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Narrativa literária de Eça.

Uma viagem para o mundo


cinematográfico

Literatura e Imagem

Gabriel Neto

Docente: Maria de Nazaré Valente de Sousa

Covilhã, janeiro de 2023


Resumo: Como sabemos existem várias narrativas cinematográficas que vão buscar os
elementos narrativos a obras literárias já existentes. É o que acontece com a obra de
Eça de Queirós, que vai servir de base para várias adaptações. Vou referir alguns
conceitos importantes e relacionados com as adaptações; vou dar ao leitor um pouco da
biografia dos escritores desta obra literária assim como do responsável pela realização
das adaptações cinematográficas em análise; vou examinar a obra literária e depois
analisar as adaptações existentes de forma a estabelecer uma comparação. Sabemos
que nas adaptações há sempre alterações que vão de acordo com o meio em que se
encontram como é o caso dos filmes, em que há elementos que são introduzidos e que
não se encontram no livro assim como elementos que são suprimidos aquando da
passagem para o cinema.

Palavras-chave
O mistério da Estrada de Sintra; adaptação; Eça de Queirós; cinema; narrativa
Introdução

O objetivo deste trabalho é proporcionar uma análise da obra literária – O Mistério da


Estrada de Sintra, de Eça de Queirós em colaboração com o amigo Ramalho Ortigão.
Foi a partir da pesquisa e análise das adaptações feitas nos possíveis mundos narrativos
existentes sobre a obra e de seguida uma comparação entre as mesmas que este
trabalho foi desenvolvido.
A partir deste romance policial foram feitas algumas adaptações como foi percetível a
partir da pesquisa; existe uma adaptação para teatro, feita em 1944 por Joaquim Beja
que pertencia à Companhia de Teatro de Sintra, região onde ocorreu o enredo da obra.
No entanto não me foi possível encontrar a peça teatral para visualização e uma análise
posterior possível.
Encontramos ainda mais duas adaptações do mesmo realizador para o mundo
cinematográfico, uma em formato de série e outra em filme. Duas adaptações que irão
ser analisadas no decorrer deste, em que me foquei mais no filme como objeto de
estudo para este trabalho.
Definição de conceitos

É importante a definição de alguns conceitos a reter ao ler este trabalho, de forma a haver
um maior entendimento do mesmo. Destaquei dois conceitos: adaptação
cinematográfica e análise literária.
Comecemos então por adaptação cinematográfica. No dicionário adaptação é descrita
como o ato de adaptar, tornar apto, ou mesmo até um processo de integração de algo ou
alguém. O segundo termo diz respeito ao cinema e de forma resumida significa filmes.
Portanto “o trabalho de adaptação de uma obra literária para o mundo cinematográfico
é sobretudo um trabalho de transformação, um exercício da linguagem fílmica que
confere um movimento e um determinado tempo à palavra escrita transformando-a
numa outra expressão”.1
Desta forma, podemos dizer que a adaptação cinematográfica é o processo em que uma
obra de literatura é utilizada como fonte para a criação de uma outra narrativa, mas para
a imagem.
Relativamente à análise literária, que é aquilo que vou realizar neste trabalho, é
necessário entender em que consiste a mesma.
Este conceito é formado por dois termos que têm significados individuais e
posteriormente dão um outro significado quando se juntam as palavras.
Assim sendo a primeira palavra – análise, tem alguns significados como a separação dos
principais componentes de algo, um exame minucioso de algo em que cada uma das suas
partes, de forma a conhecer os seus elementos. O segundo termo – literário está
relacionado com a literatura. A literatura apresenta-se como uma arte que usa a
linguagem como meio de expressão.
Resumindo, o conceito de análise literária, diz respeito a uma avaliação de todas as partes
de uma obra literária, como por exemplo o tema, as personagens, o estilo de escrita, tipos
de narrador existentes, entre outras.
Então, mas qual é o primeiro passo de uma análise literária?
Um pouco óbvio está claro ser a leitura da obra de forma a compreender em que contexto
se insere. Depois da leitura é conseguir responder a certas questões tais como o tema, as
personagens e as características das mesmas, o narrador e a estrutura utilizada pelo
escritor ou escritores como é o caso em Mistério da Estrada de Sintra.

