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Resumo
Abstract
The process of early deindustrialization affecting the Brazilian economy, resulting both from the
country's macroeconomic and institutional imbalances, has been aggravated in recent years by
the prolonged economic stagnation. This article seeks to deepen how this phenomenon of
deindustrialization and territorial mobility of capital unequally affects the Brazilian urban network,
with a specific look at the metropolis The objective is to highlight and characterize the process of
metropolitan deindustrialization, whether due to internal relocation or relative shrinkage and
absolute of industrial activity.
The data analyzed allow us to conclude that it is not possible to generalize, at least during the
expansion phase of the economic cycle, the joint occurrence of the processes of contemporary
metropolization with deindustrialization, since the latter behavior is more present in some poles
and, in almost all cases, with the exception of São Paulo, there is a process of relative loss of
importance of the industry, but not of absolute loss. And even in the case of São Paulo, there
would be a process of progressive de-industrialization, favored both by the relocation of the
industry to other more suitable territorial areas, and a productive restructuring carried out by
innovative sectors, especially the higher tertiary sector.
1 - Introdução
Este artigo tem como propósito evidenciar e caracterizar o processo de
desindustrialização metropolitana, na atual década, seja decorrente da
1
Economista e Mestre em Desenvolvimento Econômico. Docente da Escola de Negócios da Pontifícia
Universidade Católica do Paraná (PUCPR) e doutorando no Programa de Pós-Graduação em Geografia
da Universidade Federal do Paraná (PPGGEO/UFPR).
relocalização interna ou do encolhimento relativo e absoluto da atividade
industrial. Utiliza os dados das Contas Regionais do IBGE, apurados para as
metrópoles dos principais arranjos populacionais brasileiros. Também busca
perceber como novos fatores locacionais atuam impulsionando as atividades
industriais pelos diferentes compartimentos metropolitanos. Em um processo de
metropolização contemporânea que combina a concentração e dispersão,
conforme Lencione (2017, p.92), a indústria busca condições logísticas, terrenos
livres e bolsões de força de trabalho que não são dispersos de forma homogênea
no território metropolitano, mas configuram uma fragmentação que destaca as
“ilhas de urbanização” e “ilhas de produtividade” com condições privilegiadas
para receber investimentos com demandas espaciais seletivas.
A conclusão do estudo revela que a desindustrialização absoluta, ou
mesmo relativa, não se evidencia, em todo o período analisado, para o conjunto
das metrópoles brasileiras e, quando ocorre, é mais evidente nos polos
metropolitanos do que para o restante das áreas metropolitanas, e está
associada à fase recente do ciclo econômico de crise. Assim, a reestruturação
produtiva que caracteriza o processo de desindustrialização precisa ser
reavaliado nos diferentes compartimentos territoriais, pois não ocorre de maneira
homogênea para o conjunto do país, cabendo desenhar políticas de
desenvolvimento regional e setorial distintas para o enfrentamento do menor
dinamismo da indústria nas fases agudas crise e da estagnação econômica.
2
Para mais detalhes ver Almeida (2012) e Vergnhanini (2013).
3
As principais referências são Nakabashi; Scatolin; Cruz (2007), Bresser-Pereira; Marconi (2008), Oreiro;
Feijó (2010) e Cano (2012).
A segunda abordagem, a Ortodoxa-Liberal4, em um lado oposto à
corrente anterior, também evidencia a desindustrialização, mas decorrente da
ineficiência produtiva da indústria brasileira. A baixa competitividade decorreria
do protecionismo e menor exposição à concorrência internacional, o que explica
o atraso tecnológico e apego da indústria a subsídios e câmbio desvalorizado.
Mas ainda atuam as piores condições sistêmicas de competitividade industrial
(tributação, infraestrutura, mercado de trabalho) – Custo Brasil, além da
instabilidade macroeconômica, associada aos juros altos e déficits públicos
recorrentes (inclusive o previdenciário).
Uma terceira vertente, a Intrassetorial5, evidencia que ocorre a
desindustrialização pela mudança regressiva na composição interna da
indústria, com ganho relativo dos segmentos de menor intensidade tecnológica
e baixo valor agregado em detrimento dos segmentos mais intensivos em
tecnologia e alta agregação de valor. Tal fenômeno seria resultado tanto da
sobrevalorização cambial como da carência de uma política industrial
verticalizada.
