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ARTIGO ACADÊMICO

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PRONUNCIAMENTOS DE
CHURCHILL E HITLER NO
CONTEXTO DA SEGUNDA
GUERRA MUNDIAL: UMA
ANÁLISE DE CONTEÚDO
Por Clécio Antônio Barbosa Oliveira JÚNIOR1
Universidade Federal de Goiás

RESUMO
Durante a Segunda Guerra Mundial a Inglaterra foi conduzida por seu Primeiro Ministro, Winston Churchill,
enquanto a Alemanha era regida por Adolf Hitler. Em comum, ambos os líderes foram reconhecidos histori-
camente pelos discursos exemplares. Este artigo pretende, por meio de ferramentas de análise de conteúdo,
verificar a existência de similaridades nos pronunciamentos dos dois líderes para identificar as estratégias e
técnicas recorrentes que ajudaram a inspirar e mobilizar milhões de indivíduos.

PALAVRAS-CHAVE: Churchill. Hitler. Segunda Guerra Mundial. Discurso. Análise de conteúdo.

INTRODUÇÃO mais violento da história da humani-


dade. Entre os diversos aspectos que

A
análise de conteúdo, segundo podem ser explorados sobre a Guer-
Krippendorff (1990, p. 28), é ra, é particularmente interessante
uma técnica de investigação observar como populações foram mo-
destinada a formular, a partir de tivadas a engajar-se no conflito por
certos dados, inferências reprodu- meio de ideologias propagadas por
zíveis e válidas que podem se apli- líderes e discursistas reconhecida-
car a seu contexto. A partir dessa mente hábeis. Esse é justamente o se-
definição este artigo terá como alvo gundo motivo que levou a escolha, a
de investigação a transcrição de um curiosidade sobre casos de destaque
pronunciamento de Winston Chur- da comunicação, tema tão importante
chill e outro de Adolf Hitler, ambos para a área de marketing, onde a per-
realizados no dia 03 de setembro de suasão do público é um desafio diá-
1939, logo após a declaração da Se- rio. A convergência desses interesses
gunda Guerra Mundial. conduziu à lembrança de Churchill e
Hitler e motivou a estudar com mais
Dois fatores motivaram a escolha des- profundidade alguns dos discursos
ses dados para estudo. O primeiro que foram capazes de mobilizar mi-
está relacionado ao extremismo dos lhões de pessoas a defender com a
acontecimentos da Segunda Guerra vida os valores propostos.
Mundial (SGM). É surpreendente ob-
servar a violência e a proporção dos A relevância teórica deste tema re-
eventos que marcaram o conflito. Se- side na investigação da hipótese de
gundo Hobsbawm (1994), a SGM foi o que existem mensagens semelhan-
maior empreendimento até então co- tes nos pronunciamentos de Hitler e
nhecido pelo homem, tendo como re- Churchill, apesar da rivalidade e di-
sultado uma estimativa de 50 milhões ferenças ideológicas, e de que essas
de pessoas mortos, o que contribuiu semelhanças são na realidade técni-
para que o Século XX se tornasse o cas persuasivas reproduzíveis. A re-

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levância prática deste levantamento pretensões imperialistas sobre a Eu-


está na identificação e sistematização ropa, firmando alianças com a Itália,
de tais técnicas, o que permitirá sua governada pelo ditador Mussolini, e
aplicação consciente em outros traba- Japão, que realizava ataques à China
lhos, assim como uma compreensão e outros países asiáticos. Entretanto,
mais apurada de outros discursos que pouco foi feito para impedir o cresci-
contenham a mesma temática ou con- mento do Nazismo, pois de maneira
textos semelhantes. geral, nos primeiros momentos de seu
governo, Hitler fez diversos discursos
1. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA pacifistas, apesar dos atos de milita-
A Segunda Guerra Mundial foi ofi- rização indicarem o contrário. Outro
cialmente declarada pela França e fator foi a memória ainda recente do
Inglaterra no dia 03 de setembro de terror e perdas causadas pela Primei-
1939 como uma medida de repressão ra Guerra Mundial, que fez com que
à Alemanha após uma série de inva- poucos países estivessem dispostos
sões que tiveram como estopim o as- ou preparados a entrar em um novo
salto à Polônia. É importante ressaltar conflito, apesar dos alertas constan-
que alguns dos países invadidos, in- tes de alguns observadores, entre
cluindo a Polônia, foram criados após eles o futuro Primeiro Ministro da In-
a Primeira Guerra Mundial por meio glaterra, Winston Churchill.
do Tratado de Versalhes , que repar-
tiu os territórios alemão, russo e aus- Com as mais raras exceções, ne-
tro-húngaro em uma série de estados nhum historiador sério jamais
menores. Observa-se, portanto, que o duvidou de que a Alemanha,
Japão e (mais hesitante) a Itália
conflito foi uma continuação do ante-
foram os agressores. Os Esta-
rior, resultado de um contexto históri- dos arrastados à guerra contra
co de grandes tensões, ressentimen- os três, capitalistas ou socialis-
tos e filosofias nacionalistas, como tas, não queriam o conflito, e
pode ser verificado no texto a seguir: a maioria fez o que pôde para
evitá-lo. Em termos mais sim-
A guerra iniciada em setembro ples, a pergunta sobre quem ou
de 1939 pode ser adequadamen- o que causou a Segunda Guerra
te explicada somente no con- Mundial pode ser respondida
texto da deterioração da ordem em duas palavras: Adolf Hitler.
européia durante a década de (HOBSBAWN, 1994, p.43)
1930, quando a crise econômi-
ca, a ascensão de ditaduras au- Para uma compreensão mais ampla
toritárias, as profundas divisões
das ações de Hitler é necessário co-
ideológicas, as rivalidades na-
nhecer alguns aspectos de sua his-
cionalistas e o colapso dos es-
forços da Liga das Nações para tória e as motivações que o levaram
preservar a paz se combinaram a conduzir a Alemanha à Segunda
para tornar provável um grande Guerra Mundial.
conflito. (OVERY, 2009, p. 13).
1.1 Sobre Adolf Hitler
Em meio ao momento de crise alemã, Adolf Hitler nasceu no então império
Adolf Hitler surge como uma lideran- austro-húngaro, próximo à fronteira
ça disposta a recuperar os territórios da Alemanha, onde teve uma infância
perdidos na guerra anterior e o orgu- humilde ficando órfão aos 19 anos,
lho nacional. Hitler já era uma preocu- quando se mudou para Viena para es-
pação dos países da Europa ocidental tudar artes. Nesse período conheceu
por ser um ditador, fato que ia contra os ideais antissemitistas, muito disse-
a filosofia de democracia e liberalismo minados na região por meio de pro-
econômico praticados pelas potên- fessores, políticos e folhetos, os quais
cias da época. Além disso, Hitler pro- tiveram grande impacto na mente de
pagava uma política antissemitista , Hitler. Em 1913 mudou-se para Muni-
reorganizou o exército e apresentava que, para afastar-se da diversidade

