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Moldura narrativa como (re)designação moral e política na pornografia comercial – um

exercício de análise para o papel das feminilidades em Sexo dos Anormais

Mariana Baltar1

Resumo: Esta comunicação pretende partir de uma análise do filme pornográfico brasileiro Sexo
dos Anormais (Alfredo Sternheim, 1984), para pensar os modos pelos quais, no interior de uma
produção comercial mainstream e claramente voltada para o público masculino e heterossexual ,
ocorrem fissuras de ordem moral e política nas relações entre desejo e prazeres das personagens
femininas. O filme é um marco pela inserção, entre as protagonistas, da personagem trans vivida
por Claudia Wonder, performer e ativista trans importante nas décadas de 80 a 2000. A partir de um
exercício de análise, queremos refletir de que maneira a tensão central para os estudos do longa
metragem pornográficos dos anos 1970 e 80 - entre o regime de atrações dos números musicais e o
regime narrativo – produz e reverbera tensões de ordem política no que diz respeito ao prazer
feminino e coloca em cena discursos sobre a visibilidade da personagem travesti (seu corpo e seus
desejos).
Nesse sentido, a comunicação parte da perspectiva que o entende o campo dos estudos de
pornografia como arena de disputas em torno do gênero, suas estéticas e políticas, são empreendidas
levadas em consideração o corpo e seus engajamentos sensoriais e sentimentais como mobilização
das formas de ver e ser no mundo. É central o entendimento que refletir sobre o papel das narrativas
do gênero pornográfico na cristalização mas também nas fissuras dos dispositivos de
saberes/poderes que perpassam a sociedade patriarcal heterossexualmente orientada

Palavras-chave: pornografia, corpos femininos, personagem trans.

Esta fala é motivada por mais perguntas que respostas. Sua questão central diz mais respeito a
uma problemática de ordem metodológica e teórica do que propriamente a um mergulho histórico e
político no campo do pornográfico. É uma questão que diz respeito às formas de olhar para imagens
pornográficas. Aqui vou empreender um exercício analítico para refletir sobre o como e o quê olhar
em tais produções
Se acreditamos que o campo do pornográfico é revelador das questões políticas em torno do
gênero, e se compartilhamos da convicção de que olhar seriamente (sem moralismos e simplismos)
para este campo pode trazer a tona uma problematização mais complexa que se processa na
interseção cada vez mais central para a vida contemporânea onde se misturam de modo quase
inseparável os campos das artes, das mídias e da política; precisamos nos perguntar sobre os
métodos do olhar analítico.

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PPGCine, Universidade Federal Fluminense, Niterói, Brasil.

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),
Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X
Defendo que estudar o campo da pornografia é para se inserir num conjunto de reflexões que
coloca o corpo e suas visualidades (ele em ação cotidiana, em cena, encarnando os modos de
subjetivação) no centro das preocupações políticas.
Corpo é palavra corrente nas pesquisas contemporâneas das humanidades - e mais ainda na
interseção entre comunicação, filosofia e ciências sociais - pois linha gerais, tais reflexões o entende
"como algo que simultaneamente transcende a linguagem e nos serve de canal de comunicação com
mundo (...) É neste corpo, transformado em um registro vivo, que serão inscritos afetos, emoções,
representações da história do sujeito, do seu tempo" (NOVAES e VILHENA, 2010).
A eficácia do pornográfico - suas imagens e a experiência que elas convocam - reside em tal
entendimento de corpo. Onde nosso corpo de espectador é capturado e mobilizado pelos corpos em
ação das telas. Refletir politicamente a partir do pornográfico é acima de tudo o reconhecimento da
importância de pesquisar pornografia, a necessidade de não cair em simplificações morais ou
ingenuidades celebratórias, e ao mesmo tempo abrir caminho para refletir de que maneira as
imagens pornográficas também podem implicar ações de empoderamento2 das mulheres e das
sexualidades e corpos dissidentes.
Acredito que o desafio teórico que se coloca é: como analisar tais imagens não retirando seu
estatuto de imagens e sons (sua materialidade audiovisual que afeta sensorial e narrativamente), não
apagando seu estatuto midiático de circuito espetacular e nem silenciando os atravessamentos
culturais que impregnam essas obras e produtos.
Duas autoras, tributárias das inspirações feministas, enfrentaram esse desafio metodológico de
modo mais direto: Linda Williams, nos anos 1990, e Susanna Paasonen, mais contemporaneamente
(2011).
Williams (1999) entende a pornografia hardcore a partir de uma analogia com o gênero
musical, onde a narrativa (o enredo, a trama e a dimensão dramatúrgica) se equilibra com as
atrações (a mostração dos corpos em coreografias sexuais) em um jogo regido pelo princípio da

