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Fraude,

Fome e
Fascismo
Autor:
Douglas Tottle

Tradução
Leonardo Griz Carvalheira

Introdução ao estudo do
Holodomor
Klaus Scarmeloto

Posfácio
João Carvalho
Fraude,
Fome e
Fascismo
Autor:
Douglas Tottle

Tradução
Leonardo Griz Carvalheira

Introdução ao estudo do
Holodomor
Klaus Scarmeloto

Posfácio
João Carvalho
Copyright ©2022 – Todos os direitos reservados a Editora Raízes da América.

Diagramação: Gabriel Felipe Silva


Autor: Douglas Tottle
Tradução: Leonardo Griz Carvalheira
Prefácio: Klaus Scarmeloto
Posfácio: João Rafael Chío Serra Carvalho
Capa: Brunno Eduardo de Oliveira da Silva

Conselho Editorial:
João Rafael Chío Serra Carvalho: Mestre em História Social pela USP,
Doutorando em História Social da Cultura pela UFMG;
Apoena Canuto Cosenza: Mestre em História Econômica pela USP, Doutor
em História Econômica também pela USP.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


Tuxped Serviços Editoriais (São Paulo, SP)
Ficha catalográfica elaborada pelo bibliotecário Pedro Anizio Gomes - CRB-8 8846

T721f Tottle, Douglas.

Fraude, Fome e Fascismo: o mito do genocídio ucraniano de Hitler a Harvard / Douglas Tottle; Tradução de Leonardo
Griz Carvalheira; Posfácio de João Rafael Chío Serra Carvalho. – 1. ed. – São Paulo : Editora Raízes da América, 2022.
272 p.; il.; gráfs.; fotografias. 16 x 23 cm.

Título original: Fraud, Famine and Fascism: The Ukrainian Genocide Myth from Hitter to Harvard.
Inclui bibliografia.
ISBN 978-65-994637-7-8.

1. Antifascismo. 2.Comunismo. 3. Fascismo. 4. Marxismo-Leninismo.


I. Título. II. Assunto. III. Autor. IV. Tradutor.

CDD 320.531
CDU 316.323.72

ÍNDICE PARA CATÁLOGO SISTEMÁTICO


1. Socialismo e sistemas relacionados: Comunismo, Marxismo, Leninismo.
2. Ciência política: Socialismo, Comunismo e Marxismo.

1ª edição: fevereiro de 2022


Em memória

Carlos Campos Rodrigues Costa


Intelectual, 72 anos. Membro do Partido desde 1943 e funcionário do Par-
tido desde 1951. Foi membro do MUD Juvenil desde o seu início, foi membro
da sua Comissão Central e funcionário. Pertenceu ao Comité Local de Fafe do
PCP (1948) e foi responsável pela organização do Algarve. Em 1961 foi cha-
mado ao trabalho do Secretariado do CC. Foi responsável pela DOR Lisboa
e pela Juventude. Foi responsável pela DOR Norte. Cerca de 15 anos de pri-
são. Participou na fuga de Peniche (1960). Membro do Comité Central desde
1960. Membro do Secretariado do CC de 1975 a 1990 e da Comissão Polí-
tica do CC de 1974 a 1988. Foi membro da Comissão Central de Controlo e
Quadros de 1988 a 1992. Foi membro do Conselho Nacional de 1992 a 1996.
É membro da Comissão Central de Controlo.

Eduardo Neves
Vasco Trindade
CAMARADA CHARLES ENGELS, PRESENTE!
Em primeiro Lugar, seria impossível descrever a trajetória de vida de uma
pessoa tão grandiosa, sem antes citar uma frase muito conhecida de um dos
seus revolucionários mais admirados. “ permita-me dizer-vos, com risco de
parecer ridículo, que o verdadeiro revolucionário é guiado por grandes senti-
mentos de generosidade, é impossível imaginar um revolucionário autentico
sem esta qualidade” (CHE GUEVERA)
E é exatamente assim, que podemos descrever a memória do camarada
Charles, sempre muito motivado por grandes sentimentos de generosidade e
compromisso com a verdade.
Um homem de ideias brilhantes, preocupado com o próximo e com as
injusticas sociais que permeiam nossa atual estrutura política. Historiador,
comunista e professor, o camarada dedicou grande parte de sua vida, desen-
volvendo trabalhos nas redes sociais, onde disseminava conhecimento e atuava
politicamente com o fim de informar e influenciar diversos segmentos sociais.
Sua página no facebook, o “Acervo do conhecimento histórico”, possui
atualmente mais de 200 mil seguidores, permanecendo ativa através da ajuda
de moderadores de inteira confiança. Além desse trabalho, o camarada possuía
outros projetos nas redes sociais e em outras mídias como, o Instagram com o
“acervo histórico” que acumulava um total de 60 mil seguidores, também pos-
suía seu canal no youtube, “opinião do professor” onde o mesmo expressava
sua análise política sobre a sociedade. Recentemente, construiu um estúdio de
gravação, onde pôde realizar muitos debates políticos nas eleições municipais
de 2020 trazendo diversos candidatos para apresentarem seus projetos, apenas
com o intuito de esclarecer as massas. Ele também criou a conhecida comuni-
dade Josef Stalin e a página de mesmo nome no Facebook. O professor Charles
se declarava MARXISTA-LENINISTA com orgulho e fazia valer o nome que
carregava de Friedrich Engels, por ser um revolucionário leal e fiel as suas con-
vicções.
Perdemos um companheiro de grande prestigio e influencia, mas ganha-
mos um grande referencial de luta de classe, um verdadeiro apaixonado pelo
revolução, suas ideias sempre perduraram em cada camarada que o conheceu,
pois seu legado e sua memória sempre estarão presentes dentro de cada passo
e avanço de uma sociedade mais justa onde o povo viva de forma digna.
Sua luta política começou muito jovem na militância do (PCB-PA), Par-
tido Comunista Brasileiro, onde pertenceu a (UJC) União da Juventude Co-
munista, no final da década de 90. Em 2008, foi dirigente do comitê provisório
do (PCB-PA), junto com alguns camaradas leais ao partido, em 2020 o cama-
rada voltou ao partido comunista, onde participou do ativo do (PCB-PA) atu-
ando na célula dos servidores, como secretario de formação.
Mas tudo isso só foi possível, graças a influência de seu avô Roberto Sales
Moraes e seu pai Giovani Tacilo Garcia Moraes, ambos comunistas, que con-
duziram com muito êxito um homem que soube desenvolver suas próprias
analises políticas e sociais.
Capaz de contagiar as massas, com seu carisma e discurso muito bem fun-
damentados em conhecimento, ideias e princípios verdadeiros, o professor
Charles, era muito querido nos lugares em que atuava, Jamais encontraremos
outro com tanta determinação, amado e odiado pelos que tentaram negar a
verdade e a justiça.
Para o professor Charles, a grande arma reside no conhecimento, nos fa-
tos reais, tendo como testemunho sempre a verdade, e aqui estamos buscando
ela, dia após dia, e onde quer que o camarada esteja, a memória dele vive em
nossos corações junto com o sentimento de revolução que ele nos despertou.
“HASTA LA VICTORIA, SIEMPRE” EM MEMORIA DE CHARLES EN-
GELS CHAVES MORAES

Nanci Luana Souza


SUMÁRIO

I INTRODUÇÃO AO ESTUDO
DO HOLODOMOR
ORIGEM DO CONCEITO DE HOLODOMOR E SEU OBJETIVO ATUAL .......... 15

FUSÃO DO NAZISMO E DO LIBERALISMO................................. 26

HOUVE RESISTÊNCIA A COLETIVIZAÇÃO E A INDUSTRIALIZAÇÃO?....... 33

PAPEL DOS KULAQUES NA FOME ......................................... 41

CONFLITO ENTRE OS “REVISIONISTAS” E OS “TOTALITÁRIOS”:


TAUGER CONTRA CONQUEST.............................................. 47

FRAUDE NOS NÚMEROS DE MORTOS E A DESCONSIDERAÇÃO DOS DADOS


DEMOGRÁFICOS.......................................................... 53

OS GRÃOS FORAM ENVIADOS PARA SERVIR OS MILITARES NA GUERRA


CONTRA O JAPÃO ...................................................... 59

CAUSAS NATURAIS SÃO IGNORADAS PELOS CRÍTICOS.................... 62

OS CAMPONESES TRABALHAM AINDA MAIS DURO E PRODUZIRAM MAIS


APÓS A FOME DE 1932.................................................. 71

Ordens de Ajuda para o Povo Ucraniano............................ 72

ANEXO I................................................................ 74

ANEXO II............................................................... 76
SUMÁRIO

II FRAUDE, FOME E
FASCISMO
AGRADECIMENTOS........................................................ 87

INTRODUÇÃO ............................................................ 89

CAPÍTULO 1: THOMAS WALKER, O HOMEM QUE NUNCA EXISTIU .......... 93

CAPÍTULO 2: A CAMPANHA DA IMPRENSA DE HEARST CONTINUA......... 101

CAPÍTULO 3: FOTOS DA FOME: QUAL FOME?............................ 111

CAPÍTULO 4: GUERRA FRIA I: FEITOS SOMBRIOS...................... 125

CAPÍTULO 5: O JOGO DOS NÚMEROS .................................... 135

CAPÍTULO 6: GUERRA FRIA II: A CAMPANHA DOS ANOS 1980 .......... 149

CAPÍTULO 7: A COLHEITA DA DECEPÇÃO................................ 169

CAPÍTULO 8: A FOME................................................... 185

CAPÍTULO 9: COLABORAÇÃO E CONSPIRAÇÃO............................ 199

CAPÍTULO 10: CRIMINOSOS DE GUERRA, ANTISSEMITISMO E A


CAMPANHA DA FOME-GENOCÍDIO ......................................... 217

APÊNDICE: DE PROPAGANDISTA DO TERCEIRO REICH A AUTOR DA


FOME-GENOCÍDIO........................................................ 231

NOTAS .................................................................. 239

Bibliografia.......................................................... 257

POSFÁCIO: Uma Batalha pela História .............................. 267


INTRODUÇÃO AO
ESTUDO DO HOLODOMOR
ORIGEM DO CONCEITO DE HOLODOMOR E SEU OBJETIVO ATUAL| 15

ORIGEM DO CONCEITO DE HOLODOMOR E SEU OBJETIVO


ATUAL

Estudar o Holodomor significa, basicamente, trabalhar um tema espinho-


so, de grande polêmica e que afeta a sensibilidade pública já que, tradicional-
mente, afirma-se que boa parte do povo ucraniano foi vítima de um genocídio
— causado intencionalmente pela política comunista Soviética — para minar
a resistência do nacionalismo ucraniano supostamente apoiado pelas massas.
Nesta Perspectiva, o Holodomor está ligado a produção das emoções, atin-
gindo as gerações mais atuais de ucranianos.
O termo “Holodomor” foi deliberadamente cunhado para soar semelhante
a “Holocausto”.
Alguns nacionalistas ucranianos afirmam que a fome causou números es-
palhafatosos entre 7 a 10 milhões de mortos, a fim de igualar ou ultrapassar os
6 milhões do Holocausto judeu (o título da obra de Chumatskij “Por que um
holocausto vale mais do que os outros?” é um exemplo disto). 1
O próprio termo “Holodomor” (“holod” = “fome”, “mor” do polonês
“mord” = “assassinato”, “morduvati” ucraniano = “assassinar)” significa tra-
duzindo literalmente: matar pela fome ou de fome.
O conceito de “Holodomor” nasceu entre a emigração ucraniana. Nos
anos de 1940 a 1970, trabalhos foram publicados periodicamente no Ocidente,
nos quais a fome de 1932 a 1933 foi declarada como um ato planejado da lide-
rança do Kremlin, visando à destruição espiritual e física do povo ucraniano,
custando a vida de 7, 10 ou 15 milhões de pessoas2 .
No início dos anos de 1980, a atenção ao Holodomor aumentou drama-
ticamente.
Nos EUA e no Canadá foram realizadas conferências sobre o problema da
fome na União Soviética e até filmes.
Monumentos foram erguidos em Edmonton, Winnipeg, Londres e Mel-
bourne, conforme indicado, para as vítimas do “genocídio da fome” organi-
zado pelo “governo soviético em Moscou”.
A campanha recebeu ampla cobertura da mídia, as embaixadas da União
Soviética foram alvo de piquetes organizados pelos representantes da diáspora

1
Verificar: FURR, Grover. The “Holodomor” and the Film “Bitter Harvest” are Fas-
cist Lies. Disponível em: https://www.counterpunch.org/2017/03/03/the-holodomor-
and-the-film-bitter-harvest-are-fascist-lies. Acesso em 1 de Dezembro de 2021.
2
МАРЧУКОВ, Андрей. Операция “Голодомор”. MARCHUKOV, Andrey. Operação
Holodomor. Disponível em: <https://bit.ly/3Hea41y>. Acesso em 1 de dezembro de 2021.
16 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

ucraniana e membros da Organização dos Nacionalistas Ucranianos3 .


Os aspectos narrativos na sovietologia, seja ela oficial ou não, podem con-
ter problemas quando confrontados com as fontes descobertas mais recente-
mente, e as novas revelações sobre a fome de 1932 a 1933 não escapam a essa
sorte.
O Holodomor, no entanto, por este angulo apresentado, não visa “ape-
nas” reescrever o passado histórico do povo ucraniano nem, tão somente, subs-
tituir a história oficial soviética.
Acima de tudo, a propagação do Holodomor visa produzir emoções para
controlar o presente e o futuro, assim como o chamado massacre de Katyn4 .
Para controlar o presente e quem sabe o futuro, as classes dominantes atu-
ais recorrem a velha prática dos burgueses franceses e, sobretudo, dos impe-
rialistas britânicos: que consiste em dividir os países e os colonizar através do
incentivo dos conflitos étnico-nacionais.
Através da antagonização das contradições secundárias, o imperialismo
procura hierarquizar os povos do mundo todo pelo mais bruto chauvinismo
nos mais diversos aspectos, opondo culturas, costumes, religiões, característi-
cas fenotípicas, sempre buscando gerar conflitos e até financiar grupos separa-
tistas.
Por vezes, o financiamento dado às nacionalidades distintas de um país
advém de diferentes fontes do imperialismo. Em algumas ocasiões, a fonte
é diretamente o imperialismo estadunidense ou as potencias imperialistas de
segunda escala como Inglaterra, França, Alemanha e a Europa em geral.
Em uma sociedade plurinacional os imperialistas permeiam diferentes apoi-
os, onde a autodeterminação implica, em regra, na separação territorial. Difi-
cilmente apoiam a comunhão nacional e a autodeterminação que implicaria
estimular o sincretismo e o respeito a diversidade cultural em um só país. Em
contrapartida, são contra o separatismo quando exploram qualquer país pela
ocupação e administração direta.
No Brasil, diferentes fontes financiam distintos grupos com a temática ét-
nico racial e nacional, o imperialismo francês procura financiar grupos sepa-
ratistas na Amazônia falando em autodeterminação com a questão indígena.
Por outro lado, ONGS e Fundações que financiam os movimentos antirracis-
tas de mercado estão ligados ao imperialismo estadunidense. Neste sentido, a
autodeterminação é reivindicada para fins de dominação, e, portanto, não visa

3
Idem. Ibidem.
4
Sobre o assunto ver FURR, Grover. The Mystery of the Katyn Massacre: The evidence,
The solution. Nova York: 2019, Erythros Press.
ORIGEM DO CONCEITO DE HOLODOMOR E SEU OBJETIVO ATUAL| 17

resolver os problemas nacionais a partir do respeito a diversidade e do sincre-


tismo de culturas, religiões, línguas, e etc.
Como o objeto das classes dominantes, atualmente, é desemancipar, e,
portanto, reinstalar o projeto colonial clássico5 , muitos agentes contrarrevo-
lucionários procuram colocar em prática, ainda que sutilmente e por etapas,
velhos preceitos do colonialismo clássico como a proibição dos costumes, lín-
guas e alfabetos. No caso da Ucrânia, em especial, esse projeto está retornando
aos poucos através das tentativas múltiplas de suprimir o alfabeto cirílico em
proveniência do alfabeto latino, comum tanto na Europa quanto nos EUA.
Pelo menos 5 das antigas repúblicas soviéticas estão a passos largos de con-
sumar o fato6 . A Ucrânia, por outro lado, tem incentivadores disso no go-
verno7 .
Segundo o Historiador Petr Petrovich Tolochko, o tema da fome tam-
bém tem objetivos do tipo “sendo explorado de forma imoral”8 . Os pseudo-
historiadores, competem para nomear as maiores [fatalidades]. “E algo em
torno de 11 a 12 milhões já foram especulados. Neste sentido, caso isto fosse
verdade, não haveria nenhuma população sobrando depois disto”9 .
Sem acordo com as teorias atuais sobre a origem da antiga russificação da
Ucrânia, com uma linha que enfatiza um passado em comum, somadas a ne-
gação de que a fome de 1932-1933 foi um genocídio contra o povo ucraniano,
insiste Tolochko que tudo não passa de uma forma de orientar a entrada da
ucrânia na União Europeia.
Tolochko acredita que não houve perseguição à cultura ucraniana no pe-
ríodo de 1932-1933. Afirma ele: “Não aceito essa interpretação de forma al-
guma, embora [aqui na Ucrânia] esteja legalmente formalizada e quem não a
aceita é severamente punido”10 . Ele completa afirmando: “Mas, ainda assim,

5
LOSURDO, Domenico; NOVAES, João; MACHADO, Rodolfo. Losurdo: pro-
dução das emoções é novo estágio do controle da classe dominante. Disponí-
vel em https://operamundi.uol.com.br/politica-e-economia/31593/eua-sao-o-pior-inimigo-
da-democracia-nas-relacoes-internacionais-diz-filosofo-italiano. Acessado em 19/01/2022.
6
Ver a matéria a seguir para perceber o quanto a antiga URSS se encontra em total “latinização”.
https://bit.ly/3pyT7bVl
7
Ver o posicionamento do secretário do Conselho de Segurança e Defesa Nacional, Oleksiy
Danilov https://bit.ly/3FHQDOk.
8
Голодомор – это фейк, – выдающийся украинский история Петр Толочко. TO-
LOCHKO, Petr Petrovich. O Holodomor é Falso. Disponível em: <https://golos-
pravdy.eu/golodomor-eto-fejk-vydayushhijsya-ukrainskij-istorik-petr-tolochko>. Acesso em:
1 de Dezembro de 2021.
9
Idem. Ibidem.
10
Idem. Ibidem.
18 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

não consigo aceitá-la porque sou um historiador e sei que havia fome em quase
todas as regiões produtoras de grãos da União Soviética”11 . Quase sem exce-
ção havia fome “No Kuban, a região do Volga e o Cazaquistão”12 . Longe de
eximir de responsabilidade os comunistas e o Partido Comunista da União So-
viética sobre o incidente, Tolochko afirma: “O que se pode, evidentemente, é
questionar o governo soviético ou os comunistas pela fome”13 . Mas “afirmar
que a fome foi gerada para a destruição deliberada do povo ucraniano é, claro,
uma mentira completa, tudo isto é especulativo”.14 Nada disso é feito pura e
simplesmente atoa. “Mas, isso é dirigido contra Moscou, já que proclamamos
um rumo para a integração europeia e até o chamamos de “nossa escolha civi-
lizacional”15 . Portanto, “tudo o que é contra Moscou e a Rússia funciona, ao
que parece, para a integração europeia”16 .
É certo que a posição expressa neste texto introdutório se distanciará um
pouco dessa abordagem, mas, sem dúvida, Tolochko ganha importância não
só por ser ucraniano, e sim por ser especialista na história medieval da cha-
mada Rússia de Kiev que aborda a existência milenar conjunta da Rússia com
a Ucrânia, passado comum indissolúvel.
Analisando os livros didáticos para o ensino fundamental Tolochko en-
controu erros maciços. “Os livros são incrivelmente ideologizados. Nos pri-
meiros períodos históricos, tudo era declarado como meramente ucraniano —
de Tripillya a Kievan”17 . Assim “esse absurdo é introduzido nos livros didáti-
cos com objetivos atuais, e as crianças, claro, já absorvem essa mitologia”18 . Por
exemplo, “os ucranianos criaram a Rússia de Kiev. Por um período posterior,
após Bohdan Khmelnytsky, há uma linha negligenciada continuamente”19 .
Por fim, esta linha negligenciada aparece “como um tipo de buraco negro na
história da Ucrânia”20 . Segundo essa projeção, há o estimulo a vergonha no
passado comum dos povos ucranianos e soviético-russos, incentivado para se

11
Idem. Ibidem.
12
Idem. Ibidem.
13
Idem. Ibidem.
14
Idem. Ibidem.
15
Idem. Ibidem.
16
Idem. Ibidem.
17
Idem. Ibidem.
18
Idem. Ibidem.
19
Idem. Ibidem.
20
Академик Петр Толочко: “Нельзя отдать на растерзание Ющенко нашу общую
историю”. Tolochko, P. Não podemos dar nossa história comum à misericórdia de
Yushchenko. Disponível em: <https://iz.ru/news/342642>. Acesso em 1 de Dezembro de
2021.
ORIGEM DO CONCEITO DE HOLODOMOR E SEU OBJETIVO ATUAL| 19

criar um sentimento antissoviético, que atualmente, são transferidos para um


sentimento contra a Rússia.
Como todo e qualquer chauvinismo, esse é transmitido para que se faça
o cerceamento russo e que se impeça, portanto, que as antigas repúblicas so-
viéticas se unam novamente, ainda que não seja sob a bandeira do socialismo.
Segundo Tolochko não há nada de ofensivo no fato de que durante o passado
a história da ucrânia se mistura com a história da Rússia. A Rússia também
não existia como tal.
Pyotr Petrovich Tolochko, não é o único ucraniano a sustentar que o Ho-
lodomor é uma farsa, e que há uma história em comum entre a Rússia e a
Ucrânia, pensam como ele os historiadores Gueorgui Tkatchenko e Vladimir
Pustoboitov quando afirmam: “ao longo da guerra à Alemanha de Hitler pra-
ticamente não se utilizou o tema do “terror pela fome”, do qual se poderia ter
tirado proveito em termos propagandísticos”21 . Não obstante, “eles conhe-
ciam as informações autênticas sobre o assunto”22 . E sabiam, acima de tudo,
que essa propaganda não surtiria efeito no povo soviético. Assim, pode-se di-
zer que “O consulado da Alemanha na Ucrânia preparou nesses anos relatórios
escritos para o Ministério dos Negócios Estrangeiros”23 . Nesta perspectiva “es-
tes documentos estão publicados. O que neles se diz é que o governo soviético
não calculou bem os seus recursos”24 . Neste acervo documental jamais fora
“sequer referida a possibilidade de uma fome planejada”25 . Nem os Alemães,
ao fim do regime Nazista, davam credibilidade a esta mentira, tal qual eles mes-
mos fizeram com Katyn26 .
Como já afirmamos, o ganho atual em se recriar o holodomor, um termo
reinventado frequentemente na história soviética, consiste em manter a Ucrâ-
nia econômica e politicamente nas mãos dos Europeus e Estadunidenses, nada

21
Holodomor Cortina de Fumo do Regime. Disponível em: <http://www.hist-
socialismo.com/docs/Golodomor-Acortinadefumodoregime.pdf>. Acesso em 20 de Maio
de 2020.
22
Idem, Ibidem.
23
Idem, Ibidem.
24
Idem, Ibidem.
25
Idem, Ibidem.
26
Infelizmente, munições alemãs foram encontradas nos túmulos de Katyn. A questão de como
eles chegaram lá precisa ser esclarecida. É o caso de munições vendidas por nós durante o
período de nosso acordo amigável com os russos soviéticos, ou dos próprios soviéticos jogando
essas munições nas sepulturas. Em qualquer caso, é essencial que este incidente seja mantido
em sigilo absoluto. Se fosse para chegar ao conhecimento do inimigo, todo o caso Katyn teria
que ser abandonado. GOEBBELS, J. The Goebbels Diaries 1942 – 1943. Doubleday 8c
Company, Inc. Garden City 1948 New York. PAG 354. Tradução Nossa.
20 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

mais, nada menos. Na verdade, o holodomor, em sentido mais filosófico, nada


mais é do que um mero ponto de viragem do chamado “Ilusionismo político”
(ou Prestidigitação política).
No que consiste este “ilusionismo”?
Trata-se da manipulação técnica do espectador com truques que, por pro-
duzir suas emoções por meio da rapidez e agilidade no uso das informações e
imagens, o agride em sua dignidade para leva-lo imediatamente a um culpado
por um fato trágico. Transmitem-se imagens horríveis escolhidas em uma série
para chocar e que podem ser falsas ou descontextualizadas.
Assim, através desse artifício, ou truque, que depende da velocidade com
o qual se transmite imagens e “informações” para não permitir tempo de refle-
xão, provoca-se indignação na opinião pública e esse monopólio de produção
emocional é muito relevante para gerar guerras entre os povos por meio do na-
cionalismo ou sentimento de ameaça a pátria.
Assim, o holodomor não se reproduz sem uma consistente arte performá-
tica realizada para entreter a nação “principal” (aquela que se quer atingir — no
caso os ucranianos), e as “secundárias” (aquelas que por proximidade podem
“sofrer os mesmos efeitos” — os Euroasiáticos). O medo espalhado sobre uma
nação visa contaminar as que estão próximas territorialmente e politicamente.
Mas, não basta informar e demonstrar por meio de imagens o que aconteceu
de trágico, é preciso culpar alguém por isto, é preciso dar a ilusão um caráter
concreto e um inimigo real. É preciso afirmar que quem realizou este “ataque
artificial” e “intencional”, foi um inimigo escolhido a dedo pela hegemonia
imperialista como alvo (a Rússia, neste caso). As razões econômicas básicas
consistem em eliminar um concorrente direto, sobretudo, no fornecimento
de gás ou derivados de petróleo. Como já dissemos em outras oportunidades:
“não é nada pessoal, são apenas negócios”.
No ilusionismo ideológico, o “impossível se consuma como fato” e a histó-
ria se ressignifica para dar lugar a um mito. Como na mágica praticada por um
ilusionista competente, a atenção do público é direcionada para o local onde
os fatos não acontecem.
Os praticantes desta atividade designam-se por ilusionistas políticos, criam
o que Fanon chamou em seus escritos de “anomia política” ou alienação, sendo
peritos na produção das emoções, no controle dos sentimentos e no domí-
nio da psicologia popular. Como afirmou Losurdo, essa se tornou a principal
forma de guerra após o fim da Segunda Guerra Mundial.
Visando o controle do país alvo, os imperialistas praticam a desemancipa-
ção humana, a anomia ou alienação colonial. O objetivo é regredir a Ucrânia
ORIGEM DO CONCEITO DE HOLODOMOR E SEU OBJETIVO ATUAL| 21

a uma nação dependente, sem identidade, portanto, apostam na retirada da


identidade à deriva da dominação, deixando o colono inconsciente dos pro-
cessos históricos e confusos sobre sua verdadeira raiz. Segundo Fanon:
O colonialismo não se contenta em apertar nas suas redes o povo, em
esvaziar o cérebro colonizado de qualquer forma e conteúdo. Por uma
espécie de perversão da lógica, orienta-se para o passado do povo opri-
mido, distorce, desfigura e o aniquila. Essa empresa de desvalorização
da história anterior à colonização adquire hoje a sua significação dialé-
tica.

Quando se reflete acerca dos esforços despendidos para realizar a alie-


nação cultural, tão característica da época colonial, compreende-se que
nada se fez ao acaso e que o resultado global procurado pelo domínio
colonial era efetivamente convencer os indígenas de que o colonialismo
vinha arrancá-los da noite. O resultado, conscientemente perseguido
pelo colonialismo, era meter na cabeça dos indígenas que a saída do co-
lono significaria para eles o regresso à barbárie, ao aviltamento, à anima-
lização. No plano do inconsciente, o colonialismo não queria ser com-
preendido pelo indígena como uma mãe que impede sem cessar que o
seu filho, extremamente perverso, caia no suicídio, lance à rédea solta os
seus instintos maléficos. A mãe colonial defende o seu contra si mesma,
contra a sua fisiologia, a sua biologia, a sua desgraça ontológica.27
Essa guerra de novo tipo, não convencional, consiste, em partes, na propa-
gação de pseudociência que, para se fazer valer, precisa de outras artimanhas
artísticas. O talento para o espetáculo ilusionista é necessário para acobertar os
problemas científicos da pseudociência. Reafirmamos: os dotes teatrais, por-
tanto, equivalem a assinalar para uma direção oposta ao local da manipulação.
Quando o “mágico” afirma “é aqui que a mágica acontece”, na verdade,
quer tirar sua atenção do local real onde sua artimanha ocorre. Insistimos em
dizer isto porque o Holodomor, nada mais é, do que um truque de mestre,
que apontando a culpa aos russos, as etnias não ucranianas, para atacar o co-
munismo, Stalin e o bolchevismo, oculta que é na atual Ucrânia desde a queda
da União Soviética que a população diminuiu em mais de 13.000.000 de ha-
bitantes.
Pois bem, o maior genocídio ucraniano, portanto, fora executado após a
queda da União Soviética!
27
FANON, F. Condenados da Terra. Disponível em: <https://www.marxists.org/portu-
gues/fanon/1961/condenados/04.htm>. Acesso em 20 de Novembro de 2021.
22 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Neste caso, negam categoricamente que a União Soviética acabou com a


fome estrutural secular e periódica das regiões que se instaurou.
O cientista político ucraniano Viktor Pirojenko afirmou que “as maiores
perdas humanas provocadas pela fome ocorreram na população da Ucrânia
Ocidental”28 que na época dos fatos não estava sobre o controle Soviético. Até
2012 a ucrânia era orientada para a amizade com a Rússia —, e caso esse sen-
timento cresça, o temor da volta da união das repúblicas poderia ser uma rea-
lidade. “Por isso, este conceito de Holodomor é utilizado antes de mais nada
para desacreditar o passado comum russo-ucraniano e visa associar a Rússia
à imagem do inimigo”29 . A política, já diria Norberto Bobbio inspirado por
Carl Schmitt é “a atividade de agregar e defender amigos, dispersar inimigos e
lutar contra eles”30 . Por vezes, também é a arte de produzir inimigos se neces-
sário.
Diante deste contexto é importante se perguntar:
“Quais são os objetivos perseguidos pela elite ucraniana, levantando per-
sistentemente um alvoroço em torno do evento que há muito caiu no esque-
cimento?”31 No que consiste o conceito de Holodomor e o que ele pretende?
Em primeiro lugar: “O conceito de “Holodomor” pretende: designar o
inimigo (tanto real-material como metafísico, uma espécie de “mal absoluto”),
que desempenhou um papel fatal na vida da Ucrânia.”32
Em segundo lugar, o conceito foi criado e recriado “para incutir na cons-
ciência coletiva dos ucranianos o sentimento de uma vítima inocente”33 .
Em terceiro lugar, procura “convencer a comunidade mundial de que os
ucranianos são essas vítimas”34 .
Em quarto lugar, quer “instilar nesse inimigo um complexo de culpa e
impor-lhe obrigações morais e materiais de expiação de sua “culpa”35 .
Assim “não é por acaso que os líderes ucranianos estão cada vez mais cha-
28
Holodomor Cortina de Fumo do Regime. Disponível em: <http://www.hist-
socialismo.com/docs/Golodomor-Acortinadefumodoregime.pdf>. Acesso em 20 de Maio
de 2020.
29
Idem. Ibidem.
30
ARDITI, Benjamin. Sobre o “político”: com Schmitt e apesar de Schmitt. Disponível
em: <https://www.scielo.br/j/ccrh/a/SGvrJSDWSDgDqzLk6Td6dQN/?lang=pt>. Acesso
em 1 de Dezembro de 2021.
31
Marchukov, Andrey. Operação Holodomor. Disponível em: <https://bit.ly/3Hea41y>.
Acesso em 1 de dezembro de 2021.
32
Idem. Ibidem.
33
Idem. Ibidem.
34
Idem. Ibidem.
35
Idem. Ibidem.
ORIGEM DO CONCEITO DE HOLODOMOR E SEU OBJETIVO ATUAL| 23

mando a fome de “Holocausto Ucraniano” (enfatizando que a escala e as con-


sequências do “Holodomor” excedem o Holocausto Judeu)”36 .
Neste sentido “Como Kuchma corretamente observou, “os processos de
consolidação da nação ucraniana ainda estão longe de estar concluídos”37 . Ou
seja, concluiu o ex-presidente, a “Ucrânia” foi criada, agora é necessário criar os
“ucranianos”38 . Isto é, agora é preciso “formar um tipo diferente de sociedade
moral, psicológica e nacional, com base na principal disposição da ideologia
ucraniana, que diz que “a Ucrânia não é a Rússia”39 .
Por isto, “é aqui que o conceito de “Holodomor” — genocídio — etnocí-
dio de ucranianos — organizado por “Moscou” deve cumprir seu papel”.40
Com objetivo “de criar uma nova sociedade e um “novo ucraniano”, é
dada especial atenção ao período soviético, uma vez que teve uma forte in-
fluência na imagem social e cultural do povo, na sua identidade”41 .
“Durante este período, o parentesco espiritual entre ucranianos e russos
foi significativamente fortalecido, apesar até mesmo da política oficial, segundo
a qual eram considerados nacionalidades diferentes”42 .
Todo o contexto real, uma fome criada por desastres naturais que atingiu
toda região euroasiática, uma crise de grãos cuja culpa também recai sobre os
produtores de grãos, as crises do capitalismo atuando nas reminiscências do
capitalismo de estado e, portanto, no socialismo soviético são a verdade. E essa
verdade “dificulta a implementação do atual projeto ucraniano. Nas mentes
da geração mais jovem, o passado soviético deveria ser odiado como uma era
de opressão colonial e destruição moral e física do povo”43 .
Se a fome não se converte em Holodomor, o capitalismo e o imperialismo
perdem o cabo de guerra ideológico e novas razões surgem para o retorno do
sistema soviético. Para isto o incidente da fome dos anos de 1930 deve ser “re-
tratado como o mecanismo originalmente previsto para o desenvolvimento
da União Soviética, consequência da rejeição do caminho “normal” seguido
pelo Ocidente, fruto das atividades do regime ditatorial (”stalinista”)”44 . “O
Sistema político soviético, e, ao mesmo tempo, tudo com que conviveram vá-

36
Idem. Ibidem.
37
Idem. Ibidem.
38
Idem. Ibidem.
39
Idem. Ibidem.
40
Idem. Ibidem.
41
Idem. Ibidem.
42
Idem. Ibidem.
43
Idem. Ibidem.
44
Idem. Ibidem.
24 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

rias gerações, seus ideais, conquistas e sucessos, deve ser declarado artificial e
falso”45 .
Assim, “uma base é lançada para a deseroização do passado”,46 com “a di-
famação de feitos históricos (por exemplo, Vitória na segunda guerra, uma des-
coberta no espaço, a transformação do país em uma poderosa potência cientí-
fica e industrial) e abre o caminho para novos “heróis” e “marcos sagrados”47 .
Não é por acaso que a campanha de promoção do “Holodomor” está sendo
conduzida em paralelo pelas mesmas pessoas que fazem a “revisão” da história
da Grande Guerra Patriótica, com a exaltação de Stepan Bandera e da Orga-
nização dos Nacionalistas Ucranianos e seu braço armado a UPA (Exército
Insurrecto Ucraniano), em persistentes tentativas de igualar a União Soviética
com o Terceiro Reich. Todos esses são elos da mesma cadeia.48
Ademais, não é só a Ucrânia que vem passando pela queda constante de
sua população paralelamente após a queda do socialismo. Este processo acon-
tece em quase todo Leste europeu também. Há uma tentativa de se criar o véu
do holocausto soviético e socialista de leste para tirar de cena as evidências dos
crimes contra as nações de Leste e das antigas repúblicas soviéticas e seus povos
que vem diminuindo após a queda do socialismo.
“A este propósito o professor e historiador Mikhail Rodionov observou
que “as perdas demográficas da atual Ucrânia ultrapassam largamente a mor-
talidade nos anos da fome. A população da Ucrânia diminui sistemática e
constantemente. Em algumas regiões do Leste do país a população diminuiu
20%”49 . O tigre de papel, quer se passar por um cão pastor, que se coloca pelos
interesses mais humanos possíveis. No entanto, a verdade é diversa. “Estamos
em presença de uma política orientada para o extermínio dos seus próprios ci-
dadãos. Procurando adiar o momento em que, mais tarde ou mais cedo, terá
de responder pelo genocídio real e não mítico, o regime cria uma cortina de
fumo sob a forma de holodomor-genocídio”50 . Da direita mais conservadora,
a esquerda mais liberal e anticomunista, todas as fontes indicam que o leste
europeu nada no mar do caos e na amargura. Citaremos alguns dados, mas
recomendamos uma busca no google simples pelo índice de país a país que
compõe tanto as republicas que foram partes da URSS, e também dos países
do leste europeu. Os dados do Banco Mundial, da ONU e da União Europeia

45
Idem. Ibidem.
46
Idem. Ibidem.
47
Idem. Ibidem.
48
Idem. Ibidem.
49
Idem. Ibidem.
50
Idem. Ibidem.
ORIGEM DO CONCEITO DE HOLODOMOR E SEU OBJETIVO ATUAL| 25

não tentam sequer esconder esse fato. Segundo estimativas do próprio banco
mundial, da ONU e da União europeia, já se calcula “que até o ano de 2050
vão desaparecer 50 milhões de trabalhadores e a imigração vai disparar. A po-
pulação está em declínio no “Velho Continente”, cada vez mais um território
de idosos e que hoje produz mais caixões do que berços, diz uma notícia de
jornal”51 .
No mesmo ritmo segue a Bulgária que está passando por uma profunda
transformação socioeconômica provocada por mudanças demográficas extra-
ordinárias. “Entre 1950 e 1988, sua população cresceu de 7,3 milhões para
quase 9,0 milhões e depois caiu pela metade para 7,5 milhões em 2010” 52 .
Atualmente, a população da Bulgária, de acordo com as Nações Unidas, é “de
6.948.000 habitantes”53 .
No lapso de tempo entre 1989 e 2019, “a população da Romênia diminuiu
em 3,5 milhões. Para além de um número de nascimentos inferior ao número
de mortes, o país registrou uma migração líquida negativa de 100.000 pessoas
por ano, em média, nos últimos 30 anos”54 . Outra estimativa diferente afirma
que a população romena caiu de 1989 a 2019 de 23,8 milhões para 19,41 mi-
lhões entre 2002 e 201155 , o que são mais de 4 milhões de pessoas a menos.
Se a imigração constante é provocada pela crise do capital, a responsabilidade
da política econômica do país no extermínio indireto daquele povo, que some
em meio a diáspora, é indiscutível, sobretudo quando isso não acontece por
condições de embargos.
A Polônia sofreu grandes perdas durante a Segunda Guerra Mundial. Em
1939 a Polônia tinha 35,1 milhões de habitantes56 , no final da guerra possuía
apenas 19,1 milhões dentro de suas fronteiras57 . O primeiro censo do pós-

51
O novo velho continente e suas contradições: As cidades que vão morrer. Disponível
em: <https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/O-novo-velho-continente-e-suas-
contradicoes-As-cidades-que-vao-morrer/4/49356>. Acessado em 22 de Maio de 2021.
52
Active Aging: How Can Bulgaria Tap the Potential of the Elderly?
https://www.worldbank.org/en/events/2016/06/22/active-aging-how-can-bulgaria-tap-
the-potential-of-elderly. Acesso em 20 de maio de 2021.
53
Bulgária: mapa, população, economia, curiosidades. Disponível em: <
https://bit.ly/342hgzj >. Acesso 1 de dezembro de 2021.
54
En Roumanie, immigrés dans un pays d’émigration. Romênia: imigrante num país de
imigração. Disponível: <https://bit.ly/3sJldmJ>. Acesso em 1 de dezembro de 2021.
55
Intentions to Return Evidence from Romanian Migrants. Disponível em:
<https://bit.ly/3mEH236>. Acessado em 1 de dezembro.
56
Tadeusz Piotrowski. Poland’s Holocaust: Ethnic Strife, Collaboration with Occupying
Forces and Genocide... [S.l.]: McFarland & Company. 1997. Pag. 32.
57
Idem. Ibidem.
26 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

guerra, em fevereiro de 1946 indicou apenas 23,9 milhões58 . Dos 6 milhões de


cidadãos poloneses cerca de 21,4%, morreram entre 1939 e 1945. Mais de 80%
da capital da Polônia foi destruída durante o Cerco de Varsóvia. Em 1990, a
população polonesa era de 37.988.000. Atualmente, a população da Polônia
é de 37.840.000, isso antes da crise do Corona vírus. Embora comparada as
outras nações de Leste, as estimativas polonesas sejam melhores, cumpre res-
saltar que a mudança de sistema não favoreceu o crescimento populacional e
constantemente a mídia burguesa divulga medidas de incentivo do aumento
populacional por parte do governo Polonês. O mesmo contexto e histórico
se aplica a Hungria e a antiga Checoslováquia, agora dividida em República
Checa e Eslováquia, vossas populações não cresceram em nenhuma das hipó-
teses após a queda do socialismo, e ainda decaiu industrialmente devido a di-
visão.

FUSÃO DO NAZISMO E DO LIBERALISMO


(NAZI-LIBERALISMO/LIBERAL-FASCISMO)

Parte da ideia central do Holodomor quer construir o mito de que os bol-


cheviques teriam gerado a fome dolosamente para eliminar fisicamente a “re-
sistência” ucraniana. No fundo, essa premissa visa dar força aos aliados táticos
de Hitler para construir a narrativa de que os banderistas, agora subsidiados
pelo imperialismo estadunidense, foram e continuam sendo legítimos cons-
trutores da liberdade. E também quer se criar o mito de que a Ucrânia como
um todo, tanto o lado ocidental quanto o lado oriental, lutaram de maneira
independente na segunda guerra, sem se aliar a Alemanha de Hitler ou a União
Soviética de Stálin. A verdade é que apenas os bandeiristas e nacionalistas ucra-
nianos como um todo lutaram contra a União Soviética e ao lado dos nazistas,
pelo menos essa era a intenção declarada por parte dos nacionalistas, embora
não tão bem aceita, conforme se verá adiante, pelos nazistas.
Faz parte, portanto, deste conto negar a ligação tática da Organização dos
Nacionalistas Ucranianos e de Stepan Bandera, seu maior expoente, com os
nazifascistas. No entanto, na contramão deste relato a verdade se coloca: a Or-
ganização dos nacionalistas Ucranianos como conhecemos não existiria sem a
ascensão do nazifascismo. Nesta perspectiva, suas origens são bem evidentes,
a Organização dos Nacionalistas Ucranianos “pertence a uma tradição do fas-
cismo genérico europeu, surgindo de uma mistura entre a Organização Militar
Ucraniana e várias outras organizações de extrema direita, como a Associação
58
Norman Davies. God’s Playground, a History of Poland, Columbia University. Disponí-
vel em: <Google Print, p.595». books.google.com>. Acesso 1 de Dezembro de 2021.
FUSÃO DO NAZISMO E DO LIBERALISMO| 27

Nacional Ucraniana, a União dos Fascistas Ucranianos e a União para a Li-


bertação da Ucrânia”59 . Assim, por consequência, “desde o momento de sua
fundação, os fascistas foram parte integrante e desempenharam um papel cen-
tral na organização”60 .
A Organização dos Nacionalistas Ucranianos evitou se autodenominar
fascista para enfatizar a “originalidade do nacionalismo ucraniano”61 . Para fins
retóricos sua origem fascista é negada. “Em 1941, a organização se dividiu en-
tre uma ala mais radical, a Organização dos Nacionalistas Ucranianos (b), em
homenagem a seu líder, Stepan Bandera, e uma ala mais conservadora, a Orga-
nização dos Nacionalistas Ucranianos (m), liderado por Andrii Melnyk. Am-
bos eram totalitários, antissemitas e fascistas”62 . Mas, mesmo com esta divisão,
as diferenças eram uma disputa por um pouco mais de liberdade e soberania,
porém ainda nos termos de submissão a liderança de Hitler. Mesmo a Orga-
nização dos Nacionalistas Ucranianos (b), era bastante “entreguista”.
Assim, não há como negar que, “em termos de tática, a Organização dos
Nacionalistas Ucranianos (m) foi mais cautelosa e permaneceu leal à Alema-
nha nazista durante a guerra, enquanto o Organização dos Nacionalistas Ucra-
nianos (b) adotou uma linha um pouco mais independente”63 . De todo modo,
os objetivos comuns eram muitos e ambas eram submissas conforme provare-
mos. “A Organização dos Nacionalistas Ucranianos compartilhava os atribu-
tos fascistas: antiliberalismo, conservadorismo e anticomunismo, um partido
armado, totalitarista, antissemita, o Führerprinzip e uma adoção de saudações
fascistas”64 . Mesmo Seus líderes mais independentes não economizavam es-
forços para “enfatizarem avidamente a Hitler e Ribbentrop que compartilha-
vam a Weltanschauung nazista e um compromisso com uma Nova Europa
fascista”65 . Neste ínterim, “Franziska Bruder, a autora do estudo detalhado
da organização descreve a “ Organização dos Nacionalistas Ucranianos como
um representante clássico de um movimento nacionalista com características
fascistas da Europa Centro-Oriental”, uma análise compartilhada por outros
estudiosos não nacionalistas da Organização dos Nacionalistas Ucranianos”66 .
59
Rudling, Per. The OUN, the UPAand the Holocaust: AStudy in the Manufacturing of
Historical Myths. Disponível em: <http://carlbeckpapers.pitt.edu/ojs/index.php/cbp/arti-
cle/viewFile/164/160>. Acesso em 1 de dezembro de 2021.
60
Idem. Ibidem.
61
Idem. Ibidem.
62
Idem. Ibidem.
63
Idem. Ibidem.
64
Idem. Ibidem.
65
Idem. Ibidem.
66
Idem. Ibidem.
28 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

“Na verdade, atualmente o regime ucraniano está tentando criar uma his-
tória diferente, reivindicando como heróis aqueles que antes (na União Sovié-
tica) eram considerados inimigos”67 . Por isto foram erguidas “dezenas de mo-
numentos aos “heróis” do chamado Exército Insurgente Ucraniano (U-P-A).
Muitos destes serviram ao regime de Hitler, especialmente de 1941 a 1942”68 .
Sem escrúpulos o nazismo é glorificado na Ucrânia. “A biografia de um dos lí-
deres dos nacionalistas ucranianos — Roman Iosipovich é um exemplo notá-
vel. Roman, junto de milhares de nacionalistas ucranianos, serviu no exército
nazista (Lisenko, 2008: 27)”69 . É claro, “milhares de russos serviram nos exér-
citos de Hitler e o comandante do chamado Exército de Libertação Russo (R-
O-A), General A.A. Vlasov não era melhor do que Roman Iosipovich e seus
associados”70 . No entanto, “na Rússia, as atividades de Vlasov foram oficial-
mente condenadas, nunca foram consideradas, não são consideradas, e, com
sorte, nunca serão consideradas heroicas”71 . Ao contrário da Ucrânia que hoje
“tem 35 ruas com o nome de Roman Iosipovich, 11 monumentos foram er-
guidos”72 . Assim sendo, “dezenas de monumentos estão instalados na Ucrâ-
nia em homenagem a muitos outros nacionalistas ucranianos que colaboraram
com os nazistas”73 ... Este fato deveria ser repudiado. “Isso pode ser chamado
de “curso pró-europeu” do governo ucraniano?”74 .
A esta altura é importante mencionar um pouco da trajetória de Stepan
Bandera. O líder da Organização dos Nacionalistas Ucranianos (b), e antes da
Organização dos Nacionalistas Ucranianos como um todo, a partir de 1931
lidera o executivo regional da Organização dos Nacionalistas Ucranianos e co-
manda a UVO — organização militar ucraniana que operava na clandestini-
dade na Polonia durante 2ª República Polaca desde 1920.
Em 1933 Stepan Bandera procura instaurar um Estado ucraniano e a Or-
ganização dos Nacionalistas Ucranianos assassina Bronisław Pieracki, Minis-
tro do Interior do governo polaco em 1934. Bandera é condenado pelo crime
— embora não fosse o executor — a cumprir pena de morte que foi substi-
tuída mais tarde pela prisão perpétua. Ainda que não tenha sido o assassino
67
FEDEROV, A; LEVITSKAYA, A. Comparative analysis of the development of mass
media education in the Commonwealth of Independent States (CIS) countries. Dis-
ponível em: <https://bit.ly/31dWvQi>. ´Pag. 45.
68
Idem. Ibidem.
69
Idem. Ibidem.
70
Idem. Ibidem.
71
Idem. Ibidem.
72
Idem. Ibidem.
73
Idem. Ibidem.
74
Idem. Ibidem.
FUSÃO DO NAZISMO E DO LIBERALISMO| 29

ele foi julgado e condenado por liderar a organização que realizou o assassinato
e durante a ocupação nazista, Bandera foi liberado pelos Nazistas.
Bandera manteve por perto diversos círculos militares alemães favoráveis
à “independência” da Ucrânia e organizou grupos expedicionários da Organi-
zação dos Nacionalistas Ucranianos. Quando a Alemanha nazista invadiu a
União Soviética, ele preparou a Proclamação de 30 de junho de 1941 da cria-
ção de um Estado ucraniano em Lviv, jurando lealdade a Adolf Hitler. E aqui,
nos cabe citar o documento por inteiro que prova tal assertiva:
30 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Tradução do documento anterior:


A Proclamação do Estado Ucraniano
1. Pela vontade do povo ucraniano, a Organização dos Nacionalistas Ucra-
nianos, sob a direção de Stepan Bandera, proclama a restauração do Estado
ucraniano, pela qual gerações inteiras dos melhores filhos da Ucrânia deita-
ram suas cabeças.
A Organização dos Nacionalistas Ucranianos, sob a direção de seu fun-
dador e líder Yevhen Konovalets, empreendeu nas últimas décadas uma san-
grenta batalha contra a escravização Moscovita-Bolchevique.
O governo soberano ucraniano garantirá ao povo ucraniano a ordem, o
desenvolvimento compreensivo de todas as suas forças e a satisfação de todas
as suas necessidades.
2. Nas terras ocidentais da Ucrânia está sendo formado um governo ucra-
niano, que está subordinado ao governo nacional ucraniano que será formado
na capital da Ucrânia — Kiev pela vontade do povo ucraniano.
3. O recém-restaurado estado ucraniano trabalhará em estreita co-
laboração com a Grande Alemanha Nacional-Socialista, que sob a lide-
rança de Adolf Hitler está criando uma nova ordem na Europa e no
mundo e está ajudando o povo ucraniano a se libertar da ocupação Mos-
covita.
O Exército Revolucionário Popular Ucraniano, que está sendo formado
nas terras ucranianas, continuará a lutar com o Exército Alemão Aliado contra
a ocupação Moscovita por um Estado soberano do Concílio Ucraniano e pela
nova ordem em todo o mundo.

Viva a Ucrânia Soberana Unida! Viva a Organização dos Nacionalistas


Ucranianos! Viva o líder da Organização de Nacionalistas Ucranianos!
Glória á Ucrânia! Glória aos heróis!!

[assinatura] Yaroslav Stetsko.

Líder da Assembleia Nacional

Os nazistas, no entanto, não viram com bons olhos essa declaração de le-
aldade. Mas, independentemente da atitude de início bélica, por parte dos
nazistas para com a Organização dos Nacionalistas Ucranianos e contra Ste-
pan Bandera, é fato público e notório que os banderistas pretendiam ter uma
soberania limitada a liderança global de Hitler na segunda guerra, após a decla-
ração acima. O líder do Terceiro Reich, porém, duvidava de vossas intenções
FUSÃO DO NAZISMO E DO LIBERALISMO| 31

e por um tempo os manteve presos, só os libertando quando os soviéticos co-


meçaram a vencer a guerra para os utilizar como arma75 .
A verdade é que Hitler jamais pensou que precisaria da Organização dos
Nacionalistas Ucranianos e de Bandera para ganhar a guerra, por isto, de início
os encarcerou mesmo diante de uma declaração de independência que jurava
lealdade a Alemanha. Neste sentido, cumpre ressaltar os bandeiristas como
são: fascistas, e vassalos nazistas com clara intenção de se vender a Hitler 76 .
Devemos combater o revisionismo do governo ucraniano atual que visa apa-
gar da história este fato. De todo modo, está refutada a ideia estapafúrdia de
que Organização dos Nacionalistas Ucranianos não era aliada ou submetida
ao Nazismo.
Na esquerda os trotskistas os viam com bons olhos, sem questionar ab-
solutamente nada, Mandel dizia que a quarta internacional “negligenciou” o
apoio ao movimento nacionalista ucraniano.
Quando os nazistas ocuparam parte da URSS em 1941, fundaram e
apoiaram na Ucrânia um movimento nacionalista e pró-nazista que mas-
sacrou centenas de milhares de judeus, poloneses e comunistas. Em
1944, no momento da retirada, os nazistas deixaram grupos fascistas
ucranianos, dirigidos por oficiais alemães nazistas, atrás das linhas do
Exército Vermelho. O grupo de Mandel aclamou esta contrarrevolução
nazista, como parte da “revolução política antiburocrática”. Inacreditá-
vel?
75
ROSSOLINSKI, Grzegorz. Stepan Bandera: The Life and Afterlife of a Ukrainian
Nationalist: Fascism, Genocide, and Cult. Columbia University Press, 2014. p.538. Dis-
ponível em: <https://bit.ly/32jgw8J>. Acesso em 1 de dezembro de 2021.
76
FEDEROV, A; LEVITSKAYA, A. Comparative analysis of the development of mass
media education in the Commonwealth of Independent States (CIS) countries. Dis-
ponível em: <https://bit.ly/31dWvQi>. Acesso em 1 de dezembro de 2021. O Documento
aqui referenciado, também se encontra no estudo acima, sendo legitimamente um documento
ucraniano. Na verdade, a liderança nazista não gostou das ações dos associados de S.A. Ban-
dera em relação à proclamação da chamada “independência” da Ucrânia. Mas se lermos cui-
dadosamente o texto original do Ato de Proclamação do Estado Ucraniano (1941), podemos
facilmente descobrir que SA Bandera e seus partidários não assumiram de forma alguma a
verdadeira “independência” ucraniana, argumentando que ... 3. O estado ucraniano recém-
formado trabalhará em estreita colaboração com a Grande Alemanha Nacional-Socialista, sob
a liderança de seu líder Adolf Hitler, que está formando uma nova ordem na Europa e no
mundo e está ajudando o povo ucraniano a se libertar da ocupação moscovita” (Lei ..., 1941: 1)
(para fins substantivos, o texto completo da Lei de Proclamação do Estado Ucraniano (1941)
encontra-se em anexo). Eu me pergunto se o texto completo é fornecido por professores ucra-
nianos aos seus alunos e se eles têm vergonha de reconhecer que os nacionalistas ucranianos
queriam viver de acordo com as leis nazistas e, consequentemente, de aceitar e acolher todas
as suas ações (por exemplo, o Holocausto. Pag. 44-45.
32 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Julguem vós próprios: em 1988, o grupo de Mandel escreveu o seguinte:


Durante a Segunda Guerra Mundial, a IV Internacional subestimou
gravemente as potencialidades revolucionárias do movimento naciona-
lista ucraniano. A Internacional só percebeu da existência do movi-
mento revolucionário de libertação nacional 5 anos depois da guerra,
quando os guerrilheiros ucranianos travavam seu último combate. 77
Atualmente, uma colaboração significativamente grande tem sido forne-
cida pelo ocidente e pela CIA para a interpretação que vai na contramão de
tudo que expusemos acima.
Para contribuir com a mistificação dessa história e para controlar o pre-
sente foi criada a operação holodomor por parte do imperialismo estaduni-
dense.
No que consiste?
Basicamente em subsidiar a emigração ucraniana e a antiga burguesia ou
nobreza ucraniana que foram todos obrigados a militar nas organizações naci-
onalistas ucranianas. As recomendações para o financiamento de programas
de estudo da fome na Ucrânia foram realizadas pela própria CIA. Sua emprei-
tada recomendava a criação de centros universitários pelo mundo que guiavam
estudos neste sentido78 sempre aproximando-se de ex-comunistas ou emigra-
dos ucranianos.
O Historiador Andrey Murchokov, inclusive, conhecido por não eximir
de responsabilidade o Estado soviético de erros que atrapalharam na resolução
do problema da fome, sobre esta questão das atuações da CIA e das grandes
universidades afirma: “Assim, em 1981, na Universidade de Harvard, junto a
organizações ucranianas, tal como a OUN, foi lançado um programa de es-
tudos sobre a fome na Ucrânia”79 . Nesta esteira, “os livros de James Mace
e Robert Conquest foram criados dentro dessa estrutura elementar e”80 , as-
sim, “tornou-se uma etapa importante na criação e propaganda do conceito
de “Holodomor”81 : como “a fome e a política nacional de “Moscou” estavam
ligadas uma à outra, a própria fome caracterizou-se como uma ação da lide-
rança soviética com o objetivo de quebrar o poder ucraniano, o campesinato
77
Martens, L. A URSS, a Contrarrevolução de Veludo e Outros Escritos. Ciências Revo-
lucionárias: São Paulo, Pag. 619.
78
Marchukov, Andrey. Operação Holodomor. Disponível em: <https://bit.ly/3Hea41y>.
Acesso em 1 de dezembro de 2021.
79
Idem. Ibidem.
80
Idem. Ibidem.
81
Idem. Ibidem.
HOUVE RESISTÊNCIA A COLETIVIZAÇÃO E A INDUSTRIALIZAÇÃO?| 33

e a nação em geral, finalmente conquistando a Ucrânia”82 . Trata-se de uma


política orientada para desinformação:
Recentemente, a mídia frequentemente ouviu a palavra até então des-
conhecida “Holodomor”. (...) É assim que a fome de 1932-1933 agora
é chamada na Ucrânia. Há vários anos, a Ucrânia exige da comunidade
mundial, da ONU e da Rússia, que o reconheçam oficialmente como
“genocídio”. A escala e a agressividade da campanha em torno deste
trágico evento são impressionantes. Tendo o luto como pano de fundo,
a tendência é transformar a memória das vítimas da fome em manifes-
tação política.
Quais são os objetivos das pessoas por trás desta campanha? É preciso
entender isso, pois visa a Rússia. As causas, o curso e as consequências
da fome já são bem pesquisados. (2) O assunto de nossa atenção não
é a fome como tal, mas sua interpretação na ideologia do nacionalismo
ucraniano e na política das elites ucranianas.
Vamos enfatizar imediatamente que, embora as palavras “fome” e “ho-
lodomor” tenham a mesma raiz, elas têm significados fundamentalmente
diferentes. O Holodomor não é apenas uma “fome severa”. O Holo-
domor é um conceito ideológico, uma ferramenta poderosa para influ-
enciar a consciência de massa. Embora seja sobre essa substituição de
conceitos que todo o conceito se constrói.83

HOUVE RESISTÊNCIA A COLETIVIZAÇÃO E A


INDUSTRIALIZAÇÃO?

Tauger afirma que a coletivização e a industrialização, são também respon-


sáveis pelo acentuamento da problemática da fome, mas de forma alguma pelo
problema em si. Como prova ele traz uma série de testemunhos advindos de
documentos e relatórios.
Tauger alega que os camponeses em geral apoiaram as duas políticas: a po-
lítica de coletivização e a política de industrialização, exaustivamente, porque
não viam alternativas possíveis para o país. Assim ele argumenta: “Finalmente,
o que dizer dos outros 90% dos camponeses que não se rebelaram? Alguns
camponeses não rejeitaram a coletivização e até a apoiaram”84 .
82
Idem. Ibidem.
83
Idem. Ibidem.
84
Tauger, Mark. “Soviet Peasants and Collectivization, 1930-39: Resistance and Adap-
tation.” In Rural Adaptation in Russia by Stephen Wegren, Routledge, New York, NY,
2005, Chapter 3, p. 75-78
34 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Tauger não encontrou provas cabais de que essas políticas não fossem que-
ridas pelo campesinato e pelo proletariado. Muito pelo contrário. “Em março
de 1929, os camponeses sugeriram em uma reunião em Riazan okrug que o
governo soviético deveria tomar todas as terras”85 — sem qualquer ressalva —
“e fazer com que os camponeses trabalhassem em troca de salários, uma con-
cepção não muito distante da futura operação de kolkhozy”.86 Um camponês
desta mesma região, em um relatório da O-G-P-U, segundo Tauger, afirmava
que “as aquisições de grãos são difíceis, mas necessárias”87 e que, portanto,
eles não podiam “mais viver como antes, é necessário construir fábricas e in-
dustrias, e para isso é necessário o grão”88 .
Outros testemunhos dão fortalecimento a Tauger: “Em janeiro de 1930,
durante a campanha, alguns camponeses disseram, ’chegou a hora de abando-
nar nossas fazendas individuais. É hora de parar com isso, [nós] precisamos
nos transferir para a coletivização”89 . Seguindo a adiante “Outro documento
de janeiro relatou vários casos de camponeses formando kolkhozy espontane-
amente e consolidando seus campos, o que era uma parte básica da coletiviza-
ção”90 .
Nesta perspectiva, quem deseja sustentar que tanto a coletivização quanto
a industrialização são políticas “equivocadas” tem o dever de tratar o problema
como um erro coletivo, tanto das direções políticas como dos dirigidos. Não se
tratou de um erro apenas dos líderes do partido. Assim, “a análise de Bokarev
resumida acima sugere uma razão pela qual muitos camponeses não se rebe-
laram contra a coletivização”91 : isto porque “os kolkhozes de certa maneira,
especialmente em seu coletivismo de uso da terra e princípios de distribuição
igualitária, não estavam muito longe das tradições e valores camponeses nas
aldeias corporativas em toda URSS”92 .
Inevitavelmente “este exemplo, é a evidência de que a vasta maioria dos
camponeses não se envolveu em protestos contra a coletivização, refuta clara-
mente a afirmação de Graziosi citada acima de que as aldeias estavam “unidas”
contra a coletivização93 .

85
Idem. Ibidem.
86
Idem. Ibidem.
87
Idem. Ibidem.
88
Idem. Ibidem.
89
Idem. Ibidem.
90
Idem. Ibidem.
91
Idem. Ibidem.
92
Idem. Ibidem.
93
Idem. Ibidem.
HOUVE RESISTÊNCIA A COLETIVIZAÇÃO E A INDUSTRIALIZAÇÃO?| 35

Pelos mesmos motivos, “todas as citações anedóticas de documentos da O-


G-P-U de camponeses que se recusam a trabalhar são, na melhor das hipóteses”
94
, sem dúvida, “problemáticas, bem como, muitas vezes, sem sentido como
indicadores gerais de suas ações e as consequências delas” 95 , logo, “nenhuma
generalização ou conclusão de que a maioria ou todos os camponeses resisti-
ram ao trabalho nas fazendas, são válidos se extraídos de tais evidências”96 .
As experiências e relatos anedóticos não possuem força por si só, e podem
ser usados por todos os lados. “Em versões tão extremas, a “interpretação da
resistência” levaria a esperar que o sistema de kolkhozes não pudesse ter funci-
onado: os camponeses teriam evitado o trabalho, cometido sabotagem e sub-
terfúgio e produzido pouco ou nada”97 . Assim os “escritos nesta interpretação
raramente indicam que os camponeses realmente realizavam qualquer traba-
lho agrícola; a partir desses estudos, parece que praticamente tudo o que os
camponeses fizeram foi mostrar resistência”98 ....
É importante alçar “Os dados da safra da década de 1930” que, “porém,
demonstram que essa interpretação não é compatível com os resultados do tra-
balho do sistema”99 . A grande maioria do campesinato “se adaptou ao novo
sistema e trabalharam arduamente nos períodos cruciais todos os anos”100 .
Deste modo, “quando as condições eram favoráveis, as colheitas eram adequa-
das e às vezes abundantes; quando desfavoráveis, os resultados eram quebras
de safra e fome se as colheitas fossem especialmente baixas”101 . Mais desta-
cadamente, “as colheitas foram maiores nos anos após os desastres naturais e
quebras de safra (nos anos de 1933, 1935 e 1937), indicando que muitos cam-
poneses trabalharam em condições muito difíceis, até mesmo com fome, para
produzir mais e superar as crises”102 . Certamente, “isso significa que, além de
seus problemas de evidência, a “interpretação da resistência”, pelo menos em
suas versões extremas, é unilateral, reducionista e incompleta”103 . Deste jeito,
“as respostas dos camponeses ao sistema de kolkhozes não podem ser reduzidas
à resistência sem sérias omissões e distorções dos eventos reais. Uma interpre-

94
Idem. Ibidem.
95
Idem. Ibidem.
96
Idem. Ibidem.
97
Idem. Ibidem.
98
Idem. Ibidem.
99
Idem. Ibidem.
100
Idem. Ibidem.
101
Idem. Ibidem.
102
Idem. Ibidem.
103
Idem. Ibidem.
36 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

tação mais completa e precisa deve levar em conta mais do que a resistência”104 .
Por consequência, “isso significa que, além de seus problemas de evidência, a
“interpretação da resistência”, pelo menos em suas versões extremas, é unila-
teral, reducionista e incompleta”.105
Não raramente, o próprio Estado soviético procurou investigar os focos
da fome para melhor combatê-la, e sem a coletivização, seria improvável que as
próprias informações fossem circuladas tão rapidamente.
Uma fome predominantemente causada pelo Homem, além de ser um
método secundário de obliteração e quebra da resistência, costuma proceder
pelo cercamento das vias de transporte de alimentos das regiões que se quer
atingir. Como se sabe, não foi isso que aconteceu com a Ucrânia oriental,
houve apenas um controle sobre as entradas e saídas das regiões famintas, mas
não um cerceamento delas ou cercamento militar. Nenhum país opta pela
fome quando dispõe do poder bélico para a realização de um genocídio. A
fome, neste caso, é um método secundário de dominação. Por isto, é neces-
sário questionar por que um país, com objetivos genocidas e com modernos
arsenais de guerra, optaria pela fome como método principal para atingir este
propósito?
Ao pesquisar as evidências não se encontra base para essa acusação. Por
exemplo:
Durante o início de 1933, a O-G-P-U e vários voluntários investiga-
ram aldeias para determinar a extensão da fome para os esforços de so-
corro. Invariavelmente, seus relatórios mostraram que, embora a fome
afetasse principalmente os camponeses que não ganhavam muitos dias
de trabalho, ela frequentemente atingia os camponeses que ganhavam
centenas de dias de trabalho e kolkhozy altamente produtivos e bem-
sucedidos. Claramente, uma vez que muitos kolkhozniki eram traba-
lhadores e bem-sucedidos até a campanha de aquisições do outono de
1932, a resistência está longe de ser a história completa106 .

Quem quer matar de fome, não socorre. E isto também implica a incoe-
rência a tese da resistência a política comunista ou soviética.
A própria ideia de resistência a política soviética atingiu uma fração dos
camponeses ligada a nobreza latifundiária que, posteriormente, manifestaria
104
Idem. Ibidem.
105
Idem. Ibidem.
106
Tauger, Mark. “Soviet Peasants and Collectivization, 1930-39: Resistance and Adap-
tation.” In Rural Adaptation in Russia by Stephen Wegren, Routledge, New York, NY,
2005, Chapter 3, p.82.
HOUVE RESISTÊNCIA A COLETIVIZAÇÃO E A INDUSTRIALIZAÇÃO?| 37

seu apoio ao governo soviético e ao partido. Portanto, a realidade é que muitos


camponeses fizeram esforços e mantiveram seu apoio ao sistema soviético e,
com o tempo, todos os setores do campesinato assim procederam.
Mesmo que por um instante se afirme que a industrialização e a coletivi-
zação foram políticas pesadas de maneira geral para o povo soviético, ambas,
cedo ou tarde, foram encaradas como sacrifícios conscientes, necessários e in-
dispensáveis para o desenvolvimento das forças produtivas e para a resistência
a inevitável segunda guerra mundial que se aproximava.
Criticar tais políticas significa evaporar a história e o contexto que fizeram
delas necessidades primordiais. Deve-se ter em conta que o contexto histórico
forçava a URSS a atingir o mesmo grau de desenvolvimento tecnológico que
seus adversários para se defender de futuras ameaças. No entanto, não dispu-
nham os soviéticos de condições sadias de tempo médio para se industrializar
bem como, infelizmente, todos viviam sob o medo da ameaça de uma nova
guerra que poderia os colonizar em caso de derrota. Esta pressão externa, este
medo geral, causou diferentes reações nos extratos sociais soviéticos. Cada fac-
ção reagiu de maneira diferente ao processo tal e qual, por isto, a luta interna
era uma constante que precisa ser explicada em um trabalho focado apenas
nisto.
É preciso compreender a geopolítica daquele momento histórico, no qual
Alemanha, EUA, Inglaterra, França, e Japão, levaram décadas para se desen-
volver industrialmente, e, por isso, subjugavam cada qual, em maior ou menor
proporção.
A URSS não tinha esse tempo médio infelizmente.
Bem conheciam os soviéticos o fato de que o sistema imperialista, como
diria Lênin107 , partia e repartia o mundo por meio de sucessivas guerras que
aconteciam periodicamente. Todo país “despreparado” para essas guerras era
obrigado e condenado a escravidão.
Os soviéticos sabiam alto preço a ser pago pela realização em míseros 4 anos
de um processo industrial em que, sadiamente, os mais diversos países, faziam
em 100 anos. Mas, a alternativa seria ainda mais cara: a colonização. E a escolha
por esse sacrifício não foi apenas um esforço em nome próprio, mas também
uma decisão tomada para resguardar os interesses de toda humanidade.
107
Na obra “Imperialismo, fase superior do capitalismo”, Lênin prova que “a guerra de 1914-
1918 foi, de ambos os lados, uma guerra imperialista (isto é, uma guerra de conquista, de
pilhagem e de rapina), uma guerra pela partilha do mundo, pela divisão e redistribuição das
colônias, das esferas de influência, do capital financeiro, etc.”. LÊNIN, V.I. Imperialismo,
Fase Superior do Capitalismo. Disponível em: <https://pcb.org.br/portal/docs/oimperia-
lismo.pdf>. Acessado em 1 de Dezembro de 2021.
38 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Este contexto se prova pelo simples fato de que após a obtenção da bomba
atômica a guerra mundial deixou de existir, e isso diminuiu a capacidade im-
perialista de realização dessas guerras. Os soviéticos assumindo o risco, engo-
liram secamente as adversidades. Este preço trazia sobrecargas que gerariam
negligências em diversas áreas, que eram praticamente sacrificadas.
Particularmente, é notável que cientistas brilhantes como Vigotsky e
Krupskaya, acabaram sem grandes atenções, o mesmo aconteceu com Luria
e Leontiev.
Krupskaya acabou por compor diversas comissões de revisão dos expur-
gos, por exemplo, em vez de desenvolver e aplicar seu projeto: a pedagogia so-
cialista. Luria e Leontiev foram obrigados a cumprir funções administrativas
no decorrer da guerra.
O medo da guerra colocava todo o Estado e, por consequência, o Partido
na mais alta pressão. Por vezes, a situação levava a exageros. No entanto, em-
bora isto fosse ruim não era “evitável” no período histórico que corre de 1917 a
1953. Ao pensar, por um instante, a alternativa: a industrialização e a coletivi-
zação moderadas, não se tem garantias de preparo contra uma invasão massiva
de diversos países. Se por ventura esse fosse o caminho soviético, não restaria
dúvidas de que a Guerra contra a Alemanha teria um destino completamente
diferente e ainda mais trágico.
A ocasião infelizmente determina a direção.
É exatamente por isto, pela soma de fatores determinantes que não faz sen-
tido concentrar atenções e elucidações “tão exclusivamente na relutância, es-
pecialmente como fazem versões extremas da interpretação da resistência”108 .
Isto porque, por este caminho, não se explica “a produção repetida dos cam-
poneses soviéticos de boas colheitas que sucederam as graves quebras de safra
e fome”109 , bem como, por consequência, “deturpa-se as ações da maioria dos
camponeses e omite suas realizações, tal qual, portanto, apresenta-se uma in-
terpretação incorreta da vida rural soviética”110 ....
Como é de se esperar, nenhuma política, por mais necessária que seja, deixa
de portar problemas. Com a coletivização, não foi diferente. “A coletivização
foi, portanto, fundamentalmente ambivalente como política, com lados bons
e ruins”111 . Neste mesmo sentido aconteceu a recepção do campesinato a esta
108
Tauger, Mark. “Soviet Peasants and Collectivization, 1930-39: Resistance and Adap-
tation.” In Rural Adaptation in Russia by Stephen Wegren, Routledge, New York, NY,
2005, Chapter 3, p.88.
109
Idem. Ibidem.
110
Idem. Ibidem.
111
Idem. Ibidem.
HOUVE RESISTÊNCIA A COLETIVIZAÇÃO E A INDUSTRIALIZAÇÃO?| 39

política. “As respostas dos camponeses a isto também foram ambivalentes; in-
cluindo, é claro, resistência, mas também muitas outras atitudes, incluindo
adaptação e apoio significativo”112 . Compreendendo que o problema não se
limitava a “maldade” dos comunistas, como tenta fazer parecer o paradigma
dominante, o campesinato agiu para superar as causas centrais da fome e do
problema como um todo, incluindo sua parcela de culpa na questão. Por isto,
procuraram os camponeses, colocar de lado os individualismos em nome do
bem maior. Assim, foi “no auge da crise, que os camponeses demonstraram
repetidamente sua capacidade de colocar de lado suas objeções, de superar ad-
versidades mesmo com grandes custos e de produzir colheitas que acabavam
com a fome”113 . Esta postura do campesinato, não seria possível sem uma vasta
educação geral e socialista.
Eis que seguindo adiante, na mesma página da obra referida de Tauger,
podemos perceber o porquê de a escola revisionista não poder ser considerada
estalinista como sugerem os trotskistas de mãos dadas com a escola totalitária
de Conquest.
Tauger afirma que o sistema soviético em si era um erro, do qual não neces-
sariamente ele apresentará solução ou resposta alternativa viável, infelizmente.
Em maior ou menor proporção, apesar de sua importância, a escola revisio-
nista se coloca como um conglomerado de críticos que fogem do problema
geral do cerco capitalista114 que inferiam os acontecimentos locais tais como
são, para se concentrar nos problemas tais como eles aparecem, em seu fenô-
meno e, embora a distinção entre o que é real e que é fenomênico não estejam
separados por um abismo intransponível115 , é preciso não reduzir a história da

112
Idem. Ibidem.
113
Idem. Ibidem.
114
Para nosso entendimento, a construção da sociedade socialista e da sociedade anti-imperialista
não se compara com qualquer outra sociedade. É preciso compreender sua política de embar-
gos, como a do cordão sanitário soviético, a inevitável industrialização acelerada para a prepa-
ração para guerra que dependiam necessariamente da política de coletivização.
115
Sejam quais forem as coisas e processos que consideremos, verificaremos sempre que essência e
fenómeno não são a mesma coisa. Karl Marx diz, em O Capital:«Toda a ciência seria supérflua
se a forma fenomênica e a essência das coisas coincidissem diretamente.» (O Capital, t. III,
Berlim, 1953, p. 870 - ed. alemã).Mas essência e fenómeno também não estão separados por
um abismo intransponível. É sempre a essência de uma coisa que se manifesta nos fenóme-
nos. Por isso mesmo é que só podemos penetrar na essência, no cerne, partindo do exame dos
fenómenos, por comparações, pela busca de conexões, etc.Há, deste modo, dois tratamentos
incorretos da relação dialética de essência e fenómeno. Um deles reduz tudo aos fenómenos.
É o caso de se dizer, pelo facto de muitos operários de países capitalistas desenvolvidos estarem
acríticos perante o capitalismo, que «os operários já não são revolucionários». E isto vem da
boca de pessoas que se dizem de esquerda e que querem ser de esquerda. O erro está, aqui, em
40 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

URSS a sua aparência imediata, seja nos documentos avaliados seja nos depoi-
mentos analisados. E, infelizmente, muitos teóricos, inclusive no marxismo
cometem esse erro ao analisar as sociedades em transição para o socialismo e
acabam a margem da verdade. Neste sentido, Tauger afirma:

Em outras palavras, o ‘giro’ — tropo — que proponho aqui para abran-


ger e compreender todas as respostas dos camponeses à coletivização não
é o da resistência heroica, mas fútil contra um sistema totalmente er-
rado — os nobres camponeses lutando com as armas dos fracos se re-
fere apenas a uma fração dos camponeses —, mas antes um heroísmo
amargo e ambivalente, esforços desesperados, mas muitas vezes bem-
sucedidos, de alguns camponeses, apesar dos desastres naturais, da inép-
cia e aspereza do regime e do desprezo e hostilidade de alguns de seus vi-
zinhos. Essa concepção corresponde muito melhor aos resultados con-
cretos que na maioria dos anos alimentaram a crescente população da
URSS.116

O erro aqui está em se confundir o papel objetivo da classe operária (sua


realidade inevitável) com o seu comportamento e a sua consciência atual (o
fenômeno), o mesmo podemos dizer do campesinato ou de qualquer outro
aliado objetivo do proletariado. Mesmo que eles manifestem uma insatisfação
ou um comportamento inadequado para o objetivo socialista, isto jamais de-
finirá por si só o seu papel na sociedade.
O papel do campesinato não pode ser reduzido a manifestação de seu com-
portamento e de seu pensamento porque ambos estão em negação e afirmação,
entre o socialismo e o capitalismo. Tal qual o papel da classe operária não se
confunde nem com o seu comportamento nem com o seu pensamento que
condiciona em regra a sua forma de agir...

que se confunde o papel objetivo da classe operária (a essência) com a sua consciência atual (o
fenómeno). No mesmo pé estão os representantes ideológicos do capitalismo que dizem, por
exemplo, que «a classe operária (ou o capitalismo) já hoje não existe».O segundo erro consiste
em divorciar essência e fenômeno e em autonomizar a essência — por exemplo, considerando
apenas o papel objetivo da classe operária e subestimando o grau concreto de consciência so-
cialista da classe operária de um país num determinado momento histórico, passa-se a tratar
a «essência» como algo de «transcendente» e cai-se no domínio da teologia, para a qual a
essência é um fenómeno divino. A posição correta é a de reconhecer a unidade contraditória
de essência e fenómeno. Disponível em: <https://www.marxists.org/portugues/tematica/li-
vros/abc-marxismo/b06.htm>
116
Tauger, Mark. “Soviet Peasants and Collectivization, 1930-39: Resistance and Adap-
tation.” In Rural Adaptation in Russia by Stephen Wegren, Routledge, New York, NY,
2005, Chapter 3, p.82.
PAPEL DOS KULAQUES NA FOME| 41

Tauger menciona a tal ambivalência, mas parece não perceber que esta am-
biguidade é própria das sociedades de transição para o socialismo, no qual a
consciência e o comportamento que dela pode derivar equivale, mas, ao mesmo
tempo, não é socialista. Paralelamente em que é, porém, simultaneamente,
não é, capitalista.
Por isso, se a URSS e suas políticas eram ambivalentes, não é possível dizer
que o sistema era equívoco, ele era e não era problemático, isto é, era vacilante
entre o objetivo socialista e a reminiscência capitalista.
Tudo na história e nas fontes históricas guardam sua afirmação e negação.
Embora o erro próprio dos revisionistas seja ignorar parte da dialética e do
materialismo, a luta de classes, eles e Tauger cumprem um importante papel
no que tange a mostrar que a resistência contra as políticas soviéticas jamais
permeou o suficiente para ganhar a centralidade do debate.

