Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Instituto de Economia
Arthur Welle
Campinas
2022
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
Instituto de Economia
Arhur Welle
Campinas
2022
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
Instituto de Economia
Arthur Welle
Defendida em 31/03/2022
COMISSÃO JULGADORA
Prof. Dr. Bruno Martarello de Conti - PRESIDENTE
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP)
Prof. Dr. José Dari Krein
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP)
Profª. Dra. Juliana Bacelar de Araujo
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)
Prof. Dr. Jacob Carlos Lima
Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR)
Prof. Dr. Marcelo Prado Ferrari Manzano
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP)
O Microempreendedor Individual (MEI) é uma figura jurídica recente criada com o obje-
tivo explícito de trazer à formalidade um contingente considerável de trabalhadores que até então
viviam fora da guarda mínima de proteção social. Esta política mostrou ter um impacto forte no
mercado de trabalho, até 2022 mais de 13 milhões de pessoas já se inscreveram no programa,
e a taxa de crescimento deste grupo foi positiva mesmo durante a crise sanitária da COVID-19.
Por outro lado, no Brasil e no mundo, há elementos que indicam o aumento da flexibilidade e
da precariedade no mercado de trabalho, e neste contexto o MEI, muitas vezes, pode ser visto
como mais um dos fatores que distanciam o trabalhador de direitos e proteções, garantias típicas
de uma relação de assalariamento formal. Esta visão questiona, e se preocupa, se o MEI não
estaria ocupando espaço do assalariamento formal, seja de modo geral quando um trabalhador
perde o emprego e se vê forçado a procurar o autoemprego via MEI, ou de forma mais ostensiva
quando uma empresa demite seus empregados assalariados e os recontrata como MEI.
O objetivo deste trabalho é situar o MEI no conjunto de fatores estruturais e conjunturais do
mercado de trabalho brasileiro em transformação e avaliar, do ponto de vista dos trabalhadores,
os resultados de tal política. Para atender a este objetivo geral, este trabalho faz uma discus-
são teórica sobre a ontologia do autoemprego e sua relação multifacetada com a precariedade
no mercado de trabalho. Em seguida, este trabalho faz uma análise de longo prazo dos conta
própria, grupo no qual o MEI melhor se encaixa nas pesquisas domiciliares, e uma análise dos
registros administrativos do MEI. Posteriormente o foco recai em análises das transições para
o MEI usando o painel da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios Contínua (PNADC),
aprofundando empiricamente uma série de hipóteses sobre o autoemprego, sua renda, e a qua-
lidade de sua inserção no mercado de trabalho. Finalmente, para dar conta de questões que
escapam às atuais pesquisas domiciliares, aplicamos uma pesquisa tipo survey com os MEIs
focada na identificação de características de dependência e precarização de sua inserção laboral.
Podemos concluir que o MEI é um grupo muito heterogêneo, tanto nas suas características
pessoais, quanto na sua forma e qualidade de inserção no mercado de trabalho. As trajetórias
laborais analisadas nos mostram que dois caminhos estão presentes no Brasil, o da formalização
e o da “pejotização”. A análise longitudinal nos mostra que as transições para o MEI significam
melhoria de renda quando esta é uma formalização e piora quando esta é uma pejotização em
períodos de desaquecimento do mercado de trabalho. Mostrou também que a renda é mais volátil
para os autoempregados via MEI e que estes têm piores chances de se aposentar. Mensuramos
ainda uma considerável proporção de MEIs que apresentam características de dependência e de
precariedade na ocupação e mostramos que, em muitos casos, estão associados no autoemprego
via MEI ambas as características.
Palavras-chave: Microempreendedor Individual (MEI), Autoemprego, Trajetórias, Preca-
riedade, Relações de trabalho.
ABSTRACT
The Individual Micro Entrepreneur (MEI) is a recent legal figure created with the explicit
objective of bringing to formality a considerable contingent of workers who until then lived
outside the minimum social protection guard. This policy has shown to have a strong impact on
the labor market. By 2022 more than 13 million people have already enrolled in the program,
and the growth rate of this group was positive even during the COVID-19 health crisis. On
the other hand, in Brazil and in the whole world, there are elements that indicate the increase
in flexibility and precariousness in the labor market, and in this context, the MEI can often be
seen as one of the elements that distance the worker from labor rights and protections - typical
guarantees of a formal employment relationship. This view questions, and worries, whether the
MEI is occupying the space of formal salary, been in general sense when a worker loses his job
and is forced to seek self-employment via MEI, or more ostensibly when a company fires its
salaried employees and rehires them as MEI.
The objective of this work is to place the MEI in the context of structural and conjunctural
factors of the ever changing Brazilian labor market and to evaluate, from the workers’ point of
view, the results of such policy. To meet this general objective, we make a theoretical discussion
about the ontology of self-employment and its multifaceted relationship with precariousness in
the labor market. Then, we make a long-term analysis of the self-employed, a group in which the
MEI fits best in the Brazilian household surveys, and an analysis of the administrative records
of the MEI. Subsequently, the focus falls on the analyzes of the transitions to the MEI using the
panel of the Continuous National Household Sample Survey (PNADC), empirically deepening a
series of hypotheses about self-employment, its income, and the quality of its insertion in the la-
bor market. Finally, to address issues that escape current household surveys, we applied our own
survey with MEIs focused on identifying characteristics of dependence and of precariousness of
their work.
We can conclude that the MEI is a very heterogeneous group, both in its individual cha-
racteristics and in its quality of insertion in the labor market. The labor trajectories analyzed
show us that two paths are present in Brazil, that of formalization and that of “pejotization”. The
longitudinal analysis shows us that the transitions to the MEI entails income improvement when
they are a formalization and worsening when it is a “pejotization” in periods of downside in the
labor market. It also showed that the income is more volatile for self-employed via MEI and
that they are less likely to retire. We also measured a considerable proportion of MEIs that have
characteristics of dependency and precariousness at work and showed that, in many cases, both
characteristics are associated in self-employment via MEI.
Key-words: Individual Micro Entrepreneur (MEI), Self-employment, Trajectories, Preca-
riousness, Labor Relations.
SUMÁRIO
RESUMO
ABSTRACT
INTRODUÇÃO 18
CONCLUSÃO 152
REFERÊNCIAS 157
INTRODUÇÃO
sobre o trabalho que envolve competição selvagem, sacrifícios e privações e ainda exploração
justificada de outrem em nome de uma promessa de vitória empresarial ou pessoal (SOFRITTI
et al., 2020).
Não se nega que parte dos inscritos como MEI sejam empreendedores verdadeiros, no sen-
tido schumpeteriano, mas eles não são a maioria. O empreendedor verdadeiro pode ser carac-
terizado pela busca do lucro, em contraste com a busca da subsistência da maioria dos autoem-
pregados (self-employment) (BALTAR; MANZANO, 2020). A maioria dos autoempregados, e
dos MEI como sua subclasse, busca somente a autossubsistência, não contempla inovar, crescer,
abrir filiais, contratar empregados. O pequeno negócio familiar, o trabalho provisório, o trabalho
como autoemprego como fuga da desocupação, o exercício de uma profissão que exige habilida-
des adquiridas (ex. pedreiro, padeiro, cabeleireiro) são as formas mais comuns do autoemprego
via MEI.
O MEI pode ser visto ainda por um terceiro ângulo, o da inclusão social e produtiva, por
meio da formalização via CNPJ e acesso a direitos sociais, em especial à aposentadoria. A
comparação quase inevitável é com os direitos do trabalhador assalariado formal, aquele que,
no Brasil, tem carteira assinada. O acesso à direitos é talvez o ponto mais celebrado da política, e
com justeza. Para muitos autoempregados que até então estavam na informalidade o MEI, e seu
baixo custo, é a única forma de poder contribuir para a previdência e ter acesso à aposentadoria
futura. Os questionamentos que se colocam aqui é sobre a qualidade deste acesso à direitos, e
se estes são suficientes para garantir tanto um trabalho digno quanto proteção para os momentos
de não trabalho (doença, e aposentadoria). Se de um lado ao comparamos o MEI com aquele
autoempregado que até então era informal vemos uma melhora indiscutível no acesso à direitos,
por outro lado, ao comparar os direitos do MEI com os direitos de um assalariado formal notamos
que este não tem férias, 13º salários, seguro-desemprego, entre outros elementos.
Ademais há questionamentos de que o MEI pode estar sendo usado por alguns por outros
motivos que não o trabalho via MEI. Há relatos de que o vínculo permite compras de automóveis
ou seguro saúde de forma mais barata do que aquelas compras feitas pela pessoa física. Em
especial, há a possibilidade do vínculo ser usado somente como uma forma de contribuição
previdenciária relativamente barata. Estes casos, ainda que factíveis, devem ser, no agregado,
somente residuais e não explicam o aumento das inscrições no montante que se vê. De todo
modo avaliar o programa deste ponto de vista é questionar sobre sua real efetividade e os méritos
e deméritos de sua atual estruturação.
Por último, o quarto ponto de vista é aquele de dentro do mundo dos trabalhos. Deste
ponto de vista o inscrito no MEI deve ser tratado como um trabalhador, que devemos avaliar na
comparação entre as outras categorias de trabalhadores ocupados do mundo dos trabalhos. Aqui
as perguntas que faríamos para avaliar o programa são bem distintas de quando olhamos para o
MEI como uma empresa, aqui queremos qualificar o MEI no seu trabalho, e a qualidade (ou falta
de qualidade) desta ocupação. Quem são os trabalhadores que se tornam MEI? Quais são os mo-
20
tivos para fazê-lo? O trabalhador procura voluntariamente ou é forçado à transição para o MEI?
Quais são as condições desta ocupação? Como é sua jornada? Esta ocupação resulta em renda
suficiente para o bem-estar do ocupado e de sua família? Qual é a volatilidade desta renda? Há
questões de subordinação deste trabalhador? O trabalhador define sua jornada, horários, ativi-
dades? Ele depende de um ou poucos clientes? Estas são questões que valeriam ser perguntadas
para qualquer trabalhador, mas que ganham contornos específicos dadas as características deste
grupo particular.
Uma fatia cada vez maior dos “novos” autoempregados está no setor de serviços e cons-
trução, conta própria, sem empregados, e em ocupação que exige pouco ou nenhum capital. O
temor é que este novo grupo está cada vez mais associado a uma condição involuntária, depen-
dente e precária (CONEN; SCHIPPERS, 2019, p.2).
Entre estas características que precisamos analisar para avaliar o MEI do ponto de vista
do mundo dos trabalhos estão as formas de transições para o MEI. Elas podem ser do conta
própria que até então era totalmente informal (formalização), ou pode ser que um trabalhador
assalariado seja forçado para esta posição na ocupação pela destruição dos postos de trabalho
assalariados formais. A trajetória deve ser chave para a qualificação do fenômeno.
Finalmente, o MEI pode estar sendo usado para aumentar o número daqueles na condi-
ção de empregado disfarçado, ou como é comumente conhecida, a “pejotização” na sua forma
restrita2 .
O objetivo de discutir o MEI do ponto de vista do mundo dos trabalhos não é exatamente
pautar a transformação de todo autoempregado em empregado, mas sim a transformação de todo
trabalho em um trabalho decente. O debate deve ser sobre assegurar um trabalho digno a todos,
que este seja produtivo, que este dê uma renda suficiente, que garanta segurança no ambiente
de trabalho, e proteção às famílias no momento de necessidade e na aposentadoria, que garanta
ainda liberdades de organização, participação e representatividade política nas decisões relativas
às suas vidas (WILLIAMS; LAPEYRE, 2017, p.7).
O microempreendedor individual vem tendo um crescimento expressivo ao longo da última
década no Brasil. Apesar disso, o estudo deste contingente dos ocupados é difícil e de certa forma
negligenciado. A lei do MEI de 2008 visava trazer à formalidade um contingente considerável
de trabalhadores que até então viviam fora da guarda mínima de proteção social (CÂMARA
DOS DEPUTADOS, 2010, p.12-13). No entanto, o MEI como política é ambíguo nas suas
consequências. Tanto pode ser visto como um sucesso como quanto um retrocesso em termos
de qualidade do, e no, trabalho. Do ponto de vista crítico o seu crescimento pode ser entendido
como fazendo parte de um contexto maior de mudanças estruturais no mercado de trabalho
brasileiro, em direção à maior flexibilidade das relações de trabalho e também em direção à
2
Veremos ao longo do texto, que podemos entender pejotização de forma ampla como o aumento do autoem-
prego, ou da forma restrita, indicando somente o caso onde há a burla das normas legais trabalhistas quando um
empregador tenta esconder o vínculo de assalariamento por meio de um contrato entre pessoas jurídicas
21
maior precariedade.
Nosso conhecimento sobre o MEI é ainda parcial e possivelmente insuficiente para guiar, de
todos estes pontos de vista, as ações de políticas públicas para este grupo. Avaliar o MEI, como
política pública complexa, exige um entendimento mais profundo da sua natureza como autoem-
pregado, de suas características específicas, do seu contexto no mercado de trabalho brasileiro
recente, das suas trajetórias de a para o MEI, e das possíveis consequências para os trabalhadores
e para a qualidade do seu trabalho.
O caminho percorrido pelo presente trabalho começa, no Capítulo 1, com uma discussão
das bases teóricas que guiam os estudos sobre a natureza do autoemprego, sua inserção no debate
da formalidade, o contexto mais geral das transformações pelas quais o mercado de trabalho vem
passando em direção à flexibilização e precarização, e finalmente uma apresentação do MEI no
contexto institucional do mercado de trabalho brasileiro. Já no Capítulo 2 fazemos uma análise
de longo prazo do mercado de trabalho brasileiro, focada no conta própria, grupo que melhor
representa onde o MEI se encaixaria nas estatísticas nacionais. Este capítulo descreve as caracte-
rísticas deste grupo, mostrando sua heterogeneidade, seu crescimento, e sua composição setorial,
ocupacional e outras divisões relevantes. O Capítulo 3 busca elucidar algumas hipóteses sobre
as transições para o MEI discutidas nos dois capítulos iniciais, desta feita empiricamente. As
transições, bem como, mais abrangentemente, as trajetórias laborais, são tomadas como chave
para aprofundar o conhecimento das reais diferenças deste grupo para com os outros (quem faz
a transição para o MEI, sua renda, a volatilidade dessa renda, e consequências de longo prazo
da atividade como MEI). Finalmente no Capítulo 4 temos dois objetivos, o primeiro é tentar
responder questões sobre a qualidade da ocupação como MEI baseada em perguntas diretas ao
grupo (via survey), e o segundo é utilizar o mesmo questionário para examinar os elementos
de dependência no grupo. Uma Conclusão fecha este trabalho retomando os principais pontos
levantados e elencando alguns pontos abertos para discussão futura.
22
Há muito tempo as ciências humanas buscam abarcar a realidade social em categorias ana-
líticas para melhor compreendê-la. Este ímpeto aplicado ao mundo dos trabalhos levou à criação
de inúmeras maneiras de classificar os ocupados no mercado de trabalho. Papel centralizador
nestas tentativas tiveram, e têm, os responsáveis nacionais e internacionais pelas estatísticas ofi-
ciais. Há uma tentativa perene de criar o melhor conjunto possível de categorias para entender
as facetas mais importantes de um mundo em constante transformação. Novidades regulatórias,
avanços tecnológicos e novas formas de organização produtiva fazem com que as classificações
que outrora representavam o mundo dos trabalhos não mais o façam satisfatoriamente. O tra-
balho por aplicativo, o aumento do outsourcing, de formas não-padrão de assalariamento e de
arranjos flexíveis são alguns dos muitos fenômenos recentes que, por vezes, borram as fronteiras
entre as categorias analíticas anteriormente utilizadas para descrever a realidade do mercado de
trabalho. Ademais, o ferramental analítico é construído com um objetivo de uso, ajudando a
trazer a tona alguma faceta da realidade de interesse de quem faz a análise, mas podendo, por
vezes, esconder outras. Isso significa que se o objetivo analítico mudar o ferramental muitas
vezes tem que ser adaptado.
No histórico do estudo do mercado de trabalho e das suas construções analíticas uma cate-
goria é central: a relação de emprego. A relação de emprego, ou de assalariamento, é tão central
para o capitalismo que por vezes pode ser tomada como uma de suas facetas constituidoras mais
importantes (MARX, 2013). A relação de emprego é aquela predominante na economia ca-
pitalista. Historicamente, em especial nas economias centrais, a relação de emprego formal é
aquela da maior parte dos ocupados. Na próxima seção discutiremos mais profundamente o sig-
nificado de formalidade, aqui, por enquanto, formal tem um sentido geral de ser regulada pelo
conjunto de leis de cada país, geralmente implicando uma série de direitos e restrições. De todo
modo, seja formal ou informal, a relação de emprego é aquela que é mais facilmente definível
(especialmente se regulamentada pelas leis nacionais), supostamente mais comum (nem sempre
verdade nas economias periféricas) e, portanto, aquela na qual as outras categorias do mercado
de trabalho se definem por oposição ou semelhança.
A primeira grande divisão dos ocupados no mercado de trabalho se dá entre emprego e
autoemprego (self-employment)3 . Se por um lado a categoria emprego é mais clara, a de au-
3
Talvez no lugar de "autoemprego"um termo menos ambíguo seria de auto-ocupação como usado por Souza
(2007). As estatísticas nacionais brasileiras recentemente vêm se afastando do uso do termo desemprego e passaram
23
toemprego quase surge como resíduo: aquilo que não é emprego. Muitas vezes as próprias
dificuldades em fazer a separação entre emprego e autoemprego são reveladoras da mudança na
natureza dos dois lados desta divisão. No restante dessa seção discutiremos o autoemprego, sua
ontologia ou natureza e a evolução das ferramentas analíticas criadas para ajudar a compreender
melhor suas características.
Quando pensamos em um autoempregado podemos ter em mente um dono de pequeno
negócio, um ambulante, ou até mesmo um dono de empresa grande com muitos funcionários.
Em contraste com os empregados, espera-se que estes trabalhadores não tenham um chefe, ou
seja, não tenham uma relação de subordinação. Intuímos que eles têm autonomia para decidir
quando e como executar as atividades que definem seu trabalho, novamente em oposição ao que
intuímos predicar uma relação de emprego (onde há subordinação à outra pessoa, que define
quando e como executar as tarefas do trabalho). Como consequência da relação, espera-se que
o empregado tenha um salário, isto é, uma renda acordada previamente e que será repetida no
transcorrer de um período também acordado (mensal, semanal, etc.). O autoempregado não
recebe salário, sua renda advém do resultado da operação da atividade produtiva na qual está
inserido (o resultado líquido entre seus custos e suas receitas). Já um tipo específico de emprego,
a relação de emprego padrão, seria de tempo integral, com prazo indeterminado e subordinado
diretamente por uma relação bilateral entre empregado e empregador (OIT, 2016). Comparado
com esta lista de características da relação de emprego padrão esperamos que autoemprego não
teria nenhuma dessas.
A classificação adotada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) de 1993 (Inter-
national Classification of Status of Employment, ICSE-93) divide os ocupados em assalariados
(empregados) e autoempregados (empregadores, os conta própria, membros de cooperativas e
trabalhadores familiares) (OIT, 1993). A ICSE-93, para fins estatísticos, define que empregados
são todos os ocupados cuja remuneração não depende diretamente do faturamento da unidade
na qual trabalham. Autoempregados, pelo contrário, têm sua remuneração dependente direta-
mente dos recursos angariados como resultado da atividade da unidade na qual trabalham, sejam
produtos ou serviços. Assim, autoemprego é tradicionalmente entendido como ocupação não
assalariada recompensada pelo lucro ao invés de salário, e autoempregado por “pessoas enga-
jadas na própria atividade econômica, não importando o tipo de contrato ou se tem ou não
empregados” (SKRZEK-LUBASIŃSKA; SZABAN, 2019, p.6).
A definição adotada pela OIT foi ao longo dos anos, cada vez mais, posta em questão por
não mais dar conta em descrever a realidade do grupo dos autoempregados, nem apontar com
clareza para as problemáticas que surgiam na esteira das mudanças no mercado de trabalho em
direção à flexibilização e em direção a formas não-padrão de ocupação (KREIN et al., 2018a). A
classificação de 1993 não era clara no tratamento de certos grupos de trabalhadores que tinham
a privilegiar o termo desocupação para evitar a confusão frequente entre ocupação e emprego (e por extensão a con-
fusão entre desemprego e desocupação, que são comumente usados como sinônimos). Como o termo autoemprego
é ainda predominantemente usado na literatura, mantivemos este neste trabalho.
24
uma condição ambígua entre empregados e autoempregados, e não levava em conta os diferentes
graus de autoridade e controle sobre a organização do próprio trabalho e nos diferentes graus
de riscos econômicos enfrentados (OIT, 2020, p.3). Vamos tratar de cada uma dessas facetas,
isto é, dependência (pessoal e econômica), risco e habitualidade, a seguir. A inclusão delas nos
permite enfatizar as características emergentes da natureza heterogênea do autoemprego.
Uma característica apontada como sendo do autoempregado, que o distingue da relação de
emprego, é sua relativa independência de ação, sua liberdade de definir quando e como trabalhar
sem ter a figura do chefe lhe disciplinando. Ser “chefe de si mesmo” é propagado como uma das
vantagens que fazem o autoemprego desejável, e de fato a independência é apontada por muitos
como uma das principais razões para se migrar voluntariamente para o autoemprego (SEBRAE,
2019b, p.77). Mas o que exatamente significa qualificar de independente o autoemprego?
Podemos dividir o conjunto de elementos que caracterizam a dicotomia depen-
dente/independente, dentro do contexto das relações de trabalho, em dois: subordinação
e dependência econômica.
A subordinação (também nomeada de dependência pessoal (EICHHORST et al., 2008,
p.29), (WILLIAMS; LLOBERA VILA; HORODNIC, 2020, p.2), (MILLÁN; MILLÁN;
CAÇADOR-RODRIGUES, 2020, p.2) (DIETRICH; PATZINA, 2018) ou dependência ope-
racional (OIT, 2018, p.16)) ocorre quando falta autoridade para o trabalhador definir várias
facetas do próprio trabalho, por exemplo, receber diretivas ou supervisão de como executar seu
trabalho, ou ter definido por outro sua jornada, horários e local de trabalho.
A relação de emprego padrão implica um contrato onde um trabalhador se submete à dis-
ciplina de horário, jornada, afazeres, em troca de um salário. A atividade produtiva capitalista,
organizada, racionalizada, compartimentada e dividida em uma série de procedimentos especia-
lizados, exige organização e coordenação de atividades, o que se consegue exigindo organização
e coordenação dos trabalhadores por meio de uma estrutura hierárquica, procedimental e com
responsabilidades bem ou mal definidas. Neste ambiente produtivo clássico exige-se a subordi-
nação e integração do trabalhador à disciplina do processo produtivo engendrado pelo capitalista.
Esta exigência é mais facilmente visualizada naqueles processo produtivos onde impera o tempo
e ritmo das máquinas.
Emprego e autoemprego de acordo com a antiga visão (por exemplo, aquela aparente na
ICSE-93) seriam polos bem definidos em relação à subordinação. O assalariamento estaria bem
estabelecido como uma relação subordinada, pois o empregado na maioria das vezes não define
seu horário, tarefas, jornada e local de trabalho. Ora, a estrutura do modo de produção capitalista,
na sua forma mais paradigmática, isto é a fábrica, exige uma complexa hierarquia e divisão de
tarefas específicas e coordenadas. Por oposição, o autoemprego então deveria ser aquele que
congrega no seu trabalho os elementos de autonomia e independência. No entanto, nem todo
empregado é completamente subordinado e, mais importante para nossa discussão aqui, nem
25
aqueles na condição de empregados, não define como vende, o que vende, e seu marketing (OIT,
2018, p.3). Este trabalhador seria considerado independente pelo critério de quantidade de cli-
entes ou proporção de renda advinda de uma única fonte, pois tem muitos clientes, porém será
considerado economicamente dependente pelos critérios de acesso ao mercado.
Algo semelhante se encontra nas novas formas de relação de trabalho por meio de aplicati-
vos ou plataformas. Aqui os elementos clássicos de autonomia e subordinação aparentam estar
embaralhados. Vamos pensar por meio de um exemplo: entregador que utiliza um aplicativo
para encontrar suas “corridas”. Este trabalhador não tem chefe direto, define sua jornada e ho-
rário de trabalho, é dono das duas principais ferramentas de trabalho (a moto e o celular), assim
podemos dizer que este trabalhador tem algum grau de independência pessoal ou operacional,
ou em outras palavras não têm alguns dos elementos que caracterizam a subordinação tal qual
um empregado. No entanto, seus clientes não são aqueles que recebem as entregas, mas sim a
empresa (ou poucas empresas) que gere a plataforma de seu trabalho. Ela não define o horário,
mas algoritmicamente a empresa que gere a plataforma incentiva locais e horários, e pune com
menores ou piores corridas aqueles que não cumprem com uma dada carga. O trabalhador não
é capaz de definir o preço do seu “serviço”, só pode aceitar ou recusar a corrida. E ainda a
empresa que controla o algoritmo pode a qualquer momento “desligar” o trabalhador alegando
descumprimento dos termos e condições de uso assinados no momento da instalação do apli-
cativo (OLIVEIRA; SANTOS; ROCHA, 2020, p.77-78). Com isso este trabalhador congrega
elementos claros de subordinação e dependência econômica (sem falar nos elementos de preca-
riedade, que discutiremos na próxima seção). Portanto, mesmo que existam elementos flexíveis
de autonomia, existem também elementos clássicos de dependência pessoal (ABÍLIO, 2020,
p.116), bem como de dependência econômica (CARVALHO; OLIVEIRA, 2021; OLIVEIRA;
SANTOS; ROCHA, 2020), de tal modo que é fácil argumentar que estes são empregados e não
outra coisa (e que lhes cabem os direitos legais como tais). Este é só mais um exemplo da área
cinzenta das novas formas de relação de trabalho, e nota-se, definir de uma ou de outra forma in-
cute tanto uma visão de mundo quanto interesses políticos e econômicos visto que os resultados
práticos de tal definição implicam em custos e portanto, perdas e ganhos econômicos.
Até aqui tratamos dos elementos de dependência (dependência pessoal ou subordinação
e dependência econômica) que caracterizam emprego e autoemprego, mas é possível também
olhar por um segundo prisma, o do risco4 (BÖHEIM; MÜHLBERGER, 2009). De fato, o risco
parece estar contido dentro dependência econômica, e estes dois conceitos estão ligados (EI-
CHHORST et al., 2008, p.29), mas pensar tendo como base o risco nos traz elementos interes-
santes para entender o autoemprego. O objetivo continua sendo o mesmo, mostrar as diferenças
na natureza de empregados e autoempregados, ou ainda entre diferentes tipos de autoemprega-
dos, na sua forma de inserção e ação no mundo dos trabalhos.
4
Na área jurídica brasileira também se usa o termo alteridade para se referir ao fato do empregado não assumir
os riscos (MACHADO, 2019, p.19).
27
Um empregado trabalha para um capitalista, que contrata sua força de trabalho na esperança
de utilizar o resultado do trabalho na obtenção de lucro (ou da acumulação de capital). Muitas
vezes é entendido que um dos componentes do lucro é o prêmio ao risco tomado pelo capitalista
ao se aventurar no mercado (SCHUMPETER, , p.129). No que consiste esse risco? O risco
econômico ou de mercado seria a possibilidade de falhar na empreitada capitalista, isto é, quando
este capitalista “perde” no jogo competitivo do mercado. O capitalista se lança à empreitada com
um afã próprio do apostador; ele não sabe se a sua tentativa de ação no mercado dará certo. Ele
pode produzir e não vender, ele pode ter um dado custo (e derivado desse um dado preço de
venda) e outra empresa entrar no mesmo mercado como concorrente baixando por demais os
preços, ou ainda, pode haver uma mudança de regulação que jogue na água seus esforços. A
incerteza ante aos resultados da aposta capitalista é o risco dessa aposta.
Nota-se que neste exemplo simples parece estar bem definido que de um lado temos o capi-
talista assumindo o risco e de outro empregados não assumindo este risco. Mas isso não é bem
verdade na medida em que o trabalhador pode ser demitido com maior ou menor facilidade a de-
pender da legislação nacional de acordo com flutuações na atividade econômica ou na demanda
específica daquela unidade produtiva. De fato, do ponto de vista do capital, o trabalho é visto
como custo5 , e, como custo, é alvo constante da busca de minimização. Daqui derivam uma
das defesas políticas da maior flexibilização e menor regulação do mercado de trabalho. Além
disso, temos que o risco da demissão repentina para o trabalhador assalariado é velha conhecida
de modo que em muitas nações, não sem luta dos trabalhadores, foram criados mecanismos para
diminuir as consequências desse risco, em especial as diferentes versões do seguro desemprego
(retomaremos a mitigação dos riscos na próxima seção ao discutirmos a precarização).
Como podemos caracterizar o risco no autoemprego? Como vimos, dentro das categorias
que compõem o autoempregado temos os empregadores que mais facilmente podemos colocar
do lado dos capitalistas no que tange ao risco assumido, mas temos também, e este grupo é nu-
mericamente muito maior, os conta próprias. Não parece tão claro como alocar o risco para estes
trabalhadores. Eles são muitas vezes empresas unipessoais, onde as características da atividade
exercida se assemelham com aquelas dos empregados, porém com as responsabilidades adicio-
nais de uma empresa. Para entender melhor essas colocações podemos lançar mão da ideia de
duas lógicas de ação: busca de lucro/acumulação ou busca de subsistência (PÁEZ, 2003, p.9)
(BALTAR; MANZANO, 2020, p.1) (BÖGENHOLD, 2020, p.2). Parte dos autoempregados está
em busca de lucro (empregadores e parte dos conta próprias verdadeiramente empreendedores),
outra parte dos autoempregados, age com relação à sua atividade ou ocupação pela lógica da sub-
sistência. Os que assim o fazem compartilham este comportamento com o paradigma clássico
dos empregados.
Os autoempregados que agem pela lógica da subsistência buscam na ocupação uma forma
5
De um ponto de vista Keleckiano muitas vezes o capitalista é cego para o fato de que, no agregado, o seu
gasto com os salários dos trabalhadores se torna, no giro da economia, a demanda pelos seus produtos e serviços
(KALECKI, 1954, p.46).
28
de adquirir rendimento para a manutenção da sua própria vida e de seu núcleo familiar. Para
estes não há vontade, ou meios, para crescer, contratar, ou tentar se tornar uma empresa maior. O
estabelecimento do negócio tende a se manter do mesmo tamanho, até pela natureza da ocupação
específica dentro do contexto de um negócio unipessoal. Um cabeleireiro, por exemplo, que tem
como salão um cômodo da sua própria residência, exerce seu trabalho sozinho, sem pretensões
de crescer, abrir filiais, ou contratar ajudantes. Por outro lado, o tipo ideal dos autoempregados
que agem de acordo com a lógica do lucro é o empreendedor (ou no nosso caso, microempreen-
dedor). A imagem ideal de um empreendedor de sucesso é um empresário criativo, disposto a
tomar riscos, inovador e com a habilidade de reconhecer e explorar oportunidades de negócios.
Essa imagem ideal de empreendedor não se encaixa facilmente com grande parte dos autoem-
pregados que buscam neste trabalho a própria subsistência.
Empreendedor é um conceito guarda-chuva para designar todos aqueles que se aventuram
na criação e expansão de novos negócios. É um conceito bastante disputado, muitas vezes,
mas não necessariamente, vindo associado à ideologia do empreendedorismo (LIMA, 2010). A
ideia clássica de empreendedor é schumpeteriana: aquele que toma risco capitalista e/ou que
inova. O empreendedor é um tipo particular de capitalista (para Schumpeter quase seu sujeito
definidor), mas que como capitalista busca o crescimento da sua empresa, ou em outros termos
a acumulação de capital.
Assim, a disposição da tomada de risco capitalista separa dois tipos de autoempregados.
E quando ocorre do risco ser empurrado para o trabalhador sem que este o queira, podemos
associar isso à dependência econômica tal como discutido anteriormente (EICHHORST et al.,
2008, p.29), agora sob a ótica do risco. Ademais, como já mencionado, o risco pode ser en-
tendido como um custo, e deste modo, o capital, logicamente, quer, na medida do possível, se
ver livre dele. Uma forma de fazer isso é tentar compartilhar com os trabalhadores o risco ca-
pitalista. O caso do trabalho por plataforma vai claramente neste sentido: o trabalhador assume
parte do risco capitalista quando fica disponível para arcar com as flutuações de demanda pelos
serviços ofertados pela plataforma. Se ocorrer uma baixa na demanda, ele fica sem trabalhar,
e sem receber. Esta é a chamada transferência do risco (DANSON; GALLOWAY; SHERIF,
2021; CONEN; SCHIPPERS, 2019).
Esta transferência, que é na verdade a tentativa de passar o custo do risco para o trabalha-
dor, ocorre de duas formas. A primeira forma de repasse de riscos é do risco capitalista per se,
que vínhamos discutindo anteriormente. Fazer com que o trabalhador arque com as consequên-
cias que as variações de demanda e flutuações no nível de atividade têm nas vendas e receitas
do capitalista (uma forma de flexibilização). A segunda forma é a tentativa de repassar o risco
social para o trabalhador, isto é, fazer com que ele, individualmente, esteja a cargo dos riscos
associados ao trabalho ou falta dele (EUROFOUND, 2017b, p.3). Este processo pode ser cha-
mado de privatização do risco (MASCINI; VEEN, 2020), na medida em que tenta passar da
coletivização do risco (quase sempre por intermédio do Estado) para a individuação do risco.
29
Para os empregados formais, o risco de desamparo e desemprego e da falta de renda, tende a ser
contrabalançado com direitos e mecanismos de proteção, garantidos para alguns que preencham
requisitos (por exemplo, no Brasil, seguro desemprego para empregados formais com 1 ano de
emprego). Para os empregados formais, o risco de longo prazo de não ter renda suficiente para
uma vida digna durante a velhice é contrabalançado, em boa parte dos países, pelo direito à
aposentadoria também dado uma série de requisitos preenchidos. A privatização destes riscos
sociais até então coletivizados, portanto, vem de mãos dadas com as tentativas de diminuição
do estado de bem estar social.
Nota-se que a discussão da privatização do risco serve tanto para o empregado quanto para
o autoempregado, economicamente dependente ou não, mas, argumenta-se, o risco para o au-
toempregado é maior pois sua proteção geralmente tende a ser menor. Como veremos o grupo
dos autoempregados é muito mais heterogêneo que o dos empregados, sua renda mais volátil,
sua chance de precarização maior, tudo isso faz com o que risco para os autoempregados da
insustentabilidade social no curto e longo prazo seja maior para este grupo (EUROFOUND,
2017b, p.4). Os autoempregados estão associados à ideia de independência e autonomia, e mais
recentemente, associados muitas vezes à ideologia do empreendedorismo, fortemente individu-
alista. É “esperado” da posição do autoempregado que este assuma os riscos individualmente, e
o fomento e a defesa de um mundo com menos empregos e mais autoempregos (na forma de em-
preendedores) se transforma no fomento e defesa da privatização do risco social e transferência
para o trabalhador do risco social e do risco de capital6 .
