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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS

Programa de Pós-Graduação em Psicologia

Luana Rodrigues de Freitas Alves Amarante

NARRATIVAS COM MULHERES JOVENS QUE TENTARAM SUICÍDIO

Belo Horizonte
2020
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Luana Rodrigues de Freitas Alves Amarante

NARRATIVAS COM MULHERES JOVENS QUE TENTARAM SUICÍDIO

Texto Dissertação apresentada ao Programa de Pós-


Graduação em Psicologia da Pontifícia Universidade
Católica de Minas Gerais, como exigência parcial para
obtenção do título de Mestre em Psicologia.

Orientadora: Profa. Dra. Luciana Kind do Nascimento

Linha de Pesquisa: Intervenções Clínicas e Sociais


Apoio: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de
Minas Gerais (FAPEMIG).

Belo Horizonte
2020
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FICHA CATALOGRÁFICA
Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

Amarante, Luana Rodrigues de Freitas Alves


Narrativas de mulheres jovens que tentaram suicídio / Luana Rodrigues de
Freitas Alves Amarante. Belo Horizonte, 2020.
XXX f.: il.

Orientadora: Luciana Kind do Nascimento


Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.
Programa de Pós-Graduação em Psicologia

1. Tentativa de suicídio. 2. Mulheres. 3. Suicídio de mulheres. 4. Violência


contra mulheres. 5. Violência e suicídio. I. Nascimento, Luciana Kind do
(orientação). II. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de
Pós-Graduação em Psicologia. III. Título.

CDU: XXX.XXX Ficha catalográfica elaborada por XXXXXXXXXX.


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Luana Rodrigues de Freitas Alves Amarante

NARRATIVAS COM MULHERES JOVENS QUE TENTARAM SUICÍDIO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação


em Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de
Minas Gerais, como exigência parcial para obtenção do
título de Mestre em Psicologia.

___________________________________________________________________________
Prof.ª Dra. Luciana Kind do Nascimento - PUC Minas

___________________________________________________________________________
Prof.ª Dra Cássia Beatriz Batista e Silva - UFSJ

___________________________________________________________________________
Prof.ª Dra Luciana Gaudio Martins Frontzek - UniBH
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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus e a todos os guias que me ampararam em todos os passos que dei.
Agradeço ao meu querido e amado esposo, Alison Amarante, pelas discussões e reflexões
constantes e por compreender os momentos de ausência e cansaço.
Agradeço a minha mãe por me dar a vida e confiar nas escolhas que faço.
Agradeço a minha madrinha e segunda mãe, Ermelinda, mais conhecida como Dindinha, por
ser exemplo e incentivo desde minha infância.
Agradeço ao meu padrinho e pai por enviar mensagens constantes dizendo que tudo daria
certo.
Agradeço a pequena Maria, minha enteada, que carinhosamente cuidou de mim em meus
momentos de estudo.
Agradeço a minha irmã, Kelly Mayrink, e minha grande amiga, Luciana Gaudio, por serem
minhas incentivadoras e por terem possibilitado que este sonho se realizasse.
Agradeço a minha irmã, Luana Lima, por acreditar em meus projetos e dividi-los comigo.
Agradeço a toda equipe do Hospital Espírita André Luiz que carinhosamente aceitaram a
parceria e contribuíram para que esta pesquisa se concretizasse.
Agradeço a FAPEMIG por acreditar no potencial de pesquisa e ser a principal responsável por
este tempo de crescimento pessoal e profissional.
Agradeço a professora Luciana Kind por me acompanhar e ensinar tanto neste tempo.
Agradeço aos colegas que estiveram presentes durante essa caminhada e com quem pude
dividir as alegrias e angústias do processo.
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Dedico carinhosamente este trabalho a todas as mulheres


que já tentaram ou desejaram tentar suicídio, em especial,
àquelas que compartilharam suas vidas comigo.
Dedico também a todas as mulheres que em algum
momento da vida passaram por situações de violência.
Dedico a toda minha família que de forma direta ou indireta
foi inspiração para este trabalho.
Dedico afetuosamente a minha sogra Cleide Gonçalves Amarante
(in memorian).
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Não te deixes destruir…


Ajuntando novas pedras
e construindo novos poemas.
Recria tua vida, sempre, sempre.
Remove pedras e planta roseiras e faz doces. Recomeça.
Faz de tua vida mesquinha
um poema.
(Trecho poesia „Aninha e suas pedras‟, Cora Carolina)
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RESUMO

Essa dissertação apresenta um estudo sobre suicídio de mulheres jovens que tentaram suicídio
e foi construída em formato de artigos. O objetivo geral da pesquisa foi compreender histórias
de vida de mulheres jovens que passaram pela experiência de tentativa de suicídio. Os
objetivos específicos foram: realizar uma revisão sistemática da literatura sobre suicídio e
mulheres; descrever as motivações narradas pelas participantes do estudo para a tentativa de
suicídio; investigar os desafios que as mulheres vivenciam após a tentativa de suicídio não
fatal; produzir conhecimento para subsidiar reflexões e propostas de intervenções que visam à
redução dos comportamentos suicidas. A metodologia foi qualitativa e teve como método de
produção de material empírico a pesquisa narrativa. O projeto foi aprovado pelo Comitê de
Ética e Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. As narrativas com as
mulheres apontaram que existe uma relação consistente entre situações de violência com a
tentativa de suicídio. As situações que mais se apresentaram foram: abuso sexual, violência
psicológica e física. O comportamento suicida também foi atravessado por dificuldades
relacionadas à comorbidades. Esse estudo reforça a necessidade de mais pesquisas que
explorem o suicídio de mulheres jovens, em especial, porque estamos diante de uma
problemática que possui facetas múltiplas. A pesquisa abre possibilidade para discussões que
poderão auxiliar na criação de medidas preventivas e que ampliam a circulação de
informações sobre o tema.

Palavras-chave: Mulheres. Tentativa de suicídio. Narrativas. Suicídio de mulheres.


Violência.
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ABSTRACT

This dissertation presentes a study on suicide of Young women who attempted suicide and
was constructed in the formo f articles. Tha general objective of the research was to
understand life histories of Young women who went through the experience of attempting
suicide. The specific objectives were: to carry out a systematic review of the literature on
suicide and women; description as motivations narrated by the study participants for the
suicide attempt; investigating the challenges that women experience after attempting non-fatal
suicide; knowledge to support reflections and proposals for interventions aimed at reducing
suicidal behaviors. The methodology was qualitative and had as a method of producing
empirical material the narrative search. The Project was approved by the Ethics and Research
Committee of the Pontifical Catholic University of Minas Gerais. The narratives with women
pointed out that there is a consistente relationship between situations of violence and
attempted suicide. The most likely hypotheses: sexual abuse, psychological and physical
violence. Suicidal behavior was also affected by difficulties related to comorbidities. This
study reinforces the need for more research that explores the suicide of Young women,
especially because we are facing a problem that gas multiple facets. The research opens up the
possibility for the exercise to assist in the creation of preventive measures that expand the
circulation of information on the topic.

Keywords: Women. Suicide attempt. Narratives. Suicide of women. Violence.


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LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 - Desenho da pesquisa

FIGURA 2 - Código QR Code


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LISTA DE QUADROS na

QUADRO 1 - Descrição dos Artigos

QUADRO 2 - Características da Mulheres entrevistadas

QUADRO 3 – Realidade vivenciada pelas mulheres


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LISTA DE TABELAS

TABELA 1 - Retorno das entrevistas não realizadas.


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LISTA DE SIGLAS

CEP Comitê de Ética em Pesquisa

CFEMEA Centro Feminista de Estudos e Assessoria

CNDM Conselho Nacional da Condição da Mulher

CNS Conselho Nacional de Saúde

DANTPS Departamento de Doenças e Agravos Não-Transmissíveis e Promoção da

Saúde

HEAL Hospital Espírita André Luiz

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

NaGeS Grupo de Pesquisa em Narrativas, Gênero e Saúde

NEPS Núcleo de Estudo e Prevenção ao Suicídio

PUC Minas Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

TALP Teste de Associação Livre de Palavras

TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

UPA Unidade de Pronto Atendimento

WHO World Health Organization


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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 16
1.1 Caminhos metodológicos .......................................................................................... 18
1.1.1 Etapas da pesquisa ............................................................................................... 23
Referências ....................................................................................................................... 24

2 TENTATIVA DE SUICÍDIO DE MULHERES: uma experiência atravessada por


violências e perdas............................................................................................................... 27
2.1 Introdução .................................................................................................................. 28
2.2 Metodologia ................................................................................................................ 29
2.3 Resultados e Discussões ............................................................................................ 31
2.3.1 A experiência de violência nas relações afetivas ................................................. 32
2.3.2 Violência psicológica e física na relação familiar primária................................ 34
2.3.3 O luto, as perdas e as comorbidades.................................................................... 37
2.4 Considerações finais .................................................................................................. 38
Referências ....................................................................................................................... 39

3 A RELAÇÃO ENTRE VIOLÊNCIA CONTRA MULHERES E TENTATIVA DE


SUICÍDIO ............................................................................................................................ 42
3.1 Introdução .................................................................................................................. 43
3.2 Violência contra mulheres ........................................................................................ 44
3.3 Tentativa de suicídio no Brasil................................................................................. 47
3.4 Impactos das violências nas tentativas de suicídio ................................................. 49
3.5 Considerações finais .................................................................................................. 50
Referências ....................................................................................................................... 50

4 MULHERES JOVENS E TENTATIVA DE SUICÍDIO ............................................. 53


4.1 Introdução .................................................................................................................. 54
4.2 Metodologia ................................................................................................................ 56
4.3 Resultados e Discussões ............................................................................................ 61
4.3.1 A tentativa de suicídio .......................................................................................... 62
4.3.2 Abuso Sexual ........................................................................................................ 66
4.3.3 Comorbidades....................................................................................................... 68
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4.3.4 Violência nas relações afetivas ............................................................................ 70
4.3.5 Violências vivenciadas nas relações familiares ................................................... 73
4.4 Considerações finais .................................................................................................. 75
Referências ....................................................................................................................... 76

5 PRODUÇÃO TÉCNICA ................................................................................................. 79


5.1 Vídeo ........................................................................................................................... 79
5.2 Ebook: Violência contra mulher e suicídio ............................................................. 80
5.3 Livro: Suicídio Feminino .......................................................................................... 92

REFERÊNCIAS ................................................................................................................ 115

APÊNDICE A – Carta de apresentação do projeto de pesquisa .................................. 120


APÊNDICE B – Termo de compromisso ........................................................................ 121
APÊNDICE C – Questão gerativa e tópicos de aprofundamento ................................ 122
APÊNDICE D – Retorno das entrevistas não realizadas .............................................. 123
APÊNDICE E – Termo de consentimento livre e esclarecido ...................................... 126
APÊNDICE F – Contextualização das entrevistas não realizadas ............................... 128

ANEXO A – Aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa ............................................ 132


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1 INTRODUÇÃO

O interesse por estudar o suicídio feminino surgiu durante um período de estágio em


psicologia de um ano e meio no Hospital Espírita André Luiz (HEAL), um hospital
psiquiátrico localizado na cidade de Belo Horizonte. Ao iniciar as atividades fui
direcionada e assumi a responsabilidade pela unidade feminina, o que significava conduzir
grupos terapêuticos com as mulheres, além dos atendimentos psicológicos individuais.
Sempre que possível elas ocupavam os espaços para narrarem suas experiências com a
tentativa de suicídio e em muitos momentos, das frustrações que sentiam por não ter
conseguido êxito no mesmo ou dos olhares após terem cometido o ato. Em inúmeros
momentos e espaços falavam das dificuldades vivenciadas por serem mulheres, da
sobrecarga, das violências e das dores.
O suicídio aparece como um último recurso para resolução de alguma dificuldade
pessoal. “Trabalhar com o tema do suicídio inclui lidar com questões existenciais, tais
como: falta de sentido, solidão, tédio, medo, sofrimento, agonia e ajustamentos criativos
disfuncionais” (Fukumitsu & Scavacini, 2013, p. 199). Diante destes cenários muitos
questionamentos surgiram: o que leva às mulheres a tentarem suicídio? Que dor é essa que
retira o desejo pela vida? O suicídio é mesmo a única opção? E, também, surgiu um desejo
grande por ouvir e conhecer história dessas mulheres.
Ainda neste período de estágio tive um encontro com um Grupo de Pesquisa em
Narrativas, Gênero e Saúde (NaGeS) o que me despertou o interesse pelas narrativas
enquanto método de pesquisa por não limitar a expressão da pessoa que narra, tornando
possível apreender de forma mais ampla o mundo vivenciado por ela (Flick, 2009).
O objetivo geral da pesquisa foi compreender histórias de vida de mulheres jovens
que passaram pela experiência de tentativa de suicídio. Os objetivos específicos foram:
realizar uma revisão sistemática da literatura sobre suicídio e mulheres; descrever as
motivações narradas pelas participantes do estudo para a tentativa de suicídio; investigar os
desafios que as mulheres vivenciam após a tentativa de suicídio não fatal; produzir
conhecimento para subsidiar reflexões e propostas de intervenções que visam à redução dos
comportamentos suicidas.
O suicídio caracteriza-se pelo ato de ocasionar a própria morte (Minayo &
Cavalcante, 2013). Segundo a Organização Mundial de Saúde (World Health Organization,
17
WHO, 2008), um suicídio é consumado a cada 40 segundos e uma tentativa é realizada a
cada três segundos. O número de tentativas chega a superar em 10 a 20 vezes os suicídios
consumados (OMS, 2014). De acordo com o boletim do Ministério da Saúde no período
entre 2007 e 2016 foram registrados 106.374 óbitos por suicídio e em 2016 a taxa chegou a
5,8 por 100 mil habitantes. A Diretora do Departamento de Doenças e Agravos Não-
Transmissíveis e Promoção da Saúde (DANTPS), do Ministério da Saúde, Fátima Marinho
declarou que “é importante a análise desses dados, pois é uma questão de saúde pública que
tem se agravado no país, principalmente para que possamos diminuir o preconceito e o
estigma nas pessoas que tentam o suicídio” (Brasil, 2018a). De acordo com Lovisi e
colaboradores (2009, p. S87) “o Brasil está entre os 10 países com mais suicídios”.
Durkheim (2000) em sua obra clássica, O Suicídio, atribui a maior taxa de suicídio
aos homens devido o seu maior engajamento coletivo, considerando que as mulheres eram
menos afetadas, ou seja, não sofriam influência das dificuldades sociais, estresses, pressões,
lutas, porém, também não eram afetadas por conquistas sociais e convívios comunitários.
Vale destacar que aqui tem um enviesamento por ser um homem a falar pela mulher. O
contexto atual diz de uma crescente igualdade entre homens e mulheres quanto à
participação social e política, bem como acerca de direitos e acessos a bens e posições.
Com isso, Bertolote (2012) afirma que as diferenças nas taxas de suicídio entre homens e
mulheres estão diminuindo desde os anos de 1980 e 1990.
No que tange às tentativas de suicídio, alguns autores afirmam que existe maior
prevalência no sexo feminino e os casos com desfecho fatal ocorrem mais entre o sexo
masculino (Meneghel et al., 2015; Rabasquinho & Pereira, 2007; Vieira, Santana &
Suchara, 2015). Cerca de 15 a 25% das pessoas que tentaram uma vez, no prazo de dez
anos, conseguem concluir o ato (Vieira, Santana & Suchara, 2015). Pesquisas apontam para
a existência de alguns fatores que podem influenciar na decisão de mulheres sobre a
retirada da própria vida, como por exemplo, a maior prevalência de depressão, distúrbios
alimentares, abuso de álcool e outras drogas, psicose pós-parto, vulnerabilidade à perda de
filhos, violência doméstica, e problemas de ordem familiar e socioeconômicas (Minayo &
Cavalcante, 2013; Minayo & Cavalcante, 2015).
Vale dizer que estatisticamente apenas uma a cada três tentativas se tornam
conhecidas pelos serviços de saúde (Meneghel et al., 2015). Os estigmas vinculados ao
suicídio interferem nos resultados dos registros e têm consequências, como por exemplo, o
18
negligenciamento de programas preventivos (Bertolote, 2012). A Lei 13.819 de 26 de abril
de 2019 institui a Política Nacional de Prevenção da Automutilação e do Suicídio e tem
como objetivo a promoção de saúde mental e a prevenção à violência autoprovocada e
contempla sobre as notificações e o seu caráter sigiloso visando ter maior êxito tanto nos
dados quanto na prevenção e tratamento das pessoas que tentaram o autoextermínio (Brasil,
2019b).
Tais informações demonstram que os comportamentos suicidas constituem um
problema de saúde pública (Rothes, Henriques & Correia, 2013; WHO, 2008). A taxa de
suicídios tem aumentado mundialmente a cada ano (Fukumitsu et al., 2015). O boletim
divulgado pelo Ministério da Saúde em 2018 (Brasil, 2018a) apontou que as mulheres são
responsáveis por 70% das tentativas de suicídio e que em 2017 o número de tentativas
aumentou cinco vezes considerando o ano de 2007. Destacou-se um aumento nas tentativas
entre jovens de 15 a 29 anos (Brasil, 2018b), o que motivou a realização desta pesquisa. O
boletim epidemiológico divulgado em 2019 discorre especificamente sobre as tentativas e
óbitos por intoxicação exógena no período de 2007 a 2016 e também sugere que 69,9% das
tentativas com tal método, foram realizadas por mulheres (Brasil, 2019a).
Diante de um aumento tão significativo, se faz necessário pensar as influências
culturais nos comportamentos suicidas de mulheres. E, para, além disso, buscar
compreender os processos de subjetivação que permeiam as vivências das tentativas de
autoextermínio feminino. Ou seja, a partir dessa realidade, a questão que norteará a
realização deste trabalho será: como a experiência com a tentativa de suicídio compõe as
narrativas de mulheres jovens?
Para finalizar, vale considerar que esta pesquisa, ao analisar trajetórias de mulheres
jovens que tentaram o suicídio, pode proporcionar o surgimento de novas ações e reflexões
que visam orientar a práticas de profissionais de saúde quando dirigidas a esse público.

1.1 Caminhos metodológicos

A pesquisa tem como referência as abordagens qualitativas, uma vez que busca
compreender qual é o significado que as participantes atribuem aos diversos aspectos de
suas vidas (Minayo, 2007) e o uso das narrativas enquanto método de pesquisa se deu por
acreditar no que aponta Gluck citada por Santhiago (2016) ao dizer que a entrevista é “um
19
encontro feminista que empoderava igualmente entrevistadora e narradora” (p. 87).
Santhiago (2016) ao analisar o texto de Sherna Berger Gluck, de 1977, faz um recorte e traz
para sua reflexão que independente da mulher que é convidada a narrar sua história de vida
a outra mulher, e que por mais distantes que sejam as realidades que possam vivenciar,
existe um fio comum que é capaz de ligá-las.
Existem várias abordagens quanto ao modo de se trabalhar com narrativas, e elas
possuem visões distintas a partir da área em que estão sendo trabalhadas. Por exemplo, os
sociólogos e antropólogos se interessam em compreender a totalidade de uma narrativa, e
um trabalho que vem sendo muito reconhecido é desenvolvido por Catherine Riessman. Já
os sociolinguistas optam por trabalhar fragmentos de narrativas e voltam-se às suas
estruturas, um nome muito divulgado por este tipo trabalho é de William Labov. Outra área
que também apresenta novo olhar é a psicologia, ela busca ordenar de forma temporal e
progressiva uma narrativa e a divide em episódios, um nome influente é o Jerome Bruner
(Tamboukou, 2016). Como é possível notar, a pesquisa narrativa é múltipla.
A pesquisa narrativa considera que sujeito e sociedade não podem ser vistos
separadamente, a narrativa se torna um terreno fértil para compreender eventos
psicossociais. Tamboukou (2016) ao falar sobre o que é narrativa aponta que a questão
principal deveria ser “o que uma narrativa faz?”. Dessa forma, seria possível aproximar de
suas manifestações. E, no momento seguinte seria possível pensar sobre suas condições e
possibilidades. A questão em si não é sobre definir as características da narrativa, “mas
trata-se de rastrear suas continuidades e descontinuidades, bem como as diferenças e as
repetições de como as narrativas são contadas e usadas nas ciências sociais.” (Tamboukou,
2016, p.70). As narrativas possuem três características principais:

a) temporalidade - as narrativas representam uma sequência de eventos; b) significação -


narrativas carregam ricos significados; e c) sociabilidade - narrativas sempre se direcionam
a uma audiência, na verdade, elas são produzidas tendo-se um público em mente
(Tamboukou, 2016, p.71).

