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Revista Brasileira de Geografia Física V. 08, número especial do IV SMUD (2015) 623-634.

Revista Brasileira de
Geografia Física
ISSN:1984-2295
Homepage: www.ufpe.br/rbgfe

Gases de efeito estufa em sistemas de produção animal brasileiros e a importância do balanço


de carbono para a preservação ambiental

Patrícia Perondi Anchão Oliveira1


1
Pesquisadora da Embrapa Pecuária Sudeste, São Carlos - SP.

Artigo recebido em 09/09/2015 e aceito em 10/12/2015.


RESUMO
O aquecimento global, acentuado por ações antrópicas de emissão de gases de efeito estufa, tem como consequência as
mudanças climáticas, que causam muitos transtornos ambientais para a humanidade. A atividade pecuária produz gases
de efeito estufa na forma de metano (CH4) e óxido nitroso (N2O) principalmente, com tendência de aumento de emissão
atrelado ao aumento da produção pecuária. A degradação de pastagens, o mais importante problema ambiental da
pecuária, também pode contribuir para a emissão desses gases e pode levar à desertificação. Ações de mitigação dessas
emissões podem amenizar o problema e devem ser observadas considerando-se o balanço de carbono dos sistemas de
produção pecuários, onde, além da emissão de gases de efeito estufa, o sequestro de carbono é também considerado. Na
pecuária, existe possibilidade de mitigação das emissões pela redução da emissão do CH4 e do N2O, entretanto, o maior
potencial de mitigação das emissões está no sequestro de carbono devido à recuperação das pastagens. Apesar disso,
grande ênfase é dada aos aspectos envolvendo a emissão de CH 4 entérico pelos ruminantes e suas formas de mitigação.
Também é importante ressaltar que a adoção das tecnologias que promovem a mitigação das emissões de gases de
efeito estufa depende mais de questões econômicas do que da viabilidade técnica das ações de mitigação propostas.
Palavras-chave: pecuária, desertificação, degradação, metano, óxido nitroso.

Greenhouse gases in brazilian livestock production systems and the importance of the carbon
balance for environmental preservation

ABSTRACT
Global warming is intensified by greenhouse gases emissions from human activities, resulting in climate change and
causing many environmental disorders for humanity. The livestock produces greenhouse gases such as methane (CH 4)
and nitrous oxide (N2O) mainly and the increasing in emissions is linked to increased livestock production. The
degradation of pastures had been the most important issue of livestock contributing to the greenhouse gases emissions
and leading the desertification. Mitigation actions can reduce these emissions and the carbon balance of livestock
production systems, which also considerate carbon sequestration besides the emission of greenhouse gases. Mitigating
emissions of CH4 and N2O are possible in livestock but the carbon sequestration that occurs during the recovery of
pasture is the greatest potential for mitigating greenhouse. Nevertheless, great emphasis can be found in literature
related to the aspects involving the issue of enteric methane by ruminants and its methods of mitigation. Importantly,
the adoption of technologies that promote mitigation of greenhouse gases emissions is most dependent of economic
issues than technical feasibility of the mitigation actions proposed.
Keywords: livestock, desertification, degradation, methane, nitrous oxide.

*E-mail para correspondência: patrícia.anchao- eventos extremos como tornados e furacões. As


