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ENSINO DA GEOMETRIA NO CONTEXTO SOCIOCULTURAL DO POVO


UMBUNDU NA PROVÍNCIA DO BIÉ/ANGOLA NUMA PERSPECTIVA DA
ETNOMATEMÁTICA GD 16 -Etnomatemática

Conference Paper · March 2023

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Ezequias Cassela
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP)
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ENSINO DA GEOMETRIA NO CONTEXTO SOCIOCULTURAL DO
POVO UMBUNDU NA PROVÍNCIA DO BIÉ/ANGOLA NUMA
PERSPECTIVA DA ETNOMATEMÁTICA

Ezequias Adolfo Domingas Cassela1

GD 16 – Etnomatemática

Resumo: O presente projeto de pesquisa, conducente a elaboração da tese de doutorado em Educação


Matemática, objetiva-se em estudar os artefatos culturais do povo Umbundu da Província do Bié/Angola,
para o ensino da Geometria com foco na formação de professores do 2º ciclo do ensino secundário, visando
a contextualização dos conteúdos em uma dimensão cultural. O mesmo está encaminhado a responder a
seguinte questão da pesquisa: qual é a potencialidade de artefatos culturais do povo Umbundu da província
do Bié/Angola para o ensino da Geometria na formação de professores do 2º ciclo do ensino secundário?
Para tal adotou-se a pesquisa etnográfica centrada em interações com a comunidade e com os artefatos
produzidos, bem como pela realização de entrevistas semiestruturadas e observações participantes, com
registros de imagens, áudios e vídeos. O principal referencial teórico conta com as contribuições de
Ubiratan D’Ambrósio e o método da Etnogeometria de Paulus Gerdes, cuja ênfase recai aos
conhecimentos geométricos da cultura umbundu através de artefatos culturais. Além disso, considerar-se-
á Etnomodelagem para a utilização de artefatos como instrumentos pedagógicos que irão permitir o diálogo
entre a Geometria da cultura umbundu e a ensinada na academia. Com esta pesquisa espera-se que os alunos
possam se sentir motivados ao trabalharem com artefatos culturais, desenvolvendo a autonomia,
criatividade e inter-relações culturais, dando um novo olhar aos seus ambientes culturais e um sentido as
suas próprias aprendizagens.
Palavras-chave: Ensino da Geometria, Etnomatemática, Etnomodelagem, Artefatos culturais, Formação de
professores.

JUSTIFICATIVA DA PESQUISA

A educação em Angola, país situado na África Austral, constitui um processo que visa
preparar o indivíduo para as exigências da vida política, econômica e social, visando à formação
harmoniosa e integral do homem, tendo sido consagrada por lei como um direito para todos os

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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP; Programa de Pós Graduação; Doutorado em Educação
Matemática; eezequiasadolfo@hotmail.com; orientadora: Profa. Doutora Ana Lúcia Manrique.

