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COMISSÃO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS

Bruxelas, 30.04.1997
COM(97) 176 final

PRINCÍPIOS GERAIS DA LEGISLAÇÃO ALIMENTAR


DA UNIÃO EUROPEIA

Livro Verde da Comissão


ÍNDICE

Resumo v
PARTE I INTRODUÇÃO 1
1. Observações de carácter geral 1
2. Contexto económico 3
3. Historial das actividades comunitárias no sector dos produtos
alimentares 4
3.1 Política Agrícola Comum e legislação relativa aos produtos
alimentares 4
3.2 Política Comum de Pescas 5
3.3 Desenvolvimento do mercado interno no domínio dos produtos
alimentares transformados 6
4. Política industrial 8
5. Consumidores, segurança alimentar e protecção da saúde 8

PARTE H SIMPLIFICAÇÃO E RACIONALIZAÇÃO DA LEGISLAÇÃO


ALIMENTAR COMUNITÃRIA 11
1. Introdução 11
2. Questões de carácter genérico 11
3. Abordagem regulamentar em termos gerais 12
4. Papel da auto-regulação no sector dos produtos alimentares 14
5. Abordagens horizontais e verticais da legislação alimentar 15
6. Subsidiariedade e simplificação da legislação 15
7. Iniciativas legislativas de âmbito nacional 17
8. Necessidade de nova legislação comunitária com vista à realização do
mercado interno 19

PARTE m REVISÃO DA LEGISLAÇÃO COMUNITÃRIA EXISTENTE 19


1. Questões de carácter geral 20
2. Transparência da legislação comunitária 20
3. Os regulamentos como alternativa às directivas 21
4. Adaptação da legislação ao progresso científico e técnico 21
5. Racionalização das definições utilizadas na legislação alimentar
comunitária 22
5.1 Definição de produtos alimentares 23
5.2 Definição de colocação no mercado 24
6. Higiene alimentar 24
7. Qualidade alimentar 27
8. Rotulagem dos alimentos 28

m
PARTE IV MANUTENÇÃO DE UM ELEVADO GRAU DE
PROTECÇÃO 31
1. Observações de ordem geral 31
2. Papel dos pareceres científicos na elaboração da legislação
relativa à segurança alimentar 31
3. Cooperação científica no domínio dos alimentos 33
4. Abordagem deriscosgraves e urgentes para a saúde pública 35
5. Emergências radiológicas 36
6. Zoonoses 37
7. Introdução da obrigação geral de garantia da segurança e higiene
dos alimentos 39
7.1 Actual situação a nível comunitário 39
7.2 Âmbito da obrigação geral de segurança e higiene 40
8. Aplicação do princípio da responsabilidade pelos produtos no
sector alimentar 41
9. Satisfação das novas aspirações dos consumidores 42

PARTE V ASSEGURAR A IMPLEMENTAÇÃO EFICAZ DAS


REGRAS DO MERCADO INTERNO 45
1. Generalidades 45
2. Transposição e aplicação da legislação comunitária 45
3. Controlo e aplicação 46
3.1 Controlos veterinários 47
3.2 Outros controlos oficiais dos produtos alimentares 48
4. Sanções 49
5. Gestão do mercado interno em áreas não harmonizadas 49

PARTE VI DIMENSÃO EXTERNA 52


1. Generalidades 52
2. Dimensão multilateral 53
2.1 Acordos OMC 53
2.2 Evolução do Codex Alimentarius 55
2.3 Consequências desta evolução para a Comunidade 56
3. Dimensão bilateral 57

IV
Resumo |

Contexto Geral

1. A legislação alimentar é um tema de grande interesse público. É necessário um


elevado grau de segurança e controlo público efectivo para garantir a segurança e
higiene dos alimentos e assegurar a protecção eficaz de outros interesses dos
consumidores.

2. Trata-se de um sector de importância vital para a economia europeia, uma vez que
cada agregado familiar dispende em média 20% do seu rendimento disponível em
alimentos e bebidas. As indústrias de transformação alimentar e de bebidas, por si só,
empregam cerca de 2,3 milhões de pessoas, e, em 1996, o consumo a nível
comunitário cifrar-se-á em 500 000 milhões de ecus.

3. A legislação comunitária relativa aos produtos alimentares aumentou


substancialmente, designadamente em virtude do mercado interno e da implementação
da política agrícola comum. Hoje em dia, a maior parte das legislações alimentares
nacionais foi harmonizada a nível comunitário. Mesmo no que respeita às áreas não
harmonizadas, a aplicação das regras comunitárias de carácter material constantes do
Tratado, nomeadamente dos seus artigos 30°-36°, constitui a base da livre circulação
de produtos alimentares.

4. A nova abordagem da Comissão em relação aos pareceres e controlos científicos, na


forma em que foi especificada na Comunicação relativa à saúde dos consumidores e à
segurança alimentar, posterior à decisão sobre a separação de responsabilidades de,
por um lado, gestão dos comités científicos e das actividades de controlo, e, por outro
lado, das suas estruturas legislativas não é abordado no presente Livro Verde, que
abrange principalmente as regras de carácter material constantes da legislação
comunitária e aplicáveis ao sector alimentar. Como foi referido nessa comunicação, a
Comissão tomou medidas para melhorar o rendimento dos seus serviços de controlo,
bem como para optimizar a sua qualidade, ao assegurar a respectiva independência,
transparência e eficácia.

Objectivos do Livro Verde

1. Analisar em que medida a legislação satisfaz as necessidades e expectativas dos


consumidores, produtores, fabricantes e comerciantes.

2. Analisar o modo como as medidas destinadas a aumentar a independência,


objectividade, equivalência e eficácia dos sistemas oficiais de controlo e inspecção
satisfazem os seus objectivos básicos de garantia de alimentos seguros e higiénicos e
de protecção de outros interesses dos consumidores.

3. Lançar um debate público sobre a legislação alimentar.


4. Desse modo, dotar a Comissão de meios que lhe permitam, se necessário, propor
medidas adequadas com vista ao desenvolvimento futuro da legislação alimentar
comunitária.

Como ponto de partida para o debate, o Livro Verde aponta seis objectivos
básicos para a legislação alimentar comunitária:

1. Assegurar um elevado grau de protecção da saúde pública e de segurança do


consumidor.

2. Assegurar a livre circulação de mercadorias no mercado interno.

3. Assegurar que a legislação assente sobretudo em dados científicos e em avaliações


de risco.

4. Assegurar a competitividade da indústria europeia e melhorar as suas perspectivas


de exportação.

5. Atribuir à indústria, aos produtores e aos fornecedores a principal responsabilidade


pela segurança alimentar, através da análise deriscoe de sistemas do tipo de pontos de
controlo críticos (HACCP), a que há que acrescentar um controlo e aplicação oficiais
eficazes.

6. Assegurar que a legislação seja coerente, racional e convivial.

Para se alcançarem estes objectivos, importa assegurar que a abordagem regulamentar


abranja toda a cadeia alimentar "do estábulo até à mesa". Tal facto levanta duas
questões:

1. Em que medida se deverá aplicar o mesmo conjunto de regras gerais quer à


produção agrícola primária quer ao sector da transformação de produtos alimentares;

2. Obrigatoriedade do princípio da responsabilidade do produtor em relação a


produtos deficientes no que respeita à produção agrícola primária (ver Directiva
85/374/CEE).

Simplificação e racionalização da legislação alimentar comunitária

1. Muito embora constituam objectivos desejáveis, a simplificação e a racionalização


não deverão conduzir a um menor grau de protecção da saúde pública ou do
consumidor. Desde 1985 que a Comissão, em termos gerais, limitou as suas propostas
relativas ao sector dos produtos alimentares do mercado interno às medidas
necessárias para a protecção da saúde pública e dos consumidores.

2. Importa assegurar que a legislação existente crie um equilíbrio adequado entre


disposições de carácter geral e legislação prescritiva mais pormenorizada, entre o
recurso a legislação obrigatória e a instrumentos facultativos e entre abordagens
horizontais e regras específicas aplicáveis a categorias específicas de produtos
alimentares.

vi
3. A aplicação dos princípios da subsidiariedade e da simplificação legislativa a este
domínio produziu resultados inconclusivos. Um problema específico foi a dificuldade
em assegurar que a aplicação prática do princípio da subsidiariedade não conduza ao
desmantelamento progressivo do mercado interno em consequência de novas
iniciativas legislativas nacionais. Além disso, poderá ser necessário alargar o âmbito da
legislação comunitária por forma a que abranja certas áreas em que se afigura que o
mercado interno não está a funcionar eficazmente.

Análise da legislação existente

1. A consulta alargada dos parceiros sociais aquando da elaboração da legislação é um


importante meio para assegurar que a legislação satisfaça os seus objectivos. Os
parceiros sociais poderiam ser incentivados a participar mais activamente na avaliação
dos custos e benefícios das propostas de nova legislação.

2. Um maior recurso a regulamentos, e não a directivas, aumentaria a transparência da


legislação e evitaria dificuldades decorrentes do atraso ou da incorrecção das
transposições. No entanto, a directiva deveria continuar a ser o instrumento de
primeira escolha para a legislação de enquadramento.

3. As graves dificuldades de adaptação ao progresso científico e técnico da legislação


existente seriam menores se se recorresse mais a procedimentos simplificados.

4. As definições existentes, que constam de toda uma variedade de instrumentos


jurídicos, devem ser racionalizadas e completadas por novas definições de produtos
alimentares e de colocação no mercado.

5. No domínio da higiene, verifica-se a coexistência de 11 directivas de higiene


veterinária com uma directiva de higiene dos produtos alimentares. A Comissão lançou
já trabalhos de simplificação das directivas verticais, mas há que ponderar a sua relação
com a directiva de carácter geral. Há que dar prioridade à garantia da existência de um
corpo coerente e consistente de normas higiénicas comunitárias. Para tal, os melhores
meios são a aplicação generalizada dos princípios do tipo HACCP e a limitação de
regulamentos prescritivos generalizados aos casos em que sejam considerados
essenciais. Há que estabelecer um equilíbrio entre a vontade de consistência e a
necessidade de se manter o grau necessário de flexibilidade no que respeita à
concepção e implementação da regulamentação de higiene alimentar, por forma a
assegurar um elevado nível de protecção sem criar encargos desnecessários para as
empresas.

6. No domínio da qualidade, afigura-se que as diferenças de abordagem resultantes dos


objectivos diferentes do mercado interno e da legislação agrícola não levantam
problemas nem de incoerência nem de falta de consistência.