A “interpretação da resistência” parece ser um exemplo de erudição teó-


rica ou mesmo politicamente motivada, na qual os estudiosos seleciona-
ram evidências para se encaixar em suposições teóricas pré-concebidas
ou expressar sua hostilidade ao regime soviético, mas não consideraram
quão representativas e realistas suas evidências realmente eram. A “in-
terpretação da resistência”, pelo menos em suas versões extremas, é na
verdade, profundamente irrealista: os camponeses, como outras pes-
soas, tinham atitudes e respostas diferentes aos eventos que os afetavam.
Basta considerar a ampla gama de opiniões de alguns antigos campone-
ses que chegaram a posições de destaque no início do século 20 na Rús-
sia e na URSS... Dado tal espectro de perspectivas de antigos campone-
ses, devemos esperar e buscar uma variedade de opiniões nas evidências,
em vez de assumir que todos os camponeses eram resistentes e atribuir
a todos eles as opiniões de uma minoria.117

PAPEL DOS KULAQUES NA FOME

Para Tauger, apesar de haver resistência, inclusive armada, e aqui ele fez
referência a nobreza ex-czar e latifundiária, esse fator não foi predominante
nas determinações da fome como teriam sido as causas naturais. Mas, a falta
de preponderância de um fator não significa a inércia dele na equação.
Mesmo um reacionário como Volkoganov é obrigado a reconhecer que os
Kulaques impuseram resistência armada ao regime e isso também foi um dos
agravantes da Fome, embora possivelmente não o principal fator:
117
Idem. Ibidem.
42 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Como resultado das deliberações de uma Comissão do Politburo presi-


dida por Molotov e sob pressão de Stalin, em janeiro de 1930 o Comitê
Central aprovou uma resolução “Sobre Medidas para Liquidar Fazen-
das Kulaques em Áreas de Coletivização Plena” ....

Correspondentemente, os ataques kulaques ao regime soviético aumen-


taram, às vezes, se estendendo por amplas áreas. As ações contra as ca-
madas mais abastadas do campesinato deram origem a uma onda de pro-
testos, banditismo e levantes armados contra as autoridades.

A produção de grãos imediatamente caiu, logo seguida por um declí-


nio na pecuária. A empresa camponesa nativa foi cortada pela raiz.... A
morte em massa dos animais começou em muitas regiões: em compara-
ção com 1928, o número de animais caiu para metade ou um terço em
1933.118
Conquest também chegou a se ver obrigado a admitir o fato: “Em vez de
permitir que seu gado caísse nas mãos do Estado, eles massacraram metade
do rebanho do país. Em março, estava claro que o desastre havia atingido o
campo”119 . Embora, talvez, essa seja uma admissão um tanto involuntária, que
é comum existir no pensamento de qualquer autor com uma obra extensa.
Assim, em relação deskulakização houve “insurgências e outros atos de vi-
olência como assassinatos de coletivistas e seus colaboradores locais, protestos
vociferantes de mulheres, frequentemente, em conexão com decisões sovié-
ticas de fechamento de igrejas e/ou confisco de propriedade da igreja”120 , ao
mesmo tempo, aconteceu o “esbanjamento” de gado e outros bens através do
abate e venda, à destruição de edifícios agrícolas coletivos, à libertação de ku-
laques presos, à reaquisição de bens confiscados, e à dissolução de fazendas
coletivas”121 . A criação de animais sofreu mais do que qualquer outra coisa
por causa do abate em massa de gado quando os camponeses ingressaram nas
fazendas coletivas.
É admitido por muitos historiadores burgueses que os Kulaks haviam des-
truído boa parte dos animais necessários para a produção e instigado os cam-
poneses médios ao mesmo caminho. Por isto, a deskulakização acabou por
118
Volkogonov, Dmitri. Stalin: Triumph and Tragedy. New York: Grove Weidenfeld, 1991,
Pag. 169
119
Conquest, Robert. Stalin: Breaker of Nations. Nova York, Nova York: Viking, 1991. Pag.
160
120
Siegelbaum and Sokolov. Stalinism as a Way of Life. New Haven, Conn.: Yale University
Press, c2000, p. 11 e 62.
121
Idem. Ibidem.
PAPEL DOS KULAQUES NA FOME| 43

ser inevitável. As estatísticas são as seguintes: “Em 1928, havia 33,5 milhões
de cavalos no país; em 1932, 19,6 milhões. Para o gado, os números foram,
respectivamente, 70,5 milhões e 40,7 milhões; para suínos, 26 milhões e 11,6
milhões; para ovinos e caprinos, 146 milhões e 52,1 milhões”122 . Neste sen-
tido, “no Cazaquistão, o número de ovelhas e cabras caiu de 19,2 milhões em
1930 para apenas 2,6 milhões em 1935. De 1929 a 1934, um total de 149,4 mi-
lhões de cabeças de gado foram destruídas”123 . Assim, “o valor desses animais
e de seus produtos (leite, manteiga, lã e etc.) ultrapassou em muito o valor das
gigantescas fábricas construídas no mesmo período. A destruição de cavalos
significou uma perda de 8,8 milhões de cavalos de potência”124 .
Pode-se dizer que “a motivação revolucionária de Stálin foi, sem dúvida,
reforçada por um sentimento de medo sobre a chegada de informações acerca
da disseminação do massacre de gado pelos camponeses”125 . Infelizmente nada
pôde parar esse processo que causou prejuízos. “No início de 1930, por exem-
plo, o número de cavalos no país — e na contínua ausência de um grande
número de tratores, os cavalos eram tão essenciais para a agricultura coletiva
quanto haviam sido para a agricultura privada — diminuiu drasticamente de-
vido ao abate, doença e falta de alimentação.”126 Na mesma época, “ao longo
de todo o período de coletivização camponesa (1928-33), as estatísticas de abate
de gado camponês, reveladas após a morte de Stalin, são: 26,6 milhões de ca-
beças de gado, ou 46,6% do total; 15,3 milhões de cabeças de cavalos, ou 47%
do total; e 63,4 milhões de cabeças de ovinos, ou 65,1% do total”127 .
Embora aqui exista um bom número de citações de autores relativamente
burgueses da historiografia mundial, nunca é demais repeti-los. Montefiore,
conhecido pelo antistalinismo ferrenho, também admite a chamada pressão
advinda dos Kulaques.

“Os camponeses acreditavam que podiam forçar o governo a parar, des-


truindo seu próprio gado; o desespero que poderia levar um camponês a
matar seus próprios animais, dá uma ideia da escala; 26,6 milhões de ca-
beças de gado foram abatidas, 15,5 milhões de cavalos. Em 16 de janeiro
de 1930, o governo decretou que a propriedade dos kulaques poderia ser
confiscada se eles destruíssem o gado.”128
122
Nekrich and Heller. Utopia in Power. New York: Summit Books, c1986, p. 237
123
Idem. Ibidem.
124
Idem. Ibidem.
125
Tucker, Robert. Stalin In Power: 1929-1941. Nova York: Norton, 1990, p. 178, 182.
126
Idem. Ibidem.
127
Idem. Ibidem.
128
Montefiore, Sebag. Stalin: The Court of Red Czar. Nova York: Knopf, 2004, p. 47
44 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Muitos dos camponeses fizeram sabotagem instigados pelos próprios Ku-


laques. Afinal, estes eram os que mais tinham a perder pela política de socia-
lização dos animais e do campo. É claro que, nesse meio, sobretudo, entre os
mais desonestos historiadores, colocam informações de que esta foi uma rea-
ção de todos os camponeses como resposta a coletivização, o que não é verdade
e Tauger já o demonstrou acima das mais diferentes formas. Seu relato possui
mais força também em função da extensa análise documental que ele realizou.
Abaixo ele nos traz uma eficiente avaliação das questões de como os animais
foram tratados. Com isso, temos bases para afirmar que, embora não tiveram
principal eixo da fome em suas mãos, os Kulaques tiveram alguma importân-
cia no resultado da fome. Tauger afirma que houve algum ressentimento na
eliminação dos animais, e que também muitos foram abatidos para servir de
alimento no período da grande crise dos grãos que afetou toda a região euroa-
siática.
“As forças de recrutamento diminuíram drasticamente, direta ou indireta-
mente, como resultado da coletivização”129 . Logo, “Em resposta à coletiviza-
ção e à socialização de sua propriedade nos kolkhozes, muitos camponeses ven-
deram ou abateram seu gado, por uma variedade de razões”130 : sem pensar nas
consequências, “como um protesto contra a coletivização; porque não que-
riam entregar seus animais às novas fazendas coletivas sem compensação; por
causa das promessas irrealistas das autoridades locais sobre a mecanização”131 .
No decorrer da “campanha inicial de 1930, essas ações afetaram a maioria
dos animais de consumo, principalmente bovinos e suínos”132 . Deste modo,
“posteriormente, quando a maioria dos camponeses já havia sido coletivizados
e sujeitos às demandas de aquisição de 1931, o número de animais de tração,
especialmente cavalos, diminuiu rapidamente”133 . Por consequência “Os ani-
mais foram as vítimas imediatas da escassez em 1930-33, já que,”134 em meio
a um possível desespero, “os camponeses famintos não tinham escolha a não
ser se alimentar primeiro das reservas cada vez menores e porque os campo-
neses frequentemente expressavam seu ressentimento com a coletivização por
meio da negligência e”135 , sem hesitar, “do tratamento abusivo do gado soci-

129
Tauger, Mark. Natural Disaster and Human Actions in the Soviet Famine of 1931-
1933 Pittsburgh: University of Pittsburgh, 2001, p. 21
130
Idem. Ibidem.
131
Idem. Ibidem.
132
Idem. Ibidem.
133
Idem. Ibidem.
134
Idem. Ibidem.
135
Idem. Ibidem.
PAPEL DOS KULAQUES NA FOME| 45

alizado”136 . Ademais, “como discutido acima, a principal forragem de grãos


para cavalos, aveia, sofreu perdas substanciais com a ferrugem em 1932”137 .
Assim, infelizmente, “como resultado, o número de cavalos diminuiu dras-
ticamente em 1932. As fábricas soviéticas estavam produzindo tratores no iní-
cio dos anos de 1930, mas não em quantidade suficiente para compensar as
perdas de cavalos”138 . Ainda existia atraso industrial.

Por outro lado, em algumas ações os camponeses expressaram claramen-


te indignação e pretendiam se vingar do regime reduzindo a safra. As
ações mais óbvias foram os ataques incendiários a edifícios e campos
Kolkhozes. No Médio Volga, Nizhni Novgorod, Ivanovo e regiões do
norte, o incêndio criminoso destruiu milhares de hectares de grãos não
colhidos e centenas de toneladas de grãos colhidos, além de centenas de
milhares de hectares de florestas, madeira cortada, habitação e combus-
tível. Em alguns lugares, os camponeses atacaram funcionários e outros
camponeses envolvidos no trabalho de colheita e destruíram máquinas
de colheita, de acordo com a O-G-P-U, com o objetivo de dificultar a
colheita.139

Como vimos acima, os ataques aos pequenos camponeses, no mínimo,


geraram problemas de ordem prática que agravaram a situação da fome. Isto
não é, portanto, um detalhe insignificante.

Não quero dizer que todos os relatórios da O-G-P-U, como os da agri-


cultura citados acima, foram falsificados. A maioria dessas descrições
pode ser confirmada em outras fontes arquivadas e publicadas. Muitas
fontes, por exemplo, documentam os esforços dos camponeses para des-
mantelar os kolkhozes e restaurar as práticas agrícolas tradicionais du-
rante o processo de coletivização em 1929-1930 e repetidamente depois
disso; os relatórios da O-G-P-U citados acima confirmam essas práticas
e fornecem detalhes importantes.140

Pessoalmente, Stálin agiu com cautela. Alguns relatos dão conta de com-
preender que sua ação não era necessariamente ou imediatamente repressiva.
E isto pode ser documentado tanto por meio de relatos de migrantes, quanto
por meio de pesquisa arquivística.
136
Idem. Ibidem.
137
Idem. Ibidem.
138
Idem. Ibidem.
139
Idem. P, 31.
140
Idem, p, 41.
46 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Bandos de guerrilha percorreram os distritos do país roubando os novos


Coletivos, destruindo seus prédios e queimando suas plantações. Sem
nenhum objetivo claro, eles caíram em banditismo mal disfarçado, ata-
cando e matando da maneira que seus ancestrais mongóis e tártaros ha-
viam feito sob Tamerlão.

Por muito tempo, Stalin permaneceu paciente. Ele sabia, por amarga ex-
periência na Geórgia, como é difícil trazer novas ideias a um povo pouco
emancipado, e tinha uma consideração simpática pelo forte individua-
lismo que resiste a qualquer autoridade ativa pela força. Quando final-
mente a ação foi forçada sobre ele, ele se moveu com sua firmeza usual,
mas não até que todas as outras vias tivessem sido exaustivamente explo-
radas.

Onde a resistência persistiu, apesar de todos os esforços, o Estado come-


çou a deportação em massa de elementos traidores e, se necessário, não
hesitou em remover aldeias inteiras para a Sibéria e os ermos do norte.

Como já havia sido feito muitas vezes antes, o treinamento de Stalin


deu-lhe forças para continuar durante esse período. O homem que po-
deria perdoar Zinoviev e Kamenev, que três vezes os traíram; o líder que
deixou Bukharin viver em liberdade, embora Bukharin tivesse procla-
mado abertamente a determinação de matá-lo, nada pararia no que di-
zia respeito à sua fé. 141
Esse relato, embora soe apologético não é exagerado. O próprio Getty con-
firmou tempos atrás que os excessos contra os Kulaques também eram conti-
dos por Stálin e pelo partido. “Em alguns casos, o zelo dos militantes locais
superou os planos do centro, e Moscou muitas vezes teve que conter as dekula-
quizações excessivas, a coletivização forçada e o zelo ultraesquerdista na perse-
guição da religião”142 . Ainda nesse sentido, mesmo após decretos bastante en-
fáticos contra a piedade, Stálin reviu muitos casos e diminuiu sua pena. “Ape-
sar das restrições de Stalin no decreto original contra a clemência, em agosto de
1936 um decreto secreto ordenou a revisão de todas as sentenças sob a lei de 7
de agosto de 1932. Quatro quintos dos condenados tiveram suas sentenças re-
duzidas, e mais de 40.000 delas foram libertados naquela época.”143 Indo um
141
Cole, David M. Josef Stalin; Man of Steel. London, New York: Rich & Cowan, 1942, p.
84-85
142
Getty & Naumov, The Road to Terror. New Haven, Connecticut: Yale Univ. Imprensa,
c1999, p. 43, p, 110, e, p, 180.
143
Idem. Ibidem.
CONFLITO ENTRE OS “REVISIONISTAS” E OS “TOTALITÁRIOS”: TAUGER CONTRA CONQUEST| 47

pouco além, por vezes, a clemência com a família era relativamente conside-
rada. Um documento do P-C-U-S prova isso com muita exatidão: “[Extrato
de 2 de junho de 1935 do Protocolo nº 46 da sessão do Comitê Territorial do
Mar Negro de Azov do Partido Comunista] 2) Deportamos de nosso território
1.500 kulaques, contrarrevolucionários que continuam a exercer seu antisso-
vietismo, atividades antikolkhozes e sabotagem. Os membros de suas famílias,
por outro lado, podem, se assim o desejarem, permanecer no local”144 .

CONFLITO ENTRE OS “REVISIONISTAS” E OS


“TOTALITÁRIOS”: TAUGER CONTRA CONQUEST

Pouco se falou, até o presente momento do texto, sobre os debates entre as


escolas históricas. Pincelou-se apenas algumas menções para fins de demons-
trar como o debate não é homogêneo entre as escolas historiográficas na sovi-
etologia, mesmo entre os defensores da chamada escola “revisionista” do qual
aqui chamamos de “antitotalitária”. Não haverá tempo hábil para explanar o
assunto na sua totalidade. Mas, podemos nos contentar, enquanto não esgo-
tamos este assunto, em dizer que a diferença entre as duas escolas está na adesão
ou rejeição da tese de que a URSS foi ou não totalitária.
Os chamados “revisionistas”, em maior ou menor medida, pregam desde
o fim dos anos 60 que, conforme novas fontes primárias soviéticas foram sur-
gindo, não há meios de se defender a tese do totalitarismo. No entanto, isto
não foi aceito de bom grado pelos “totalitários”.
Os totalitários se opuseram ferozmente aos “revisionistas” afirmando que
seus adversários não passam de apologéticos de Stalin e os acusaram de relati-
vizar o terror. No entanto, Conquest nunca conseguiu responder a altura e
seus críticos crescem enquanto seus adeptos frequentemente diminuem.
A verdade é que o campo acadêmico após a Segunda Guerra Mundial e du-
rante a Guerra Fria foi dominado pelos estudiosos do “modelo totalitário” da
União Soviética145 , que se caracterizava enfatizando a natureza absoluta do po-
der de Joseph Stalin. O “modelo totalitário” foi definido pela primeira vez na
década de 1950 pelo cientista político Carl Joachim Friedrich, que postulou

144
Idem. Ibidem.
145
Davies, Sarah; Harris, James (2005). “Joseph Stalin: Power and Ideas”. Stalin: A New
History. Cambridge: Cambridge University Press. p. 3. A Sovietologia acadêmica, filha
do início da Guerra Fria, foi dominada pelo “modelo totalitário” da política soviética. Até a
década de 1960 era quase impossível avançar qualquer outra interpretação, pelo menos nos
EUA. Disponível em: <https://vdocuments.mx/stalin-a-new-history.html>. Acesso em 2 de
dezembro de 2021.
48 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

que a União Soviética e outros Estados Comunistas eram sistemas totalitários,


com o culto à personalidade e os poderes quase ilimitados do “grande líder”
como Stalin.146 A “escola revisionista” iniciada na década de 1960 concentrou-
se em instituições relativamente autônomas que poderiam influenciar a po-
lítica de nível superior.147 Matt Lenoe descreve a “escola revisionista” como
representando aqueles que “insistiam que a velha imagem da União Soviética
como um estado totalitário voltado para a dominação mundial era simplificada
demais ou simplesmente errada. Eles tendiam a se interessar pela história so-
cial e a argumentam que a liderança do Partido Comunista teve que se ajustar
às forças sociais.”148 Esses historiadores da “escola revisionista”, como J. Arch
Getty e Lynne Viola, desafiaram o “modelo totalitário”, que foi considerado
desatualizado,149 e eram, os “revisionistas”, ativos nos arquivos dos antigos es-
146
Idem. pp. 3–4. Em 1953, Carl Friedrich caracterizou os sistemas totalitários em termos de 5
pontos: uma ideologia oficial, controle de armas e da mídia, uso do terror e um único partido
de massas, ‘geralmente sob um único líder’. É claro que havia uma suposição de que o líder era
crítico para o funcionamento do totalitarismo: no ápice de um sistema monolítico, centrali-
zado e hierárquico, era ele quem emitia as ordens que eram cumpridas sem questionamento
por seus subordinados.
147
Idem. Pp.5-4. O trabalho de Tucker enfatizou a natureza absoluta do poder de Stalin, uma
suposição que foi cada vez mais contestada por historiadores revisionistas posteriores. Em
seu Origins of the Great Purges, Arch Getty argumentou que o sistema político soviético era
caótico, que as instituições muitas vezes escapavam ao controle do centro e que a liderança de
Stalin consistia em uma extensão considerável em responder, em uma base ad hoc, às crises
políticas conforme eles surgiram. O trabalho de Getty foi influenciado pela ciência política
dos anos 1960 em diante, que, em uma crítica ao modelo totalitário, começou a considerar a
possibilidade de que instituições burocráticas relativamente autônomas pudessem ter alguma
influência na formulação de políticas no nível mais alto.
148
Lenoe, Matt (June 2002). “Did Stalin Kill Kirov and Does It Matter?”. The
Journal of Modern History. 74. Pag. 367–368. Disponível em: <https://ur.bo-
oksc.eu/book/53810785/4c3478>. Acesso dia 2 de dezembro de 2021. Historiadores revisi-
onistas insistiram que a velha imagem da União Soviética como um estado totalitário voltado
para a dominação mundial foi simplificada demais ou simplesmente errada. Eles tendiam a se
interessar pela história social e a argumentar que a liderança do Partido Comunista teve que
se ajustar às forças sociais. O regime havia até mesmo respondido em alguns momentos às ne-
cessidades sentidas por grandes grupos sociais (no maciço programa de ação afirmativa para os
trabalhadores soviéticos no início dos anos 1930, por exemplo). Os revisionistas, como grupo,
eram céticos em relação à retórica maniqueísta da Guerra Fria dos políticos americanos. Fre-
quentemente, eles preferiam fontes soviéticas a emigrantes, e alguns estavam interessados em
“reabilitar” algum aspecto da experiência soviética (Stephen Cohen e a Nova Política Econô-
mica, por exemplo).
149
Zimmerman, William (September 1980). “Review: How the Soviet Union is
Governed”. Slavic Review. 39. Pag. 482. Disponível em: <https://af.bo-
oksc.eu/book/27828345/d45db1>. Acesso em 2 de dezembro de 2021. No quarto século
que se passou, a União Soviética mudou substancialmente. Nosso conhecimento da União
CONFLITO ENTRE OS “REVISIONISTAS” E OS “TOTALITÁRIOS”: TAUGER CONTRA CONQUEST| 49

tados comunistas, especialmente no Arquivo do Estado da Federação Russa


relacionado com a União Soviética.150
Logo, “o primeiro e inovador trabalho dessa escola é John Arch Getty, Ori-
gins of the Great Purges: The Soviet Communist Party Reconsidered, 1933-
1938 (Cambridge University Press, 1985)”151 . Este trabalho consiste numa
“versão muito revisada de seu doutorado, a dissertação no Boston College,
1979, orientado por Roberta Manning, esse trabalho é fundamental”152 .
As diferenças básicas entre as escolas foram resumidas muito bem no en-
saio de Grover Furr, onde ele recomenda o estudo da obra de Robert Thurs-
ton, bem como, ao fim, faz um breve relato da história da escola revisionista.
Neste resumo, Furr coloca em evidência a refutação de Wheatcroft a compa-
ração entre Hitler e Stálin que resume muito bem a natureza e a discordância
central entre ambas escolas históricas da sovietologia:
Por exemplo, em “A escala e a natureza da repressão e assassinatos em
massa alemães e soviéticos, 1930-1945”, EAS 48 (dezembro de 1996),
1319-1353, Wheatcroft ataca a comparação fácil e anticomunista de Sta-
lin com Hitler. O resumo diz: A repressão e os assassinatos em massa
executados por lideranças alemãs e soviéticas durante o período 1930-
45 diferiram em vários aspectos. Parece que o líder alemão Adolf Hi-
tler matou pelo menos cinco milhões de inocentes, principalmente por
causa de sua antipatia por judeus e comunistas. Em contraste, o líder
soviético Josef Stalin ordenou o assassinato de cerca de um milhão de
pessoas porque aparentemente as acreditava culpadas de crimes contra o
Estado. Ele teve o cuidado de documentar essas execuções, ao passo que
Hitler não se preocupou em fazer qualquer pretensão de legalidade.153
Soviética também mudou. Todos nós sabemos que o paradigma tradicional não satisfaz mais,
apesar de vários esforços, principalmente no início dos anos 1960 (a sociedade dirigida, o to-
talitarismo sem terror, o sistema de mobilização) para articular uma variante aceitável. Chega-
mos à conclusão de que modelos que eram, na verdade, ramificações de modelos totalitários
não fornecem boas aproximações da realidade pós-stalinista.
150
Sheila, Fitzpatrick (2007). “Revisionism in Soviet History”. History and Theory. 46 (4).
Pag. 77. [...]. Os acadêmicos ocidentais que, nas décadas de 1990 e 2000, foram os mais ativos
na busca pelos novos arquivos de dados sobre a repressão soviética, eram revisionistas (sem-
pre “ratos de arquivo”), como Arch Getty e Lynne Viola. Disponível em: <https://www.js-
tor.org/stable/4502285>. Acesso em 2 de dezembro de 2021.
151
FURR, G. Analise de “Life and Terror in Stalin’s Russia, 1934 -1941” de Robert
Thurston. Disponível em: <https://www.cienciasrevolucionarias.com/post/analise-de-life-
and-terror-in-stalin-s-russia-1934-1941-de-robert-thurston>. Acesso em 1 de dezembro de
2021.
152
Idem. Ibidem.
153
Idem. Ibidem.
50 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Este debate entre as escolas também chegou a versar sobre a questão da


fome de 1932-1933. E é este o escopo que nos interessa no momento.
Tauger afirmou como, já se averiguou em partes, que mesmo a cessação
total das exportações não teria revertido os problemas devido a dimensão dos
desastres naturais. Agora, portanto, traremos mais evidências e mais comple-
mentos a essa discussão de suma importância para o Estudo da URSS.
O que não se analisou ainda é que houve um debate entre Conquest e
Tauger. Este debate foi importante porque faz parte de uma discussão entre a
escola revisionista contra a escola dos totalitários sobre a questão da fome de
1932-1933. Conquest responde as obras de Tauger:
Talvez eu possa acrescentar que minhas próprias análises e descrições do
terror-fome apareceram pela primeira vez na URSS em Moscou em jor-
nais russos como Voprosy Istorii e Novyi Mir, e que o longo capítulo
impresso neste último era sobre a fome na Ucrânia e, portanto, depen-
deu significativamente de fontes ucranianas.154

Tauger replica Conquest:


O Sr. Conquest não trata desses argumentos. Ele quase se aproxima em
sua afirmação de que na Ucrânia e em algumas outras áreas “toda a safra
foi removida”. Uma vez que o regime adquiriu 4,7 milhões de tonela-
das de grãos da Ucrânia em 1932, muito menos do que em qualquer
ano anterior ou subsequente na década de 1930, isso implicaria que a
colheita na Ucrânia foi apenas dessa ordem de magnitude ou ainda me-
nos do que minha estimativa baixa! Obviamente, este não poderia ter
sido o caso, ou o número de mortos na Ucrânia não teria sido de qua-
tro ou cinco milhões, mas mais de 20 milhões, porque toda a população
rural teria ficado sem grãos....

Ainda estou para ver qualquer diretiva central real ordenando o blo-
queio da Ucrânia ou o confisco de alimentos na fronteira. As fontes
disponíveis ainda são muito incompletas para se chegar a qualquer con-
clusão sobre isso.155

É notável que Tauger é um excelente pesquisador e com intenções hones-


tas sobre a Ucrânia e sobre a URSS. No entanto, os dados sobre a fome que ele
154
Tauger, Mark e Robert Conquest. Slavic Review, Volume 51, Issue 1 (Spring, 1992), pp. 192-
194.
155
Idem. Ibidem.
CONFLITO ENTRE OS “REVISIONISTAS” E OS “TOTALITÁRIOS”: TAUGER CONTRA CONQUEST| 51

nos transmite são diferentes dos trazidos por Viktor Zemskov e Elena Prud-
nikova. Esta é uma questão que daria um livro específico só para trabalhar a
metodologia de cada escola, e escapa ao nosso tempo neste momento. No fu-
turo trabalharemos esta questão. Em breve abaixo abordaremos o ponto de
vista dos demógrafos soviéticos. Por hora nos cumpre mostrar a incoerência
dos totalitários. Tauger responde a Conquest com veemência:
“A segunda resposta de Robert Conquest ao meu artigo não resolve em
seu favor a controvérsia entre nós sobre as causas da fome de 1933”156 . Por
este motivo, “em seus pontos iniciais, observei que a fome era pior na Ucrânia
e em Kuban do que em outros lugares, em grande parte porque as colheitas
nessas regiões eram muito menores do que se conhecia anteriormente”157 . Por
consequência, “rejeitei sua evidência não porque não fosse “oficial”, mas por-
que minha pesquisa mostrou que estava incorreta”158 . Conquest, com toda
sua fragilidade probatória “cita o decreto de Stalin de janeiro de 1933 em uma
tentativa de validar os relatos das memórias ucranianas, para desacreditar as
fontes de arquivo que citei e para provar que a liderança soviética concentrou
a fome na Ucrânia e em Kuban”159 . Entretanto, “as sanções do decreto, não
correspondem aos relatos das memórias, nenhum dos quais descreveu campo-
neses sendo devolvidos às suas aldeias pelas forças da O-G-P-U”160 .
Assim, “as experiências descritas nesses relatos, em vez disso, refletem a
aplicação de uma diretiva secreta da O-G-P-U de setembro de 1932, orde-
nando o confisco de grãos e farinha para impedir o comércio ilegal”161 . Logo,
“uma vez que isso foi aplicado em todo o país, os relatos das memórias ucrani-
anas refletem a política geral e não um foco na Ucrânia”162 .
Neste sentido, “Vários novos estudos confirmam meu ponto de que cen-
tenas de milhares de camponeses fugiram da fome não apenas na Ucrânia e
Kuban, mas também na Sibéria, nos Urais, na bacia do Volga e em outros lu-
gares de 1932-1933”163 . Para conter o problema, como já foi ressaltado “As
autoridades regionais tentaram os deter e, em novembro de 1932, o Politburo
começou a preparar o sistema de passaportes que logo impôs restrições à mo-
bilidade em todo o país”164 .
156
Idem. Ibidem.
157
Idem. Ibidem.
158
Idem. Ibidem.
159
Idem. Ibidem.
160
Idem. Ibidem.
161
Idem. Ibidem.
162
Idem. Ibidem.
163
Idem. Ibidem.
164
Idem. Ibidem.
52 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Esta foi a razão do decreto de janeiro que “foi, portanto, uma das várias
medidas tomadas nessa época para controlar a mobilidade da mão-de-obra,
neste caso para reter a mão-de-obra nas regiões de grãos para que a safra de
1933 não fosse ainda pior”165 . O decreto fazia “referência às regiões do norte,
sugere que pode até ter sido usado para enviar camponeses dessas áreas ao sul
para fornecer trabalho”166 .
Por esta razão “Nem o próprio decreto nem a escala de sua aplicação são
suficientes para provar que a fome foi artificialmente imposta à Ucrânia”167 .
...
Na lógica da história oral, “os relatos de testemunhas oculares ucranianas,
por outro lado, são enganosos porque muito poucos camponeses de outras
regiões tiveram a oportunidade de escapar da URSS após a Segunda Guerra
Mundial”168 .
Tauger alça um importante trabalho para provar a falsidade da premissa
colhida de história oral por Robert Conquest, indicando o trabalho do histo-
riador russo Kondrashin que teria reunido depoimentos o suficiente pra des-
mentir por completo a questão.
É verdade que em um debate com os defensores do holodomor — toma-
dos pelo argumento ad personam e pelo racismo antirrusso —, Kondrashin
poderia ser desconsiderado a priori por ser russo, mas é inegável que ele reali-
zou um excelente trabalho quando “entrevistou 617 sobreviventes da fome na
região do Volga e refutou explicitamente o argumento de Conquest sobre o
foco da nacionalidade da fome”169 . Após a entrevista Kondrashin relatou que
“de acordo com essas testemunhas oculares, a fome foi mais severa nas regiões
de trigo e centeio, em outras palavras, em parte como resultado da pequena co-
lheita”170 .... Por isto, “Tanto estudiosos russos quanto ocidentais, como Kon-
drashin... e Alec Nove... agora reconhecem que a colheita de 1932 foi muito
menor do que se pensava e foi um fator importante na fome.”171
Segundo essas estimativas, a pesquisa do principal representante da escola
do totalitarismo, hoje, passa por diversos problemas em todos os âmbitos da
historiografia, seja na coleta de amostra de história oral ucraniana seja para se
provar documentalmente.

165
Idem. Ibidem.
166
Idem. Ibidem.
167
Idem. Ibidem.
168
Idem. Ibidem.
169
Idem. Ibidem.
170
Idem. Ibidem.
171
Idem. Ibidem.
FRAUDE NOS NÚMEROS DE MORTOS E A DESCONSIDERAÇÃO DOS DADOS DEMOGRÁFICOS| 53

FRAUDE NOS NÚMEROS DE MORTOS E A DESCONSIDERAÇÃO


DOS DADOS DEMOGRÁFICOS

Em suas memórias Molotov já rejeitava completamente a ideia de milhões


de mortos na proporção que os historiadores da escola totalitária abordam,
o que está inclusive de acordo com a maioria das pesquisas arquivísticas. E
cabe lembrar que ele já estava fora de influência do chamado “Stalinismo”, e
de Stálin a quem ele poderia talvez ter motivos para se amargurar, uma vez
que foi durante o governo de Stálin que sua a esposa foi acusada de ser espiã e
exilada. Mesmo com razões para destruir Stálin, Molotov seguiu um caminho
diverso:
CHUEV: Mas quase 12 milhões morreram de fome em 1933....
MOLOTOV: Os números não foram comprovados.
CHUEV: Não foram comprovados.
MOLOTOV: Não, não, de forma alguma. Naqueles anos, estive no
país em viagens de compra de grãos. Essas coisas não poderiam sim-
plesmente ter me escapado. Eles simplesmente não podiam. Viajei duas
vezes para a Ucrânia. Visitei Sychevo nos Urais e alguns lugares na Sibé-
ria. Claro que não vi nada desse tipo ali. Essas alegações são absurdas!
Absurdo! É verdade que não tive ocasião de visitar a região do Volga....
Não, esses números são um exagero, embora essas mortes tenham sido
relatadas, é claro, em alguns lugares.172

Além disso, o já citado por Tauger, Alec Nove, é novamente trazido ao


debate, desta vez por Getty que afirma a falsidade geral nas estatísticas normal-
mente apresentadas no ocidente.
Mais uma vez, cumpre lembrar, nenhum desses historiadores deve nada a
Stalin ou a URSS, para diminuir de vossos caminhos os lastros de calúnias e
difamações levantadas contra ambos. Nove afirma:
Além disso, os números sobre as mortes relacionadas com a fome não
podem ser precisos, por razões de “definição” .... As estatísticas ucra-
nianas mostram um declínio muito grande nos nascimentos em 1933
a 1934, que pode ser atribuído a um aumento acentuado nos abortos
e também ao não registro de nascimentos de pessoas que morreram na
infância.173
172
Chuev, Feliks. Molotov Remembers. Chicago: IR Dee, 1993, p. 243.
173
NOVE, apud in: Getty e Manning. Stalinist Terror: New Perspectives. Cambridge, NY:
Cambridge University Press, 1993, p. 290.
54 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Além de não serem precisos, mas apenas estimados, a escalada de mortos


por fomes na URSS não deixou de considerar outras causas além da fome.
Com relação à escala da fome em 1932 e 1933, agora temos informações
muito melhores sobre sua cronologia e cobertura regional entre a população
civil registrada. O nível de excesso de mortalidade registrado pela população
civil foi da ordem de 3 a 4 milhões ... o que ainda é muito inferior aos números
alegados por Conquest, Rosefield e Medvedev.
Finalmente chega o momento de verificar o número real de mortos na
Ucrânia e as complicações próprias desse debate. Para Tauger, Getty, Zems-
kov174 e Alec Nove, o número total varia entre 3-4 milhões.
Elena Prudinikova, historiadora e jornalista Russa, nos passa em detalhes
uma situação diferente, com uma variação menor indicando a morte por todas
as causas. E o motivo que leva a diferença no quadro se deve a possível metodo-
logia de avaliação. Prudnikova contabiliza mortes apenas na região Ucraniana
e os demais consideram as mortes de ucranianos em geral em toda URSS. Este
assunto merece uma atenção especial que infelizmente não pode ser dada neste
espaço e tempo, mas em breve teceremos considerações a respeito.
É importante verificar a atenção especial dada aos arquivos de Moscou:
Através da pesquisa no GARF, Arquivo do Estado da Federação Russa,
Prudnikova fez descobertas essenciais. Assim ela afirma: “de acordo com da-
dos desclassificados do Departamento Central de Contabilidade Econômica
Nacional do Comitê de Planejamento do Estado da URSS (como o Depar-
tamento Central de Estatística era chamado na época)”175 , que foram “com-
174
As vítimas do terror político, segundo algumas abordagens, frequentemente incluem aqueles
que morreram de fome em 1933, o que dificilmente é apropriado. Afinal, estamos falando da
política fiscal do Estado no contexto de um desastre natural (seca). Naquela época, em regiões
afetadas pela seca (Ucrânia, Cáucaso do Norte, partes da região do Volga, Urais, Sibéria e Ca-
zaquistão) o Estado não considerou necessário reduzir o volume de suprimentos obrigatórios
e apreendeu a escassa colheita dos camponeses até o último grão, condenando-os à morte por
inanição. A controvérsia sobre o número de mortes por fome estava longe de ter terminado:
as estimativas variavam principalmente entre 2 milhões e 8 milhões [171]. De acordo com
nossas estimativas, cerca de 3 milhões de pessoas foram vítimas da fome de 1932-1933, cerca
da metade delas na Ucrânia. Nossa conclusão, naturalmente, não é original, pois aproximada-
mente as mesmas estimativas foram dadas nos anos 80 do século XX pelos historiadores V. P.
Danilov (URSS), S. Wheatcroft (Austrália) e outros. [172] ZEMSKOV, V. Stalin e o Povo:
Por que não Houve Levante? Disponível em: <https://stalinism.ru/dokumentyi/stalin-i-
narod-pochemu-ne-bylo-vosstaniya.html?showall=1>. Acesso em 26 de novembro de 2021.
175
RGAE. F. 1562, inventário 329, ed. xp. 16, l. 12; GARF. F. 1562, inven-
tário 329, ed. xp. 256, l. 45. Apud in: Прудникова Елена, Чигирин Иван.
Мифология «голодомора». PRUDNIKOVA ELENA, CHIGIRIN, IVAN. A mito-
logia do “Holodomor”. Moscou. Editora: Veche, 2015 Livro Completo Disponível em:
FRAUDE NOS NÚMEROS DE MORTOS E A DESCONSIDERAÇÃO DOS DADOS DEMOGRÁFICOS| 55

pilados com base em certificados do Departamento de Contabilidade Econô-


mica Nacional da República Socialista Soviética da Ucrânia”176 , só no ano de
“1932, na Ucrânia, 668.200 pessoas morreram por todas as causas, em 1933
— 1.850.300 mil pessoas”177 . Consequentemente, “no total, em 1932 e 1933,
2.518.500 pessoas morreram de todas as causas na Ucrânia”178 . De forma mais
precisa, ela impugna dados da escola revisionista se perguntando: “Como 3,5
milhões de mortos por fome se encaixam aqui é uma questão para os demó-
grafos ucranianos, uma vez que eles não têm outras fontes de estimativas, bem
como, por definição, não seria possível”179 . Ela prossegue com um relatório
bastante preciso obtido na GARF.
“Como podemos ver, com uma população média de 31,9 milhões, mor-
reram em média 465.600 pessoas por ano”. Assim “este número inclui mor-
tes por várias causas — bebês menores de 1 ano (e a mortalidade infantil era
enorme), velhice, por doenças, acidentes e etc”180 .
Logo, “do número total de mortes em 1932 e 1933, subtraímos o valor
médio — 465.600, do número total de óbitos: 2.518.580 (465.600 vezes 2
anos = a 931.200. 2.518.380 menos 931.200 = 1.587.380 pessoas)”. Este é o
excesso de mortalidade máximo, em 1932 e 1933, segundo Prudinikova. 181
“Tomando a média aritmética e arredondando-a, temos que, em 1932-
1933, 1,5 milhão de pessoas morreram a mais do que o previsto, com base na
mortalidade média. Quão precisos são esses cálculos?”182
Seguindo com a avaliação dos arquivos, “na nota explicativa dos materiais

<https://www.litmir.me/br/?b=256400&p=1>. Acesso na data de 26 de Novembro de


2021.
176
Idem. Ibidem.
177
Idem. Ibidem.
178
Idem. RGAE. F. 1,562,500 inventário 329, ed. xp. 16, l. 12”.
179
Idem. Ibidem.
180
Para efeitos de comparação: na Ucrânia, 782 mil morreram por todas as causas em 2005 pes-
soas com uma população de 47,1 milhões de pessoas [51]. Os números são bastante compa-
ráveis. Idem. Ibidem.
181
Cabe ressaltar que ela, Prudinikova, não faz parte da escola revisionista. Há uma escola
marxista-leninista em construção, e o problema é que esta escola é menos sistematizada e cons-
truída que as demais. Mas, seus métodos, conforme veremos em um trabalho a parte sobre o
assunto, são mais completos.
182
RGAE. F. 1562, inventário 329, ed. xp. 16, l. 12; GARF. F. 1562, inven-
tário 329, ed. xp. 256, l. 45. Apud in: Прудникова Елена, Чигирин Иван.
Мифология «голодомора». PRUDNIKOVA ELENA, CHIGIRIN, IVAN. A mito-
logia do “Holodomor”. Moscou. Editora: Veche, 2015 Livro Completo Disponível em:
<https://www.litmir.me/br/?b=256400&p=1>. Acesso na data de 26 de Novembro de
2021.
56 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

da evolução anual do movimento natural da população para 1933, é indicado


o erro máximo — 21% dos valores reais. Só não diz para qual lado”. Sendo
realista, “no entanto, as autoridades locais dificilmente estavam inclinadas a
exagerar indicadores desagradáveis como a taxa de mortalidade”183 . Sendo as-
sim, “somando mais 21% ao número que recebemos, chegamos a 1 milhão e
800 mil pessoas. Este é o máximo possível de excesso de mortalidade na repú-
blica”184 . É evidente por lógica que, “esse resultado, não é bom. Mas, não se
trata de vinte, nem dez, nem sete, ou mesmo 3,5 milhões de Mortos”. 185
Apesar das revelações acima serem surpreendentes e bastante inéditas para
as pesquisas ocidentais, nem de longe se trata da descoberta mais relevante
que podemos encontrar na pesquisa de Prudnikova. Além da descoberta ex-
posta acima, estudando mais profundamente os arquivos, Prudnikova desco-
briu provas da existência de um significativo expurgo nos registros materiais
acerca da mortalidade em 1933. Segundo suas pesquisas arquivísticas a morte
epidêmica, possivelmente, é a que compõe a causa mais provável de morbi-
dade no período de 1933. Portanto, na falta de dados que destrinchem a taxa
de mortalidade, o mais próximo possível seriam os casos que abordam a mor-
bidade.
A morbidade ou morbilidade, consiste na taxa de indivíduos portadores de
determinada doença dentro de um grupo específico, a partir de certo período
de análise. Mortalidade faz referência a tudo que pode ser mortal.
Se os dados de morbidade em 1933 existem, mas os de mortalidade não,
podemos concluir que, provavelmente, quem expurgou os arquivos não quer
que as duas coisas coincidam. Essa é uma possível interpretação.
Afinal, se os dados de mortalidade e morbidade estivessem casados no pior
caso de 1933, mais da metade dos mortos que excederam a média prevista, ou
seja, quase 60% do total, estariam classificados como vítimas não de fome, mas
de malária entre outras doenças existentes fortemente na época.
Mas, felizmente, como se sabe, a URSS vinha melhorando drasticamente
a saúde do país em quadros comparativos que analisam desde os tempos do
Czar, o governo provisório e a era Lênin. Ao observar as estatísticas soviéticas

183
Idem. Ibidem.
184
Idem. Ibidem.
185
RGAE. F. 1562, inventário 329, ed. xp. 16, l. 12; GARF. F. 1562, inven-
tário 329, ed. xp. 256, l. 45. Apud in: Прудникова Елена, Чигирин Иван.
Мифология «голодомора». PRUDNIKOVA ELENA, CHIGIRIN, IVAN. A mito-
logia do “Holodomor”. Moscou. Editora: Veche, 2015 Livro Completo Disponível em:
<https://www.litmir.me/br/?b=256400&p=1>. Acesso na data de 26 de Novembro de
2021.
FRAUDE NOS NÚMEROS DE MORTOS E A DESCONSIDERAÇÃO DOS DADOS DEMOGRÁFICOS| 57

sobre este assunto, Prudnikova afirma:

“pode-se escrever romances e fazer filmes sobre a luta teimosa e heroica


da medicina soviética contra as doenças infecciosas. Em primeiro lu-
gar — para crianças. E, aliás, não foi possível reduzir a incidência do
sarampo no país como um todo, e na Ucrânia, que foi submetida ao
“genocídio” — pela metade”. Mas não estamos falando sobre isso. Pro-
curamos uma epidemia e podemos encontrá-la facilmente.”186

Desse modo, a discussão apresentada pela autora tem grande pertinência


ao estudo da sovietologia. Mostra que os melhores estatísticos podem estar na
superficialidade da questão.
Cumpre refletir adequadamente o que ela diz sobre a “queima de arqui-
vos” em relação a questão da mortalidade em 1933. Ao que tudo indica, essa
“queima de arquivos” não foi realizada nos períodos da Era Stálin, como uma
forma de se livrar de “provas do genocídio” ou “da responsabilidade pela fome”,
do contrário, não se encontraria registros de mortalidade em nenhuma cidade
do país. Ao que parece sumiram apenas os arquivos que falam da mortalidade
em 1933 porque eles coincidiriam com prontuários médicos que retratavam
questões epidêmicas. Neste sentido, sumiram com os registros de mortalidade
da Ucrânia em 1933, mas não sumiram com os prontuários médicos que indi-
cam que quase 900.000 pessoas foram vítimas de epidemias.
“Um cálculo simples mostra que essa mortalidade “errada” e anormal em
1933 é responsável por cerca de 75.000 pessoas nas cidades e 800.000 nas al-
deias”187 , ou seja, “mais da metade daqueles que morreram naquele ano fatí-
dico na Ucrânia, por definição, não poderiam morrer de fome! Qual é o pro-
blema?”188
Como um passe de mágica, e favorecendo fortemente a tese do genocídio,
“no arquivo russo onde esses dados estão armazenados, não há informações
sobre as causas da morte neste ano”189 . A situação é estranha porque há ar-
quivos sobre “todas as regiões e repúblicas, mas não sobre a Ucrânia! O que
também te faz pensar”190 por quê?
186
ELENA, PRUDINIKOVA, CHIGIRIN, IVAN. A mitologia do “Holo-
domor”. Moscou. Editora: Veche, 2015 Livro Completo Disponível em:
<https://www.litmir.me/br/?b=256400&p=16>. Acesso na data de 26 de Novem-
bro de 2021.
187
Idem. Ibidem.
188
Idem. Ibidem.
189
Idem. Ibidem.
190
Idem. Ibidem.
58 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Logo, não é impossível crer que o expurgo foi motivado por razões ma-
quiavélicas, afinal, “por várias razões políticas, os arquivos soviéticos foram re-
petidamente “limpos, e o desaparecimento destes dados é inconveniente ape-
nas uma campanha política a da “fome”191 . Neste sentido, somando este fato
“aos estranhos números acima, tem-se a sugestão de que a fome não foi a causa
principal da morte em 1933”192 . Assim, “se todas essas pessoas morreram de
fome — qual o motivo do súbito desaparecimento de dados dos arquivos do
estado?”193
A resposta é mais simples do que se imagina. “A história conhece três cau-
sas de mortalidade em massa: fome, guerra e epidemia. Por definição, não
pode haver fome no verão. Também não houve guerra em 1933. O terceiro
componente permanece — a epidemia. (...)”194
Temos de concreto que, “Para 1933, não há dados sobre mortalidade, como
já mencionado, mas há sobre morbidade”195 . Em frente “estão os dados do ín-
dice Card do Comitê de Planejamento do Estado T-s-U-N-K-h-U (da URSS
sobre a propagação das principais doenças infecciosas na B-S-S-R, a R-S-F-S-R
e a U-R-S-S”196 .
Assim sendo, “nas informações sobre a S-S-R ucraniana e a U-R-S-S, o
numerador da fração indica o número absoluto de doenças (em milhares) e o
denominador — o número de casos por 10.000 habitantes”. De outro modo
“na Bielo-Rússia e na Rússia, as estatísticas, aparentemente, ainda não atingi-
ram tais alturas”. (...)197
Não há como negar que “A propagação de epidemias geralmente é algo
misterioso”198 . Em caso análogo, “o companheiro habitual da fome — disen-
teria em 1933 deu um mínimo estável, mas por alguma razão aumentou drasti-
camente em 1934, um ano sem fome. O que mais uma vez testemunha: tudo
foi difícil”199 .
De outra forma, necessariamente, “dispararam os indicadores de duas do-
enças esquecidas, uma das quais associada a calamidades sociais (mas não à
fome) e a outra — em geral por conta própria, pois depende principalmente da

191
Idem. Ibidem.
192
Idem. Ibidem.
193
Idem. Ibidem.
194
Idem. Ibidem.
195
Idem. Ibidem.
196
Idem. Ibidem.
197
Idem. Ibidem.
198
Idem. Ibidem.
199
Idem. Ibidem.
OS GRÃOS FORAM ENVIADOS PARA SERVIR OS MILITARES NA GUERRA CONTRA O JAPÃO | 59

fertilidade dos mosquitos”200 . Prosseguindo no ano de 1933, “mais de cem mil


pessoas superavam os indicadores de tifo (212.644 pessoas) e malária (767.224
pessoas)”. De maneira geral, na URSS daquele ano, “houve o maior pico de
morbidade durante toda a existência do estado — o número de infectados com
malária foi de 6 milhões 282 mil 586 pessoas”201 .
A descoberta mais relevante desta pesquisa é o papel da malária nas mortes.
“A malária apresenta um pico de morbidade no verão pronunciado e caracte-
rístico. Achamos que não há necessidade de procurar outras causas para o pico
de mortalidade no verão”.202
Neste sentido, podemos e devemos concluir que a causa morte principal
da Ucrânia não foi a fome, foi a malária, e que a fome não foi em 1933 o prin-
cipal problema enfrentado na Ucrânia. Uma busca completa poderia revelar
o mesmo em todos os períodos e repúblicas soviéticas. Dos 1.500.000 amais
que morreram em 1933, 900.000 foram de epidemias. Mas, cumpre lembrar
que se trata de morte de todas as causas, e que por definição não podem ser
todas mortes pela fome.

OS GRÃOS FORAM ENVIADOS PARA SERVIR OS MILITARES


NA GUERRA CONTRA O JAPÃO

Segundo Walter Duranty afirmou, em sua obra relativa à história da URSS,


uma parte destacada dos grãos serviriam a guerra contra os japoneses. Quais
guerras os soviéticos tinham contra os japoneses?
As guerras de fronteira soviético-japonesas aconteceram ao longo da dé-
cada de 1930.
Foram uma série de confrontos do Japão contra a União Soviética entre
1932 e 1939.
O imperialismo japonês, no decorrer da invasão e dominação dos países
asiáticos, exercendo seu costume bélico derivado dos britânicos, entrou em
conflito com a União Soviética e, antes disto, havia entrado em confrontos
com a China pelo domínio da Manchúria.
Os intentos militares japoneses nesses campos soviéticos, inevitavelmente,
provocaram confrontos com frequência e várias disputas de demarcação terri-
torial.
O confronto fronteiriço japonês soviético, tratou-se de uma guerra não de-
200
Idem. Ibidem.
201
Idem. Ibidem.
202
Idem. Ibidem.
60 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

clarada que, como se sabe, acabou com uma vitória decisiva soviética do exér-
cito vermelho na Batalha de Khalkhin Gol, configurando a primeira e mais
grave derrota militar do Japão desde o início de seu expansionismo na Ásia203 .
Graças a esta derrota, e ao relatório do general soviético que traiu a URSS
Liushikov, o Japão abandonou a ideia de enfrentar a União Soviética sem o
apoio alemão. Os detalhes destes conflitos podem ser vistos na obra de Jo-
nathan Haslam, que diz em sua pesquisa: “A essência do relato começa com
a rejeição do Japão de um pacto de não agressão com a URSS em dezembro
de 1932 e termina com a assinatura de um pacto de neutralidade em abril de
1941.”204 . O Relato de Duranty parece bastante plausível se acompanhado
pela história dos conflitos do Japão fascista contra a URSS.
“O que aconteceu foi trágico para o interior da Rússia”205 . Diretrizes tive-
ram de ser “dadas em março, no início do período de semeadura da primavera
na Ucrânia e no Norte do Cáucaso e no Baixo Volga, para que 2 milhões de
toneladas de grãos fossem coletados em 30 dias porque o Exército precisava
deles”206 . Infelizmente, sem alternativas a demanda “tinha que ser recolhida,
sem discussão, sob pena de morte. As ordens sobre a gasolina não eram menos
peremptórias. Aqui não sei os números, mas tantos milhares de toneladas de
gasolina devem ser dados ao Exército”207 . Naquele contexto histórico as fa-
zendas coletivas dependiam de tratores para arar seus campos”208 . Essa seria “a
terrível verdade da chamada “fome criada pelo homem”, da “idade de ferro”
da Rússia, quando Stalin foi acusado de causar a morte de 4 ou 5 milhões de
camponeses para satisfazer sua própria determinação brutal de que deveriam
ser socializados ... se não”209 .
Não resta dúvidas que esta é uma concepção errada! “Compare isso com
a verdade, que o Japão estava prestes a atacar e o Exército Vermelho devia ter
reservas de comida e gasolina”210 .... assim, todo setor agrícola foi obrigado a
dispor dos grãos. “A cota precisava ser atingida, essa era a ordem do Krem-

203
Haslam, Jonathan (1992). The Soviet Union and the threat from the East, 1933-41:
Moscow, Tokyo, and the prelude to the Pacific War (em ingles). [S.l.]: University of
Pittsburgh Press. Disponível em: <https://br1lib.org/book/2939709/0f6543?dsource=re-
commend>. Pag. 132. Acesso em 01 de dezembro de 2021.
204
Idem. Pag. 06.
205
Duranty, Walter. USSR: The Story of Soviet Russia. Philadelphia, NY: JB Lippincott
Co. 1944, p. 192.
206
Idem. Ibidem.
207
Idem. Ibidem.
208
Idem. Ibidem.
209
Idem. Ibidem.
210
Idem. Ibidem.
OS GRÃOS FORAM ENVIADOS PARA SERVIR OS MILITARES NA GUERRA CONTRA O JAPÃO | 61

lin. Ele foi alcançado, mas as lixeiras estavam muito limpas”211 . Naquele exato
momento, de fato, “os camponeses, kulaques e coletivos russos estavam envol-
vidos em uma desgraça comum”212 . Assim conclui Duranty:
Os animais de tração estavam mortos, em uma fase anterior da luta, e
não havia gás para os tratores, e suas últimas reservas de comida e se-
mentes para a primavera haviam sido arrancadas deles pelo poder do
Kremlin, que era impulsionado pela compulsão, isto é, pelo medo do
Japão....213
Muito impressiona como as reportagens de Duranty, apesar de se enqua-
drarem na categoria de história imediata, são bastante coerentes com os mate-
riais de arquivos de importantes historiadores que abordamos acima.
Abaixo temos um complemento a discussão apresentada por Prudinikhova
sobre as epidemias.
“Seus padrões de vida [dos camponeses] foram tão reduzidos que se torna-
ram presas fáceis das doenças de desnutrição — tifo, cólera e escorbuto, sempre
endêmicos na Rússia — e infectaram as populações urbanas”214 .
Nesta ótica “a Rússia foi devastada pela miséria, mas o Exército Vermelho
restaurou suas reservas de alimentos e de gasolina, e roupas e couro para uni-
formes e botas”215 . Posteriormente “o Japão não atacou. Em agosto de 1932,
a conclusão da Barragem Dnieper foi comemorada de uma forma que ecoou
em todo o mundo”216 . Por consequência “milhões de acres russos estavam de-
sertos e não cultivados; milhões de camponeses russos imploravam por pão ou
morriam. Mas o Japão não atacou”217 . A guerra, ou a ameaça de guerra, obriga
a retenção de alimentos. E isto infelizmente não é discutível.
A escassez de alimentos e mercadorias na Rússia foi atribuída, como Sta-
lin pretendia, à tensão do Plano Quinquenal, e tudo que os espiões ja-
poneses puderam aprender foi que o Exército Vermelho aguardava seu
ataque sem ansiedade. Sua ponta de lança, apontada para a Mongólia
Exterior e o Lago Baikal, foi deslocada, e suas tropas moveram-se para o
sul para a província chinesa de Jehol, que eles conquistaram facilmente
e adicionaram a “Manchukuo”. 218
211
Idem. Ibidem.
212
Idem. Ibidem.
213
Idem. Ibidem.
214
Idem. p. 193 e 195.
215
Idem. Ibidem.
216
Idem. Ibidem.
217
Idem. Ibidem.
218
Idem. Ibidem.
62 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

A verdade é que a URSS era uma sociedade que se construía não só para
o socialismo, mas uma sociedade de defesa contra o provável terror de uma
guerra mundial contra ela. “Stalin havia vencido o jogo contra probabilidades
terríveis, mas a Rússia pagou em vidas tanto quanto na guerra”219 . Neste sen-
tido, “À luz desse e de outros conhecimentos subsequentes, é interessante ler
meus despachos de Moscou no inverno de 1932-33”220 . Duranty assim perce-
beu o problema com toda clareza:
Parece que eu sabia o que estava acontecendo, sem saber por quê, ou seja,
sem perceber que o Japão era a verdadeira chave do problema soviético naquela
época, e que a primeira melhora genuína da situação agrária durou quase um
dia. com o impulso japonês para o sul contra Jehol. Significava, para dizer de
forma sucinta, que Stalin havia vencido seu blefe: o Japão mudou-se para o
sul, não para o norte, e a Rússia poderia ousar usar seus melhores homens.221

CAUSAS NATURAIS SÃO IGNORADAS PELOS CRÍTICOS

A premissa que se defende neste trabalho, insisto em dizer, é de que as cau-


sas naturais foram as principais razões da fome e que o restante, portanto, as
influências humanas, podem ser consideradas mais agravantes do que propri-
amente dados de origem do problema. No entanto, a atuação dos Kulaques é
agravante de natureza muito mais grave do que o confisco de grãos e a guerra
imperialista ainda mais grave que ambos. Afinal é preciso compreender que
o confisco de grãos tinha como meta a industrialização e a defesa da URSS na
futura segunda guerra mundial. A política de confisco de certa existia também
porque os grandes latifundiários eram especuladores.
Determinados tipos de confiscos legais, eram pré-determinados com anuên-
cia majoritária dos camponeses soviéticos que apoiaram basicamente três polí-
ticas em maior ou menor medida: a coletivização, a deskulaquização e a indus-
trialização. Ou seja, aqui se expõe uma política “esperada” pelo povo. Além
do mais, já provamos em outra oportunidade o quanto os soviéticos apoiaram
de maneira geral essas políticas.
Sobre a questão ambiental “dois estudos discutem as safras desses anos”222
de 1928 a 1933, Tauger se refere a “Robert Davies e Stephen Wheatcroft”223 ,
219
Idem. Ibidem.
220
Idem. Ibidem.
221
Idem. Ibidem.
222
Tauger, Mark. Natural Disaster and Human Actions in the Soviet Famine of 1931-
1933. Pittsburgh: University of Pittsburgh, 2001, p.6.
223
Idem. Ibidem.
CAUSAS NATURAIS SÃO IGNORADAS PELOS CRÍTICOS| 63

estes argumentam “que as colheitas de 1931 e 1932 foram pequenas devido à


seca e às dificuldades de trabalho e capital, especialmente o declínio dos ani-
mais de tração”224 .... O Declínio aqui citado, como já abordado, deve-se a atu-
ação dos Kulaques.
Em sua obra Tauger reexamina “as colheitas de 1931 e especialmente de
1932 com base em documentos de arquivo recentemente disponíveis e fontes
publicadas, incluindo alguns que os estudiosos nunca utilizaram”225 . Mos-
trando que “O contexto ambiental dessas fomes merece muito mais ênfase do
que recebeu anteriormente”226 .
Neste contexto, há o deslocamento do eixo das causas humanas para os
desastres ambientais. Estes desastres ambientais “reduziram substancialmente
a colheita de grãos soviética em 1932 e devem ser considerados uma das prin-
cipais causas da fome”227 . Tauger argumenta que “as dificuldades de capital
e trabalho foram significativas, mas não tão importantes quanto esses fatores
ambientais, e foram em parte resultado deles”. Ou seja, mesmo os problemas
humanos, foco de alguns trabalhos aqui abordados como Davies e Wheat-
croft, Bach e Diane Koenker, estão intimamente determinados pelas causas
naturais. Tauger também demonstra “que a liderança soviética não entendeu
totalmente a crise e por ignorância agiu de forma inconsistente em resposta a
ela”228 . Assim, as conclusões de Tauger seguem, portanto, longe da orbita de
“descrever a fome soviética de 1932-1933 simplesmente como uma fome ar-
tificial ou produzida pelo homem, ou então reduzi-la a uma única causa”229 .
Por consequência, no geral, “a baixa safra e, portanto, a fome, resultaram de
um complexo de fatores humanos e ambientais, uma interação do homem e
da natureza, assim como a maioria das fomes anteriores da história”. 230
A tese de Tauger é aqui fundamental para nossa. Embora ele defenda que
as razões humanas tenham interferido, ele não coloca entre estes fatores, os am-
bientais e humanos, uma possível hierarquia, e é desse ponto que aqui difere-se
fundamentalmente. Em nossa visão, o fato dele afirmar que o problema rela-
cionado a capital e trabalho está subordinado, em partes, a questão ambiental,
permite inferir uma superioridade do problema natural sobre o problema hu-
mano. Do mesmo modo ele afirma que nem a cessação das exportações mesmo

224
Idem. Ibidem.
225
Idem. Ibidem.
226
Idem. Ibidem.
227
Idem. Ibidem.
228
Idem. Ibidem.
229
Idem. Ibidem.
230
Idem. Ibidem.
64 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

de início seria o insuficiente para acabar com o problema, e boa parte do con-
fisco visava a exportação. Por tabela o confisco e a exportação tinham algum
grau de ligação. Portanto, nem o fim do confisco e das exportações possivel-
mente erradicariam o problema.
As causas naturais evidentemente devem ganhar mais destaque, são elas:
1) Doenças: Já abordamos as epidemias nas citações trazidas por Elena
Prudnikova, e acreditamos que aquela é a abordagem mais correta em relação
a causa de morte mais frequente em 1933. Mas, as doenças sobre as plantações,
e produções que dependem do meio ambiente também causaram imenso pre-
juízo.
2) Pragas nas Plantações: ferrugem, fungos e etc. A ferrugem é um
fungo que ataca plantas. De início, não é possível perceber nenhuma alteração
aparente na planta, o que vai ocorrer algum tempo após a infestação, quando
o fungo se reproduzir e esporular. Nesse momento, as manchas começam a
surgir e a doença já causou danos à plantação.
A literatura agronômica soviética e outras fontes publicadas e arquiva-
das da década de 1930, que nenhum estudo anterior sobre a fome dis-
cutiu, indicam que em 1932 as safras soviéticas sofreram de uma com-
binação extraordinariamente severa de infestações de doenças e pragas
nas plantações. A infestação mais importante em 1932 veio de diversas
variedades de ferrugem, uma categoria de fungos que podem infestar
grãos e muitas outras plantas.231
Os números causados de perdas por desastres naturais não são pequenos
em se tratando da URSS. “Embora as infestações de ferrugem não fossem um
problema novo na Rússia, o surto extremo em 1932 pegou agrônomos de sur-
presa, e eles não entenderam totalmente”232 . São substanciais as perdas:
Com ferrugem em 1932 atingiram aproximadamente 9 milhões de to-
neladas, 13% do valor da colheita oficial e quase 20% da estimativa de
colheita de arquivo mais baixa. Também deve ser observado que, em-
bora essas estimativas sejam aproximadas, elas também são as únicas es-
timativas concretas, com base em qualquer evidência científica, mesmo
remotamente, das perdas gerais da colheita de grãos de 1932 de quais-
quer fatores ambientais ou humanos disponíveis em quaisquer fontes
publicadas ou arquivadas que eu tenha sido capaz de encontrar.233
231
Tauger, Mark. Natural Disaster and Human Actions in the Soviet Famine of 1931-
1933. Pittsburgh: University of Pittsburgh, 2001, p. 13
232
Tauger, Mark. Tauger, Mark. Natural Disaster and Human Actions in the Soviet Fa-
mine of 1931-1933. Pittsburgh: University of Pittsburgh, 2001, p. 16.
233
Idem. Pag. 17
CAUSAS NATURAIS SÃO IGNORADAS PELOS CRÍTICOS| 65

3) Infestações de Insetos como gafanhotos sempre levaram pecuaristas e


agricultores a se defender de uma praga secular de proporções históricas. Esses
insetos estão são capazes de devorar plantações inteiras em poucas horas.
O clima quente e úmido em 1932 também levou a graves infestações
de insetos, incluindo gafanhotos, mariposas e outros insetos nos grãos
e na beterraba sacarina. Um jornal agronômico relatou que em 1932
uma “multiplicação em massa” de gafanhotos asiáticos ocorreu em to-
dos os criadouros importantes da zona desértica, incluindo o Dagues-
tão, o Baixo Volga, o delta do rio Ural, o Cáucaso do Norte e o Oblast
de Kalmyk. Os relatórios da O-G-P-U durante a primavera de 1932 ob-
servaram infestações de gafanhotos, mariposas dos prados, moscas-do-
campo, gorgulhos da beterraba e outros insetos. Um relatório de 28 de
maio observou que o gorgulho da beterraba infestou quase 100.000 hec-
tares de beterraba na Ucrânia; em um distrito, os gorgulhos destruíram
quase 500 hectares em três horas. 234

4) Secas, chuvas e infestações. Embora contraditório, os três fenômenos


eram recorrentes na URSS em diferentes áreas.
Como veremos a seguir, esses desastres naturais foram apenas parte de um
complexo de fatores que tornaram os anos agrícolas de 1931-1932 desastrosos.
No entanto, a seca, a chuva e as infestações destruíram pelo menos 20% da co-
lheita, e isso por si só teria sido suficiente para causar séria escassez de alimentos
ou mesmo fome. Se esses fatores não estivessem em evidência em 1931 e 1932,
a produção agrícola teria sido consideravelmente maior e, embora as aquisi-
ções pudessem ter causado escassez em regiões específicas, não teriam causado
uma fome como a de 1933....235
Se distinguindo dos que acreditam que a fome era apenas um fator hu-
mano, a pesquisa de Tauger segue na contramão disso, e também procurou
refutar, como já foi abordado antes, a falta de adesão dos camponeses as polí-
ticas soviéticas, ou a “resistência ao governo opressor”.
“Minha pesquisa sobre as políticas de trabalho agrícola soviéticas e as prá-
ticas camponesas reais e minha leitura dessa literatura”236 , também “tornaram-
me cético em relação ao argumento da resistência do trabalho como causa ex-
clusiva ou mesmo dominante das colheitas baixas e da fome no início dos anos
1930”237 .
234
Idem. Pag. 18.
235
Idem. Pag. 20.
236
Idem. p. 26.
237
Idem. Ibidem.
66 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

“Em primeiro lugar, enquanto alguns camponeses estavam tão ressentidos


com a coletivização e aquisições que tentaram sabotar as fazendas, para a resis-
tência camponesa ter sido suficiente para”238 gerar, por consequência, “a baixa
safra de 1932, um número extremamente grande de camponeses teria que agir
dessa maneira, isto é, ter evitado o trabalho e tentado destruir a colheita”239 .
“Em outras palavras, o argumento”240 — carece totalmente de lógica — por-
que “afirma que a maioria dos camponeses tentou privar suas famílias e outros
moradores de alimentos suficientes para durar até a próxima colheita”241 .
É também por este motivo que as causas naturais devem ser colocadas sob
seus pés, ou devemos aceitar a hipótese da autofagia ou suicídio político e so-
cial em larga escala. “Esta interpretação, portanto, exige que acreditemos que
a maioria dos camponeses agiu contra seus próprios interesses e os de seus vizi-
nhos”242 . Deste modo, “este ponto de vista é difícil de aceitar, tanto em termos
humanos gerais, quanto particularmente quando aplicado aos camponeses da
Rússia e da Ucrânia”243 . Neste contexto, “A grande maioria desses campone-
ses havia vivido por séculos em aldeias corporativas que haviam incutido certos
valores cooperativos básicos, e os kolkhozes perpetuaram características bási-
cas dessas aldeias”244 .
Em segundo lugar, por conseguinte, “o argumento é reducionista porque
tenta explicar tudo o que aconteceu nesta crise por ações humanas”245 , par-
ticularmente “pelo conflito entre o governo soviético e os camponeses, com
ênfase na resistência camponesa como uma espécie de luta heroica contra o
regime opressor”246 . Assim, sem qualquer controvérsia podemos dizer que
“esse reducionismo é problemático porque não leva em conta ações que não
se enquadram no padrão de resistência, que ocorreram fora do nexo de resis-
tência”247 . Neste sentido:

Se a situação fosse tão conflituosa quanto esta interpretação sugere, se a


grande maioria dos camponeses fizesse pouco ou nenhum trabalho agrí-
cola e executasse o trabalho que faziam de forma negligente e mal por

238
Idem. Ibidem.
239
Idem. Ibidem.
240
Idem. Ibidem.
241
Idem. Ibidem.
242
Idem. Ibidem.
243
Idem. Ibidem.
244
Idem. Ibidem.
245
Idem. Ibidem.
246
Idem. Ibidem.
247
Idem. Ibidem.
CAUSAS NATURAIS SÃO IGNORADAS PELOS CRÍTICOS| 67

despeito, então a colheita em 1932 não teria sido nem mesmo 50.000.000
de toneladas, mas praticamente nada.248

É nesta esteira que se torna, portanto, impossível considerar uma causa


humana o epicentro da crise dos grãos na URSS.
Apesar de considerarmos Prudnikova a principal referência para este es-
tudo, tanto pela profundidade argumentativa, quanto pela qualidade de revi-
são dos arquivos, não podemos negar que para o Ocidente Mark Tauger deve
ser popularizado e lido com prioridade. Talvez ele seja depois de Thurston e
Getty o principal nome da escola revisionista que nos interessaria para incen-
tivar o estudo de fontes primárias da sovietologia.
Com base na discussão sobre as causas naturais, devemos afirmar “que
uma compreensão da fome soviética de 1932-1933 deve começar a partir do
pano de fundo das crises agrícolas crônicas nos primeiros anos soviéticos”249 ,
por isto, “as falhas na colheita de 1931 e 1932 e a interação de fatores ambien-
tais e fatores humanos que os causaram”250 . Logo, “Em 1932, o clima extre-
mamente seco reduziu as safras em algumas regiões, e o clima incomumente
úmido e humano na maioria das outras gerou infestações sem precedentes”251 .
Nessas condições “desde o início reduziram o rendimento potencial naquele
ano, como a seca havia ... em 1931”252 . Paralelamente, “as aquisições do re-
gime da safra de 1931 deixaram os camponeses e o gado de trabalho famintos
e enfraquecidos”253 . Por outro lado, não é impossível que questões humanas
viessem a interferir no problema ambiental de produção agrícola. A questão
ideológica, pode influenciar e muito no modo de lidar com os problemas.
“Quebras de safra, aquisições que reduziram os recursos forrageiros, ne-
gligência dos camponeses, uso excessivo do número limitado de trato-
res, e a escassez de peças sobressalentes e combustível, tudo combinado
para reduzir a força de tração disponível. Consequentemente, o traba-
lho agrícola era mal executado em muitos kolkhozes e sovkhozy, muitas
vezes mesmo quando os camponeses estavam dispostos a fazer esse es-
forço. Finalmente, as atividades agrícolas combinadas com outros pro-
blemas ambientais — exaustão do solo, ervas daninhas e ratos — para
reduzir ainda mais a colheita de 1932 aos níveis de fome.254
248
Idem. Ibidem.
249
Idem. Ibidem.
250
Idem. Ibidem.
251
Idem. Ibidem.
252
Idem. Ibidem.
253
Idem. Ibidem.
254
Idem. Pag. 45.
68 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Os estudos que negam tanto os problemas ambientais como os fatores ide-


ológicos da luta de classes devem ser menosprezados por qualquer pesquisador
sério. “Qualquer estudo que afirme que a safra não foi extraordinariamente
baixa e que”, por isto, “a fome foi uma medida política intencionalmente im-
posta por meio de aquisições excessivas está claramente baseado em uma insu-
ficiência de fontes e em uma abordagem acrítica às fontes oficiais”255 .
Por óbvio que “as evidências citadas acima demonstram que a fome de
1932-1933 foi o resultado de uma escassez genuína”, isto é, “um declínio subs-
tancial na disponibilidade de alimentos causado por um complexo de fato-
res”256 , assim, “cada um dos quais diminuiu muito a colheita e que, combi-
nados, devem ter diminuído a colheita bem abaixo da subsistência”257 . Em
termos históricos, portanto, a fome soviética “assemelhava-se à fome irlandesa
de 1845-1848, mas resultou de uma litania de desastres naturais que se com-
binaram para o mesmo efeito que a praga da batata havia ocorrido 90 anos
antes”258 , e, assim, “em um contexto semelhante de exportações substanciais
de alimentos”259 .
Por lógica “se devemos acreditar que o regime matou os camponeses de
fome para induzir a disciplina do trabalho nas fazendas”260 , também “devemos
interpretar a fome nas cidades como a ferramenta do regime para disciplinar
os trabalhadores de colarinho azul e branco, suas esposas e filhos?” Embora as
políticas soviéticas de distribuição de alimentos estejam além do escopo deste
artigo, está claro que as pequenas safras de 1931-1932 criaram uma escassez
que afetou praticamente a todos no país e que o regime soviético não tinha os
recursos internos para aliviar a crise.261
De uma vez por todas é preciso enterrar a ideia que vem sendo pregada faz
anos pelos nacionalistas e fascistas ucranianos.