Como estamos vendo, a área cinzenta entre o emprego e o autoemprego é populada por
diferentes tipos de arranjo de trabalho. Os conceitos de dependência pessoal (subordinação),
dependência econômica e risco nos ajudam a entender melhor o debate sobre a natureza destes
arranjos. A dificuldade teórica em definir o ponto onde acaba o emprego e começa o auto-
emprego se torna uma dificuldade com consequências reais quando esta definição, qualquer que
seja, se cristaliza nas leis, sempre dentro de um ambiente de disputa política. A definição quando
se torna parte do ordenamento jurídico implica em direitos ou não para um dado grupo de traba-
lhadores, proteção ou não para um dado grupo de trabalhadores. Filgueiras e Dutra (2021, p.3)
afirmam que a própria conceituação de área cinzenta e aumento das “novas” formas de traba-
lho pode ser ideologicamente carregada e ser, portanto, usada para tentar remover as barreiras
impostas à exploração do trabalho.
Ontologicamente há um grupo na área cinzenta entre empregados e autoempregados:
quando um empregador trata um trabalhador autônomo (autoempregado) da mesma forma
6
O maior risco é ainda funcional para o capital de uma terceira maneira, quando o trabalhador com aumento da
insegurança se vê obrigado a "vestir a camisa", aumentar seus esforços ou aumentar sua jornada (FRACAROLLI,
2019, p.127).
30
como trataria um de seus empregados, escondendo sua real relação de trabalho, o que podemos
chamar de uma relação de emprego disfarçada (outros termos que aparecem para designar o
fenômeno são quasi-autoemprego, falso autoempregado, para-subordinação, autoempregado-
empregado (KAUTONEN et al., 2010, p.113), emprego mascarado (MILLÁN; MILLÁN;
CAÇADOR-RODRIGUES, 2020) e pejotização (KREIN et al., 2018b, p.48-51)).
A relação de emprego disfarçada é definida de acordo com cada legislação local, mas
se aproxima com os conceitos discutidos de dependência, isto é, subordinação e dependência
econômica na medida em que se trata de uma relação com as principais características de em-
prego: pagamento regular e contínuo; coordenação das atividades com os outros empregados
“verdadeiros” da empresa, ou seja a inclusão/integração do trabalhador na rotina da empresa
onde ele realiza o trabalho (estar sujeito à disciplina desta empresa); uso das dependências e
equipamentos do contratante (especialmente se o trabalhador não dispuser destes). O ponto de-
finidor, no entanto, para caracterizar como relação de emprego disfarçada é a tentativa de escon-
der a real natureza da relação, geralmente visando redução de custos com o trabalho (ROMÁN;
CONGREGADO; MILLÁN, 2011, p.3) (KREIN et al., 2018b, p.48-51).
De fato, a diferença entre autoemprego dependente e relação de emprego disfarçada é por
vezes tênue. Ambos indicam situações de trabalho na fronteira entre status diferentes, mas cada
um enfatiza características distintas. Relação de emprego disfarçada enfatiza a tentativa de burlar
as regulações (trabalhistas, fiscais, de direitos etc.), com o objetivo de reduzir custos e evitar
pagamentos a direitos (EUROFOUND, 2017b, p.39). Já o termo autoemprego dependente, por
contraste, pode ser o resultado não intencional da relação concreta ao invés de uma criação
deliberada. Ambos, no entanto, compartilham a ideia de ser um trabalhador que se assemelha
em certos aspectos às características de um empregado e não de um autoempregado. Por sobre
ele há um véu supostamente paradoxal, pois mistura opostos: autonomia de jure e dependência
de facto. No contínuo dos diferentes graus e facetas da subordinação ao caminhar mais e mais
em direção à dependência chegamos em um caso de autoemprego totalmente dependente, este
é muito semelhante a um empregado, e quando mantem somente o registro civil no lugar do
registro trabalhista se trata de emprego disfarçado.
Para a OIT uma relação de emprego disfarçada deveria ser assumida como de emprego e o
poder público deveria trabalhar para que isso se torne realidade, já o autoemprego dependente
compartilha de algumas características do emprego sem no entanto ser considerado como tal
(OIT, 2016, p.36). O problema é que autoemprego dependente geralmente vem acompanhado de
elementos precarizantes (como veremos na próxima seção), e portanto, caberia primeiramente
entender este grupo e buscar protegê-lo quando necessário com regulação específica. Assim,
cada país, de acordo com o ordenamento construído localmente, tentará definir normas para os
diferentes grupos.
Ao classificar a relação de emprego muitos países (Itália, Alemanha, Portugal e Espanha)
usam critérios similares: a) subordinação e controle; b) risco; c) inclusão dentro da companhia;
31
3) não ter responsabilidade e autoridade para tomar decisões em relação aos recursos finan-
ceiros da empresa;
4) não ter autoridade para tomar decisões em relação às políticas de compras da empresa;
5) não ter autoridade para tomar decisões em relação à política de preços da empresa;
7
Trata-se da negação dos critérios para a presunção de emprego dadas pelo Artigo 12º do Código do Trabalho
(Lei n.º 7/2009) https://dre.pt/dre/legislacao-consolidada/lei/2009-34546475-46719375
8
A lei italiana é anterior à ICSE-18.
33
6) não ter responsabilidade acordada para atingir certo resultado sobre um trabalho;
7) ter garantia de remuneração ou pagamento fixo, ambos não relacionados com os resultados
dos negócios ou seu desempenho;
8) não ser empregador nem ter a possibilidade de recrutar empregados, ou ainda não ter a
possibilidade de ser trocado para executar o trabalho acordado;
pode colocar para si mesmo, no contato com o mercado, uma disciplina semelhante), é necessá-
rio que a habitualidade venha conjugada com a situação de subordinação. Com isso queremos
argumentar que a habitualidade pode ser consequência da subordinação, mas não o contrário, e
deste modo podemos entender que a subordinação é logicamente mais relevante na definição de
emprego do que a habitualidade.
Já a ideia de pessoalidade indica que o trabalhador na condição de empregado está ligado
à tarefa a qual executa, ou ainda que ele esteja de tal maneira inserido no fluxo de atividades
dentro da unidade de produção e serviços que ele não pode ser substituído por outro trabalha-
dor sem perda. O contrato de trabalho é firmado com a pessoa e não com uma entidade civil
(empresa), e o contratado não pode enviar no seu lugar outro trabalhador. Por contraste, pelo
contrato civil de aquisição de produtos ou serviços está se contratando o resultado da atividade
(em produtos ou serviços) e, assim, para a contratante não importa muito quem será aquele que
executará a atividade. A empresa contratada poderia, em tese, trocar o trabalhador que executa a
atividade sem problemas. Se isso não for verdade teremos uma indicação de relação de emprego
disfarçada.
Na terceirização uma empresa é contratada para fornecer mão de obra como serviço, por
exemplo, no ramo de limpeza ou segurança. Neste caso para a empresa que contrata os serviços
da terceirizada quem virá fazer o serviço não lhe importa, fica a cargo da empresa terceirizada
organizar os trabalhadores para tanto. Porém do ponto de vista da terceirizada os seus funcioná-
rios são, evidentemente, empregados com a qualidade de pessoalidade, é com ele que o contrato
de trabalho é feito e, espera-se, mais nenhum intermediário.
Dito isso, o conceito de pessoalidade parece não agregar muito na distinção entre empre-
gado e autoempregado, especialmente quando temos em mente os autoempregados que formam
empresas unipessoais. Contratar os serviços destas empresas unipessoais parece implicar na pes-
soalidade, visto que entidade jurídica civil e trabalhador não se separam com clareza. Nota-se
que as dificuldades só se apresentam quando estamos tratando de um tipo especifico de autoem-
prego, aquele que forma empresa unipessoal e ainda que preste serviços, geralmente às empresas.
Empregadores, auxiliares familiares e muitos conta próprias que produzem ou vendem para pes-
soas e não empresas, dificilmente apresentam caráter de pessoalidade na sua relação com outras
entidades econômicas.
As alternativas para definir estatisticamente o autoemprego dependente até hoje focaram
na autodefinição de autoempregado, e que, ademais, dependem economicamente de um número
reduzido de clientes para a sua renda total e que dependem pessoalmente de poucos destes para
a organização de sua atividade. Essas tentativas são limitadas: potencialmente incluem autoem-
pregados independentes que tem poucos clientes (por razões genuínas), ao mesmo tempo podem
excluir trabalhadores como os da economia gig que tem múltiplos clientes mas cujo acesso ao
mercado ou aos insumos para a produção são controlados totalmente por outra entidade econô-
mica (OIT, 2018, p.12). Para dificultar ainda mais, muitas vezes nas pesquisas oficiais a autode-
35
claração como autoemprego é o primeiro passo para identificar o autoemprego dependente, mas
pode haver casos onde o entrevistado se identifica como empregado (por exemplo quando ele é
um empregado disfarçado) mas que, de fato, está utilizando relações de contrato civil. O grupo
de trabalho da ICSE-18 enfatiza que é preciso identificar esse grupo, aqueles que se autodecla-
ram como empregados, mas que não têm os mesmos direitos que o padrão esperado e não são
exatamente empregados informais. Em segundo lugar enfatiza que é preciso uma noção mais
abrangente de dependência (OIT, 2018, p.12).
O controle do acesso ao mercado, como dito, é elemento definidor para dependência econô-
mica na visão da ICSE-18. Ela precisa ser definida de forma mais abrangente do que somente
pelo número de clientes ou porcentagem de receitas tendo como fonte um único cliente. A
proposta da ICSE-18 cria uma nova classificação: a de empreiteiros dependentes (“dependent
contractors”). Nota-se que o conceito de empreiteiros dependentes é sinônimo do conceito de
autoemprego dependente como vínhamos discutindo10 , o texto da OIT prefere o primeiro pois
entende que o segundo dá a falsa ideia de que o trabalhador criou a ocupação para si mesmo o
que é questionável em vários casos (OIT, 2018, p.1). Empreiteiros dependentes seriam traba-
lhadores que tem um arranjo contratual de natureza comercial para prover bens ou serviços em
nome de uma segunda unidade econômica, não é um empregado desta unidade, mas é depen-
dente dessa unidade econômica para organização e execução do seu trabalho ou para o acesso
ao mercado (OIT, 2018, p.13).
O texto que traz as bases para a ICSE-18 complementa:
“For the purposes of statistical measurement, dependent contractors are defined as wor-
kers employed for profit, who are dependent on another entity that exercises explicit or
implicit control over their productive activities and directly benefits from the work per-
formed by them.
(b) The economic units on which they depend may be market or non-market units and in-
clude corporations, governments and non-profit institutions which benefit from a share
in the proceeds of sales of goods or services produced by the dependent contractor,
and/or benefit when the work performed by dependent contractors may otherwise be
performed by its employees.” (OIT, 2018, p.13)
a) Seu trabalho é organizado ou supervisionado por outra unidade econômica que serve de
cliente, ou ainda que sirva como mediadora para o acesso ao mercado;
b) O modo de remuneração é por meio de uma transação comercial (e portanto não salário);
c) O preço pago pelos bens produzidos ou serviços prestados é determinado pelo cliente ou
um intermediário;
d) Acesso aos insumos para produção, equipamento ou itens de capital é controlado pelo
cliente ou intermediário;
e) As condições reais de trabalho podem se parecer muito com aquela dos empregado
g) O trabalhador é, ele próprio, responsável por seu seguro social e por suas contribuições
sociais.
Este mesmo texto afirma que o fato de haver incorporação (incorporating), isto é, sepa-
ração jurídica da pessoa física da empresa criada, mesmo sem empregados (conta própria sem
empregados, empresa unipessoal), é motivo suficiente para crer que aquele autoempregado é
independente (OIT, 2018, p.13). O fato de criar uma entidade jurídica distinta seria suficiente
para criar uma camada de distanciamento entre empresa contratante e o trabalho feito pelo traba-
lhador. Desse modo se, no caso concreto, as características da dependência econômica se apre-
sentarem quem seria dependente seria esta empresa unipessoal e não o trabalhador. No entanto,
esta divisão (incorporated/unincorporated) não se aplica consistentemente no caso brasileiro.
Algumas pessoas jurídicas que garantem CNPJ, por exemplo o MEI, não separam responsabi-
lidade pessoal da jurídica (os bens pessoais serão considerados para pagamento de dívidas, por
exemplo, o mesmo não ocorre com Empresas Limitadas - LTDA, onde há separação clara dos
bens de um e de outro). É difícil sustentar, no caso brasileiro e portanto no caso geral, que a
simples criação de pessoa jurídica indique a independência do autoempregado.
Vimos que, ontologicamente, o autoemprego não tem definição tão simples, assim tenta-
mos aqui tornar mais claras as principais características utilizadas na qualificação da natureza
do autoemprego nos apoiando na literatura relevante. Neste caminho fizemos uso, e discutimos
brevemente, os conceitos de subordinação (ou dependência pessoal), dependência econômica,
risco e habitualidade. Tentamos contrastar os outros grupos em relação aos autoempregados
bem como dividir os principais subgrupos dentro deles. O contraste com a relação de emprego
nos permitiu olhar com mais cuidado para alguns dos casos cinzentos posicionados entre em-
prego e autoemprego, inclusive as noções de relação emprego disfarçado e a recente sugestão
proposta pelo grupo de trabalho da OIT de empreiteiro dependente. Finalmente as discussões
37
sobre a natureza do autoemprego nos permitiram também observar brevemente algumas tenta-
tivas nacionais de implementar esses conceitos nas definições das estatísticas e pesquisas feitas
em cada país.
38
tange às estatísticas oficiais, olhar para o conjunto de pequenos estabelecimentos bastava para
caracterizar a parte informal (o setor informal).
Segundo Santos e Melo (2011, p.31) o problema desta visão é que ela está baseada total-
mente nas experiências das economias centrais (com pleno emprego, Estado forte, e meios de
financiar investimentos). Este embasamento contextual fazia estas teorias terem dificuldade de
articular o que se via nas periferias. Como afirma Santiago e Vasconcelos (2017) o paradigma
do mercado de trabalho formal nos países centrais durante as décadas de 1950 a 1970 era a re-
lação de assalariamento da grande empresa (com atributos como segurança de renda, proteção
contra dispensa sem justa causa, direito à saúde e à segurança do trabalho entre outros). Deste
modo, a associação entre tamanho da unidade produtiva e formalidade foi uma consequência. O
que não estava dentro deste padrão, tal como qualquer pequeno arranjo produtivo, foi associado
à informalidade. A OIT fez uma proposta de definição de informalidade em 1972 tendo como
pivô justamente na natureza da unidade produtiva, a ideia de “setor informal” (OIT, 1972). Pela
proposta da OIT setor informal seria aquele onde não há divisão entre capital e trabalho (o tra-
balhador é dono dos parcos ou simples meios de produção), onde se utiliza a força de trabalho
familiar como auxílio para produção, onde temos pequena escala produtiva com baixo nível de
capital e tecnologia, empreendimentos intensivos em mão de obra com baixa qualificação e com
baixa produtividade (OIT, 1972, p.5-6).
Souza et al. (2020) resume bem:
“O setor informal, denominado pelo autor [Paulo Renato de Souza] como “formas não
tipicamente capitalistas de organização”, é categorizado em: a) empresas familiares:
pequenas empresas ou trabalhadores autônomos, concentrados no pequeno comércio
ou na pequena indústria; b) trabalhadores por conta própria subordinados: trabalha-
dores que produzem ou prestam serviços a uma única empresa; c) pequenos vende-
dores de serviços: trabalhadores autônomos que estão submetidos a várias empresas;
d) serviço doméstico: envolvem a prestação de serviço para uma família, e não uma
empresa; e) quase-empresas capitalistas: refere-se às pequenas empresas nas quais o
proprietário também participa do processo produtivo, visa ao nível de rendimento total
do proprietário e não ao lucro.” (SOUZA et al., 2020, p.12-13)
Para Santos e Melo (2011, p.32) a produção informal, por esta visão, baseava-se na organi-
zação familiar e tradicional, voltada predominantemente para o a subsistência e sustento familiar
e, portanto, sem a busca por lucros. Vale lembrar que, como aponta Souza et al. (2020, p.7),
neste trabalho a OIT pinta o setor informal como algo positivo, gerador de renda e dinamismo
apesar de sua baixa produtividade, e termina por clamar pelo incentivo de políticas públicas para
o setor.
As diferentes visões caracterizadas acima podem ser chamadas de dualistas por oporem a
dicotomia entre dois setores, formal e informal, o segundo apartado do primeiro. A forma como
estes dois lados se articulam foi alvo de debate teórico no âmbito da PREALC (Programa Regi-
onal de Emprego para América Latina e Caribe) que passou a conceber o setor informal como
40
assalariamento. Os conta próprias por opção seriam aqueles que deixam o mercado de trabalho
(se afastam do assalariamento) porém, não conseguem alcançar a condição de empreendedor-
empregador. Já os conta próprias por expulsão também deixam de participar do mercado de
trabalho mas partem para o autoemprego como única opção de participação na atividade produ-
tiva e o fazem geralmente à revelia.
Bögenhold, Heinonen e Akola (2014, p.306) notam que a dicotomia pull-push é muitas
vezes reducionista demais para descrever o que é na verdade o resultado de um feixe complexo
de fatores influentes. A decisão de entrar no autoemprego pode combinar, ao mesmo tempo,
elementos distintos dos dois lados desta dicotomia. Assim, vale seguir a afirmação de que o
autoemprego é um grupo heterogêneo e descrever ainda outros subgrupos possíveis dentro do
autoemprego: autoemprego híbrido e autoemprego como renda complementar. O autoempre-
gado híbrido é aquele que trabalha ao mesmo tempo como conta própria e como assalariado.
Esta é uma categoria crescente com as novas possibilidades de trabalho por aplicativo. Há ainda
os trabalhadores cujo trabalho independente como autoemprego é esporádico e instável (RO-
SENFIELD, 2018, p.344). Muitas vezes é alguém em processo de espera para uma transição
para uma posição assalariada que verdadeiramente deseja, ou seja, estaria somente em refúgio no
autoemprego. O autoemprego complementar por sua vez se diferencia do híbrido pois no último
tenta-se captar aquele trabalhador que está vinculado a mais de uma ocupação, enquanto que no
autoemprego como renda complementar não necessariamente se vincula a outra ocupação, pois
outras fontes de renda que não do trabalho podem estar envolvidas. O exemplo de autoemprego
complementar é uma pessoa que recebe aposentadoria e preenche parte do seu tempo com uma
ocupação que lhe permite uma renda a mais12 .
As trajetórias laborais dentro do mercado de trabalho podem ser elencadas como acessó-
rias para definir se um dado autoemprego é precário ou não. Há maiores chances, porém não
é necessariamente assim, que um autoempregado por necessidade esteja em condições precá-
rias no autoemprego. Por oposição o autoemprego que, por exemplo, voluntariamente deixa
um emprego assalariado para tentar se estabelecer como autoempregado geralmente o faz com
planejamento, com acúmulo de um pequeno capital prévio, e com maior segurança. Estes ele-
mentos dão à esta última transição uma maior probabilidade de sucesso de inserção não precária.
No que vem a seguir, propomos uma breve discussão de alguns elementos de precariedade. Vale
lembrar que parte destes predicados deverá ser aplicada não a todos, mas somente a um subgrupo
destes autoempregos, devido à heterogeneidade do grupo que o compõe.
Os principais elementos de precariedade do autoemprego são: renda, acesso à direitos,
representatividade, inserção laboral de longo prazo e saúde laboral. Na seção seguinte olharemos
para estes elementos aplicados ao caso específico do MEI no Brasil, mas primeiramente, no
restante desta seção faremos uma breve discussão sobre estes elementos de precariedade para o
12
Como veremos na seção seguinte, as regras do MEI impedem que um pensionista se inscreva no MEI, mas não
que um aposentado o faça.
44
cial de inclusão necessária, ainda que se saiba dos problemas deste no que tange a renda gerada
(quantidade, volatilidade). Pode-se argumentar que esta posição não seja ideal, dada as com-
parações com o mercado de trabalho assalariado formal, porém necessária em certo contexto.
Se isto é verdade, a promoção do autoemprego deve vir sempre acompanhada da promoção de
alternativas a este, como a do emprego formal.
O segundo elemento de precariedade do autoemprego, e provavelmente o mais destacado
na literatura, se refere ao acesso aos direitos e proteções sociais (EICHHORST et al., 2008;
WILLIAMS; LAPEYRE, 2017; EUROFOUND, 2017b; OIT, 2020; KOOL; BORDON; GAS-
SMANN, 2021). A comparação que regularmente é feita, como vem sendo em boa parte do
presente texto, é com os empregados, em especial os formais, pois são estes últimos que, histo-
ricamente, foram alvo primordial do arcabouço regulatório criado no século XX na maioria dos
países. Adicionalmente, as formas emergentes de arranjos de relação de trabalho, que incluem
o crescimento do autoemprego, reforçam a importância de se discutir o acesso à direitos relaci-
onados ao trabalho (e não somente ao assalariamento formal). Em especial, vale reforçar, está
o autoemprego dependente, ou aquele que apresenta muitas das características do emprego (su-
bordinação, dependência econômica) sem, no entanto, ter os mesmos direitos destes. A relação
suposta entre pessoas jurídicas leva a uma série de direitos e deveres civis, distante, portanto, de
preocupações que decorrem se esta relação é considerada entre empresa e trabalhador, ou seja,
uma relação trabalhista, regida por direitos e deveres de outra esfera.
(OIT, 2016, p.299-300) descreve quatro arranjos de sistema de proteção social: a) proteção
social ligada a um contrato com um empregador específico, isto é, as obrigações acessórias do
empregador (contribuição patronal, pagamento da licença maternidade, etc.); b) proteção social
derivada do status de empregado, isto é, o empregado continua mantendo o direito se passar de
um emprego para outro. Geralmente são direitos garantidos a todos os empregados (formais)
seguindo algumas regras. Exemplo mais frequente seria o seguro desemprego; c) proteção social
derivada do status como ocupado, abarcando outras formas de ocupação que não somente a de
empregado (são programas de seguro social que podem abarcar os autoempregado); d) proteção
social ligados ao status de residente em um país. Neste caso todos aqueles que se enquadram nos
requisitos têm direitos. Exemplo frequentemente encontrados em diversas economias é alguma
forma de aposentadoria social, pensão aos debilitados e acesso à saúde.
Na prática Os principais elementos dos direitos proteções sociais são as garantia de rendi-
mento na aposentadoria, seguro e amparo ante aos riscos de desemprego, e uma série de direitos
ligados ao contrato específico tais como férias remuneradas, 13º salário. Conen e Schippers
(2019, p.11) mostra que para os países europeus o diferencial de proteção social entre empre-
gados e autoempregados varia enormemente de país para país. No Brasil, seguindo a legislação
trabalhista temos ainda uma série específicas de elementos tais como adicional por hora extra de
trabalho, licença maternidade, intervalos e descanso remunerados entre outros (KREIN et al.,
2018b, p.48).
46
segurança laboral e exigência legal de treinamento, pode não se aplicar ao autoempregado con-
tratado como prestador de serviços o que eleva os riscos de acidentes e suas consequências
(WILLIAMS; LAPEYRE, 2017, p.11).
Nesta seção discutimos alguns dos elementos relevantes para descrever as diferentes ver-
sões dos conceitos de informalidade e precariedade e suas articulações com o autoemprego.
Alguns destes elementos são base para análises das consequências da transição para o auto-
emprego (Capítulo 3) e para a interpretação de uma pesquisa própria, realizada somente com
trabalhadores inscritos no MEI (Capítulo 4).
48
Nas seções anteriores vimos as discussões que envolvem o autoemprego, sua ontologia e
os possíveis problemas e críticas às características como esta forma de inserção no mundo do
trabalho pode tomar, muitas vezes precária ou precarizante (em oposição ao trabalho decente).
Para tentar entender como o Microempreendedor Individual (MEI) se encaixa nestes debates
vamos descrever, nesta seção, primeiramente, os elementos do ordenamento jurídico que regem
esta pessoa jurídica. Em segundo lugar procuramos descrever os principais motivos que fazem
o MEI atrativo, em especial do ponto de vista tributário. Em terceiro lugar descrevemos algu-
mas das dificuldades geradas pelo seu desenho institucional. Finalmente, utilizaremos exemplos
hipotéticos para amarrar os conceitos discutidos ao longo de todo este primeiro capítulo tendo
em vista o autoemprego em geral com a prática do autoemprego via MEI.
Com o objetivo explícito de aumentar a taxa de formalização dos conta próprias (CÂMARA
DOS DEPUTADOS, 2010, p.12-13), o governo federal, no fim de 2008, criou, pela Lei Com-
plementar 128/2008, a nova figura jurídica do Microempreendedor Individual (MEI). Esta lei
qualifica como microempreendedores, e portanto diferenciando-os dos outros empreendedores,
aqueles que tenham uma receita bruta máxima de 81 mil reais ao ano15 , que tenham no máximo
um empregado (este recebendo um salário mínimo ou o piso salarial da sua categoria16 ), e que
estejam dentro de uma lista positiva predefinida de aproximadamente 500 subsetores econô-
micos17 . O MEI deverá ainda ser optante pelo Simples Nacional, possuir um único estabele-
cimento (portanto sem nenhuma filial) e não participar de outra empresa como titular, sócio
ou administrador. Qualquer trabalhador, mesmo aquele que já esteja vinculado a uma empresa
como assalariado com carteira, pode fazer o registro de um MEI, exceto servidores públicos e
pensionistas.
O processo de abertura do MEI é simplificado, ocorrendo completamente por meio eletrô-
nico e é completamente isento de taxas de registro. Ao contrário de outras pessoas jurídicas é
possibilitado ao MEI utilizar a própria residência como sede do estabelecimento. O MEI tam-
bém é dispensado da utilização de serviços contábeis, podendo ele mesmo fazer suas declarações
anuais18 , todas feitas por meio eletrônico.
Do ponto de vista do trabalhador, a lei que cria o MEI vem acompanhada de uma série
de direitos e deveres para a pessoa jurídica. Ela cria uma nova forma de contribuição para
previdência com alíquota fixa de 11%, posteriormente (maio de 2011) alterada para 5%, do
salário mínimo por mês, abaixo do que os trabalhadores pagariam em qualquer outra forma de
15
Pela Lei Complementar nº 128/2008, o MEI poderia ter um faturamento máximo de 36 mil reais anuais. Este
valor foi alterado a partir de 2012 para 60 mil reais anuais de faturamento (Lei Complementar nº 139/2011), e em
2018 para 81 mil reais (Art. 18-A, § 1º da LC 123/06) (Receita Federal, 2020, p.7).
16
Art. 18-C da Lei Complementar nº 123, de 2006.
17
A lista sofreu acréscimos e decréscimos ao longo dos anos, no Anexo 1 temos a tabela atualizada para 2021.
18
Lei Complementar n° 123/2006, artigo 18, § 22-B
49
Vimos até aqui aspectos teóricos que ajudam a entender a problemática do autoemprego
no geral e as características específicas que esta problemática adquire dentro do ordenamento
jurídico brasileiro por meio da figura do MEI. As fontes de pressão para o aumento do autoem-
prego são diversas, podem ser tanto forças econômicas de longo prazo (novas tecnologias, busca
por flexibilização), ou podem ser ainda conjunturais (por exemplo, o autoemprego como refú-
gio à desocupação). Outra divisão possível destes motivos diferencia pressões que partem das
empresas e estruturas econômicas existentes (flexibilização e pejotização) daquelas pressões que
partem de forças que estão mudando a estrutura econômica atual (novas tecnologias, hipótese do
fim do emprego, mudança setorial). Nesta subseção focaremos somente em um tipo específico,
mas muito relevante, de pressão: aquela que, partindo da estrutura atual, busca minorar os cus-
tos. Dito em forma de pergunta: é possível afirmar que especificamente as empresas hoje têm
incentivo a promover o aumento do autoemprego por meio do MEI? É possível que a pejotização
19
Para aqueles que ainda teriam este direito, ou seja, os inscritos antes da reforma da previdência de 2019. Depois
da reforma da previdência a aposentadoria por tempo deixa de existir para todos os trabalhadores.
50
seja explicitamente derivada de pressões das empresas atuais? A resposta para estas questões
passa pela análise da motivação principal para tanto: os custos. A flexibilidade de um contrato
via pessoa jurídica pode ser entendida como diminuição de riscos e, portanto, diminuição de
custos indiretos, enquanto os diferentes encargos de cada uma das opções de adquirir trabalho
se traduzem em diminuição direta de custos. A diminuição dos custos diretos com o trabalho são
considerados o principal motivo para a busca de novas formas de contratação (Receita Federal,
2016, p.3)(WILLIAMS; LAPEYRE, 2017, 15). Retomando para deixar claro do que tratamos
aqui: o aumento do autoemprego se deve a vários fatores, entre eles a pressão das empresas
existentes por diminuição de custos, diretos e indiretos, é um dos principais.
Temos dois âmbitos de custos diretos a serem analisados: custos a cargo do trabalhador e
custos a cargo da firma. Do ponto de vista das empresas temos as seguintes diferenças caso ela
opte por adquirir trabalho por meio de uma pessoa jurídica via MEI no lugar de um empregado
com carteira:
f) Contribuição patronal previdenciária - CPP. Em geral 20% da folha salarial para empresas
do SIMPLES;
a) Imposto de renda. Para o MEI a declaração dos rendimentos da empresa é feita pela
Declaração Anual de Faturamento do MEI eletronicamente e obrigatória. A necessidade
ou não de declaração do Imposto de Renda Pessoa Física segue os mesmos critérios para
qualquer outra pessoa, com o adendo que parte das rendas provenientes do MEI é isenta21 ;
c) adicionalmente o MEI deve pagar ISS e ICMS, estes fixados em valores absolutos de
R$1,00 a título do ICMS para o Estado e/ou R$5,00 de ISS para o município (podem ser
ambos a depender do setor da empresa).
O texto da Receita Federal (2016, p.39) indica que a substituição de emprego formal por
prestação de serviço implica em diminuição de 31% do custo para a empresa contratante com a
desobrigação das exigências trabalhistas e redução dos encargos diretos.
Uma dificuldade trazida pelo desenho do MEI, e que nos ensina muito sobre para quem
este política pública foi feita, se aplica para aqueles que são empreendedores verdadeiros. Re-
lembrando, um empreendedor verdadeiro seria aquele que age visando o lucro (em oposição à
subsistência), busca o crescimento da empresa, a contratação de mais empregados e abertura
de filiais. A legislação do MEI é claramente pensada para o conta própria, e assim é, de fato,
restritiva para o crescimento do MEI se este for entendido como empreendedor: ele não pode
ter sócio, não pode ter mais de um empregado de baixo salário, ele não pode ter mais de um
estabelecimento, e está sujeito ao limite de faturamento22 . Este grupo de empreendedores-MEI
só podem ser bem-sucedidos nesta tarefa se deixarem o MEI e transitarem para outras figuras
jurídicas, mais comumente para microempresa (ME). Transitar para uma nova pessoa jurídica
visando poder crescer pode ser uma dificuldade adicional para o empreendedor. Não há gradu-
alismo entre estas pessoas jurídicas e regimes tributários. Deixar o MEI e se tornar ME implica
de um dia para o outro deixar de pagar geralmente 5% de um salário mínimo para entrar na
estrutura tributária do SIMPLES.
21
Serviços: 32% da receita bruta anual é isenta de Imposto de Renda; Transporte de passageiros: 16% da receita
bruta anual é isenta; Comércio, indústria e transporte de carga: 8% da receita bruta anual é isenta.
22
Em 2017 entre os sete milhões de MEIS 150 mil haviam passado para microempresa por ultrapassar o teto
(ROSENFIELD, 2018, p.342).
52
Por um lado, o baixo valor da contribuição do MEI ao INSS (5% do salário mínimo) é
uma ferramenta importante para dar acesso barato à aposentadoria às faixas de trabalhadores até
então fora deste sistema de proteção social. Isto é verdade em especial aos trabalhadores com
rendimentos baixos e anteriormente informais. Por outro lado, os limites superiores de renda
do MEI permitem aos trabalhadores relativamente bem posicionados (em termos de rendimento
relativo na estrutura de rendas brasileira) um pagamento muito menor do que o esperado como
assalariado formal. Como argumentamos ao discutir a reforma trabalhista, o aumento de transi-
ções de assalariado formal para MEI representa uma pressão para o regime geral da previdência
na medida em que diminui as contribuições (WELLE et al., 2019).
Ademais, o MEI engloba tanto o ocupado com baixíssima renda, abaixo até de um salá-
rio mínimo, quanto o ocupado com renda no limite máximo estipulado para o MEI. Alguns
autores (COSTANZI; ANSILIERO, 2017) discutem a focalização destas alíquotas para o MEI,
enfatizando que para aqueles no topo dos rendimentos do MEI a capacidade contributiva não
é de todo preenchida, isto é, estes trabalhadores teriam renda suficiente para fazerem maiores
contribuições que não justificariam tamanho subsídio, especialmente se comparados com os as-
salariados de mesma faixa. Os mesmos autores argumentam ainda ser possível que esta alíquota
fixa e baixa representa um diferencial tão grande de custos para o contratante que ela se torna
um incentivo para formação de relações de emprego disfarçadas utilizando o MEI (CORSEUIL;
NERI; ULYSSEA, 2014, p.29) (ANSILIERO; COSTANZI; FERNANDES, 2020, p.104).
Para a parte de baixo da distribuição de renda a estabilidade de renda é claramente uma
preocupação no curto prazo, mas dados os parcos mecanismos de proteção social a segurança
financeira de longo prazo também se torna uma preocupação (renda na idade adulta e na apo-
sentadoria). Este ponto afeta ambos os autoempregados menos e mais bem posicionados na
distribuição de rendas do trabalho. O valor do benefício da aposentadoria vinculado ao MEI é
limitado a um salário mínimo, o que pode não ser suficiente para uma aposentadoria digna, espe-
cialmente considerando arranjos domiciliares onde a renda da aposentadoria é, por necessidade,
dividida entre muitos membros da família. O microempreendedor individual pode optar por fa-
zer contribuições voluntárias adicionais para ter direito a outro patamar de aposentadoria, mas
isso raramente ocorre. Como discutido na seção 1.1. isto pode ser visto como um dos elementos
de pressão pela privatização do risco social, transferindo para o trabalhador o risco de pobreza
na aposentadoria e fomentando, por consequência, esquemas de aposentadoria complementar.