7. No domínio da rotulagem, deveriam existir normas obrigatórias de rotulagem para


assegurar que os consumidores disponham da informação essencial sobre os produtos
alimentares, a qual deve ser clara. Importa estabelecer um equilíbrio que assegure que
os consumidores recebam todos os dados úteis e evitem dados pormenorizados

vu
desnecessários. Os fabricantes devem poder apresentar dados adicionais, desde que
não enganosos, muito embora, em determinados casos, possa ser necessária legislação
sobre a apresentação de dados adicionais. A este propósito, o Livro Verde solicita
especificamente a apresentação de observações sobre a abordagem da legislação
comunitária em relação às alegações e à rotulagem nutricional.

Manutenção de um elevado grau de protecção

1. O Tratado requer que a Comunidade contribua para a manutenção de um elevado


grau de protecção da saúde pública, do ambiente e dos consumidores. Para assegurar
um elevado grau de protecção e coerência, as medidas de protecção devem assentar na
avaliação do risco e atender a todos os factores relevantes, designadamente questões
de carácter tecnológico, a melhoria dos dados científicos disponíveis e a
disponibilidade de amostragem para inspecção e de métodos de ensaio. Se não for
exequível uma avaliação de risco integral, há que adoptar medidas cautelares.

2. E crucial a existência de uma fonte independente de pareceres respeitada pelo


público. Há que assegurar a independência e objectividade dos pareceres científicos e
dos Comités Científicos. Há que adoptar medidas tendentes a assegurar a existência
dos recursos necessários, bem como a coordenação central do número, âmbito,
composição e actividades dos Comités Científicos, por forma a que se garanta um
elevado grau de competência e a consistência plena dos pareceres científicos. Há que
envidar esforços no sentido da apresentação clara e convincente das conclusões
científicas.

3. Os pareceres científicos são um factor particularmente importante, mas não o único


determinante, A legislação comunitária reconheceu já várias vezes que há que atender
a outros factores, nomeadamente às necessidades e preocupações dos consumidores,
que há que considerar igualmente no processo de tomada de decisões.

4. A Comunidade deve dispor de meios adequados para adoptar medidas preventivas


contra vários riscos sérios e urgentes em termos de saúde pública. A Comissão dispõe
de todo um leque de competências no domínio das salvaguardas, muito embora
importe verificar a inexistência de lacunas no sistema. Poderá ser também necessário
melhorar a comunicação com o público em caso de riscos graves.

5. A Comunidade dispõe de toda uma variedade de estratégias de abordagem e


controlo das zoonoses (erradicação, redução, remoção e tratamento). A Comissão
solicita sugestões sobre o possível melhoramento das medidas de gestão do risco de
zoonoses.

6. A legislação deve definir claramente as responsabilidades dos produtores,


processadores, distribuidores e retalhistas no que respeita ao fornecimento de
alimentos seguros e salutares adequados para consumo humano, com qualidade bem
especificada e adequadamente identificados, bem como as responsabilidades das
autoridades competentes de controlo. Poderá ser desejável introduzir obrigações
genéricas relativas a todos os operadores económicos, a fim de adoptar todas as
medidas necessárias para assegurar que apenas sejam colocados no mercado alimentos
seguros e higiénicos. Estas obrigações devem ser independentes dos direitos dos

viu
consumidores, que deverão ser melhorados no quadro da directiva relativa à
responsabilidade pelos produtos deficientes.

7. O alargamento à produção agrícola primária do âmbito da directiva relativa à


responsabilidade pelos produtos deverá melhorar o nível global de protecção dos
consumidores, muito embora não deva ser considerado uma alternativa a normas
adequadas de segurança dos produtos e a sistemas oficiais de controlo eficazes.

8. Os últimos acontecimentos evidenciaram o interesse dos consumidores pelos


métodos de produção alimentar. A legislação alimentar comunitária1 não requer a sua
indicação na rotulagem se não tiverem impacto nas características alimentares do
produto acabado. No entanto, em determinados casos, poder-se-ão considerar
necessários esquemas obrigatórios de rotulagem, como sucedeu com as regras
recentemente adoptadas sobre a rotulagem da carne de bovino. Além disso, poderá ser
necessário ponderar um enquadramento adequado para esquemas facultativos de
rotulagem concebidos tendo em conta este interesse.

Assegurar a implementação efectiva das regras do mercado interno

1. A implementação atempada e correcta da legislação comunitária é essencial para o


funcionamento eficaz do mercado interno. Há que recorrer mais amiúde aos Comités
Permanentes com vista à análise de questões relativas à interpretação da legislação
comunitária e de dificuldades imprevistas que possam ocorrer aquando da sua
implementação. Há que ponderar a criação de um fórum em que representantes da
Comissão, dos Estados-membros e das partes interessadas possam debater questões de
carácter geral sobre a implementação da legislação.

2. O principal papel da Comunidade no domínio do controlo não é substituir-se aos


Estados-membros, mas sim verificar que os controlos necessários estão a ser
efectuados de modo eficaz e em termos equivalentes a nível de todo o mercado
interno. A legislação deve prever medidas adequadas de aplicação e controlo. Muito
embora tenham por objectivo um elevado grau de protecção, estas medidas devem
atender ao princípio da proporcionalidade e prever que os controlos incidam sobretudo
nas actividades de maior risco. Há que adoptar medidas de reforço da cooperação
administrativa e científica entre os Estados-membros e com a Comissão, por forma a
assegurar a equivalência da aplicação em toda a Comunidade, bem como mecanismos
eficazes de prevenção da colocação no mercado de alimentos não seguros e de
reconstituição da origem e dos factores envolvidos em surtos de doenças de origem
alimentar. O quinío programa-quadro de investigação deve também desempenhar um
papel neste domínio. Para aumentar a confiança dos consumidores, procurou-se,
através da Comunicação relativa à saúde dos consumidores e à segurança alimentar,
aumentar a transparência do sistema de controlo a nível comunitário e dever-se-á
estudar igualmente o aumento da transparência a nível nacional.

1
Directiva 79/112/CEE, relativa à aproximação das legislações dos Estados-
membros respeitantes à rotulagem, apresentação e publicidade dos géneros
alimentícios destinados ao consumidor final.
Regulamento (CEE) n° 258/97, relativo a novos alimentos e ingredientes
alimentares.

IX
3. As sanções por infracções à legislação comunitária relativa ao mercado interno
devem ser efectivas, proporcionais, dissuasivas e equivalentes às previstas nas
legislações nacionais.

4. Há mecanismos de análise de novos projectos de legislação nacional, o principal dos


quais é a Directiva 83/189/CEE, caso a legislação envolva uma regulamentação
técnica; a Comissão também assegura a observância das normas comunitárias no
domínio dos produtos alimentares através da investigação de queixas. Prevê-se
igualmente que, neste âmbito, o novo procedimento de informação mútua sobre
medidas nacionais que derroguem o princípio da livre circulação de mercadorias
constitua um importante contributo.

Nas áreas não harmonizadas, o principal instrumento de gestão do mercado interno


continua a ser o princípio do reconhecimento mútuo, o qual requer que um Estado-
membro autorize no seu território a livre circulação de mercadorias produzidas ou
colocadas no mercado em conformidade com os ensaios, regras ou normas de um
outro Estado-membro que proporcionem um grau de protecção equivalente ao dos
seus próprios ensaios, regras ou normas.

Dimensão externa

1. A Comunidade é um grande importador e exportador de alimentos. Na sua


qualidade de importador, a Comunidade é obrigada a assegurar que os alimentos
importados observam normas tão rigorosas como as que foram estabelecidas para a
produção comunitária. Enquanto exportador, a Comunidade deve poder garantir aos
governos e consumidores de países terceiros que os alimentos produzidos na
Comunidade possam ser colocados nos mercados dos respectivos países com toda a
segurança.

2. A legislação deve ser compatível com as obrigações internacionais da Comunidade,


nomeadamente as decorrentes dos acordos da OMC. A Comunidade deve igualmente
trabalhar em estreita cooperação com os Estados-membros, os produtores e a indústria
para assegurar que os nossos principais parceiros comerciais estejam a respeitar
igualmente as respectivas obrigações. A Comunidade deve poder participar plenamente
nas acções de normalização internacionais no domínio dos produtos alimentares. Se
possível, a Comunidade deve negociar acordos de equivalência ou medidas de
reconhecimento mútuo com os principais parceiros comerciais, por forma a garantir
sempre um elevado grau de protecção dos consumidores.
PARTE I
INTRODUÇÃO
1. Observações de carácter geral

A maior parte das legislações alimentares nacionais foi já harmonizada a nível


comunitário, após mais de 30 anos de actividade legislativa. Estudos recentes,
nomeadamente o estudo sobre o impacto e eficácia do mercado interno no sector dos
produtos alimentares transformados, demonstraram que a legislação comunitária no
domínio dos produtos alimentares teve um impacto global positivo, muito embora
tenham sido formuladas algumas críticas sobre o grau de pormenor e a fragmentação
da legislação, sobre as dificuldades de adaptação da legislação à inovação e sobre
problemas do funcionamento quotidiano do mercado interno. Face a determinados
problemas recentes, nomeadamente o da BSE, levantaram-se dúvidas sobre se a
legislação é capaz de satisfazer todos os seus objectivos para assegurar um elevado
grau de protecção da saúde pública e dos consumidores.

Ao contrário do que se verifica com a legislação da maior parte dos Estados-membros,


a legislação alimentar comunitária foi desenvolvida por etapas, ao longo do tempo, não
existindo nenhum acto unificador central que estabeleça os princípios fundamentais da
legislação alimentar comunitária e defina claramente as obrigações de todas as partes
envolvidas. Nos últimos anos, registaram-se muitos mais apelos para um tal
enquadramento legislativo, em especial por parte do Parlamento Europeu. Em 1992, a
Comissão convidou três peritos eminentes no domínio da legislação alimentar a
analisar a necessidade e o possível âmbito de uma tal directiva geral. Em Maio de
1993, a pedido da Comissão, o Instituto Universitário Europeu de Florença organizou
uma conferência sobre esta questão, em que participaram os três peritos,
representantes dos Estados-membros e da Comissão, bem como dos sector agrícola,
industrial e comercial e das associações de consumidores.

Os objectivos do presente Livro Verde são os seguintes:

- Analisar em que medida a legislação satisfaz as necessidades e expectativas dos


consumidores, produtores, fabricantes e comerciantes.

- Analisar o modo como as medidas destinadas a reforçar a independência,


objectividade, equivalência e eficácia dos sistemas oficiais de controlo e inspecção dos
produtos alimentares satisfazem plenamente os seus objectivos.