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cidadãos, independentemente do sexo, raça, etnia e crença religiosa. Desde 1978 que o governo
angolano começou a engajar-se afincadamente na implementação de um sistema educativo para
as populações que estivesse em correspondência com as necessidades da sociedade angolana, em
detrimento de uma estrutura imposta pelo colonizador que predominou durante um tempo de
aproximadamente quinhentos (500) anos.
O processo de organização com vista a pensar Angola na perspectiva de desenvolvimento
em dimensões diferenciadas no período após proclamação da independência, ficou duramente
afetado por uma outra guerra civil que teve o seu fim em 4 de abril de 2002. Esse fato influenciou
negativamente o desenvolvimento progressivo da Educação no país, torna-o dependente de
modelos curriculares importados do exterior do país. Tal situação, foi anulando em passos lentos
as influências das manifestações emergentes da matriz cultural angolana no sistema educativo.
No decorrer dos anos, segundo informações sistematizadas pelo Instituto Nacional de
Investigação em Educação de Angola, o país começou a ressentir consideráveis consequências
neste quesito, tais como as que abaixo se descrevem:
Dificuldades na adaptação do currículo importado nas diferentes realidades sociais e
culturais do país, identificadas, fundamentalmente na gestão do processo formativo, conduzindo
assim os formandos para um perfil de saída menos desejado; constatação de uma formação muito
geral, teórica e abstrata, essencialmente dominada por abordagens normativas prescritas e
descritas; as condições de estudos oferecidas aos alunos, tais como: o número excessivo de alunos
por turma, falta de laboratórios e de infraestruturas desportivas, cantinas, livrarias, falta de
manuais escolares para os diferentes níveis, falta de programas uniformizados e estruturados, bem
como a falta de inspeção regular aos institutos, são apontados como fatores que contribuem para
a fraca qualidade do Sistema de Educação.
Os currículos de ensino passaram a ser vistos como instrumentos que oferecem uma
formação muito compartimentalizada e repetitiva, pois o formando não assume uma postura de
empoderamento e independência formativa. Os conhecimentos de contextos aprendidos fora do
ambiente escolares foram deixados de lado e subvalorizados, provocando no seio dos alunos um
sentimento de completa dependência.
Movido pela intenção de superar esta fase, o governo angolano levou e continua a levar a
cabo profundas reformas na sua política de governação e em particular no sistema educativo, tendo

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sempre como premissa a formação multifacetada dos cidadãos para que possam atuar
criativamente e estejam aptos para construir uma nova sociedade e defender as conquistas
alcançadas, tal como se verifica na Lei de Bases do Sistema Educativo e Ensino angolano, Lei
17/16 de 7 de outubro, aprovada em 2016 pela Assembleia Nacional da República, alterada e
republicada pela Lei n.º 32/20 de 12 de agosto. “(...) formar um indivíduo capaz de compreender
os problemas nacionais, regionais e internacionais de forma crítica e construtiva para a sua
participação ativa na vida social, à luz dos princípios democráticos.” (ASSEMBLEIA
NACIONAL DE ANGOLA, 2016).
A linha de pensamento pautada nesta Lei, denota a importância que o executivo angolano
concede na preparação do homem e o papel que este deve desempenhar na sua formação integral
para enfrentar a realidade e assumir uma atitude transformadora. Não obstante, para o alcance
desse objetivo, não basta apenas fazer reformas curriculares, faz-se necessário alcançar um ensino
que estimule os alunos a pensar, primar pelo desenvolvimento da reflexão sobre os conteúdos
aprendidos e a forma como se aprende, adaptando a utilização de planos de ação para as novas
situações.
Por isso as instituições de ensino de Angola em particular as de formação de professores
devem ser capazes de contribuir para a formação integral dos cidadãos, pelo que é necessário que
o processo de ensino e aprendizagem se relacione com o contexto sociocultural e produtivo do
aluno, de tal forma que se possam levar discussões nas aulas relativas aos problemas da prática
social. Essa perspectiva requer a inclusão dos contextos locais, históricos e culturais no ensino e
aprendizagem da Matemática, que por sua vez, sugere a matematização de atividades culturais.
Fato que me levou a adotar para este estudo a abordagem relacionada com a Etnomatemática, cuja
sustentabilidade tem fundamento na seguinte afirmação apresentada por Bandeira (2006, p.64).
A Etnomatemática encaixa-se perfeitamente no paradigma educacional proposto por
D’Ambrosio (2001), cujo objetivo principal é construir novos conhecimentos que
superem as limitações dos conhecimentos “formais e informais” em confronto. Esses
novos conhecimentos devem ser úteis à intervenção social transformadora da escola, da
educação em outros âmbitos (sociais, políticos, entre outros) e das próprias relações
sociais.