11
Manuela Penafria, O Paradigma do documentário. p.30-31
Breves Biografias

Uma das partes importantes de uma análise é perceber quem são os responsáveis pela
composição das obras e também, como é o caso do realizador responsável pelas
adaptações cinematográficas.
Comecemos então por dar a conhecer o escritor mais conhecido do panorama da
literatura portuguesa nesta dupla de escritores da narrativa aqui apresentada, - Eça de
Queirós.
Eça de Queirós nasceu na Póvoa de Varzim no dia 25 de novembro de 1845. Em 1849
vai viver com os avós paternos, na localidade de Verdemilho, em Aveiro.
Com 9 anos foi matriculado no Colégio da Lapa, na cidade do Porto, onde acabou por
completar nesta escolaridade obrigatória até entrar na Universidade.
Em 1861 matriculou-se no curso de Direito da Universidade de Coimbra. Já após
concluir o curso, em 1866 fundou o jornal – O Distrito de Évora.
Colaborou ainda, com alguns textos na Gazeta de Portugal.
Aliou-se com Antero de Quental na criação do poeta Carlos Fradique. Em 1872, iniciou
também a sua carreira diplomática no estrangeiro, no entanto este afastamento não foi
suficiente para deixar de colaborar no meio português e assim sendo continuou a
escrever para o Diário de Portugal, A Atualidade, A Gazeta de Notícias, entre outros, e
de ter uma opinião mais crítica da sociedade portuguesa.
Faleceu em Paris no dia 16 de agosto de 1900.
De seguida, mas não menos importante temos o colaborador de Eça nesta narrativa, -
Ramalho Ortigão.
Escritor e jornalista nascido no Porto quando decorria o ano de 1836. Fez os seus
estudos preparatórios no Porto; lecionou no Colégio da Lapa, onde o seu pai era o
diretor.
Ingressou em direito, mas sem finalizar o curso, no entanto entrou para a redação do
Jornal do Porto, onde fez mostrar as qualidades necessárias para o destaque irá vir a ter
na área das letras.
Já no lado oposto, referente aqui ao responsável pelas adaptações cinematográficas da
obra de Eça, falamos assim de Jorge Paixão da Costa, nascido em 1954 em Lisboa.
Licenciou-se em Cinematografia pela Universidade de Estocolmo em 1982. Além de
professor universitário, é realizador de televisão e cinema, com vários filmes no seu
diretório como por exemplo: Soldado Milhões (2019), Jacinta (2017), Na Paz dos Anjos
(1994), e claro o filme com o mesmo nome da obra literária, Mistério da Estrada de
Sintra (2007) e a série, Nome de Código: Sintra (2007), entre outros.
Resumo comentado

Eça de Queirós, em colaboração com Ramalho Ortigão ludibriaram os habitantes


daquela região, com a história de um crime escrito em forma de folhetim nas páginas
do Jornal Diário de Notícias. Estes enviavam em forma de cartas anónimas ao redator
deste jornal os relatos de um crime que teria acontecido numa noite na Estrada de
Sintra.
Com o objetivo de tirar a sociedade lisboeta do estado de espírito em que se
encontravam, de tédio, e pela falta de acontecimentos relevantes naquele período, estes
dois escritores resolveram escrever esta narrativa de uma forma bastante curiosa.
E a verdade é que o objetivo foi cumprido, pois como é referido no prefácio da obra,
“Parece que Lisboa efetivamente despertou, pela simpatia ou pela curiosidade…”.2
Assim podemos entender que esta iniciativa dos dois autores fez suscitar um interesse
ou podemos dizer até uma curiosidade de forma expressiva dos habitantes daquela
região e que esta despertou uma reação até de sujeito participativo no próprio
desvendar do crime revelado no jornal, como se este fosse um crime verdadeiro.

A obra em questão é a primeira obra publicada por Eça de Queirós e também


considerada como pioneiro na categoria de romance policial português.