As evidências e análises que apresentei aqui mostram que a fome sovié-


tica foi um evento mais sério e mais importante do que a maioria dos
estudos anteriores afirmam, incluindo aqueles que aderiram à interpre-
tação nacionalista ucraniana, e que resultou de uma combinação alta-
mente anormal de circunstâncias ambientais e agrícolas. 262
255
Idem. Pag. 46
256
Idem. Ibidem.
257
Idem. Ibidem.
258
Idem. Ibidem.
259
Idem. Ibidem.
260
Idem. Ibidem.
261
Idem. Pag. 46
262
Idem. Pag. 47.
CAUSAS NATURAIS SÃO IGNORADAS PELOS CRÍTICOS| 69

Os métodos soviéticos podem também ter apresentado erro na avaliação


científica da colheita, mas esta, sem dúvida alguma, é uma causa muito me-
nos relevante ao resultado geral. A eliminação dos Kulaques era criticada por
alguns neste sentido, mas cumpre lembrar que por vezes os excessos foram con-
tidos por Stálin e já retratamos este ponto. O Governo soviético tentou conter
a fome continuamente. Isso não se pode negar, as evidências são bem claras
neste sentido.

O governo soviético tinha pequenas reservas de grãos, mas continua-


mente as retirava para distribuir alimentos à população. Visto que pra-
ticamente todo o país experimentou escassez de alimentos, indicando
que os dados de aquisição e distribuição são razoavelmente precisos, cla-
ramente a União Soviética enfrentou uma grave escassez, e a causa mais
importante dessa escassez deve ter sido as pequenas colheitas em 1931 e
1932.263

Entre as razões humanas, também, colocamos uma hierarquia. A Res-


posta dos Kulaques ao socialismo em queimar as colheitas, em abater o gado,
ou antes disso, em reter para o uso especulativo, não pode ser vista como equi-
valente aos confiscos. Não havia outro meio de lidar com a atitude dos Kula-
ques que não fosse por meio da coletivização da terra, dos bens agrários e dos
animais, tendo em vista que se permitido as leis do capital trariam uma fome
ainda maior. Um relato interessante pode provar o que estamos aqui a dizer:
Logo de cara “a oposição (dos kulaques) manifestou-se (...) pelo abate do
gado bovino e cavalar, que consideravam preferível a vê-los coletivizados”264 .
Assim, “Dado que a maioria das vacas e dos cavalos pertencia aos kulaques,
o resultado foi terrível para a agricultura soviética”265 . No decorrer de 1941,
“a economia rural soviética ainda não tinha recuperado completamente destas
perdas terríveis”266 (...). Logo, “Alguns kulaques assassinaram funcionários,
incendiaram propriedades coletivas e chegaram a queimar as suas próprias co-
lheitas e sementes”267 . Neste sentido, “Um número ainda maior recusou-se a
semear e a colher, talvez na convicção de que as autoridades lhes fariam con-
cessões e lhes assegurariam de qualquer forma a alimentação”268 . Em seguida
“o que se seguiu foi a “fome” de 1932-1933. (...) Relatos macabros, fictícios
263
Idem. Pag. 5.
264
Tottle, Douglas. Fraud, Famine, and Fascism. Toronto: Progress Books, 1987, Pag. 94
265
Idem. Ibidem.
266
Idem. Ibidem.
267
Idem. Ibidem.
268
Idem. Ibidem.
70 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

na sua maior parte, apareceram na imprensa nazi e na imprensa de Hearst nos


Estados Unidos (...)”269 . Desse modo, “a fome, nas suas fases ulteriores, não
foi o resultado de um défice de alimentação, apesar da redução importante das
sementes e das colheitas”270 , também “consequência das requisições especiais
na Primavera de 1932, motivadas aparentemente pelo receio de uma guerra
com o Japão”271 .
Sem dúvida, “a maior parte das vítimas não foram kulaques que se haviam
recusado a semear os seus campos ou que tinham destruído a sua colheita.”272
Em suma, as ameaças constantes de guerras nas fronteiras podem ser con-
sideradas fatores agravantes da fome.
A necessidade de uma industrialização acelerada para lidar com a guerra,
pode ser considerada uma das questões que invariavelmente atrapalhariam o
combate imediato a fome, mas que, infelizmente, não comportava uma alter-
nativa.
Por não haver essa opção “perfeita”, é importante que se perceba a dinâ-
mica dos paradoxos que a URSS sofria, onde todos os caminhos do fluxograma
levariam a algum resultado “negativo”, bem como, por lógica, o pior foi evi-
tado: o jugo da URSS e do mundo por Hitler. E isto foi o que de melhor
poderia acontecer.
Aqui, portanto, defende-se a tese que a dinâmica imperialista naquele pe-
ríodo histórico não poderia dar ao socialismo soviético qualquer outra opção
além da industrialização e coletivização em caráter acelerado.
Apesar de tudo que já citamos para desmistificar a questão da fome como
genocídio e até mesmo outros mitos soviéticos combatidos em outras ocasiões,
é fundamental verificar que a maioria esmagadora das críticas a URSS que ava-
liamos: seja a coletivização, seja a industrialização, a democracia, a pedagogia,
as leis, costumam, em algum momento, evaporar a necessidade histórica de
uma industrialização acelerada que se devia a uma imposição do sistema im-
perialista. Como diria Lênin:
“no terreno do capitalismo, que outro meio poderia haver, a não ser a
guerra, para eliminar a desproporção existente entre o desenvolvimento
das forças produtivas e a acumulação de capital, por um lado, e, por
outro lado, a partilha das colônias e das esferas de influência do capital
financeiro?”.273
269
Idem. Ibidem.
270
Idem. Ibidem.
271
Idem. Ibidem.
272
Idem. Ibidem.
273
LÊNIN, V, I. Imperialismo fase superior do capitalismo. Pag. 230. Disponível
OS CAMPONESES TRABALHAM AINDA MAIS DURO E PRODUZIRAM MAIS APÓS A FOME DE 1932| 71

Boa parte dos historiadores burgueses, e mesmo na escola revisionista, ape-


sar de apresentarem uma noção da interligação dos problemas, costumam os
isolar nos campos em que se situam e não compreendem a que sistemática glo-
bal pertencem a sua múltipla determinação como diria Marx. Quando falam
da industrialização acelerada, a criticam como se houvesse na ordem do dia
uma outra opção e não se aproximasse uma guerra; quando falam da coleti-
vização a criticam como se não tivesse nenhuma importância no processo de
modernização; quando falam dos expurgos criticam todo e qualquer excesso
como se essa prática não tivesse permitido a vitória na segunda guerra mun-
dial.
Muito possivelmente esta insensibilidade na interpretação da história so-
viética se deve a falta da dinâmica direta da guerra mundial no cotidiano. A
noção do preparo para este tipo de conflito diminuiu sensivelmente na popula-
ção de todo o mundo. Embora não se possa reduzir o problema a uma questão
de vivência direta, é inegável que a falta dessa experiência gera insensibilidade
sobre a interpretação da história e favorece de algum modo o anacronismo.
Não sendo possíveis evitar os problemas que disso decorrem — da cha-
mada guerra de tipo mundial — a URSS saiu numa escalada ininterrupta de
desenvolvimento.
Quando finalmente se tornariam plausíveis as condições que colocaram a
industrialização acelerada como uma possibilidade e não uma necessidade, o
partido e a URSS nos principais polos estava infestada de oportunistas.
Mas, se as guerras imperialistas, as guerras de fronteira, as provocações coti-
dianas, que geravam a necessidade de uma industrialização e coletivização ace-
leradas, podem ser um fator que agrava o combate à fome, qual seria o outro?
A atividade dos Kulaques. Como se verificou anteriormente eles não fo-
ram irrelevantes na equação. De todo o modo, o sistema burguês e a atividade
das classes dominantes, sua prática imperialista, e a luta de classes doméstica
que se apoia na burguesia internacional, são mais importantes do que a nossa
vã historiografia revisionista é capaz de provar.

OS CAMPONESES TRABALHAM AINDA MAIS DURO E


PRODUZIRAM MAIS APÓS A FOME DE 1932

Após o caos que se formou pelos vários setores soviéticos, de uma coisa
devemos ter certeza, o aprendizado para os camponeses foi gigantesco, a ponto

em: <https://www.marxists.org/portugues/lenin/1916/imperialismo/imperialismo.pdf>.
Acesso em 26 de Novembro de 2021.
72 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

de a produção sempre se superar.

De alguma forma, os camponeses trabalharam mais arduamente em


1933 do que em 1932. Em junho de 1933, as fazendas haviam seme-
ado uma área maior do que naquela data nos três anos anteriores (1930-
32). O adido agrícola alemão Otto Schiller dirigiu 6.000 milhas pelas
principais regiões agrícolas no verão de 1933 e descreveu um sistema de
Kolkhozes muito fortalecido e consolidado. Ele atribuiu isso à pressão
administrativa e à fome como força motivadora, e também à adminis-
tração e organização do trabalho eficazes. Relatórios de toda a URSS
indicavam que os camponeses que haviam evitado trabalhar nos kolkho-
zes agora competiam entre si pelo trabalho e tinham uma “atitude me-
lhor” em relação ao trabalho nos kolkhozes do que antes. E o resultado,
conforme documentado na Tabela 2, foi um aumento dramático na co-
lheita em 1933.... Assim, não pode haver dúvida de que o padrão geral
de trabalho intensificado, melhores condições e maior produção eviden-
ciado pelas estatísticas era de fato representativo das condições em todo
o país.274

Com o tempo as próprias fazendas coletivas vinham funcionando com


mais eficiência e o planejamento geral não se mostrou um erro.

Estudos conduzidos em meados da década de 1930 descobriram que os


kolkhozniki na verdade trabalhavam mais arduamente do que os cam-
poneses não coletivizados haviam trabalhado na década de 1920, evi-
dência clara de adaptação significativa ao novo sistema.275

Ordens de Ajuda para o Povo Ucraniano

Os documentos soviéticos abertos dão conta de refutar algumas mentiras


banais que nos são jogadas pela direita. O livro já citado na primeira parte de
nossa exposição que constitui um compilado de documentos soviéticos que
negam a tese do genocídio, também demonstram como o governo soviético
subsidiou ajuda a ucrânia.
[Suplemento às atas do escritório do Partido Ucraniano em Kiev, 22
de fevereiro de 1933, instruindo que a fome seja aliviada e que “todos
274
Tauger, Mark. “Soviet Peasants and Collectivization, 1930-39: Resistance and Adap-
tation.” In Rural Adaptation in Russia by Stephen Wegren, Routledge, New York, NY,
2005, Capítulo 3, p. 87
275
Idem. Ibidem.
ORDENS DE AJUDA PARA O POVO UCRANIANO| 73

os que ficaram completamente incapacitados por causa da emaciação de-


vem ser postos de pé novamente” até 5 de março]
... 10. Em vista das contínuas tentativas de nossos inimigos de usar es-
ses fatos contra a criação de fazendas coletivas, os Comitês do Partido Raion
devem conduzir um trabalho sistemático de esclarecimento, trazendo à luz as
verdadeiras causas da fome existente (abusos nas fazendas coletivas, preguiça,
declínio na disciplina de trabalho, etc.).276
O governo soviético tentou fornecer aos camponeses meios de subsistência
nos momentos mais críticos mesmo nos anos anteriores a fome de 1932.
Naquele ano (1931) houve uma forte seca no Volga, na Sibéria Ociden-
tal, em partes da Ucrânia e em outras regiões. Reconhecendo isso, o
regime enviou publicamente grãos adquiridos de volta às regiões de seca
como ajuda alimentar e sementes, organizou uma conferência de espe-
cialistas para discutir medidas contra a seca e iniciou a implementação
de algumas das medidas propostas.277

Sobre esse assunto, ainda vale um testemunho direto que confirma com
exatidão os dados arquivísticos que os historiadores aqui trabalharam, O Dr.
Hans Blumenfeld trabalhou como arquiteto na cidade ucraniana de Makeyev-
ka na época da fome. Vosso depoimento segue no anexo 1.

276
Koenker e Bachman. Revelations from the Russian archives. Washington: Library of
Congress, 1997, p. 401.
277
Tauger, Mark. “Statistical Falsification in the Soviet Union: A Comparative Case
Study of Projections, Biases, and Trust.” The Henry M. Jackson School of Internati-
onal Studies, University of Washington, 2001, p. 44.
74 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

ANEXO I

Nestas condições, havia poucos motivos para tendências antirrusas ou se-


paratistas entre os ucranianos, e eu nunca as encontrei. Fiquei, portanto, bas-
tante surpreso ao ler recentemente no respeitado jornal francês Le Monde, por
ocasião do 50º aniversário da fome de 1933, que foi devido a um planejado
“genocídio” da nação ucraniana. Dada a extrema escassez de mão-de-obra na
União Soviética na época, esta hipótese é bastante absurda. É igualmente ab-
surdo assumir que qualquer governo poderia ser tão estúpido a ponto de acre-
ditar que a fome poderia ser um meio eficaz para quebrar a resistência nacional
— diante da experiência da fome irlandesa dos anos 1840 e de muitos outros....
Houve realmente uma fome em 1933, não apenas na Ucrânia, mas tam-
bém em outras regiões semiáridas da URSS, do Baixo Volga e do Norte do
Cáucaso; e Makeyevka, localizada perto da junção dessas três regiões, sentiu
todo o impacto da fome. Muitos camponeses de lá vieram para a cidade; a
siderurgia tentou empregar alguns deles, mas a maioria deles se foi embora,
achando o trabalho muito difícil. Alguns já estavam muito distantes, com os
membros inchados. Havia também muitas crianças perdidas, que eram leva-
das para instituições para crianças ou, muito frequentemente, adotadas por
famílias urbanas; dois de meus velhos amigos, trabalhadores da construção ci-
vil de Viena que na época trabalhavam em Makeyevka, cada um adotou uma
dessas crianças. Apenas uma vez vi uma criança com pernas espigadas e bar-
riga inchada; ela estava no jardim de uma creche, às mãos de uma enfermeira
esperando o médico. Também nunca vi um cadáver deitado em uma rua....
Não há dúvida de que a fome fez muitas vítimas. Não tenho base para
estimar o número, e duvido que alguém o tenha feito. Quais foram as razões
e o que poderia ter sido feito para evitar esta terrível calamidade?
Houve uma conjunção de uma série de fatores. Primeiro, o verão quente
e seco de 1932, que eu havia vivido no norte de Vyatka, havia resultado no
fracasso da colheita nas regiões semiáridas do Sul. Em segundo lugar, a luta
pela coletivização havia perturbado a agricultura. A coletivização não era um
processo ordenado, seguindo regras burocráticas. Ela consistia em ações dos
camponeses pobres, encorajados pelo Partido. Os camponeses pobres estavam
ansiosos para expropriar os “kulaques”, mas menos ansiosos para organizar
uma economia cooperativa. Em 1930 o Partido e já enviava quadros para con-
ter e corrigir os excessos. Um dos quadros envolvidos neste trabalho relatou
mais tarde sua experiência: os comunistas locais lhe disseram: “Estamos cons-
truindo o socialismo na aldeia, e você e seu Stalin estão nos apunhalando pelas
costas”. Depois de ter exercido contenção em 1930, o Partido deu um novo
ANEXO I| 75

impulso em 1932. Como resultado, naquele ano, a economia de kulaques dei-


xou de produzir, e a nova economia coletiva ainda não produziu plenamente.
A primeira alegação sobre o produto inadequado foi para a indústria urbana
e para as forças armadas; como o futuro de toda a nação, incluindo os campo-
neses, dependia deles, dificilmente poderia ser de outra forma. Além disso, a
depressão no Ocidente destruiu o mercado de petróleo e madeira, com o qual
os soviéticos esperavam pagar as dívidas contraídas durante o Primeiro Plano
Quinquenal. Assim, em vez de poder importar grãos, a União Soviética re-
almente exportou alguns. Que alternativas eles tinham? Vejo apenas duas:
usar sua reserva de ouro, ou conseguir um empréstimo no Ocidente. Eles ten-
taram fazer este último, mas o obtiveram somente em 1934, quando já não
precisavam mais dele. Se a culpa pelo terrível sofrimento de 1932 tem que ser
atribuída, ela recai em partes iguais sobre o governo soviético por se recusar a
desfazer-se de sua reserva de ouro, e sobre o Ocidente por se recusar a empres-
tar quando era necessário.
Provavelmente a maioria das mortes em 1933 foi devido a epidemias de
tifo, febre tifoide e disenteria. As doenças transmitidas pela água eram fre-
quentes em Makeyevka; sobrevivi por pouco a um ataque de febre tifoide....
Em 1933, as chuvas foram adequadas. O Partido enviou seus melhores
quadros para ajudar a organizar o trabalho nos kolkhozes. Eles conseguiram;
após a colheita de 1933, a situação melhorou radicalmente e com uma veloci-
dade surpreendente. Tive a sensação de que estávamos puxando uma carroça
pesada para cima, incertos se teríamos sucesso; mas no outono de 1933 tínha-
mos passado dos limites e a partir de então pudemos avançar a um ritmo acele-
rado. Certamente, a estupidez e a insensibilidade infligiram muito sofrimento
evitável durante o processo de coletivização, e muitos kolkhozes soviéticos con-
tinuaram a sofrer com o fato de terem começado com o pé errado em contraste
com os de outros países como a Alemanha Oriental e a Hungria, que apren-
deram com os erros cometidos na União Soviética. Mas a agricultura soviética
não é o monumental fracasso que muitas vezes é considerada como no Oci-
dente.
76 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

ANEXO II

Abaixo selecionamos dois documentos de suma importância para compre-


endermos como o PCUS tentou combater a fome e a seca. É verdade que ou-
tros documentos já foram trabalhados no corpo do nosso texto e estes abaixo
têm natureza complementar.
É também importante alertar que, ao analisar a totalidade destes docu-
mentos — não só os aqui selecionados —, encontramos base para defender a
tese de que o partido foi imprudente por soar, em determinados momentos,
inflexível. No entanto, essa é uma possível interpretação que se tem de alguns
documentos que, por falta de tempo, não poderemos abordar . Pode-se di-
zer que as críticas ao partido encontram alguma base nos documentos, mas a
defesa do partido igualmente. E diante do presente, temos mais do que o sufi-
ciente para desmantelar a tese do genocídio e selecionamos dois dos principais
documentos.

№8
RESOLUÇÃO DA URSS E DO COMITÊ CENTRAL DO PCUS (b)
SOBRE A COLETA DE FUNDOS COLETIVOS DE SEMENTES NA
URSS E SOBRE MEDIDAS DE SEMENTES E ALIMENTOS
ASSISTÊNCIA A ÁREAS DE SECA

16 de fevereiro de 1932
1. Em conexão com a abordagem da campanha de semeadura, o Conselho
dos Comissários do Povo da URSS e o Comitê Central do PCUS (b) indicam a
todos os partidos e organizações soviéticas que a tarefa central de seu trabalho
nas aldeias nas próximas semanas é criar fazendas coletivas de sementes para
estimular o plano de semeadura.
O Conselho de Comissários do Povo e o Comitê Central do PCUS (B.)
Obrigam todas as organizações partidárias, soviéticas e kolkhozes a iniciarem
a formação de fundos iniciais de kolkhozes imediatamente.
2. Aprovar o plano de formação de fundos de cultivo coletivo de sementes
de safras de grãos da primavera estabelecido pelo Comissariado do Povo de
Terras da URSS.
ANEXO II| 77

SSR 9500 mil ц


Norte do Cáucaso 3920
Lower Volga 3820
Krymskaya ASSR 203
ZSFSR 440
Uzbekskaya SSR 500
Kyrhyzskaya ASSR 460
Turkmenskaya SSR 30
Tadzhykskaya SSR 180
Dahestanskaya ASSR 36
Kazahskaya ASSR 3000
Região Oeste 1486
Área Ivanovskaya 797
Tatarskaya ASSR 1291
Srednyaya Volga 4360
C. Charles A. 3894
PEC 689
extremo norte 948
Bashkiria 2500
Sibéria Ocidental 5800
Nyzhehorodskyy final 2480
Moskovskaya Oblast 1786
Região Leningradskaya 812
BSSR 1200
Ural 5451
Sibéria Oriental 1772
57355 mil ц

Defina-se o dia 10 de março como o prazo para terminar o enchimento


de sementes para a Ucrânia, Baixo Volga, Cáucaso do Norte, Crimeia e Ásia
Central, e 1º de abril para outras repúblicas, distritos e regiões.
3. Devido à seca nas regiões orientais da URSS no ano passado, como re-
sultado, uma série de fazendas coletivas e estatais nessas áreas são incapazes de
fornecer a quantidade necessária de sementes de primavera com seus próprios
recursos e, em alguns casos, algumas dificuldades alimentares. Dessas áreas,
deve-se realizar um empréstimo sem juros e alimentos sem juros com o re-
torno no outono de 1932 em espécie no valor de 53 milhões 500 mil poods,
incluindo 39 milhões de poods para fazendas coletivas e 14 milhões 500 mil
poods para grãos, sementes e fazendas estatais de gado.
4. Distribuir o empréstimo de sementes e alimentos concedidos às fazen-
das coletivas por safras da seguinte forma:
78 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Quantidade
Grão
[em milhões de poods]

Trigo 18,10
Ovsa 8,25 (incluindo 6 milhões
Cevada 0,40 de poods em comida)
Rzhy 6,50
Milho 3,00
Girassóis 2,80

Distribuir trigo, aveia, cevada e centeio alocados para fazendas coletivas


na forma de empréstimos de sementes e alimentos pelos distritos da seguinte
forma:
Trigo Aveia Cevada Centeio
Baixo Volga 1,50 0,50 - 0,30
Médio Volga 3,90 1,90 - 1,50
Urais 4,20 2,30 0,40 1,70
Cazaquistão 3,45 0,50 - 1,50
Bashkiria 0,85 0,75 - -
Oeste. Sibéria 3,90 1,40 - 1,50
Tartaristão 0,30 0,90 - -

6. Instruir o Comissariado do Povo de Terras da URSS a distribuir milho e


girassóis liberados para as fazendas coletivas em Semsoud, bem como sementes
liberadas para as fazendas estaduais pelos distritos.
7. Obrigar o Comissariado do Povo da Agricultura a liberar o empréstimo
de semente do Estado somente quando as fazendas coletivas formarem fundos
de semente com seus próprios recursos. 8. Obrigar o Banco do Estado a finan-
ciar a liberação de sementes e ajuda alimentar.
9. O Conselho dos Comissários do Povo e o Comitê Central do PCUS (B)
chamam a atenção de todas as organizações partidárias, soviéticas e agrícolas
coletivas para o fato de que a coleta de sementes deve ser concluída em todos
os lugares o mais rápido possível, a fim de garantir a semeadura precoce e o
máximo para obter um maior rendimento.
10. O Comissariado do Povo de Terras da URSS para estabelecer o mo-
nitoramento operacional do andamento da coleta de sementes publicará um
resumo do andamento da formação de fundos agrícolas coletivos de sementes
em distritos, regiões e repúblicas
Presidente do Conselho de Comissários do Povo da URSS V. Molotov (Scria-
bin) Secretário do Comitê Central do PCUS (b) I. Stalin278
278
Fonte: Arquivos da Ucrânia: <https://old.archives.gov.ua/Sections/Famine/Publicat/Fam-
ANEXO II| 79

DOCUMENTO 188 Planos do Comitê do Partido do Oblast de Odessa, 7


de agosto de 1933, para distribuir provisões de pão de acordo com a
ocupação dos trabalhadores
ULTRA SECRETO
O Partido Comunista (Bolchevique) da Ucrânia. Comitê de Odessa Oblast
No. S-29
No. S-29 / 6z-op. TSK VKP (bJ) [Comitê Central do Partido Comunista
de União (Bolcheviques)], TSK KP (b) U [Comitê Central do Partido Comu-
nista (Bolcheviques) da Ucrânia]; aos camaradas Borisov, Klinovskii, Shul’kin,
Klochko, Nizovskii; Pervomaiskii, Comitê do Partido:
7 de agosto - 1933 PASTA ESPECIAL
Extrato da Ata nº 29 de 4 de agosto de 1933, reunião do SECRETARI-
ADO do Comitê do Oblast do KP (b) U.
No plano de fornecimento de pão para o mês de agosto.
1. Aprovar o plano apresentado pela Oblast ‘Supplying Agency [Oblsnab]
para fornecer pão em todo o oblast’ em agosto.
Para a primeira lista Aos trabalhadores 800 gramas
Aos trabalhadores de colarinho
400 gramas
branco e dependentes
Para a segunda lista Aos trabalhadores 600 gramas
Aos trabalhadores de colarinho
300 gramas
branco e dependentes
in Zinov’evsk - The Red Star in Kherson -
Para grandes empresas
im. Petrovskogo” and Obozny
Aos trabalhadores 700 gramas
Para a terceira lista Aos trabalhadores 500 gramas
Aos trabalhadores de colarinho
300 gramas
branco e dependentes
Aos dependentes de trabalhadores
200 gramas
de colarinho azul e branco.

2. Aprovar para os trabalhadores de Odessa e Nikolaev uma emissão de


50% da cota do pão na farinha de trigo e assim 50% na farinha de centeio.
3. Sugira à agência de aquisição de grãos do Oblast que garanta a emissão
oportuna do sortimento de farinha indicado.
4. Tendo verificado e eliminado todas as “almas mortas”, aconselhe os
comitês do partido da cidade e do oblast de Odessa, Nikolaev, Kherson, Zi-
nov’evsk e Pervomaisk a cumprir estritamente as normas e cotas aprovadas.
Pyrig-1932.php#nom-08>
80 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Aconselhar a Oblsnab a estabelecer um controle operacional estrito do


consumo real de pão de acordo com as normas, cotas e planos aprovados.

Pão nosso
Nome da cidade Lista e Grupo Contingente
de cada dia
ODESSA Primeira Lista
Traballhadores 21.587 800g
Traballhadores do colarinho branco 24.830 400g

Primeira Lista
ORS IANV Z-DA I DZHUTOV:
Traballhadores 7.805 800g
Traballhadores do colarinho branco 7.068 400g

Segunda Lista
Traballhadores 79.267 600g
Traballhadores do colarinho branco 80.814 300g

Terceira Lista 33.571


Traballhadores 11.899 500g
Traballhadores do colarinho branco 41.528 300g
Dependentes 200g
NIKOLAEV Primeira Lista
Traballhadores 6.125 800g
Traballhadores do colarinho branco 7.840 400g

Segunda Lista
Traballhadores 12.591 600g
Trabalhadores do colarinho branco
11.002 300g
e dependentes

Terceira Lista
Traballhadores 8.509 500g
Traballhadores do colarinho branco 588 300g
ZINOVESK Primeira Lista
Traballhadores 941 800g
Traballhadores do colarinho branco 1.521 400g

Estrela Vermelha
Traballhadores 12.685 600g
Trabalhadores do colarinho branco
8.372 300g
e dependentes

Segunda Lista
Traballhadores 8.372 500g
Traballhadores do colarinho branco 11.320 300g
ANEXO II| 81

I. Para abastecer as cidades de acordo com os contingentes e cotas acima


indicados, aprove o seguinte plano de distribuição de farinha para o mês de
agosto (em toneladas).
Para a cidade de Odessa — 2,778.6 Toneladas.
Para a cidade de Nikolaev — 1,125.6
(incluindo 498,3 toneladas para Marti e 142,5 toneladas para “61” seções
de abastecimento de trabalhadores [ORS]).
Para a cidade de zinov’evsk — 487.
Para a cidade de Kherson — 494.8.
Para a cidade de Pervomaisk — 93.7.
Para a cidade de Voznesensk — 15.
II. Para os artesãos e as pequenas manufaturas principais das cidades, em-
pregando trabalhadores [ilegíveis] e tendo 3.000 dependentes, cabem 45,3 to-
neladas, de acordo com o contrato firmado com o conselho industrial do oblast.
Ao todo, para o abastecimento individual das cidades, 5.040 toneladas.
III. Plano de distribuição de farinha para alimentação pública:
a) Serviço público de alimentação para empresas municipais 386,2 tonela-
das
b) Serviço público de alimentação para ORS - 88 toneladas:
Incluindo para ORS Marti e “61” - 63 toneladas ORS Dzhutova e IAnv. -
18 toneladas
FRAUDE, FOME E
FASCISMO
| 85

Mito do Genocídio Ucraniano de Hitler a


Harvard
de Douglas Tottle, 1988

Tradução de Leonardo Griz Carvalheira


AGRADECIMENTOS
Tenho uma enorme dívida com pessoas de origem ucraniana, tanto nasci-
das no Canadá quanto da imigração pós-guerra, que compartilharam comigo
seu conhecimento pessoal dos eventos discutidos neste livro. Sua ajuda para
traduzir materiais necessários é muito apreciada. Gostaria de agradecer parti-
cularmente aqueles da imigração pós-guerra que tiveram a coragem de forne-
cer ou verificar informações sobre a presença de antigos colaboradores e cri-
minosos de guerra nazistas que atualmente se escondem atrás do bom nome
da comunidade canadense ucraniana. Também não quero esquecer a assistên-
cia valiosa de acadêmicos ucranianos de quatro universidades pelas suas avali-
ações, críticas e encorajamento na preparação deste livro.
Finalmente, sinto-me honrado por conhecer judeus sobreviventes do oeste
da Ucrânia e da Polônia. Eles me contaram sua experiência de pogroms nacio-
nalistas ucranianos e prisões policiais, verificando a experiência de outros com
nacionalistas ucranianos como ferramentas voluntárias dos nazistas na cidade,
no campo e nos campos de concentração.
INTRODUÇÃO
Dos primeiros dias da Revolução Russa até o presente momento, campa-
nhas propagandísticas têm sido conduzidas contra a União Soviética. Aqueles
em posições de poder em países capitalistas veem o socialismo como uma ame-
aça aos seus lucros e privilégios constantes. Tanto para desmoralizar o apoio
a uma alternativa socialista em seus próprios países, quanto para manter uma
posição dominante nas relações econômicas e políticas internacionais, todos
os tipos de mentiras e distorções são utilizados para pintar a URSS com a pior
imagem possível. Estereótipos e caricaturas passaram a dominar o entendi-
mento de muitas pessoas da história soviética e sua realidade atual.
Os elementos particulares desta guerra psicológica são muito amplos e às
vezes de curta duração. A ideia de que a revolução socialista “nacionalizou
as crianças” – que foi a explicação que meu professor deu da ideia de creche,
anos atrás – já se apagou no desenrolar da história. Alegações americanas (em
1981) do uso de armas químicas pelos soviéticos no Sudeste Asiático – “chuva
amarela” – eventualmente entraram em colapso quando o produto químico
em questão foi classificado por cientistas como estrume produzido por abe-
lhas durante o voo. Mas as acusações é que são lembradas; as retratações, se
chegam a ser feitas, são relegadas às páginas finais dos jornais e esquecidas. As
diversas campanhas se combinam para criar percepções populares a serviço de
fins políticos.
Este livro é a história de uma campanha que tem persistido. Baseado na
tese de que a fome entre 1932-1933 na Ucrânia foi um genocídio de ucrania-
nos deliberadamente planejado pelo governo soviético, a campanha da grande
fome-genocídio tem vindo à tona intermitentemente pelas últimas cinco déca-
das. O renascimento da campanha da grande fome-genocídio nos anos 80 do
século XX tem buscado conquistar a aceitação desta teoria na historiografia.
Entretanto, enquanto os historiadores aceitam que uma grande fome ocorreu
na Ucrânia entre 1932-33 – assim como em outras áreas da URSS – ainda es-
tão debatendo as causas, a extensão e os resultados. Meu exame da campanha
e suas acusações de “genocídio ucraniano” não é uma tentativa de estudar a
grande fome de forma detalhada. De toda forma, é necessário fazer algumas
afirmações.
A Revolução Russa de 1917 foi seguida de intervenção militar de quatorze
potências estrangeiras (incluindo os Estados Unidos, o Reino Unido e o Ca-
90 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

nadá), além de uma longa guerra civil. A destruição proveniente de sete anos
de guerra, revolução e intervenções, combinados com uma seca severa, resulta-
ram num amplo cenário de fome e penúria – a fome russa de 1921-22. Tendo
sobrevivido estas provações, os soviéticos traçaram os rumos de algo que não
contava com precedentes na história mundial: a construção de uma sociedade
socialista. Eles buscaram transformar uma terra atrasada e repleta de pobreza
e analfabetismo em um país industrializado com um moderno setor agrícola.
Isso foi visto pelos soviéticos como necessário não apenas para o desenvolvi-
mento econômico e social, mas também para a própria sobrevivência do so-
cialismo num ambiente internacional hostil. No início da década de 1930, a
tomada japonesa da Manchúria e a tomada do poder por Hitler na Alemanha
foram vistos de forma especialmente ameaçadora.
A coletivização massiva da agricultura e um programa de industrialização
ambicioso foram pontos centrais do primeiro Plano Quinquenal iniciado em
1929. A coletivização encontrou oposição ativa de partes do campesinato, e
em muitas regiões o embate quase se transformou em guerra civil. A seca (um
fator complicador), sabotagem massiva, planificação amadora soviética, exces-
sos stalinistas e erros causaram a fome de 1932-33.
Durante a campanha da fome-genocídio, todavia, os fatores da seca e da
sabotagem têm sido ignorados, negados, diminuídos ou distorcidos. Os ex-
cessos soviéticos e erros, em contraste, ganham ênfase, recebem uma motiva-
ção “anti-ucraniana”, são descritos como conscientemente planejados, e os re-
sultados são exagerados com afirmações de que as mortes causadas pela fome
atingiram vários milhões de pessoas.
Fotografias fraudulentas e evidências suspeitas são extensivamente utiliza-
dos para enfeitar acusações de “genocídio”, e são na verdade as imagens domi-
nantes da campanha. A quantidade assustadora de materiais não-autênticos
usados para apoiar a ideia de genocídio deveria ser, por si só, motivos para a
rejeição completa de uma tese tão dúbia.
Apresentado na imprensa nazista em 1933, a campanha da fome-genocí-
dio chegou ao Reino Unido em 1934, e aos Estados Unidos no ano seguinte.
Na Alemanha, um país com fortes movimentos comunistas, socialistas e sin-
dicalistas, os nazistas criaram a primeira campanha de propaganda organizada
(1933-1935) como parte de sua consolidação do poder. No Reino Unido e
nos Estados Unidos, por outro lado, a campanha foi desenvolvida como parte
dos esforços da Direita para manter a União Soviética isolada e fora da Liga das
Nações. A campanha também serviu para desencorajar a crescente militância
da classe trabalhadora no período da Grande Depressão.
INTRODUÇÃO| 91

A campanha da fome-genocídio encontra seus promotores mais ardentes


entre os nacionalistas ucranianos. (O termo “nacionalista ucraniano” é usado
aqui e por todo o livro para classificar a minoria conservadora e fascista na
comunidade ucraniana, que tem como um de seus objetivos construir uma
Ucrânia “independente” a partir de uma base antissocialista. O autor de forma
alguma busca identificar esse nacionalismo extremo com a nação ucraniana ou
com pessoas de origem ucraniana no geral). A campanha recebeu um ímpeto
renovado no período pós-guerra com a chegada, na América do Norte, de di-
versos milhares de nacionalistas ucranianos. Entre os imigrantes de boa-fé que
desembarcaram nos anos subsequentes à guerra, estavam milhares de antigos
colaboradores e simpatizantes dos nazistas. O interesse direto deles na campa-
nha coincidiu com a propaganda da Guerra Fria usada na época.
O clima da Guerra Fria da Era Reagan tem visto um ressurgimento da
campanha, ainda mais forte do que aquelas vistas nas décadas de 1930 e 1950.
Enquanto filmes como Rambo e Amanhecer Violento ocuparam a fase fan-
tasiosa desse ataque político no intelecto cultural do Ocidente, a exumação
da “fome-genocídio ucraniana” tenta levar o mesmo ataque para a realidade
pseudo-histórica. A campanha serve também para desviar a atenção de recen-
tes investigações relativas a crimes de guerra cometidos por colaboradores na-
cionalistas ucranianos, que agora residem no ocidente.
O historiador americano J. Arch Getty comentou: “Podemos nos indagar
proveitosamente sobre o ressurgimento, justamente agora, da história da fome
intencional. Parece ser parte de uma campanha dos nacionalistas ucranianos
para promover a ideia de um ‘terrorismo de fome’ no ocidente [...] A men-
sagem não tão secreta por trás da campanha coincide com objetivos políticos
que há muito tempo circulam em grupos de emigrantes: dado que os soviéti-
cos foram capazes de assassinar tantos de seu próprio povo, como não estariam
dispostos a iniciar uma guerra destrutiva para espalhar sua doutrina maléfica?
Já que os soviéticos são como os nazistas, nós devemos evitar qualquer tipo
de elogio, manter nossa vigilância – e parar de deportar os acusados de serem
criminosos de guerra da Segunda Guerra Mundial para países do Leste Euro-
peu”. [1]
No geral, as motivações específicas da campanha dos nacionalistas são con-
sistentes como os objetivos de política internacional dos conservadores em ge-
ral. As confrontações da Guerra Fria, e não a compreensão da verdade histó-
rica, tem caracterizado a campanha da fome-genocídio. Ao cortar pela emara-
nhada teia de evidências fraudulentas, conexões fascistas e nazistas, abafamen-
tos de colaborações durante a Guerra, e pesquisas acadêmicas questionáveis, é
minha esperança que esse livro irá contribuir na exposição do mito político do
92 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

genocídio ucraniano. O estudo histórico da grande fome de 1932-1933 me-


rece uma abordagem objetiva e não-propagandística.
CAPÍTULO 1:
THOMAS WALKER, O HOMEM
QUE NUNCA EXISTIU
Em 1898 vários grupos de interesses americanos, inclusive empresas de
açúcar, estavam ansiosos para que os Estados Unidos tomassem Cuba.
Um pretexto era necessário para construir um sentimento pós-guerra en-
tre o público americano. O magnata da imprensa Americana, William
Randolph Hearst, pelo que dizem, enviou o famoso artista Frederick Re-
mington para Cuba para encontrar evidências de condições que justifica-
riam uma intervenção militar americana. Não encontrando nada fora
do normal, Remington retornou o telegrama para Hearst: “Está tudo
tranquilo aqui... Desejo retornar”. Hearst respondeu: “Por favor, fique.
Você fornece as fotos e eu fornecerei a guerra”. [1]

No outono de 1934, um americano usando o nome de Thomas Walker


entrou na União Soviética. Depois de esperar por menos de uma semana em
Moscou, ele passou o restante de sua jornada de treze dias a caminho da fron-
teira com a Manchúria, momento em que ele deixou a URSS para nunca mais
voltar. Essa jornada aparentemente monótona foi o pretexto para uma das
maiores fraudes já perpetradas na história do jornalismo do século XX.
Uns quatro meses mais tarde, em 18 de fevereiro de 1935, uma série de
artigos começaram a aparecer na imprensa de Hearst, assinados por Thomas
Walker, “notório jornalista, viajante e estudante de assuntos russos, que pas-
sou diversos anos conhecendo a União da Rússia Soviética”. Os artigos, pu-
blicados na Chicago American e no New York Evening Journal, por exemplo,
descreveram numa prosa arrepiante a gigantesca fome na Ucrânia que, aparen-
temente, tinha vitimado “seis milhões” de vidas no ano anterior. [2] Acompa-
nhando as histórias havia fotografias mostrando a devastação da fome, as quais
supostamente Walker tinha contrabandeado numa câmera sob “as mais adver-
sas e perigosas circunstâncias possíveis”.
Por si só, as histórias de Walker publicadas na imprensa de Hearst não fo-
ram exemplos particularmente impressionantes de fraudes sobre a União So-
viética. Nem foram as maiores obras de jornalismo amarelo já produzidas pela
imprensa aliada aos conservadores. Mentiras e distorções vinham sendo escri-
tas sobre a União Soviética desde os dias da Revolução de Outubro em 1917.
94 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

As campanhas midiáticas antissoviéticas subiram o tom no final das décadas de


1920 e 1930, dirigidas por pessoas como Hearst, que queriam manter a URSS
fora da Liga das Nações e isoladas em todos os aspectos.

As histórias e fotos falsas de Thomas Walker apareceram na imprensa de


Hearst em fevereiro de 1935. Outras fontes apontam diferentes fotógra-
fos, anos e temporadas para essas fotos falsificadas tiradas antes da década
CAPÍTULO 1: THOMAS WALKER, O HOMEM QUE NUNCA EXISTIU| 95

de 1930, que também contam com evidências de alterações e edições. Este


trecho do Chicago American de Hearst (25 de fevereiro de 1935) foi pu-
blicado como uma evidência da “fome-genocídio” em uma edição de 1983
da revista nacionalista ucraniana EKRAN, com sede em Chicago.

Todavia, as fotos de Walker sobre a fome são realmente notáveis, dado que,
tendo sido provadas como completas mentiras há mais de 50 anos, continuam
a serem usados por nacionalistas ucranianos e institutos de propaganda uni-
versitários como provas do suposto genocídio. A extensão da fraude de Walker
pode apenas ser medida pela magnitude e longevidade da mentira que as fotos
são usadas para ilustrar.
Histórias de horror sobre a Rússia eram comuns na imprensa ocidental,
particularmente entre jornais e jornalistas com orientação conservadora ou fas-
cista. Por exemplo, o London Daily Telegram de 28 de novembro de 1930, pu-
blicou uma entrevista com um homem chamado Frank Eastman Woodhead
que teria “recém retornado da Rússia após uma visita de sete meses”. Wo-
odhead reportou ter testemunhado massacres sangrentos naquele novembro,
uma carnificina que deixou “fileiras de cadáveres medonhos”.
Louis Fischer, um escritor americano para a New Republic e para The Na-
tion, que estava em Moscou no momento das supostas atrocidades, descobriu
que não apenas tais eventos nunca ocorreram, mas que Woodhead tinha dei-
xado o país quase oito meses antes das cenas que teria afirmado testemunhar.
Fischer desafiou Woodhead e o London Daily Telegram no assunto; ambos
responderam com um silêncio vergonhoso. [3]
Quando os artigos de Thomas Walker apareceram na imprensa de Hearst,
Fischer passou a desconfiar – ele nunca tinha ouvido falar de Walker e não en-
controu ninguém que o conhecesse. Os resultados de sua investigação foram
publicados na edição de 13 de março de 1935 do The Nation:
O Sr. Walker, fomos informados, “entrou na Rússia na última prima-
vera”, que foi a primavera de 1934. Ele viu fome. Ele fotografou suas
vítimas. Ele conseguiu relatos em primeira mão e emocionantes da de-
vastação da fome. Agora, a fome na Rússia é notícia “quente”. Por que o
Sr. Hearst manteve esses artigos sensacionais parados por dez meses antes
de publicá-los? Minhas suspeitas cresceram ainda mais [...]

Eu tinha cada vez mais certeza de que ele era apenas outro Woodhead,
outro jornalista ausente. Então eu consultei as autoridades soviéticas que
detinham as informações oficiais de Moscou. Thomas Walker esteve na
União Soviética apenas uma vez. Recebeu um visto de trânsito do Cônsul
96 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

soviético em Londres em 29 de setembro de 1934. Entrou na URSS pela


Polônia por trem em Negoreloye em 12 de outubro de 1934. (Não na pri-
mavera de 1934 como diz.) Ele esteve em Moscou no dia 13. Ele perma-
neceu em Moscou do sábado, dia 13, até quinta, dia 18, depois embarcou
no trem transiberiano que o levou até a fronteira soviética-manchuriana
em 25 de outubro de 1934, seu último dia no território soviético. Seu trem
não passou sequer a centenas de milhas de distância do solo negro e dos
distritos ucranianos onde ele “visitou” e “viu” e “passeou” e “fotografou”.
Teria sido fisicamente impossível para o Sr. Walker, nos cinco dias entre
13 e 18 de outubro, ter coberto um terço dos pontos que ele “descreve” de sua
experiência pessoal. Minha hipótese é que ele ficou o suficiente em Moscou
para colher de estrangeiros amargados a “cor local” ucraniana que ele pre-
cisava para dar a seus artigos a falsa verossimilhança que eles possuem.
As fotografias do Sr. Walker poderiam facilmente remontar à fome no
Volga em 1921. Várias delas podem ter sido tiradas fora da União So-
viética. Foram tiradas em diferentes estações do ano [...] uma foto conta
com árvores ou arbustos, com folhas grandes. Tais folhas não poderiam ter
crescido tanto no “final da primavera” da suposta visita do Sr. Walker.
Outras fotos mostram cenários de inverno e do começo do outono. Aqui
vai o Journal do dia 27. Um menino de 15 anos de idade, inchado e fa-
minto, posa calmamente e nu para o Sr. Walker. No próximo momento,
no mesmo vilarejo, o Sr. Walker fotografa um homem que está obvia-
mente sofrendo com o frio, mesmo estando com um sobretudo de pele de
ovelhas. O tempo naquela primavera deveria ter sido tão confiável quanto
o Sr. Walker para permitir poses nuas em um momento, e precisar de pe-
les de animais no próximo.
Seria fácil decifrar as histórias do Sr. Walker. Elas não merecem o es-
forço. A verdade é que a colheita soviética de 1933, incluindo a colheita
da Ucrânia Soviética, em contraste àquela de 1932, foi excelente; a coleta
de taxas em grãos foi moderada; e por isso condições mesmo remotamente
semelhantes às retratadas pelo Sr. Walker não poderiam ter aparecido
na primavera de 1934, e não apareceram.
Fischer desafiou os motivos da imprensa de Hearst de contratar uma fraude
como Walker para inventar tais mentiras:
[...] o Sr. Hearst naturalmente não contesta se seus jornais estragarem as
relações soviético-americanas e encorajarem nações estrangeiras a lança-
rem planos militares hostis contra a URSS. Mas seu real alvo é o movi-
mento radical americano. Estes artigos de Walker são parte da campa-
nha Anti Vermelha de Hearst. Ele sabe que o enorme progresso econômico
CAPÍTULO 1: THOMAS WALKER, O HOMEM QUE NUNCA EXISTIU| 97

registrado pela União Soviética desde 1929, quando o mundo capitalista


entrou em depressão, fornece a grupos esquerdistas encorajamento espiri-
tual e fé. O Sr. Hearst quer privar tais grupos desse encorajamento e fé
ao pintar um quadro de ruína e morte na URSS. A tentativa é muito
transparente, e as mãos são muito sujas para terem sucesso.
Em um posfácio, Fischer acrescentou que um homem chamado Lindsay
Parrott tinha visitado a Ucrânia e escrito que em nenhum lugar em qualquer
cidade ou vilarejo que tinha visitado “encontrei quaisquer sinais dos resultados
da fome sobre a qual os correspondentes internacionais têm prazer em descre-
ver”. Parrott, afirma Fischer, escreveu sobre a “excelente colheita” de 1933; o
progresso, ele declarou, “é indiscutível”. Fischer conclui: “As organizações de
Hearst e os nazistas estão começando a trabalhar cada vez mais próximos. Mas
eu não percebi que os jornais de Hearst tenham publicado as histórias do Sr.
Parrott sobre a próspera Ucrânia Soviética. O Sr. Parrott é o correspondente
do Sr. Hearst em Moscou”.
As incríveis fotografias que acompanhavam as falsas histórias de Walker
também levantaram as suspeitas de James Casey, um escritor investigativo ame-
ricano. As manchetes de Hearst diziam que “acabaram de ser tiradas na União
Soviética”, mas as fotografias eram, na verdade, “ressuscitadas” e rejuvenesci-
das”:
Os chefes dos departamentos de arte dos jornais de Hearst foram instruí-
dos a procurar velhas fotos da guerra e do pós-guerra em seus arquivos
[...] fotos tiradas de quinze a dezoito anos atrás das áreas arrasadas pela
guerra na Europa [...] algumas das fotos foram retocadas para parece-
rem novas. Em outros casos, as velhas fotos da guerra foram fotografadas
novamente. Como resultado, várias delas parecem meras cópias. [4]
Algumas das fotografias acabaram sendo identificadas como mostrando
cenas do velho Império Austro-Húngaro. Uma fotografia do New York Eve-
ning Journal (18 de fevereiro de 1935), foi identificada por Casey como sendo
de um soldado da cavalaria austríaca em pé ao lado de um cavalo morto na
sequência de uma ação militar da Primeira Guerra Mundial. [5]
Outras fotos falsas similares, afirmou Casey, “estão aparecendo agora no
Voelkischer Beobachter, Der Sturmer e outros jornais nazistas, e estão circu-
lando por toda a Alemanha”. [6]
Hearst e Walker estavam preparados para chegar a níveis incríveis de ci-
nismo e perversa crueldade ao explorarem os sentimentos humanos de com-
paixão. Uma famosa fotografia de Walker é a da “criança sapo”, que foi publi-
cada com a seguinte descrição:
98 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

TENEBROSO – Abaixo de Karkov279 (sic), em uma típica cabana cam-


ponesa, chão sujo, teto de palha e uma única mobília, um banco, esta-
vam uma menina muito magra e seu irmão de 2 anos e meio (mostrados
acima). Essa criança mais nova rasteja pelo chão como um sapo e seu pobre
corpinho estava tão deformado pela falta de nutrição que não se parecia
com o de um humano. A mãe deles tinha morrido quando a criança ti-
nha apenas um ano de idade. Essa criança nunca tinha experimentado
leite ou manteiga e tinha comido carne uma única vez. [7]

Pode-se dizer também que esta foto mostra uma trabalhadora da saúde,
em qualquer lugar da Europa, sentada na sala de espera de uma clínica com
uma criança faminta ou deformada. Há traços inconfundivelmente urbanos,
não-eslavos e provenientes do começo da década de 1920 na boina da mulher.
Além disso, a mulher, que parece estar perfeitamente saudável, está vestida para
o tempo frio enquanto “seu irmão” está nu. O banco tem o encosto marcado,
como ocorre em velhos bancos de escritório, dificilmente correspondendo a
uma única mobília da casa de um “típico camponês”.
Como foi usada na imprensa de Hearst, essa fotografia – e outras fraudes
de Walker encontradas frequentemente na Campanha da Grande fome-geno-
cídio – foi retocada e alterada. Ela tem a aparência de ter sido uma cópia al-
terada de uma fonte não-primária, ao invés de ser uma revelação direta de um
negativo. Esse autor encontrou essa foto inesquecível em uma publicação do
começo da década de 1920 sobre a fome russa no período que seguiu a Primeira
Guerra Mundial. De qualquer maneira, deve-se lembrar que Walker nunca es-
teve na Ucrânia em 1932-1933.
Partes da série de 1935 de Hearst-Walker, incluindo algumas das fotos, ti-
nham realmente aparecido no ano anterior, na edição de 6 de agosto de 1934
do London Daily Express. Atribuídas a um anônimo jovem “turista” inglês, a
história conta com um relato virtualmente idêntico ao da invenção da “criança-
sapo” de Walker. Todavia, essa versão anterior da fraude localiza a história em
Belgorod – que fica na Rússia propriamente. Versões subsequentes da fraude
durante décadas mudaram politicamente o ocorrido para Karkov, que fica, é
claro, na Ucrânia.
Assim, pelo menos alguns dos relatos falsos de Walker foram preparados
com bastante antecedência de sua verdadeira visita soviética no outono de 1934.
Parece que os conspiradores de Hearst-Walker decidiram inventar uma série
279
O nome da cidade é traduzido para o português como Carcóvia, porém, essa tradução é muito
pouco usada. Também é possível encontrar o nome da cidade como Kharkov. Optamos então
pelo nome mais usado para se referir à cidade em textos em português: Karkov. [N.T]
CAPÍTULO 1: THOMAS WALKER, O HOMEM QUE NUNCA EXISTIU| 99

expandida e melhorada, incluindo alguns dos materiais publicados anonima-


mente no Reino Unido. Conclui-se que a curta viagem soviética de Walker foi
simplesmente um detalhe, um gesto cosmético para a já planejada publicação
da série nos jornais americanos de Hearst em 1935.

A garota de Thomas Walker com a criança-sapo publicada no New York Evening Journal de
Hearst (19 de fevereiro de 1935). Alegações contraditórias acerca da origem dessa foto foram
instigadas por propagandistas nazistas na década de 1930. Uma cena da década de 1920, essa
foto é ainda amplamente usada como evidência da “Grande fome-genocídio”.
100 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Não apenas eram as fotografias uma fraude, a viagem até a Ucrânia uma
fraude, e a série de Hearst sobre a fome-genocídio uma fraude; Thomas Wal-
ker era também uma fraude. Deportado da Inglaterra e preso em seu retorno
aos Estados Unidos apenas alguns meses depois da série de Hearst, no fim das
contas, Thomas Walker era na realidade o fugitivo condenado Robert Green.
O New York Times publicou: “Robert Green, um escritor de artigos republi-
cados sobre as condições na Ucrânia, que se apresentou na última sexta-feira
perante um Júri Federal numa denúncia de fraude de passaporte, se declarou
culpado ao Juiz Federal Francis G. Caffey. O juiz descobriu que Green era um
fugitivo da Prisão Estadual do Colorado, de onde ele escapou após ter servido
dois anos de uma pena de oito anos por falsificação”. [8]
Robert Green, foi revelado, tinha construído uma impressionante ficha
corrida por três décadas. Seu rastro de crimes passou por cinco estados ame-
ricanos e quatro países europeus, e incluiu condenações em denúncias de ter
violado o Mann White Slave Act no Texas, falsificação e “golpe do casamento”.
[9]
Provas apresentadas no julgamento de Walker revelaram que ele tinha feito
uma visita anterior à União Soviética em 1930, sob o nome de Thomas J.
Burke. Tendo trabalhado brevemente para uma firma de engenharia na URSS,
ele foi – por sua própria confissão – expulso por ter tentado tirar um membro
do Exército Branco do país. Um repórter que cobriu o julgamento notou que
Walker “admitiu que as fotos da ‘fome’ publicadas em sua série no jornal de
Hearst eram falsas e que não tinham sido tiradas na Ucrânia como informado”.
[10]
As “evidências” de fome-genocídio trazidas ao público americano por esse
“notório jornalista” e “testemunha” seguem vivas em círculos historiográfi-
cos contaminados. Os materiais de Walker e sua afirmação de seis milhões de
vítimas ainda são reconhecidos e publicados por editoras de livros de histó-
ria como o Fundo de Estudos Ucranianos da Universidade de Harvard, assim
como na imprensa dos próprios Nacionalistas Ucranianos. As fotografias fal-
sas de Walker são as mais difundidas “provas” visuais associadas à campanha
da fome-genocídio no pós-guerra, mesmo com depois de todo o seu material
ter sido desmascarado como fraudulento imediatamente após a sua publica-
ção em 1935. Aparentemente, sentem que os riscos inerentes em enganar o
público são necessários para seguirem com as invenções sobre a fome-genocí-
dio. [11]
CAPÍTULO 2:
A CAMPANHA DA IMPRENSA
DE HEARST CONTINUA
Apesar do fiasco com Thomas Walker, Hearst não desistiu da campanha
da fome-genocídio; ela fazia parte de sua propagação geral de visões antisso-
viéticas e pró-fascistas. Enquanto ultrapassa o escopo deste livro examinar de
forma pormenorizada as atividades do magnata da imprensa William Ran-
dolph Hearst, pode-se afirmar que ele era conhecido por milhões na década
de 1930 como “O Fascista Número Um da América”. É amplamente conhe-
cido que certas corporações americanas (como por exemplo, Henry Ford), em-
prestaram dinheiro aos nazistas, enquanto uma corporação de petróleo ame-
ricana abasteceu o exército de Franco durante a Guerra Civil Espanhola. [1]
O que é menos conhecido, todavia, é que por um período durante a década de
1930, Hearst empregava o ditador fascista italiano Benito Mussolini, pagando-
o quase dez vezes o valor que o mesmo recebia como chefe do Estado Italiano:
“Por um longo período, a maior fonte de renda de Mussolini eram os 1.500
dólares que recebia por semana da imprensa de Hearst, no começo de 1935,
todavia, ele desistiu de escrever artigos regulares porque a política internacio-
nal estava muito delicada para que ele pudesse se expressar francamente”. [2]
Hearst estava longe de ser o único magnata conservador extremista da im-
prensa. George Seldes, correspondente veterano do Chicago Tribune e autor
do clássico Fatos e Fascismo, avisou das conexões entre grandes empresas, a im-
prensa e tendências fascistas na década de 1930 e no período de guerra Ameri-
cano:

Se o leitor pensa nos donos das nossas cadeias de jornais, como Hearst,
Howard, Patterson e McCormack, como apenas quatro entre os 15.000
editores americanos, não consegue enxergar o perigo para os Estados Uni-
dos vindo de uma imprensa antidemocrática e antiamericana. Esses qua-
tro editores publicam um quarto de todos os jornais vendidos diariamente
em nossas ruas, eles possuem quarenta dos 200 jornais das grandes cidades
que formam a opinião pública americana, eles comandam não apenas as
três maiores redes de jornais no país, mas duas das três maiores grandes
prestadoras de serviços jornalísticos que alimentam a maioria dos diários
dos Estados Unidos, e pelo fato de eles sempre terem sido contra os trabalha-
102 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

dores, antiliberais e antidemocráticos, mesmo quando não abertamente


seguindo as linhas de Mussolini e Hitler, constituem o que eu acredito ser
a maior força hostil ao bem-estar geral das pessoas comuns da América.
[3]

Muitas das alegações mais extremas da fome-genocídio da década de 1930


emanaram desses editores.
Este não era o limite das conexões fascistas de Hearst. No final do verão de
1934, Hearst visitou a Alemanha Nazista. Em Munique, ele foi acompanhado
de um homem que conhecia bem, Ernst Hanfstaengel, assessor de imprensa
do Reich e um conselheiro íntimo de Hitler. [4] Em Bad Neuheim, quatro
soldados chegaram para informar Hearst que um avião o aguardava para levá-
lo até Hitler, com quem ele se encontrou para uma reunião. [5] Vários acordos
foram fechados, um sendo que a Alemanha iria comprar notícias internacio-
nais da agência de coleção de notícias de Hearst, a International News Service.
O acordo foi estimado em um milhão de marcos por ano. [6] Talvez tais con-
siderações financeiras serviam para justificar as convicções políticas de Hearst,
reveladas em um comentário publicado no New York Times: “se Hitler for
bem-sucedido em apontar o caminho para a paz e ordem [...] ele terá conquis-
tado algo muito positivo não apenas para seu próprio povo, mas para toda a
humanidade”. [7]

William Randolph Hearst, conhecido por milhões de americanos durante a década de 1930
como o “Fascista Número 1 da América”, posa com líderes nazistas durante sua visita no outono
de 1934 à Alemanha Nazista. Da esquerda para a direita: Sr. Rocker, secretário privado de
Hearst; líder nazista Alfred Rosenberg; William Randolph Hearst; Dr. Karl Bomer, Chefe da
Divisão de Imprensa do Bureau de Política Estrangeira Nazista; Thilo von Trotha, tenente de
Rosenberg. Alguns meses após seu retorno aos EUA, Hearst lançou sua campanha de propaganda
da fome.
CAPÍTULO 2: A CAMPANHA DA IMPRENSA DE HEARST CONTINUA| 103

Hearst parece ter sido por muito um promotor devoto dos interesses do
Estado alemão. Desde pelo menos a Primeira Guerra Mundial: “Ele foi contra
empréstimos e envio de munições para a Inglaterra e França, sendo também
contra que os navios mercadores dos Estados Unidos fossem armados. Ele
contratou um antigo correspondente do New York Times, William Bayard
Hale, e o enviou para a Alemanha. Mais tarde se descobriu que Hale era pago
pelos alemães [...]”. [8]
Os métodos para noticiar os períodos de guerra aplicados por Hearst eram
tão amarelos que a Harper’s Weekly, suspeitando que Hearst estava fazendo
uso de correspondentes místicos para publicar artigos falsos, afirmou tal sus-
peita em 15 de outubro de 1915. Em outubro de 1916, os governos britânico
e francês baniram a imprensa de Hearst de fazer uso dos telégrafos e dos cor-
reios. O governo canadense tomou as mesmas medidas no mês seguinte, ba-
nindo todos os jornais de Hearst. Ser pego com um jornal de Hearst naqueles
dias significava uma multa de 5.000 dólares ou até cinco anos de prisão. [9]
Foi após a viagem de Hearst para a Alemanha que sua imprensa passou a
promover a temática da “fome-genocídio na Ucrânia”. Antes disso, seus jor-
nais tinham refletido em diversos momentos uma perspectiva distinta. Por
exemplo, em 1º de outubro de 1934, a edição do Herald and Examiner pu-
blicou um artigo do antigo Primeiro Ministro Francês, Edouard Herriot, que
tinha recentemente retornado de uma viagem pela Ucrânia. Herriot afirmou:
“[...] toda a campanha sobre o tema fome na Ucrânia está neste momento
sendo divulgada. Enquanto cruzei a Ucrânia, não vi nada do tipo.” [10]
Com certa ligação com os planos para uma campanha da fome-genocídio,
existia uma gigantesca campanha de “medo vermelho”, que havia inundado a
imprensa de Hearst desde o final do outono de 1934. Para fundamentar seus
pedidos de leis que obrigassem professores a fazer juramentos de lealdade, He-
arst enviou “centenas” de repórteres para “desmascarar” professores radicais,
em uma “caçada vermelha que destruiu a imagem de vários liberais honestos
[...]”. [11] E, enquanto mantinha uma abordagem frouxa sobre as ativida-
des nazistas na Alemanha, Hearst iniciou seu ataque midiático sobre a suposta
“grande fome, miséria e brutalidade” da União Soviética. [12]
Para a imprensa nazista na Alemanha, os alemães protegidos por outros
Estados estrangeiros, e o império de imprensa de Hearst nos Estados Unidos,
1935 seria o Ano da Grande Fome Ucraniana. Um dos aliados de Hearst neste
processo, Dr. Ewald Ammende, descreveu o início da campanha: “Em 5 de
janeiro de 1935, William Randolph Hearst transmitiu um discurso baseado
quase que por completo nos relatados do Cardeal Innitzer Committee [...]
toda a imprensa de Hearst passou a focar na fome na Rússia”. [13]
104 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Violentamente maculando os esforços Soviéticos para coletivizar e se in-


dustrializar, e ao mesmo tempo protegendo o que vinha ocorrendo na Ale-
manha Nazista, Hearst deu espaço para suas visões elitistas em sua transmis-
são que abrangia os Estados Unidos de uma costa à outra: “A verdade é que
o governo pelos proletários, governo dos menos capazes e menos conscientes
elementos da comunidade – governo da turba, governo pela tirania e terro-
rismo [...] é o horripilante fracasso que precisa ser e definitivamente merece
ser”. [14]
Tendo feito tal afirmação, Hearst fez tudo em seu poder para torná-la ver-
dade, pelo menos na imaginação de seus leitores. O homem que publicou arti-
gos sem qualquer censura de nazistas como Goering e Rosenberg, e o ditador
fascista Mussolini, [15] tinha iniciado sua Campanha da Grande Fome – Ge-
nocídio. Em fevereiro de 1935, Hearst e seus escribas mercenários estavam
prontos para entrar em ação. Relatos de uma “próspera Ucrânia soviética”
eram escondidos, e em seus lugares foram introduzidas as histórias falsas de
Thomas Walker.
Após a série de Walker, Hearst lançou sua próxima jogada, determinado
em convencer os americanos de que a União Soviética era a terra da mais com-
pleta fome, genocídio e canibalismo. Desta vez ele apresentou os contos de um
tal Harry Lang, editor do Daily Forward, uma publicação na língua Ídiche de
uma facção de extrema direita do Partido Socialista. A escolha de Hearst por
Harry Lang fazia sentido, de um ponto de vista estratégico: o passado socia-
lista de Lang iria, com sorte, fornecer um ponto de vista mais universal para
sua campanha antissoviética, com a ilusão de um apoio vindo da esquerda.
Por que um socialista iria se juntar com um editor capitalista e multimili-
onário?
No começo da década de 1920, após divisões entre a esquerda e a direita,
o Daily Forward tinha se rebaixado ao status de um diário de extrema-direita.
Passou a representar as visões e interesse de um pequeno grupo ligado com
operadores do “sindicato dos empresários”, que resistiam violentamente – com
a tinta de seus jornais, ameaças e coturnos – qualquer militância entre os tra-
balhadores os quais dominavam. [16]
Em uma greve de 1926, o Forward fez uso descarado de táticas de fura-
greve contra militantes dos sindicatos, cujas demandas, se conquistadas, te-
riam envergonhado e colocado em perigo o controle que seus membros ti-
nham em seus respectivos sindicatos:

O Forward cumpriu completamente sua “missão sagrada”. Diariamente


publicou um ataque incansável, com temática do “medo vermelho” con-
CAPÍTULO 2: A CAMPANHA DA IMPRENSA DE HEARST CONTINUA| 105

tra a greve [...] O objetivo da liderança Comunista da greve, segundo o


jornal, era mostrar a Stalin “que seus seguidores americanos tinham co-
meçado a fazer a revolução”. Já que os trabalhadores dos curtumes não
estavam interessados nesta “revolução”, estavam sendo aterrorizados pe-
los comunistas para continuarem em greve. O Forward até mesmo “desco-
briu” uma misteriosa “Sala C” no quartel-general da greve. Lá, de acordo
com o jornal, centenas dos trabalhadores de curtumes que se recusaram a
apoiar a greve eram levados à força e espancados até mudarem de ideia,
pelos “terroristas comunistas”.