Como afirmam Ansiliero e Nagamine (2017, p.7-8), nas ações do Estado parece haver re-
lativa unanimidade em torno da hipótese de que a falta de proteção dos conta próprias deve-se,
fundamentalmente, à falta de capacidade contributiva de seus integrantes. Porém, se vemos mu-
dar a própria composição dos conta próprias abarcando uma ampla gama de rendimentos (não só
através do MEI) é possível que para parte deste grupo a política de inclusão previdenciária deva
ser alterada, dando mais peso para a capacidade contributiva das faixas mais bem posicionadas
sem deixar de oferecer opções inclusivas para grande parte dos casos onde o baixo rendimento
54
é o principal responsável pela falta de proteção previdenciária. Estes autores criticam o que
chamam de má focalização do programa, dando subsídio previdenciário (5% salário) para um
grupo que poderia, e deveria, contribuir mais.
Um problema mais frequente encontrado pelos MEI é que pode ser difícil para o traba-
lhador conseguir cumprir com os requisitos de 180 contribuições para ter o direito ao benefício
da aposentadoria26 . No entanto, não houve ainda tempo hábil para podermos avaliar isso ver-
dadeiramente pois depois de 12 anos de MEI mesmo que um trabalhador tivesse se inscrito no
primeiro ano do programa ainda não teria a carência necessária de contribuições. O alto grau
de rotatividade que tanto assola os empregados neste quesito se aplica também aos MEI, talvez
ainda mais dadas as características de volatilidade discutidas durante este capítulo (os dados de
inadimplência mostram uma taxa de inadimplência alta, por volta de 50% segundo a Receita
Federal/SIMEI27 . A Pesquisa do Perfil do MEI de 2017 aponta que 42% dos MEI já deixaram
de pagar os boletos mensais da previdência, o DAS (SEBRAE, 2017, p.81)).
Por último, gostaríamos de discutir o fenômeno da pejotização. Primeiramente é preciso
delimitar os termos usados. Há pelo menos três usos diferentes para o termo pejotização. O
primeiro é a tendência de comprar como serviço parte daquilo que antes era feito internamente
pelos seus trabalhadores que podemos chamar de outsourcing, ou seja, no agregado um aumento
do número de pessoas jurídicas (PJs). Chamaremos este fenômeno mais geral de “pejotização
em sentido amplo”. O segundo uso do termo é mais estrito e diretamente ligado à legalidade:
a tentativa de burlar a legislação trabalhista ao tentar descaracterizar o vínculo de emprego.
Quando usarmos o conceito pejotização no restante deste trabalho sem predicá-lo ele se remete
a este segundo entendimento. O terceiro uso é ainda mais estrito, que aqui chamaremos de “pro-
cesso de pejotização”, que envolve uma transição quando uma empresa demite um funcionário
assalariado para “recontratá-lo” por um contrato civil entre pessoas jurídicas. O terceiro caso é
um subconjunto específico do segundo.
O processo de outsourcing pode ser chamado de pejotização no sentido amplo por substituir
um trabalhador por um contrato com outra empresa. Ao fazer isto a empresa busca tornar mais
variável um de seus custos, e com isso poder acompanhar melhor as flutuações da atividade
econômica. Há um argumento favorável a este processo pois ele indica maior especialização,
que por sua vez está intimamente ligado ao aumento de produtividade. Um trabalhador que antes
fazia um serviço especializado uma vez por mês na empresa onde era funcionário, ao se tornar
uma empresa que presta serviços a outras empresas pode se especializar nesta tarefa particular
e servir melhor não só uma, mas um conjunto amplo de empresas.
Alguns autores (WILLIAMS; LAPEYRE, 2017, p.9)(OIT, 2016, p.170-174) argumentam
que se há vantagens de curto prazo com flexibilidade, há também desvantagens em se apoiar
muito em relações não-padrão de trabalho, incluindo aqui a pejotização tanto na sua forma ampla
26
Problema mais frequente pois a maioria dos MEIs se encontram longe do limite superior de renda.
27
Veja: http://www8.receita.fazenda.gov.br/simplesnacional/arrecadacao/estatisticasarrecadacao.aspx
55
quanto a restrita (ilegal). Isto porque esses fenômenos podem resultar em pouco investimento
em capital humano e na contínua erosão de habilidades específicas dentro da firma, limitando a
habilidade de se adaptar às alterações econômicas e de mercado. Os benefícios de diminuição
de custos e aumento da flexibilidade percebidos no curto prazo podem se mostrar problemas de
longo prazo, quer sejam administrativos, de inovação ou de produtividade. Isto provavelmente
se aplica mais às médias e grandes empresas, que, por estas e outras razões, se mantêm mais
afastadas destas formas não-padrão de emprego.
A segunda definição de pejotização é bem mais estrito e é mais comum na literatura espe-
cializada em especial aos textos jurídicos. Ela se refere, especificamente, à uma forma de tentar
burlar a legislação trabalhista. Pejotização seria aqui entendida como ato ilegal, criar um vín-
culo com uma pessoa jurídica, mas que na verdade esconder um vínculo de trabalho assalariado.
Trata-se do mesmo fenômeno do vínculo de emprego disfarçado discutido na seção anterior, mas
aqui ele tem que ser contextualizado pela legislação local, ou melhor, pela tentativa de burlar
uma legislação específica. Relação de emprego disfarçada e pejotização no seu entendimento
estrito são sinônimos, mas o primeiro é mais abstrato podendo indicar o fenômeno em qualquer
parte do mundo, enquanto que o segundo está vinculado à lei local, no caso brasileira, e portanto
depende da definição local de emprego.
A lista de ocupações/setores econômicos permitidas para o MEI restringe, idealmente, as
possibilidades deste uso ilegal desta categoria. É possível que este fenômeno possa ocorrer
predominantemente através do mau uso de outras pessoas jurídicas, não restritas pela lista. De
todo modo este fenômeno faz mais sentido em ocupações que podem estar tanto dentro quanto
fora de uma empresa, os serviços prestados às empresas sendo os mais óbvios candidatos. Há
menor chance de pejotização quando o resultado da atividade é vendido primordialmente para
pessoas e não para empresas. Porém, como não há um controle rígido sobre os serviços prestados
referentes à cada nota fiscal que um dado MEI emite, é possível que as leis sejam burladas duas
vezes: uma vez ao registrar um MEI e emitir nota diferente daquilo que realmente é a atividade
exercida e, em segundo lugar, ser na verdade uma relação de emprego disfarçada.
O tamanho do diferencial de custos do trabalho adquirido como assalariamento e como
relação entre empresas definirá o incentivo subjacente para que as empresas busquem a pejoti-
zação, tanto no sentido amplo, quanto no sentido estrito de relação de emprego disfarçada28 .
Há ainda três medidas legislativas que têm possíveis efeitos diretos e indiretos para os
MEIs, a Lei nº 11.196, a lei de terceirização e a reforma trabalhista de 2017.
No Artigo 129 da Lei 11.196 que trata de benefícios fiscais à prestação de serviços inte-
lectuais por pessoas jurídicas lê-se:
Como a própria Receita Federal argumenta, esta norma, ao estabelecer que a legislação que
vale para estes casos é aquela referente às pessoas jurídicas “(. . . ) opera, na prática, como um
permissivo legal, praticamente autorizando a utilização não usual da pessoa jurídica para ocul-
tar típica relação de trabalho, sob a forma de contrato de prestação de serviços entre sociedades
empresárias.” (Receita Federal, 2016, p.4)
A segunda lei com efeitos para o MEI é a Lei Nº 13.429/2017, também conhecida como
lei da terceirização. Ela afeta o grupo de interesse na medida em que permite a terceirização
da atividade fim, o que aumenta o escopo de possibilidades de contratação de serviços de por
parte das empresas (Receita Federal, 2016, p.5) (ANSELMO, 2020) (MACHADO, 2019). Este
serviço terceirizado pode ser prestado por qualquer pessoa jurídica, inclusive o MEI, se este se
encaixar nas necessidades da empresa. Provavelmente o caso principal de terceirização continua
sendo uma empresa contratando outra empresa que por sua vez tem empregados com carteira.
Não imaginamos, porém, razões para que a lei da terceirização diminua o número de MEIs, só
que os aumente.
De todo modo, a pejotização se liga ao fenômeno da terceirização na sua busca de reduzir
os custos do trabalho. É deste ponto de vista, considerado uma entre outros tantos fenômenos
recentes do mercado de trabalho na atualidade na direção à precarização (somente com o caso
concreto podemos afirmar que assim o seja). No entanto, a terceirização envolve uma atividade
habitual, repetida e constante. O trabalhador terceirizado é um assalariado, regido pelas leis
trabalhistas na condição de empregado. O mesmo nem sempre ocorre com o trabalhador pejoti-
zado. Como vimos, a pejotização engloba tanto o sentido amplo, isto é o autoemprego legítimo
(que pode ser precário ou não), quanto o sentido estrito, caso no qual o trabalhador é sim um
empregado assalariado da empresa, mas está disfarçado de autoempregado.
Temos ainda a reforma trabalhista (Lei Nº 13.467 de 2017) feita sob o governo Temer,
que forma o pano de fundo mais recente para os caminhos do mercado de trabalho brasileiro.
A discussão política e teórica que embasou a reforma traz muitos elementos reveladores do
contexto atual no qual o MEI se insere e devem ser, portanto, levados em conta29 .
A reforma altera substancialmente uma série de artigos da CLT. Aqui vale mencionar as
mudanças no Artigo 442 com relação ao trabalho autônomo. Adições de frases como “Não ca-
racteriza a qualidade de empregado prevista no art. 3º o fato de o autônomo prestar serviços
a apenas um tomador de serviços” redação da Medida Provisória 808/2017 e “A contratação
do autônomo, cumpridas por este todas as formalidades legais, com ou sem exclusividade, de
29
Um trabalho abrangente que discute os vários aspectos da reforma está no livro "Dimensões Críticas da Reforma
Trabalhista no Brasil"(KREIN; GIMENEZ; SANTOS, 2018).
57
forma contínua ou não, afasta a qualidade de empregado prevista no art. 3º desta Consolida-
ção” redação atualmente vigente do artigo, são bastante explícitas na intenção do legislador nas
mudanças visando dar maior espaço para relações de trabalho por meio de contrato de pessoa ju-
rídica, visando retirar responsabilidade empregatícia da empresa que contrata pessoas jurídicas
(POCHMANN, 2020, p.97-98).
Esta reforma deve ter impactos ambíguos no conjunto dos MEIs. Por um lado é uma re-
forma contracionista em termos macroeconômicos na medida em que tende a diminuir a parcela
dos salários no PIB, e, com maior desemprego, possivelmente teremos maior quantidade de ex-
assalariados tentando constituir MEI por necessidade. Por outro lado, o espírito da reforma vê o
trabalho como custo, e busca baixá-lo. Neste sentido, se bem sucedida neste intento, a reforma
tende a diminuir o preço relativo de contratar ou demitir um assalariado em relação ao de con-
tratar um serviço de um trabalhador por MEI. Ainda assim, é provável que, mesmo ligeiramente
diminuído, o diferencial de custo seja ainda relevante suficiente para as empresas privilegiarem
os contratos por pessoa jurídica além das vantagens da flexibilidade que este modo de relação
traz para as empresas, isto é, transferência dos riscos.
Para finalizar este capítulo podemos brevemente pensar em alguns exemplos hipotéticos e
utilizar os conceitos discutidos até agora no presente trabalho, visando entender melhor como
eles ajudam a compreender as diferentes realidades do autoemprego via MEI no mercado de
trabalho brasileiro.
Primeiramente vamos usar o exemplo de um padeiro. Note que “padaria” consta na lista
positiva do MEI. De um lado do espectro temos o exemplo de um padeiro que tem carteira as-
sinada e trabalha dentro de um supermercado. Este trabalhador é sem sombra de dúvidas um
empregado, recebe um salário mensal, tem horário de trabalho pré-definido no contrato de tra-
balho. Este contrato de trabalho é regido pelas leis trabalhistas, o que lhe traz direitos como
férias, décimo terceiro, adicional por horas extras ou trabalho no final de semana, seguro de-
semprego e fundo de garantia por tempo de serviço. O empregador é encarregado de fazer suas
contribuições com a previdência, em torno de 21% do salário, enquanto que do salário desse
empregado é ainda descontada a contribuição social relativa ao trabalhador (7,5% se receber um
salário mínimo). O local de trabalho é de propriedade do empregador e todos os equipamen-
tos usados neste trabalho são de responsabilidade também deste, bem como os equipamentos
de segurança e o treinamento de segurança. Adicionalmente este empregado, hipoteticamente,
recebe um treinamento específico de confeitaria e panificação, custeado pelo empregador. Este
trabalhador está totalmente integrado ao supermercado, isto é, ele interage e coordena suas ações
com os outros trabalhadores do local, tem chefes definidos que dirigem suas atividades e para os
quais ele se reporta. Por fim, para definir esta relação de trabalho podemos ainda afirmar que o
empregado não pode deixar de ir ao trabalho a qualquer tempo e enviar outrem para fazê-lo, isto
é, se trata de uma relação com características de pessoalidade. O empregado não pode contratar
ele mesmo outro trabalhador para executar suas tarefas.
58
pode resolver fechar o espaço e possivelmente define hora de abertura e fechamento da padaria).
Outra possibilidade é que o supermercado sugira que o padeiro forme uma empresa para
trabalhar dentro da padaria do supermercado, mas desta feita muito mais parecido com a relação
que tinham anteriormente, isto é, de assalariamento. Este seria um caso de relação de emprego
disfarçada. O padeiro apresentaria todas as características de um empregado: dependência pes-
soal ao lhe ser ditados jornada, horário, e atividades a serem executadas, bem como serem de
outrem o local e os equipamentos de trabalho; dependência econômica ao estar incorporado den-
tro de outra empresa da qual depende totalmente, não podendo existir como empresa fora dela;
ele tem ainda chefe direto, que coordena suas atividades com os outros trabalhadores da em-
presa. No entanto, apesar de apresentar as características de empregado ele não tem um vínculo
formal de emprego, mas sim um contrato civil entre sua pessoa jurídica (via MEI) e a pessoa
jurídica do supermercado. Isso lhe tira os direitos que são assegurados pelas leis trabalhistas, e,
essencialmente, o custo do seu trabalho do ponto de vista do supermercado caiu, pois além dos
direitos como 13º salário, férias, a contribuição patronal com o INSS inexiste. É possível que
seja feito um acordo entre empresa e o empregado disfarçado, um acordo no qual o diferencial
de custos é de alguma forma repartido, o empregado disfarçado receberia mais em proventos
do que anteriormente recebia, enquanto que a empresa pagaria menos. Neste caso o empregado
disfarçado é precarizado na perda de direitos, mas acredita que não foi penalizado no seu ren-
dimento, no entanto, além da dificuldade deste em computar o valor monetário do que deixará
de receber (em férias, fundo de garantia, seguro desemprego), no longo prazo ele terá maiores
dificuldades de renda digna na aposentadoria (se comparado com o benefício que teria direito
como empregado caso seu rendimento fosse maior que um salário mínimo).
Um outro exemplo distinto de dependência econômica são os revendedores de produtos
de beleza porta a porta. Esses trabalhadores compram seu estoque de uma única empresa e a
representam, há uma semi-dependência pessoal, isto é, ao mesmo tempo em que esses traba-
lhadores fazem sua jornada, horário, e rotas, seu comportamento é treinado (disciplina laboral
da empresa), recebe treinamento da empresa, e por vezes tem metas ou cotas a cumprir. A de-
pendência econômica é mais evidente: tem um só fornecedor, sua “empresa” não tem controle
sobre os produtos, marketing e preços dos produtos que revende. Não tem também controle da
contratação de empregados.
A guisa de conclusão deste capítulo vamos retomar o percurso feito até aqui. Iniciamos
o capítulo com uma discussão da ontologia do autoemprego, isto é, quais são as características
definidoras deste grupo. Vimos que muitas vezes o autoemprego é definido por contraste com
o emprego. Os principais elementos desse contraste explorados foram aqueles da dependência
pessoal ou subordinação, da dependência econômica e do risco. Vimos que o autoemprego en-
globa uma variedade muito grande e heterogênea de arranjos de trabalho. Tanto forças políticas
quanto mudanças tecnológicas são fatores que recentemente tem alterado o mercado de trabalho
e com isso podemos dizer que a natureza desses arranjos vem se alterando, em especial para os
60
autoempregados. Com isso crescem aqueles casos que se encontram na área cinzenta entre em-
prego e autoemprego, entre os quais as diversas formas de autoemprego dependente, incluindo a
sua forma mais aguda, a relação de emprego disfarçada. Em um segundo momento exploramos
a relação do autoemprego com o conceito de informalidade e como o histórico da evolução deste
conceito está intimamente ligado a este grupo. A discussão de informalidade, por sua vez, ense-
jou uma breve revisão teórica sobre as consequências em termos de qualidade (ou falta dela) da
ocupação por meio do autoemprego. Discutimos, ainda que brevemente, uma série de elementos
referentes à inserção laboral dos autoempregados: motivação para a ocupação (necessidade ou
oportunidade), renda, volatilidade de renda, representatividade, e consequências de longo prazo
desta inserção foram alguns desses elementos. Finalmente, na última seção do capítulo, descre-
vemos em maior detalhe o desenho institucional que dá base ao MEI, seus direitos e deveres,
bem como as diferenças que engendram um diferencial tributário (e no agregado de custos) no
vínculo via MEI em comparação com o vínculo de trabalho formal. Esse diferencial invoca uma
pressão em direção à pejotização, entendida tanto de um ponto mais abrangente como aumento
do outsourcing, quanto na sua forma mais estrita de relação de emprego disfarçada no contexto
legal brasileiro.
61
O objetivo deste capítulo é fazer uma análise descritiva do conta própria em geral, e do
MEI em específico, por meio das principais pesquisas sobre o mercado de trabalho brasileiro e
dados dos registros administrativos.
A seção 2.1. faz uma descrição de longo prazo do conta própria no Brasil. Para tanto
modificamos e aplicamos uma metodologia de harmonização entre as PNADs e expandimos
essa harmonização para a PNAD Contínua Anual, incluindo, portanto, os anos mais recentes. A
descrição deste trabalho metodológico está na seção 2.1.1. Esse trabalho permite acompanhar
indicadores sobre o grupo de interesse por mais de quatro décadas, o que traz elementos para
contextualizar as mudanças recentes do mercado de trabalho, entre as quais a criação do MEI e
seus efeitos em uma série de indicadores.
Na seção 2.2 fazemos uma descrição do MEI baseado diretamente nos registros adminis-
trativos da Receita Federal (no Cadastro Nacional de Empresas - CNE, que lista todos os CNPJs
do Brasil). Tanto o estoque de registros MEI quanto o fluxo vem mostrando evolução quase
exponencial ao longo desta primeira década do MEI. Auxiliam na descrição do MEI pesquisas
secundárias, particularmente do SEBRAE, voltadas à este grupo específico.
62
O presente trabalho tem como objeto principal de análise o MEI. Esta é uma criação re-
lativamente recente no arcabouço jurídico do mercado de trabalho brasileiro. Analisar primei-
ramente o grupo geral no qual o MEI se encaixa, os conta própria, nos ajuda a contextualizar
as mudanças introduzidas pelo MEI. Assim, visamos nessa seção fazer uma descrição de longo
prazo dos principais traços que caracterizam o conta própria no Brasil30 . Baseado em traba-
lhos anteriores, avançamos em uma metodologia de harmonização de longo prazo para duas das
principais pesquisas domiciliares do IBGE, a PNAD e a PNAD Contínua (PNADC). Com isso
é possível qualificar parte das variáveis do mercado de trabalho brasileiro com foco no conta
própria, tais como, evolução da quantidade de ocupados nessa posição na ocupação, sua renda,
jornada, tempo no emprego, composição ocupacional e setorial, e formalização tanto em ter-
mos de contribuição à previdência quando em termos de registro de CNPJ31 . Ademais, sempre
que se considerar importante o grupo formado pelos conta próprias será comparado com outras
posições na ocupação, particularmente empregados e empregadores.
Além da evolução geral de longo prazo das séries históricas criadas pela harmonização, es-
taremos interessados temporalmente em alguns momentos chave: o momento da criação do MEI
no fim de 2008 (mas realmente ativo a partir de 2009) e o momento de início da crise recente,
iniciada em 2015. Sempre que possível tentaremos explicitar nos gráficos o momento da criação
do MEI, e buscaremos expor aqueles dados que têm maior relevância para o entendimento deste
subgrupo dos conta próprias.
Para fazer uma descrição de longo prazo do conta própria utilizaremos as PNADs desde
1976 até 2015 e a PNAD Contínua Anual de 2012 a 2019. Todavia houve muitas alterações ao
longo dos anos nas metodologias de pesquisa de ambas, nos conceitos base e na abrangência
das amostras utilizadas. E ainda, o próprio Brasil, ao longo deste período sofreu alterações que
devem ser levadas em conta, por exemplo, Unidades da Federação foram criadas e a moeda em
circulação mudou algumas vezes. Faz-se necessário fazer uma harmonização mínima para po-
der compatibilizar tanto entre os diferentes anos da PNAD quanto entre a PNAD e a PNADC.
A primeira parte dessa tarefa, a harmonização interna da PNAD (1976-2015) é possível, ainda
que restrita, especialmente pela falta de variáveis compatíveis ao longo de todo o período. No
entanto, as alterações entre a PNAD e a PNAD Contínua Anual são de tal magnitude (REMY,
M.A.P.A. , WELLE, 2015) que sua harmonização completa entre as duas pesquisas não é pos-
30
O MEI pode também por vezes ser encaixado na posição na ocupação de empregador, visto que sua legislação
permite o contrato de um empregado com algumas restrições. A vasta maioria não tem empregado e estará mais
bem encaixado entre os conta próprias (SEBRAE, 2015, p.37). O resultado de nossa própria pesquisa analisada no
Capítulo 4 indica que somente 6,2% tem empregados, veja Figura A5.7.
31
O registro CNPJ só está presente na PNAD a partir 2009 e está presente na PNADC
63
sível satisfatoriamente. Ainda assim gostaríamos de apresentar, nos mesmos gráficos, as séries
das duas pesquisas identificando-as em separado. Isto permitiria uma análise da evolução geral
para além de 2015 (último ano da antiga PNAD), mostrando a tendência das séries entre as duas
pesquisas. Felizmente o IBGE ao fazer a transição da PNAD/PME para a PNADC levou à campo
durante quatro anos ambas as pesquisas concomitantemente. Com isso, quando apresentarmos
nos gráficos ambas as séries podemos ver quão discrepantes são os resultados obtidos em cada
um das pesquisas entre 2012 e 2015 e com isso calibrar nosso entendimento da evolução geral
da realidade do mercado de trabalho subjacente.
A solução aqui adotada para superar estas dificuldades técnicas foi construir duas seleções
distintas dos dados que contenham tanto PNAD quanto PNAD Contínua com algumas alterações.
A primeira seleção (doravante Seleção 1) abarca a PNAD de 1976 a 2015 utilizando o método
de Barbosa (2014) para harmonização interna da PNAD, e nossa extensão desta metodologia
para a PNAD Contínua Anual com alterações simples nas variáveis e na amostra. A segunda
seleção dos dados (doravante Seleção 2) abarca de 2004 a 2015 (PNAD) e 2012 a 2019 (PNADC
Anual). Nesta segunda seleção as variáveis são praticamente constantes dentro de cada pesquisa,
e as amostras não são selecionadas, isto é, foram mantidas as amostras totais de cada uma das
pesquisas32 .
Com duas seleções temos então um primeiro conjunto de dados mais restritos (Seleção 1)
com abrangência temporal maior, e um conjunto de dados com maior riqueza de detalhes das
Pesquisas Amostrais Domiciliares porém abarcando um período menor (Seleção 2, 2004-2019).
As duas seleções se complementam. A grande vantagem da Seleção 1 é poder acompanhar
anualmente as variáveis de interesse para um período longo do mercado de trabalho brasileiro,
embasando a observação de mudanças estruturais e contextualizando as variações que vemos
nos últimos anos para o grupo dos conta próprias. A Seleção 2 permite análises mais pormeno-
rizadas para o período recente, bem como permite a utilização de variáveis sem possibilidade de
harmonização no recorte de longuíssimo prazo, em especial as categorias de grupo ocupacional
e setorial de atividade.
Vale ainda registrar que esse trabalho de compatibilização entre as PNAD e PNADC feito
aqui estende trabalhos anteriores de harmonização interna da PNAD criando possibilidades ricas
de análise que podem ir muito além do trabalho que se segue. Algumas análises gráficas que
ficaram de fora do texto são mantidas no Apêndice 1.
32
Assim com a Seleção 2 é possível utilizar a estratificação de cada pesquisa para construir um desenho amostral
complexo que permita calcular para cada estatística pontual um intervalo de confiança, coisa que é impossibilitada
na Seleção 1.
64
Seleção 1
PNAD (1976-2015) Amostra selecionada baseada em mínimo comum,
Centro-Oeste rural e Norte rural excluídos. Recodificação
de variáveis baseado no método de (BARBOSA, 2014) com
pequenas alterações
PNADC (2012-2019) Amostra selecionada baseada em mínimo comum,
Centro-Oeste rural e Norte rural excluídos. Recodificação
de variáveis para seguir a harmonização anterior da PNAD.
Seleção 2
PNAD (2004-2015) Amostra completa (Centro-Oeste e Norte rural incluídos).
Recodificação mínima de variáveis.
PNADC (2012-2019) Amostra completa Recodificação mínima de variáveis.
Algumas das principais variáveis da PNAD e PNAD Contínua que precisaram ser recodi-
ficadas para serem comparáveis são descritas no restante desta subseção.
A variável condição de ocupação incluía no início da série pessoas com 10 anos ou
mais, e passou a incluir somente pessoas com 14 anos ou mais. Por consistência optamos
por definir como ocupados somente pessoas com 14 anos ou mais33 . A variável posição na
ocupação não diferenciava nos primeiros anos da PNAD o trabalhador assalariado com e sem
carteira dos empregados domésticos com e sem carteira, portanto esses dois grupos foram agre-
gados em um. A variável raça/cor só existe a partir de 1987 e ainda assim não separa indígena
de pardos, e, portanto, essas duas categorias estão agrupadas em todo o período posterior. A
variável horas efetivamente trabalhadas na PNADC mudou a partir de 4º trimestre de
2015. Eram captadas as horas trabalhadas no dia anterior e este valor era extrapolado para a
semana, posteriormente passou-se a captar o valor semanal diretamente34 .
Uma variável importante para este trabalho, o empreendimento tem registro CNPJ,
só faz parte da PNAD a partir de 2009. E na PNADC ela não aparece nos primeiros anos, entre
2012 e 2015. Em virtude disso muitas vezes neste capítulo e no próximo seremos obrigados a
ficar somente com a variável contribui para a previdência para, associado à posição na
ocupação como conta própria, identificar o grupo mais próximo do MEI.
Entre 1976 e 2015 o Brasil teve seis trocas de moeda e passou por períodos de hiperin-
33
Isto implica também na exclusão de rendimentos de ocupados com menos de 14 anos
34
A partir do 4º trimestre de 2015 houve mudança da forma de captação do quesito de horas efetivamente traba-
lhadas. Anteriormente, investigava-se as horas trabalhadas diariamente e somava-se o total de horas para se obter as
horas semanais e, a partir do referido trimestre, passou-se a investigar diretamente as horas semanais efetivamente
trabalhadas. Veja notas em https://sidra.ibge.gov.br/tabela/6326
65
flação, deste modo a comparação dos valores monetários presentes na PNAD deve ser tomada
com muito cuidado. Utilizamos a metodologia apresentada por Corseuil e Foguel (2002) e ex-
pandidos até 2015 no trabalho de Barbosa (2014) para fazer a harmonização e deflacionamento
baseado no INPC dos valores dos rendimentos da PNAD, todos para o ano de 2015. Para a
PNADC Anual, por sua vez, o IBGE prepara um deflator feito para cada trimestre e para cada
Unidade da Federação. Utilizamos este deflator para trazer todos os valores da PNADC Anual
para setembro de 201535 .
Diferente da PNAD a PNADC passou a diferenciar rendimento efetivo de rendimento ha-
bitual. Para a comparação entre PNAD e PNADC Anual na Seleção 1 utilizamos o rendimento
efetivo de todos os trabalhos ou do trabalho principal. Para rendas compostas pela soma de
todas as fontes de rendas (tal como renda domiciliar per capita) o IBGE passou a utilizar para
a parte das rendas do trabalho a sua variante habitual, mantendo os rendimentos efetivos para
todas as outras fontes. Isso significa que quando acompanharmos a evolução do rendimento do-
miciliar internamente da PNADC haverá uma diferença metodológica entre o início e o fim da
série, mas acreditamos que ela não afeta significativamente o entendimento da evolução geral
do comportamento da série.
Na Seleção 1 os setores econômicos foram agregados de acordo com ISIC3 como sugerido
por Barbosa (2014). A lista completa da compatibilização dos setores da CNAE Domiciliar
com ISIC3 está no Apêndice 2. Já na Seleção 2 seguimos nossa proposta de fazer nesta quase
nenhuma alteração para privilegiar a complexidade setorial existente nos dados base. No en-
tanto, entre PNAD e PNADC a CNAE Domiciliar utilizada sofre alterações, assim toda análise
aqui apresentada que trouxer a divisão setorial utilizando a Seleção 2 será sempre focada em
uma das pesquisas somente (quer seja PNAD 2004-2015 ou PNADC 2012-2019). Isto mantém
compatível a classificação completa de subsetores das pesquisas, permitindo olhar com a maior
desagregação possível para as variáveis de interesse.
Ainda há casos onde as variáveis de interesse só existem para algum período ou ano es-
pecífico. Quando fizermos uso destas, sempre será a partir da Seleção 2 de dados, isto é, será
usada a amostra completa com alterações mínimas na codificação das variáveis. Isto ocorre em
variáveis chave, como presença ou não de CNPJ no estabelecimento de trabalho. Estes casos
serão explicitados ao longo do texto.
O contingente total dos conta próprias no Brasil, de acordo com Seleção 1, passa de menos
de 10 milhões de pessoas no início da década de 1980 para quase 25 milhões de pessoas nos
35
As antigas PNADs eram geralmente colhidas entre agosto e setembro de cada ano, deste modo aproximamos
os deflacionamento de valores das PNADC Anual sempre para o terceiro trimestre de 2015.
66
anos mais recentes. Seu crescimento segue o crescimento geral da população ocupada. Muitos
autores consideram o conta própria como elemento estrutural da economia brasileira (PRANDI,
1978) (HOLZMANN, 2013), e realmente vemos que sua fatia dentre os ocupados se mantém
praticamente constante ao longo de várias décadas.
Figura 1. Quantidade de conta própria (1977-2019)
Fonte: PNAD/PNADC (Seleção 1) - IBGE. Elaboração própria. Linha pontilhada vertical marca a criação do
MEI.
Como pode ser visto na Figura 2, na PNAD (Seleção 1) a proporção dos conta próprias
no total da população ocupada vinha sendo relativamente estável ao longo das últimas décadas.
A proporção inicia a série com um valor de 23,72% em 1976, que se mantém praticamente
constante até o início dos anos 2000. Apresenta leve queda durante os governos trabalhistas,
enquanto o mercado assalariado formal estava aquecido, marcando 20,32% em 2013. Com a
reversão do ciclo econômico esta proporção passa a subir no período recente, como podemos
acompanhar pela PNADC na Seleção 1, de 23,71% em 2015, chegando a 25,39% em 2019 e
com tendência crescente.
67
Fonte: PNAD/PNADC (Seleção 1) - IBGE. Elaboração própria. Linha pontilhada vertical marca a criação do
MEI.
A proporção dos conta próprias mostra, portanto, certa estabilidade, e suas variações são
maiores nos anos recentes. Um olhar setorial mostra que esta estabilidade geral pode ser engana-
dora. Previamente à análise do conteúdo do gráfico nota-se que ao analisar a evolução setorial da
proporção dos conta próprias vis-à-vis empregados (Figura 3) vê-se que a harmonização setorial
entre PNAD e PNADC por meio do ISIC3 parece funcionar bem na Seleção 1. Notamos que
suas linhas quase sempre se sobrepõem entre 2012 e 2015, com exceção talvez da Agricultura.
Se no geral, como vimos no Figura 2 espera-se que em média os conta próprias representem
entre 20% e 25% do total dos ocupados, aqui vemos que há fortes diferenças entres os grandes
setores. A Manufatura e os Serviços aos Negócios apresentam uma proporção muito maior de
empregados, enquanto que Comércio, Hotéis e Restaurantes e Transportes e Comunicação se-
guem o padrão geral. Construção e Outros Serviços são os grandes setores onde a proporção de
conta próprias supera a de empregados. A Construção, em especial, é particularmente interes-
sante pois é o grande setor que mostra maior mudança estrutural ao longo das últimas décadas,
passando de menos de um quarto para mais da metade do total ocupados por conta própria.
68
Fonte: PNAD/PNADC (Seleção 1) - IBGE. Elaboração própria. Linha pontilhada vertical marca a criação do
MEI. Nota: em cada setor a soma não é 100% pois há ainda empregadores e trabalhadores não remunerados e/ou
familiares.
Este conjunto de gráficos também expressa as mudanças mais recentes impostas pelas flu-
tuações conjunturais da economia brasileira. Se notarmos em todos os grandes setores de ser-
viços vemos, no período que equivale aos governos trabalhistas a partir de 2003, um aumento
da proporção de emprego assalariado em detrimento do conta própria. Com a desaceleração
da economia e, especialmente, com o início da forte crise iniciada em 2015, vemos uma súbita
reversão de tendência na maioria dos setores. A proporção de conta própria passa a crescer ra-
pidamente. Nota-se ainda que a o momento dessa reversão de tendência parece estar muito mais
associado ao momento de aprofundamento da crise do que com o momento de criação da figura
jurídica do MEI, porém é provável que a mudança legal seja um dos fatores essenciais para que
tal reversão ocorresse de forma tão forte.
Se em todos os setores podemos ver tendência de aumento dos conta próprias, o setor de
Transportes e comunicação vê especial mudança nos últimos anos. Parte dessa nova tendência
pode ser explicada pelo crescente uso de aplicativos de transporte de passageiros e mercadorias,
que engendra outro fenômeno crescente do mercado de trabalho, a uberização (ABÍLIO, 2020).
69
As três principais posições na ocupação (Figura 4) tem uma tendência de leve e constante
queda geral na média de horas trabalhadas em todos os trabalhos ao longo do tempo. Tendência
essa alterada somente na margem, no último ano da série analisada, 2019, para as três categorias
de posição na ocupação.