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racial do império Austro-Húngaro. em 1900 Churchill fosse eleito para


Entrou para o exército alemão na Pri- o parlamento inglês e para que pos-
meira Guerra, onde foi reconhecido teriormente assumisse a posição de
pela sua oratória e inteligência. Após primeiro Lorde do Almirantado e ain-
sair do exército se afiliou a um par- da Ministro dos Armamentos e Minis-
tido nacionalista, onde tempos mais tro da Fazenda. Nos anos 30, quando
tarde tentou um golpe de estado mal estava fora do governo, fez diversos
sucedido no norte da Alemanha e por alertas sobre o crescimento do Nazis-
isso foi preso. Foi libertado da prisão mo na Alemanha. Quando em 1º de
depois de seis meses, tempo que lhe setembro de 1939 foi declarado Guer-
rendeu a escrita de Mein Kampf . Vol- ra, o então Primeiro Ministro, Neville
tou às atividades políticas criando Chamberlain, restituiu a Churchill o
diversas associações e disseminan- cargo de Lorde do Almirantado. Em
do a política antissemita. Devido à maio de 1940, devido a uma série de
situação pós-guerra do país acabou derrotas inglesas, Chamberlain re-
recebendo grande apoio popular, tor- nunciou e Churchill então assumiu
nando o seu partido, Nazi, o segundo o posto de Primeiro Ministro Inglês,
maior do país. Em questão de pouco cargo que ocupou até o fim da guer-
tempo, com intimidação e expulsão ra em 1945. Churchill também era
de membros do parlamento alemão, pintor, historiador e escritor, o que
Hitler se tornou líder com poderes lhe rendeu o Prêmio Nobel de Litera-
ditatórios. Repudiando o Tratado de tura em 1953 “por sua maestria nas
Versalhes e desejando expandir o es- descrições históricas e biográficas
tado alemão, reconstruiu o exército, assim como pela brilhante oratória
fez alianças com a Itália, Japão, União na defesa dos elevados valores hu-
Soviética e outros países. Começaram manos ”. Em 2002 a rede BBC de
assim suas invasões à Áustria, Che- Londres, organizou votação para
coslováquia e finalmente Polônia, eleger os 100 maiores britânicos de
quando então França e Inglaterra de- todos os tempos, Churchill foi eleito
cidiram decretar guerra à Alemanha. em primeiro lugar.

Do outro lado do conflito, na Ingla- Tanto para Adolf Hitler quanto para
terra, estava Winston Churchill, que Winston Churchill a chegada ao po-
antes da guerra alertava sobre os der exigiu manobras e alianças polí-
perigos que estavam por vir com as ticas, e mesmo depois de já ocupar
ações de Adolf Hitler no poder da cargos de liderança, uma das princi-
Alemanha. Sua história é marcada pais ferramentas de autopromoção
por aventuras militares, diversos car- e persuasão utilizada era o discurso
gos políticos e premiações no campo político. Assim, para incrementar a
da literatura. analise dos aspectos quantitativos e
qualitativos dos conteúdos seleciona-
1.2 Sobre Winston Churchill dos, é importante observar a perspec-
Churchill era filho de Lord Randolph tiva dos estudos já realizados sobre a
Churchill, nobre político inglês que modalidade política do discurso, uma
ocupou o cargo de Ministro da Fazen- vez que envolve aspectos relevantes
da. Winston Churchill ingressou na como poder e legitimidade.
carreira militar, sendo corresponden-
te de guerra em Cuba, Índia e África 1.3 O Discurso Político
do Sul, onde em 1899 se tornou pri- O discurso político é um ato de lingua-
sioneiro de guerra. Após a fuga, que gem, e segundo Charaudeau (2006),
envolveu o esconderijo em uma mina todo ato de linguagem é um agir so-
e uma jornada de trem, em meio a bre o outro. É um agir sobre outro no
fardos de lã até Moçambique, voltou sentido que o discurso busca condu-
para o exército. Essas ações foram no- zir o ouvinte a pensar, dizer e agir
ticiadas, o que deu impulso para que conforme uma expectativa de quem

