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FICHA CATALOGRÁFICA
Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
___________________________________________________________________________
Prof.ª Dra. Luciana Kind do Nascimento - PUC Minas
___________________________________________________________________________
Prof.ª Dra Cássia Beatriz Batista e Silva - UFSJ
___________________________________________________________________________
Prof.ª Dra Luciana Gaudio Martins Frontzek - UniBH
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AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus e a todos os guias que me ampararam em todos os passos que dei.
Agradeço ao meu querido e amado esposo, Alison Amarante, pelas discussões e reflexões
constantes e por compreender os momentos de ausência e cansaço.
Agradeço a minha mãe por me dar a vida e confiar nas escolhas que faço.
Agradeço a minha madrinha e segunda mãe, Ermelinda, mais conhecida como Dindinha, por
ser exemplo e incentivo desde minha infância.
Agradeço ao meu padrinho e pai por enviar mensagens constantes dizendo que tudo daria
certo.
Agradeço a pequena Maria, minha enteada, que carinhosamente cuidou de mim em meus
momentos de estudo.
Agradeço a minha irmã, Kelly Mayrink, e minha grande amiga, Luciana Gaudio, por serem
minhas incentivadoras e por terem possibilitado que este sonho se realizasse.
Agradeço a minha irmã, Luana Lima, por acreditar em meus projetos e dividi-los comigo.
Agradeço a toda equipe do Hospital Espírita André Luiz que carinhosamente aceitaram a
parceria e contribuíram para que esta pesquisa se concretizasse.
Agradeço a FAPEMIG por acreditar no potencial de pesquisa e ser a principal responsável por
este tempo de crescimento pessoal e profissional.
Agradeço a professora Luciana Kind por me acompanhar e ensinar tanto neste tempo.
Agradeço aos colegas que estiveram presentes durante essa caminhada e com quem pude
dividir as alegrias e angústias do processo.
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RESUMO
Essa dissertação apresenta um estudo sobre suicídio de mulheres jovens que tentaram suicídio
e foi construída em formato de artigos. O objetivo geral da pesquisa foi compreender histórias
de vida de mulheres jovens que passaram pela experiência de tentativa de suicídio. Os
objetivos específicos foram: realizar uma revisão sistemática da literatura sobre suicídio e
mulheres; descrever as motivações narradas pelas participantes do estudo para a tentativa de
suicídio; investigar os desafios que as mulheres vivenciam após a tentativa de suicídio não
fatal; produzir conhecimento para subsidiar reflexões e propostas de intervenções que visam à
redução dos comportamentos suicidas. A metodologia foi qualitativa e teve como método de
produção de material empírico a pesquisa narrativa. O projeto foi aprovado pelo Comitê de
Ética e Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. As narrativas com as
mulheres apontaram que existe uma relação consistente entre situações de violência com a
tentativa de suicídio. As situações que mais se apresentaram foram: abuso sexual, violência
psicológica e física. O comportamento suicida também foi atravessado por dificuldades
relacionadas à comorbidades. Esse estudo reforça a necessidade de mais pesquisas que
explorem o suicídio de mulheres jovens, em especial, porque estamos diante de uma
problemática que possui facetas múltiplas. A pesquisa abre possibilidade para discussões que
poderão auxiliar na criação de medidas preventivas e que ampliam a circulação de
informações sobre o tema.
ABSTRACT
This dissertation presentes a study on suicide of Young women who attempted suicide and
was constructed in the formo f articles. Tha general objective of the research was to
understand life histories of Young women who went through the experience of attempting
suicide. The specific objectives were: to carry out a systematic review of the literature on
suicide and women; description as motivations narrated by the study participants for the
suicide attempt; investigating the challenges that women experience after attempting non-fatal
suicide; knowledge to support reflections and proposals for interventions aimed at reducing
suicidal behaviors. The methodology was qualitative and had as a method of producing
empirical material the narrative search. The Project was approved by the Ethics and Research
Committee of the Pontifical Catholic University of Minas Gerais. The narratives with women
pointed out that there is a consistente relationship between situations of violence and
attempted suicide. The most likely hypotheses: sexual abuse, psychological and physical
violence. Suicidal behavior was also affected by difficulties related to comorbidities. This
study reinforces the need for more research that explores the suicide of Young women,
especially because we are facing a problem that gas multiple facets. The research opens up the
possibility for the exercise to assist in the creation of preventive measures that expand the
circulation of information on the topic.
Saúde
INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 16
1.1 Caminhos metodológicos .......................................................................................... 18
1.1.1 Etapas da pesquisa ............................................................................................... 23
Referências ....................................................................................................................... 24
A pesquisa tem como referência as abordagens qualitativas, uma vez que busca
compreender qual é o significado que as participantes atribuem aos diversos aspectos de
suas vidas (Minayo, 2007) e o uso das narrativas enquanto método de pesquisa se deu por
acreditar no que aponta Gluck citada por Santhiago (2016) ao dizer que a entrevista é “um
19
encontro feminista que empoderava igualmente entrevistadora e narradora” (p. 87).
Santhiago (2016) ao analisar o texto de Sherna Berger Gluck, de 1977, faz um recorte e traz
para sua reflexão que independente da mulher que é convidada a narrar sua história de vida
a outra mulher, e que por mais distantes que sejam as realidades que possam vivenciar,
existe um fio comum que é capaz de ligá-las.
Existem várias abordagens quanto ao modo de se trabalhar com narrativas, e elas
possuem visões distintas a partir da área em que estão sendo trabalhadas. Por exemplo, os
sociólogos e antropólogos se interessam em compreender a totalidade de uma narrativa, e
um trabalho que vem sendo muito reconhecido é desenvolvido por Catherine Riessman. Já
os sociolinguistas optam por trabalhar fragmentos de narrativas e voltam-se às suas
estruturas, um nome muito divulgado por este tipo trabalho é de William Labov. Outra área
que também apresenta novo olhar é a psicologia, ela busca ordenar de forma temporal e
progressiva uma narrativa e a divide em episódios, um nome influente é o Jerome Bruner
(Tamboukou, 2016). Como é possível notar, a pesquisa narrativa é múltipla.
A pesquisa narrativa considera que sujeito e sociedade não podem ser vistos
separadamente, a narrativa se torna um terreno fértil para compreender eventos
psicossociais. Tamboukou (2016) ao falar sobre o que é narrativa aponta que a questão
principal deveria ser “o que uma narrativa faz?”. Dessa forma, seria possível aproximar de
suas manifestações. E, no momento seguinte seria possível pensar sobre suas condições e
possibilidades. A questão em si não é sobre definir as características da narrativa, “mas
trata-se de rastrear suas continuidades e descontinuidades, bem como as diferenças e as
repetições de como as narrativas são contadas e usadas nas ciências sociais.” (Tamboukou,
2016, p.70). As narrativas possuem três características principais:
A partir da narração é possível reconstruir histórias e contextos uma vez que ela
aponta para detalhes como o tempo, o lugar, as palavras e sentidos próprios da sua
experiência de vida, bem como de sua subcultura e grupos sociais. “Através da narrativa, as
pessoas lembram o que aconteceu, colocam a experiência em uma sequência, encontram
20
possíveis explicações para isso, e jogam com a cadeia de acontecimentos que constroem a
vida individual e social” (Jovchelovitch & Bauer, 2007, p. 91). Também constroem
significados em suas vidas, por isso, a narrativa é um ponto central para as ciências sociais
(Tamboukou, 2016). Para a autora, “as narrativas devem ser entendidas como uma
sequência de eventos organizados em um todo, de modo que o significado de cada evento
possa ser compreendido a partir de sua relação com todo” (Tamboukou, 2016, p.71).
Jovchelovitch e Bauer (2007) acrescenta que
O que define o começo e fim de uma história é o enredo. Portelli (2016) acrescenta
ainda que “a narrativa também não é um texto fixo e um depósito de informações, mas sim
um processo e uma performance” (p.19). Schütze declarou que as narrativas podem ser
expressas por três formas: detalhada, fixação da relevância ou fechamento da Gestalt
(Jovchelovitch & Bauer, 2007; Rosenthal, 2014).
Quando o esquema autogerador é o detalhamento, o narrador oferece o máximo de
detalhes a fim de contextualizar a sua fala e fazer ligações com os próximos
acontecimentos. Já na fixação da relevância, o entrevistado seleciona aquilo que irá dizer
apenas com as informações relevantes sobre os fatos, de acordo com aquilo que lhe é
importante e significativo. Por fim, o fechamento da Gestalt é quando se conta em
totalidade um acontecimento central (Jovchelovitch & Bauer, 2007; Rosenthal, 2014), esse
esquema autogerador “estimula o falante a dar forma às estruturas cognitivas iniciais”
(Rosenthal, 2014, p.189).
A pesquisa narrativa tem como ponto central a singularidade de quem se conta, mas
não é individualista. A investigação narrativa está inserida na política e é o local do
conhecimento encarnado por possuir uma história única. O self narrável tem um caráter
nômade, ou seja, não é um self dado, fixo, único e inalterável, ao contrário, possui vários
eus com níveis diferentes posições de sujeitos. As narrativas abrem espaço para o
21
imaginário, uma vez que ele “dá acesso às realidades do mundo social” (Tamboukou, 2016,
p. 77).
O fazer pesquisa narrativa envolve considerar o espaço-tempo e ter a certeza que
nem sempre existirá uma linearidade nas histórias. A pessoa que narra pode ir e voltar no
tempo para falar sobre alguma experiência, o que reafirma que ela pode se dizer no presente
a partir do que o constituiu no passado. A investigação narrativa implica a presença do
poder e desejo, no entanto, vale considerar que as histórias “não são apenas efeitos
condicionados pelas relações de poder, conhecimento e desejo. Histórias fazem coisas: elas
produzem realidades. A pesquisa narrativa é, portanto, sobre o poder constitutivo das
histórias em produzir realidades e sujeitos” (Tamboukou, 2016, p. 78).
Na década de 1970, Fritz Schütze apresentou uma nova técnica para realização de
entrevistas abertas, a entrevista narrativa. Rosenthal (2014, p.170) aponta que “é nela que
vemos o „princípio da abertura‟ ser aplicado da maneira mais sistemática, tanto na
realização da entrevista quanto nas diversas formas de análise de dados.”
A entrevista narrativa acontece a partir de uma pergunta gerativa de narrativa. A
pesquisadora gera uma pergunta de modo que encoraje e estimule a narradora a contar sua
história de vida, bem como o meio em que está inserido (Jovchelovitch & Bauer, 2007).
Não devem acontecer interrupções para não interferir no fluxo de memórias e não
prejudicar o processo de narração de história. Através dos relatos mais livres e longos, sem
interrupções, “é possível observar com clareza o modo como o entrevistado emerge em
fluxo narrativo e de lembranças enquanto também ativa a sua memória sensitiva e constrói
histórias cada vez mais detalhadas” (Rosenthal, 2014, p. 189). Ela é uma entrevista aberta e
não estruturada e possui características específicas (Jovchelovitch & Bauer, 2007).