A partir da narração é possível reconstruir histórias e contextos uma vez que ela
aponta para detalhes como o tempo, o lugar, as palavras e sentidos próprios da sua
experiência de vida, bem como de sua subcultura e grupos sociais. “Através da narrativa, as
pessoas lembram o que aconteceu, colocam a experiência em uma sequência, encontram
20
possíveis explicações para isso, e jogam com a cadeia de acontecimentos que constroem a
vida individual e social” (Jovchelovitch & Bauer, 2007, p. 91). Também constroem
significados em suas vidas, por isso, a narrativa é um ponto central para as ciências sociais
(Tamboukou, 2016). Para a autora, “as narrativas devem ser entendidas como uma
sequência de eventos organizados em um todo, de modo que o significado de cada evento
possa ser compreendido a partir de sua relação com todo” (Tamboukou, 2016, p.71).
Jovchelovitch e Bauer (2007) acrescenta que

Contar histórias implica duas dimensões: a dimensão cronológica, referente à narrativa


como uma sequência de episódios, e a não cronológica, que implica a construção a
construção de um todo a partir de sucessivos acontecimentos, ou a configuração de um
„enredo‟. O enredo é crucial para a constituição de uma estrutura de narrativa. É através do
enredo que as unidades individuais (ou pequenas histórias dentro de uma história maior)
adquirem sentido na narrativa (Jovchelovitch & Bauer, 2007, p.92).

O que define o começo e fim de uma história é o enredo. Portelli (2016) acrescenta
ainda que “a narrativa também não é um texto fixo e um depósito de informações, mas sim
um processo e uma performance” (p.19). Schütze declarou que as narrativas podem ser
expressas por três formas: detalhada, fixação da relevância ou fechamento da Gestalt
(Jovchelovitch & Bauer, 2007; Rosenthal, 2014).
Quando o esquema autogerador é o detalhamento, o narrador oferece o máximo de
detalhes a fim de contextualizar a sua fala e fazer ligações com os próximos
acontecimentos. Já na fixação da relevância, o entrevistado seleciona aquilo que irá dizer
apenas com as informações relevantes sobre os fatos, de acordo com aquilo que lhe é
importante e significativo. Por fim, o fechamento da Gestalt é quando se conta em
totalidade um acontecimento central (Jovchelovitch & Bauer, 2007; Rosenthal, 2014), esse
esquema autogerador “estimula o falante a dar forma às estruturas cognitivas iniciais”
(Rosenthal, 2014, p.189).
A pesquisa narrativa tem como ponto central a singularidade de quem se conta, mas
não é individualista. A investigação narrativa está inserida na política e é o local do
conhecimento encarnado por possuir uma história única. O self narrável tem um caráter
nômade, ou seja, não é um self dado, fixo, único e inalterável, ao contrário, possui vários
eus com níveis diferentes posições de sujeitos. As narrativas abrem espaço para o
21
imaginário, uma vez que ele “dá acesso às realidades do mundo social” (Tamboukou, 2016,
p. 77).
O fazer pesquisa narrativa envolve considerar o espaço-tempo e ter a certeza que
nem sempre existirá uma linearidade nas histórias. A pessoa que narra pode ir e voltar no
tempo para falar sobre alguma experiência, o que reafirma que ela pode se dizer no presente
a partir do que o constituiu no passado. A investigação narrativa implica a presença do
poder e desejo, no entanto, vale considerar que as histórias “não são apenas efeitos
condicionados pelas relações de poder, conhecimento e desejo. Histórias fazem coisas: elas
produzem realidades. A pesquisa narrativa é, portanto, sobre o poder constitutivo das
histórias em produzir realidades e sujeitos” (Tamboukou, 2016, p. 78).
Na década de 1970, Fritz Schütze apresentou uma nova técnica para realização de
entrevistas abertas, a entrevista narrativa. Rosenthal (2014, p.170) aponta que “é nela que
vemos o „princípio da abertura‟ ser aplicado da maneira mais sistemática, tanto na
realização da entrevista quanto nas diversas formas de análise de dados.”
A entrevista narrativa acontece a partir de uma pergunta gerativa de narrativa. A
pesquisadora gera uma pergunta de modo que encoraje e estimule a narradora a contar sua
história de vida, bem como o meio em que está inserido (Jovchelovitch & Bauer, 2007).
Não devem acontecer interrupções para não interferir no fluxo de memórias e não
prejudicar o processo de narração de história. Através dos relatos mais livres e longos, sem
interrupções, “é possível observar com clareza o modo como o entrevistado emerge em
fluxo narrativo e de lembranças enquanto também ativa a sua memória sensitiva e constrói
histórias cada vez mais detalhadas” (Rosenthal, 2014, p. 189). Ela é uma entrevista aberta e
não estruturada e possui características específicas (Jovchelovitch & Bauer, 2007).
A entrevista narrativa é constituída pelas seguintes fases: a) iniciação: neste
momento é colocada a pergunta gerativa de narrativa e feito o convite para que a pessoa
narre sua história; b) narrativa principal: nesta fase não deve acontecer interrupções e
devem ser utilizadas apenas manifestações paralinguísticas (Humm). Nesta fase é possível
tomar nota de algumas palavras chaves para a próxima etapa, ela pode durar alguns minutos
ou várias horas e é importante esperar pelo momento de coda (sinal de finalização) do
entrevistado; c) fase de questionamentos: deve iniciar a partir das anotações realizadas na
fase anterior e seguir a ordem de acontecimentos escolhida pelo entrevistado. As perguntas
devem encorajá-lo a dar mais detalhes de uma determinada situação e por isso, não cabem
22
perguntas como “por quê”; d) conclusão da entrevista: deve considerar que a entrevista não
seja finalizada em momento que o entrevistado estiver relatando uma situação muito difícil,
deve ser possível encorajá-lo a continuar contando para que possa emergir acontecimentos
advindos pelo ocorrido anterior. Nesta fase, já com gravador desligado, é possível lançar
outras perguntas e não é necessário excluir os “por quês”. Após toda finalização deve-se
realizar anotações de todos os acontecimentos após o gravador ser desligado (Jovchelovitch
& Bauer, 2007; Rosenthal, 2014).
Fritz Schütze construiu uma proposta para a análise das narrativas. Em momento
inicial, é necessário realizar uma transcrição detalhada do material verbal. A segunda fase
consiste em dividir o material em indexados, ou seja, a quem fez o quê, quando, onde e por
quê, e não indexados, quais são os valores, juízos e como os acontecimentos são
vivenciados. A terceira fase implica em analisar e ordenar o conteúdo indexado em
trajetórias individuais. Na fase quatro, o conteúdo não indexado será analisado buscando
identificar o que aparece como “conhecimento”. Na quinta fase, será realizado um
agrupamento e comparação entre as histórias individuais. Na sexta e última fase, é possível
identificar trajetórias coletivas a partir das aproximações das experiências individuais
(Jovchelovitch & Bauer, 2007). Vale considerar que este é apenas uma maneira de se olhar
para as entrevistas narrativas. Riessman (2008) propõe quatro abordagens para analisar as
narrativas:

a) abordagem temática onde o foco é sobre “o que é dito”; b) a abordagem estrutural, em


que a atenção desloca-se para a forma de narração; c) abordagem dialógica, em que o
público e os contextos são priorizadas na análise; e, finalmente, d) a virada visual, um
interesse relativamente recente que tem surgido sobre as narrativas visuais. (Tamboukou,
2016, p.71).

Riessman (2008) também apresenta a proposta de análise dialógica/performática.


Ela afirma que ao se contar uma história uma performance é construída e apresentada ao
ouvinte. Também reforça a importância de se considerar o contexto em que a narrativa é
produzida. Nascimento (2016) ao falar sobre tal análise propõe que algumas perguntas
precisam ser respondidas, como, para quem está sendo direcionado? Para que serve? E
principalmente, “que „eus‟ se apresentam na dimensão dialógico-performativa das
histórias?” (Nascimento, 2016, p. 61).
23
Para auxiliar na codificação e identificar as performances das narrativas, Riessman
(2008) propõe alguns recursos linguísticos: interrupções e pausas; uso de inflexão; discurso
direto; uso de sons expressivos; interlocução; estilo narrativo heroico; uso performático de
tempos verbais; sobreposição de discursos; repetição, ventriloquismo; apresentação do
“Self Preferido”.

1.1.1 Etapas da pesquisa

Nesta seção serão apresentadas as fases desenvolvidas nesta pesquisa a fim de


compreender o fenômeno estudado. Através da Figura 1 é possível visualizar o desenho da
pesquisa.

Figura 1 - Desenho da pesquisa

Fonte: Elaborada pela autora.

Na fase 1, foram realizadas duas reuniões junto ao Hospital Espírita André Luiz
para estabelecimento de parceria para execução da pesquisa. Após alinhamentos dos passos
a serem seguidos durante a fase empírica do trabalho, tais como os critérios a serem
adotados para reconhecimento das possíveis indicações para as entrevistas, foi estabelecido
o compromisso entre as partes. Nesta etapa foi enviada uma carta de apresentação do
projeto de pesquisa (Apêndice A) e assinado por responsáveis do hospital um Termo de
Compromisso (Apêndice B).
Também na primeira fase da pesquisa, o projeto de pesquisa intitulado “Narrativa de
mulheres jovens que tentaram suicídio” foi tramitado pelo Comitê de Ética em Pesquisa
24
(CEP) da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas) no período de
julho a setembro de 2019. Após aprovação recebeu um número referente ao parecer do CEP
que se chama Certificado de Apresentação de Apreciação Ética (CAAE)
19647619.4.0000.5137 (Anexo A). Através deste número é possível consultar o parecer
junto ao comitê de ética.
Na fase 2 foi realizada uma revisão sistemática com a finalidade de “fundamentar
teoricamente o objeto de estudo, contribuindo com elementos que subsidiam a análise
futura dos dados obtidos” (Lima & Mioto, 2007, p. 44). No artigo que se encontra no
capítulo 2 é possível ver a metodologia mais detalhada. Também foi realizado um ensaio
teórico de elementos conceituais. Os resultados estão no artigo que se encontra como
capítulo 3 desta dissertação.
Ainda na fase 2, foram realizadas doze entrevistas com mulheres com idade igual ou
superior a 18 anos e no máximo 29 anos e que tentaram suicídio pelo menos uma vez, tendo
como embasamento a proposta da pesquisa narrativa. A entrevista narrativa tem como base
uma “pergunta gerativa de narrativa” e tem como finalidade encorajar a entrevistada a
contar sua história (Flick, 2009; Jovchelovitch & Bauer, 2007). Nesta pesquisa a questão
gerativa utilizada foi: “Conte-me sobre sua história de vida e experiência com a tentativa
de suicídio. Você pode levar o tempo que for preciso e pode dar detalhes de tudo que for
importante para você". O Apêndice C apresenta tópicos para a formulação de questões de
aprofundamento que foram utilizadas, preferencialmente de forma imanente à narração
inicial.
O hospital parceiro realizou a indicação de 60 mulheres e destas foi possível realizar
a entrevista apenas com 12. No Apêndice D é possível ver uma planilha com o retorno de
todos os contatos realizados que não resultaram em entrevistas. Os detalhes quanto à
metodologia da pesquisa empírica se encontram no artigo 3, no capítulo quatro.
Já na terceira fase, as entrevistas foram transcritas, em segundo momento houve
nova escuta dos áudios acompanhados das transcrições e, em seguida, elas foram analisadas
a partir da análise dialógica performativa proposta por Riessman (2008). No Apêndice F
consta uma breve contextualização do contato com cada uma das entrevistadas. Os
resultados das análises também são possíveis ser vistos no artigo três desta dissertação.
A dissertação será apresentada em forma de artigos. Sendo que os dois primeiros
trazem pesquisas teóricas e o terceiro conta com a apresentação da pesquisa empírica. Em
25
função disso, cada seção, desde esta Introdução, conta com as referências específicas
utilizadas no corpo do texto. Além dos artigos, a este material conta com um capítulo com
as produções técnicas que foram desenvolvidas.

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27
2 TENTATIVA DE SUICÍDIO DE MULHERES: uma experiência atravessada por
violências e perdas1

Resumo
Neste artigo apresentamos uma revisão sistemática da literatura a fim de aprofundar o
conhecimento sobre o suicídio entre mulheres jovens na contemporaneidade. Pesquisas
com essa temática são escassas na produção brasileira por considerarem que mulheres se
suicidam menos que os homens. No entanto, elas tentam mais contra a própria vida e os
dados divulgados pelo boletim do Ministério da Saúde (Brasil) em 2019 apontaram que elas
são responsáveis por 70% das tentativas. A estratégia metodológica foi uma revisão
sistemática da literatura realizada no Portal Periódicos CAPES e utilizou-se dos
indexadores “suicídio AND mulheres” e “tentativa de suicídio AND mulheres”, totalizando
em oito artigos para leitura na íntegra e análise dos dados. O trabalho analítico resultou na
construção de três eixos temáticos: I) A experiência de violência nas relações afetivas; II)
Violência psicológica e física nas relação familiar primária; e, III) O luto, as perdas e
comorbidades. As discussões sinalizam que as mulheres tendem a recorrer ao suicídio
como modo de resolução de seus problemas e das dificuldades, principalmente quando
acreditam que não tem outra solução, senão morrer.
Palavras-chave: Mulheres; suicídio; tentativa de suicídio; violência doméstica;
patriarcado; feminismo.

Abstract
In this paper we present a research which aim was to conduct a systematic review of the
literature in order to deepen the knowledge about female suicide. Researches with this
theme are scarce because they consider that women are less effective in suicide than men.
However, they are more likely to attempt against their own lives than men, and the data
released by the Ministry of Health bulletin in 2019 pointed out that women are responsible
for 70% of the attempts of suicide. The methodological strategy was a systematic review of
the literature carried out on the Portal Periódicos Capes and used the indexes “suicide AND
women” and “suicide attempt AND women”, totaling eight articles for reading in full and

1
O artigo será submetido à Revista Psicologia em Pesquisa. Todas as adequações às normas serão revistas
antes da submissão.
28
analyzing the data. The analytical work resulted in the construction of three thematic axes:
I) marital conflicts; II) violence and family burden; and, III) mourning, losses and
comorbidities. The discussions indicate that women tend to resort to suicide as a way of
solving their problems and difficulties, especially when they believe that they have no other
solution but to die.
Keyworks: Women; suicide; suicide attempt; domestic violence; patriarchy; feminism.

2.1 Introdução

O suicídio é considerado um fato social que se constitui como um problema de


saúde pública e gera impactos sociais (Durkheim, 2000; Meneghel, Moura, Hesler &
Gutierrez, 2015; Rothes, Henriques & Correia, 2013). Alguns autores descrevem o
fenômeno como o ato de definir a própria morte como sua última escolha (Fukumitsu,
2013; Fukumitsu, Provedel, Kovács & Loureiro, 2015; Minayo & Cavalcante, 2013). A
escolha pela tentativa de suicídio pode ter inúmeros fatores como determinantes, ou seja,
pode ser por questões biológicas, sociais ou psicológicas (Minayo & Cavalcante, 2013).
Nesta pesquisa, dedicamo-nos a compreender experiências do ato suicida com
desfecho não fatal. Logo, foram privilegiadas e tomadas como ponto principal as tentativas
de suicídio e com especial atenção ao público feminino. Pesquisas que abarcam a temática
suicídio feminino são escassas na produção brasileira, provavelmente por considerarem que
as mulheres se matam menos que os homens (Durkheim, 2000; Minayo & Cavalcante,
2013). No entanto, Minayo e Cavalcante (2013, p. 2412) afirmam que “ao contrário de um
tipo de literatura que considera as mulheres ineptas a executarem um plano suicida, os
resultados mostram que elas testam métodos e, até clinicamente debilitadas, conseguem ser
exitosas em antecipar seu fim”.
O boletim divulgado pelo Ministério da Saúde em 2018 (Brasil, 2018a) apontou que
as mulheres são responsáveis por 70% das tentativas de suicídio e que em 2017 o número
de tentativas aumentou cinco vezes considerando o ano de 2007. Evidenciou-se também um
aumento nas tentativas entre jovens de 15 a 29 anos o que influenciou na escolha por
mulheres jovens para realização desta pesquisa (Brasil, 2018b). O boletim epidemiológico
(Brasil, 2019a) divulgado em 2019 discorre especificamente sobre as tentativas e óbitos por
29
intoxicação exógena no período de 2007 a 2016 e sugere que 69,9% das tentativas com tal
método, foram realizadas por mulheres.
Mesmo com todas as ações de emancipação de mulheres observadas na
contemporaneidade, sabe-se que mudanças culturais se dão historicamente de forma lenta.
Portanto, características de opressão como submissão, maior sobrecarga, maior
responsabilização para as mesmas tarefas que os homens, ainda são o que predomina na
sociedade contemporânea. E, alguns estudos apontam que a sobrecarga e as violências estão
entre as principais causas para as mulheres atentarem contra as próprias vidas (Correia et
al., 2014; Meneghel et al., 2015; Pinto, Alves & Maia, 2015). Diante disso, neste artigo
realizamos uma revisão sistemática da literatura a fim de aprofundar o conhecimento sobre
o suicídio feminino.

2.2 Metodologia

A pesquisa tem como referência as abordagens qualitativas, uma vez que busca
compreender qual é o significado que as participantes atribuem aos diversos aspectos de
suas vidas (Minayo, 2007). Para mapear as produções existentes, realizou-se uma revisão
sistemática da literatura com a finalidade de “fundamentar teoricamente o objeto de estudo,
contribuindo com elementos que subsidiam a análise futura dos dados obtidos” (Lima &
Mioto, 2007, p. 44). Diante disso foram estabelecidas algumas etapas da pesquisa,
distribuídas da seguinte forma: a identificação do tema, formulação da questão problema,
estabelecimento de critérios de inclusão ou exclusão dos artigos localizados, avaliação dos
estudos incluídos e análise e síntese dos resultados encontrados.
A coleta dos dados aconteceu no período de setembro de 2019 a março de 2020. A
busca por trabalhos científicos indexados se deu através do Portal de Periódicos CAPES em
dois momentos, sendo que a primeira estratégia de truncagem de termos de busca foi:
“suicídio AND mulheres”. Esta busca gerou um total de 70 resultados. Após a aplicação
dos critérios de refinamento – artigos publicados em periódicos revisados por pares,
publicações dos últimos dez anos e como parâmetro linguístico serem em português,
espanhol e inglês – retornamos um total de 46 textos que foram submetidos à etapa de
leitura seletiva. Nesta etapa foram desconsiderados os trabalhos com viés estritamente
quantitativo e de outras áreas de produção, como enfermagem, medicina e farmácia,
30
gerando um número final de seis artigos. Vale considerar que os artigos de outras áreas
foram excluídos por apresentarem conteúdos muito distantes da experiência vivenciada por
mulheres que tentaram suicídio, por exemplo, o material da medicina e farmácia dizia dos
efeitos dos fármacos no organismo.
Após a leitura dos artigos surgiu a necessidade por realizar uma nova busca, desta
vez com os indexadores “tentativa suicídio AND mulheres” resultando em 384 artigos.
Após aplicar os mesmos critérios utilizados na primeira busca, ficaram 123 documentos
que foram submetidos a leitura seletiva e também passaram pelo refinamento da primeira
busca, ou seja, trabalhos estritamente quantitativos e de outras áreas foram desconsiderados
a partir dos mesmos vieses da busca anterior. Por fim, ficaram cinco artigos que foram lidos
na íntegra. Um dos artigos selecionados para análise refere-se a uma pesquisa realizada
com mulheres portuguesas por acreditar que as experiências não se distanciariam das
mulheres brasileiras e considerar a vivência feminina.
Vale ressaltar que três artigos se repetiram e foram considerados apenas uma vez.
Dessa forma, oito produções foram analisadas e utilizadas como meio de discussão neste
trabalho. Para a coleta de dados e compreensão do tema foi produzido um quadro que conta
com as seguintes informações acerca dos artigos selecionados: autores, ano, título,
objetivos e participantes. Diante disso, foi possível verificar e evidenciar o rigor
metodológico de cada amostra, conforme se observa abaixo. A leitura dos trabalhos
selecionados permitiram a ordenação dos textos em três eixos temáticos que serão
trabalhados adiante.

Quadro 1 - Descrição dos artigos

Autores Ano Título Objetivo Participantes Temática

Meneghel et al 2013 Suicídio de Identificar características de gênero Histórias de mulheres 1,2 e 3


Mulheres: uma presentes nas histórias de vida de que suicidaram
situação limite? mulheres que se suicidaram.

Pacheco, 2010 Tentativa de suicídio Identificar os casos de tentativas de Quatro mulheres que 1,2 e 3
Damasceno, Souza em mulheres por suicídio por queimaduras em mulheres tentaram suicídio
e Brito queimaduras em um centro de tratamento de
queimados; descrever as
características socioeconômicas das
mulheres que tentaram suicídio por
queimaduras e avaliar os fatores
relacionados à tentativa de suicídio
por queimaduras de mulheres.

Minayo e 2013 Estudo Compreender empiricamente os casos Familiares de 11 2e3


31
Cavalcante compreensivo sobre e as múltiplas razões de 11 mulheres idosas que morreram
suicídio de mulheres que faleceram por suicídio e cujos por suicídio
idosas de sete fragmentos de histórias pessoais que
cidades brasileiras as levaram à morte autoinfligida
narradas por seus familiares.