Uma quarta ótica, a da Restrição Externa6, indica que a
desindustrialização está dissociada de determinantes históricos-estruturais,
percebendo a importância da substituição e complementariedade das
importações e do nível de investimento. Ocorreria um processo mais amplo de
mudança estrutural da economia brasileira, que conteria a desindustrialização.
O limite dessas abordagens, para nosso propósito, é analisar o conjunto
da indústria brasileira sem compreender as dinâmicas regionais e urbanas
diferenciadas, portanto, sem perceber os distintos movimentos de
industrialização e desindustrialização que possam ocorrer em diferentes porções
do território brasileiro ou mesmo em seus principais centros industriais.
4
Nessa abordagem se destacam as perspectivas de Barros; Pereira (2008), Bonelli; Pessoa (2010),
Schwartsman (2008, 2012) e Pastore; Gazzano; Pinotti (2013).
5
Nessa perspectiva destacam-se Feijó; Carvalho; Almeida (2005), Nassif (2006), Squeff (2012) e IEDI
(2019).
6
Para mais detalhes desta abordagem ver Carneiro (2010) e Cunha; Lélis; Fligenspan (2013).
A industrialização brasileira está historicamente associada à urbanização
e à metropolização. As metrópoles brasileiras, com exceção de Brasília,
apresentaram seu crescimento econômico e urbano dinamizado pela presença
das atividades industriais. A conformação das metrópoles industriais, como
modelo de metropolização brasileira, seguindo a referência do Rio de Janeiro e
São Paulo, é o paradigma predominante que vigorou no país em todo o século
XX.
Seguindo o modelo do U invertido proposto por Rowthorn, a própria
dinâmica dos mercados metropolitanos, suas concentrações populacionais, e
suas externalidades, apontam para uma crescente diversificação produtiva,
favorecendo a concentração de atividades terciárias, principalmente do terciário
superior e com maior intensidade em conhecimento e tecnologia, resultando em
mais um elemento da metamorfose metropolitana.
Porém, este processo não pode ser generalizado para todas as
metrópoles brasileiras e nem para todos os compartimentos metropolitanos. Na
metrópole líquida, estendida na sua área e ocupação e concentrada nas
atividades de maior valor agregado, há uma tendência de deslocamento da
indústria para as coroas e entornos metropolitanos, sobretudo nos municípios
mais integrados e melhor conectados. Lencione, ao analisar a metropolização
de São Paulo, indica:
Por outro lado, o processo de metropolização associado ao de
desconcentração industrial não se desenvolveu de forma contínua; ao
contrário, privilegiou as cidades localizadas junto aos principais eixos
de circulação viária. Além do mais, algumas cidades, não importando
o seu porte, ou seja, quer fossem médias ou pequenas, passaram a
ser integradas diretamente à nova lógica da reestruturação produtiva,
enquanto outras o fizeram apenas indiretamente. (LENCIONE, 2011,
p. 140)
7
Lencione (2015), Cano (2008) e Diniz (1993) e Azzoni (1986) .
cabe distinguir quanto desse movimento resultou em relocalização industrial,
tanto para o interior do estado, como para outras regiões da “aglomeração
poligonal da indústria brasileira”8, por uma multiplicidade de fatores que
conduziram a atividade industrial para outras regiões, conforme apontado por
Diniz:
Ao lado da reversão do processo de polarização da área metropolitana
de São Paulo, (...) vem ocorrendo a atração exercida por outras regiões
ou áreas do país. Essas estão ligadas a diferentes condições e
características: criação de economias de aglomeração e
externalidades em outras áreas; integração produtiva com as fronteiras
agropecuária e mineral; efeitos das políticas nacionais de
desenvolvimento regional e das políticas estaduais; melhoria da
infraestrutura; disponibilidade de matérias primas; estratégia de
barreiras a entrada ou de ocupação de mercados, entre outras. (DINIZ,
2013, p.19)
8
Diniz (1993)
empresas inovadoras do país e a macrometrópole paulista respondia por 73%
delas. Dessa forma, a macrometrópole conforma um território inovador, onde se
encontram condições específicas para o capital inovador, com as condições de
infraestrutura material, como a estrutura de P&D de apoio à inovação, e os
recursos de conhecimento, em especial os circuitos de difusão de
conhecimentos tácitos, a presença de ocupações em CT&I e a associação do
Estado com o capital privado inovador. (Tunes, 2015, Parte III, cap.3).
Assim, a macrometrópole estaria assistindo a um profundo processo de
reestruturação produtiva como território de inovação, que traz embutida a
desindustrialização, conforme apontado na abordagem da Restrição Externa.