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discursa. Mas para que isso aconte- ser visto a seguir, será adotado o mo-
ça, é necessária a existência de estí- delo da professora Laurence Bardin,
mulos presentes no discurso capazes da Universidade de Paris.
de sensibilizar os receptores. O autor
levanta a hipótese que os estímulos 2. METODOLOGIA
sejam basicamente conquistados por Para a análise dos discursos de Chur-
meio de gratificações (promessas) e chill e Hitler será utilizada a metodo-
ameaças (medos). logia da Análise de Conteúdo. Entre
as propostas existentes a de Bardin
Essa hipótese é validada nos discur- (1988) se destaca e propõe uma es-
sos analisados neste trabalho. Os dis- trutura de estudo por fases compos-
cursos que seguiram à declaração da ta por “pré-análise”, “exploração do
Segunda Guerra Mundial são particu- material” e “tratamento dos resulta-
larmente emblemáticos, pois ambos dos e interpretação”.
revelam esse aspecto de gratificação
e ameaça com clareza. Esse momen- A pré-analise é composta por três par-
to é politicamente crítico e exige, tes, sendo a primeira a escolha dos
mais do que em outras situações, documentos para a análise, a segun-
que a população se comporte de for- da a formulação das hipóteses e dos
ma ordenada e esperada. Hitler, nes- objetivos e finalmente a elaboração
se momento, ressalta a importância de indicadores que fundamentem a
de a população obedecer às novas interpretação final.
regras sobre o risco de sofrer penali-
dades, enquanto Churchill alerta so- Para a escolha dos documentos é re-
bre a redução dos direitos populares comendável uma leitura flutuante,
sob a promessa de vencer a guerra para absorver impressões e determi-
para depois então fazer a devolução nar, a priori, se o mesmo serve ao
dos mesmos direitos em escala glo- objetivo da análise. Nesta fase, Bar-
bal. O objetivo de ambos é o mesmo, din estabelece algumas regras para a
evitar que a população se revolte ou escolha do material de acordo com a
disperse, seja por meio do medo ou missão da análise. São elas: a regra
da gratificação. da exaustividade, regra da represen-
tatividade, regra da homogeneidade
Claramente o discurso político extra- e regra da pertinência. No caso deste
pola essa simplificação dualista de artigo, a regra da homogeneidade é a
perdas e ganhos, evocando outros mais adequada por ter como objetivo
sentimentos como o de pertencimen- comparar entre si resultados individu-
to, orgulho, ódio e altruísmo. ais e, portanto exigir que o corpus se-
lecionado trate do mesmo tema.
Em cada situação ele deve agir
e comunicar, mas com estraté- Segue-se então a formulação das hi-
gias ligeiramente diferentes, já póteses e dos objetivos. As hipóteses,
que ele se encontra em posi-
segundo Bardin (1988) são suposições
ções de legitimidade diferentes.
Diversos tipos de palavra (ou de
cuja origem é a intuição e que preci-
estratégias discursivas) estão à sam ser validadas com provas extra-
disposição: palavra de promes- ídas dos dados. O objetivo é a finali-
sa, palavra de decisão, palavra dade geral, sua utilidade na resolução
de justificação, palavra de dissi- de um problema ou composição de
mulação. (CHARAUDEAU, 2006, um quadro teórico. Não está descar-
p. 258). tada nesse sistema a possibilidade de
estudos exploratórios, que analisem
Após essa breve fundamentação teó- os textos em busca de insights, sem
rica podemos nos aproximar mais da hipóteses prévias. Em todo o caso hi-
análise dos conteúdos selecionados. póteses, mesmo que implícitas, serão
Mas para isso é necessário selecio- levantadas e deverão ser submetidas
nar uma metodologia adequada e já a comprovação.
estabelecida para guiar a análise de Com as hipóteses escolhidas, deter-
forma mais completa. Como poderá minam-se os indicadores para com-

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provação das mesmas. Aqui estão elementos tanto quantitativos quando qua-
litativos. Quantitativamente, Bardin sugere que seja feito um recorte por meio
de escolha das “unidades de registro e de contexto”, ou seja, o que de fato
será observado e contabilizado. Podem ser as palavras , os temas (ou núcleos
de sentido), os personagens, os acontecimentos, e a estrutura do documento e
ainda outros. A contabilização, ou as “regras de enumeração” podem consistir
na análise da freqüência, presença (ou ausência), intensidade (semântica, tem-
po verbal e outros), direção (positivo, neutro, negativo) e ordem de aparição.
A análise qualitativa é importante por admitir que a presença ou ausência de
um índice pode ser mais reveladora que a freqüência do mesmo. Além disso,
permite analisar relações entre os índices, e realizar inferências acerca de
causas e efeitos das mensagens.
Depois de selecionados os indicadores é o momento de fazer aplicação dos
mesmos nos textos selecionados, fase denotada de “exploração do material”,
de onde serão retirados dados para a fase de tratamento que envolve as opera-
ções estatísticas, categorização e inferências, definidas na fase de pré-análise.