Pinto, Alves e Maia 2015 Adversidade na Caracterizar a prevalência das 225 mulheres com 2
infância prediz experiÊncias adversas autorrelatadas idades compreendidas
sintomas em mulheres adultas portuguesas e entre 18 e 78 anos
depressivos e avaliar se essas experiências estão
tentativas de relacionadas a sintomas depressivos e
suicídio em tentativas de suicídio
mulheres adultas
portuguesas

Correia et al 2014 Representações Apreender a estrutura das 30 mulheres foram 1e2


sobre o suicídio para representações sociais sobre o suicídio submetidas ao teste de
mulheres com para mulheres com história de associação livre.
história de violência violência doméstica e tentativa do Destas, 10 foram
doméstica e mesmo submetidas à
tentativa do mesmo entrevista..

Tavares et al 2012 Prevalence of Avaliar a prevalência do risco de 919 mulheres pós- 3


suicide risk and suicídio e comorbidades em mulheres parto
comorbidities in pós-parto
postpartum women
in Pelotas

Macedo, Rosa e 2011 Queimaduras Analisar a incidência, as 278 pessoas 1


Silva autoinfligidas: características, a conduta e a taxa de queimadas. Destes, 15
tentativa de suicídio mortalidade de pacientes com foram incluídos por
queimaduras por autoagressão de um confessar intenção.
centro regional de tratamento de
queimaduras no Brasil

Santos, Lovisi, 2009 Prevalência de Estimar a prevalência dos transtornos 96 pessoas que 3
Legay e Abelha transtornos mentais mentais nos casos de tentativas de tentaram suicídio
nas tentativas de suicídio atendidos em um hospital de
suicídio em um emergência público no Rio de Janeiro,
hospital de Brasil, no período de abril de 2006 a
emergência no Rio março de 2007.
de Janeiro, Brasil

Fonte: Elaborado pela autora.

2.3 Resultados e Discussões

A partir da leitura e compreensão dos dados construímos, são elas: 2.3.1 A


experiência de violência nas relações afetivas; 2.3.2 Violência psicológica e física nas
relação familiar primária; e, 2.3.3 O luto, as perdas e as comorbidades. Para a construção
das temáticas foi utilizada a Análise de Conteúdo (AC) proposta por Laurence Bardin
(1977). Por meio da análise categorial, elencamos as construções das temáticas que
emergiram dos conteúdos dos artigos supracitados.
32
2.3.1 A experiência de violência nas relações afetivas

Estudos apontam que diante de conflitos nas relações afetivas, mulheres tendem a
recorrer ao suicídio como tentativa de resolver e acabar com tais situações. Dessa forma,
conflitos conjugais tornam-se fatores predisponentes ao suicídio feminino (Correia et al.,
2014; Macedo, Rosa & Silva, 2011; Meneghel et al., 2013; Pacheco, Damasceno, Souza &
Brito, 2010). No presente trabalho tais conflitos serão considerados violências vivenciadas
por mulheres dentro de suas relações afetivas. Optou-se pela nomenclatura „violência
conjugal‟ não para se tornar generalista e suscitar a ideia de violências mútuas, mas sim,
para compreender o fenômeno da violência contra a mulher dentro de suas relações íntimas.
Pacheco, Damasceno, Souza e Brito (2010) realizaram uma pesquisa em que foram
incluídas quatro mulheres que tentaram suicídio por queimaduras e foram assistidas pelo
Instituto José Frota, um hospital público municipal de grande porte da cidade de Fortaleza,
Ceará. As participantes foram entrevistadas junto ao leito e a entrevista teve duração de 30
a 40 minutos. As autoras afirmam que o trabalho é “uma contribuição de alerta a sociedade
quanto aos fatores de risco ligados às tentativas de suicídio em mulheres” (p. 153).
Destacamos alguns fragmentos dos dados expostos por Pacheco e colegas (2010).
Diamante Mandarim, 34 anos, informou que vivia bem, que brigava com o esposo às vezes,
mas que não era nada demais. No entanto, após ter uma discussão com marido na qual ele
ameaçou sair casa, ela jogou álcool sobre o corpo e disse que iria colocar fogo em si. Ele
pegou a caixa de fósforo da mão da esposa e disse que não o faria. Para acalmar-se, ela
acendeu um cigarro provocando a queimadura. Outra participante daquele estudo, uma
jovem de 25 anos, Beija-flor, relata que a segunda tentativa de suicídio aconteceu após
brigas conjugais. Ela contou que presenciou inúmeros conflitos dos pais e no momento da
tentativa estava desconfiada que o marido a estava traindo e apesar das negações por parte
dele, ela os pegou em flagrante (Pacheco et al., 2015). Estes são breves recortes do trabalho
desenvolvido pelas pesquisadoras.
Diante do exposto, é importante considerar que a existência de violências conjugais,
ausência de afeto, uso abusivo de ácool e outras drogas pelos dos companheiros e
principalmente a vivência de violência psicológica, sexual e física dentro de suas relações
33
afetivas, bem como o sentimento de incapacidade para resolver tais questões fazem com
que o suicídio se torne uma possibilidade concreta de resolução dos problemas.
Macedo, Rosa e Silva (2011) reafirmam essa questão quando apresentam e discutem
os resultados da pesquisa que desenvolveram. Em seu estudo, as mulheres que tentaram
suicídio por queimaduras relataram que a existência de problemas familiares foram as
principais razões para suas ações, em especial, relacionados a pouca compreensão dos
parceiros, bigamia, falta de interesse familiar, carência afetiva, matrimonio precoce e
diferenças de idade.
O trabalho realizado por Macedo, Rosa e Silva (2011) incluiu um total de 15
mulheres que ao recorrer aos cuidados médicos em uma Unidade de Queimados do
Hospital Regional da Asa Norte localizado no Distrito Federal, Brasil, declararam a
intenção de suicidar. Seus resultados apontaram que a maioria das participantes tinham
como motivação para a tentativa de suicídio seus conflitos nos relacionamentos amorosos.
Outra pesquisa que também abordou a temática e trouxe contribuições foi realizada
por Correia e suas colaboradoras (2014). Elas tiveram como objetivo apreender a estrutura
das representações sociais sobre o suicídio para mulheres com história de violência
doméstica e tentativa do mesmo. Foram incluídas 30 mulheres atendidas pelo Núcleo de
Estudo e Prevenção ao Suicídio (NEPS) no Município de Salvador, Bahia, Brasil. Estas
mulheres foram ouvidas através de uma entrevista e foram submetidas à realização de um
Teste de Associação Livre de Palavras (TALP).
Correia e colaboradores (2014) trouxeram uma fala significativa que exemplifica o
que é abordado nesta seção: “é muito difícil a gente falar, denunciar [...] Eles parecem
artistas monstros e depois bonzinhos. Ele me perseguia [...] eu não tinha a quem recorrer
(S3)” (p. 124). O sentimento de desamparo e impotência por não conseguirem romper o
ciclo de agressões sofridas fez com que a mulher em questão tentasse suicídio como uma
maneira de se libertar do aprisionamento emocional. Assim como a participante do estudo
de Correia e colaboradoras (2014) inúmeras mulheres com histórico de violências conjugais
recorrem à antecipação do fim de suas vidas, não significando que o desejo fosse realmente
pela morte, mas sim, por sua libertação. O relato de uma das mulheres participantes da
pesquisa demonstra que além de não conseguir romper com a experiência ruim, ainda gerou
danos psicológicos à mesma: “eu permiti que isso acontecesse porque não conseguia sair
daquilo [...]. A covardia foi tomando conta de mim e tudo que ele dizia eu absorvia [...], fui
34
guardando cada gesto, cada palavra, fui morrendo aos poucos (S7)” (p. 124). De acordo
com Correia e colaboradoras (2014)

A violência conjugal, que se manifesta no cotidiano de algumas mulheres de forma repetida,


cruel e naturalizada, é responsável pelo medo, pela vergonha, pelo isolamento e pelo
consequente distanciamento da mulher das redes de apoio, dificultando a visibilidade dos
agravos à saúde da mesma. (Correia et al., 2014, p. 124)

As violências no relacionamento conjugal tendem a desencadear problemas


emocionais, como por exemplo, a depressão, e com ela o desejo por findar a própria vida
(Correia et al., 2014; Pacheco et al., 2010). Em outro fragmento da participante S3, do
estudo de Correia e colegas (2014), lemos que a depressão veio após o convívio danoso
com seu esposo. “a depressão veio com meu marido [...]. Quando me senti lesada por ele de
forma cruel [...], sofri violência [...] (S3)” (Correia et al., 2014, p. 122).
Cerca de 1,3 milhão de mulheres sofrem violência doméstica, por ano, no Brasil,
segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Cerqueira, Moura e
Pasinato (2019), divulgaram em seu estudo, a partir do Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada – IPEA, que meninas que crescem em ambientes violentos podem ficar mais
suscetíveis a se tornarem vítimas de violência de gênero (IPEA, 2019). Considerando tais
informações, no próximo tópico abordaremos questões vinculadas às violências
vivenciadas, além da sobrecarga familiar por desempenharem os papéis estabelecidos pela
cultura do patriarcado como se fossem exclusivos para as mulheres.

2.3.2 Violência psicológica e física na relação familiar primária

Minayo e Cavalcante (2013) apresentaram um estudo realizado com familiares de


onze idosas que faleceram por suicídio. O estudo levou em consideração os relatos dos
familiares sobre a vida das idosas, bem como seu lugar na família e peculiaridades da
condição feminina. Das onze mulheres, nove eram viúvas, uma solteira e uma separada.
Seis idosas tinham ensino fundamental incompleto, duas tinham o fundamental completo,
duas delas concluíram o superior e uma era analfabeta. Quanto às profissões quatro
mulheres afirmaram que trabalham no lar, cinco são agricultoras e do lar, uma é dentista e
uma funcionária pública.
35
A família de Dona Sépala, 67 anos, viúva e trabalhadora do lar, conta que ela sofreu
maus tratos pelos pais e foi vítima de trabalho escravo na infância, o que deixou marcas
emocionais severas. A filha relatou que a mãe sempre foi deprimida, assim como dois de
seus irmãos. As autoras afirmam que “internalizada, a violência mina forças psíquicas
como pulsão, e sem mediação interfere nas relações interpessoais e sociais e realimenta
traumas. As marcas dessas vivências podem suscitar ideias e consumação de suicídios”
(Minayo & Cavalcante, 2013, p. 2409).
Além de Dona Sépala, outro relato que ilustra a vivência e impactos da violência na
vida foi de Dona Exótica, 65 anos, viúva e agricultora e trabalhadora do lar. Desta vez, a
experiência foi de maus tratos pelo pai violento e alcoolista. Ela reproduziu as experiências
com os sete filhos e era conhecida entre familiares e vizinhança como uma mulher
agressiva e muito violenta (Minayo & Cavalcante, 2013).
Já Canário, participante da pesquisa realizada por Pacheco e colaboradoras (2010),
queixava-se da falta de amor no ciclo familiar. Relatou agressões familiares, em especial de
discussões com o avô, sendo que após uma destas discussões ateou fogo sobre o próprio
corpo.
O estudo desenvolvido por Pinto, Alves e Maia (2015) contou com uma amostra de
225 mulheres que vivem no norte de Portugal. Destas 122 mulheres estavam empregadas e
94 não possuíam emprego. Quanto ao estado civil, 137 eram casadas ou em relação estável,
55 solteiras, 23 divorciadas e sete viúvas. Em relação ao nível de escolaridade, vale
ressaltar que 42 tinham formação universitária, 30 concluíram o ensino secundário e das
225 mulheres, apenas duas nunca foram à escola. O objetivo principal era caracterizar a
prevalência das experiências adversas autorrelatadas em mulheres adultas portuguesas e
avaliar se essas experiências estão relacionadas a sintomas depressivos e tentativas de
suicídio. A partir dos resultados encontrados elas afirmaram que “a exposição às
experiências adversas durante a infância está associada, e é preditora, do índice de sintomas
depressivos e tentativas de suicídio durante a idade adulta em mulheres portuguesas” (p.
623).
As autoras apontaram que 95,9% das mulheres estudadas vivenciaram pelo menos
uma experiência adversa na infância. Destas, 17,1% passaram por cinco ou mais
experiências de adversidade. Os tipos de situações mais relatadas foram a violência
doméstica, 79,8% das mulheres e o abuso físico, 46,2%.
36
As quatro pesquisas destacadas que associam violência familiar e tentativas de
suicídio apontam que existe uma relação significativa entre violência e tentativa de
suicídio. Além disso, aqui será considerada a sobrecarga vivenciada por mulheres como
uma violência e reforçar que tal experiência também é um fator preditor para a tentativa de
suicídio.
Mesmo com todas as mudanças históricas em relação às posições das mulheres
ainda é comum que desempenhem papéis de gênero tradicionais, sendo as principais
responsáveis pela criação e cuidado da prole, bem como, a manutenção do casamento e
cuidado com a casa (Meneghel et al., 2015; Rabasquinho & Pereira, 2007). A naturalização
do casamento e maternidade em relação às mulheres são aspectos criticados pelo
movimento feminista por terem estreita relação com as lógicas patriarcais, “mas tal
afirmação revela uma posição de prescrição de formas de emancipação que foi e segue
sendo alvo de tensões e problematizações dentro do feminismo” (Mayorga, 2014, p. 227).
O movimento feminista busca problematizar as bases de opressão com a finalidade
de construir relações menos desiguais. Uma de suas problemáticas é o patriarcado por ser
fixado o princípio da opressão de gênero e consequentemente, a violência contra mulheres
(Narvaz & Koller, 2006). Meneghel e colaboradoras (2015, p. 1724) declaram que

na sociedade patriarcal existe desigualdade na distribuição de poder entre os gêneros e


atribuição ou naturalização de papéis específicos a homens e mulheres. As hierarquias de
poder geram desigualdade e expõem as mulheres a situações de violência ao longo da vida.
Esse processo ocorre desde a socialização das meninas e a educação diferenciada de gênero,
seguindo na vida adulta com a divisão sexual do trabalho e a ausência de remuneração para
as atividades domésticas (Meneghel et al., 2015, p. 1724).

Diante deste cenário, vale considerar que muitas mulheres desempenham jornada
dupla porque trabalham fora de casa e ainda são as principais responsáveis pelo cuidado da
casa, dos filhos e manutenção do matrimônio. Meneghel e colaboradores (2013) realizaram
um estudo com a finalidade de identificar as características de gênero presentes nas
histórias de vida de mulheres que se suicidaram. Foram selecionadas sete mulheres que
consideraram que foram marcadas pela desigualdade de gênero, sendo que quatro são de
Candelária, duas são de Porto Alegre e uma de São Lourenço, cidades brasileiras, do Rio
Grande do Sul. A pesquisa foi realizada através de autópsia psicossocial feita com
participação de familiares de mulheres que cometeram suicídio. Os autores apontam que
37
nas narrativas que ouviram, havia “o relato de uma sobrecarga que vai aumentando e parece
que elas morreram quando não tinham mais forças, quando „não aguentavam mais‟.”
(Meneghel et al., 2013, p.211). Ainda acrescentam uma condição que avaliaram

como sobrecarga presente na vida de algumas das mulheres que se suicidaram foi o
desempenho do papel de cuidadora na família. Além do trabalho adicional e estafante que a
atividade de cuidado representa, as mulheres são silenciadas, impedidas de expor
sentimentos, de reclamar, como se o papel que lhe foi concedido tivesse que ser
obrigatoriamente cumprido (Meneghel et al., 2013, p. 210).

Em Minayo e Cavalcante (2013) nove das onze mulheres que participaram da


amostra do estudo vivenciaram papéis de gênero impostos pela cultura do patriarcado até se
sentirem esgotadas ou que já haviam cumprido o seu papel. A frase “agora que meu caçula
se casou posso morrer feliz!” (p. 2411) ilustra o sentimento de dever cumprido por seu
árduo desempenho da função de mulher na relação familiar.

2.3.3 O luto, as perdas e as comorbidades

Conviver com a perda de entes queridos, cônjuges, pais ou filhos pode gerar
sofrimento psicológico e sentimento de solidão em mulheres em diferentes fases da vida.
Estudos apontam que o luto pode se tornar um período de muito desespero em que a
escolha por findar a dor inclua acabar também com a própria vida (Minayo & Cavalcante,
2013; Pacheco et al., 2010).
Tanto as participantes do estudo de Pacheco e colaboradoras (2010), quanto de
Minayo e Cavalcante (2013) relataram que a dificuldade em lidar com a dor do luto que
despertou o desejo de retirar a própria vida. Canária havia perdido o pai há mais de um mês
e estava sentindo sua falta e não queria mais existir, desejando constantemente se jogar
debaixo dos carros, não se importando nem com o fato de estar grávida (Pacheco et al.,
2010). Já Dona Camélia e Dona Margarida tiveram perdas significativas, a primeira perdeu
a filha por um câncer no fígado e pulmão, enquanto a segunda perdeu o noivo em um
traumático acidente e ainda cuidou dos pais até a morte. Mais tarde, ambas ainda
vivenciaram diagnósticos difíceis, Dona Camélia estava com um tumor no cérebro o que
contribuiu para a decisão de suicidar, e Dona Margarida tinha doença de Alzheimer, que
após algumas tentativas conseguiu consumar o ato (Minayo & Cavalcante, 2013).
38

As doenças e a incapacidade para atividades diárias produzem sentimento de inutilidade e


estão presentes na vida de uma parcela de mulheres suicidas. A doença, neste caso, não é
concebida a partir de sua gênese biológica, mas leva em consideração o fato social de estar
doente e o que isso pode acarretar. (Meneghel et al., 2013, p.213).

O estudo realizado por Santos, Lovisi, Legay e Abelha (2009) incluiu 96 pessoas
que tentaram suicídio e foram atendidos no Hospital Municipal Souza Aguiar no Rio de
Janeiro. O atendimento era realizado através do Sistema Único de Saúde (SUS) e o nível
social dos pacientes, em sua maior parte, é muito baixo. A pesquisa teve como objetivo
estimar a prevalência dos transtornos mentais nos casos de tentativas de suicídio atendidos
em um hospital de emergência público no Rio de Janeiro, Brasil, no período de abril de
2006 a março de 2007. Os resultados apontaram que comorbidades psiquiátricas são
presentes em 71,9% dos casos, sendo que os transtornos mais frequentes são o episódio
depressivo maior, uso abusivo de substâncias psicoativas, transtorno de estresse pós-
traumático e abuso de álcool.
Os autores alertam para a necessidade de terem mais atenção às mulheres no início
do curso dos transtornos mentais (Santos et al., 2009). Pacheco e colaboradoras (2010)
reforçam os dados ao apresentarem que a maioria dos pacientes que tentaram suicídio, fatal
ou não, possui comorbidades psiquiátricas. Os principais transtornos foram depressão,
transtorno afetivo bipolar e abuso de álcool.
A pesquisa realizada por Tavares e colaboradores (2012), com uma amostra de 919
mulheres pós-parto, teve como objetivo verificar a prevalência de risco de suicídio e
comorbidades em puérperas apontou que distúrbios psiquiátricos estão fortemente
associados ao risco de suicídio. No entanto, os principais transtornos que apareceram foram
de humor e ansiedade.
Para finalizar, Minayo e Cavalcante (2013) apontam que mulheres tendem a
encontrar no suicídio a solução para “evitar o confronto com perdas funcionais, de
autonomia ou para fugir de dores” (p. 2410).

2.4 Considerações Finais

O material bibliográfico analisado neste estudo mostra que as mulheres tendem a


recorrer ao suicídio como modo de resolução de seus problemas, principalmente quando se
39
sentem incapazes de resolvê-las, ou seja, quando acreditam que não tem outra solução. Os
principais fatores de risco são os conflitos conjugais, violências, especialmente a
psicológica e física, traumas familiares, lutos, perdas tanto funcionais quanto de autonomia
e comorbidades.
A pesquisa constatou que ainda existem poucas publicações que abordam o suicídio
de mulheres, em especial, o suicídio de mulheres jovens no Brasil. A maioria dos trabalhos
encontrados pertencia a outras áreas de conhecimento como farmácia, enfermagem e
medicina o que indica a necessidade de estudos mais abrangentes sobre a temática em
questão no campo da psicologia, que também possui relevante potencial de contribuição ao
tema. Este trabalho não teve intenção de esgotar as possibilidades de diálogo, pelo
contrário, a intenção foi despertar para a importância de reflexões sobre as tentativas de
suicídio realizadas por mulheres. O Ministério da Saúde também aponta a relevância de
novos estudos e da criação de espaços de diálogo e escuta sobre tais questões. Novos
estudos se fazem necessários, inclusive, para maior compreensão e criação de ações sociais
de cunho preventivo.