oliveira@embrapa.br consequências desse processo são a fome, sede,
prejuízos e desalojamento de famílias e a perda de
Introdução áreas, quer seja por inundação ou por
As mudanças climáticas são foco de desertificação. O aquecimento global pode
atenção e preocupação mundial, devido aos contribuir e acentuar essas mudanças climáticas.
iminentes desastres ambientais nos seus diferentes A emissão de gases de efeito estufa (GEE) por
graus de intensidade, como tempestades, ações antrópicas contribui para o aquecimento
enchentes, secas, elevação do nível do mar e
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global e deve ser estudada profundamente de mais atenção do que a emissão realizada pelos
forma a diminuir seu impacto sobre o ambiente. outros setores porque, além de existir em 2011 um
A atividade pecuária produz gases de rebanho de 3,6 bilhões de ruminantes domésticos
efeito estufa na forma de metano (CH4), oriundo no mundo, com uma taxa de aumento de 25
da fermentação entérica dos ruminantes, óxido milhões de ruminantes domésticos por ano nos
nitroso (N2O), devido ao uso de fertilizantes últimos 50 anos, ainda há projeção de crescimento
nitrogenados, e ambos os gases, a partir do da produção anual de carne de 229 milhões de
manejo de dejetos e da deposição de dejetos sobre toneladas em 2000 para 465 milhões em 2050.
as pastagens (O´Mara, 2012). Em menor Para melhor avaliar a pecuária e evitar
proporção também existe a emissão de CO2 distorções, chegando a conclusões que reflitam a
devido ao uso de combustíveis fósseis e de realidade e tragam desenvolvimento ao setor,
energia (O´Mara, 2012). torna-se necessário observar a dinâmica de GEE
Globalmente, a tendência é de aumento da nos sistemas de produção pecuários, levando-se
produção da pecuária, como consequência do em consideração todos os compartimentos dos
aumento da demanda por alimentos, e das sistemas produtivos (solo-planta-animal e
emissões de GEE associadas a esta atividade para atmosfera), e não somente as questões de emissão
os próximos quarenta anos, caso não seja de GEE, uma vez que os componentes desses
realizada nenhuma ação de mitigação (O´Mara, sistemas podem atuar como dreno dos GEE, sendo
2012). No Brasil não é diferente. Estudos o sequestro de carbono, realizado pelas pastagens
realizados pelo Ministério da Agricultura Pecuária e pelas culturas eventualmente integradas nos
e Abastecimento apontam que em 2018-2019 as sistemas de produção, o aspecto mais importante
exportações de carnes pelo Brasil poderão para mitigação das emissões de GEE nos sistemas
representar 60,6%, 89,7% e 21% do comércio de produção animal. Entretanto, para que essa
mundial de carnes bovina, de frango e suína, condição seja alcançada, há necessidade de
respectivamente. Assim, as perspectivas são de adoção de práticas adequadas às áreas cultivadas,
que as produções dessas três commodities pois dependendo do manejo essas áreas podem se
reunidas passarão das atuais 24,6 milhões para tornar tanto fonte como dreno de GEE para a
37,2 milhões de toneladas em 2018 (MAPA, atmosfera (Ferreira et al., 2014).
2008). Uma das principais preocupações com Existe uma forte relação entre a emissão
relação a esse grande crescimento está relacionada de GEE do solo e vegetação para a atmosfera,
aos possíveis impactos ambientais, o que especialmente o CO2, e o processo de degradação
certamente colocará em evidência o tratamento das pastagens, que pode culminar em aumento da
dispensado pelo nosso país em relação às questões área de deserto mesmo em clima com menor
ambientais. déficit hídrico (Lal, 2001). O manejo inadequado
No Brasil, em 2008 o CEPEA publicou o das pastagens contribui para a emissão de GEE,
estudo “Pecuária de corte brasileira: impactos especialmente pela exaustão da matéria orgânica
ambientais e emissões de gases efeito estufa do solo durante o processo de degradação (Lal,
(GEE)” elaborado por Zen et al. (2008), no qual 2001). No Brasil, o deserto do Alemão no
são apontados os principais problemas ambientais município de Santa Rita do Passa Quatro, estado
da pecuária relatados por pesquisadores: a de São Paulo, é um exemplo da formação de um
degradação dos sistemas ambientais, a degradação deserto em local onde o déficit hídrico ocorre
do solo, a emissão de GEE e a poluição de somente em alguns meses do ano. Tal fato ocorreu
recursos hídricos. em consequência do manejo inadequado do solo
No exterior, o tema também é discutido e (http://www.santaritadopassaquatro.tur.br/deserto-
um dos artigos mais debatidos foi “LIVESTOCK'S do-alemao/).
LONG SHADOW: environmental issues and Felizmente esse processo pode ser
options”, (A extensa sombra da pecuária: questões revertido, pois várias formas de recuperação de
ambientais e opções), publicado pela FAO em pastagens têm a capacidade de aumentar o teor de
2006. Esse trabalho permanece formando opinião, matéria orgânica do solo, trazendo vários
como pode ser visto no artigo “Ruminants, climate benéficos para o ecossistema da pastagem e
change and climate policy” (Ruminantes, prevenindo a degradação e desertificação das
mudanças e políticas climáticas), recentemente mesmas. A FAO, em 2009, enfatizou e
publicado por Ripple et al. (2014), em que são reconheceu esse fato quando veiculou o artigo
realizadas as estimativas das emissões futuras de “Grasslands: Enabling their potential to