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O termo empoderamento está muito em voga para dar conta de uma nova atitude individual de sujeitos marginalizados
- seja do ponto de vista de classe, racial ou de gênero - frente a ordem societária. Ele requer alguns esclarecimentos e
matizes, que não cabe necessariamente aqui empreender. Tomo o termo como instância de disputa onde, seja no nível
individual ou de um grupo, conquista-se a vez e "voz, visibilidade, influência e capacidade de ação e reação"
(Horochovski e Meirelles, 2007). Nesse sentido, o conceito não pode ser entendido fora do escopo das noções de
autonomia e emancipação, em que pese toda a miríade de complexidades que envolvem essas noções (uma vez que
nunca se é totalmente autônomo ou emancipado no contexto da vida societária moderna). Assim, a ideia de
empoderamento, esse conceito que chega ao Brasil a partir de uma tradução do uso nos contextos do movimento
feminista e negro nos anos 1970 do termo empowerment, envolve autonomia e capacidade (no sentido de possibilidade)
de fazer escolhas nos âmbitos culturais, políticos, econômicos e sociais.

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máxima visibilidade, onde as cenas de meatshot3, close-ups, em especial nas genitálias, são os
signos que sustentam o pacto pornográfico de trazer de modo explícito para o olhar público do
espectador os encontros sexuais. As análises que Williams faz ao longo de seu livro HardCore (e
em outros textos, como no livro Screening Sex, de 2008) tratam as obras pornográficas a partir de
observações da construção do olhar, da narrativa e da cena. Apesar de falar em termos de números
sexuais e coreografias, a abordagem de Williams privilegia uma mirada narrativa para colocar em
tensão as questões políticas (relacionadas a gênero) que submergem das obras pornográficas.
Paasonen faz, em seu livro Carnal Ressonance (2011), um franco debate com o caminho
aberto por Williams. Segundo a autora finlandesa, os tradicionais enfoques com base nos estudos de
narrativa, de representação, de identificação que fundamentaram análises culturais e textuais - os
trabalhos de Linda Williams, por exemplo - não necessariamente dariam conta das dinâmicas
afetivas, espectatoriais e, correlatamente, político-culturais envolvidas. Assim, Paasonen propõe
pensar em termos de noções como captura (grab) em correlação a tradicional perspectiva teórica do
olhar (gaze); pensar no papel do ritmo (rhythm) mais do que na narrativa (narrative) e na ideia de
uma ressonância (ressonance) no espectador, mais do que identificação. É preciso, portanto, atentar
para "os prazeres de ser arrebatado e maravilhado pelo visual" (Paasonen, 2011:185).4 Ao longo do
livro, Paasonen estabelece uma longa discussão com autores já tradicionais do campo da chamada
virada afetiva (sobretudo a partir dos "seguidores" das leituras que Gilles Deleuze faz de Spinoza e
dos escritos de Brain Massumi)5 e argumenta pela faculdade afetiva do campo do pornográfico pois
as experiências mobilizadas por ele são da ordem de um reação visceral e carnal:
Eu abordo, de um modo geral, as experiências da pornografia a partir da
noção de afeto como reações viscerais, experiências intensas, sensações
corporais, ressonâncias e sentimentos ambíguos. Ao mesmo tempo, percebo
que estes são impossíveis de demarcar distintamente das articulações
emocionais (...) emoções - impregnadas como são de nossas histórias
pessoais, valores, políticas e tantas outras coisas - também orientam modos
de compartilhamentos, de sensações e de construções de sentido das
imagens que encontramos" (Paasonen, 2011: 26)6