O fluxo das etapas da metodologia pode ser visualizado por meio da fi-
gura elaborada por Bardin (1988) a seguir. O quadro por ela desenvolvido
resume as etapas que podem ser seguidas no desenvolvimento da analise
de um conteúdo.

Figura 1. Desenvolvi-
mento de uma análise.
Fonte: BARDIN, 1988,
p. 128.

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3. PRÉ ANÁLISE declaração de guerra em 1º de setem-
A primeira etapa em direção a análise bro de 1939. Para selar a escolha, os
comparativa dos conteúdos presentes dois discursos abordam tópicos se-
nos pronunciamentos de Churchill e melhantes para explicar as causas da
Hitler foi a seleção das falas. Para isso guerra e preparar a população para
alguns discursos foram explorados os acontecimentos futuros, o que per-
até que dois deles se destacaram por mite uma análise comparativa clara,
estarem temporalmente próximos, respeitando a regra da homogeneida-
ambos proclamados em 03 de setem- de proposta por Bardin. O primeiro
bro de 1939, e também devido a im- discurso a ser apresentado será o de
portância histórica de ser o primeiro Winston Churchill , que pode ser con-
discurso de ambos os líderes após a ferido a seguir:

“Discurso de Guerra” – de Winston Churchill

Nesta hora solene é um consolo recordar e viver nossos repetidos esforços para paz. Todos fo-
ram malfadados, mas todos têm sido feitos com fé e sinceridade. Isto é do mais alto valor moral
no momento presente - e não apenas valor moral, mas de valor prático - porque a concordância
sincera de dezenas de milhões de homens e mulheres, cuja cooperação é indispensável, cuja
camaradagem e fraternidade são indispensáveis, é a única base sobre a qual as provações e
as tribulações da guerra moderna podem ser suportadas e superadas. Esta convicção moral
proporciona uma resiliência sempre estimulante e renovará a força e a energia das pessoas nos
longos, duvidosos e escuros dias. Lá fora, as tempestades de guerra podem explodir e as terras
podem ser açoitadas com a fúria de seus ventos, mas em nossos corações nesta manhã de do-
mingo, há paz. Nossas mãos podem estar ativas, mas as nossas consciências estão em repouso.

Não devemos subestimar a gravidade da tarefa que está diante de nós ou a temeridade da
provação, a que não devemos nos encontrar indiferentes. Devemos esperar muitas decepções,
e muitas surpresas desagradáveis, mas podemos ter certeza de que a tarefa que aceitaram li-
vremente não está além do compasso e da força do Império Britânico e da República Francesa.
O primeiro-ministro disse que era um dia triste, e isso é realmente verdade, mas no momento
há outra nota que pode estar presente, que é um sentimento de gratidão que, se estas grandes
aflições se abaterem sobre a nossa Ilha, existe uma geração de britânicos aqui prontos para
provar a si mesmo não indignos dos dias de outrora e não indignos desses grandes homens, os
pais da nossa terra, que lançaram as bases de nossas leis e formaram a grandeza do nosso país.

Esta não é uma questão de lutar por Danzig ou lutar pela Polônia. Estamos lutando para salvar
o mundo inteiro da peste da tirania nazista e em defesa de tudo que é mais sagrado para o
homem. Esta não é uma guerra de dominação ou engrandecimento imperial ou ganho de ma-
terial; não é uma guerra para tapar qualquer país de sua luz solar e meios de progresso. É uma
guerra, vista em sua qualidade inerente, para estabelecer, em rochas inexpugnáveis, os direitos
do indivíduo, e é uma guerra para estabelecer e reviver a estatura do homem.

Talvez possa parecer um paradoxo que uma guerra empreendida em nome da liberdade e direi-
to deve exigir como parte necessária de seus processos, a entrega para o momento de muitas
das liberdades e direitos de valor muito caro. Nestes últimos dias, a Câmara dos Comuns tem
votado dezenas de leis que entregam ao executivo nossas mais caras e valorizadas liberdades
tradicionais. Temos certeza de que essas liberdades estarão em mãos que não vão abusar de-
las, que não irão utilizá-las para nenhuma classe ou interesses de partido, que irão valorizar e
protegê-las, e estamos ansiosos para o dia, certos, confiantes e ansiosos para o dia, quando as
nossas liberdades e direitos serão restaurados para nós, e quando deveremos ser capazes de
compartilhá-los com os povos a quem essas bênçãos são desconhecidas.

Traduzido livremente do original em inglês disponível na em http://www.winstonchurchill.org


sob o título de “War Speech”. O discurso foi proferido no Parlamento Inglês.

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O segundo discurso apresentado será o de Adolf Hitler que pode ser lido abaixo:

“Apelo ao povo alemão” – de Adolf Hitler

Durante séculos, a Inglaterra tem perseguido o objetivo de tornar os povos da Europa indefe-
sos contra a idéia britânica de conquista do mundo, proclamando um equilíbrio de poder. Isto
permite a Inglaterra o direito, no mais surrado de pretextos, atacar e destruir qualquer Estado
europeu que pareça ser o mais ameaçador.