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42
3 A RELAÇÃO ENTRE VIOLÊNCIA CONTRA MULHERES E TENTATIVA DE
SUICÍDIO

Resumo

Neste artigo realizamos um ensaio teórico que articulou categorias conceituais relevantes
para conhecimento sobre as atuais discussões acerca da violência contra mulheres e as
tentativas de suicídio no Brasil, bem como os impactos de tais experiências na decisão de
findar a própria vida. Mulheres em situação de de violência doméstica tendem a carregar
marcas subjetivas mais graves que as possíveis lesões físicas. Em 2018, o Brasil divulgou
que os registros por lesão corporal aumentaram significativamente. Concomitante, os dados
referentes às tentativas de suicídios entre mulheres também aumentou, chegando a ser de 5
a 20 vezes maiores que os de suicídio fatal. A partir desta realidade, foi realizado um estudo
a fim de aprofundar o conhecimento acerta da violência contra mulheres e foi possível
perceber que jovens com idade entre 18 e 29 anos recorrem mais ao atendimento decorrente
de violência doméstica e familiar. Quanto à tentativa de suicídio no Brasil os dados
apontam que o comportamento suicida não fatal é predominante nas mulheres. Por fim,
uma reflexão sobre os impactos das violências nas tentativas de suicídio que demonstrou
que a vivência de violência surge como um dos motivos para a decisão de pôr um fim a
própria vida.

Palavras-chave: Mulheres; violência contra mulheres; suicídio; tentativa de suicídio;


suicídio feminino.

Abstract

In this article, we conducted a theoretical essay that articulated relevant conceptual


categories for knowledge about current discussions about violence against women and
suicide attempts in Brazil, as well as the impacts of such experiences on the decision to end
one‟s life. Women who are victims of domestic violence tend to carry more severe
subjective marks than possible physical injuries. In 2018, Brazil reported that registrations
for bodily injury increased significantly, Concomitantly, the data regarding suicide attempts
among women has also increased, reaching 5 to 20 times greater than those of fatal suicide.
Based on this reality, a study was carried out in order to deepen the correct knowledge of
violence against women and it was possible to notice that Young people aged between 18
and 29 years old resort more to the care resulting from domestic and Family violence
against women. As for the suicide attempt in Brazil, the data indicate that non-fatal suicidal
behavior is predominant in women. Finally, a reflection on the impacts of violence on
suicide attempts that demonstrated that the experience of violence appears as one of the
reasons for the decision to end one‟s own life.

Keywords: Women; violence against women; suicide; suicide attempt; female suicide.
43

3.1 Introdução

De acordo com Costa (2002, p.71), “„mulher‟ é uma categoria histórica e


heterogeneamente construída dentro de uma ampla gama de práticas e discursos, e sobre os
quais o movimento de mulheres se fundamenta”. Simone Beauvoir (1949), na produção de
seu texto O segundo sexo, considera que a experiência de ser mulher não é marcada pelo
biológico em seu nascimento, ou seja, a anatomia não pode definir o seu destino, mas que
tal experiência diz de um processo de construção.
Nesse processo, as mulheres têm um histórico de opressão e direitos negados. No
entanto, hoje contam com um amparo legal e com uma nova perspectiva social, em que é
possível estar inserida na vida social e consequentemente gozar da universalidade dos
Direitos Humanos que as contempla (Silva, 2018).
O movimento feminista, além de lutar para que estes direitos sejam garantidos,
problematiza a cultura do patriarcado que contribui para a existência da desigualdade entre
os gêneros. Tal cultura faz com que mulheres continuem vivenciando agressões em
diversas esferas da vida.
A mulher vítima de violência doméstica “carrega consigo marcas subjetivas que
muitas vezes extrapolam o sentido que as lesões físicas podem ter deixado. Desse modo,
podemos inferir que as mulheres que sofrem agressões corporais carregam uma carga de
sofrimento que atinge a sua subjetividade” (Guimarães et al., 2018, p. 1989).
Além da agressão física, elas podem experienciar a violência psicológica, sexual,
moral e patrimonial. Violência psicológica diz respeito a toda forma de vigilância
constante, manipulação e ameaças. A violência sexual é toda ação que force a mulher a
manter, presenciar ou participar de relação sexual indesejada. Já a violência moral consiste
em calunias, injurias e difamação. Por fim, a violência patrimonial ocorre quando há
controle do dinheiro ou privação de bens e recursos econômicos (Instituto Maria da Penha,
2018).
Todas as formas de violência geram prejuízo à saúde das mulheres, tornando tal
contexto um problema de saúde pública. Os principais agressores, normalmente, são
pessoas com as quais é mantida ou já tiveram relações afetivas próximas e que carregam
44
consigo o sentimento de posse em relação a mesma (Souza, Pascoaleto & Mendonça,
2018).
No Brasil, no ano de 2018, os registros por lesão corporal feitos por mulheres
chegaram a 263.067, o que representa uma ocorrência a cada dois minutos. No período de
março e abril de 2020, no início do contexto pandêmico, os registros de feminicídio
cresceram em 22% de casos (Bond, 2020). Ainda em 2018, o Ministério da Saúde do país
divulgou um aumento nos registros de tentativas de suicídio de mulheres com idade entre
15 a 29 anos.
Bertolote (2012) define que a tentativa de suicídio “é um ato autoagressivo
deliberado (por exemplo: cortar-se ou ingerir medicamentos ou outras substâncias tóxicas)
com a intenção de pôr fim à vida, cujo desfecho, porém, não é fatal” (p. 24). Uma tentativa
de suicídio torna-se o principal fator de risco para um suicídio consumado no futuro.
O número de tentativas de suicídio chega a ser de 5 a 20 vezes maior que os de
suicídio fatal. As mulheres tendem a recorrer ao envenenamento como método para retirar a
própria a vida, e geralmente, pode ser motivada pela presença de uma crise interpessoal ou
social (Macente, Santos & Zandonade, 2009). Botega (2015) declara que

As tentativas de suicídio acabam tendo um impacto social e econômico significativo,


representado pela utilização dos serviços de saúde e pelo efeito psicológico e social do
comportamento sobre o indivíduo e seus familiares, além do ônus decorrente da
incapacitação de longa duração que pode ser ocasionada pelo ato suicida (Botega, 2015, p.
52).

Diante disso, neste artigo realizamos um ensaio teórico que articulou categorias
conceituais relevantes para conhecimento sobre as atuais discussões acerca da violência
contra mulheres e as tentativas de suicídio no Brasil, bem como os impactos de tais
experiências na decisão de findar a própria vida.

3.2 Violência contra mulheres

A violência doméstica e familiar contra mulheres é toda ação ou omissão que lhe
cause algum sofrimento físico, sexual, psicológico e dano moral ou patrimonial (Lei
11.340/06, Brasil, 2006a). Pensar em violência contra mulher faz lembrar do percurso e
lutas do movimento feminista no Brasil.
45
A primeira onda do feminismo no país tinha como cerne a luta pelo voto e uma
personagem importante, na década de 1910, foi Bertha Lutz, bióloga e cientista. Ela foi
uma das fundadoras da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, “organização que
fez campanha pública pelo voto, tendo inclusive levado, em 1927, um abaixo-assinado ao
Senado, pedindo a aprovação do Projeto de Lei, de autoria do Senador Juvenal Larmartine,
que dava o direito de voto às mulheres” (Pinto, 2010, p. 16). Esse movimento perdeu forças
na década de 1930, retornando apenas na década de 1960.
O movimento feminista retoma suas lutas nos anos de 1960 e 1970, contribuições de
mulheres brancas e da classe média. Nos anos seguintes, 1980 e 1990, outros grupos de
mulheres que não se sentiam contempladas pelo movimento, criaram novas formas de
vivenciar o feminismo a partir de suas próprias experiências de opressão, discriminação e
violência, demonstrando que existem muitas faces de opressão feminina. A partir de então,
foi considerado a questão de raça e classe social nos discursos dos movimentos (Mayorga,
2014; Santos et al., 2016).
Vale frisar que, além do movimento feminista, existe um movimento de mulheres e
segundo Cisne (2014), o que está no cerne deste movimento é a busca por melhorias das
condições de vida e de trabalhos femininos. Já o movimento feminista lutava contra um
sistema opressor e por liberdade, levantando questões sobre sexualidade, violências,
ocupação de espaços políticos e por ter direitos civis garantidos. Ela ressalta também que
no Brasil, até por uma confusão na delimitação de cada movimento, aconteceu um encontro
pela aproximação das intenções, ou seja, pela identificação de suas pautas. Afinal, ambas
lutam pelas mulheres. No entanto, alguns movimentos de mulheres não compreendem bem
o movimento feminista e podem distorcer sua bandeira.
Mudanças significativas aconteceram em relação à posição da mulher na sociedade,
tais como, a partir de 1988 conquistaram igualdade de direitos na Constituição; em 1998
contavam com maior número de eleitorado; ultrapassaram os homens em todos os níveis
educacionais; e tiveram diversas vitórias específicas na legislação nacional, como a Lei Nº
11.340 - Lei Maria da Penha (Alves et al., 2019). Pinto (2010) afirma ainda que

Uma das mais significativas vitórias do feminismo brasileiro foi a criação do Conselho
Nacional da Condição da Mulher (CNDM), em 1984, que, tendo sua secretária com status
de ministro, promoveu junto com importantes grupos – como o Centro Feminista de
Estudos e Assessoria (CFEMEA), de Brasília – uma campanha nacional para a inclusão dos
46
direitos das mulheres na nova carta constitucional. Do esforço resultou que a Constituição
de 1988 é uma das que mais garante direitos para a mulher no mundo. O CNDM perdeu
completamente a importância com os governos de Fernando Collor de Mello e Fernando
Henrique Cardoso. No primeiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva, foi criada a
Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, com status de ministério, e foi recriado o
Conselho, com características mais próximas do que ele havia sido originalmente. (Pinto,
2010, p. 17)/.

No entanto, as mulheres ainda são as responsáveis por desempenhar papéis de


gênero tradicionais. Além de suas atividades profissionais, fora de casa, ainda são as
responsabilizadas pelos cuidados domésticos, o que tende a gerar um cansaço físico e
emocional (Meneghel et al, 2015; Rabasquinho & Pereira, 2007).
A principal problemática do feminismo envolve o sistema patriarcal, através dele
existe uma opressão de gênero o que acarreta violência contra mulheres (Narvaz & Koller,
2006). Meneghel e colaboradoras (2015) denunciam a desigualdade de poder entre os
gêneros e a naturalização de papéis específicos para ambos. Elas acreditam que reforçar o
patriarcado faz com que mulheres continuem vítimas de opressão e violências ao longo da
vida.
Souza, Pascoaleto e Mendonça (2018) destacaram na pesquisa realizada que 23,4%
dos sujeitos já insistiram para que a namorada tivesse relações sexuais mesmo contra a
própria vontade e 17% assumiram que pediram para ter atos sexuais indesejados por elas. A
agressão sexual perpetrada por homens ilustra os construtos sociais do sistema patriarcado
que estipula que o homem ocupa um papel ativo em relação a sua sexualidade enquanto as
mulheres têm postura passiva e vinculada restritamente a reprodução. Ainda fazem uma
crítica quanto aos

padrões de comportamento feminino e masculino transmitidos nos lares brasileiros [uma


vez que] perpetuam, por exemplo, a ideia do homem como sujeito viril e agressivo e da
mulher, como sexualmente recatada à procura de um parceiro para o casamento. Dessa
maneira, entende-se que a violência sexual é socialmente invisibilizada e a desigualdade de
gênero é o meio de conservá-la. (Souza, Pascoaleto & Mendonça, 2018, p. 39)

No que tange à violência psicológica, vale considerar que ela afeta diretamente a
saúde psíquica da mulher por gerar um sofrimento intenso, comprometer sua autoestima e
distorcer sua autoimagem. Pode também levá-las a construir crenças de desvalorização e
47
sentimento de insuficiência em tudo que fizer. Guimarães et al. (2018) reforça tal questão
quando diz que

A violência de ordem psicológica é considerada a mais avassaladora quando nos referimos a


perca da autoestima, esses danos são causados de diferentes formas como a privação da
liberdade de realizar atividades cotidianas como trabalho, estudo e contato com a família e
amigos, humilhações, ameaças de agressões e xingamentos que denigram a imagem da
mulher (Guimarães et al., 2018, p. 1995).

A pesquisa realizada por Souza, Pascoaleto e Mendonça (2018) com jovens


universitários sobre a violência contra mulher, contou com uma amostra de 47 rapazes.
Houve uma prevalência por agressões psicológicas visto que 46,8% dos participantes já
haviam controlado, manipulado ou ameaçado agredir fisicamente as parceiras. Também
apontaram que “a maior anuência se deu sobre aquelas afirmações cujo ato violento era a
ameaça de agressão física, conduta associada a uma violência corporal. Este dado
demonstra a visibilidade dos comportamentos que culminam em danos facilmente
identificáveis” (p. 39). Já ações como xingar, perseguir e manipular eram menos
reconhecidas. As autoras apresentam um ciclo de violência

A princípio, ofensas psicológicas e emocionais vão sendo cometidas através de insultos,


humilhações e/ou intimidações, gerando conflitos e caracterizando o período de tensão. Em
seguida, os incidentes de depreciação e inferiorização da mulher se intensificam, incluindo
ameaças e resultando no episódio agudo do fenômeno cuja violência física se faz presente.
Em momento posterior, o homem tende a se mostrar arrependido e a ficar mais amoroso na
relação; por meio de promessas, propõe mudanças em seus comportamentos, fase
denominada lua-de-mel. O ciclo ocorre de modos diferentes em cada relacionamento, visto
que existem inúmeras formas de violentar e agredir que podem ser incorporadas em cada
fase de maneira sutil, tendendo a maior violência, frequência e intensidade no decorrer da
relação (Souza, Pascoaleto & Mendonça, 2018, p. 33).

Estudos apontam que jovens com idade entre 18 e 29 anos recorrem mais ao
atendimento decorrente de violência doméstica e familiar contra mulher. Quanto aos
agressores, normalmente, são os companheiros ou ex-companheiros e indivíduos do sexo
masculino e o local em que a ocorrência acontece, em grande maioria, é a residência da
vítima (Garcia, Duarte, Freitas & Silva, 2016; Guimarães et al., 2018; Guimarães &
Pedroza, 2015).
Guimarães e Pedroza (2015) alertam ainda que “altos níveis de feminicídio, com
frequência, são acompanhados por uma grande tolerância quanto à violência contra as
48
mulheres” (p. 257). A cultura construída sob a desigualdade entre gêneros favorece para
que exista uma naturalização da violência sofrida. Com isso, muitas mulheres não recorrem
a meios para findar o ciclo de agressões ou nem acreditam que são capazes de fazê-lo
(Guimarães et al., 2018). Neste ponto, o suicídio aparece como uma opção para libertação.

3.3 Tentativa de suicídio no Brasil

A tentativa de suicídio é resultado de um processo que se inicia com uma ideação


suicida e que se alimentada interiormente e se for persiste poderá evoluir para a formulação
de um plano para esse fim e provavelmente resultará em um ato suicida, que neste caso,
teria um desfecho não fatal (Bertolote, 2012).
Ficher e Vansan (2008) a partir de um estudo de casos apontaram sobre motivos que
desencadearam a tentativa de suicídio de jovens de até 24 anos atendidos em um grande
hospital geral de Ribeirão Preto, São Paulo. Eles perceberam que os jovens sentiam-se
“desvalorizados, rejeitados e desprezados pelas pessoas dos seus núcleos sócio-familiares, e
apresentavam intensos e constantes problemas de relacionamento com suas famílias de
origem e/ou com seus respectivos parceiros” (p.372). A possibilidade real ou imaginação
de separações de pessoas importantes aparecem como motivadores para a tentativa de
suicídio.
Ficher e Vansan (2008) afirmam que o comportamento suicida não fatal é
predominante nas mulheres. Sendo as responsáveis por 75% dos casos atendidos no
Hospital das Clínicas da FMRP-USP. Em todas as idades, as taxas referentes à tentativa das
mulheres, são superiores. No entanto, o estudo mostrou “de maneira consistente que a
tentativa de suicídio é mais comum em jovens” (p. 369), especialmente, mulheres.
Macente, Santos e Zandonade (2009) corroboram com estas informações ao
declararem que “ao se comparar tentativa e suicídio segundo sexo, verificou-se
significância, para o fato de as mulheres terem cometido mais tentativas de suicídio que os
homens” (p. 240). Além disso, no mesmo estudo foi possível observar que a idade média
para os casos de tentativa de suicídio não fatal estava entre 25 e 35 anos.
Os transtornos mentais que podem ser presentes entre os pacientes com
comportamento suicida são: transtorno do humor bipolar, dependência química e depressão.
A esquizofrenia e transtornos de personalidade também são considerados fatores de risco
49
(Botega, 2014; Toro et al., 2013). Vale considerar que tais doenças são consideradas
comorbidades e não preditores do comportamento suicida.
Quanto aos principais métodos utilizados para o evento, a ingestão de medicamentos
e de outras substâncias químicas são mais comumente observadas entre as mulheres. Já os
homens, costumam recorrer a meios como o enforcamento e uso de armas de fogo (Ficher
& Vansan, 2008; Macente, Santos e Zandonade, 2009).
A partir do trabalho desenvolvido por Toro et al. (2013) foi possível constatar que
mesmo quando o desfecho do evento não é fatal, observou-se

que a tentativa de suicídio deixa marcas profundas na subjetividade. Foram encontrados


seres humanos fragilizados, em que o sofrimento existencial e as angústias emergiram,
sendo que eles se viam mergulhados em sentimentos ambivalentes: revolta, arrependimento,
alívio, culpa, entre outros (Toro et al., 2013, p. 414).

3.4 Impactos das violências nas tentativas de suicídio

Correia e colaboradores (2014), ao pesquisarem sobre tentativa de suicídio de


mulheres apontam “a vivência de violência como um dos motivos precipitantes deste ato
extremo, ressaltando que as perdas interpessoais, as dificuldades de relacionamento e as
histórias de violência física, verbal e sexual constituem principais causas para essas
tentativas” (p.119).
As mulheres pesquisadas por eles relataram a dificuldade de falar sobre as
violências vividas e da sensação de incapacidade para resolver. Algumas se sentiam
culpadas pela vivência uma vez que não conseguiam evitar e muito menos encerrar a
relação. Ao relatarem sobre a tentativa de suicídio, esclareciam que o desejo era por
finalizar a relação e não concretamente colocar fim a vida.
Com isso, é possível notar que a agressão não acontecia de forma isolada, mas
repetidas vezes de modo que a mulher ficasse fragilidade e com a saúde mental afetada.
Quando uma pessoa é submetida a qualquer tipo de abuso existente, especialmente se
ocorrer na fase da infância ou adolescência isso pode comprometer “seriamente o
desenvolvimento emocional e cognitivo” (Correia et al., 2019, p. 1526), além de apresentar
associação com o comportamento suicida e alguns transtornos mentais.
50
Souza, Pascoaleto e Mendonça (2018) afirmam que de 2 a 12% dos jovens mantêm
relacionamentos marcados por violência e que isso afeta diretamente nas altas taxas de
ideação e tentativas de suicídios entre o público. Outras taxas que estão aumentando
correspondem as gravidezes indesejadas e doenças sexualmente transmissíveis.
Estudos apontam que há relação entre a vivência de violência doméstica e a decisão
em retirar a própria vida (Correia et al., 2014; Minayo & Cavalcante, 2013; Souza,
Pascoaleto & Mendonça, 2018). Enfim, vale frisar que estamos tratando aqui sobre um
lugar de vulnerabilidade e violência que perpassam as construções sociais enraizadas no
sistema patriarcal, além disso, ainda é comum que as mulheres sintam vergonha e muitas
vezes naturalizam as experiências vividas.

3.5 Considerações finais

As informações apresentadas não têm intenção de esgotar todas as fontes de saber e


nem pretende fechar as possibilidades de reflexão sobre os temas. Também vale reforçar
que o suicídio possui várias facetas, o presente trabalho debruçou-se sobre uma apenas, a
vivência de violências contra mulheres, mas não descarta os demais pontos de influência
para que uma pessoa tome a decisão de retirar a própria vida.
Para maior compreensão do fenômeno a partir da vivência feminina, faz-se
necessária novas pesquisas e com possibilidade de uma atenção à narração e história destas
mulheres, em especial, as jovens uma vez que o Ministério da Saúde do Brasil vêm
apontando para uma crescente nos registros de novos casos.

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53
4 MULHERES JOVENS E TENTATIVA DE SUICÍDIO

Resumo
Realizamos uma pesquisa narrativa a fim de compreender de forma mais ampla o mundo
experienciado de mulheres jovens que tentaram suicídio. As entrevistas aconteceram no
período de outubro de 2019 e março de 2020. Foram entrevistadas doze mulheres que
atentaram contra suas vidas pelo menos uma vez e estiveram internadas no Hospital
Espírita André Luiz, localizado em Belo Horizonte, Minas Gerais. A idade das
participantes variou de 20 a 29 anos. uma oportunidade de narrar suas próprias
experiências. A análise das entrevistas foram embasadas na proposta da análise
dialógica/performática. Os resultados são apresentados a partir de seis subtópicos, sendo
que os dois primeiros contemplam os relatos da tentativa de suicídio que deram mais
destaque e os selves preferenciais das mulheres. Nos demais subtópicos são apresentadas
subtramas sobre as seguintes temáticas que emergiram nas narrativas: abuso sexual,
comorbidades, violência nas relações afetivas e violências vivenciadas nas relações
familiares. As narrativas apontaram que existe uma relação significativa entre mulheres em
situação de violência e a tentativa de suicídio. No entanto, a pesquisa não esgotou as
possibilidades de compreensão do fenômeno, em especial, porque estamos diante de uma
problemática que é multifacetada.
Palavras-chave: Narrativas; narrativas de mulheres; tentativa de suicídio; violência contra
mulheres.