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planos de detalhe das penetrações
4
"the pleasures of being overwhelmed and impressed by the visual" (Paasonen, 2011:185)
5
Não vou refazer aqui esse debate pois ultrapassaria os limites do artigo, para tanto remeto ao livro de Paasonen em
especial a Introdução e os capitulos 2 e 5.
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"I address experiences of pornography largely through the notion of affect as gut reactions, intensities of experience,
bodily sensations, resonances, and ambiguous feelings. At the same time, I realize that these are impossible to mark
apart from articulations of emotion. (...) emotions—imprinted as they are with personal histories, values, politics, and
many things besides—also orient ways of encountering, sensing, and making sense of the images we encounter."
(Paasonen, 2011: 26)

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Minha questão aqui não é advogar por uma abordagem em detrimento da outra - não se trata
de competição de pertinências - mas de buscar um equilíbrio entre as duas perspectivas na medida
em que ambas reconhecem que a dimensão político-afetiva do pornográfico está na sua capacidade
de transformar o corpo do espectador em caixa de ressonância que reverbera o encontro entre
corpos expressos nas telas e mobilizados pela câmera.
Nesse sentido, o desafio é articular um arcabouço teórico-metodológico que possa dar conta
de obras que pressupõem estratégias de mobilizar afetivamente a atenção do espectador através de
um jogo que se processa entre corpos: o corpo nas telas, o corpo da câmera e o corpo do espectador.
Proponho que nesse jogo, a dimensão narrativa (a cena e a trama) são moldura que (re)enquadra as
performances e coreografias dos corpos; estas, por sua fez, redimensionam o enredo (quando este se
apresenta na obra, como é o caso das produções dos anos 1980, 90 e das produções contemporâneas
que frequentam os canais de televisão e streaming de conteúdo adulto7).
Enfrento o desafio no exercício de análise de uma obra dos anos 1980, o filme Sexo dos
Anormais (Alfredo Sternheim, 1984), onde o regime narrativo e o regime performático das atrações
coexistem nos moldas da tradição do longa-metragem hardcore comercial. Minha hipótese é que
neste filme, uma produção mainstream e claramente voltada para o público masculino e
heterossexual, é justamente a interconexão entre a moldura narrativa e as atrações da coreografias
sexuais que deixam antever fissuras de ordem moral e política nas relações entre desejo e prazeres
das personagens femininas. em especial, tais fissuras das ordem moral e política submergem na
trajetória da personagem travesti (nomeada desta forma no filme) Jéssica, vivida pela performer
trans Claudia Wonder.
O enredo do filme mostra as trajetórias de três mulheres (Miriam, Tônia e a travesti Jéssica)
que são tratadas numa clínica pelo psiquiatra Daniel, auxiliado por sua mulher e o atendente
Roberto. Miriam é levada a clínica por sugestão do seu namorado que percebe no apetite sexual da
moça traços de ninfomania; Tônia tem uma conturbada relação com o marido, atravessada por
fetichismos do repertório BDSM (em especial orgias que motivam conflitos no casal) e Jéssica

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Faço essa resalva pois no caso das produções amadoras e da maiorias das cenas aparecem nos portais de conteúdo
pornográfico da netporn - tais como RedTube, PornHub etc - as relações entre a dimensão narrativa e performática são
diferenciadas, no sentido em que o que pode se singularizar como dimensão narrativa é muito mais esgarçado se
comparado com as produções dos anos 1980 e 90 e com as produções contemporâneas veiculadas como longas
metragens ou séries para canais de conteúdo adulto para tv. Não há dúvidas que uma interconexão entre narrativa e
performance também existe nesse universo da netporn (acredito mesmo que seria impossível, e infértil, separar
totalmente tais dimensões), mas ela tem características diferentes que, portanto, demandam empreitada de análise que
considere tal diferenciação. Nesse sentido, o livro de Paasonen, buscando analisar a pornografia contemporânea a partir
do vocabulário do afeto, me parece o melhor caminho.