- Lançar um debate público sobre a legislação alimentar, e, desse modo, apoiar a


Comissão na sua futura iniciativa legislativa no domínio dos produtos alimentares, e,
por conseguinte,

- Dotar a Comissão de meios que lhe permitam, se possível, com vista à protecção da
saúde pública , propor medidas que aumentem a coerência da legislação alimentar
comunitária e a consolidem e simplifiquem, melhorem o funcionamento do mercado
interno, e atendam à dimensão externa, cada vez mais importante, nomeadamente às
políticas adoptadas pelos parceiros comerciais mais avançados e aos requisitos dos
acordos da OMC.

A nova abordagem da Comissão em relação aos pareceres e controlos científicos, na


forma em que foi especificada na Comunicação relativa à saúde dos consumidores e à
segurança alimentar, posterior à decisão sobre a separação de responsabilidades de,
por um lado, gestão dos comités científicos e das actividades de controlo, e, por outro
lado, das suas estruturas legislativas, não é abordado no presente Livro Verde, que
abrange principalmente as regras de carácter material constantes da legislação
comunitária e aplicáveis ao sector alimentar. Como foi referido nessa comunicação, a
Comissão tomou medidas para melhorar o desempenho dos seus serviços de controlo,
bem como para optimizar a sua qualidade, ao assegurar a respectiva independência,
transparência e eficácia.

Antes da análise das opções políticas apresentadas para discussão, importa reafirmar
os objectivos fundamentais e os sucessos da legislação alimentar da CE, que de modo
algum devem ser postos em causa. São os seguintes:

- Assegurar um elevado grau de protecção da saúde pública e do consumidor, bem


como de segurança.

- Assegurar a livre circulação de mercadorias no mercado interno.

- Assegurar que a legislação assente sobretudo em dados científicos e em avaliações de


risco e observe as obrigações internacionais da Comunidade.

- Assegurar a competitividade da indústria europeia, graças à adaptação flexível da


legislação, por forma a que incorpore novos progressos técnicos, e melhorar as suas
perspectivas de exportação.

- Atribuir à indústria, aos produtores e aos fornecedores a principal responsabilidade


pela segurança alimentar, incluindo no que respeita às importações de países terceiros,
através de medidas de autoverificação (os chamados sistemas do tipo de pontos de
controlo críticos da análise do risco (HACCP)), apoiados por um controlo e aplicação
oficiais eficazes.

- Assegurar que a legislação seja coerente, racional, mais clara e convivial, bem como a
sua elaboração em estreita cooperação com todas as partes interessadas.

Importa sublinhar igualmente que, à medida que a cadeia alimentar se torna cada vez
mais complexa, com mais e mais intervenções, desde as dos produtores primários,
passando pelas da indústria agroalimentar até às dos distribuidores e retalhistas, se
torna essencial assegurar que a abordagem alimentar da Comunidade abranja todos os
riscos potenciais para a segurança e a higiene dos alimentos em todas as fases da
cadeia alimentar, incluindo factores a montante, relativos a entradas potencialmente
perigosas ou contaminantes ambientais, factores relacionados com a produção agrícola
e factores ligados às operações a jusante de fabrico, transformação, distribuição ou
armazenamento.
Por este motivo, o Livro Verde tem também por objectivo analisar se e em que medida
será possível aplicar o mesmo conjunto de regras gerais quer à produção agrícola
primária quer ao sector da transformação de produtos alimentares, apesar das
diferenças que os separam. Ao abrigo da directiva relativa à responsabilidade pelos
produtos, incumbe também aos Estados-membros decidir sobre a aplicação ou não da
responsabilidade pelos produtos à produção primária. Está, portanto, a analisar-se o
alargamento das regras comunitárias sobre a responsabilidade pelos produtos a todos
os operadores da cadeia alimentar, incluindo os produtores primários.

A Comissão pretende que a consulta abrangida pelo presente Livro Verde seja tão
vasta quanto possível. Solicita, portanto, às partes interessadas quaisquer outras
observações e sugestões relevantes. No final do processo de consulta, a Comissão
analisará as alterações que será necessário introduzir. Estas poderão envolver:

- Uma proposta de directiva geral no domínio da legislação alimentar;


- A consolidação e simplificação de determinadas disposições ou a reformulação da
legislação existente;
- Sugestões ou propostas de carácter não legislativo, incluindo alterações dos
procedimentos ou métodos de trabalho.

As observações relativas ao presente Livro Verde devem ser enviadas até 31 de Julho
de 1997 para:

Comissão Europeia
Direcção-Geral da Indústria (Livro Verde sobre a legislação alimentar)
200 rue de la Loi (RP 11 3/1)
B-1049 Bruxelas

2. Contexto económico

Na Comunidade, cada agregado familiar dispende em média 20% do seu rendimento


disponível em alimentos e bebidas. Em 1996, o consumo comunitário de alimentos,
bebidas e tabaco cifrar-se-á em cerca de 500 000 milhões de ecus, enquanto a
produção ascenderá a 510 000 milhões de ecus. A Comunidade é simultaneamente o
maior importador e o maior exportador de produtos alimentares. Em 1994, as
exportações da Comunidade ascenderam a 34 250 milhões de ecus, o que conduziu a
um saldo positivo da balança comercial de 9 770 milhões de ecus e representa um
acréscimo de mais de 50% em relação a 1992. Nalguns sectores alimentares existe,
porém, um défice da balança comercial. Verifica-se, por exemplo, um défice
comunitário em produtos das pescas, o qual ascendeu a 6 172 milhões de ecus em
1994. As indústrias alimentar e das bebidas empregam mais de 2,3 milhões de pessoas,
quase 50% das quais em empresas com menos de 100 empregados. A produção
agrícola primária emprega mais de 10 milhões de pessoas. O sector dos alimentos e
bebidas é, portanto, de grande importância para toda a economia europeia.

Entre 1984 e 1992, a produção e o consumo de alimentos e bebidas a nível


comunitário cresceu a um ritmo real constante de 2-2,5% por ano. No entanto, em
1992-1993 esta taxa de crescimento diminuiu para menos de 1%. Muito deste
crescimento deve-se a um maior valor acrescentado, uma vez que, particularmente no
que respeita à Europa do Norte, os consumidores estão a mudar dos produtos
alimentaresfrescospara os alimentos transformados 'de conveniência". Os principais
produtores reagiram a esta alteração permanente e investiram fortemente no aumento
da respectiva capacidade de produção, na modernização do equipamento e nas novas
tecnologias. Por outro lado, os pequenos produtores estão a sofrer cada vez mais
pressões, não só em virtude da alteração do tipo de procura de produtos alimentares,
como também em virtude das grandes mutações que se estão a verificar no sistema de
distribuição a retalho, nomeadamente o aumento da concentração da distribuição
alimentar e o papel cada vez mais importante dos produtos com a marca dos
supermercados que os colocam no mercado. Por conseguinte, muitos pequenos
produtores vêem-se confrontados com a necessidade de procurar um nicho no
mercado de qualidade ou de se tornarem fornecedores de produtos com as marcas dos
supermercados.

A nível de toda a Comunidade, registam-se ainda variações regionais significativas


entre os mercados de produtos alimentares, especialmente entre as regiões do Norte e
as mediterrânicas. No Sul da Europa, o consumo de alimentos frescos continua a ser
relativamente elevado, pelo que a percentagem de valor acrescentado da indústria de
transformação alimentar é significativamente inferior. No entanto, registou-se a nível
de todas as regiões uma diversificação considerável do tipo e leque de produtos
disponíveis e esta tendência irá provavelmente manter-se à medida que os fabricantes
procurem recorrer às regras do mercado interno para obter novas vias de escoamento
para os respectivos produtos.

Neste contexto, parece claro que a Comunidade deve desempenhar um papel


importante, através da promoção de um quadro regulamentar transparente e estável,
que constituirá a base do desenvolvimento futuro deste sector vital. A transparência e
o funcionamento eficaz do mercado interno são muito importantes para a
sobrevivência de um grande número de pequenas e médias empresas, as quais terão de
concorrer cada vez mais com os gigantes da indústria agroalimentar.

3. Historial das actividades comunitárias no sector dos produtos alimentares

Os principais determinantes da legislação alimentar comunitária são os decorrentes da


Política Agrícola Comum e da realização do mercado interno. Existe igualmente uma
política independente de pescas e aquicultura, a Política Comum de Pescas.

De futuro, o desenvolvimento das actividades comunitárias neste sector irá também ser
fortemente influenciado pelas novas disposições introduzidas pelo Tratado de
Maastricht sobre a protecção da saúde humana (artigo 129°), dos consumidores (artigo
129°-A) e do ambiente (artigo 130°-R).

3.1 Política Agrícola Comum e legislação relativa aos produtos alimentares

A política Agrícola Comum teve um impacto significativo no desenvolvimento da


legislação alimentar comunitária. As medidas adoptadas para alcançar os objectivos da
CAP conduziram inevitavelmente à elaboração de legislação que abrange a venda de
produtos alimentares de origem agrícola. Há que destacar três pontos:
1. Uma das principais características da PAC foi o desenvolvimento de organizações
comuns de mercado no que respeita às principais mercadorias agrícolas, bem como a
garantia de preços e medidas de intervenção financiadas pelo Fundo Europeu de
Orientação e Garantia Agrícola (FEOGA). No que respeita às medidas com vista ao
funcionamento eficaz e à prevenção dafraude,foi necessário definir em determinados
casos especificações de qualidade que permitem definir quais os produtos elegíveis
para apoio. Além disso, e a título de medida de apoio do mercado, bem como por
vezes na ausência de mecanismos de apoio dos preços, afigurou-se necessário
estabelecer especificações de qualidade dos produtos. A natureza e o âmbito destas
regras variam consoante a organização comum do mercado em questão. Nalguns
casos, as regras podem ter pouco impacto na comercialização de produtos alimentares
acabados. Noutros casos, por exemplo no que respeita à organização comum do
vinho, constituem um corpo completo e independente de regras de comercialização.

2. Para garantir a livre circulação de matérias-primas agrícolas a nível da Comunidade,


considerou-se necessário estabelecer regras pormenorizadas de aproximação das
legislações relativas à saúde humana, animal e das plantas. A título de exemplo, as
regras no domínio da higiene veterinária têm uma grande influência na utilização e
comercialização de produtos alimentares de origem animal. É igualmente necessário
assegurar que as técnicas utilizadas na produção agrícola não constituam por si só um
risco para a saúde pública. Assim, por exemplo, foram instituídas medidas
pormenorizadas que estabelecem limites para os resíduos de pesticidas e de
medicamentos veterinários nos produtos alimentares.