Abstract
We conducted a narrative research in order to understand more fully the experienced world
of Young women who attempted suicide. The interviews took place in the period of
October 2019 and March 2020. Twelve women were interviewed who attempted their lives
at least once and were admitted to the André Luiz Spiritist Hospital, located in Belo
Horizonte, Minas Gerais. The age of the participants ranged from 20 to 29 years. An
opportunity to narrate your own experiences. The analysis of the interviews was based on
opportunity to narrate your own experiences. The analysis. The results are presented from
six subtopics, with the first two contemplating the reports of the suicide attempt that gave
more prominence and the preferred selves of women. In the other subtopics, subplots are
presented on the following themes that emerged in the narratives: sexual abuse,
comorbidities, violence in affective relationships and violence experienced in Family
relationships. The narratives pointed out that there is a significant relationship between
women in situations of violence and attempted suicide. However, the research has not
exhausted the possibilities of understanding the phenomenon, especially because we are
facing a problem that is multifaceted.
Keywords: Narratives; women‟s narratives; suicide attempt; violence against women.
54

4.1 Introdução

O médico inglês, Thomas Browne foi quem definiu o termo “suicídio” no ano de
1643. Em seu livro apresenta duas formas de suicídio, uma com conotação “heróica” e a
outra de ordem “patológica”. Desde então, a temática se tornou um fenômeno de interesse
para psiquiatria (Bertolote, 2012).
Coelho (1997, p. 49) relata que somente “a partir da segunda metade do século
XVIII, as punições em relação ao suicida e seus familiares começaram a ser suavizadas;
não tanto pela compreensão em relação ao suicídio, mas devido ao fato de o indivíduo
isolado perder a importância coletiva que tinha, tanto na antiguidade quanto na idade
média”. No entanto, o suicídio passou a ser cada vez mais considerado patológico. Apenas
no final do século XIX, com as contribuições de Durkheim, o ato foi considerado um
fenômeno social (Bertolote, 2012). A consolidação do suicídio pela perspectiva da saúde
pública se deu entre o final do século XX e início do século XXI, tendo como ênfase a
prevenção de tais comportamentos. Bertolote (2012, p. 21-22) declara que para a
fenomenologia

o suicídio é um processo que se inicia com considerações mais ou menos vagas sobre a
morte e sobre morrer (ideação suicida), as quais podem adquirir consistência (persistente ou
recorrente, flutuante), evoluir para a elaboração de um plano (plano suicida) e culminar
num ato suicida, cujo desfecho pode ser fatal (suicídio) ou não (tentativa de suicídio).
(Bertolote, 2012, p. 21-22).

O comportamento suicida tem multideterminações e resulta de diversos fatores de


risco (Marín-León & Barros, 2003; Meneghel et al., 2015). Para aprofundar acerca de tais
fatores, serão utilizadas as considerações de Bertolote (2012) sobre os fatores
predisponentes e fatores precipitantes. Os fatores predisponentes, também chamados de
distais, correspondem ao biológico e alguns traços de personalidade, apresentam-se muito
antes do ato suicida. Já os fatores precipitantes, ou proximais, que seriam os
acontecimentos próximos ao fato, por exemplo, perdas significativas, situações de
humilhação e violência (Bertolote, 2012). O suicídio não pode ser considerado como tendo
uma causa única, afinal, diversos acontecimentos podem servir como pretexto (Durkheim,
2000).
55
Para Durkheim (2000) para cada cultura existe "uma forma coletiva, de energia
determinada, que leva os homens a se matar" (p. 384). Ou seja, grupos sociais distintos,
possuem distintas inclinações coletivas e que resultam em predisposições individuais para a
ideação suicida.
O suicídio representa o ápice de um sofrimento para o ser humano e diante dessa
realidade vale considerar questões como falta de sentido para existir, medos, conflitos
existenciais e até mesmo ajustamentos criativos disfuncionais (Fukumitsu & Scavacini,
2013; Fukumitsu et al., 2015). Fukumitsu e Scavacini (2013) ao falarem sobre suicídio
retomam uma frase chave da Psicologia da Gestalt em que diz que „o todo é diferente da
soma das partes‟ e diante dela, afirmam que “a pessoa que pensa no suicídio deseja eliminar
o sofrimento, parte da existência, mas confunde a necessidade de aniquilar seu sofrimento
com auto aniquilar-se, matando o todo” (p. 199).
Para Fukumitsu e colaboradores (2015), “acolher e respeitar o sofrimento alheio,
pode servir de base para que a impotência individual se transforme em ação coletiva no
sentido de promover mudanças” (Fukumitsu et al., 2015, p. 7). Também reforçam a
necessidade de ficar alertas aos sinais de mudanças repentinas e isso que pode auxiliar no
surgimento de ações preventivas.
A Lei 13.819 de 26 de abril de 2019 referente à Política Nacional de Prevenção da
Automutilação e do Suicídio discorre sobre questões como as notificações e do rigor de
sigilo das informações, porque dessa forma seria possível ter mais êxito nos dados e tanto
as ações preventivas e quanto às vinculadas ao tratamento seriam mais eficazes (Brasil,
2019b).
O Ministério da Saúde (2018a) apontou uma crescente no número de tentativas de
suicídio, em especial, no público feminino que é responsável por 70% das mesmas e a faixa
etária que mais se contempla está entre 15 e 29 anos. Considerando que as mulheres são as
que mais atentam contra a própria vida, este trabalho se direcionou para este público em
específico.
A pesquisa de Marín-León e Barros (2003) apontou que as mulheres utilizam como
meio de tentativa a ingestão de medicamentos, envenenamento, com arma de fogo e
enforcamento. Minayo e Cavalcante (2013) declaram que o suicídio é multifatorial, ou seja,
existem diversas razões para que uma pessoa queira tirar a própria vida. No entanto,
estudos envolvendo mulheres apontaram que alguns fatores que estão muito presentes são:
56
conflitos conjugais, conflitos familiares, lutos e comorbidades (Correia et al., 2014;
Macedo, Rosa & Silva, 2011; Meneghel et al., 2013; Minayo & Cavalcante, 2013; Macedo,
Rosa & Silva, 2011; Pinto, Alves & Maia, 2015; Santos, Lovisi, Legasy & Abelha, 2009;
Tavares et al., 2012). Diante dessa realidade, o objetivo desta pesquisa foi compreender
histórias de vida de mulheres jovens que passaram pela experiência de tentativa de suicídio.

4.2. Metodologia

Trata-se de uma pesquisa de cunho qualitativo com foco em compreender, a partir


da perspectiva de quem narra os sentidos e significados atribuídos à experiência vivida
(Minayo, 2007). Foi utilizada como método de produção de material empírico a pesquisa
narrativa. Através das narrativas é possível abordar de forma mais ampla o mundo
experienciado da pessoa que conta sua história (Flick, 2009). A entrevista narrativa tem
como base uma “pergunta gerativa de narrativa” e é de natureza não estruturada. Através
dela é possível aprofundar em características específicas sobre um determinado contexto
importante de sua vida e do contexto social em que está inserida. Ela tem como finalidade
encorajar a entrevistada a contar sua história (Flick, 2009; Jovchelovitch & Bauer, 2007).
Jovchelovitch e Bauer (2007) apresentam as características da entrevista narrativa.
De acordo com esses autores, a entrevista narrativa é composta por quatro fases. Na
primeira, denominada como iniciação, é realizada a formulação do tópico a ser narrado e
apresentação da “pergunta gerativa de narrativa”. Na segunda fase é o momento em que a
pessoa faz a sua narração e a pesquisadora deve manter-se em uma escuta ativa. Apenas na
terceira fase são realizados questionamentos com a finalidade de completar as possíveis
lacunas existentes e considerando as palavras e questões trazidas pela narradora. A quarta
fase consiste no momento após o relato, inclusive após desligar o gravador, em que podem
surgir alguns comentários e discussões sobre a temática em questão (Flick, 2009;
Jovchelovitch & Bauer, 2007). Nesta pesquisa, a questão gerativa foi: “Conte-me sobre sua
história de vida e experiência com a tentativa de suicídio. Você pode levar o tempo que for
preciso e pode dar detalhes de tudo que for importante para você".
As entrevistas foram realizadas com mulheres que passaram por pelo menos uma
tentativa de suicídio, mas que estavam com quadro clínico estável e que passaram por
acompanhamento clínico em serviço de atenção do Hospital Espírita André Luiz (HEAL)
57
beneficente de assistência à saúde mental de Belo Horizonte. O contato com a equipe
multiprofissional do hospital auxiliou para compreensão das condições estáveis de saúde
para participação de uma pesquisa. Se caso fosse verificada durante a entrevista, ideação
suicida na fala das jovens, ela seria encaminhada para serviços de apoio no próprio hospital,
como se detalha a seguir. No entanto, vale já antecipar, que não foi necessário realizar
nenhum encaminhamento.
Essa pesquisa respeitou os requisitos da Resolução do Conselho Nacional de Saúde
(CNS), nº 466 de 2012, por se tratar de uma pesquisa que envolve seres humanos. Portanto,
o estudo se pautou no respeito às questões que envolvam a dignidade humana e proteção
aos participantes, com uso de total sigilo e engajamento ético por parte da pesquisadora. A
escolha por não realizar a entrevista em período de internação se deu para evitar conflitos
entre o objetivo do tratamento terapêutico e o da pesquisa. As entrevistas foram realizadas
com muita cautela e respeitando os limites das mulheres ao narrarem suas histórias, por se
tratar de uma experiência que envolve sofrimento e poderia ter desencadeado desconfortos.
A pesquisadora tem experiência no atendimento com esse público e desenvolveu a pesquisa
em diálogo com a equipe do serviço de saúde, assegurando-se a possibilidade de acioná-la
sempre que necessário. Caso tivesse sido observado algum desconforto as entrevistas
seriam interrompidas e o sofrimento seria acolhido pela entrevistadora e, sendo necessário,
a participante seria encaminhada para dar continuidade ao acompanhamento pela equipe de
referência.
A pesquisadora atuou no setor de psicologia da internação do Hospital Espírita
André Luiz ao qual a pesquisa esteve associada durante a vigência de sua execução. Em sua
prática clínica, continua realizando atendimentos psicoterápicos de jovens e mulheres com
ideações suicidas.
Foram realizadas doze entrevistas, no período de outubro de 2019 a março de 2020,
e elas aconteceram no consultório da pesquisadora e em alguns casos, na casa das
entrevistadas. Os dias e horários, bem como local, foram acordados com cada mulher,
considerando o que ficaria mais adequado com suas dinâmicas de vida. Todas as
participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)
(APÊNDICE E) e foram informadas sobre os riscos e benefícios de participarem, e também
da possibilidade de desistência a qualquer momento em que desejarem.
58
Os critérios de inclusão destas mulheres foram ter ficado internada após tentativa de
suicídio no hospital parceiro e que tinham recebido alta há pelo menos 6 (seis) meses.
Tinham idade igual ou superior a 18 anos e no máximo 29 anos, considerando somente a
participação de jovens, uma vez que o último boletim do Ministério da Saúde apontou para
um crescente aumento de tentativas e suicídios nessa faixa etária e serem consideradas
juridicamente capazes (Brasil, 2018b).
Foram realizadas duas reuniões com a equipe do hospital para alinhamentos
necessários em relação aos aspectos éticos e para ficarem claros os critérios de inclusão de
participantes. Para auxiliar na comunicação foi criado um grupo de WhatsApp e um
arquivo no Google Drive que foi alimentado tanto pela equipe do hospital, quanto pela
pesquisadora. A equipe que deu suporte ao desenvolvimento desta pesquisa estava
composta por uma psicóloga, coordenadora da equipe de Psicologia, uma enfermeira,
coordenadora da equipe de Enfermagem, um médico psiquiatra assistente e um assistente
do setor de psicologia. Esse grupo de profissionais realizava a triagem das pacientes e
alimentavam a planilha no Google Drive apenas com informações básicas e relevantes para
a pesquisa como nome, telefone para contato, data de nascimento e data da alta. Após fazer
contato a pesquisadora adicionava uma observação dizendo se havia entrevistado ou não.
Vale considerar que a pesquisadora não tinha acesso a nenhum documento interno do
hospital e nem histórico das mulheres indicadas para a entrevista. A planilha foi alimentada
com novos contatos por 5 vezes, totalizando 60 indicações. Como o número de retornos
negativos foi considerável decidiu-se por findar as buscas quando se chegou a 12
entrevistadas. Os motivos pelos quais as demais 48 entrevistas não se concretizaram foram
diversos, algumas mulheres se recusaram a participar por acreditarem que ainda não
estavam prontas para falar sobre, outras por distanciamento físico e/ou dificuldades com
suas rotinas. Outras indicadas, ainda, não deram retorno às tentativas de contato e, em
alguns casos, os responsáveis pelos cuidados não permitiram que a jovem se
disponibilizasse a participar.
As mulheres que não retornaram ao contato realizado foram respeitadas e não houve
insistência para não gerar desconforto e sentimento de obrigação. Algumas, parabenizaram
pela iniciativa da pesquisa, mas diziam que ainda não estavam preparadas para falar sobre,
nestes casos, a pesquisadora fazia um breve acolhimento desta mulher e agradecia a atenção
e retorno. O contato foi realizado sempre com a intenção de não se tornar invasivo e de
59
maneira a deixar as mulheres livres para participarem apenas se sentissem que “estavam
prontas para falar”, como algumas entrevistadas marcaram. Falas como “é tranquilo falar
sobre isso” ou “quero poder ajudar outras mulheres que passam pela mesma situação que
eu” estiveram presentes em alguns retornos positivos.
No Quadro 2 são apresentadas as características das mulheres entrevistas. Os nomes
fictícios foram escolhidos por elas, exceto quando se aproximaram muito de seus nomes
reais e foi preciso realizar alterações por precauções para que elas não fossem identificadas,
a entrevista com duração menor teve 33 minutos e a maior foi de uma hora e 28 minutos.

Quadro 2 - Características das mulheres entrevistadas

Nome Idade Quantas Trabalho Estado Filhos Escolaridade Tratamento


fictício tentativas civil atual

Marina 23 anos Perdeu as Não Solteira Não Superior em curso Sim


contas

Laura 29 anos 4 Autônoma Casada Sim (1) Superior completo Interrompido


por causa da
gestação

Camila 27 anos 8 Trabalha no Solteira/ Sim (2) Ensino Médio Sim


restaurante da União Completo
família do marido estável

Gabriela 28 anos 1 Sim Solteira Não Superior completo Sim

Dame Vide 22 anos 4 Não Solteira Não Superior completo Sim

Flor 29 anos 8 Não Solteira Não Superior incompleto Sim

Alice 26 anos 2 Não Solteira Não Superior incompleto Sim

Julia 24 anos Perdeu as Não Solteira Não Superior incompleto Sim


contas

Pietra 20 anos 2 Autônoma Solteira Não Superior em curso Sim

Juliana 21 anos 8 Não Solteira Não Superior em curso Sim

Olivia 22 anos Perdeu as Não Solteira Não Superior em curso Sim


contas

Cris 28 anos se machucou Sim Solteira Não Superior completo Sim


umas 30 vezes

Fonte: Elaborado pela autora.

A idade das mulheres variou entre 20 e 29 anos. Destas, dez são solteiras, uma é
casada e uma vive em união estável a mais ou menos um ano. Apenas duas mulheres são
mães. Vale ressaltar que na data da entrevista, uma delas estava em dias finais da gestação
60
da primeira filha e a outra não tinha a guarda de suas duas filhas, mas queria recorrer
judicialmente para poder reaver a situação. Quanto à escolaridade, uma havia concluído o
ensino médio, quatro possuem curso superior completo, sendo que duas atuam na área de
formação, uma não está trabalhando e a outra, formada em direito, trabalha administrando a
fazenda do pai. Outras quatro estão em processo de formação no curso superior e outras três
interromperam a graduação por acreditarem que não tem condições psicológicas de
concluir, no momento.
Das doze participantes quatro afirmaram que perderam as contas de quantas vezes
recorreram a tentativa de suicídio como opção para algum conflito, duas mulheres tentaram
oito vezes, duas fizeram quatro tentativas e outras duas tentaram duas vezes. Quanto às
demais, uma tentou sete vezes e a outra apenas uma. O método mais utilizado por onze
delas foi a ingestão de medicamentos psiquiátricos. Uma tentou pular de um viaduto e foi
impedida por um taxista que passava no momento, outras três tentaram pular das janelas de
seus apartamentos e foram impedidas por vizinhos ou familiares. Três mulheres cortaram
os pulsos e todas foram encontradas por familiares e encaminhadas ao pronto atendimento.
Duas entrevistadas relataram que em uma de suas tentativas fizeram a combinação de
medicação, cocaína e bebida alcoólica e a outra combinou a ingestão de medicação e o
corte nos pulsos.
O Ministério da Saúde (Brasil, 2006b) aponta como um fator protetivo o
encorajamento da fala sobre os pensamentos e ideações suicidas, bem como sobre as suas
experiências de sofrimento. Relata-se que as pessoas tendem a ficar agradecidas e aliviadas
e que isso não representa que a ideação será incutida no sujeito. Tendo em vista todos os
cuidados éticos no decorrer de toda a pesquisa, acreditamos que o desenvolvimento da
pesquisa se alinhe com esse fator protetivo, e que tenha sido apresentado para as
participantes como uma oportunidade de narrar suas próprias experiências.
A análise das entrevistas foram embasadas na proposta da análise
dialógica/performática de Riessman (2008). Segundo a autora, a pessoa que narra sua
história constrói uma performance para comunicar o que deseja. Ou seja, a pessoa pode
assumir diversas formas de expressão que se apresentam por performances. Também
aponta que o contexto no qual a produção da narrativa acontece pode interferir nas formas
de narrar. Para ela, “nas entrevistas narrativas (assim como nas interações face a face),
narradores têm uma tarefa a cumprir; eles precisam convencer o ouvinte, que não estava lá,
61
de que certos eventos realmente aconteceram.” (Riessman, 2008, p.86). Nascimento (2016)
reforça que

a análise dialógico-performativa enfatiza o contexto de produção, a dimensão interacional e


a performatividade nas narrativas, de forma que as seguintes perguntas devem ser colocadas
ao trabalharmos com a perspectiva dialógica de análises: Para quem um enunciado pode ser
direcionado? Como funcionam as histórias narradas? Para que servem? Quando? Por quê?
A quem servem? Que “eus” se apresentam na dimensão dialógico-performativa das
histórias? (Nascimento, 2016, p. 61)

Riessman (2008) descreve onze recursos linguísticos que auxiliam na codificação e


identificação das intenções a serem comunicadas durante sua narrativa, ou seja, qual a
performance que a pessoa apresenta. As ferramentas que podem ser utilizadas são: discurso
direto; repetição, ventriloquismo; uso de sons expressivos; interlocução; interrupções e
pausas; uso de inflexão; estilo narrativo heroico; uso performático de tempos verbais;
sobreposição de discursos; apresentação do “Self Preferido”.
As etapas para a construção da análise performática realizada nesta pesquisa serão
descritas a seguir. A primeira etapa constituiu-se da escuta das histórias de vida das
mulheres que passaram pela experiência da tentativa de suicídio e transcrição das mesmas.
No segundo momento, foi necessário ouvir os áudios e acompanhar através da leitura da
transcrição para identificar as vozes e na forma como se apresentavam, além de poder
identificar quais recursos linguísticos performáticos eram utilizados por cada uma. Na
terceira etapa, foi realizada a leitura do material transcrito novamente. Na quarta e última
etapa, já tendo olhado para o material com foco interpretativo, foi apresentado relatos
individuais de cada entrevista.

4.3 Resultados e Discussões

Foram analisadas as dozes entrevistas e para apresentação das narrativas foram


construídos subtópicos, sendo que no primeiro estão alguns relatos da tentativa que deram
mais destaque. Nos demais subtópicos são apresentadas subtramas sobre as seguintes
temáticas: abuso sexual, comorbidades, violência nas relações afetivas e violências
vivenciadas nas relações familiares. Nos subtópicos serão apresentados trechos que se
destacaram ou foram mais trabalhados pelas próprias jovens.
62
O Quadro 3 apresenta as realidades vividas por cada uma das mulheres participantes
da pesquisa a partir das temáticas que foram elencadas para análise. No que tange o abuso
sexual foram considerados os casos em que as participantes foram coagidas a terem
relações sexuais indesejadas. Por comorbidades entendemos todas as doenças que foram
mencionadas como causas de incapacitação do desenvolvimento das atividades cotidianas,
sejam por questões físicas ou mentais. Tanto no subtópico que aborda a violência nas
relações afetivas quanto nas relações familiares foram consideradas situações de em que
houve agressões físicas e psicológicas.