A entrevista narrativa é constituída pelas seguintes fases: a) iniciação: neste
momento é colocada a pergunta gerativa de narrativa e feito o convite para que a pessoa
narre sua história; b) narrativa principal: nesta fase não deve acontecer interrupções e
devem ser utilizadas apenas manifestações paralinguísticas (Humm). Nesta fase é possível
tomar nota de algumas palavras chaves para a próxima etapa, ela pode durar alguns minutos
ou várias horas e é importante esperar pelo momento de coda (sinal de finalização) do
entrevistado; c) fase de questionamentos: deve iniciar a partir das anotações realizadas na
fase anterior e seguir a ordem de acontecimentos escolhida pelo entrevistado. As perguntas
devem encorajá-lo a dar mais detalhes de uma determinada situação e por isso, não cabem
22
perguntas como “por quê”; d) conclusão da entrevista: deve considerar que a entrevista não
seja finalizada em momento que o entrevistado estiver relatando uma situação muito difícil,
deve ser possível encorajá-lo a continuar contando para que possa emergir acontecimentos
advindos pelo ocorrido anterior. Nesta fase, já com gravador desligado, é possível lançar
outras perguntas e não é necessário excluir os “por quês”. Após toda finalização deve-se
realizar anotações de todos os acontecimentos após o gravador ser desligado (Jovchelovitch
& Bauer, 2007; Rosenthal, 2014).
Fritz Schütze construiu uma proposta para a análise das narrativas. Em momento
inicial, é necessário realizar uma transcrição detalhada do material verbal. A segunda fase
consiste em dividir o material em indexados, ou seja, a quem fez o quê, quando, onde e por
quê, e não indexados, quais são os valores, juízos e como os acontecimentos são
vivenciados. A terceira fase implica em analisar e ordenar o conteúdo indexado em
trajetórias individuais. Na fase quatro, o conteúdo não indexado será analisado buscando
identificar o que aparece como “conhecimento”. Na quinta fase, será realizado um
agrupamento e comparação entre as histórias individuais. Na sexta e última fase, é possível
identificar trajetórias coletivas a partir das aproximações das experiências individuais
(Jovchelovitch & Bauer, 2007). Vale considerar que este é apenas uma maneira de se olhar
para as entrevistas narrativas. Riessman (2008) propõe quatro abordagens para analisar as
narrativas:
Na fase 1, foram realizadas duas reuniões junto ao Hospital Espírita André Luiz
para estabelecimento de parceria para execução da pesquisa. Após alinhamentos dos passos
a serem seguidos durante a fase empírica do trabalho, tais como os critérios a serem
adotados para reconhecimento das possíveis indicações para as entrevistas, foi estabelecido
o compromisso entre as partes. Nesta etapa foi enviada uma carta de apresentação do
projeto de pesquisa (Apêndice A) e assinado por responsáveis do hospital um Termo de
Compromisso (Apêndice B).
Também na primeira fase da pesquisa, o projeto de pesquisa intitulado “Narrativa de
mulheres jovens que tentaram suicídio” foi tramitado pelo Comitê de Ética em Pesquisa
24
(CEP) da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas) no período de
julho a setembro de 2019. Após aprovação recebeu um número referente ao parecer do CEP
que se chama Certificado de Apresentação de Apreciação Ética (CAAE)
19647619.4.0000.5137 (Anexo A). Através deste número é possível consultar o parecer
junto ao comitê de ética.
Na fase 2 foi realizada uma revisão sistemática com a finalidade de “fundamentar
teoricamente o objeto de estudo, contribuindo com elementos que subsidiam a análise
futura dos dados obtidos” (Lima & Mioto, 2007, p. 44). No artigo que se encontra no
capítulo 2 é possível ver a metodologia mais detalhada. Também foi realizado um ensaio
teórico de elementos conceituais. Os resultados estão no artigo que se encontra como
capítulo 3 desta dissertação.
Ainda na fase 2, foram realizadas doze entrevistas com mulheres com idade igual ou
superior a 18 anos e no máximo 29 anos e que tentaram suicídio pelo menos uma vez, tendo
como embasamento a proposta da pesquisa narrativa. A entrevista narrativa tem como base
uma “pergunta gerativa de narrativa” e tem como finalidade encorajar a entrevistada a
contar sua história (Flick, 2009; Jovchelovitch & Bauer, 2007). Nesta pesquisa a questão
gerativa utilizada foi: “Conte-me sobre sua história de vida e experiência com a tentativa
de suicídio. Você pode levar o tempo que for preciso e pode dar detalhes de tudo que for
importante para você". O Apêndice C apresenta tópicos para a formulação de questões de
aprofundamento que foram utilizadas, preferencialmente de forma imanente à narração
inicial.
O hospital parceiro realizou a indicação de 60 mulheres e destas foi possível realizar
a entrevista apenas com 12. No Apêndice D é possível ver uma planilha com o retorno de
todos os contatos realizados que não resultaram em entrevistas. Os detalhes quanto à
metodologia da pesquisa empírica se encontram no artigo 3, no capítulo quatro.
Já na terceira fase, as entrevistas foram transcritas, em segundo momento houve
nova escuta dos áudios acompanhados das transcrições e, em seguida, elas foram analisadas
a partir da análise dialógica performativa proposta por Riessman (2008). No Apêndice F
consta uma breve contextualização do contato com cada uma das entrevistadas. Os
resultados das análises também são possíveis ser vistos no artigo três desta dissertação.
A dissertação será apresentada em forma de artigos. Sendo que os dois primeiros
trazem pesquisas teóricas e o terceiro conta com a apresentação da pesquisa empírica. Em
25
função disso, cada seção, desde esta Introdução, conta com as referências específicas
utilizadas no corpo do texto. Além dos artigos, a este material conta com um capítulo com
as produções técnicas que foram desenvolvidas.
Referências
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27
2 TENTATIVA DE SUICÍDIO DE MULHERES: uma experiência atravessada por
violências e perdas1
Resumo
Neste artigo apresentamos uma revisão sistemática da literatura a fim de aprofundar o
conhecimento sobre o suicídio entre mulheres jovens na contemporaneidade. Pesquisas
com essa temática são escassas na produção brasileira por considerarem que mulheres se
suicidam menos que os homens. No entanto, elas tentam mais contra a própria vida e os
dados divulgados pelo boletim do Ministério da Saúde (Brasil) em 2019 apontaram que elas
são responsáveis por 70% das tentativas. A estratégia metodológica foi uma revisão
sistemática da literatura realizada no Portal Periódicos CAPES e utilizou-se dos
indexadores “suicídio AND mulheres” e “tentativa de suicídio AND mulheres”, totalizando
em oito artigos para leitura na íntegra e análise dos dados. O trabalho analítico resultou na
construção de três eixos temáticos: I) A experiência de violência nas relações afetivas; II)
Violência psicológica e física nas relação familiar primária; e, III) O luto, as perdas e
comorbidades. As discussões sinalizam que as mulheres tendem a recorrer ao suicídio
como modo de resolução de seus problemas e das dificuldades, principalmente quando
acreditam que não tem outra solução, senão morrer.
Palavras-chave: Mulheres; suicídio; tentativa de suicídio; violência doméstica;
patriarcado; feminismo.
Abstract
In this paper we present a research which aim was to conduct a systematic review of the
literature in order to deepen the knowledge about female suicide. Researches with this
theme are scarce because they consider that women are less effective in suicide than men.
However, they are more likely to attempt against their own lives than men, and the data
released by the Ministry of Health bulletin in 2019 pointed out that women are responsible
for 70% of the attempts of suicide. The methodological strategy was a systematic review of
the literature carried out on the Portal Periódicos Capes and used the indexes “suicide AND
women” and “suicide attempt AND women”, totaling eight articles for reading in full and
1
O artigo será submetido à Revista Psicologia em Pesquisa. Todas as adequações às normas serão revistas
antes da submissão.
28
analyzing the data. The analytical work resulted in the construction of three thematic axes:
I) marital conflicts; II) violence and family burden; and, III) mourning, losses and
comorbidities. The discussions indicate that women tend to resort to suicide as a way of
solving their problems and difficulties, especially when they believe that they have no other
solution but to die.
Keyworks: Women; suicide; suicide attempt; domestic violence; patriarchy; feminism.
2.1 Introdução
2.2 Metodologia
A pesquisa tem como referência as abordagens qualitativas, uma vez que busca
compreender qual é o significado que as participantes atribuem aos diversos aspectos de
suas vidas (Minayo, 2007). Para mapear as produções existentes, realizou-se uma revisão
sistemática da literatura com a finalidade de “fundamentar teoricamente o objeto de estudo,
contribuindo com elementos que subsidiam a análise futura dos dados obtidos” (Lima &
Mioto, 2007, p. 44). Diante disso foram estabelecidas algumas etapas da pesquisa,
distribuídas da seguinte forma: a identificação do tema, formulação da questão problema,
estabelecimento de critérios de inclusão ou exclusão dos artigos localizados, avaliação dos
estudos incluídos e análise e síntese dos resultados encontrados.
A coleta dos dados aconteceu no período de setembro de 2019 a março de 2020. A
busca por trabalhos científicos indexados se deu através do Portal de Periódicos CAPES em
dois momentos, sendo que a primeira estratégia de truncagem de termos de busca foi:
“suicídio AND mulheres”. Esta busca gerou um total de 70 resultados. Após a aplicação
dos critérios de refinamento – artigos publicados em periódicos revisados por pares,
publicações dos últimos dez anos e como parâmetro linguístico serem em português,
espanhol e inglês – retornamos um total de 46 textos que foram submetidos à etapa de
leitura seletiva. Nesta etapa foram desconsiderados os trabalhos com viés estritamente
quantitativo e de outras áreas de produção, como enfermagem, medicina e farmácia,
30
gerando um número final de seis artigos. Vale considerar que os artigos de outras áreas
foram excluídos por apresentarem conteúdos muito distantes da experiência vivenciada por
mulheres que tentaram suicídio, por exemplo, o material da medicina e farmácia dizia dos
efeitos dos fármacos no organismo.
Após a leitura dos artigos surgiu a necessidade por realizar uma nova busca, desta
vez com os indexadores “tentativa suicídio AND mulheres” resultando em 384 artigos.
Após aplicar os mesmos critérios utilizados na primeira busca, ficaram 123 documentos
que foram submetidos a leitura seletiva e também passaram pelo refinamento da primeira
busca, ou seja, trabalhos estritamente quantitativos e de outras áreas foram desconsiderados
a partir dos mesmos vieses da busca anterior. Por fim, ficaram cinco artigos que foram lidos
na íntegra. Um dos artigos selecionados para análise refere-se a uma pesquisa realizada
com mulheres portuguesas por acreditar que as experiências não se distanciariam das
mulheres brasileiras e considerar a vivência feminina.
Vale ressaltar que três artigos se repetiram e foram considerados apenas uma vez.
Dessa forma, oito produções foram analisadas e utilizadas como meio de discussão neste
trabalho. Para a coleta de dados e compreensão do tema foi produzido um quadro que conta
com as seguintes informações acerca dos artigos selecionados: autores, ano, título,
objetivos e participantes. Diante disso, foi possível verificar e evidenciar o rigor
metodológico de cada amostra, conforme se observa abaixo. A leitura dos trabalhos
selecionados permitiram a ordenação dos textos em três eixos temáticos que serão
trabalhados adiante.
Pacheco, 2010 Tentativa de suicídio Identificar os casos de tentativas de Quatro mulheres que 1,2 e 3
Damasceno, Souza em mulheres por suicídio por queimaduras em mulheres tentaram suicídio
e Brito queimaduras em um centro de tratamento de
queimados; descrever as
características socioeconômicas das
mulheres que tentaram suicídio por
queimaduras e avaliar os fatores
relacionados à tentativa de suicídio
por queimaduras de mulheres.