Se os empregadores têm em média uma jornada em todos os trabalhos claramente acima
das outras categorias, os ocupados por conta própria trabalham em média um número de horas
semelhante aos empregados. Porém devido a natureza mais flexível da primeira posição na ocu-
pação e, por outro lado, devido ao limitador legal para a quantidade de horas de trabalho entre os
empregados formalizados, espera-se que a distribuição das horas trabalhadas seja mais dispersa
entre os conta próprias que entre os empregados formais (na Figura 4 temos o total de emprega-
dos, formais e informais). Além disso, pode existir auto-seleção para conta própria justamente
buscando a possibilidade de trabalho em diferentes arranjos de jornada. Recentemente há uma
separação, perceptível tanto na PNAD quanto na PNADC, os conta próprias passam a ter menos
horas trabalhadas em média do que empregados.
Figura 4. Média de horas trabalhadas em todos os trabalhos, por posição na ocupação
(1976-2019)
Fonte: PNAD/PNADC (Seleção 1) - IBGE. Elaboração própria. Linha pontilhada vertical marca a criação do
70
MEI.
Ainda sobre a jornada na última parte do período analisado é possível que exista um efeito
dinâmico de composição diretamente relacionado com o momento ruim da economia a partir de
2015, quando muitos trabalhadores são direcionados por falta de opção para a ocupação como
conta própria sem conseguir o número de horas de trabalho que gostariam. O tema das transi-
ções será tratado mais detidamente no Capítulo 3 e a satisfação da jornada dos MEI no Capítulo
4 (veja Figura44), mas podemos aqui discutir a insuficiência da jornada. Somente nos anos
mais recentes da série podemos analisar o conceito da subutilização da força de trabalho por
insuficiência de horas trabalhadas (utilizando a Seleção 2). Na PNAD Contínua o entrevistado
é questionado se gostaria de trabalhar mais horas nos seus trabalhos, quando isto ocorre geral-
mente o ocupado sente que a renda retirada nos seus trabalhos está aquém da desejada ou que
esta não é suficiente para o sustento próprio ou de sua família. Entre os empregados a jornada
é determinada pelo empregador que é quem comanda a demanda por mais ou menos horas de
trabalho. O conceito de subordinação neste caso se mostra importante. No caso dos conta pró-
prias as fronteiras podem não ser tão claras como foi discutido no Capítulo 1. Em teoria os conta
próprias determinam suas próprias jornadas, mas há casos cada vez mais recorrentes de relações
de autoempregados dependetes e de assalariamento disfarçadas, onde existe total subordinação
e a autodeterminação do tempo de trabalho não existe de fato. Para os conta próprias que podem
sim determinar sua jornada há a diferença entre aqueles que podem ofertar quase indefinida-
mente mais trabalho (embora sem certeza de retorno em forma de rendimento), tal como um
vendedor ambulante, e aqueles que só trabalham mediante demanda de seus produtos ou servi-
ços, como um designer autônomo. Estas colocações reforçam que a dinâmica dos subocupados
por insuficiência de horas trabalhadas deve ser bastante distinta entre as posições na ocupação e
entre ocupações específicas dada a própria natureza da atividade. A Figura 5 nos mostra que os
conta próprias tem mais do que o dobro de chances de considerar que sua própria jornada seja
insuficiente. A prevalência de subutilização por insuficiência de horas trabalhadas do grupo de
conta própria em 2019 foi de 12,24%, e entre empregados do setor privado 4,72%36 .
36
O resultado tem valores muito semelhante e se mostra estável para todos os anos entre 2012 e 2019 utilizando
a PNADC Anual na Seleção 2.
71
Fonte: PNADC Anual (Seleção 2) - IBGE. Elaboração própria. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
Outro possível indicador para mudanças na composição dos conta próprias é o tempo médio
no atual trabalho principal. A rotatividade é considerada alta no mercado de trabalho brasileiro
(DIEESE, 2011) o que faz com que o número de meses médio no mesmo trabalho entre os
assalariados seja baixo. Já entre os conta próprias e empregadores há maior estabilidade na
posição na ocupação, o que não significa estabilidade nem de ocupação nem de rendimento. Pelo
contrário, a natureza do conta própria que o faz mais flexível que os empregados é tanto a fonte
da volatilidade nos rendimentos, como permite a relativa estabilidade da posição na ocupação.
Um conta própria pode trabalhar intermitentemente ao longo dos meses no ano, com variações
de poucas e muitas horas nos meses trabalhados e se considerar fixo nessa posição na ocupação
por anos a fio. Novamente, o maior tempo na mesma ocupação não significa menor precariedade
se esta ocupação não fornecesse renda suficiente, se sua renda é muito volátil, se esta renda flutua
relativamente mais com as flutuações do nível de atividade econômica, se esta ocupação não vem
acompanhada de direitos (tendo como referência, por exemplo, os direitos do vínculo assalariado
formal), se estes direitos não são passíveis de defesa estatal/judicial se forem violados, se esta
ocupação afeta negativamente a saúde e qualidade de vida do ocupado. Enfim, estabilidade na
mesma ocupação no geral deve ser distinguida de estabilidade específica no emprego formal,
quando, supostamente, se seguidas a regulação trabalhista a maior parte destas condições de
precariedade não estão presentes. A estabilidade em uma condição de elevada precariedade não
é algo a ser almejado, pelo contrário.
Nota-se no também, na Figura 6, que nos últimos anos há um decrescimento do tempo
médio no trabalho principal dos conta próprias ao mesmo tempo há um aumento na mesma
72
estatística para os empregados. É provável, como vemos também em vários outros indicadores
discutidos nesta seção, que a crise levou ao aumento das transições para o conta própria. Este
novo conta própria impacta para baixo a média e pode ser distinto dos trabalhadores que até
então faziam parte do grupo dos conta próprias, por terem distintas características. As séries
de dados dos empregadores e conta própria vinham coladas em boa parte do período, mas se
distanciam nos últimos anos do período. Podemos especular que a natureza dos conta próprias
era mais próxima dos empregadores mas vem se distanciando dele no último período e que o
MEI teria provável papel em explicar essas mudanças? Nota-se que no período que temos dados
disponíveis houve outras crises no mercado de trabalho, mas somente a última destas levou a
este descolamento.
Figura 6. Tempo médio no atual trabalho principal por posição na ocupação (1990-2019)
Fonte: PNAD/PNADC (Seleção 1) - IBGE. Elaboração própria. Linha pontilhada vertical marca a criação do MEI
Alguns autores enfatizam que o rendimento dos conta próprias tende a ser em média abaixo
do rendimento geral dos ocupados (HOLZMANN, 2013, p.129), e com maior amplitude (CO-
NEN; SCHIPPERS, 2019, p.7) (HOLZMANN, 2013, p.129). Ao observar os dados apresenta-
dos na Figura 7 notamos que a média de rendimentos real dos conta próprias tende, realmente,
a ser mais baixa que a dos empregados. O deflacionamento aplicado é importante para limpar
a série das muitas variações do valor da moeda (e na moeda utilizada). Nota-se também que as
séries caminham juntas na quase totalidade dos últimos quarenta anos, exceto, justamente, nos
anos mais recentes do período em análise. Neste longo período de quatro décadas a economia
brasileira passou por diversas crises, algumas excepcionalmente agudas, mas isso não foi mo-
tivo para levar a uma diferença estrutural dos rendimentos destas duas categorias dos ocupados,
porém isso parece ocorrer nos últimos anos.
73
Figura 7. Rendimento real médio de todos os trabalhos, por posição na ocupação, valores
de 2015 (1976-2019)37
Fonte: PNAD/PNADC (Seleção 1) - IBGE. Elaboração própria. Linha pontilhada vertical marca a criação do
MEI.
Ao longo dos últimos anos uma mudança distinta pode ser percebida no rendimento real
médio de todos os trabalhos dos conta próprias se comparada com o rendimento real dos empre-
gados (Figura 7). Se tomarmos somente os dados da PNADC em 2012 o rendimento real médio
dos empregados em todos os trabalhos foi de 1.741,25 reais e o rendimento real médio dos conta
próprias foi de 1.441,43 reais (ambos à preços de 2015). Ou seja, empregados tinham renda em
média 21.32% maior que os conta próprias em 2012. Já em 2019 os empregados ganhavam em
média 44.71% a mais do que os conta própria, 1.952,96 e 1.353,78 reais, respectivamente.
Em que pese sabermos não ser exatamente comparáveis as bases PNAD e PNADC, no
período em que as duas pesquisas foram a campo concomitantemente (2012-2015) os valores
da PNADC já apresentam maior diferença do que os valores da PNAD, matizando, portanto, a
interpretação de que a diferença de rendimentos no último período é sem precedentes. Ademais,
em breve (Figura 9) veremos que entre os empregados somente os que têm contribuição à pre-
vidência é quem mantém a subida dos rendimentos reais. De todo modo, a tendência apontada
pela PNADC é muito importante. Se realmente houve mudança estrutural da composição de
quem faz parte do grupo dos conta próprias, se a sua natureza está mudando com as mudanças
do mundo do trabalho, incluindo aqui o MEI, então o aumento das diferenças pode ser sim um in-
dicador significativo de um aumento na precariedade desse grupo. Como discutido no Capítulo
1, a falta de uma fonte de renda do trabalho constante é uma das características da precarização
contemporânea. Nas crises, quem geralmente sofre mais com volatilidade de renda (ou, na rea-
37
O pico abrupto do rendimento real no meio da década de 1980 pode ser atribuído aos efeitos do Plano Cruzado.
74
lidade, perda de renda) são os mais vulneráveis, os empregados sem carteira e conta própria em
especial. Pelo indicador que se expõe na Figura 7 os conta próprias podem ter caminhado em
direção à maior precariedade, isto é, ao mesmo tempo menores rendimentos e estarem sujeitos
mais fortemente às flutuações do nível de atividade da economia, tal como os assalariados sem
carteira assinada (denotado pelo descolamento das séries no gráfico).
O Figura 8 traz a massa de rendimentos reais do trabalho principal para empregados com e
sem contribuição à previdência e conta própria com e sem contribuição à previdência. A massa
é resultado da dinâmica do rendimento médio real e da dinâmica da quantidade de ocupados em
cada categoria. Além disso, como acabamos de ver no gráfico anterior, exceto no último período,
há alguma estabilidade do rendimento real médio entre os conta próprias no longo prazo. Assim
poderíamos esperar que ao longo do tempo o crescimento da massa de rendimentos reais seja
majoritariamente devido ao crescimento populacional, ou mais precisamente o crescimento da
população ocupada. Deve-se alertar ainda que, entre os quatro quadros apresentados no gráfico
abaixo (Figura 8), o de empregados que contribuem com a previdência tem um eixo em escala
muito superior aos outros, pois este é o maior grupo entre todos eles.
Figura 8. Massa real de rendimentos do trabalho principal, por posição na ocupação e
contribuição à previdência, valores de setembro de 2015 (1976-2019)
Fonte: PNAD/PNADC (Seleção 1) - IBGE. Elaboração própria. Linha pontilhada vertical marca a criação do
MEI.
Os painéis deixam muito claro que entre os empregados e conta próprias que contribuem
houve grandes alterações localizadas no tempo. O momento do início da alteração de ambas
as trajetórias é bem delineado. Entre os empregados que contribuem, o ponto mais forte de in-
flexão ocorreu junto com o início de governos trabalhistas em 2003. Foi política ativa destes
governos o aumento real do salário mínimo e a busca pela formalização dos trabalhadores (tanto
75
empregados quanto dos conta próprias). Para o grupo dos empregados que contribuem com a
previdência (fortemente associado àqueles que têm carteira assinada) o crescimento da massa se
estende até a crise de 2015. A partir deste momento a massa de rendimentos permanece relati-
vamente estagnada até o último ano da série. Já para o grupo dos conta próprias que contribuem
com a previdência a inflexão é nítida concomitante com a criação da figura jurídica do MEI, no
fim de 2008. Como será secundado na Figura 10, para este grupo, com a crise, temos a seguinte
composição de variações: aumento da quantidade de ocupados e diminuição do valor do ren-
dimento médio real. Estes dois fatores se anulam resultando em uma estabilidade da massa de
rendimentos dos conta próprias com contribuição previdenciária no último período da série.
Notável também é o fato dos conta próprias sem contribuição mostrarem massa de rendi-
mento maior do que aqueles com contribuição durante praticamente toda a série. Só por meio
da política do MEI, e com seu expressivo crescimento ao longo dos anos recentes, que em 2015
a massa real de rendimentos dos conta próprias com contribuição finalmente se tornou maior do
que a do grupo de conta própria sem contribuição38 .
Sobre a ideia de que a dispersão de rendimentos do conta própria seria maior do que a
dispersão de rendimentos entre os empregados, gostaríamos de tecer alguns comentários. De-
dutivamente os rendimentos deste grupo teriam uma tendência a ser mais disperso pois, como
vimos , os conta próprias variam muito a quantidade de horas trabalhadas dada a natureza das
atividades e por estar associado, pelo menos um subgrupo seu, com a ocupação para comple-
mento de renda familiar. Mas mesmo o rendimento por hora trabalhada (tirando o efeito da
dispersão do número de horas trabalhadas) ainda é intuitivamente mais disperso entre os conta
próprias do que entre os empregados, pois não há para estes um elemento forte que define boa
parte dos rendimentos entre os empregados: o salário mínimo. A própria natureza do conta
própria (autoemprego independente) como aquele que assume os riscos da empreitada capita-
lista faz com que sua renda seja incerta ao longo do tempo, afinal, um empregado com carteira
tem um contrato de trabalho, ele pode esperar de antemão uma renda acordada no final do mês
de trabalho, o mesmo não ocorre com o autoempregado. Ademais, como afirma Gomes (2009,
p.17) os rendimentos do autoemprego têm uma natureza distinta, ele é mais próximo da renda
do capital, intrinsecamente volátil. A seção 2.3 do Capítulo 3 é dedicada à discutir a volatilidade
de renda para diferentes posições de ocupação.
A distribuição em décimos da renda domiciliar per capita dos ocupados mostra que entre
os empregados vemos ao longo das últimas quatro décadas uma tendência de diminuição destes
entre os 20% de maior rendimento (acima do oitavo decil). Por outro lado, o grupo dos conta
próprias apresenta um padrão de mudança bastante interessante. Se observarmos o painel su-
perior da Figura 9 vemos que as linhas de cor mais claras, indicando distribuições de anos mais
antigos, tem um formato decrescente. Isto significa que os conta próprias estavam concentrados
38
Note que esta análise deixa de lado o trabalho secundário e outros trabalhos e suas respectivas massas de
rendimentos, pois estas não são passíveis de calculo para a totalidade do período da Seleção 1.
76
na parte de baixo da distribuição de renda no passado, notavelmente nos dois primeiros décimos.
Ao longo dos anos evidencia-se que o formato desta distribuição se altera em direção à homoge-
neidade, representada idealmente por uma reta horizontal (na verdade, em anos mais recentes, a
reta está ligeiramente inclinada positivamente), isto é, quando todo décimo de renda tem 10% dos
respectivos ocupados39 . A composição do grupo dos conta próprias vem se colocando cada vez
melhor na distribuição de rendimentos domiciliares no Brasil, e hoje está quase perfeitamente
distribuídas: há tantos ocupados por conta própria nos estratos inferiores quanto há ocupados
por conta própria nos estratos superiores de renda domiciliar per capita. Esta mudança é mais
um elemento para fortalecer a ideia de que há uma mudança recente na composição ou na na-
tureza deste grupo. Por fim, podemos especular que tal mudança pode ser de aproximação ou
substituição do assalariamento pelo conta própria (ou mais geral, pelo autoemprego).
39
Todos os gráficos apresentados na presente seção 2.1 deste Capítulo incluem os trabalhadores residentes em
áreas rurais. Como exercício refizemos todos eles sem os trabalhadores rurais e constatamos que em nenhum caso,
com exceção da Figura 9, houve diferenças que alterassem a interpretação descrita no texto. No caso da distribuição
de renda nos décimos a alteração relevante, se retirarmos os trabalhadores rurais, é que entre os conta próprias a
progressão das curvas se torna bem mais suave, mantendo a direção. Isto pode indicar que há entre os conta própria,
mais do que nas outras posições na ocupação, uma passagem do rural ao urbano, sendo que nos anos iniciais os
conta próprias rurais seriam os responsáveis por deixar cheia a cauda inferior da sua distribuição.
77
Figura 9. Distribuição dos ocupados por posição na ocupação e décimo da renda domiciliar
per capita ao longo do tempo (1976-2015)
Como explicar a aparente contradição entre a evolução recente da renda real média dos
conta próprias (Figura 7) e o formato da sua distribuição nos décimos de renda domiciliar per
capita (Figura 9), visto que a primeira apresenta uma queda nos últimos anos enquanto o segundo
vê crescerem as participações destes ocupados nos décimos superiores? Como podem perder
renda real média e ao mesmo tempo ocupar mais os estratos mais ricos? A possível explicação
para isso está na dinâmica da composição dos grupos e na sua heterogeneidade. O grupo dos
78
empregados, apesar de incluir os assalariados sem carteira, é muito marcado pela existência de
um piso de rendimentos, o salário mínimo. Quando a crise se avizinha muitos passam para a
condição de não ocupados, só restam no grupo aqueles que mantêm o emprego, ou seja, não
mais se trata exatamente do mesmo grupo ao longo do tempo. Por outro lado, na crise, muitos
iniciam a ocupação de conta própria aumentando a população deste grupo e diminuindo sua
renda média (iniciantes tendem a ter renda menor, e ademais não há fronteira inferior como o
salário mínimo)40 .
Ainda por outro motivo a composição heterogênea dos grupos pode ajudar a explicar esses
dados. Se o grupo de conta própria tiver maior idade média, suas famílias terão maior chance de
serem compostas por membros que têm renda de aposentadoria41 . Se isso é verdade, como pa-
rece ser o caso, dada a composição da família (em um ambiente de queda de renda generalizada)
os conta próprias irão ocupar mais os estratos superiores da distribuição de renda domiciliar per
capita por terem um “colchão familiar” mais estruturado. Esta colocação se associa bem com a
ideia de que muitas vezes o conta própria é uma ocupação de complemento de renda familiar,
e portanto, muito embora seu rendimento direto seja sabidamente mais volátil, possivelmente
as outras rendas familiares podem ser, em média, menos voláteis em comparação com as outras
rendas das famílias dos empregados42 . Outro ponto interessante que pode ser notado aqui é que
se tornar conta própria muitas vezes ocorre no final da vida ativa do trabalhador, quando ao
mesmo tempo, devido a idade, o trabalhador sente dificuldade de recolocação em emprego for-
mal e possivelmente já acumulou conhecimento ou experiência para iniciar um nova ocupação
como autoempregado.
A Figura 10 separa o rendimento real das mesmas categorias (empregado e conta própria),
mas desta feita segrega aqueles que contribuem com a previdência social daqueles que não con-
tribuem. Este gráfico nos reforça alguns aspectos que indicamos previamente e questiona outros.
Primeiramente lembrando que constatamos que os conta próprias tinham em média renda menor
do que os empregados, mas se comparamos empregados com contribuição à previdência com
conta própria com contribuição à previdência os segundos têm renda média maior. O mesmo
ocorre entre aqueles que não contribuem com a previdência, conta própria têm maior renda
média. Ainda assim, a diferença entre a média geral de cada das duas posições na ocupação é
favorável aos empregados pois há diferentes proporções entre os dois grupos (com e sem con-
tribuição) de cada uma das posições na ocupação. O total de conta própria que não contribuem
é muito maior do que os que contribuem, assim mesmo que os conta próprias que contribuem
tenham renda média maior que os empregados que contribuem, e os conta próprias que não con-
tribuem tenham renda média maior que os empregados que não contribuem, a renda média do
total de conta própria é ainda menor que a renda média do total de empregados. A discrepância,
40
Reforçamos novamente que o tema das transições será tratado mais detidamente nos próximos capítulos deste
trabalho.
41
De fato os conta próprias tem maior idade média do que os outros ocupados, veja Figura A1.1 no Apêndice 1,
e tem maior chance de ter rendimento de aposentadoria, veja Figura A1.8 no Apêndice 1.
42
Isto parece ser uma hipótese testável com método semelhante àquele usado na seção 3.2.3.
79
Em resumo, o conta própria trabalha em média um pouco menos que o empregado, tende
80
a ganhar menos na média, e ser um grupo mais heterogêneo em termos de rendimentos. Vemos
também que este grupo tem melhorado ao longo das últimas décadas sua a posição na distri-
buição de renda total, apesar de não ser tão claro os motivos para tanto. Ademais reunimos
uma série de indícios para afirmar que a natureza da composição do grupo de conta própria que
contribuem com a previdência deve ter mudado como resultado da política do MEI, fomentando
transições tanto dos conta próprias sem contribuição à previdência para o MEI (a formaliza-
ção almejada pela política pública), quanto de assalariado para MEI (e portanto para o conta
própria).
A ideia de formalização foi discutida com mais profundidade teórica na seção 1.2.1. Lá
vimos que o próprio conceito de formalização está em constante evolução e disputa, e é utilizado
de diferentes maneiras por distintos autores. No caso específico do conta própria o conceito sofre
ainda com a dificuldade inerente à esta posição na ocupação. Devemos olhá-lo do ponto de vista
de uma empresa, e portanto a formalização é o registro como pessoa jurídica (no Brasil equiva-
lente a ter um CNPJ) ou do ponto de vista do trabalhador, neste caso associando formalização
ao recebimento de direitos e garantias de proteção do Estado tal qual um assalariado formal?
Um dos apontamentos da discussão feita naquele capítulo é que, para os propósitos deste tra-
balho, muitas vezes formalização como conceito compartilha muitos elementos do conceito de
precariedade. No final das contas o que realmente importa são as condições materiais gerais
dos trabalhadores e a forma da sua inserção no mundo do trabalho. Assim as distintas formas
de ver a formalização do conta própria são proxys, ainda que discutíveis, para auferir, no final, a
qualidade de vida desta parcela da população ocupada.
Do ponto de vista dos dados, no entanto, somos limitados pela disponibilidade de variáveis
presentes ou não nas principais pesquisas domiciliares brasileiras utilizadas neste capítulo. O
indicador de contribuição à previdência, frequentemente usado para auferir formalidade dos
conta próprias, é a única variável que pode ser utilizada desde o início da série da Seleção 1,
isto é, desde 1976. O registro do CNPJ do negócio, outra variável importante para falar da
legalidade do negócio, está presente na PNAD a partir de 2009 e na PNAD Contínua a partir de
2012. Vamos olhar brevemente para cada uma delas, começando com dados dos conta próprias
com e sem contribuição à previdência.
81
Figura 11. Conta própria sobre população ocupada, por condição de contribuição à pre-
vidência (1976-2019)
Fonte: PNAD/PNADC (Seleção 1) - IBGE. Elaboração própria. Linha pontilhada vertical marca a criação do
MEI.
Fonte: PNAD/PNADC (Seleção 1) - IBGE. Elaboração própria. Linha pontilhada vertical marca a criação do
MEI.
A Figura 11 nos mostra a proporção do total de ocupados por conta própria com e sem
contribuição à previdência e a Figura 12 a taxa de contribuição previdenciária dos conta próprias.
Como vimos no início desta seção a proporção geral de conta própria vinha em levíssima mas
82
constante queda durante décadas, tendência revertida com a política do MEI. Porém, se olharmos
mais detidamente para os dados apresentados nos dois gráficos acima, vemos que quem vinha
em queda eram os conta próprias que contribuem com a previdência, enquanto que os conta
próprias que não contribuem estavam em leve tendência de crescimento até 2003, ano este que
marca o início das políticas de fortalecimento do mercado de trabalho dos recentes governos
trabalhistas. Os conta próprias com contribuição à previdência só revertem sua trajetória de
queda com a criação do MEI, a partir de 2008. Estes dois processos estão cristalizados na taxa
de contribuição à previdência apresentada na Figura 12, talvez o gráfico mais importante para
mostrar os impactos positivos do MEI no mercado de trabalho. Alguns marcos de destaque nesta
série são um pico de 29,95% em 1983, queda constante até o ponto mais baixo da série, em 2002,
contabilizando 14,01%, A partir deste ponto mais baixo a taxa apresenta crescimento leve até
a data da criação do MEI, a partir de quando a taxa passa a crescer fortemente até a crise de
2015. Um novo pico é atingido em 2016 quando 31,83% dos conta próprias contribuem com a
previdência. A crise estabiliza este número acima de 30%.
Se compararmos a Figura 11 com a Figura 2, notamos que o crescimento da proporção
de conta própria com contribuição previdenciária sobre o total de ocupados é contrabalançado
pelo decrescimento da proporção de conta própria sem contribuição à previdência, de modo que
a proporção total de conta própria no total de ocupados se mantém relativamente estável entre
a promulgação da Lei do MEI e o início da crise. Se olharmos somente para estes dados, esta
subseção do mercado de trabalho parece estar fazendo um processo de formalização, isto é, neste
caso, transições entre conta própria informal para conta própria formal.
O período entre a promulgação da lei do MEI e o começo do crescimento relativamente
acelerado do conta própria traz questões importantes. No momento em que a crise se instaura
no mercado de trabalho geral, é provável que, por falta de opção, o trabalhador se veja direci-
onado a procurar no autoemprego uma saída. Outra hipótese, não excludente é que o período
de aquecimento do mercado assalariado formal esconde um processo mais geral e subjacente de
pressões pela flexibilização das relações de trabalho. Por esta hipótese, as mudanças nas rela-
ções de trabalho, descritas no Capítulo 1 estariam ocorrendo estruturalmente ao longo de todo o
período de crescimento econômico: as empresas estariam avançando na busca por flexibilidade
das relações de trabalho, estariam naquele momento procurando outras formas de se relacionar
com a força de trabalho para além do assalariamento formal tido como rígido e custoso. Po-
rém níveis historicamente baixos de desocupação aberta jogam uma névoa sobre este processo,
isto é dizer que as mudanças estão ocorrendo mas que não estão aparentes. Esta névoa só seria
dissipada com o início da crise. Esta visão mais crítica à forma de conduzir as políticas de for-
malização do conta própria apontaria que as possíveis transições entre conta própria informal
para formal (formalização) estariam sendo acompanhadas também por transições de assalariado
formal para conta própria (a pejotização entendida de forma abrangente). Separar quais foram
as formas de transição para o conta própria com contribuição deve nos ajudar a entender melhor
83
este fenômeno.
Com relação à taxa de legalidade, isto é, a proporção de estabelecimentos que tem CNPJ,
a Seleção 2 permite, a partir de 2009, acompanhar este indicador, como exposto na Figura 13.
Olhando para a relação entre PNAD e PNADC quando estas foram concomitantes vemos que a
primeira é sempre aproximadamente dois por cento maior que a segunda. Assim, podemos dizer,
aplicando esta diferença no ano inicial da PNAD, que a taxa passa de um pouco mais de 10%
em 2009 para 20% em 2019, praticamente dobrando em 10 anos. Esta evolução em uma década
é muito próxima daquela apresentada pela evolução da taxa dos conta próprias contribuintes à
previdência (Figura 12). Naquela série também a taxa praticamente dobra no mesmo período
(de 17,58% para 30,59% em 2019).
Figura 13. Taxa de legalidade dos conta próprias por CNPJ (2009-2019)
Fonte: PNAD/PNADC Anual (Seleção 2) - IBGE. Elaboração própria. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
Esta subseção analisou os dados de um ponto de vista da estática comparada, isto é, olhamos
uma série de estatísticas de um subgrupo dos dados ao longo do tempo. Porém em diversos
momentos esbarramos nas dificuldades de composição, pois estes grupos mudam ao longo do
tempo. Assim, uma série de perguntas ficou aqui sem ser respondida sobre as transições entre as
diferentes posições na ocupação, em especial de e para os conta própria. Estas questões só serão
abordadas no Capítulo 3 onde tratamos mais detidamente das transições utilizando a qualidade
de painel da PNADC.
Trazemos nesta seção uma análise ainda maior detalhada dos conta próprias com contribui-
ção à previdência, visando nos aproximar mais do subgrupo de maior interesse deste trabalho,
84
os microempreendedores individuais.
A Figura 14 divide a taxa de contribuição à previdência nos grandes setores econômicos
harmonizados na Seleção 1. Aqui se vê diferenças marcantes entre a evolução desta taxa entre
os setores. Os grandes setores de serviços (Comércio, Hotéis e restaurantes, Transporte e comu-
nicação e Imobiliária e serviços aos negócios) apresentam forte queda na taxa de contribuição à
previdência dos conta próprias entre o fim da década de 1970 e os anos 2000. De fato surpreende
mais que esta taxa, nestes setores de serviço, rondasse em torno dos 60% no início do período43 .
Ademais é bem marcante, na maioria dos grandes setores, o momento que marca a criação da
figura jurídica do MEI. Nesta marca temos mudança ou mesmo reversão de tendência na taxa
de contribuição à previdência em todos os grandes setores.
Figura 14. Conta própria, proporção que contribui à previdência por setor ISIC3 (1976-
2019)
Fonte: PNAD/PNADC (Seleção 1) - IBGE. Elaboração própria. Linha pontilhada vertical marca a criação do
MEI.
Infelizmente a Seleção 1 só permite olhar para os grandes setores harmonizados, mas para
este trabalho é particularmente importante fazer uma análise mais detida dos subsetores econô-
micos que apresentaram crescimento do conta própria com contribuição à previdência pois este
43
Aproximadamente o dobro da taxa geral apresentada na Figura 12.
85
grupo está associado ao MEI. O problema é que as mudanças gerais do mercado de trabalho
brasileiro levam à tentativa constante de readequação das pesquisas amostrais do IBGE. Assim,
entre PNAD e PNADC há mudanças nas categorias da classificação de setores econômicos utili-
zada, a CNAE Domiciliar. Mesmo na Seleção 2, portanto, ainda é impossível uma harmonização
entre PNAD e PNADC sem um alto grau de agregação dos subsetores econômicos. A saída é
olharmos somente para a PNADC entre 2012 e 2019, selecionando os subsetores com maior
crescimento absoluto de ocupados em conta própria e com maior variação positiva da taxa de
contribuição destes à previdência entre 2012 e 201944 .
A Figura 15 mostra a evolução da quantidade de conta própria com contribuição à previ-
dência nos subsetores da CNAE Domiciliar que apresentaram maior relevância de acordo com
o critério discutido no parágrafo anterior. O gráfico de dispersão relaciona variação absoluta
na quantidade de conta própria (seu log) com a variação em pontos percentuais na taxa de con-
tribuição à previdência entre os conta própria, sempre por subsetor econômico. Subsetores re-
presentados no alto do gráfico são subsetores com grande crescimento no número de ocupados
por conta própria, subsetores representados mais à direita são subsetores que tiveram grande
crescimento na proporção dos conta próprias que contribuem com a previdência entre 2012 e
2019. Escolhemos focalizar no gráfico e descrever os dados de alguns subsetores selecionados
(pontos em vermelho). A tabela que se segue à este gráfico elenca estes subsetores.
Figura 15. Variação de quantidade absoluta e variação da taxa de contribuição à previ-
dência entre os conta próprias por subsetor CNAE Domiciliar (2012-2019)
Fonte: PNAD (Seleção 2) - IBGE. Elaboração própria. Nota: destacados em vermelho aqueles subsetores listados
na próxima tabela.
44
Outra possibilidade seria olhar somente para a PNAD entre 2009, ano de início do MEI e o último ano da
PNAD, 2015. Este trabalho foi feito e está explicitado na Figura 9 e Figura 10 do Apêndice 1.
86
Tabela 2. conta própria nos principais subsetores CNAE, quantidade e taxa de contribui-
ção à previdência
O mesmo trabalho é feito para as ocupações usando a CBO Domiciliar no maior nível de
desagregação que a pesquisa permite. As duas ocupações de crescimento mais destacado em ter-
mos do número de ocupados por conta própria entre os anos de 2012 e 2019 são Comerciantes
de lojas (de 333.666 a 833.719) e Vendedores a domicílio (de 68.162 a 309.449). Outras ocu-
pações de serviços pessoais como esteticistas, cabeleireiros e alfaiates tem menor crescimento
absoluto mas maior crescimento relativo. Há ainda, duas ocupações agrícolas e a dos condutores
de automóveis, este último possivelmente ligado ao surgimento dos aplicativos de transporte e
entrega.
87
Tabela 3. conta própria nas principais ocupações CBO Domiciliar, quantidade e taxa de
contribuição à previdência
Fonte: PNADC (Seleção 2) - IBGE. Elaboração própria. Nota: destacados em vermelho aqueles subsetores listados
na próxima tabela.
88
Como era esperado há algumas relações diretas entre os subsetores com alto crescimento
de conta própria e ocupações com alto crescimento de conta própria. Tanto o subsetor quanto
a ocupação de cabeleireiros estão presentes nas duas listas; o subsetor de transporte rodoviário
de passageiros e a ocupação condutores de automóveis, táxis e caminhonetes ou ainda o sub-
setor Comércio de artigos do vestuário, complementos e calçados e a ocupação Comerciantes
de lojas. Há também discrepâncias não explicadas entre as tabelas subsetorial e ocupacional.
O subsetor de transporte rodoviário de passageiros passou de 25% para 35% de taxa de con-
tribuição à previdência, enquanto que a ocupação de condutores diminuiu de 42% para 31% de
taxa de contribuição à previdência. Ambos têm alto crescimento na quantidade, e possivelmente
poderiam estar bastante ligados. Só um cruzamento destas variáveis permitiria esmiuçar essas
diferenças, mas é provável que parte das categorias ocupacionais que compõem o grupo não faça
parte do subsetor indicado.
Interessante notar que aparece também entre as ocupações de maior crescimento de quan-
tidade de conta própria Advogados e juristas, mantendo relativamente estável sua alta taxa de
contribuição à previdência em relação às outras ocupações. Esta é uma ocupação de profissi-
onais liberais de alta qualificação, quase sempre exigindo o ensino superior para ser exercida.
Todas as outras ocupações listadas não compartilham esta característica, sendo estas mais ligadas
ao trabalho pouco qualificado, geralmente manual. O texto de Santiago e Vasconcelos (2017),
discute justamente este ponto, apontando que cada vez mais o conta própria no Brasil é hetero-
gêneo, abarcando tanto catador quanto o “doutor”, isto é, fisioterapeutas, dentistas, advogados,
contadores (SANTIAGO; VASCONCELOS, 2017, p. 321). Nota-se, porém, que o advogados e
outras profissões liberais não estão presentes na lista do MEI (veja Anexo 1), apontando que o
processo de aumento de conta pŕoprias não pode ser atribuído somente à esta política específica.
Há outras formas de criar uma pessoa jurídica que não o MEI. Outras pessoas jurídicas geral-
mente usadas para estas ocupações fora da lista do MEI são EIRELI e Micro Empresa (ME). O
processo de pejotização também pode ocorrer por meio destas figuras jurídicas.