3. Na sua comunicação de 1989 sobre o futuro da sociedade rural, a Comissão


manifestou a intenção de promover uma política de qualidade a nível comunitário. Por
conseguinte, foi adoptada legislação comunitária específica sobre a utilização das
marcas ou rótulos de quahdade com vista à identificação de produtos sujeitos a
requisitos específicos de qualidade da produção (Regulamento n° 2082/92), que
provenham de áreas conhecidas pela sua produção tradicional (Regulamento n°
2081/92) ou que se comprove poderem ser produzidos através de métodos especiais,
como os alimentos biológicos.

Mais recentemente, registaram-se vários acontecimentos importantes para o


consumidor. O Conselho adoptou recentemente regras obrigatórias sobre a
documentação da origem dos produtos bovinos e há mais medidas que estão a ser
analisadas para melhorar a documentação da origem de outros produtos animais. Estão
também a ser elaboradas propostas no sentido de que a rotulagem orgânica seja
alargada aos produtos alimentares de origem animal.

3.2 Política Comum de Pescas

Muito embora o termo produção agrícola primária abranja geralmente os produtos das
pescas, as pescas e a aquicultura são abrangidas por uma Política Comum de Pescas
(PCP) bastante independente. Esta prevê medidas específicas da legislação alimentar
comunitária no que respeita aos produtos das pescas. A organização comum deste
mercado envolve um conjunto de princípios e regras relativos às normas de
comercialização comuns, às organizações de produtores, aos mecanismos de apoio dos
preços no mercado interno e ao regime de trocas comerciais com países não membros.
Os mecanismos de assistência estrutural às pescas e à aquicultura são implementados
ao abrigo do instrumentofinanceirode orientação das pescas QFOP), que envolve o
financiamento com vista à melhoria e controlo da qualidade e da higiene. São parte
integrante da PCP regras pormenorizadas de conservação do estado das reservas de
peixe. A legislação veterinária relativa ao peixe e aos moluscos está actualmente a ser
analisada no âmbito do projecto de simplificação da legislação veterinária relativa aos
produtos de origem animal.

3.3 Desenvolvimento do mercado interno no domínio dos produtos alimentares


transformados

Quer na perspectiva do consumidor, quer na dos operadores económicos, o sector dos


produtos alimentares é uma parte essencial do mercado interno. Por conseguinte, todas
as medidas adoptadas a nível nacional e comunitário deverão atender aos princípios
gerais do mercado interno, nomeadamente ao da livre circulação de mercadorias.

A Comunidade dispõe de uma série de instrumentos com vista à realização do mercado


interno:

- Aplicação dos princípios gerais relativos à livre circulação de mercadorias,


nomeadamente o do reconhecimento mútuo, derivado da jurisprudência do Tribunal de
Justiça (o qual requer que os Estados-membros autorizem a livre circulação nos
respectivos territórios de mercadorias produzidas ou comercializadas em conformidade
com os testes, regras, ou normas de outro Estado-membro que possibilitem um grau
de protecção equivalente aos seus próprios testes, regras ou normas);
- Harmonização aprofundada da legislação nacional nos casos em que a aplicação do
princípio do reconhecimento mútuo não constitua uma base suficiente no que respeita
ao mercado interno;
- Recurso à legislação-quadro, que estabelece determinados princípios gerais, muito
embora os Estados-membros possam adoptar normas mais estritas ou específicas,
desde que estas não sejam restrições inadequadas ao funcionamento do mercado
interno;
- Recurso a instrumentos facultativos, como a normalização e os códigos de boa
prática.

A harmonização aprofundada das legislações nacionais com vista à livre circulação


teve início logo nos primórdios da Comunidade. Entre 1962 e 1985, foram adoptadas
duas abordagens:

- Harmonização horizontal de todos os produtos alimentares, com vista à protecção da


saúde pública (p.ex., aditivos) ou de outros interesses dos consumidores, como a
apresentação de informação ou a prevenção de práticas comerciais enganosas (p. ex.,
no que respeita à rotulagem);
- Harmonização vertical, que estabelece especificações pormenorizadas de tipos
específicos de produtos alimentares; foram adoptadas oito directivas, que abrangem os
produtos de cacau e chocolate, os açúcares, o mel, os frutos de sumos e produtos
análogos, as compotas, geleias e doces de fruta, o leite conservado, os extractos de
café e as águas minerais naturais.
Além disso, há que referir a Directiva 80/778/CEE, relativa às águas destinadas ao
consumo humano. Esta directiva é fundamental para o sector dos produtos
alimentares, uma vez que toda a água utilizada nas empresas de produção alimentar de
fabrico, transformação ou comercialização de produtos ou substâncias para consumo
humano e que afecte a salubridade dos produtos alimentares acabados deve observar
os requisitos estabelecidos nessa directiva.

Paralelamente à actividade legislativa a nível comunitário, o Tribunal de Justiça


procedeu à interpretação dos artigos 30° a 36° do Tratado CE. Na sequência da
jurisprudência do Tribunal no acórdão relativo ao Cassis de Dijon, a Comissão reviu
inteiramente a sua política de harmonização da legislação alimentar, e, em 1985,
apresentou uma comunicação ao Conselho e ao Parlamento Europeu sobre a
realização do mercado interno (COM(85)603 final). Simultaneamente, clarificou-se o
âmbito do princípio do reconhecimento mútuo.

Nos termos da comunicação, a legislação alimentar comunitária limitar-se-ia a partir de


então à harmonização das regras nacionais justificável face aos requisitos obrigatórios
estabelecidos pelo Tribunal, nomeadamente:
- A protecção da saúde pública;
- A protecção de outros interesses dos consumidores, designadamente a sua
informação;
- A lealdade das práticas comerciais;
- A necessidade de assegurar controlos oficiais adequados.

Por outro lado, a Comissão afirmou que, em princípio, deixaria de apresentar


propostas de harmonização das especificações de qualidade, como regras sobre a
composição ou fabrico de produtos alimentares que não estivessem ligadas à protecção
da saúde pública. A Comissão afirmou crer que o reconhecimento mútuo poderia ser
também alcançado pelo reforço das regras de rotulagem, para assegurar a informação
dos consumidores, bem como a lealdade das práticas comerciais. Além disso, a
Comissão incentivou o desenvolvimento por parte da indústria de políticas de
qualidade baseadas na utilização de instrumentos facultativos.

Em 1989, numa outra comunicação sobre a livre circulação de produtos alimentares a


nível comunitário, a Comissão resumiu os princípios que regem esta área tendo em
conta a jurisprudência do Tribunal. Na sua comunicação interpretativa de 1991 sobre
as denominações de venda dos produtos, a Comissão especificou o sistema de
reconhecimento mútuo de produtos alimentares em áreas não harmonizadas, bem
como a possibilidade da adopção de medidas sectoriais consideradas necessárias para a
implementação de outras políticas comunitárias, como requisitos quanto à composição,
a definição de produção biológica, marcas de qualidade dos produtos tradicionais e
denominações de origem.

Quase toda a legislação apontada no programa de 1985 da Comissão foi já adoptada,


excepto as propostas relativas à irradiação dos alimentos e aos produtos alimentares
novos, que estão actualmente a ser analisadas pelo Conselho e pelo Parlamento
Europeu. Além disso, foram adoptadas novas medidas para atender a problemas que
não haviam sido previstos em 1985, nomeadamente a higiene alimentar, os
contaminantes e a cooperação entre a Comissão e os Estados-membros na análise das
questões cientificas relativas aos alimentos.

A partir de 1 de Janeiro de 1989, os Estados-membros passaram a ter de comunicar à


Comissão, no âmbito do procedimento de apresentação de informação previsto na
Directiva 83/189/CEE, projectos de regulamentos técnicos relativos aos produtos
alimentares. É também necessária a notificação específica de medidas nacionais
relativas à rotulagem dos alimentos, aos contaminantes e à higiene alimentar. Estas
notificações encontram-se descritas na secção 7 da parte 2.

Por último, há que atender a que, no que respeita às áreas não abrangidas pela
legislação comunitária, a evolução da jurisprudência do Tribunal de Justiça constitui
uma base contínua para a livre circulação de produtos alimentares.

4. Política industrial

Na secção 2, indicou-se que a produção agrícola primária e os sectores da


transformação alimentar e das bebidas são muito importantes para a economia
europeia. Importa, portanto, manter a competitividade destes sectores, por forma a
aumentar o nível de vida e o bem-estar social a nível de toda a Comunidade. Na sua
recente comunicação sobre a avaliação da competitividade da indústria europeia, a
Comissão declarou que os principais responsáveis pela manutenção da competitividade
das empresas são as próprias empresas. No entanto, as autoridades públicas apoiam a
competitividade através da implementação de um enquadramento adequado ao
funcionamento das empresas, nomeadamente através do fornecimento de infra-
estruturas adequadas, da criação de uma estrutura regulamentar adequada e de
iniciativas específicas, designadamente nas áreas da inovação, da qualidade, do
ambiente empresarial das pequenas e médias empresas e da coesão económica. Neste
contexto, a Comissão lançou recentemente uma série de iniciativas de carácter geral,
como o Livro Verde sobre a inovação, o documento de trabalho sobre a qualidade e o
programa plurianual relativo às PME, as quais são também relevantes para o sector
dos produtos alimentares. Algumas destas questões, como a necessidade de se
assegurar um quadro regulamentar adequado que fomente a inovação, são abordadas
em vários pontos do presente Livro Verde. A Comissão considera importante
assegurar que estas orientações da política industrial sejam integradas na sua
abordagem regulamentar do sector dos produtos alimentares e solicita sugestões de
novas medidas que possam ser necessárias para o efeito.

5. Consumidores, segurança alimentar e protecção da saúde

Como foi indicado nas secções anteriores, as regras comunitárias aplicáveis aos
produtos alimentares derivam de uma grande variedade de bases jurídicas previstas no
Tratado, por forma a satisfazer vários objectivos políticos. A legislação assenta
igualmente na divisão complexa de responsabilidades entre a Comissão e os Estados-
membros. A situação é complexa e difícil de compreender não só pelo cidadão médio,
como, por vezes, até mesmo pelos especialistas. Tal facto conduziu a críticas de
acordo com as quais a Comunidade não dispõe de uma política coerente para a
globalidade do sector alimentar e aborda os problemas caso a caso.