De forma breve podemos fazer um resumo da obra de Eça.

Começa por falar que iam dois homens a cavalo na Estrada de Sintra, sendo estes a
contar a história ao redator do jornal.

A identidade deles como da maioria das personagens do livro foi oculta. (De forma a
dar uma maior credibilidade á história, assim como esta ter sido apresentada por um
jornal.)

Estes dois homens que estavam a andar a cavalo foram sequestrados por três homens
mascarados. Levaram-nos para uma casa onde estava um corpo para que um dos
sequestrados, que era doutor fizesse uma avaliação do corpo ali presente, se estava vivo
ou não e se não estivesse qual seria a causa da morte. A qual virá afirmar que terá sido
ópio. Surgem aqui logo algumas questões normais de uma investigação criminal; Quem
é cadáver? O que faz ali? Assassinato ou Suicídio? Quem cometeu o crime?.

2
Queirós, Eça. O mistério da Estrada de Sintra. Lisboa: Livros do Brasil, 2007. p.7
Aqui os narradores são os próprios escritores que se colocam como personagens. As
primeiras cartas que estes enviam é para relatar ao redator do Diário de Notícias aquilo
que tinha acontecido, o rapto e a descoberta do corpo.
No decorrer desta narrativa surgem outras personagens como A.M.C, a intervenção da
personagem denominada Z, uma personagem que se assume na minha opinião como
uma personagem importante para aumentar a credibilidade junto aos leitores. Isto
acontece porque Z, apresenta-se como um leitor crítico dos folhetins que vem dizer que
conhece o homem com as iniciais A.M.C , pois tinha sido relatado que este homem com
estas iniciais era um estudante de medicina, natural de Viseu, ao que ele vem responder
que tem um amigo que corresponde a estas características. “encontro no folhetim
publicado hoje as iniciais de um nome de homem -A.M.C… Eu tenho um amigo com
aquelas iniciais no seu nome. (Eça de Queirós, p.52). Vem declarar a inocência do
amigo ao redator do jornal, no entanto vem logo dizer que foi a casa do amigo mas este
tinha desparecido e que tal acontecimento mais o facto de este ter sido mencionado no
folhetim como o culpado pelo crime não poderia ser coincidência.
Há ainda no desenrolar da narrativa a introdução de novos fatos e pistas. A introdução
da personagem feminina, condessa W., que tinha um caso com o capitão Rytmel, o
militar inglês que estava morto.
É feita ainda a introdução de uma forma mais abrangente de outra personagem, um dos
Mascarados, responsável pelo sequestro naquela noite. Este mascarado, primo da
condessa W. , envia uma carta ao redator do jornal com a justificação e com a
necessidade de se explicar e dar a sua versão dos factos. “eu era nas cartas do doutor…
nunca supus que me veria na necessidade lamentável de vir ao seu jornal trazer
também a minha parte das revelações.” (Queirós, Eça. p.87). No entanto este não quis
falar do crime em si, mas sim dos acontecimentos anteriores ao crime, acontecimentos
que o ligavam ao militar inglês. É nesta carta relatada uma viagem deste, com a
condessa W, e do conde a Malta; da forma como o Mascarado apresentou o Captain
Rytmel à sua prima condessa.
Introduz aqui também outras personagens como Carmén Puebla, ex-amante do capitão
inglês, e também o atual marido de Carmén, Nicazio Puebla, um mercador espanhol e o
Conde Grenley.
Fala ainda da amizade que mantinha com o capitão inglês e do acolhimento que lhe deu
na sua casa.
Nas cartas seguintes, sendo outro capítulo do livro, encontramos as “Revelações de
A.M.C, onde este começa por relatar a sua vida humilde, e a forma como encontrou a
condessa de W no Rossio pela primeira vez e depois quando a encontra e esta se
confessa a ele pelo crime cometido.
“Eu matei um homem”. (p.177).
A última carta enviada ao redator do Diário de Notícias é breve e serviu apenas para
revelar que toda aquela narrativa apresentada naquele período se tratava de uma
narrativa hipotética sem a existência de um verdadeiro crime e também para revelar a
autoria da mesma narrativa.