Uma vez isto foi verdade do Império Espanhol, em seguida, no holandês, depois no Francês,
e, desde 1871, isto tem sido verdade do Reich Alemão. Nós mesmos testemunhamos a política
de cerco que a Grã-Bretanha tem procurado implementar contra a Alemanha desde antes da
guerra. No momento em que o Reich alemão, sob a liderança nacional-socialista, começou a se
recuperar das conseqüências terríveis do Tratado de Versalhes e ameaçou superar a crise, a
política britânica de cerco imediatamente começou mais uma vez.

Os senhores da guerra britânicos conhecidos por nós, desde os dias da Guerra Mundial não
querem que o povo alemão viva. Antes da Guerra Mundial, eles mentiram para nós, alegando
que sua luta foi dirigida apenas contra a Casa de Hohenzollern ou contra o militarismo alemão

Eles declararam que não tinham projetos em colônias alemãs, nem mesmo haviam pensado em
tomar a nossa marinha mercante. Então, eles forçaram o povo alemão sob o jugo do Tratado
de Versalhes. Mais cedo ou mais tarde, a obrigação do cumprimento deste novo Tratado teria
significado a erradicação de vinte milhões de alemães. Eu, então, me comprometi a mobilizar
a resistência da nação alemã contra isso, e, em um esforço único e pacífico, a garantir o pão
e trabalho para o povo alemão. Na medida em que uma revisão pacífica das humilhações do
Tratado de Versalhes pareceu prosseguir com sucesso e o povo alemão mais uma vez começou
a viver, uma nova política de cerco organizada pela Inglaterra se iniciou. Os senhores da guerra
fizeram sua aparição novamente em 1914. E outra vez, eu ofereci à Inglaterra e aos ingleses um
entendimento e a amizade do povo alemão. Minha política inteira foi construída sobre esta idéia
de um entendimento. Eu fui rejeitado uma e outra vez.

Em vez disso, houve uma busca contínua de novos pretextos hipócritas para limitar o habitat
alemão, mesmo em áreas onde nunca ameaçamos os interesses britânicos. Novas tentativas
foram feitas para tornar a nossa vida mais difícil e nos separar.

Foi a Inglaterra, que incitou à Polônia a postura que tornou impossível um entendimento pa-
cífico. Sua declaração de garantia, abriu para o Governo polaco a possibilidade de provocar a
Alemanha sem correr qualquer perigo, e até mesmo de serem autorizados a atacar a Alemanha.

O governo britânico errou em um ponto, no entanto: a Alemanha de 1939 não é a Alemanha de


1914! E o nome de seu chanceler presente não é Bethmann-Hollweg! Além disso, nos meus dis-
cursos em Saarbrücken e em Wilhelmshaven, declarei que nós devemos defender-nos em vista
desta política britânica de cerco. Eu não deixo nenhuma dúvida de que, apesar de paciência e
resistência, os ataques poloneses contra alemães, bem como contra o Cidade Livre de Danzig
teve que chegar a um fim.

Fortalecidos pela garantia britânica e os protestos de belicistas britânicos, a Polônia acreditava


que poderia simplesmente ignorar estes avisos. Durante dois dias, agora o exército alemão vem
lutando no Oriente para restabelecer a segurança para o território do Reich. Nossos soldados
estão quebrando a resistência polonesa.

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A Inglaterra pode perceber: hoje o Reich alemão une 90 milhões de seres humanos! E eles estão
determinados a não permitir-se estrangular pela Inglaterra. Ao contrário da Inglaterra, eles não
têm travado guerra para conquistar 40 milhões quilômetros quadrados de terra. No entanto,
eles têm a vontade de viver sobre a terra que lhes pertencem. E eles não vão deixar a Inglaterra
tomar esta vida deles.

Sabemos que o povo inglês em sua totalidade não pode ser responsável por tudo isso. Pelo con-
trário, é a classe judaico-plutocrática e democrática que se autodenomina superior que gostaria
de conceber o resto do mundo como escravos obedientes; que odeia o nosso novo Reich porque
o vêem como um dos pioneiros do trabalho social e temem poder infectar seus países também

Vamos agora assumir esta luta contra esta nova tentativa de destruir a Alemanha. Vamos levá-
-la com determinação nacional-socialista. O dinheiro e os políticos britânicos podem descobrir o
que significa entrar em guerra contra Alemanha nacional-socialista, sem qualquer causa.

Por meses eu tenho sabido que o objetivo perseguido por esses senhores da guerra foi de longo
prazo. A determinação para atacar a Alemanha, em uma ocasião oportuna, chegou há muito
tempo. Minha decisão, no entanto, para conduzir esta guerra e contra-ataca-los é marcada por
uma determinação ainda maior.

Alemanha não vai capitular nunca mais. Paz, sob as condições de um segundo Tratado de Ver-
salhes, ou pior, não tem sentido.

Nós nunca fomos um povo de escravos! E nunca seremos um no futuro também! E os sacrifícios
que tantos alemães fizeram no passado não serão maiores do que aqueles que estamos deter-
minados a tomar sobre nós hoje. Esta decisão é implacável. E isso obriga-nos a tomar medidas
decisivas, acima de tudo, como exemplo: ninguém deve fazer lucro nesta guerra, enquanto
nossos soldados estão lutando no front. Ninguém deve tentar escapar do cumprimento de seus
deveres enquanto nossos soldados estão lutando no front. Quem tentar resistir a estas medidas
não pode esperar que a população mostre consideração a ele.

