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VARIAÇÕES
IMÊf
SOBRE 0
# R I O D E JA*EDR.0
Iitvraria. Liaao-Braslloirci
M. Piedade & C—BditOro» •
#6 - 1R.U4 DA A S S E M B L E 4 *- 46
VARIAÇÕES SOBRE O "FLIRT
9^
*
OBRAS DO AUTOR
A s Religões n o Rio, 7- m i l h e i r o — E d i t o r
Garnier.. 7
RIO DE JANEIRO
L,ivraria t u s o - B r a s i l e i r a
M. Piedade & C — E d i t o r e s
46 - RUA DA ASéEMBLEA - 46
1907
A. Madame de E
Minha Senhora,
D essa preterição i r r a c i o n a l v e m
1
E o flamengo ?
Tres mullures valem um mercado.
E o normando ?
—11—
Be mulher e de cabellos
Sempre ha o que dizer
E o italiano ?
V
— 12
— A s mulheres t e m u m a alma
de reuda.
o que v e m a ser u m a a l m a de fia
de seda, de fio de l i n h a , que co-
meça, faz ponto, a f r o u x a , é r e l e v o
a g u i , depressão acolá, f o r m a vié<
zes, curvas, flores, bichos, nomes,
e que, uma vez acabada, não se
sabe p o r onde acaba nem princi-
pia, labyrintho perturbador da
sensação...
Quando o homem não d i z m a l ,
d o u t r i n a — o que é peior. Já um
a n a l y s t a assegurou com g r a n d e gra-
v i d a d e o s e g u i n t e : « N ã o h a nessa
c r e a t u r a que parece tão profunda
m e n t e estudada senão paixão e
a m o r , d e v o t a m e n t o ou d u p l i c i d a d e ,
irresistivel pudor ou indon ayel
desejo. Mas as v i r t u d e s como os
v i c i o s a h i se e n c o n t r a m em estado
endêmico, g e i m e n s q u e p o d e m flo-
rescer ou perder se, segando a s
13
— 17 —
— IX —
panhia, élla, que è ineontentavel,
quiz t e r todos os d i r e i t o s e i n v e n -
t o u esse b r i n q u e d o t u r t u r a n t e q u e
todo o m u n d o c h a m a o «Flirt...
W horrível. H a peior.
O sábio Dr. E o u x no Tnstinçt
(VJfrnour, assegura : — o flirt é a
conquista amorosa sem amor, ê o
desejo de inspirar o amor sem o
sentir. No flirt, cada u m dos adver-*
sarios, s i m ! é esse o nome que se
lhe deve dar ! cada u m dos adver-
sários acredita enganar e não en-
gana, não imagina mesmo que o
enganado é elle. R i das palavras
que diz e não percebe a i r o n i a das
que ouve ; pensa quasi sempre l u -
d i b r i a r e é a si mesmo que burla ;
ri i n t i m a m e n t e dos sentimentos
que finge e não sente ser apanhado
na rêde da comedia. O flirt é a
l u t a amorosa.
E ?
ainda horrível. Mas, feliz-
mente, encontra a gente opiniões
mais suaves. Oct?,vio Uzanne de-
finiu a coisa por gráos, que podiam
ser de exame e podiam ser de
20
A trahição é um ensinamento na
D u v i d a perpetua. Os grandes sen-
timentos dissolvem-se ; as grandes
phrases t o m a m na conversa pro-
porções de megatheriuns assusta-
•
^^m ^W^Ê 23 —
:: ;
~
dores ; teme-se o espasmo e o êx-
tase, e tem-se o frenesi de os obter.
Se o Creador não tivesse feito as
coisas cá por b a i x o menos mal, se
a psyohologia, depois, não v e r i f i -
casse, que no indivíduo são iude-
pendentes da volição e por conse-
qüência do cérebro, as funeções da
v i d a inconsciente, essa vida. peri-
» garia de certo. A sociedade só
chega ao fim por esquecimento, a
sociedade teme, a sociedade não se
assusta com o que dizem delia,
assusta-se por talvez não encontrar
o que almeja.
E' a neurastbenia. Daneurasthe-
nia resultou a delirante crise de
sport. da fúria, da força e das velo-
cidades hábeis, que actualmente
agita o homem. O F l i r t é uma con-
seqüência dessa conseqüência ; —
é u m sport, è a « cabra cega » do
amor, em que o homem t e m os
Í
— 24 —
* *
Todas as coisas são boas e são
más. Ampliando, generalisando,
englobando, chega-se à neurasthe-
nia diffusa como sua origem. Aua-
lyzando-o apenas, detalhando-lhe
a obra, fazendo a anatomia da sua
essência perversa encontramos-lhe
uma serie longa de superioridades
e de distincções.
A p r i m e i r a ê a differença entre
o f l i r t e o n.imoro. Namorar é an-
t i g o e v i r t u a l m e n t e democrático,
namorar é deplorável e velho. Já
Horacio, o poeta gorducho de Me-
cenas, dizia : — a pastora forma o
b'eijo para que o pastor o roube.