Quadro 3 – Realidade vivenciada pelas mulheres


Violência nas Violência nas
Nome fictício Abuso sexual Comorbidades
relações afetivas relações familiares

Marina X

Laura X X X

Camila X X X

Gabriela X

Dame Vide X X X

Flor X X

Alice X X

Julia X X X

Pietra X X X

Juliana X X X

Olivia X X

Cris X X

Fonte: Elaborado pela autora.

4.3.1 A tentativa de suicídio

Nesta sessão, serão apresentadas algumas falas que ilustram o processo de tentar
findar a própria vida, bem como o método que foi escolhido por cada uma. Olivia (22 anos)
relata que por inúmeras vezes tomou medicamentos em excesso e que ia sozinha para o
hospital, sem falar com ninguém da família. Disse e que nunca teve nenhuma complicação
e o que facilitava no momento de justificar aos médicos o motivo de sua consulta. Ela
63
enfatiza uma de suas tentativas que classifica como „uma das piores‟. Conta que havia
iniciado um novo emprego e sentia que sua gestora a tratava muito mal e diante disso:

eu tentei (gagueja) o auto extermínio assim, que eu considero um dos piores pra mim,
porque eu me tranquei no banheiro, num dia que eu sabia que eu tinha que trabalhar, e eu
me desesperei porque eu tinha que trabalhar (riso de nervoso) e ver ela (gestora), então
aquilo foi me pressionando, me pressionando de uma forma, e aí eu peguei a lâmina do meu
irmão de fazer barba e tentei cortar os meus pulsos. Só que ela tava cega, e eu tentando
fazer aquilo, e minha tia batendo na porta, porque ela sabia que eu tava no banheiro e que
não era uma coisa boa. Então ééé ela começou a bater, pedindo pra abrir a porta, e eu
pensava que eu só queria morrer, que eu queria dar um fim naquele sofrimento que eu tava
sentindo (Olivia).

Julia relata que foram muitas tentativas e grande parte com ingestão de medicação.
Dá ênfase a uma ocasião e diz que foi a única vez que ela planejou por mais de um mês e
no dia, despediu de todos e sentia-se muito bem por acreditar que no outro dia não estaria
viva.

„Eu vou morrer hoje, graças a Deus eu não vou viver amanhã‟. Liguei minha música
favorita, da Ariana Grande, coloquei o meu fone de ouvido no talo, e… Tô lá… ouvindo,
tava terminando de espremer os últimos comprimidinhos dentro do zip-lock, quando eu
escutei alguém batendo na minha porta. (...) minha mãe que não mora comigo, desce lá da
casa dela, exatamente naquela hora, exatamente naquele mesmo horário e bate na minha
porta e pergunta o que que tava acontecendo, eu falei: „Nada. Tá acontecendo nada não, por
quê?‟ (...) Então… não deu certo, minha mãe sabia que alguma coisa tava errada. Minha
mãe descobriu… abriu a porta, queria que eu vomitasse tudo o que eu já tinha tomado
(Julia).

Camila afirma que tentou suicídio umas oito vezes, sendo que algumas vezes ingeriu
medicação em excesso, em outra ocasião pegou uma faca para enfiar em seu coração e foi
impedida pelos pais. Também tentou pular do terraço da casa dos genitores. Em algumas
das tentativas precisou ir ao hospital fazer lavagem e relata que foi uma experiência muito
desagradável. Porém dá mais ênfase à sua primeira tentativa:

Meu primeiro suicídio foi com 18 anos... a primeira tentativa. Eu tinha brigado com ele
(namorado), e achava que a vida não tinha mais graça. Era muito nova. Fui na casa de ração
e comprei Chumbinho e fui para casa, só que tratei ele normal, a gente teve uma briga, aí eu
não falei que eu iria fazer nada, não falei pra ninguém. Fui em casa, e cheguei e tomei o
chumbinho. Aí... ele fala que ele ligou pro meu celular várias vezes e que eu não atendia. Aí
ele pulou o muro da minha casa e me achou já desmaiada. Aí me levaram pro hospital,
dessa vez eu cheguei a ficar na UTI 3 dias, é... Mas... Não tive nenhum dano (Camila).
64
Flor assim como Camila atentou contra própria vida por umas oito vezes e fez uso
de medicação em excesso. Já se trancou no banheiro com uma faca para cortar os pulsos,
mas os pais perceberam que algo estava errado e arrombaram a porta. Agora, a pior delas
foi quando ela tentou pular da janela do prédio

Foi por causa de relacionamento amoroso, término com o namorado, eu (breve pausa) bebi
(bebida alcoólica), tomei remédio e fui pular da janela, eu tava sozinha em casa, aí os
vizinhos arrombaram a porta e assim, eu vesti a roupa que eu queria ser enterrada ééé fiquei
na janela tomando coragem de me jogar, nesse tempo os vizinhos arrombaram a porta e me
pegaram, aí foi nessa vez que eles me levaram pro pronto socorro e no pronto socorro eles
falaram que só me liberariam se eu fosse internada, aí foi minha primeira internação (Flor).

Das mulheres entrevistadas Gabriela foi a única que havia tentado suicídio apenas
uma vez. Mas, algo comum à todas as demais foi o método utilizado.

Em Janeiro eu tava começando a ficar sem dormir de novo, cada vez com a carga de
remédio para dormir maior, e maior, e maior… E aí eu comecei a ouvir coisas, aí era uma
perturbação mental tão grande que eu peguei todos os remédios que eu tinha e tomei nesse
dia. (Engasgo) A sorte é que no tomar esses remédios depois eu comecei a passar muito mal
e aí eu fui parar na Unimed com muito vômito, aquela coisa toda, e acho que eu consegui
expelir um pouco (Gabriela).

Laura conta que já tentou pular de um viaduto, mas foi impedida por um taxista que
estava passando e percebeu que ela não estava bem e a encaminhou para uma unidade de
pronto atendimento (UPA). Também já tentou pular da janela do quarto na casa dos pais
após uma discussão com o pai. O genitor foi quem a impediu desta vez. Na tentativa através
de remédio ressalta que se o irmão não tivesse chegado, teria morrido porque quando ele
chegou já estava...

… evacuando, vomitando, sem consciência nenhuma, aí ele me levou pro hospital e eu fiz
realmente de caso pensado (...) a minha mãe deixou os meus medicamentos dos dias que ela
ia ficar fora comigo… era mais ou menos uns sete dias, eu tomava uns sete comprimidos
por dia então eu peguei aquela medicação toda e tomei de uma vez e todos os outros
remédios que eu encontrei na casa. ai o meu irmão ia pra um sítio com a namorada e não
iria voltar, ele iria dormir lá. Aí eu pensei vou tomar porque ele não vai voltar, não tem
ninguém aqui, e vai acabar com isso (Laura).
65
Pietra tentou suicídio duas vezes. Uma com ingestão de medicação em excesso.
Outra foi após a morte do avô e momento em que não sabia como terminar uma relação
abusiva. Conta que tomou

Três caixas de remédio… mas… na época que tinha um super acesso a dinheiro e drogas, e
coisa do tipo, eu tinha muito cocaína em casa, eu cheirei tudo, eu bebi uns… uma garrafa
inteira de tequila e uma garrafa inteira de vinho… e saí andando pela rua… Fingi pra minha
família que eu estava super sóbria e normal, cortei o meu cabelo, fui pra minha aula… e lá
eu comecei a passar mal.

Todas as mulheres entrevistadas corroboraram com o que literatura apresenta em


relação ao principal método utilizado por mulheres: ingestão de medicação (Brasil, 2018c;
Magalhães et al., 2014; Ribeiro, Castro, Scatena & Haas, 2018). De acordo com o estudo
realizado por Magalhães e colaboradores (2014, p.18 e 19) “a intoxicação voluntária por
medicamentos foi duas vezes mais utilizada pelas mulheres que pelos homens”.
Camila ingeriu Chumbinho em sua primeira tentativa. Ela destacou essa situação
como a mais grave pelos efeitos colaterais vivenciados. Ribeiro, Castro, Scatena e Haas
(2018) apontaram que tanto a ingestão de remédios quanto o uso do chumbinho foram os
principais meios utilizados no estudo que realizaram. Afirmaram que o fácil acesso às
substâncias pode influenciar na escolha feita pelas mulheres. Além disso, afirmam que “a
restrição poderia ser passível de prevenção, como por exemplo, exigir maior rigor para a
comercialização” (p. 7).
Cris declarou que sempre teve crises de arranhar-se, morder-se, machucar-se e que
não tinha mais desejo de viver. Porém, acrescentou que

Nunca tentei o suicídio em si, mas sempre passou pela minha cabeça aquele trem „ah, não
quero mais continuar vivendo, ah, minha vida tá horrível, ah não sei pra quê continuar
isso…‟ esse tipo de pensamento assim. (...) No fim do ano passado que eu me cortei, eu
cortei o braço com a gilete. Eu passei a lâmina até cortar (Cris).

A partir da fala de Cris é possível identificar que existem casos subnotificados e isso
pode dificultar no estabelecimento de ações preventivas. Apesar da vivência auto lesiva
adicionada ao desejo de morrer, ela não nomeia sua atitude como um comportamento
suicida. Vale ressaltar que quando foi convidada a participar da pesquisa ficou ciente sobre
a temática, tentativa de suicídio de mulheres jovens, e se interessou em contar sua história.
66
Então, nos cabe questionar se a não nomeação é por não reconhecimento ou por medo de
vivenciar estigmas sociais direcionados às pessoas que atentam contra a própria vida.

4.3.2 Abuso Sexual

De acordo com o boletim epidemiológico divulgado pelo Ministério da Saúde


(2018c, p. 10) a “violência tem consequências profundas para a saúde física e mental nas
pessoas que a vivenciam, tendo impacto no desenvolvimento psicossocial das crianças e
adolescentes, no bem-estar das famílias e das comunidades, constituindo-se em desafios
para os gestores e profissionais da saúde”. Aqui vamos apresentar algumas narrativas de
jovens que foram abusadas sexualmente no período da infância e adolescência. Sendo que
todas elas passaram por mais de uma situação de violência sexual. Marina foi viveu três
vezes, sendo que as duas primeiras foram por dois vizinhos e a terceira, pelo próprio irmão
mais velho. Ela conta que foi

Eu fui abusada de quando eu era pequena (...) Primeiro foi o vizinho aqui de casa, começou
tudo com seis anos de idade, minha mãe me deixava por necessidade de ter que resolver as
coisas, né? (...) fala que criança esquece. Mas criança nunca esquece. Ele passou a mão na
minha parte íntima (breve pausa) e ficava fingindo que lá, eu queria andar de bicicleta, mas
eu não sabia andar de bicicleta e lá tinha uma bicicleta de exercício e ficava assim 'vem cá,
vem cá andar de bicicleta' e depois que ele passou a mão na minha parte íntima eu fiquei tão
assim 'meu Deus que isso' (Marina).

Assim como Marina, Dame Vide foi abusada por três vezes e por pessoas diferentes.
Faz questão de frisar isso em sua fala:

Eu já fui estuprada três vezes, por três pessoas diferentes, em três épocas diferentes da
minha vida. Então assim, (gagueja) foi foi difícil sabe... A primeira vez foi um primo meu,
que tem problema mental. (...) eu sempre escondi isso sabe, essa questão do estupro por
medo mesmo sabe, os outros casos foi um professor particular, e aí o outro caso foi um
amigo mesmo (Dame Vide).

Alice contextualiza que após a separação dos pais, a mãe iniciou uma nova relação e
em pouco tempo foram morar na casa desse novo companheiro dela. E nesse novo contexto
ela sentia que a mãe estava abandonando os filhos da primeira relação e com isso, ficou
muito próxima do filho do padrasto. Relata que acabou criando
67

uma confiança muito grande nele, que ele acabou usando pra... pra poder se... pra poder
abusar de mim assim... que muitas vezes eu não sabia o que tava acontecendo, mas tava
acontecendo... eu me lembro... a primeira vez que eu fiz sexo oral nele e ele pediu e eu falei
„mas o que que é isso?‟ eu nem sabia o que que era assim sabe, era muito estranho (Alice).

Também passou por experiências de violência sexual com o avô paterno, relata que
ele “ficava oferecendo dinheiro pra andar pra ele... sem roupa em casa, ficava se
masturbando no sofá... e eu não sabia o que era né”. Olivia também se sentiu violada e
invadida após reencontrar um amigo de infância,

era um amigo da família e eu brincava muito com ele né, até os meus oito anos de idade.
Depois disso, ele mudou de casa, aí eu não (gagueja) encontrei com ele mais, eu também
mudei... Aí a gente começou a conversar e tudo, ele pediu meu telefone, pediu meus
contatos, pediu para ir na minha casa... E eu achei estranho né, a velocidade que as coisas
foram acontecendo porque num dia ele me pediu meu telefone e no outro dia ele tava na
minha casa me esperando chegar da escola. (...) E aí a gente começou a sair algumas vezes,
e tudo, lá perto da minha casa mesmo, a gente foi na sorveteria, nesses lugares assim,
porque até então também eu não saía sozinha. (...) Então eu comecei a interessar por ele, e
eu tocava violão (...) então eu resolvi compor uma música para ele, eu nunca tinha
composto uma música nem nada, mas foi ali naquele momento de sentimento e tudo mais,
aí eu compus uma música. Aí eu chamei ele para poder escutar essa música, mas ele me
enrolou durante sete meses pra aparecer, (Risos) e aí eu fiquei naquela expectativa, fui me
frustrando mais (...) Ai esse menino reapareceu eee me pediu para ir na casa dele pra tocar a
música pra ele. E aí foi quando aconteceu o meu primeiro abuso sexual. Ele me forçou a ter
relações com ele, eu não sabia que ele trabalhava pra polícia, ele era da polícia, eee quando
eu fui na casa dele, toquei a música e tudo mais, ele foi e falou que queria ficar comigo,
que gostava muito de mim, mas que ele tinha voltado com a ex namorada dele por
(gagueja) pressão da família, por pressão das pessoas, e que ele não conseguia sair disso,
mas que ele queria ficar comigo. E aí ele ficou insistindo naquilo e naquilo, e aí quando eu
falei com ele que não, aí ele pegou a arma, foi quando eu descobri que ele era policial, (bem
baixinho) ele apontou a arma na minha cabeça, e foi um momento de trauma na minha vida,
porque ali encerrou tudo que eu acreditava. Que até então eu não tinha tido nenhuma
relação sexual, eu pensava em casamento, pensava em casar virgem, pensava nisso, então
ali ele destruiu todos os meus conceitos, ele tirou tudo de mim naquele momento. (Olivia)

Este é o relato do primeiro abuso sexual que Olivia sofreu. Ela teve um segundo
abuso, que foi com o professor de educação física da escola. Neste, o segurança/vigia da
escola a socorreu e deram queixa do professor: “E aí quando eu sofri esse segundo abuso,
eu falei „que vergonha, meu corpo foi violado duas vezes, (voz chorosa) tudo que eu
acredito tá sendo jogado fora e eu não consigo fazer nada, eu não consigo reagir diante
disso‟”. O terceiro e último abuso foi o esposo da tia, neste caso, a família „abafou‟ o
acontecimento: “pra mim foi a pior coisa do mundo, porque ele me chamou pra dar aula de
68
violão pra ele (...) quando eu consegui pegar no violão de novo, ele destruiu aquilo de novo.
Então foi um momento muito difícil pra mim, e aí eu falei „meu Deus, como que eu vou
conseguir contar isso pra minha família?‟ (choro) Porque quando acontece com pessoas de
fora já é ruim, imagina uma pessoa dentro da sua família. A minha tia tava grávida, e aí eu
pensei „que que eu vou fazer?‟”.
A partir da fala das mulheres é possível notar que os abusadores tinham alguma
relação com elas, alguns familiares como tio, irmão e primo. E, amigos ou pessoas em
quem confiavam como professores. Tais informações reafirmam os dados sobre violência
sexual contra crianças e adolescentes divulgados pelo Ministério da Saúde em 2018. O
boletim informa que a maioria dos abusadores tinham algum vínculo com as vítimas, eram
familiares ou amigos/conhecidos (Brasil, 2018c).
Das jovens entrevistadas apenas uma foi abusada por uma pessoa do sexo feminino.
As demais foram vítimas de pessoas do sexo masculino o que também corrobora para os
dados apontados pela literatura nacional (Brasil, 2018c). Para finalizar, o Ministério da
Saúde (Brasil, 2018c) aponta que

Os indivíduos do sexo masculino foram apontados como os principais autores das


violências sexuais contra crianças e adolescentes. Diante disso, faz-se necessário
problematizar essa situação, considerando que esse maior envolvimento como perpetradores
das violências sexuais contra estes grupos pode ser reflexo da afirmação de uma identidade
masculina hegemônica, marcada pelo uso da força, provas de virilidade e exercício de poder
sobre outros corpos (Brasil, 2018c, p.13).

4.3.3 Comorbidades

Foram consideradas comorbidades toda doença que gere algum sofrimento intenso
que possa influenciar diretamente na realização das atividades diárias. Será apresentado um
relato de uma jovem que convive com uma doença autoinume que afeta sua vida pessoal,
profissional e acadêmica. Também serão apresentados três relatos de mulheres que
convivem com transtornos afetivo bipolar.

Tipo com uns 17 ou 18, eu descobri que eu tinha a doença de Chron, não sei se cê já ouviu
falar, é uma… doença autoimune, que ela inflama o intestino. (...) Eles (os médicos) falam
que o psicológico influencia muito e é uma coisa que eu não consigo controlar. Por mais
que eles consigam controlar... e fazer todo um tratamento clínico, o meu psicológico
interfere. (...) “Eu pensar que eu ia ter que viver com essa doença pra sempre e que… eu
69
não ia… Eu não ia ter a tal vida normal que esses médicos falavam que... eee vendo que as
coisas não iam melhorar, passava um ano entrava outro, passava um ano entrava outro, eu
sentia que nada ia melhorar e sua mente começa a falar com você, tipo... ééé „Poxa, todo
mundo morre um dia. (...) Então por que que eu vou continuar estendendo o meu período de
sobrevivência na terra digamos assim, se eu to sofrendo desse jeito? Num quero não (Julia).

Julia sente que a doença afeta de forma considerável a sua vida, tanto por causa de
todas as consultas quanto por não conseguir controlar ou estabilizar os sintomas
vivenciados. Meneghel e colaboradores (2013) apontaram que as doenças que afetam na
realização de atividades diárias podem produzir sentimentos de inutilidade que influenciam
mulheres com comportamentos suicidas.
Gabriela conta que o irmão foi diagnosticado com esquizofrenia e que na época
todos voltaram os cuidados para ele, mesmo sem entender muito bem o que estava
acontecendo. A situação gerou uma grande sobrecarga para todos da família. Após se
formar na faculdade assumiu a coordenação de uma equipe que também exigia muito sua
atenção. Neste período, começou a ter períodos de agitação intensa. Passou noites em claro
e percebeu que algo não estava bem. Com isso, procurou ajuda em diversos médicos.
Começou a fazer uso de algumas medicações que acabaram potencializando sintomas como
alucinações e agitação. Fala que começou a ter perturbações mentais o que influenciou de
forma significativa na decisão de tomar remédios em excesso para acalmar toda a agitação
e acabar com as vozes. Na internação após a tentativa de suicídio foi diagnosticada com
Transtorno Bipolar. Ela reforça que a

tentativa de suicídio na época, era sanar aquela dor mental, uma coisa... Aquela perturbação
que eu não conseguia fazer nada, não conseguia conversar com as pessoas, e ao mesmo
tempo não conseguia sair, não conseguia fazer nada. Então era aquilo que eu queria, era
sanar. Não no intuito de acabar com a vida, era um intuito de acabar com o momento, com o
presente, com o que tava acontecendo (Gabriela).

