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Anais franco-alemães, foi, sobretudo, Marx quem mais colaborou com essa revista. Nela
apareceram, em 1844, o ensaio acerca da como a questão judaica e a Introdução à crítica da
filosofia do direito hegeliana, assim uma troca de correspondência entre Marx, Ruge, Bakunin
e Feuerbach. Logo depois Marx rompeu com Ruge. Os juízos extremamente mordazes de Ruge
sobre a pessoa de Marx, e os não menos deprecativo de Marx sobre Ruge, em nada alteraram
o fato de que lhes era inteiramente comum o princípio da crítica a Hegel. A diferença, contudo,
consiste em que Marx excedia de longe, em rigor científico e energia, o talento jornalístico de
Ruge, que ele, entre os jovens hegelianos, não somente era o mais radical, mas também era
em geral aquele que, em Penetração conceitual erudição mais poderia competir com o próprio
Hegel. A frase retórica, que em Ruge pertence à substancia de seus escritos, é em Marx
somente um meio finalidade e não enfraquece o caráter penetrante de suas análises críticas. O
quanto ele foi formado por Hegel mostram menos seus primeiros escritos influenciados por
Feuerbach, mas que se referem imediatamente a Hegel, do que, ao contrário, O capital, cujas
análises, apesar de seu afastamento de Hegel, não são concebíveis sem a incorporação da
maneira como este autor traz o fenômeno ao conceito.
Quando o velho Marx chega a fixar o acontecer próprio da história nas transformações
ocorridas nas relações materiais de produção e ver nas lutas econômicas de classe o único
motivo para o movimento de toda a história, acredita ele ter ajustado contas com sua “antiga
consciência filosófica, porém, no fundo, continuou a subsistir, com a passagem para a crítica da
economia a discussão originária com Hegel. Sua primeira e, ao mesmo tempo, definitiva critica
a Hegel se põe como uma antítese à consumação hegeliana. A questão, que Marx movimenta
na sua tese, é a que se refere a possibilidade de um recomeço após aquele fim.
À tese de 1840-41 sobre Epicuro e Demócrito contém uma discussão indireta com a
situação criada por Hegel. Epicuro e Demócrito são considerados em relação a filosofia dos
gregos, consumada por Platão e Aristóteles, e de fato, em analogia com a resolução da filosofia
hegeliana por seus epígonos materialistas e ateus. As afirmações introdutórias a respeito do
relacionamento da filosofia grega clássica com as seitas filosóficas posteriores contêm
simultaneamente uma alusão ao relacionamento do próprio Marx com Hegel.
A filosofia grega parece encontrar o que uma boa tragédia não deve,
a saber, uma conclusão débil, Com Aristóteles, o Alexandre
macedônio da filosofia grega, parece cessar a história objetiva da
filosofia na Grécia [...] epicuristas, estoicos e céticos são considerados
quase como um suplemento inoportuno, que não guardam relação
alguma com suas potentes premissas.
Mas é um erro pensar que a filosofia grega tenha simplesmente se esgotado, enquanto
a história mostra que o assim chamado produto da decomposição da filosofia grega tornou-se
o protótipo do espírito romano, cuja particularidade plena de caráter e intensidade é
indiscutível. E se com isso a filosofia clássica chegou ao seu fim, não se parece a morte de um
herói com “o estouro de um sapo inflado”, mas sim com o pôr do sol que promete um novo
dia.
A afirmação segundo a qual a nova deusa tem a figura obscura de um destino incerto
da pura luz ou das puras trevas remete à imagem hegeliana do filosofar no crepúsculo cinzento
de um mundo que te tornou concluso, Isso significa para Marx: agora, após o
desmoronamento da filosofia que em Hegel havia se concluído, que ainda não se pode com
certeza ver se esse crepúsculo é um crepúsculo noturno, anterior a entrada de uma noite
tenebrosa, ou um crepúsculo matutino, anterior ao nascimento de um novo dia.
O envelhecimento do mundo efetivo coincide para Hegel com um rejuvenescimento
último da filosofia, e em Marx, que antecipa o futuro, coincide a filosofia concluída com o
rejuvenescimento do mundo real e em oposição à velha filosofia. Por meio da realização da
razão no mundo efetivo, a filosofia como tal se supera, adentra na práxis da não filosofia
existente, quer dizer, a Filosofia tornou-se marxismo, em uma teoria imediatamente prática.
Porque Marx compreendeu à nova situação de maneira tão radical que, a partir da
crítica da Filosofia do direito hegeliana, converteu-se em autor de O capital, podia também
compreender a acomodação de Hegel a efetividade política melhor do que Ruge.
Em que medida Marx seja um hegeliano ou Hegel “marxista” com essa crítica mostram
as exposições de Hegel sobre o diferente relacionamento da filosofia à efetividade na França e
na Alemanha: ele afirma que na Alemanha o princípio da liberdade somente existe como
conceito, enquanto na França alcançou existência política. "O que na Alemanha surge da
efetividade aparece como um ato de violência de circunstâncias extremas e da reação a isso."
Os franceses têm o “sentido da efetividade, do agir, do levar as coisas ao seu termo, Nós
temos a cabeça cheia de rumores de toda a espécie [...], por isso as cabeças alemãs preferem
ficar quietas, vestidas com seus gorros de dormir atuando em si mesmas".
Com respeito a relação da filosofia com a efetividade, Marx adotou uma postura
bifronte: contra a exigência prática de uma negação simples da filosofia e, ao mesmo tempo,
contra à mera critica teórica dos partidos políticos. Alguns creem que a filosofia alemã não faz
parte da efetividade e gostariam de superar a filosofia, sem realizá-la; outros acham que seria
possível realizar a filosofia sem superá-la. A crítica verdadeira precisa efetuar ambas. Ela é uma
análise crítica do Estado moderno e, ao mesmo tempo, uma dissolução da consciência política
até então vigente, cuja expressão última e mais universal é a Filosofia do direito, de Hegel.
A partir desse ponto de vista histórico, Para Marx, toda história anterior desloca-se
para o papel de mera "pré-história” perante uma total transformação das relações de
produção subsistentes, entendidas como o modo e & maneira como 0s homens produzem sua
vida física e espiritual. À esse "ponto nodal” na história da filosofia corresponde, na história do
mundo, um ponto de intersecção entre o futuro e o passado. À radicalidade dessa pretensão,
somente pode-se medir com Marx o programa inverso de Stirner, cujo livro divide toda a
história do mundo em duas partes, intituladas: “o homem” e “eu”.