GEE frente ao crescimento do rebanho mundial. contribute to greenhouse gas mitigation”
Ripple et al. (2014) afirmam que a (Pastagens: aprovando seu potencial para
emissão de GEE por ruminantes deveria receber contribuir com a mitigação dos gases de efeito
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estufa) em que os pesquisadores sugerem que as ao manejo inadequado das plantas forrageiras, têm
pastagens manejadas adequadamente, tanto em levado à degradação de milhões de hectares de
relação à manutenção e/ou melhoria da fertilidade pastagens (Oliveira, 2007). Na década de 90,
do solo quanto ao manejo correto da planta Zimmer et al. (1994) já chamavam a atenção para
forrageira, seriam capazes de sequestrar grandes o fato de que 30 milhões de hectares de pastagens
quantidades de carbono, realizando a mitigação a de capim-brachiaria no Brasil estavam degradados
custos relativamente baixos e inclusive superando e necessitavam de recuperação. Atualmente
as emissões de GEE dos sistemas de produção existem autores compilando informações de que
animal. Dessa forma, os sistemas de produção 80% das pastagens cultivadas estão estabelecidas
pecuários não podem ser observados somente sob em solos degradados (Barcellos e Vilela, 2001;
a ótica das emissões de GEE, mas devem ser Kluthcouski e Aidar, 2003).
observados também sob o contexto de balanço de Entretanto, a estimativa do valor correto
carbono, onde o sequestro de carbono também da área de pastagens degradadas no Brasil é
deve ser considerado. desconhecida, mas há consenso de que o valor é
O objetivo desse artigo é ressaltar a bastante alto e seu conhecimento é imprescindível
necessidade de observações holísticas e fundamental para o planejamento da agricultura
relacionadas à dinâmica de GEE na pecuária, brasileira, pois a recuperação e intensificação
apontando a importância de se melhorar o balanço dessas áreas de pastagens, bem como a adoção de
de carbono desses sistemas de produção, sistemas integrados como a lavoura-pecuária, os
tornando-os mais sustentáveis e evitando sistemas silvipastoris e os sistemas
desordens ambientais, como a degradação das agrossilvipastoris, permitem aumentar a
pastagens e a desertificação de áreas de produção. capacidade de suporte animal e evitam a
necessidade de abertura novas áreas destinadas à
Desenvolvimento exploração com pastagens (Oliveira, 2007). Esse
A ineficiência zootécnica e a problemática fato pode evitar a pressão de desmatamento sobre
ambiental da degradação das pastagens a floresta, permitir a diversificação das
No Brasil, Primavesi (2007) ressalta que, propriedades pecuárias, disponibilizar áreas para
dentre os desequilíbrios ambientais da atualidade agricultura e agroenergia, colocar produtos
relacionados às mudanças climáticas, a pecuários mais próximos dos centros
degradação das áreas agricultáveis é um dos consumidores, além de melhorar a imagem
pontos mais importantes, porque provoca a nacional e internacional da pecuária brasileira,
compactação, reduzindo a aeração dos solos, desgastada especialmente por sua associação com
diminuindo a infiltração de água e aumentando a o desmatamento, emissão de GEE e mudanças
possibilidade de emissão de GEE, além de o solo climáticas.
descoberto favorecer o aumento da amplitude Lal (2001) enfatiza que a mudança no uso
térmica que acelera ainda mais o processo de da terra e a degradação do solo possuem uma
degradação. contribuição importante no enriquecimento da
No caso da Caatinga, um Bioma atmosfera em CO2, sendo a degradação do solo
exclusivamente brasileiro, extensa parte de sua especialmente importante para as regiões secas,
área encontra-se antropizada de forma imprópria, onde a desertificação é um sério problema.
especialmente pelo manejo inadequado dos Segundo o autor, a adoção de práticas
sistemas produtivos, com uso do fogo e inapropriadas para o uso do solo (superpastejo,
agropecuária extensiva, culminando em solos falta de conservação do solo e consequente erosão
extremamente degradados e em desertificação, e não conservação da água) e práticas sem
com o ciclo de carbono alterado e emitindo GEE preocupação com a manutenção da fertilidade do
para atmosfera (Giongo et al., 2011). A Caatinga solo causam a depleção do estoque de carbono
teve sua cobertura vegetal original e secundária orgânico do solo e acentuam o processo de
reduzida de 460.063 km² para 443.121 km², ou degradação e desertificação. Oliveira (2007)
seja, o bioma sofreu uma perda aproximada de 2% também enfatiza a correção e manutenção da
entre 2002 e 2008 (CSR/IBAMA, 2010). Estima- fertilidade do solo e o manejo adequado das
se que a região Nordeste, que abriga a maior pastagens como forma de evitar a degradação e
extensão de área com predominância do clima como meio de promover a recuperação das
semiárido no Brasil, seja responsável pela emissão mesmas.
de 13% do CH4 e 14% do N2O emitidos pelo setor Por outro lado, Oliveira et al. (2014)
brasileiro de agropecuária (MCTI, 2014). ressaltam pontos positivos da pecuária, como o
A falta de correção do solo, de fertilização fato de o rebanho pecuário brasileiro, em especial
de manutenção e de controle da erosão, associados os ruminantes, ser basicamente alimentado em seu
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ambiente natural, garantindo grande conforto aos