Já todos sabem que, quando j u l g a
dar o abraço de posse perpetua, o
homem sempre vão e vaidoso mur-
mura :—meu bem ! o que é o maior
dos paradoxos da espécie homem
desde o Paraizo. O namoro è m i l -
lenar, mas está para o f l i r t como
u m a proporção a r i t h e m e t i c a para
uma geométrica. Os que n a m o r a m
são simples, sem espirito e c o m
m u i t a carne; os que f l i r t a m t e m
espirito quasi tanto quanto carne e
ásvez^s até mesmo mais. U m ra-
pazola namorador não passa das
phrases consagradas, dessas tão ve-
lhas que parecem velhas sempre
alegres:—Quem me déra ser pedra
pai a a sra. pizar ! Ou então :—Se
eu pedir, yayá. você me dá? Os
jovens ãernier batteau, os P r i o l a
incipientes, dizem nos salões em-
quanto as orchestras desfiam v a l -
sas enervantes :—Sabe V. Ex. que
está allucinadora 1.. ou então:
Que nuca a t u a ! U m beijo para a
m i n h a v i d a !... O f l i r t só pertence
á nata, ao escól, ao dessus ãu pa-
bier] ao pessoal ãêrnière petrolette,
o pessoal que custa a se compro-
metter, veste bem, cria em torno
uma athemosphera de excitantes,
e, antes de f*è entregar completa-
mente, reflete com calma na vida,
na carteira de cambio e nas suas
conseqüências. N u n c a passou pela
imaginação de ninguém o f l i r t de
u m vendedor de balas ou de uma
lavadeira. E uma idéia que h o r r i -
?
pila. E n t r e t a n t o , ao v e r tres ou
quatro cavalheiros com quatro ou
cinco damas em torno ao samovar
de um chá das cinco, ou n u m baile,
entre espaduas núas e p e i t i l h o s re-
luzentes, não ha quem não diga :
Nossa Senhora ! Que f l i r t a t i o n !
'Que flirtage ! — p a r a i r , invejo*
saniente. lazer o mesmo a l l i ade-
ante.
No cerebio do homem de soeie-,
dade a noção de f l i i t já se radicou a
t a l ponto que nã) ha homem capaz
de conversar dez minutos com uma
senhora, sem que lhe emprestem ou
que elle mesmo tenha a intenção
de aproveitai-os nessa espécie de
trottoir roulant do Amor... Flirta-se
como se fuma : é u m costume ad-
quirido, è u m habito, é u m vicio
permettido. Seria mesmo reparado
que não se flirtasse. O f l i r t é como
o charuto. Fornece a breve illusão
no seu leve fumo. faz mal aos que
o experimentam pela p r i m e i r a vez,
e, quando se'apaga não se o torna
a accender—porque ninguém ac-
cende um charuto apagado como
não ha quem o fume todo, com
m e d o á q u e i m a d u r a do lábio...
D'ahi o u t r a distiucção : a com-
pleta amoralidade de que è elle
amostra. Nós andamos m u i t o pou-
co certos da v i d a para termos tem-
po de a m a r com paixão. O amor é
u m a c a l d e i r a d a egoistica p a r a vo-
razes glutões.
O f l i r t ^alta do a p e r i t i v o ao café
da sobremezae n a t u r a l m e n t e é cy-
nico, è canalha, é a m o r a l .
Amoral sim ! A moralidade é
uma facecia tristonha que cada
qual usa conforme entende para
a t a c a r o próximo, O f l i r t é amo-
ral, como o derriço do b a i x a classe,
e essa amoralidade, a completa
ignorância da c r i m e é que salva-
g u a r d a o estado das camadas so-
eiaes. Se tirassem u m a costureira
modesta, que ama o seu rapaz ou
mesmo os seus rapazes, ^ a r a u m a
festa de caridade ou um b a i l e onde
flirtaru as/W Ufjkt e as prôjlmo-
'nal beautp-s do estação, a costu-
r e i r a achará isso uma pouca ver-
gonha. E<u compensação u m a gran-
de dama não s u p o r t a r i a nem a
v i s t a de um «reconhecimento» de
costureiras à sabida do a t e l i e r . . .
O f l i r t t e m além d a elegância e
da a m o i a l i d a d e a renovação das
expressões nos diálogos e a m a r c a
indelével de u l t i m a obra, de vieili
de paráitre da seducção f e m i n i u a .
Que seria R o m e u h o j e ? bem gran-
de cacete. Paulo e Virgínia e n t r e
as bananeiras da I l h a de França?
b e m intolerável a b o r r e c i m e n t o . E
Hernaui? E Othelo ? Dv Juan
mesmo p a r a resistir teve que- mu-
dar de nome. Já ninguém namora
hoje encostado a u m I a m )eão de-
f r o n t e da j a n e l l a da apaixonada,
n e m h a quem d i g a a serio :—«In-
— 30
•i
34 —
se Fallières ou o Dr. Afíbnso
Penua escolhessem um simples
bispo para esse serviço secreto ?