Análise formal

Passando à análise formal da narrativa, podemos referir que se trata de uma narrativa
situada no final do século XIX, na região de Sintra, próximo a Lisboa.
Eça de Queirós aborda temas como a moral, o amor e o papel da mulher na sociedade
nas suas obras. Ao analisar esta obra, podemos observar como o autor trata estes temas
e como estes estão interligados no desenvolver do romance.
O espaço é extenso. É nos falado na narrativa lugares como Sintra, Malta, Gibraltar,
Lisboa e Paris.
É narrada inicialmente através de cartas enviadas ao longo de várias semanas. Como já
foi referido anteriormente o livro começa com o relato do assassinato de alguém e
começa aí a investigação e o desenrolar da história.
No meio da narrativa existem algumas paragens que nos dão a conhecer mais sobre as
personagens até mesmo de acontecimentos anteriores ao crime, como se fosse uma
viagem no tempo, como acontece por exemplo na carta enviada pelo Mascarado.
Portanto podemos identificar aqui uma técnica da narrativa que é a analepse, ou seja a
introdução de acontecimentos passados no meio da narrativa presente.
Temos a presença da comparação digamos entre as duas personagens femininas,
quando é demonstrado que uma das personagens, sendo esta a condessa é uma
personagem mais aristocrata, mais calma enquanto que Carmén, apresenta-se como
uma personagem mais ativa.
Nas cartas de A.M.C, são feitas referências culturais da literatura estrangeira e é nos
apresentado assim alguns nomes como, Julieta de Shakespeare, Werther de Goethe ou
Manon de Prévost que têm um valor simbólico no que diz respeito à característica do
romance, pois todas estas personagens, tal como Rytmel e Condessa, vivem um grande
amor que acaba com a morte.
Relativamente à classificação do narrador, não foi uma tarefa propriamente fácil
porque existem várias alterações no tipo de discurso
A primeira parte, onde é contado pelo doutor os acontecimentos, o narrador é
autodiegético. Na intervenção de Z, também podemos identificar o narrador como
autodiegético, pois este leitor atento fala o que pensa; nas revelações de A.M.C o
narrador continua a ser autodiegético.
A narrativa do Mascarado, o narrador é homodiegético, porque o Mascarado apresenta
a sua versão dos factos, do que viu e ouviu. O outro capítulo, que é a confissão da
Condessa, e quem escreveu a carta foi A.M.C, como é referido no livro, aqui mais uma
vez o narrador é autodiegético.
A linguagem utilizada por Eça e Ramalho é uma linguagem simples e direta, sem haver
a necessidade de recorrer a dicionários como acontece com outros escritores do
panorama nacional. Existe também descrição detalhada, algo que já patente na escrita
de Eça de Queirós e visível em outras obras do mesmo autor, o que se revela um traço
identitário do próprio Eça. Neste caso, na obra em estudo, as descrições detalhadas das
personagens, dos lugares, dos acontecimentos da história foram importantes para
captar a atenção da sociedade a estes factos relatados no jornal de forma a se
mostrarem verídicos. Em alguns momentos também utiliza uma linguagem mais
formal e poética, o que contribui para a atmosfera dramática desta narrativa.
Eça utiliza ainda bastantes metáforas e os recursos narrativos como a interpolação
como já tinha referido.
Outro traço encontrado nesta narrativa de Eça é o humor que apresenta, como por
exemplo quando é relatado no início da viagem a Malta, em que a condessa odeia os
ingleses e que nem sabe inglês, e no fim o amante acaba por ser um capitão inglês,
quase como uma antítese.