Pinto, Alves e Maia 2015 Adversidade na Caracterizar a prevalência das 225 mulheres com 2
infância prediz experiÊncias adversas autorrelatadas idades compreendidas
sintomas em mulheres adultas portuguesas e entre 18 e 78 anos
depressivos e avaliar se essas experiências estão
tentativas de relacionadas a sintomas depressivos e
suicídio em tentativas de suicídio
mulheres adultas
portuguesas
Santos, Lovisi, 2009 Prevalência de Estimar a prevalência dos transtornos 96 pessoas que 3
Legay e Abelha transtornos mentais mentais nos casos de tentativas de tentaram suicídio
nas tentativas de suicídio atendidos em um hospital de
suicídio em um emergência público no Rio de Janeiro,
hospital de Brasil, no período de abril de 2006 a
emergência no Rio março de 2007.
de Janeiro, Brasil
Estudos apontam que diante de conflitos nas relações afetivas, mulheres tendem a
recorrer ao suicídio como tentativa de resolver e acabar com tais situações. Dessa forma,
conflitos conjugais tornam-se fatores predisponentes ao suicídio feminino (Correia et al.,
2014; Macedo, Rosa & Silva, 2011; Meneghel et al., 2013; Pacheco, Damasceno, Souza &
Brito, 2010). No presente trabalho tais conflitos serão considerados violências vivenciadas
por mulheres dentro de suas relações afetivas. Optou-se pela nomenclatura „violência
conjugal‟ não para se tornar generalista e suscitar a ideia de violências mútuas, mas sim,
para compreender o fenômeno da violência contra a mulher dentro de suas relações íntimas.
Pacheco, Damasceno, Souza e Brito (2010) realizaram uma pesquisa em que foram
incluídas quatro mulheres que tentaram suicídio por queimaduras e foram assistidas pelo
Instituto José Frota, um hospital público municipal de grande porte da cidade de Fortaleza,
Ceará. As participantes foram entrevistadas junto ao leito e a entrevista teve duração de 30
a 40 minutos. As autoras afirmam que o trabalho é “uma contribuição de alerta a sociedade
quanto aos fatores de risco ligados às tentativas de suicídio em mulheres” (p. 153).
Destacamos alguns fragmentos dos dados expostos por Pacheco e colegas (2010).
Diamante Mandarim, 34 anos, informou que vivia bem, que brigava com o esposo às vezes,
mas que não era nada demais. No entanto, após ter uma discussão com marido na qual ele
ameaçou sair casa, ela jogou álcool sobre o corpo e disse que iria colocar fogo em si. Ele
pegou a caixa de fósforo da mão da esposa e disse que não o faria. Para acalmar-se, ela
acendeu um cigarro provocando a queimadura. Outra participante daquele estudo, uma
jovem de 25 anos, Beija-flor, relata que a segunda tentativa de suicídio aconteceu após
brigas conjugais. Ela contou que presenciou inúmeros conflitos dos pais e no momento da
tentativa estava desconfiada que o marido a estava traindo e apesar das negações por parte
dele, ela os pegou em flagrante (Pacheco et al., 2015). Estes são breves recortes do trabalho
desenvolvido pelas pesquisadoras.
Diante do exposto, é importante considerar que a existência de violências conjugais,
ausência de afeto, uso abusivo de ácool e outras drogas pelos dos companheiros e
principalmente a vivência de violência psicológica, sexual e física dentro de suas relações
33
afetivas, bem como o sentimento de incapacidade para resolver tais questões fazem com
que o suicídio se torne uma possibilidade concreta de resolução dos problemas.
Macedo, Rosa e Silva (2011) reafirmam essa questão quando apresentam e discutem
os resultados da pesquisa que desenvolveram. Em seu estudo, as mulheres que tentaram
suicídio por queimaduras relataram que a existência de problemas familiares foram as
principais razões para suas ações, em especial, relacionados a pouca compreensão dos
parceiros, bigamia, falta de interesse familiar, carência afetiva, matrimonio precoce e
diferenças de idade.
O trabalho realizado por Macedo, Rosa e Silva (2011) incluiu um total de 15
mulheres que ao recorrer aos cuidados médicos em uma Unidade de Queimados do
Hospital Regional da Asa Norte localizado no Distrito Federal, Brasil, declararam a
intenção de suicidar. Seus resultados apontaram que a maioria das participantes tinham
como motivação para a tentativa de suicídio seus conflitos nos relacionamentos amorosos.
Outra pesquisa que também abordou a temática e trouxe contribuições foi realizada
por Correia e suas colaboradoras (2014). Elas tiveram como objetivo apreender a estrutura
das representações sociais sobre o suicídio para mulheres com história de violência
doméstica e tentativa do mesmo. Foram incluídas 30 mulheres atendidas pelo Núcleo de
Estudo e Prevenção ao Suicídio (NEPS) no Município de Salvador, Bahia, Brasil. Estas
mulheres foram ouvidas através de uma entrevista e foram submetidas à realização de um
Teste de Associação Livre de Palavras (TALP).
Correia e colaboradores (2014) trouxeram uma fala significativa que exemplifica o
que é abordado nesta seção: “é muito difícil a gente falar, denunciar [...] Eles parecem
artistas monstros e depois bonzinhos. Ele me perseguia [...] eu não tinha a quem recorrer
(S3)” (p. 124). O sentimento de desamparo e impotência por não conseguirem romper o
ciclo de agressões sofridas fez com que a mulher em questão tentasse suicídio como uma
maneira de se libertar do aprisionamento emocional. Assim como a participante do estudo
de Correia e colaboradoras (2014) inúmeras mulheres com histórico de violências conjugais
recorrem à antecipação do fim de suas vidas, não significando que o desejo fosse realmente
pela morte, mas sim, por sua libertação. O relato de uma das mulheres participantes da
pesquisa demonstra que além de não conseguir romper com a experiência ruim, ainda gerou
danos psicológicos à mesma: “eu permiti que isso acontecesse porque não conseguia sair
daquilo [...]. A covardia foi tomando conta de mim e tudo que ele dizia eu absorvia [...], fui
34
guardando cada gesto, cada palavra, fui morrendo aos poucos (S7)” (p. 124). De acordo
com Correia e colaboradoras (2014)
Diante deste cenário, vale considerar que muitas mulheres desempenham jornada
dupla porque trabalham fora de casa e ainda são as principais responsáveis pelo cuidado da
casa, dos filhos e manutenção do matrimônio. Meneghel e colaboradores (2013) realizaram
um estudo com a finalidade de identificar as características de gênero presentes nas
histórias de vida de mulheres que se suicidaram. Foram selecionadas sete mulheres que
consideraram que foram marcadas pela desigualdade de gênero, sendo que quatro são de
Candelária, duas são de Porto Alegre e uma de São Lourenço, cidades brasileiras, do Rio
Grande do Sul. A pesquisa foi realizada através de autópsia psicossocial feita com
participação de familiares de mulheres que cometeram suicídio. Os autores apontam que
37
nas narrativas que ouviram, havia “o relato de uma sobrecarga que vai aumentando e parece
que elas morreram quando não tinham mais forças, quando „não aguentavam mais‟.”
(Meneghel et al., 2013, p.211). Ainda acrescentam uma condição que avaliaram
como sobrecarga presente na vida de algumas das mulheres que se suicidaram foi o
desempenho do papel de cuidadora na família. Além do trabalho adicional e estafante que a
atividade de cuidado representa, as mulheres são silenciadas, impedidas de expor
sentimentos, de reclamar, como se o papel que lhe foi concedido tivesse que ser
obrigatoriamente cumprido (Meneghel et al., 2013, p. 210).
Conviver com a perda de entes queridos, cônjuges, pais ou filhos pode gerar
sofrimento psicológico e sentimento de solidão em mulheres em diferentes fases da vida.
Estudos apontam que o luto pode se tornar um período de muito desespero em que a
escolha por findar a dor inclua acabar também com a própria vida (Minayo & Cavalcante,
2013; Pacheco et al., 2010).
Tanto as participantes do estudo de Pacheco e colaboradoras (2010), quanto de
Minayo e Cavalcante (2013) relataram que a dificuldade em lidar com a dor do luto que
despertou o desejo de retirar a própria vida. Canária havia perdido o pai há mais de um mês
e estava sentindo sua falta e não queria mais existir, desejando constantemente se jogar
debaixo dos carros, não se importando nem com o fato de estar grávida (Pacheco et al.,
2010). Já Dona Camélia e Dona Margarida tiveram perdas significativas, a primeira perdeu
a filha por um câncer no fígado e pulmão, enquanto a segunda perdeu o noivo em um
traumático acidente e ainda cuidou dos pais até a morte. Mais tarde, ambas ainda
vivenciaram diagnósticos difíceis, Dona Camélia estava com um tumor no cérebro o que
contribuiu para a decisão de suicidar, e Dona Margarida tinha doença de Alzheimer, que
após algumas tentativas conseguiu consumar o ato (Minayo & Cavalcante, 2013).
38
O estudo realizado por Santos, Lovisi, Legay e Abelha (2009) incluiu 96 pessoas
que tentaram suicídio e foram atendidos no Hospital Municipal Souza Aguiar no Rio de
Janeiro. O atendimento era realizado através do Sistema Único de Saúde (SUS) e o nível
social dos pacientes, em sua maior parte, é muito baixo. A pesquisa teve como objetivo
estimar a prevalência dos transtornos mentais nos casos de tentativas de suicídio atendidos
em um hospital de emergência público no Rio de Janeiro, Brasil, no período de abril de
2006 a março de 2007. Os resultados apontaram que comorbidades psiquiátricas são
presentes em 71,9% dos casos, sendo que os transtornos mais frequentes são o episódio
depressivo maior, uso abusivo de substâncias psicoativas, transtorno de estresse pós-
traumático e abuso de álcool.
Os autores alertam para a necessidade de terem mais atenção às mulheres no início
do curso dos transtornos mentais (Santos et al., 2009). Pacheco e colaboradoras (2010)
reforçam os dados ao apresentarem que a maioria dos pacientes que tentaram suicídio, fatal
ou não, possui comorbidades psiquiátricas. Os principais transtornos foram depressão,
transtorno afetivo bipolar e abuso de álcool.
A pesquisa realizada por Tavares e colaboradores (2012), com uma amostra de 919
mulheres pós-parto, teve como objetivo verificar a prevalência de risco de suicídio e
comorbidades em puérperas apontou que distúrbios psiquiátricos estão fortemente
associados ao risco de suicídio. No entanto, os principais transtornos que apareceram foram
de humor e ansiedade.
Para finalizar, Minayo e Cavalcante (2013) apontam que mulheres tendem a
encontrar no suicídio a solução para “evitar o confronto com perdas funcionais, de
autonomia ou para fugir de dores” (p. 2410).
Referências
Resumo
Neste artigo realizamos um ensaio teórico que articulou categorias conceituais relevantes
para conhecimento sobre as atuais discussões acerca da violência contra mulheres e as
tentativas de suicídio no Brasil, bem como os impactos de tais experiências na decisão de
findar a própria vida. Mulheres em situação de de violência doméstica tendem a carregar
marcas subjetivas mais graves que as possíveis lesões físicas. Em 2018, o Brasil divulgou
que os registros por lesão corporal aumentaram significativamente. Concomitante, os dados
referentes às tentativas de suicídios entre mulheres também aumentou, chegando a ser de 5
a 20 vezes maiores que os de suicídio fatal. A partir desta realidade, foi realizado um estudo
a fim de aprofundar o conhecimento acerta da violência contra mulheres e foi possível
perceber que jovens com idade entre 18 e 29 anos recorrem mais ao atendimento decorrente
de violência doméstica e familiar. Quanto à tentativa de suicídio no Brasil os dados
apontam que o comportamento suicida não fatal é predominante nas mulheres. Por fim,
uma reflexão sobre os impactos das violências nas tentativas de suicídio que demonstrou
que a vivência de violência surge como um dos motivos para a decisão de pôr um fim a
própria vida.