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aparece na clínica após encontro sexual violento que desencadeia uma insatisfação geral da
personagem.
Se de um lado, o lugar da clínica de reabilitação, comandada por um médico homem, hetero e
branco, sugere uma incômoda reiteração heteronormativa e patriarcal por outro, o tratamento
audiovisual das coreografias sexuais dessas três personagens demarca um lugar de prazer para suas
vivências que, num primeiro momento são apresentadas como dissonantes pela narrativa
(motivando justamente a procura da clínica), mas que ao longo do filme vão se consolidando como
esfera de libertação. Os desfechos de enredo para cada uma delas reitera a tríade aceitação de seu
prazer-libertação-felicidade individual tanto as coreografias sexuais quanto os longos e estratégicos
discursos do psiquiatra Daniel apresentam. Ao cabo, em Sexo dos Anormais, a cura é livrar-se dos
rótulos: "nada pode ser considerado anormal (...) a cura é a auto-aceitação", explica dr. Daniel, na
cena que antecede a apresentação do desfecho de cada personagem. Este desfecho é, claro,
sequências de coreografias e performances sexuais onde cada uma delas reencontra seus prazeres.
Sexo dos anormais é politicamente ambíguo. Mas um olhar mais focado nas relações entre
narrativa e atrações performáticas das coreografias sexuais pode nos fazer pensar em fissuras na
ordem política hetero-patriarcal pela maneira como a sexualidade feminina é trazida (narrativa e
afetivamente) à cena.
Mas talvez seja na personagem travesti Jéssica onde essa ambiguidade política esteja mais
forte. E vale focar um pouco mais em seu trajeto de personagem no filme. Mas antes, é bom
recolocar esta obra no conjunto das produções pornô brasileiras dos anos 1980 e no contexto das
disputas em torno da visibilidade das travestis e das questões trans.

A questão trans e o universo pornô brasileiro dos anos 1980

Os anos 1980 marcaram o início de uma virada na questão da visibilidade travesti e trans no
Brasil. Paralelo ao crescimento de discursos políticos sobre a questão das transgenereidades -
alinhados aos movimentos LGBTs -, a representação desses corpos trans na cultura midiática
audiovisual vai se alterando na segunda metade da década.
Em sua excelente dissertação de mestrado sobre a personagem trans no cinema brasileiro,
Luis Henrique Martins diagnostica:

Até meados dos anos 80, quando a produção cinematográfica nacional


estava dentro de um contexto de uma cultura heteronormativa dominante,
essas personagens eram retratadas sob uma perspectiva de alteridade

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monstruosa (...) numa categoria localizada na fronteira com a norma (...) A
partir dos anos 90, um novo contexto histórico permitiu uma diversificação
na produção cinematográfica, permitindo que novos olhares emergissem
estabelecendo diálogo com a diversidade de discursos circulando entre os
mais variados movimentos e grupos LGBT’s do País. (Martins, 2017:16)

Segundo o autor, apenas nas últimas décadas o protagonismo sobre as discussões relacionadas
as questões travesti e transexual foi assumido por esses mesmos sujeitos. Numa reflexão também
compartilhada por autores como Mário Carvalho e Sérgio Carrara (2013) e Juliana Jayme (2004),
Martins (2017)8 chama atenção para o fato de que a construção da categoria política e identitária da
travesti se processa de modo lento desde o final dos anos 1970, pois até então o termo era associado
ao "fazer a travesti" (ou seja, se vestir de mulher) pelo homossexual masculino. Já nos anos 1990,
percebe-se uma intensa disputa sobre o termo em correlação com transexual, embora parte do
ativismo reivindique a permanência do termo travesti - em adição ao termo trans - para dar conta
das experiências e subjetividades transgênero9.
Em sua pesquisa, Martins (2017) chama atenção para uma significativa presença da
personagem trans (travesti e transexual) ao longo da história do cinema brasileiro, desde a
“transgeneridade farsesca” - conforme coloca Lacerda Junior (2015) - característica das chanchadas
dos anos 1930, passando pela personagem travesti nas pornochanchadas dos anos 1970, e
culminando na participação travesti e trans no cinema pornô a partir dos anos 1980.
A produção pornô brasileira com travestis e pessoas trans é intensa, de significativa
exportação e muito mal mapeada. Ela sem dúvida remonta aos anos 1980, década em que a
curiosidade popular e massiva pelo corpo da travesti tomou de assalto a cultura midiática. Nesse
sentido, basta lembrar o imenso sucesso da modelo Roberta Close.