Limitamos aqui nosso destaque aos subgrupos de ocupações e de subsetores que tenham
um crescimento absoluto considerável, pois se por um lado a maior desagregação de categorias
setoriais e ocupacionais qualifica quem e onde a participação do conta própria cresce, por outro
a pesquisa amostral (PNADC) não é desenhada para ser fiel neste nível de detalhe, retirando
a confiança nas estatísticas e aumentando os casos de flutuações aleatórias45 . Usar a variação
absoluta na quantidade permite separar estes casos com mais facilidade.
Ao longo das descrições anteriores, muito embora seja o pano de fundo de interesse, to-
mamos o cuidado de enfatizar que tratamos do grupo dos conta próprias e não exatamente do
MEI. Quanto podemos inferir sobre o MEI com estes dados indiretos, visto que estes fazem parte
daqueles?
45
Isto implica intervalos de confiança maiores, e variações proporcionais ano a ano muito grandes não explicadas
pelos dados mas sim pelo tamanho da amostra.
89
Esta análise do MEI por meio dos dados do conta própria não pode ser feita sem mediações,
pois, como visto, não é possível com exatidão separar o MEI do grupo geral. Ainda assim, a
criação do MEI e sua veloz expansão parecem ter deixado suas marcas nas séries de dados aqui
construídas. Não é exagero dizer que a criação do MEI teve um efeito importante e notável nos
indicadores do mercado de trabalho brasileiro.
Podemos aqui voltar a refletir sobre a discussão feita no Capítulo 1. Se houve aumento
da formalização esta formalização melhorou as condições de inserção no mercado de trabalho
dos conta próprias? Se os dados de renda média dentre os conta próprias mostrassem um alto
crescimento então poderíamos especular nesta direção, porém eles não mostram isso (Figura
10). Se houvesse queda na taxa de subutilização por insuficiência de horas trabalhadas no grupo
dos conta próprias, mas não há esta queda. O que de fato cresceu foram os contribuintes à
previdência e registros com CNPJ (Figura 11 e (Figura 13)), ambos sem dúvidas importantes,
mas que sozinhos não são elementos suficientes para uma inserção que podemos afirmar não ser
precária. Dito isso, voltamos a enfatizar uma última vez, o poder destas especulações é inibido
pelas mudanças na composição do grupo ao longo do tempo. É preciso associar os presentes
dados apresentados com uma análise de transições e trajetórias para podemos ir mais a fundo
nesta questão, trabalho este deixado para os próximos capítulos.
Na próxima seção faremos uma breve descrição mais detalhada dos inscritos no MEI por
meio dos registros administrativos junto à Receita Federal.
91
Como qualquer outra pessoa jurídica, o registro administrativo do MEI se dá junto à Receita
Federal pelo Cadastro Nacional de Empresas (CNE). Esta base de dados é de acesso aberto ao
público geral47 e, relevante para nosso estudo, há uma variável indicadora se um dado CNPJ é
MEI ou não.
O estoque total mensal de registros MEI, como observado abaixo na Figura 17, apresenta
um crescimento bastante acelerado. Foram necessários 47 meses para atingir o primeiro milhão
de inscritos no MEI em novembro de 2012. Depois disso, com mais 23 meses este número
já havia dobrado atingindo 2 milhões em outubro de 2014. Com mais 26 meses novamente
dobrado, passando a quatro milhões de registros em dezembro de 2016. Com mais 32 meses,
o estoque já atingia oito milhões de registros em agosto de 2019. E no último registro da base
utilizada, de agosto de 2020, esse número ultrapassou o total de dez milhões e quinhentos mil
inscritos. Em janeiro de 2022 já temos mais de 13 milhões de inscritos. Para dar proporção a
este número podemos retomar os dados da Figura 1 da seção anterior notando que de acordo
com os dados das pesquisas amostrais haveriam aproximadamente 24 milhões de conta próprias
no Brasil em 2019.
Figura 17. Estoque mensal total de MEIs (2009-2020)
Declaração Anual do Simples Nacional (DASN-MEI) em dois períodos anuais seguidos acom-
panhados de pelo menos o mesmo período de inadimplência de suas contribuições previden-
ciárias (ANSILIERO; NAGAMINE, 2017, p.58-59). A consequência disto é que os registros
administrativos do MEI junto ao CNE da Receita Federal são mais bem entendidos como fluxo
de novos entrantes pois a baixa dos registros inativos é feita com pouca frequência. Em outras
palavras, o estoque total de registros esconde uma quantidade considerável de trabalhadores que
não mais tem o MEI como ocupação real.
De acordo com a publicação de análise dos 10 anos do MEI do SEBRAE a pesquisa amos-
tral de junho de 2019 com mais de 10 mil MEIs indicava que 72% dos inscritos estavam em
atividade (SEBRAE, 2019a, p.10), o que implicaria, proporcionalmente, aproximadamente 7,62
milhões de MEIs ativos em agosto de 2020. Este número praticamente cobre o total dos conta
próprias com contribuição previdenciária e é superior a quantidade dos conta próprias que de-
clararam ter registro do próprio negócio nas pesquisas amostrais48 . Ademais, a inadimplência
de contribuições dos MEI gira em torno de 50% (ANSILIERO; NAGAMINE, 2017, p.59).
A Figura 18 que traz o fluxo mensal, assim como o gráfico da evolução do estoque, tem
formato crescente, embora menos inclinado que o anterior. A série mostra um patamar de 25 a
50 mil novos inscritos por mês em média entre os anos de 2010 e 2014. Com o início da crise
de 2015 há um salto notável para cada vez mais próximo de 100 mil novos inscritos por mês
(alcançado em 2017). Esse número médio só acelera chegando à média de 200 mil inscritos por
mês no ano de 2020, já em meio a pandemia.
48
Isto mostra a cobertura do MEI. A discrepância provavelmente se deve a alguns fatores. Tanto a pesquisa
SEBRAE quanto PNAD e PNADC são amostrais e autodeclaradas e, portanto, tem um erro embutido em seus
resultados. Em segundo lugar, lembra-se que há uma parcela de MEI que se auto-enquadra como empregadores ao
responder o questionário de uma pesquisa amostral. Ademais, ainda é possível que parte se auto-enquadre como
empregado, ao estar em uma posição de autoemprego dependente ou pejotizado.
93
A evolução no fluxo de novos inscritos no MEI nos subsetores com maior número de re-
gistros, a Figura 19 abaixo, mostra que entre os setores há diferenças importantes. O subsetor de
Cabeleireiros manicure e pedicure, o maior subsetor com 803.131 registros, sofreu em quanti-
dade de novos registros na pandemia, ao contrário do Comércio varejista de artigos do vestuário
e acessórios, segundo maior subsetor com 765.164 registros, que viu acelerar ainda mais o fluxo
de entrantes durante o início da pandemia.
Vale ressaltar a especificidade do setor Cabeleireiros manicure e pedicure pois este tem
regulamentação própria, por meio da Lei N° 13.352/2016 que institui o chamado salão parceiro.
Nesta modalidade um dono de estabelecimento pode fazer contrato de parceria com pessoas que
trabalharão neste salão. Está vedada ao dono do salão ser MEI, mas todos os parceiros podem ser
(não é obrigatório, eles podem ser autônomos também, mas a opção do MEI é a mais atrativa).
94
Figura 19. Fluxo mensal de abertura e fechamento de MEIs, seis subsetores com maior
número de registros (2009-2020)
Para ilustrar os subsetores com maior número de registros, o gráfico abaixo (Figura 20)
lista os vinte subsetores com maior número de registros. Dentre eles, ordenamos pelo valor do
capital social declarado pelo MEI.
Boa parte desta lista não parece ser setores onde a pejotização no sentido estrito ocorresse.
Minimercados, por exemplo, é um subsetor geralmente vinculado ao negócio próprio, indepen-
dente, e diretamente ligado a consumidor final, isto é com poucas chances de serem empresas
seus clientes. A pejotização no sentido estrito envolve a tentativa da contratante em ocultar um
emprego formal por meio de um contratado entre pessoas jurídicas. A pejotização no sentido
estrito geralmente ocorre no setor de serviços, pois este deve ser passível de ser feito às empresas
como substituição do emprego49 . Tomemos o caso do Obras de alvenaria como exemplo: pode
ser que um autônomo se torne MEI, o que estaria dentro do espírito dessa lei (formalização),
mas pode ser que uma construtora demita seu assalariado e contrate serviços de alvenaria de
terceiros (MEI). Este seria o caso de pejotização no sentido estrito. O mesmo vale para setores
como Instalação e manutenção elétrica, Serviços de apoio administrativo, Outras atividades de
ensino, Serviços de pintura, e Transporte rodoviário de cargas.
49
A substituição da produção de dentro da empresa pela fora, que seria considerada do setor industrial, é o que
chamamos de pejotização no sentido amplo, isto é, o aumento geral do autoemprego na economia.
95
Figura 20. Valor do capital social50 , percentis selecionados nos vinte maiores subsetores
em número de registros - (2009-2020)
Fonte: Cadastro Nacional de Empresas (CNE) - Receita Federal. Elaboração própria. Nota: Valores deflacionados
para janeiro de 2020 pelo INPC.
Com relação ao gênero dos MEIs usando o nome dos registrados e o pacote genderBR
(MEIRELES, 2021) encontramos o gênero de 96% da base de CNPJs da Receita Federal. Esses
dados indicam que 53,3% dos MEI são homens e 46,7% mulheres51 . Dividindo estes resultados
pela CNAE principal do negócio podemos ver como estão concentrados os gêneros, na figura
abaixo.
50
Os dados de capital social são autodeclarados pelo MEI. Há muitos valores zerados ou grandes demais para
serem críveis, provavelmente por erro no preenchimento. Para mitigar esta característica retiramos previamente,
dos dados apresentados neste gráfico, valores zerados e maiores que 3 milhões de reais. Além disso, privilegiamos
estatísticas posicionais (percentis) em detrimento de globais (como médias), pois as últimas tendem a carregar
maior distorção.
51
Resultado semelhante encontramos em pesquisa própria, cujo resultado está no Apêndice 5. A Pesquisa do
Perfil do MEI (SEBRAE, 2019a, p.34) também mostra 52,5% homens e 47,5% mulheres em 2018
96
O SEBRAE faz anualmente uma pesquisa sobre o perfil do MEI. Esta publicação traz algu-
mas informações não tratadas anteriormente e que valem ser descritas. Sobre o local onde opera
o negócio 40% responderam que tem a própria casa como local, 28% utilizam estabelecimento
comercial, 17% na casa ou empresa do cliente e 11% na rua (SEBRAE, 2019a, p.49). Pergunta-
dos sobre a ocupação anterior a se tornar MEI 51% disseram ter sido empregados com carteira,
21% empreendedor informal, 12% empregado informal, 5% dono de casa, 3% estudante, 2%
empreendedor formal, e 2% desempregado (SEBRAE, 2019a, p.54).
Sobre as rendas a publicação traz algumas informações interessantes. Ela estima que em
2019 haviam 4,6 milhões de MEIS em atividade com única fonte de renda sendo aquela advinda
do trabalho como MEI (76% do total). Dentre eles 37% tinham na renda da ocupação via MEI é
a única renda da família (SEBRAE, 2019a, p.11-13). Entre os MEI entrevistados 76% disseram
não ter outra fonte de renda, enquanto 7% deles disseram ter renda do emprego formal, 6% renda
do emprego informal, 4% renda de outro negócio como conta própria, 4% renda de aposenta-
doria, e 3% renda de aluguel (SEBRAE, 2019a, p.71). A renda média individual da ocupação
como MEI em 2019 foi de R$1.375 reais mensais (SEBRAE, 2019a, p.15). Estes números serão
novamente úteis no Capítulo 4 onde apresentamos os resultados obtidos com survey próprio com
MEIs.
Neste capítulo buscamos fazer uma análise de longo prazo das características dos conta
própria, grupo no qual os MEIs melhor se encaixam nas pesquisas domiciliares nacionais, e
apresentar alguns dados dos registros administrativos dos MEIs. As análises permitem qualifi-
car a quantidade relativa deste grupo ao longo de quase quatro décadas dentro dos ocupados no
mercado de trabalho brasileiro, sua estabilidade de longo prazo e leve crescimento a partir do
97
momento da criação da figura jurídica do MEI (Figura 2). Já com relação ao grupo dentro dos
conta próprias com contribuição à previdência vemos um grande crescimento associado com o
MEI (Figura 12). Vimos também que esses resultados são bastante distintos entre setores dife-
rentes. Pudemos ainda qualificar algumas das características da inserção deste grupo, em termos
de jornada, (sub)ocupação e rendimento (seção 2.1.2.2). Observamos a evolução da posição dos
conta próprias na distribuição de renda no Brasil (Figura 9), sendo este o grupo com maiores
alterações nesta inserção ao longo do tempo e mostrando que hoje o grupo está bastante dis-
perso nesta distribuição de renda, o que indica a heterogeneidade do grupo (bem e mal inseridos
em termos de renda). Vemos a partir da crise iniciada em 2015 uma queda nos rendimentos
dos conta próprias com contribuição, fazendo com que a sua renda média se equipare àquelas
dos empregados com contribuição (antes era maior, veja Figura 10). Vimos ainda, tanto pela
PNADC (Figura 15) quanto pelos dados administrativos (Figura 19) de inscrições no MEI seu
crescimento quase exponencial no geral e concentrada em alguns setores. Como apontado, esse
crescimento de inscrições não se traduz diretamente em trabalhadores em atividade, mas dá uma
referência para a crescente importância desse instrumento no mercado de trabalho brasileiro que
nem a crise sanitária arrefeceu52 .
52
Como veremos no próximo capítulo (veja Figura 22).
98
CAPÍTULO 3. Transições
Comparar duas quantidades em dois momentos nos faz deduzir o fluxo líquido entre estes
dois momentos, isto é, quanto um dado grupo cresceu ou diminuiu de tamanho. Porém, uma
análise focada somente nos fluxos líquidos pode esconder elementos importantes para entender
a dinâmica dessas mudanças por desconsiderar os fluxos brutos. Nas análises do mercado de
trabalho brasileiro este elemento é bem exemplificado quando comparamos diferenças em dois
anos da RAIS (fluxo líquido), com as diferenças dadas pelo CAGED (fluxos brutos). Dado um
resultado positivo de fluxo líquido este pode ser decomposto em aumento de entradas (mais
contratações) ou diminuição de saídas (menos demissões) do grupo em questão.
Em vários momentos no Capítulo 2 esbarramos nas dificuldades de composição para po-
der inferir, com segurança, algo sobre o grupo dos conta própria. Se o grupo está mudando sua
composição ao longo do tempo, como podemos afirmar que uma mudança em alguma de suas
estatísticas, acompanhadas ano a ano pelas PNADs, advém de um causa outra que não esta mu-
dança de composição? A análise de estática comparada pode se tornar mais segura se pudermos
acompanhar verdadeiramente o grupo ao longo do tempo.
Particularmente importante é saber de onde vem os novos conta própria, o que, de um
ponto de vista, equivale a avaliar a eficácia da política do MEI, contrastando formalização de
conta própria anteriormente informal com as transições do assalariado para conta própria, isto
é, alguma forma de pejotização (ampla ou restrita). Se pudermos analisar os fluxos brutos de
e para o MEI (ou sua proxy) veremos que o crescimento deste grupo, visto no Capítulo 2, é
decomposto em fluxos brutos de entrada e fluxos brutos de saída. Avaliações como esta só são
possíveis acompanhando uma mesma pessoa ao longo do tempo.
Ademais no Capítulo 1 vimos que estão associados ao autoemprego no geral uma série
de características relacionados à precariedade que só podem ser observadas ao longo do tempo.
Por exemplo, discutimos teoricamente que a renda do autoemprego, por sua natureza em relação
à responsabilidade para com os riscos, tende a ser mais volátil ao longo do tempo (comparada
com a do emprego formal sob arcabouço legal minimamente protetivo). Tal afirmação só pode
ser testada analisando rendimentos seguidos de uma mesma pessoa.
A proposta deste capítulo é explorar quatro hipóteses ou questões sobre o autoemprego no
geral e o MEI em particular que só podem ser feitas a partir de um ponto de vista dinâmico, isto
é, levando em conta períodos sequenciais de análise. Construímos e analisamos um painel ao
nível de indivíduos usando a PNADC que nos permite nos aproximar de algumas dessas questões
empiricamente. As questões são as seguintes:
Dentre as quatro questões pontuais acima citadas que serão aprofundadas ao longo do pre-
sente capítulo, a primeira trata de uma descrição das características das transições, a segunda e
terceira analisam duas hipóteses sobre o rendimento do autoemprego (seu nível e volatilidade).
A última versa sobre a qualidade de vida de longo prazo da ocupação como autoemprego.
100
Ambas a Pesquisa Mensal de Emprego (PME) e a PNADC tem o formato de painel rota-
tivo, o que significa que elas acompanham a mesma pessoa em diversos momentos. Na PME
a pesquisa era feita 8 vezes no mesmo domicílio, englobando 18 meses e na PNADC Trimes-
tral, atualmente, a pesquisa é feita por 5 trimestres consecutivos no mesmo domicílio (REMY,
M.A.P.A. , WELLE, 2015). A PNADC Trimestral, porém, não divulga, atualmente53 , um con-
junto de variáveis que permitam acompanhar o indivíduo ao longo do tempo, somente um do-
micílio ao longo do tempo. Enfrentando dificuldades semelhantes para a PME, Ribas e Soares
(2008) criaram uma metodologia para construir painéis a nível do indivíduo indiretamente. As
principais variáveis utilizadas por eles são aquelas que indicam o domicílio e a data de nasci-
mento reportada54 . Isso permite construir uma sub-base onde podemos crer com grande chance
de acertar que uma mesma pessoa foi entrevistada mais de uma vez, pois se trata de pessoa no
mesmo domicílio com a mesma data de nascimento ao longo do tempo. Os autores vão adi-
ante e sugerem uma metodologia para tentar recolher e parear mais casos, usando um algoritmo
aplicado somente para aqueles que não foram pareados pelo método simples.
A adaptação do primeiro método de Ribas e Soares, o chamado método simples, para a
PNADC é relativamente fácil pois a PNADC traz as variáveis de identificação do domicílio
e da data de nascimento requisitadas pelo algoritmo. Nossos testes sugerem, no entanto, que
uma aplicação do método avançado (usando mais variáveis) não resultou em um acréscimo de
pareamentos muito grande (4% do total da base a mais) com um custo muito alto para a segurança
do pareamento (a comparação das métricas do primeiro grupo - primeiro método - com este
grupo adicional mostram discrepâncias não esperadas). Escolhemos, portanto, ficar somente
com a adaptação do primeiro método de Ribas e Soares, privilegiando, portanto, a segurança do
pareamento em detrimento de uma amostra maior.
A aplicação da metodologia de pareamento pode ser feita, por simplicidade para algumas
análises, sobre a base trimestral da PNADC ou, caso necessário, sobre uma junção da PNADC
Trimestral com a Anual. A PNADC Anual é construída pelo IBGE juntando entrevistas da
mesma visita de cada um dos trimestres de um ano. As visitas distintas têm diferentes ques-
tionários, em especial, a primeira e a última (quinta) trazem perguntas sobre outras fontes de
renda para além das do trabalho, e questionamentos sobre as condições do domicílio. Assim,
se for necessário utilizar a renda total domiciliar e suas variáveis derivadas é preciso utilizar a
PNADC Anual (primeira ou quinta visita, ou ambas). A principal base construída e utilizada
neste capítulo é, portanto, aquela que junta visita 1 e 5 da PNADC Anual com os os trimestres
intermediários da PNADC Trimestral.
53
Dentro do próprio IBGE a pesquisa é sim ligada individualmente. Embora a divulgação da chave individual
ainda não tenha acontecido, ela é uma uma promessa antiga.
54
Na verdade a junção das variáveis dia de nascimento, mês de nascimento e ano de nascimento. Pro-
põem também um método avançado que utiliza mais variáveis: sexo, idade, posição no domicílio (RIBAS; SOA-
RES, 2008)
101
Uma harmonização das principais variáveis presentes nas bases anuais da PNADC foi ne-
cessária, pois nem todas elas se mantiveram constantes ao longo do tempo. Em seguida fizemos
o pareamento de todos os trimestres (com a adição das variáveis da PNADC Anual, como dis-
cutido acima) e selecionamos como sub-base somente aqueles casos onde temos pareamento
completo pela chave criada para o indivíduo (indicador do domicílio e data de nascimento) nos
cinco trimestres consecutivos. Retiramos também casos ambíguos com mesma data de nasci-
mento e mesmo identificador de domicílio (que podem ser tanto erro de declaração ou indivíduos
com mesma data de nascimento como irmãos gêmeos). A base resultante tem aproximadamente
60% da base original da PNADC, com uma chave a nível do indivíduo e uma série de variáveis
advindas das PNADC Anuais (em especial outras fontes de renda e variáveis domiciliares) que
se somam à todas as outras variáveis já presentes nas PNADCs trimestrais.
Ao juntarmos dois trimestres resta a questão de qual fator de expansão, ou peso, utilizar.
O problema que se coloca é que por vários motivos há viés nos domicílios e nas pessoas que se
repetem entre os trimestres. É esperado que parte dos domicílios entrevistados deixe a amostra
na entrevista seguinte, por várias razões entre elas a mudança de endereço.
Para lidar com esta dificuldade utilizamos uma versão adaptada da metodologia de correção
dos pesos disponibilizada pelo trabalho de Jacob (2021, p.68). Seguindo este trabalho ajusta-se
um modelo sobre a propensão de resposta/não-resposta entre dois trimestres por meio do pacote
survey (LUMLEY, 2020) o que utiliza o desenho amostral complexo da PNADC55 . O modelo
de propensão a não-resposta segue parte das variáveis sugeridas por Jacob (2021, p.69), onde
todas as variáveis utilizadas são aquelas do trimestre inicial de análise:
N ivelInstru(t1) + SituacaoOcupacional(t1)
Onde:
P = Probabilidade de não-resposta;
UF = Unidade da Federação;
TipoArea = Tipo de área (Capital, Região metropolitana, Região Integrada de Desenvolvi-
mento Econômico, Resto da UF);
EspecieDom = Espécie da unidade doméstica (unipessoal, nuclear ou extendida);
Idade = Polinômio de segundo grau para a idade
NivelInstruPF = Nível de instrução da pessoa;
55
Em novembro de 2021 o IBGE atualizou os microdados da PNADC para incorporar a nova estrutura de calibra-
ção da pesquisa passando para o uso de replicação nos pesos amostrais. Neste trabalho não utilizamos estes novos
pesos, mas, entendemos que os resultados das estatísticas pontuais não sofram alterações com isso, somente os
resultados das variâncias destes estimadores podem se alterar(Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2021).
102
Como vimos, mesmo durante a crise sanitária o número de novos registros MEI continua
em alta. Em números absolutos 2020 foi o ano com maior quantidade de novos registros desde a
criação da figura do MEI com 1,8 milhões de inscrições, só superado por 2021 com aproximada-
mente 2 milhões de novos inscritos. Dados da PNADC Mensal mostram que o choque negativo
na quantidade total de ocupados durante a pandemia foi imenso. A variação do total de ocupados
ante ao mesmo mês do ano anterior teve um pico negativo de 14%. O Auxílio Emergencial e
o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda56 visavam justamente manter
boa parte dos cidadãos em casa e manter os empregos, mas não evitaram de todo a desestrutu-
ração produtiva (bastante heterogênea entre os setores) e, consequentemente, a perda de postos
de trabalho (WELLE et al., 2020). A desocupação não explodiu porque para ser considerado
desocupado é preciso estar buscando ativamente uma ocupação. Isto significa que no momento
posterior à pandemia a retomada do total de pessoas na força de trabalho pode levar a um cres-
cimento da taxa de desocupação na medida em que parte deste contingente reinicia a procurar
por ocupação.
A PNADC Mensal reflete a base de dados de registros MEI e entre todas as categorias
de posição na ocupação desagregadas (Figura 22) os conta próprias com CNPJ junto com o
funcionalismo público, foram os únicos grupos que ao invés de diminuírem como esperado na
crise, aumentaram de tamanho.
56
Medida Provisória N° 936/2020, Lei 14.020/2020 e Medida Provisória N° 1.045/2021.
104
Figura 22. Contribuição para a variação da média móvel 12 meses do total de ocupados
por posição na ocupação e formalização (2017-2021)
Para explicar esse fenômeno temos algumas hipóteses: a) o autoemprego é sempre uma
saída possível para a desocupação e momentos de incerteza; b) busca do aprofundamento do
uso do MEI como vínculo flexível pelas empresas durante a pandemia, isto englobaria as duas
formas de pejotização (segundo nossa definição), aquela mais geral de outsourcing e aquela
mais restrita e nociva, por ser ilegal, de ocultamento de vínculo de emprego57 (discutidos mais
profundamente na seção 1.3); c) o auxílio emergencial era garantido para MEIs, e muito embora
fosse preciso estar registrado antes da pandemia iniciar, é possível que parte tenha procurado
o registro tendo isso em mente. Imagina-se que o crescimento observado deste grupo possa
ter características distintas do crescimento dos anos anteriores. Algumas ocupações e setores
sofreram muito com a pandemia, enquanto outros (entregas, trabalho remoto) cresceram com a
crise sanitária. O número total de registros continuou a crescer, o estoque passou de 9,4 milhões
57
Esta engloba aquela denominada de "processo de pejotização", conceito ainda mais estrito onde há a demissão
de um empregado e recontratação como pessoa física ocultando o vínculo.
105
em janeiro de 2020 para 11,3 em janeiro de 2021 e 13,3 milhões em janeiro de 202258 .
Como visto na ontologia do autoemprego apresentada no Capítulo 1 o autoemprego no geral
e o MEI em específico muitas vezes podem ser divididos entre aqueles que o são por necessidade
ou por oportunidade. A trajetória, portanto, é essencial para entender sua inscrição. Quais
as características do trabalhador que fez essa transição? Quais as características da ocupação
anterior do trabalhador que fez essa transição?
É possível fazer uma análise de trajetórias utilizando o Painel da PNADC Trimestral, cuja
metodologia acaba de ser apresentada na seção 3.1, e focar nas transições entre os diferentes
estados, sempre comparando como esta pessoa estava cinco trimestres depois da primeira ob-
servação. A Figura 23 mostra as principais posições da ocupação onde estavam aqueles que se
tornaram conta própria com contribuição à previdência59 . O maior grupo em todos os trimestres
é o dos conta próprias sem contribuição. Esta transição particular representa o objetivo primor-
dial da política do MEI, isto é, a formalização de um grupo de ocupados que já trabalhavam
como autoempregados, porém não formalizados.
Figura 23. Transições de diferentes grupos para conta própria com contribuição à previ-
dência (1T2012-4T2020)
Fonte: PNADC Trimestral - IBGE. Elaboração própria. Nota: SC = Sem Contribuição e CC = Com Contribuição
à previdência.
pria com contribuição que partem do conjunto de empregados (empregado privado, público,
doméstico). No entanto, recordando a pesquisa do Perfil do MEI de 2019, perguntados sobre
a ocupação anterior a se tornar MEI, 51% disseram que foram empregados com carteira, 21%
empreendedores informais, 12% empregadores informais, 5% donos de casa, 3% estudantes, 2%
empreendedores formais, e 2% desempregados (SEBRAE, 2019b, p.54). Resultado semelhante
encontramos na pesquisa própria apresentada no próximo capítulo (veja Figura 33), aproxima-
damente metade dos MEI tinham como ocupação anterior o assalariamento. Porém não parece
ser isso que vemos no gráfico acima, onde algo mais próximo de um quinto daqueles que fa-
zem transição para o conta própria com contribuição eram empregados cinco trimestres antes.
Este valor é ainda mais concentrado se olharmos para uma subseleção dos conta próprias cujas
ocupações estão dentro da lista do MEI (veja lista utilizada no Apêndice 3))
Figura 24. Transições de diferentes grupos para conta própria com contribuição à previ-
dência na lista de ocupações do MEI (1T2012-4T2020)
Fonte: PNADC Trimestral - IBGE. Elaboração própria. Nota: SC = Sem Contribuição e CC = Com Contribuição
à previdência.
Gostaríamos de observar as transições para o MEI, mas é preciso tentar deixar explícito
todas as mediações destes resultados. A PNADC coleta dados autodeclarados, há viés de não-
resposta (tratado acima), e estamos sempre comparando dois pontos no tempo, neste caso a
primeira e quinta visita. É possível que seja comum a seguinte trajetória de um empregado
que busca refúgio no autoemprego: primeiramente inicia a ocupação sem o registro e só em
um segundo momento faz realmente o registro. A depender do momento da entrevista este
trabalhador será contado como formalização, mas se perguntado diretamente dirá que a ocupação
anterior era de assalariado. Finalmente, a “limpeza” da base selecionando somente as ocupações
presentes na lista do MEI retira também a chance do grupo representado no gráfico acima ser um
107
empregado disfarçado (ou ter passado pelo processo de pejotização), pois como as ocupações
são autodeclaradas um pejotizado pode estar fora destes dados, pois se declara empregado. Isso
significa que, para boa parte dos trabalhadores em ocupações da lista do MEI, a política do
MEI parece estar funcionando de acordo com a sua intenção inicial, isto é, de formalização do
autoemprego informal.
Já a Figura 25, abaixo, acompanha número de transições de desocupados e desalentados
para conta própria com contribuição previdenciária (proxy para MEI). Por esta figura fica evi-
dente o aumento de transições por necessidade, saindo da desocupação e desalento para o conta
própria com contribuição depois do início da crise de 2015. Nota-se ainda uma queda impor-
tante destas mesmas transições durante os três últimos trimestres de 2020, marcados pelo início
dos efeitos da crise sanitária relativa à COVID-1960 .
Figura 25. Transições de desocupados e desalentados para conta própria com contribuição
previdenciária (1T2012-4T2020)
tido como tendo uma pequena participação proporcional no total de MEIs, um indicador de que
mesmo podendo contratar um funcionário quase nenhum MEI o faz (SEBRAE, 2019b, p.22).
Os motivos para este grupo ser pequeno são de especial interesse. Uma análise que coloca,
desde o ponto de partida, todo MEI como um empreendedor irá responder essa questão com
uma mistura das seguintes características: incentivos fiscais para continuar pequeno, natureza
da ocupação não permite crescimento, pouca vocação empreendedora, dificuldades relacionadas
aos negócios como financiamento, burocracia entre outros. No entanto, esses elementos devem
ser importantes somente para uma parte pequena do grupo. A maioria do grupo segue a lógica
da subsistência e para estes a questão da transição “para cima” simplesmente não se coloca.
Em suma, ambas as transições de formalização direta e aquela do assalariamento para o
conta própria com contribuição ficam evidentes nos dados de painel da PNADC. O momento
de crise econômica vê o aumento das transições que passam pela desocupação e mesmo a crise
sanitária não arrefeceu a tendência de aumento do grupo vinculado ao autoemprego do qual
o MEI faz parte. Por outro lado, para as ocupações da lista do MEI há maior prevalência de
transições do tipo de formalização, o que pode ser elencado como um resultado positivo da
política.
Repetidamente vimos que o grupo dos autoempregados é bastante heterogêneo e que den-
tro dele temos tanto trajetórias positivas quanto negativas. A grande divisão (que acolhe dentro
delas outras possíveis) entre transição voluntária ou por necessidade deve ser sentida diferen-
temente em termos monetários. O nível e dispersão de rendimentos do autoemprego são mais
comumente avaliados na literatura especializada (como também foi feito neste trabalho no Ca-
pítulo 4) em detrimento dos efeitos de uma transição para o autoemprego. Vejamos brevemente
alguns resultados presentes na literatura, e em seguida propomos nosso exercício, focado no
efeito de diferentes transições na renda do trabalho com base no painel da PNADC.
Stenard (2019) estudando trabalhadores bem qualificados dos Estados Unidos mostra que
as transições para o autoemprego tem efeito negativo na renda, e que esses resultados variam
dependendo da motivação para fazer a transição. Contrabalançando uma renda menor, os be-
nefícios não financeiros seriam a principal motivação para a transição. Já Cribb e Xu (2020)
analisam um painel de dados para Grã-Bretanha e observam que as transições do assalariamento
para o conta própria levam a queda de renda média, mesmo para aqueles que fizeram a transi-
ção sem passar pela desocupação, isto é, aqueles que têm maiores chances de terem feito tal
transição voluntariamente. Por outro lado, estes mesmos trabalhadores têm uma série de indica-
dores de bem-estar melhorados com a transição. Como Stenard (2019), estes autores relacionam
estes resultados conjugados com a hipótese de que para estes trabalhadores há benefícios não
monetários para a transição que compensam a queda na renda.
109
Há ainda estudos que analisam os efeitos nos rendimentos de trajetórias laborais que passam
do assalariamento para o autoemprego e de volta para o assalariamento. Kolvereid e Hanssen
(2021, p.5-6) ao fazer uma revisão destes estudos indicam que os resultados variam devido aos
métodos utilizados e países analisados, mas que, na sua maioria, os efeitos encontrados são
negativos. Isto é, a renda é penalizada ao retornar ao assalariamento depois de transitar para o
autoemprego.
Seriam estes resultados comparáveis com o caso do MEI no Brasil? Não parece ser tão
fácil essa ligação direta primeiramente pelas características especificas da economia e mercado
de trabalho brasileiro, e em segundo lugar pelas vicissitudes do desenho institucional do MEI
que exclui de sua lista justamente os profissionais liberais, e que é voltado para uma faixa de
renda relativamente não muito alta.
Para as rendas das pessoas que transitam para o autoemprego, é de se esperar uma dispersão
de resultados: aqueles que transitam para o autoemprego e passam a ter maiores rendimentos,
e aqueles que transitam para o autoemprego e passam a ter menores rendimentos. A motivação
para a transição (se por oportunidade ou necessidade), bem como o momento conjuntural da
atividade econômica, devem ser fatores centrais para ajudar a compreender os efeitos médios
destas transições. O período de comparação também pode fazer diferença, é possível que a
atividade por conta própria possa demorar um pouco mais para retomar o rendimento (hipótese
de “curva em jota” de rendimentos).
Nesta seção pretendemos acompanhar as variações de renda quando há transição para a
proxy do MEI usando a base da PNADC onde identificamos o mesmo indivíduo em dois mo-
mentos. Focaremos em duas transições de interesse. A primeira transição será entre o conta
própria sem contribuição dentro da lista do MEI para o conta própria com contribuição dentro
da lista do MEI. A segunda se dá entre assalariados do setor privado com contribuição e dentro
da lista de ocupações do MEI para o conta própria com contribuição dentro da lista do MEI. Es-
tas duas transições buscam a identificação de trajetórias de formalização e de pejotização (tanto
geral quanto restrita) no painel da PNADC.
Um problema metodológico adicional que se coloca ao comparar a renda de um conta pró-
pria com a de um empregado está na composição do primeiro. Se há a figura do autoemprego
dependente, e mais especialmente a pejotização e o emprego disfarçado, o grupo dos conta pró-
prias estaria incluindo parte dos empregados dentro dele, dificultando a comparação correta?