9
Grupo formado pelas metrópoles de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Recife, Porto Alegre,
Salvador, Brasília, Fortaleza e Curitiba.
A tabela 1, a seguir, apresenta os dados de participação da Indústria10 e
dos serviços privados11 no total do Valor Adicionado Bruto (VAB) das metrópoles
brasileiras.
No conjunto das metrópoles a indústria perde participação relativa entre
2002 e 2013, de 25,24% para 21,35%, uma perda relativa de 0,35% ao ano,
revelando um processo de reestruturação produtiva com lenta perda de
importância relativa da indústria. Mas, no período da crise 2013-2016 a
contração foi de 21,35% para 19,59%, uma perda de participação próxima a
0,6% ao ano, revelando um maior impacto da crise sobre a indústria do que no
conjunto da economia, tanto nas metrópoles, em geral, como no país.
Em relação aos serviços privados, para o conjunto das metrópoles
selecionadas, assim como no total do país, a participação é crescente para todo
o período, com maior especialização relativa para os núcleos das metrópoles do
que para o entorno, evidenciando um processo de concentração conduzido pelas
economias urbanas facilitadas pela diversidade produtiva, efeito indutor entre
demanda e oferta especializadas, fertilidade cruzada (JACOBS, 1969),
infraestrutura dedicada, força de trabalho qualificada e ativos tecnológicos.
Tabela 1: Participação da Indústria no Valor Adicionado Bruto em territórios
selecionados, 2002, 2010, 2013 e 2016
Indústria Serviços Privados
Unidades Territoriais
2002 2013 2016 2002 2013 2016
Fortaleza (CE) 18,65 18,19 17,38 65,65 66,88 67,15
Metrópole Fortaleza 24,75 23,67 21,45 58,36 60,60 62,22
Recife (PE) 23,94 19,76 14,21 63,43 68,03 70,99
Metrópole Recife 27,27 26,28 22,93 54,94 58,24 59,12
Salvador (BA) 16,82 18,09 14,98 71,17 68,50 70,15
Metrópole Salvador 30,93 26,15 32,53 58,14 61,32 55,52
Belo Horizonte (MG) 19,02 22,15 15,71 68,35 65,82 70,22
Metrópole Belo Horizonte 28,15 30,13 26,20 57,95 57,54 59,35
Rio de Janeiro (RJ) 18,84 17,24 13,90 63,90 65,92 67,87
Metrópole Rio de Janeiro 18,97 18,57 15,96 59,35 60,83 62,74
São Paulo (SP) 17,42 14,06 11,11 75,43 78,36 81,53
Macrometrópole São Paulo 27,84 21,67 19,80 63,24 69,32 71,44
10
Conjunto da indústria extrativa, indústria de transformação, serviços industriais de utilidade pública e
construção civil, conforme adotado nas Contas Regionais do IBGE.
11
Classifica-se como serviços privados os serviços exclusive administração, defesa, educação e saúde
públicas e seguridade social, conforme os dados disponíveis nas Contas Regionais do IBGE. Assim o
grupamento setorial é composto tanto pelo comércio e outros serviços de distribuição, serviços pessoais
e serviços empresariais.
Curitiba (PR) 25,01 23,68 18,86 65,91 66,06 68,14
Metrópole Curitiba 33,35 29,49 27,71 56,08 59,01 58,60
Porto Alegre (RS) 13,25 13,84 10,84 76,50 74,67 78,36
Metrópole de Porto Alegre 27,05 22,79 23,89 61,25 63,27 62,89
Brasília (DF) 8,71 6,43 4,68 46,68 48,88 50,31
Metrópole de Brasília 8,96 7,09 5,23 46,53 48,64 50,13
Metrópoles Selecionadas 25,24 21,35 19,59 59,81 63,97 65,18
Brasil 26,37 24,85 21,23 50,73 53,49 55,66
Fonte: IBGE – Contas Regionais. Elaboração própria.
Nota: Em 2013 o município de São Francisco do Conde apresentou Valor Adicionado da Indústria
negativo, em grande proporção. Assim adotou-se, nesta e demais tabelas, para este município,
os dados de 2012, para evitar distorções na análise.