animais que não ficam contidos em Emissões de gases de efeito estufa por sistemas
confinamentos, sendo sua principal fonte de de produção pecuários
alimento as pastagens (IBGE, 2010), muitas vezes Globalmente, a pecuária é responsável por
nativas, preservando a biodiversidade. Boa parte 8 a 10,8% da emissão de GEE (O’Mara, 2011).
da evolução do setor pecuário brasileiro se deve às Tendo como base a análise de ciclo de vida (onde
melhorias ocorridas nas pastagens, sendo que nas as emissões além da porteira são consideradas) a
últimas quatro décadas houve um avanço muito contribuição da pecuária está acima de 18% das
grande da forma como as pastagens são tratadas emissões globais de GEE (O’Mara, 2011). A Ásia
dentro dos sistemas de produção. Alguns é a principal fonte de emissão de CH4 entérico,
exemplos dos avanços ocorridos foram a adoção mas a América Latina, a África, a Europa
de pastagens cultivadas, a melhoria das pastagens Ocidental e a América do Norte também são
nativas, o aumento da lotação animal e o ganho importantes emissores desse gás. Essas emissões
incremental na produtividade devido à melhoria são, em sua maioria, oriundas diretamente dos
da qualidade das pastagens. rebanhos ruminantes domesticados (O’Mara,
Segundo Oliveira et al. (2014), em 1970 a 2011).
área ocupada por pastagens naturais no Brasil era No Brasil, segundo informações
de 124,4 milhões de hectares e a de pastagens apresentadas nas “Estimativas Anuais de
cultivadas era de 29,7 milhões de hectares. Em Emissões de Gases de Efeito Estufa” (MCTI,
2006 a situação já havia se invertido e as 2014), as emissões totais de GEE brasileiras em
pastagens cultivadas ocupavam 101,4 milhões de 1.203.424 Gg de CO2eq., sendo 446.445 Gg de
hectares, enquanto as nativas ocupavam apenas CO2eq. (cerca de 37%) relativa ao setor
57,3 milhões de hectares. Com relação à lotação agropecuária e 175.685 Gg de CO2eq. (cerca de
animal, em 1970, esse índice era de 0,51 cab/ha, 15%) relativa ao setor mudanças do uso da terra e
enquanto em 2006 o valor dobrou atingindo 1,1 floresta.
cab/ha. Na Figura 1, podem-se observar as
Oliveira et al. (2014), discutindo dados do emissões brasileiras de GEE (CO2eq.) de 1990 até
Censo Agropecuário 1970/2006, afirmam que, em 2012. Neste período houve decréscimo na
termos de produção de leite, a melhoria na porcentagem de participação da mudança do uso
alimentação do rebanho, em especial nas da terra no total de emissões e, como
pastagens, ajudou a aumentar a produção consequência, a agricultura e a pecuária tornaram-
nacional. Entre os anos de 1980 e 2010, a se proporcionalmente os maiores emissores
produção de leite por vaca por ano dobrou, brasileiros de GEE, mesmo tendo aumentado
passando de 676 litros para 1.340 litros, como muito pouco a emissão absoluta. O setor de
consequência de ganhos incrementais em fatores energia apresentou praticamente a mesma emissão
associados como o melhor manejo, sanidade e que o setor agropecuária, cerca de 37% das
melhoramento genético. No mesmo período, com emissões totais estimadas, aumento que é
aumento de apenas 38% no número de vacas atribuído à necessidade de uso de combustíveis
ordenhadas e queda de 6 milhões de hectares na fósseis para a geração de energia.
área de pastagens, a produção nacional de leite foi Das emissões relativas ao setor
triplicada, aumentando de 11,162 para 30,715 agropecuária, 38% são de N2O e 62% de CH4. As
milhões de litros de leite por ano, refletindo todo o contribuições dos subsetores para a emissão do
trabalho na melhoria das áreas de pastagens setor agropecuária em 2012 foram: 55,9% para a
brasileiras. fermentação entérica, 35,9% para a emissão dos
Mas, apesar todos os avanços já solos agrícolas, 4,8% para o manejo de dejetos
realizados na pecuária no Brasil, o potencial de animais, 1,9% para a cultura do arroz e 1,5% para
aumento de produção e produtividade das a queima do algodão.
pastagens e dos índices zootécnicos dos sistemas
de produção ainda é muito alto em relação à
situação nacional atual, podendo contribuir em
muito com o crescimento do agronegócio
brasileiro de forma sustentável.