Narrativa transmediática

Antes de falar de adaptações fílmicas ou cinematográficas convém falar acerca da


narrativa transmediática. Um termo cunhado por Jenkins, no livro Convergence
Culture.
Jenkins define a narrativa transmediática como a representação de um mundo
narrativo em “histórias que se desenrolam através de múltiplas plataformas
mediáticas”. 3

3
Jenkins, H. (2006). Convergence Culture: Where old and new media collide.
Portanto a introdução de uma ideia narrativa contada de várias formas, ajustando à
narrativa em que se insere, podendo ser um spin-off dos filmes como existem vários
exemplos a nível mundial, ou mesmo um jogo, blogs, etc.
E qual é a relação com a adaptação? Será a mesma coisa?
É que parecem ter definições parecidas, no entanto existem alguns autores que
contradizem, dizendo que narrativa transmediática não é adaptação porque adaptar é
contar a mesma história. Portanto podemos dizer que adaptação é a transferência de
um texto escrito para um filme, enquanto a narrativa transmediática são narrativas que
se desdobram em várias plataformas, uma narrativa que de igual forma que se
desdobra também se expande ao apresentar nas variadas plataformas outras
contribuições.
Relativamente a estas adaptações cinematográficas podemos falar que se trata de uma
narrativa transmediática, pois temos o caso da série que funciona quase como um spin-
off da série, e também no filme em que temos o desenrolar de uma narrativa de igual
importância ao lado da narrativa do triangulo amoroso que já existia no livro, neste
caso a narrativa da amizade, como se fosse outra história diferente, com a introdução
de novas características às personagens como se as tivesse aprofundar.

Adaptações existentes da narrativa de Eça?

Como já referi no início do trabalho existem adaptações feitas a partir desta obra de Eça
e de Ramalho Ortigão. Umas mais bem concebidas do que outras.
Os cineastas fazem adaptações por diversas razões como: escassez de guiões originais,
que para promover e homenagear o autor da obra, para atualizar a obra, etc.
Referi a peça teatral que não vou analisar porque não encontrei a reprodução da
mesma, mas podemos falar de Nome de Código: Sintra, uma série portuguesa de 2006,
composta por 13 episódios e que é baseada nesta obra de Eça.
Tem o título original de Novos Mistérios da Estrada de Sintra e conta com alguns atores
bem conhecidos da televisão portuguesa como Adriano Luz, Ana Bustoff, Catarina
Wallestein, Giselle Itié, José Pedro Vasconcelos, Joaquim Barros, entre outros.
Esta série, apesar de ser uma adaptação da narrativa literária afasta se de alguns pontos
essências da obra.
A começar com o início da ação (e sim, é verdade, cometi aqui um pleonasmo, ou
digamos um pleonasmo vicioso, de que já estamos habituados até a encontrar em
muitos textos e principalmente no texto falado), em que o crime ocorreu num jantar de
aniversário de um deputado, em que este é a vítima do crime e cujo nome não é
idêntico ao do assassinado no livro. Portanto começa logo com algumas diferenças. No
entanto do que eu entendi da série, as personagens relacionam factos dos crimes
ocorridos em pleno século XXI, com os acontecimentos ocorridos e relatados nas cartas
enviadas para o Diário de Notícias. São introduzidas partes da narrativa aqui espelhada
na série como por exemplo em um determinado episódio em que uma personagem está
a ler o diário de outra personagem e descobre a relação da Condessa de W. com o
capitão inglês. São assim estes apresentados como antepassados.
Há também a existência na série de um amor proibido; é questionado ainda a
veracidade do Mistério da Estrada de Sintra, o mistério ocorrido com os seus
antepassados.