O efeito total dependerá de quão pervasiva é esta prática e como se auto-declaram os trabalha-
dores na pesquisa amostral. Como não há maneira de separar nos dados da PNADC os dois
grupos só podemos pensar em indicadores externos para tanto. O Capítulo 4 trará elementos
para tentar precisar o tamanho deste fenômeno. Aqui vale somente ressaltar que a comparação
parece se manter possível mesmo com esta problemática por dois motivos, primeiro pois parte
daqueles que são empregados disfarçados deve se autodeclarar empregado para a PNADC e em
segundo lugar pois se este grupo “contamina” a amostra ele o faz aproximando as estatísticas
110
Fonte: PNADC Trimestral - IBGE. Elaboração própria. Nota: Lista de ocupações do MEI na PNADC de acordo
com Apêndice 3. Nota: Valores deflacionados para valores médios do ano de 2019.
Se empilharmos a base para observar a distribuição das diferenças de renda (log desta) de
todas as transições entre primeira e quinta visita, como na Figura 27 vemos que as diferenças
entre as distribuições são relativamente pequenas, e refletindo o gráfico anterior vemos uma leve
diferença em favor do grupo “tratado” (maior rendimento para aqueles que se formalizaram).
111
Figura 27. Distribuição do log da diferença da renda real do trabalho principal do conta
própria sem contribuição dentro da lista de ocupações do MEI que fizeram (tratado) ou
não (controle) transição para o conta própria com contribuição dentro da lista do MEI
entre a primeira e a quinta visita
Fonte: PNADC Trimestral - IBGE. Elaboração própria. Nota: Lista de ocupações do MEI na PNADC de acordo
com Apêndice 3. Nota: Valores deflacionados para valores médios do ano de 2019.
Os resultados para a segunda transição são um pouco mais ambíguos à primeira vista. Esta
transição, que podemos chamar de pejotização (principalmente no sentido amplo mas possivel-
mente também o sentido estrito), envolve a saida da ocupação como assalariado formal e entrada
na ocupação como conta própria com contribuição dentro da lista do MEI (ou seja, uma proxy
para o MEI). Os resultados, apresentados na Figura 28 mostram que antes da crise de 2015 este
tipo de transição era favorável ao trabalhador em termos de renda. Porém, ao longo da crise
iniciada em 2015 os resultados se invertem e, em média, aqueles que fizeram esta transição (tra-
tado) tiveram uma diferença negativa em termos de renda real se comparado com a média das
diferenças de renda real de quem não fez a transição (controle).
112
Figura 28. Evolução da diferença da renda real do trabalho principal dos assalariados
formais dentro da lista de ocupações do MEI que fizeram (tratado) ou não (controle) tran-
sição para o conta própria com contribuição dentro da lista do MEI entre a primeira e a
quinta visita
Fonte: PNADC Trimestral - IBGE. Elaboração própria. Nota: Lista de ocupações do MEI na PNADC de acordo
com Apêndice 3. Nota: Valores deflacionados para valores médios do ano de 2019.
Ao empilharmos a base (na Figura 29 abaixo), levando em conta dois momentos antes e
depois de 2015, o resultado fica evidente. A cauda positiva da distribuição dos resultados para o
grupo que fez transições (tratado) está acima da cauda positiva da distribuição dos resultados de
quem não fez (controle). Nota-se ainda que como estão muito mais dispersas as diferenças de
renda daqueles que fizeram a transição em comparação com quem não fez. Em outras palavras,
quem fez transição do tipo pejotização, mesmo em tempos de aquecimento do mercado de tra-
balho (antes de 2015), tem diferencial de renda muito mais variado, mais resultados negativos e
mais resultados positivos.
113
Figura 29. Distribuição do log da diferença da renda real do trabalho principal dos assala-
riados formais dentro da lista de ocupações do MEI que fizeram (tratado) ou não (controle)
transição para o conta própria com contribuição dentro da lista do MEI entre a primeira
e a quinta visita
Fonte: PNADC Trimestral - IBGE. Elaboração própria. Nota: Lista de ocupações do MEI na PNADC de acordo
com Apêndice 3. Nota: Valores deflacionados para valores médios do ano de 2019.
Nota-se que estamos comparando aqui os grupos empiricamente identificados, mas isso
não significa que os grupos são iguais. Tomemos o exemplo acima analisado: a comparação de
transições do tipo formalização. Aqui os dois grupos são semelhantes, conta própria sem con-
tribuição dentro da lista do MEI, um deles é “tratado”, ou seja transita para o conta própria com
contribuição, outro não. Porém, apesar de semelhantes, os grupos não são iguais no sentido de
que provavelmente há características não controladas que fazem aumentar a chance de transição.
Portanto, não podemos dizer que identificamos o efeito causal na renda de transitar para o MEI.
Uma das discussões mais importante para identificar causalidade é a busca por fazer compa-
rações corretas. Na falta de um experimento com dois grupos aleatoriamente escolhidos, um
que recebe um tratamento e outro que não, os estudos de causalidade desenvolvem uma série de
ferramentas para tentar nos aproximar destes grupos comparáveis. A PNADC será aqui tomada
como um quase-experimento e selecionaremos para acompanhar cada um dos grupos analisa-
dos dois outros semelhantes que servirão de como grupo de controle para as comparações. Com
114
isso podemos aplicar diferença das diferenças e assim chegar no efeito médio do tratamento nos
tratados (ATT).
Para construir estes grupos comparáveis utilizamos a ponderação pelo inverso da propensão
de ser tratada. Esta propensão é encontrada ajustando o seguinte modelo com o pacote twang
(GRIFFIN et al., 2021).
Onde:
P = Probabilidade de ser “tratado”, no caso fazer a transição;
UF = Unidade da Federação;
Tri = Trimestre;
N_pesDom = Número de pessoas no domicílio;
Idade = Idade;
Instrucao = Nível de instrução da pessoa;
Cor = Cor/raça da pessoa;
HorasHabTrabPrincipal = Horas habitualmente trabalhadas no trabalho principal;
RendaHabTodosTrabalhos = Rendimento habitual todos os trabalhos.
A aplicação desta ponderação acima especificada permite que se construam grupos me-
lhor comparáveis, e assim o método de diferença em diferenças aplicado para dois grupos em
dois momentos (grupo de controle e grupo tratado antes e depois do tratamento) nos permitirá
calcular o efeito médio de tratamento.
Os resultados indicam que a formalização (conta própria sem contribuição dentro da lista
do MEI para o conta própria com contribuição dentro da lista do MEI) tem um efeito positivo
na renda de R$104,70 (valores reais, deflacionados para preços médios de 2019) em média.
A transição entre assalariado formal do setor privado dentro da lista do MEI para o conta
própria com contribuição dentro da lista do MEI tem um efeito médio de aumento de renda real
de R$9,04 reais de 2019. No entanto, se replicarmos este mesmo exercício de diferença em
diferença para dois períodos distintos identificando a crise do mercado de trabalho a partir de
2015 (antes de 2015 e após 2015) vemos que antes da crise a transição tinha um efeito médio
na renda muito maior (R$241,66 reais a mais, em média), no entanto, no segundo período esse
efeito se torna negativo (menos R$80,60 em média). Este resultado está em acordo com a ideia de
115
Na seção 1.2.2 discutimos alguns motivos advindos da forma como o autoemprego é exer-
cido que levam à hipótese de que os rendimentos sejam mais voláteis para estes do que para em-
pregados, são eles: a) o autoemprego assume (voluntariamente ou não) o risco econômico das
flutuações na demanda por seus produtos; b) arranjos de recebimento concentrados na entrega
para produtos ou serviços que demoram mais de um mês para serem executados; c) existência,
pelo menos no papel, de fronteira mínima para rendimentos dos assalariados formais (o salário
mínimo) enquanto a renda do autoemprego pode estar em toda a faixa de possibilidades a partir
do zero; d) arranjos de trabalho como autoemprego somente como complementação da renda e
eventual.
Nota-se que na discussão sobre pejotização a flexibilidade de rendimentos é justamente um
dos fatores atrativos para as empresas contratantes. Elas podem, com isso, transferir justamente
os riscos capitalistas para outras entidades econômicas no caso do outsourcing, ou diretamente
para os trabalhadores no caso do emprego disfarçado, em ambos os casos buscando diminuir
seus custos.
A proposta desta seção é verificar a dispersão de rendimentos para uma mesma pessoa ao
longo dos cinco trimestres que esta é entrevistada na PNADC. Aqui iremos focar, portanto, na
dispersão de rendimentos para cada ocupação, em oposição à distribuição dos rendimentos entre
os diferentes ocupados (entre os autoempregados e/ou entre os empregados).
Promomos aqui um indicador de volatilidade de rendimento, construído com a seguinte
fórmula:
recebe toda sua renda em um trimestre dos cinco possíveis (por exemplo: 0, 0, 0, 0, 5, resultando
em média 1), a soma do módulo das diferenças para a média será oito ( 1, 1, 1, 1, 4 = 8) e,
P
portanto o indicador resultará no valor um (β = 1). Se, por outro lado, a renda for exatamente
igual em todos os trimestres, teremos zero de desvio ante a média a cada trimestre, e portanto,
o indicador será zero (β = 0). Assim o indicador vai de zero (renda perfeitamente distribuída
entre os trimestres) a um (renda perfeitamente concentrada em um dos cinco trimestres).
Na Figura 30 a menor concentração de valores perto dos números baixos da distribuição
significa maior presença de volatilidade de renda. Na Figura 30 mostramos dois exercícios. O
primeiro, à esquerda, compara as distribuições do indicador de volatilidade de rendimento entre
os trabalhadores que estão em uma dada posição da ocupação (empregado do setor privado com
contribuição dentro da lista do MEI; conta própria com contribuição dentro da lista do MEI e
conta própria sem contribuição dentro da lista do MEI) no primeiro trimestre de cinco trimestres
acompanhados. O segundo exercício, à direita, mostra resultados semelhantes ao primeiro com a
diferença que, desta feita, os grupos se referem somente àqueles que estavam na mesma posição
de ocupação no primeiro e no quinto trimestre da análise. Em ambos os casos o que se nota é que
os conta próprias com contribuição têm maior volatilidade de renda do que os empregados com
contribuição e que aqueles conta próprias com contribuição têm menor volatilidade do que os
conta próprias sem contribuição61 . Assim mostramos empiricamente que, como esperado pela
discussão teórica, os autoempregados têm maior volatilidade de renda entre os trimestres.
61
Os picos nos dados refletem casos onde temos um trimestre de cinco sem renda (β = 0, 25), ou dois de cinco
(β = 0.5) e assim por diante.
117
Fonte: PNADC Trimestral - IBGE. Elaboração própria. Nota: Lista do MEI compreende ocupações de acordo
com Apêndice 3. Nota: as linhas pontilhadas verticais indicam a mediana de cada distribuição.
Este resultado está associado à maior chance de transições entre diferentes posições na ocu-
pação, como visto na seção 3.2.1 acima. Se há maior rotatividade para os autoempregados então
é esperado que sua renda varie mais. Mas a volatilidade se mantém maior mesmo se acompa-
nhamos somente as pessoas que se mantêm na mesma posição da ocupação ao longo de cinco
trimestres (gráficos à direita). Este segundo efeito identificado pode ser explicado pelo risco
capitalista assumido pelos autoempregados, voluntariamente ou não, para dar conta das flutua-
ções de mercado. De todo modo, os resultados apontam o que se esperava teoricamente, uma
maior volatilidade de renda no autoemprego se comparado com emprego, e que autoemprego
sem contribuição tem ainda mais volatilidade do que o com contribuição (proxy do MEI).
118
método explicitado no início do Capítulo 3, pois o modelo utiliza as variáveis idade, educação,
condição de ocupação, etc., porém o modelo não utiliza uma variável direta de renda. Assim,
a sugestão acatada nesta seção é adicionar ao modelo anterior uma variável que identifica no
primeiro trimestre a posição nos décimos da renda domiciliar per capita62 .
O exercício exposto abaixo compara grupos de trabalhadores por posição na ocupação (as-
salariado, conta própria) a sua chance de fazer transição para a aposentadoria dada sua idade.
Figura 31. Probabilidade de fazer transição para a aposentadoria entre dois grupos de
ocupados no trimestre inicial
O gráfico acima mostra que são muito parecidos na chance de aposentar os ocupados como
assalariados e como conta própria. Se há alguma diferença os conta próprias tem um pouco
menos chance, dada uma idade, do que os assalariados de se aposentar. A aposentadoria é um
evento cheio de nuances baseadas na legislação e na realidade econômica que estes dados não
captam muito bem. Por exemplo, qual o efeito do Benefício de Prestação Continuada para a
chance de aposentadoria para os de menor rendimento? Nossa análise dos dados mostra que
quanto mais bem posicionado na distribuição de renda maior a chance de continuar no mercado
de trabalho. Isso pode refletir a expulsão de parte dos trabalhadores, especialmente dos menos
qualificados, do mercado de trabalho com o avançar da idade.
62
Na análise que segue apresentaremos os resultados utilizando este método de ajuste para não-resposta que leva
em conta a renda, porém nota-se que os resultados diferem muito pouco do ajuste inicial sem a variável de renda.
120
Novamente nota-se que este exercício compara os diferentes grupos tal como eles se en-
contram, e nota-se, eles são diferentes entre si na sua composição. Por exemplo, o grupo dos
assalariados formais tem maior média educacional do que os conta próprias com contribuição.
Desse modo, o exercício mostra as diferentes curvas de chance de aposentar considerando todas
as características distintas de cada grupo, sem isolar somente a posição na ocupação.
Na Figura 32, abaixo, vemos dois grupos bem distintos de distribuições de renda na apo-
sentadoria. O primeiro grupo compreende aqueles que se aposentam, na sua maioria, com uma
renda entre mil e dois mil reais (de 2019), empregados do setor privado e empregadores dentro
da lista do MEI. O segundo grupo são aqueles que se aposentam com valores altamente concen-
trados ao redor do mínimo benefício, um salário mínimo, caso dos conta própria, trabalhadores
domésticos e trabalhadores auxiliares, todos dentro da lista do MEI. Reforça-se que neste gráfico
temos dados somente daqueles que conseguiram se aposentar (ou mais precisamente aqueles que
transitaram para a renda da aposentadoria entre a 1ª e a 5ª visita). A mediana da nova renda de
aposentadoria de todos os grupos de posição na ocupação são semelhantemente baixas, o que
chama a atenção é a relativa concentração dos valores para os conta própria, trabalhadores auxi-
liares e trabalhadores domésticos, indicando que se estes conseguem se aposentar o fazem muito
mais concentradamente ao redor do benefício mínimo, tal como era esperado pela literatura e
pela forma como é organizada a seguridade social brasileira.
Figura 32. Rendimento de aposentadoria para novos aposentados por posição na ocupação
entre ocupações dentro da lista do MEI
Fonte: PNADC Anual - IBGE. Elaboração própria. Nota: Dados empilhados de 2015 até 2019. Valores deflacio-
nados para valores médios do ano de 2019. Lista do MEI de acordo com Apêndice 3
121
Neste capítulo exploramos o painel da PNADC para identificar as transições para o MEI e
suas consequências em termos de renda do trabalho, seu patamar e sua volatilidade e em termos
de renda na aposentadoria. As evidências analisadas sugerem que o autoemprego tem renda
menor e mais volátil e menores chances de se aposentar dada uma idade e quando conseguem se
aposentar o benefício é relativamente menor. As transições do tipo formalização são positivas
em termos de renda, porém as transições para o autoemprego advindas do emprego formal tem
efeito negativo na renda a partir do momento em que o mercado de trabalho sentiu os efeitos da
crise de 2015.
Os elementos acima analisados trazem novas indicações da forma como se inserem os
autoempregados, e em particular os MEI, no mercado de trabalho brasileiro. Mas ainda que
as análises de trajetória, que acompanham uma mesma pessoa ao longo de alguns trimestres,
possam trazer um novo prisma para as análises do grupo em questão, as limitações dos dados
e da metodologia são grandes. Assim, no próximo capítulo buscaremos sanar mais algumas
lacunas do entendimento sobre o grupo por meio de pesquisa própria, feita diretamente com
uma amostra dos MEI.
122
No Capítulo 2 fizemos uma análise dos conta próprias por meio de pesquisas domiciliares e
de registros administrativos do microempreendedor individual. Estas análises serviram para dar
uma dimensão de longo prazo sobre as características do grupo e sua composição. Mas vimos
também que estes exercícios, pelas limitações nos dados63 , não podem nos ajudar em uma série
de questões importantes sobre a ocupação do autoempregado como MEI. Parte delas é impossí-
vel de ser respondida com estática comparada, e no Capítulo 3 nos apoiamos em uma estratégia
de identificação do mesmo indivíduo ao longo de múltiplas entrevistas da PNADC para nos
aprofundarmos em quatro questões sobre as transições envolvendo os MEI (ou sua proxy). Mas
mesmo isso nem de longe esgota todas as problemáticas sobre o MEI no âmbito do mundo dos
trabalhos. No presente capítulo descrevemos os resultados de um survey que aplicamos aos mi-
croempreendedores individuais elencando duas temáticas como fios condutores da escrita. A
primeira, à qual seção 4.1 é dedicada, trata dos elementos relacionados à qualidade da ocupação
como MEI. A segunda temática, na seção 4.2, trata do autoemprego dependente e suas diferentes
manifestações (dependência econômica, subordinação, pejotização). Como discutido no Capí-
tulo 1 estes elementos supostamente são a base da diferenciação entre autoemprego e emprego,
porém cada um deles pode se apresentar de diferentes formas. O questionário feito diretamente
com os trabalhadores via MEI permite responder questões que ficaram em aberto sem perder a
complexidade das múltiplas manifestações do autoemprego.
Criamos um questionário eletrônico com 41 perguntas (veja o questionário completo no
Apêndice 4) que versam sobre a maioria dos temas de interesse para este trabalho, em especial
sobre a natureza e qualidade da ocupação do autoemprego como MEI. Fizemos uma amostra
probabilística simples dos inscritos no MEI dentro de duas janelas de tempo, isto é, foram con-
vidados a responder o questionário aleatoriamente pessoas inscritas como MEI na base de regis-
tros de CNPJ da Receita Federal (CNE) entre novembro e dezembro de 2020. Em novembro de
2021 enviamos convites para inscritos em novembro de 2020 e em dezembro de 2021 enviamos
convites para inscritos em dezembro de 2020. Isto foi feito para assegurar que os respondentes
tivessem 12 meses de inscrição, o que permite questões sobre o período de um ano de registro
consistentemente. Reforça-se que o questionário foi respondido sempre de forma anônima, mas
que, no entanto, o questionário eletrônico exigiu login na ferramenta (Google Foms) de modo a
não permitir múltiplas respostas de uma mesma pessoa. Para todas as perguntas, exceto aquelas
cujas respostas são ordinais (ex. “Qual sua idade?”), as possibilidade de resposta foram em-
baralhadas de forma aleatória para cada respondente. Isto é feito em consonância com as boas
63
A PNAD de 2014 incluiu a pergunta que identificava o MEI no seu questionário auxiliar, depois deste ano
nunca mais o fez. Com o aumento do número de MEIs no país e, consequentemente, de sua importância para o
entendimento do mercado de trabalho atual, seria muito interessante que esta pergunta voltasse ao questionário.
123
online.
Olhando para a distribuição da escolaridade dos MEI que responderam o questionário po-
demos agrupar em grupos de escolaridade compatíveis com os resultados apresentados pela
pesquisa de Perfil do MEI (SEBRAE, 2019a, p.43). No entanto, vemos que os resultados estão
em desacordo entre si, a principal diferença sendo no total de MEIs com pós-graduação - 4% na-
quela pesquisa, e 17,4% na presente pesquisa. Parte da explicação está na evolução em direção
à maior escolaridade entre todos os trabalhadores brasileiros e inclusos os MEI66 . Outra parte
da explicação provavelmente é o viés causado pela maior propensão de resposta entre aqueles
com maior facilidade de manipulação de ferramentas digitais, como discutido anteriormente.
Figura 33. Formação escolar dos entrevistados (P3)
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita neste capítulo. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
Podemos pensar em mitigar esta indicação de viés em direção à maior escolaridade e me-
nor idade na presente pesquisa por meio de calibração de novos pesos. O Apêndice 6 traz todos
os resultados para todas as perguntas com ponderação calibrada para idade e nível educacional,
porém os resultados pouco diferem daquele sem esta ponderação (não diferem mais do que o in-
tervalo de confiança da primeira). Deste modo, por simplicidade, escolhemos manter a amostra
inicial sem ponderação no corpo do texto e nos gráficos que se seguem.
telefone o que deu maior relevância ainda para estas diferenças metodológicas e seus possíveis vieses.
66
Veja Figura 5 do Apêndice 1, o que também é verificado pelos resultados ao longo do tempo no Perfil do MEI
(SEBRAE, 2019a, p.44)
125
São múltiplas dimensões da qualidade (ou, por oposição, precariedade) da ocupação como
MEI. Um trabalho digno envolve um rendimento suficiente para dar condições materiais de vida
para o trabalhador e sua família, saúde no trabalho, segurança no trabalho, uma jornada que não
seja exaustiva, direitos e proteção social para os momentos que o trabalhador, por qualquer mo-
tivo, deixar a condição de ocupado (entrando na desocupação ou na aposentadoria), entre outros
elementos. Há ainda a satisfação pessoal com a própria ocupação, o senso de autorrealização e
decisão livre (para quem pode) de carreira.
Perguntados sobre os motivos para se tornarem empreendedores as duas respostas mais co-
muns foram “Precisava de uma fonte de renda” e “Queria ser independente”. Ora esses são duas
respostas representando dois lados da dicotomia simplificadora que recorrentemente chamamos
de autoemprego por necessidade versus autoemprego por oportunidade. De fato se agruparmos
todas as respostas nestas duas categorias67 o resultado agregado indica que, entre os entrevis-
tados, 41,8% disseram ter se tornado empreendedores por motivos que podemos agrupar em
“oportunidade”, enquanto 46,9% por “necessidade”.
Figura 34. Motivos para se tornar um empreendedor (P10)
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita neste capítulo. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
No Capítulo 3 analisamos transições para uma proxy do MEI na PNADC. Uma pergunta
relativa às transições foi feita também no questionário aqui analisado. Se consideramos um pro-
cesso de formalização uma transição da ocupação como conta própria sem CNPJ para o MEI,
67
Oportunidade neste caso é a soma das seguintes respostas: a) "Queria ser independente"; b) "Queria pra-
ticar seus conhecimentos profissionais"e c) "Tinha o dinheiro para começar um negócio e encontrou oportuni-
dade". Necessidade, por sua vez, é a soma de a) "Não conseguiu um emprego com um salário bom"; b) "Indica-
ção/Recomendação do meu empregador"; c) "Precisava de uma fonte de renda"e d) "Não conseguiu um emprego
na área em que queria trabalhar".
126
entre os respondentes somente 11,6% disseram ter como ocupação anterior um conta própria in-
formal. Por outro lado, a categoria com maior número de MEIs foi “Empregado(a) com carteira”
com 41,5%68 . Nota-se ainda que aproximadamente 10% dos MEIs entrevistados disseram ter
vindo do desemprego, neste caso, indicando mais claramente o autoemprego por necessidade69 .
Figura 35. Principal ocupação antes do entrevistado se registrar como MEI (P11)
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita neste capítulo. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
Figura 36. Satisfação do entrevistado com a ocupação atual comparada com a anterior
(P13)
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita neste capítulo. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
O questionário faz então uma pergunta direta sobre a vontade de trocar a atual ocupação
como MEI pela de empregado: “Se surgisse a oportunidade de uma vaga de emprego com car-
teira assinada para ganhar o mesmo aceitaria?”. Infelizmente não temos parâmetro de compa-
ração semelhante para empregados com carteira, se estes gostariam de trocar sua posição para
o autoemprego, mas a pergunta é um indicador de satisfação direta com a atual posição. O re-
sultado é bastante revelador, 43,8% dos MEI entrevistados gostaria de fazer a transição para o
emprego formal. São números comparáveis aos resultados obtidos acima (Figura 32) que men-
suram autoemprego por necessidade e autoemprego por oportunidade.
Figura 37. Proporção dos entrevistados com vontade em migrar para emprego formal
(P31)
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita neste capítulo. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
Analisando os motivos para afirmar que aceitariam trocar o autoemprego pelo emprego
com carteira assinada, a “Segurança do salário” aparece em primeiro lugar, seguido de “Pro-
gredir na carreira” e “Melhores condições de aposentadoria”. Aqui retonram à superfície os
temas tratados nos capítulos anteriores de risco, volatilidade de renda e renda na aposentadoria.
128
Figura 38. Motivos para aceitar migrar de MEI para emprego formal entre os entrevista-
dos (P32)
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita neste capítulo. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
Os dois próximos gráficos tentam abarcar duas esferas da qualidade da ocupação que só
podem ser analisadas ao longo de um período completo, a saber, a frequência e/ou volatilidade
de renda e frequência e/ou volatilidade das contribuições à previdência. As duas perguntas es-
tão intimamente ligadas na medida em que é provável que um MEI pague a sua contribuição à
previdência (por meio do DAS) somente naqueles meses quando tem rendimento. Como anali-
sado na seção 3.2.3 a volatilidade de rendimentos ao longo de um período faz parte da natureza
da ocupação de algumas profissões em autoemprego. Um padeiro espera vender diariamente e,
portanto, ter um fluxo de rendas relativamente constante, já um pedreiro (dependendo da forma
de contrato) pode receber somente no final de uma obra. Para ambos ainda, autoempregados
independentes, que assumem o risco capitalista, pode ocorrer que em um mês vendam mais e
em outro menos (ou nada), em contraste com um empregado cujo salário, em tese, não depende
dos resultados da atividade70 . Entre os respondentes 40,5% afirmaram ter tido renda em todos os
meses do último ano e 60,2% disseram ter tido 7 ou mais meses de renda. Já com relação ao pa-
gamento da contribuição previdenciária 50,6% disseram terem contribuído 12 meses, enquanto
69,7% disseram ter tido 7 ou mais meses de contribuição.
Mesmo sendo um valor baixo para os padrões de contribuição previdenciária no Brasil (5%
de um salário mínimo) ainda assim temos uma porção grande, aproximadamente um terço71 ,
70
Veremos na próxima seção que se parte dos MEI entrevistados são pejotizados, estes têm, por definição, carac-
terísticas de um empregado, e portanto, espera-se que tenham maior número de meses de renda e de contribuição.
71
Na seção 1.3.2. vimos que a inadimplência calculada pela Receita Federal é de aproximadamente 50%. A
diferença entre estes valores se dá pois a Receita usa como base todos os inscritos e, como não há custos relevantes
em manter aberto o CNPJ do MEI, há muitos MEIs inativos naquela base.
129
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita neste capítulo. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
Figura 40. Assiduidade de contribuição à previdência na ocupação via MEI (meses com
contribuição nos últimos 12 meses) (P16)
130
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita neste capítulo. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
O rendimento dos MEI foi investigado com duas perguntas “Qual é a renda mensal da
atividade como MEI (em média, habitualmente)?” e “Somando todas as rendas de todas as
pessoas que moram na sua casa, o(a) Sr.(a) diria que a sua renda familiar mensal habitual,
incluindo salários, ’bicos’, aposentadorias etc. é de quanto, aproximadamente?”.
Um total de 56,85% dos MEI declararam que mais da metade da renda familiar advinha da
atividade como MEI, enquanto 22,58% deles declararam que a renda do MEI era a única fonte
de renda familiar. Na pesquisa Perfil do MEI de 2019 28% dos entrevistados disseram que a
atividade como MEI era a única renda da família (SEBRAE, 2019a, p.7).
Figura 41. Renda mensal da atividade como MEI (em média, habitualmente) (P18)
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita neste capítulo. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
O rendimento mediano da ocupação como MEI dos entrevistados está na faixa de R$1.500
a R$2.000. A distribuição dos resultados apresenta uma certa polarização, com um primeiro
grupo nas rendas em torno da mediana e outro grupo mais acima, perto do limite de faturamento
do MEI72 (mensalizado). A renda média da ocupação como MEI segundo a pesquisa do Perfil
do MEI de 2019 era de R$1.375,00 (SEBRAE, 2019b, p.15).
O autoemprego pode ter características de segunda fonte de renda, o chamado “autoem-
prego híbrido”. A pergunta sobre outras rendas visou justamente mensurar este fenômeno
(“O(A) Sr.(a) tem outra fonte de renda, além da sua atividade como MEI/ Microempreende-
dor/ Empreendedor?”). Nota-se que ter emprego (formal e informal) são as segundas fontes de
renda com maior número de respostas. Esta pergunta também permite identificar aqueles que
têm na ocupação como MEI sua única fonte de renda pessoal, o que ocorre para praticamente
metade dos entrevistados (“Não possuo nenhuma outra fonte de renda”).
72
O mesmo se verifica nas rendas familiares, como visto na Figura A5.8.
131
Figura 42. Existência de outras fontes de renda que não a da atividade como MEI (P20)
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita neste capítulo. Nota: Intervalo de confiança a 95%. Nota:
Esta pergunta permitia múltiplas respostas, portanto a soma destas é maior que o total de entrevistados ativos.
Com relação à jornada duas questões foram feitas. A primeira, quantitativa, busca mensurar
o número de horas habitualmente trabalhadas por semana (“Em uma semana normal quantas
horas trabalha com o MEI?”). A segunda questão, subjetiva, pergunta para o entrevistado sobre
a própria satisfação em relação ao número de horas trabalhadas (“Em relação a jornada (horas
trabalhadas na semana): Gostaria de trabalhar mais horas, menos horas ou está satisfeito.”).
Figura 43. Jornada semanal na atividade como MEI (horas de trabalho) (P22)
132
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita neste capítulo. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita neste capítulo. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
as flutuações nas vendas de produtos ou serviços”. Mais da metade dos entrevistados afirmou
não fazer tal reserva.
Figura 45. Faz reserva de recursos para as flutuações nas vendas de produtos ou serviço?
(P33)
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita neste capítulo. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
Outra pergunta direta foi feita “Se você ficasse doente por muito tempo e não pudesse mais
trabalhar, como você ficaria financeiramente?” que buscava qualificar quão central são as rendas
do trabalho como MEI para a segurança financeira familiar do autoempregado73 . Esta questão
e a anterior diferem um pouco. A anterior pode ser interpretada como focando na segurança
financeira do negócio (muito embora no caso de empresas unipessoais, como o MEI, o fluxo
financeiro da empresa ou da pessoa muitas vezes se confundem). A segunda pergunta foca na
insegurança caso deixasse a ocupação como MEI. Ademais, como vimos, quase um quarto dos
entrevistados tem como única fonte de renda de toda a sua família o trabalho como MEI.
Figura 46. Segurança de longo prazo na atividade como MEI (P37)
73
O tema do colção de renda familiar foi brevemente tratado na seção 2.1.2.2.
134
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita neste capítulo. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
Olhando para a segurança no longo prazo, o questionário pergunta também “Você tem pre-
vidência complementar?”. Como sabemos o MEI contribui relativamente pouco com a seguri-
dade social, mas tem como consequência um benefício fixo em um salário mínimo. Na parte
de cima da distribuição de rendimentos do MEI, para aqueles mais bem inseridos economica-
mente no autoemprego via MEI, há discrepância considerável entre contribuição e benefício.
Um empregado formal que ganhasse o teto do MEI (limite de faturamento mensalizado) pagaria
e receberia o teto do benefício do INSS. O mesmo não ocorre com os MEI cujo benefício está
limitado a um salário mínimo visto que a contribuição é fixa74 . Um trabalhador bem inserido no
mercado de trabalho pode ver seu rendimento percebido sofrer uma baixa abrupta no instante da
sua aposentadoria. Este processo pode forçar uma parte dos MEIs a buscarem na aposentado-
ria complementar a segurança financeira para o término da vida laboral (refletindo a discussão
crítica de privatização dos riscos sociais feita no início desse trabalho). Entre os MEIs entre-
vistados 14,9% disseram ter previdência complementar, o que pode ser considerado um número
alto para os padrões dos outros grupos de trabalhadores brasileiros.
Figura 47. Prevalência de previdência complementar na atividade como MEI (P34)
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita neste capítulo. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
Em resumo, nossa pesquisa mostrou estarem presentes entre os autoempregados via MEI
vários dos elementos de precariedade na ocupação. Mais de 40% trocaria o autoemprego pelo
assalariamento (Figura 37), dando destaque para os elementos que fazem desta posição na ocu-
pação, no Brasil, um porto seguro em termos de segurança de renda, melhores condições de
aposentadoria e melhores chances de uma carreira satisfatória (Figura 38). Como esperado, a
dispersão de horas trabalhadas é grande entre os MEI entrevistados, com aproximadamente um
quinto trabalhando mais de 50 horas por semana e aproximadamente um terço trabalhando me-
nos de 10 horas por semana (Figura 43). Com isso aproximadamente metade dos entrevistados
está insatisfeito com a jornada e gostaria de trabalhar menos ou mais horas (Figura 44). A mai-
oria dos autoempregados via MEI entrevistados tem renda média abaixo de 2500 reais (Figura
41), e em torno de 40% passou metade dos meses do ano, ou mais, sem ter renda (Figura 39)
ou sem contribuir com a previdência (Figura 40) criando dificuldades para o trabalhador cum-
prir com os requisitos para a aposentadoria. E se alcançado o benefício será, pelo desenho da
74
O trabalhador via MEI pode, no entanto, fazer contribuições voluntárias para o INSS.
135
política, baixo o que por sua vez força estes trabalhadores, quando podem, a contribuírem com
previdência complementar (Figura 47).
136
trabalho, 15,8% afirmam que recebem treinamento de algum de seus clientes para executar o
próprio trabalho, e 28,6% afirmam que trabalham junto de outros empregados do cliente.
Figura 48. Indicadores de dependência
A) Você define seus horários de trabalho? (P21)
C) Recebe treinamento de algum de seus cliente para executar o seu trabalho? (P28)
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita neste capítulo. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
São números bastante significativos para todos estes indicadores de dependência pessoal
ou subordinação. Aqui é importante levantar a discussão sobre o possível erro associado aos
138
indicadores aqui analisados. Essa discussão será retomada ao longo do restante do capítulo,
quanto necessária. Ainda que seja possivelmente tautológico, dizer que o objetivo de utilizar as
perguntas como indicadores de dependência é indicar dependência na relação, isso não significa
que na prática o indicador acertará em todos os casos. O MEI pode trabalhar no local definido
pelo contratante dos seus serviços sem que isso signifique dependência real. Pode ocorrer que a
atividade executada exija que assim seja.