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Figura 1. Emissões de gases de efeito estufa no Brasil, em CO2eq., entre os anos de 1990 e 2012. Tg =
milhões de toneladas (MCTI, 2014)

No Brasil, do efetivo de animais estratégias de aprimoramento de manejo resulta


ruminantes, 88,62% são bovinos, seguidos por em um fator médio de emissão de 59,5 kg
ovinos, caprinos e bubalinos (IBGE, 2010). A CH4/animal bovino por ano. Os fatores de emissão
emissão de CH4 entérico, que é resultado de um sugeridos pelo IPCC (2006) para a América
processo natural e intrínseco aos ruminantes Latina são 63 kg CH4/animal por ano para vacas
(MCTI,2014), aumenta com o aumento do de leite e 56 kg CH4/animal por ano para outros
rebanho nacional. O Primeiro Inventário das bovinos, valores próximos aos encontrados em
Emissões Antrópicas de Gases de Efeito Estufa pesquisas no Brasil para essas mesmas espécies
(MCT, 2004) estimou que as emissões totais de animais (Berndt et al., 2014).
CH4 entérico foram de 184,8 Gg de CO2eq./ano, Por outro lado, Berndt et al. (2014)
enquanto que o Segundo Inventário Brasileiro das enfatizam que estratégias de manejo da pastagem
Emissões e Remoções Antrópicas de Gases de ou alimento volumoso, estratégias nutricionais
Efeito Estufa (MCT, 2010) indicou emissões de (interferência direta no rúmen, a redução da
metano entérico de 241,227 Gg de CO2eq./ano. população de micro-organismos metanogênicos,
Por sua vez, o Relatório das Estimativas Anuais uso de aditivos) associados ao melhor
de Gases de Efeito no Brasil (MCTI, 2013) desempenho animal resultam em um fator médio
apresentou emissões de CH4 entérico da ordem de de emissão para bovinos de corte de 39,2 kg
246,569 Gg de CO2eq./ano em 2010. As três CH4/animal por ano, um valor 34,2 % menor do
publicações estimaram rebanhos de 158.243.229; que a média dos animais produzidos sem
207.156.696; 209.541.109 animais, estratégias de mitigação (59,5 kg CH4/animal por
respectivamente. Em 2010, a espécie bovina ano). Esses resultados indicam que há um grande
contribuiu com 96,8% das emissões de metano potencial de mitigação das emissões de CH4 sob as
por fermentação entérica, sendo apenas de 3,2% a condições de produção de bovinos no Brasil
emissão de outras espécies animais. (Berndt e Tomkins, 2013, citado por Berndt et al.,
Segundo revisão apresentada por Berndt 2014).
et al. (2014), a produção de CH4 depende da Devido a esse cenário, o mais recente
quantidade e da qualidade do alimento digerido, desafio no sistema de produção de ruminantes é
do tipo de animal, da quantidade e do grau de desenvolver dietas e estratégias de gestão que
digestibilidade da massa digerida (MCT, 2006), minimizem a produção relativa de CH4 (kg de
assim como das várias modalidades e condições CH4 / kg de carne ou leite), permitindo uma maior
de sistemas de criação dos animais. eficiência de produção e redução no impacto
Estudos realizados no Brasil demonstram negativo da produção pecuária sobre o
os benefícios da melhoria da digestibilidade da aquecimento global (Berndt et al., 2014).
dieta de ruminantes, favorecendo a ingestão De forma contrária, a emissão de N2O não
alimentar, ganho de peso e diluição das emissões tem se mostrado muito significativa nas condições
de CH4 por unidade de produto. A ausência de brasileiras de pastagens, podendo em algumas
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ocasiões, onde baixas doses de nitrogênio (N) são metas para 2020, para o setor “agropecuária”:
aplicadas em solos pobres em fertilidade, sequer reduções de 83 a 104 Mt de CO2eq. com
chegar a emitir N2O pelo processo de recuperação de pastagens, de 18 a 22 Mt de
desnitrificação. Avaliando dois sistemas de CO2eq. com integração lavoura-pecuária, de 16 a
produção, um baseado em pastagem extensiva 20 Mt de CO2eq. com plantio direto e de 16 a 20
sem nenhum tipo de adubação ou correção do solo Mt de CO2eq. com fixação biológica de N
(sistema extensivo) e outro em pastagens irrigadas (BRASIL, 2010).
e adubadas com 456 kg/ha de N por ano (20-05- Desta forma, os esforços para as
20 + 5% S), parcelado em 12 aplicações, sendo mensurações das emissões de GEE e do sequestro
seis da época das águas (36 kg de N/ha em cada de carbono na agropecuária revestem-se de muita
aplicação) e seis da época da seca (33 kg/ha por importância, porque, além da importância para
aplicação) (sistema intensivo), Oliveira et al. orientar a melhoria da eficiência da pecuária, esse
(2013) observaram que o sistema extensivo valores serão a base para a comprovação do
apresentou durante a primavera menor emissão de alcance das metas propostas.
N2O do que o sistema intensivo. A magnitude das
emissões foi muito baixa, representando, na A importância da mitigação dos gases de efeito
pastagem intensiva, somente 0,01% da quantidade estufa e da preservação ambiental.
de N aplicada naquele ciclo de pastejo, valor O manejo adequado dos solos degradados,
muito abaixo do fator de emissão [Fator de especialmente nos processos de reforma ou
emissão = (N-N2O emitido com aplicação de recuperação de pastagens, por um lado promove,
fertilizante nitrogenado - N-N2O emitido sem em curto prazo, aumento nas emissões de GEE
aplicação de fertilizante nitrogenado) *100 / tanto em função do revolvimento do solo quanto
quantidade de N aplicada] proposto pelo IPCC. devido à aplicação de fertilizantes nitrogenados.
Tal fenômeno pode ser atribuído às condições Por outro lado, em longo prazo, essas práticas
desfavoráveis à desnitrificação encontradas nos aumentam a quantidade de C armazenada no solo.
solos tropicais brasileiros, como baixa Dessa forma para a avaliação da dinâmica de GEE
disponibilidade de N, solos estruturados e bem nesses sistemas de produção, torna-se necessário
drenados, com boa porosidade e aeração (Oliveira considerar o balanço de C, que é a contabilidade
et al., 2014). entre as entradas (acúmulo de C) e saídas de GEE
Morais et al. (2013) avaliaram a emissão (N2O e CH4) dos sistemas de produção em um
de N2O durante 618 dias em uma área de capim determinado período de tempo, expresso em
elefante e encontraram perdas de apenas 726 g/ha equivalente CO2. Se o balanço de C for positivo,
de N-N2O durante o plantio convencional do subentende-se que o sistema é benéfico ao meio
capim. Nesse período, depois dos ciclos de ambiente, pois está havendo maior retenção do
colheita, as emissões de N2O foram de 173, 410 e que emissão de GEE; se o balanço for negativo,
705 g/ha de N-N2O para cada ciclo de há maior emissão do que a retenção dos GEE nos
crescimento, respectivamente, equivalente a um sistemas de produção, o que não é desejável.
fator de emissão de 0,51% com um intervalo de O controle da desertificação e a
confiança de 0,35–0,73%, quase metade do fator recuperação dos solos e ecossistemas poderiam