O Forward publicou diversas propagandas onde implorava a todos os tra-


balhadores de curtume que queriam “se tornar financeiramente indepen-
dentes” a se candidatarem em certos centros de emprego para fura-greves.
Os trabalhadores rasgaram com ódio cópias do jornal [...] [17]

Em 1933, o Forward recebeu até mesmo convites dos empregadores para


ajudar a criar sindicatos de empresas para diminuir os esforços de organização
dos sindicatos militantes, o que faria com que gastassem mais dinheiro em sa-
lários e benefícios. [18] Foi neste mesmo ano que o editor do jornal, Harry
Lang, foi até a URSS – a base de seus “relatos horrendos” da Grande fome-ge-
nocídio.
Dessa forma, tinha-se uma distância política bem curta entre a função de
editor de Harry Lang no Forward até a fábrica de mentiras de Hearst. Espe-
cialmente quanto às mentiras sobre a Rússia. Lang e seu jornal anti vermelho
estavam tão ávidos a defender o capitalismo quando seus parceiros nas lide-
ranças “sindicais” que estavam determinados a manterem suas posições como
uma “aristocracia operária”. Por estas razões, é difícil aceitar as tentativas de
alguns historiadores em definir as estórias de Harry Lang sobre a Grande fo-
me-genocídio como as confissões de um “socialista desiludido”.
As contribuições de Lang à campanha de Hearst atingiram novos ápices no
macabro. Fazendo uso de manchetes sensacionalistas como “Massas Soviéti-
cas Rezam em sepulturas para morrerem”, “A Polícia Secreta Soviética Rouba
dos Famintos”, “Armas Forçam o Trabalho Russo”, “Os Famintos Inimigos
Soviéticos são Exilados para o Ártico”, e “Relatos de Torturas Soviéticas con-
tra Mulheres”, Lang “trouxe às claras os horrores soviéticos”:
No escritório de um funcionário soviético, vi um pôster que chamou mi-
nha atenção. Mostrava a foto de uma mãe em desespero, com uma cri-
ança inchada a seus pés, e sobre a foto havia a inscrição: Comer Crianças
Mortas é Barbarismo. O oficial soviético me explicou: “Nós distribuímos
106 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

esses posters em centenas de vilarejos, especialmente na Ucrânia. Fomos


obrigados.” [19]
Entretanto, Hearst não teve mais sucesso com Lang do que teve com Wal-
ker. As histórias de Lang eram publicamente desafiadas por americanos que
tinham visitado, ou trabalhado, em alguns dos lugares que ele “descreveu” na
Ucrânia. O trabalhador americano Santo Mirabele escreveu:
Harry Lang, você disse que esteve em Karkov [...] e viu trabalhadores
voltando da fábrica de tratores sujos e maltrapilhos com bebês em seus colos
porque não existem carrinhos de bebê. Harry Lang, você é um mentiroso
[...] você não viu os carrinhos e os apartamentos dos trabalhadores a uns
dez quarteirões de distância da grande fábrica de tratores? Você não sabe
que os trabalhadores têm muitas instalações para se lavarem antes de sair
da fábrica? Você não viu os mesmos milhares de trabalhadores voltando
à noite para o auditório da fábrica para ouvirem música e se divertirem
por algumas horas?

Estas foram as coisas que vi em Karkov em 1932. Estou disposto a en-


contrar com Harry Lang em qualquer plataforma, em qualquer dia –
mentiroso e escritor prostituído que é – e deixar o público julgar quem está
contando a verdade. [20]
Lang foi publicamente criticado pelo movimento trabalhista judeu, e tam-
bém por seu próprio Partido Socialista. O Secretário Nacional do Partido So-
cialista, Clarence Senior, declarou:
O Partido Socialista dos Estados Unidos repudia os ataques feitos à Rús-
sia Soviética que neste momento ilustram os jornais de Hearst. Lang, que
se diz ser socialista, não apenas representou de forma falsa a atitude so-
cialista da Rússia Soviética, mas se colocou em posição de crítica de todos
os trabalhadores ao se fazer uma reles ferramenta de William Randolph
Hearst, o amargo inimigo do movimento trabalhista e a principal im-
prensa do fascismo Americano [...] [21]
Várias reuniões ocorreram dentro das correntes do Partido Socialista sobre
o assunto da expulsão de Lang. Em uma delas, onde estavam representadas 43
filiais do Círculo dos Trabalhadores, I. Laderman afirmou que ele tinha estado
na Ucrânia ao mesmo tempo que Harry Lang, e provou ser mentira toda a série
de Lang na imprensa de Hearst. No meio de maio de 1935, o Partido Socialista
do Estado de Illinois pediu a expulsão de Lang, enquanto o Partido Socialista
de Nova York suspendeu seu status de membro por um ano. [22]
CAPÍTULO 2: A CAMPANHA DA IMPRENSA DE HEARST CONTINUA| 107

Até o próprio Forward divulgou uma nota de esclarecimento: “Lang es-


creveu sob sua própria responsabilidade”. O jornal teve que admitir que a
maioria dos numerosos protestos que recebeu em resposta aos artigos de Lang
vieram de “calorosos amigos do jornal que declararam o quanto acharam de-
plorável e estão indignados com este incidente”. [23]
O The Nation trouxe mais detalhes sobre um grande motivo pelo qual
Hearst tinha escolhido tal “testemunha”:
[...] o espetáculo vindo de um suposto Socialista, não importa o quão re-
negado seja combinado com as forças do mais inescrupuloso e reacionário
jornalista nos Estados Unidos em uma campanha de falsa representação
sobre o primeiro país Socialista está fadado a causar confusão no público.
Hearst sabe que seus leitores não estão em uma posição para julgar a pre-
cisão de suas acusações. E ele sabe que seus objetivos podem ser melhor al-
cançados ao jogar uma cortina de fumaça sobre o impressionante progresso
que a União Soviética alcançou nos últimos dois anos. Ao tentar desacre-
ditar o comunismo na distante Rússia, ele está meramente fazendo uso
de um método fácil e desonesto de atacar o radicalismo em todas as suas
variações nos Estados Unidos. [24]

Mesmo após a rejeição de Lang pelo público, Hearst ainda não tinha exau-
rido sua série sobre a “Grande fome-genocídio”. Mas seu tempo era curto –
1935 não tinha sido um ano difícil como 1932 ou a parte pré-colheita de 1933,
e os próprios correspondentes de Hearst estavam enviando relatórios favorá-
veis sobre o progresso econômico e social dos soviéticos. [25] Todavia, Hearst
estava determinado a matar a União Soviética de fome, nem que fosse de forma
retroativa.
Seguindo Lang na lista de escribas contratados, tem-se R. H. Sanger, que
fez sua estreia nas edições do final de abril de 1935. Inicialmente apresentados
pelos jornais de Hearst como um “ex-comunista”, Sanger posteriormente ad-
mitiu que seu “comunismo” consistia em ter assistido algumas aulas em uma
escola noturna socialista enquanto trabalhava no Escritório de Comércio Es-
trangeiro e Doméstico em Washington. Para ilustrar suas histórias, uma fo-
tografia supostamente mostrando Sanger entrevistando um grupo de traba-
lhadores russos em Moscou foi incluída. Observadores críticos, todavia, afir-
maram que a foto tinha sido creditada a um fotógrafo da equipe do Evening
Journal de Hearst. Nenhuma das fotos mostrava condições que apoiavam as
denúncias da “Grande fome-genocídio”.
Mais “testemunhas” foram apresentadas. Em maio de 1935, Hearst cele-
brou a “saída do armário” de Andrew Smith, recém-retornado depois de três
108 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

anos na União Soviética. Smith perdeu pouco tempo antes de vender histórias
de horror para a imprensa de Hearst, embora suas correspondências anteriores
com amigos americanos não tenham indicado tal cenário. Talvez ele precisasse
de um novo começo nos Estados Unidos que estava repleto de desempregados.
Sem dúvidas, lembrando da forma na qual tinham queimado seus dedos
na série anterior, os jornais de Hearst agora reproduziam uma suposta docu-
mentação de apoio da estadia de Smith: seus documentos de férias. As pessoas
que sabiam Russo, todavia, afirmaram que o certificado de baixa de Smith di-
zia “dispensado por vadiagem”, e não “dispensado para férias”. [26]
O The Nation desacreditou ainda mais as afirmações de Smith, trazendo à
luz sérias inconsistências e “falsificações” no “orçamento” de Smith que havia
sido descrito na imprensa de Hearst. [27] As estórias de Smith também foram
expostas como mentiras por um trabalhador americano com quem Smith ti-
nha trabalhado na União Soviética e a quem ele tinha nomeado como uma
testemunha chave de suas alegações. Carl Blaha não apenas chamou Smith de
mentiroso, mas também forneceu um relato detalhado e muito diferente das
reais condições de vida e trabalho vivenciadas por ele e Smith. [28]
O “testemunho” de Andrew Smith não se limitou a alegações da existência
da Grande fome-genocídio. Até 1949 ele colaborou com uma testemunha da
Promotoria para o Comitê da Câmara dos Deputados sobre a Guerra Fria e
Atividades Não-Americanas. [29]
Outro informante para o Comitê da Câmara da Era McCarthy foi um
certo Fred Beal, que tinha fugido para a União Soviética em 1930 para se evadir
de uma sentença de 20 anos de prisão como resultado da greve em Gastonia.
[30] Beal voltou de forma secreta para os EUA por seis meses, e depois foi de
volta à União Soviética de forma voluntária. Após seu retorno final para os
EUA em 1933, Beal, o fugitivo que não conseguia qualquer emprego no meio
da depressão econômica, já em 1934 estava se preparando para se vender por
dinheiro e pela esperança de uma pena de prisão reduzida.
Em junho de 1935, artigos de Beal apareceram no Forward de Harry Lang,
e outros foram publicados na imprensa de Hearst. De acordo com um jornal,
que publicou partes da correspondência inicial de Beal que contradiziam suas
alegações perante a imprensa de Hearst, os artigos de Beal foram “ditados” du-
rante maio de 1934. [31]
Os relatos de Beal na imprensa de Hearst foram confrontados por outros
trabalhadores americanos, entre eles um trabalhador da indústria automobi-
lística, J. Wolynec, que tinha trabalhado na fábrica de tratores de Karkov entre
1931 e 1935. Wolynec, que não fazia parte do Partido Comunista, tinha co-
CAPÍTULO 2: A CAMPANHA DA IMPRENSA DE HEARST CONTINUA| 109

nhecido Beal na Ucrânia por dois anos. Ele desafiou os relatos de Beal de ter
ouvido conversas relevantes, afirmando que Beal sequer sabia falar russo [ou
ucraniano]. [32] Wolynec citou um livreto anterior escrito por Beal, com o
título Trabalhadores Estrangeiros em uma Fábrica de Tratores Soviéticos, no
qual Beal tinha dado descrições completamente contraditórias às que posteri-
ormente escreveu para Hearst. Pouco tempo após ter voltado aos EUA, Beal
escreveu em seu livreto:
Não seria verdade dizer que todos os estrangeiros estavam satisfeitos com
a vida na União Soviética. A maioria veio com intenções honestas, mas
também existiam alguns que esperavam algo em troca de nada. Estes,
obviamente, ficaram desapontados e voltaram rapidamente. Mas a mai-
oria dos que voltaram contam a verdade sobre a situação aqui. [33]
Beal não foi um destes.
Após sua reabilitação na imprensa de Hearst, Beal recebeu a autorização de
cumprir apenas uma pequena parte de sua sentença original de prisão. Sua au-
tobiografia – Jornada Proletária – apareceu em 1937, um clássico da imprensa
marrom que ainda é usado como arma da Campanha da Grande fome-geno-
cídio.
Neste livro, Beal apresenta “amostras” difamatórias de americanos que ti-
nham se voluntariado para ajudar na industrialização soviética. O suposto diá-
logo de Beal com uma mulher negra, que ele diz ter sido “pega nas ruas” para
preencher uma cota da Comintern de americanos negros que trabalhavam na
URSS, claramente mostra sua mentalidade racista e sexista. Em resposta à per-
gunta dele sobre seu passado como membro de um sindicato, a caricatura de
Beal responde:
Não, sinhô, eu não pertenço a sindicato nenhum. Eles não têm sindicato
no meu negócio. Trabalhei uma vez numa fábrica de camisas e as pes-
soas lá, elas me fizero entrar no sindicato, mas ieu larguei. Eu não iria
trabalhar em fábrica nenhuma. Consigo mais dinheiro dos meus clientes
homens. [34]
À essa invenção, Beal adicionou um trabalhador americano que seria um
sanguessuga e estuprador. [35] Em outro ponto, ele faz um de seus persona-
gens afirmar: “Essas mulheres de Moscou são imundas, nunca tomam banho.”
[36] E claro que o livro não estaria completo sem uma descrição de uma terra
arrasada pela Grande Fome – Genocídio:
[...] Eu peguei o trem na nossa pequena estação em Lossevo, e andei por
duas horas até Chekuyev. Deste lugar, andamos por várias milhas. Não
110 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

encontramos ninguém. Encontramos um cavalo e um homem mortos ao


lado da estrada. O cavalo ainda estava atrelado à carruagem. O homem
estava segurando as rédeas em suas mãos duras e sem vida. Ambos tinham
morrido de inanição [...] [37]

Alguém pode se perguntar porque um trem se daria ao trabalho de parar


em um lugar onde não havia mais ninguém vivo na região, ou como um ho-
mem e um cavalo tinham morrido simultaneamente. Embora Jornada Prole-
tária seja bem ilustrado com as fotos de Beal da URSS, nenhuma delas, nem
remotamente, indicada condições de Grande fome-genocídio e de toda a du-
reza descrita em seu livro ou em seus artigos iniciais para a imprensa de Hearst.
Defendendo seus artigos para Hearst, Beal escreve em sua autobiografia:
“os jornais de Hearst são lidos, em sua maioria, pela massa trabalhadora, e
sempre tiveram uma predileção distinta a favor dos trabalhadores”. [38] Raro
mesmo era encontrar alguém, que mesmo sendo bem pago, sugeriria que a im-
prensa de Hearst era amiga dos trabalhadores.
De toda forma, Beal conquistou para si mesmo um lugar especial nos li-
vros de História conservadores ao afirmar que teve uma audiência com Pre-
trovsky, Presidente da República Soviética da Ucrânia, que supostamente te-
ria dito a ele que milhões de pessoas estavam morrendo. [39] Sovietologistas
anticomunistas contemporâneos, como Robert Quest e Dana Dalrymple ci-
tam Beal nesse quesito; mas, como temos visto, Beal não pode ser considerado
uma fonte confiável.
Cinquenta anos depois, “testemunhas” como Beal, Walker, Lang, Smith e
outros continuam a interpretar seu papel original na campanha. Na verdade,
a campanha da década de 1930 está tendo um impacto maior meio século de-
pois. Referências a relatos da década de 1930 dão certa credibilidade superfi-
cial às atuais alegações de fome-genocídio. O que foi reconhecido na década
de 1930 com sensacionalismo com motivações políticas foi transformado em
evidências primárias na década 1980. Exemplos de fraude e contradições des-
mascarados no passado são convenientemente esquecidos. O notório caráter
de direita da imprensa de Hearst é raramente lembrado. Ao notar esses que-
sitos da campanha da década de 1930 e da memória seletiva do que usam a
imprensa de Hearst para propagar a tese do genocídio, pode-se ter uma noção
melhor das características da atual campanha da fome-genocídio.
CAPÍTULO 3:
FOTOS DA FOME: QUAL
FOME?
Simultaneamente à campanha de fome-genocídio de Hearst em 1935, a
imprensa nazista na Alemanha e jornais semelhantes em outras partes da Eu-
ropa publicaram materiais sobre o mesmo tema. Os nazistas estavam batendo
na questão desde 1933, com fotos com datas fraudulentas. [1] O órgão oficial
do partido nazista Voelkischer Beobachter publicou e elogiou a campanha de
Hearst em seu artigo “William Hearst uber Die Sowjetrussische Hungerkatas-
trophe” (William Hearst sobre a catástrofe da fome na Rússia soviética). [2]
As contribuições nazistas para a campanha não passaram despercebidas. Um
correspondente do New York Times comentou:
[...] houve uma nova explosão de propaganda de fome “na imprensa
alemã e austríaca, com pedidos de caridade para as ‘infelizes vítimas da
fome soviética’”. Este escritor ouviu em Berlim que esta campanha foi
apoiada por fotografias tiradas anteriormente. Algumas inclusive da-
tavam da fome no Volga de 1921. Esse é um truque favorito dos propa-
gandistas antibolcheviques. [3]
A extensão propagandística da fome até então inexistente foi reforçada
pelo aparecimento em 1935 de um livro em alemão, Muss Russland Hun-
gern? do Dr. Ewald Ammende. [4] Sua edição em inglês de 1936, Human
Life in Russia, teve uma influência duradoura sobre aqueles que propagavam
o mito da fome-genocídio. A importância do livro de Ammende pode ser ve-
rificada pelo fato de ter sido republicado em 1984 (após um lapso de 50 anos),
em meio à Guerra Fria da era Reagan. [5]
Human Life in Russia faz pouca pretensão de objetividade. Ammende
não apenas dá crédito às versões de personagens de Hearst como Andrew Smith
e Harry Lang, como também traz relatos da Alemanha nazista, da Itália de
Mussolini e da imprensa nacionalista emigrante. [6] Alegações de “viajantes”
e “especialistas” não identificados são livremente “citadas”. A documentação é
mínima: as notas de rodapé são notavelmente escassas e nenhuma bibliografia
é incluída.
Uma investigação das evidências fotográficas se faz necessária, especialmen-
te porque praticamente todas as evidências fotográficas normalmente utiliza-
112 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

das para fundamentar as alegações de fome-genocídio podem ser atribuídas a


Ammende, bem como à série Thomas Walker de Hearst e publicações nazistas
alemãs, que compartilham um número considerável de fotografias idênticas.
O próprio Ammende declara: “[as fotografias] estão entre as fontes mais im-
portantes dos fatos reais da posição russa.” [7]
De acordo com o Dr. James E. Mace da Universidade de Harvard (que
escreve a apologética “Introdução Histórica” à reimpressão de 1984 do Hu-
man Life in Russia), Ammende esteve pessoalmente envolvido em trabalhos
de assistência durante a fome russa de 1921-22. [8] Isso deve ser lembrado,
principalmente quando considerado ao lado das peculiaridades, contradições
e motivações no uso das fotografias. Além disso, Ammende reluta em reco-
nhecer as afinidades fotográficas de Human Life in Russia com publicações
anteriores na Inglaterra, nos Estados Unidos, na Alemanha nazista e em ou-
tros lugares.
Ammende evita qualquer documentação genuína das fotografias em ques-
tão: “a maioria delas foi tirada por um especialista austríaco [...]”. [9] Assim
como em tantos livros de “evidências” da fome, Ammende não o identifica.
Nenhuma das fotos é identificada especificamente como tendo sido tirada pelo
austríaco anônimo. Somos informados de que “a autenticidade das fotogra-
fias, que formam um registro permanente dos terríveis eventos na Ucrânia, [...]
é inquestionável”. [10] No entanto, a prova dessa afirmação consiste em alegar
que as fotos foram examinadas e aprovadas por “especialistas” sem nome.
Ammende alega que “as fotos realmente foram tiradas nas ruas e praças
de Karkov no verão de 1933, o que é inclusive evidente a partir de vários de-
talhes claramente visíveis nas fotos”. [11] Contudo, apenas 10 das 26 fotogra-
fias parecem retratar cenas urbanas. Destas, apenas duas (página oposta 32)
são identificadas como Karkov nas legendas. Elas mostram o que parecem ser
aglomerações tranquilas fora das lojas. Não há evidências aparentes de fome
ou pânico, apesar da alegação da legenda de que a loja estaria sendo “cercada
pela população”. A fila da segunda foto é na verdade bastante esparsa, alinhada
e bem espaçada. Embora os sinais das lojas sejam parcialmente legíveis, as fotos
não estão documentadas quanto à data e local específico. Dadas as ineficiên-
cias dos métodos de distribuição das lojas de comida soviéticas, essa imagem
pode ter sido tirada durante qualquer um entre vários anos.
A única referência restante a Karkov em qualquer uma das fotos é encon-
trada em uma legenda abaixo de uma foto de alguns cadáveres deitados em
um vagão (página oposta 192). No entanto, nem essa foi tirada em Karkov;
a legenda diz: “Essas famílias embarcaram em um trem e foram para Karkov
para exigir comida, o que, no entanto, não receberam. Quando o trem foi
CAPÍTULO 3: FOTOS DA FOME: QUAL FOME?| 113

aberto, descobriu-se que eles morreram de fome na viagem de volta”. Na ver-


dade, a foto não retrata “famílias”, mas três ou quatro corpos. Como o vagão
foi aberto na jornada de “retorno”, teria sido bem simples identificar tanto o
local quanto o nome do fotógrafo. Porém, também aqui, esses detalhes mais
elementares não são fornecidos para fundamentar as alegações de Ammende.
As demais fotos “de rua” (páginas opostas 96, 97, 128; página 192, em
cima) são, como as outras, indocumentadas e sem créditos. Contrariamente
às alegações de Ammende, elas não contêm pistas sobre qual cidade ou data
em que foram realmente tiradas. Placas de sinalização, pontos de referência,
etc., que são tradicionalmente incluídos para servir como pontos de identifi-
cação, estão notadamente ausentes. Em alguns casos (verso da página 128), as
fotos são compostas ou cortadas de tal maneira que a identificação dos prin-
cipais elementos humanos se torna impossível. Também não é certo que essas
fotografias tenham sido expostas pelo mesmo fotógrafo e equipamento.
Human Life in Russia traz muitas fotos não encontradas na edição alemã
original do livro. [12] Embora não sejam especificamente identificadas, nota-
se a alegação de Ammende de que essas fotos adicionais “foram fornecidas ao
autor pelo Dr. Ditloff, por muitos anos diretor da Concessão Agrícola do go-
verno alemão - Drusag - no Cáucaso Norte”. [13] Depois de informar o leitor
que a concessão alemã foi liquidada em 1933 (no final de agosto, muito depois
que os nazistas tomaram o poder), Ammende afirma que as fotografias “foram
tiradas pelo próprio Dr. Ditloff no verão de 1933 e demonstram as condições
prevalecentes nas planícies das áreas agrícolas da Zona da Fome”. [14]
Observa-se que o Dr. Ditloff estava alocado no Cáucaso Norte, não na
Ucrânia. No entanto, Ammende é deliberadamente obscuro sobre o local
exato em que Ditloff fez a notável captura. Se as “planícies das áreas agríco-
las da Zona da Fome” se referem à Ucrânia (usada nas acusações subsequentes
de fome-genocídio), então é preciso se perguntar o que Ditloff - na época um
funcionário do governo nazista - estava fazendo passeando livremente pelo país
e tirando fotos aleatórias. De toda forma, independentemente de sua data e
local de origem reais, as imagens do Dr. Ditloff aparecem em publicações pos-
teriores sem nenhuma documentação ou atribuídas a uma fonte totalmente
diferente, às vezes com legendas novas, fabricadas.
Algumas fotos de Ditloff são idênticas às de Thomas Walker, já compro-
vadamente fraudulentas. Em uma fotografia (página oposta 64), uma garota
segura uma “criança-sapo” deformada, a mesma foto usada por Walker. En-
quanto Ammende reproduz como “evidência” o cerne da história fictícia da
criança-sapo de Walker, ele não o faz em conexão com esta foto, que ele usa
em outro contexto. [15] Para evitar a identificação da história com seu uso
114 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

igualmente fraudulento na imprensa de Hearst em 1935, Ammende cita sua


aparição em um jornal não identificado de Londres de 6 de agosto de 1934.
Este, na verdade, revela-se como sendo o London Daily Express (como obser-
vado no capítulo I).

Fotografias usadas de forma fraudulenta em Human Life in Russia (p. op. 65). A foto à es-
querda foi roubada de uma fonte de ajuda à fome russa de 1921-1922 - Informação nº 22
(Genebra, 30 de abril de 1922, p. 16), publicada pelo Comitê Internacional de Ajuda à Rússia
do Dr. F. Nansen. Versões alteradas desta foto de 1922 aparecem em livros nacionalistas ucra-
nianos, como 50 Years Ago: The Famine Holocaust in Ukraine (p. 46) de Walter Dushnyck e
The Black Deeds of the Kremlin (Vol. I, p. 228). “Irmãos na Angústia” (à direita) foi tirada de
um filme anterior a 1930. Até o filme nacionalista ucraniano Harvest of Despair admite que
sua origem não é dos anos 1930 e a relaciona à fome de 1921-1922.

Além da foto da criança-sapo, Ammende inclui outras seis fotos publica-


das quase um ano antes nos Estados Unidos por Thomas Walker. [16] Estas
incluem a foto de soldados com cavalos mortos, também apresentada no Daily
Express de 1934 sob a legenda “Trilha da morte de Belgoroda” (Belgoroda fica
na Rússia, não na Ucrânia). Embora tenha plena consciência do crédito do
Daily Express a um jovem “turista” inglês, Ammende atribui essa foto ao ale-
mão Dr. Ditloff.
Entre o restante da coleção indocumentada - mas politicamente legendada
- de Ammende, estão fotos perturbadoras de crianças famintas, que curiosa-
mente remontam ao período que abrange os últimos anos do czarismo, a Pri-
meira Guerra Mundial e o imediato pós-guerra. Na verdade, a “Irmãos na An-
gústia” [17] - dois filhos emaciados, um alimentando o outro com uma colher
de uma panela - nada tem a ver com os supostos eventos da década de 1930 na
Ucrânia. Milhões de norte-americanos que assistiram à série de TV “A Rús-
CAPÍTULO 3: FOTOS DA FOME: QUAL FOME?| 115

sia de Peter Ustinov” viram a mesma foto retratando as condições de fome em


um período anterior. [18] A imagem se originou como um “momento” co-
piado de um documentário feito muito antes da fome de 1932-33. (Nota-se
que Ammende não faz referência a nenhum dos dois “fotógrafos” gravando
vídeos.) Essa imagem também foi apresentada em outros documentários da
Rússia do início do século XX. Até o filme de propaganda nacionalista ucra-
niano Harvest of Despair apresenta essa imagem relacionada à fome russa de
1922.
A vida humana na sórdida trilha de fraude da Rússia não termina aqui. A
foto do lado oposto à página 161 foi publicada pela primeira vez (em relação a
1932-33) no órgão do partido nazista alemão Voelkischer Beobachter, em Ber-
lim (18 de agosto de 1933). É uma das três fotos obviamente atualizadas dos
anos 20 usadas com o artigo “Hungerhoelle Sowjetrussland”. O artigo não
está assinado, indicando que representa a linha oficial do partido nazista. Am-
mende legendou sua versão da foto “vítimas da fome no hospital”. Isso contém
cuidados médicos prejudiciais e implicações para a reabilitação dos teóricos do
genocídio da fome contradizem a noção de uma fome deliberada de extermi-
nar um povo.
Ainda há mais contradições. Ammende declara que todas as fotografias
do Human Life in Russia foram tiradas no verão de 1933. [19] Portanto,
surpreende-se encontrar uma cena de cemitério de verão aparecendo na mesma
página que uma foto de uma pilha de cadáveres nus e congelados num campo
coberto de neve. [20] Este último parece ser um retrato, de um ângulo dife-
rente da câmera, de uma cena de cemitério de inverno encontrada no livro de
1922, La Famine en Russie. [21]
Esta foto ainda não foi colocada devidamente na lata de lixo da história.
Usada como evidência de genocídio da fome, a legenda da foto é frequente-
mente reescrita, mostrando o desconforto dos autores subsequentes com a ale-
gação de “verão” de Ammende. Por exemplo, a foto aparece no The Black De-
eds of the Kremlin com a legenda “Cadáveres congelados num cemitério em
Karkov”. [22] No ultradireitista History of Ukraine [História da Ucrânia] de
Nahayewsky, a legenda muda sem nenhuma menção ao local: “Acima, uma
pilha de cadáveres de fome cobertos por neve. Eles tiveram que ficar estirados
ali até a primavera para serem enterrados.” [23] O 50 Years Ago: The Famine
Holocaust in Ukraine, de Dushnyck, não dá nenhuma pista sobre local ou
estação, mas cortou partes do primeiro plano coberto de neve. Sua legenda
dizia: “Isso não é uma pilha de madeira, mas cadáveres de ucranianos famin-
tos no local do enterro.” [24] (Diferente das legendas acima, esses autores não
dão nenhuma informação sequer sobre a fonte das fotos. Outros exemplos de
116 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

legendas estranhas e arbitrárias podem ser citados com relação a essa imagem
sozinha.)
Outras “cenas de verão” em Human Life in Russia incluem uma pessoa
vestida com casaco pesado, capuz e botas; um motorista funerário, cujo cha-
péu volumoso de peles e casaco de gola de pele apertado também são vestimen-
tas indicativas de uma década anterior; uma mulher e um menino agasalhados
para o inverno, o menino vestindo não apenas um chapéu, mas um casaco com
capuz, cachecol e luvas. Outra foto mostra uma garota com casaco, chapéu e
cachecol - segurando uma criança nua no colo. [25]
CAPÍTULO 3: FOTOS DA FOME: QUAL FOME?| 117

Ammende alega que Dr. Ditloff tirou


essas fotos no “verão de 1933”. Tho-
mas Walker disse que ele tirou essas fo-
tos na “primavera de 1934”. Uma pro-
paganda nazista registra os créditos a
Ditloff e as data como “primavera” de
1933. Notar a foto da mulher e garoto
agasalhados para um inverno severo.

Embora a relutância de Ammende em documentar suas fotos seja compre-


ensível, é curioso que a maioria dos autores da fome-genocídio que utilizam
as mesmas fotografias nem citam nem mencionam Ammende, seu livro, ou
seus misteriosos fotógrafos. Isso surpreende, já que o Human Life in Russia
é citado frequentemente por seu texto, e é reconhecido por historiadores de
direita como um livro clássico para os seus propósitos. [26]
Publicações subsequentes usam as mesmas fotos de uma das duas manei-
ras. Ou elas são usadas sem nenhuma pretensão de documentação, sem ne-
nhum crédito a nenhum fotógrafo, ou o crédito é dado a Thomas Walker e/ou
à imprensa Hearst. Isso apesar do fato de que Walker alega ter tirado as fotos
na primavera de 1934, enquanto que as fotos são usadas atualmente para re-
tratar eventos em 1932 ou 1933.
O The Ninth Circle, de Olexa Woropay, por exemplo, credita a Thomas
Walker pelas fotos que compartilha com Human Life in Russia e que são cre-
ditadas a Ditloff por Ammende. O The Great Famine in Ukraine: The Unk-
nown Holocaust deixa não documentadas as fotos designadas por Ammende
como tiradas pelo austríaco anônimo; e credita Thomas Walker pelas fotos que
Ammende creditou a Ditloff. [27] Num abandono parcial dessa prática, o Fa-
mine in the Soviet Ukraine 1932-1933: A Memorial Exhibition de Harvard
atribui algumas fotos em questão a Thomas Walker, e o restante a um outro
livro que credita a Ditloff. [28]
Embora uma pessoa comum possa compreensivelmente se desesperar com
esse confuso emaranhado de evidências documentais, espera-se justificadamente
118 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

que os historiadores verifiquem e atestem o material de origem. Portanto, é


bastante espantoso que o Dr. James E. Mace, da Universidade de Harvard, te-
nha desempenhado um papel importante em todos os livros citados. Ele não
apenas escreveu a “Introdução Histórica” à reimpressão de 1984 do Human
Life in Russia, mas também editou e introduziu o The Ninth Circle, contri-
buiu com um artigo para o Great Famine in Ukraine e foi uma das três pessoas
creditadas por preparar o Famine in the Soviet Ukraine. Ele assinou, assim, seu
selo de aprovação em versões contraditórias e mutuamente exclusivas sobre a
origem das fotos. Aparentemente preparados para endossar qualquer antico-
munismo, certos acadêmicos parecem empenhados em comprometer sua re-
putação (e a da sua universidade).
O que fazer, então, com as evidências fotográficas oferecidas pelo Human
Life in Russia de Ammende? Seriam as fotos de Ditloff na verdade de Wal-
ker, ou talvez as de Walker seriam de Ditloff? Ammende de fato afirma que
algumas das fotos haviam sido publicadas anteriormente sem a permissão de
Ditloff. Como se se antecipasse às dúvidas e cheques, ele lava as mãos cinica-
mente dizendo que Ditloff assumiria toda a responsabilidade e garante a au-
tenticidade das fotos. [29]
Previsivelmente, Ammende sequer tenta esclarecer onde, quando e por
quem foram publicadas as fotos de Ditloff anteriormente. Ele também não de-
clara quais fotos têm sido usadas sem permissão. Já que a publicação anterior
não autorizada da “fonte mais importante” de evidências de um autor (prin-
cipalmente se acompanhada de relatos contrários aos seus) é uma afronta a
qualquer escritor histórico honesto, seu silêncio sobre esse assunto gera o pior
ceticismo. Pior ainda, Ammende estava bem ciente da série de Hearst sobre a
fome desde o seu início. Ele não apenas cita as versões de Hearst para desen-
volver sua própria argumentação, como também declara: “Em 5 de janeiro de
1935, William Randolph Hearst transmitiu um discurso baseado quase intei-
ramente no relato do Comitê do Cardeal Innitzer [...] Depois, toda a imprensa
Hearst passou a lidar com a fome russa.” [30] Lembra-se que os artigos e fo-
tos falsificados de Thomas Walker foram os primeiros da série de Hearst sobre
a fome. Portanto, Ammende não era um idiota inocente que recebera fotos
falsas por ignorância. De fato, Ammende era o Secretário Geral do Comitê
Innitzer de cujos relatos Hearst obteve informações para a sua transmissão em
janeiro.
Outros aspectos do passado de Ammende levantam dúvidas. De acordo
com seu prefácio a Human Life in Russia, Ammende passou um tempo nas
regiões do Volga e Kama na Rússia czarista estudando camponeses e o comér-
cio russo de grãos já em 1913. [31] Depois da revolução, durante o período
CAPÍTULO 3: FOTOS DA FOME: QUAL FOME?| 119

de intervenção estrangeira e Guerra Civil, Ammende admite ter ocupado um


cargo junto aos governos contrarrevolucionários da Estônia e da Letônia. Ele
foi escalado para trabalhar vinculado ao regime do Hetman280 Skoropadsky,
instalado na Ucrânia pelos alemães em 1918. As simpatias políticas de Am-
mende podem ser detectadas na sua referência em tom de aprovação à “repú-
blica ucraniana independente” sob o fantoche do Kaiser, Skoropadsky. [32]
Ammende descreve seu trabalho como jornalista e envolvimento no apoio a
trabalhos de socorro na fome russa de 1921. [33]
Seguindo a carreira subsequente desse especialista já citado sobre a fome
ucraniana, observa-se que por muitos anos Ammende atuou como Secretário
Geral do chamado Congresso Europeu das Nacionalidades, que incluía afili-
ados nacionalistas emigrados e outros que fugiram da revolução russa. [34] O
órgão do Partido Nazista Voelkischer Beobachter elogiou Ammende efusiva-
mente, por promover a campanha da fome-genocídio e o Congresso Europeu
das Nacionalidades em 1933. [35]
No fim de 1933, Ammende foi indicado como Secretário Honorário do
Comitê Interconfessional e Internacional de Ajuda às Áreas de Fome na Rús-
sia pelo Cardeal pró-fascista Innitzer de Viena. Mesmo o Dr. Mace de Harvard
teve de admitir que “deve ser dito que Ammende pediu ajuda para a fome só
depois da fome ter acabado [...]”. [36]
As associações, viagens e atividades de Ammende indicam que ele estava
numa excelente posição para ter acesso a uma ampla variedade de fotos de so-
frimento e fome humanos durante as duas décadas anteriores a 1930. De fato,
uma ampla variedade de fotos e cenas de filmes documentários foram tiradas
na Rússia, Ucrânia, Europa Oriental e Armênia durante o período da Primeira
Grande Guerra, da Revolução Russa, da Guerra Civil e intervenção estran-
geira, eventos que contribuíram para a fome russa de 1921-22. Essas fotos -
tiradas por jornalistas, agências de ajuda, trabalhadores médicos, soldados e
indivíduos - eram frequentemente publicadas nos jornais e brochuras do pe-
ríodo. Tais fotos foram as fontes mais comuns para as “evidências” fotográficas
da fome-genocídio: elas poderiam facilmente ser selecionadas dos arquivos,
coleções e noticiário de óbitos e colocados na conta dos anos 1930. [37]

280
Título militar apenas inferior ao monarca, usado no leste europeu medieval principalmente
entre poloneses, ucranianos e cossacos. [N.T]
120 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Essas publicações são dedicadas à fome russa de 1921-1922, mas suas fotos são usadas de forma
fraudulenta para ilustrar a “fome-genocídio ucraniana de 1933”. O filme Harvest of Despair
[“Colheita do desespero”], por exemplo, usa fotos encontradas em cada uma. Em cima à es-
querda: Comitê Internacional de Ajuda à Rússia do Dr. Fridtjof Nansen, Information Nº 22,
Genebra, 30 de abril de 1922. Em cima à direita: publicação nacionalista ucraniana Holod
Na Ukrainyi, por Ivan Gerasymovitch, Berlim, 1922. Embaixo: La Famine en Russie, Gene-
bra, 1922.
CAPÍTULO 3: FOTOS DA FOME: QUAL FOME?| 121

Fotografias do Human Life in Russia. “A Última Jornada” (topo à esquerda) é uma cena da
fome russa de 1921-1922 tirada do Information Nº 22 (pág. 21). A foto, no topo à direita,
mostra homens vestindo boinas do exército russo da Primeira Guerra e apareceu pela primeira
vez como propaganda da “fome de 1933” no jornal nazista Voelkischer Beobachter (18 de agosto
de 1933). Abaixo à esquerda: uma fotografia posada similar às fotos da agência de ajuda à
fome russa de 1921-1922 (p.e. Information Nº 22, pág. 66). Abaixo à direita: essa cena da
cova congelada desmente a alegação de “verão de 1933” de Ammende; lembra muito aquela
encontrada na página 10 do La Famine en Russie.

Em verdade, algumas das principais fotos “de Ditloff” publicadas no Hu-


man Life in Russia se originaram de fato de publicações da fome de 1922. Por
exemplo, a foto legendada como “A Última Jornada” (pág. op. 193) foi publi-
cada pela primeira vez mais de uma década antes. Legendada como “Procissão
Funeral em Cherson”, ela aparece no boletim Information Nº 22 (p. 21) publi-
cado em Genebra, Suíça pelo Comitê Internacional de Ajuda à Rússia do Dr.
Fridtjof Nansen, datado de 30 de abril de 1922. Da mesma forma, a fotografia
da página oposta 65 (esquerda), também pode ser encontrada no boletim de
1922 (pág. 16). A foto de crianças emaciadas colocadas cuidadosamente num
122 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

banco (pág. op. 33, topo), lembra muito a técnica e o estilo de fotos prepara-
das, oficiais de documentação tiradas por grupos de assistência durante a fome
de 1921-22.
Como um experiente trabalhador de assistência à fome russa de 1921-22,
Ammende sem dúvida era familiarizado com o material de 1922 do Nansen;
e Ammende de fato descreve uma reunião com Nansen em Human Life in
Russia. [38] Há poucas dúvidas de que Ammende foi cúmplice na aventura
de falsificação de fotos da fome de seu amigo Ditloff. Pode ser, contudo, que
o próprio Ditloff - e os nazis - tenha tido um papel mais central na fraude.
Lembramos que Dr. Ditloff foi Diretor da concessão agrícola ao governo
alemão no Cáucaso Norte, sob um acordo entre o governo alemão e os sovié-
ticos. Quando Hitler tomou o poder em 1933, Ditloff (assim como os “es-
pecialistas” na fome Herwarth e Henke) não renunciaram em protesto. Ele
continuou como Diretor enquanto durou o projeto, indicando que os nazis-
tas não o consideraram inimigo dos seus interesses. Seguindo seu retorno à
Alemanha Nazista mais tarde naquele ano, Ditloff reuniu uma variedade es-
púria de fotos da fome. Estas, como já demonstrado, incluem fotos roubadas
de fontes da fome de 1921-1922. Somado a isso, ao menos 25 das fotos de Di-
tloff podem ter sido divulgadas pelos nazistas, muitas das quais foram passadas
ou recolhidas por vários editores antissoviéticos e pró-fascistas mundo afora.
Algumas das fotos de Ditloff foram publicadas no órgão do Partido Na-
zista Voelkischer Beobachter (18 de agosto de 1933). Outras apareceram no
London Daily Express (6 de agosto de 1934). Aqui deve-se notar que Am-
mende e Ditloff estiveram na Inglaterra em maio de 1934, fazendo campanha
a favor da pressão britânica contra a União Soviética na questão da fome. Am-
mende e Ditloff visitaram o Ministério das Relações Exteriores britânico, bus-
cando que o voto britânico sobre a admissão dos soviéticos na Liga das Nações
fosse “condicionado a algumas garantias [dos soviéticos] sobre os assuntos [...]
como o alívio da fome”. [39] Como Thomas Walker estava vivendo na In-
glaterra como um escritor antissoviético infiltrado, é possível que tenham lhe
passado fotos ali. De fato, fica óbvio que Walker era o turista inglês anônimo
no London Daily Express.
Em 1935, tanto a imprensa nazista quanto William Randolph Hearst pro-
moveram sistematicamente a campanha da fome-genocídio, junto com horrí-
veis fotografias. Aquele ano também viu a publicação em Berlim do livro vi-
olentamente antissemita do nazista Alfred Laubenheimer Und du Siehst Die
Sowjets Richtig [“E veja você os soviéticos corretamente”]. [40] A introdução
de Laubenheimer ao Und Du Siehst elogia o governo Hitler fervorosamente:
“Graças a Deus que desde a revolução Nacional Socialista [nazista] essas con-
CAPÍTULO 3: FOTOS DA FOME: QUAL FOME?| 123

dições incompreensíveis mudaram fundamentalmente. A luta contra o terror


bolchevique foi executada com sucesso na Alemanha.” [41] Acontece sem ne-
nhuma surpresa que em 1937 os nazistas autorizam uma segunda impressão
desse livro.
Em destaque no livro de Laubenheimer, há uma seção especial de 25 fo-
tografias de Ditloff, usadas para ilustrar as alegações de fome-genocídio dos
Nazistas. [42] Dois terços delas são idênticas às fotos de Thomas Walker pu-
blicadas no mesmo ano pela imprensa de Hearst. [43] De fato, as fotos de
Ditloff no Und Du Siehst incluem praticamente todo o conjunto de fotos de
Walker.
Ditloff contribuiu com mais que fotografias para esse livro de propaganda
nazista. Und Du Siehst também inclui um importante artigo do Doutor, acla-
mado como uma autoridade na introdução do artigo. [44]
Em 1936, um velho companheiro de viagem de Dr. Ditloff e colega de
campanha de fome, Ewald Ammende, publicou sua edição em língua inglesa,
Human Life in Russia. Ao contrário da alegação de Ammende, a maioria das
fotos são falsificações de Ditloff - sendo um número significante delas idênticas
àquelas usadas tanto por Walker quanto por Laubenheimer no ano anterior.
Qualquer que seja a mecânica real da distribuição das fotografias de Ditloff-
Walker, sua fraude está bem estabelecida. Aqueles que pretendem propagar o
mito da fome-genocídio por propósitos políticos não têm hesitado em usar
essas fotografias repetidamente até os dias de hoje - sem acrescentar qualquer
fragmento de evidência de autenticação a esse material questionável. Os mo-
tivos e persuasões políticos dos grupos e indivíduos envolvidos são realmente
relevantes aqui. Nazistas alemães, nacionalistas ucranianos de direita derrota-
dos e exilados, conservadores europeus, milionários da mídia neofascista como
Hearst - todos queriam isolar e pressionar a União Soviética, para desacreditar
e reverter os desenvolvimentos socialistas.
CAPÍTULO 4:
GUERRA FRIA I: FEITOS
SOMBRIOS
A campanha da fome-genocídio de 1930 apoiou-se fortemente em mate-
riais - geralmente fraudulento - rastreável em fontes antissoviéticas de direita.
Historiadores convencionais não aceitaram as fabricações da extrema direita.
[1] Na verdade, essa tese era tão duvidosa para historiadores contemporâneos
que alguns nacionalistas ucranianos e acadêmicos da Guerra Fria alegam que
a “fome-genocídio” foi ignorada ou deliberadamente ocultada em algum tipo
de conspiração pró soviética, de esquerda ou mesmo judaica. [2]
Enraizada no clima de opiniões pró-nazistas e conservadoras dos anos 1930,
a questão da fome-genocídio foi exumada durante a Guerra Fria dos anos 1950.
O período McCarthy testemunhou não só o ressurgimento da direita luná-
tica, mas a sua aliança com a onda nacionalista ucraniana pós-guerra que fu-
giu da Ucrânia com os alemães em retirada. Um casamento anticomunista de
conveniência se deu entre a ultradireita americana e os nacionalistas ucrania-
nos, setores que tinham colaborado com os nazistas. Eles precisavam agora de
uma nova roupagem e uma história que encobrisse suas atividades passadas,
enquanto que os promotores da Guerra Fria podiam apontá-los como “teste-
munhas vivas da ameaça comunista que enfrenta a humanidade”.
Vários livros foram publicados por nacionalistas ucranianos, não só para
agradar seus novos aliados políticos ocidentais, mas também para propagar
suas interpretações da história perante o público ocidental. Típico das ale-
gações de fome-genocídio ao estilo Guerra Fria é o The Black Deeds of the
Kremlin. [3] Publicado em 1953 e 1955, esses dois volumes são agora mais
uma arma no arsenal apologético e nas histórias de encobrimento nacionalis-
tas. Apesar de admitirem no prefácio ser uma mistura assimétrica de retalhos
[“motley” e “uneven”], o Black Deeds é usado como recurso e material de re-
ferência para a atual geração de ativistas da fome-genocídio.
As editoras dos volumes - SUZERO e DOBRUS, respectivamente - indi-
cam sua flagrante falta de objetividade. A SUZERO é a assim chamada Associ-
ação Ucraniana das Vítimas do Terror Comunista Russo, enquanto que DO-
BRUS significa a também prolixa Organização Democrática de Ucranianos
Anteriormente Perseguidos pelo Regime Soviético nos EUA. Ambos grupos
126 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

são afiliados à Federação Mundial de ex Presos Políticos Ucranianos e Vítimas


do Regime Soviético. Deve ser de alguma relevância aqui as observações no
Registro do Congresso dos EUA do debate de 1948 sobre a Lei de Pessoas De-
salojadas: “Sem dúvida todos eles [antigos colaboradores da ocupação nazista
do Leste Europeu durante a guerra] agora têm um novo nome, [se] passam
por mártires da opressão soviética e atendem a todas as especificações de um
‘refugiado político’.” [4]
O Volume I inclui uma seção especial devotada a acusações de nacionalis-
tas de execuções em massa soviéticas durante os anos 1930 em Vinnytsia.281
Desenterradas em 1943 durante a ocupação nazista, as covas foram “examina-
das” por uma “comissão” nomeadas pelos nazistas e foram exibidas em filmes
de propaganda nazista. [5] Entre os escritores de Black Deeds nessa seção está
Petro Pavlovich. Descrito na legenda de uma foto como “a principal testemu-
nha das execuções em massa em Vinnytsia”, Pavlovich também testemunhou
perante uma Comissão do Congresso dos EUA sobre Agressões Comunistas
em 1953. Contudo, em suas contribuições à Comissão americana da Guerra
Fria e no Black Deeds falta o violento pró-nazismo, antissemitismo e culto a
Hitler que caracterizavam sua versão original em Zlochyn U Vinnytsya (Cri-
mes em Vinnytsia). [6]
Escrito sob seu antigo nome Apollon Trembovetskyj, Zlochyn U Vinnytsya
foi publicado com 10.000 cópias com autorização nazista. Um entusiasmado
colaborador nazista, Pavlovich/Trembovetskyj foi editor do Vinnytski Visti na
Vinnytsia ocupada pelos alemães. O prefácio de Zlochyn U Vinnytsya trai a
intenção do autor - e a do exercício de propaganda como um todo - de reunir
apoio para a sina nazista em declínio na guerra:

Deixem que [o massacre] una fortemente nosso povo com a poderosa força
da Alemanha, libertadora da Ucrânia, deixe que [nos] una na luta cruel
e impiedosa com o terrível inimigo da raça humana - o bolchevismo. [7]

O apelo do livro ao apoio aos nazistas é indicativo do grau de colaboração


nacionalista, indo na época para o seu terceiro ano. Em 1943 os nazistas causa-
ram a morte ou o transporte para trabalho escravo de milhões de ucranianos;
ainda assim o apelo dos nacionalistas seguia. Proclamando Hitler “o grande
Salvador e humanitário”, Trembovetskyj suplica: “Só com trabalho duro e
nossas vidas seremos capazes pagar nossa dívida com Hitler, e derrotar o co-
munismo judeu.” [8]
281
O nome da cidade é traduzido para o português como Veneza, porém, essa tradução é muito
pouco usada. Optamos então pelo nome mais usado para se referir à cidade: Vinnytsia. [N.T]
CAPÍTULO 4: GUERRA FRIA I: FEITOS SOMBRIOS| 127

O Zlochyn U Vinnytsya é repleto de insultos antissemitas. Trembovetskyj


chama os ucranianos para serem forjados “na grande e cruel luta contra o judai-
co-comunismo” e se refere a “Stalin o idiota judeu” e “Stalin e seu governo
judeu”. Numa seção intitulada “Judeus e o NKVD”, Trembovetskyj culpa
especificamente os judeus pelos supostos massacres dos anos 1930. [9]

Folha de rosto do Zlochyn U Vinnytsya, um relato nacionalista ucraniano de 1943 sobre a des-
coberta das valas de Vinnytsia. Página 46 (em parte) enaltece: “Hitler o grande humanitário e
salvador. Só com trabalho duro e nossas vidas seremos capazes de pagar nossa dívida com Hitler,
e derrotar o comunismo judeu.”
128 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Clérigo pró-nazista Bispo Yevlohiy e Arcebispo Hrihory na abertura das valas de Vinnytsia. O
Bispo Yevlohiy declarou: “O Senhor Deus teve piedade de nós e para a nossa salvação nos enviou
as mãos louváveis do povo alemão e de seu líder Adolph Hitler. Todos devemos ajudar o povo
alemão e, com trabalho honesto e coração dedicado, acelerar a vitória sobre o bolchevismo.”

O testemunho pós-guerra de soldados alemães, contudo, expõem a desco-


berta de valas comuns em Vinnytsia como uma fraude da propaganda nazista.
De acordo com o documento oficial de Israel, Yad Washem Studies, Oberleut-
nant Erwin Bingel declarou que em 22 de setembro de 1941 ele testemunhou
a execução em massa de judeus pela SS e a milícia ucraniana. Isso incluiu um
massacre executado por auxiliares ucranianos no Parque Vinnytsia, onde Bin-
gel testemunhou “camadas sobre camadas” de corpos enterrados. De volta a
Vinnytsia mais tarde na guerra, Bingel leu sobre os especialistas trazidos pelos
nazistas para examinar as valas de vítimas de execuções “soviéticas” no mesmo
parque. Depois de verificar pessoalmente, Bingel concluiu que a “descoberta”
tinha sido encenada para fins de propaganda nazista e que o número de cadáve-
res que ele viu correspondia àqueles massacrados por fascistas ucranianos em
1941. [10]
Para ilustrar a seção do Black Deeds em Vinnytsia, há uma fotografia do
Bispo Yevlohiy da Igreja Ortodoxa Ucraniana na abertura das covas em 1943.
Seguindo os ritos funerários para as vítimas, Trembovetskyj escreve no Zlo-
chyn U Vinnytsya, o Bispo Yevlohiy afirmou:
O Senhor Deus teve piedade de nós e para a nossa salvação nos enviou
as mãos louváveis do povo alemão e de seu líder Adolph Hitler. Todos
devemos ajudar o povo alemão e, com trabalho honesto e coração dedicado,
CAPÍTULO 4: GUERRA FRIA I: FEITOS SOMBRIOS| 129

acelerar a vitória sobre o bolchevismo. [11]

No geral, os editores do Volume I esforçaram-se consideravelmente para


aparecerem com uma documentação pitoresca com alguma relação com as si-
nistras alegações do livro. Eles não tiveram sucesso - a menos que uma cari-
catura de Stalin com a fisionomia facial estereotipada, remanescente de uma
geração anterior de artistas antissemitas possa ser considerada uma evidência.
[12] Além da obra de arte de terceira categoria, esse volume é decorado com
desenhos irrelevantes, retratos de líderes do governo fascista e simpático aos
pogroms, as inevitáveis fotografias não-documentadas, e a seguinte farsa indi-
cativa:
Acompanhando o artigo “Collective Farming” [“Agricultura Coletiva”],
de um tal “PV” está a recorrente fotografia não-documentada, nesse caso um
grupo de camponeses com cavalos. Os camponeses, aliás, todos aparentam
estar bem vestidos com roupas práticas de trabalho. O poder de observação
científica de PV o autoriza a declarar que “todos eles estão descalços e parecem
miseráveis em seus trapos e farrapos”. [13] A descrição “trapos e farrapos”
parece melhor aplicada ao nível de escolaridade do nacionalista, já que sequer
estão visíveis na fotografia os pés de nenhum dos camponeses. De forma simi-
lar, aparece uma foto de agricultores coletivos - uma “equipe de capinagem” -
na qual algumas das mulheres estão dando risada. [14] Talvez a “agência” que
forneceu a obra de arte política tivesse esgotado as fotos que mostram traba-
lhadores infelizes labutando em roupas esfarrapadas.
O Volume I também apresenta uma um punhado de supostas fotos da
fome de 1932-1933 plagiadas de períodos históricos anteriores. Todas não-
documentadas. Algumas são roubadas de publicações da fome russa de 1921-
1922. Por exemplo, a “Um pequeno canibal” apareceu no Information Nº
22 (publicado pelo Comitê Internacional de Ajuda à Rússia em 1922). Que
essa foto foi roubada da sua fonte de 1922, e não do Human Life in Russia de
Ammende (onde ela também aparece), pode ser deduzido dos seguintes fatos:
Ammende dá à sua versão a legenda “Outra vítima da fome”; em 1922, a foto
recebeu a legenda “Canibal de Zaporozhe: comeu sua irmã” - um paralelo com
o “pequeno canibal” do Black Deeds. [15]
Outras fotos são tiradas das publicações da Alemanha Nazista dos anos
1930. Por exemplo, a foto que mostra três homens usando bonés da Primeira
Guerra Mundial (p. 237), foi publicada pela primeira vez relacionada com
alegações dos anos 1930, em 18 de agosto de 1933 no órgão oficial do partido
nazista Voelkischer Beobachter.
Entre aqueles generosos doadores listados para a publicação do Black De-
130 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

eds está Fedir Fedorenko. Seria esse o mesmo Fedorenko deportado dos Es-
tados Unidos e posteriormente condenado como guarda confesso do campo
de extermínio de Treblinka? [16] Outros doadores incluem Anatol Bilotser-
kiwsky, [17] identificado em alguns livros como Anton Shpak, um ex-policial
nazista ucraniano em Bila Tserkva, Ucrânia. Sobre essa pessoa, o escritor ucra-
niano M. Skrybnyak declara: “De acordo com documentos e depoimento de
testemunha, Anton Shpak e seus semelhantes exterminaram quase dois mil
residentes civis em Bila Tserkva durante a ocupação nazista. A maioria das ví-
timas eram judeus.” [18] Uma testemunha sobrevivente, I. Yevchuk, relembra:
Quando levavam os judeus para onde os executariam, uma moça bonita
correu para Shpak, “Ora, Anton, o que você está fazendo? Você não lembra
que fomos colegas na escola, você carregava minha mochila?”, ela implo-
rou. “Cala a boca, sua puta desgraçada”, rugiu Shpak, que levantou sua
arma e atirou bem na cara da moça. [19]

No mesmo dia, diz Yevchuk, Shpak também matou Mordko B. Diener,


sua esposa e uma senhora, Dworja Golostupetz. [20] Bilotserkiwsky (Shpak)
se identifica como um membro da Federação Mundial de ex Presos Políticos
do Regime Soviético. [21] Se Shpak e outros semelhantes não tivessem esca-
pado para o ocidente, sem dúvidas teriam se tornado “prisioneiros soviéticos”
e encarado tribunais pelos seus crimes.
Entre os escritores sobre a fome no Volume I com passado colaboracionista
nazista está Oleksander Hay-Holowko. [22] Esse homem não só era membro
da SS, como também trabalhou como propagandista para o aparelho ucrani-
ano da SS. Quando os nazistas invadiram a Ucrânia, Hay-Holowko foi “Mi-
nistro da Propaganda” do grupo nacionalista OUN em Lvov, 282 cujo breve
reinado de terror fascista foi caracterizado pelo massacre de milhares de judeus
por nacionalistas ucranianos. [23]

282
O nome da cidade é traduzido para o português como Leópolis, porém, essa tradução é muito
pouco usada. Também é possível encontrar o nome da cidade como Lviv. Optamos então
pelo nome mais usado para se referir à cidade: Lvov. [N.T]
CAPÍTULO 4: GUERRA FRIA I: FEITOS SOMBRIOS| 131

Órgão do partido nazista Voelkischer Beobachter, 18 de agosto de 1933: fotos de 1921-1922 são
usadas para ilustrar a fome de 1933. Em 1935 essas fotos reaparecem no livro de propaganda
antissemita Und Du Siehst die Sowjets Richtig (reimpresso em 1937). Esse livro e o Human
Life in Russia de Ammende (1936) dão créditos a Fritz Ditloff como fotógrafo. Fotos dessa
seleção também são utilizadas pelos seguintes livros nacionalistas ucranianos: Black Deeds of
the Kremlin (1953, 1955); 50 Years Ago: The Famine Holocaust in Ukraine (1983); The Great
Famine in Ukraine: The Unknown Holocaust (1983); e o chamado documentário Harvest of
Despair (1984).
132 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Página 15 do Information Nº 22 publicado em Genebra em 1922. A mesma foto é usada no


Black Deeds of the Kremlin para retratar uma “vítima da fome ucraniana de 1933” (Vol. II,
1955, p. 457).
CAPÍTULO 4: GUERRA FRIA I: FEITOS SOMBRIOS| 133

DIZERES NA IMAGEM: Quando visitei Zaporozhe no final de feve-


reiro, os mortos de fome já chegavam a 30 ou 40 todos os dias em cada
volost∗ [∗NT: volosts e uyezd são antigas divisões territoriais da Ucrâ-
nia]. No dia em que visitei a cidade de Cherson (3 de março de 1922),
foram registradas 42 duas mortes de fome no dia anterior (20 adultos e
22 crianças), e me disseram que poderia haver 100 casos por dia. A ci-
dade tem aproximadamente 20.000 habitantes. Na cidade de Ekateri-
noslav (160.000 habitantes), agora por volta de 80 pessoas estão morrendo
de fome por dia. No uyezd∗ de Taganrog, no mês de fevereiro, foram
registrados 642 casos de morte por fome. ( Gangrena por fome). Tam-
bém deve ser lembrado que a fome aumenta indiretamente a vulnera-
bilidade a doenças. Mesmo doenças que sob circunstâncias normais têm
uma porcentagem insignificante de mortalidade agora têm uma enorme.
Por exemplo, o sarampo é frequentemente seguido por gangrena das gen-
givas, transformando-se em gangrena da boca, com mais de 20% de mor-
talidade. Vacinações perdem boa parte de sua capacidade de prevenção.
Ao uso de substitutos para alimentos corresponde uma grande porcenta-
gem de doenças abdominais; outros, como pão com damasco, são muito
venenosos, com uma mortalidade de 50% logo após a ingestão. Ligada ao
consumo de carne de cavalos mortos, há casos de mormo. Em consequência
da fome, especialmente entre os adultos, muitos casos podem ser observa-
dos por edema, que causa [...]

Com a legenda “A Grande Fome na Ucrânia 1932-1933”, o Volume II do


Black Deeds tem credenciais impecáveis da Era McCarthy, e, mais ainda, for-
nece evidências do conluio entre o nacionalismo ucraniano e tendências neo-
fascistas durante a Guerra Fria dos anos 1950 nos Estados Unidos. O leitor é
informado que o Volume I do Black Deeds foi aceito como “evidência” pelo
Comitê da Câmara sobre a Agressão Comunista, chefiado pelo velho comba-
tente da Guerra Fria, o Deputado Charles H. Kersten de Wisconsin. [24] Por
sua vez, Dep. Kersten assinou a Introdução violentamente anticomunista ao
segundo volume do Black Deeds. [25]
Ao invés de qualquer documentação do “material ilustrativo” usado no
Volume II, o leitor é apenas referido aos arquivos de SUZERO e DOBRUS,
bem como a O. Kalynyk, autor do livro Communism the Enemy of Mankind
[“Comunismo, o inimigo da humanidade”], publicado pela organização da
juventude da facção de Bandera da OUN. [26] Os “materiais ilustrativos” são
todos muito familiares. Abrindo as duas primeiras páginas do livro estão nove
134 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

fotos de Thomas Walker e seus relatos parciais da imprensa Hearst de 1935. As


fotografias restantes - nenhuma delas documentadas ou creditadas - incluem
dez do Human Life in Russia de Ammende (duas das quais também foram
usadas por Walker e outra pelo Voelkischer Beobachter), uma do boletim In-
formation Nº 22 de 1922, e uma variedade de cenas da Guerra Civil Russa e da
fome russa de 1922. [27] Por exemplo, a fotografia legendada “A Execução dos
Kurkils [Kulaks]” (pág. 155), mostra quatro soldados e um oficial, aparente-
mente nos detalhes do enterro. Infelizmente para os editores do livro, parece
que os soldados estavam usando uniformes do exército czarista - exército er-
rado, década errada.
Um aspecto particularmente desagradável do Volume II são as macabras
alegações de canibalismo. Na verdade, o Volume II tem sido chamado, de
forma um tanto grosseira, mas com alguma justificativa, de um livro de receitas
nacionalista ucraniano. Uma série de “artigos testemunhais” carregam títulos
como: We Ate Father [“Comemos o Pai”]; He Cooked His Dead Mother’s
Hand [“Ele Cozinhou a Mão da Sua Mãe Morta”]; He Ate His Wife [“Ele
Comeu Sua Esposa”]; The Children Are There - In the Pot [“As Crianças
Estão Ali - Na Panela”]; First They Ate Their Own Family [“Primeiro Eles
Comeram a Própria Família”]; A Mother Eats Her Child [“A Mãe Come Seu
Filho”]; She Turned Her Father Into Jellied Meat [“Ela Transformou Seu Pai
em Carne Moída”]; e com um toque gourmet, Pasties of Human Flesh [“Pas-
téis de Carne Humana”]. [28]
Embora a leitura de relíquias do passado da Guerra Fria possa às vezes for-
necer uma fonte um tanto perversa de entretenimento, o livro foi usado como
“evidência” por vários comitês e autores de direita, além de influenciar a opi-
nião e as políticas públicas. Embora se duvide que o Black Deeds tenha ven-
dido bem (se é que vendeu algo) para o público em geral, ele foi fornecido
gratuitamente para universidades e bibliotecas públicas - este autor encontrou
esses “presentes” identificados com adesivos escritos “com comprimentos do
Comitê Ucraniano Canadense”. Talvez se espere que os incautos sejam aco-
lhidos.
CAPÍTULO 5:

O JOGO DOS NÚMEROS


As evidências apresentadas para se estabelecer um caso de genocídio deli-
berado contra os ucranianos durante 1932-1933 permanecem altamente par-
ciais, muitas vezes mentirosas, contraditórias e, consequentemente, muito du-
vidosa. Os materiais comumente utilizados podem quase que invariavelmente
ser rastreados para fontes de direita, “especialistas”, jornalistas ou publicações
anticomunistas, assim como as organizações políticas nacionalistas ucranianas
altamente parciais. Um papel importante nessa tese de genocídio é assumido
pelo número de mortos pela fome - obviamente é difícil alegar genocídio a
menos que as mortes estejam na casa dos milhões. Aqui, a metodologia dos
teóricos da fome-genocídio pode ser descrita, na melhor das hipóteses, como
eclética, não científica; e os resultados, como palpites politicamente manipu-
lados.
Um “estudo de referência” no jogo dos números é o artigo “The Soviet Fa-
mine of 1932-1934” [“A Fome Soviética de 1932-1934”], de Dana Dalrymple,
publicado na Soviet Studies, de janeiro de 1964. De acordo com o historiador
Daniel Stone, a metodologia de Dalrymple consiste na média de “pitacos de
20 jornalistas ocidentais que visitaram a União Soviética na época, ou falaram
com emigrantes soviéticos até duas décadas depois. Ele faz a média de 20 con-
tagens que variam de um mínimo de 1 milhão de mortes (New York Herald
Tribune, 1933) a um máximo de 10 milhões de mortes (New York World Tele-
gram, 1933).” [1] Reproduzo aqui a lista dos 20 de Dalrymple e as referências
que a acompanham. [2]
Como o professor Stone da Universidade de Winnipeg sugere, o método
de Dalrymple não tem nenhuma validade científica; seu “método” substitui
a arte de recortar jornal pela ciência da coleta objetiva de evidências. Isso fica
evidente quando se descobre o uso totalmente inaceitável de material fraudu-
lento construído na tentativa de desenvolver números sensacionalistas para a
fome.
Na lista se encontra, por exemplo, Thomas Walker. Sobre esse vigarista
literário que nunca esteve na Ucrânia para começar, Dalrymple declara: “[...]
Thomas Walker fez uma pesquisa comparativa alguns meses depois - no final
da primavera de 1934 - ao fugir de uma visita guiada. Anteriormente, Walker
136 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

[...] passou alguns anos visitando a URSS e provavelmente falava russo.” [3]
Tão inaceitável quando usar Walker como fonte, é a compulsão de Dalrym-
ple para inserir suposições sem fundamento de que esse homem “provavel-
mente falava russo”, sem mencionar a utilização dessas fabricações como evi-
dências para estender a fome até 1934. Para explorar melhor a pirueta de Wal-
ker, Dalrymple declara que “Walker incluiu uma extensa e arrepiante variedade
de fotos”. [4]

A LISTA DOS VINTE DE DALRYMPLE

________________________________________________-
___

ESTIMATIVAS DE MORTE NA FOME RUSSA, 1933

Estimativa feita ou citada por Número estimado de mortos


1. Ralph Barnes 1.000.000+
2. Walter Duranty 2.000.000+
3. Maurice Hindus 3.000.000+
4. William Chamberlin 4.000.000
5. Stephen Duggan 4.000.000
6. Frederick Birchall 4.000.000+
7. Bernard Pares 5.000.000
8. Eugene Lyons 5.000.000±
9. Arcebispo de Cantuária 5.000.000±
10. Clarence Manning 5.000.000±
11. Whiting Williams 5.000.000+
12. Naum Jasny 5.500.000+
13. Harry Lang 6.000.000
14. Thomas Walker 6.000.000
15. Nicholas Prychodko 7.000.000+
16. William Chamberlin 7.500.000±
17. Ewald Ammende 7.500.000±
18. Otto Schiller 7.500.000±
19. Serge Prokopovicz 9.000.000
20. Richard Sallet 10.000.000
Média 5.500.000+

1. Ralph W. Barnes, Million Feared Dead of Hunger in South Russia, New York Herald
Tribune, 21 de Agosto de 1933, p. 7.
2. Walter Duranty, Famine Toll Heavy in Southern Russia, New York Times, 24 de Agos-
to de 1933, p. 1 (computado de números dados por Duranty).
CAPÍTULO 5: O JOGO DOS NÚMEROS| 137

3. Citado por Eugene Lyons em Assignment in Utopia, Harcourt Brace, Nova Iorque,
1937, p. 579.
4. W. H. Chamberlin, Soviet Taboos, Foreign Affairs, Abril de 1935, p. 435.
5. Stephen P. Duggan, Russia After Eight Years, Harper’s Magazine, Novembro de 1934,
p. 696.
6. Frederick Birchall, Famine in Russia Held Equal of 1921, New York Times, 25 de
Agosto de 1933, p. 7.
7. Bernard Pares, Russia, New American Library, Nova Iorque, 1953, p. 7.
8. Lyons, loc. cit. (estimativas feitas por estrangeiros e russos em Moscou).
9. Starvation in Russia (pauta da Câmara dos Lordes de 25 de julho), The Times (Lon-
dres), 26 de julho de 1934, p. 7.
10. Clarence Manning, Ukraine Under the Soviets, Bookman Associates, Nova Iorque,
1953, p. 101.
11. Whiting Williams, The Worker’s View of Europe, Nation’s Business, dezembro de
1933, p. 20.
12. Naum Jasny, The Socialist Agriculture of the USSR, Stanford University Press, Stan-
ford, 1949, p. 553.
13. Harry Lang, Socialist Bares Soviet Horrors, New York Evening Journal, 15 de Abril de
1935, p. 2.
14. Thomas Walker, 6,000,000 Starve to Death in Russia, New York Evening Journal, 18
de Fevereiro de 1935, p. 1.
15. Nicholas Prychodko, Ukraine and Russia, Ukrainian Canadian Committee, Winni-
peg, 1953, p. 15.
16. Chamberlain, op. cit., p. 432 (estimativas de expatriados da Ucrânia).
17. Wide Starvation in Russia Feared, New York Times, 1 de julho de 1934, p. 13.
18. Otto Schiller, Die Landwirtschaftspolitik der Sowjets und Ihre Ergebnisse, Berlin, 1943,
p. 79.
19. Serge N. Prokopovicz, Histoire Economique de L’URSS, Portulan, Paris, p. 66.
20. Says Ten Million Starved in Russia, New York World Telegram, 7 de julho de 1933,
p. 3.