Embora varie entre os países a flexibilidade da forma de remuneração de um empregado, no
Brasil ela está entre as características definidoras do emprego, a onerosidade mediante salário,
e tende a ser relativamente estável. O salário na maioria dos casos não depende diretamente
do resultado da atividade econômica, ou seja, deixa claro que o risco econômico da empreitada
capitalista não está a cargo do trabalhador. As flutuações de vendas, por exemplo, não devem
afetar o empregado, que mantém inalterado seu direito ao salário pelo trabalho executado76 . O
assalariado sempre mantém o risco de perder o emprego, mas tenta-se mitigar as consequências
de tal evento com proteções adicionais como seguro-desemprego e fundo de garantia. Um quarto
dos MEI ativos entrevistados (26%) aponta que recebem um valor acordado por semana ou mês
de trabalho, como mostra o gráfico abaixo.
Figura 49. Forma de recebimento na atividade como MEI (P19)
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita neste capítulo. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
A palavra “salário” não foi usada na questão, no entanto o fato de receber um pagamento
acordado por semana ou mês pode ser um indicador de dependência. Espera-se que o autoem-
pregado independente seja responsável ou tenha controle sobre o resultado de seu esforço de
trabalho (em produtos ou serviços). Espera-se que o autoempregado independente possa iden-
tificar o resultado desse esforço de trabalho, e com isso este produto ou serviço é passível de
76
É claro que sobre o salário base podem haver outros arranjos mais flexíveis de rendimento variável ou vincu-
lados à produtividade, mas este não é o caso mais comum.
139
ser vendido: um pão, uma parede pintada, um corte de cabelo, um estudo, uma revenda de pro-
duto alimentício, um jardim refeito, uma roupa costurada sob medida, uma bicicleta consertada,
uma instalação de máquinas, uma edição de vídeo. O artigo indeterminado “um” ou “uma” é
importante aqui. Tendo um produto/serviço identificável o autoempregado vai ao mercado e,
geralmente, espera receber por essa unidade identificável. Receber um valor acordado por se-
mana ou mês parece desvincular o trabalho do produto/serviço produzido. O recebimento deixa
de depender, como era esperado para um autoempregado independente, do resultado direto do
seu trabalho.
Outra questão interessante feita no questionário busca identificar diretamente o caso de
transição de empregado para MEI que continua vinculado de alguma forma com a antiga ocu-
pação (“Se na ocupação anterior o(a) Sr(a) respondeu ”empregado” (com ou sem carteira), na
atividade como MEI presta serviços para a mesma empresa onde já foi empregado(a)?”). No-
vamente aqui não há total certeza de que o se trabalhador manteve a mesma ocupação trata-se de
um processo de pejotização. Um total de 17,9% dos MEI ativos que anteriormente trabalhavam
como empregado (com e sem carteira) afirmam que prestam serviço para a mesma empresa na
qual anteriormente era empregado77 .
Figura 50. Proporção de entrevistados que prestam serviços para o antigo empregador
entre aqueles que foram empregados (P12)
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita neste capítulo. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
O resultado acima se junta a outro, visto no Figura 32, que nos diz que 9,1% dos MEI
entrevistados afirmaram como motivo principal para se inscrever como microempreendedor a
recomendação ou indicação do empregador. Novamente repetimos que este indicador enfatiza
o processo de pejotização, onde há transição direta de um empregado para o vínculo como pes-
soa jurídica na mesma empresa, mas ele não engloba todos os casos de pejotização (pois um
MEI pode estar na condição de emprego disfarçado sem nunca ter sido anteriormente empre-
gado daquela empresa). Por outro lado, é sempre possível construir um caso hipotético onde
o novo MEI de fato presta serviços legítimos para a antiga empresa que o contratava, isto é,
está corretamente definido como relação civil entre empresas independentes e não uma relação
77
Pergunta semelhante da pesquisa do Perfil do MEI de 2019 mostra resultado menor, 13% (SEBRAE, 2019a,
p.50).
140
trabalhista. Em pesquisas futuras seria interessante seguir esta questão, se afirmativamente res-
pondida, com mais uma, questionando se o trabalhador executa as mesmas tarefas que cumpria
como empregado.
A dependência econômica ocorre quando a entidade econômica (no nosso caso a microem-
presa individual) não tem autoridade ou capacidade de agir no mercado, ou mesmo de existir no
mercado sem estar associado diretamente a outra entidade econômica. Entre os indicadores da
dependência econômica podemos citar a incapacidade de definir os rumos do próprio negócio
(preço do próprio produto/serviço, contratação de funcionários, política de compras, política de
gastos da empresa etc), ou a vinculação umbilical com outra entidade econômica de tal maneira
que toda ou quase toda a produção/serviços desta são direcionados para somente esta segunda
entidade (ter somente um cliente, ter a renda totalmente concentrada em poucos clientes). Fi-
nalmente temos ainda o caso onde os insumos para a atividade advém de somente uma entidade
econômica, esse é o caso, por exemplo, da relação formada entre revendedores de produtos de
beleza de uma mesma marca (a empresa fornece os produtos prontos, seu preço, o investimento
em marketing etc.).
O número baixo de clientes ou a concentração muito grande dos rendimentos advindos
de poucos ou somente um cliente é um dos critérios usados em países que pretendem definir a
dependência econômica78 . Utilizando o fato de o questionário ter sido aplicado com MEIs com
12 meses de inscrição foi feita a pergunta Quantos clientes teve no último ano?. O resultado
desta pergunta mostra que 13,4% dos MEI ativos entrevistados afirmaram terem tido somente
um cliente nos doze meses anteriores à entrevista, que se somam aos 19,2% que tiverem somente
de dois a cinco clientes no ano.
Figura 51. Quantidade de clientes na atividade como MEI (P25)
78
Portugal e Itália, por exemplo, colocam entre os critérios para definir economicamente dependente o trabalha-
dor receber mais de 80% de sua renda de um único cliente (veja Capítulo 1.2).
141
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita neste capítulo. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
Vale mencionar que no Brasil é possível fazer análises de dependência econômica com da-
dos de notas fiscais da Receita Federal. O MEI não é obrigado a emitir notas fiscais para cada
venda79 , no entanto, se quem compra o serviço deste é uma empresa ela geralmente buscará esta
nota. Assim é possível construir uma rede de relações entre entidades econômicas e, selecio-
nando somente os MEI, calcular, por exemplo, a porcentagem destes que recebe somente de uma
empresa, ou que recebe valores muito semelhantes todos os meses.
Figura 52. Proporção de entrevistados que fornece serviços/produtos para um único cliente
(P24)
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita neste capítulo. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
Um número alto de MEIs ativos entrevistados, 30,3%, afirmaram prestarem serviços geral-
mente para somente um único cliente. Esta pergunta (“Em relação ao seu negócio, geralmente
fornece produtos/serviços para um único cliente ou empresa?”) complementa a anterior (que
afere de fato quantos clientes o MEI teve nos últimos 12 meses). Naquela era possível que por
qualquer razão as vendas do ano tenham se concentrado em somente um cliente, por outro lado,
na presente pergunta, busca-se aferir a percepção do trabalhador sobre o que geralmente ocorre
com suas vendas.
79
Não é obrigado a emitir nota à pessoa física, mas sim à pessoa jurídica.
142
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita neste capítulo. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
Receber matéria prima é também um elemento de dependência econômica, pois pode sig-
nificar que a unidade produtiva não detém controle total sobre a sua própria produção. Por outro
lado, receber equipamentos é geralmente um indicador de dependência pessoal, isto é, como
no caso do treinamento indica que o trabalhador está sob tutela da entidade econômica que o
143
contrata e não da própria. Entre os MEIs ativos entrevistados 28,4% afirmaram receber equipa-
mentos ou matéria prima do cliente para executar o próprio trabalho80 . Novamente aqui, como
no caso do treinamento, é possível que por motivos justos um MEI receba equipamento de um
contratante sem que isso seja motivo suficiente para apontar dependência total. Por exemplo, o
trabalhador recebe da contratada equipamentos de segurança pessoal, ou ainda, o cliente fornece
as tintas para um pintor executar seu trabalho. De todo modo o indicador continua sendo válido
para outros casos de dependência menos rígidos.
Figura 54. Proporção dos entrevistados que recebem matéria prima ou equipamentos do
cliente para executar o próprio trabalho (P27)
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita neste capítulo. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
Dado o foco no autoemprego dependente desta seção gostaríamos muito de poder identifi-
car nos dados da pesquisa aqueles que fazem parte do grupo totalmente dependente ou pejotizado
(como vimos a definição para declarar uma fronteira é variada) e poder esmiuçar as característi-
cas destes em relação aos outros grupos. Por exemplo, um autoempregado pejotizado tem maior
ou menor renda? Um pejotizado está mais ou menos satisfeito com sua ocupação? Quais são
os indicadores da qualidade desta ocupação em relação à sua contraparte verdadeiramente in-
dependente? Infelizmente, como mencionado brevemente na introdução deste capítulo, estes
cruzamentos fazem com que a amostra se torne pequena demais para dar suficiente segurança
para muitas das afirmações que gostaríamos de fazer. A decisão de fazer, no que se segue, tal
análise deve vir, portanto, acompanhada deste aviso: as análises a seguir têm caráter exploratório
e como possível direcionamento para pesquisas futuras.
Abaixo, na Figura 55, apresentamos uma análise que faz o cruzamento de indicadores de
dependência com a) outros indicadores de dependência, b) com indicadores de precariedade,
e c) com o rendimento reportado. Há muita informação nos painéis da Figura 55 que precisa
ser esmiuçada. Primeiramente uma breve descrição do seu formato permitirá evitar erros de
interpretação sobre seu conteúdo (pois ele pode ser confuso à primeira vista). Os painéis estão
organizados em conjuntos de três gráficos (linhas de gráficos). Cada linha representa compara-
ções entre respostas positivas e negativas à pergunta que pode indicar dependência expressa no
seu cabeçalho. Em seguida, cruzamos este indicador de dependência com outros indicadores
80
Pergunta: "Recebe equipamentos ou matéria prima do cliente para executar o trabalho?"
144
de dependência baseadas em outras perguntas (primeiro gráfico de cada painel), com indicado-
res de precariedade da ocupação (segundo gráfico de cada painel) e com a renda da ocupação
(terceiro gráfico de cada painel). Tanto os indicadores de dependência quanto os indicadores de
precariedade estão organizados de tal modo que maiores valores são sempre indicação de de-
pendência ou precariedade mais forte. Por exemplo, ante a pergunta “Você define seus horários
de trabalho?” (A5) contabilizamos a soma de respostas “Não” como indicador de dependên-
cia, enquanto que ante a pergunta “Trabalha junto com outros empregados do cliente?” (A8)
contabilizamos a soma de respostas “Sim” como indicador de dependência. As cores vermelho
e azul representam de que subgrupo aquela estatística se trata, baseado no indicador de depen-
dência inicial (cabeçalho de cada painel). Uma linha horizontal em roxo em cada gráfico indica
a média geral para cada pergunta. Novamente intervalos de confiança à 95% são calculados
não-parametricamente para todas as estatísticas pontuais.
Em segundo lugar é interessante uma análise do conjunto de cada um dos painéis, por
exemplo, tomemos o primeiro painel. A pergunta inicial que cria um indicador de dependência
é “Onde funciona o seu negócio (onde você trabalha)?”, em todos os gráficos deste painel em
vermelho estarão estatísticas do grupo que respondeu “Na empresa do cliente” (indicador de
dependência) e em azul estatísticas do grupo que respondeu “em outro lugar” (junção de todas
as outras possibilidades de resposta exceto “Não sabe”). No primeiro gráfico do primeiro painel
estamos comparando os outros indicadores de dependência para os dois grupos criados pela
pergunta inicial de dependência (“Onde funciona o seu negócio?”). Por exemplo, as duas barras
do primeiro painel, uma azul e outra vermelha, nos mostram que quase 50% dos que afirmaram
que o negócio funciona na empresa do cliente recebem treinamento do cliente, enquanto que
menos de 10% disseram receber treinamento do cliente entre aqueles cujo negócio funciona em
outro lugar que não a empresa do cliente.
Figura 55. Cruzamento dos indicadores de dependência com outras variáveis de depen-
dência e qualidade.
Indicadores de precariedade (coluna B)
B1: “Menos satisfeito” como resposta à pergunta “Está mais ou menos satisfeito com a ocupa-
ção como MEI do que com a ocupação anterior?” (P13)
B2: “Até 6 meses” como resposta à pergunta “Nos últimos 12 meses quantos meses pagou boleto
da previdência (DAS-MEI)?” * (P14)
B3: “Até 6 meses” como resposta à pergunta “Nos últimos 12 meses quantos meses teve rendi-
mento como MEI?” (P13)
B4: “Sim” como resposta à pergunta “Se surgisse a oportunidade de uma vaga de emprego com
carteira assinada para ganhar o mesmo aceitaria?” (P31)
B5: “Insatisfeito” como resposta à pergunta “Em relação a jornada (horas trabalhadas na
145
semana):”81 (P23)
B6: “Não” como resposta à pergunta “Você faz reserva de recursos para enfrentar as flutuações
nas vendas de produtos ou serviços?” (P33)
B7: “Inseguro” como resposta à pergunta “Se você ficasse doente por muito tempo e não pu-
desse mais trabalhar, como você ficaria financeiramente?” (P37)
B8: “Não” como resposta à pergunta “Você tem previdência complementar?” (P34)
Pergunta: “A01: Onde funciona o seu negócio (onde você trabalha)?” (P9)
Respostas: “Na empresa do cliente” ou “Em outro lugar”.
Pergunta: “A03: Recebe treinamento de algum de seus clientes para executar o seu trabalho?”
(P28)
Respostas: “Sim” ou “Não”.
81
Insatisfeito aqui é a soma de "Gostaria de trabalhar mais horas"com "Gostaria de trabalhar menos horas".
146
Pergunta: “A07: Recebe equipamentos ou matéria prima do cliente para executar o trabalho?”
(P27)
Respostas: “Sim” ou “Não”.
Pergunta: “A10: O cliente define qual deve ser o local do seu trabalho?” (P26)
Respostas: “Sim” ou “Não”.
149
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita neste capítulo. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
Podemos considerar uma primeira interpretação geral destes gráficos como correlações
entre as cada um dos indicadores de dependência com a) os outros indicadores de dependência
(primeiro gráfico de cada painel) e com b) os indicadores de precariedade (segundo gráfico de
cada painel). Neste sentido todos os indicadores de dependência apresentam forte correlação
com outros indicadores de dependência, como se vê pelas barras vermelhas sempre bastante
acima das azuis nos primeiros gráficos de todos os painéis. Os indicadores A1 e A2, local
de funcionamento do negócio e ter se tornado empreendedor por indicação/recomendação do
antigo empregador, respectivamente, se mostram os indicadores com mais forte associação com
os outros indicadores de dependência, fazendo destes dois indicadores bons candidatos sintéticos
para definir dependência total ou pejotização.
Parte substantiva dos autoempregados têm características de dependência. Quantos dentre
estes são autoempregados com características esparsas de dependência e quantos são empre-
gados disfarçados (pejotizados)? Vale lembrar que temos pelo menos três definições de pejo-
tização. Pejotização em sentido amplo que é o aumento agregado dos CNPJs e, portanto dos
contratos entre empresas, especialmente decorrente de um processo de outsourcing de ativida-
des que antes eram feitas dentro da empresa. Já a pejotização em sentido estrito seria aquela
que enquadra uma relação de emprego disfarçada, e, portanto, ilegal. Finalmente há autores
que definem pejotização somente para um subgrupo de casos de pejotização restrita onde há
uma transição, dentro da mesma empresa, de um empregado para pessoa jurídica, chamamos
estes casos de “processo de pejotização”. As discussões sobre pejotização geralmente enfati-
zam a relação de legalidade (e por isso depende do arcabouço legal e de sua interpretação para
se materializar contextualmente), mas isso não abarca todas as discussões sobre pejotização,
como atesta o uso mais geral do termo. Em meio a estas discussões se coloca aquela do auto-
emprego dependente. Como vimos elas não são exatamente coincidentes muito embora estejam
intimamente ligadas. Por meio da análise acima podemos mensurar o autoemprego dependente
entre 10% e 30% do total de entrevistados, a depender das variáveis utilizadas e de seus cruza-
mentos. Afirmar mensuração semelhante para pejotizados é impossível pelos dados coletados,
justamente por depender da análise legal fática de cada caso. Assim podemos dizer que temos
evidências para a caracterização do autoemprego dependente, porém, ao mesmo tempo, que só
temos indicações indiretas para a caracterização do fenômeno da pejotização em sentido estrito
ou da relação de emprego disfarçada. Ainda assim, a pesquisa aqui apresentada parece ser um
ponto de partida interessante para qualificações futuras desse fenômeno.
Se podemos ver uma alta correlação entre os indicadores de dependência quando olhamos
a relação dos indicadores de dependência com os indicadores de precariedade não vemos uma
correlação tão forte. Como se observa na maioria dos gráficos da segunda coluna dos painéis
(anda na Figura 55) a diferença entre os resultados dos grupos com e sem indicador de depen-
dência não é tão grande. Isso é de certa forma esperado visto que a primeira é comparação de
150
dos capítulos anteriores neste trabalho o que se fez foi uma comparação relativa dos rendimentos,
isto é, entre grupos. A base de comparação é determinante para a interpretação. Se nos capí-
tulos anteriores comparamos empregado e autoempregado, por meio da pesquisa analisada no
presente capítulo isso não é possível. Só o que podemos fazer é comparar grupos de autoempre-
gados (MEIs) entre si. Os MEIs que apresentam indicadores de dependência e se assemelham,
portanto, às características dos empregados (entre os quais aqueles que de fato deveriam ser em-
pregado) têm, em média, maiores rendimentos do que os autoempregados sem características de
dependência, ou seja, o mesmo resultado visto nos capítulos anteriores ao comparar empregado
e autoemprega (em especial no Capítulo 2.1), desta feita, refletidos somente dentro do grupo de
MEIs que responderam ao questionário. É importante reforçar, este autoempregado com carac-
terísticas de empregado (dependência) apresenta nos dados, analisados de forma exploratória,
maiores rendas em média, em detrimento de a) não ter a independência que se espera de uma
posição de autoemprego e b) menores direitos e proteções se comparados com o empregado for-
mal. Em termos de rendas, provavelmente o autoemprego dependente está no meio do caminho
entre o autoemprego independente e o emprego, e como visto no Capítulo 3.2.2 a direção da
trajetória implica em diferentes resultados na renda do trabalhador que faz a transição82 .
Este capítulo fez uma análise de indicadores de precariedade e de dependência entre os
MEIs. O questionário aplicado a uma amostra dos MEIs nos trouxe informações importantes
sobre as múltiplas formas e a prevalência destas características, informações estas que as atuais
pesquisas domiciliares não nos permitem acessar. Ainda que mediado pelas dificuldades que
o tamanho da amostra impõe sobre a pesquisa, os resultados são bastante reveladores. Uma
parcela considerável dos autoempregados por meio do MEI apresenta uma série de indicadores
de dependência pessoal e econômica, o que somados indicam, para uma parte destes, a utilização
do MEI como veículo para esconder uma relação de emprego, isto é, a pejotização no sentido
estrito.
Como visto ao longo dos capítulos anteriores, e agora no contexto deste survey, é grande
a heterogeneidade de trajetórias para o MEI. Há tanto aqueles que estão muito satisfeitos com
a própria ocupação, empreendedores por opção, quanto aqueles que entram por necessidade
no autoemprego através do MEI e que trocariam esta ocupação pelo emprego formal se este
surgisse (Figura 37). Ademais, dentro do contexto da presente pesquisa, com a agregação dos
indicadores de dependência, há indicações de que uma parcela, que embora não seja a maior é
considerável, sofra dos efeitos do desvirtuamento da política do MEI na forma da pejotização.
Este desvirtuamento deve ser enfrentado diretamente para que o MEI possa seguir o espírito
da sua concepção e ser um meio de formalização e elevação de direitos para uma parcela de
autoempregados antes sem proteção e não de retirada de direitos e proteções em uma trajetória
precarizante.
82
Sendo rigoroso naquele capítulo as trajetórias analisadas não identificam as características de dependência ou
independência, mas, por extensão, acreditamos não ser errado afirmar que a direção das trajetórias para o autoem-
prego dependente importam no diferencial de renda observada.
152
CONCLUSÃO
A política de formalização voltada aos autoempregados via MEI tem claros pontos posi-
tivos, em especial pode ser considerada um sucesso na inclusão produtiva e social ao permitir
que milhões de trabalhadores tenham chance de acesso à previdência e outros benefícios. Ainda
é cedo para julgar corretamente quantos daqueles que contribuem como MEI conseguirão o
número necessário de contribuições para ter o direito ao benefício, e ainda, se a vida na aposen-
tadoria daqueles que conseguirem acesso ao benefício será de fato digna. Não obstante isso, o
MEI é uma forma relativamente barata de inclusão a certos direitos para uma parcela relevante
de autoempregados independentes e é seguro dizer que sem o instituto do MEI muitos entre
esses milhões de trabalhadores e trabalhadoras ficariam sem opção de inclusão.
Vimos que o MEI pode ser também visto criticamente como um elemento em direção à
maior precariedade entre os trabalhadores. O autoemprego em crescimento, seja por meio do
MEI ou por meio de outras pessoas jurídicas, pode indicar uma substituição das antigas relações
de assalariamento formal. O autoemprego, o conta própria e o MEI, geram para o trabalhador
consequências para a qualidade da ocupação, para além da diminuição direta de direitos (se
comparados com os direitos do assalariamento formal).
No Capítulo 1 tentando analiticamente organizar as várias nuances das categorias de auto-
emprego e emprego. O primeiro objetivo alí foi nos aprofundar na ontologia do autoemprego, ou
em outras palavras, os elementos que fazem o autoemprego ser distinto do emprego. Vimos que
o segundo é de mais fácil definição e que muitas vezes o autoemprego se define pelo contraste.
Vimos também a preocupação da literatura especializada com o crescente grupo de trabalha-
dores alocados na área cinzenta entre emprego e autoemprego. As mudanças tecnológicas e a
constante pressão por flexibilização das relações de trabalho deságuam no que muitos apontam
ser “novas” formas de relação de trabalho, tal como a uberização. Exploramos os conceitos de
dependência (pessoal e econômica) e risco como características do autoemprego e contrastamos
como estes conceitos são articulados no arcabouço jurídico de diferentes países, inclusive do
Brasil.
Um caso de particular preocupação na literatura sobre as novas e mais precárias formas de
relações de trabalho é o emprego disfarçado de autoemprego ou pejotização em sentido estrito.
Vimos que a pejotização como conceito pode ter sentido amplo quando se refere ao fenômeno
geral do aumento das relações entre entidades civis e em detrimento do vínculo de trabalho
ou ainda um sentido estrito quando se refere à tentativa de burlar a lei, buscando cortar custos
escondendo uma relação que não é outra coisa senão de emprego. Neste contexto, o MEI pode ser
veículo de tentativas de pejotização. Ele tem vários elementos que o tornam um bom alvo para
tanto (baixíssimo custo, facilidade burocrática e pouco controle), mas também alguns elementos,
dados pelo seu desenho, que inibem este uso (lista fechada de setores/ocupações e limite de
rendimento anual).
153
expressivas no total de ocupados, o total de ocupados no grupo relacionado aos MEI (Figura 22)
mostrou-se ainda crescente. De fato, ano a ano temos novos recordes de novos inscritos no MEI.
No Capítulo 4, por meio de survey próprio entre os MEI, vimos que os elementos que
caracterizam o autoemprego dependente estão muitas vezes presentes entre os relatos dos tra-
balhadores inscritos no MEI. O mesmo se dá para os elementos que indicam precarização. A
exploração do cruzamento de indicadores de dependência com indicadores de precarização, no
entanto, nos trouxe resultados somente exploratórios. A comparação entre MEI independen-
tes e dependentes indica, por exemplo, melhores rendas para os últimos, isso se dá justamente
por fazerem parte deste grupo trabalhadores pejotizados (empregados disfarçados com rendi-
mentos maiores em média do que os autoempregados). Uma comparação correta neste caso, e
impossibilitada pelo limite da população a qual a pesquisa foi aplicada, seria com outros empre-
gados não pejotizados. Em todo caso, a exploração das diversas características da dependência
permitiu-nos uma aproximação com relação à prevalência das suas diversas facetas, culminando
na dependência total ou pejotização. Os elementos de dependência muitas vezes ocorrem na
relação de trabalho via MEI, porém sem que chegue em todos os casos a caracterizar a total
dependência típica de uma relação de emprego disfarçada. Há evidências para crer que este tipo
de desvirtuamento da política do MEI seja cada vez mais prevalente (reforma trabalhista, pe-
rene pressão por diminuição de custos, enfraquecimento dos sindicatos, decisões da alta corte
jurídica, e o simples aumento do número total de inscritos).
Tudo isso indica que a política do MEI tem que ser considerada em toda a sua complexidade
para ser analisada. O acesso aos direitos, a adequação da renda, a volatilidade da ocupação e da
renda, o aumento da transferência do risco para o trabalhador, as consequências de longo prazo
para o trabalhador (dentro do mercado de trabalho, transições entre as diferentes posições, e
depois do mercado de trabalho, isto é, na aposentadoria), são alguns dos elementos que precisam
ser levados em conta.
No debate público o MEI seguidamente retorna como uma das balas de prata para “me-
lhorar o ambiente de negócios”, diminuir o custo do trabalho no Brasil ou ainda ser motor de
crescimento econômico associado ao empreendedorismo. Sugestões de alargar a lista ou di-
minuir seus limites legais (aumentar o teto de receita, permitir mais de um estabelecimento,
retirar o limite de contratação de funcionários, etc.) veem o MEI ou ingenuamente como um
empreendedor genuíno (cuja parcela de fato existe mas não deve ser, nem de longe, a maior), ou
hipocritamente como tentativa de legalização da relação de empregado disfarçado (veja a forma
como foi construído o fraseado do reforma trabalhista de viés liberal de 2017).
A pejotização como forma aguda de dependência na ocupação como autoemprego foi in-
diretamente identificada na pesquisa entre os MEI. Precisar sua proporção no total não é tarefa
fácil dadas as múltiplas dimensões que “dependência” pode significar, porém sob várias óticas
este subgrupo não é irrelevante nos dados analisados. Ademais o MEI é somente um dos meios
pelos quais este fenômeno se cristaliza, outras pessoas jurídicas são usadas para este mesmo fim,
155
não estudadas no presente trabalho. Em decisão recente, janeiro de 2022, o Supremo Tribunal
Federal usou o conceito de “trabalhador hiperssuficiente” para permitir a pejotização de médi-
cos e outros profissionais liberais83 . A decisão sugere que estes profissionais têm capacidade
de escolher e aceitar a forma de contrato sem serem pressionados à ela pelo empregador. No
entanto, a decisão também abre precedente para maior pejotização de qualquer trabalhador ao
permitir a pejotização mesmo em casos onde temos os requisitos para a definição de vínculo de
emprego do Artigo 3 da CLT. Em todo caso, novos trabalhos são necessários para explorar mais
profundamente a pejotização por meio do MEI.
No que tange a abrangência dos direitos dos trabalhadores inscritos no MEI o Brasil está
longe do ideal, o que não significa que estes trabalhadores estariam melhor sem o instituto do
MEI. Algumas possibilidades para se discutir mudanças na política do MEI são:
• Calibrar políticas de fomento ao empreendedorismo para servir à maioria dos MEI cuja
atividade não prevê a transição para uma atividade empreendedora no sentido clássico
(busca por crescimento, expansão, inovação);
• Criar mecanismos de fomento para que empresas deixem de pejotizar e formalizar o em-
pregado assalariado;
• Coibir pejotização por meio de a) enforcement, b) deixando claro na letra da lei que a
política do MEI é para autoempregados (retirar a linguagem introduzida pela reforma tra-
balhista de 2017);
• Sindicatos devem poder entrar na justiça contra empresas que fazem uso de emprego dis-
farçado (como ocorre no caso da Suécia (WILLIAMS; LAPEYRE, 2017, p.37))
• Políticas distintas para MEI que prestam serviços à empresas e aquele que atende direta-
mente as pessoas.
Há outros aspectos dos MEI que não foram considerados neste trabalho. Qual é o seu
real impacto agregado na arrecadação da seguridade social? Quais são as consequências para a
83
Veja notícia em /web/20220214015222/https://www.conjur.com.br/2022-fev-11/criterio-hipossuficiencia-
pejotizacao-divide-advogados.
156
REFERÊNCIAS
CONEN, W.; DEBETS, M. Precariousness and social risks among solo self-employed in
Germany and the Netherlands. In: CONEN, W.; SCHIPPERS, J. (Ed.). Self-Employment as
Precarious WorkA European Perspective. [S.l.]: Edward Elgar Publishing, 2019. cap. 7.
CORSEUIL, C.; NERI, M.; ULYSSEA, G. Uma análise exploratória dos efeitos da política de
formalização dos microempreendedores individuais. IPEA Texto para Discussão 1939, 2014.
Disponível em: <https://www.econstor.eu/handle/10419/121626>.
CORSEUIL, C. H.; FOGUEL, M. N. Uma sugestão de deflatores para rendas obtidas a partir
de algumas pesquisas domiciliares do IBGE. IPEA - Texto para discussão, v. 897, p. 57–63,
2002. ISSN 1982-8772. Disponível em: <https://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/
conjuntura/190529_carta_de_conjuntura_41.pdf>.
CRIBB, J.; XU, X. Going solo: How starting solo self-employment affects incomes and
well-being. IFS Working Papers, No. W20/23 Institute for Fiscal Studies (IFS), p. 47, 2020.
Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1920/wp.ifs.2020.2320>.
. In-work poverty in the EU. [s.n.], 2017. ISSN 1977-0375. ISBN 9789279167515.
Disponível em: <http://scholar.google.com/scholar?hl=en&btnG=Search&q=intitle:In-
work+poverty+in+the+EU+2010#0>.
FILGUEIRAS, V. A.; CAVALCANTE, S. M. What has changed: A new farewell to the working
class? Revista Brasileira de Ciencias Sociais, v. 35, n. 102, 2020. ISSN 18069053.
GEVAERT, J.; MOORTEL, D. D.; WILKENS, M.; VANROELEN, C. What’s up with the
self-employed? A cross-national perspective on the self-employed’s work-related mental
well-being. SSM - Population Health, Elsevier, v. 4, n. December 2017, p. 317–326, 2018.
ISSN 23528273. Disponível em: <https://doi.org/10.1016/j.ssmph.2018.04.001>.
GRIFFIN, B. A.; RIDGEWAY, G.; MORRAL, A. R.; BURGETTE, L. F.; MARTIN, C.;
ALMIRALL, D.; RAMCHAND, R.; JAYCOX, L. H.; MCCAFFREY., D. F. Toolkit for
Weighting and Analysis of Nonequivalent Groups (TWANG). 2021. Disponível em:
<http://www.rand.org/statistics/twang.>
KAUTONEN, T.; DOWN, S.; WELTER, F.; VAINIO, P.; PALMROOS, J.; ALTHOFF, K.;
KOLB, S. "Involuntary self-employment"as a public policy issue: A cross-country European
review. International Journal of Entrepreneurial Behaviour and Research, v. 16, n. 2, p.
112–129, 2010. ISSN 13552554.
KOOL, T. A.; BORDON, G.; GASSMANN, F. Access to social protection for platform and
other non-standard workers: A literature review. UNU-MERIT Working Papers, v. 2021-002,
n. January, p. 42, 2021.
KREIN, J. D.; ABÍLIO, L.; FREITAS, P.; BORSARI, P.; CRUZ, R. Flexibilização das
relações de trabalho : insegurança para os trabalhadores. Revista do Tribunal Regional
do Trabalho da 15ª Região, Campinas, SP, v. 52, p. 41–66, 2018. Disponível em:
<https://juslaboris.tst.jus.br/handle/20.500.12178/141969>.
MARX, K.; ENGELS, F. Manifesto Comunista. 13. ed. Editora Expressão Popular, 2008.
ISSN 1098-6596. ISBN 9788578110796. Disponível em: <https://www.expressaopopular.
com.br/loja/wp-content/uploads/2020/02/manifesto-comunista-EP.pdf>.
MASCINI, P.; VEEN, R. van der. Editorial: The Privatization of Work-Related Risk Control.
Zeitschrift für Sozialreform, v. 66, n. 3, p. 195–206, 2020. ISSN 0514-2776.
MEIRELES, F. genderBR: Predict Gender from Brazilian First Names. 2021. Disponível
em: <https://cran.r-project.org/package=genderBR>.
MURGIA, A.; BOZZON, R.; DIGENNARO, P.; MEZIHORAK, P.; MONDON-NAVAZO, M.;
BORGHI, P. Hybrid Areas of Work Between Employment and Self-Employment: Emerging
Challenges and Future Research Directions. Frontiers in Sociology, v. 4, n. January, p. 1–8,
2020. ISSN 22977775.
POCHMANN, M. Structural trends in the world of work in Brazil. Ciencia e Saude Coletiva,
v. 25, n. 1, p. 89–99, 2020. ISSN 16784561.
PRANDI, J. R. O trabalhador por conta própria sob o Capital. 1. ed. São Paulo: [s.n.],
1978. 165 p.
PREALC. El Sector Informal Urbano. Cuadernos de Economia,, Ano 12, n. n. 35, p. 117–129,
1975.
SOFRITTI, F.; BENOZZO, A.; CAREY, N.; PIZZORNO, M. C. Working precarious careers
trajectories: tracing neoliberal discourses in younger workers narratives. Journal of Youth
Studies, Taylor and Francis, v. 23, n. 8, p. 1054–1070, 2020. ISSN 14699680. Disponível em:
<https://doi.org/10.1080/13676261.2019.1654602>.
WILLIAMS, C.; LLOBERA VILA, M.; HORODNIC, A. Tackling Undeclared Work in the
Collaborative Economy and Bogus Self-Employment. SSRN Electronic Journal, 2020.
WILLIAMS, M.; BROUGHTON, A.; MEAGER, N.; SPIEGELHALTER, K.; JOHAL, S.;
JENKINS, K. The true diversity of self-employment: Uncovering the different segments of the
UK’s self-employed workforce. p. 44, 2017.
165
Este Apêndice traz alguns gráficos adicionais que complementam a análise feita na seção
2.1.2. deste trabalho, ajudando a descrever a evolução de longo prazo das características do
grupo dos conta própria.
Figura A1.1. Idade Média por posição na ocupação (1976-2019)
Fonte: PNAD/PNADC (Seleção 1) - IBGE. Elaboração própria. Linha pontilhada vertical marca a criação do MEI.
Nota: Na Seleção 1 contabilizam-se somente os ocupados acima de 14 anos.
166
Fonte: PNAD/PNADC (Seleção 1) - IBGE. Elaboração própria. Linha pontilhada vertical marca a criação do MEI.
Figura A1.3. Proporção de brancos no total de ocupados e no total dos conta própria
(1987-2019)
Fonte: PNAD/PNADC (Seleção 1) - IBGE. Elaboração própria. Linha pontilhada vertical marca a criação do MEI.