Além disso, todos nós sabemos: enquanto o povo alemão ficou unido em sua história, nunca
foi vencido! Apenas a dissidência do ano de 1918 levou ao colapso. Assim, quem agora acredita
que pode pecar contra esta unidade não pode esperar outra coisa que não a sua destruição
como um inimigo da nação.

Se o nosso povo cumprir seu maior dever a este respeito, então o Senhor Todo-Poderoso nos
ajudará. Ele sempre concedeu Suas bênçãos sobre aqueles que estavam determinados a ajudar
a si mesmo! As leis necessárias para a defesa e segurança do Reich estão sendo decretadas. Os
homens responsáveis por sua implantação e cumprimento estão sendo nomeados. Eu mesmo
irei para o front hoje.

Traduzido livremente do original em alemão disponível na internet em http://der-fuehrer.org/


sob o título de “An das deutsche Volk!”.

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Após a leitura flutuante e a seleção dos conteúdos a hipótese sugerida é de que
existem similaridades nos discursos de Churchill e Hitler, que apesar de suas dife-
renças como líderes, são responsáveis pela reconhecida qualidade dos conteúdos.
O objetivo deste artigo é então identificar e classificar as similaridades existentes
nestes discursos selecionados para que possam ser trabalhadas de forma sistemá-
tica nas práticas e estudos da comunicação social.

Bardin estabelece como passo anterior a análise propriamente dita, a definição


das unidades de registro e de contexto que serão contabilizadas em busca de se
alcançar o objetivo proposto. Neste caso o que se busca são as similaridades nos
discursos, para tanto será feita uma análise quantitativa e comparativa do número
de palavras, categorias sintáticas e temas mais utilizados por Churchill e Hitler. E
sob o aspecto qualitativo serão investigadas mensagens de impacto não quantita-
tivo, com destaque para a ausência e a presença de conteúdos e mensagens não
explícitas, porém observáveis.

4. A ANÁLISE

4.1 As Palavras
A seguir consta a tabulação dos dados, que foi construída a partir da utilização de
programa de computador que realiza a contagem de palavras e indica a freqüência
das mesmas. A divisão sintática exigiu um trabalho de separação e classificação
das palavras cuja freqüência foi superior a duas aparições e por isso representam
a ênfase do conteúdo.

Os principais verbos utilizados por próximo. O discurso é ainda um cha-


Churchill são “é”, “podem”, “devemos” mado para os deveres que serão ne-
e “ser”. A iminência da Guerra foi um cessários durante o conflito, e a pala-
período de incerteza e expectativa, o vra “devemos” reflete esse aspecto e
que é inferido pelo uso freqüente da mostra a necessidade de engajamen-
palavra “podem”, sugerindo as pos- to e aproximação do discursante com
sibilidades e dificuldades do futuro os ouvintes.
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No discurso de Hitler observa-se a tentar resistir a estas medidas não
agressividade de alguns verbos que pode esperar que a população mostre
foram mais utilizados, como “Tomar”, consideração a ele”.
“Atacar” e “Lutando”. Vale notar
que esses verbos não são utilizados Os adjetivos são pouco repetidos, sen-
com a intenção de incentivar essas do a palavra “moral” a mais utilizada
ações, mas no sentido de se posi- por Churchill e “alemão, britânico e
cionar como quem sofre com essas determinados” as mais freqüentes de
ações. Isso fica mais evidente com Hitler. Aqui nota-se um aspecto inte-
os verbos “estão” e “foi”. A palavra ressante em que Churchill promove
“estão” remete a “eles”, os ingleses, uma luta não contra uma nação, mas
que são os acusados durante o dis- contra uma ideia que prejudicaria o
curso. A outra palavra, “foi”, aparece sentimento de moralidade. Hitler, no
freqüentemente na contextualização entanto se esforça para separar bem
do passado recente de submissão da o povo alemão do povo inglês, que
Alemanha e para estimular o ódio segundo o ditador é a nação opres-
contra Inglaterra e França. sora que busca impedir a evolução
alemã. A palavra “determinados”, re-
Avançando para os substantivos petida algumas vezes, reafirma a mo-
encontra-se a primeira similaridade, bilização fanática pela causa nazista
com a palavra “guerra” sendo a mais e informa também sobre a impossibi-
utilizada por Churchill e Hitler. A pa- lidade de desistência.
lavra confirma o tema dos discursos
e deixa claro que não há mais nego- A análise dos pronomes permite ob-
ciações, ambos são uma confirmação servar a inexistência do pronome
da declaração de guerra. Seguindo, “Eu” no discurso de Churchill, en-
observa-se uma tendência poética quanto Hitler o utiliza por sete vezes.
nas escolhas de Churchill, ao utili- Como um membro do parlamento,
zar com mais freqüência as palavras Churchill não possuía poderes para
“Dia(s); Liberdades; Valor; Direitos e realizar mudanças políticas sozinho,
Momento”. O líder inglês faz ques- e por isso se refere ao parlamento e
tão de ressaltar que essa é uma luta ao povo como “nós”. Enquanto isso,
pela paz, que não possui interesses Hitler, com poderes ditatoriais, era
expansionistas, que é uma luta pela capaz de provocar grande parte das
defesa de direitos e liberdades. Esse mudanças que desejasse em seu país.
discurso transmite um ideal de luta O uso do pronome “eu” demonstra
legitima, isenta de culpa, uma luta do também a personificação do Estado
bem contra o mal, que remete às con- Alemão em sua pessoa, de forma a
quistas tão propagadas e enraizadas se qualificar como um herói que luta
pelo mundo ocidental de liberdade, por seu povo. Segue dois trechos que
fraternidade e valores. demonstram essa situação. O primei-
ro é “Eu, então, me comprometi a mo-
Enquanto isso, no lado alemão é no- bilizar a resistência da nação alemã
tável a questão ditatorial. As palavras contra isso, e, em um esforço único e
“Povo; Política; Cerco; Determinação; pacífico, a garantir o pão e trabalho
Cumprimento; Entendimento; Front; para o povo alemão”. Depois segue,
Resistência; Soldados e Senhores” são “E outra vez, eu ofereci à Inglaterra
uma imposição e um alerta ao povo e aos ingleses um entendimento e a
alemão do que deve ser obedecido. amizade do povo alemão”.
Hitler faz isso por meio de acusações
ao inimigo, valorização das terras e 4.2 Os temas
do orgulho germânico e intimidação Quando analisada a estrutura temá-
ao próprio povo. Isso fica evidente tica, algumas recorrências são obser-
nos momentos finais do discurso, com váveis. A primeira delas é o destaque
destaque para o trecho “ninguém que ambos deram aos esforços de paz
deve tentar escapar do cumprimento antes da guerra. Churchill inicia seu
de seus deveres enquanto nossos sol- discurso ressaltando esse ponto “Nes-
dados estão lutando no front. Quem ta hora solene é um consolo recordar