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" Durante os anos 80, movimento de lutas pelos direitos das travestis surgem, a princípio dentro do movimento
homossexual, sendo a partir dos anos 90 que estes grupos começam a ter certa independência política ao se
desvincularem dos movimentos gays, uma vez que dentro dos diversos grupos de travestis e transexuais foram
percebidas demandas cada vez maiores por empoderamento e protagonismo político que não eram possíveis dentro dos
grupos LGBTs. Para Carrara e Carvalho (2013), estas organizações em defesa dos grupos de travestis surgem
predominantemente de dois fatores: por um lado de forma auto organizada como reposta a violência policial em locais
de prostituição; por outro, através de alianças com setores progressistas de instituições públicas, ONGs e grupos de
prevenção e luta contra AIDS. Já a construção da categoria transexual, enquanto categoria identitária e política
independente da travesti, surge entre o final dos anos 90 e início dos anos 2000, quando se fortalece movimentos em
defesa de pessoas transexuais com pautas nem sempre comuns as dos grupos de travestis." (Martins, 2017:35)
9
"Podemos entender transgênero como um conceito utilizado para se referir a diversas categorias que tem em comum a
transgressão das normas de gênero, ou seja, afrontam um conjunto de regras culturais implícitas que regulam e
disciplinam corpos, constroem relações de poder ao criar padrões de masculinidade e feminilidade percebidos como
“naturais”, que fundamentam uma coerção social para que pessoas se relacionem afetivamente e sexualmente com
pessoas do sexo oposto, isto é, a heterossexualidade compulsória. A matriz heterossexual, marcada pela
heteronormatividade, que vai definir o que são corpos inteligíveis em nossa sociedade"(Martins, 2017: 18).

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Roberta era um verdadeiro fenômeno nacional, sendo considerada uma das
mulheres mais bonitas da época. Ela posou nua três vezes e foi, inclusive, a
primeira mulher transexual a posar nua para revista Playboy, sendo a
primeira vez antes da realização da cirurgia de redesignação sexual, em
maio de 1984, e a segunda, após a cirurgia, em março de 1990, além de ser
capa da revista Sexy em agosto de 1996 entre outros ensaios sensuais.
(Martins, 2017: 39)

A indústria pornô como esfera de trabalho para as travestis e pessoas trans só cresceu dos
anos 1980 para cá. Contudo, tal associação não deixa de ser ambivalente do ponto de vista político:

Apesar disso, as travestis ainda são entendidas como corpos intrusos na ordem social. A
produção pornô, ao abrir novas áreas de trabalho, facilitando a "tolerância" para com elas
através da beleza de sua aparência, também reforça o preconceito ao associa-las ao universo
da representação obscenas. Se o status de estrela pornô enfraquece a relação imaginária
com a criminalidade de rua, reforça a estigmatização pelo viés da associação com a
pornografia (LEITE JR, 2006, p. 271)

Vivemos o paradoxo de ser um país onde se consome intensamente pornografia com atores e
atrizes trans e ao mesmo tempo ser um dos países de maior índice de crimes de transfobia. Segundo
levantamento realizado pelo projeto Transgender Europe's Trans Murder Monitoring, e
mencionado no artigo de Jacqueline Gomes de Jesus (2011), entre 2008 e 2011, foram registrados
816 homicídios de pessoas trans no mundo, destes, 325 são em território brasileiro. Por outro lado,
segundo pesquisa do portal RedTube, o termo "shemale” é a quinta categoria mais pesquisada pelos
brasileiros no canal (sendo a 9 no mundo).10
Os filmes pornô produzidos nos anos 80 no Brasil viram nos nichos mais segmentados,
compreendidos pelo que até então se caracterizava como pornografia bizarra, uma forma de
competir com os produtos norte-americanos de hardcore que chegavam no país e que tomavam de
assalto o circuito de cinemas populares antes alimentado pelas produções da pornochanchada. Sem
dúvida, a presença das travestis faz parte dessa estratégia, capitalizando também a curiosidade em
torno desses corpos, comum à época11.
Sexo dos anormais deve ser conectado com essa larga história de um cinema popular que se
sustenta no sexo como vetor de apelo ao público. A pornochanchada produzida em São Paulo na

10
fonte: http://www.pornhub.com/insights/redtube-brazil. acesso em 25 de julho de 2017
11
É importante ressaltar como Sexo dos anormais é reflexo desse contexto, não apenas pela presença da personagem
travesti Jéssica, mas pela relação com o próprio produtor do filme, Juan Bajon. Bajon será importante produtor do
seguimento de zoofilia dos anos 1980 numa série de filmes conhecido como jegue movies, cuja marca era inserção de
simulação de sexo com animais.