de emissão proposto pelo IPCC (1% da dose de N melhorar a qualidade do solo e o teor de matéria
aplicada). orgânica e, consequentemente, aumentar a
Sordi et al. (2014) avaliaram os fatores de quantidade de carbono armazenada no solo e na
emissão de fezes e urina de bovinos em pastagens biomassa, além de promover a redução da emissão
na região subtropical do Brasil e encontraram de C para a atmosfera (Lal, 2001).
valores de 0,15% para fezes e 0,26% para urina, O controle da desertificação e a
bem abaixo do fator de emissão de 2% proposto recuperação dos solos são obtidos pelo
pelo IPCC para deposição de excretas sobre o estabelecimento de cobertura vegetal com
solo. Lessa et al. (2014), também chegaram à espécies apropriadas, melhor eficiência de uso da
conclusão de que é preciso rever os fatores de água, usando a irrigação suplementar, inclusive de
emissão de N2O para as pastagens do Cerrado águas de reuso; desenvolvimento de uma
brasileiro. estratégia de manejo integrado de nutrientes que
Em 2009, na Conferência das Partes sobre enriqueçam o solo e adoção de sistemas de
mudança do clima (COP-15), que ocorreu em produção com controle da erosão e da salinização.
Copenhague, na Dinamarca, o Brasil se destacou Apesar dos custos com carbono advindos do uso
com avançadas propostas voluntárias de “Ações de insumos, como combustíveis fósseis e
de Mitigação Nacionalmente Adequadas” fertilizantes, a adoção dessas práticas é importante
(NAMAs, da sigla em inglês), com as seguintes para promover o sequestro de C no sistema. Com
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a adoção de boas práticas nos sistemas de envelhecidas e rejeitadas, além do resíduo de pós-
produção, o potencial total de sequestro de pastejo e dos dejetos depositados pelos animais na
carbono em terras sob clima árido é de 0,9 a 1,9 superfície do solo (Oliveira et al., 2014). Outro
Pg C/ano por 25 a 50 anos, antes que a taxa de fator importante que contribui para o aumento da
sequestro de C fique inexpressiva (Lal, 2001). matéria orgânica no solo sob pastagem é a
Além disso, o sequestro de C nos solos e incorporação de matéria orgânica oriunda do
ecossistemas tem inúmeros benefícios auxiliares, sistema radicular, uma vez que após o corte da
como o aumento de produtividade e a segurança planta verifica-se a morte de até 50% do sistema
alimentar, sendo necessário o estabelecimento de radicular (Moraes, 1991; Cecato et al., 2001).
políticas públicas para facilitar a adoção de Um exemplo da interferência positiva do
práticas recomendadas e para a precificação do melhor manejo e da correção e fertilização do solo
carbono sequestrado (Lal, 2001). em pastagens foi observado por Segnini et al.
O potencial de mitigação das emissões de (2013), que avaliaram o sequestro de carbono em
GEE em escala global para agricultura foi quatro sistemas de produção de bovinos de corte
avaliado no quarto relatório divulgado pelo IPCC mantidos a pasto: pastagem sob manejo intensivo
(Smith et al., 2007, citado por O'Mara, 2011), que irrigado com alta lotação (adubação nitrogenada
mostrou um potencial técnico de mitigação da com 600 kg/ha de N), pastagem sob manejo
ordem de 5.500 a 6.000 milhões de toneladas intensivo de sequeiro com alta lotação (adubação
CO2eq./ano até 2030, comparado a uma emissão nitrogenada com 400 kg/ha de N), pastagem sob
projetada para o mesmo ano de 8.200 milhões de manejo intensivo de sequeiro com lotação animal
toneladas CO2eq./ano. A maior parte desse valor moderada (adubação nitrogenada com 200 kg/ha
(89%) está relacionada ao sequestro de C do solo. de N) e pastagem degradada, comparados com a
O potencial técnico de mitigação para o CH4, Floresta Estacional Semidecidual no Bioma Mata
proveniente da fermentação entérica, manejo de Atlântica. O manejo adotado nos sistemas de
dejetos e manejo das culturas de arroz, foi produção afetou o estoque de C no solo nas
somente de 9% do total, ou aproximadamente 500 camadas de 0 a 30 cm e de 0 a 100 cm de
milhões de toneladas de CO2-eq./ano. Menos da profundidade. Os maiores estoques de C foram
metade disso foi relativo à fermentação entérica. observados para os sistemas sob manejo intensivo
Os solos da região Semiárida brasileira de sequeiro com alta e moderada lotação animal e
têm sido submetidos a intenso processo de o mais baixo estoque para a pastagem degradada
degradação e desertificação, devido à atividade em ambas as profundidades. Os estoques de
agropastoril extensiva, calcada em sistemas de carbono (0 a 100 cm) variaram de 99,2 Mg/ha de
manejo convencionais, associada à mudança de C na pastagem degradada a 142,4 Mg/ha de C na
uso da terra (substituição da vegetação nativa por pastagem de sequeiro com média lotação animal,
culturas), principalmente por meio de queimadas e enquanto que na Floresta Estacional Semidecidual
da retirada de madeira. Isto tem reduzido os o valor foi de 115,5 Mg/ha. Nos sistemas de
estoques de carbono no solo e aumentado a sequeiro de alta e moderada lotação animal foram
emissão de GEE para a atmosfera (Ferreira et al., observadas taxas de acúmulo de C na camada de 0
2014). Neste sentido, estratégias como a adoção a 100 cm de 1,93 e 1,80 Mg/ha de C por ano,
de sistemas conservacionistas, baseados em menor respectivamente, mostrando um favorável
ou nenhum revolvimento do solo, no aumento do acúmulo de carbono nos sistemas mais
aporte de resíduos vegetais e na rotação de intensificados.
culturas, além da implantação de pastagens e A simulação de um balanço entre as
florestamento com espécies nativas, podem emissões e as remoções de GEE num processo de
recuperar os estoques de C e mitigar as emissões recuperação direta de pastagem é apresentada na
de GEE nesse bioma (Ferreira et al., 2014). Tabela 1. É possível observar que o balanço é
Em pastagens sob manejo intensivo, positivo, com um saldo de 7,68 Mg/ha de CO2eq.
observa-se ao longo dos anos aumento no teor de sequestrado anualmente, garantindo o abatimento
matéria orgânica e consequentemente da das emissões dos animais, importante para a
capacidade de troca de cátions do solo; assim, sustentabilidade da atividade pecuária (Oliveira et
ocorrem por vezes teores maiores de matéria al., 2014). Além das emissões provenientes dos
orgânica nas áreas de pastagem sob manejo animais e do uso de fertilizantes, outras emissões
intensivo do que na área de mata não antropizada também deveriam ser consideradas, como o
localizada na mesma gleba (Oliveira et al., 2014). trânsito de máquinas e equipamentos agrícolas, o
Isso acontece porque durante o manejo da que deve ser foco de futuros estudos (Oliveira et
pastagem há perdas de pastejo, representadas al., 2014).
pelas folhas e pelas hastes quebradas,
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O potencial de mitigação da emissão de Entretanto, opções de mitigação devem