Dana G. Dalrymple, The Soviet Famine of 1932-1934, Soviet Studies, Ja-


neiro de 1964, Oxford, Basil Blackwell, pp. 259-260.
Junto com as invenções e com os chutes de Thomas Walkers e Langs, estão
números politicamente motivados de emigrantes ucranianos de direita como o
nacionalista Nicholas Prychodko, um colaborador que trabalhou para o “Mi-
nistério da Cultura e Educação” reconhecido pelos nazistas em Kiev durante a
138 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

guerra. Também está incluída a estimativa de mortes de Otto Schiller, um im-


portante funcionário nazista designado para reorganizar os recursos agrícolas
para atender às necessidades do Reich e da máquina de guerra de Hitler. [5]
Observa-se que, para os números de Schiller, Dalrymple cita um livro solici-
tado aos nazistas publicado em Berlim.
Saindo de funcionários ocasionais dos nazistas e colaboradores de guerra,
também se encontra o palpite do Arcebispo Cantuária. A citação de Dalrym-
ple da contribuição de orelhada do Arcebispo parece refletir uma necessidade
estatística de soltar um nome clerical. Na falta de infalibilidade do Bispo de
Roma, a alegação do Arcebispo ainda merece ser examinada. Como fonte,
Dalrymple cita um recorte da imprensa de um debate na Câmara dos Lordes
britânica. O pesquisador canadense Marco Carynnyk lança luz sobre o con-
texto:
Em julho de 1934, o Lorde Charnwood, “baseando-se nas informações
fornecidas por Malcolm Muggeridge e Ewald Ammende [...] notificou que
ele estaria levantando uma pergunta sobre a fome na Câmara dos Lordes”. O
Ministério das Relações Exteriores respondeu: “[...], mas não há nenhuma
informação para sustentar a aparente sugestão do Lorde Charnwood de que
o governo soviético tenha seguido uma política de empobrecimento delibe-
rado de distritos agrícolas do país, se sua política tem ou não esse efeito.” No
debate subsequente da Câmara em 25 de julho de 1934, o Arcebispo de Can-
tuária [sem dúvidas influenciado pela “informação” de Ammende] defendeu
o Lorde Charnwood reivindicando uma cifra que ouviu de 5.000.000 mor-
tes. Os membros do governo encerraram a discussão, parcialmente “argumen-
tando que aqueles que queriam falar sobre a fome na Ucrânia não estavam tão
animados para analisar a opressão na Alemanha ou a pobreza na Inglaterra”.
[6]
Talvez os membros do governo tinham em mente a observação do Arce-
bispo numa reunião do Sínodo da Cantuária no mês anterior, na qual decla-
rou: “Eu tenho a maior simpatia com o imenso, incontestável e, no todo, be-
néfico despertar que chegou à vida alemã em todos os aspectos da memorável
revolução associada ao nome do Herr Hitler.” [7] Alguns dias depois do de-
bate na Câmara dos Lordes, o London Daily Express começou a publicação
das séries do turista anônimo (Walker) - o ponto de partida foi uma campanha
extensiva sobre a fome na imprensa britânica.
Outro personagem em destaque na lista de Dalrymple é William H. Cham-
berlin. Um escritor antissoviético de longa data, a carreira de Chamberlin aca-
bou o levando ao Conselho Administrativo do Comitê Americano para a Li-
bertação do Bolchevismo (AMCOMLIB), também conhecido como Radio
CAPÍTULO 5: O JOGO DOS NÚMEROS| 139

Liberty. Os fundos para o AMCOMLIB foram levantados pelos esforços da


Crusade for Freedom [“Cruzada pela Liberdade”], que por sua vez recebeu
“mais de 90% da sua receita [...] de contas não aprovadas da CIA [...]” [8].
Já que o primeiro chute de Chamberlin é um modesto - para os padrões dos
fominólogos - 4.000.000, Dalrymple o cita duas vezes. A segunda “estimativa
de residentes estrangeiros na Ucrânia” de Chamberlin de 7.500.000 é somada,
claro, ao total a ser calculada a média.
Também encontramos os pitacos de Eugene Lyons, cuja fama no jorna-
lismo o levou ao cargo de Editor Sênior da Reader’s Digest. Esse fato é menci-
onado por Dalrymple provavelmente para estabelecer as credenciais literárias
de Lyons nas mentes de uma geração menos crítica de leitores. De acordo com
Dalrymple, o palpite de Lyons é baseado em rumores de “estimativas feitas por
estrangeiros e russos em Moscou”. A propósito, Lyons, como Chamberlin,
também foi membro do Conselho Administrativo do AMCOMLIB. [9]
Sem surpresa, Dalrymple também lista os números de mortos de Ewald
Ammende, embora Ammende não tenha ido à União Soviética desde o pe-
ríodo de 1921-1922. Dalrymple nota a liderança de Ammende no Comitê de
Ajuda estabelecido no verão de 1934, assim como o levantamento de vários
fundos de ajuda “simultaneamente”. [10]
Há poucas dúvidas de que tais “comitês de ajuda” eram frentes politica-
mente motivadas, arranjadas com propósitos propagandísticos. Um desses
fundos (citados por Dalrymple) foi o Fundo Ucraniano de Ajuda H.H. Eli-
zabeth Skoropadsky, nomeado depois da filha de Hetman Skoropadsky. Sko-
ropadsky, lembremos, chefiou um governo nacionalista ucraniano fantoche
estabelecido pelas autoridades da ocupação alemã na Ucrânia em 1918. Seu
breve governo acabou quando os alemães se retiraram mais tarde naquele ano.
Skoropadsky fugiu para o exílio na Alemanha onde recebia uma bela pensão
pelos governos de Weimar e depois nazista. Os hetmanitas mantiveram gru-
pos mundo afora, incluindo Canadá, onde eles compõem uma seita dentro
do movimento fascista ucraniano. Sporopadsky foi morto em 1945 durante
um ataque aéreo americano, quando tentava fugir de Berlim de trem. O pró-
prio envolvimento dos grupos hetmanitas indica uma razão de ser política para
os “fundos de ajuda”.
Além disso, foi reconhecido até por historiadores de direita que qualquer
fome que tenha existido já havia terminado quando esses comitês e fundos
foram estabelecidos. [11] Esse aspecto da farsa não passou despercebido pela
mídia do dia. Já em agosto de 1933, o New Republic declarou:

[...] a presente colheita é sem dúvidas a melhor em muitos anos - alguns


140 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

camponeses relatam um rendimento mais alto de grãos do que qualquer


um de seus antepassados conhecia desde 1834. As entregas de grãos ao go-
verno estão ocorrendo a uma taxa muito satisfatória e o preço do pão caiu
drasticamente nas cidades industriais da Ucrânia. Em vista desses fatos,
o apelo do Cardeal Arcebispo [Innitzer] de Viena por assistência às víti-
mas da fome russa parece ser uma manobra política contra os soviéticos.
[12]
E, ao contrário de estórias selvagens contadas por nacionalistas ucrania-
nos exilados sobre “russos” comendo fartamente enquanto condenavam deli-
beradamente à morte de fome “milhões” de ucranianos, o New Republic nota
que, enquanto o preço do pão caía na Ucrânia, “o preço do pão em Moscou
subiu”. [13] À luz das alegações de que 25 a 50% dos ucranianos morreram,
só imaginamos como que uma colheita tão abundante pode ter sido plantada
ou mesmo colhida.
Por todas as fontes confiáveis, as safras de 1933 e 1934 foram bem suce-
didas. Como uma alusão a esse fato, pouquíssimos vendedores da fome-ge-
nocídio hoje sustentam as alegações de uma fome em 1934. Contudo, tanto
Ammende, quanto Dalrymple, seguindo-o, parecem estar determinados a ma-
tar a Ucrânia de fome também em 1934. Na verdade, a fonte de Ammende
na lista dos vinte de Dalrymple é uma carta de Ammende para o New York
Times publicada em 1 de julho de 1934 sob o título “Temores de uma Vasta
Fome na Rússia”. Numa carta de continuação no mês seguinte, Ammende
escreveu que as pessoas estavam morrendo nas ruas de Kiev. Em questão de
dias, o correspondente do New York Times Harold Denny mandou uma re-
futação às alegações de Ammende. Datada de 23 de agosto de 1934, Denny
acusou: “Essa declaração certamente não tem fundamento nenhum [...] Seu
correspondente esteve em Kiev por alguns dias no último julho por volta da
época em que as pessoas supostamente estariam morrendo lá, e nem na cidade,
nem na área rural circundante havia fome.” Algumas semanas depois, Denny
relatou: “Em canto nenhum foi encontrada fome. Em canto nenhum nem
mesmo medo dela. Há comida, inclusive pão, nos mercados locais abertos. Os
camponeses também estavam sorrindo, e generosos com seus alimentos. Em
suma, não há nenhum sopro de problema ou problemas iminentes.” [14]
Obviamente, ninguém informou os camponeses que eles deveriam supos-
tamente caídos apáticos de fome naquele ano. Mas talvez alguém com as téc-
nicas típicas dos fominólogos dos últimos dias sugira a presença de um guarda
armado agachado atrás da banca de repolho, ordenando que todos sorrissem.
A lista de Dalrymple também inclui Frederick Birchall. Durante seu man-
dato como chefe do Escritório de Berlim do New York Times, Birchall foi um
CAPÍTULO 5: O JOGO DOS NÚMEROS| 141

dos primeiros jornalistas dos EUA a pular no barco pró-Hitler e tentar pôr
um “rosto humano” no nazismo. O autor americano Michael Parenti cita
uma entrevista com Birchall na rádio nacional da CBS pela sua alegação de
que os nazistas não estavam planejando “nenhum massacre dos seus inimigos
ou opressão racial em nenhum nível vital”. Parenti diz:
Enquanto os soviéticos eram retratados como sempre à beira de lançar ata-
ques agressivos contra todos e qualquer um, Birchall tranquilizou os ou-
vintes de que os nazistas não tinham vontade de ir à guerra e Hitler não
podia ser chamado de ditador. Com aquele típico olhar aguçado para o
irrelevante do jornalismo americano, ele observou que Hitler era vegeta-
riano e não fumante, atributos [...] supostamente indicativos de uma na-
tureza benigna. E observou que Hitler havia assumido “o trabalho mais
difícil que um homem poderia empreender”. [16]
O maior pontuador entre os 20 caçadores de fome-genocídio de Dalrym-
ple é Richard Sallet, cujo material foi no jornal de Scripp-Howard, o New York
World Telegram. O tipo de jornalismo desse jornal tinha a fama de chegar
perto da de Hearst. Aparentemente o pessoal de Scripp-Howard não sentia
necessidade de ser conservador quando se tratava de histórias que agrediam os
“russkies” - o lance de Sallet lidera com 10.000.000 mortes.
Antes de sair da lista de Dalrymple, que seja observado que um número
significativo de suas fontes se mostraram fraudes completas, rumores basea-
dos em “residentes estrangeiros” (um termo jornalístico interessante) ou me-
ros boatos, ex-nazistas e colaboradores ucranianos, enquanto ao menos três
das estimativas são citadas da campanha antissoviética do estilo de imprensa
do neofascista Hearst e Scripps-Howard e outras cinco de livros publicados
nos anos de Guerra Fria de 1949-1953, exceto um que foi impresso na Alema-
nha nazista.
Ao estabelecer um contexto para seu caso, Dalrymple não só se apoia pesa-
damente em recortes da imprensa, mas também faz referência a figuras histó-
ricas questionáveis. Entre as suas celebridades (não incluídas na lista dos 20),
encontramos o infame Cardeal Innitzer, trazido para reforçar as alegações de
canibalismo durante a fome. [16] Dentro de poucos anos de trabalho do seu
“comitê de ajuda”, Innitzer teve um papel central na traição da Áustria em fa-
vor dos nazistas. O historiador britânico Joseph McCabe, citando o Annual
Register, declara:
Hitler assegurou ao Cardeal que respeitaria escrupulosamente os direitos
da Igreja; ele assegurou ao Vaticano que em troca da ajuda na Áustria
ele adoçaria suas relações azedas com a Alemanha. Innitzer ordenou aos
142 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

católicos que votassem no homem “cuja luta contra o bolchevismo e pelo po-
der, honra e unidade da Alemanha corresponde à voz da Divina Provi-
dência”, como ele disse [...] Depois da sua própria assinatura no plebiscito,
ele acrescentou “Heil Hitler”. [17]

É uma questão de alguma significância que as alegações do Cardeal Innit-


zer de fome-genocídio tenham sido amplamente promovidas durante os anos
1930, não só pelo chefe da propaganda de Hitler, Goebbels, mas também por
fascistas americanos. Será lembrado que Hearst deu o pontapé inicial de sua
campanha da fome com uma transmissão de rádio baseada principalmente
no material do “comitê de ajuda” do Cardeal Innitzer. Em Organized Anti-
Semitism in America [“O Antissemitismo Organizado na América”], um livro
de 1941 expondo grupos e atividades nazistas nos EUA do pré-guerra, Donald
Strong nota que o padre e líder fascista Coughlin usou material de propaganda
nazista extensivamente. Isso incluía charges nazistas de “atrocidades de comu-
nistas judeus” e porções literais de um discurso de Goebbels se referindo ao
“apelo [de Innitzer] de julho de 1934, de que milhões de pessoas estavam mor-
rendo de fome por toda a parte na União Soviética”. [18]
Nas mãos de Dalrymple e outros, os mortos parecem se multiplicar a uma
taxa fenomenal. Boatos, rumores, fofocas, testemunhos políticos, confissões
de desertores, jornalismo amarelo, nazistas e ucranianos direitistas, todos se
interconectam num abraço incestuoso por todas as campanhas da fome-geno-
cídio.
Mas e as versões da fome daqueles que não concordavam com as conclu-
sões das distorções-genocídio? Se incluídas, as médias de Dalrymple não pode-
riam ser reduzidas a um nível de realidade demográfica? Porém isso é quanti-
tativamente inaceitável para os propósitos políticos dos direitistas ucranianos,
acadêmicos da Guerra Fria e agências ocidentais de propaganda. “Testemu-
nhas hostis” devem ser descartadas.
Já que os relatos da maioria das testemunhas não sustentam suas teses,
Dalrymple deve ou desacreditá-los, imputar motivos, ou melhor ainda, nem
mesmo mencioná-los. [19] Assim, embora Dalrymple admita “que houve al-
guns questionamentos quanto à existência e magnitude da fome”, ele se apressa
para desacreditar aqueles cujos relatos teimam em divergir, declarando: “aque-
les que não ‘viram’ a fome devem ser divididos em dois grupos: (1) aqueles que
por alguma razão realmente não a viu; (2) aqueles que viram a fome, mas não
a reportaram”. [20]
Tendo demonstrado que ele sabe contar até dois, Dalrymple lança as bases
para a classificação de testemunhas hostis entre os “enganados” e os “mentiro-
CAPÍTULO 5: O JOGO DOS NÚMEROS| 143

sos”. Dalrymple passa então a atribuir motivos políticos e oportunistas a esse


punhado deliberadamente reduzido:
O primeiro grupo (1) consiste de socialistas que estavam cegos a essa falha
específica no programa soviético e/ou dignatários visitantes que receberam
uma excursão semelhante à de Potemkin na Rússia, que escondeu a expo-
sição à fome. Os socialistas Beatrice e Sidney Webb, por exemplo, viram
uma escassez de comida, mas nenhuma fome em si. [21]

Dalrymple insinua que aos Webb283 , “como a M. Herriot, o ex Primeiro


Ministro da França, e Sir John Maynard, só foi mostrado o que os russos que-
riam que eles vissem”. [22] Sir John Maynard, um ex alto funcionário no go-
verno indiano era um especialista renomado em fomes e medidas de socorro.
Baseado nas suas experiências na Ucrânia, ele declarou que a ideia de três ou
quatro milhões de mortos “virou lenda. Qualquer sugestão de uma calami-
dade comparável à fome de 1921-1922 é, na opinião do presente escritor, que
viajou à Ucrânia e ao Norte do Cáucaso em junho e julho de 1933, infundada.”
[23] Mesmo um estudioso conservador como Warren Walsh escreveu em de-
fesa de Maynard, sua “competência profissional e integridade pessoal estavam
para além de qualquer desafio razoável.” [24]
A integridade de Herriot e Maynard está muito acima da de qualquer um
que Dalrymple tenha selecionado para defender sua causa. Mas sem dúvida,
os fominólogos podem produzir um nacionalista ucraniano que vai “testemu-
nhar” que um dia antes de tais visitas, um funcionário passou pelas vilas cho-
rando, “todos as putas e pedintes saiam das ruas - os Webb estão vindo!”.
Tendo categorizado os Webb, Herriot e Maynard como “enganados”, Dal-
rymple alega que Walter Duranty e “outros jornalistas” (os quais escolheu não
nomear), “conheciam a fome, mas evitaram se referir a ela explicitamente por
causa de pressões do governo”. [25] Dalrymple não oferece nenhuma prova
para essa alegação, mas sem dúvida, fiel à sua forma, alguns boatos ou fofocas
não registradas podem ser escavados.
A alegação de testemunhas mentirosas é um tema frequente em fomino-
logia. O jornal nacionalista ucraniano EKPAH-EKPAH de Chicago, na sua
edição especial da fome de 1983, lista, por exemplo: “[...] Walter Durante do
New York Times, Louise Fisher (sic), Eugene Lyons, William Rezwick, Morris
Hindus (sic) e outros. Pelo bem do lucro, eles enganaram o público americano
283
Beatriz e Sidney Webb foram um casal de sociólogos e economistas socialistas britânicos que
se radicaram na União Soviética e contribuíram com a urdidura de diversas obras sobre a so-
ciedade e economia soviética, dentre as quais merecem destaque Soviet Communism: A new
civilization e The Truth about Soviet Russia, respectivamente de 1935 e 1942. [N.T]
144 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

e se renderam para Moscou, enquanto milhões de ucranianos (sic) estavam


morrendo [...].” [26]
É chocante descobrir o conhecido anticomunista Eugene Lyons na lista
nacionalista de soviéticos enganados. Talvez seja a maneira do EKPAH-EKPAH
mostrar desprazer com seu palpite de 5 milhões de mortos, quando a taxa co-
mum é de 7 a 15 milhões. Talvez não surpreenda que, ao imprimir fotografias
de Thomas Walker, essa publicação acuse que jornalistas que discordam de seu
ponto de vista estejam mentindo para obter ganhos financeiros - sem oferecer
a menor prova.
Não contentes em alegar motivos financeiros na denúncia de testemunhas
“hostis”, algumas organizações e publicações nacionalistas ucranianas recor-
rem ao antissemitismo aberto. Um livro publicado por veteranos do Exército
Insurgente Ucraniano chega a declarar:
Em 1933 a maioria da imprensa europeia e americana, controlada pelos
judeus, silenciavam sobre a fome [...] A conspiração do silêncio praticado
pela Rússia e seus simpatizantes judeus escondem muito mais. Em 1932
o jornalista judeu Duranty foi mandado dos EUA para checar o rumor
de que havia uma fome colossal na Ucrânia. Duranty, depois agraciado
com o maior prêmio do jornalismo, falsamente e deliberadamente negou
o “rumor” [...] [27]
Tais interpretações oferecidas por uma ala proeminente do movimento na-
cionalista ucraniano indicam uma visão da história muito próxima da dos na-
zistas.
O artigo de Dana Dalrymple de 1964 foi complementado no ano seguinte
por um artigo intitulado “A fome soviética de 1932-1934: mais algumas re-
ferências”. [28] Buscando expandir seu pitaco anterior de mortes, Dalrymple
introduz um relato do Dr. Horsley Gantt, que reivindica um número de mor-
tos em 15 milhões. [29] Essa alegação, se verdadeira, teria eliminado 60% da
população étnica ucraniana da república ucraniana de aproximadamente 25
milhões em 1932.
Uma leitura cuidadosa da atualização de Dalrymple mostra, contudo, esse
número como baseado no que pode ser chamado somente de boato suspeito,
senão rumor fabricado. Quase previsivelmente, Dalrymple revela que a fonte
do número de Gantt são supostas conversas: “o Dr. Gantt indica que ele con-
seguiu anonimamente o número máximo de 15 milhões de autoridades so-
viéticas”. [30] A bem da verdade, as supostas autoridades soviéticas não são
identificadas.
Dalrymple nos informa de maneira reveladora que, “embora seu artigo
CAPÍTULO 5: O JOGO DOS NÚMEROS| 145

não tenha sido publicado até 1936, o Dr. Gantt indica que forneceu boa
parte da informação acerca da fome usada por correspondentes americanos
durante esse período [...]”. [31] Curiosamente, Ralph Barnes, mencionado
por Dalrymple como exemplo de repórter que recebeu informações do Dr.
Gantt, parece ter depositado pouca fé nos números de mortos de Gantt. De
acordo com a lista de Dalrymple, o palpite do próprio Barnes era quinze vezes
menor do que o defendido por Gantt. [32] Não obstante tais contradições, as
alegações inverificáveis de Gantt, apesar dos seus números demograficamente
implausíveis, contribuíram para os pitacos estimados de mortes que circula-
ram pelos subsequentes polemistas de direita.
A segunda sessão de “Outras Referências” de Dalrymple apresenta “Ob-
servadores Contemporâneos” trazidos à luz em “[um] estudo de registros antes
não abertos do Departamento de Estado dos EUA”. [33] Isso se refere a um
memorando de uma conversa realizada entre Felix Cole (encarregado de ne-
gócios, Riga) e um certo John Lehrs, com um membro de uma missão diplo-
mática estrangeira em Moscou. Novamente, Dalrymple não vai ou não pode
identificar o funcionário da missão estrangeira - que poderia muito bem ser da
Alemanha Nazista por tudo que o leitor sabe. Tal rumor infundado baseado
em fofoca diplomática mal constitui uma evidência aceitável. Mas Dalrymple
tem a audácia de creditar de sete a oito milhões de pessoas “morrendo de fome”
a esses rumores. [34]
“Informes de Emigrantes” é a terceira categoria encontrada nas “Outras
Referências”. Em aparente desespero, Dalrymple se volta para as contagens
do desacreditado Black Deeds of the Kremlin. Então, depois de citar uma
“autobiografia” de um nacionalista publicada pela imprensa anticomunista de
russos emigrados, Dalrymple traz ao leitor trabalhos de ficção: “Wasyl Barka
apresenta uma versão mais extensa na sua novela Zhovty Kniaz (“O Príncipe
Amarelo”). O livro descreve a luta de uma família de uma fazenda coletiva pela
existência durante a fome e reflete a maioria das ocorrências típicas daquele pe-
ríodo.” [35]
Tendo levado a sua busca de fatos sobre a fome até o campo da ficção po-
lítica, Dalrymple observa que o novelista em questão está empregado no Co-
mitê da Radio Liberty em Nova Iorque, uma agência de propaganda e desin-
formação financiada pela CIA.
Ao terminar os “Informes de Emigrantes”, Dalrymple pega emprestada
uma contagem de mortos de cinco a sete milhões do Ukraine: A Concise Ency-
clopaedia [“Ucrânia: uma enciclopédia concisa”], uma apologia nacionalista
oficial, cujo chefe editor era o chefe dos colaboradores nazistas do “Comitê
Central Ucraniano” nos tempos da guerra, Volodymyr Kubijovyc. [36]
146 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

As “Outras Referências” de Dalrymple descuida completamente da sua


seção final, “Kruschev sobre a fome”. Aqui Dalrymple revela a falência de sua
empreitada sem a menor pretensão de qualquer tipo de validade:
Pouco depois do meu artigo ser publicado, Kruschev viu que caberia co-
mentar sobre as condições de fome durante o período de Stalin. Em de-
zembro de 1963, ele reconheceu - pela primeira vez - que a fome existia sob
Stalin e Molotov. Seus comentários, contudo, se limitaram a 1947. [37]

Embora os “comentários” se referissem às condições depois da carnificina e


destruição da Segunda Guerra Mundial, isso não impediu Dalrymple de pon-
tuar que as descrições de Kruschev das dificuldades de 1947 “pareciam igual-
mente aplicáveis à fome de 1932-1934”. [38] Tais métodos de pesquisa, talvez
adequado para montar uma colagem de recados, são inadequados para qual-
quer finalidade séria. Porém, apesar da fraqueza e das falhas metodológicas do
“estudo” de Dalrymple, seu trabalho tem sido aceito acriticamente por aqueles
determinados a “provar” um caso de fome deliberada. [39]
CAPÍTULO 5: O JOGO DOS NÚMEROS| 147

Anúncios de página inteira, com fotografias falsas e espúrias, foram característicos da campanha
de fome-genocídio em 1983. Acima: anúncio da Winnipeg Free Press, 1 de outubro de 1983,
colocado pelo Comitê Ucraniano Canadense. Fotos usadas no anúncio (de cima para baixo):
cadáveres congelados - uma cena de “verão” do Human Life in Russia e a publicação nazista
Und Du Siehst die Sowjets Richtig; homens usando boinas do exército czarista, publicado pelo
órgão do partido Voelkischer Beobachter (18 de agosto de 1933); crianças na fome russa de 1921-
1922, publicada em La Famine en Russia (Genebra, 1922, p. 7); a criança faminta num banco,
do Information Nº 22 (Genebra, 1922, p. 19); Embaixo à esquerda: foto de propaganda nazista
do Voelkischer Beobachter; embaixo à direita: uma vítima da fome de 1922, do Information Nº
22 (p. 16).
CAPÍTULO 6:
GUERRA FRIA II: A
CAMPANHA DOS ANOS 1980
Não foi por acidente que campanhas de massa foram financiadas por toda
a América do Norte em 1983 para homenagear o “50º aniversário da fome-ge-
nocídio na Ucrânia”. O principal objetivo da ressurreição de um assunto tão
dúbio era elevar os sentimentos anticomunistas e facilitar as metas da Guerra
Fria de Reagan. Diferente de “aniversários” anteriores, que se limitaram à pe-
riferia dos círculos de ucranianos exilados de direita, a última homenagem foi
destacada pela publicidade na mídia de massas, outdoors, comícios públicos
e tentativas contínuas de incluir a “fome-genocídio” ucraniano no currículo
escolar. Em Edmonton e Winnipeg, foram erguidos monumentos às “víti-
mas do genocídio”. O “obelisco da fome” de Winnipeg foi um “presente” do
Comitê Ucraniano Canadense à cidade, com um custo registrado de $75.000.
Como Winnipeg é há um bom tempo cidade-irmã de Lvov, na Ucrânia - muito
por causa do aborrecimento dos nacionalistas ucranianos - esse monumento
só pode ser visto como uma provocação política contra relações pacíficas. É re-
velador que nem mesmo uma pequena placa jamais foi colocada para honrar
as milhões de vítimas do holocausto nazista. O fato de esse evento ter ocorrido
nos anos 1980 representa uma infeliz homenagem ao novo clima de Guerra
Fria e ao poder de lobby dos ucranianos de direita.
A cobertura “acadêmica” da campanha da fome-genocídio alcançou seu
auge sem precedentes nos anos 1980. O “crédito” por isso é obtido pela Uni-
versidade de Harvard, como declarado numa publicação recente patenteada
pelo Presidente e Colegas do Harvard College: “[...] a Fome ocupou um lugar
apenas marginal nos escritos históricos produzidos pela geração pós-guerra de
Sovietólogos Ocidentais [...] O Projeto Fome estabelecido pelo Instituto de
Pesquisas Ucranianas da Universidade de Harvard em 1981 tem sido o mais
decisivo na organização de trabalhos acadêmicos sobre a Fome. Membros do
Projeto incluem Robert Conquest, bolsista pesquisador sênior no Instituto
Hoover da Universidade de Stanford [...] [e] James E. Mace, pesquisador ad-
junto no Instituto de Pesquisas Ucranianas e diretor do Projeto [...].” [1]
A Universidade de Harvard tem sido há tempos um centro de pesquisas,
estudos e programas anticomunistas, frequentemente em colaboração com
150 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

agências militares e de inteligência dos EUA. [2] Foi um professor de histó-


ria de Harvard, William Langer, que encabeçou o Departamento de Pesquisa e
Análise do Escritório de Serviços Estratégicos em tempos de guerra. O escritor
americano C. Ford descreveu o Departamento de Pesquisa e Análise (P&A)
como: “[...] a maior coleção de educadores e pesquisadores eminentes jamais
reunida numa única agência do governo. O P&A pegou os melhores dos de-
partamentos de ciências sociais de todas as universidades [...]” [3] Ford cita o
ex estadista americano McGeorge Bundy, que escreveu no The Dimensions of
Diplomacy:
Em larga medida os programas de estudo na área desenvolvidos nas uni-
versidades americanas nos anos seguintes à guerra foram administrados,
dirigidos, ou estimulados por graduados do OSS - uma instituição notá-
vel, meio polícia-e-ladrão e meio reunião do corpo docente. Ainda é ver-
dade hoje, e eu espero que sempre seja, que há em grande medida uma
interpenetração entre universidades com programas na área e agências
de coleta de informações do governo dos Estados Unidos. [4]
Publicado em 1983 pelo Fundo de Estudos Ucranianos da Universidade
de Harvard para “comemorar o 50º aniversário da fome”, o livro The Ninth
Circle [“O Nono Círculo”] de Olexa Woropay é mais um volume na crescente
biblioteca da fome-genocídio. [5] Publicado primeiramente na Inglaterra em
1953 pela juventude da facção de Bandera da Organização de Ucranianos Na-
cionalistas, a “edição comemorativa” foi editada e introduzida pelo Dr. James
E. Mace da Universidade de Harvard. Apesar dessa assistência, o The Ninth
Circle parece ser inadequadamente documentado. O Professor John Ryan,
referindo-se a um informe dos nacionalistas ucranianos ao Conselho Escolar
de Winnipeg, que usou o The Ninth Circle como evidência, acusou:
O informe deles é uma polêmica, desprovida de qualquer documentação,
e o livro The Ninth Circle de Olexa Woropay está na mesma categoria e
carece da essência de qualquer trabalho acadêmico. Por exemplo, a série
de relatos de experiências pessoais (pp. 17-36) carece de identificação de
qualquer pessoa que supostamente contou essas histórias. Mais que meras
deficiências acadêmicas, há um tom perturbador em todo o livro. Woro-
pay apresenta um relato detalhado das suas atividades na Ucrânia du-
rante os anos 1930, mas ele evita minuciosamente qualquer menção sobre
o que ele fez durante a ocupação nazista da Ucrânia. Deixando essa la-
cuna em sua carreira como um ponto de interrogação, ele retoma a sua
crônica em 1948, mas agora está em Münster, na Alemanha [Ociden-
tal]. Aqui ele entrevista ucranianos que, como ele, deixaram a Ucrânia.
CAPÍTULO 6: GUERRA FRIA II: A CAMPANHA DOS ANOS 1980| 151

Será que ele e seus colegas, da maneira que milhares de outros haviam
feito, partiram com as tropas nazistas porque eles haviam colaborado com
os nazistas? No seu relato não há sequer uma palavra de crítica aos na-
zistas; ao contrário, não há nada além de ódio e condenação dos soviéticos.
Com isso em mente, como o leitor pode ver a objetividade do material que
está sendo apresentado? [6]
A conexão do The Ninth Circle com Harvard pode não se limitar a Mace
e ao Fundo de Estudos Ucranianos da universidade. Um programa de pes-
quisa de Harvard é particularmente relevante aqui. Logo depois da guerra,
o Escritório de Coordenação Política do Departamento de Estado dos EUA
(futuro componente da CIA) escalou um time de historiadores de Harvard
para entrevistar europeus do leste nos campos de refugiados na Europa. O
principal objetivo do projeto de pesquisa era a coleta de informações para a
inteligência. Essas entrevistas forneceram muitos dos “relatos de testemunhas
oculares” para as alegações de fome-genocídio. [7]
Indaga-se, de fato, se as entrevistas de Woropay em Münster, na Alemanha
em 1948 foram parte do projeto de Harvard-CIA. O próprio Woropay indica
que sua “pesquisa” consistiu em pouco mais que reunir contos políticos do
calor do pós-guerra num campo de refugiados na Alemanha Ocidental:
No inverno, não tinha nada para fazer e as noites eram longas e maçan-
tes. Para passar o tempo, as pessoas contavam histórias sobre suas próprias
experiências. Havia muitos camponeses da Ucrânia ocidental e eles lem-
bravam da vida sob o governo soviético. [8]
Previsivelmente, Woropay não fornece nenhum contexto político ou de
guerra sobre suas “testemunhas” anônimas. Isso pode ter prejudicado ainda
mais a credibilidade do The Ninth Circle.
A pitoresca prova que Woropay oferece é igualmente suspeita. Somente
fotografias de Thomas Walker foram selecionadas, embora Woropay se reivin-
dique como uma testemunha ocular. Será que ele não percebeu a diferença
entre falsificações obviamente manipuladas tomadas uma década antes, in-
cluindo algumas da Rússia, e cenas de um suposto holocausto que ele afirma
ter testemunhado em sua própria terra?
O texto das histórias de Walker não é reproduzido com as fotos; talvez se
espere que a conexão Walker, como os supostos 7 a 15 milhões de ucranianos,
vai simplesmente desaparecer. Afinal de contas, Walker dizia ter feito suas via-
gens na primavera de 1934; Woropay e Mace não ousam tentar esticar a fome
por mais um ano, eles estão em terreno instável nesse caso. (Na verdade, deve-
se lembrar, Walker nunca pisou na Ucrânia, e entrou na Federação Russa no
152 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

outono de 1934.) Porém, sem dúvidas para o constrangimento de Woropay,


quem quer que tenha tirado o texto da história de Walker perdeu uma linha
abaixo da foto da página oposta 8. Nessa linha se lê: “Quando o Sr. Walker en-
trou na Rússia na última primavera [1934] ele entrou clandestinamente com
uma câmera.”
Se as acusações das testemunhas da “fome-genocídio” são tão fraudulen-
tas quanto as evidências fotográficas usadas para ilustrá-las, pode-se concluir
seguramente que o público de hoje está sendo enrolado tanto quanto os leito-
res das histórias de fome-genocídio de Hearst em 1935.
Essa conclusão se aplica igualmente ao Famine in the Soviet Ukraine 1932-
1933: A Memorial Exhibition preparado por Oksana Procyk, Leonid Heretz e
James Mace. Esse livro é o catálogo de uma importante exposição patrocinada
em 1983 pela Biblioteca da Faculdade de Harvard, o Instituto de Pesquisas
Ucranianas e o Fundo de Estudos Ucranianos da Universidade de Harvard.
A introdução do catálogo enfatiza indiretamente seu objetivo de obter uma
impressão emocional da fome, no lugar de uma análise de suas causas, uma
ênfase que caracteriza a maioria da campanha da fome-genocídio:
O segundo objetivo deste catálogo é transmitir os aspectos intangíveis da
Fome ao leitor. Apesar dos pesquisadores continuarem a debater as cau-
sas da Fome, o número de suas vítimas e sua extensão geográfica, não pode
haver dúvida da magnitude da tragédia nas suas dimensões espiritual e
humana. Através do uso de fotografias, memórias, o testemunho de sobre-
viventes e os trabalhos literários de testemunhas oculares, tentamos evocar
uma imagem, ainda que inadequada, do mundo de pesadelo da Ucrâ-
nia faminta de 1932-1933. [9]

A imagem de pesadelo evocada pelas evidências fotográficas é, contudo,


destruída por uma explicação das fontes citadas. O Famine in the Soviet Ukraine
de Harvard contém 44 supostas fotos da fome de 1932-1933. Mais de um
quarto (12) delas são atribuídas ao Muss Russland Hungern de Ammende,
a edição alemã do Human Life in Russia que contém fotos supostamente ti-
radas por um fotógrafo austríaco anônimo (ver Capítulo 3). Três são fotos
dúbias e com datas erradas - incluindo uma dos soldados em uniformes da era
czarista - do espúrio Black Deeds of the Kremlin, Volume 2 (ver Capítulo 4).
O maior grupo de fotos de Harvard é tirado de dois livros de aberta propa-
ganda nazista Alfred Laubenheimer: dez são creditadas ao Die Sowjet Union
am Abgrund de Laubenheimer, e catorze ao Und du Siehst die Sowjets Rich-
tig. Neste último, lembraremos, Laubenheimer credita o Dr. Ditloff, que por
sua vez encontrou mais fama no Human Life in Russia de Ammende. Como
CAPÍTULO 6: GUERRA FRIA II: A CAMPANHA DOS ANOS 1980| 153

vimos, Ditloff não se importava em passar fotos de 1921-1922 como evidên-


cias da fome de 1932-1933 na Ucrânia.
Três das fotos de Ditloff usadas por Harvard foram inicialmente publi-
cadas edição de 18 de agosto de 1933 do órgão do partido nazista Voelkischer
Beobachter. As oito restantes estão entre as muitas fotos de Ditloff usadas pela
imprensa Hearst creditadas ao fraudulento Thomas Walker.
Embora as fotografias da fome não provem por si só a tese de genocídio,
elas são usadas para reforçar visualmente as acusações de uma fome em massa
deliberada, planejada. Verificar sua origem é uma questão em si mesma, parti-
cularmente dadas as reivindicações conflitantes sobre a autoria de certas fotos
amplamente usadas da fome. Como uma das três pessoas que prepararam o
Famine in the Soviet Ukraine, James Mace de Harvard pode talvez ter esclare-
cido essa questão. Anteriormente, Mace esteve ligado à publicação tanto do
The Ninth Circle - que credita Walker - quanto da reimpressão de 1984 do
Human Life in Russia - que atribui a Ditloff as fotografias em comum. Em
Famine in the Soviet Ukraine, pela primeira vez tanto Ditloff quanto Walker
são creditados no mesmo livro. Alguns cuidados foram tomados para evitar
sobreposição direta - oito fotos de Ditloff/Walker são creditadas ao Und du
Siehst (Ditloff) e cinco falsificações de Ditloff/Walker são atribuídas a Wal-
ker. Uma contradição gritante, no entanto, passou despercebida. A placa 128
(p. 45) do Famine in the Soviet Ukraine de Harvard contém uma fotografia
(no canto inferior direito) de uma mulher com um menino pequeno, uma das
cinco fotos creditadas a Thomas Walker e ao New York Evening Journal de
Hearst. A mesma foto aparece na página 333 (placa 86) do Und du Siehst die
Sowjets Richtig de Laubenheimer (edição de 1935), em que é creditada a Di-
tloff!
Mace e seus colegas de Harvard têm ainda a audácia de declarar, em sua
introdução ao material de Walker: “Jornalista americano [...] Thomas Wal-
ker [...] escreveu um relato franco da Fome baseado no que eles testemunha-
ram na Ucrânia em 1933.” [10] Ignorando a natureza fraudulenta das séries
de Walker expostas há mais de 50 anos, os estudiosos de Harvard conveniente-
mente adiantam a viagem declarada de Walker de 1934 para 1933. Isso indica
o verdadeiro significado da declaração na Introdução ao Famine in the Soviet
Ukraine: “Primeiramente, [o catálogo] é uma pesquisa do presente estado da
arte e atual conhecimento sobre a Fome.” [11]
Não só esse “conhecimento” é decifrado com imprecisões, exageros, dis-
torções e fraudes, ele recorre acriticamente a fontes nazistas sem informar o
leitor da natureza espúria dessas fontes. São fontes para mais da metade das
fotos de Harvard os dois livros de Laubenheimer observados anteriormente,
154 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

com mais de um terço do total do livro tiradas do Und de Siehst dis Sowjets
Richtig. Laubenheimer abre a seção destacando a coleção de fotos de Ditloff
e o artigo sobre a fome-genocídio de Ditloff com essas linhas do Mein Kampf
de Adolf Hitler:
Se, com a ajuda do seu credo marxista, os judeus forem vitoriosos sobre
outros povos do mundo, sua coroa será a coroa fúnebre da humanidade e
este planeta será, como foi há milhões de anos, movido pelo éter desprovido
de homens.
A Natureza Eterna vinga inexoravelmente a violação de seus mandos.
[12]

Ataques antissemitas permeiam o livro de Laubenheimer. O “bolchevismo


judeu” é culpado por escravizar e condenar à fome os gentios da União Sovié-
tica; a seguinte ameaça nazista contra os judeus é típica: “Aí dos judeus e de
seus ajudantes quando o dia [da retribuição] chegar, e ele vai chegar. E a an-
tiga linhagem de sangue russo ferve e um povo subjugado deve se levantar por
um justo propósito e se libertar dessa vergonha e desonra!” [13]
CAPÍTULO 6: GUERRA FRIA II: A CAMPANHA DOS ANOS 1980| 155

Propaganda nazista é usada como fonte primária para evidências da “fome-genocídio de 1933”.
O livro Die Sowjet Union am Abgrund de Laubenheimer também foi utilizado por embaixa-
das Alemãs – marcações nas notas e emblema nazista. Direita: Propaganda de 1935 de Die
Sowjet Union am Abgrund de Laubenheimer – em libação às organizações alemãs e da fronte
Volksdeutsche nazista
156 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Und Du Siehst Die Sowjets Richtig contém a maior coleção de fotos comumente usadas como
evidência de um “genocídio planejado de ucranianos” na fome de 1932-1933. Acima à di-
reita: uma citação do Mein Kampf de Adolf Hitler principia a seção sobre a fome neste livro
de propaganda nazista. As 15 fotografias que aparecem nas duas páginas subsequentes são
idênticas àquelas usadas na série falsa de Thomas Walker na imprensa de Hearst (Fevereiro –
Março 1935). Enquanto Walker diz ter tirado as fotos na primavera de 1934, Und Die Siehst
alega que Fritz Ditloff as tirou em 1933. As roupas, poses formais e qualidade de algumas
delas sugerem uma origem anterior a 1930. Também aparentam ter sido tiradas por distintas
combinações de câmeras e fotógrafos, sendo que algumas dessas fotos já haviam sido publica-
das nos anos 1920.
CAPÍTULO 6: GUERRA FRIA II: A CAMPANHA DOS ANOS 1980| 157
158 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Vale observar que a editora nazista do Und du Siehst achou os relatos de


Malcolm Muggeridge suficientemente alinhados com seus propósitos para in-
cluir um de seus artigos. [14]
CAPÍTULO 6: GUERRA FRIA II: A CAMPANHA DOS ANOS 1980| 159

O Famine in the Soviet Ukraine também inclui fotografias do livro ante-


rior de Laubenheimer Die Sowjet Union am Abgrund [“A União Soviética
no Abismo”]. [15] Este último foi anunciado e endossado por tais organi-
zações nazistas e de fachada como a Gesamtverband deutscher antikommu-
nistischer Vereinigungen [União das Associações Anticomunistas Alemãs], a
Bund der Auslanddeutschen [Federação de Alemães Expatriados] e o Reichs-
stand der deutschen industrie [Associação Imperial da Indústria Alemã]. [16]
Tendo circulado amplamente pelos nazistas como propaganda antissoviética
nos anos 1930, ele também foi distribuído pelas embaixadas da Alemanha Na-
zista mundo afora. [17] Embora não selecionadas para serem usadas no Fa-
mine in the Soviet Ukraine, certas fotos que aparecem no Die Sowjet Union
am Abgrund dão sinais de terem sido alteradas. [18]
Dado o uso de fontes nazistas e antissemitas, talvez não devamos nos sur-
preender ao encontrar na bibliografia do Famine in the Soviet Ukraine uma
publicação do ucraniano ex-membro da SS Olexa Hay-Holowko. Hay Ho-
lowko era “Ministro da Propaganda” na facção de Bandera do grupo fascista
OUN, que reivindicou um breve “governo” em Lvov, Ucrânia em julho de
1941 sob a ocupação alemã. A característica mais marcante do mandato desse
“governo” foi o massacre em massa de milhares de judeus (e intelectuais anti-
fascistas ucraniano) por nacionalistas ucranianos auxiliares dos nazistas e po-
gromistas. [19]
Outra contribuição para a recente reaparição da campanha da fome-geno-
cídio é o 50 Years Ago: The Famine Holocaust in Ukraine de Walter Dushnyck.
Com o subtítulo “Terror e Miséria como Instrumentos do Imperialismo So-
viético Russo”, a capa exibe uma caveira humana branca sobreposta a uma
foice e um martelo vermelho (de alguma forma tematicamente reminiscente
de uma geração anterior de pôsteres fascistas). Esse livreto - 56 páginas de texto
de guerra fria - é frequentemente oferecido como material de pesquisa em ten-
tativas de fazer com que Conselhos de Educação incluam a “fome-genocídio”
no currículo escolar.
Publicado pelo Congresso Mundial de Ucranianos Livres, uma organiza-
ção internacional guarda-chuva que une várias facções nacionalistas, 50 Years
Ago foi impresso pela Svoboda Printing Company de Nova Jersey. Essa úl-
tima descende de um antigo Svoboda, um jornal também publicado em Nova
Jersey. Antes ligado ao movimento pró-nazista anterior à entrada dos EUA na
Segunda Guerra Mundial, o Svoboda foi banido uma vez de entrar no Canadá
durante a guerra por ser pró-fascista e subversivo. [20] O prefácio do 50 Years
Ago acaba por ter sido preparado por ninguém menos que Dana Dalrymple.
Talvez esperando se distanciar um pouco da qualidade grosseira e da retórica
160 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

raivosa anticomunista do livro, Dalrymple afirma: “Estou menos certo do grau


em que a fome foi planejada”. [21] Dalrymple ainda não parece ter percebido
a natureza fraudulenta da antiga campanha de fome de Hearst (ou talvez ele
espere que seu leitor não tenha). Vinte anos depois da sua própria utilização
das narrativas fraudulentas de Thomas Walker nas páginas do Soviet Studies,
a página 9 do prefácio de Dalrymple é decorada com fotografias falsas de Wal-
ker.
Apresentando a mesma posição acrítica de seus artigos anteriores, Dalrym-
ple, em seu prefácio, refere o leitor à “Tomada Comunista da Ucrânia” do Co-
mitê Seleto sobre a Agressão Comunista de 1954. As fontes dos rumores co-
lhidas nas várias audiências realizadas durante a histeria da era McCarthy nos
Estados Unidos merecem uma abordagem muito mais cautelosa do que a que
Dalrymple utiliza.
O próprio Dushnyck era um editor associado da Ukraine: A Concise Ency-
clopaedia. Sob a chefia de edição do antigo colaborador nazista Kubijovyc, a
“enciclopédia” inclui a reescrita da colaboração nacionalista na guerra e retrata
a história ucraniana de forma simpática a Petliura,284 Bandera, os pogromistas
de Nachtigall285 e as unidades Halychyna-SS286 . Dushnyck também é iden-
tificado no seu livro como o editor do jornal anticomunista The Ukrainian
Quarterly, um fato deixado muito claro já que ele se refere repetidamente a
esse jornal como fonte material de suas alegações.
O que 50 Years Ago se omite de informar ao leitor sobre o passado de
Dushnyck é ainda mais significante. De acordo com o direitista Ukrainian We-
ekly de Nova Jersey, as raízes de Dushnyck podem ser traçadas no movimento
fascista da Europa no pré-guerra. Seu obituário lembra que “o Dr. Dushnyck
era ativo na Organização dos Nacionalistas Ucranianos e era pessoalmente ín-
timo dos líderes do Conselho Supremo da OUN”. O Ukrainian Weekly tam-
bém observa que Dushnyck foi um colaborador no Rozbudova Natsii (“Re-
construção de uma Nação”), publicado pela Organização Militar Ucraniana
da Organização dos Nacionalistas Ucranianos na Europa do pré-guerra.
284
Symon Petliura, jornalista e nacionalista ucraniano, conhecido como “Hetman Supremo”
(”hetman” é um antigo título de liderança militar do Leste Europeu), liderou diversos po-
groms e massacres contra trabalhadores e bolcheviques. Foi presidente da breve República
Popular da Ucrânia, formada por nacionalistas que rivalizavam com a República Soviética da
Ucrânia durante a Guerra Civil Russa. [N.T]
285
O Batalhão de Nachtigall (oficialmente Grupo Especial de Nachtigall) foi uma formação mi-
litar comandada pela Alemanha nazista durante a Segunda Guerra Mundial para o combate
na Ucrânia e composto por nacionalistas ucranianos, majoritariamente da facção de Bandera
da OUN. [N.T]
286
Divisão da SS na Galícia da Europa Central [N.T]
CAPÍTULO 6: GUERRA FRIA II: A CAMPANHA DOS ANOS 1980| 161

O texto do 50 Years Ago é uma retórica rasa da guerra fria. Uma crítica do
Professor John Ryan afirma:
[...] [50 Years Ago] apesar de ostensivamente documentado, viola certas
normas de pesquisa acadêmica. Por exemplo, o livro contém inúmeras ci-
tações diretas de líderes soviéticos, ou diretivas do Governo Soviético, mas
em nenhuma ocasião sequer isso é documentado com uma fonte primária;
em vez disso, as notas de rodapé se referem a fontes secundárias, todas as
quais aparentam ser publicações antissoviéticas, e a maioria se refere ao
The Ukrainian Quarterly do qual o autor é o editor. Isso não é propria-
mente uma pesquisa acadêmica, e com base somente nisso toda a publica-
ção se torna suspeita. Se Walter Dushnyck pretendia que fosse um artigo
acadêmico sério, com um B.A. e um M.A., ele certamente deveria saber o
procedimento correto. Noto que seu PhD é da Ukrainian Free University
em Munique, mas pelo que posso afirmar, as universidades canadenses e
americanas não reconhecem o status dessa universidade.

[...] Para alguém familiarizado com o assunto, esse material está total-
mente carente de qualquer entendimento intelectual dos eventos da época.
Em vez de uma análise acadêmica, o material consiste numa polêmica vi-
triólica altamente carregada emocionalmente. De fato, pouco tem a ver
com produção acadêmica e, inquestionavelmente, carece de objetividade.
[22]
50 Years Ago continua a prática nacionalista de usar fotografias falsas e
não-documentadas como evidência. Das catorze fotografias da fome forneci-
das, oito são falsificações de Walker/Ditloff. Entre as outras seis, “Um Monte
de Crianças Famintas” (p. 22) aparece na publicação de 1922 La Famine en
Russie (publicada pelo Comite Russe de Secours aux Affames en Russie, Ge-
nebra, 1922, p. 7). A “Coleção de Cadáveres” (p. 24), outra fraude reserva de
1921-1922, fez sua estreia na fome-genocídio de 1932-1933 na edição de 18 de
agosto de 1933 do órgão da Alemanha nazista Voelkischer Beobachter.
A cena do cemitério do Human Life in Russia aparece na página 36, com
boa parte das características de inverno no primeiro plano cortada para corro-
borar a data alegada por Ammende do verão de 1933. Na página 40, é ofere-
cida ao leitor uma imagem não documentada de crianças sem-teto de aparên-
cia tão velha e de qualidade tão atrozmente pobre de cópia repetida que suas
origens anteriores à década de 1930 dificilmente podem ser contestadas. Um
cadáver nu de 1922 decora a p. 44; também apareceu no já citado Voelkischer
Beobachter. Por último, para a p. 46 Dushnyck selecionou “O Menino Ucra-
niano que já foi bonito”. Essa foto aparece no boletim de 1922 Information
162 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Nº 22 (Publicado pelo Comitê Internacional de Ajuda à Rússia, Genebra, 30


de abril de 1922, p. 16).

Fotografia usada por Walter Dushnyck em 50 Years Ago: The Famine Holocaust in Ukraine. A
legenda cita enganosamente um artigo canadense como fonte. A fotografia foi tirada na verdade
do La Famine en Russie (Genebra, p. 7), publicado em 1922. 50 Years Ago foi apresentado
por nacionalistas ucranianos ao Conselho Escolar de Winnipeg em 1983 como evidência para
defender a introdução das interpretações de “fome-genocídio” no currículo escolar.

As fotografias, declara Dushnyck, “foram fornecidas pelo Consistório da


Igreja Ortodoxa Ucraniana nos EUA”. [23] Essa igreja tem sido o feudo do
ex clérigo apoiado pelos nazistas e colaborador de guerra Stepan Skrypnyk,
“Mstyslav Metropolitano”.
Tentando reforçar sua tese de fome-genocídio, Dushnyck passa a um “exa-
me” do número de mortos de fome. Em vez de fazer uma média de rumores
de estimativas a la Dalrymple, o método de Dushnyck consiste em projetar
uma taxa antecipada de crescimento populacional, baseada no censo de 1926,
na população listada pelo censo de 1939 para a Ucrânia. A diferença entre a
estimativa hipotética e a listagem do censo de 1939 é então pronunciada como
“vítimas da fome”.
CAPÍTULO 6: GUERRA FRIA II: A CAMPANHA DOS ANOS 1980| 163

Uma foto de 1922 do La Famine en Russie (p. 9) embeleza a revisão acrítica de Paul Pihichyn do
Execution by Hunger [“Execução por fome”] no Winnipeg Free Press (23 de novembro de 1983).
Escrito por Miron Dolot (um pseudônimo assumido), Execution by Hunger não é documentado
e não contém fotos.

Por exemplo, Dushnyck declara: “tomando os dados de acordo com o


censo de 1926 [...] e o censo de 17 de janeiro de 1939 [...] e o aumento médio
antes da coletivização [...] (2,36% ao ano), pode ser calculado que a Ucrânia
[...] perdeu 7.500.000 pessoas entre os dois censos.” [24]
Embora esse “método” de cálculo das mortes da fome seja amplamente
empregado pelos teóricos da fome-genocídio, a frequência do seu uso não o
torna cientificamente mais válido. O sociólogo dos EUA Albert Szymanski,
criticando a estimativa de três milhões de mortos, observou:
Essa estimativa assume: (a) que, mesmo em condições de fome extrema,
instabilidade e guerra civil, camponesas engravidariam na mesma taxa
164 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

de períodos menos precários; (2) que aborto e infanticídio (intencional ou


não) não aumentaram significativamente; (3) que havia tantas mulhe-
res em idade reprodutiva máxima em 1932-1933 quanto havia antes ou
depois. Todas essas suposições são erradas. Todos os camponeses têm técni-
cas tradicionais de controle de natalidade e são por isso capazes de limitar
sua reprodução a um grau significante; é o benefício econômico decorrente
de ter famílias numerosas que é eficaz - um fator não aplicável durante
a fome - não a ignorância do controle de natalidade [...] [além disso,]
o aborto legal foi tão amplamente praticado nesse período que, em 1936,
o estado o baniu como parte da campanha para aumentar a população.
[25]
Um declínio na taxa de natalidade pode, portanto, ter sido esperado, e não
somente pelas razões destacadas por Szymanski. Ao examinar a demografia do
período da fome, S.G. Wheatcroft declara:
Como é bem sabido, a Primeira Guerra Mundial, a Guerra Civil e os pri-
meiros anos da década de 1920 causaram uma grande lacuna nos nas-
cimentos nestes anos. A geração nascida em 1914 teria 16 anos em 1930
e teria, portanto, entrado no período de maior reprodução. Consequente-
mente, Lorimer e outros estudiosos concluíram que a estrutura etária da
população levaria a um declínio de nascimentos entre o início da década
de 1930 e até que a geração reduzida nascida em 1914-1922 passasse bem
para o futuro. [26]
Essas considerações bastante importantes não são levadas em considera-
ção por teóricos da fome-genocídio como Walter Dushnyck. Uma abordagem
igualmente anticientífica é tomada pelo “especialista” de Harvard James Mace.
Dentre as muitas contribuições de Mace à campanha da fome-genocídio está
um artigo publicado no jornal Problems of Communism. [27] Talvez não seja
acidente que essa publicação seja o órgão da notória Agência de Informação
dos Estados Unidos (USIA). Da Voice of America [“Voz da América”] ao pro-
grama de TV Let Poland Be Poland [“Deixar a Polônia ser Polônia”], da Radio
Marti transmitida em Cuba ao envolvimento no acobertamento da missão de
espionagem KAL 007, a USIA é conhecida como um veículo de desinforma-
ção e guerra psicológica direcionado contra países socialistas e movimentos de
libertação. [28]
Nesse artigo, Mace afirma: “Se subtrairmos nossa estimativa da popula-
ção pós-fome da população pós-fome, a diferença é de 7.954.000, o que pode
ser tomado como uma estimativa do número de ucranianos que morreram
antes do seu tempo.” [29] Mas, como pontuaram os respeitados demógrafos
CAPÍTULO 6: GUERRA FRIA II: A CAMPANHA DOS ANOS 1980| 165

Barbara Anderson e Brian Silver, Mace está confundindo déficit populacional


com excesso de mortalidade. Ao não considerar nenhum declínio na taxa de
natalidade, Mace iguala aqueles que nunca nasceram com aqueles que “mor-
reram antes da hora”. [30]
A metodologia de Mace-Dushnyck também ignora outros fatores: mu-
danças de nacionalidade declarada, casamentos, assimilação, migração, etc.,
todos os quais têm impactos nos números do censo. [31] Por exemplo, Ro-
bert Wixman apontou que no final da década de 1920 - entre os dois censos
em questão - os Cossacos de Kuban foram reclassificados de ucranianos para
russos (eles viviam na Rússia). Anderson e Silver observam: “Se os ucranianos
reclassificados totalizam 2 a 3 milhões sugeridos por Wixman, então entre 25
a 40% do déficit estimado de ucranianos de Mace podem ser contabilizados
dessa forma.” [32]
Há uma infinidade de dificuldades em interpretar esse campo, enfatizam
Anderson e Silver. Eles citam o notável estatístico Lorimer, que escreveu sobre
suas próprias descobertas: “Há, é claro, muitas outras fontes de possíveis erros
em todos esses cálculos. Consequentemente, esses resultados devem ser aceitos
com muitas reservas.” [33] Parece que os propagadores da fome-genocídio não
atentaram para essas reservas.
Como se não bastasse, Mace vai um passo além, tentando substanciar suas
suposições sobre a fome-genocídio pelos resultados do censo soviético de 1959:
[...] podemos rastrear a fome procurando regiões onde o número de mu-
lheres rurais (o segmento menos com menos mobilidade da população) é
anormalmente pequeno em categorias etárias que nasceriam imediata-
mente antes ou durante a fome. [Mace assume novamente a priori que
essas pessoas nasceram] esses são a Ucrânia Soviética, uma nação com tra-
dições ferozmente independentes; regiões habitadas por grandes popula-
ções cossacas, também ferozmente independentes; e as áreas dos alemães
do Volga [...] [34]
Mas por um lapso bastante incomum para um “especialista” de Harvard
na história da Ucrânia, Mace não leva em conta um evento significativo que
ocorreu entre a fome de 1932-1933 e o censo soviético de 1959: a Segunda
Guerra Mundial. Aparentemente Mace nunca ouviu falar que a Ucrânia foi
ocupada pelos nazistas de 1941 a 1944 e foi palco de batalhas que tiraram a
vida de milhões de combatentes e civis.
O oblast da Karkov, por exemplo, é destacado na “geografia da morte” de
Mace. Por alguma razão, Mace se omite de mencionar que a Karkov esteve
não somente sob ocupação nazista até o final de julho de 1943, como também
166 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

foi palco de quatro enormes batalhas antes da libertação. Das 700.000 pessoas
que moravam na cidade quando foi capturada pelos nazistas, apenas metade
sobreviveu.
Similarmente, Mace ignora fatos básicos sobre os alemães do Volga - entre
650.000 e 700.000 alemães do Volga foram reassentados para leste durante a
guerra e nunca retornaram às áreas de seu antigo assentamento.
Além de ignorar aqueles residentes da década de 1930 que morreram ou
foram realocados por causa da guerra, Mace também ignora o grande número
dos que emigraram para outras regiões e repúblicas durante o período da gran-
de reconstrução do pós-guerra. Em resumo, o censo de 1959, como o próprio
Mace sabe, revela padrões demográficos atribuídos principalmente aos desen-
volvimentos pós 1941. Sua tentativa de detectar fumaça de uma fogueira que
foi engolida por um incêndio é infrutífera desde o princípio. Pode-se concluir
que qualquer admissão da Segunda Guerra Mundial como um elemento te-
nha sido vista por Mace como prejudicial à sua defesa - ele não se importa com
o genocídio nazista, procurando apenas convencer os leitores do “genocídio
comunista”.
Pode-se enxergar um sentido mais gráfico da natureza anticientífica de tal
manipulação estatística ao se projetar uma hipotética fome-genocídio em ten-
dências populacionais na província de Sascachevão [Canadá]. Usando núme-
ros básicos do Canada Year Book, pode-se “provar” que 228.586 residentes
nesta província desapareceram durante a Grande Depressão e na sequência
imediata:

População de Sascachevão em 1931: 921.785


Crescimento populacional de Sascachevão de 1921 a 1931: 22%
População projetada de Sascachevão para 1941:
1.124.578
(População de 1931 mais 22%)
População real de Sascachevão em 1941: 895.992
“Vítimas da fome-genocídio”: 228.586
“Vítimas” em porcentagem da população em 1931: 25%

Citando essa “prova” estatística, alguns podem argumentar que os capi-


talistas cometeram genocídio deliberado contra a população de Sascachevão
nos anos 1930, com o objetivo de suprimir a resistência militante de agricul-
tores da pradaria e dos trabalhadores que tinham suas vidas arruinadas pela
depressão econômica. A supressão das lutas das massas - como o ataque da
RCMP [Royal Canadian Mounted Police, principal força de segurança do
Canadá] aos grevistas da Estevan ou o derramamento de sangue infligido aos
CAPÍTULO 6: GUERRA FRIA II: A CAMPANHA DOS ANOS 1980| 167

Trekkers287 desempregados em Regina - poderia ser citada, sem mencionar o


despejo em massa de inquilinos pobres e as expropriações hipotecárias de fa-
zendas.
É claro que nenhuma pessoa racional aceitaria tal tese. A menor população
de Sascachevão pode ser atribuída à menor taxa de crescimento populacional
durante a Depressão, à emigração para fora da província, e - como a Ucrânia -
Sascachevão não era imune à seca ou à turbulência econômica.
Na verdade, a população da Ucrânia não diminuiu em termos absolutos;
entre 1926 e 1939 a população aumentou em 3.339.000 pessoas. [38] Mesmo
levando em conta a tradicional alta taxa de natalidade da Ucrânia, a taxa regis-
trada - principalmente à luz das outras considerações descritas acima - dificil-
mente indica um genocídio.
As altas estimativas de mortalidade apresentadas na campanha da fome-ge-
nocídio parecem amplamente exageradas ainda de outro ponto de vista. Seis,
oito, dez, quinze milhões de mortes, todas de uma população étnica de pouco
mais de 25 milhões de ucranianos na RSS da Ucrânia, de acordo com os pró-
prios nacionalistas [39] - é inconcebível que a Ucrânia pudesse perder de 25
a 60% da sua população étnica e mesmo assim extrair uma colheita bem su-
cedida em 1933, e depois perder outras 5 a 10 milhões de pessoas na Segunda
Guerra Mundial. [40] Se tais invenções forem levadas às suas últimas conclu-
sões, querem que acreditemos que sobraram somente 10 milhões de ucrani-
anos étnicos vivos na RSS da Ucrânia depois da guerra. [41] Faz pouco sen-
tido perguntar como essa reminiscência poderia aumentar para cerca de 36,6
milhões de ucranianos étnicos somente na Ucrânia Soviética dentre uma po-
pulação total de 49,7 milhões na república em 1979. [42] Essa é a loucura da
numerologia da fome-genocídio travestida de estatística.
Embora não seja possível estabelecer um número exato de mortes, vimos
que as estimativas-pitacos dos escritores da fome-genocídio deram atualizaram
o sentido da palavra hipérbole. Suas alegações demonstraram ser exageros ex-
tremos fabricados para fortalecer suas alegações políticas de genocídio.

287
A Jornada On-to-Ottawa foi resultado da agitação de homens solteiros desempregados em
campos federais de ajuda humanitária. Campos de ajuda federais foram trazidos sob o go-
verno do primeiro-ministro R. B. Bennett como resultado da Grande Depressão. A Grande
Depressão paralisou a economia canadense e deixou um em cada nove cidadãos em alívio.
[N.T]
CAPÍTULO 7:

A COLHEITA DA DECEPÇÃO
A campanha da fome-genocídio, lançada pelos nazistas em 1933 e reavi-
vada em escala de massas 50 anos depois, atingiu seu clímax com o apareci-
mento, em 1986, do ataque “acadêmico” de Harvest of Sorrow [“A Colheita
do Sofrimento”], de Robert Conquest, e o assalto “visual” do filme Harvest
of Despair [“A Colheita do Desespero”].
Produzido pelo Comitê de Pesquisa da Fome Ucraniana do Instituto St.
Vladimir e sob os auspícios do Comitê Canadense Ucraniano e do Congresso
Mundial de Ucranianos Livres, o Harvest of Despair emprega praticamente
todas as fotos datadas erradas e não documentadas comumente usadas na cam-
panha da fome-genocídio em seu apelo à emoção do espectador.
Esse filme de propaganda nacionalista foi exibido em todo o Canadá desde
1984, usado agora como uma nova arma nas tentativas de incluir a “fome-ge-
nocídio” no currículo escolar como parte de uma campanha muito mais am-
pla. A Canadian Broadcasting Corporation, aparentemente sem saber da sua
cumplicidade com essa fraude, televisionou o Harvest of Despair para uma
audiência nacional no outono de 1985. Ilustrando a tendência da era Reagan
do establishment político e midiático de aceitar qualquer coisa antissoviética,
o filme ganhou uma Medalha de Ouro e o Grand Trophy Award Bowl no 28º
Festival Internacional de Filme e TC em Nova Iorque em 1985.
Contradizendo o prestígio que essa honraria implica, contudo, uma re-
vista de Nova Iorque descreveu esse festival de filmes como: “Notoriamente
conhecido como um festival pague-pelo-nariz-para-ganhar-um-grande-prêmio
[“pay-through-the-nose-for-a-snatch-of-the-big-time”], foi rebaixado ao longo
do tempo nesta coluna pela sua política de fornecer placas de prêmio oficiais
fraudadas a todos os participantes, independentemente da qualidade.” [1]
Talvez sentindo o mau cheiro, certos meios de comunicação dos EUA têm
sido no mínimo instintivamente cautelosos com esse filme. Inicialmente, o
Public Broadcasting System se recusou a tratá-lo, enquanto a WNET sabia-
mente o declarou “inadequadamente documentado”. Em novembro de 1985,
a WPBT em Miami rejeitou o Harvest of Despair com o argumento de que “ti-
nha percebido um viés em termos de público”. Algumas outras organizações
de mídia dos EUA o descreveram corretamente como “subjetivo” e expres-
170 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

sando “um ponto de vista”. [2]


Apesar dessas rejeições, o Harvest of Despair supostamente estava na fila
para um Oscar - o equivalente a aceitar o Cardiff Man no Hall da Fama An-
tropológico.
No Harvest of Despair, todo um exército de testemunhas de direita desfi-
lou pela tela. Ex-colaboradores nazistas ucranianos e oficiais nazistas alemães
se fizeram presentes em uma reunião de célula no pós-guerra de ex aliados da
infeliz “Nova Ordem” de Hitler no Leste Europeu. Entre eles está Stepan
Skrypnyk, que o historiador americano Alexander Dallin aponta como antigo
editor do jornal Volyn, controlado por nazistas, sob a ocupação alemã. [3]
Com a benção dos ocupantes nazistas da Ucrânia, Skrypnyk se formou
de um leigo para a “ordenação” como bispo em um tempo recorde de três se-
manas. De acordo com o jornal nacionalista ucraniano do período da guerra
Nastup, Skrypnyk, então recém-ordenado Bispo Mystyslav, colocou seu nome
num telegrama conjunto a Adolf Hitler que dizia:

Neste momento apelamos ao todo poderoso com orações ardentes e pedimos


que Ele lhe dê força e saúde para completar essa grande causa que você
começou [...] Acreditamos que não está distante o tempo em que, numa
Europa rejuvenescida construída sobre as bases da genuína moral cristã,
os sinos tocarão alegremente contando ao mundo a nossa vitória. [4]

De acordo com a brochura que acompanha o Harvest of Despair, a Igreja


Ortodoxa Ucraniana de Skrypnyk nos Estados Unidos foi uma apoiadora fi-
nanceira dos custos da produção do filme.
O Harvest of Despair também apresenta relatos de dois ex diplomatas da
República de Weimar na União Soviética, que se transformaram em nazistas
quando Hitler tomou o poder na Alemanha em 1933. O primeiro é Hans
Von Herwarth, conhecido durante a guerra como Johann Herwarth Von Bit-
tenfeld. Herwarth voltou à União Soviética com a invasão nazista, onde sua
“experiência russa” precedente foi usada para recrutar mercenários para a má-
quina de guerra de Hitler dentre os prisioneiros de guerra soviéticos. [5]
O segundo é Andor Henke, que serviu a Hitler como um diplomata na-
zista. [6] Em 1941, Henke abordou o líder nacionalista bielorrusso emigrante
Vasyl
Zakharka para solicitar apoio para os objetivos de guerra de Hitler e a ocu-
pação da Bielorrússia. No filme, Herr Henke parece senil ou incapacitado, e
na verdade não apresenta as alegações de fome-genocídio a ele atribuídas. Em
vez disso, seus parentes falam por ele.
CAPÍTULO 7: A COLHEITA DA DECEPÇÃO| 171

Complementando o testemunho desses antigos nazistas, há imagens na-


zistas da guerra do departamento de propaganda do Terceiro Reich. A “des-
coberta” nazista de valas comuns em Vinnytsia é apresentada com o objetivo
de retratar as atrocidades soviéticas da década de 1930. Na verdade, Vinnytsia
foi o cenário de execuções em massa de judeus pelos nazistas e pela polícia local
ucraniana em 1941. [7] Parece, portanto, que o Harvest of Despair utiliza pro-
paganda nazista das atrocidades antissemitas dos próprios fascistas ucranianos
para construir seu cenário de “genocídio russo” contra os ucranianos.
Malcolm Muggeridge, a anomalia conservadora preferida da Inglaterra
Tory, faz uma aparição previsível no Harvest of Despair. Um ex-agente da inte-
ligência britânica, [8] Muggeridge se ofereceu a várias causas da direita, escre-
vendo, por exemplo, o prefácio do livro de Oleskiw sobre a fome, o Agony of a
Nation. Como observado anteriormente, propagandistas nazistas publicaram
material antissoviético de Muggeridge nos anos 1930. Como Thomas Walker,
Muggeridge alega ter feito um tour privado “em fuga” na Ucrânia durante a
fome, e seus relatos são citados como autoridade em círculos de direita.
De forma reveladora, partes do jornal britânico que continham suas alega-
ções de fome são reproduzidas no filme. Observa-se que Muggeridge é descrito
como tendo entrado na Rússia “um comunista fervoroso”, uma revelação que
deve ter pego de surpresa o Partido Comunista Britânico. O artifício jorna-
lístico de “comunistas” declarados pela imprensa se tornando pró-capitalistas
arrependidos no intervalo de um artigo sobre a fome também foi usado pela
imprensa Hearst.
O General Grigorenko, o desertor russo favorito de Ronald Reagan, tam-
bém soma a sua presença ao filme. Esse sujeito roda os EUA e o mundo, com
tudo pago, para dar palestras sobre os males do comunismo sob o pretexto da
defesa dos “direitos humanos” - embora você não o encontre em reservas indí-
genas americanas, manifestações de desempregados ou piquetes na embaixada
da África do Sul.
O sempre presente Dr. James Mace do Instituto de Estudos Ucranianos
de Harvard também aparece. Como um dos principais apologistas da mul-
tidão pós-Hitler de nacionalistas ucranianos em exílio dos EUA, Mace voará
pelo continente para rufar os tambores enquanto um especialista na “fome-ge-
nocídio”. Em óbvia estima pelo seu trabalho em torno desse assunto de pro-
paganda da Guerra Fria, Mace foi indicado como diretor de pessoal da “Co-
missão sobre a fome ucraniana” do governo dos EUA em fevereiro de 1986.
Ainda outro ator no filme é o desertor soviético Lev Kopylew. Contudo,
escritos antigos de Kopylew não indicavam que ele concordava com a tese da
172 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

fome de “russos contra ucranianos”. A entrevista gravada do pesquisador da


fome Marco Carynnyk com Lev Kopylew foi vista na primavera de 1983 no
Instituto St. Vladimir de Toronto. Na gravação original, Kopylew - respon-
dendo à questão de a fome ter sido deliberadamente planejada - nega que o te-
nha sido, embora ele fale de casos de requisição exagerada de grãos por baixos
funcionários. Sem surpresa, essa parte da entrevista é censurada do Harvest
of Despair. Talvez esse incidente tenha a ver com o fato de que Carynnyk está
processando os produtores do filme na Suprema Corte de Ontário por viola-
ção de seus direitos autorais sobre o material fotográfico que ele forneceu para
o filme. [9]
No geral, os produtores do filme, Slavko Nowytsky e Yuri Luhovy, conse-
guiram juntar uma colcha de retalhos de material. O revisor de cinema notou
que o coprodutor Luhovy “admite que a maior parte de sua receita vem da
edição de longas-metragens de qualidade duvidosa. Ele tem a reputação de
ser um bom ‘médico’ - alguém que foi trazido para salvar filmes considerados
impublicáveis por expositoras e distribuidoras de filmes.” [10] Em Harvest of
Despair parece que o doutor entregou uma das maiores fraudes cinematográfi-
cas de todos os tempos. Objetividade e apresentação científica são sacrificadas
no altar da frente psicológica da Guerra Fria.
De acordo com a Winnipeg Free Press, Luhovy “olhou pessoalmente mais
de 300.000 metros de filmagens históricas para encontrar cerca de 20 minutos
(200 metros) de material apropriado para o filme”. [11] Isso diz menos sobre
a pesquisa dele do que sobre a completa falta de evidências fotográficas da fo-
me-genocídio.
De fato, não é apresentada no filme nenhuma peça de evidência documen-
tada sequer para sustentar a tese de genocídio. Em vez disso, numa montagem
de fotos não documentadas, o espectador é submetido às falsificações de Tho-
mas Walker/Ditloff; numerosas cenas roubadas das já familiares publicações
que cobriram a fome russa de 1921-22, La Famine en Russie e Information
Nº 22; fotos de Ammende (com todas as suas contradições notadas anteri-
ormente); fotos dos anos 1920 usadas no órgão nazista Voelkischer Beobach-
ter em 1933. Certas fotos do Harvest of Despair também podem ser rastrea-
das para os livros de propaganda nazista de Laubenheimer, assim como para
uma publicação em língua ucraniana em Berlim em 1922 (Holod Na Ukrainyi
[Fome na Ucrânia] - de Ivan Gerasymovitch). [12]
Outras cenas pegaram cenas emprestadas tanto do passado quanto do fu-
turo. Por exemplo, imagens de soldados marchando têm homens do Exér-
cito Vermelho usando uniformes dos dias da Guerra Civil Russa. Uma fil-
magem de mulheres pobres cozinhando também é da Guerra Civil. Outras
CAPÍTULO 7: A COLHEITA DA DECEPÇÃO| 173

cenas exibem trajes de camponeses da região do Volga no período imediato


pós-Primeira Guerra Mundial, não ucranianos em 1933. Filmagens de minei-
ros puxando trenós de carvão pelas mãos e joelhos têm origem, na verdade,
na era czarista. Cenas de camponeses em reuniões usando peculiares capu-
zes altos e pontiagudos datam de períodos anteriores; além disso, suas roupas
não são consistentes com trajes ucranianos. É possível identificar o material
gravado de filmes soviéticos da década de 1920, incluindo sequências do Czar
Hunger [“Fome do Czar”] (1921-1922) e Arsenal (1929) e até de reportagens
pré-revolucionárias. [13]
Pulando para o futuro, o filme mostra cenas de fabricação militar de mode-
los de tanques que não eram produzidos até o final da década de 1930. Assim
como: “o episódio da distribuição do pão em Leningrado sitiado pelos nazistas
(retirado de ‘The Siege of Leningrad’ [“O Cerco de Leningrado”], um filme
do épico ‘An Unknown War’ [“Uma Guerra Desconhecida”]) foi usado pelos
autores da videofraude como ‘evidência filmada’ de escassez de alimentos [...]
na Ucrânia na década de 1930.” [14] E assim por diante.
Parece que, como outros anteriores, os produtores do Harvest of Despair
vasculharam os arquivos procurando por pedaços de cenas antigas de guerra-
e-fome que poderiam ser juntadas ao filme para um grande efeito subliminar
- misturadas a narrativas e entrevistas enviesadas intercaladas. Muito disso foi
admitido, como veremos.
Em novembro de 1986, nacionalistas ucranianos em aliança com funci-
onários de direita do conselho escolar fizeram uma tentativa de incluir sua
propaganda da fome-genocídio no currículo do ensino médio de Toronto.
Para esse fim, uma exibição do Harvest of Despair foi organizada no Cen-
tro de Educação. Entre os oradores anunciados para o evento, incluíram o
vice-presidente do Conselho Nola Crewe de Educação de Toronto, Dr. Yury
Boshyk, pesquisador do Instituto de Pesquisas Ucranianas de Harvard e Marco
Carynnyk, escritor e pesquisador associado ao Harvest of Despair em sua fase
de pesquisa.
Confrontados por este autor na parte de discussão da reunião, de que as
fotos e filmagens usadas no filme eram fraudulentas, os oradores foram força-
dos a admitir abertamente que as acusações deste autor eram verdadeiras. [15]
Embora relutantes em reconhecer a extensão completa da fraude, o dolo estava
confirmado. Como reportou o Toronto Star:
O pesquisador Marco Carynnyk, que disse que originou a ideia do filme,
diz que suas preocupações sobre as questionáveis fotografias foram ignora-
das. Carynnyk disse que nenhuma filmagem documental do filme é da fome
174 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

ucraniana e que “muito poucas fotos de ‘32-33’ pareciam poder ser rastreadas
como autênticas. Uma cena dramática no final do filme de uma garota emaci-
ada, que também foi usada no material promocional do filme, não é da fome
de 1932-1933”, disse Carynnyk.
“Eu deixei claro que esse tipo de imprecisão não pode ser permitida”, disse
ele numa entrevista. “Eu fui ignorado.” [16]

Talvez seja por isso, usando o termo de B.S. Onyschuk, vice-presidente do


Comitê de Pesquisa da Fome Ucraniana, que Carynnyk foi “deixado de lado”
do filme antes da sua conclusão. [17]
À luz do citado acima, imagina-se por que Carynnyk esperou alguns anos
antes de vir a público com a verdade, e mesmo assim somente depois de um
desafio público e exposição por este autor.
Numa confissão um tanto inacreditável para um acadêmico, Orest Sub-
telny, um professor de história na Universidade de York, justificou o uso de
fraudes. Notando que há muitas poucas fotos da fome de 1933, Subtelny de-
fendeu a ação dos produtores do filme: “Você precisa ter o impacto visual.
Você quer mostrar como aparentam as pessoas que estão morrendo de fome.
Crianças famintas são crianças famintas.” [18]
Nem precisaria dizer que uma confissão assim tão franca não poderia ser
permitida para desequilibrar um exercício internacional bem orquestrado da
Guerra Fria. Dentro de dois dias, o Comitê de Pesquisa da Fome Ucraniana
emitiu enérgicas negações - repletas de contradições, distorções e inverdades.
[19]

Mesmo o material de promoção de Harvest of Despair usa uma foto não autêntica – uma garota
russa da fome de 1921-1922. Seu uso falseador para ilustrar a fome de 1933 foi admitido pelo
pesquisador do filme Marco Carynnyk.
CAPÍTULO 7: A COLHEITA DA DECEPÇÃO| 175

Esquerda: Capa de um livro nacionalista ucraniano distribuído gratuitamente às centenas na


exibição de Novembro de 1986 de Harvest of Despair no Toronto Education Centre para influ-
enciar educadores a ensinar a suposta “fome-genocídio”. The Great Famine in Ukraine é repleto
de fotos espúrias. Direita: A fonte original de 1922 da foto usada na capa. Retirada do Infor-
mation nº22 publicado pelo Comitê Internacional para o Alívio da Fome na Rússia (Genebra,
1922, p.6)

O Comitê para a Pesquisa da Fome na Ucrânia clama que as imagens usadas em Harvest of
Despair provém de “três fontes primárias”. Não incluídas nessas três está o livro nazista de
propaganda antissemítica Und du Siehst die Sowjets Richtig. As fotos acima e abaixo, usadas
em Harvest of Despair, são tiradas do Und du Siehst, muitas das quais são cenas típicas russas.
Esquerda: camponeses em roupas típicas russas – perceba o calçado de fibra e as calças típicas
(Und du Siehst, p.37, placa 7). Direita: legenda no Und du Siehst lê “um garoto pedinte de
vilarejo nas ruas de Moscou” (p.48, placa 29). Abaixo: 1- p.42, placa 16; 2- p.43, placa 18; 3-
p.43, placa 17; 4- p.51, placa 35; 5-p.57 placa47 e 6- p.132, placa 69
176 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

A publicação de imprensa do Comitê alegou: “Imagens da Fome de 1921


são usadas quando o filme lida com a Fome de 1921. Imagens da Fome de 1933
são usadas quando o filme lida com a Fome de 1933.” [20] Isso não é verdade.
A seção do Harvest of Despair que lida com a fome de 1921 é uma fração de 28
segundos do filme com o qual ninguém se incomodou. As fontes originais de
1922 de fotos específicas usadas em relação a 1932-1933 foram identificadas
CAPÍTULO 7: A COLHEITA DA DECEPÇÃO| 177

na publicação deste autor distribuída na reunião de novembro. [21]


Embora confrontado com as fontes originais de fraudes específicas, o Co-
mitê busca sua segurança em recorrer largamente a fontes secundárias como
linha de defesa: “os retratos da Fome de 1932-1933”, declara o Comitê, “são
tiradas de três fontes primárias”. (sic) São citados como as três fontes o Hu-
man Life in Russia de Ammende, a coleção privada da esposa do diplomata
nazista Andor Henke (as fotos em particular não são citadas) e as falsificações
de Walker do New York Evening Journal de 1935 e do Chicago Herald and
Examiner. [22]
As imagens de Ammende, eles alegam, são “claramente rastreáveis para a
Fome de 1933”. [23] Isso é reivindicado apesar do fato de algumas das fotos de
Ammende aparecerem no livro de 1922, Holod na Ukrainyi, publicado pelos
próprios nacionalistas ucranianos e frequentemente citado por escritores na-
cionalistas ucranianos subsequentes relacionados à fome de 1921. Além disso,
o Comitê alega que Ammende “viajou extensivamente na Ucrânia durante o
tempo da fome”. [24] Isso é, porém, uma alegação nova - na verdade Am-
mende testemunhou apenas a fome russa de 1921. Talvez o Comitê devesse
ler realmente o Human Life in Russia.
O Comitê declara que as fotos de Walker foram usadas somente “[...] onde
elas poderiam ser autenticadas como oriundas de outras fontes [...]” [25] Será
que isso significa correspondê-las com as fotos em Human Life in Russia? Mas
Ammende reivindica um ano e um fotógrafo diferentes. Será que elas foram
comparadas através da aparição simultânea em vários jornais Hearst? Nesse
caso, Walker é igual a Walker. Se elas fossem conferidas na série do London
Daily Express de 1934 pelo “turista” anônimo, eles teriam notado que os rela-
tos eram quase literalmente de Thomas Walker. É possível que a “autentica-
ção” tenha vindo do livro de propaganda nazista de Laubenheimer, Und du
Siehst die Soviet Richtig? Nesse caso, eles estariam não estão só dando crédito
a propaganda nazista, como também teriam visto que Laubenheimer credita as
fotos a Ditloff. Este autor ainda está esperando para ver como esses ditos pes-
quisadores conseguiram autenticar as fotografias de Walker do Chicago Ame-
rican como qualquer coisa senão as fraudes roubadas de antes dos anos 1930
que elas são.
A respeito do uso de fotos em geral, o Comitê atribui à palavra “documen-
tário” [“documentary”] um novo sentido com ambiguidade de 1984:

Todas as fotografias usadas só foram usadas como recursos visuais ou ilus-


trações [...] [26]
Onde a origem de qualquer foto não pôde ser verificada pelo nosso Comitê
178 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

ou pelos produtores do filme, elas não foram usadas ou foram usadas so-
mente onde não afetaram a narrativa e apenas como ilustrações dos rela-
tos de outras testemunhas oculares. Esses usos dessas últimas imagens são
claramente reconhecidos como adequados pelos produtores de filmes docu-
mentários, e não distorce ou afeta de forma alguma os fatos apresentados
no filme, ou a autenticidade dos eventos mostrados. [27]
Esse uso, na verdade, claramente não é reconhecido como adequado. Por
definição, um “filme documentário” visivelmente documenta, verifica fatos e
eventos. Em parte, nenhuma do filme há fotos ou filmagens específicas identi-
ficadas como ilustrativas, em vez de documentárias. O simples fato de materi-
ais não autenticados terem sido usados não é reconhecido em canto nenhum
do filme. Reedição de “documentários” de propaganda nazista da década de
1930, o Harvest of Despair vai além de uma pesquisa acadêmica desonesta. O
uso generalizado de imagens deturpadas engana e manipula o público para se
adequar aos propósitos políticos dos criadores do filme. Dado o reconheci-
mento de Carynnyk de que o produtor do filme “ignorou” seus protestos de
que “esse tipo de imprecisão não pode ser aceita”, só se pode concluir que o
Harvest of Despair representa uma fraude deliberada.
Não é descabido repetir o apelo deste autor a uma revisão independente
para examinar e avaliar melhor esse filme, principalmente considerando os sub-
sídios e apoio logístico que recebeu de órgãos de financiamento públicos como
o National Film Board [Conselho Nacional de Filmes] do Canadá e o Multi-
culturalism Canada.
O Harvest of Despair evidentemente não é um documentário. Ao con-
trário, é uma contribuição grosseira de propaganda para uma campanha da
Guerra Fria em andamento. Completamente de acordo com esse contexto, o
coprodutor do filme Luhovy demonstra seu talento para o melodrama da dé-
cada de 1950, ao declarar: “Eu não posso dizer honestamente se meus parentes
que vivem na União Soviética sofrerão por causa desse filme.” [28] Os parentes
soviéticos de Luhovy podem bem sofrer severamente - do constrangimento de
ter um parente produzindo um compilado tão sujo que serve a uma causa já
há tanto tempo desacreditada.