Outra das adaptações existentes é o filme com o mesmo nome que a obra literária. Foi
produzido também em 2007 por Jorge Paixão da Costa, nome já referido
anteriormente.
Um filme que conta a história como é na obra literária, pelo menos assume a maior
parte das diretrizes, faltando alguns elementos que não são possíveis de transparecer
no ecrã.
Um filme de quase duas horas e que conta com alguns atores bem conhecidos do
panorama nacional como Nicolau Breyner, Ivo Canelas, Rogério Samora, Giselle Itié e
António Pedro.
A trilha sonora do filme é feita com músicas de Guga Bernardo e com a produção
musical de Marco Boaventura.
Neste filme, Eça e Ramalho tornam-se personagens e passam a narrar o que acontece
no livro dentro do próprio filme. Como já referi anteriormente alguns elementos não
foram transportados da obra literária para o cinema, pois existem diferenças de como
transmitir uma ideia no livro, assim como existem formas diferentes de o demonstrar
no cinema.
No filme conservou-se aquilo que seria o expectável de existir no século XIX, e com isto
refiro-me aos trajes utilizados, aos costumes, a própria maneira de falar e também é
visível algumas características que foram descritas de forma exaustiva no livro e que
foram posteriormente transportadas para o filme.
Ivo Canelas interpreta Eça de Queirós e Ramalho Ortigão é interpretado por António
Pedro Cerdeira.
O capitão inglês foi interpretado por James webber Brown. Giselle Itié interpretou
Carmén, enquanto o seu marido, um espanhol foi interpretado por Flávio Galvão e a
condessa foi interpretada por Bruna di Tullio.
As cenas descritas no livro sobre o começo do relacionamento entre o capitão e a
condessa, as cenas do jantar são exemplos de algumas das cenas que foram bem
conservadas nas cenas fílmicas.
No filme existem cenas de discussão e discordância entre Eça e Ortigão, o que não
acontece no livro, pois o livro é feito através de cartas escritas pelos dois, enquanto os
dois se encontravam á distância.
No filme aparecem ainda cenas sobre a doença sexual que era incurável na época e
cenas da revolta perante Eça pelas cartas publicadas no Diário de Notícias.
Tanto no filme como no livro não há nenhuma personagem que seja identificada como
detetive.
Os primeiros minutos do filme são como uma lufada de ar fresco no que diz respeito às
componentes de um bom filme policial, pois é nos apresentado um duelo no navio,
depois aparece num cenário escuro a estrada de Sintra e o sequestro e depois a cena do
cadáver.
Outro reparo que se faz no filme é relativamente ao espaço.
A partir do livro conseguimos enumerar alguns lugares como: Gibraltar, Paris, Malta,
Itália, Lisboa e Sintra, enquanto que na adaptação cinematográfica não nos é mostrado
alguns destes países e cidades porque também seria complicado , sendo o orçamento
baixo ter a capacidade de fazer cenário para estes lugares todos.
No entanto encontramos no filme alguns lugares como a Praça onde Ramalho e Ortigão
se encontram, a casa destes e a sede do jornal, o que também é facilmente explicado,
pois na obra literária estes não são personagens, mas sim narradores que escrevem
uma narrativa em conjunto, através de cartas.
Outro elemento que é apresentado na obra cinematográfica, mas que não partiu da
base da obra é a música, elemento impossível de se fazer ouvir num texto escrito.
Existe ainda a eliminação de certas personagens como A.M.C e do leitor critico que era
amigo do anterior, Z.
Outras personagens também tem um desfecho diferente se compararmos as duas
narrativas.
Na narrativa literária, o militar inglês é envenenado pela Condessa, enquanto no filme
esta personagem morre de sífilis, doença sexualmente transmissível e sem cura na
época retratada.
A antiga amante do militar, Cármen também teve outro desfecho; no livro é nos
apresentada uma morte sossegada, em que esta morre no navio inglês e no filme esta
personagem atira-se do penhasco, ou seja, os responsáveis pela escrita quer do livro
quer do roteiro acreditavam na ideia de um desfecho diferente nestas narrativas.
Podemos ainda falar que este filme continua a preocupar-se com a crítica à sociedade.
Ouvimos pela voz de Ortigão e Eça, a crítica que é feita à época do século XIX, e aos
escritores, o que é interessante, sendo eles escritores da época e estando retratados
também no filme.
Outra característica que não nos é apresentada no livro são as cenas do sensualismo e o
desejo carnal das personagens, quando no filme nos são apresentadas cenas bastante
explicitas assim como a faceta agressiva do conde, onde este no filme estuprou a
condessa.
Por fim, uma das partes mais notórias no filme foi o destaque se deu à amizade de Eça
de Queirós e Ramalho Ortigão, tendo a mesma importância até que as cenas do
romance em si mesmo, existindo até personagens como o redator do jornal que tenta
que não haja desavenças entre os dois e que estes continuem amigos.
Conclusão