N2O para as condições brasileiras necessita de ser consideradas e mensuradas, como o uso de
mais informações, visto que, no momento os fontes alternativas de fertilizantes, uso de
trabalhos estão focados na obtenção dos fatores de inibidores de urease, uso de inibidores de
emissão desse gás. Zanata et al. (2010) avaliaram nitrificação, adoção de nutrição de precisão na
o impacto da aplicação de fertilizantes dieta dos animais, especialmente no que tange ao
nitrogenados nos fluxos de N2O e CH4 em um correto balanceamento da proteína, adoção de
Gleissolo no Sul do Brasil, e obtiveram redução pastejo rotacionado, melhorando a distribuição da
das emissões de N2O do solo pelo uso de fontes deposição dos dejetos (fezes e urina) nas áreas de
amoniacais e amídicas em detrimento de fontes pastagens, conservação e manutenção da estrutura
nítricas. Os fertilizantes de liberação lenta e com bem aerada dos solos, adoção de um programa de
inibidores de urease também são alternativas recomendação de fertilização nitrogenada que leve
potenciais visando à mitigação das emissões de a menores perdas, dentre outros.
N2O para atmosfera (Snyder et al., 2009; Zanata et
al., 2010).

Tabela 1. Simulação de um balanço entre as emissões e remoções antrópicas de GEEs, considerando-


se apenas os principais processos produtivos.
Estoque Estoque Carbono C emitido Lotação N2O Diferença
Tempo
Tipo de vegetação de C† de C sequestrado£ bovino€ Animal emitido§ líquida

Mg/ha. Mg CO2 Mg CO2


anos Mg/ha Mg CO2 eq. Mg CO2eq. n/ha
ano eq. eq.

Cerradão 0 129

Pastagem Extensiva 27 174 1,7 6,1 0,975 1 0,88 4,3

Pastagem Bem
manejada 30 223 3,13 11,49 0,975 3 0,88 7,68

Fonte: Oliveira et al. (2014)


† estoque de C na profundidade de 0 a 100cm, segundo Segnini, et al. (2007)
£ usado o fator de conversão 3,67
€39 kg CH4/animal/ano, segundo Primavesi et al. (2012)
€39*25=0,975 kg Mg CO2 eq. /animal/ano, considerando-se um fator de correção de 25, oriundo do potencial
de aquecimento 25 vezes maior do metano em relação ao gás carbônico (IPCC, 2007)
§3 kg N2Oóxido nitroso/ha, 296*3=0,88 t CO2 eq./ha, considerando-se um fator de correção de 296 (IPCC,
2007).

O potencial de mitigação para o CH4 prazo, mudanças estruturais e de manejo e o


entérico foi considerado em três grande categorias melhoramento animal.
por Smith et al. (2007), citado por O'Mara (2011), No Brasil, Berndt et al. (2014) enfatizam
sendo: (i) melhoria das práticas de alimentação que as principais estratégias para a redução da
(incluindo a substituição de forragens por emissão de CH4 entérico envolvem: melhoria dos
concentrados, melhorando as forragens, incluindo índices zootécnicos de produção e reprodução
leguminosas e mais fontes de gordura nas dietas); (redução da idade de abate, redução do intervalo
(ii) uso de aditivos e agentes de redução da entre partos, redução da idade a primeira cria);
emissão de CH4 entérico, tais como somatotropina reduzindo a necessidade de matrizes
bovina, hormônios estimulante do crescimento, sobressalentes e aumentado a longevidade
ionóforos e precursores de propionato (embora reprodutiva das vacas; melhoria do mérito
com pouca aceitabilidade e aplicabilidade em genético dos animais e das plantas forrageiras;
muitas regiões do mundo); (iii) bem como a longo utilização de aditivos e suplementos alimentares;
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melhoria da conversão alimentar; melhoria do A degradação de pastagens, o mais