__________________________________________

Depois de muita pompa e heráldica, incluindo trechos selecionados reple-


tos de fotos falsas na imprensa diária, [29] o tão esperado estudo derradeiro da
“fome-genocídio” finalmente apareceu no final de 1986. Descrito como “exce-
lentemente e profissionalmente escrito” por ninguém menos que o principal
CAPÍTULO 7: A COLHEITA DA DECEPÇÃO| 179

escritor de ficção feudalista do ocidente, Alexander Solzhenitsyn, o Harvest of


Sorrow: Soviet Collectivization and the Terror Famine de Dr. Robert Con-
quest emergiu como a melhor tentativa de legitimação dos fome-genocidistas.
[30]
Como o onipresente James Mace, Robert Conquest tem sido usado há
anos para ligar a fome com propósitos mais amplos de propaganda da direita.
Considerado por alguns como o mentor de Mace, as semelhanças políticas,
metodológicas e de propósito não surpreendem. A carreira de Conquest como
um historiador antissoviético obsessivo já passou por duas guerras frias. Atu-
almente um pesquisador sênior do Hoover Institution, ele tem sido associado
há muito tempo com emigrantes de direita e esforços de propaganda antico-
munista, enquanto “especialistas”.
De acordo com o London Guardian, Conquest foi empregado do projeto
de desinformação do Serviço Secreto Britânico, o Departamento de Pesquisa
de Informação (IRD, sigla em inglês de Information Research Department).
Os principais alvos do IRD foram o “Terceiro Mundo” e “os russos”. Em-
baixadas tinham residentes do IRD disfarçados que plantavam material com
jornalistas locais e formadores de opinião, material admitido por “antigas au-
toridades” como fortemente “tendenciosos”. [31] O Guardian declara depois:
O IRD também encoraja a produção de livros descritos no Whitehall
como “fertilização-cruzada”. Robert Conquest [...] frequentemente crí-
tico da União Soviética foi um daqueles que trabalharam para o IRD.
Ele estava no FO [Ministério das Relações Exteriores, “Foreign Office”]
até 1956. [32]

Por sugestão da IRD, Conquest escreveu um livro sobre a União Soviética;


um terço dos exemplares foi comprado por Preager, que teria um registro de
publicação de livros a pedido da CIA. [33]
Uma publicação de 1986 fornece uma visão mais aprofundada da menta-
lidade e dos objetivos políticos mais amplos de historiadores da “fome-geno-
cídio”, como o Dr. Conquest. O What to Do When the Russians Come: A
Survivalist’s Handbook [“O Que Fazer Quando os Russos Vierem: Um Ma-
nual de Sobreviventes”], de Conquest (e Jon Manchip White), parece dese-
nhado para empurrar o clima político dos EUA ainda mais para o reino da
paranoia e irracionalidade da Guerra Fria. Elogiado pelo Wall Street Journal e
martelado pelo ultradireitista Conservative Book Club, o Handbook reduz a
sovietologia dos EUA ao nível do filme Amanhecer Violento [Red Dawn] e da
série Amerika TV. De fato, Conquest pode ter ultrapassado o nível Hearst de
contação de história, se aproximando da ficção de terror nazista em mais temas
180 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

do que somente o da fome. Uma breve olhada no anúncio do livro se mostra


esclarecedora. Um anúncio de página inteira nas trombetas da revista Military
History:
QUEIME ESTE LIVRO, Mas esse é apenas o começo, se os pacíficos ven-
cerem e a Rússia algum dia assumir o controle. A alternativa pode ser
passar o resto dos seus dias perto do Círculo Ártico [...] [34]

O anúncio acima cria uma lista das “engenhosas variações” do terror co-
munista reservadas para os americanos democráticos, incluindo o espectro de
estupros coletivos de mulheres americanas por soldados russos, um destino
miserável para as crianças americanas e alertas para “fomes” inevitáveis. Mas
pode haver esperança. Este livro, nos informam os seus divulgadores do Con-
servative Book Club, é “onde aprender sobre a guerra de guerrilha e sobre a
sobrevivência [...]”. Eles citam o Wall Street Journal para um endosso - “lei-
tura obrigatória sobre o que esperar nos EUA se nos tornarmos tão covardes
que os soviéticos nos dominem [...]”. [35]
Que “historiador” melhor para dar um verniz acadêmico para a campanha
da “fome-genocídio” do que o Dr. Robert Conquest? Mas algumas revisões
foram feitas. O trabalho anterior de Conquest (The Great Terror) alegou que
apenas cinco a seis milhões de pessoas tinham perecido no período de 1932-
1933, e só pouco mais da metade eram ucranianos. [36] Esse dado era inade-
quado para a nova, melhorada campanha da fome-genocídio dos anos 1980.
Entre novas investigações de criminosos de guerra do Leste Europeu na Amé-
rica do Norte, foram exigidos trabalhos diferentes com cálculos de mortes que
se aproximem ou superem os seis milhões judaicas de Hitler. Com a ascensão
do reaganismo e uma crescente mentalidade de Guerra Fria na kremlinologia
dos EUA, existiam condições para a reintrodução de velhas alegações da ex-
trema direita sob a guisa de pesquisa acadêmica séria. Como publicado no
proeminente jornal nacionalista ucraniano, Conquest aumentou - em 1983 -
sua estimativa de mortes para 14 milhões e estendeu as condições de fome para
1937. [37] Tais revisões coincidiram comodamente com o “50º aniversário da
fome-genocídio” lançado naquele ano.
Os capítulos de abertura e a linha geral dos eventos do Harvest of Sorrow
tendem a duplicar a abordagem tradicional da sovietologia americana sobre a
história soviética e a teoria leninista, assim como as interpretações dos naci-
onalistas ucranianos de direita sobre a história ucraniana. Portanto, os vários
grupos nacionalistas que dominaram partes da Ucrânia durante a Guerra Civil
Russa e as intervenções estrangeiras simplesmente são apresentados como go-
vernos idôneos. A aceitação por Conquest da mitologia do estado nacionalista
CAPÍTULO 7: A COLHEITA DA DECEPÇÃO| 181

é inquestionável. O massacre de judeus ucranianos executado sob a “indepen-


dência” nacionalista em 1918-1919 é dispensado vagamente em três palavras.
[38] A ocupação nazista da Ucrânia é apresentada implicitamente como um
intervalo entre períodos de “terror” soviético, e a libertação dos nazistas como
“reocupação” soviética. [39]
Um exame crítico das referências de Conquest revela uma confiança em
relatos espúrios e de direitistas ao ponto de ser desequilibrada. Somados aos
falsos relatos de Thomas Walker, encontramos o desacreditado Black Deeds of
the Kremlin, Fred Beal da infame imprensa Hearst, o Human Life in Russia
de Ammende, materiais publicados na Alemanha nazista e outras fontes duvi-
dosas examinadas em outras partes deste livro. Um capítulo chave do Harvest
of Sorrow - o Capítulo 12: “The Famine Rages” [“As Fúrias da Fome”] - pode
servir de exemplo da tendência subjetiva de Conquest, confiança em alegações
não verificáveis, e metodologia de seleção e avaliação.
O capítulo 12 contém 237 referências. [40] Mais da metade (mais de 120)
é de fontes de emigrados ucranianos de direita, dos quais 50 se referem ao Black
Deeds of the Kremlin. O Ninth Circle de Woropay, com ilustrações de Wal-
ker e parcialmente anônimo, é citado 14 vezes. Outras referências incluem
o Communism the Enemy of Mankind (publicado pela juventude da OUN-
Bandera), relatos de 1935 da imprensa Hearst, o Projeto de Entrevistas com
Refugiados de Harvard, financiado pela CIA, e o Comitê de Agressão Co-
munista (1955) da Câmara [dos Representantes] dos EUA da era McCarthy.
Trabalhos de ficção são livremente usados como documentação genuína. Por
exemplo, 13 referências são feitas a uma novela supostamente de Vasily Gros-
sman, publicada em Nova Iorque. [41]
Um exemplo da “pesquisa acadêmica” de Conquest pode ser visto na sua
seleção do seguinte relato para o Capítulo 12. Um correspondente estrangeiro
reporta que, perto de Kiev, ele testemunhou a seguinte cena:
Em uma cabana estavam cozinhando uma bagunça que desafiava a aná-
lise. Havia ossos, caruru, pele e o que parecia um couro de botas na pa-
nela. O modo como a meia dúzia de habitantes restantes (de uma popu-
lação anterior de quarenta) assistia ansiosamente a essa bagunça viçosa
demonstrava seu estado de fome. [42]
Acontece que o correspondente estrangeiro é ninguém menos que Tho-
mas Walker, o homem que nunca existiu. Ainda mais inacreditável, na sua
nota de referência para esta citação, Conquest adiantou a data de publicação
deste artigo da imprensa Hearst de 1935 para “26 de fevereiro de 1933”. [43]
Em resposta a críticas posteriores feitas ao seu livro, Conquest tentou de-
fender a autenticidade dos materiais de Thomas Walker:
182 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

“Os fatos falam por si só”, responde o Sr. Conquest. Embora admitisse que
tenha citado artigos das séries de Walker, ele não aceitou que eles eram
fraudulentos. “Isso nunca foi confirmado.” [44]
As evidências fotográficas de Conquest consistem nas mesmas velhas ima-
gens não datadas. Elas incluem as falsificações de Thomas Walker somadas ao
banner do Chicago American de 6 de março de 1935 de Hearst. Pode-se até
encontrar a “garota com a criança-sapo” tirada de uma publicação da ajuda à
fome russa de 1922 e famosa pelo seu uso por Walker, Ammende e Laube-
nheimer. Além disso se encontra a velha cena do cemitério com neve e gelo do
“verão de 1933” que Ammende tentou passar em 1936 e uma óbvia foto da
ajuda humanitária de 1921-1922 de uma linha de crianças famintas intitulada
“Os sem-teto”. [45]
Novamente em resposta a críticas, Conquest tenta justificar o uso de fotos
de 1921-1922 para ilustrar alegações de fome-genocídio em 1932-1933: “Além
disso, ele diz que as fotografias da época são difíceis de identificar claramente,
mas, de qualquer forma, ele de fato cobriu a fome de 1921 no seu livro para
que as daquela época não fossem necessariamente inadequadas.” [46] Sombras
do Harvest of Despair.
Além do desequilíbrio político das fontes de Conquest, sua confiança em
memórias revela mais defeitos na sua pesquisa e metodologia. Um analista de
memórias de guerra afirmou: “a memória é uma espécie de ficção, diferindo
do ‘primeiro romance’ [...] apenas por atestados implícitos de veracidade [...]
Quanto mais os materiais escritos saem da forma do diário, mais eles se apro-
ximam do figurativo e do ficcional.” [47] Pode-se acrescentar - principalmente
quando questões de próprio interesse de natureza política e quando aspectos
desagradáveis de um passado devem ser ocultados.
O historiador americano J. Arch Getty observou que, para nenhum outro
período ou assunto, exceto para o estudo da União Soviética nos anos 1930,
“os historiadores ficaram tão empolgados em escrever e aceitar histórias-por-
anedota”. Ele declarou:
Grandes generalizações analíticas vieram de pedaços de fofocas de segun-
da-mão de conversa de corredor. Histórias de campos de prisão (“Minha
amiga conheceu a mulher de Bukharin numa prisão e ela disse [...]”) vi-
raram fontes primárias sobre as tomadas de decisões políticas centrais [so-
viéticas] [...] a necessidade de generalizar informações particulares e não
verificadas transformou rumores em fontes e equiparou a repetição de his-
tórias com confirmação.
É uma característica reveladora da metodologia de Conquest referente à
CAPÍTULO 7: A COLHEITA DA DECEPÇÃO| 183

União Soviética, escreve Getty, que ele eleva rumores e “ouvir dizer” ao nível
de fato histórico. [49] De fato, o próprio Conquest declarou: “A verdade só
pode ser filtrada na forma de rumores” e, “em questões políticas, basicamente
a melhor fonte, embora não infalível, são os rumores”. [50] Getty comenta:
“Essas declarações seriam espantosas em qualquer outro campo da história.
É claro que historiadores não aceitam conversas e rumores como evidência.”
[51]
Tendo batizado rumores e boatos para o reino da evidência histórica em
The Great Terror (objeto da crítica de Getty), Conquest passa a conceder-lhes
ritos de confirmação em Harvest of Sorrow. Os exemplos a seguir estão em
apenas uma página:
Um comunista estrangeiro foi confrontado com um número de dez mi-
lhões de mortes na URSS como um todo. [A referência é a um artigo da
imprensa Hearst de 1935]

Outro trabalhador estrangeiro [...] ficou sabendo através de funcioná-


rios locais que Petrovsky havia admitido um número de mortos, até agora,
de cinco milhões. [A referência é a Fred Beal]

[...] Parece razoável supor que os números de Duranty derivam da mesma


fonte que aqueles, também nunca impressos, dados a um dos seus colegas
por um outro alto funcionário [...] ou em qualquer valor de estimativas
oficiais semelhantes circulando entre autoridades [...]

[...] Outro americano ouviu de um alto funcionário ucraniano que seis


milhões morreram [...] [A referência é a Lang]

[...] Foi dito a um ucraniano-canadense [...] que um relatório secreto [...]


dava um número de dez milhões de mortos. [52]
O cálculo de estimativa de mortes de Conquest, quando não apoiado em
números tradicionais da direita e de faminólogos, traz pouca novidade à demo-
grafia da fome-genocídio. Como outros antes dele, Conquest obtém da ponta
do lápis uma falta de milhões e milhões de pessoas ao comparar números dos
censos com projeções baseadas em taxas de crescimento populacional anterio-
res. [53] Nessa questão, assim como em outros aspectos da tese da fome-geno-
cídio, o Harvest of Sorrow falha em romper com os métodos desacreditados e
politicamente motivados da pesquisa da fome-genocídio.
O viés anticomunista inabalável de Conquest permite que ele se afunde
no pântano de materiais da direita, onde estudiosos mais críticos temem pisar.
184 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Mas então, pesquisadores sérios e objetivos dificilmente prestam seus talentos


a prioridades tão neuróticas como “sobrevivencialismo” e insurreições comu-
nistas na América. O uso de relatos há tempos comprovados fraudulentos
como o de Walker por Conquest dificilmente soma credibilidade às alegações
feitas no Harvest of Sorrow de que o livro tinha sido “pesquisado meticulosa-
mente”.
Portanto, a prova “acadêmica” e “visual” definitiva do “genocídio” apre-
sentada no Harvest of Sorrow e no Harvest of Despair cai por terra. Desespero
e sofrimento são mais definitivos daqueles que tentam colher uma safra do an-
tissovietismo estilo Guerra Fria ao interpretar falsamente a fome de 1932-1933
como “genocídio planejado”.
CAPÍTULO 8:
A FOME
As “provas” apresentadas proeminentemente na campanha da fome-geno-
cídio se mostraram fraudulentas ou suspeitas. Fotografias falsas, malabarismos
estatísticos não científicos e testemunhos e rumores politicamente motivados
estão entre os dispositivos empregados para embelezar as alegações de fome-
genocídio. As causas da fome são submetidas a manipulações similares: secas,
sabotagens, planejamento amador soviético, excessos e erros na primeira soci-
alização em massa da agricultura no contexto de um ambiente internacional
hostil.
Ao longo da história da campanha da fome-genocídio, os fatores da seca e
da sabotagem têm sido ignorados, negados, subestimados ou distorcidos. Os
excessos e erros soviéticos, em contraste, são enfatizados, dados uma motiva-
ção “anti-ucraniana”, descritos como deliberada e conscientemente planeja-
dos, e os resultados exagerados em contagens de mortos famintos em muitos
milhões. Ao evento central - a coletivização da agricultura como parte do de-
senvolvimento socialista - nunca é dado nada além da clássica interpretação
anticomunista. Como no mundo preto e branco de Ronald Reagan de “terro-
ristas” e “lutadores da liberdade”, é inconcebível e completamente inaceitável
para a interpretação nacionalista ucraniana e sovietólogos que o socialismo e a
União Soviética devam ser reconhecidos como tendo qualquer apoio popular
e o direito de existir. O quão nitidamente um “genocídio” soviético cabe na
sua imagem estereotipada da “tirania bolchevique”.
Para alguns promotores da “fome-genocídio”, qualquer coisa além de cau-
sas humanas é ignorada e negada. Causas naturais, tais como secas, nunca
são alegadas; reivindicações de que secas foram um fator contribuidor são de-
nunciadas como invenções soviéticas. [1] Pode-se esperar então que nenhuma
fonte não-soviética poderia ser citada para substanciar uma seca.
Contudo, em A History of Ukraine [“Uma história da Ucrânia”], Mikhail
Hrushevsky - descrito pelos próprios nacionalistas como “principal historia-
dor da Ucrânia” - declara: “De novo um ano de seca coincide com caóticas con-
dições agrícolas; e durante o inverno de 1932-1933, uma grande fome, como
aquela de 1921-1922, varreu a Ucrânia Soviética [...].” [2] De fato, em parte
alguma o History of Ukraine alega uma fome deliberada, causada pela ação
humana contra ucranianos, e dedica mais espaço para a fome de 1921-1922.
186 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Publicada postumamente em 1941 pelo principal grupo nacionalista ucra-


niano nos Estados Unidos na época (a Associação Nacional Ucraniana), a his-
tória de Hrushevsky foi atualizada em 1940 com base em notas do Dr. Luke
Myshuha. [3] Antes que acusem Myshuha de ser um burro comunista, deve-
se notar que ele é identificado nos agradecimentos do livro como editor-chefe
do jornal nacionalista ucraniano Svoboda. O correspondente de Roma do
Svoboda lavou dinheiro fornecido pelos EUA à Organização dos Nacionalis-
tas Ucranianos, que mudou sua sede para a Itália fascista no final de 1940. [4]
O próprio Myshuha visitou Berlim em 1939, falando em ucraniano na rádio
nazista, e suas conexões com os nazistas foram tema de testemunho perante
um Comitê do Congresso dos EUA. [5]
Histórias mais recentes podem ser citadas no tema da seca. Nicholas Rias-
novsky, ex-professor visitante no Centro de Pesquisas Russas da Universidade
de Harvard, nota no seu History of Russia [“História da Rússia”] que ocor-
reram secas tanto em 1931 quanto em 1932. [6] Michael Florinsky, logo após
uma descrição da destruição em massa executada pela resistência dos kulaks à
coletivização, afirma: “Secas severas em 1930 e 1931, especialmente na Ucrâ-
nia, agravaram a difícil situação da agricultura e criaram condições quase de
fome.” [7] O Professor Emérito em Columbia e um prolífico escritor sobre a
URSS, Florinsky dificilmente pode ser acusado de simpatias com a esquerda:
nascido em Kiev, Ucrânia, ele lutou contra os bolcheviques na Guerra Civil.
[8]
Mesmo Ewald Ammende, o primeiro grande escritor político da fome dos
anos 1930, credita outras causas que não o “genocídio comunista premedi-
tado”. Primeiro culpando falhas e ineficiências da coletivização soviética da
agricultura, Ammende diz: “Se uma colheita futura fosse severamente com-
prometida por causas climáticas ou outras causas naturais - como foi o caso
em 1933 - a catástrofe atingiria novamente enormes dimensões.” [9] Não sur-
preende que escritores contemporâneos da fome-genocídio evitam referências
à citação acima de Human Life in Russia.
Embora a seca tenha sido um fator importante, a causa principal da fome
foi a luta em torno da coletivização da agricultura que escalou no campo nesse
período.
Dez anos depois da revolução, a produção privada ainda dominava a eco-
nomia agrícola. O atraso e o trabalho manual caracterizavam o estado da agri-
cultura nas milhões de pequenas fazendas de camponeses. Em 1928, três quar-
tos das terras eram semeadas à mão. Um terço da área da safra era colhida na
foice, 40% da safra era debulhada por mangual. Mais de um quarto dos do-
micílios camponeses não possuíam nenhum animal de tração ou implementos
CAPÍTULO 8: A FOME| 187

agrícolas, e 47% tinham apenas arados. [10]


Uma parte integral do desenvolvimento socialista e a base para a mecaniza-
ção e a completa modernização da produção agrícola, a coletivização represen-
tou uma revolução na vida rural. Pequenas terras arrendadas de camponeses
foram unidas a enormes cooperativas, fazendas coletivas. Primeiramente de-
senvolvida por uma base voluntária, a coletivização acelerou no final dos anos
1920 e se tornou um consenso no final da década, um fator central do primeiro
Plano Quinquenal da URSS lançado em 1929.
A coletivização - socialização da economia agrícola - incluía o fim da pro-
priedade privada dos meios de produção agrícolas. ∗ A socialização da terra foi
casada com a socialização dos animais produtivos e de tração, prédios agríco-
las, maquinaria e equipamentos. Acabar com a propriedade privada significou
e a classe de proprietários privados - os kulaks - não existiria mais enquanto
classe. Essa política foi chamada de “liquidação dos kulaks enquanto classe”
e foi parte do programa de coletivização completa em andamento desde o co-
meço dos anos 1930.
Embora só uma pequena fração da população do campo, os kulaks ocu-
pavam um papel significativo na produção agrícola, com uma área de plantio e
produção de grãos comercializáveis maior que seus números diziam. Em 1927,
por exemplo, 4% das propriedades detinham 15% da área cultivada. Os ku-
laks eram os emprestadores de dinheiro, os intermediários, os empresários do
campo. Eram principalmente eles que detinham os garanhões das fazendas, os
empreendimentos industriais rurais como moinhos e fornos, que arrendavam
aos camponeses mais pobres seus equipamentos, maquinaria e animais de tra-
ção, que controlavam uma grande parte do comércio varejista nas áreas rurais.
[11]
Como parte do programa de coletivização, as terras dos kulaks tinham que
ser confiscadas e transferidas às fazendas coletivas, assim como seu gado, ma-
quinaria e outras propriedades da fazenda. Um número significativo de famí-
lias de kulaks mais ricas tinha que ser despejado de áreas coletivizadas e enviado
para outro lugar.
Os kulaks responderam - lutando contra a coletivização com uma campa-
nha organizada de destruição em larga escala. A luta se espalhou pelo campo,
chegando à escala de guerra civil em muitas áreas, com resultados devastadores
particularmente na Ucrânia.
Frederick Shuman, Professor Woodrow Wilson de Governo no Williams
College na época da escrita, afirma que ele e milhares de outros turistas viaja-
ram à Ucrânia durante o período da fome. Ele escreve:
188 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

A oposição [dos kulaks] tomou a forma inicial do abate do seu próprio


gado e cavalos em preferência à coletivização dos mesmos. O resultado foi
um duro golpe para a agricultura soviética, pois a maioria dos bovinos e
equinos pertenciam aos kulaks. Entre 1928 e 1933 o número de cavalos na
URSS caiu de quase 30.000.000 para menos de 15.000.000; de gado de
70.000.000 (incluindo 31.000.000 de vacas) para 38.000.000 (incluindo
20.000.000 vacas); de ovelhas e cabras, de 147.000.000 para 50.000.000;
e de porcos de 20.000.000 para 12.000.000. A economia rural soviética
não havia se recuperado dessa perda impressionante até 1941.

[...] Alguns [kulaks] mataram funcionários, atearam fogo na proprie-


dade dos coletivos, e até queimaram sua própria safra e grãos de sementes.
Outros recusaram-se a semear ou colher, talvez na esperança de que as au-
toridades fizessem concessões e de qualquer forma os alimentaria.

O resultado foi a “fome” da Ucrânia de 1932-1933 [...] Relatos terríveis,


a maioria ficcional, apareceram na imprensa nazista na Alemanha e na
imprensa Hearst nos Estados Unidos, frequentemente ilustrados com fo-
tografias que se revelaram como tendo sido tiradas ao longo do Volga em
1921. [...] A “fome” não foi, nos seus estágios posteriores, um resultado
de uma escassez de comida, apesar da grave redução da colheita de grãos
provenientes das requisições especiais na primavera de 1932 que aparente-
mente foram ocasionadas pelo medo de uma guerra com o Japão. A maior
parte das vítimas foram kulaks que se recusaram a semear seus campos ou
destruíram suas plantações. [12]

Diferente de muitos teóricos da fome-genocídio que não consideram a sa-


botagem dos kulaks, alguns nacionalistas ucranianos fornecem descrições en-
tusiasmadas da sabotagem e do terrorismo. Isaac Mazepa, antigo Premier do
governo nacionalista de Petliura na Ucrânia e um obstinado nacionalista até a
sua morte, admitiu francamente que a quebra da safra, e logicamente muito
da fome resultante, foi muito devida às seguintes causas:
Primeiro houve distúrbios nos colcozes [fazendas coletivas] ou os oficiais
comunistas e seus agentes foram mortos, mas depois foi favorecido um sis-
tema de resistência passiva que visava a frustração sistemática dos planos
dos bolcheviques para a semeadura e a mobilização da colheita [...] A ca-
tástrofe de 1932 foi o golpe mais difícil que a Ucrânia Soviética teve que
encarar desde a fome de 1921-1922. As campanhas de semeadura tanto
do outono quanto da primavera fracassaram. Trechos inteiros não foram
CAPÍTULO 8: A FOME| 189

semeados, além disso, quando a colheita estava sendo feita [...] em mui-
tas áreas, especialmente no sul, 20, 40 e até 50% foi deixado nos campos e
não foram coletados ou foram perdidos na debulha. [13]
Duvida-se que os heróis dos nacionalistas - aqueles grupos proprietários
que cometeram grande destruição dos recursos agrícolas - tenham sido rece-
bidos calorosamente pelo resto da sociedade que sofreu as consequências. A
destruição dos meios de vida deve ter sido considerada criminosa.
A luta em torno da coletivização não foi limitada aos kulaks. Um número
considerável de camponeses médios foi tratado erroneamente como kulaks.
No lugar de serem ganhos para o apoio da coletivização, eles resistiram à co-
letivização. Louis Fischer observou: “Eu mesmo vi, por toda a Ucrânia em
outubro de 1932, enormes pilhas de grãos que os camponeses se recusaram
a recolher e estavam apodrecendo. Essa, eu escrevi, ‘era a comida de inverno
deles. Depois esses mesmos camponeses passaram fome.’ O Sr. Chamberlin
interpretou falsamente a fome e alguns americanos aceitaram sua interpreta-
ção.” [14]
Problemas inerentes à introdução massiva de um novo sistema coletivo de
cultivo complicaram ainda mais a situação. A própria escala e velocidade da
coletivização foi assustador: no espaço de quatro anos, mais de 14 milhões de
fazendas foram coletivizadas, incluindo 70% das fazendas na Ucrânia. [15]
A coletivização ocorreu a taxas e com métodos sujeitos a extremas oscilações
dependendo das habilidades e atitudes das autoridades locais e regionais. O
planejamento cuidadoso deu lugar a confusão, pois mesmo os níveis superio-
res de programação e de metas da coletivização estavam sujeitos a mudanças e
revisões drásticas. Com poucas experiências históricas para se apoiar e em um
campo conhecido pelo atraso e pelas velhas tradições camponesas, milhões de
pequenos lotes e propriedades foram fundidas em algumas centenas de milha-
res de fazendas coletivas. Os camponeses há muito acostumados ao trabalho
manual e com tração animal eram agora introduzidos aos arados e semeadeiras
puxadas por tratores, colheitadeiras mecânicas e debulhadores. Diante desse
cenário e da sabotagem generalizada, uma transição tranquila era impossível.
Somado a isso há erros e excessos cometidos no curso da coletivização. Ao
contrário do que ideólogos e “especialistas” nacionalistas tentariam nos fazer
acreditar, a historiografia soviética não ignora esse período, nem encobre erros
cometidos. (É verdade, porém, que pouco foi escrito na União Soviética sobre
a fome; como a vida contemporânea soviética demanda um olhar mais aberto
à sua história, pode-se esperar que isso vá mudar.) O History of the Ukrainian
SSR [“História da RSS da Ucrânia], de oito volumes (dois deles duplos) for-
nece a seguinte análise e crítica no capítulo “Luta Contra Distorções da Linha
190 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

do Partido na Construção da Coletivização”:


No caminho do estabelecimento do movimento de coletivização foram co-
locadas grandes dificuldades que foram condicionadas pela novidade e
complexidade do processo, pela velha tradição camponesa de propriedade
privada, pela obsolescência técnico-econômica e pela grande escassez de qua-
dros. Essas dificuldades eram complicadas pelo cerco capitalista em que o
estado soviético se encontrava e pela intensificação da luta de classes nas
áreas rurais. Nessas condições, as distorções da linha do partido perante a
construção da coletivização, que foram notadas no primeiro estágio sólido
de coletivização, eram especialmente perigosas. Em algumas regiões, na
busca por altas taxas de coletivização, no lugar de um trabalho de mas-
sas organizacional persistente e dedicado entre os camponeses, a direção
tomou o caminho da coerção. Muitos erros e distorções foram feitos por
trabalhadores responsáveis de Shepetytsky, Tulchyn, Proskuriv e várias
outras regiões onde, durante os últimos vinte dias de fevereiro de 1930,
o nível de coletivização em alguns distritos pulou de 10-15% a 80-90%.

Distorções no movimento para a coletivização também tinham a ver com


o fenômeno de que organizações locais e republicanas nem sempre enca-
minhavam as instruções corretas. Assim, na Ucrânia, comitês regionais
e distritais do partido receberam, em 24 de fevereiro de 1930, uma dire-
tiva para coletivizar as estepes ao final da campanha de semeadura da
primavera, e toda a Ucrânia - para o outono de 1930. Isso era uma vi-
olação vulgar das diretivas do partido a respeito das taxas e métodos da
coletivização.

Uma distorção particularmente perigosa da política do partido no que


diz respeito ao movimento de coletivização era a abordagem incorreta to-
mada perante o médio campesinato em vários distritos. Cumprindo o
curso da coletivização, o partido se guiou pela abordagem leninista se-
gundo a qual os sucessos na transformação socialista da agricultura de-
pendiam em grande parte da atitude do campesinato médio. Não obs-
tante, há casos de médio campesinato ser tratado como se fossem kulaks.
Como foi notado numa carta do Comitê Central do PCUS para as orga-
nizações do partido de 2 de abril de 1930, a política de fortalecimento das
alianças com o médio campesinato com o apoio do pequeno campesinato, e
na condição de uma luta impiedosa contra os kulaks, começou a dar lugar
à política, hostil ao leninismo, de comandismo nas relações com o médio
campesinato.
CAPÍTULO 8: A FOME| 191

Todas essas distorções e erros, que não tinham nada em comum com a
linha leninista do partido, foi útil aos kulaks, à burguesia nacionalista,
aos oportunistas de direita e aos trotskistas. [16]

Métodos arbitrários, um sistema de comando administrativo e o trata-


mento do médio campesinato como kulaks expandiu a oposição à coletiviza-
ção e a convulsão social e econômica. Os erros e excessos soviéticos, a estiagem
e a campanha organizada de sabotagem e resistência resultaram na fome de
1932-1933. Não houve nenhum plano de destruir os ucranianos enquanto
povo; os erros - mesmo quando acompanhados por excessos trágicos e imper-
doáveis - não constituem um “genocídio premeditado”.
A fome foi agravada por uma epidemia de tifo. O planejador urbano inter-
nacionalmente aclamado e premiado com a Ordem do Canadá, o Dr. Hans
Blumenfeld trabalhou como arquiteto na cidade ucraniana de Makayevka no
tempo da fome. Ele escreve:
Houve de fato uma fome em 1933, não só na Ucrânia, mas também no
[...] Baixo Volga e no Cáucaso Norte; e Makeyevka, localizada perto da
junção entre essas três regiões, sentiu totalmente o impacto dela. [...] So-
mente uma vez eu vi uma criança com pernas finas e barriga inchada; foi
no jardim de uma escola de enfermagem nas mãos de uma enfermeira es-
perando pelo médico. Eu também nunca vi um cadáver estendido na rua.
[...] Não há dúvidas que a fome fez muitas vítimas. Eu não tenho base
para estimar esses números. [...] Provavelmente a maioria das mortes em
1933 foram graças à epidemia de tifo, febre tifoide e disenteria. Doenças
transmitidas pela água eram frequentes em Makeyevka; eu sobrevivi por
pouco a um ataque de febre tifoide. [17]

Muito ocasionalmente, fontes do campo da “fome-genocídio” notam as


epidemias generalizadas. Apesar da sua absurda estimativa de mortes, Horsley
Gantt confirma esse ponto, como citado na seguinte passagem de Dalrymple:
“Ele [Gantt] relata que o pico da epidemia de tifo coincidiu com o da fome.
[...] Ele acrescenta, contudo, que por causa da fome ter sido complicada pela
epidemia, não é possível separar qual das duas causas foi mais importante em
causar mortes.” [18]
A fome não se estendeu além do período pré-colheita de 1933. Para levar
adiante seus fins políticos, os ativistas da fome-genocídio da década de 1930,
como Ammende e a imprensa Hearst, tentaram esticar a fome até e mesmo
além de 1934; seus seguidores dos anos 1980 raramente ousam fazer alegações
192 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

similares. O sucesso da colheita de 1933 foi garantido por medidas tomadas


pelo governo soviético para superar a situação. Trinta e cinco milhões de pesos
russos de sementes, alimentos e forragem foram enviados para a Ucrânia na
primavera de 1933. Mudanças foram feitas para melhorar a organização e a
administração das fazendas coletivas, e mais milhares de tratores, colheitadeiras
e caminhões foram entregues. [19] O Dr. Hans Blumenfeld nos oferece um
útil resumo pessoal do período:
[...] [A fome foi causada por] uma conjunção de vários fatores. Primeiro,
o verão quente e seco de 1932, que eu experienciei no norte de Vyatka, re-
sultou no fracasso da safra nas regiões semiáridas do sul. Segundo, a luta
pela coletivização perturbou a agricultura. A coletivização não foi um
processo ordeiro seguindo regras burocráticas. Consistiu nas ações de cam-
poneses pobres, encorajados pelo Partido. Os camponeses pobres estavam
ansiosos por expropriar os “kulaks”, mas menos ansiosos por organizar
uma economia cooperativa. Em 1930 o Partido já tinha enviado qua-
dros para conter e coibir excessos [...] Depois de uma contenção em 1930, o
Partido voltou a se movimentar em 1932. Como resultado, naquele ano a
economia kulak parou de produzir, e a nova economia coletiva ainda não
produzia em toda a sua capacidade. A primeira acusação de produto in-
suficiente foi para a indústria urbana e as forças armadas; como o futuro
de toda a nação, incluindo os camponeses, dependia deles, dificilmente po-
deria ser o contrário [...]

Em 1933 a chuva foi adequada. O Partido mandou seus melhores qua-


dros para ajudar a organizar o trabalho nos colcozes [fazendas coletivas
não estatais = cooperativas]. Eles conseguiram; depois da colheita de 1933
a situação melhorou radicalmente e com velocidade impressionante. Eu
sentia que nós estávamos subindo uma carreta pesada ladeira acima, sem
certeza se conseguiríamos; mas no outono de 1933 nós ultrapassamos as
metas e a partir de então poderíamos avançar em um passo acelerado.
[20]

As tarefas de socializar a produção industrial e agrícola, por mais anáte-


mas para os capitalistas e outros que se opõem ao socialismo, visavam elevar as
condições aos níveis do século XX. Os soviéticos achavam que a socialização e
o desenvolvimento eram criticamente necessários para a sobrevivência de seu
país, principalmente à luz do surgimento do fascismo em outras partes da Eu-
ropa e do expansionismo japonês no Oriente. O jornalista americano Albert
Rhys Williams observou bastante e citou uma fala de Stalin de 1931: “estamos
CAPÍTULO 8: A FOME| 193

de 50 a 100 anos atrás dos países. Devemos percorrer essa distância em 10 anos.
Ou fazemos isso ou eles nos esmagarão.” [21]
E eles correram! O programa da coletivização e os projetos de industriali-
zação em larga escala dos planos quinquenais dos anos 1930 foram orientados
para a construção de um país industrial moderno, além de desenvolver o soci-
alismo e fortalecer a habilidade da URSS de se defender. A um grande custo,
contra tremendas dificuldades, e não sem dolorosos erros e excessos, a União
Soviética atingiu seus objetivos. O jornalista americano Howard K. Smith ob-
servou:
[...] a produção atingiu seu nível de 1913 apenas em 1928. Depois eles
começaram seus planos para a industrialização. Em outras palavras, eles
não tinham vinte e três, mas só doze anos para se prepararem para a Se-
gunda Guerra Mundial. A medida do seu sucesso está nos índices compa-
rativos da produção industrial de 1940, com o nível de 1913 como index
100 em todos os casos:

França 93,2
Reino Unido 113,3
EUA 120,0
Alemanha 131,6
URSS 908,6 [22]

Quanto ao resultado da coletivização e industrialização na Ucrânia du-


rante esse período, o jornalista americano Edgar Snow escreveu no Saturday
Evening Post:
A Ucrânia [...] em 1940 [...] perdeu apenas para os Estados Unidos em
mineração de ferro e minerou o dobro da França, o maior produtor da
Europa. Seus altos fornos fundiram mais ferro gusa do que a Inglaterra
e o dobro da França, sendo superada apenas pelos Estados Unidos e a Ale-
manha. Na produção de aço ficou em quarto mundial, bem à frente de
países como a França e o Japão. A mineração de carvão na mesma posi-
ção [...] No campo, a Ucrânia é famosa por mais do que seus grãos. Sua
produção de batata é excedida no mundo apenas pela Alemanha e pela
Polônia. É o maior produtor do mundo de açúcar de beterraba [...] O óleo
vegetal é prensado a partir de uma safra anual de mais de um milhão de
toneladas de sementes de girassol. Algodão e borracha natural [...] são
novas plantações enormes. [23]
Significativamente, o reconhecimento dessas conquistas foi concedido por
alguns historiadores nacionalistas ucranianos, como foi citado no livro de Ihor
194 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Kamenetsky, Hitler’s Occupation of Ukraine 1941-1944 [“A ocupação da Ucrâ-


nia por Hitler 1941-1944”]. [24]
As conquistas da construção socialista são ainda mais notáveis à luz dos
problemas e dificuldades reais da década de 1930. Eles próprios praticamente
atestam a mentira nas alegações de 7 a 15 milhões de mortos famintos há meros
seis ou sete anos antes, sugerindo algo bem diferente da linha de holocausto de
Innitzer, de Hearst, dos nazistas, dos nacionalistas ucranianos e dos soldados
da Guerra Fria.
O fato de o Japão ter ocupado a Manchúria e Hitler ter tomado o poder
na Alemanha durante o próprio período da fome podem indicar que a União
Soviética tenha empreendido seu programa de emergência no limite do tempo.
A reorganização social da indústria e da agricultura soviéticas, tão despre-
zada pelos emigrantes de direita e capitalistas semelhantes, provou ser o balu-
arte de sucesso da Europa contra a máquina de guerra de Hitler. Apesar das
enormes perdas iniciais no começo da guerra, na passagem de um ano o real
poder dos sovietes era evidente para os alemães. Como afirma o historiador
Heinz Hohne:
Dois anos preocupantes de guerra sangrenta na Rússia forneceram provas
cruéis da falsidade do conto sobre sub-humanos. Tão logo quanto agosto
de 1942, nos seus “Relatos do Reich” o SD notou que crescia o sentimento
entre o povo alemão de que “fomos vítimas de uma ilusão. A primeira e
principal impressão é a vasta massa de armas soviéticas, sua qualidade
técnica, e o esforço soviético gigantesco da industrialização - tudo isso em
acentuado contraste com a imagem anterior da União Soviética. As pes-
soas estão se perguntando como é que os bolcheviques conseguiram produzir
tudo isso.” [25]
Se a Alemanha nazista e seus aliados europeus não tivessem dedicado muito
esforço contra o poder social e industrial desenvolvido pela URSS nos anos
1930, as potências do Eixo, armadas com a riqueza adicional dos recursos so-
viéticos, poderiam bem ter saído vitoriosas. Sobre esse evento é uma questão
discutível se algum nacionalista ucraniano teria sobrevivido aos programas ra-
ciais planejados pelos nazistas para escreverem sobre a “fome-genocídio”.
De acordo com nacionalistas ucranianos, a fome afetou - ou, melhor, foi
direcionada conscientemente - quase que exclusivamente contra ucranianos
étnicos. É verdade, o The Black Deeds of the Kremlin declara isso aberta-
mente, e nos levaria a acreditar que outras nacionalidades não foram afetadas
e comiam normalmente. [26] O escopo das dificuldades são chauvinistica-
mente restritas, distorcidas e politicamente manipuladas. Outras nacionali-
CAPÍTULO 8: A FOME| 195

dades que sofreram - russos, turcomenos, cazaques, grupos caucasianos - nor-


malmente são ignoradas, ou se ao menos mencionadas, o fazem de passagem
e relutantemente. É como se as histórias de horror xenofóbicas dos naciona-
listas não tolerassem concorrência. Bolcheviques “russos” são confrontados
com ucranianos “puros”. Em ofensas verbais de tirar o fôlego às vezes insupe-
ráveis fora dos círculos literários nazistas, somos informados: “Toda essa horda
monstruosa de comunistas russos, como um bando de feras de rapina, se lan-
çou sobre uma Ucrânia já empobrecida e saqueada.” [27]
James Mace também tenta interpretar a fome como deliberadamente fo-
cada contra certas nacionalidades, a ponto de alegar que: “[...] a fome parou
precisamente na fronteira entre a Rússia e a Bielorrússia propriamente [...]”
[28] O historiador de direita Alec Nove - que de outra forma apoia a tese de
fome deliberada - discorda da ênfase de Robert Conquest na etnia como fator
determinante: “Há um assunto sobre o qual se deve discordar de Conquest. É
o que pode ser chamado do aspecto ucraniano [...] russos que estavam na área
afetada [...] no Baixo Volga e Cáucaso Norte, por exemplo - também morre-
ram [...] Sim, o campo ucraniano sofreu terrivelmente. Mas Conquest parece
inclinado a aceitar o mito nacionalista ucraniano.” [29]
O Dr. Hans Blumenfeld, em resposta às alegações dos nacionalistas ucra-
nianos de genocídio ucraniano, se baseia na sua experiência pessoal ao descre-
ver as pessoas que vieram à cidade em busca de comida:
Eles vieram não só da Ucrânia, mas em número igual de áreas russas ao
nosso leste. Isso refuta o “fato” do genocídio anti-ucraniano paralelo ao
holocausto antissemita de Hitler. Para qualquer pessoa familiarizada
com a desesperada escassez de força de trabalho da União Soviética na-
queles anos, a noção de que seus líderes reduziriam deliberadamente esse
escasso recurso é absurdo [...] Até a década de 1950 o número mais fre-
quentemente citado era de dois milhões [de vítimas]. Só depois de ter sido
confirmado que o holocausto de Hitler tinha custado seis milhões de víti-
mas [judaicas] que a propaganda antissoviética sentiu a necessidade de
aumentar aquele número ao substituir o número fantástico de sete para
dez milhões [...] [30]
A maioria dos historiadores não nacionalistas ucranianos da “fome-geno-
cídio” não tentam limitar a fome à Ucrânia. Ao mesmo tempo, contudo, eles
tentam retratar o período da coletivização do início dos anos 1930 como o
da destruição em massa do povo ucraniano e da sua aniquilação etnocultural.
Alguns vão tão longe a ponto de estender as condições de fome até o final da
década. [31] Se tais alegações fossem verdadeiras, poder-se-ia esperar que os na-
zistas, junto com seus “Grupos de Marcha” fascistas ucranianos e intérpretes,
196 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

descobrissem uma terra abandonada pouco habitada de famintos atrasados e


“russificados” quando eles invadiram a Ucrânia em 1941. Os colaboradores
nacionalistas ucranianos da Ucrânia ocidental que entraram na Ucrânia So-
viética junto com os exércitos nazistas dão um relato bem diferente. Por exem-
plo, o proeminente nacionalista Lev Shankivsky, em Pokhidni hrupy OUN
[Grupos em Marcha da OUN], cita o relato de um “trabalhador cultural” da
Galícia:
Pode-se cruzar com uma garota comum do vilarejo [...] durante nossa con-
versa, descobrimos que a garota é versada em matemática, física, química
[...] terminou o ensino médio e trabalhou como motorista de um trator
[...] Em outros exemplos, pode-se encontrar uma ex-estudante de univer-
sidade, instituto médico ou faculdade de professores entre as meninas do
vilarejo. Tais casos são frequentes [...] As pessoas estão bem informadas.
Pode-se discutir qualquer tema político ou social com os camponeses [...]
Nossos colegas [os fascistas galícios da OUN] se deram mal em discussões
sobre questões profissionais ou no conhecimento da estrutura do estado [...]
[32]
Resta apenas imaginar que tipo de “genocídio” resulta em tais avanços cul-
turais e educacionais.
Outras fontes descrevem uma reação ainda mais hostil da população ucra-
niana aos nacionalistas marionetes dos nazistas. Um pastor, o Padre Ohienko,
despachado pelos nazistas para Kiev, estava extremamente aflito, como indica
uma carta a um amigo:
Já estive aqui por alguns meses, mas não consigo achar nenhuma paz espi-
ritual. Você não imagina como o bolchevismo mudou tudo [...] As pessoas
são maliciosas e nos consideram inimigos da maneira que talvez seus an-
cestrais tenham tratado os tártaros [...] Desrespeito total [...] Encontra-
mos hostilidade pontual em toda parte. Todos os ucranianos chegando de
fora [colaboradores nacionalistas] são chamados de espiões fascistas, mer-
cenários de Hitler, o que eu admito ser parcialmente verdade [...] Os ale-
mães realmente nos atribuem os trabalhos mais sujos. [33]
O registro da resistência ucraniana aos nazistas e seus auxiliares nacionalis-
tas ucranianos é exemplar. Como afirma a autoridade americana sobre a União
Soviética, William Mandel:
Na maior porção oriental da Ucrânia, que tinha sido soviética por vinte
anos, a lealdade foi esmagadora e ativa. Havia meio milhão de guerri-
lhas soviéticas organizadas [...] e 4.500.000 ucranianos étnicos lutaram
CAPÍTULO 8: A FOME| 197

no exército soviético. Claramente, esse exército teria sido fundamental-


mente enfraquecido se houvesse descontentamentos básicos entre um con-
tingente tão grande. [34]
A Ukraine: A Concise Encyclopaedia, dos próprios nacionalistas, admite
um número ainda maior de ucranianos que lutaram no Exército Vermelho,
dando uma estimativa de “aproximadamente 5 milhões”. [35] Seria surpreen-
dente a capacidade de uma nação de mobilizar esse número de homens predo-
minantemente em idade militar à luz dos números de mortos de fome reivin-
dicados pelos nacionalistas. A Encyclopaedia também assume que das 11.000
medalhas de “Herói da União Soviética” concedidas, 2.000 foram para solda-
dos ucranianos. [36] Mandel, entre outros, explica essa sólida defesa da União
Soviética: “Havia uma razão óbvia para essa lealdade. Para a massa ucraniana
de camponeses, trabalhadores e profissionais recém ascendidos dessas classes,
o sistema soviético demonstrou vantagens econômicas e culturais enormes.”
[37]
De fato, a única área onde os nacionalistas encontraram algum tipo de base
durante a ocupação nazista, foi na antiga (até 1939) Galícia Polonesa, onde os
nazistas fizeram o grosso do recrutamento para a polícia fascista e as unidades
da SS. Isso é confirmado pelo historiador Roman Szporluk, que escreve que as
“zonas de operação” do “nacionalismo ucraniano organizado [...] eram limi-
tadas aos antigos territórios poloneses” [38] - isto é - à área da base política do
movimento fascista ucraniano (galício) do pré-guerra.
A verdade nessa matéria é que desde 1918, as várias facções dos naciona-
listas ucranianos tiveram pouco apoio para falar do próprio povo ucraniano.
O nacionalista Mykola Stepanenko admite relutantemente que: “A atual re-
sistência ucraniana e o movimento de defesa da nacionalidade (sic) [...] ainda
não gozou do apoio ou da participação ativa de tecnocratas, funcionários do
governo, membros de baixo e médio escalão do partido, profissionais e traba-
lhadores.” [39] Só se pode acrescentar que se o povo ucraniano não apoiava
os nacionalistas no tempo do escrito de Stepanenko no exílio (1977), certa-
mente também não o fizeram quando ele estava marchando pela Europa em
uniforme nazista da 14ª Divisão da Waffen SS.
Se a população da Ucrânia Soviética de 1941 consistia nos remanescentes
e sobreviventes de um holocausto de massa de muitos milhões de poucos anos
antes, ou se tivessem visto a fome de 1932-1933 como genocídio, deliberada-
mente dirigido aos ucranianos, então sem dúvidas o fascismo teria encontrado
uma recepção bem diferente; ucranianos soviéticos teriam sido tão relutantes
em defender a URSS quanto teriam sido os sobreviventes judeus em defender
a Alemanha Nazista.
198 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Mas, como veremos a seguir, a ocupação nazista da Ucrânia é relevante não


só pela a oposição aos nazistas pela maioria esmagadora da população. Tam-
bém é muito relevante pelo papel desempenhado pelos nacionalistas ucrania-
nos - os principais perpetradores do mito da fome-genocídio.
CAPÍTULO 9:

COLABORAÇÃO E
CONSPIRAÇÃO
Em 30 de junho de 1941, o exército nazista entrou em Lvov, capital da
Ucrânia ocidental. Na sua vanguarda veio o Batalhão Nachtigall, de uniforme
alemão, sob o comando de Roman Shukhevych. Com o conluio do Abwehr
nazista, a facção de Bandera da Organização dos Nacionalistas Ucranianos
criou imediatamente o chamado “Governo das Terras Ocidentais da Ucrânia”,
chefiado por Yaroslav Stetsko que havia acompanhado os invasores nazistas
para a cidade. Um pogrom da população judaica da área de Lvov foi logo lan-
çado. [1] Phillip Weiss, líder do Comitê do Holocausto de Winnipeg e so-
brevivente da Ucrânia ocidental, nota que isso foi antecipado pelo “[...] ar de
medo e terror pairando sobre a cidade por causa da aproximação do exército
alemão e o conhecimento público do próximo pogrom de judeus por nacio-
nalistas ucranianos”. [2]
O escritor americano Saul Friedman, que empreendeu uma extensa pes-
quisa na perseguição histórica de judeus por nacionalistas ucranianos, afirma
no seu livro Pogromchik:

Durante os três primeiros dias de julho de 1941, o Batalhão Nachtigall,


composto quase inteiramente de ucranianos sob a direção da Gestapo, mas-
sacrou sete mil judeus nas cercanias de Lvov. Antes de sua execução, pro-
fessores, advogados e médicos judeus foram obrigados a lamber todos os
degraus de quatro prédios e a carregar lixo na boca de casa em casa. De-
pois os forçaram a passar por homens usando braçadeiras azuis e douradas
(coincidentemente as cores da República de Petliura), foram baionetados
à morte no que foi oficialmente chamado de Aktion Petliura. [3]

Sob a panelinha nacionalista banderista posando como governo, muitos


dos escritores, intelectuais e professores não-judeus de Lvov conhecidos por
serem hostis ao nazismo também foram massacrados. Há, por exemplo, o des-
tino do Dr. Taras Maliarchuk, um cirurgião ucraniano: “Nº 516; cirurgião;
afogado na banheira; sua esposa estuprada na presença de suas crianças e de-
pois baionetada; sua filha Maria de cinco anos foi jogada por uma janela e seu
200 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

filho de três anos Mikhailo foi baleado com uma pistola Browning de baixo
calibre.” [4]
Uma sobrevivente judia ucraniana de Kolomija descreveu a barbárie dos
nacionalistas ucranianos. “O momento em que os alemães entraram, [...] [os
nacionalistas ucranianos] vestiram braçadeiras brancas [...] e começaram uma
matança.” Escondido num bunker com outras 17 pessoas, ela se lembra:
Ouvimos um tiro bem perto. Depois uma garota e eu subimos silencio-
samente do porão [...] Olhamos em volta, saímos, havia uma mulher
grávida caída. Seu bebê ainda se mexia nela. Ela não falava, mas ela
ainda estava viva. Depois ouvimos algo se aproximar. Saímos correndo
[...] Quando subi do bunker naquele segundo dia [...] e olhei pela janela
para ver o que estava acontecendo, a imagem que vi nunca será apagada
da minha mente. Dez ou doze policiais ucranianos andando com suas bo-
tas altas de couro; todos cobertos de sangue. Eles foram ao poço que ficava
no final da nossa rua para lavar o sangue. [5]
O historiador Reuben Ainsztein registrou a ajuda generalizada e volun-
tária dada pelos nacionalistas ucranianos aos extermínios nazistas na Ucrânia
ocidental. No seu clássico Jewish Resistance in Nazi-Occupied Eastern Eu-
rope, ele afirma que no começo da ocupação nazista, os dirigentes da OUN:
Stetsko e Bandera proclamaram a criação de uma “Ucrânia livre” e or-
ganizaram uma forte milícia de 31.000 homens [...] A milícia teve um
papel importante em tornar possível que o Einsatzkommando executasse
suas tarefas de genocídio e terror até meados de agosto [de 1941] [...] A
milícia foi então dissolvida e 3.000 feridos foram autorizados a entrar na
polícia auxiliar ucraniana, que deveria desempenhar um papel tão abo-
minável na aniquilação dos judeus no Leste Europeu. [6]
Nos primeiros oito meses da ocupação nazista da Ucrânia Ocidental, 15%
dos judeus galícios - 100.000 pessoas - foram massacrados pelas ações conjun-
tas dos alemães e dos nacionalistas ucranianos. [7] Um sobrevivente judeu-
canadense e condecorado partisan antinazista Nahum Kohn descreve o pa-
pel fascista ucraniano no holocausto na região da Volínia da Ucrânia: “[...]
quando judeus eram massacrados, quatro ou cinco alemães participariam, ‘aju-
dados’ por 100 ou 200 nacionalistas ucranianos. Quando a Ucrânia foi pra-
ticamente Judenrein [“limpa de judeus”], a Banderovtsy (OUN-Bandera) se
voltou para os seus vizinhos poloneses.” [8] Na sua autobiografia, Kohn des-
creve como seus guerrilheiros vieram ao resgate dos habitantes poloneses de
Pshebrazhe, violentados pelos fascistas Banderistas que massacraram 40% dos
moradores. [9]
CAPÍTULO 9: COLABORAÇÃO E CONSPIRAÇÃO| 201

Os perpetradores nacionalistas ucranianos dos pogroms contra os judeus


- tanto antes da guerra quanto principalmente durante a guerra - são retrata-
dos num tom um tanto diferente nas publicações dos nacionalistas ucranianos
propagando o mito da fome-genocídio.
O primeiro capítulo do Black Deeds of the Kremlin é aberto com um re-
trato de página inteira honrando o líder pogromista da Ucrânia Nacionalista
(1918-1919), Simon Petliura. Descrito pelo historiador Gerald Reitlinger as
“[...] um dos heróis nacionais mais dúbios de todos os tempos”, Petliura foi
expulso da Ucrânia Soviética pela revolução e se juntou aos intervencionistas
estrangeiros contra a URSS. [10] Esperando levar de volta seu grupo naciona-
lista pelas baionetas de tropas estrangeiras, ele fez um acordo com a Polônia
que entregou a Ucrânia ocidental (Galícia) aos poloneses através do tratado
de 21 de abril de 1920. [11] O historiador de orientação nacionalista John J.
Reshetar admite que “enquanto curtia a hospitalidade dos poloneses durante
o inverno de 1919-1920, Petliura se encontrou com Pilsudski e se convenceu
de que o único meio de obter o apoio dos Aliados, e mais especificamente da
França, era se tornando um satélite da Polônia.” [12]
Remanescentes dos nacionalistas de Petliura acompanharam a invasão da
Ucrânia Soviética pelos poloneses apoiados pelos franceses, que foi decisiva-
mente derrotada pelos bolcheviques. Os poloneses mantiveram-se na Ucrânia
ocidental, e Petliura se exilou na França. Sobre esse dito líder, mesmo seu co-
lega Volodymyr Vynnychenko relembra: “[...] [um] maníaco doentiamente
ambicioso, encharcado até os ouvidos no sangue dos judeus pogromizados,
politicamente analfabeto, disposto a aceitar qualquer reação para preservar seu
poder.” [13]
Assassinado pelo judeu Sholem Schwartzbard em Paris em 1926 como vin-
gança pelo massacre de dezenas de milhares de judeus pelo exército do governo
de Petliura, [14] ele era o símbolo usado pelos nacionalistas para vingar seus
“grandes cavaleiros”. Em julho de 1941 em Lvov, os nacionalistas da OUN
declararam um “Dia de Honra pela Memória de Petliura” e deixaram as ruas
vermelhas com o sangue das vítimas judaicas. Como afirma a historiadora do
holocausto Lucy Davidowicz:
Em Lvov os alemães e ucranianos [nacionalistas], em caçadas porta-a-
porta por judeus, os baleavam aleatoriamente no local. Vingando com
atraso o assassinato [...] de Petliura, um notório antissemita [...] os ucra-
nianos executaram gigantescos pogroms, massacrando milhares e levando
outros milhares de judeus para os quartéis do Einsatzgruppen. Dentro de
horas ou dias, aqueles judeus que tinham sido levados foram metralha-
dos em massa em alguma área desolada remota. O desastre foi épico [...]
202 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

[15]

Outro tributo de página inteira do Black Deeds honra o “Major” nazista


e assassino Roman Shukhevych, comandante do sanguinário Batalhão Nach-
tigall. [16] Seguindo a reorganização das suas tropas como batalhões Schutz-
mannschaft nazistas no verão de 1941, Shukhevych, sob direção nazista, li-
derou seus homens à Bielorrússia para massacrar guerrilheiros, judeus e cam-
poneses. Mais para frente na guerra, esse ganhador da Cruz de Ferro nazista
comandou o Exército Insurgente Ucraniano (UPA), que Ainsztein descreve
como “os inimigos mais perigosos e cruéis de judeus sobreviventes, campone-
ses poloneses e colonos, e todos os guerrilheiros antialemães”. [17]
Também são venerados no Black Deeds um número de clérigos que apoi-
aram os nazistas, abençoaram as unidades ucranianas da SS, ou que de outras
formas facilitaram politicamente a ocupação nazista. Diferente de Skrypnyk
(Bispo Mystyslav) ou do Padre Vasyl Laba (que se estabeleceu em Edmonton),
o Metropolitano Andrei Sheptytsky e Josyp Slipyi não conseguiram fugir do
país com a retirada alemã; eles são honrados no Black Deeds com retratos. [18]
O historiador pró-nacionalista John Armstrong observa: “[...] [Sheptytsky]
favoreceu pessoalmente a criação da Divisão Galícia [14ª Waffen-SS], e man-
dou um dos seus clérigos, o Dr. Laba, para atuar como capelão chefe. O Bispo
Joseph Slipyi conduziu um serviço na Catedral de São Jorge em Lvov, cele-
brando a inauguração da Divisão.” [19]
Sobre a captura de Kiev, o Metropolitano Sheptytsky mandou a seguinte
mensagem para Hitler:

Como chefe da Igreja Católica Grega Ucraniana eu mando à vossa exce-


lência minhas sinceras felicitações sobre a ocasião da ocupação da capital
da Ucrânia, a cidade da cúpula dourada sobre o Dnieper - Kiev! [...] Ve-
mos em você o líder invencível do glorioso e insuperável Exército Alemão.
A causa da destruição e erradicação do bolchevismo que você como Führer
do Grande Reich Alemão tomou como o objetivo dessa campanha assegura
à Vossa Excelência a gratidão de todo o mundo cristão. A Igreja Católica
Grega Ucraniana sabe o significado histórico do poderoso progresso da Na-
ção Alemã sob a sua liderança [...] Devo orar a Deus para que Ele abençoe
a vitória que deve ser a garantia de paz duradoura para a sua Excelência,
o Exército Alemão e a Nação Alemã. [20]

Como os policiais fascistas lavando suas botas no poço, os nacionalistas


ucranianos da Banderivtsy, das unidades da SS, das milícias auxiliares, etc. são
confrontados com o problema da lavagem do sangue derramado durante a
CAPÍTULO 9: COLABORAÇÃO E CONSPIRAÇÃO| 203

ocupação nazista. Muitos milhares que fugiram para a Alemanha e outros lu-
gares, após a retirada dos exércitos nazistas, tiveram que encobrir sua culpa
pessoal e coletiva no holocausto e na traição de seu país. Há de fato uma ten-
tativa consciente de disfarçar o passado dessas pessoas, e de distorcer a história
do papel dos nacionalistas ucranianos no holocausto nazista. Esses encobri-
mentos são subtemas nas campanhas da fome-genocídio, pois a credibilidade
das alegações de fome-genocídio é destruída por associação direta com cola-
boração e atrocidades na época da guerra. Por exemplo, durante um simpósio
de professores em Winnipeg em 1984, no qual falava da “fome-genocídio”, Ja-
mes Mace foi perguntado por que ele pensava que os nacionalistas ucranianos
apoiaram Hitler e a invasão nazista da Ucrânia. Mace respondeu que eles apoi-
aram Hitler apenas por um breve período no início da guerra. [21]
Mas a relação entre o nazismo alemão e o nacionalismo ucraniano não foi
uma breve lua-de-mel. Ambos representavam formas de nacionalismo extre-
mista que no final da década de 1920 alcançaram alguns fundamentos ideo-
lógicos comuns. Dois documentos dos anos 1920 indicam a direção do pe-
ríodo de transição do nacionalismo ucraniano. O primeiro é o Decálogo (De-
kaloh), os dez mandamentos do nacionalismo ucraniano. Originalmente pu-
blicado no Surma em 1929, todos os membros da Organização dos Naciona-
listas Ucranianos tinham de memorizá-lo:
Consiga um Estado Ucraniano ou morra em batalha por ele.
Não permita que ninguém difame a glória ou a honra da Sua Nação.
Lembre-se dos Grandes Dias dos nossos esforços.
Tenha orgulho do fato de Você ser um herdeiro da luta pela glória do Tri-
dente de Volodymyr.
Vingue a morte dos Grandes Cavaleiros.
Não fale da causa com quem quer que seja possível, mas apenas com quem
quer que seja necessário.
Não hesite em cometer o maior crime, se o bem da causa o demanda.
Considere os inimigos da Sua Nação com ódio e perfídia.
Nem pedidos, nem ameaça, nem tortura, nem a morte podem obrigar
Você a revelar um segredo.
Aspire a expandir a força, os cumes e o tamanho do estado ucraniano,
mesmo por meio da escravidão de estrangeiros. [22]
Similarmente, mas num nível mais intelectual, se encontram inconfundí-
veis noções fascistas de mistificação e “o destino” nas teses de V. Voin sobre a
“juventude com pensamento de Estado”:
204 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

O atributo mais claro de uma pessoa no universo é sua habilidade de do-


minar seus ambientes vivos e não vivos, mesmo no tempo e no espaço. In-
divisíveis em sua essência, ideias e ações, quando executadas sistematica-
mente, são meios para (esse) domínio. Além delas há apenas o caos. A
eterna luta com o caos é a tarefa básica da pessoa. O ideal é a eventual
subjugação do caos pela pessoa.

O maior imperativo para ucranianos, a luta pela perfeita nação ucra-


niana, é simultaneamente uma luta contra o caos nas esferas familiar e
social. Essa luta só é possível com o treinamento de líderes, que governa-
rão sistematicamente sobre essas esferas, sem nenhum remorso em destruir
tudo que for hostil dentro deles próprios e no seu ambiente. A criação de
tais líderes é a tarefa básica da Nação. O ideal é uma Nação, onde o in-
divíduo existe somente para a Nação em nome da sua perfeição [...]