Este trabalho teve como objetivo analisar e comparar uma obra literária com as adaptações
cinematográficas pelo meio de análise narratológica.
Da comparação vemos que o realizador se inspirou no livro, para desenvolver estas narrativas,
o que é considerado por muitos autores um desafio perigoso devido à importância da
literatura e à superioridade que apresenta relativamente ao cinema.
As personagens no livro muito importantes como Mascarado Alto, Condessa, Rytmel, Conde e
Cármen, são mantidas. Por outro lado, o que consideramos a adição são os destinos de Eça de
Queirós e Ramalho Ortigão, as suas desavenças e os protestos que sofrem por outras
personagens. Ainda os destinos das outras personagens são resultados de uma outra
conceção: Cármen suicida-se, Rytmel morre de sífilis e Luísa envenena-se. Como outras
diferenças consideramos as características das personagens, porque a maioria destas não
mantêm as características descritas no livro.
Em relação à serie que foi analisada por alto, só com base nas sinopses e algumas partes de
episódios, apenas conseguimos entender que, sim foi baseada na obra literária de Eça, mas
mais que o filme foge ao que seria a cópia da narrativa apresentada no livro. O que acontece, é
pois mais uma atualização, no sentido em que é retratada outra época, são os descendentes
da Condessa de W. , e ocorre um crime em que é estabelecido uma relação com alguns pontos
da narrativa escrita e onde são lembrados alguns factos do crime ocorrido no século XIX.
Em relação ao filme é sem dúvida muito mais dramático de que o livro, devido à música e aos
efeitos visuais próprios do mundo narrativo em que se inserem.
Trata-se duma verdadeira ação cinematográfica
Esta adaptação foi uma boa iniciativa de homenagear o escritor e uma boa forma de mostrar
ao público esta obra queirosiana que não é conhecida por muitos. Para além disso, os
cineastas nos apresentaram aquela época, os hábitos de então, o modo de indumentária etc. o
que foi muito difícil, mas em contrapartida é grande vantagem deste filme
Como já mencionei, a obra queirosiana serve frequentemente de fonte para uma adaptação.
O interesse dos cineastas de adaptar a obra queirosiana demonstra que Eça continua a ter
narrativas atraentes também para serem retratadas na época contemporânea.
Uma das principais críticas que lanço à narrativa é que a solução do mistério é um pouco
previsível e também dada cedo demais.
Bibliografia

BARBOSA , Damares. O mistério da estrada de Sintra: das páginas portuguesas ao


cinema lusobrasileiro. [online], s. 1-6 Disponível online:
https://abralic.org.br/eventos/cong2008/AnaisOnline/simposios/pdf/016/DAMARES
_BARBOSA.pdf

COSTA, Jorge Paixão da. (2007). O Mistério da Estrada de Sintra (Filme).

Jenkins, H. (2006). Convergence culture: Where old and new media collide. New York

Equipe editorial de Conceito.de. (9 de Setembro de 2013). Conceito de análise literária.


(online). Disponivel em:
https://conceito.de/analise-literaria

Fundação Eça de Queiroz. Cronologia. (online). Disponivel em:


https://feq.pt/o-escritor/

QUEIRÓS, Eça. (2007). O Mistério da Estrada de Sintra. Lisboa: Livros do Brasil

TEIXEIRA, Juçara Moreira (2019). Adaptações cinematográficas e obras literárias sob


a ótica dos leitores-espectadores do ensino fundamental II. Revista do SELL

Tretas & Letras.(2007). Curtas sobre metragens – O mistério da estrada de Sintra.


(Blog online). Disponível em:
http://tretaseletras.blogspot.com/2007/05/curtas-sobre-metragens-o-mistrio-da.html

Programas TV. Nome de Código: Sintra.


Disponivel em:
https://www.rtp.pt/programa/tv/p21134

Portal da Literatura. (s.d). Ramalho Ortigão. (online)


Disponivel em:
https://www.portaldaliteratura.com/autores.php?autor=203

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