Abstract
Keywords: Women; violence against women; suicide; suicide attempt; female suicide.
43
3.1 Introdução
Diante disso, neste artigo realizamos um ensaio teórico que articulou categorias
conceituais relevantes para conhecimento sobre as atuais discussões acerca da violência
contra mulheres e as tentativas de suicídio no Brasil, bem como os impactos de tais
experiências na decisão de findar a própria vida.
A violência doméstica e familiar contra mulheres é toda ação ou omissão que lhe
cause algum sofrimento físico, sexual, psicológico e dano moral ou patrimonial (Lei
11.340/06, Brasil, 2006a). Pensar em violência contra mulher faz lembrar do percurso e
lutas do movimento feminista no Brasil.
45
A primeira onda do feminismo no país tinha como cerne a luta pelo voto e uma
personagem importante, na década de 1910, foi Bertha Lutz, bióloga e cientista. Ela foi
uma das fundadoras da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, “organização que
fez campanha pública pelo voto, tendo inclusive levado, em 1927, um abaixo-assinado ao
Senado, pedindo a aprovação do Projeto de Lei, de autoria do Senador Juvenal Larmartine,
que dava o direito de voto às mulheres” (Pinto, 2010, p. 16). Esse movimento perdeu forças
na década de 1930, retornando apenas na década de 1960.
O movimento feminista retoma suas lutas nos anos de 1960 e 1970, contribuições de
mulheres brancas e da classe média. Nos anos seguintes, 1980 e 1990, outros grupos de
mulheres que não se sentiam contempladas pelo movimento, criaram novas formas de
vivenciar o feminismo a partir de suas próprias experiências de opressão, discriminação e
violência, demonstrando que existem muitas faces de opressão feminina. A partir de então,
foi considerado a questão de raça e classe social nos discursos dos movimentos (Mayorga,
2014; Santos et al., 2016).
Vale frisar que, além do movimento feminista, existe um movimento de mulheres e
segundo Cisne (2014), o que está no cerne deste movimento é a busca por melhorias das
condições de vida e de trabalhos femininos. Já o movimento feminista lutava contra um
sistema opressor e por liberdade, levantando questões sobre sexualidade, violências,
ocupação de espaços políticos e por ter direitos civis garantidos. Ela ressalta também que
no Brasil, até por uma confusão na delimitação de cada movimento, aconteceu um encontro
pela aproximação das intenções, ou seja, pela identificação de suas pautas. Afinal, ambas
lutam pelas mulheres. No entanto, alguns movimentos de mulheres não compreendem bem
o movimento feminista e podem distorcer sua bandeira.
Mudanças significativas aconteceram em relação à posição da mulher na sociedade,
tais como, a partir de 1988 conquistaram igualdade de direitos na Constituição; em 1998
contavam com maior número de eleitorado; ultrapassaram os homens em todos os níveis
educacionais; e tiveram diversas vitórias específicas na legislação nacional, como a Lei Nº
11.340 - Lei Maria da Penha (Alves et al., 2019). Pinto (2010) afirma ainda que
Uma das mais significativas vitórias do feminismo brasileiro foi a criação do Conselho
Nacional da Condição da Mulher (CNDM), em 1984, que, tendo sua secretária com status
de ministro, promoveu junto com importantes grupos – como o Centro Feminista de
Estudos e Assessoria (CFEMEA), de Brasília – uma campanha nacional para a inclusão dos
46
direitos das mulheres na nova carta constitucional. Do esforço resultou que a Constituição
de 1988 é uma das que mais garante direitos para a mulher no mundo. O CNDM perdeu
completamente a importância com os governos de Fernando Collor de Mello e Fernando
Henrique Cardoso. No primeiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva, foi criada a
Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, com status de ministério, e foi recriado o
Conselho, com características mais próximas do que ele havia sido originalmente. (Pinto,
2010, p. 17)/.
No que tange à violência psicológica, vale considerar que ela afeta diretamente a
saúde psíquica da mulher por gerar um sofrimento intenso, comprometer sua autoestima e
distorcer sua autoimagem. Pode também levá-las a construir crenças de desvalorização e
47
sentimento de insuficiência em tudo que fizer. Guimarães et al. (2018) reforça tal questão
quando diz que
Estudos apontam que jovens com idade entre 18 e 29 anos recorrem mais ao
atendimento decorrente de violência doméstica e familiar contra mulher. Quanto aos
agressores, normalmente, são os companheiros ou ex-companheiros e indivíduos do sexo
masculino e o local em que a ocorrência acontece, em grande maioria, é a residência da
vítima (Garcia, Duarte, Freitas & Silva, 2016; Guimarães et al., 2018; Guimarães &
Pedroza, 2015).
Guimarães e Pedroza (2015) alertam ainda que “altos níveis de feminicídio, com
frequência, são acompanhados por uma grande tolerância quanto à violência contra as
48
mulheres” (p. 257). A cultura construída sob a desigualdade entre gêneros favorece para
que exista uma naturalização da violência sofrida. Com isso, muitas mulheres não recorrem
a meios para findar o ciclo de agressões ou nem acreditam que são capazes de fazê-lo
(Guimarães et al., 2018). Neste ponto, o suicídio aparece como uma opção para libertação.
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53
4 MULHERES JOVENS E TENTATIVA DE SUICÍDIO
Resumo
Realizamos uma pesquisa narrativa a fim de compreender de forma mais ampla o mundo
experienciado de mulheres jovens que tentaram suicídio. As entrevistas aconteceram no
período de outubro de 2019 e março de 2020. Foram entrevistadas doze mulheres que
atentaram contra suas vidas pelo menos uma vez e estiveram internadas no Hospital
Espírita André Luiz, localizado em Belo Horizonte, Minas Gerais. A idade das
participantes variou de 20 a 29 anos. uma oportunidade de narrar suas próprias
experiências. A análise das entrevistas foram embasadas na proposta da análise
dialógica/performática. Os resultados são apresentados a partir de seis subtópicos, sendo
que os dois primeiros contemplam os relatos da tentativa de suicídio que deram mais
destaque e os selves preferenciais das mulheres. Nos demais subtópicos são apresentadas
subtramas sobre as seguintes temáticas que emergiram nas narrativas: abuso sexual,
comorbidades, violência nas relações afetivas e violências vivenciadas nas relações
familiares. As narrativas apontaram que existe uma relação significativa entre mulheres em
situação de violência e a tentativa de suicídio. No entanto, a pesquisa não esgotou as
possibilidades de compreensão do fenômeno, em especial, porque estamos diante de uma
problemática que é multifacetada.
Palavras-chave: Narrativas; narrativas de mulheres; tentativa de suicídio; violência contra
mulheres.
Abstract
We conducted a narrative research in order to understand more fully the experienced world
of Young women who attempted suicide. The interviews took place in the period of
October 2019 and March 2020. Twelve women were interviewed who attempted their lives
at least once and were admitted to the André Luiz Spiritist Hospital, located in Belo
Horizonte, Minas Gerais. The age of the participants ranged from 20 to 29 years. An
opportunity to narrate your own experiences. The analysis of the interviews was based on
opportunity to narrate your own experiences. The analysis. The results are presented from
six subtopics, with the first two contemplating the reports of the suicide attempt that gave
more prominence and the preferred selves of women. In the other subtopics, subplots are
presented on the following themes that emerged in the narratives: sexual abuse,
comorbidities, violence in affective relationships and violence experienced in Family
relationships. The narratives pointed out that there is a significant relationship between
women in situations of violence and attempted suicide. However, the research has not
exhausted the possibilities of understanding the phenomenon, especially because we are
facing a problem that is multifaceted.
Keywords: Narratives; women‟s narratives; suicide attempt; violence against women.
54
4.1 Introdução
O médico inglês, Thomas Browne foi quem definiu o termo “suicídio” no ano de
1643. Em seu livro apresenta duas formas de suicídio, uma com conotação “heróica” e a
outra de ordem “patológica”. Desde então, a temática se tornou um fenômeno de interesse
para psiquiatria (Bertolote, 2012).
Coelho (1997, p. 49) relata que somente “a partir da segunda metade do século
XVIII, as punições em relação ao suicida e seus familiares começaram a ser suavizadas;
não tanto pela compreensão em relação ao suicídio, mas devido ao fato de o indivíduo
isolado perder a importância coletiva que tinha, tanto na antiguidade quanto na idade
média”. No entanto, o suicídio passou a ser cada vez mais considerado patológico. Apenas
no final do século XIX, com as contribuições de Durkheim, o ato foi considerado um
fenômeno social (Bertolote, 2012). A consolidação do suicídio pela perspectiva da saúde
pública se deu entre o final do século XX e início do século XXI, tendo como ênfase a
prevenção de tais comportamentos. Bertolote (2012, p. 21-22) declara que para a
fenomenologia
o suicídio é um processo que se inicia com considerações mais ou menos vagas sobre a
morte e sobre morrer (ideação suicida), as quais podem adquirir consistência (persistente ou
recorrente, flutuante), evoluir para a elaboração de um plano (plano suicida) e culminar
num ato suicida, cujo desfecho pode ser fatal (suicídio) ou não (tentativa de suicídio).
(Bertolote, 2012, p. 21-22).
4.2. Metodologia
A idade das mulheres variou entre 20 e 29 anos. Destas, dez são solteiras, uma é
casada e uma vive em união estável a mais ou menos um ano. Apenas duas mulheres são
mães. Vale ressaltar que na data da entrevista, uma delas estava em dias finais da gestação
60
da primeira filha e a outra não tinha a guarda de suas duas filhas, mas queria recorrer
judicialmente para poder reaver a situação. Quanto à escolaridade, uma havia concluído o
ensino médio, quatro possuem curso superior completo, sendo que duas atuam na área de
formação, uma não está trabalhando e a outra, formada em direito, trabalha administrando a
fazenda do pai. Outras quatro estão em processo de formação no curso superior e outras três
interromperam a graduação por acreditarem que não tem condições psicológicas de
concluir, no momento.
Das doze participantes quatro afirmaram que perderam as contas de quantas vezes
recorreram a tentativa de suicídio como opção para algum conflito, duas mulheres tentaram
oito vezes, duas fizeram quatro tentativas e outras duas tentaram duas vezes. Quanto às
demais, uma tentou sete vezes e a outra apenas uma. O método mais utilizado por onze
delas foi a ingestão de medicamentos psiquiátricos. Uma tentou pular de um viaduto e foi
impedida por um taxista que passava no momento, outras três tentaram pular das janelas de
seus apartamentos e foram impedidas por vizinhos ou familiares. Três mulheres cortaram
os pulsos e todas foram encontradas por familiares e encaminhadas ao pronto atendimento.
Duas entrevistadas relataram que em uma de suas tentativas fizeram a combinação de
medicação, cocaína e bebida alcoólica e a outra combinou a ingestão de medicação e o
corte nos pulsos.