11. O caráter da organização da juventude ucraniana deve corresponder


ao caráter da nação ucraniana. A organização mais fundamental e mais
famosa, instintivamente aceita por todo mundo na Ucrânia, é a militar,
louvada em músicas e canções [...] [23]

O pesquisador Alexander J. Motyl comenta:

Esse extremismo de Voin provavelmente não era atípico pois a Liga é suge-
rida por uma declaração pública liberada pela LUN [League of Ukrai-
nian Nationalists] no final do verão de 1926. “[...] a única forma possível
de domínio estatal, no começo e sob as presentes condições, pode ser uma di-
tadura de grupos de patriotas-nacionalistas ucranianos organizados, que
têm tendências de pensamento de Estado, [uma ditadura] que deveria
ser realizada na pessoa daquele vozhd [führer] nacional que vai organi-
zar e completar a liberação do povo ucraniano.” [24]

No final dos anos 1920, a liderança dos nacionalistas ucranianos exilados


se agrupou em torno da Organização dos Nacionalistas Ucranianos (OUN),
sob o vozhd∗ Eugene Konovalets. Estabelecido em 1927, a OUN se baseou
na Liga dos Nacionalistas Ucranianos, que tinha sido formado em 1925 numa
convenção conjunta da União dos Fascistas Ucranianos, da Federação Nacio-
nalista Ucraniana e da União pela Libertação da Ucrânia. O órgão da OUN,
Rozbudova Natsii, trai as evidências de antissemitismo que era generalizado
no movimento nacionalista ucraniano: “[...] Ucrânia está ameaçada pelos ju-
deus. Eles não só nos fizeram muito mal, mas [...] continuarão a nos fazer mal
CAPÍTULO 9: COLABORAÇÃO E CONSPIRAÇÃO| 205

enquanto os ucranianos falharem em aplicar os meios necessários para a auto-


defesa.” [25]
Durante os anos 1930, o aspecto fascista da OUN foi complementado por
uma campanha de terror e assassinatos na Polônia, [26] táticas indicadas no
jornal nacionalista ucraniano Meta: “[...] O nacionalismo ucraniano deve es-
tar preparado para aplicar qualquer método de luta contra o comunismo, sem
excluir o extermínio físico em massa, mesmo que este último implique no sa-
crifício de milhões de vidas.” [27]
Mesmo antes, em novembro de 1930, o jornal da OUN Rozbudova Natsii
proclamou: “Devemos ser impiedosos naquele grande dia que certamente virá
[...] Não deve haver piedade com os jovens nem com os velhos.” Não surpre-
ende que em janeiro de 1932 o Conselho da Liga das Nações marcou a OUN
como uma organização terrorista.
A afinidade entre o nacionalismo ucraniano e o nazismo não estava confi-
nada na Europa. No Canadá, o antissemitismo, o louvor a Hitler, o racismo
e o fascismo eram expressos abertamente nos jornais nacionalistas ucranianos
nos anos 1930. Em Winnipeg uma edição na língua ucraniana do infame an-
tissemita Protocols of the Elders of Zion foi publicada em 1934 e reimpressa
em 1959. A seguinte passagem pode ser encontrada na postagem de outubro
de 1938 do Church Life, órgão dos católicos ucranianos em Winnipeg:

O maior homem no presente momento é Adolph Hitler. Ele mudou o


mapa da Europa e uniu todos os alemães em um estado [...] Junto com
Mussolini ele tem resistido à invasão bolchevista da Europa, pisado no pes-
coço dos bolcheviques na Espanha e declarado que eles não podem avançar
para além da sua atordoada Rússia! [...] Hitler está salvando a Europa
e sua cultura dos bolcheviques.

No mesmo ano, o jornal canadense da Organização dos Hetman Unidos


(seguidores do Hetman Pavel Skoropadsky) declarou: “[...] Se tornou impos-
sível para os nacionalistas franceses se chamarem de franceses. O próprio nome
convida o ataque dos Yids [judeus]. Bilhões de dólares Yids estão sendo mo-
bilizados para a pacificação dos gois [gentios] europeus [...]” [28] Na mesma
linha, o Novy Shliakh (Novo Caminho), a voz da facção de Melnyk da OUN
de Winnipeg, a Federação Nacional Ucraniana, publicou:

Na Rússia, terroristas Yid mataram 28 bispos, 1.215 padres, 6.575 pro-


fessores, 8.800 médicos, 54.850 senhores dos vilarejos, 260.000 soldados,
105.000 policiais, 48.000 guardas, 12.500 chefes de polícia, 355.250 in-
telectuais, 192.000 trabalhadores, 815.000 camponeses [...] Ninguém se
206 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

opôs. Mas hoje quando judeus não foram nem açoitados, mas apenas
amedrontados, todo mundo grita. [28]
Percebe-se que enquanto ontem os supostos perpetradores de genocídio
eram rotulados de judeus, hoje o rótulo mudou para russos. Antissemitismo
tem uma longa história na ideologia nacionalista. Um exemplo especialmente
vil da literatura de ódio filonazista apareceu na edição de janeiro de 1935 do
Klich (O Chamado), publicado por Anthony Hlynka, um membro de Cré-
dito Social do parlamento de Vegreville, em Alberta. Culpava os judeus pela
fome:
Isso é o descendente dos sanguessugas que exploraram a Ucrânia.
Seus ancestrais roubaram nossos pais da última faixa de terra.
Seus ancestrais ficaram com as chaves dos nossos templos.
Seus ancestrais eram informantes contra nós.
Sua raça barrou o caminho para a formação do nosso estado.
Sua raça assassinou o líder da República Ucraniana.
Sua raça manchou perante o mundo o nome do nosso grande Chmelnitsky.
Sua raça é responsável pelo terror sem precedentes na Ucrânia.
Sua raça matou por exílios, torturas e fome não só milhões de nossos irmãos
e irmãs como também milhões de crianças inocentes da Ucrânia.
Sua raça abusou, perverteu, poluiu, corrompeu e contaminou a majestade
da Ucrânia. [30]
Sem nenhuma menção ao antissemitismo do Klich, Marunchak escreve
sobre Hlynka em The Ukrainian Canadians: A History: “Pelo seu interesse
nas condições dos refugiados, A. Hlynka logo ficou conhecido como o ‘guar-
dião da terceira [pós-guerra] imigração para o Canadá’.” [31]
O contexto ideológico do nacionalismo ucraniano foi um fator que contri-
buiu no apoio ao fascismo de Hitler. O ideólogo nacionalista ucraniano Dmi-
tro Dontsov (que foi permitido se estabelecer no Canadá depois da Segunda
Guerra Mundial) tentou justificar a tomada de poder de Hitler na Alemanha,
descrevendo as condições pré-nazistas, em parte: “O terceiro fator de decadên-
cia foi a comunidade judaica internacional que atacou o país colapsado como
gafanhotos para, junto com os vitoriosos, dele dispor livremente, para man-
char a literatura, a música e a arte teatral com os males da pornografia [...] para
manchar as artes puras com as ideias do bolchevismo.” [32] Bem relacionados
com os círculos de inteligência nazistas seguindo a tomada do poder por Hi-
tler, as visões fascistas da OUN a levaram diretamente para a aliança na guerra
CAPÍTULO 9: COLABORAÇÃO E CONSPIRAÇÃO| 207

com o Terceiro Reich: “o nacionalismo xenofóbico, antidemocrático e antis-


semita da OUN se entrosava facilmente com o nazismo”. [33]
Em seguida à morte de Konovalets em 1939, a Organização dos Naciona-
listas Ucranianos rachou em duas facções: a OUN-B, encabeçada por Stepan
Bandera, e a OUN-M liderada por Andrei Melnyk. O depoimento do oficial
da Abwehr alemão Erwin Schtolze nos julgamentos dos crimes de guerra de
Nuremberg revelou que tanto Melnyk quanto Bandera estavam na folha de
pagamentos dos nazistas antes da invasão de Hitler à União Soviética:
foi pontuado na ordem que, com o propósito de desferir um golpe relâm-
pago contra a União Soviética, Abwehr II [...] deve usar seus agentes para
acender antagonismos nacionais entre o povo da União Soviética [...] En-
trei em contato com os nacional-socialistas ucranianos que estavam no Ser-
viço de Inteligência Alemão e outros membros dos grupos nacionalistas
fascistas [...] Instruções foram dadas por mim pessoalmente aos líderes
dos nacionalistas ucranianos, Melnyk (codinome “Consul I”) e Bandera
(codinome “Consul II”) para organizarem [...] manifestações na Ucrâ-
nia a fim de perturbar a retaguarda imediata dos exércitos soviéticos [...]
Além disso, uma unidade militar especial foi treinada para atividades
subversivas em território soviético [...] [34]

Os batalhões nacionalistas ucranianos foram treinados na Alemanha antes


da guerra e alguns foram usados pelos nazistas na sua invasão de 1939 da Polô-
nia. Como diz a enciclopédia dos próprios nacionalistas: “A primeira unidade
ucraniana foi formada pela Organização dos Nacionalistas Ucranianos nas vés-
peras da Guerra Polaco-Alemã. Com uma força de aproximadamente 600 ho-
mens, consistia em antigos soldados do Sitch da Carpátia. Comandado pelo
Cel. Roman Sushko, entrou na Galícia com o Exército Alemão em setembro
de 1939.” [35]
Quando Hitler invadiu a União Soviética em junho de 1941, suas forças
incluíam os batalhões Nachtigall e Roland de nacionalistas ucranianos. Os
sangrentos relatos da carnificina de judeus e poloneses em Lvov pelo Batalhão
Nachtigall nunca serão esquecidos. A formação dessas unidades é admitida
pela enciclopédia dos nacionalistas: “Nas vésperas da Segunda Guerra Mun-
dial, como resultado do acordo entre algumas autoridades alemãs e a facção
de Bandera da OUN, dois destacamentos voluntários ucranianos (Nachtigall
e Roland) foram formados em território alemão [...] Eles fizeram parte das
operações militares do exército alemão [...] [No final de 1941] eles foram reor-
ganizados [...] no Batalhão de Polícia 201 e realocados para a Bielorrússia [...]”
[36]
208 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Vimos, portanto, que a aliança dos nacionalistas ucranianos com o na-


zismo é anterior ao “início da guerra”. Ao mesmo tempo, a aliança não acon-
teceu sem contradições. Enquanto os nacionalistas cravaram suas esperanças
nos nazistas como um veículo para ganhar o controle da Ucrânia, os fascistas
alemães não estavam inclinados a ceder parte alguma do seu poder. Unidos
pela sua oposição à União Soviética, o domínio nazista direto da Ucrânia tam-
bém apareceu como um obstáculo às ambições dos nacionalistas ucranianos.
Essa contradição foi amplamente exagerada no encobrimento pós-guerra da
colaboração e cumplicidade nacionalista com o holocausto nazista; espera-se
que a transformação retroativa do dos colaboradores “parceiros juniores” em
“patriotas antinazistas” os traga aceitação como “aliados da democracia”, para
melhor servirem à cruzada antissoviética contemporânea.
Ivan Bahryany, por exemplo, oferece o seguinte álibi no Black Deeds of
the Kremlin: “Ucranianos não são criminosos de guerra porque eles lutaram
contra Hitler e Stalin. Eles lutaram contra ambos antes da guerra e eles lutaram
contra ambos durante a guerra.” [37]
É claro que ninguém nunca alegou que os ucranianos como tais são crimi-
nosos de guerra. Afinal, a maioria dos ucranianos que estavam em condições
lutaram contra Hitler. Mas se, por ucranianos, Bahryany se refere aos nacio-
nalistas, então ele acaba condenado como mentiroso da estatura do próprio
Goebbels. Os ucranianos que lutaram contra Hitler estiveram na verdade en-
tre os principais alvos das unidades armadas dos nacionalistas.
E quem é Bahryany? Durante a ocupação nazista, ele era um dos pou-
cos escritores ucranianos autorizado a publicar seus trabalhos pela Casa Edi-
torial Ucraniana, controlada pelos nazistas. É confirmado que essa editora era
autorizada pelos nazistas no Ukraine: A Concise Encyclopaedia: “No final
de 1939, por permissão das autoridades alemãs, a Casa Editorial Ucraniana
(Ukrains’ke Vydavnytsvo) foi estabelecida em Cracóvia, em forte associação
com o Comitê Central Ucraniano. A Casa Editorial Ucraniana tinha o direito
exclusivo de publicar noticiários, jornais e livros ucranianos no ‘Generalgou-
vernement’.” [38]
Nota-se que essa colaboração começou na Polônia ocupada pelos alemães,
um ano e meio antes da invasão nazista da União Soviética. Sua autoridade foi
estendida depois para as áreas da Ucrânia ocupadas pelos nazistas, e também
lançou publicações ucranianas pró-nazistas como Volyn (1941-1944), Krakivs-
ki Visti (1940-1945), e Lvivski Visti (1941-1944), para nomear alguns. [39] Foi
uma ferramenta importante do controle político, literário e social alemão so-
bre os ucranianos que viveram sob a ocupação.
CAPÍTULO 9: COLABORAÇÃO E CONSPIRAÇÃO| 209

Buscando desesperadamente por alguma “prova” do combate antinazista,


os nacionalistas e seus apologistas alegam que o Exército Insurgente Ucraniano∗
(UPA) era na verdade um “exército de libertação nacional” patriota que lutou
para expulsar os nazistas do território da Ucrânia ocidental. O Instituto Ca-
nadense de Estudos Ucranianos da Universidade de Alberta - editor da versão
canadense do Harvest of Sorrow de Conquest - publicou um livro no qual o
UPA da OUN-Bandera é até descrito como estando no mesmo nível da Re-
sistência Francesa. [40] Ihor Kamenetsky, outro exemplo, declara no Hitler’s
Occupation of Ukraine que o “movimento guerrilheiro [dos nacionalistas] na
Ucrânia teve uma influência considerável no enfraquecimento dos esforços de
guerra alemães no Leste.” [41] Na realidade, os assim chamados “guerrilhei-
ros” do UPA aliviaram a pressão das linhas de frente nazistas ao ajudar a limpar
os guerrilheiros soviéticos e a proteger as áreas de abastecimento e ocupação da
retaguarda alemã.
Vamos examinar a tecelagem com a qual autores como Kamenetsky ten-
tam tecer seu disfarce histórico. Kamenetsky utiliza invenções sobre confron-
tos entre o UPA da OUN-Bandera e os nazistas. Por exemplo, ele alega que
o Chefe de Gabinete das SA alemãs, Victor Lutze, foi morto por um destaca-
mento do UPA na estrada entre Kovel e Brest em maio de 1943. [42] O fato de
outros historiadores nacionalistas darem locais diferentes e contraditórias para
o suposto assassinato de Lutze não acrescenta na credibilidade dessa invenção
pós-guerra.
A verdade desse assunto é que Lutze foi ferido num acidente de carro perto
de Berlim e morreu num hospital em Potsdam a centenas de quilômetros de
onde os nacionalistas alegaram que o UPA o tinha matado. [43] De acordo
com os diários de Goebbels, o funeral de Lutze contou com a presença de
Hitler, Goebbels e outros nazistas do alto escalão. Como consequência do
acidente de Lutze, escreve Goebbels, Hitler alertou os dirigentes alemães que
carros com placas do partido nazista devem limitar sua velocidade a oitenta
quilômetros por hora. [44]
Em outro lugar, Kamenetsky insinua que uma ofensiva antipartisan alemã
em Volyn foi dirigida contra o UPA nacionalista:
Na grande ação no verão de 1943, conduzida pelo General da SS Bach-
Zelewsky contra os guerrilheiros ucranianos em Volnia e Polyssa, 50 tan-
ques [...] e quase 10.000 alemães e polícias auxiliares foram usados. So-
mado a isso, alguns destacamentos húngaros e batalhões de voluntários do
leste participaram. [48]

Embora seja verdade que os “guerrilheiros” nacionalistas da UPA lutaram


210 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

em Volyn nesse período, eles não estavam combatendo os nazistas. Reuben


Ainsztein escreve:

Foi então que [o líder guerrilheiro soviético] Aleksei Fyodorov-Chernigovs-


kiy chegou com a sua brigada da região de Chernigov na área onde a
brigada Brinskiy estava operando. Em algumas semanas Fyodorov con-
verteu aquela parte de Volyn em território guerrilheiro onde os alemães
perderam todo o controle e começaram sua campanha sistemática contra
a rede ferroviária num tempo em que a batalha de Kursk alcançava seu
clímax. Os alemães reuniram uma força de 15.000 composta por tropas
da SS e da Wehrmacht, Lituanos, unidades de Vlasov e polícia ucrani-
ana, assim como 5.000 nacionalistas ucranianos, e em agosto lançaram
uma operação massiva contra os guerrilheiros [...]

Enquanto Fyodorov aguentava o peso do combate contra os alemães, a


brigada de Brinskiy recebeu a tarefa de se encarregar dos batalhões do
Exército Guerrilheiro Ucraniano [UPA], que, apoiados por bombardeiros
e baterias de morteiros alemães, tentavam empurrar os guerrilheiros para
a emboscada preparada pelos alemães. [48]

Compostos de criminosos e algozes, antigos membros da odiada polícia


ucraniana, guardas de segurança, homens da SS e Legionários fascistas, o UPA
e outras gangues nacionalistas certamente não eram “conhecidos” pelo seu
combate antinazista. Como afirma Ainsztein:

Seguras da assistência alemã em armas e, quando necessário, cooperação


militar aberta, as gangues do UPA, que ficaram conhecidas como as Ban-
derovtsy, se provaram sob o comando de Shukhevych, agora conhecido como
Taras Chuprynka, o inimigo mais perigoso e cruel dos sobreviventes ju-
deus, camponeses poloneses e colonos, e todos os guerrilheiros antialemães.
[...] O fanatismo e a loucura nacionalista da Banderovtsy, Bulbovtsy e
outras gangues nacionalistas ucranianas atingiram profundidades que
pareciam incríveis mesmo para guerrilheiros soviéticos e judeus, cuja ca-
pacidade de se horrorizar com o que o homem pode fazer com o homem
já estava calejada pelas suas experiências diárias da Nova Ordem na-
zista. O guerrilheiro judeu Bakalczuk-Felin [...] nos deixou uma des-
crição de vilarejos poloneses inteiros destruídos, seus habitantes invaria-
velmente torturados e estuprados antes de serem massacrados com facas e
machados, os bebês assassinados com o mesmo tipo de selvageria que foi a
sina de crianças judias. [47]
CAPÍTULO 9: COLABORAÇÃO E CONSPIRAÇÃO| 211

A tarefa de Kamenetsky e a sua turma de tentar transformar os auxilia-


res e terroristas ucranianos de Hitler em guerrilheiros antinazistas não é nada
invejável. Mas então essa não é a primeira vez que encontramos tal duplici-
dade nos retratos nacionalistas ucranianos da sua história. Sem surpresa - e re-
manescente da pesquisa demonstrada nas alegações da fome-genocídio - dois
terços das “evidências” para as asserções de Kamenetsky vieram de colegas ide-
ológicos. Das 49 referências no Capítulo 5 do Hitler’s Occupation of Ukraine
usadas para substanciar o suposto papel antifascista do UPA, não menos que
28 vêm do apologista dos nacionalistas Krypyakevich e 5 do antissemita Petro
Mirchuk. [48]
Semelhantemente distorcido - senão ignorado em silêncio como por Mace∗
- é o papel da 14ª Divisão Galícia da Waffen SS (também conhecida como Di-
visão Halychyna). Formada em 1943 com apoio da OUN-Melnyk e recons-
truída depois da sua esmagadora derrota em Brody em 1944, a principal fun-
ção da 14ª Divisão da Waffen SS era o trabalho antipartisano brutal em alguns
países. Os nacionalistas ucranianos e seus apologistas geralmente buscam dar
a impressão de que a Divisão Galícia, diferente de outras unidades da Waffen
SS, era quase uma organização patriótica de escoteiros sem nenhuma amarra-
ção política com a causa nazista. A história mostra outra coisa. No seu apelo
de maio de 1943 para os galícios se juntarem a essa unidade da SS, Volodymyr
Kubijovych afirmou:
O momento tão esperado chegou quando o povo ucraniano tem novamente
a oportunidade de pegar em armas para dar batalha para seu adversário
mais cruel - o bolchevismo moscovita-judaico. O Führer do Grande Reich
Alemão concordou com a formação de uma unidade militar voluntária
ucraniana sob o nome de Divisão “Halychyna” de Fuzileiros da SS [...]
Você deve ficar ombro a ombro com o imbatível exército alemão e destruir,
de uma vez por todas, o monstro judaico-bolchevique. [49]
Citando os discursos de Himmler contidos nos arquivos do US National
Archives, o Escritório Canadense do Centro Simon Wiesenthal descreve o re-
pulsivo registro dessa unidade da SS:
Em 16 de maio de 1944, o Chefe da SS Heinrich Himmler congratulou
os oficiais da 14ª Divisão (Nº 1 Galícia) da Waffen SS por ter melhorado
a bela paisagem ucraniana ao se livrar de seus judeus. Himmler acres-
centou que ele estava ciente de que nada agradaria mais à divisão do que
submeter ao mesmo tratamento os poloneses, mas o timing dessa ação seria
decidido por Hitler, o homem a quem eles haviam jurado absoluta obedi-
ência. [50]
212 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Cartaz de recrutamento para a 14ª Divisão da Waffen SS. No Canadá, a organização dos anti-
gos membros da 14ª Divisão da Waffen SS se chama Brotherhood of Former Combatants, First
Ukrainian Division, Ukrainian National Army [“Irmandade dos Antigos Combatentes, Pri-
meira Divisão Ucraniana, Exército Nacional Ucraniano”], e é filiada ao Ukrainian Canadian
Committee [“Comitê Canadense Ucraniano”].
CAPÍTULO 9: COLABORAÇÃO E CONSPIRAÇÃO| 213

Osyp Nawrocky (primeiro à direita), ex-chefe dos terroristas do pré-guerra da Organização Mi-
litar Ucraniana e durante a Segunda Guerra Mundial, membro do Estado Maior da 14ª Di-
visão da Waffen SS, posa com oficiais nazistas durante a ocupação alemã da Ucrânia. Tendo
escapado para o ocidente depois da guerra, Nawrocky morou em Winnipeg e teve uma posição
de liderança no Comitê Canadense Ucraniano.

A 14ª Waffen SS, liderada por oficiais nazistas do topo até praticamente o
nível da companhia, sem nenhum comando nacionalista ucraniano indepen-
dente, foi fundamental para dar treinamento militar ao UPA. Isso só poderia
ter acontecido com o planejamento, conhecimento e aprovação do comando
da SS e dos oficiais alemães que lideravam a divisão. De fato, certos histori-
adores nacionalistas admitem abertamente que o UPA foi assistido pela 14ª
Waffen SS. Wasyl Veryha, um veterano da SS e historiador da Divisão em To-
ronto, escreveu na Visti Combatanta (uma revista de veteranos ucranianos da
SS):
Ao lembrar dos fatos bastante conhecidos de que o pessoal treinado na di-
visão [14ª Waffen SS] havia se tornado a espinha dorsal do UPA, deve
ser mencionado que o comando do UPA também mandou grupos de seu
pessoal à divisão para receber treinamento militar adequado [...] Isso re-
forçou o UPA que foi deixado na terra natal [depois da retirada dos na-
zistas], principalmente seus comandantes e instrutores. [51]
214 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Zum Sieg, órgão semanal da 14ª Divisão da Waffen SS. A edição acima inclui a mensagem de
Ano Novo de Adolph Hitler, que afirma numa parte: “O judaísmo internacional conduz essa
guerra para colocar a Europa e a Inglaterra ao bolchevismo.”

A visão do UPA como uma ferramenta nazista parece ser compartilhada


por certas seções entre os nacionalistas. Talvez na esperança de se distanciar dos
registros sanguinários do UPA, a publicação nacionalista Ukrainskyi Samosti-
CAPÍTULO 9: COLABORAÇÃO E CONSPIRAÇÃO| 215

inyk admitiu que o UPA “foi influenciado e formado após o padrão nazista”, e
“adquiriu toda a mentalidade nazista”. Além disso, ele “não era uma unidade
de combate do povo ucraniano, mas meramente uma Waffen SS ucraniana da
OUN”. [52]
O serviço dos nacionalistas ucranianos ao Terceiro Reich de Hitler não
acabou com a expulsão dos nazistas da Ucrânia em 1944. Como revelou o
oficial nazista Schtolze nos julgamentos de crimes de guerra de Nuremberg:
Durante a retirada das tropas alemães da Ucrânia, Kanaris instruiu
pessoalmente a Abwehr para estabelecer uma rede secreta para continuar
a luta contra o poder soviético na Ucrânia, para organizar atos de terro-
rismo, subversão e espionagem. Agentes competentes foram deixados espe-
cialmente para dirigir o movimento nacionalista. Foram dadas ordens
para instalar esconderijos, para armazenar munições, etc. Para manter
a ligação com essas bandas, agentes foram enviados para cruzar a linha
de frente. [53]

Além disso, o historiador americano John Armstrong (normalmente sim-


pático aos nacionalistas) admite que depois que os alemães foram expulsos da
Ucrânia e continuaram até o início de 1945, “agências militares alemães” lan-
çaram de aviões suprimentos para unidades do UPA, “[...] o que a maioria
dos oficiais alemães de então consideraram como um útil prejuízo às linhas de
abastecimento soviéticas”. [54]
Como vimos, a colaboração entre os nazistas e os nacionalistas ucranianos
começou bem antes da guerra e continuou durante a guerra, e mesmo depois
dos alemães terem sido completamente expulsos do território ucraniano. Os
nacionalistas estavam firmemente fechados na máquina de ocupação nazista.
Sua polícia e unidades punitivas assassinaram em massa judeus assim como
ucranianos. Um grande número de ucranianos também foi capturado, com
a ajuda de colaboradores ucranianos, para serem enviados para a Alemanha
como trabalhadores escravos. Milhares de ações foram executadas pelas milí-
cias nacionalistas, SB, UPA e unidades de polícia ucranianas, frequentemente
sob supervisão alemã. Tropas recrutadas por nacionalistas serviram a Hitler na
Ucrânia, Polônia, Bielorrússia, Tchecoslováquia, Hungria e Iugoslávia. Co-
laboradores ucranianos ajudaram no assassinato de centenas de milhares em
campos de extermínio como Treblinka, Sobibor, Yanowska e Trawniki. [55]
Tal era a “luta antinazista” daqueles a quem os nacionalistas hoje apresen-
tariam como “lutadores da libertação nacional”, “heróis do povo ucraniano”
e “patriotas que lutaram por uma Ucrânia livre”.
CAPÍTULO 10:
CRIMINOSOS DE GUERRA,
ANTISSEMITISMO E A
CAMPANHA DA
FOME-GENOCÍDIO
Foram em vão as esperanças dos nazistas e nacionalistas. A derrota e a re-
tribuição se aproximaram como um redemoinho vindo do leste. Fugindo da
ofensiva soviética com os alemães em retirada, os colaboradores nacionalistas
rumaram para o oeste.
Depois da vitória dos Aliados sobre a Alemanha nazista, milhares de pes-
soas deslocadas pela guerra se reuniram em campos de refugiados na Europa
aguardando reassentamento. Muitos buscaram começar uma nova vida na
América do Norte, Austrália e outros países. Grande parte deles eram colabo-
radores ativos que estavam em perigo de serem identificados e levados à justiça.
Os aliados concordaram em examinar os refugiados e prender os suspeitos de
crimes de guerra.
Contudo, mal havia terminado a Segunda Guerra Mundial quando uma
nova guerra estava em preparação. Já em 1945, a administração dos EUA pla-
nejava um primeiro ataque contra a URSS e os colaboradores nacionalistas
também desempenharam um papel nos seus planos e preparação de guerra.
O período pós-guerra introduziu novos elementos na campanha da fome-
genocídio dos nacionalistas, por exemplo o seu uso por alguns para desviar
investigações de criminosos de guerra. O antissemitismo, velha característica
de algumas seções da comunidade nacionalista - foi atenuado, mas continua
a aparecer. Como nos anos 1930, a campanha atraiu o apoio da direita mais
ampla. A campanha é uma forma específica de esforço geral para avançar uma
política externa de confrontação com a URSS, sem excluir a guerra nuclear. A
ascendência da direita americana, representada pela administração Reagan dos
anos 1980, não coincidentemente proclamou um renascimento e elevação da
campanha da fome-genocídio a novos patamares. A campanha dos anos 1980
tem suas raízes em parte nos desenvolvimentos dos primeiros anos pós-guerra.
Como detalhado no The Belarus Secret [“O segredo da Bielorrússia”] de
John Loftus (antigo advogado do Escritório de Investigações Especiais do De-
218 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

partamento de Justiça dos EUA), as agências de inteligência ocidentais aju-


daram a limpar colaboradores nazistas para a emigração para novas terras em
troca de nova colaboração. Um papel particularmente importante foi desem-
penhado pelo Escritório de Coordenação Política [OPC, sigla em inglês do
Office of Policy Coordination] da administração dos EUA encabeçado por
Frank Wisner: “A IRO ([sigla em inglês da] Organização Internacional dos
Refugiados) assim como a Comissão de Refugiados dos EUA há muito con-
sideravam os nazistas ucranianos como inelegíveis para vistos e colocaram suas
organizações na ‘lista inimiga’; mas isso não deteve Wisner.” [1] Numa ten-
tativa de abrir os portões para ucranianos e outros colaboradores, Wisner afir-
mou: “A OUN (Organização dos Nacionalistas Ucranianos) e o exército guer-
rilheiro criado em 1942 (sic), UPA, lutaram amargamente tanto contra os ale-
mães quanto contra os russos soviéticos.” [2] Aqui se vê a tese do “combate
antinazista” dos nacionalistas numa de suas primeiras formas - uma história
de encobrimento usada pela inteligência americana para passar clandestina-
mente nazistas ucranianos e outros nazistas do Leste Europeu para os Estados
Unidos após a guerra. Loftus comenta:
Isso foi completamente fabricado. O CIC (Corpo de Contrainteligência
dos EUA) tinha um agente que fotografou onze volumes dos arquivos se-
cretos internos da OUN-Bandera. Esses arquivos mostram claramente
como a maioria dos seus membros trabalharam para a Gestapo ou para
a SS como policiais, executores, caçadores de guerrilheiros e funcionários
municipais. A contribuição da OUN aos esforços de guerra alemães foi
significante, incluindo o recrutamento de voluntários para várias divi-
sões da SS. Foi precisamente por causa do seu trabalho com os nazistas que
Wisner queria contratar a OUN para as suas forças especiais. [3]
A carta de Wisner em nome dos fascistas da OUN teve sucesso em “con-
vencer” os funcionários da imigração a tirar a organização OUN-Bandera da
“lista inimiga”.
Quando a Lei de Refugiados expirou em 1952, 400.000 imigrantes vi-
eram para os Estados Unidos. Entre eles estavam importantes colabora-
dores nazistas da Bielorrússia, da Ucrânia [...] incluindo o núcleo das
“forças especiais” de Wisner. Durante o mesmo período de quatro anos, o
OPC de Wisner desfrutou de liberdade de ação praticamente ilimitada e
cresceu a ponto de estar consumindo mais da metade do orçamento anual
da CIA. O exército privado de Wisner lançou uma guerra não declarada
contra a União Soviética. Ele desafiou a proibição do Congresso de acei-
tar nazistas; ele desviou fundos do governo para comprar armas para ex-
terroristas nazistas; e ele obstruiu a justiça ao abrigar fugitivos criminosos
CAPÍTULO 10: CRIMINOSOS DE GUERRA, ANTISSEMITISMO E A CAMPANHA DA FOME-GENOCÍDIO| 219

de guerra que tinham sido denunciados pelo Tribunal de Nuremberg, pe-


las Nações Unidas e pelo Congresso dos Estados Unidos. [4]

Frank Wisner e o Escritório de Coordenação Política não operaram, con-


tudo, por fora do plano geral da administração dos EUA para a guerra contra a
União Soviética. Documentos desclassificados da Junta dos Estados-Maiores
dos EUA e do Conselho Nacional de Segurança delineiam os preparativos
americanos para a guerra, incluindo a disposição para o primeiro uso de ar-
mas nucleares. [5] A Diretiva 4/A do Conselho de Segurança Nacional de
dezembro de 1947 esboça as direções das atividades secretas. A guerra psico-
lógica incluía “[...] primeiramente atividades relacionadas à mídia, incluindo
publicações anônimas, falsificações e subsídios a publicações; a ação política
envolvia a exploração de pessoas expropriadas e desertores e apoio a partidos
políticos; as atividades paramilitares incluíam apoio a guerrilhas e sabotagem;
as atividades econômicas consistiam em operações monetárias.” [6]
Colaboradores “limpos” do Leste Europeu foram colocados para traba-
lhar na Radio Free Europe, Radio Liberty, na Voice of America e em escolas
para treinar funcionários da inteligência dos EUA em línguas do Leste Eu-
ropeu. [7] Alguns foram treinados para operações de sabotagem dentro da
União Soviética. [8] Outros foram empregados como “testemunhas vivas do
terror comunista” no condicionamento psicológico do povo americano para
a guerra contra a URSS. [9] A “fome-genocídio” ucraniana foi apenas um de
muitos temas. Seus interesses coincidiam com aqueles do governo dos EUA.
George Kennan escreve em suas memórias:

Foi a existência em nosso país de um elemento vocal e não sem influência


que não só queria a guerra com a Rússia, mas tinha uma ideia muito
clara do propósito pelo qual, em sua própria opinião, tal guerra deveria
ser travada. Tenho em mente os fugitivos e imigrantes, a maioria recen-
tes, das partes não-russas da União Soviética do pós-guerra, assim como
de alguns dos estados satélites do Leste Europeu. A ideia deles, à qual eles
estavam apaixonadamente e às vezes impiedosamente ligados, era sim-
plesmente que os Estados Unidos deveriam, para o seu benefício, travar
uma guerra contra o povo russo para atingir a dissolução final do estado
russo e o estabelecimento deles próprios como os regimes dos vários terri-
tórios “libertados” [...] Eles às vezes apelavam com sucesso ao sentimento
religioso e, ainda mais importante, à histeria anticomunista dominante.
Uma ideia do poder político que eles possuíam pode ser tida pelo fato de que
alguns anos depois (1959) eles puderam recomendar ao Congresso, através
de seus amigos lá, o texto de uma resolução - a chamada Captive Nations
220 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Resolution [“Resolução das Nações Cativas”] - cada palavra do que foi es-
crito (na sua própria admissão publicada) por seu porta-voz, Dr. Lev. E.
Dobriansky, então professor associado da Universidade de Georgetown,
e fazer com que esse documento fosse solenemente adotado pelo Congresso
como uma declaração da política americana. Essa resolução comprome-
teu os Estados Unidos, na medida em que o Congresso tinha o poder de
fazê-lo, com a “libertação” de 22 “nações”, duas das quais nunca tiveram
nenhuma existência real, e cujo nome de uma delas parecia ter sido in-
ventado no ministério da propaganda nazista durante a guerra recente.
[10]

Como um dos arquitetos da política dos Estados Unidos de “contenção”


da Guerra Fria, Kennan dificilmente ficaria chocado com esse subproduto do
trabalho da CIA em levar adiante a política dos EUA.
Os Estados Unidos não foram o único destino depois da Segunda Guerra
Mundial. Foram autorizados a entrarem no Canadá, principalmente depois
do início da Guerra Fria, antigos membros do terrorista Exército Insurgente
Ucraniano, polícia ucraniana, destacamentos punitivos, polícia de segurança,
guardas de campos de concentração. Não se deve esquecer dos colaborado-
res políticos, escritores de propaganda e procuradores de trabalho escravo das
alas de Melnyk e de Bandera da Organização dos Nacionalistas Ucranianos.
O mais notável foi a decisão do governo canadense de 1950 de admitir, em
massa, membros da divisão Galícia da Waffen SS. Com tratamento especial
concedido, eles foram autorizados a entrar no Canadá anos antes da suspen-
são da proibição de outras unidades da SS.
Sob o comando nazista, a 14ª divisão da Waffen SS cortou sua retirada pela
Tchecoslováquia e pela Iugoslávia, lutando contra os partisans e as massas po-
pulares que se levantavam contra o jugo nazista. Alguns serviram aos nazis-
tas na sua defesa de Budapeste. [11] Logo antes da rendição da Alemanha,
em 24 de abril de 1945, a divisão mudou seu nome para a “Primeira Divisão”
no inexistente “Exército Nacional Ucraniano” num esforço para disfarçar seu
passado SS. Outras unidades fascistas ucranianas como o sanguinário 31º Des-
tacamento Punitivo foram incorporadas à divisão antes de se renderem. [12]
A unidade SS rebatizada foi encabeçada pelo notório General Pavel Shandruk,
um vira-casaca do exército polonês no pré-guerra com um longo registro de
serviços aos nazistas. Depois da rendição dos nazistas, o principal corpo da di-
visão foi alocado pelos britânicos num campo em Rimini, na Itália.
CAPÍTULO 10: CRIMINOSOS DE GUERRA, ANTISSEMITISMO E A CAMPANHA DA FOME-GENOCÍDIO| 221

Documento desclassificado da inteligência estadunidense descrevendo a carreira nazista de um


colaborador dos Nacionalistas Ucranianos chamado Pavel Shandruk. Além de servir enquanto
um agente da Gestapo, Shandruk chefiava a Primeira Divisão Ucraniana (A 14ª Waffen SS),
depois da mudança cosmética do nome daquela divisão em Abril de 1945. Os serviços de Shan-
druk datam de seu papel enquanto líder “Pogromchik” durante o assassinato em massa de judeus
pelas forças nacionalistas ucranianas de Petliura ( Ver FRIEDMAN, Saul. Pogromchik. p.
220-221)
222 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Nacionalistas ucranianos no estrangeiro prepararam “comitês de ajuda”


para tirar esses colaboradores e outros dos campos de refugiados e internatos,
e levá-los a países como o Canadá e os Estados Unidos. No Canadá, um papel
central foi desempenhado pelo Comitê Canadense Ucraniano (UCC). Hoje
proeminente na campanha da fome-genocídio (o filme Harvest of Despair foi
feito sob seus auspícios), o UCC foi fundado em novembro de 1940 pela Ir-
mandade de Católicos Ucranianos, a Liga de Autossuficiência Ucraniana, a
Liga das Organizações Ucranianas e as pró-fascistas Organizações dos Hetman
Unidos e Federação Nacional Ucraniana (UNF). Citando documentos do Ar-
quivo Público do Canadá, o Centro Simon Wiesenthal de Toronto destacou
o papel ativo desempenhado pela Royal Canadian Mounted Police (RCMP)
na formação do Comitê Canadense Ucraniano. [13]
“A organização Hetman”, nota o Centro Wiesenthal, “buscou restaurar a
monarquia na Ucrânia e estabelecer uma ditadura militar baseada no fascismo
italiano.” [14]
Editores do New Pathway, a Federação Nacional Ucraniana tinha um his-
tórico anterior à guerra de glorificar o regime nazista e Hitler. Mesmo Watson
Kirkconnell - “conselheiro honorário” do comitê de coordenação que levou à
formação do UCC - sabia anteriormente que a UNF eram “nazistas ucrania-
nos”. Vendo que a UNF era o braço canadense da OUN-Melnyk, Kirkconnell
escreveu que essa organização era “antissemita, marcadamente militar, auto-
ritária e antidemocrática e foi proibida na Polônia pelas suas campanhas de
assassinato e terrorismo.” [15] Um informe confidencial do Departamento de
Serviços de Guerra descreveu a UNF como “fanáticos admiradores do sistema
nazista”. [16]
Em 1946, o Presidente do Comitê Canadense Ucraniano Vasyl Kushnir
visitou os homens da SS em Rimini, alguns dos quais ainda vestiam seus uni-
formes nazistas. Depois do retorno de Kushnir ao Canadá, o UCC fez lobby
para assegurar sua entrada no Canadá. Isso aparentemente foi difícil - mem-
bros da SS foram barrados de entrar. Diante do Comitê Permanente para a
Imigração e o Trabalho, Kushnir foi perguntado se havia militares entre as pes-
soas em questão. Kushnir respondeu negativamente, defendendo a alegação
do Senador David de que os homens da SS eram trabalhadores e acrescentando
que eles tinham sido deportados forçadamente. [17]
A barreira formal para membros da SS perdeu importância à medida que a
Guerra Fria se aprofundava. Mais preocupante para o Departamento de Imi-
gração Canadense era se o aplicante era ou havia sido um “comunista” ou não.
Assim, um partisan antinazista de convicções de esquerda, ou um que tenha
lutado sob uma liderança de esquerda contra a ocupação alemã (em muitos
CAPÍTULO 10: CRIMINOSOS DE GUERRA, ANTISSEMITISMO E A CAMPANHA DA FOME-GENOCÍDIO| 223

países europeus, a maior parte dos movimentos de resistência) foram rejei-


tados. [18] Em contraste, antigos nazistas da SS foram aceitos aos milhares.
Mesmo antes da permissão aos membros da 14ª Divisão da Waffen SS, certas
autoridades canadenses foram cúmplices em facilitar a entrada de membros
da SS: em dezembro de 1947 “um membro da legislatura de Ontário escreveu,
numa viagem de apuração de fatos pela Europa, da Alemanha para Saul Hayes,
o Diretor do Congresso Judaico Canadense, que os funcionários da RCMP
examinaram e aprovaram ‘cerca de doze homens que foram parados pelo dou-
tor antes de embarcarem porque o doutor havia descoberto uma marca da SS
tatuada sob suas axilas.’” [19]
Assim que se estabeleceram em seu novo ambiente, os ativistas políticos
entre eles buscaram ou foram procurados para novas alianças dentro das are-
nas políticas e acadêmicas da Guerra Fria. O investigador de nazistas Sol Litt-
man, por exemplo, afirmou: “Para coletar informações sobre os países do bloco
soviético, eles (a RCMP) cultivaram os nacionalistas radicais de direita nas co-
munidades canadenses bálticas, ucranianas, húngaras, romenas, croatas e po-
lonesas.” [20]
A nova onda nacionalista ascendeu rapidamente nas fileiras das organiza-
ções canadenses e americanas, algumas das quais tinham sido enfraquecidas
e esvaziadas durante os anos da guerra pelas suas inclinações pró-nazis de an-
tes. Acrescentando alguns milhares de novos membros, os recém-chegados
finalmente vieram a dominar a liderança da direita na comunidade ucraniana,
dando um novo sopro de vida ao movimento.
No Canadá, por exemplo, vários ucranianos leais à OUN-Melnyk no pós-
guerra se juntaram à Federação Nacional Ucraniana. Novas organizações tam-
bém foram estabelecidas, como a Sociedade dos Veteranos do Exército Insur-
gente Ucraniano (o UPA da OUN-Bandera); a Irmandade dos Antigos Com-
batentes, a Primeira Divisão, o Exército Nacional Ucraniano (apelido da 14ª
Waffen SS); e Liga pela Libertação da Ucrânia da OUN-Bandera. Esses grupos
finalmente se filiaram ao Comitê Canadense Ucraniano.
Antigos fascistas, colaboradores nazistas e homens da SS podem ser encon-
trados em todas as associações étnicas e políticas dominadas por certas tendên-
cias nacionalistas. Alguns nacionalistas ucranianos proeminentes se gabam
abertamente da influência exercida por ex-membros de organizações ucrani-
anas de direita. O antigo SS ucraniano Mykola Stepanenko, que dizem ter tra-
balhado tanto para a Radio Liberty quanto para a Radio Canada, falou para
um banquete comemorativo do aniversário da 14ª Divisão da Waffen SS em
Toronto. Como representativo do “centro de governo da República Nacional
Ucraniana”, ele vangloriou-se:
224 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Eu compartilho vossa convicção de que os antigos membros da Primeira


Divisão Ucraniana são encontrados hoje “em todas as organizações, socie-
dades e instituições ucranianas, que eles estão entre os líderes de todas essas
organizações. Eles ocupam cargos de responsabilidade em empresas priva-
das, funcionando em uma variedade de instalações públicas e do governo,
no sistema de educação, desde escolas públicas a universidades. Todos eles
passaram pela escola da vida na Divisão [...] e eles não têm vergonha
disso.” [21288 ]

Embora Stepanenko e outros possam não estar “envergonhados” da sua


antiga participação na SS, a tendência geral no movimento nacionalista ucrani-
ano tem sido de encobrir a cumplicidade nacionalista nos crimes da Alemanha
nazista. Uma nova imagem e roupas limpas eram coletivamente necessárias, o
que obscureceria o passado colaboracionista com os nazistas e permitiria que
eles pegassem os pedaços estilhaçados de sua luta anticomunista de novas bases
no ocidente.
Basta analisar as numerosas “instituições” estabelecidas para transformar
a história dos nacionalistas ucranianos numa fina arte apologética. A vasta
massa de material ocidental sobre a história, cultura e política ucranianas é
manufaturada por direitistas exilados e suas “instituições acadêmicas” financi-
adas liberalmente. Essas instituições como a Sociedade Científica Shevchenko,
a Editora Smoloskyp, a Academia Ucraniana de Artes e Ciências (Nova Ior-
que), a Universidade Livre Ucraniana em Munique tentam passar as interpre-
tações nacionalistas da história como se representassem as visões e aspirações
de todos os ucranianos no mundo.
Frank Wisner e o Escritório de Coordenação Política desempenharam um
papel direto nos anos 1950 em estabelecer institutos de emigrantes. John Lof-
tus nota ainda: “O financiamento para esses ‘institutos de pesquisa’, que eram
pouco mais que grupos de fachada para ex-funcionários da inteligência na-
zista, vieram do Comitê Americano pela Libertação do Bolchevismo, conhe-
cido agora como Radio Liberty. O comitê era na verdade uma fachada para o
OPC.” [22]
Muitas dessas instituições continuaram sendo generosamente assistidas
por várias fontes públicas e privadas, abertamente ou de forma encoberta. Nos
288
Ex-membros da 14ª Waffen SS (vulgo Primeira Divisão Ucraniana) não se encontram em “to-
das as organizações ucranianas”; todas as organizações ucranianas não são nacionalistas, e só
uma minoria de ucranianos canadenses e americanos têm se associado a organizações nacio-
nalistas de direita. As alegações dos nacionalistas de que falam não só pelos ucranianos no
exterior, mas também pela Ucrânia, são evidentemente ridículas. [N.T]
CAPÍTULO 10: CRIMINOSOS DE GUERRA, ANTISSEMITISMO E A CAMPANHA DA FOME-GENOCÍDIO| 225

Estados Unidos, uma exposição da Village Voice chamou atenção à Associa-


ção Prolog de Pesquisa e Publicação. Seu propósito: “a investigação da histó-
ria, economia, política e cultura da Ucrânia [...] expondo à opinião pública do
mundo a verdadeira natureza da ditadura comunista e a ameaça à liberdade por
toda parte.” [23] O certificado da Prolog preenchido em Nova Iorque lista o
criminoso de guerra nazista ucraniano Mykola Lebed como diretor. De acordo
com o Village Voice, Leved encabeçava uma facção da OUN, da qual a Prolog
era pelo menos parcialmente um grupo de fachada. A Village Voice comenta:
“Ucranianos familiares com os trabalhos da Prolog dizem que ela não se sus-
tentaria apenas da venda de suas publicações - algumas das quais eram regular-
mente contrabandeadas para [...] a Ucrânia - e que ela provavelmente recebia
ajuda de uma agência do governo.” Algumas pessoas entrevistadas menciona-
ram a CIA. [24]
No Canadá, nacionalistas e anticomunistas dominaram departamentos de
estudos ucranianos e do Leste Europeu de algumas universidades. Eles pare-
ciam ter mãos livres para publicar propaganda como história. [25] Esses depar-
tamentos de “estudos”, dourado como nome de universidades respeitadas, são
não só um meio de perpetuar as posições ideológicas do nacionalismo ucrani-
ano, mas buscam a elevá-las e transformá-las numa história mais amplamente
aceita. Dessa forma elas servem o arsenal ideológico da direita da Guerra Fria.
Em deferência a abordagens anticomunistas norte-americanas mais “res-
peitáveis”, materiais nacionalistas contemporâneos abaixou o tom no geral ou
abandonou silenciosamente antigos temas tipicamente nazistas e de caça aos
judeus. Talvez isso esteja por trás da afirmação desejosa de Robert Conquest
de que “de maneira geral, o nacionalismo ucraniano como existe agora é de
um tipo liberal e generoso”. [26] Contudo, o antissemitismo não foi com-
pletamente relegado à história. Ele continua dando as caras em alegações de
fome-genocídio, e particularmente em resposta a investigações sobre crimes
de guerra.
Um exemplo particularmente cruel é o livro Why is One Holocaust Worth
More than Others? [“Por que um holocausto vale mais que outros?”], pu-
blicado em 1986 pelos Veteranos do Exército Insurgente Ucraniano (UPA).
[27] Escrito por um ex-membro do UPA usando o nome Yurij Chumarskyj,
o livro vê a história à maneira fascista clássica como um complô judaico. Seu
argumento central funciona da seguinte forma: os judeus são culpados pela
“fome deliberada” de 1932-1933, que (supostamente) matou mais ucranianos
que Hitler (e seus auxiliares ucranianos) matou judeus na guerra; ninguém,
portanto, ousa acusar os nacionalistas ucranianos do pós-guerra de abrigar co-
laboradores e criminosos de guerra; tais acusações usam falsas evidências de
226 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

sionismo-moscovita.
Para encenar a fabricação da fome-genocídio, o holocausto contra os ju-
deus é minimizado e descartado como uma reivindicação dos “judeus sionis-
tas”. Desde o começo a causa do antissemitismo é vista como “obstinação e
arrogância judaica”. [28] O número de seis milhões de vítimas judaicas é des-
contado como uma “alegação” e o leitor é informado que o holocausto contra
os judeus está sendo usado meramente como “a arma de propaganda número
um de Israel”. [29] Em simpatia com aqueles que negam o holocausto, como
os racistas canadenses Zundel e Keegstra, Chumatskyj afirma:
[...] historiadores revisionistas que reivindicam que não houve nenhum
plano para exterminar judeus, não houve gaseamento em massa e que me-
nos de um milhão de judeus morreram de todas as causas na Segunda
Guerra Mundial, são perseguidos, e seus livros são banidos por boicote co-
mercial. Eles têm sido perseguidos nos tribunais [...] nos EUA, Alemanha
Ocidental e Canadá, eles estão sujeitos a assassinatos de reputação na mí-
dia [...] [30]

O verdadeiro holocausto, argumenta Chumatskyj, foi causado pelos ju-


deus/bolcheviques. Ele afirma: “[...] de acordo com as declarações sionistas,
Hitler matou seis milhões de judeus, mas Stalin, apoiado pelo aparato de es-
tado judaico, foi capaz de matar dez vezes mais cristãos [...]” [31] Alegando
que financistas judeus apoiaram a Revolução Russa, que judeus compunham
a liderança e foram responsáveis por 60-65 milhões de mortes de gentios, Chu-
matskyj conta com a mitologia antissemita para explicar as causas da fome de
1932-1933. Em resposta à sua própria pergunta “Por que essa fome foi cri-
ada”, Chumarskyj afirma:
[...] tendo maioria no governo da URSS, os judeus se envolveram em todas
as tomadas de decisão, incluindo o assentamento de judeus na Ucrânia e
na Crimeia, mais o plano de construir “Sião” na Ucrânia. O planeja-
mento da fome ucraniana ainda estava alguns anos no futuro. Desar-
mando a Ucrânia com falsas promessas de anistia e intimidando ainda
mais a população com processos judiciais, a Rússia tomou medidas então
para implementar o “plano da fome”. Os fazendeiros judeus foram aler-
tados com antecedência e deixaram suas propriedades mudando-se para
cidades e vilas próximas. A população judaica não passou fome já que o
alerta os permitiu estocar comida antecipadamente. [32]

Tendo diluído a Ucrânia pela “fome planejada” com o propósito da colo-


nização judaica, o leitor é informado que a imprensa ocidental “controlada por
CAPÍTULO 10: CRIMINOSOS DE GUERRA, ANTISSEMITISMO E A CAMPANHA DA FOME-GENOCÍDIO| 227

judeus” suprimiu as notícias da fome. [33] O escritor gentio irlandês Duranty


é até rotulado como um “jornalista judeu” para apoiar a tese de “simpatizantes
judeus” encobrindo um genocídio. [34]
Investigações atuais de criminosos de guerra ucranianos são, portanto, mal
direcionadas, ele alega. O livro oferece, em apoio, a seguinte mensagem de
Yaroslav Stetsko, líder fascista ucraniano que depois da guerra chefiou o “Bloco
Antibolchevique de Nações” até sua morte recente: “Hoje o poder é exercido
pelos ‘sub-humanos’ moscovitas. O flácido Ocidente age como se ninguém
visse que o verdadeiro ‘sub-humano’ não é o errado [Ivan] Demjanjuk, mas as
criaturas que ocupam o Kremlin!” [35]
O tema da conspiração “judaico-bolchevique” também é lembrado na rea-
ção de certos outros nacionalistas ucranianos à possível extradição ou acusação
de criminosos de guerra ucranianos. Sob o título “Ucranianos no Tribunal:
Graças a ‘Testemunhas e Documentos’ Judaico-Soviéticos”, o jornal naciona-
lista EKPAH-EKRAN declara:
É frequentemente muito doloroso quando alguém ouve, lê, vê, na cha-
mada “mídia”, comentários sensacionais e cheios de propósitos, informes
sobre “crimes” de ucranianos contra os judeus e a “colaboração” destes úl-
timos com os alemães. [...] onde estão nossas instituições educacionais -
UVAN, NTSH, departamentos de Estudos Ucranianos, organizações so-
ciais, partidos políticos, UCCA, CUC, WCFU, igrejas, associações profissi-
onais, que tomariam uma posição pública na imprensa de língua inglesa
a respeito da falsidade de testemunhas, testemunhas judaico-soviéticas e
“documentações” da KGB, as campanhas judaicas muitas frequentemen-
te planejadas contra os acusados julgados por tribunais americanos! [...]
nossa emigração deve defender a honra ucraniana de maneira geral e abs-
trata e não num entendimento singular perante tribunais ocidentais. Isto
é - opor-se de forma compacta a falsas “documentações” soviéticas e suas
supostas testemunhas, imparcialidade, com testemunhas judaicas politi-
camente forjadas que têm acesso ilimitado à “mídia jornalística” ameri-
cana.
A decisão do governo canadense de estabelecer a comissão de investigar a
presença de criminosos de guerra no Canadá (a Comissão Deschenes) provo-
cou respostas um tanto similares. O “jornal canadense para estudantes ucra-
nianos”, Student, afirmou, por exemplo: “A comunidade judaica, durante a
história, levou a uma existência urbanizada; tentando sempre estar na linha de
frente política e comercial, exercendo influência sobre processos de tomada de
decisão para se beneficiar onde fosse possível. A formação da comissão é ape-
nas um resultado de seus esforços.” O Student atribui o “silêncio” dos “poucos
228 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

ucranianos em qualquer posição de falar sobre esse assunto com qualquer grau
de credibilidade” ao “medo da repercussão nas suas vidas profissionais. Eles es-
tão bem cientes da formidável presença judaica em todas as áreas de emprego
e evitam morder a mão que os alimenta.” [37]
Mais repugnante ainda são os comentários feitos pelo Padre Myron Sta-
siw numa estação de rádio de Toronto em fevereiro de 1985. Stasiw, um ex-
membro da 14ª Divisão da Waffen SS, ainda carrega a sua tatuagem da SS e não
demonstra nenhuma vergonha em ter sido membro desse aparelho sujo. Um
membro proeminente da comunidade de nacionalistas ucranianos, Stasiw foi
eleito presidente da Associação dos Nacionalistas Ucranianos (filiada ao Co-
mitê Canadense Ucraniano) em abril de 1987. Afirmando que, se existisse tal
coisa como “ucranianos criminosos de guerra”, eles seriam “consideravelmente
menos numerosos que os judeus criminosos de guerra”, Stasiw repete a velha
calúnia propagada por reacionários ucranianos:

Os judeus e seu ódio pelos ucranianos remontam a 300 anos atrás ou mais;
mas eles não dizem quais foram as causas desses pogroms judaicos - aque-
les que tinham as chaves para as igrejas cristãs e não permitiriam que as
pessoas entrassem para rezar. Eles eram os taberneiros, que roubaram os
camponeses das suas terras por whiskey, e os fizeram seus servos. Da mesma
forma, os judeus não falam sobre como os judeus jogaram alcatrão der-
retido e água fervente e apedrejaram as cabeças dos soldados ucranianos
[os nacionalistas de Petliura] em Berdichev, em 1918 no tempo do estado
ucraniano [...] Quantos judeus estavam lá no governo de Leiba Trotski?
[...] Considere a façanha de Kaganovich como comissário da Ucrânia nos
anos da fome de 1932-1933, quando mais de sete milhões de ucranianos
pereceram de fome artificial. [38]

Um tema correlato (também visto em Why is One Holocaust Worth More


than Others) ficou particularmente popular nos protestos nacionalistas con-
tra a investigação de criminosos de guerra. Isso é o de projetar o conceito de
que “comunismo é igual a mais que fascismo”, de retratar a União Soviética
como tendo cometido um “genocídio” tão grande quanto - ou até maior que
- o genocídio de Hitler contra os judeus. Por exemplo, L. Shulakewych es-
creve para o editor do Winnipeg Free Press: “[...] Hitler aniquilou cerca de 11
milhões nas suas operações genocidas. Stalin teve pelo menos 29 milhões de
mortos [...]” [39] O escritor segue atacando “organizações judaicas” por insis-
tir que documentos nazistas e outras evidências da URSS sejam usados pela
comissão do governo canadense que investiga crimes de guerra. De forma pa-
recida, numa aparente tentativa de desviar a atenção do julgamento então em
CAPÍTULO 10: CRIMINOSOS DE GUERRA, ANTISSEMITISMO E A CAMPANHA DA FOME-GENOCÍDIO| 229

andamento em Israel de John Demjanjuk (o antigo SS ucraniano acusado de


operar a câmara de gás de Treblinka), um Sr. Onyshko escreve: “Os russos fo-
ram pioneiros no uso de câmaras de gás em 1938 em Vorkuta. É um antigo
truque comunista usar as câmaras de gás para destruir aqueles que lutam con-
tra os monstros russos.” [40] Campanhas nacionalistas como aquelas alegando
o “genocídio” soviético na fome ucraniana são usados, portanto, para desviar
o exame da cumplicidade nacionalista nos crimes fascistas.
Esse, porém, é um objetivo secundário; o principal objetivo da campanha
da fome-genocídio é contribuir para o condicionamento psicológico para o
confronto e a guerra contra a União Soviética. Isso é visto por alguns como o
método para tornar realidade o sonho nacionalista de uma “Ucrânia indepen-
dente”.
Em 1920, os nacionalistas ucranianos viram a Polônia intervencionista e
sua invasão da União Soviética como o meio para ganhar poder. De meados da
década de 1930 até a Segunda Guerra Mundial, a Alemanha Nazista era vista
como o meio para os fins dos nacionalistas. No período pós-guerra, os Estados
Unidos têm sido vistos como garantidores da promessa de realizar o objetivo
de uma Ucrânia governada pelos nacionalistas. As políticas dos EUA baseadas
na hostilidade e desconfiança com a URSS e a guerra nuclear são vistas como
necessárias para esse propósito.
A seguinte declaração do jornal nacionalista ucraniano Homin Ukrainy
indicaria que alguns nacionalistas estão depositando suas últimas esperanças
para um retorno à Ucrânia, ou às suas cinzas, num ataque nuclear contra a
URSS:
Consideramos a ameaça de uma terceira guerra mundial, à medida que
se aproxima da humanidade, como a última, talvez a chance mais ade-
quada [...] mesmo que metade ou mais da humanidade morresse nesta
guerra, não a consideraríamos um preço muito exorbitante para ganhar
a nossa liberdade. [41]

Em um semelhante ataque de loucura, o jornal nacionalista ucraniano


Svoboda declarou: “Daqui a alguns anos o presidente americano terá ape-
nas duas coisas a escolher - começar uma guerra nuclear contra a URSS, ou
submeter-se a Moscou.” [42] Em apoio aos planos americanos de aplicar bom-
bas de nêutron na Europa, ex-colaboradores nazistas e o líder exilado da OUN
Yaroslav Stetsko declarou: “Numa guerra contra os países do Pacto de Varsóvia
a OTAN não tem nenhuma chance de vencer por armas normais a menos que
use armas de nêutrons na Europa [...] Dentre todos tipos diferentes de armas
nucleares, ela é a mais humana [...] O uso tático de armas nucleares não sig-
230 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

nifica uma guerra nuclear universal.” [43] Para não ficar para trás, o Vyzvolnyi
Shliakh afirmou: “A continuidade da existência da URSS configura uma ame-
aça maior ao mundo do que um cataclisma nuclear.” [44]
Fora do movimento nacionalista, num contexto mais amplo, a campanha
da fome-genocídio é uma engrenagem na roda da guerra psicológica contra a
URSS na máquina militar dos EUA. Documentos desclassificados dos EUA
do final da década de 1940 e 1950 claramente associam uma política ofensiva
contra a União Soviética e a sua derrota aos interesses dos Estados Unidos. Nos
anos 1980, o governo dos EUA reenfatizou a política oficial de legitimar o pri-
meiro uso de armas nucleares, um ataque nuclear “preventivo”, e teorias de
guerra nuclear “limitada” e “ganhável”. [45] Uma atmosfera de confrontação
direta com a URSS tem sido promovida, usando a linguagem da chantagem e
ameaças características da “cruzada contra o comunismo” do presidente Ro-
nald Reagan dos EUA.
É cultivada cuidadosamente a imagem de um “Império do Mal” Soviético
preparado para lançar uma guerra convencional ou nuclear para atingir a “do-
minação do mundo”. Deve-se tomar cuidado com o apaziguamento - segue o
argumento - e buscar uma posição de força militar.
A imagem de “Império do Mal” se baseia - ainda que em pequena medida
- na interpretação da fome de 1932-1933 como um genocídio deliberado, pré-
planejado de milhões de ucranianos.
O confronto da Guerra Fria, em vez da verdade e do entendimento histó-
ricos, motivou e caracterizou a campanha da fome-genocídio. Elementos de
fraude, antissemitismo, nacionalismo degenerado, fascismo e pseudo-acade-
micismo revelados neste exame crítico de certas evidências centrais apresenta-
das na campanha, do propósito político e do contexto histórico dos promoto-
res da campanha negritam essa conclusão.
Há mais de 50 anos atrás, o jornalista americano Louis Fischer expôs a
mentira e os motivos políticos do editor pró-fascista William Randolph He-
arst. Ao examinar os registros daqueles que propagam a campanha da fome-
genocídio nos dias de hoje, somos levados à conclusão de Fischer:
A tentativa é muito transparente, e as mãos estão muito sujas para ter
sucesso.
APÊNDICE: DE
PROPAGANDISTA DO
TERCEIRO REICH A AUTOR
DA FOME-GENOCÍDIO
“Testemunhas oculares” estão entre as fontes mais efetivas usadas na pro-
paganda da “fome-genocídio”. A fraqueza acadêmica de tais “evidências” tem
sido geralmente notada. Não é possível examinar cada história individual es-
pecífica. Uma deve bastar.
Dentre os muitos “testemunhos” no Black Deeds of the Kremlin, está um
de Olexa Hay-Holowko. Na época da publicação do livro, esse homem estava
vivendo em Winnipeg sob o nome falso de “Boryslawsky” - um nome que ele
usou até 1958 quando voltou a usar seu nome da época da guerra. [1] Discus-
sões com imigrantes ucranianos do pós-guerra e informações de várias organi-
zações de pesquisa revelam que Hay-Holowko deixou de lado algumas partes
de sua “história”.
Um documento de identificação apresentado na Cracóvia, Polônia, em 14
de novembro de 1942, sob o “Generalgouvernement” de Hans Frank identi-
fica Hay-Holowko como um Shriftsteller, ou escritor, aprovado pelos nazistas.
O documento é carimbado com “Berlim”, indicando a máxima aprovação ofi-
cial nazista. Nascido em 12 de agosto de 1910 em Pysariwka, seu estado civil é
dado como casado. [2] Sua data e local de nascimento devem ser mantidos em
mente, pois, como será mostrado, Hay-Holowko continua mudando detalhes
em documentos antes e depois da rendição da Alemanha.
Hay-Holowko também recebeu um visto de trabalho emitido através do
Ukrainischer Hauptausschuss (Comitê Central Ucraniano) de Volodymyr Ku-
bijovyc. Esse front colaboracionista sob controle alemão foi formado na Cra-
cóvia em 1940 pelos nazistas e nacionalistas ucranianos, muito antes da inva-
são da União Soviética. O visto de trabalho, emitido em 1943, declara Hay-
Holowko membro da Associação de Escritores de Lvov. Possui um número de
identificação extremamente baixo (sete), o que parece indicar que ele foi um
dos primeiros a se inscrever na associação aprovada pelos nazistas. A fotografia
apresentada casa claramente com suas fotos do pós-guerra. [3]
De acordo com um de seus livros publicados décadas depois no Canadá,
232 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Hay-Holowko teve trabalho aprovado e publicado sob autoridade nazista du-


rante a ocupação da Ucrânia. [4] Somado a isso, há relatos de fontes imigran-
tes ucranianas no Canadá que ele trabalhou ao lado de autoridades nazistas
em tentativas de recrutar prisioneiros soviéticos para lutar para Hitler, assim
como em campos de prisioneiros de guerra em Borislav.

Antes e depois. Acima: Documento de filiação aprovado por nazistas de Hay-Holowko à asso-
ciação de escritores. Notar o baixo número de filiações. Abaixo: depois da rendição nazista, o
membro da SS Hay-Holowko usou um pseudônimo e documentos de identificação sob o nome
“Hajewycz” para escapar de ser identificado.
APÊNDICE: DE PROPAGANDISTA DO TERCEIRO REICH A AUTOR DA FOME-GENOCÍDIO| 233

Os escritos pessoais de Hay-Holowko afirmam que em agosto de 1944 ele


foi juramentado na SS e recebeu sua tatuagem da SS sob o braço esquerdo. [5]
A rendição da Alemanha nazista encontrou Hay-Holowko na Áustria,
onde, incidentalmente, milhares de membros ucranianos da SS emergiram de-
pois de se retirarem da Iugoslávia e de outros lugares. Em meio ao pânico e
confusão dos últimos dias da guerra, muitos nazistas e colaboradores tentaram
mudar suas identidades, e terminar a guerra nas zonas britânicas e americanas.
A Divisão Halychyna da SS e outras forças fascistas ucranianas “se reconstituí-
ram” com consentimento alemão como a “Primeira Divisão Ucraniana” do
não-existente Exército Nacional Ucraniano imediatamente antes da rendição
nazista - uma tática planejada para evitar retaliação. Como os aliados concor-
daram que todas as formações da SS eram organizações criminosas, houve ini-
cialmente muitos colaboradores nervosos buscando segurança.
Hay-Holowko não parece ter sido uma exceção. Dois vistos impressos
idênticos foram feitos para o trem de Linz a Feldkirch de 12 de abril de 1945.
Um para “Olexij Haj-Holowko” nascido em 12 de agosto de 1912; o outro,
para “Olexander Hajewytch”, nascido em 12 de outubro de 1912. [6] Sem
dúvidas esses documentos seriam úteis se verificados por certas autoridades
aliadas.
Isso era, porém, apenas o começo. Em Kramsach em Tirol lhe foi emitido
um Bescheinigung [“certificado”] em 1 de julho, em nome de Olexsy Hay-
Holowko, nascido em 12 de agosto de 1910. Esse certificado indica sua pre-
sença num campo de refugiados e traz a assinatura do burgermeister local,
Herr I. A. Wolf. [7] Um formulário da polícia datado de 16 de junho de 1945,
revela que Hay-Holowko se registrou em Innsbruck com o nome Alexander
Hajewych, nascido em 12 de outubro de 1912 em Sanok. Seu último local
de residência consta como sendo Viena. [8] Ainda outro documento, datado
de 22 de junho de 1945, parece ser uma carteira de identidade falsificada do
“União dos Estudantes Ucranianos do Ensino Médio” de Innsbruck. Identi-
ficado como um estudante de filosofia, a sua alcunha é dada uma escrita po-
lonesa modificada - Alexander Hajewycz; nascido em 12 de outubro de 1912
em Sanok. [9] Menos de um mês depois, um documento policial solicitado em
19 de julho de 1945 é emitido a Alex Haj-Holowko, nascido em 12 de agosto
de 1910 em Pysariwka - equivalente àquele dado nos documentos aprovados
pelos nazistas em Lvov durante a guerra. O último local de residência é dado
como Kramsach, e a ocupação como escritor. Pelas fotografias fica inequivo-
camente claro que Hajewych, Hajewycz e Hay-Holowko são uma e a mesma
pessoa.
Em seus documentos obtidos na Áustria, Hay-Holowko alega ser solteiro.
234 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Na verdade, ele se casou em Lvov em 14 de fevereiro de 1942 com Alexandra


Kusykeva. [10] Ele não apenas abandonou sua esposa, mas também um filho
jovem. Yaroslav Holowko nasceu em 24 de agosto de 1942 em Lvov, tendo o
nascimento sido registrado na Catedral de São Jorge. [11] Embora se con-
fesse ortodoxo grego em seus documentos pós-guerra, o casamento e o ba-
tismo ocorreram na Igreja Romana. Não foi encontrado divórcio para esse
casamento.
Vemos, portanto, uma pessoa na correria, esforçando-se extraordinaria-
mente para ocultar não apenas sua identidade real, mas também sua locali-
zação exata, destinos, locais de residência e datas dos mesmos. Suspeita-se que
alguns documentos foram feitos antes das informações indicadas e outros mais
tarde do que os descritos. Dado o mercado negro de passaportes e outros do-
cumentos entre os que se escondiam do passado, tais manobras eram inteira-
mente viáveis.
O recente livro We Accuse: Documentary Sketch [“Acusamos: esboço do-
cumental”], do escritor e pesquisador ucraniano Valery Styrkul, contém ma-
teriais muito interessantes sobre Holowko. (Styrkul também é autor de um
livro sobre a organização e as atrocidades cometidas por membros da 14ª Di-
visão da Waffen SS na Ucrânia, Polônia e Tchecoslováquia.) [12]
Onde estava Olexa Hay-Holowko no início de julho de 1941, quando a
nata da intelligentsia de Lvov e milhares de homens, mulheres e crianças ju-
deus inocentes estavam sendo massacrados por fascistas ucranianos durante o
primeiro exercício dos nacionalistas no “governo” desde Petliura? De acordo
com Styrkul:
Naquela pseudo-administração, Olexa Hay-Holowko virou ministro da
propaganda [...] Também não foi coincidência que Hay-Holowko se en-
controu entre os tais membros do “governo” em Stetsko, Lebed, Shukhevych
e outros. Ele odiava judeus tanto quanto eles. Depois do começo da guerra,
ele escreveu inclusive essas linhas “poéticas” - ou melhor, fanáticas, cani-
balistas:

Que um furacão [...] varra o mundo dos odiosos judeus;


A morte, formidável e colérica, já tocou suas trombetas,
Está se elevando sobre você, foice na mão [...]
Pois os malditos judeus
Passearam pela Santa Sofia [...] [13]
Hay-Holowko, não surpreendentemente, omite totalmente qualquer men-
ção do seu papel como ministro da propaganda nas suas memórias publicadas.
APÊNDICE: DE PROPAGANDISTA DO TERCEIRO REICH A AUTOR DA FOME-GENOCÍDIO| 235

[14] Embora se apresentasse como tendo uma memória fenomenal para deta-
lhes triviais e supostas conversas que remontam a meio século, Hay-Holowko
sofre de amnésia quando se trata do auge de sua carreira política. Esse lapso de
memória, contudo, não é compartilhado pela ala de Bandera do movimento
nacionalista ucraniano. O livro banderista The Restauration of the Ukrainian
State in World War II [“A restauração do Estado ucraniano na Segunda Guerra
Mundial”], não apenas o lista na formação desse dito governo, como o home-
nageia com uma fotografia. [15]
O “governo” de Stetsko da OUN-Bandera durou apenas 10 dias e alguns
pogroms antes de ser substituído pelo domínio alemão nazista direto. De acor-
do com Styrkul, Hay-Holowko foi treinado na sequência pelos alemães e se
tornou um correspondente de propaganda de guerra, trabalhando para a for-
mação da SS Skorpion Ost (Escorpião do Oeste). Membro de um órgão de
imprensa de escritores das forças armadas nazistas, foi relatado mais tarde que
Hay-Holowko foi alocado no comando da Tropa de Aço, aparentemente um
grupo de nacionalistas ucranianos ligado ao exército nazista. Styrkul afirma
que perto do final da guerra, ele recebeu uma nova promoção na SS: “Em fe-
vereiro de 1945, Haj-Holovko foi nomeado editor do jornal Do Boyu (Com-
bate) e ligado à Divisão Halychyna da SS.” [16]
Styrkul também pode lançar luz sobre a fuga desesperada de Hay-Holowko
da justiça no final da guerra: em junho de 1945 Hay-Holowko foi “preso em
Augsburg (Alemanha) sob acusações de crimes de guerra enquanto servia à SS.
No seu caminho à prisão, uma vez fora da cidade, ele nocauteou e estrangulou
seu motorista americano, saltou do carro e fugiu, deixando para trás seus do-
cumentos, entre eles suas fotos e seu diário.” [17]
Depois de alguns anos na Alemanha, Hay-Holowko decidiu se mandar
daquela parte da Europa completamente. Em 1948 ele foi à Inglaterra como
“Sr. Boryslawsky”, onde morou e trabalhou durante aquele ano. Depois ele
decidiu emigrar para o Canadá, mas foi barrado pelas autoridades que se ques-
tionaram com bons motivos por que o seu irmão, que se estabeleceu em Ed-
monton, Alberta, tinha um sobrenome diferente.
Encurralado na Inglaterra, o Sr. Boryslawsky, ainda não divorciado do
seu casamento de 1942, arranjou um noivado por correspondência com uma
mulher em Montreal, com quem jamais havia se encontrado, para ser apoiado
no Canadá como seu noivo. Embora usasse um nome falso (violando as leis de
imigração canadenses), omitisse seu passado na SS e estivesse casado com uma
família deixada para trás em Lvov, Hay-Holowko conseguiu entrar no Canadá
em 1949. Depois de visitar seu irmão em Edmonton, ele veio a Winnipeg,
casou com sua noiva por correspondência e se estabeleceu.
236 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

Ocupando vários empregos e filiações políticas dentro da comunidade


nacionalista, Hay-Holowko tem diversos livros publicados e trabalhou na
Ukrainsky Holos (Voz Ucraniana). Em 1953 ele saiu brevemente do armário
com seu nome real de Hay-Holowko para se passar por especialista na “fome-
genocídio” de 1932-1933. Por isso que ele apareceu no The Black Deeds of
the Kremlin (Volume 1).
Na retomada dos anos 1980 da campanha da fome-genocídio, Hay-Holow-
ko - ex-colaborador nazista e membro da SS - reapareceu na cena da Guerra
Fria, uma “testemunha ocular da fome-genocídio”. Entrevistado pela Winni-
peg Free Press em 1983, Hay-Holowko repetiu as histórias e a retórica naci-
onalistas de terror agora comuns. Sob a manchete “Mortos arrastados pelas
pernas e empilhados em caminhões como se fossem lenha”, o artigo foi acom-
panhado por uma foto de Hay-Holowko e a segunda Sra. Holowko posando
confiante, com sorrisos presunçosos, sob a imagem arranjada de Jesus. [18]
Hay-Holowko atraiu uma considerável atenção em Manitoba durante a-
quele “50º Aniversário da Fome”. Numa marcha e comício de comemora-
ção organizados pelos nacionalistas em Winnipeg em outubro de 1983, Hay-
Holowko aparece como principal orador, junto com o Premier de Manitoba
Howard Pawley e dois representantes de uma organização judaica, que apa-
rentemente tinham memória curta. Para o comício, Hay-Holowko declarou:
“Sou uma vítima que sobreviveu à grande, grande fome que a União Soviética
impôs sobre aqueles que se recusaram à escravidão.” [19]
Alguém pode só imaginar como Hay-Holovko foi um sobrevivente de
nada mais que seu próprio apetite, se seus próprios livros dão qualquer in-
dicativo. Embora ele alegue que os judeus e comunistas tinham acesso a co-
mida enquanto “ucranianos” passavam fome, no autobiográfico Smertelnoiu
Dorohoiu (“Pela Estrada da Morte”, Volume II), Hay-Holowko descreve uma
vida relativamente próspera:
Na sala de jantar a mesa estava coberta. Lá estavam sua esposa e sua filha
mais nova. Sentamos todos na mesa e experimentamos um borscht [sopa
russa de beterraba]. Conversamos e então sua esposa trouxe as costelas e o
purê de batatas. [20]
No Ano Novo de 1933, Hay-Holowko escreve sobre a ida à festa com uma
nova namorada para quem ele havia comprado dois vestidos novos, e depois ter
ido ver um filme. Depois eles compareceram a uma festa na Casa de Literatura,
onde havia uma abundância de comida e bebida. [21]
Durante período em questão, essa “vítima da fome-genocídio” parece ter
aproveitado mais do que a sua cota de bebida e janta. Talvez ele quisesse dizer
APÊNDICE: DE PROPAGANDISTA DO TERCEIRO REICH A AUTOR DA FOME-GENOCÍDIO| 237

que era um sobrevivente da retaliação do povo ucraniano, que ele teria que
enfrentar se não tivesse mudado de nome e fugido após a guerra.
Hay-Holowko não lutou contra a escravidão nazista que matou milhões
de ucranianos pelos quais ele alega falar. Ao contrário, ele serviu à “Nova Or-
dem” em várias funções. Ele continua a servir como expoente da campanha da
fome-genocídio.
NOTAS
INTRODUÇÃO
1. London Review of Books, 22 de Janeiro de 1987

CAPÍTULO 1 - THOMAS WALKER: O HOMEM QUE NUNCA


EXISTIU
1. James Creelman em Pearson’s Weekly, setembro de 1906.
2. Ver, por exemplo, Thomas Walker, “6.000.000 Morrem de Fome na Rússia”; “Crianças Passam Fome En-
tre Mortos Soviéticos”; “Corpos de Vítimas da Fome Soviética São Roubados”; “Soviéticos Recrutam Ho-
mens, Mulheres Passam Fome”; “Fome Varre Vilas Soviéticas”; New York Evening Journal, respectivamente
18, 19, 21, 25, 27 de fevereiro de 1935.
3. Louis Fischer, “A Fome Russa de Hearst”, The Nation, Vol. 140, Nº 3636, 13 de março de 1935.
4. Daily Worker, 21 de fevereiro de 1935.
5. Ibid.
6. Ibid.
7. New York American, 3 de março de 1935.
8. New York Times, 16 de julho de 1935.
9. Daily Worker, 20 de julho de 1935.
10. Ibid.
11. Entre as várias publicações que usam os materiais fraudulentos de Walker como prova histórica estão: “The
Soviet Famine of 1932-34” de Dana Dalrymple, Soviet Studies, janeiro de 1964; The Ninth Circle de Olexa
Woropay, Fundo de Estudos Ucranianos de Harvard, 1983; The Great Famine in Ukraine: The Unknown
Holocaust, Associação Nacional Ucraniana (EUA), 1983; 50 Years Ago: The Famine Holocaust in Ukraine -
Terror and Human Misery as Instruments of Soviet Russian Imperialism de Walter Dushnyck, 1983; Wit-
ness: Memoirs of the Famine of 1933 in Ukraine de Pavlo Makohon, Anabasis, 1983; Human Like in Russia
de Ewald Ammende, John T. Zubal, 1984 (reimpressão da edição de 1936); Harvest of Sorrow de Robert
Conquest, University of Alberta Press, 1986; Famine in the Soviet Ukraine 1932-1933: A memorial Exhi-
bition preparado por Oksana Procyk, Leonid Heretz e James E. Mace, Widener Library, Universidade de
Harvard, Cambridge, Biblioteca da Faculdade de Harvard, 1986.