As observações de carácter geral do inicio da presente parte descrevem vários


objectivos comuns a toda a legislação alimentar.

A crise da BSE realçou a necessidade de uma política alimentar europeia baseada no


requisito de que apenas possam ser colocados no mercado produtos alimentares
seguros, salubres e adequados para consumo. No que respeita aos produtos
alimentares, a protecção da saúde é sempre uma prioridade absoluta e não apenas uma
questão a analisar em situações de emergência.

A Comissão adoptou já medidas para adaptar a estrutura dos seus serviços por forma a
a concretizar plenamente deste objectivo.

A Comissão pretende desenvolver uma verdadeira política alimentar que atribua uma
importância fundamental à protecção do consumidor e da respectiva saúde.

Para criar uma política alimentar eficaz, há que desenvolver grandes esforços no
sentido de que:
- Se atenda aos dados científicos mais recentes e completos aquando da tomada de
decisões sobre medidas legislativas ou outras;
- Se adopte como regra uma abordagem cautelosa caso os dados científicos sejam
incompletos ou pouco convincentes, facto que impossibilita a avaliação integral do
risco;
- Em todas as fases da cadeia alimentar exista uma responsabilidade clara pela
segurança e salubridade dos alimentos. Tal facto implica medidas de responsabilização
caso a saúde do consumidor seja prejudicada por alimentos inseguros ou insalubres;
- Se adoptem medidas de controlo em todos os pontos críticos da cadeia alimentar
(produção primária, transformação, transporte, manuseamento, distribuição e
exposição no localfinalde venda). O mesmo se deve aplicar aos produtos alimentares
importados.
- Se adoptem medidas adequadas para assegurar a informação correcta do consumidor
sobre a natureza e o conteúdo dos produtos alimentares.
- Se definam claramente as responsabilidades dos vários agentes de controlo (como os
produtores, as autoridades dos Estados-membros e os serviços da Comissão), bem
como o carácter dos controlos (inspecção do local, auditoria dos sistemas de controlo,
etc.).

Neste contexto, há que atender ao facto de que, após a entrada em vigor do Tratado
de Maastricht, a Comissão foi investida de novas responsabilidades no que respeita a
um elevado grau de protecção da saúde humana (artigo 129°) e de protecção dos
consumidores (artigo 129°-A) e do ambiente (artigo 130°-R). Nos últimos anos,
verificou-se um interesse acrescido por problemas como a nutrição e a saúde. A
Conferência Intergovernamental está actualmente a analisar a revisão do artigo 129°
do Tratado.
Além disso, nos últimos anos, prestou-se uma cada vez maior atenção a questões
como as da nutrição e da saúde, o que suscita interrogações sobre o papel da
Comunidade nestas áreas.

10
PARTE H
SIMPLIFICAÇÃO E RACIONALIZAÇÃO DA LEGISLAÇÃO ALIMENTAR
COMUNITÁRIA

1. Introdução

Nos últimos anos, formularam-se críticas sobre a complexidade, fragmentação e


incoerência da legislação alimentar comunitária, bem como sobre as dificuldades de
adaptar esta legislação às inovações. Sugeriu-se nomeadamente que:

- Algumas disposições são desnecessariamente pormenorizadas ou prescritivas e não


atendem ao desenvolvimento dos sistemas de controlo interno utilizados pela indústria
para melhorar a qualidade e segurança dos produtos alimentares;
- Há casos de duplicação de medidas legislativas e de incoerência entre regras verticais
aplicáveis a sectores específicos ou entre regras verticais e horizontais;
- A complexidade da legislação e a lentidão dos procedimentos legislativos
comunitários dificulta a actualização da legislação para atender ao progresso científico
e técnico.

A nível político, o Conselho do Mercado Interno também apelou à Comissão no


sentido de que fosse definido o âmbito da simplificação da legislação relativa ao
mercado interno.

A presente parte analisa a abordagem geral da Comunidade em relação ao sector


alimentar tendo em conta as críticas supracitadas, bem como o âmbito das medidas de
simplificação e racionalização da legislação alimentar comunitária.

2. Questões de carácter genérico

Uma das principais responsabilidades das autoridades públicas tem sido assegurar o
fornecimento aos consumidores de alimentos seguros e sadios. Hoje em dia, todos os
países desenvolvidos adoptaram legislação que procura garantir a segurança,
salubridade e adequação ao consumo humano dos alimentos, a lealdade das
transacções comerciais e a implementação dos sistemas necessários de inspecção e
controlo oficiais.

Nos últimos anos, levantou-se uma série de questões novas sobre os produtos
alimentares, as quais decorrem do aumento dos conhecimentos científicos e da
consciencialização do público para a relação entre nutrição e saúde, bem como de
novas aspirações dos consumidores, que estão não só interessados em alimentos
'seguros" como também estão cada vez mais preocupados com os métodos utilizados
na produção agrícola e alimentar.

À medida que a implementação do mercado interno e da política agrícola comum foi


progredindo, as regras nacionais foram sendo substituídas por legislação comunitária.
Hoje em dia, a maior parte da legislação alimentar está harmonizada a nível
comunitário, e, em muitos domínios, verifica-se uma forte restrição do âmbito das
iniciativas unilaterais dos Estados-membros. Por conseguinte, a Comunidade deve

11
elaborar ela própria políticas que assegurem um elevado grau de protecção e
satisfaçam as exigências e expectativas legítimas dos consumidores, embora deva
evitar legislação que imponha encargos desnecessários aos produtores e à indústria,
cujo custo, como é evidente, é suportado em última análise pelo consumidor através de
preços mais elevados.

Como foi já referido, a partir de 1985 o âmbito da legislação alimentar comunitária


passou a restringir-se às medidas necessárias para a protecção da saúde pública e de
outros interesses dos consumidores e para a instituição das medidas de controlo
necessárias. Além disso, o facto de a legislação comunitária ter conduzido à
substituição de 15 conjuntos diferentes e por vezes incompatíveis de regras por um só
conjunto de regras harmonizadas foi, por si só, um contributo significativo para a
simplificação da legislação alimentar.

Tendo em conta este contexto, há que afirmar claramente que se não levanta a questão
da desregulamentação global e do desmantelamento do sistema de protecção
instituído. O objectivo é criar um corpo legislativo igualmente eficaz, simples, mais
compreensível e convivial para os principais interessados (os produtores, a indústria, as
empresas alimentares, as autoridades responsáveis pela sua aplicação e os
consumidores).

3. Abordagem regulamentar em termos gerais

A legislação alimentar é uma questão de grande interesse público. Só um elevado grau


de segurança e um controlo público eficaz poderão minimizar a vulnerabilidade dos
alimentos a receios em termos de saúde que podem ter grande impacto na procura, no
rendimento desta indústria e no emprego. E, portanto, essencial um enquadramento
legislativo e regulamentar eficaz. Além disso, dada a complexidade crescente da
produção e distribuição alimentar, importa assegurar que toda a cadeia alimentar seja
abrangida. O controlo estrito de partes da cadeia alimentar não se justifica caso a
contaminação seja introduzida noutros pontos.

No entanto, este enquadramento regulamentar deve ser concebido e implementado por


forma a atender plenamente ao facto de que os principais responsáveis pela produção
de alimentos seguros e nutritivos são os produtores e a indústria. Por conseguinte,
sempre que possível, deve permitir à indústria flexibilidade na concepção e
implementação de procedimentos adequados de monitorização interna, desde que estes
sejam suplementados por sistemas oficiais de controlo eficazes.

Nalguns casos, poderá ser necessária legislação pormenorizada específica. Ela é


particularmente importante nos casos em que tipos de transformação dificilmente
detectáveis possam ser utilizados para dissimular as consequências de métodos de
produção pouco higiénicos ou inadequados.

Nos restantes casos, bastará que os requisitos regulamentares abranjam os respectivos


objectivos e resultados pretendidos, não sendo necessário estabelecer o modo como os
resultados devem ser alcançados. Logo que esteja criado um quadro legislativo claro
que estabeleça os objectivos a alcançar, os operadores económicos poderão
implementar a legislação, sob supervisão eficaz das autoridades de controlo, através do

12
recurso a sistemas tipo HACCP, códigos de conduta e a outros instrumentos
adequados.

A diferença entre estas duas abordagens é mais manifesta no domínio da higiene


alimentar, em que ambas são utilizadas. No que respeita aos produtos alimentares de
origem animal com implicações em termos de saúde, existe uma série de directivas
verticais pormenorizadas que definem os requisitos a observar em termos de higiene.
Os outros produtos alimentares são abrangidos pela directiva genérica relativa à
higiene alimentar. Muito embora esta inclua algumas disposições de carácter
prescritivo, a verdade é que adopta uma abordagem mais geral, em que se definem os
objectivos da higiene alimentar e se faculta à indústria uma grande margem de
flexibilidade na sua aplicação. A área da higiene alimentar é abordada em mais
pormenor na secção 6 da parte III.

Ambas as abordagens apresentam vantagens e desvantagens. Uma vez que a


abordagem mais prescritiva requer que o legislador identifique os principais factores de
risco, bem como os meios para os ultrapassar, ela conduz frequentemente a uma
melhor clarificação das obrigações das empresas e facilita a tarefa das autoridades de
controlo. A abordagem mais geral, por seu turno, permite que a indústria disponha de
maiorflexibilidadena implementação da legislação, pelo que é mais provável que
conduza a uma redução dos custos da sua observância, muito embora deva assegurar
um grau de protecção da saúde pública equivalente ao da abordagem mais prescritiva.
É também provável que diminua a necessidade de uma actualização frequente da
legislação. No entanto, requer que quer as empresas alimentares quer as autoridades de
controlo adoptem um papel muito mais activo na análise dos riscos inerentes a várias
actividades e a garantia de que possam ser tomadas medidas eficazes com vista ao seu
controlo. Tal facto pode criar dificuldades às pequenas empresas do sector, muito
embora a elaboração de códigos de boa prática aplicáveis a toda a indústria possa
constituir uma solução para este problema.

Importa sublinhar que estas duas abordagens não são mutuamente exclusivas. A
legislação comunitária relativa aos aditivos alimentares constitui um exemplo de um
domínio em que foram combinadas com sucesso. Esta legislação baseia-se na avaliação
rigorosa de todos os aditivos. Na Comunidade, apenas podem ser utilizados os aditivos
cuja presença é considerada segura nos alimentos. Se a avaliação de segurança
justificar o estabelecimento de uma dose diária admissível (DDA) com vista à
protecção da saúde pública, estabelecem-se limites de utilização de cada aditivo para
cada produto alimentar, por forma a assegurar que a exposição humana não exceda a
DDA. No entanto se a avaliação de segurança conduzir à conclusão de que não é
necessário estabelecer uma DDA, aplica-se o princípio 'taiantum satis". Tal facto
significa que a indústria é livre de utilizar o aditivo em questão, em conformidade com
a boa prática de fabrico, numa concentração que não seja superior à necessária para se
obter o resultado pretendido, desde que o consumidor não seja induzido em erro.