O Ministério da Saúde (Brasil, 2006b) aponta como um fator protetivo o
encorajamento da fala sobre os pensamentos e ideações suicidas, bem como sobre as suas
experiências de sofrimento. Relata-se que as pessoas tendem a ficar agradecidas e aliviadas
e que isso não representa que a ideação será incutida no sujeito. Tendo em vista todos os
cuidados éticos no decorrer de toda a pesquisa, acreditamos que o desenvolvimento da
pesquisa se alinhe com esse fator protetivo, e que tenha sido apresentado para as
participantes como uma oportunidade de narrar suas próprias experiências.
A análise das entrevistas foram embasadas na proposta da análise
dialógica/performática de Riessman (2008). Segundo a autora, a pessoa que narra sua
história constrói uma performance para comunicar o que deseja. Ou seja, a pessoa pode
assumir diversas formas de expressão que se apresentam por performances. Também
aponta que o contexto no qual a produção da narrativa acontece pode interferir nas formas
de narrar. Para ela, “nas entrevistas narrativas (assim como nas interações face a face),
narradores têm uma tarefa a cumprir; eles precisam convencer o ouvinte, que não estava lá,
61
de que certos eventos realmente aconteceram.” (Riessman, 2008, p.86). Nascimento (2016)
reforça que
Marina X
Laura X X X
Camila X X X
Gabriela X
Dame Vide X X X
Flor X X
Alice X X
Julia X X X
Pietra X X X
Juliana X X X
Olivia X X
Cris X X
Nesta sessão, serão apresentadas algumas falas que ilustram o processo de tentar
findar a própria vida, bem como o método que foi escolhido por cada uma. Olivia (22 anos)
relata que por inúmeras vezes tomou medicamentos em excesso e que ia sozinha para o
hospital, sem falar com ninguém da família. Disse e que nunca teve nenhuma complicação
e o que facilitava no momento de justificar aos médicos o motivo de sua consulta. Ela
63
enfatiza uma de suas tentativas que classifica como „uma das piores‟. Conta que havia
iniciado um novo emprego e sentia que sua gestora a tratava muito mal e diante disso:
eu tentei (gagueja) o auto extermínio assim, que eu considero um dos piores pra mim,
porque eu me tranquei no banheiro, num dia que eu sabia que eu tinha que trabalhar, e eu
me desesperei porque eu tinha que trabalhar (riso de nervoso) e ver ela (gestora), então
aquilo foi me pressionando, me pressionando de uma forma, e aí eu peguei a lâmina do meu
irmão de fazer barba e tentei cortar os meus pulsos. Só que ela tava cega, e eu tentando
fazer aquilo, e minha tia batendo na porta, porque ela sabia que eu tava no banheiro e que
não era uma coisa boa. Então ééé ela começou a bater, pedindo pra abrir a porta, e eu
pensava que eu só queria morrer, que eu queria dar um fim naquele sofrimento que eu tava
sentindo (Olivia).
Julia relata que foram muitas tentativas e grande parte com ingestão de medicação.
Dá ênfase a uma ocasião e diz que foi a única vez que ela planejou por mais de um mês e
no dia, despediu de todos e sentia-se muito bem por acreditar que no outro dia não estaria
viva.
„Eu vou morrer hoje, graças a Deus eu não vou viver amanhã‟. Liguei minha música
favorita, da Ariana Grande, coloquei o meu fone de ouvido no talo, e… Tô lá… ouvindo,
tava terminando de espremer os últimos comprimidinhos dentro do zip-lock, quando eu
escutei alguém batendo na minha porta. (...) minha mãe que não mora comigo, desce lá da
casa dela, exatamente naquela hora, exatamente naquele mesmo horário e bate na minha
porta e pergunta o que que tava acontecendo, eu falei: „Nada. Tá acontecendo nada não, por
quê?‟ (...) Então… não deu certo, minha mãe sabia que alguma coisa tava errada. Minha
mãe descobriu… abriu a porta, queria que eu vomitasse tudo o que eu já tinha tomado
(Julia).
Camila afirma que tentou suicídio umas oito vezes, sendo que algumas vezes ingeriu
medicação em excesso, em outra ocasião pegou uma faca para enfiar em seu coração e foi
impedida pelos pais. Também tentou pular do terraço da casa dos genitores. Em algumas
das tentativas precisou ir ao hospital fazer lavagem e relata que foi uma experiência muito
desagradável. Porém dá mais ênfase à sua primeira tentativa:
Meu primeiro suicídio foi com 18 anos... a primeira tentativa. Eu tinha brigado com ele
(namorado), e achava que a vida não tinha mais graça. Era muito nova. Fui na casa de ração
e comprei Chumbinho e fui para casa, só que tratei ele normal, a gente teve uma briga, aí eu
não falei que eu iria fazer nada, não falei pra ninguém. Fui em casa, e cheguei e tomei o
chumbinho. Aí... ele fala que ele ligou pro meu celular várias vezes e que eu não atendia. Aí
ele pulou o muro da minha casa e me achou já desmaiada. Aí me levaram pro hospital,
dessa vez eu cheguei a ficar na UTI 3 dias, é... Mas... Não tive nenhum dano (Camila).
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Flor assim como Camila atentou contra própria vida por umas oito vezes e fez uso
de medicação em excesso. Já se trancou no banheiro com uma faca para cortar os pulsos,
mas os pais perceberam que algo estava errado e arrombaram a porta. Agora, a pior delas
foi quando ela tentou pular da janela do prédio
Foi por causa de relacionamento amoroso, término com o namorado, eu (breve pausa) bebi
(bebida alcoólica), tomei remédio e fui pular da janela, eu tava sozinha em casa, aí os
vizinhos arrombaram a porta e assim, eu vesti a roupa que eu queria ser enterrada ééé fiquei
na janela tomando coragem de me jogar, nesse tempo os vizinhos arrombaram a porta e me
pegaram, aí foi nessa vez que eles me levaram pro pronto socorro e no pronto socorro eles
falaram que só me liberariam se eu fosse internada, aí foi minha primeira internação (Flor).
Das mulheres entrevistadas Gabriela foi a única que havia tentado suicídio apenas
uma vez. Mas, algo comum à todas as demais foi o método utilizado.
Em Janeiro eu tava começando a ficar sem dormir de novo, cada vez com a carga de
remédio para dormir maior, e maior, e maior… E aí eu comecei a ouvir coisas, aí era uma
perturbação mental tão grande que eu peguei todos os remédios que eu tinha e tomei nesse
dia. (Engasgo) A sorte é que no tomar esses remédios depois eu comecei a passar muito mal
e aí eu fui parar na Unimed com muito vômito, aquela coisa toda, e acho que eu consegui
expelir um pouco (Gabriela).
Laura conta que já tentou pular de um viaduto, mas foi impedida por um taxista que
estava passando e percebeu que ela não estava bem e a encaminhou para uma unidade de
pronto atendimento (UPA). Também já tentou pular da janela do quarto na casa dos pais
após uma discussão com o pai. O genitor foi quem a impediu desta vez. Na tentativa através
de remédio ressalta que se o irmão não tivesse chegado, teria morrido porque quando ele
chegou já estava...
… evacuando, vomitando, sem consciência nenhuma, aí ele me levou pro hospital e eu fiz
realmente de caso pensado (...) a minha mãe deixou os meus medicamentos dos dias que ela
ia ficar fora comigo… era mais ou menos uns sete dias, eu tomava uns sete comprimidos
por dia então eu peguei aquela medicação toda e tomei de uma vez e todos os outros
remédios que eu encontrei na casa. ai o meu irmão ia pra um sítio com a namorada e não
iria voltar, ele iria dormir lá. Aí eu pensei vou tomar porque ele não vai voltar, não tem
ninguém aqui, e vai acabar com isso (Laura).
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Pietra tentou suicídio duas vezes. Uma com ingestão de medicação em excesso.
Outra foi após a morte do avô e momento em que não sabia como terminar uma relação
abusiva. Conta que tomou
Três caixas de remédio… mas… na época que tinha um super acesso a dinheiro e drogas, e
coisa do tipo, eu tinha muito cocaína em casa, eu cheirei tudo, eu bebi uns… uma garrafa
inteira de tequila e uma garrafa inteira de vinho… e saí andando pela rua… Fingi pra minha
família que eu estava super sóbria e normal, cortei o meu cabelo, fui pra minha aula… e lá
eu comecei a passar mal.
Nunca tentei o suicídio em si, mas sempre passou pela minha cabeça aquele trem „ah, não
quero mais continuar vivendo, ah, minha vida tá horrível, ah não sei pra quê continuar
isso…‟ esse tipo de pensamento assim. (...) No fim do ano passado que eu me cortei, eu
cortei o braço com a gilete. Eu passei a lâmina até cortar (Cris).
A partir da fala de Cris é possível identificar que existem casos subnotificados e isso
pode dificultar no estabelecimento de ações preventivas. Apesar da vivência auto lesiva
adicionada ao desejo de morrer, ela não nomeia sua atitude como um comportamento
suicida. Vale ressaltar que quando foi convidada a participar da pesquisa ficou ciente sobre
a temática, tentativa de suicídio de mulheres jovens, e se interessou em contar sua história.
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Então, nos cabe questionar se a não nomeação é por não reconhecimento ou por medo de
vivenciar estigmas sociais direcionados às pessoas que atentam contra a própria vida.
Eu fui abusada de quando eu era pequena (...) Primeiro foi o vizinho aqui de casa, começou
tudo com seis anos de idade, minha mãe me deixava por necessidade de ter que resolver as
coisas, né? (...) fala que criança esquece. Mas criança nunca esquece. Ele passou a mão na
minha parte íntima (breve pausa) e ficava fingindo que lá, eu queria andar de bicicleta, mas
eu não sabia andar de bicicleta e lá tinha uma bicicleta de exercício e ficava assim 'vem cá,
vem cá andar de bicicleta' e depois que ele passou a mão na minha parte íntima eu fiquei tão
assim 'meu Deus que isso' (Marina).
Assim como Marina, Dame Vide foi abusada por três vezes e por pessoas diferentes.
Faz questão de frisar isso em sua fala:
Eu já fui estuprada três vezes, por três pessoas diferentes, em três épocas diferentes da
minha vida. Então assim, (gagueja) foi foi difícil sabe... A primeira vez foi um primo meu,
que tem problema mental. (...) eu sempre escondi isso sabe, essa questão do estupro por
medo mesmo sabe, os outros casos foi um professor particular, e aí o outro caso foi um
amigo mesmo (Dame Vide).
Alice contextualiza que após a separação dos pais, a mãe iniciou uma nova relação e
em pouco tempo foram morar na casa desse novo companheiro dela. E nesse novo contexto
ela sentia que a mãe estava abandonando os filhos da primeira relação e com isso, ficou
muito próxima do filho do padrasto. Relata que acabou criando
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uma confiança muito grande nele, que ele acabou usando pra... pra poder se... pra poder
abusar de mim assim... que muitas vezes eu não sabia o que tava acontecendo, mas tava
acontecendo... eu me lembro... a primeira vez que eu fiz sexo oral nele e ele pediu e eu falei
„mas o que que é isso?‟ eu nem sabia o que que era assim sabe, era muito estranho (Alice).
Também passou por experiências de violência sexual com o avô paterno, relata que
ele “ficava oferecendo dinheiro pra andar pra ele... sem roupa em casa, ficava se
masturbando no sofá... e eu não sabia o que era né”. Olivia também se sentiu violada e
invadida após reencontrar um amigo de infância,
era um amigo da família e eu brincava muito com ele né, até os meus oito anos de idade.