167
Figura A1.4. Proporção de alfabetizados no total de ocupados e no total dos conta própria
(1977-2015)
Fonte: PNAD/PNADC (Seleção 1) - IBGE. Elaboração própria. Linha pontilhada vertical marca a criação do MEI.
Fonte: PNAD/PNADC (Seleção 1) - IBGE. Elaboração própria. Linha pontilhada vertical marca a criação do MEI.
168
Figura A1.6. Rendimento mediano do trabalho principal por hora dos empregados e conta
próprias por setor e contribuiçao à previdência (1976-2019)
Fonte: PNAD/PNADC (Seleção 1) - IBGE. Elaboração própria. Linha pontilhada vertical marca a criação do MEI.
Nota: valores deflacionados para 2015.
169
Figura A1.7. Tempo médio no atual trabalho principal por posição na ocupação e contri-
buição à previdência (1990-2019)
Fonte: PNAD/PNADC (Seleção 1) - IBGE. Elaboração própria. Linha pontilhada vertical marca a criação do MEI
Figura A1.8. Porcentagem de ocupados acima de 55 anos por posição na ocupação que
recebe rendimento de aposentadoria (1976-2019)
Fonte: PNAD/PNADC (Seleção 1) - IBGE. Elaboração própria. Linha pontilhada vertical marca a criação do MEI.
170
Fonte: PNAD (Seleção 2) - IBGE. Elaboração própria. Nota: destacados em vermelho aqueles subsetores listados
na próxima tabela.
Tabela A1.1. conta própria nos principais subsetores CNAE, quantidade e taxa de contri-
buição à previdência - PNAD
(continued)
Ref. CNAE Descrição Qtd. Qtd. Tx. Tx.
Gráfico Dom. 2009 2015 Previd. Previd.
2009(%) 2015(%)
Tabela A1.2. conta própria nos principais ocupações CBO Domiciliar, quantidade e taxa
de contribuição à previdência - PNAD
(continued)
Ref. CBO Descrição Qtd. Qtd. Tx. Tx.
Gráfico Dom. 2009 2015 Previd. Previd.
2019(%) 2015(%)
Como descrito na seção 2.1.2. deste trabalho utilizamos os setores ISIC3 para harmonizar
entre os diferentes anos da PNAD e da PNADC na Seleção 1, baseado na tese de Barbosa84 e
descrito em texto posterior (BARBOSA, 2014). A lista dos códigos setoriais utilizados em cada
década está explicitada abaixo:
Tabela A2.1. Relação de códigos setoriais na PNAD 1976-1979 e correspondência proposta
para ISIC3
PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3
(Continua...)
84
Os algoritmos usados naquele trabalho estão disponíveis em https://github.com/antrologos/harmonizePNAD .
174
PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3
& 80 & 527 & 111 & 541 & 114 & . & .\* \end{longtable}
Tabela A2.2. Relação de códigos setoriais na PNAD 1981-1989 e correspondência proposta
para ISIC3
PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3
(Continua...)
175
PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3
114 & 521 & 60 & 612 & 90 & . & .\* \end{longtable}
Tabela A2.3. Relação de códigos setoriais na PNAD 1992-1999 e correspondência proposta
para ISIC3
PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3
(Continua...)
176
PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3
40 & 511 & 70 & 610 & 113 & 999 & 0\* \end{longtable}
Tabela A2.4. Relação de códigos setoriais na PNAD 2001-2015 e na PNADC 2012-2019 e
correspondência proposta para ISIC3
PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3
(Continua...)
177
PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3
(Continua...)
178
PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3 PNAD ISIC3
!6}{14004} & 20 & 32000 & 30 & 53080 & 60 & 74040 & 111 & . & .\* \end{longtable}
179
O trabalho disposto abaixo foi feito de forma discricionária tentando encaixar da melhor
forma os setores (CNAE) permitidos para o MEI (veja Anexo 1) com as ocupações dispostas da
PNADC (CBO Domiciliar). O objetivo deste trabalho é especialmente “limpar” a base de conta-
própria com contribuição ou com CNPJ de ocupações que por definição não podem estar entre
os MEI, em especial profissões liberais (dentistas, advogados, etc.). Muito embora a legislação
traga uma lista de setores permitidos, o trabalho via MEI é predominantemente unipessoal e
assim na maioria dos casos uma ocupação única pode ser identificada para aquele setor (como
é o caso do alfaiate que trabalha no setor de corte e costura). No entanto este só pode ser parcial
e aproximado por não haver compatibilização correta entre as bases.
Tabela A3.1. Lista de códigos de ocupações na PNADC indicadas como MEI.
5141 Cabeleireiros
5142 Especialistas em tratamento de beleza e afins
5161 Astrólogos, adivinhos e afins
5164 Cuidadores de animais
5211 Vendedores de quiosques e postos de mercados
(Continua...)
180
Tabela A3.1. Lista de códigos de ocupações na PNADC indicadas como MEI (continuação)
Cód. Descrição da Ocupação
CBODom
6225 Pescadores
7111 Construtores de casas
7112 Pedreiros
7113 Canteiros, cortadores e gravadores de pedras
7115 Carpinteiros
7119 Outros trabalhadores qualificados e operários da construção não classificados anteriormente
7121 Telhadores
7122 Aplicadores de revestimentos cerâmicos, pastilhas, pedras e madeiras
7123 Gesseiros
7125 Vidraceiros
7126 Bombeiros e encanadores
7127 Mecânicos-instaladores de sistemas de refrigeração e climatização
7131 Pintores e empapeladores
7132 Lustradores
(Continua...)
181
Tabela A3.1. Lista de códigos de ocupações na PNADC indicadas como MEI (continuação)
Cód. Descrição da Ocupação
CBODom
O questionário criado busca suprir lacunas específicas sobre a inserção do MEI no mercado
de trabalho, em especial a qualidade dessa inserção e as diversas óticas sobre a dependência na
ocupação. Muitas das questões construídas se baseiam em questões já feitas em outros surveys
com população semelhante ou que discutem sua tipificação (SHIBAO et al., 2013; OLIVEIRA;
FORTE, 2014; BEHLING; LENZI, 2016; WILLIAMS et al., 2017; EUROFOUND, 2017b;
TONDOLO, 2018; OIT, 2018; CIEŚLIK; DVOULETY, 2019; EUROFOUND, 2017a; FRA-
CAROLLI, 2019). Especial destaque vai para as pesquisas realizadas pelo SEBRAE intituladas
“Perfil do Microempreendedor Individual” (SEBRAE, 2011; SEBRAE, 2012; SEBRAE, 2013;
SEBRAE, 2015; SEBRAE, 2017; SEBRAE-SP, 2017; SEBRAE, 2019a; SEBRAE, 2019b).
Estas últimas, como vimos no Capítulo 4, foram importantes para validar os resultados já que
a amostra utilizada na presente pesquisa é muito menor e, portanto, sujeita à maior erro. As
pesquisas do SEBRAE permitiram também calibrar os resultados da pesquisa como disposto no
Apêndice 6.
Procedimentos:
Participando do estudo você está sendo convidado a responder um questionário com um
roteiro de perguntas sobre o tema do trabalho via MEI. O questionário tem previsão de cerca de
15 minutos de duração. Os dados serão usados para fins científicos da pesquisa em questão e
as demais publicações científicas relacionadas a ela. Os resultados deste trabalho poderão ser
apresentados em encontros ou revistas científicas, entretanto, ele mostrará apenas os resultados
obtidos como um todo, sem revelar seu nome, instituição a qual pertence ou qualquer informa-
ção que esteja relacionada com sua privacidade. Cabe esclarecer que os dados e informações
obtidos dos entrevistados serão mantidos em sigilo e tornados anônimos. Os arquivos gerados
das entrevistas não serão compartilhados e ficarão em posse exclusiva do pesquisador armaze-
nados no Google Drive pelo período de 5 anos após o final da pesquisa, de acordo com a Res.
CNS-510/16.
Desconfortos e riscos:
Não há riscos previsíveis. Para minimizar desconfortos, constrangimentos e quaisquer ris-
cos não previstos, fique a vontade para encerrar sua participação a qualquer momento, sem que
haja nenhum prejuízo ao indivíduo objeto da pesquisa em decorrência da sua decisão.
Este questionário é direcionado aqueles que são ou já foram Microempreendedor Indivi-
duais. Você não deve participar desta pesquisa se não se encaixar em um destes quesitos.
Benefícios: Não há previsão de benefícios diretos aos participantes. Os benefícios indiretos
de sua participação na pesquisa são os de favorecer a compreensão da inserção de trabalho via
MEI, bem como a possibilidade de contribuir para a criação de melhores políticas públicas
voltadas para a promoção dos direitos dos microempreendedores.
Acompanhamento e assistência:
A qualquer momento, antes, durante ou até o término da pesquisa, os participantes pode-
rão entrar em contato com os pesquisadores para esclarecimentos e assistência sobre qualquer
aspecto da pesquisa ou danos decorrentes da pesquisa. O participante terá direito ao acesso aos
resultados da pesquisa assim que os mesmos começarem a ser produzidos. A solicitação dos
resultados poderá se dar via contatos indicados neste documento e pode ser realizada a qualquer
momento, inclusive após o término da pesquisa.
Sigilo e privacidade:
Você tem a garantia de que sua identidade será mantida em sigilo e nenhuma informação
será dada a outras pessoas que não façam parte da equipe de pesquisadores. Na divulgação dos
resultados desse estudo, seu nome não será citado.
Os pesquisadores serão os únicos a ter acesso aos dados e tomarão todas as providências
necessárias para manter o sigilo, mas sempre existe a remota possibilidade da quebra do sigilo,
mesmo que involuntário e não intencional, cujas consequências serão tratadas nos termos da lei.
184
Ressarcimento e Indenização:
Você não terá nenhuma despesa ao participar do estudo. Também não vamos pagar-lhe por
sua participação, pois toda a entrevista será realizada em formato remoto (online), o que não
exigirá gastos com deslocamentos de sua parte.
Você terá a garantia ao direito a indenização diante de eventuais danos decorrentes da pes-
quisa quando comprovados nos termos da legislação vigente.
Contato:
Em caso de dúvidas sobre a pesquisa, você poderá entrar em contato com os pesquisa-
dores: professor Bruno de Conti <deconti@unicamp.br>, telefone (19) 35215721 Extensão:
15721 e endereço: Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Economia. Rua Pitágoras,
353 - sala 73 Barão Geraldo - Campinas, SP, Arthur Welle, telefone (19) 99911-1632, e-mail
<arthurwelle@gmail.com>.
Em caso de denúncias ou reclamações sobre sua participação e sobre questões éticas do
estudo, você poderá entrar em contato com a secretaria do Comitê de Ética em Pesquisa em
Ciências Humanas e Sociais (CEP-CHS) da UNICAMP das 08h30 às 11h30 e das 13h00 as
17h00 na Rua Bertrand Russell, 801, Bloco C, 2º piso, sala 05, CEP 13083-865, Campinas –
SP; telefone (19) 3521-6836; e-mail: <cepchs@unicamp.br>.
O Comitê de Ética em Pesquisa (CEP).
O papel do CEP é avaliar e acompanhar os aspectos éticos de todas as pesquisas envolvendo
seres humanos. A Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP), tem por objetivo desen-
volver a regulamentação sobre proteção dos seres humanos envolvidos nas pesquisas. Desem-
penha um papel coordenador da rede de Comitês de Ética em Pesquisa (CEPs) das instituições,
além de assumir a função de órgão consultor na área de ética em pesquisas.
Responsabilidade do Pesquisador:
Eu, Bruno Martarello De Conti, na qualidade de pesquisador responável asseguro ter cum-
prido as exigências da resolução 510/2016 CNS/MS e complementares na elaboração do pro-
tocolo e na obtenção deste Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Asseguro, também,
ter explicado e fornecido uma via deste documento ao participante. Informo que o estudo foi
aprovado pelo CEP perante o qual o projeto foi apresentado e pela CONEP, quando pertinente.
Comprometo-me a utilizar o material e os dados obtidos nesta pesquisa exclusivamente para as
finalidades previstas neste documento ou conforme o consentimento dado pelo participante.
Consentimento livre e esclarecido:
Após ter recebido esclarecimentos sobre a natureza da pesquisa, seus objetivos, méto-
dos, benefícios previstos, potenciais riscos e o incômodo que esta possa acarretar, ao clicar em
“Aceito” você irá prosseguir para o questionário e estará consentindo em participar dessa etapa
da pesquisa. Caso não queira participar clique em “Não Aceito”. Para que tenha registro das
185
informações aqui prestadas, uma cópia deste questionário com suas respostas será enviado ao
seu e-mail inserido abaixo.
3.2 Questionário
Características do indivíduo
P1. Idade:
P2. Sexo: ( ) Masculino ( ) Feminino ( ) Outros
P3. Qual a sua formação escolar?
(1) Ensino fundamental incompleto
(2) Ensino fundamental completo
(3) Ensino médio incompleto
(4) Ensino médio completo
(5) Ensino superior incompleto
(6) Ensino superior completo
(7) Pós Graduação (mestrado/doutorado)
P4. Quantas pessoas moram na sua casa, incluindo filhos, parentes e você?
P5. Qual o setor principal de atividade MEI (CNAE)?
P12. Se na pergunta anterior o(a) Sr(a) respondeu “empregado” (com ou sem car-
teira), na atividade como MEI presta serviços para a mesma empresa onde já foi empre-
gado(a)? (U-A)
(1) Sim
(2) Não
(99) Sem resposta
P13. Está mais ou menos satisfeito com a ocupação como MEI do que com a ocupação
anterior? (U-A)
(1) Menos satisfeito
(2) O mesmo
(3) Mais satisfeito
(98) Não sabe
(99) Sem resposta
P14. Tem funcionários? (U-A)
(1) Sim
(2) Não
(99) Sem resposta
P15. Nos últimos 12 meses quantos meses teve rendimento como MEI?
(1) ___________________ meses. (0-12 no máximo)
(99) Sem resposta
P16. Nos últimos 12 meses quantos meses pagou boleto da previdência (DAS-MEI)?
(1) ___________________ meses. (0-12 no máximo)
(99) Sem resposta
P17. Somando todas as rendas de todas as pessoas que moram na sua casa, o(a) Sr.(a)
diria que a sua renda familiar mensal habitual, incluindo salários, ‘bicos’, aposentadorias
etc. é de quanto, aproximadamente?
(1) R$___________________
(98) Não sabe
(99) Sem resposta
P18. Qual é a renda mensal da atividade como MEI (em média, habitualmente)?
(1) R$___________________
189
(2) Não
(99) Sem resposta
P29. Trabalha junto com outros empregados do cliente? (A)
(1) Sim
(2) Não
(99) Sem resposta
P30. É difícil tirar um dia de folga para resolver assuntos pessoais ou familiares? (A)
(1) Fácil
(2) Difícil
(99) Sem resposta
P31. Se surgisse a oportunidade de uma vaga de emprego com carteira assinada para
ganhar o mesmo aceitaria? (A)
(1) Sim
(2) Não
(99) Sem resposta
P32. Se sim para a pergunta anterior, porque? (U-A)
(1) Segurança do salário
(2) Progredir na carreira
(3) Melhores condições de aposentadoria
(4) Dificuldades, resposabilidades e preocupações de ser empreendedor
(5) Não está satisfeitos com a atual ocupação
(6) Outro motivo
(98) Não sabe
(99) Sem resposta
P33. Você faz reserva de recursos para enfrentar as flutuações nas vendas de produtos
ou serviços? (A)
(1) Sim
(2) Não
(99) Sem resposta
P34. Você tem previdência complementar? (A)
192
(1) Sim
(2) Não
(99) Sem resposta
P35. Você faz vendas pela internet (facebook, whatsapp, instagram, ou outros)? (A)
(1) Sim
(2) Não
(99) Sem resposta
P36. Você faz uso de crédito bancário? (A)
(1) Sim
(2) Não
(99) Sem resposta
P37. Se você ficasse doente por muito tempo e não pudesse mais trabalhar, como você
ficaria financeiramente? (A)
(1) Estaria seguro financeiramente
(2) Estaria inseguro financeiramente
(98) Não sabe
(99) Sem resposta
P38. O MEI tem alguns limites, algum deles está atualmente te atrapalhando? (M-A)
(1) Não poder contratar mais de um funcionário no valor de um salário mínimo
(2) Limite de faturamento de 81 mil reais anuais
(3) Não poder abrir filial
(4) Lista de ocupações do MEI é muito restrita
(98) Não sabe
(99) Sem resposta
P39. É fácil encontrar novos clientes? (A)
(1) Sim
(2) Não
(99) Sem resposta
P40. A pandemia afetou seu negócio? (A)
(2) Sim, menor número de clientes
193
Este anexo traz estatísticas descritivas de todas as perguntas que não foram analisadas ao
longo do Capítulo 4.
Figura A5.1. Gênero dos entrevistados
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita no Capítulo 4. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita no Capítulo 4. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
195
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita no Capítulo 4. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita no Capítulo 4. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
Pergunta base “Atualmente o(a) Sr.(a)está em atividade como Microempreendedor Individual?”.
196
Figura A5.5. Motivos para ter encerrado as atividades entre os entrevistados não ativos
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita no Capítulo 4. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
Pergunta base “Por que o(a) Sr.(a) encerrou suas atividades?”.
197
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita no Capítulo 4. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
Pergunta base “Há quanto tempo o empreendimento está em atividade? (contando tempo antes do MEI se houver)”.
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita no Capítulo 4. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
198
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita no Capítulo 4. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
Pergunta base “Somando todas as rendas de todas as pessoas que moram na sua casa, o(a) Sr.(a) diria que a sua
renda familiar mensal habitual, incluindo salários, ‘bicos’, aposentadorias etc. é de quanto, aproximadamente?”.
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita no Capítulo 4. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
Pergunta base “É dificil tirar um dia de folga para resolver assuntos pessoais ou familiares?”.
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita no Capítulo 4. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
Pergunta base “Você faz vendas pela internet (facebook, whatsapp, instagram, ou outros)?”.
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita no Capítulo 4. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
Pergunta base “Você faz uso de crédito bancário?”.
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita no Capítulo 4. Nota: Intervalo de confiança a 95%. Nota:
Esta pergunta permitiu múltiplas respostas, portanto a soma destas é maior que o total de entrevistados. Pergunta
base “O MEI tem alguns limites, algum deles está atualmente te atrapalhando?”.
A pergunta acima poderia nos permitir, talvez de forma incompleta e aproximada, identi-
ficar aqueles que são verdadeiramente empreendedores (veja discussão na seção 1.3.2) e cujos
limites impostos pelo MEI estão sendo relevantes. No entanto, uma análise crítica posterior nos
indica que faltou uma opção de resposta que indicasse “Não sinto dificuldades com os limites do
MEI”. Sem esta opção muitos podem ter assinalado “Não sabe” ou qualquer outra opção sem
200
na verdade ter esta dificuldade. Ademais a opção “Não poder contratar mais de um funcionário
no valor de um salário mínimo” junta duas características do desenho legal do MEI distintas:
número de funcionários e valor do salário destes. As duas opções que, caso assinaladas, melhor
indicariam serem empreendedores verdadeiros seriam não poder contratar mais funcionários e
não poder abrir filial.
Figura A5.13. Proporção dos entrevistados que afirma ser fácil encontrar novos clientes
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita no Capítulo 4. Nota: Intervalo de confiança a 95%.
Pergunta base “É fácil encontrar novos clientes?”.
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita no Capítulo 4. Nota: Intervalo de confiança a 95%.Per-
gunta base “A pandemia afetou seu negócio?”.
Figura 15. Proporção dos entrevistados que afirma ter recebido auxílio emergencial
Fonte: Elaboração própria com base na pesquisa descrita no Capítulo 4. Nota: Intervalo de confiança a 95%. O
Auxílio Emergencial foi um programa de transferência de renda visando mitigar os efeitos da crise sanitária causada
pela Covid-19. Todos os MEIs tinham direito a requisitar o auxílio.
201
• B) Valores das proporções com ponderação calibrada para as faixas de educação com
base nos números do SEBRAE (2019a, p.43);
• C) Valores das proporções com ponderação calibrada para as faixas etárias com base
nos números do SEBRAE (2019a, p.38);
• D) Valores das proporções com ponderação calibrada para as faixas etárias e para as
faixas de educação com base nos números dos dois anteriores85 .
Ponderação
(Continua...)
85
A calibração das ponderações com duas variáveis foi feita utilizando o pacote anesrake (PASEK, 2018)
202
Tabela A6.1. Resultados do questionário com MEIs com diferentes ponderações (continuação)
Ponderação
Formação escolar? Ensino médio incompleto 23 299 7.7 8.3 6.9 8.0
Formação escolar? Ensino superior completo 68 299 22.7 19.0 21.6 19.0
Formação escolar? Ensino superior incompleto 43 299 14.4 9.1 11.3 9.0
Formação escolar? Pós Graduação 52 299 17.4 3.9 21.5 4.0
(mestrado/doutorado)
Quantas pessoas no domicílio? 1 24 294 8.2 6.2 8.5 7.2
Porque não mais ativo? Consegui um emprego 2 22 9.1 4.1 7.5 4.0
Porque não mais ativo? Dificuldades com o ponto 2 22 9.1 11.7 12.6 14.6
comercial (Infraestrutura, aluguel,
localização, etc.)
Porque não mais ativo? Muita burocracia/impostos 1 22 4.5 3.2 2.5 1.9
Porque não mais ativo? Não sabe 4 22 18.2 20.1 20.2 24.3
Porque não mais ativo? Não tenho perfil de 2 22 9.1 8.8 13.0 12.0
empresário/empreendedor
Porque não mais ativo? Não tinha dinheiro para 3 22 13.6 16.9 7.2 9.0
investir/pagar fornecedores
Porque não mais ativo? Não tive apoio 1 22 4.5 5.6 5.0 6.1
Porque não mais ativo? Outro 7 22 31.8 29.5 32.0 28.1
Quanto tempo na ocupação? entre 1 e 2 anos 139 274 50.7 48.8 46.3 45.0
Quanto tempo na ocupação? entre 2 e 3 anos 24 274 8.8 7.7 10.0 8.7
Quanto tempo na ocupação? entre 3 e 4 anos 12 274 4.4 4.9 4.1 4.7
(Continua...)
203
Tabela A6.1. Resultados do questionário com MEIs com diferentes ponderações (continuação)
Ponderação
Quanto tempo na ocupação? entre 4 e 5 anos 6 274 2.2 2.1 2.3 2.6
Quanto tempo na ocupação? entre 5 e 6 anos 7 274 2.6 3.1 2.4 2.6
Quanto tempo na ocupação? entre 6 e 7 anos 2 274 0.7 1.1 1.0 1.6
Quanto tempo na ocupação? entre 7 e 8 anos 5 274 1.8 2.2 2.1 2.4
Quanto tempo na ocupação? entre 8 e 9 anos 1 274 0.4 0.3 0.3 0.3
Quanto tempo na ocupação? entre 9 e 10 anos 2 274 0.7 0.6 0.7 0.6
Quanto tempo na ocupação? mais de 10 anos 21 274 7.7 9.4 10.8 13.1
Quanto tempo na ocupação? menos de 1 ano 55 274 20.1 19.8 19.8 18.5
Onde funciona seu negócio? Em casa 126 276 45.7 40.5 45.6 40.9
Onde funciona seu negócio? Em feira ou Shopping popular 2 276 0.7 0.4 1.2 0.6
Onde funciona seu negócio? Em um estabelecimento comercial 49 276 17.8 20.3 17.5 19.1
Onde funciona seu negócio? Na casa do cliente 26 276 9.4 13.1 9.5 13.6
Onde funciona seu negócio? Na empresa do cliente 26 276 9.4 7.7 9.9 8.9
Onde funciona seu negócio? Na rua (ambu- 9 276 3.3 3.7 2.9 3.2
lante/carro/quiosque/foodtruck)
Onde funciona seu negócio? Não sabe 1 276 0.4 0.5 0.3 0.5
Onde funciona seu negócio? Não tenho local, sou motorista de 5 276 1.8 2.1 1.9 2.3
aplicativo ou faço transporte/frete
Onde funciona seu negócio? Outro 18 276 6.5 6.0 5.9 4.7
Onde funciona seu negócio? Venda porta a porta 14 276 5.1 5.8 5.2 6.1
O que levou a se tornar MEI? Indicação/Recomendação do meu 25 275 9.1 6.6 7.9 5.7
empregador
O que levou a se tornar MEI? Não conseguiu um emprego com 13 275 4.7 4.2 4.7 4.5
um salário bom
O que levou a se tornar MEI? Não conseguiu um emprego na 12 275 4.4 3.2 4.9 2.5
área em que queria trabalhar
O que levou a se tornar MEI? Outro 31 275 11.3 11.1 10.6 9.8
O que levou a se tornar MEI? Precisava de uma fonte de renda 79 275 28.7 30.0 30.5 34.9
O que levou a se tornar MEI? Queria praticar seus conhecimentos 25 275 9.1 7.1 12.0 9.4
profissionais
O que levou a se tornar MEI? Queria ser independente 65 275 23.6 26.6 21.7 24.0
O que levou a se tornar MEI? Tinha o dinheiro para começar um 25 275 9.1 11.2 7.8 9.0
negócio e encontrou oportunidade
Ocupação anterior? Aposentado(a) 3 275 1.1 0.5 2.2 1.0
Ocupação anterior? Desempregado(a) 25 275 9.1 11.3 8.8 10.8
Ocupação anterior? Dona(o) de casa 18 275 6.5 7.8 6.1 7.2
Ocupação anterior? Empregado(a) com carteira 114 275 41.5 40.0 42.9 39.9
Ocupação anterior? Empregado(a) sem carteira 30 275 10.9 11.1 10.1 10.8
Ocupação anterior? Estudante 22 275 8.0 6.9 4.0 3.4
(Continua...)
204
Tabela A6.1. Resultados do questionário com MEIs com diferentes ponderações (continuação)
Ponderação
Satisfação com ocupação? Mais satisfeito 168 272 61.8 65.9 59.7 64.5
Satisfação com ocupação? Menos satisfeito 36 272 13.2 10.1 14.7 10.7
Satisfação com ocupação? Não sabe 17 272 6.2 7.2 5.6 6.6
Satisfação com ocupação? O mesmo 51 272 18.8 16.8 20.0 18.2
Tem funcionários? Não 257 274 93.8 93.7 95.1 95.2
(Continua...)
205
Tabela A6.1. Resultados do questionário com MEIs com diferentes ponderações (continuação)
Ponderação
Renda familiar? de 10.001 a 15.000 reais 14 266 5.3 3.2 4.4 2.2
Renda familiar? de 2.001 a 2.500 reais 23 266 8.6 9.5 7.8 8.2
Renda familiar? de 2.501 a 3.000 reais 22 266 8.3 8.7 8.2 9.3
Renda familiar? de 3.001 a 3.500 reais 15 266 5.6 4.9 5.8 5.0
Renda familiar? de 3.501 a 4.000 reais 20 266 7.5 8.0 7.9 8.7
Renda familiar? de 4.001 a 5.000 reais 29 266 10.9 12.4 12.0 13.3
Renda familiar? de 5.001 a 6.000 reais 20 266 7.5 6.1 8.3 7.1
Renda familiar? de 501 a 1.000 reais 15 266 5.6 6.0 5.9 6.2
Renda familiar? de 6.001 a 7.000 reais 16 266 6.0 4.9 6.1 5.7
Renda familiar? de 7.001 a 8.000 reais 10 266 3.8 2.6 4.2 2.4
Renda familiar? de 8.001 a 9.000 reais 6 266 2.3 1.9 2.0 1.6
Renda familiar? de 9.001 a 10.000 reais 7 266 2.6 1.5 3.2 2.0
Renda familiar? Menos de 500 reais 6 266 2.3 2.3 2.7 2.7
Renda familiar? Sem resposta / prefere não 7 266 2.6 2.6 1.7 1.4
responder
Renda familiar? zero 3 266 1.1 1.5 1.1 1.4
Renda MEI? 10.001 reais ou mais 5 268 1.9 1.3 1.6 0.9
Renda MEI? de 1.001 a 1.500 reais 33 268 12.3 13.8 14.0 15.2
Renda MEI? de 1.501 a 2.000 reais 30 268 11.2 10.9 12.3 11.6
Renda MEI? de 2.001 a 2.500 reais 25 268 9.3 10.4 9.1 9.6
Renda MEI? de 2.501 a 3.000 reais 10 268 3.7 3.8 3.0 3.2
Renda MEI? de 251 a 500 reais 21 268 7.8 8.5 8.8 10.0
Renda MEI? de 3.001 a 3.500 reais 10 268 3.7 3.4 3.8 3.4
Renda MEI? de 3.501 a 4.000 reais 20 268 7.5 8.7 8.3 10.1
Renda MEI? de 4.001 a 5.000 reais 17 268 6.3 5.3 5.9 4.9
Renda MEI? de 5.001 a 6.000 reais 15 268 5.6 3.5 5.6 3.7
Renda MEI? de 501 a 750 reais 15 268 5.6 5.5 5.0 5.0
Renda MEI? de 6.001 a 7.000 reais 9 268 3.4 2.7 3.2 2.6
Renda MEI? de 7.001 a 8.000 reais 1 268 0.4 0.6 0.4 0.5
Renda MEI? de 751 a 1000 reais 21 268 7.8 6.7 6.3 5.8
Renda MEI? Menos de 250 reais 14 268 5.2 5.1 5.2 5.1
(Continua...)
206
Tabela A6.1. Resultados do questionário com MEIs com diferentes ponderações (continuação)
Ponderação
Renda MEI? Sem resposta / prefere não 9 268 3.4 4.1 2.5 2.6
responder
Renda MEI? zero 13 268 4.9 5.9 5.0 5.9
Qual a forma de recebimento? Não sabe 20 273 7.3 9.4 6.9 8.3
Qual a forma de recebimento? Outro 17 273 6.2 8.3 6.9 9.2
Qual a forma de recebimento? Recebe a cada produto/serviço 131 273 48.0 46.5 49.3 47.7
Qual a forma de recebimento? Recebe por plataforma digital ou 13 273 4.8 5.7 4.3 5.6
aplicativo
Qual a forma de recebimento? Recebe valor acordado por semana 71 273 26.0 23.4 25.6 23.7
ou mês
Qual a forma de recebimento? Recebe valor no final de um projeto 21 273 7.7 6.7 7.0 5.5
Define seus horários? Não 55 272 20.2 19.6 18.7 17.8
Define seus horários? Sim 217 272 79.8 80.4 81.3 82.2
Horas trabalhadas? Menos que 10 horas 94 273 34.4 36.5 34.0 34.3
Satisfação com jornada? Está satisfeito com o número de 116 273 42.5 44.5 40.9 42.0
horas que trabalha geralmente (não
gostaria nem mais nem menos).
Satisfação com jornada? Gostaria de trabalhar mais horas 55 273 20.1 19.5 22.2 21.6
em média.
Satisfação com jornada? Gostaria de trabalhar menos horas 82 273 30.0 28.4 29.9 29.8
em média.
Satisfação com jornada? Não sabe 20 273 7.3 7.6 7.0 6.6
(Continua...)
207
Tabela A6.1. Resultados do questionário com MEIs com diferentes ponderações (continuação)
Ponderação
Trabalha junto com outros Sim 79 276 28.6 25.4 27.4 25.4
empregados?
Tirar dia de folga: Difícil 88 276 31.9 34.5 32.1 35.6
Tirar dia de folga: Fácil 188 276 68.1 65.5 67.9 64.4
Trocaria ocupação atual por Não 155 276 56.2 55.5 58.9 57.9
emprego?
Trocaria ocupação atual por Sim 121 276 43.8 44.5 41.1 42.1
emprego?
Segurança financeira se doente? Estaria inseguro financeiramente 200 275 72.7 73.9 73.3 75.9
Segurança financeira se doente? Estaria seguro financeiramente 35 275 12.7 10.9 13.1 10.5
Segurança financeira se doente? Não sabe 40 275 14.5 15.3 13.7 13.6
Encontrar novos clientes? Não 133 273 48.7 43.3 49.9 44.5
Encontrar novos clientes? Sim 140 273 51.3 56.7 50.1 55.5
(Continua...)
208
Tabela A6.1. Resultados do questionário com MEIs com diferentes ponderações (continuação)
Ponderação
Pandemia afetou negócio? Não 103 275 37.5 34.9 36.6 34.3
Pandemia afetou negócio? Sim 172 275 62.5 65.1 63.4 65.7
Recebeu auxilio emergencial? Não 161 273 59.0 54.2 60.9 55.3
Recebeu auxilio emergencial? Sim 112 273 41.0 45.8 39.1 44.7
emergencial? & Sim & 112 & 273 & 41.0 & 45.8 & 39.1 & 44.7\* \end{longtable}
209
Descrição
(Continua...)
210
Anexo 1 Tabela 1. Lista positiva de subsetores permitidos no MEI e sua descrição - 2021(continuação)
Descrição
(Continua...)
211
Anexo 1 Tabela 1. Lista positiva de subsetores permitidos no MEI e sua descrição - 2021(continuação)
Descrição
(Continua...)
212
Anexo 1 Tabela 1. Lista positiva de subsetores permitidos no MEI e sua descrição - 2021(continuação)
Descrição
(Continua...)
213
Anexo 1 Tabela 1. Lista positiva de subsetores permitidos no MEI e sua descrição - 2021(continuação)
Descrição
(Continua...)
214
Anexo 1 Tabela 1. Lista positiva de subsetores permitidos no MEI e sua descrição - 2021(continuação)
Descrição
(Continua...)
215
Anexo 1 Tabela 1. Lista positiva de subsetores permitidos no MEI e sua descrição - 2021(continuação)
Descrição
(Continua...)
216
Anexo 1 Tabela 1. Lista positiva de subsetores permitidos no MEI e sua descrição - 2021(continuação)
Descrição
(Continua...)
217
Anexo 1 Tabela 1. Lista positiva de subsetores permitidos no MEI e sua descrição - 2021(continuação)
Descrição
(Continua...)
218
Anexo 1 Tabela 1. Lista positiva de subsetores permitidos no MEI e sua descrição - 2021(continuação)
Descrição
(Continua...)
219
Anexo 1 Tabela 1. Lista positiva de subsetores permitidos no MEI e sua descrição - 2021(continuação)
Descrição
(Continua...)
220
Anexo 1 Tabela 1. Lista positiva de subsetores permitidos no MEI e sua descrição - 2021(continuação)
Descrição
(Continua...)
221
Anexo 1 Tabela 1. Lista positiva de subsetores permitidos no MEI e sua descrição - 2021(continuação)
Descrição
(Continua...)
222
Anexo 1 Tabela 1. Lista positiva de subsetores permitidos no MEI e sua descrição - 2021(continuação)
Descrição