Por outro lado, olhando para a Geometria, importa referir que a razão que justifica a
atenção dedicada ao seu ensino como objeto da presente pesquisa, está relacionada com as

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situações observadas durante os anos de experiência do autor deste trabalho como professor de
Geometria Analítica na Escola Superior Pedagógica do Bié, como por exemplo, a pouca motivação
na aprendizagem de conteúdos ligados à essa disciplina, sustentada pela não implementação de
atividades que relacionem os conteúdos de ensino e aprendizagem com a realidade dos alunos.
Não se quer com isso afirmar que a causa total da falta de motivação pela qual as oportunidades
de aprendizagem dos alunos não são otimizadas, tenha a ver com esse distanciamento. Mas o rol
imenso de queixas relativamente a essas dificuldades, ocasionalmente é acompanhado pelas
seguintes questões:
• Aprender isso para quê?
• Onde é que esse conhecimento vai ser usado na minha vivência?
• Será que isso é aplicável no nosso contexto?
• Como podemos identificar isso nos objetos que fazem parte do nosso cotidiano?
Parece-nos que a ideia que os alunos querem transmitir com estas questões sobre a
Matemática, se enquadra na visão de Gerdes (2012, p.17), sedimentada no seu livro “o pensamento
africano com respeito aos conhecimentos matemáticos”, por meio da seguinte afirmação: "a
Matemática é vista como uma disciplina bastante estranha e sem utilidade, importada de fora de
África."
A descrição anterior parece mostrar que a falta de percepção por parte dos alunos de que o
mundo é cognoscível, que a Matemática surgiu pela abstração da realidade e que há nexos entre o
seu desenvolvimento com o da sociedade, pode ser uma das causas que fazem com que os baixos
níveis de aproveitamento no seu ensino e aprendizagem estejam amplamente difundidos. Na busca
de soluções para esse tipo de situações, no âmbito do processo de ensino e aprendizagem, Paulus
Gerdes (1996), propõe nove pontos que incentivam o professor a fazer do contexto um recurso
didático que desperte uma motivação para otimizar a aprendizagem dos alunos, dos quais, em
função da intenção desta pesquisa, escolheram-se três:
• Preparação dos futuros professores de matemática para a pesquisa das ideias e
práticas matemáticas das suas comunidades culturais, étnicas e linguísticas e que reflitam na
incorporação destas na sua prática de ensino;
• Incorporação no currículo de material de várias culturas, valorizando assim os
conhecimentos culturais dos seus alunos;

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• Introdução nos manuais de elementos culturais que facilitem a aprendizagem
através do seu reconhecimento.
Na mesma perspectiva considera-se, a afirmação de D'Ambrosio (2005), quando diz que
"o ensino da matemática não deve ser hermético nem elitista. Deve levar em consideração a
realidade sociocultural do aluno, o ambiente em que ele vive e o conhecimento que ele traz de
casa".
Alinhada a este pensamento, Santos (2014, p. 86) assinala que “o currículo escolar precisa
reconhecer outros modos de pensar matemática no ponto de vista pedagógico”. Em um outro
momento argumenta que,
[...] a matemática escolar rejeita e faz os alunos não aprenderem várias formas de pensar
matemática que são apresentadas na família e na comunidade “. Assim, é lícito trazer
para sala de aula olhares que contemplem a cultura africana, visto que “essa cultura
negada dentro dos espaços escolares, precisa ser visibilizada para contribuir com o ensino
e aprendizagem (SANTOS 2018, p. 12)

Rosa (2010, p. 869), por sua vez afirma que:


A Matemática é um empreendimento cultural enraizado na tradição. Ela não foi
concebida como uma linguagem universal, porque seus princípios, conceitos e
fundamentos foram desenvolvidos de maneira diferenciada pelos membros de grupos
culturais distintos.

Dando uma pausa no olhar para a Matemática em uma visão global e retornando a
Geometria, como uma área de conhecimento matemático e uma disciplina de ensino alvo desta
pesquisa, reconhece-se a sua importância como um saber necessário para a vida do aluno, uma vez
que por meio dela é possível se conectar com a realidade visando a compreensão do seu contexto,
conforme afirma Fainguelernt (1999, p. 20),
[...] A Geometria é considerada uma ferramenta para a compreensão, descrição e inter-
relação com o espaço em que vivemos. Por um lado, é, talvez, a parte da Matemática
mais intuitiva, concreta e ligada a realidade...