Depois disso, ele mudou de casa, aí eu não (gagueja) encontrei com ele mais, eu também
mudei... Aí a gente começou a conversar e tudo, ele pediu meu telefone, pediu meus
contatos, pediu para ir na minha casa... E eu achei estranho né, a velocidade que as coisas
foram acontecendo porque num dia ele me pediu meu telefone e no outro dia ele tava na
minha casa me esperando chegar da escola. (...) E aí a gente começou a sair algumas vezes,
e tudo, lá perto da minha casa mesmo, a gente foi na sorveteria, nesses lugares assim,
porque até então também eu não saía sozinha. (...) Então eu comecei a interessar por ele, e
eu tocava violão (...) então eu resolvi compor uma música para ele, eu nunca tinha
composto uma música nem nada, mas foi ali naquele momento de sentimento e tudo mais,
aí eu compus uma música. Aí eu chamei ele para poder escutar essa música, mas ele me
enrolou durante sete meses pra aparecer, (Risos) e aí eu fiquei naquela expectativa, fui me
frustrando mais (...) Ai esse menino reapareceu eee me pediu para ir na casa dele pra tocar a
música pra ele. E aí foi quando aconteceu o meu primeiro abuso sexual. Ele me forçou a ter
relações com ele, eu não sabia que ele trabalhava pra polícia, ele era da polícia, eee quando
eu fui na casa dele, toquei a música e tudo mais, ele foi e falou que queria ficar comigo,
que gostava muito de mim, mas que ele tinha voltado com a ex namorada dele por
(gagueja) pressão da família, por pressão das pessoas, e que ele não conseguia sair disso,
mas que ele queria ficar comigo. E aí ele ficou insistindo naquilo e naquilo, e aí quando eu
falei com ele que não, aí ele pegou a arma, foi quando eu descobri que ele era policial, (bem
baixinho) ele apontou a arma na minha cabeça, e foi um momento de trauma na minha vida,
porque ali encerrou tudo que eu acreditava. Que até então eu não tinha tido nenhuma
relação sexual, eu pensava em casamento, pensava em casar virgem, pensava nisso, então
ali ele destruiu todos os meus conceitos, ele tirou tudo de mim naquele momento. (Olivia)
Este é o relato do primeiro abuso sexual que Olivia sofreu. Ela teve um segundo
abuso, que foi com o professor de educação física da escola. Neste, o segurança/vigia da
escola a socorreu e deram queixa do professor: “E aí quando eu sofri esse segundo abuso,
eu falei „que vergonha, meu corpo foi violado duas vezes, (voz chorosa) tudo que eu
acredito tá sendo jogado fora e eu não consigo fazer nada, eu não consigo reagir diante
disso‟”. O terceiro e último abuso foi o esposo da tia, neste caso, a família „abafou‟ o
acontecimento: “pra mim foi a pior coisa do mundo, porque ele me chamou pra dar aula de
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violão pra ele (...) quando eu consegui pegar no violão de novo, ele destruiu aquilo de novo.
Então foi um momento muito difícil pra mim, e aí eu falei „meu Deus, como que eu vou
conseguir contar isso pra minha família?‟ (choro) Porque quando acontece com pessoas de
fora já é ruim, imagina uma pessoa dentro da sua família. A minha tia tava grávida, e aí eu
pensei „que que eu vou fazer?‟”.
A partir da fala das mulheres é possível notar que os abusadores tinham alguma
relação com elas, alguns familiares como tio, irmão e primo. E, amigos ou pessoas em
quem confiavam como professores. Tais informações reafirmam os dados sobre violência
sexual contra crianças e adolescentes divulgados pelo Ministério da Saúde em 2018. O
boletim informa que a maioria dos abusadores tinham algum vínculo com as vítimas, eram
familiares ou amigos/conhecidos (Brasil, 2018c).
Das jovens entrevistadas apenas uma foi abusada por uma pessoa do sexo feminino.
As demais foram vítimas de pessoas do sexo masculino o que também corrobora para os
dados apontados pela literatura nacional (Brasil, 2018c). Para finalizar, o Ministério da
Saúde (Brasil, 2018c) aponta que
4.3.3 Comorbidades
Foram consideradas comorbidades toda doença que gere algum sofrimento intenso
que possa influenciar diretamente na realização das atividades diárias. Será apresentado um
relato de uma jovem que convive com uma doença autoinume que afeta sua vida pessoal,
profissional e acadêmica. Também serão apresentados três relatos de mulheres que
convivem com transtornos afetivo bipolar.
Tipo com uns 17 ou 18, eu descobri que eu tinha a doença de Chron, não sei se cê já ouviu
falar, é uma… doença autoimune, que ela inflama o intestino. (...) Eles (os médicos) falam
que o psicológico influencia muito e é uma coisa que eu não consigo controlar. Por mais
que eles consigam controlar... e fazer todo um tratamento clínico, o meu psicológico
interfere. (...) “Eu pensar que eu ia ter que viver com essa doença pra sempre e que… eu
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não ia… Eu não ia ter a tal vida normal que esses médicos falavam que... eee vendo que as
coisas não iam melhorar, passava um ano entrava outro, passava um ano entrava outro, eu
sentia que nada ia melhorar e sua mente começa a falar com você, tipo... ééé „Poxa, todo
mundo morre um dia. (...) Então por que que eu vou continuar estendendo o meu período de
sobrevivência na terra digamos assim, se eu to sofrendo desse jeito? Num quero não (Julia).
Julia sente que a doença afeta de forma considerável a sua vida, tanto por causa de
todas as consultas quanto por não conseguir controlar ou estabilizar os sintomas
vivenciados. Meneghel e colaboradores (2013) apontaram que as doenças que afetam na
realização de atividades diárias podem produzir sentimentos de inutilidade que influenciam
mulheres com comportamentos suicidas.
Gabriela conta que o irmão foi diagnosticado com esquizofrenia e que na época
todos voltaram os cuidados para ele, mesmo sem entender muito bem o que estava
acontecendo. A situação gerou uma grande sobrecarga para todos da família. Após se
formar na faculdade assumiu a coordenação de uma equipe que também exigia muito sua
atenção. Neste período, começou a ter períodos de agitação intensa. Passou noites em claro
e percebeu que algo não estava bem. Com isso, procurou ajuda em diversos médicos.
Começou a fazer uso de algumas medicações que acabaram potencializando sintomas como
alucinações e agitação. Fala que começou a ter perturbações mentais o que influenciou de
forma significativa na decisão de tomar remédios em excesso para acalmar toda a agitação
e acabar com as vozes. Na internação após a tentativa de suicídio foi diagnosticada com
Transtorno Bipolar. Ela reforça que a
tentativa de suicídio na época, era sanar aquela dor mental, uma coisa... Aquela perturbação
que eu não conseguia fazer nada, não conseguia conversar com as pessoas, e ao mesmo
tempo não conseguia sair, não conseguia fazer nada. Então era aquilo que eu queria, era
sanar. Não no intuito de acabar com a vida, era um intuito de acabar com o momento, com o
presente, com o que tava acontecendo (Gabriela).
Em mania se acontecer alguma coisa eu vou fazer (tentar suicídio), eu vou ter coragem de
fazer sabe? É sempre assim. E na época da mania é mais perigoso, tem que ficar mais
atenta, quando eu to na fase depressiva os pensamentos não somem, de que eu quero, que eu
não quero viver, que não vale a pena de que não tem mais saída, mas eu ainda fico, eu não
tomo ação, eu fico totalmente sem ação
Com 14 anos eu comecei a namorar um menino da escola, namorei com ele por 2 anos e
meio, fiquei noiva dele 6 meses... É... Muito nova, mas enfim, as circunstâncias eram,
eram... Fazia sentido, sabe? A gente ficar noivo e tal. É… Mas aí ele foi um crápula
comigo, eu terminei com ele, ele não aceitou… E aí, enfim, a gente era um casal né, então
71
fotos íntimas e tal, e aí basicamente quando eu terminei ele não aceitou ele né... Jogou tudo
na rede, na escola e tal... Então ali começou o meu, meu… Meus primeiros pensamentos de
me matar. E ali começou também a minha depressão, sabe? Foi uma coisa assim, horrível.
Nossa, foi horrível! (Dame Vide).
um namoro… que me colocava totalmente pra baixo o tempo inteiro. É… eu briguei com
Deus e o mundo pra ficar com essa pessoa, (...) me cobrava demais a questão de corpo (...)
eu cheguei a morar um tempo com ele, porque meu pai não aceitava, meu pai sabia da
história toda dele, e meu pai não aceitava, meu pai foi e falou comigo „se você quiser
namorar com ele, é do portão pra fora. Aqui dentro da minha casa eu não aceito ele‟. Aí
resolvemos ir morar juntos, com toda essa situação, só que foi só piorando, agravando a
minha doença que eu já tinha porque aí ele fazia tudo isso. (...) se eu tivesse indo com X
calcinha é porque eu tava pensando em fazer algo errado na faculdade. Então foi um
negócio que foi mexendo também demais com a minha cabeça. E a questão das cobranças e
a questão da traição. Eu descobri as traições, não conseguia, brigava, esbravejava, aquela
coisa toda, mas não conseguia pôr um fim no relacionamento. Eu dependia emocionalmente
dele (Laura).
Só que ele era uma pessoa super obsessiva. (...) como eu morava em outra cidade e ele tinha
que trabalhar, e tinha que estudar e tinha que fazer várias outras coisas e eu também tinha
que estudar, ele ficava super ciumento e aí ele me deu um celular e ficava me ligando 24
horas por dia. Eu tinha que deixar meu celular sempre carregado, porque ele me ligava
literalmente o tempo todo. E não era tipo ele me ligava e desligava, e ligava e desligava,
ligava e desligava. Ele ligava e deixava ligado a ligação enquanto eu vivia a minha vida pra
saber o que que eu tava fazendo. (...) era como se eu fosse o bichinho de estimação dele, eu
sempre tava lá pra ele. É, ele conseguiu manipular a minha mente pra acreditar em coisas
que eu não consigo nem imaginar que eu acreditei. Eu fico perplexa com o como ele
conseguiu me manipular com palavras tão simples e coisas tão sensíveis (Pietra).