manejo dos animais e da pastagem e uso de água importante problema ambiental da pecuária,
de boa qualidade, garantindo animais saudáveis, também pode contribuir para a emissão de GEE e
pois animais doentes emitem mais GEE e pode levar à desertificação. Ações de mitigação
possuem seu desenvolvimento comprometido; e dessas emissões podem amenizar esse problema e
melhoria do bem-estar animal, livrando os devem ser observadas considerando-se o balanço
animais de stress. Em termos de manejo de carbono dos sistemas de produção pecuários.
nutricional e manipulação do rúmen, estratégias Na pecuária, existe possibilidade de mitigação das
específicas devem ser consideradas como emissões de GEE pela redução da emissão do CH4
alternativas que sejam drenos para o H2 produzido e do N2O, entretanto, o maior potencial de
pela fermentação entérica e redução da população mitigação está no sequestro de carbono que ocorre
de microrganismos metanogênicos como as durante a recuperação das pastagens. Apesar
Archaea devem ser consideradas (Joblin, 1999, disso, grande ênfase é dada aos aspectos
citado por Berndt et al., 2014). envolvendo a emissão de CH4 entérico pelos
Berndt, et. al. (2014), elaboraram uma ruminantes e suas formas de mitigação. Esse fato
revisão de estratégias nutricionais e de manejo tem levado à publicação de artigos científicos com
para reduzir a emissão de CH4 entérico e o efeito visão restrita em importantes meios de
sobre a produção animal potencial. As estratégias comunicação científica. A adoção das tecnologias
incluem uso de manejo intensivo de pastagem, uso que promovem a mitigação das emissões de GEE
de grãos e alimentos concentrados na dieta dos depende, especialmente, de questões econômicas
animais, processamento adequado das forragens e não somente da viabilidade técnica das ações de
conservadas de modo a aumentar sua mitigação propostas.
digestibilidade, uso de leguminosas, de taninos,
saponinas, compostos secundários, óleos Agradecimentos
essenciais, adição de óleos e gorduras saturadas Ao CNPq pelo financiamento do projeto
ou insaturadas, ionóforos, nitrato, leveduras, 562861/2010-6,
malato e fumarato. À Embrapa pelo financiamento da rede de
O'Mara (2011) enfatiza as implicações pesquisa PECUS,
econômicas para a problemática da dinâmica de À CAPES pelo financiamento do projeto CAPES
GEE e relata que existem tecnologias para a x EMBRAPA de bolsas de estudo a alunos de
mitigação desses gases, mas elas são limitadas e pós-graduação.
há implicações de custo que restringem o seu uso.
Esse fato destaca a necessidade de Referências
desenvolvimento de formas de computar esses Barcellos, A.deO., Vilela, L., 2001.
custos para garantir a adoção das tecnologias já Restabelecimento da capacidade produtiva de
existentes. Em muitos casos, as tecnologias para a pastagens por meio da introdução de Stylosantes
mitigação da emissão de GEE possuem potencial guianensis cv. Mineirão. Embrapa Cerrado,
técnico maior que o potencial econômico e esse Planaltina. (Embrapa Cerrado. Comunicado
processo é dependente do preço que pode ser pago técnico, 65).
pela tonelada de CO2-eq. mitigado. Para o CH4, Berndt, A., Alves, B.J.T., Barioni, L.G., Boddey,
cujo potencial de mitigação seria de 500 milhões R.M., 2014. Mitigação da Emissão de Gases da
de toneladas de CO2-eq./ano (metade desse valor é Produção Animal, in: Palhares, J.C.P., Gebler,
representado pelo CH4 entérico), ao preço de L. (Eds.), Gestão Ambiental na Agropecuária.
US$20/tonelada de CO2-eq., o potencial de Embrapa, Brasília, pp. 285-318.
mitigação seria reduzido a menos que 150 milhões BRASIL, 2010. Nota nº 31, de 29 de janeiro.
de toneladas de CO2-eq./ano (O´Mara, 2011). No Disponível:
caso da melhoria das pastagens degradadas, que http://www.mre.gov.br/portugues/imprensa/no
têm o maior potencial de redução de emissão de ta_detalhe3.asp?ID_RELEASE=7811 Acesso:
GEE pelo sequestro de carbono (cerca de 800 12 abr. 2010.
milhões de toneladas de CO2-eq./ano), os custos Cecato, U., Cano, C.C.P., Bortolo, Herling, V.R.,
envolvidos são bastante elevados. A um preço de Canto, M.W. do, Castro, C.R. de C., 2001.
US$20/tonelada de CO2-eq., o potencial de Teores de carboidratos não-estruturais,
mitigação pela melhoria das pastagens seria nitrogênio total e peso de raízes em coastcross-1
reduzido a menos de 200 milhões de toneladas de (Cynodon dactylon (L.) Pers) pastejado por
CO2-eq./ano (O´Mara, 2011). ovinos. Revista Brasileira de Zootecnia 30, 644-
50.
Conclusão
631
Oliveira, P. P. A.
Revista Brasileira de Geografia Física V. 08, número especial do IV SMUD (2015) 623-634.

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