Olhando para a afirmação de D’Ambrosio, é possível compreender a necessidade de se


enquadrar as bases epistemológicas específicas para o ensino da Geometria no contexto social e
cultural do aluno, como fator preponderante para despertar a sua motivação na maximização de
oportunidades de aprendizagens, uma vez que o aluno, o seu ambiente e a sua cultura não existem
isoladamente. A aprendizagem da Geometria pode torna-se interessante quando corresponde às

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necessidades práticas que emergem da cultura do aluno, ou seja, aquela construída a partir da ação
do homem na satisfação das suas necessidades.
Em concordância com o anteriormente descrito e acreditando que determinados artefatos
culturais do povo umbundu da província do Bié podem ser utilizados, do ponto de vista didático
para motivar os alunos na aprendizagem de determinados conteúdos, bem como estimular o
desenvolvimento da criatividade, conduzindo-os à novas formas de relações interculturais,
realizar-se-á uma pesquisa visando a dar resposta a seguinte questão científica: qual é a
potencialidade de artefatos culturais do povo Umbundu da província do Bié/Angola para o ensino
da Geometria na formação de professores do 2º ciclo do ensino secundário? Para se dar resposta a
essa questão, determinou-se o seguinte objetivo geral: Estudar os artefatos culturais do povo
Umbundu da Província do Bié/Angola para o ensino da Geometria com foco na formação de
professores do 2º ciclo do ensino secundário, visando a contextualização dos conteúdos em uma
dimensão cultural.
Para a concretização do objetivo geral determinado nesta pesquisa, consideraram-se os
seguintes objetivos específicos:
• Observar as principais atividades desenvolvidas na realidade social, cultural e
natural do povo Umbundu na província do Bié, com vista a identificação de artefatos que
subentendem conhecimentos com significado geométrico (etno);
• Registrar toda informação a ser recolhida por meio de entrevistas aos artesãos,
ligada a produção de artefatos que fazem parte da realidade do povo umbundu da província do
Bié/Angola (matema);
• Usar os artefatos identificados com conhecimentos geométricos neles
subentendidos para o ensino da Geometria com foco na formação de professores do 2º ciclo do
ensino secundário, visando a contextualização dos conteúdos em uma dimensão cultural. (tica).
REFERENCIAL TEÓRICO

O principal referencial teórico conta com as contribuições de Ubiratan D’Ambrósio (1975)


e o método da Etnogeometria de Paulus Gerdes (2012), cuja ênfase recai aos conhecimentos
geométricos da cultura umbundu através de artefatos culturais. Além disso, considerar-se-á
Etnomodelagem para a utilização de artefatos como instrumentos pedagógicos que irão permitir o

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diálogo entre a Geometria da cultura umbundu e a ensinada na academia. Para a estruturação das
atividades didáticas com base aos artefatos culturais que permitirão contextualizar os conteúdos
de Geometria abordados em sala de aula em uma dimensão cultural, ter-se-á em conta a
potencialidade que brinda a Teoria das Situações didáticas de Brousseau (1975).