Além da relação supracitada, Pietra vivenciou mais dois namoros abusivos e relata
que em todas sofreu com agressões físicas e que não sabia o que fazer para sair do
relacionamento. Apesar de sentir-se oprimida “não pensava na pessoa como um agressor” o
que contribuiu para permanecer mais tempo no enlace afetivo. Em um dos namoros, conta
que sua
Vida virou um inferno. Eu lembro que até os 6 meses de namoro eu já tava me perguntando
se eu era louca, ou… se eu não tinha deixado de ser eu mesma, ou se ao mesmo tempo eu
tinha feito isso tudo e eu tava perdendo a minha vida do lado daquela pessoa. Seis meses de
namoro. Eu namorei quase 3 anos com esse cara (...) foi horrível pra mim, era tipo, eu não
queria transar eu tinha que transar, era eu não queria ir num lugar e eu tinha que ir, eu
queria ir num lugar e eu não podia, eu queria conversar com os meus amigos e eu não podia,
eu queria fazer alguma coisa, eu não podia. Mas se eu não queria, provavelmente eu teria
que fazer. Era isso que eu tinha durante quase três anos da minha vida. (Pietra)
Roberto veio de um jeito que ninguém tinha vindo assim de querer cuidar, de querer
resolver tudo, de querer resolver minha vida inteira (...) Só que ele era muito controlador
sabe ele queria controlar tudo. Tanto que eu fiquei 4 meses sem ver os meus amigos logo
depois de começar a namorar com ele. Que, se eu saia ele queria saber onde que eu tava,
com quem que eu tava, que horas que eu iria voltar, que roupa eu tava usando, que batom eu
tava usando e tudo. E ele não fazia questão também de estar ali sabe, de ir comigo nas
coisas, de viver as coisas comigo... (...) depois que eu terminei com ele eu acabei
conhecendo o Fábio (...) era realmente muito carinhoso comigo no começo saiu muito
comigo com os meus amigos fez tudo certinho até o dia que ele bebeu. O dia que ele bebeu,
ele tentou me agredir... ficou agressivo comigo, ficou falando que eu era muito corajosa de
tá perto dele, que se ele me desse um soco que ele me desmontava. (Alice)
Muito difícil, era bem difícil mesmo, a gente (se referindo ao ex namorado) brigava muito
(...) da mãe dele perguntar se ele já tinha me batido... Ah, às vezes ele me empurrou no
chão, coisas assim do tipo, e aí foi até a gente resolver terminar. Aí quando a gente começou
a namorar eu não podia conversar com ninguém, meu telefone tinha, eu tinha que (gagueja)
eu tinha que almoçar com o telefone ligado, porque ele tinha que ouvir com quem que eu
tava almoçando... Foi, foi bem difícil. (Cris)
Na minha festa de 15 anos, ele chegou no meu pai e falou „eu quero, eu tô namorando sua
filha‟ a partir dai eu tava namorando e eu não pude falar nada e ele era muito abusivo, eu
não podia sair com ninguém, ele ligava para os amigos, ele xingava meus amigos,
ameaçava, éé, eu podia sair só com ele, todos tudo assim, muitas brigas, muitas brigas,
horríveis, horríveis assim (...) ele virava pra mim e falava assim „sua mãe é horrorosa‟, „sua
mãe é a mulher mais feia que eu já vi, não sei como seu pai casou com ela‟, „todo mundo
fala que sua mãe é feia, você puxou ela‟ sabe era umas coisas assim e a gente terminou
porque ele me bateu, ele me agrediu, ai ele me agrediu e eu dei, eu fiz o boletim de
ocorrência na época não existia nada disso de Maria da Penha, de abuso com as mulheres
então não foi pra frente nada e ele ainda queria continuar o namoro e não continuamos, eu
falei „não, chega!‟, eu tava numa situação com ele de que eu tava com ele porque eu não
tinha saída, ai no depois que aconteceu isso que ele me bateu que eu falei „acabou‟ eu falei
„cara se não acontecesse isso eu não tinha terminado com ele‟ (Flor).
Dos meus seis aos meus 12 anos eu apanhava todos os dias. E eu apanhava por causa do
meu irmão, porque eu era uma pessoa muito quieta, eu sempre fui muito introspectiva. E o
meu irmão fazia muitas coisas assim, artes de criança, sabe? Tipo pintar a cara de cachorro,
subir no telhado... E aí meu pai entendia aquilo como uma coisa ruim, e batia em mim,
porque eu tinha que ter obrigação de olhar meu irmão, e meu irmão não podia fazer essas
coisas, me batia porque meu irmão não tirava nota boa na escola e eu tirava (Olivia).
A jovem conta que durante um período de sua infância ficava na casa da avó e foi
um período que apanhou muito do pai porque ela dizia que haviam aprontado e era motivo
para brigas. Até que aos 9 anos a mãe a ensinou a cozinhar, arrumar casa e passou as regras
para que ficasse em casa sozinha cuidando do irmão enquanto eles estavam trabalhando,
relata que com isso sua responsabilidade aumentou muito.
A minha mãe e meu pai são casados têm, vão fazer 31 anos de casado agora. E é o caos, a
minha mãe sempre foi muito agressiva, (fala intensamente) muito agressiva comigo, com
meu irmão a gente cresceu assim na base do (gagueja) de apanhar, sabe? E do grito, tudo de
uma maneira muito agressiva sabe, sempre. Qualquer coisinha vira pivô pra uma briga
enorme, pra confusão pra grito, pra xingo, pra bater e quebrar as coisas... Então assim,
sempre tive essa infância muito conturbada. (...) Ela (mãe) sempre teve muito em casa, mas
ao mesmo tempo era como se não tivesse, porque ela não fazia a menor questão da gente.
Sempre muito fria, muito distante... Então, meu pai sempre muito ausente por conta do
trabalho (Dame Vide).
Minha infância foi bem... não foi uma coisa legal. (breve pausa) Igual, meu pai e minha
mãe se separaram. Porque até então eu tinha achado que, porque meu pai bateu na minha
mãe, batia nela, mas eu pensava que era aquele bater normal. E aí quando a minha
psicóloga começou a perguntar meus pais sobre o que aconteceu minha mãe finalmente
depois de muitos anos me contou que, na verdade, meu pai tinha espancado ela. Espancado
ela feio, deixado ela no chão de um jeito que ela não conseguia nem mexer. E que ela teve
que chamar meu vô e minha vó pra levar ela no hospital (Julia).
Ao contar sobre um fim de semana na casa do pai quando tinha 11 anos, narra que
seu pai agrediu sua madrasta
Pegou ela assim pelo pescoço e levantou ela assim na parede (demonstrando como o pai
fez), e eu assim arregalei os olhos desse tamanho (faz cara de assustada). Fiquei assim „meu
deeeeeus!‟ Ficou eu e ela tentando empurrar meu pai, empurrar meu pai até que a gente
conseguiu empurrar ele e jogar ele no sofá. Aí a gente entrou no quarto e fechou a porta.
Ficou lá dentro. Ficou eu e ela chorando a noite toda. Ela chorando pelo cara que ela casou,
e eu chorando pelo cara que eu achei que era meu pai mas que num era (Julia).
Julia vivenciou agressões do pai para com a mãe, do pai em relação a madrasta e
também presenciou o padrasto batendo na mãe. Na fala da jovem ela traz como se fosse
algo natural quando fala „bater normal‟ sem gerar nenhum estranhamento quanto a atitude
do pai agredir a mãe quando ainda estavam casados. Dame Vide também relata ter
presenciado violência entre os genitores, em um determinado momento da entrevista relata
que já tiraram sangue no outro. O ponto que distancia as histórias das duas é que a primeira
nunca teve episódios direcionados a ela. Já a segunda também sofria com as agressões por
parte da mãe.
A minha família já é totalmente diferente de mim, eles não me passam amor, eles não me
dão atenção, é... Me machucou muito quando a minha mãe pegou a guarda das minhas
filhas, porque eu não esperava isso dela.... Desde os 16 anos que... Eu comecei a namorar
com o pai das minhas filhas, que eu venho enfrentando a minha família, porque eles não
aceitavam meu relacionamento com ele, então eu venho sendo uma filha desobediente para
eles. Aí passamos por tudo, foram 8 anos de relacionamento, até que aceitaram meu esposo,
aí ele vai e morre. (...) Na minha cabeça, eu tinha que dar um pai pras minhas filhas, elas
não podiam ficar sem um pai, sem uma referência masculina. Só que eu não queria que o
meu pai fosse a referência masculina na vida delas, porque meu pai, ele me agrediu muito
75
quando eu era pequena... Ele agredia às vezes sem motivo nenhum! Chegava cansado do
serviço, era um motivo pra agredir eu e a minha irmã. Aí até hoje eu tenho dificuldade de…
De chegar perto do meu pai (...) eu fui cansando a minha mãe né, ela foi ficando cansada,
porque ela viu que eu não levava a sério o tratamento. Tanto que hoje em dia ela nem se
preocupa se eu tô bem, ou se eu tô mal (Camila).
Ficava muito estressada, porque eu tinha que dar conta de duas crianças, de casa, de tudo,
né? E ficava muito em casa, não saía, aí comecei a ficar mais depressiva nessa época. Mas
nunca deixei de ser uma boa mãe, de deixar a casa limpa, de dar as coisas que minhas filhas
precisavam. Só deixei de sorrir... Meu esposo até reclamava disso (Camila).
Ele (o pai) gritava, batia na mesa, e o fato de tipo eu era pequena e às vezes chorava com
medo de escuro, ele achava que eu tinha que ficar no escuro pra ver que não tinha nada, aí
ele me colocava de castigo no escuro porque não tinha nada. E assim, são poucas as coisas
que eu lembro, sabe eu não lembro muito, eu lembro assim de sempre tá chorando e de
quando eu tava adolescente ele falar que tipo ah, „se eu não quisesse seguir as regras da casa
que eu podia ir embora‟... Às vezes brigava por causa da roupa que eu tava, brigava e falava
que eu podia sair de casa. (...) tanto que eu tenho pavor até hoje só de pensar que eu posso
voltar pra casa! Tenho pavor! Pavor mesmo! (Cris)
Seja através de violência psicológica, física e até mesmo pela sobrecarga vivenciada
todas as participantes foram afetas em alguma instância e apontaram tais experiencias como
fatores que influenciaram nas tomadas de decisão quanto à tentativa de suicídio. A
internalização de situações violentas pode vir a minar forças psíquicas e realimentar
traumas. De forma que tais mulheres revisitem interiormente os sentimentos e sensações e
queiram pôr um fim em tudo (Minayo & Cavalcante, 2013).
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77
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79
5 PRODUÇÃO TÉCNICA
5.1 Vídeo
“Conte-me sobre sua história de vida e experiência com a tentativa de suicídio. Você pode
levar o tempo que for preciso e pode dar detalhes de tudo que for importante para você".
- Contexto da tentativa;
- Estigmas;
- Tratamento;
- Repercussões da tentativa;
- Explorar situações específicas apenas mencionadas na narração central, tais como:
família, equipe multiprofissional no tratamento, pertencimento a grupos, situação no
trabalho, etc.
- Projetos para o futuro;
Informações gerais:
Nome: ________________________________________________________________
Nome fictício: __________________________________________________________
Idade: ________________________________________________________________
Escolaridade: __________________________________________________________
Quantas tentativas de suicídios: ___________________________________________
Trabalho: _____________________________________________________________
Estado civil: ___________________________________________________________
Filhos/as: _____________________________________________________________
123
APÊNDICE D - Retorno das entrevistas não realizadas
Indicação 1 Disse que iria pensar. Depois disse que não queria.
Primeiro contato foi com a mãe dela, que passou o número sem
Indicação 3
questionamentos. A Sarah visualizou a mensagem e escolheu não responder.
Achou a pesquisa interessante, mas acredita que não tenha uma história
Indicação 10 interessante e que a tentativa foi um ato impulsivo. Conversamos e ela escolheu
não participar por acreditar que não teria tanto a contribuir.
Respondeu que no momento não estava sentindo confortável para falar sobre.
Indicação 20
Fiz um breve acolhimento e agradeci o retorno.
Indicação 26 Demonstrou interesse, porém ela mora em Ipatinga. Combinamos que caso ela
viesse a BH me avisaria e se eu conseguisse ir até lá faria novo contato.
O pai disse que repassaria meu contato para ela e os cuidadores dela e me daria
Indicação 28
um retorno. Porém, não fez mais contato e respeitei o momento deles.
A mãe retornou dizendo que a Ana havia se casado e foi morar nos EUA.