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região da Boca do Lixo nos anos 1970 (filmes muito diversos entre si, mas que comum tinham o
lastro da fórmula erotismo - produção de baixo custo - título sensacionalista) acabou criando um
circuito cultural e técnico que foi, parte dele, transposto para a produção de sexo explícito nos anos
1980.
Alfredo Stenheim será um desses que farão a transposição, sendo um dos poucos que assinará
filmes pornô sem pseudônimo, como ressalta Nuno Cesar Abreu (2006). Sua carreira remonta às
produções da Boca, mas também a outros nomes do cinema nacional, tendo sido assistente de
direção de Walter Hugo Khouri e dirigido em 1973, Anjo Loiro. Na Boca, assinou, entre outros, o
filme Mulher Desejada (1978), da produtora Kinoarte de Alfredo Palácios, descrito por Abreu
(2006) como um melodrama erótico.
Para Martins, "O fenômeno Roberta Close foi um dos responsáveis por uma onda de
produções de filmes de sexo explícito com participação de travestis." (2017:41)12 e Sexo dos
anormais sem dúvida é reflexo disso. A presença de Claudia Wonder, vivendo a personagem
Jéssica, não é mero acaso e o filme capitaliza em torno do texto estelar dessa performer importante
da cena underground paulista e do ativismo travesti13. Em 2011, a primeira edição do festival
PopPorn fez uma homenagem a Claudia exibindo Sexo dos anormais e o documentário sobre ela,
dirigido por Dácio Pinheiro, Meu amigo Claudia (2009).

Anormais são as feminilidades celebradas

Minha análise de Sexo dos anormais não quer simplesmente celebrar ou demonizar o filme a
partir do olhar político das questões de gênero, em especial no que diz respeito ao prazer feminino e
a visibilidade da personagem travesti (seu corpo e seus desejos). Como já ressaltei, percebo que no
filme o regime narrativo e o regime performático das atrações coexistem produzindo fissuras nesta

12
"Sexo dos Anormais narra a história de uma clínica psiquiátrica que trata de pacientes com “distúrbios sexuais”.
Cláudia Wonder, atriz e performer, interpreta Jéssica, uma travesti que teria “se transformado” em mulher após uma
desilusão amorosa enquanto ainda era um peão. Após ser rejeitada por seu amante por não ser uma mulher, ela vai para
Europa, passando por procedimentos cirúrgicos para transformar seu corpo e retorna para a fazenda, onde é mais uma
vez rejeitada por ser considerada uma aberração. O próprio nome do filme já mostra que a personagem travesti é
percebida como uma perversão sexual ou um corpo anormal. A continuação do filme se chamaria Sexo dos Anormais 2,
porém após perceberem que este nome, carregado de preconceitos, estava causando uma série de problemas no mercado
exibidor, o nome foi trocado. Sternheim diz que seu produtor, apesar de solicitar um filme com temática travesti, insiste
para que o mesmo tenha cenas de sexo heterossexual. O corpo da travesti é visto como um corpo exótico, uma vez que
são vistos como corpos inferiores, mas ainda sim fontes de uma curiosidade erótica." (Martins, 2017: 41)
13
Na crônica "Meu amigo Claudia", Caio Fernando Abreu se refere a ela como "travesti intelectual". Entre outras
performances importantes de Claudia, está uma realizada na boate Madame Satan, nos anos 1980, quando ela se despe
numa banheira de suco de groselha enquanto canta músicas de Lou Reed. Em 1985, Claudia atuou na encenação da
peça O Homem e o cavalo, de Oswald de Andrade, montada por Zé Celso.