Se dissermos a uma grave m a t r o n a
que respeita Bossuet: a X está
flirtando com o ioven H : a ma-
trona porá as mãos na cabeça,
-totalmente escandalisada desse *
meio directo de approximação.
Devemos censurai-a por isso ? Não!.
EUa também i)intou o sete, se
p i n t a r o sete é obedecer ás leis
íataes"da natureza. Apenas p i n t o u
de outra maneira e com outro gê-
nero de conducções.
H a no mundo coisas m u i t o d i -
versas, que teem uma secreta cor-
relação. O amor no R i o evoluiu
com a viação urbana...
No tempo da colônia, por exem-
plo, os gêneros de conducção eram
a cadeirinha e a rêde. Viam-se
passar pelo L a r g o do Paço sujeiti-
r
nhos, m u i t o bem deitados n'uma
rêde indiana, ao trote de dois po-
bres negros. A cidade t i n h a um
aspecto de África do norte, A r g e l
menor, sem francezes domiciliados
mas com assaltos de francezes. A s
casas eram caiadas de branco, sem
janellas, apenas com u m pequeno
postigó ; e, quando janellas havia,
essas eram gradeadas.
A s filhas dos colonisadores eram
como os escravos, sua propriedade.
Não sabiam ler e passavam o d i a
a conversar com as mucamas — o
que de certo também f a r i a m os i r -
mãos e algumas vezes os paes.
Quando o noivo escolhido pelo
progenitor indagava :
— Dona, que r casar commigo %
A menina baixava os olhos e
respondia :
— Não sei ; se pàpá quizer...
36
x i m a t i v o , as procissões, as missas,
porque havia missa a toda a hora :
— a missa das quatro em S. José, a
missa das cinco, a missa das sete, a
missa das oito e meia, a das nove, a
das onze, e até a missa do t i r o de
peça. O namoro precisou de um sa-
christão e surgiu o moleque para os
recados.
Vieram depois as tres etapas da
locomoção democrata: a gondola
a séceò, o bonde e o electrico E a
?
Sinhasinha presumida
Com seu cabello loiro,
Fica toda delambida
Com a carta de namoro.
41 —
A carta é u m estylo l i t t e r a r i o . Os
nossos paes deviam ser terrivel-
mente lettrados. Mas não foram.
O estylo tropeçava na emoção, e
de vez em quando a franqueza era
mais forte do que a fantasia. Hou-
ve um que terminou a missiva
neste g r i t o d'alma.
Beste qu de ti se esconde
fi
de batucar um prelúdio, t e m d i a n t e
, de si o escolho da perdição.
W preciso saber tocar, harmo-
nisar os temperamentos, afinal-
os pela diapasão do mais forte.
O fliit ensina se pela Espécie de
flirteuses. Encontramos por exem-
plo aflirteuse. profissional, uma se-
nhora que t e m em geral o v i c i o de
ver todos os homens a seus pés
p a r a m e t t e r ferro ás amigas, con-
vencer-se da sua radiosa belleza e
prosperar. Orça pelos t r i n t a e tan-
tos e toda a gente a chama : a bélla
mme. Gonzaga. Esta dama é vai-
dosa como uma artista, a r t i f i c i a l
como um cômico, e i n t e i r a m e n t e
insensível. Que fazer? Mirtar 1
Como ? O coro de Thanauser, phra-
ses de eífeito e de obrigação. V e m
em seguida ãflirteuse iugenua, que
faz isso por instiucto lançando a
isca do casamento um, dois, tres
_ 48 —
— l i ! )—
Hontem no baile...
O flirt renovou tudo isso,—por-
que a mulher o quiz e o que quer a
mulher quer Deus...
k apparecer:
HORAS DE CIRCO
DE
João do (Rio
I
Edições desta livraria
DOTE, comedia em. três
S;«ctos de A. xAxpcdo.... 2$Q00
M ORÁCULO, comedia cm . i $ o b o
í^^lfcto-fi-^. Azevedo..
O CANDIDATO, comedia em
um acto em verso de
''jpaüfi... • • . • • '•
.HORIZONTES, v e r s o s de »
•; ' Eduardo Nazareno 2$ 5 00
. GIOÇONDA, ^tragédia em-4
actosde Gabriele "D 'Au-
nuuzio^»duc'ção de O.
2 $00O
Duque-Estrada .,.«..-..-
Í||ÍWO-^RÉL©,4 sahir:
^^IB™VERME7.HO, r o -
mance brasileiro de Do-
^^pingôsRibeiro Filho.. ..2$0OO
NOÇÕES DE^PHARMACIA GA-
|f'^Bp\, por Tcdro Jiu-
5 $000