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e viver nossos repetidos esforços para a viver, uma nova política de cerco
paz. Todos foram malfadados, mas to- organizada pela Inglaterra se iniciou.
dos têm sido feitos com fé e sinceri- Os senhores da guerra fizeram sua
dade”. Hitler também o faz em mais aparição novamente em 1914”.
de um momento. Esse tema é neces-
sário para demonstrar a responsabi- Em seu livro, Mein Kempf, Hitler diz
lidade dos países e justificar a en- sobre a importância de um movimen-
trada na guerra. A cultura ocidental to popular possuir apenas um inimigo
exige esse esforço de paz prévio ao comum contra o qual ele deve lutar.
ataque, uma vez que quem faz o ata- Ele diz que a uniformidade intensifica
que inicial é visto como o gerador a crença na justiça da causa e reforça
do mal, aquele que deve ser comba- o sentimento de hostilidade contra o
tido, posição em que nenhuma na- adversário. Esse aspecto é visto tam-
ção quer se enquadrar. bém no discurso analisado quando é
dito “Sabemos que o povo inglês em
Outra similaridade presente nos dois sua totalidade não pode ser respon-
discursos é a evocação da honra aos sável por tudo isso. Pelo contrário, é
antepassados. Hitler faz isso no tre- a classe judaico-plutocrática e demo-
cho “Nós nunca fomos um povo de crática que se autodenomina superior
escravos! E nunca seremos um no que gostaria de conceber o resto do
futuro também! E os sacrifícios que mundo como escravos obedientes;
tantos alemães fizeram no passado que odeia o nosso novo Reich”. O ini-
não serão maiores do que aqueles migo do nazismo era o povo judeu, e
que estamos determinados a tomar não deveria haver outros. Entretanto
sobre nós hoje”. Churchill por sua vez o povo judeu estava presente em to-
diz “existe uma geração de britânicos dos os estados europeus, e segundo
aqui prontos para provar a si mesmo Hitler, esse povo estaria no controle
não indignos dos dias de outrora e dos países inimigos.
não indignos desses grandes homens,
os pais da nossa terra, que lançaram Outra similaridade encontrada é o
as bases de nossas leis e formaram a alerta sobre os sacrifícios necessá-
grandeza do nosso país”. Esse aspec- rios durante a guerra. No discurso
to é interessante e característico prin- de Churchill encontramos “devemos
cipalmente dos povos europeus que esperar muitas decepções, e muitas
valorizam sua história ancestral. Este surpresas desagradáveis” e “Talvez
aspecto do discurso é sentimental- possa parecer um paradoxo que uma
mente forte e apóia a criação de uma guerra empreendida em nome da li-
atmosfera transcendental, de perten- berdade e direito deve exigir como
cimento, gratidão, orgulho e respon- parte necessária de seus processos,
sabilidade pelo país. a entrega para o momento de muitas
das liberdades e direitos de valor mui-
É recorrente nos dois discursos a luta to caro.” Em Hitler pode ser lido “isso
contra um inimigo tirano e opressor, obriga-nos a tomar medidas decisi-
uma luta pelos direitos, honra e liber- vas, acima de tudo, como exemplo:
dade. No pronunciamento de Chur- ninguém deve fazer lucro nesta guer-
chill isso é verificado em “Esta não é ra, enquanto nossos soldados estão lu-
uma questão de lutar por Danzig ou tando no front. Ninguém deve tentar
lutar pela Polônia. Estamos lutando escapar do cumprimento de seus de-
para salvar o mundo inteiro da peste veres enquanto nossos soldados estão
da tirania nazista e em defesa de tudo lutando no front. Quem tentar resistir
que é mais sagrado para o homem”. a estas medidas não pode esperar que
Hitler diz da seguinte forma “Na me- a população mostre consideração a
dida em que uma revisão pacífica das ele”. Esses alertas dão credibilidade
humilhações do Tratado de Versalhes ao palestrante, revelando que o mes-
pareceu prosseguir com sucesso e o mo está ciente das conseqüências e se
povo alemão mais uma vez começou preocupa em preparar a população.