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ordem política hetero-patriarcal em relação à sexualidade e prazer das feminilidades, ordem tal que
também, de modo ambíguo atravessa o filme.
Olhar as imagens pornográficas é não esquecer que, muito além da narrativa, trata-se de
performances e coreografias de corpos e nesse sentido, parece sintomático que todas as cenas
sexuais em Sexo dos anormais são tratadas de um mesmo modo estilístico: alternância entre um
plano médio frontal e parado e closes nos corpos em suas interações, embalados por peças da
música erudita europeia. Apenas uma sequência sexual não é encenada assim, com notada ausência
da trilha musical e entrecortada por falas violentas e closes nos rostos com expressão de dor: a cena
em que Jéssica (Claudia Wonder) é violentada numa festa por um homem irritado por sua condição
travesti. Nesta cena, que marca a ida de Jéssica para a clínica do Dr. Daniel, a personagem defende-
se das violências impetradas contra ela e a cena finaliza sem qualquer presença visível de gozo e
com Jéssica mordendo o pênis de seu agressor.
Como já mencionei, o desenvolvimento narrativo do filme coloca a sexualidade voraz das
personagens femininas (e a personagem de Claudia é fortemente incluída nesse hall pelo discurso
fílmico, o que fica patente desde e a sequência dos créditos de abertura) como o grande signo de
"anormalidade", um desvio que é constantemente celebrado pelas falas do psiquiatra Daniel. As
cenas de atrações de coreografia sexuais também celebra essa voracidade, construindo para os
encontros sexuais - a maioria deles cenas de sexo grupal - uma aura de espetáculo reforçada pela
relação entre câmera e corpos (na alternância da visão do conjunto e dos closes) e no uso da trilha
sonora para embalar todas as cenas que culminam no prazer de todos os envolvidos.
Mas se por um lado há tais fissuras no modo como Sexo dos anormais celebra a explosão
sexual feminina, e no modo como afirma a inclusão da travesti nessas feminilidades; por outro há
também uma certa domesticação do texto estelar de Claudia Wonder. Ao longo do filme, sua
personagem Jéssica constantemente afirma que seu sonho é o casamento e a vida de dona de casa, e
este será seu desfecho. Cada uma das personagens femininas no filme, acaba alcançando um lugar
harmônico com seu apetite sexual: Miriam e sua ninfomania são abraçadas pelo namorado, Tônia e
seu pendor grupal é canalizado para a produção de filmes pornô BDSM e Jéssica encontra em
Roberto, assistente de Dr. Daniel, seu marido ideal (a cena final da personagem é inclusive vestida
de noiva num diálogo claro com o desfecho comum da telenovela, onde a mocinha celebra seu
destino com a festa de casamento jogando o buquê).
Em todas as suas cenas de coreografias sexuais, o corpo de Claudia é colocado em poses
correlatas àquelas performadas pelas outras personagens femininas do filme, centrando o prazer

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visual de seu corpo em seu rosto, curva do quadril, bunda e seios. Há apenas dois closes na sua
genitália: o primeiro na já mencionada cena em que sua personagem é violentada e o segundo, na
primeira sequência em que se dá visibilidade à expressão de gozo de Jéssica.
Nesse sentido, meu argumento é que o grande gesto político de Sexo dos anormais está no
modo como as coreografias sexuais de Jéssica a inserem no hall das feminilidades, e nesse sentido,
inclusive o gesto de trazer para sua personagem o desfecho do amor romântico telenovelesco pode
ser entendido no sentido das fissuras políticas que estou ressaltando aqui. Tais coreografias são
passagens onde um regime de atrações fazem encarnar nos corpos a celebração (visível nas
performances e explicitadas no enredo) das maravilhosas "anormalidades" femininas.

Referências
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Narrative Frame as moral and political (re)definition at mainstream porn – an analytical take
on female roles in Sexo dos Anormais

Astract: This paper aim to analyze Brazilian porn film Sexo dos Anormais (Alfredo Sternheim,
1984) in order to investigate the ways in which this film presents moral and political tensions with
the patriarchal and heterosexual ideology when it depicts female pleasure and desires. This film is
consider a milestone due to the presence of trangender character played by trans activist and
performer Claudia Wonder.

Keywords: porn, female body, transgender

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