Nestas circunstâncias, a Comissão considera necessária uma abordagem que envolva


um equilíbrio entre legislação prescritiva pormenorizada e legislação de carácter
genérico e solicita comentários sobre se tal equilíbrio existe já na actual legislação
comunitária.

13
4. Papel da auto-regulação no sector dos produtos alimentares

Dada a importância do sector dos produtos alimentares, sempre se debateu sobre em


que medida a utilização de instrumentos de auto-regulação, como códigos de conduta
ou normas, constitui uma alternativa em relação à regulamentação ou um seu
complemento.

Caso se utilizem instrumentos facultativos, importa que eles sejam genuinamente


facultativos e que se adoptem salvaguardas adequadas para assegurar que a sua
elaboração seja transparente, aberta a todas as partes interessadas e garanta o controlo
necessário da qualidade do trabalho.

Até ao momento, o recurso a instrumentos facultativos como alternativa à


regulamentação verificou-se sobretudo:

- No domínio das especificações da composição dos produtos alimentares. Na sua


comunicação de 1985 sobre a realização do mercado interno no sector dos produtos
alimentares, a Comissão anunciou ir deixar de apresentar propostas legislativas de
harmonização das especificações da composição dos produtos alimentares, a menos
que estas fossem necessárias em termos de política agrícola comum, e ir incentivar
antes a utilização de normas facultativas neste domínio. Desde então, a experiência de
normalização a nível europeu neste domínio não foi particularmente bem sucedida, não
tendo sido adoptadas normas europeias sobre as especificações de qualidade dos
produtos alimentares, apesar de várias tentativas nesse sentido. No entanto, a nível
nacional, verificou-se um recurso crescente à utilização de normas ou instrumentos
equivalentes, como códigos de conduta, o que poderá acarretar o risco de novos
entraves de facto às trocas comerciais intracomunitárias.

- No que respeita aos métodos de amostragem e análise, relativamente aos quais a


experiência a nível da Comunidade foi muito mais positiva e foram adoptadas várias
normas.

No domínio da higiene alimentar, os instrumentos facultativos estão a ser utilizados


como complemento da legislação existente. O artigo 5o da Directiva 93/43/CEE
incentiva o desenvolvimento de códigos de boa prática de higiene, que podem ser
utilizados pelas empresas alimentares a título facultativo ou como directrizes para a
implementação dos princípios gerais de higiene alimentar previstos na directiva. Além
disso, a directiva estabeleceu um procedimento de reconhecimento das directrizes a
nível comunitário, bem como determinadas garantias para assegurar que elas sejam
elaboradas por representantes das empresas alimentares interessadas e de outros
grupos em que tenham repercussões substanciais, como as autoridades competentes e
as associações de consumidores, satisfaçam os requisitos higiénicos previstos, sejam
exequíveis e haja consultas adequadas aquando da sua elaboração. Para além de várias
iniciativas a nível nacional, a Comissão tem conhecimento da elaboração de várias
directrizes a nível europeu, nomeadamente no domínio dos sorvetes, da pastelaria e da
venda de alimentos e bebidas quentes e frios em distribuidores automáticos.

A Comissão solicita comentários sobre o recurso a instrumentos facultativos no sector


dos produtos alimentares. Solicita igualmente observações sobre o possível

14
alargamento do âmbito de aplicação dos instrumentos nacionais facultativos existentes
a toda a Comunidade.

5. Abordagens horizontais e verticais da legislação alimentar

Dada a grande diversidade do sector alimentar, é por vezes necessário ponderar se há


que dar prioridade a uma abordagem horizontal, que estabelece regras gerais aplicáveis
a todos os produtos alimentares, ou a uma abordagem vertical, que estabelece regras
específicas para um determinado domínio.

No âmbito da legislação adoptada ao abrigo do programa do Livro Branco de 1985


relativo aos produtos alimentares transformados, atribuiu-se por via de regra
prioridade às medidas horizontais que se aplicam a todas as categorias de produtos
alimentares (aditivos, aromatizantes, solventes de extracção, rotulagem, rotulagem
nutricional, higiene, etc.). No entanto, foi por vezes necessário recorrer a medidas
verticais, nomeadamente no que respeita aos géneros alimentícios destinados a uma
alimentação especial e aos alimentos ultracongelados.

No que respeita às regras que regem a produção primária e os produtos de origem


animal, utilizou-se geralmente uma abordagem mais sectorial, muito embora tenha
também sido adoptada legislação de carácter geral, designadamente a relativa às
denominações de origem e às especificidades e à utilização da menção do carácter
biológico.

A parte m aborda questões específicas relativas à coexistência de actos de carácter


horizontal e vertical integrados no âmbito da legislação comunitária existente. Em
termos gerais, porém, poder-se-á salientar que, em lugar de favorecer sempre um tipo
de abordagem, se procura encontrar um equilíbrio adequado entre estas duas
abordagens, as quais apresentam ambas vantagens e desvantagens. A abordagem
horizontal conduz a uma perspectiva geral de uma situação específica e facilita a
implementação, nomeadamente no que respeita às empresas alimentares envolvidas em
vários sectores, que incluem não só os fabricantes, como os retalhistas e a distribuição.
A abordagem vertical, por seu turno, permite adaptar a legislação às necessidades de
um sector específico, nomeadamente caso se tenha considerado necessária uma
abordagem mais dirigida da legislação. Possibilita igualmente uma abordagem
regulamentar mais integrada que abrange todos os aspectos de um determinado sector.

A Comissão gostaria particularmente de receber observações sobre esta questão.

6. Subsidiariedade e simplificação da legislação

O artigo 3°-B do Tratado CE refere que, nos domínios que não sejam das suas
atribuições específicas, a Comunidade intervém apenas, de acordo com o princípio da
subsidiariedade, se e na medida em que os objectivos da acção encarada não possam
ser suficientemente realizados pelos Estados-membros, e possam, pois, devido à
dimensão ou aos efeitos da acção prevista, ser melhor alcançados a nível comunitário.

Há já vários anos que a Comissão inclui uma 'declaração relativa à subsidiariedade"


em todas as novas propostas legislativas, afimde esclarecer porque é que a Comissão

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considera necessária essa acção a nível comunitário. Esta declaração inclui igualmente
a análise dos objectivos da medida proposta, bem como a de se medidas de carácter
menos vinculativo seriam suficientes para alcançar os objectivos propostos. Além
disso, em 16 de Janeiro de 1996, a Comissão adoptou directrizes de carácter geral
sobre a política regulamentar, destinadas a aumentar a coerência das actividades da
Comissão, a racionalizar e modernizar a avaliação dos efeitos das suas propostas e a
reforçar as consultas externas.

Face às conclusões da Cimeira de Edimburgo de Dezembro de 1992, a Comissão


empreendeu várias iniciativas de simplificação da legislação existente relativa ao sector
alimentar. Estas iniciativas envolvem uma nova análise da necessidade de determinadas
medidas legislativas, bem como a supressão de disposições desnecessariamente
restritivas da actual legislação.

Em Abril de 1994, a Comissão apresentou uma proposta de alteração da Directiva


89/398/CEE, relativa aos géneros alimentícios destinados a uma alimentação especial,
por forma a reduzir o número de directivas específicas relativas a categorias também
específicas de alimentos dietéticos de 8 para 4. De facto, a Comissão propôs o
abandono das directivas pormenorizadas relativas aos alimentos hipossalinos, isentos
de glúten, para diabéticos e para atletas. Muito embora se registe um largo consenso
quanto à dispensabilidade de directivas pormenorizadas sobre alimentos hipossalinos e
isentos de glúten, devendo bastar disposições de carácter geral relativas à rotulagem,
gerou-se uma grande controvérsia sobre a necessidade de directivas relativas a
alimentos para diabéticos e atletas. A Comissão alterou a sua proposta por forma a
aceitar uma alteração proposta pelo Parlamento que apelava a uma directiva sobre os
alimentos para diabéticos. No entanto, no âmbito do Conselho, uma maioria
significativa dos Estados-membros contestou a necessidade de tal directiva e um
número significativo de Estados-membros insistiu na necessidade de uma directiva
relativa aos alimentos para atletas.

Além disso, em 17 de Abril de 1996 a Comissão adoptou um pacote de 7 propostas de


simplificação das directivas antigas, adoptadas em 1970, relativas à composição do
mel, do açúcar, dos leites conservados, dos extractos de café, dos sumos e néctares de
fruta, das compotas, geleias e doces de fruta e do chocolate e produtos à base de
chocolate. Verificou-se novamente uma grande controvérsia, nomeadamente no que
respeita às regras quanto à composição do chocolate.

Estes dois exemplos demonstram claramente que a simplificação legislativa está longe
de ser uma tarefa fácil. Disposições consideradas desnecessariamente restritivas por
alguns podem ser consideradas de importância fundamental para outros. As vantagens
potenciais da simplificação legislativa devem estar em equilíbrio com os riscos de
reabertura de controvérsias antigas e de se poder criar um longo período de incerteza
no que respeita aos operadores económicos dos sectores interessados.

A Comissão apresentou propostas de consolidação, simplificação e actualização da


directiva relativa à água destinada ao consumo humano (COM(94)612). Na secção 6
da parte m apresenta-se uma outra iniciativa da Comissão relativa à simplificação da
legislação no domínio da higiene veterinária.

16
Um problema específico do sector alimentar é a dificuldade de conciliar os conceitos
práticos de simplificação e subsidiariedade com a manutenção de um elevado grau de
protecção e funcionamento eficaz do mercado interno e da política agrícola comum.
Todos os anos os Estados-membros adoptam várias medidas legislativas com vista à
protecção da saúde pública ou dos consumidores. Estas medidas podem gerar entraves
no âmbito do mercado interno ou problemas de funcionamento da PAC, sendo então
solicitada legislação comunitária. No entanto, o que um Estado-membro considera
necessário pode ser considerado excesso de regulamentação por parte de outros
Estados-membros. O capítulo II aborda esta questão em mais pormenor. No entanto,
para que sejam totalmente eficazes, os princípios da subsidiariedade e da simplificação
legislativa terão de ser aplicados quer a nível nacional, quer comunitário.