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5. INTERPRETAÇÕES encontrados no primeiro momento


Uma análise quantitativa dos textos com a análise quantitativa, pelo con-
permitiu alguns insights a respeito trário, os resultados ressaltaram a di-
dos líderes e do objetivo dos discur- ferença entre os líderes. Entretanto
sos. A análise temática permitiu iden- quando aplicada a análise qualitativa
tificar similaridades de forte apelo dos temas abordados, as semelhan-
emocional e de mobilização. Hitler e ças foram então evidenciadas.
Churchill tinham estilos discursivos
diferentes, mas utilizavam os mesmos Observou-se que inicialmente, nos
temas. Uma análise restrita ao texto, discursos, ambos se posicionaram
sem levar em consideração os aspec- contrários a guerra, ressaltando os
tos históricos nos leva a entender a esforços de paz previamente estabe-
Alemanha como um país oprimido lecidos. Podemos compreender que
que lutava por sua liberdade, e estava colocar-se na posição de vitima da
sob uma liderança que buscou de to- ofensa permite a legitimação da en-
das as maneiras a paz para devolver trada na guerra em busca da defesa
a honra e o desenvolvimento do seu dos próprios interesses. Além dis-
povo. Do outro lado, que a Inglaterra so, tal posicionamento estabelece a
convocava o povo inglês a defender a criação de um inimigo e de um obje-
liberdade, fraternidade e a moral do tivo, que tende a mobilizar a popula-
mundo, com um discurso de seme- ção. E tanto Hitler quanto Churchill
lhanças bíblicas, construído com po- qualificaram o inimigo como tirano
esia e referências sobre sacrifício em e opressor.
busca da salvação.
Complementar aos esforços de moti-
Independente da legitimidade das vação de ambos os líderes, foi utiliza-
causas, a compreensão do conteúdo da a referencia aos antepassados para
dos discursos dos líderes nesse singu- valorizar a importância de defesa da
lar momento histórico é importante, pátria e para gerar um sentimento de
pois alerta para possíveis ameaças orgulho e unidade entre o povo.
futuras. Populações em momentos
de crise mobilizadas com causas ex- E finalmente foi recorrente o alerta
tremistas, líderes com discursos acu- para os sacrifícios que estariam por
sadores, ressaltando os esforços de vir. Este tema foi tratado nos últimos
paz, elevando o orgulho das origens momentos em ambos os discursos, o
ancestrais e demandando a exigência que nos leva a entender que na estra-
de sacrifícios devem ser observados, tégia discursiva de ambos foi escolhi-
sobretudo quando iniciarem movi- do estimular os sentimentos de ódio,
mentos de fortalecimento militar. orgulho e unidade para depois infor-
mar das privações que a população
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS iria sofrer.
As hipóteses levantadas neste artigo
foram a da existência de semelhan- Os elementos temáticos identificados
ças, ou padrões, no conteúdo dos dis- foram eficazes no contexto da segun-
cursos de Winston Churchill e Adolf da guerra mundial e podem ser siste-
Hitler. O objetivo foi o de identificar matizados para a aplicação em con-
tais semelhanças a partir da seleção textos similares da comunicação nos
de dois pronunciamentos com a mes- tempos atuais.
ma temática. Os padrões não foram

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NOTAS

1 - Pós Graduando em Comunicação Estratégica na PUC Goiás. Bacharel em Publicidade e


Propaganda pela Universidade Federal de Goiás. E-mail: cleciogo@gmail.com

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

HOBSBAWM, Eric. Era dos Extremos: o breve século XX: 1914-1991, São Paulo: Companhia das
Letras, 1994.

KRIPPENDORFF, Klaus. Metodologia de análisis de contenido: teoria e práctica. Barcelona,


Ediciones Paidós, 1990.

JAKOBSON, Roman. On Linguistic Aspects of Translation, in Language in Literature, Cambridge,


Harvard University Press, 1987.

OVERY, Richard. 1939 - Contagem regressiva para a guerra. Rio de Janeiro: Editora Record, 2009.

CHARADEAU, Patrick, O Discurso Político. São Paulo: Contexto, 2006.

BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977

HITLER, Adolf. Mein Kampf. 1925. Disponível em: <http://www.greatwar.nl/books/meinkampf/


meinkampf.pdf>. Acesso em: 17 dez. 2012

OGGIONI, Alessandra. Discurso ideológico dos anos 30 dá lugar ao pragmatismo. Último Segundo
– Especial Revolução de 30. 2010. Disponível em: <http://ultimosegundo.ig.com.br/revolucao1930/
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17 dez. 2012

GUTERMAN, Marcos. A escalada do totalitarismo e do horror. Estadão. 2011. Disponível em: <http://
www.estadao.com.br/noticias/suplementos,a-escalada-do-totalitarismo--e-do-horror,767709,0.htm>
Acesso em: 17 dez. 2012

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