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"O Pensamento"
Milton Santos
1994
Região: Horizontalidades e Verticalidades
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Os avanços técnicos-científicos-informacionais fazem com que objetos
e ações. cada vez mais, sejam operacionais e se dêem de forma sistêmica.
Tratam-se de objetos e ações a serviço dos atores hegemônicos,
subordinados à produção de uma mais-valia mundial e, que possibilitam,
através de suas funcionalizações, a manutenção dos fluxos globais.
Criaram-se, portanto, situações nitidamente diferentes. No passado,
os objetos não continham tal conteúdo informacional e as ações não eram
obrigatoriamente homogeneizadas. Ou seja, o sistema espacial
contemporâneo foi totalmente redefinido e, com ele, todos os subespaços
regionais.
Em tal sistema espacial reorganizado encontram-se as redes que
incluem ao mesmo tempo materialidade e ação. De um lado tais redes são
globais, funcionam como instrumento de uma produção, circulação e
informação mundializados. Incubem-se de transportar o universo ao local,
unindo diferentes pontos ou regiões numa mesma lógica produtiva. Este
seria o funcionamento vertical do espaço contemporâneo. o recorte vertical
do território. Mas as redes também são locais, pois no lugar a rede
praticamente se integra e se dissolve pelo trabalho coletivo. Aí são criadas
as condições técnicas do trabalho direto, isto é, o funcionamento horizontal
do espaço onde se estabelece a co-presença num espaço contínuo. Este, por
sua vez, seria o recorte horizontal do território.
Horizontalidades e verticalidades são recortes espaciais superpostos,
ao mesmo tempo, condicionados e condicionantes da solidariedade
organizacional, principal elemento de formação das regiões
contemporâneas. Tal solidariedade tanto pode se dar a partir de
contigüidades e continuidades, como da ação empreendida a partir de
pontos distantes, mas não isolados. Ambas estão sempre sujeitas as leis do
movimento.
Aliás, é justamente pelo fato de estar sempre em movimento, em
constante aceleração, que fica a idéia de que a região não mais existe.
Temos que apreender que o momento atual faz com que as regiões
transformem-se continuamente, ligando portanto uma menor duração ao
edifício regional. E, também considerando que a espessura do acontecer é
aumentada diante do enorme volume de eventos que sucedem. A região aí
está, porém com um nível de complexidade jamais visto pelo homem.
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O território como norma
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Problemas para um planejamento regional
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ação pode ser muito mais eficaz. Porém, não se descarta a idéia de se
criarem autoridades que atuem diretamente junto a determinados
subespaços produtivos da província.
Um outro aspecto, mas que ligado ao anterior, seria criar um saber
que seja voltado para apreender o lugar e o mundo, cujo objetivo, por
exemplo, seria o preparo para enfrentar as tendências que desestabilizam o
produto da área, de um ponto de vista mais pragmático. Um dado de nosso
tempo, é que a cada dia acordamos mais ignorantes frente às novíssimas
inovações, ou seja, frente aos objetos que nos cercam e as ações que nos
escapam. Os riscos de sucumbirmos às disfunções são enormes.
Mas, também, devemos repor um sentido teleológico ao mundo. Não
podemos assistir passivamente à invasão de objetos e ações que invadem
nosso cotidiano, tornando-nos submissos a uma racionalidade que perdeu o
sentido, que retirou a dimensão do humano em troca da apologia da
competitividade e de uma cultura tecnicizada.
O lugar, mesmo que seja organizado por ordens externas, possui uma
ordem local que funda a escala do cotidiano, cujos parâmetros são a co-
presença, a vizinhança, a intimidade, a emoção, a cooperação e a
socialização com base na contigüidade. A riqueza comunicacional existente
no lugar pode apontar para o futuro, tornando-o sede de uma resistência da
sociedade civil.
Mais uma vez é o conhecimento do Mundo que se aprofunda no
conhecimento do lugar que nos permitirá agir, pois hoje cada lugar é o
mundo. Somente deste modo poderemos perceber as intencionalidades
estranhas que se instalam no lugar e romper com a perversidade de uma
ordem global a serviço, única e exclusivamente, das ações hegemônicas.