ASPECTOS TEÓRICOS METODOLÓGICOS

A presente pesquisa será desenvolvida na perspectiva da Etnomatemática, com foco


fundamental em artefatos culturais que subentendem conhecimentos com algum significado
geométrico do povo umbundu da Província do Bié em Angola. Nesta senda, a fonte direta dos
dados será o contexto sociocultural do povo umbundu. A visão que norteia as ações a serem
desenvolvidas tem fundamento no ambiente cultural deste povo em interação com o contexto
pedagógico dos alunos, futuros professores. Portanto, configura-se este trabalho como uma
pesquisa qualitativa, em conformidade com o pensamento de Gerhard (2009, p.32), ao pontuar o
seguinte:
A pesquisa qualitativa preocupa-se, portanto, com aspectos da realidade que não podem
ser quantificados, centrando-se na compreensão e explicação da dinâmica das relações
sociais.
O itinerário metodológico desta pesquisa é resultado de um planejamento ao meu cuidado,
assente em análises prévias de situações vividas dentro da cultura do povo Umbundu, enquanto
sujeito que nasceu, cresceu e foi educado com os princípios à ela atinente, bem como das
experiências acumuladas ao longo da minha prática docente inerente a formação de professores
no contexto da Escola Superior Pedagógica do Bié, as quais me permitiram estabelecer um contato
fatual com a problemática da pesquisa, motivando-me em traçar um cronograma de investigação
dentro de um espaço temporal de 2022 à 2025, sustentado por uma literatura de natureza teórica
alinhada à Etnomatemática.
O pensamento anterior se enquadra na visão de Merriam, (1988), destacada em um excerto
traduzido informalmente e adaptado de seu livro “Case study research in education: A qualitative
approach”, quando afirma que o problema de investigação pode ser definido primeiramente pelo
investigador baseando-se na sua própria experiência ou de situações ligadas à sua vida prática,

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mas que pode também resultar de deduções baseadas na teoria, na revisão de literatura ou nas
questões sociais ou políticas.
Como parte imanente do contexto da pesquisa, observarei ocasionalmente de forma
participada de dentro do ambiente de estudo, imerso no fenômeno de interesse, coletando dados e
analisando documentos conexos. (MOREIRA, 2003) Nesta perspectiva por se tratar literalmente
de registros próprios, artefatos e grupos de pessoas que são percebidas como portadoras de grau
de unidade da cultura Umbundu, considerei a existência de viés que enquadram este estudo em
uma componente mais específica do paradigma qualitativo, conhecida como etnografia:
A Etnografia é definida como um processo sistemático de observar, detalhar, descrever,
documentar e analisar o estilo de vida ou padrões específicos de uma cultura ou
subcultura, para apreender o seu modo de viver no seu ambiente natural. (LEININGER
1985, p.35)
Sabendo que a pesquisa etnográfica se serve fundamentalmente da observação participante,
desenvolverei o trabalho de campo imerso na cultura em estudo, assim como no contexto
pedagógico alvo da pesquisa, uma vez que o foco da referida pesquisa considera duas etapas
fundamentais: o primeiro objetiva-se em conhecer e estudar os processos técnico da construção
de artefatos e atividades desenvolvidas no contexto social da cultura umbundu que subentendem
conhecimentos geométricos (êmico); o segundo visa desenvolver atividades didáticas por meio
desses artefatos para Educação matemática (ética) que permitem contextualizar os conteúdos da
Geometria em uma dimensão cultural, conforme legitima D’Ambrosio (2008, p.10):
A pesquisa no Programa Etnomatemática recorre a muitos métodos da etnografia,
etnologia e antropologia. É necessário identificar o conhecimento matemático das
comunidades e, em seguida, sistematizar esse conhecimento.

Percurso metodológico
Conforme anunciado anteriormente a pesquisa será desenvolvida em duas etapas
paralelas, a primeira será a observação e identificação das atividades que são desenvolvidas com
os saberes Geométricos da cultura umbundu, neste âmbito pretendo me descolocar por dois meses
em aldeias tradicionais da Província do Bié onde acredita-se haver uma conservação de valores
tradicionais da cultura deste povo para trabalhar com 3 (três) artesãos, 4 (quatro) anciãos dessas
aldeias que procurarão partilhar as experiências culturais das construções de artefatos, assim como
as outras informações de dimensões políticas (estrutura organizacional do povo), econômicas
(práticas de atividades sustentáveis, como agricultura, a caça e o comércio) e sociais (vivências,