Indicação 30
Agradeci o retorno.
Disse que iria pensar. Depois disse que não se sentia preparada para falar sobre.
Indicação 31
Fiz um breve acolhimento desse sentimento e finalizamos o contato.
O pai respondeu dizendo que a filha não teria interesse em participar. Não
Indicação 32
chegou a passar o contato da Amanda.
A mãe retornou dizendo que ela estava viajando e pediu para fazer novo contato
Indicação 39
após alguns dias. Contato foi realizado, mas a mãe não podia falar.
O pai disse que repassaria meu contato para ela. Porém, não fez mais contato e
Indicação 40
respeitei o momento deles.
Achou a pesquisa interessante, ficou de pensar se seria possível. Mas, não fez
Indicação 43
novo contato
Achou a pesquisa interessante, ficou de pensar se seria possível. Mas, não fez
Indicação 44
novo contato
Indicação 45 Uma amiga informou que passaria o recado. Mas não houve nenhum retorno.
O pai passou um contato fixo para falar com ela, porém não foi possível
Indicação 46
encontrar ela em casa de forma que desse para falar com ela.
Os pais disseram que falaria com ela. Mas, decidiram que seria melhor que ela
Indicação 47
não participasse.
Prezada Sra.,
Você está sendo convidada a participar de uma pesquisa que tem por objetivo
compreender histórias de vida de jovens mulheres que passaram pela experiência de
tentativa de suicídio.
Você foi selecionada porque é uma mulher jovem, tendo entre 18 e 29 anos, por ter
tentado suicídio e estar em acompanhamento profissional em um hospital referência em
saúde mental. A sua participação nesse estudo consiste em conceder uma entrevista na
qual será convidada a narrar sua história de vida e experiência com a tentativa de
suicídio. Os riscos (e/ou desconfortos) envolvidos nesse estudo dizem respeito à
dificuldade ou não que você terá em falar dos assuntos que interessam a esse estudo.
Caso perceba algum desconforto durante a entrevista, esta poderá ser interrompida e sua
decisão sobre continuá-la ou não será inteiramente respeitada. Trata-se de uma pesquisa
desenvolvida pela psicóloga Luana Rodrigues de Freitas Alves sob supervisão da Prof.ª
Dra. Luciana Kind do Nascimento, do curso de Pós Graduação da PUC Minas.
As informações obtidas nesse estudo serão confidenciais, sendo assegurado o sigilo sobre
sua entrevista em todas as fases da pesquisa, e quando da apresentação dos resultados em
publicação científica ou educativa, uma vez que os resultados serão sempre apresentados
como retrato de um grupo e não de uma pessoa. Você poderá se recusar a participar ou a
responder algumas das questões a qualquer momento, não havendo nenhum prejuízo
pessoal se esta for a sua decisão.
Pesquisadora responsável:
Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa envolvendo Seres Humanos
da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, coordenado pela Prof.ª Cristiana
Leite Carvalho, que poderá ser contatado em caso de questões éticas, pelo telefone (31)
3319-4517 ou e-mail cep.proppg@pucminas.br.
________________________________________ _______________
Assinatura do participante ou representante legal Data
________________________________________ _______________
Assinatura da pesquisadora entrevistadora Data
128
APÊNDICE F - Contextualização das entrevistas realizadas e das tentativas de suicídio
1. Marina
A entrevista foi realizada em sua casa, conforme solicitado por ela. Marina fez
questão de me apresentar “seu mundo”, assim ela se referia ao seu quarto. Realmente ao
entrar percebi que existia um mundo ali dentro. Estando ali, ela se sentia segura e pôde
contar sobre sua história de vida, sobre os abusos sofridos e conflitos familiares. Em sua
voz existia sofrimento e muita dor, mas não apresentava desconforto ao falar sobre suas
experiências. Desde o primeiro contato ela foi muito receptiva. Marina tem 23 anos, é
solteira, universitária, mora com os pais, não tem filhos, não está trabalhando e apresenta
uma queixa quanto a isso porque acha que está difícil ingressar no mundo do trabalho e
relata que perdeu as contas de quantas vezes tentou suicídio.
2. Laura
O primeiro contato foi realizado com a mãe. Ela transmitiu a mensagem à filha que
muito disponível retornou o contato, expliquei sobre a pesquisa e ela se disponibilizou a
participar, porém, deixando claro que ficaria um pouco difícil ir até o consultório para fazer
a entrevista uma vez que estava nos dias finais de uma gestação. Perguntou se seria possível
ir até ela. Agendamos e a entrevista aconteceu na área de festas de seu condomínio. Laura
estava, aparentemente, se sentindo confortável para falar sobre sua experiência. Contou
sobre suas dificuldades familiares, conflitos nos relacionamentos amorosos e sobre o viver
o estigma por ter tentado suicídio, afinal, “ela tinha uma vida perfeita e não tinha motivos
para isso”. Laura tem 29 anos, é casada, formada em direito, mora com o marido, estava
gestante da primeira filha, tem trabalhado de forma autônoma auxiliando na fazenda do pai
e relata que tentou suicídio por quatro vezes.
3. Camila
O primeiro contato foi realizado com sua mãe que imediatamente disse que não
achava uma boa ideia a participação dela na pesquisa. No entanto, instantes após ela disse
que havia conversado com a filha que se interessou muito em participar e com isso me
passou o número para contato direto com ela. Ao enviar mensagem ela disse de seu
interesse em participar e agendamentos a entrevista. Horas antes ela envia mensagem
dizendo que não iria conseguir ir até o consultório e perguntando se eu poderia ir até ela e
assim foi feito. Ao chegar lá, notei que não era interesse do companheiro que eu estivesse
ali e isso gerou uma inquietação muito grande em mim, mas ela reforçava constantemente
que gostaria de falar comigo e que queria ajudar outras mulheres. Iniciamos a entrevista na
sala de sua casa e ela parecia muito tranquila e sempre muito disponível. Após um breve
período, o companheiro foi para sala e começou a fazer interrupções nos relatos dela. No
129
entanto, apesar de demonstrar a ele que não gostaria que ele estivesse ali, ela parecia não
considerar sua presença porque dava continuidade a sua história sem se importar com o que
ele estava dizendo. Ela contou sobre seus relacionamentos afetivos e conflituosos, sobre a
doença da filha e também conflitos familiares. Camila tem 27 anos, é solteira, porém vive
em união estável há alguns meses, possui ensino médio completo, mora apenas com o
companheiro, tem duas filhas e a mãe dela quem tem a guarda das crianças, trabalha no
restaurante da família do companheiro e relata que foram oito tentativas de suicídio.
4. Gabriela
5. Dame Vide
O primeiro contato foi realizado com a mãe que imediatamente repassou meu
número para filha. Dame Vide me aciona perguntando o motivo do contato e eu esclareço
com muito cuidado. Ela demonstra ter ficado animada e elogia a iniciativa. Conta que
estava escrevendo um livro no qual contava sua experiência com a tentativa de suicídio
através de poesias e agendamos imediatamente sua entrevista. Ela chega ao consultório
muito elegante e simpática. Conta sobre seu diagnóstico de hiperatividade e dislexia desde
a infância e sobre as dificuldades em viver com muito esforço para dar conta de
acompanhar suas turmas. Além disso, contou sobre os conflitos com a figura materna e nos
relacionamentos amorosos. Dame Vide tem 22 anos, é solteira, formada em história, mora
sozinha com seus gatos, não tem filhos, não está trabalhando e relata que teve quatro
tentativas de suicídio.
6. Flor
Flor chegou aparentando ser uma jovem muito tímida e interessada em participar da
pesquisa. Aceitou o convite logo após ouvir as informações sobre a pesquisa. Relatou que
faz tratamento para depressão desde os 15 anos e que aos 17 foi diagnosticada com
transtorno bipolar. Relatou que quando está em mania se sente mais encorajada a tentar
suicídio e que no período depressiva se sente totalmente sem ação. Mas em ambos os
períodos percebe que não tem desejo por cuidar de sua vida, podendo inclusive, se colocar
130
em situações de risco de forma proposital. Ele falava baixinho e demonstrava pouca energia
vital, foi acompanhada pelo namorado e contou sobre seus conflitos de relacionamentos
anteriores e sobre suas dificuldades cotidianas. Flor tem 29 anos, é solteira, tem uma
graduação interrompida, mora com os pais, não tem filhos, não está trabalhando e relata
que teve oito tentativas de suicídio.
7. Alice
Uma amiga da Alice foi quem recebeu o primeiro contato e passou o número dela.
Após enviar mensagem dizendo sobre a pesquisa e realizando o convite para participar, ela
informou que participaria e não via nenhum problema em falar sobre isso, além de acreditar
que isso poderia ajudar muitas outras pessoas que precisam em relação a isso. Alice contou
sobre dificuldades na vida profissional, familiar e afetiva. Ela tinha uma postura calma ao
relatar os fatos. Alice tem 26 anos, é solteira, tem uma graduação incompleta, mora em uma
república porque os pais são do interior, não tem filhos, não está trabalhando e relata que
teve duas tentativas de suicídio.
8. Júlia
O primeiro contato foi realizado com o noivo da Julia que se encarregou de fazer a
ponte da comunicação com ela. Logo em seguida, foi possível ter contato direto com ela e o
agendamento foi realizado para o mesmo dia, tanto pelo WhatsApp quanto pessoalmente
ela fez questão de dizer da importância da pesquisa que estava desenvolvendo e que que era
importante para ela poder participar. Júlia iniciou dizendo que sempre teve uma tendência a
se “auto fazer mal” e que foi uma criança muito ansiosa. Além disso, conta sobre a
experiência de descobrir, aos 18 anos, e viver com uma doença autoimune que o
“psicológico interfere demais”. Julia tem 26 anos, é solteira, tem uma graduação
incompleta, mora com o noivo, não tem filhos, não está trabalhando e relata que perdeu as
contas de quantas vezes tentou acabar com a própria vida.
9. Pietra
A aproximação com a Pietra foi muito tranquila, ela se interessou pela participação
sem nenhum questionamento sobre a pesquisa. Agendamos para dois dias após e lá estava
ela, em meu consultório, no horário marcado, usando pijamas. Ela estava, aparentemente,
muito confortável para falar sobre suas experiências e tentativas. Foi minuciosa nos relatos,
dando a entender que queria contextualizar cada situação. Em alguns momentos, notava que
ela ficava mais animada ao relatar sua vida e dores e parecia um pouco distanciada. Pietra
tem 20 anos, é solteira, tem uma graduação em curso, mora com o pai e a avo, não tem
filhos, tem trabalhado de forma autônoma e declara que fez duas tentativas de suicídio.
131
10. Juliana
11. Olivia
O primeiro contato foi realizado com a mãe que sem restrições passou o contato
dela. Olivia foi muito receptiva ao contato e se disponibilizou imediatamente a participar da
entrevista. No dia seguinte ao contato pelo WhatsApp a recebi em meu consultório. Ela
estava acompanhada pelo avo e aparentemente estava tranquila. Como na maioria das
entrevistas, eu estava ali inteiramente para ouvi-la. Ela conta sobre suas experiências de
vida que influenciaram no seu processo depressivo e em suas tentativas e suicídio, tais
como, abusos sexuais, conflitos familiares e afetivos. Olivia tem 22 anos, é solteira, tem
uma graduação em curso, mora com os pais, não tem filhos, não trabalha e relata que
perdeu as contas de quantas vezes tentou suicídio.
12. Cris