Em resumo, importa, por um lado, sublinhar a necessidade de se assegurar um


equilíbrio adequado entre a aplicação dos princípios da subsidiariedade e da
simplificação, e, por outro lado, as necessidades em termos do mercado interno. Para
se assegurar um elevado grau de protecção da saúde pública e dos consumidores, o
sector alimentar deverá continuar a ser altamente regulamentado. Na ausência de
legislação comunitária, os Estados-membros poderão continuar a adoptar legislação
que considerem necessária para a protecção da saúde ou dos consumidores. A menos
que se encontre uma resposta adequada a nível comunitário, existirá um risco
permanente defragmentaçãodo mercado interno em mercados nacionais.

7. Iniciativas legislativas de âmbito nacional

Embora o ritmo da legislação comunitária relativa ao sector alimentar tenha diminuído


substancialmente, o fluxo das novas legislações nacionais não parece abrandar. Ao
abrigo dos procedimentos previstos na Directiva 83/189/CEE, os serviços da
Comissão analisam anualmente 60-80 novas iniciativas legislativas nacionais relativas
ao sector alimentar.

Em conformidade com este procedimento, os Estados-membros devem notificar à


Comissão os projectos de legislação técnica, a qual os envia aos restantes Estados-
membros. Aplica-se inicialmente um período suspensivo de 3 meses. Se a Comissão ou
um Estado-membro considerarem que as novas medidas irão dar origem a entraves às
trocas comerciais no mercado interno, poderão apresentar um parecer pormenorizado,
o qual implica o adiamento por seis meses da aplicação destas medidas por tal Estado-
membro. Nesse caso, o Estado-membro em questão deverá indicar quais as medidas
que se propõe adoptar em resposta ao parecer pormenorizado. Este procedimento
permite igualmente que a Comissão adie a adopção da medida nacional durante até um
ano para possibilitar a elaboração de propostas de legislação a nível comunitário ou
com vista à adopção das propostas pendentes. No acórdão CIA Security International,
o Tribunal de Justiça sustentou que a não notificação em conformidade com a
Directiva 83/189/CEE de projectos legislativos por parte de um Estado-membro dará
azo à não aplicabilidade de tal legislação aos particulares.

O procedimento ao abrigo da Directiva 83/189/CEE permite que a Comissão apresente


observações sobre a proposta legislativa e solicite aos Estados-membros a introdução
de alterações que minimizem as consequências em termos de trocas comerciais
intracomunitárias. A Comissão conseguiu já várias vezes que os Estados-membros

17
alterassem os respectivos projectos para que estes estivessem em conformidade com a
legislação comunitária, por exemplo através da inserção de uma cláusula de
reconhecimento mútuo na legislação nacional. A aplicação deste procedimento é
também importante por identificar áreas em que poderá ser necessária nova legislação
comunitária.

No entanto, os procedimentos específicos de notificação aplicam-se igualmente ao


sector alimentar. As regras comunitárias sobre a rotulagem alimentar, os
contaminantes e a higiene alimentar permitem que os Estados-membros adoptem
regras mais específicas do que as existentes a nível comunitário. De acordo com o
princípio da subsidiariedade, os Estados-membros podem, portanto, adoptar legislação
mais pormenorizada por forma a atenderem à situação específica dos respectivos
países. No entanto, para proteger o interesse comunitário, nomeadamente o
funcionamento do mercado interno, a Comissão tem competência para supervisionar o
recurso a esta possibilidade por parte dos Estados-membros. Por conseguinte, os
Estados-membros devem notificar tal legislação à Comissão e aguardar três meses para
que a Comissão possa proceder à sua análise. Se tiver dúvidas sobre as suas
consequências no mercado interno, a Comissão poderá emitir um parecer negativo.
Desde que os Estados-membros emitam um parecer favorável no âmbito do Comité
Permanente dos Géneros Alimentícios, a Comissão pode então requerer que o Estado-
membro em questão altere ou retire esse projecto, ou adie a sua adopção durante um
certo período de tempo, que poderá exceder um ano, por forma a que seja possível
elaborar legislação comunitária.

Para simplificar os procedimentos administrativos envolvidos na notificação, a


Comissão introduziu medidas ao abrigo das quais todas as notificações são
inicialmente apresentadas num só ponto de entrada. No entanto, as fases subsequentes
deste procedimento apresentam diferenças significativas. Nos termos da Directiva
83/189/CEE, se um Estado-membro insistir na manutenção do seu projecto legislativo
e argumentar que ele se justifica ao abrigo do artigo 36° do Tratado, tal estado poderá
adoptá-lo após o fim do período de suspensão. Nesse caso, a Comissão terá que
decidir se irá ou não submeter a questão ao Tribunal de Justiça com vista a uma
decisão definitiva sobre se tal medida nacional é ou não compatível com a legislação
comunitária. Nos termos dos procedimentos específicos aplicáveis aos produtos
alimentares, a Comissão pode, mediante um procedimento de comitologia, requerer
que os Estados-membros alterem ou revoguem actos legislativos considerados
desnecessários ou desproporcionados.

Por motivos de eficácia administrativa, a Comissão considera importante a manutenção


do princípio de um só ponto de entrada para todas as notificações. Por outro lado, nas
partes subsequentes do procedimento, o alargamento das competências decorrentes
das regras de rotulagem e higiene e sobre contaminantes a todo o sector alimentar
poderá constituir um meio para compatibilizar os princípios da subsidiariedade e da
simplificação com o funcionamento do mercado interno. Permitiria, designadamente,
que a Comissão, em colaboração estreita com os Estados-membros, desenvolvesse
princípios claros de abordagem das novas iniciativas legislativas nacionais e definisse
as condições em que estas podem ser consideradas geradoras de entraves ao mercado
interno, bem como as circunstâncias em que as iniciativas nacionais tornam necessária
nova legislação comunitária.

18
Por outro lado, obviamente que o desenvolvimento de tais procedimentos não deve
interferir com a observância da obrigação da Comissão de assegurar a aplicação
adequada dos artigos 30°-36° do Tratado por parte dos Estados-membros. A
Comissão gostaria de receber observações sobre esta questão.

8. Necessidade de nova legislação comunitária com vista à realização do mercado


interno

Nalgumas áreas não harmonizadas, os Estados-membros sublinharam amiúde a


dificuldade da aplicação das cláusulas de reconhecimento mútuo por forma a
solucionar problemas de livre circulação. Nas áreas em que esteja em causa a
protecção da saúde pública, os Estados-membros podem considerar que a respectiva
legislação existente ou proposta se justifica em termos de protecção da saúde pública,
em conformidade com o disposto no artigo 36°, e poderão, portanto, não querer
aplicar cláusulas de reconhecimento mútuo. Nesse caso, há que ponderar a
necessidade de nova legislação comunitária, tendo em conta os problemas de saúde
pública em questão e os princípios supracitados.

Após a análise das queixas recebidas nos últimos anos sobre a livre circulação de
produtos alimentares, a Comissão identificou três áreas em que o princípio do
reconhecimento mútuo não pode, por si só, obstar a efeitos adversos no mercado
interno. A Comissão pretende, portanto, dar início o mais rapidamente possível a
consultas técnicas sobre a necessidade e o eventual âmbito da legislação comunitária
relativa aos auxiliares tecnológicos, à adição de vitaminas e minerais aos produtos
alimentares e aos suplementos dietéticos.

19
PARTE m
REVISÃO DA LEGISLAÇÃO COMUNITÁRIA EXISTENTE

1. Questões de carácter geral

A presente parte destina-se a, tendo em conta as generalidades descritas na parte


anterior, rever várias medidas que poderiam ser tomadas para racionalizar ou
simplificar a legislação comunitária existente. Começa pela análise de vários aspectos
dos procedimentos da Comumdade, como a selecção do instrumento jurídico e a
possibilidade de se actualizar a legislação em função do progresso científico e técnico.
Analisa igualmente o âmbito do aumento da coerência da legislação através da
introdução de termos e definições comuns. Termina com a análise das três principais
áreas da legislação alimentar comunitária (higiene, qualidade e rotulagem) que foram
criticadas por integrarem determinadas disposições desnecessariamente
pormenorizadas ou restritivas, ou que levantam dificuldades decorrentes da
coexistência de actos legislativos de carácter vertical e horizontal, nomeadamente
eventuais questões de coerência entre tais actos. No entanto, a Comissão apreciaria
igualmente observações sobre áreas específicas não especificamente mencionadas.

2. Transparência da legislação comunitária

A base fundamental da transparência é a consulta adequada de todos os interesses


socioeconómicos afectados pela legislação comunitária antes e durante o processo de
tomada de decisões. Para que sejam eficazes, as consultas não se devem restringir aos
aspectos técnicos das propostas, devendo permitir igualmente que os parceiros sociais
apresentem todos os dados e observações relevantes sobre a abordagem legislativa
prevista, bem como sobre os custos e benefícios da medida proposta.

A Comissão instituiu em 1975 o Comité Consultivo dos Géneros Alimentícios para


criar uma representação dos grupos socioeconómicos mais envolvidos no sector
alimentar (a agricultura, o comércio, os consumidores, a indústria e os trabalhadores).
Este pode emitir pareceres sobre qualquer questão relativa à harmonização da
legislação no sector alimentar. Foram instituídos comités análogos no sector
veterinário e em vários sectores de produtos agrícolas. As reuniões destes comités
constituem uma boa oportunidade para conciliar as posições das várias partes no que
respeita aos projectos legislativos. No entanto, para que sejam eficazes, importa que os
documentos sejam divulgados atempadamente antes de cada reunião e que os
participantes possam consultar aprofundadamente as partes que representam.

Os serviços da Comissão estão actualmente a tomar uma série de medidas para


melhorar a consulta dos parceiros socioeconómicos aquando da elaboração da
legislação comunitária, incluindo a publicação no Jornal Oficial de avisos de projectos
de legislação, o recurso acrescido a Livros Verdes e outros documentos de consulta e
um contacto mais estreito com as partes interessadas. Todavia, ainda há dificuldades
quando outras instituições propõem alterações de fundo às propostas da Comissão,
cujos efeitos são frequentemente difíceis ou impossíveis de avaliar dentro do prazo
limitado disponível.