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padronização e generalização de valores culturais). Os primeiros dias nas referidas aldeias, me
servirão para tomar contatos com as autoridades tradicionais, por formas a obter autorização para
trabalhar com aquele povo. Além disso, tratarei de conquistar a simpatia do público alvo da
pesquisa, comendo como eles, trabalhando com eles, explicando detalhadamente o propósito da
minha inserção naquela população para não ser visto como um espião. Ao longo da recolha de
dados, me servirei da observação participante, do registo de informações derivadas de entrevistas
semiestruturadas com os artesãos e os anciãos. Pretendo tirar algumas fotografias na medida em
que eles explicarão as técnicas para as referidas atividades. As línguas utilizadas para a conversa
informal serão o Umbundo e o Português.
Terminada a primeira etapa do processo de pesquisa, irei ao contexto da Escola Superior
Pedagógica do Bié, onde trabalharei com 10 alunos da minha turma do terceiro ano da referida
escola (os quais já adquiriram conhecimentos de Geometria Analítica e trabalham com a
Geometria plana no momento presente) para a aplicação das atividades que serão desenvolvidas
visando a conexão entre os saberes culturais com os da academia por meio da etnomodelagem
(zona de intercessão entre a antropologia cultural, Etnomatemática e a Matemática acadêmica).
Nesta perspectiva eu, enquanto pesquisador serei sujeito imerso no ambiente de estudo e
configurar-me-ei como instrumento principal de produção de dados. A recolha de dados nesta fase
incluirá, entrevistas, gravação de atividades quer seja em áudio ou em vídeo. As gravações em
áudio e em vídeo serão feitas enquanto decorrem as atividades, todos os dados serão valorizados
no momento da análise, após as análises, os dados serão submetidos nos arquivos do autor para
eventuais estudos posteriores.
ASPECTOS ÉTICOS DA PESQUISA

Riscos da pesquisa
Como qualquer pesquisa científica que envolve a participação de sujeitos, essa assume
riscos, tais como: a subestimação de situações sensíveis ao estado emocional dos participantes;
lesão de integridade de carácter; divulgação de questões sensíveis a estrutura organizacional da
cultura, da escola, da política, da religião e da tradição; exposição de imagens, de registros da fala
dos participantes ou quaisquer deslizes éticos. Nesta conformidade, o autor deste projeto procurará
assumir total responsabilidade para garantir o controle de todos aspectos éticos, visando o

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asseguramento do pleno consentimento dos participantes. Não serão divulgados imagens, vídeos,
áudios e registros de fala sem a prévia autorização dos mesmos mediante a assinatura de um
formulário de consentimento. Estabelecer-se-á um diálogo com os participantes para a
possibilidades da utilização de nomes próprios ou a adopção de pseudónimos.
Benefícios científicos
A pesquisa em questão pretende desenvolver atividades didáticas através de artefatos
culturais para a área da Educação Matemática que permitam contextualizar os conteúdos
académicos abordados em sala de aulas em uma dimensão sociocultural, com vista a despertar a
motivação dos alunos, a criatividade, a autonomia na aprendizagem de conteúdos ligados a
Geometria.
Benefícios sociais
Para além de contribuir para o resgate da identidade cultural dos alunos e da consciência
desta identidade, poderá servir para minimizar os níveis baixos de aproveitamento na disciplina
de Geometria, tal como afirma Paulus Gerdes (2012, p.19): “incorporando as etnomatemáticas no
currículo, contribui-se para a descolonização cultural. Reganhando autoconfiança cultural, social
e individual nas suas capacidades, os povos podem desenvolver criativamente aquela(s)
matemática(s) de que gostam e que lhes interessam.”
Cronograma de atividades.
2021 2022 2023 2023 2024
Atividades
1º 2º 1º 2º 1º
semestre semestre semestre semestre semestre
Disciplinas da pós-graduação
Definição do projeto de pesquisa
Levantamento bibliográfico
Elaboração do projeto e estudos de
campo
Avaliação do 1º corte e qualificação
pelo comité de Ética
Coleta de dados
Transcrição das gravações em
áudio e em vídeo
Análise dos resultados e discussão
Apresentação dos resultados em
congressos científicos
Elaboração da tese de doutorado

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Relatórios
Qualificação
Defesa da tese

REFERÊNCIAS
ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA DE ANGOLA. Lei nº. 17/16 de 7 de outubro de 2016. Lei de
Base do Sistema de Ensino de Angola nº 17/16. Diário Oficial da República de Angola: I série
– nº 170. Luanda: Imprensa Nacional – E.P, 2016.

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