Laura também tem diagnóstico de transtorno bipolar e relatou não conseguia se


entender muito bem e que não aceitava o tratamento. Fingia tomar os remédios e não
comparecia aos atendimentos com a psicóloga. Conta que na fase da mania “ficava muito
eufórica e queria fazer tudo. E aí eu me propunha fazer muita coisa. Quando eu não
conseguia fazer tudo o que eu me propunha fazer, aí vinha a depressão. No que vinha a
depressão, eu não conseguia levantar da cama pra fazer absolutamente nada”.
70
Flor relata que viver com transtorno bipolar e o vício em álcool afeta sua vida e
rotina consideravelmente. Se sente sozinha e tem dificuldade em estabelecer relações.
Conta que tenta “ir nos lugares mas não enturmo, então as poucas amizades que eu tinha,
elas não aceita, quando eu contei a minha verdade né? que eu tinha não fui muito aceita,
não fui entendida, afastaram, me tratam, eu sinto que me tratam diferente”. Também fala
como influenciou sua vida a ponto de não conseguir ir para faculdade porque estava
alucinando. No primeiro período tinha boas notas e se considerava estável, porém no
terceiro período ela alucinava, vozes diziam para ela matar pessoas. Com o tempo,
começou a reconhecer e compreender as suas fases e aprendeu que se está

Em mania se acontecer alguma coisa eu vou fazer (tentar suicídio), eu vou ter coragem de
fazer sabe? É sempre assim. E na época da mania é mais perigoso, tem que ficar mais
atenta, quando eu to na fase depressiva os pensamentos não somem, de que eu quero, que eu
não quero viver, que não vale a pena de que não tem mais saída, mas eu ainda fico, eu não
tomo ação, eu fico totalmente sem ação

Santos, Lovisi, Legay e Abelha (2009) apresentaram como resultado da pesquisa


realizada que 71,9% dos casos de tentativa de suicídio tinham alguma comorbidade
psiquiátrica. As principais que eles identificaram foram: episódio depressivo maior, abuso
dependência de substâncias psicoativas, transtorno de estresse pós-traumático e abuso de
álcool. Apenas uma entrevista apresentou quadro de abuso de álcool.
As demais as jovens desta pesquisa que apresentaram algum diagnóstico
psiquiátrico tinham quadro de transtorno afetivo bipolar o que fortalece os dados
divulgados por Pacheco e colaboradoras (2010). Eles apontaram que as comorbidades
psiquiátricas mais frequentes são a depressão, transtorno afetivo bipolar e abuso de álcool.

4.3.4 Violência nas relações afetivas

Nesta seção serão apresentadas narrativas que contemplam violência psicológica e


física em que os agressores foram os parceiros íntimos.

Com 14 anos eu comecei a namorar um menino da escola, namorei com ele por 2 anos e
meio, fiquei noiva dele 6 meses... É... Muito nova, mas enfim, as circunstâncias eram,
eram... Fazia sentido, sabe? A gente ficar noivo e tal. É… Mas aí ele foi um crápula
comigo, eu terminei com ele, ele não aceitou… E aí, enfim, a gente era um casal né, então
71
fotos íntimas e tal, e aí basicamente quando eu terminei ele não aceitou ele né... Jogou tudo
na rede, na escola e tal... Então ali começou o meu, meu… Meus primeiros pensamentos de
me matar. E ali começou também a minha depressão, sabe? Foi uma coisa assim, horrível.
Nossa, foi horrível! (Dame Vide).

um namoro… que me colocava totalmente pra baixo o tempo inteiro. É… eu briguei com
Deus e o mundo pra ficar com essa pessoa, (...) me cobrava demais a questão de corpo (...)
eu cheguei a morar um tempo com ele, porque meu pai não aceitava, meu pai sabia da
história toda dele, e meu pai não aceitava, meu pai foi e falou comigo „se você quiser
namorar com ele, é do portão pra fora. Aqui dentro da minha casa eu não aceito ele‟. Aí
resolvemos ir morar juntos, com toda essa situação, só que foi só piorando, agravando a
minha doença que eu já tinha porque aí ele fazia tudo isso. (...) se eu tivesse indo com X
calcinha é porque eu tava pensando em fazer algo errado na faculdade. Então foi um
negócio que foi mexendo também demais com a minha cabeça. E a questão das cobranças e
a questão da traição. Eu descobri as traições, não conseguia, brigava, esbravejava, aquela
coisa toda, mas não conseguia pôr um fim no relacionamento. Eu dependia emocionalmente
dele (Laura).

Só que ele era uma pessoa super obsessiva. (...) como eu morava em outra cidade e ele tinha
que trabalhar, e tinha que estudar e tinha que fazer várias outras coisas e eu também tinha
que estudar, ele ficava super ciumento e aí ele me deu um celular e ficava me ligando 24
horas por dia. Eu tinha que deixar meu celular sempre carregado, porque ele me ligava
literalmente o tempo todo. E não era tipo ele me ligava e desligava, e ligava e desligava,
ligava e desligava. Ele ligava e deixava ligado a ligação enquanto eu vivia a minha vida pra
saber o que que eu tava fazendo. (...) era como se eu fosse o bichinho de estimação dele, eu
sempre tava lá pra ele. É, ele conseguiu manipular a minha mente pra acreditar em coisas
que eu não consigo nem imaginar que eu acreditei. Eu fico perplexa com o como ele
conseguiu me manipular com palavras tão simples e coisas tão sensíveis (Pietra).

Além da relação supracitada, Pietra vivenciou mais dois namoros abusivos e relata
que em todas sofreu com agressões físicas e que não sabia o que fazer para sair do
relacionamento. Apesar de sentir-se oprimida “não pensava na pessoa como um agressor” o
que contribuiu para permanecer mais tempo no enlace afetivo. Em um dos namoros, conta
que sua

Vida virou um inferno. Eu lembro que até os 6 meses de namoro eu já tava me perguntando
se eu era louca, ou… se eu não tinha deixado de ser eu mesma, ou se ao mesmo tempo eu
tinha feito isso tudo e eu tava perdendo a minha vida do lado daquela pessoa. Seis meses de
namoro. Eu namorei quase 3 anos com esse cara (...) foi horrível pra mim, era tipo, eu não
queria transar eu tinha que transar, era eu não queria ir num lugar e eu tinha que ir, eu
queria ir num lugar e eu não podia, eu queria conversar com os meus amigos e eu não podia,
eu queria fazer alguma coisa, eu não podia. Mas se eu não queria, provavelmente eu teria
que fazer. Era isso que eu tinha durante quase três anos da minha vida. (Pietra)

A violência psicológica é considerada a que mais traz perdas para a autoestima e


subjetividade da mulher (Guimarães et al., 2018). Normalmente atos mais agressivos são
facilmente identificados como violências. Porém, comportamentos como perseguição e
72
manipulação são menos reconhecidos o que pode contribuir para muitas mulheres não
percebam que estão dentro de uma relação abusiva (Souza, Pascoaleto & Mendonça, 2018).
Segundo Souza, Pascoaleto & Mendonça (2018) os atos agressivos começam com
insultos, humilhações e intimidações. Pode seguir de falas depreciativas e de inferiorização
da mulher, seguindo, em casos extremos de agressões físicas. Abaixo seguem alguns relatos
de jovens que vivenciaram ameaças de agressão ou o ato propriamente dito.

Roberto veio de um jeito que ninguém tinha vindo assim de querer cuidar, de querer
resolver tudo, de querer resolver minha vida inteira (...) Só que ele era muito controlador
sabe ele queria controlar tudo. Tanto que eu fiquei 4 meses sem ver os meus amigos logo
depois de começar a namorar com ele. Que, se eu saia ele queria saber onde que eu tava,
com quem que eu tava, que horas que eu iria voltar, que roupa eu tava usando, que batom eu
tava usando e tudo. E ele não fazia questão também de estar ali sabe, de ir comigo nas
coisas, de viver as coisas comigo... (...) depois que eu terminei com ele eu acabei
conhecendo o Fábio (...) era realmente muito carinhoso comigo no começo saiu muito
comigo com os meus amigos fez tudo certinho até o dia que ele bebeu. O dia que ele bebeu,
ele tentou me agredir... ficou agressivo comigo, ficou falando que eu era muito corajosa de
tá perto dele, que se ele me desse um soco que ele me desmontava. (Alice)

Muito difícil, era bem difícil mesmo, a gente (se referindo ao ex namorado) brigava muito
(...) da mãe dele perguntar se ele já tinha me batido... Ah, às vezes ele me empurrou no
chão, coisas assim do tipo, e aí foi até a gente resolver terminar. Aí quando a gente começou
a namorar eu não podia conversar com ninguém, meu telefone tinha, eu tinha que (gagueja)
eu tinha que almoçar com o telefone ligado, porque ele tinha que ouvir com quem que eu
tava almoçando... Foi, foi bem difícil. (Cris)

Na minha festa de 15 anos, ele chegou no meu pai e falou „eu quero, eu tô namorando sua
filha‟ a partir dai eu tava namorando e eu não pude falar nada e ele era muito abusivo, eu
não podia sair com ninguém, ele ligava para os amigos, ele xingava meus amigos,
ameaçava, éé, eu podia sair só com ele, todos tudo assim, muitas brigas, muitas brigas,
horríveis, horríveis assim (...) ele virava pra mim e falava assim „sua mãe é horrorosa‟, „sua
mãe é a mulher mais feia que eu já vi, não sei como seu pai casou com ela‟, „todo mundo
fala que sua mãe é feia, você puxou ela‟ sabe era umas coisas assim e a gente terminou
porque ele me bateu, ele me agrediu, ai ele me agrediu e eu dei, eu fiz o boletim de
ocorrência na época não existia nada disso de Maria da Penha, de abuso com as mulheres
então não foi pra frente nada e ele ainda queria continuar o namoro e não continuamos, eu
falei „não, chega!‟, eu tava numa situação com ele de que eu tava com ele porque eu não
tinha saída, ai no depois que aconteceu isso que ele me bateu que eu falei „acabou‟ eu falei
„cara se não acontecesse isso eu não tinha terminado com ele‟ (Flor).

Lawrenz e colaboradores (2018) apontaram que em grande maioria, a violência


física é acompanhada de abusos psicológicos como é possível notar no relato de Flor.
Apesar do namorado de Alice não ter chegado às vias de fato, ele usou da ameaça para
intimidá-la. Os mesmos autores indicaram que as agressões contra mulheres são mais
73
registradas na fase da juventude, entre 18 e 29 anos. Vale reforçar que ainda hoje muitas
pessoas não prestam queixa por vergonha e pressões familiares.

4.3.5 Violências vivenciadas nas relações familiares

Os relatos que serão apresentados mostram como as jovens vivenciaram as


agressões físicas e psicológicas por parte de seus familiares, em grande maioria, pais e
mães. Agressão que em alguns casos foram direcionadas à elas e em outros foi por
presenciar cenas de violência. Além de relato de sobrecarga, por desempenhar muitos
papéis ou por acimar precocemente os cuidados da casa.

Dos meus seis aos meus 12 anos eu apanhava todos os dias. E eu apanhava por causa do
meu irmão, porque eu era uma pessoa muito quieta, eu sempre fui muito introspectiva. E o
meu irmão fazia muitas coisas assim, artes de criança, sabe? Tipo pintar a cara de cachorro,
subir no telhado... E aí meu pai entendia aquilo como uma coisa ruim, e batia em mim,
porque eu tinha que ter obrigação de olhar meu irmão, e meu irmão não podia fazer essas
coisas, me batia porque meu irmão não tirava nota boa na escola e eu tirava (Olivia).

A jovem conta que durante um período de sua infância ficava na casa da avó e foi
um período que apanhou muito do pai porque ela dizia que haviam aprontado e era motivo
para brigas. Até que aos 9 anos a mãe a ensinou a cozinhar, arrumar casa e passou as regras
para que ficasse em casa sozinha cuidando do irmão enquanto eles estavam trabalhando,
relata que com isso sua responsabilidade aumentou muito.

A minha mãe e meu pai são casados têm, vão fazer 31 anos de casado agora. E é o caos, a
minha mãe sempre foi muito agressiva, (fala intensamente) muito agressiva comigo, com
meu irmão a gente cresceu assim na base do (gagueja) de apanhar, sabe? E do grito, tudo de
uma maneira muito agressiva sabe, sempre. Qualquer coisinha vira pivô pra uma briga
enorme, pra confusão pra grito, pra xingo, pra bater e quebrar as coisas... Então assim,
sempre tive essa infância muito conturbada. (...) Ela (mãe) sempre teve muito em casa, mas
ao mesmo tempo era como se não tivesse, porque ela não fazia a menor questão da gente.
Sempre muito fria, muito distante... Então, meu pai sempre muito ausente por conta do
trabalho (Dame Vide).

Ao contar sobre a exposição de sua imagem feita após o término de um


relacionamento, relata como foi o recebimento da notícia para sua mãe:
74
Eu nunca vou esquecer aquele dia, 3 de Setembro de 2013… Ali… Ali a minha vida
acabou. Porque, foi horrível assim, pra mim, pra minha família né (...) A coordenadora
chamou a minha mãe na escola, a minha mãe chegou lá e me deu um tapa na cara, me
chamando de vagabunda na frente da coordenadora. Então assim, eu passei muito, muita
vergonha, sabe? E ela começou falar né, que eu era uma vergonha, que ela nunca mais ia ter
orgulho de mim, que eu era sempre, que eu ia sempre ser uma vergonha pra ela, que ela
tinha muito desgosto de mim (Dame Vide).

Minha infância foi bem... não foi uma coisa legal. (breve pausa) Igual, meu pai e minha
mãe se separaram. Porque até então eu tinha achado que, porque meu pai bateu na minha
mãe, batia nela, mas eu pensava que era aquele bater normal. E aí quando a minha
psicóloga começou a perguntar meus pais sobre o que aconteceu minha mãe finalmente
depois de muitos anos me contou que, na verdade, meu pai tinha espancado ela. Espancado
ela feio, deixado ela no chão de um jeito que ela não conseguia nem mexer. E que ela teve
que chamar meu vô e minha vó pra levar ela no hospital (Julia).

Ao contar sobre um fim de semana na casa do pai quando tinha 11 anos, narra que
seu pai agrediu sua madrasta

Pegou ela assim pelo pescoço e levantou ela assim na parede (demonstrando como o pai
fez), e eu assim arregalei os olhos desse tamanho (faz cara de assustada). Fiquei assim „meu
deeeeeus!‟ Ficou eu e ela tentando empurrar meu pai, empurrar meu pai até que a gente
conseguiu empurrar ele e jogar ele no sofá. Aí a gente entrou no quarto e fechou a porta.
Ficou lá dentro. Ficou eu e ela chorando a noite toda. Ela chorando pelo cara que ela casou,
e eu chorando pelo cara que eu achei que era meu pai mas que num era (Julia).

Julia vivenciou agressões do pai para com a mãe, do pai em relação a madrasta e
também presenciou o padrasto batendo na mãe. Na fala da jovem ela traz como se fosse
algo natural quando fala „bater normal‟ sem gerar nenhum estranhamento quanto a atitude
do pai agredir a mãe quando ainda estavam casados. Dame Vide também relata ter
presenciado violência entre os genitores, em um determinado momento da entrevista relata
que já tiraram sangue no outro. O ponto que distancia as histórias das duas é que a primeira
nunca teve episódios direcionados a ela. Já a segunda também sofria com as agressões por
parte da mãe.

A minha família já é totalmente diferente de mim, eles não me passam amor, eles não me
dão atenção, é... Me machucou muito quando a minha mãe pegou a guarda das minhas
filhas, porque eu não esperava isso dela.... Desde os 16 anos que... Eu comecei a namorar
com o pai das minhas filhas, que eu venho enfrentando a minha família, porque eles não
aceitavam meu relacionamento com ele, então eu venho sendo uma filha desobediente para
eles. Aí passamos por tudo, foram 8 anos de relacionamento, até que aceitaram meu esposo,
aí ele vai e morre. (...) Na minha cabeça, eu tinha que dar um pai pras minhas filhas, elas
não podiam ficar sem um pai, sem uma referência masculina. Só que eu não queria que o
meu pai fosse a referência masculina na vida delas, porque meu pai, ele me agrediu muito
75
quando eu era pequena... Ele agredia às vezes sem motivo nenhum! Chegava cansado do
serviço, era um motivo pra agredir eu e a minha irmã. Aí até hoje eu tenho dificuldade de…
De chegar perto do meu pai (...) eu fui cansando a minha mãe né, ela foi ficando cansada,
porque ela viu que eu não levava a sério o tratamento. Tanto que hoje em dia ela nem se
preocupa se eu tô bem, ou se eu tô mal (Camila).

No relato acima, Camila fala sobre as dificuldades e agressões vivenciadas em seu


núcleo familiar primário. Após ir morar com o namorado e pai de suas filhas, sentia-se
sobrecarregada pelos afazeres destinados a ela na relação. Em sua fala é possível notar que
apesar do cansaço, ela reforça que teve um bom comportamento uma vez que „nunca
deixou de ser uma boa mãe‟ e nem de limpar a casa. Como dizem Meneghel e
colaboradores (2013) é como se as mulheres não pudessem expor seus sentimentos e
devessem simplesmente aceitar o papel que lhes foi concedido. Conta que

Ficava muito estressada, porque eu tinha que dar conta de duas crianças, de casa, de tudo,
né? E ficava muito em casa, não saía, aí comecei a ficar mais depressiva nessa época. Mas
nunca deixei de ser uma boa mãe, de deixar a casa limpa, de dar as coisas que minhas filhas
precisavam. Só deixei de sorrir... Meu esposo até reclamava disso (Camila).

Ele (o pai) gritava, batia na mesa, e o fato de tipo eu era pequena e às vezes chorava com
medo de escuro, ele achava que eu tinha que ficar no escuro pra ver que não tinha nada, aí
ele me colocava de castigo no escuro porque não tinha nada. E assim, são poucas as coisas
que eu lembro, sabe eu não lembro muito, eu lembro assim de sempre tá chorando e de
quando eu tava adolescente ele falar que tipo ah, „se eu não quisesse seguir as regras da casa
que eu podia ir embora‟... Às vezes brigava por causa da roupa que eu tava, brigava e falava
que eu podia sair de casa. (...) tanto que eu tenho pavor até hoje só de pensar que eu posso
voltar pra casa! Tenho pavor! Pavor mesmo! (Cris)

Seja através de violência psicológica, física e até mesmo pela sobrecarga vivenciada
todas as participantes foram afetas em alguma instância e apontaram tais experiencias como
fatores que influenciaram nas tomadas de decisão quanto à tentativa de suicídio. A
internalização de situações violentas pode vir a minar forças psíquicas e realimentar
traumas. De forma que tais mulheres revisitem interiormente os sentimentos e sensações e
queiram pôr um fim em tudo (Minayo & Cavalcante, 2013).

4.4 Considerações Finais

As narrativas das jovens deram visibilidade a relação entre violência contra


mulheres e a tentativa de suicídio. Elas vivenciaram situações de agressão diversas, como
76
psicológica, física e sexual. Em grande maioria, a violência física estava direcionada a elas,
porém, algumas sinalizaram ter presenciado tal comportamento entre os pais e/ou
responsáveis. Ao relatarem sobre suas tentativas de suicídio falaram das dores e
dificuldades em lidar com tais violências.
Os dados corroboram com a literatura nacional quando apontam que os principais
meios utilizados foram o uso abusivo de medicação, cortes e tentativa de pular de prédios
altos. Vale destacar que todas tiveram pelo menos uma tentativa a partir de ingestão de
remédios utilizados para tratamento psiquiátrico.
A pesquisa realizada não esgotou as possibilidades de compreensão da tentativa de
suicídio de mulheres jovens, em especial, porque estamos diante de uma problemática que é
multifacetada. Porém, abre um campo de discussão que poderá auxiliar na criação de
medidas preventivas.
O estudo teve como limitação o difícil acesso as mulheres que tentaram suicídio, o
que demonstrou que falar sobre a temática ainda é um tabu. Muitas mulheres disseram que
era importante falar sobre, mas não estavam preparadas para isso.

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79
5 PRODUÇÃO TÉCNICA

Os produtos apresentados neste capítulo refletem sobre a importância de oferecer


acesso à pesquisa em outras linguagens e assim proporcionar que seus resultados sejam
conhecidos em espaços para além da academia. O Grupo de pesquisa Narrativas, Gênero e
Saúde (NaGeS) também tem investido em divulgar pesquisas através da produção
audiovisual.
O vídeo, ebook e livro apresentam a narrativa das mulheres a partir de histórias
ficcionais, inspiradas em Marcos Reigota (2003). Para o autor toda narrativa dispõe de um
componente verdadeiro, histórico e coletivo. Diante disso, foram construídas essas histórias
ficcionais – porque embaralham muitas vozes – mas são reais, na medida em que remonta
trajetórias vivenciadas. Vale ressaltar a importância de contar essas histórias, mas de uma
maneira que proteja ao máximo as mulheres que as vivenciaram.

5.1 Vídeo

No vídeo é feito um breve relato sobre a pesquisa, com os objetivos e metodologia.


Os resultados da pesquisa foram apresentados através de duas histórias ficcionais. Finaliza
com os agradecimentos e informações relacionadas a dissertação. Abaixo está o código QR
code (Figura 2) do vídeo:

Figura 2 - Código QR Code

Fonte: Elaborada pela orientadora.


80
5.2 Ebook
81
82
83
84
85
86
87
88
89
90
91
92
5.3 Livro
93
94
95
96
97
98
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114
115
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120
APÊNDICE A - Carta de Apresentação do Projeto de Pesquisa
121
APÊNDICE B - Termo de Compromisso
122
APÊNDICE C - Questão gerativa e tópicos para aprofundamento

Questão gerativa de narrativas e temas para as entrevistas narrativas com as jovens


que tentaram suicídio:

“Conte-me sobre sua história de vida e experiência com a tentativa de suicídio. Você pode
levar o tempo que for preciso e pode dar detalhes de tudo que for importante para você".