CAPÍTULO 2 - A CAMPANHA DA IMPRENSA DE HEARST


CONTINUA
1. A companhia de petróleo americana Texaco abasteceu o exército fascista de Franco na Espanha. Ver Peter
Elstob, Condor Legion [“Legião Condor”], Nova Iorque, Ballantine Books, 1973, p. 82. Para mais infor-
mações sobre a colaboração com os nazistas (incluindo durante a Segunda Guerra Mundial), ver Charles
Higham, Trading with the Enemy: An Expose of the Nazi-American Money Plot, 1939-1949 [“Negócios
com o Inimigo: Uma Exposição do Esquema de Dinheiro Nazi-Americano, 1939-1949”], Nova Iorque,
Delacorte Press, 1983.
2. John Gunther, Inside Europe, Nova Iorque, Harper Bros., 1936, p. 179.
3. George Seldes, Facts and Fascism, Nova Iorque, In Fact, 1943, p. 210.
240 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

4. W. A. Swanberg, Citizen Hearst: A Biography of William Randolph Hearst, Nova Iorque, Charles Scrib-
ner’s Sons, 1961, p. 443.
5. Ibid., p. 444.
6. Daily Worker, 13 de fevereiro de 1935.
7. New York Times, 23 de agosto de 1934. As visões pró-nazistas de Hearst não se limitavam aos anos 1930.
No dia seguinte da invasão do exército de Hitler à União Soviética em 1941, o New York Journal American,
em simpatia com os nazistas, aconselhou os europeus [mesmo depois da ocupação fascista] a se unirem
contra a expansão do comunismo!
8. Swanberg, p. 299.
9. Ibid., p. 301.
10. De forma similar, o Boston Sunday Advertiser, 1◦ de outubro de 1934.
11. Swanberg, p. 471; ver também pp. 468-469, e New York Times, 24 de dezembro de 1934, Social Frontier,
23 de abril de 1935.
12. Swanberg, p. 469-470.
13. Ewald Ammende, Human Life in Russia, Cleveland, John T. Zubal, 1984, pp. 274-275.
14. Swanberg, p. 470.
15. O New York American de Hearst, por exemplo, apresentou artigos dos importantes nazistas Alfred Rosen-
berg (“Está na Hora de Outras Nações Conhecerem o Desejo da Alemanha pela Paz”), Hermann Goering
(“Reich Treina Juventude para Construir Força Aérea, mas Não para Guerra”), e do ditador fascista Benito
Mussolini (“Itália se glorifica no militarismo, diz Duce; Pacifistas, os Piores Inimigos da Paz”). Ver George
Seldes, Facts and Fascism, p. 227.
16. Philip Foner, The Fur and Leather Workers Union, Newark, Nordan Press, 1950, pp. 106-107.
17. Ibid., pp. 194-195.
18. Ibid., p. 439.
19. Ver New York Evening Journal, 15, 17, 18, 20, 22 e 23 de abril de 1935. Os contos de canibalismo de Lang
seguem vivos em tais livros como The Soviet Revolution 1917-1939 de Raphael Abramovitch, Nova Iorque,
International Universities Press, 1962 (p. 345).
20. Daily Worker, 21 de maio de 1935.
21. Socialist Call, abril de 1935.
22. Daily Worker, 23 de abril e 16 de maio de 1935.
23. Forward, 18 de abril de 1935.
24. The Nation, 8 de maio de 1935.
25. Ver The Nation, 13 de março de 1935.
26. The Nation, 26 de junho de 1935. Ver também Daily Worker, 8 de junho de 1935.
27. The Nation, 26 de junho de 1935.
28. Daily Worker, 8 de junho de 1935.
29. Harvey Klehr, The Heyday of American Communism: The Depression Decade, Nova Iorque, Basic Books,
1984, p. 440.
30. Globe and Mail, 23 de março de 1947.
31. Daily Worker, 12 a 15 de julho de 1935.
32. Ibid., 20 de julho de 1935.
33. Fred Beal, Foreign Workers in Soviet Tractor Plant, 1933, pp. 49-50.
NOTAS| 241

34. Fred Beal, Proletarian Journey, Nova Iorque, Hilman-Curl, 1937, p. 247. Publicado na Inglaterra como
Word from Nowhere.
35. Ibid., p. 280.
36. Ibid., p. 279.
37. Ibid., p. 305.
38. Ibid., p. 350.
39. Ibid., p. 310.

CAPÍTULO 3: FOTOS DA FOME: QUAL FOME?


1. Ver por exemplo “Hungerhoelle Sowjetrussland - Das Massensterben in Sowjet ‘Paradies’”, Voelkischer Be-
obachter (Berlim), 18 de agosto de 1933.
2. Voelkischer Beobachter, 25 de janeiro de 1935.
3. New York Times, 10 de fevereiro de 1935.
4. Ewald Ammende, Muss Russland Hungern? Viena, Wilhelm Braumuller, 1935.
5. Ewald Ammende, Human Life in Russia, Cleveland, John T. Zubal, 1984.
6. Por exemplo Berliner Tageblatt, Koelnische Zeitung, Nordschleswigsche Zeitung, Nation und Staat, etc.
(Alemanha nazista); Osservatore Romano (Vaticano); vários jornais nacionalistas ucranianos como Dilo e
America, assim como várias publicações pró-nazistas Volksdeutsche fora da Alemanha propriamente dita.
7. Ammende (referência daqui em diante é de Human Life in Russia), p. 22.
8. Ibid., p. viii.
9. Ibid., p. 22.
10. Ibid., p. 23.
11. Ibid.
12. Também, a edição alemã inclui algumas fotos que não estão na edição em inglês.
13. Ammende, p. 23.
14. Ibid.
15. Ibid., opposite p. 64, p. 82.
16. Por exemplo, as fotos opostas à página de título, pp. 64, 129, p. 161 (canto inferior).
17. Ammende, opposite p. 65 (direita).
18. A Rússia de Peter Ustinov, Parte 5: Guerra e Revolução.
19. Ammende, p. 23.
20. Ibid., página oposta 224 (canto inferior).
21. La Famine en Russie, Album Illustré, Livraison N◦ 1, Genebra, Comite Russe de Secours aux Affames en
Russie, 1922 (em francês e russo), p. 10.
22. The Black Deeds of the Kremlin, Volume II, The Great Famine in Ukraine in 1932-1933, Detroit, DO-
BRUS, 1955, p. 436.
23. Rev. Isidore Nahayewsky, History of Ukraine, 2ª edição expandida e suplementada, Filadélfia, America
Publishing House of Providence Association of Ukrainian Catholics in America, 1975.
24. Walter Dushnyck, 50 Years Ago: The Famine Holocaust in Ukraine - Terror and Human Misery as Instru-
ments of Soviet Russian Imperialism, Nova Iorque e Toronto, World Congress of Free Ukrainians, 1983,
p. 36.
242 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

25. Ammende, página oposta 128 (topo), página oposta 193, duas fotos página oposta 64.

26. Ver, por exemplo, Dana Dalrymple, “The Soviet Famine of 1932-1934”, Soviet Studies, janeiro de 1964;
Wasyl Hrushko, The Ukrainian Holocaust, Toronto, Bahryany Foundation, 1983.

27. The Great Famine in Ukraine: The Unknown Holocaust, Nova Jersey, Ukrainian National Association,
1983. Esse livro é ilustrado inteiramente com fotografias de fome plagiadas da Primeira Guerra Mundial
à era da fome russa de 1921-1922. Por exemplo, a capa do livro consiste em uma foto plagiada do Comitê
Internacional de Ajuda à Rússia do Dr. F. Nansen, Informação N◦ 22, Genebra, 30 de abril de 1922, p. 6.
A foto na página 73 (canto inferior) vem do mesmo boletim de 1922 (p. 19).

28. Alfred Laubenheimer, Und du Siehst die Sowjets Richtig: Berichte von deutschen und auslaendischen “Spe-
zialisten” aus der Soqjet Union, segunda edição revisada, Berlim e Leipzig, Nibelungen Verlag, 1937.

29. Ammende, p. 23.

30. Ibid., pp. 274-275. Ênfase acrescentada.

31. Ibid., p. 10.

32. Ibid., p. 11.

33. Ibid., pp. 13-16.

34. Ibid., p. 19.

35. Voelkischer Beobachter, 13 de outubro de 1933.

36. “Historic Introduction”, Ammende, p. ix. Ênfase no original.

37. Esse autor comparou fotos supostamente da fome ucraniana de 1932-1933 com centenas de fotos dos tem-
pos de guerra e pós-guerra de cenas de miséria e epidemia de 1918 até o início dos anos 1920, encontradas
em antologias e documentários. Ver, por exemplo, Ernst Friedrich, War Against War, Berlim, Freijugend,
1925. Esse autor conclui que a maioria das fotos da “fome” tem uma afinidade técnica mais próxima com
fotos desse período anterior. Algumas das fotos “de 1932-1933” são de uma qualidade tão rude e retratam
cenas tão antiquadas que um período de origem ainda mais antigo é aviltado.

38. Ammende, pp. 13, 17.

39. Marco Carynnyk, “The Dogs That Did Not Bark” [“Os Cães Que Não Latiam”], The Idler, fevereiro de
1985, p. 19.

40. Alfred Laubenheimer, Und du Siehst die Sowjets Richtig: Berichte von deutschen und auslaendischen “Spe-
zialisten” aus der Sowjet-Union, Berlim e Leipzig, Nibelungen Verlag, 1935.

41. Ibid., p. 12.

42. Ibid., placas 78-102, pp. 329-340.

43. Ibid., placas 79-80, 82-88, 90-96.

44. Ibid., p. 315. A edição de 1937 do Und du Siehst também inclui o artigo e as fotografias de Ditloff.

CAPÍTULO 4: GUERRA FRIA I: FEITOS SOMBRIOS


1. O historiador americano J. Arch Getty, por exemplo, descreve a teoria da “fome intencional” como uma que
“não tem sido aceita geralmente fora dos círculos dos nacionalistas exilados”. Ver J. Arch Getty, “Starving
the Ukraine” [“Matando a Ucrânia de Fome”], London Review of Books, 22 de janeiro de 1987, p. 7.

2. A teoria da “conspiração judaica”, por exemplo, pode ser vista em Yuryj Chumatskyj, Why Is One Holo-
caust Worth More Than Others? Lidcombe, Austrália, veteranos do Exército Insurgente Ucraniano (UPA),
1986, e Canadian Farmer (Winnipeg), 25 de novembro de 1963. Para saber mais sobre este assunto, ver
Douglas Tottle, “Anti-Semitism and the Ukrainian 1933 Famine-Genocide Hoax” [“Antissemitismo e a
Farsa da fome-genocídio Ucraniana de 1933”], Outlook (Vancouver), junho de 1987.
NOTAS| 243

3. The Black Deeds of the Kremlin, A White Book, Volume 1 (Book of Testimonies), Toronto, Associação Ucra-
niana de Vítimas do Terror Comunista Russo, 1953. The Black Deeds of the Kremlin, Volume II, The Great
Famine in Ukraine in 1932-1933, Detroit, A Organização Democrática de Ucranianos Anteriormente Per-
seguidos pelo Regime Soviético nos EUA, 1955.
4. Artigo de um agente do Escritório de Serviços Estratégicos que havia observado colaboradores nazistas do
leste europeu se preparando para uma falsa entrada nos EUA, inseridos no Apêndice de Registro do Con-
gresso durante o debate de 7 de agosto de 1948 sobre o Projeto de Lei de Pessoas Desalojadas, Congresso
dos Estados Unidos. Citado em John Loftus, The Belarus Secret, Nova Iorque, Alfred A. Knopf, 1982, p.
86.
5. A “Comissão Internacional” organizada por nazistas incluía duas pessoas da Alemanha Nazista, três de
países alinhados com a Alemanha Nazista (Itália, Finlandia, França de Vichy) e duas de países ocupados
pelos nazistas (Holanda e Bélgica). Ver Black Deeds, Vol. I, p. 414.
6. Apollon Trembovetskyj, Zlochyn u Vinnytsya (Crime em Vinnytsia), Vinnytsia, Vinnytski Visti Publishers,
1943.
7. Ibid., p. 4.
8. Ibid., p. 46.
9. Ibid., pp. 7, 9, 43, 36.
10. Oberleutnant Erwin Bingel em “The Extermination of Two Ukrainian Jewish Communities: Testimony
of a German Army Officer” [O Extermínio de Duas Comunidades Judaicas Ucranianas: Testemunho de
um Oficial do Exército Alemão”], Yad Vashem Studies, Vol III, Jerusalém, 1959, pp. 303-320.
11. Tremboverskyj. p. 44.
12. Black Deeds, Vol I, p. 226.
13. Ibid., p. 213.
14. Ibid., p. 193.
15. Ibid., p. 228; “Information Nº 22”, Genebra, Comitê Internacional de Ajuda à Rússia, 1922, p. 16; Ewald
Ammende, Human Life in Russia, Cleveland, John T. Zubal, 1984, p. oposta 65.
16. News from Ukraine, Nº 28-30, 1986.
17. Black Deeds, Vol. I, p. 545.
18. Their True Face, Parte III, Lvov, Ukraina Society, 1978, p. 57. Este livro contém um capítulo inteiro sobre
Shpak/Bilotserkiwsky, mais uma fotografia.
19. Ibid., pp. 55-57.
20. Ibid.
21. Ukrainsky Visti (Edmonton). SUZERO, editora de Black Deeds, é filiada a esta Federação.
22. Black Deeds, Vol. I, p. 291.
23. Ver Capítulo 9 e Apêndice.
24. Black Deeds, Vol. II, p. v. Kersten elaborou a Emenda Kersten, endossada pelo Congresso dos EUA em
1953, para alocar US$ 100 milhões para estabelecer movimentos “subterrâneos” na URSS e em outros
países do Leste Europeu.
25. Ibid., pp. vii-viii.
26. Ibid., pp. v-vi.
27. Ibid., pp. 436, 443, 448, 463, 466 (também usada por Walker), 488, 538 (também usada pelo Voelkischer
Beobachter, 18 de agosto de 1933), 554, 560, 598 (também usada por Walker) - idênticas às fotos usadas por
Ammende em Human Life in Russia. Cenas do período da Guerra Civil e da fome russa de 1921-1933: pp.
161, 166, 170, 175, 177, 444, 457 (publicado em “Information Nº 22”, Genebra, Comitê Internacional de
Ajuda à Rússia, 1922, p. 15), 475, 494, 504, 508, 556, 595, 620, 692, 701. Muitas das últimas parecem ter
sido seletivamente recortadas.
244 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

28. Ibid., pp. 650-652, 655, 660, 662.

CAPÍTULO 5: O JOGO DOS NÚMEROS


1. Winnipeg Free Press, 21 de dezembro de 1984.

2. Dana G. Dalrymple, “The Soviet Famine of 1932-1934” [“A Fome Soviética de 1933-1934”], Soviet Studies,
janeiro de 1964, Oxford, Basil Blackwell, pp. 259-260.

3. Ibid., p. 256.

4. Ibid., p. 262.

5. Gerald Reitlinger, The House Built of Sand: The Conflicts of German Policy in Russia, 1941-1944, Londres,
Weidenfeld and Nicholson, 1960, p. 191.

6. Marco Carynnyk, The Idler, fevereiro de 1985, p. 20.

7. Citado por R. Bishop, “Anti-Soviet Propaganda in Britain”, International Press Correspondence, 5 de ou-
tubro de 1934, p. 1371.

8. John Loftus, The Belarus Secret, Nova Iorque, Alfred A. Knopf, 1982, p. 107.

9. Ibid., p. 178.

10. Dalrymple, p. 268.

11. Ver, por exemplo, James Mace, “Historic Introduction”, em Ewald Ammende, Human Life in Russia,
Cleveland, John T. Zubal, 1984, p. ix.

12. The New Republic, 30 de agosto de 1933, p. 57.

13. Ibid.

14. New York Times, 15 de outubro de 1934.

15. Michael Parenti, The Politics of Mass Media, Nova Iorque, St. Martin’s Press, 1986, p. 116.

16. Dalrymple, p. 254.

17. Joseph McCabe, The Vatican in Politics Today, Londres, Watts and Co., 1947, pp. 44, 52.

18. Donald S. Strong, Organized Anti-Semitism in America: The Rise of Group Prejudice During the Decade
1930-1940, Washington, DC, Conselho Americano sobre Assuntos Públicos, 1941, p. 61.

19. Dalrymple não menciona os relatos de Louis Fischer, Sherwood Eddy, George Bernard Shaw, os canadenses
Frederick Griffin, Robert Byron e uma série de outros cujos relatos de primeira mão contradizem a tese de
“fome-genocídio pré-planejado”.

20. Dalrymple, pp. 250, 251. Um terceiro grupo poderia ser acrescentado - as próprias testemunhas de Dalrym-
ple. Usando o seu método, esta terceira categoria pode ser descrita como aqueles que, por uma ou outra
razão - por exemplo, não estar lá - não viu fome, mas que por razões políticas ou financeiras inventou histó-
rias incríveis de milhões de mortes deliberadas (uso opcional de fotos fraudulentas).

21. Ibid., p. 251.

22. Ibid.

23. Sir John Maynard, The Russian Peasant and Other Studies, Londres, Victos Gollaner, 1942, p. 269.

24. Warren B. Walsh, Russia and the Soviet Union: A Modern History, Ann Arbor, University of Michigan
Press, 1958, p. 451.

25. Dalrymple, p. 251.

26. EKPAH-EKRAN, Revista Ucraniana para Jovens e Adultos, Chicago, Nº 123-125, 1983, p. 2.
NOTAS| 245

27. Yurij Chumatskyj, Why Is One Holocaust Worth More Than Others? Lidcombe, Austrália, veteranos do
Exército Insurgente Ucraniano (UPA), 1986, pp. 34, 41, ênfase acrescentada. Chumatskyj, como Goeb-
bels, reivindica o direito de decidir quem é um judeu; Duranty - nascido na Irlanda e educado na Inglaterra
- não era judeu.
28. Dana Dalrymple, “The Soviet Famine of 1932-1934, Some Further References”, Soviet Studies, Oxford,
Basil Blackwell, Abril de 1965, pp. 471-474.
29. Ibid., p. 471.
30. Ibid.
31. Ibid.
32. O artigo de Barnes citado por Dalrymple foi intitulado “Million Feared Dead of Hunger in South Russia”
[“Milhões Temem Morrer de Fome no Sul da Rússia”]. Dalrymple, janeiro de 1964, p. 260.
33. Dalrymple, abril de 1965, p. 472.
34. Ibid.
35. Ibid., p. 473.
36. Ibid.
37. Ibid., pp. 473-474.
38. Ibid., p. 474.
39. James Mace, por exemplo, descreve o artigo de Dalrymple como “inovador”. Ver Ammende, p. iii.

CAPÍTULO 6: GUERRA FRIA II, A CAMPANHA DOS ANOS


1980
1. Oksana Procyk, Leonid Heretz, James E. Mace, Famine in the Soviet Ukraine 1932-1933: A Memorial
Exhibition, Widener Library, Universidade de Harvard, Cambridge, Harvard College Library, 1986, p. 66.
2. Para um exemplo recente, ver Hank Carson, “Harvard Embarrassed by CIA Link” [“Harvard Constrangida
por Ligação com a CIA”], The Guardian (Nova Iorque), 6 de novembro de 1985, p. 5. Sobre um escândalo
relacionado ao financiamento de uma conferência de “política islâmica”, Carson escreve: “Autoridades
da universidade estavam com raiva, não por causa da conexão com a CIA - como muitas universidades,
Harvard tem ligações extensivas, longevas com a agência - mas porque (o professor de Harvard) Safran não
processou o dinheiro da CIA pelos canais da universidade e deu parte do dinheiro a Harvard por despesas
gerais.”
3. C. Ford, Donovan of OSS, Boston, Little, Brown and Co., 1970, p. 111.
4. Ibid., pp. 149150.
5. Olexa Woropay, The Ninth Circle: In Commemoration of the Victims of the Famine of 1933, editado por
James E. Mace, Cambridge, Fundo de Estudos Ucranianos da Universidade de Harvard, 1983.
6. Professor John Ryan, Departamento de Geografia, Universidade de Winnipeg, para Bryan Dixon do Con-
selho Escolar de Winnipeg, 23 de janeiro de 1984.
7. John Loftus, The Belarus Secret, Nova Iorque, Alfred A. Knopf, 1982, pp. 117-118; Dr. James E. Mace,
Introdução, The Ninth Circle, p. xi; Dr. James E. Mace, Historical Introduction, Human Life in Russia
de Ewald Ammende, Cleveland, John T. Zubal, 1984, p. iv, n. 4, p. v, n. 8.
8. Woropay, p. 17.
9. Famine in the Soviet Ukraine, p. xi.
10. Ibid., p. 45.
11. Ibid., p. xi.
246 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

12. Alfred Laubenheimer, Und du Siehst die Sowjets Richtig: Berichte von deutschen und auslaendischen “Spe-
zialisten” aus der Sowjet Union, Berlim-Leipzig, Nibelungen-Verlag, 1935, p. 259.
13. Ibid., p. 118.
14. Ibid., pp. 100-106. Tradução de extrato de Winter in Moscow, Londres, Eyre and Spottiswood, 1933.
15. Alfred Laubenheimer, Die Sowjet Union am Abgrund, Berlim-Halensee, Verlag Volkswirtschaftsdienst,
1933.
16. Ver Und du Siehst, última página.
17. A cópia do autor de Die Sowjet Union am Abgrund leva não só o emblema do Partido Nazista, mas também
a carimbo “Embajada de Alemania, Sevicio de Prensa Salamanca”.
18. Die Sowjet Union am Abgrund, placa 13, p. 45; placa 16, p. 50.
19. Ver Capítulo 9 e Apêndice.
20. Charles Higham, American Swastika, Nova Iorque, Doubleday, 1985, p. 119.
21. Em Walter Dushnyck, 50 Years Ago: The Famine Holocaust in Ukraine, Terror and Misery as Instruments
of Soviet Russian Imperialism, Nova Iorque, Congresso Mundial de Ucranianos Livres, 1983, p. 5.
22. Ryan to Dixon.
23. Dushnyck, p. 56.
24. Ibid., p. 35.
25. Albert Szymanski, Human Rights in the Soviet Union, Londres, Zed Press, 1984, p. 225.
26. S. G. Wheatcroft, “On Assessing the Size of Forced Concentration Camp Labor in the Soviet Union, 1926-
1956”, Soviet Studies, 2 de Abril de 1981, p. 285.
27. Dr. James E. Mace, “Famine and Nationalism in Soviet Ukraine”, Problems of Communism, maio-junho
de 1984, pp. 37-50.
28. Ver, por exemplo, Flo Conway e Jum Siegelman, Holy Terror, Nova Iorque, Delta, 1984, p. 418; “A Grande
Guerra de Palavras”, Time, 9 de setembro de 1985, p. 35; Phillip Agee, Inside the Company: CIA Diary,
Penguin, 1975, Apêndice II; Roger Burbach e Patricia Flynn, The Politics of Intervention: The United States
in Central America, Nova Iorque, Monthly Review Press, 1984, p. 140; Stephen Schlesinger e Stephen
Kinser, Bitter Fruit: The Untold Story of the American Coup in Guatemala, Garden City, Nova Iorque,
Anchor Press/Doubleday, 1983, p. 136; “Sandinistas Outgunned in Regional Radio Wars”, The Guardian
(Nova Iorque), 11 de setembro de 1985, p. 13.
29. Mace, “Famine and Nationalism in Soviet Ukraine”, p. 39.
30. Barbara A. Anderson e Brian D. Silver, “Demographic Analysis and Population Catastrophes in the USSR”,
Slavic Review, Vol. 44, Nº 3, 1985, p. 532.
31. Ibid., pp. 532-533.
32. Ibid., p. 534.
33. Frank Lorimer, The Population of the Soviet Union, Genebra, Liga das Nações, 1946, p. 240.
34. Dr. James E. Mace para o Professor Jaroslaw Rozumnyj, 4 de fevereiro de 1984. Uma cópia desta carta
enviada por Mace para o Comitê Ucraniano Canadense (UCC) foi apresentada numa reunião do Conselho
Escolar de Winnipeg, 14 de fevereiro de 1984, em apoio à campanha da UCC para incluir o tema da “fo-
me-genocídio” no currículo escolar.
35. Ian Grey, Stalin: Man of History, Londres, Weidenfeld and Nicholson, 1979, p. 370.
36. Cambridge Encyclopaedia of Russia and the Soviet Union, A. Brown, J. Fennell, M. Kaser, H. Willetts, eds.,
Cambridge, Cambridge University Press, 1982, p. 75.
37. Canada Year Book, Ottawa, Dominion Bureau of Statistics, Dept. of Trade and Commerce, 1945, p. 193.
38. Julian V. Bromley, ed., Present-Day Ehnic Processes in the USSR, Moscou, Progress Publishers, 1982, p. 68.
NOTAS| 247

39. Volodymyr Kubijovyc, ed., Ukraine: A Concise Encyclopedia, Vol. I, Toronto, University of Toronto Press,
1982, p. 811 afirma que ucranianos representam 80,1% dos 31,4 milhões de habitantes da RSS Ucraniana
em 1931.
40. Ihor Kamenetsky dá um número de 10 milhões. Ver Hitler’s Occupation of Ukraine, Milwaukee, Marquette
University Press, 1956, p. 84.
41. Este número incluiria a população étnica ucraniana de terras ocidentais incorporadas à União Soviética
imediatamente antes e depois da Segunda Guerra Mundial.
42. Bromley, p. 68.

CAPÍTULO 7: A COLHEITA DA DECEPÇÃO


1. New York Independent, julho/agosto de 1985, p. 68.
2. Peter Paluch, “Spiking the Ukrainian Famine Again”, National Review, 11 de abril de 1986, pp. 33-38.
3. Alexander Dallin, German Rule in Russia 1941-1944: A Study of Occupation Politics, Londres, Macmillan,
1957, p. 483, n.
4. Nastup (Praga), 12 de julho de 1943. Citado por Klym Dmytruk, Swastikas on Soutanes, Kiev, Politvidav
Publishers, pp. 123-124.
5. Dallin, p. 237.
6. Ibid., p. 213, n. 2.
7. Oberleutnant Erwin Bingel, em “The Extermination of Two Ukrainian Jewish Communities: Testimony
of a German Army Officer”, Yad Vashem Studies, Vol. III, Jerusalém, 1959, pp. 303-320. Ver também
Capítulo 4.
8. John Loftus, The Belarus Secret, Nova Iorque, Alfred A. Knopf, 1982, p. 72.
9. Toronto Star, 20 de novembro de 1984.
10. Winnipeg Free Press, 26 de outubro de 1984.
11. Ibid.
12. Segue uma lista parcial de falsidades usadas no Harvest of Despair:

• retrato (porção superior) de uma mulher com a cabeça coberta: foto de Walker, série de 1935 do
New York Evening Journal; usado também por Ammende, Human Life in Russia, p. op. 64,
atribuído a um ano, estação e fotógrafo diferentes;
• homem vestido para o inverno com um chapéu de pele: foto de Walker, Chicago American, 4 de
março de 1935;
• cavalo morto: detalhe recortado, foto de Walker, Chicago American, 25 de fevereiro de 1935; tam-
bém usada por Ammende, Human Life in Russia, placa de abertura, parte inferior, atribuída a um
ano, estação e fotógrafo diferentes; London Daily Express, 6 de agosto de 1934, alegando fome em
Belgorod (que fica na Rússia, não na Ucrânia);
• mulher estirada num campo: foto de Walker, New York Evening Journal, 21 de fevereiro de 1935;
Ammende, Human Life in Russia, p. op. 129, atribuída a um ano, estação e fotógrafo diferentes;
• corpos mortos num vagão de carga: Ammende, Human Life in Russia, p. op. 192, parte inferior;
• cena do cemitério congelado, Ammende, Human Life in Russia, p. op. 224 (fornecida como
“verão de 1933”); variação fora de ângulo da foto usada em La Famine en Russie, Genebra, 1922,
p. 10, esquerda.
• cadáver de criança nua na rua: publicada primeiramente em relação a 1932-1933 no órgão do
partido nazista Voelkischer Beobachter, 18 de agosto de 1933;
• carroça e coletores de cadáveres, estes últimos usam artigos de uniforme militar no estilo da Pri-
meira Guerra Mundial: Voelkischer Beobachter, 18 de agosto de 1933;
248 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

• carroceiro, com chapéu de pele, ao lado de um vagão carregado de cadáveres nus: “Funeral Pro-
cession in Kherson” [“Procissão Funeral em Cherson”] de 1922, “Information Nº 22”, Comitê
Internacional de Ajuda à Rússia, 30 de abril de 1922, p. 21;
• mulher deitada de bruços no chão: foto de Walker, série de 1935 do Chicago American;
• garota jovem e loira vestindo uma bata: detalhe recortado de foto de refugiados de 1922, Saratov,
Russia, La Famine en Russie, Genebra, 1922, p. 5

13. Hryts Mukhailiv, “Ghosts of Despair”, News from Ukraine, Nº 48 (932), Novembro de 1986.
14. Ibid.
15. Globe and Mail, 8 de novembro de 1986.
16. Toronto Star, 20 de novembro de 1986, ênfase acrescentada.
17. Ibid.
18. Globe and Mail, 18 de novembro de 1986.
19. “Press Release”, “Ukrainian Famine Research Committee”, St. Vladimir Institute, sob os auspícios do
Comitê Ucraniano Canadense, Toronto, 19 de novembro de 1986.
20. Ibid.
21. Como destacado na nota 12 acima.
22. “Press Release”.
23. Ibid.
24. Ibid.
25. Ibid.
26. Ibid., ênfase acrescentada.
27. Ibid., ênfase no original.
28. Winnipeg Free Press, 26 de outubro de 1984.
29. Ver Douglas Tottle, Letter to the Editor [Carta ao Editor], Globe and Mail, 13 de dezembro de 1986,
documentando o uso fraudulento de seis fotos no Globe and Mail, 29 de novembro e 1 de dezembro de
1986. Dessas seis fotos, só uma é usada em Harvest of Sorrow.
30. Robert Conquest, Harvest of Sorrow: Soviet Collectivization and the Terror Famine, Edmonton, University
of Alberta Press, em associação com o Canadian Institute of Ukrainian Studies, 1986.
31. “Death of the department that never was. David Leigh recounts the 30 years history of the Foreign Office’s
propaganda operation”, London Guardian, 27 de janeiro de 1978.
32. Ibid.
33. Ibid.
34. Military History, abril de 1986.
35. Ibid.
36. Robert Conquest, The Great Terror, Nova Iorque, Macmillan, 1973, p. 23.
37. Ukrainian Weekly, Vol. LI, Nº 12, 20 de março de 1983.
38. Harvest of Sorrow, p. 37.
39. Ibid., pp. 333-334.
40. Ibid., pp. 376-382.
41. Ibid., pp. 9, 396.
NOTAS| 249

42. Ibid., p. 244.


43. Ibid., p. 380, n. 133.
44. Rui Umezawa, “Re-evaluating the terror famine. The Ukrainian Holocaust debate surfaces again in Wes-
tern Canada” [“Reavaliando a fome terror. O debate do Holocausto Ucraniano emerge novamente no
Canadá Ocidental”], Alberta Report, 26 de janeiro de 1987.
45. Harvest of Sorrow, entre pp. 196 e 197.
46. Umezawa em Alberta Report.
47. Paul Fussell, The Great War in Modern Memory, Oxford, 1975, p. 310, citado em J. Arch Getty, The Ori-
gins of the Great Purges, Cambridge, Cambridge University Press, 1985, p. 4. Sobre a não-confiabilidade de
autobiografia como evidência histórica, Getty também cita Louis Gottschalk, Clyde Kluckhohn, Robert
Angell, “The Use of Personal Documents in History, Anthropology and Sociology” [“O uso de documen-
tos pessoais em história, antropologia e sociologia”], Bulletin of Social Sciences Research Council, Nº 53,
1945; Kenneth D. Barkin, “Autobiography and History”, Societas, Vol. 6, Nº 2, primavera de 1976, pp.
83-103.
48. Getty, p. 5.
49. Ibid., p. 6; p. 222, n. 12.
50. The Great Terror, p. 569.
51. Getty, p. 222, n. 22.
52. Harvest of Sorrow, p. 204. Ênfase acrescentada.
53. Ibid., pp. 299-307. Para críticas a tais “análises”, ver Barbara A. Anderson e Brian D. Silver, “Demographic
Analysis and Population Catastrophes in the USSR” [“Análise Demográfica e Catástrofes Populacionais
na URSS”], Slavic Review, Vol. 44, Nº 3, 1985, p. 517 ff; Stephen G. Wheatcroft, “New Demographic
Evidence on Excess Collectivization Deaths” [“Novas Evidências Demográficas Sobre as Mortes em Excesso
na Coletivização”], Slavic Review, Vol. 44, Nº 3, 1985, p. 50 ff; Barbara A. Anderson and Brian D. Silver,
“Tautologies in the Study of Excess Mortality in the USSR in the 1930s”, Slavic Review, Vol. 45, Nº 2,
verão de 1986, p. 307 ff; e capítulo 6 deste livro.

CAPÍTULO 8: A FOME
1. Ver, por exemplo, Dr. James E. Mace para Professor J. Rozumnyj, 4 de fevereiro de 1984.
2. Michael Hrushevsky, A History of Ukraine, publicado para a Associação Nacional Ucraniana, New Haven,
Yale University Press, 1941, p. 566. Hrushevsky foi presidente da Rada Central da Ucrânia, chefe de estado
(1917-1918) do breve “governo” do grupo nacionalista. A History of Ukraine foi reimpresso em 1970 pela
Archon Books com nenhuma mudança substantiva nas seções em questão.
3. Ibid., p. 551, n.
4. Charles Higham, American Swastika, Nova Iorque, Doubleday, 1985, p. 119. Higham caracteriza a As-
sociação Nacional Ucraniana (para quem A History of Ukraine foi publicado) como sendo repleto de ele-
mentos pró-nazistas antes da entrada dos americanos na Segunda Guerra Mundial (pp. 118-119).
5. Relatório da Associated Press, Washington, 29 de setembro de 1939, citado por Lieut. William A. Kardash,
MLA, Hitler’s Agents in Canada, Toronto, Morris Printing Co., 1942, p. 17.
6. Nicholas V. Riasnovsky, A History of Russia, Nova Iorque, Oxford University Press, 1977, p. 551.
7. Michael T. Florinsky, Russia: A Short History, Toronto, Macmillan, 1969, p. 510.
8. Ibid., ver Introdução.
9. Ewald Ammende, Human Life in Russia, Cleveland, John T. Zubai, 1984, p. 53.
10. From the First to the Second Five Year Plan: A Symposium, Moscou e Leningrado, Cooperative Publishing
Society of Foreign Workers in the USSR, 1933, p. 174.
250 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

11. S. P. Trapenznikov, Leninism and the Agrarian Peasant Question, Vol. II, Moscou, Progress Publishers,
1981, pp. 67-68.
12. Frederick L. Schuman, Russia Since 1917: Four Decades of Soviet Politics, Nova Iorque, Alfred K. Knopf,
1957, pp. 151, 152.
Em alguns aspectos, a destruição dos kulaks superou a dos nazistas no território soviético ocupado: 32 mi-
lhões de cabeças de gado e 97 milhões de ovelhas e cabras destruídas pelos kulaks; comparado a 17 milhões
e 27 milhões respectivamente pelos nazistas. Ver Pyotr Mikhailov, “Mercy in the Inferno of War” [“Mise-
ricórdia no Inferno da Guerra”], Soviet Life (Washington, DC), outubro de 1985, p. 35.
13. Isaac Mazepa, “Ukraina under Bolshevist Rule”, Slavonic Review, Vol. 12, 1933-1934, pp. 342-343.
14. The Nation, 29 de maio de 1935.
15. From the First to the Second Five-Year Plan, p. 280.
16. Istoria Ukrainskoi RSR [“História da RSS da Ucrânia”], Vol. 6, Kiev, Naukova Dumka, 1977, p. 220.
17. Hans Blumenfeld, Life Begins at 65: The Not Entirely Candid Autobiography of a Drifter, Montreal, Har-
vest House, 1987, pp. 152, 153.
18. Dana G. Dalrymple, “The Soviet Famine of 1932-1934: Some Further References” [“A Fome Soviética de
1932-1934: Mais Algumas Referências”], Soviet Studies, abril de 1965, p. 471.
19. Ver, por exemplo, M. P. Bazhan (editor chefe), Soviet Ukraine, Kiev, escritório editorial da Enciclopédia
Soviética da Ucrânia, Academia de Ciências da RSS da Ucrânia, 1969, p. 293.
20. Blumenfeld, pp. 153, 154.
21. Albert Rhys Williams, The Russians, Nova Iorque, Harcourt Brace, 1943, p. 101.
22. Citado por Carl Marzani, We Can Be Friends: The Origins of the Cold War, Nova Iorque, Topical Books
Publishers, 1952, p. 272. Schuman fornece os mesmos números, p. 145.
23. Saturday Evening Post, 27 de setembro de 1945, citado por Ihor Kamenetsky, Hitler’s Occupation of Ukraine
1941-1944, Milwaukee, Marquette Universe Press, 1956, p. ix.
24. Ibid.
25. Heinz Hohne, The Order of the Death’s Head, Londres, Pan, 1972, p. 464.
26. Ver, por exemplo, “No Famine Anywhere Else in Russia” [“Nenhuma Fome em Nenhum Outro Lugar na
Rússia”], The Black Deeds of the Kremlin, Vol. II, Detroit, 1955, pp. 621-622.
27. Olexa Woropay, The Ninth Circle, Cambridge, Fundo de Estudos Ucranianos da Universidade de Harvard,
1983, p. xx.
28. Em Ammende, p. viii.
29. Alec Nove, “When the Head is Off...”, The New Republic, 3 de Novembro de 1986, p. 37.
30. Globe and Mail, 28 de fevereiro de 1984.
31. James Mace, por exemplo, refere-se à contínua “fome”, “empobrecimento mais ou menos permanente”,
e declara: “Embora a situação fosse menos horrível depois de 1933, a necessidade de medidas de alívio
humanitárias permaneceu uma realidade premente em toda a década de 1930”. Ver Ammende, p. ix.
32. Lev Shankivsky, Pokhidni brupy OUN, Munique, 1958, p. 72.
33. Publicado em Suchasne i Maibutnje, nº 4, 1948.
34. William M. Mandel, Soviet but not Russian, Edmonton, University of Alberta Press, 1985, p. 238.
35. Volodymyr Kubijovyc (editor), Ukraine: A Concise Encyclopaedia, Vol. II, publicada para a Associação
Nacional Ucraniana, University of Toronto Press, Toronto, 1971, p. 1083.
36. Ibid.
37. Mandel, p. 239.
NOTAS| 251

38. Roman Szporluk, “The Ukraine and the Ukrainians”, em Zev Katz (editor), Handbook of Major Soviet
Nationalities, Nova Iorque, Free Press, 1975, p. 24.
39. Mykola Stepanenko, “Ukrainian Culture in the Brezhnev-Kosygin Era”, em G. W. Simmonds (editor),
Nationalism in the USSR and Eastern Europe, Detroit, Universidade de Detroit, 1977, p. 78.

CAPÍTULO 9: COLABORAÇÃO E CONLUIO


1. Ver Valery Styrkul, We Accuse: Documentary Sketch, Kiev, Dnipro Publishers, 1984, pp. 139-142; Reuben
Ainsztein, Jewish Resistance in Nazi-Occupied Eastern Europe, Harper and Row, 1974, p. 252; Scott An-
derson e Jon Lee Anderson, Inside the League, Nova Iorque, Dodd Mead, 1986, pp. 22-25.
2. Winnipeg Free Press, 4 de abril de 1984.
3. Saul S. Friedman, Pogromchik, Nova Iorque, 1976, p. 374.
4. Styrkul, p. 141.
5. Entrevista com o autor, início de novembro de 1984.
6. Ainsztein, p. 252.
7. Ibid., p. 255.
8. Nahum Kohn e Howard Roiter, A Voice from the Forest, Nova Iorque, Holocaust Library, 1980, p. 121.
9. Ibid., p. 122.
10. Gerald Reitlinger, The House Built of Sand: The Conflicts of German Policy in Russia 1939-1944, Londres,
Weidenfeld and Nicholson, 1960, pp. 163, 167.
11. John J. Reshetar, The Ukrainian Revolution, 1917-1920, Princeton, NJ, Princeton University Press, 1952,
pp. 301-303, 305. Inclui texto de tratado.
12. Ibid., pp. 300-301.
13. Ver ibid., p. 306. Vynnychenko foi presidente do Secretariado Geral da “Rada Central” de Petliura. Da
derrota da Rada, Vynnychenko escreveu: “Verdade, os bolcheviques também não tinham unidades gran-
des e disciplinadas, mas sua vantagem se baseava no fato de que toda a nossa ampla massa de soldados não
os ofereceria nenhuma resistência, ou até iriam para o lado deles; e também de que quase todos os traba-
lhadores em cada cidade juntariam suas armas com eles; de que todos os pobres das vilas aparentemente
tinham mentalidade bolchevique; e de que, numa palavra, a enorme maioria da população ucraniana em si
estavam contra nós.” Vidrodzhennia nat sii, Parte II, Viena, 1920, pp. 215-216.
14. Para informações sobre o massacre em massa de judeus ucranianos pelo exército de Petliura, ver Elias Hei-
fetz, The Slaughter of the Jews in the Ukraine in 1919, Nova Iorque, J. V. Y. Thomas Seltzer, 1921.
15. Lucy S. Dawidowicz, The War Against the Jews, Nova Iorque, Holt, Reinhart and Winston, 1975, pp. 377-
378.
16. The Black Deeds of the Kremlin, Vol. I, p. 323.
17. Ainsztein, p. 253.
18. Black Deeds, pp. 513, 515.
19. John A. Armstrong, Ukrainian Nationalism, Littleton, Colorado, Ukrainian Academic Press, 1980, pp.
173-174.
20. Citado por Klym Dmytruk, In Holy Robes, Kiev, Ukraina Society, 1978, p. 29.
21. Declarado num simpósio de professores do ensino médio, Grant Park High School, 9 de outubro de 1984.
22. Citado por Alexander J. Motyl, The Turn on the Right: The Ideological Origins and Developments of Ukrai-
nian Nationalism, 1919-1929, Nova Iorque, Columbia University Press, 1980, pp. 142-143.
23. Ibid., pp. 133-134.
252 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

24. Ibid., p. 134.


25. Y. Milyanich, “Jews, Zionism and Ukraine”, Rozbudova Natsii, nº 8-9, Praga, 1929, p. 271.
26. Ver William A. Kardash, Hitler’s Agents in Canada, Toronto, Morris Printing Co., 1942, pp. 5-7.
27. Meta (Lvov), 15ª edição, 17 de abril de 1932.
28. Ukrainian Toiler, Nº 51, 1938.
29. Novy Shliakh, 5 de janeiro de 1939.
30. Citado por R. H. Davies, This is Our Land: Ukrainian Canadians Against Hitler, Progress Books, 1943,
p. 151.
31. Michael Marunchak, The Ukrainian Canadians: A History, Winnipeg, Ottawa, Ukrainian Free Academy
of Sciences, 1970, p. 565.
32. Liturnaukovy Visnyk, maio de 1939.
33. Joe Conason, “To Catch a Nazi” [“Pegar um nazista”], Village Voice, 11 de fevereiro de 1986.
34. Nuremberg Trial of Major War Criminals before the International Military Tribunal, Nuremberg, 1947,
VII, pp. 272-273.
35. Ukraine: A Concise Encyclopaedia, Volodymyr Kubijovyc (editor), Vol. II, Toronto, University of Toronto
Press, 1971, p. 1086.
36. Ibid., p. 1087.
37. Black Deeds, p. 14.
38. Ukraine: A Concise Encyclopaedia, Vol. II, p. 505. O Comitê Central Ucraniano era encabeçado pelo
colaboracionista nazista Volodymyr Kubijovyc, que trabalhou de perto sob Hans Frank na administração
da Ucrânia ocidental ocupada pelos alemães. Frank foi executado em Nuremberg, enquanto Kubijovyc
escapou, editou enciclopédias nacionalistas e é citado como um especialista na “fome-genocídio”.
39. Ibid., p. 468.
40. Yury Boshyk (editor), Ukraine During World War II: History and its Aftermath, Edmonton, Canadian
Institute of Ukrainian Studies, Universidade de Alberta, 1986. Ver pp. 149-150. Esse livro tenta raciona-
lizar o serviço nazista da OUN, subestima o antissemitismo e a caça aos judeus dos nacionalistas, e tenta
interferir sobre a questão da presença de criminosos de guerra e colaboradores nazistas no Canadá.
41. Ihor Kamenetsky, Hitler’s Occupation of Ukraine 1941-1944, Milwaukee, Marquette University Press, 1956,
p. 82.
42. Ibid., p. 72.
43. Heinz Hohne, The Order of the Death’s Head: The Story of Hitler’s SS, Londres, Pan Books, 1972, p. 385.
Hohne cites the Nazi Wartime source, Archiv fuer Publizistische Arbeit, 26 de Agosto de 1943.
44. Louis P. Lochner (editor), The Goebbels Diaries, Garden City, Doubleday, 1948, p. 355.
45. Kamenetsky, pp. 80-81.
46. Ainsztein, pp. 359-360. Ênfase acrescentada.
47. Ibid., pp. 253-254.
48. As 28 referências são a Ivan Krypyakevych, The History of the Ukrainian Armed Forces, 2ª edição revisada,
“General Taras Chuprynka from Orders to UPA, May 1945”. Essa edição revisada do original (Lvov, 1936)
foi atualizada para incluir versões limpas de fugas de militares fascistas ucranianos durante a Segunda Guerra
Mundial. As cinco referências são a Petro Mirchuk, The Ukrainian Insurgent Army 1942-1952, Munique,
Cicero, 1953. Ao plagiar o nome do grupo Borovet (Bulba), pode ser feito para parecer que o “UPA” da
OUN foi fundado em 1942. Esses livros são tentativas pioneiras de reescrever a história da colaboração de
militares nacionalistas com os nazistas. O terrorismo continuado da OUN de Bandera contra civis soviéti-
cos e poloneses por vários anos após a rendição da Alemanha foi perpetrado pelos nacionalistas para ganhar
apoio financeiro e outros apoios de militaristas ocidentais e de agências de inteligência que anteciparam
NOTAS| 253

a guerra com a União Soviética no final da década de 1940 e início de 1950. O antissemitismo de Petro
Mirshuk, o encobrimento de suspeitos nazistas nos Estados Unidos e a minimização do Holocausto judeu
são destacados pela Liga Antidifamação de B’nai B’rith no seu relatório especial “The Campaign Against
the U.S. Justice Department’s Prosecution of Suspected War Criminals” [“A Campanha Contra a Perse-
guição do Departamento de Justiça dos EUA a Suspeitos de Crimes de Guerra”], Nova Iorque, junho de
1985, pp. 34-37.
49. Lvivski visti, Lvov, 6 de maio de 1943.
50. Canadian Bureau of the Simon Wiesenthal Centre, “Simon Wiesenthal Centre: Close Tie Between RCMP
and Pro-Fascist Wartime Ukrainian Canadian Organizations Revealed by Documents in Canadian Natio-
nal Archives. Major Ukrainian Umbrella Group Organized by RCMP Agent” [“Estreita Ligação Entre a
RCMP e Organizações de Ucranianos Canadenses Pró-Fascistas na Guerra Reveladas por Documentos em
Arquivos Nacionais Canadenses. Importante Grupo Guarda-Chuva Ucraniano Organizado por Agente
da RCMP”], Toronto, 1986.
51. Visti Combatanta, nº 5-6 (36-37), 1968, p. 23.
52. Ukrainski Samostiinyk, Fevereiro de 1950, citado por V. Khystovyi, A Plot Against the Future, Uzhgorod,
Karpaty Publishers, 1983, p. 36.
53. Nuremberg Trial, VII, p. 273.
54. Armstrong, p. 292.
55. Somado às fontes anteriormente citadas, ver Marko Terlytsia, Here is the Evidence, Toronto, Kobzar Pu-
blishing, 1984; Michael Hanusiak, Lest We Forget, Toronto, Progress Books, 1976; Richard Rashke, Escape
from Sobidor, Boston, Houghton Mifflin, 1982; Jean-Francois Steiner, Treblinka, Londres, Weidenfeld and
Nicholson, 1967; Leon W. Wells, The Janowska Road, Nova Iorque, MacMillan, 1963.

CAPÍTULO 10: CRIMINOSOS DE GUERRA, ANTISSEMITISMO


E A CAMPANHA DA FOME-GENOCÍDIO
1. John Loftus, The Belarus Secret, Nova Iorque, Alfred A. Knopf, 1982, p. 101.
2. Citado em ibid., p. 103.
3. Ibid., p. 104. A referência a divisões da SS é à facção de Melnyk da OUN e à 14ª Divisão da Waffen SS
destruída em Brody em 1944 e depois reconstruída.
4. Ibid.
5. Ver, por exemplo, “The Origins of Overkill: Nuclear Weapons and American Strategy, 1945-1960” [“As
Origens do Exagero: Armas Nucleares e Estratégia Americana, 1945-1960”], International Security, Vol.
7, nº 4, primavera de 1983; Peter Pringle e William Arkin, SIOP: The Secret U.S. Plan for Nuclear War,
Nova Iorque, 1983; Thomas H. Etzold, John Lewis Gaddis (editores), Containment: Documents on the
American Policy and Strategy, 1945-1960, Nova Iorque, Columbia University Press, 1978; Anthony C.
Brown (editor), Dropshot: The United States Plan for War with the Soviet Union in 1957, Nova Iorque,
Dial Press, 1978.
6. Final Report on the Select Committee to Study Governmental Operations with Respect to Intelligence Activi-
ties, U.S. Senate, Livro IV, Washington, Oficina Gráfica do Governo dos Estados Unidos, 1976, p. 26.
7. Sol Littman, The Rauca Case: War Criminal on Trial, Markham, Ontario, Paperjacks, 1983, p. 156.
8. Ver Peer Da Silva, Sub-Rosa: The CIA and the Uses of Intelligence, Nova Iorque, Times Books, 1978, pp.
55-56; Avro Manhattan, Catholic Imperialism and World Freedom, Londres, C.A. Watts, 1952, pp. 52-
53; Reg Whitaker, “Canada Used Loose Screen to Filter Nazi Fugitives” [“Canadá Usou Barreira Frouxa
para Filtrar Fugitivos Nazistas”], Toronto Globe and Mail, 1º de Março de 1985; William Blum, The CIA:
A Forgotten History, Londres e Nova Jersey, Zed Books, 1986, pp. 126-127.
9. Por exemplo, vimos no Capítulo 4 que o Volume I do The Black Deeds of the Kremlin foi aceito como evi-
dência documental pelo Comitê da Guerra Fria sobre Agressão Comunista encabeçada pelo Republicano
Charles Kersten. A “Emenda Kersten” liberou vastas somas de dinheiro para atividades subversivas contra
países socialistas.
254 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

10. George Kennan, Memoirs: 1950-1963, Vol. II, Boston, Toronto, Little, Brown and Co., pp. 97-99. Líder
nacionalista ucraniano Lev Dobriansky, anteriormente conectado à inteligência militar dos EUA, foi em-
baixador dos EUA nas Bahamas no início dos anos 1980.
11. Valery Styrkul, We Accuse: Documentary Sketch, Kiev, Dnipro Publishers, 1984, pp. 218-222. Styrkul cita
fontes nacionalistas, como Visti Kombatanta, nº 3, 1977.
12. Ukraine: A Concise Encyclopaedia, Vol. II, p. 1089. Encontrado numa trincheira perto de Pidgaitsy “...
onde o 13º Destacamento Punitivo da SD esteve ativo - centenas de corpos mutilados de pessoas torturadas
até a morte, com corte de orelhas, olhos arrancados, braços e pernas quebrados” (ver History Teaches a
Lesson, Kiev, Politvidav Ukraini Publishers, 1986, p. 245, n. 39).
13. Simon Wiesenthal Centre, “Close Tie Between RCMP and Pro-Fascist Wartime Ukrainian-Canadian Or-
ganizations Revealed by Documents in Canadian National Archives. Major Ukrainian Umbrella Group
Organized by RCMP”, Toronto, 1986. Ver Catherine Bainbridge, “Inquiry avoids scrutiny, Nazi hunter
says”, Winnipeg Free Press, 5 de Junho de 1986, p. 5.
14. Ibid.
15. Watson Kirkconnell, Canada, Europe and Hitler, Toronto, Oxford University Press, 1939, p. 142.
16. Citado pelo Simon Wiesenthal Centre.
17. Styrkul, p. 295.
18. Ver, por exemplo, Whitaker; e Helen Davis, “Unsung Heroes of Partisan War Unveil Deeds as a Reminder”
[“Heróis Desconhecidos da Guerra de Guerrilha Revelam Feito como Lembrança”], Toronto Globe and
Mail, 13 de maio de 1985.
19. Littman, p. 128.
20. Ibid., p. 158.
21. Visti Kombatanta, nos 5-6 (36-37), 1968, p. 12. Stepanenko cita Vasyl Veryha (Nasha Meta, nº 20 (77),
1965).
22. Loftus, p. 107.
23. Citado por Joe Conason, “To Catch a Nazi”, New York Village Voice, 11 de fevereiro de 1986.
24. Ibid.
25. Notamos anteriormente Ukraine: A Concise Encyclopaedia, editado pelo importante lacaio nazista Volo-
domyr Kubijovyc, preparado pela Shevchenko Scientific Society, publicado para a Associação Nacional
Ucraniana pela University of Toronto Press. O Harvest of Sarrow de Robert Conquest e o Ukraine Du-
ring World War II (editado por Yury Boshyk) foram publicados pelo Instituto Canadense de Estudos
Ucranianos na Universidade de Alberta.
26. Robert Conquest, Introdução, “Ethnocide of Ukrainians in the USSR” [“Etnocídio de Ucranianos na
URSS”], Ukrainian Herald, 7-8, Baltimore, Smoloskyp Publishers, 1976, p. 5.
27. Yurij Chumatskyj, Why is One Holocaust Worth More than Others? Lidcombe, Australia, Veterans of the
Ukrainian Insurgent Army, 1986. Importado ao Canadá, esse livro foi vendido abertamente em abril de
1987 pela Arka Books em Toronto e Montreal. O mentor da Arka é o grupo OUN-Banderista League for
the Liberation of Ukraine [Liga pela Libertação da Ucrânia], um filiado do Comitê Canadense Ucraniano.
28. Ibid., p. 2.
29. Ibid., p. 7.
30. Ibid., p. 93.
31. Ibid., p. 104.
32. Ibid., pp. 33-34. Chumatskyj cita, em apoio à sua interpretação antissemita da fome, o artigo de Kalen
Lucyk no extinto jornal nacionalista ucraniano Canadian Farmer, 25 de novembro de 1963.
33. Ibid., p. 34.
NOTAS| 255

34. Ibid., p. 41.


35. Ibid., p. 84. Stetsko foi chefe do “governo” fascista da OUN de Bandera na Ucrânia ocidental em julho de
1941, durante o qual nacionalistas ucranianos massacraram milhares de judeus em pogroms.
36. EKPAH-EKRAN (Chicago), nº 123-125, 1983, traduzido do ucraniano. UVAN: Academia Livre Ucrani-
ana de Ciências; NTSH: Sociedade Científica Shevchenko; UCCA: Comitê Ucraniano no Congresso da
América; WCFU: Congresso Mundial de Ucranianos Livres. Para informações sobre criminosos de guerra
ucranianos nos Estados Unidos, ver Alan A. Ryan Jr., Quiet Neighbors: Prosecuting Nazi War Criminals in
America, Nova Iorque, Harcourt Brace Jovanovich, 1984. Ryan foi diretor do Escritório de Investigações
Especiais do Departamento de Justiça dos EUA.
37. Student (Toronto), Vol. 18, nº 87, novembro-dezembro de 1985.
38. Transcrição da tradução, “Ukrainian Hour”, estação de rádio CHIN, fevereiro de 1985.
39. Winnipeg Free Press, 28 de maio de 1986.
40. Ibid., 6 de agosto de 1986.
41. Homin Ukrainy (Toronto), março de 1977.
42. Svoboda, 6 de março de 1980.
43. Shlyakh Peremohy (FRG), 5 de setembro de 1982.
44. Vyzolnyi Shliakh (Londres), nº 2, 1981.
45. Por exemplo, a sanção do presidente Carter dos EUA da Diretiva Nº 59 em 25 de julho de 1980 legitima
guerra nuclear “limitada”; a Diretiva Nacional do Conselho de Segurança Nº 32 de maio de 1982 (sob o
presidente Reagan) sanciona o primeiro uso de armas nucleares e teorias de guerra nuclear “ganhável”.
46. “Cruzada” foi de fato a palavra escolhida no discurso do presidente Reagan ao Parlamento Britânico em
junho de 1982.

APÊNDICE
1. Henderson’s Greater Winnipeg Directory, 1955, 1956, 1957, 1958, Winnipeg.
2. Documento em alemão e ucraniano, cópia em posse do autor. Exceto quando indicado, cópias de docu-
mentos citados a partir daqui estão em posse do autor.
3. Documento em alemão e ucraniano.
4. Olexa Hay-Holowko, Smertelnoiu dorohoiu (Ao Longo da Estrada da Morte), Vol. II, Winnipeg, Trident
Press, 1983, p. 205.
5. Journal, agosto de 1944, p. 12.
6. Documentos em alemão, carimbados “Ukrainischer Hauptausschuss - Stutzpunkte Linz”.
7. Documento formulário número v-o-6369, em inglês e alemão.
8. “Anmeldung bei der Polizeichen Meldebehorde”, carimbado “Der Polizeiprasident in Innsbruck”.
9. Documento em inglês.
10. “Testimonium Copulationis”, registro de casamento em ucraniano e latim.
11. Documento em ucraniano com duplicata em alemão.
12. Valery Styrkul, The SS Werewolves, Lvov, Kamenyar Publishers, 1982.
13. Valery Styrkul, We Accuse: Documentary Sketch, Kiev, Dnipro Publishers, 1984, pp. 139, 142.
14. Olexa Hay-Holowko, Duel with the Devil, Winnipeg, Communigraphics, 1986.
15. The Restoration of the Ukrainian State in World War II, Toronto, Ukrainian Central Information Service
“Studium” Research Institute, n.d., pp. 16, 19 (foto).
256 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

16. Styrkul, We Accuse, p. 143.


17. Ibid.
18. Winnipeg Free Press, 9 de abril de 1983. Essa edição em particular do Winnipeg Free Press contém diversos
artigos da “fome-genocídio”, incluindo “Starvation deliberate, diabolical” [“Inanição deliberada, diabó-
lica”] - uma entrevista de Carynnyk com Malcolm Muggeridge. Significativo é o fato de que a entrevista de
Carynnyk é ilustrada com fotografias de Thomas Walker.
19. Ibid., 11 de outubro de 1983.
20. Hay-Holowko, Smertelnoiu dorohoiu, p. 109.
21. Ibid., pp. 159-166.
Bibliografia
Para além dos livros e artigos em jornais acadêmicos listados abaixo refe-
rimos o leitor às cartas, comunicados, artigos de jornais e revistas populares
citados na sessão Notas.
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POSFÁCIO: Uma Batalha
pela História
Em sua célebre sexta tese sobre o conceito de História, Walter Benjamin
nos diz:
Articular historicamente o passado não significa conhecê-lo “como ele
de fato foi”. Significa apropriar-se de uma reminiscência, tal como ela
relampeja no momento de um perigo. Cabe ao materialismo histórico
fixar uma imagem do passado, como ela se apresenta, no momento do
perigo, ao sujeito histórico, sem que ele tenha consciência disso. O pe-
rigo ameaça tanto a existência da tradição como os que a recebem. Para
ambos, o perigo é o mesmo: entregar-se às classes dominantes, como
seu instrumento. Em cada época, é preciso arrancar a tradição ao con-
formismo, que quer apoderar-se dela. Pois o Messias não vem apenas
como salvador; ele vem também como o vencedor do Anticristo. O dom
de despertar no passado as centelhas da esperança é privilégio exclusivo
do historiador convencido de que também os mortos não estarão em se-
gurança se o inimigo vencer. E esse inimigo não tem cessado de vencer.
289

Mas o que isso significa? Primeiro, um combate contra o idealismo, a fór-


mula “como ele de fato foi” é uma citação de Leopold Von Ranke, historia-
dor alemão do século XIX cujo trabalho Geschichten der romanischen und
germanischen Völker von 1494 bis 1514290 inauguraria uma escola historio-
gráfica de profundo e profuso impacto no pensamento europeu conservador
que buscaria uma história “verdadeira” com base nos grandes homens e nos
grandes acontecimentos, onde o povo e a política se escondia e se escamoteava
no céu do idealismo burguês.
Segundo, significa mostrar que a História, e por conseguinte, a batalha
pela História, se forja no caudal da luta de classes, quer sejamos conscientes
disso ou não. Significa dizer que para além do idealismo rasteiro de se mostrar
289
BENJAMIN, Walter - Obras escolhidas. Vol. 1. Magia e técnica, arte e política. Ensaios sobre
literatura e história da cultura. Prefácio de Jeanne Marie Gagnebin. São Paulo: Brasiliense,
1987, p. 222-232.
290
RANKE, Leopold Von. Geschichten der romanischen und germanischen Völker von 1494
bis 1514. Ann Arbor: University of Michigan Press, 1985.
268 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

as coisas cobertas por uma auréola benevolente de uma verdade absoluta, cabe
ao historiador a pugna contra o falseamento da História por aqueles que que-
rem politicamente se aproveitar da mesma.
Terceiro, significa mostrar que tal luta se dá em uma longa duração291 e
perpassa não somente o contexto de urdidura de um fato, mas também seus
múltiplos contextos de recepção em diferentes momentos históricos a poste-
riori. Ora, isso nos demonstra que a História está sempre sendo “reescrita” à
medida que se mudam as formações econômicas e sociais e que, obviamente,
o status quo dominante tende a adaptá-la aos seus interesses, não importa o
quão mesquinhos esses sejam.
Ao remate, Benjamin convoca todos aqueles que abraçam o ofício de his-
toriador a se tornarem não somente os guardiões dos mortos, mas, sobrema-
neira, os protetores dos vivos. Compreender que esta é uma batalha política,
que esta é uma batalha necessária e que tal batalha precisa ser lutada ad nau-
seam enquanto nãos nos livrarmos dos grilhões que nos acorrentam como
classe foi algo que Douglas Tottle o fez, com todas as suas forças, abraçando a
missão real de um historiador das massas populares.
Marx e Engels na Ideologia Alemã nos presentearam com o famoso axi-
oma:

As ideias da classe dominante são, em cada época, as ideias dominan-


tes, isto é, a classe que é a força material dominante da sociedade é, ao
mesmo tempo, sua força espiritual dominante. A classe que tem à sua
disposição os meios da produção material dispõe também dos meios da
produção espiritual, de modo que a ela estão submetidos aproximada-
mente ao mesmo tempo os pensamentos daqueles aos quais faltam os
meios da produção espiritual. As ideias dominantes não são nada mais
do que a expressão ideal das relações materiais dominantes, são as re-
lações materiais dominantes apreendidas como ideias; portanto, são a
expressão das relações que fazem de uma classe a classe dominante, são
as ideias de sua dominação292

Ora, os pais do socialismo científico nos demonstram de forma indelével a


ligação umbilical, inextricável, entre a construção das formas superestruturais
de dominação ideológica e cultural e a forma infraestrutural de dominação
econômica.
291
Sobre o conceito de longa duração ver BRAUDEL, Fernand. Écrits sur l’histoire. Paris: Flam-
marion, 1969
292
ENGELS, Friedrich, MARX, Karl. A Ideologia Alemã. São Paulo: Boitempo, 2007, p.42
POSFÁCIO: UMA BATALHA PELA HISTÓRIA| 269

Se tal análise já era patente vis a vis à sociedade burguesa de meados do


século XIX, é preciso que atualizemos nosso ferramental analítico para pen-
sarmos como essas ligações entre infraestrutura econômica e superestrutura
ideológica e cultural dar-se-ão sob a égide do capitalismo tardio. É aqui que
entra a importante contribuição de Domenico Losurdo. Ele nos diz:
Marx fala da classe dominante burguesa que, com o controle dos modos
de produção intelectual tem o monopólio da produção e da difusão das
ideias.

Mas hoje as coisas mudarem porque com a televisão e as novas mídias,


a classe dominante não tem somente esse monopólio de produção de
ideias, mas também, o que é muito importante, o monopólio da pro-
dução das emoções. Transmitem-se imagens horríveis que podem ter
sido escolhidas em uma série de outras imagens propositalmente ou que
podem até ser falsas. [Através desse artifício] se consegue provocar uma
indignação geral [na opinião pública] ...

Devemos tomar consciência dessa nova situação: das ideias e emoções,


com uma tecnologia e psicologia muito refinadas e sofisticadas. Nesse
sentido, o aparelho militar do imperialismo ficou mais forte não só no
domínio militar clássico, mas no plano multimidiático.293

É precisamente essa torpe rede multimidiática de espalhamento e conso-


lidação de mentiras e meias-verdades a serviço da manutenção do status quo
e de um projeto de desemancipação das massas populares que Douglas Tottle
denuncia por todo o seu livro. Entender os meandros, os motivos e as formas
como se dá tal construção dão ao livro de Tottle uma perenidade para além da
questão da efeméride. Ele nos propicia um modo, um método, de nos aper-
cebermos desse tipo de construção que é feita contra a classe trabalhadora por
meio da demonização daqueles que lutam por sua libertação, feita, precisa-
mente, por aqueles que são seus feitores e senhores escravagistas.
Da imprensa marrom às torres de marfim academicistas uma pororoca de
chorume varre qualquer tentativa de verossimilhança e eleva o rumor, a boata-
ria e as mentiras mais cruentas à condição de verdade pela sua repetição e pelo
293
LOSURDO, Domenico; NOVAES, João e MACHADO, Rodolfo. Losurdo: produ-
ção das emoções é novo estágio do controle da classe dominante. Entrevista para o site
Opera Mundi. Publicada em 04 de outubro de 2013, disponível em: https://opera-
mundi.uol.com.br/politica-e-economia/31615/losurdo-producao-das-emocoes-e-novo-
estagio-do-controle-da-classe-dominante. Acessado em 18 de dezembro de 2021.
270 |FRAUDE, FOME E FASCISMO

seu uso cruzado entre pretensos historiadores, jornalistas e cientistas sociais,


todos eles sob o guarda-chuva dos serviços de inteligência e espionagem de Es-
tado das potências capitalistas. O que se forma é um pastiche mal ajambrado
de imagens retiradas de seus contextos reais, depoimentos de colaboracionistas
nazistas, este sim causadores de reais genocídios, e intelectuais de gabinete que
repetem a serviço de seus senhores tudo aquilo que o dinheiro pode comprar.
É contra essa torrente de mentiras que serve à manutenção da ideologia
dominante que pessoas como Douglas Tottle, como eu e como você leitor nos
insurgimos e insurgiremos enquanto as hostes e camarilhas dos Senhores ten-
tar barrar a porta da caverna e manter a humanidade em sua pré-história.
Que esse livro sirva como um grito: PAZ ENTRE NÓS, GUERRA AOS
SENHORES. VENCEREMOS!

João Carvalho

Dezembro de 2021

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