12
Quociente Locacional: razão entre a participação da região na atividade específica do país em relação a
participação da região na atividade global do país. No caso QL(i) = (Mi/BRi)/(Mpib/BRpib), sendo QL(i) o
quociente locacional da indústria, Mi/BRi a participação do Valor Adicionado da Indústria na Metrópole
em relação ao Valor Adicionado da Indústria no Brasil, e Mpib/BRpib a participação do PIB metropolitano
em relação ao PIB brasileiro.
Horizonte, no entorno metropolitano do Rio de Janeiro, São Paulo e Recife, e
nos polos de Salvador e Porto Alegre.
Tabela 3. Taxas Anuais de Crescimento do PIB real e VA Industrial real, em territórios
selecionados, 2003-2013 e 2014-2016.
Taxas Anuais de Crescimento
Unidades Territoriais 2003-2013 2014-2016
PIB real VA Industrial PIB real VA Industrial
Fortaleza (CE) 3,4% 3,2% -2,6% -3,5%
Metrópole Fortaleza 3,8% 3,4% -2,1% -4,8%
Recife (PE) 2,2% 0,6% -6,8% -16,3%
Metrópole Recife 3,7% 3,3% -5,2% -9,1%
Salvador (BA) 2,5% 3,5% -4,4% -10,2%
Metrópole Salvador 2,2% 0,9% -24,5% -3,4%
Belo Horizonte (MG) 2,8% 4,4% -6,4% -16,6%
Metrópole Belo Horizonte 3,7% 4,7% -6,7% -10,6%
Rio de Janeiro (RJ) 1,4% 0,3% -4,0% -10,1%
Metrópole Rio de Janeiro 1,8% 1,4% -3,0% -7,2%
São Paulo (SP) 1,6% -0,4% -3,4% -10,2%
Macrometrópole São Paulo 2,3% -0,1% -3,5% -5,6%
Curitiba (PR) 3,4% 2,7% -7,1% -13,7%
Metrópole Curitiba 3,7% 2,5% -5,9% -7,0%
Porto Alegre (RS) 1,8% 2,3% -1,1% -8,7%
Metrópole de Porto Alegre 1,9% 0,2% -1,0% 1,2%
Brasília (DF) 2,2% -0,8% 0,7% -8,7%
Metrópole de Brasília 2,3% 0,0% 0,6% -8,5%
Metrópoles Selecionadas 2,4% 0,9% -3,9% -6,1%
Brasil 3,0% 2,5% -3,5% -8,1%
Fonte: IBGE – Contas Regionais. Elaboração própria.
4 - Considerações Finais
Os dados, apresentados num breve panorama para o início do século
XXI, cobrindo duas fases do ciclo econômico observado, indicam que o processo
de metropolização e desindustrialização não são perfeitamente combinados. O
que se observa, em geral, é um fenômeno de desindustrialização relativa, e não
absoluta, cabendo mais uma indicação de reestruturação produtiva, com reflexos
setoriais e territoriais. Por um lado há metrópoles em reestruturação produtiva,
em que a dinâmica econômica passa estar mais atrelada ao terciário superior e
atividades mais intensivas em conhecimento e tecnologia, por outro lado, e há
as metrópoles em reestruturação territorial, com deslocamento da indústria para
os eixos e entorno metropolitano que ofereçam redes de conexão menos
conurbadas e apresentem externalidades para a atividade industrial
semelhantes às observadas no polo.
Estão, nesse processo, presentes duas forças centrífugas. Por um
lado, atividades industriais de maior escala precisam de disponibilidade de área
e condições logísticas não mais presentes no polo metropolitano, promovendo a
relocalização de plantas produtivas. Na mesma direção, a dispersão da
população, motivada pelo acesso e preço da terra nas áreas mais distantes do
polo, conduz a presença de serviços sociais, distributivos e pessoais, de menor
intensidade em conhecimento. E também forças centrípetas, associadas à
concentração dos setores de maior intensidade em conhecimento e alta
tecnologia, que demandam fatores locacionais associados às economias
urbanas de diversidade produtiva, maior oferta de ativos tecnológicos, mercado
de trabalho mais qualificado e aos burburinhos das centralidades, configurando,
impulsionando as atividades dinâmicas vinculadas a possíveis sistemas de
inovação metropolitano.
Nesse sentido, as políticas de desenvolvimento econômico, nas
metrópoles, devem estar atentas as transformações estruturais do seu aparelho
produtivo, com vistas a rebater as tendências de concentração, fragmentação e
seletividade espacial, que ampliam as tensões metropolitanas, sobretudo nos
momentos de crise e estagnação econômica..
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