Temas a serem formulados preferencialmente como questões imanentes, ou seja,


acompanhado as expressões e entonação utilizada pelas participantes na narração
inicial:

- Contexto da tentativa;
- Estigmas;
- Tratamento;
- Repercussões da tentativa;
- Explorar situações específicas apenas mencionadas na narração central, tais como:
família, equipe multiprofissional no tratamento, pertencimento a grupos, situação no
trabalho, etc.
- Projetos para o futuro;

Informações gerais:

Nome: ________________________________________________________________
Nome fictício: __________________________________________________________
Idade: ________________________________________________________________
Escolaridade: __________________________________________________________
Quantas tentativas de suicídios: ___________________________________________
Trabalho: _____________________________________________________________
Estado civil: ___________________________________________________________
Filhos/as: _____________________________________________________________
123
APÊNDICE D - Retorno das entrevistas não realizadas

INDICAÇÕES RETORNO DO CONTATO

Indicação 1 Disse que iria pensar. Depois disse que não queria.

Indicação 2 Não consegui contato/não teve interesse.

Primeiro contato foi com a mãe dela, que passou o número sem
Indicação 3
questionamentos. A Sarah visualizou a mensagem e escolheu não responder.

Indicação 4 Não consegui contato/não teve interesse.

Indicação 5 Visualizou a mensagem e escolheu não responder.

Inicialmente demonstrou interesse, porém se tornou inviável por questões


Indicação 6
pessoais dela. Com isso, não conseguimos marcar.

Indicação 7 Não respondeu ainda

Indicação 8 Número não é dela e nem faz contato

Indicação 9 Não consegui contato/não teve interesse.

Achou a pesquisa interessante, mas acredita que não tenha uma história
Indicação 10 interessante e que a tentativa foi um ato impulsivo. Conversamos e ela escolheu
não participar por acreditar que não teria tanto a contribuir.

Indicação 11 Não consegui contato/não teve interesse.

Inicialmente demonstrou interesse, porém se tornou inviável por questões


Indicação 12
pessoais dela. Com isso, não conseguimos marcar.

Indicação 13 Não consegui contato/não teve interesse.

Indicação 14 Não consegui contato/não teve interesse.

Indicação 15 Não consegui contato/não teve interesse.

Inicialmente demonstrou interesse. Fizemos três tentativas de marcação, em


Indicação 16 todas ela desmarcou em cima da hora. Depois ela não recebeu mais mensagens
minha.

Inicialmente demonstrou interesse. Fizemos duas tentativas de marcação, mas


Indicação 17 para ela estava difícil porque não conseguia alguém para ficar com seus filhos.
Coloquei-me a disposição para ouvi-la caso conseguisse se organizar.
124

Indicação 18 Não consegui contato/não teve interesse.

Indicação 19 Não consegui contato/não teve interesse.

Respondeu que no momento não estava sentindo confortável para falar sobre.
Indicação 20
Fiz um breve acolhimento e agradeci o retorno.

Inicialmente demonstrou interesse. Agendou uma entrevista e não compareceu,


Indicação 21
sem ao menos desmarcar.

Fiz o contato inicial com o número cadastrado/informado para o hospital e a


Indicação 22
pessoa não respondeu, com isso, nem consegui contato com a Sofia.

Inicialmente demonstrou interesse. Tentamos um agendamento, mas estava


Indicação 23
complicado para ela por questões de trabalho.

Fiz o contato inicial com o número cadastrado/informado para o hospital e a


Indicação 24
pessoa não respondeu, com isso, nem consegui contato com a Samantha.

Indicação 25 Visualizou a mensagem e escolheu não responder.

Indicação 26 Demonstrou interesse, porém ela mora em Ipatinga. Combinamos que caso ela
viesse a BH me avisaria e se eu conseguisse ir até lá faria novo contato.

Inicialmente demonstrou interesse. Fizemos um agendamento, mas a irmã dela


entrou em trabalho de parto e tivemos que cancelar. Dias após ela me enviou
Indicação 27
mensagem dizendo que tinha entrado em crise e estava viajando. Fiz um breve
acolhimento e finalizamos os contatos.

O pai disse que repassaria meu contato para ela e os cuidadores dela e me daria
Indicação 28
um retorno. Porém, não fez mais contato e respeitei o momento deles.

Foi muito receptiva ao contato, ficou de pensar e me dar um retorno. Tentei


Indicação 29
novo contato, mas ela escolheu não participar.

A mãe retornou dizendo que a Ana havia se casado e foi morar nos EUA.
Indicação 30
Agradeci o retorno.

Disse que iria pensar. Depois disse que não se sentia preparada para falar sobre.
Indicação 31
Fiz um breve acolhimento desse sentimento e finalizamos o contato.

O pai respondeu dizendo que a filha não teria interesse em participar. Não
Indicação 32
chegou a passar o contato da Amanda.

Indicação 33 Demonstrou interesse, não respondeu mais. Tentei novo contato.


125

Ficou interessada, agendamos. Mas um dia antes ela mandou mensagem


Indicação 34
desmarcando e informando que iria internar novamente no dia seguinte.

Indicação 35 Não consegui contato através do número indicado.

Indicação 36 Ficou interessada, fez perguntas, mas parou de responder.

Ela achou a pesquisa interessante. Marcou e desmarcou em cima da hora.


Indicação 37
Tentamos um novo agendamento, mas ela não respondeu mais

Indicação 38 O número indicado não era de ninguém próximo a ela.

A mãe retornou dizendo que ela estava viajando e pediu para fazer novo contato
Indicação 39
após alguns dias. Contato foi realizado, mas a mãe não podia falar.

O pai disse que repassaria meu contato para ela. Porém, não fez mais contato e
Indicação 40
respeitei o momento deles.

Indicação 41 Visualizou a mensagem e escolheu não responder.

Indicação 42 Não consegui contato através do número indicado.

Achou a pesquisa interessante, ficou de pensar se seria possível. Mas, não fez
Indicação 43
novo contato

Achou a pesquisa interessante, ficou de pensar se seria possível. Mas, não fez
Indicação 44
novo contato

Indicação 45 Uma amiga informou que passaria o recado. Mas não houve nenhum retorno.

O pai passou um contato fixo para falar com ela, porém não foi possível
Indicação 46
encontrar ela em casa de forma que desse para falar com ela.

Os pais disseram que falaria com ela. Mas, decidiram que seria melhor que ela
Indicação 47
não participasse.

Estava viajando e disse que isso impediria o encontro. Mas demonstrou


Indicação 48
interesse em participar
126
APÊNDICE E - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS


Pró- Reitoria de Pesquisa e de Pós-graduação Comitê de Ética em Pesquisa - CEP

N.º Registro CEP: CAAE 19647619.4.0000.5137


Título do Projeto: intitulado “Narrativas de mulheres jovens que tentaram suicídio”.

Prezada Sra.,
Você está sendo convidada a participar de uma pesquisa que tem por objetivo
compreender histórias de vida de jovens mulheres que passaram pela experiência de
tentativa de suicídio.

Você foi selecionada porque é uma mulher jovem, tendo entre 18 e 29 anos, por ter
tentado suicídio e estar em acompanhamento profissional em um hospital referência em
saúde mental. A sua participação nesse estudo consiste em conceder uma entrevista na
qual será convidada a narrar sua história de vida e experiência com a tentativa de
suicídio. Os riscos (e/ou desconfortos) envolvidos nesse estudo dizem respeito à
dificuldade ou não que você terá em falar dos assuntos que interessam a esse estudo.
Caso perceba algum desconforto durante a entrevista, esta poderá ser interrompida e sua
decisão sobre continuá-la ou não será inteiramente respeitada. Trata-se de uma pesquisa
desenvolvida pela psicóloga Luana Rodrigues de Freitas Alves sob supervisão da Prof.ª
Dra. Luciana Kind do Nascimento, do curso de Pós Graduação da PUC Minas.

Sua participação é muito importante e voluntária e, consequentemente, não haverá


pagamento por participar desse estudo. Em contrapartida, você também não terá nenhum
gasto. As pesquisadoras responsáveis pela entrevista irão até você para realizá-la no
hospital em que encontra-se em tratamento e no horário em que for mais conveniente.

As informações obtidas nesse estudo serão confidenciais, sendo assegurado o sigilo sobre
sua entrevista em todas as fases da pesquisa, e quando da apresentação dos resultados em
publicação científica ou educativa, uma vez que os resultados serão sempre apresentados
como retrato de um grupo e não de uma pessoa. Você poderá se recusar a participar ou a
responder algumas das questões a qualquer momento, não havendo nenhum prejuízo
pessoal se esta for a sua decisão.

Todo material coletado durante a pesquisa ficará sob a guarda e responsabilidade da


pesquisadora responsável pelo período de 5 (cinco) anos e, após esse período, será
destruído.
Os resultados dessa pesquisa servirão para subsidiar reflexões sobre as tentativas de
suicídio que podem BENEFICIAR ações voltadas à prevenção das mesmas.

Para todas as participantes, em caso de eventuais danos decorrentes da pesquisa, será


observada, nos termos da lei, a responsabilidade civil.
127
Você receberá uma via deste termo onde consta o telefone e o endereço da pesquisadora
responsável, podendo tirar suas dúvidas sobre o projeto e sua participação, agora ou a
qualquer momento.

Pesquisadora responsável:

Luana Rodrigues de Freitas Alves


Endereço: Av. Itaú, nº 525 - Bairro Dom Cabral - Belo Horizonte/MG - CEP: 30535012
E-mail: luanarodrigues.psi@gmail.com
Telefone: (31) 2565-6351 / 9 9272-7132

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa envolvendo Seres Humanos
da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, coordenado pela Prof.ª Cristiana
Leite Carvalho, que poderá ser contatado em caso de questões éticas, pelo telefone (31)
3319-4517 ou e-mail cep.proppg@pucminas.br.

Eu, ________________________________, declaro que li esse TCLE ou alguém o leu para


mim, e dou o meu consentimento para a realização da pesquisa.
O presente termo será assinado em 02 (duas) vias de igual teor.
Belo Horizonte, ___ de _______ de _____.

________________________________________ _______________
Assinatura do participante ou representante legal Data

Eu, Luana Rodrigues de Freitas Alves, comprometo-me a cumprir todas as exigências


e responsabilidades a mim conferidas neste termo e agradeço pela sua colaboração e
sua confiança.

________________________________________ _______________
Assinatura da pesquisadora entrevistadora Data
128
APÊNDICE F - Contextualização das entrevistas realizadas e das tentativas de suicídio

1. Marina

A entrevista foi realizada em sua casa, conforme solicitado por ela. Marina fez
questão de me apresentar “seu mundo”, assim ela se referia ao seu quarto. Realmente ao
entrar percebi que existia um mundo ali dentro. Estando ali, ela se sentia segura e pôde
contar sobre sua história de vida, sobre os abusos sofridos e conflitos familiares. Em sua
voz existia sofrimento e muita dor, mas não apresentava desconforto ao falar sobre suas
experiências. Desde o primeiro contato ela foi muito receptiva. Marina tem 23 anos, é
solteira, universitária, mora com os pais, não tem filhos, não está trabalhando e apresenta
uma queixa quanto a isso porque acha que está difícil ingressar no mundo do trabalho e
relata que perdeu as contas de quantas vezes tentou suicídio.

2. Laura

O primeiro contato foi realizado com a mãe. Ela transmitiu a mensagem à filha que
muito disponível retornou o contato, expliquei sobre a pesquisa e ela se disponibilizou a
participar, porém, deixando claro que ficaria um pouco difícil ir até o consultório para fazer
a entrevista uma vez que estava nos dias finais de uma gestação. Perguntou se seria possível
ir até ela. Agendamos e a entrevista aconteceu na área de festas de seu condomínio. Laura
estava, aparentemente, se sentindo confortável para falar sobre sua experiência. Contou
sobre suas dificuldades familiares, conflitos nos relacionamentos amorosos e sobre o viver
o estigma por ter tentado suicídio, afinal, “ela tinha uma vida perfeita e não tinha motivos
para isso”. Laura tem 29 anos, é casada, formada em direito, mora com o marido, estava
gestante da primeira filha, tem trabalhado de forma autônoma auxiliando na fazenda do pai
e relata que tentou suicídio por quatro vezes.

3. Camila

O primeiro contato foi realizado com sua mãe que imediatamente disse que não
achava uma boa ideia a participação dela na pesquisa. No entanto, instantes após ela disse
que havia conversado com a filha que se interessou muito em participar e com isso me
passou o número para contato direto com ela. Ao enviar mensagem ela disse de seu
interesse em participar e agendamentos a entrevista. Horas antes ela envia mensagem
dizendo que não iria conseguir ir até o consultório e perguntando se eu poderia ir até ela e
assim foi feito. Ao chegar lá, notei que não era interesse do companheiro que eu estivesse
ali e isso gerou uma inquietação muito grande em mim, mas ela reforçava constantemente
que gostaria de falar comigo e que queria ajudar outras mulheres. Iniciamos a entrevista na
sala de sua casa e ela parecia muito tranquila e sempre muito disponível. Após um breve
período, o companheiro foi para sala e começou a fazer interrupções nos relatos dela. No
129
entanto, apesar de demonstrar a ele que não gostaria que ele estivesse ali, ela parecia não
considerar sua presença porque dava continuidade a sua história sem se importar com o que
ele estava dizendo. Ela contou sobre seus relacionamentos afetivos e conflituosos, sobre a
doença da filha e também conflitos familiares. Camila tem 27 anos, é solteira, porém vive
em união estável há alguns meses, possui ensino médio completo, mora apenas com o
companheiro, tem duas filhas e a mãe dela quem tem a guarda das crianças, trabalha no
restaurante da família do companheiro e relata que foram oito tentativas de suicídio.

4. Gabriela

Recebo Gabriela no consultório para a realização da entrevista. Ela conta sobre a


descoberta e vivência do diagnóstico de esquizofrenia de seu irmão. Ela atribui sua
tentativa e questões de saúde mental ao contexto com o irmão por acreditar que “tem um
pouco de carga genética”. Demonstrava muita objetividade e distanciamento nos relatos,
porém, muito disponível desde o primeiro contato. Gabriela tem 28 anos, é solteira,
nutricionista, mora em uma república em Belo Horizonte porque sua família é de outra
cidade, não tem filhos, trabalha como nutricionista e relata que teve apenas uma tentativa
de acabar com a própria vida por desespero.

5. Dame Vide

O primeiro contato foi realizado com a mãe que imediatamente repassou meu
número para filha. Dame Vide me aciona perguntando o motivo do contato e eu esclareço
com muito cuidado. Ela demonstra ter ficado animada e elogia a iniciativa. Conta que
estava escrevendo um livro no qual contava sua experiência com a tentativa de suicídio
através de poesias e agendamos imediatamente sua entrevista. Ela chega ao consultório
muito elegante e simpática. Conta sobre seu diagnóstico de hiperatividade e dislexia desde
a infância e sobre as dificuldades em viver com muito esforço para dar conta de
acompanhar suas turmas. Além disso, contou sobre os conflitos com a figura materna e nos
relacionamentos amorosos. Dame Vide tem 22 anos, é solteira, formada em história, mora
sozinha com seus gatos, não tem filhos, não está trabalhando e relata que teve quatro
tentativas de suicídio.

6. Flor

Flor chegou aparentando ser uma jovem muito tímida e interessada em participar da
pesquisa. Aceitou o convite logo após ouvir as informações sobre a pesquisa. Relatou que
faz tratamento para depressão desde os 15 anos e que aos 17 foi diagnosticada com
transtorno bipolar. Relatou que quando está em mania se sente mais encorajada a tentar
suicídio e que no período depressiva se sente totalmente sem ação. Mas em ambos os
períodos percebe que não tem desejo por cuidar de sua vida, podendo inclusive, se colocar
130
em situações de risco de forma proposital. Ele falava baixinho e demonstrava pouca energia
vital, foi acompanhada pelo namorado e contou sobre seus conflitos de relacionamentos
anteriores e sobre suas dificuldades cotidianas. Flor tem 29 anos, é solteira, tem uma
graduação interrompida, mora com os pais, não tem filhos, não está trabalhando e relata
que teve oito tentativas de suicídio.

7. Alice

Uma amiga da Alice foi quem recebeu o primeiro contato e passou o número dela.
Após enviar mensagem dizendo sobre a pesquisa e realizando o convite para participar, ela
informou que participaria e não via nenhum problema em falar sobre isso, além de acreditar
que isso poderia ajudar muitas outras pessoas que precisam em relação a isso. Alice contou
sobre dificuldades na vida profissional, familiar e afetiva. Ela tinha uma postura calma ao
relatar os fatos. Alice tem 26 anos, é solteira, tem uma graduação incompleta, mora em uma
república porque os pais são do interior, não tem filhos, não está trabalhando e relata que
teve duas tentativas de suicídio.

8. Júlia

O primeiro contato foi realizado com o noivo da Julia que se encarregou de fazer a
ponte da comunicação com ela. Logo em seguida, foi possível ter contato direto com ela e o
agendamento foi realizado para o mesmo dia, tanto pelo WhatsApp quanto pessoalmente
ela fez questão de dizer da importância da pesquisa que estava desenvolvendo e que que era
importante para ela poder participar. Júlia iniciou dizendo que sempre teve uma tendência a
se “auto fazer mal” e que foi uma criança muito ansiosa. Além disso, conta sobre a
experiência de descobrir, aos 18 anos, e viver com uma doença autoimune que o
“psicológico interfere demais”. Julia tem 26 anos, é solteira, tem uma graduação
incompleta, mora com o noivo, não tem filhos, não está trabalhando e relata que perdeu as
contas de quantas vezes tentou acabar com a própria vida.

9. Pietra

A aproximação com a Pietra foi muito tranquila, ela se interessou pela participação
sem nenhum questionamento sobre a pesquisa. Agendamos para dois dias após e lá estava
ela, em meu consultório, no horário marcado, usando pijamas. Ela estava, aparentemente,
muito confortável para falar sobre suas experiências e tentativas. Foi minuciosa nos relatos,
dando a entender que queria contextualizar cada situação. Em alguns momentos, notava que
ela ficava mais animada ao relatar sua vida e dores e parecia um pouco distanciada. Pietra
tem 20 anos, é solteira, tem uma graduação em curso, mora com o pai e a avo, não tem
filhos, tem trabalhado de forma autônoma e declara que fez duas tentativas de suicídio.
131

10. Juliana

Juliana estava viajando quando realizei o contato. Ela se interessou em participar da


pesquisa e se disponibilizou para realizarmos online porque acreditava que seria a melhor
maneira de nos encontrarmos e assim foi feito. Após breve tempo em que havíamos
iniciado, a mãe de seu namorado acordou e a encontrou na sala. Nesse momento, notei que
ela ficou um pouco limitada na fala, solicitando que fossem feitas perguntas e respondendo
de forma monossilábica. Por este motivo sua entrevista não foi incluída para análise na
pesquisa. Porém, foi decidido que colocaria aqui um breve relato. Juliana contou
brevemente que sempre foi uma criança estranha e que sua primeira tentativa de suicídio foi
aos 9 anos. Durante a adolescência teve inúmeras tentativas também, sendo a última vez em
agosto do ano passado por ter vivenciado muitos conflitos. Juliana tem 21 anos, é solteira,
tem uma graduação em curso, mora com a mãe, não tem filhos, não trabalha e declara que
tentou suicídio por oito vezes.

11. Olivia

O primeiro contato foi realizado com a mãe que sem restrições passou o contato
dela. Olivia foi muito receptiva ao contato e se disponibilizou imediatamente a participar da
entrevista. No dia seguinte ao contato pelo WhatsApp a recebi em meu consultório. Ela
estava acompanhada pelo avo e aparentemente estava tranquila. Como na maioria das
entrevistas, eu estava ali inteiramente para ouvi-la. Ela conta sobre suas experiências de
vida que influenciaram no seu processo depressivo e em suas tentativas e suicídio, tais
como, abusos sexuais, conflitos familiares e afetivos. Olivia tem 22 anos, é solteira, tem
uma graduação em curso, mora com os pais, não tem filhos, não trabalha e relata que
perdeu as contas de quantas vezes tentou suicídio.

12. Cris

Cris ao receber o primeiro contato explicando sobre a pesquisa e fazendo o convite,


se disponibilizou a participar da entrevista e indicou o melhor dia e horário. Certamente,
isso facilitou o agendamento para a semana seguinte. Logo no início da entrevista ela me
surpreende ao dizer que nunca havia tentado suicídio. Naquele momento me despertei para
ouvi-la ainda mais atentamente, em especial pelos relatos de automutilação desde a infância
e pela fala “eu não tinha mais vontade de viver”. Mais adiante faremos uma reflexão acerca
destas questões. Cris tem 28 anos, é solteira, graduação completa em química, mora com
quatro amigas, não tem filhos, trabalha na área de formação e relata que se machucou umas
30 vezes.
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ANEXO A - Aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa
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