20
3. Oi regulamentos como alternativa às directivas

Em certos casos, a Comunidade procedeu à aproximação das legislações nacionais em


duas etapas. Na primeira, cria um quadro que estabelece critérios e princípios gerais
aplicáveis. Na segunda adopta uma série de medidas específicas para assegurar a
implementação integral e uniforme destes princípios em toda a Comunidade. Estas
disposições são por vezes extremamente pormenorizadas e ou não facultam ou quase
não facultam qualquer margem de manobra aos Estados-membros no que respeita à
sua implementação. Tal é o caso das disposições comunitárias específicas relativas aos
aditivos, aos materiais em contacto com os produtos alimentares e aos solventes de
extracção.

Noutros casos, muito embora constem de um só acto, as disposições são também


extremamente pormenorizadas e quase não facultam qualquer margem de manobra aos
Estados-membros.

Em tais circunstâncias, o recurso a um regulamento e não a uma directiva poderia


apresentar várias vantagens:

- O recurso ao regulamento facilita a aplicação uniforme da legislação em todo o


mercado interno;
- O recurso ao regulamento aumenta a transparência da legislação comunitária;
- Uma vez que não é necessária legislação nacional para a sua implementação, O
recurso ao regulamento facilita a adaptação rápida da legislação comunitária ao
desenvolvimento técnico e científico.

Por este motivo, sugere-se o recurso acrescido aos regulamentos nos casos adequados,
quer no direito comunitário primário quer no derivado. No entanto, a legislação cujo
âmbito se restrinja à harmonização de princípios e critérios gerais, como a do controlo
oficial dos produtos alimentares, poderia continuar a ser adoptada por intermédio de
directivas.

4. Adaptação da legislação ao progresso científico e técnico

É fundamental que se possa alterar rapidamente a legislação para atender ao progresso


científico e técnico. Em termos de inovação e competitividade da indústria europeia,
importa que os produtos inovadores possam penetrar rapidamente num mercado de
dimensões continentais. Em termos de saúde pública, é igualmente importante que se
possa adaptar rapidamente a legislação para atender a novos factores de risco
eventuais.

No entanto, a experiência sugere que a Comunidade não dispõe de instrumentos


necessários para atender ao ritmo cada vez mais rápido da inovação e ao aumento cada
vez maior dos conhecimentos científicos.

Um dos motivos desta situação é a recusa do Conselho e do Parlamento de delegarem


na Comissão competências em domínios como os dos contaminantes, das questões
gerais de higiene alimentar, dos materiais em contacto com os produtos alimentares,
dos géneros alimentícios destinados a uma alimentação especial e da rotulagem dos

21
alimentos; noutras áreas, como as dos aditivos alimentares, dos solventes de extracção
e da legislação veterinária, houve uma muito menor delegação de competências na
Comissão.

Assim, por exemplo, no domínio dos aditivos alimentares, qualquer alteração que
conduza à inclusão ou retirada de um aditivo da lista positiva, ou alargue ou restrinja
as condições de utilização de um aditivo, deve ser adoptada através do procedimento
de co-decisão. Se se atender ao tempo necessário para a avaliação das questões de
saúde pública no Comité Científico da Alimentação Humana, a elaboração da proposta
da Comissão e as duas ou até três leituras efectuadas pelo Conselho e pelo Parlamento
ao abrigo do procedimento de co-decisão, são necessários em média cerca de 5 anos
para que este procedimento esteja concluído a nível comunitário. Haverá que contar
com entre 6 a 7 anos se se atender igualmente ao tempo necessário para a adopção de
medidas nacionais de implementação. Em contrapartida, na maior parte dos Estados-
membros, uma decisão análoga poderia ser rapidamente tomada por intermédio de
uma decisão ministerial, após parecer de um comité científico nacional de carácter
consultivo, sem que fosse necessário direito primário.

Até mesmo as competências atribuídas à Comissão são frequentemente sujeitas a


procedimentos demasiado pesados. A título de exemplo, a Conferência
Intergovernamental, numa declaração sobre as competências da Comissão no domínio
da implementação anexada ao Acto Único Europeu, solicitou ao Conselho, para
aumentar a rapidez e eficiência do processo de tomada de decisões, que se
privilegiasse nomeadamente o procedimento do Comité Consultivo no exercício das
competências da Comissão no domínio do artigo 100o-A. No entanto, no sector
alimentar, o Conselho rejeitou sistematicamente as propostas da Comissão de um
Comité Consultivo do tipo I, tendo optado por um Comité Regulamentar do tipo IH, o
qual requer o parecer favorável da maioria qualificada dos Estados-membros antes de
a Comissão poder tomar qualquer decisão. No domínio da higiene veterinária, o
Conselho recorreu sistematicamente ao procedimento mb, que permite que uma
maioria simples de Estados-membros bloqueie qualquer acção a nível comunitário.

A Comissão considera que a adaptação da legislação comunitária à inovação e ao


progresso técnico no sector alimentar constitui um grave problema que carece de
análise aprofundada. As observações sobre esta questão enviadas pelas partes
interessadas serão analisadas tendo em conta os resultados dos debates institucionais e
intergovernamentais em curso.

5. Racionalização das definições utilizadas na legislação alimentar comunitária

A actual legislação alimentar comunitária inclui já uma série de definições,


nomeadamente as de aditivo alimentar, aromatizante, auxiliares tecnológicos,
contaminantes, resíduos de pesticidas, resíduos de medicamentos veterinários,
materiais e artigos destinados a entrar em contacto com produtos alimentares,
rotulagem, rotulagem nutricional, menções nutricionais, controlo oficial dos produtos
alimentares e higiene alimentar.

A legislação veterinária comunitária também inclui as definições de carne, carne


vermelha, carne de aves de capoeira, carne de coelho, carne de caça de criação, carne

22
de caça selvagem, produtos da pesca, moluscos bivalves, leite, produtos lácteos,
ovoprodutos, ovos, caracóis, pernas de rãs, outros produtos de origem animal e
produtos transformados.

Levantaram-se por vezes dúvidas sobre se estas definições se aplicam apenas às partes
específicas da legislação que as contêm ou se têm um âmbito mais geral. Para clarificar
esta situação, a Comissão propõe-se estabelecer que estas definições são aplicáveis a
toda a legislação alimentar comunitária.

5.1 Definição de produtos alimentares

Muito embora a legislação da maior parte dos Estados-membros contenha a definição


de produtos alimentares, a Comunidade ainda não dispõe da sua própria definição. O
Parlamento Europeu convidou oficialmente a Comissão a apresentar uma proposta
sobre esta questão, uma vez que uma definição comunitária asseguraria que toda a
legislação alimentar comunitária fosse de facto aplicável aos mesmos produtos e
substâncias em todos os Estados-membros.

Sugere-se o estudo da definição que se segue, baseada na do Codex Alimentarius:

Entendesse por produto alimentar qualquer substância ou produto, transformado,


parcialmente transformado ou não transformado, destinado a ser ingerido pelo ser
humano, excepto o tabaco, tal como definido na Directiva 89/662/CEE, os
medicamentos, tal como definidos na Directiva 65/65/CEE, e os narcóticos e as
substâncias psicotrópicas controlados pelos Estados-membros ao abrigo das
convenções internacionais relevantes.

Esta definição apresenta um âmbito deliberadamente vasto e destina-se a abranger


todos os produtos destinados ao consumo humano directo, incluindo as bebidas e as
pastilha elásticas, e todas as substâncias utilizadas no fabrico, preparação e
transformação de alimentos, nomeadamente as matérias-primas, os ingredientes, os
contaminantes e os resíduos na sua acepção mais ampla.

O conceito de ingestão destina-se a abranger todos os produtos que passam pelo tracto
gastrintestinal, nomeadamente os tomados por via oral ou nasal ou administrados por
meio de intubação gástrica. Por outro lado, esta definição não abrangeria produtos
administrados por via parentérica directamente na corrente sanguínea.

Uma outra questão é a aplicação da definição de produção primária, que poderá ser
aplicável quer ao consumo humano quer industrial (como batatas que podem ser
consumidas como alimento ou utilizadas na produção de amido industrial, ou agentes
químicos que podem ser usados como aditivos alimentares ou para outros fins
industriais). A sua inclusão no âmbito da definição significaria que os produtores
deveriam observar todas as obrigações relevantes decorrentes da legislação alimentar
comunitária, o que poderia constituir uma restrição inadequada. No entanto, é
obviamente necessário assegurar que todas as substâncias utilizadas em alimentos
observem os requisitos da legislação comunitária. A Comissão solicita observações
sobre esta questão.

23
5.2 Definição de colocação no mercado

O conceito de colocação no mercado é várias vezes utilizado na legislação comunitária


sem que, no entanto, tenha sido definido. A definição de comercialização consta das
directivas de higiene alimentar, muito embora seja inteiramente adequada em termos de
legislação dos produtos alimentares, uma vez que exclui a venda a retalho. As
directivas nova abordagem e a Directiva 90/220/CEE, relativa à libertação deliberada
no ambiente de organismos geneticamente modificados, contêm outras definições de
colocação no mercado, mas estas não são inteiramente adequadas ao sector alimentar.

A definição poderia ser a seguinte:

"Entende-se por colocação no mercado qualquer operação que se destine ao


fornecimento de produtos alimentares a terceiros, incluindo o fornecimento para
venda ou qualquer outra forma de transferência, paga ou não paga, a terceiros ou o
armazenamento com vista ao fornecimento de terceiros, excepto os fornecimentos
destinados à investigação cientifica efectuados sob controlo dos Estados-membros. "

Para assegurar a observância plena da regulamentação comunitária relativa à protecção


sanitária, esta definição abrange quer as transacções comerciais, quer operações
caritativas e o fornecimento de amostras gratuitas. Esta definição aplicar-se-ia
igualmente a todos os tipos de fornecimento de produtos alimentares, nomeadamente o
efectuado por restaurantes, cantinas, hospitais e forças armadas. No entanto, o termo
'terceiros" foi utilizado deliberadamente para excluir o armazenamento ou
transferência de produtos alimentares efectuados por familiares ou amigos a nível
doméstico.

6. Higiene alimentar

O domínio da higiene alimentar parece ser o que levanta maiores problemas no que
respeita à simplificação e racionalização da legislação alimentar comunitária.

No que respeita aos produtos alimentares de origem animal, existe uma série de 11
directivas verticais que estabelecem condições específicas de higiene relativamente às
seguintes categorias de produtos alimentares: carne fresca e carne de aves de capoeira;
derivados da carne, carne picada e carne transformada; coelho; carne de caça de
criação ou selvagem; peixe; moluscos; ovos e ovoprodutos; leite e produtos lácteos;
outros produtos, como pernas de rã, caracóis e mel. Outros actos legislativos
abrangem a importação e controlo de produtos alimentares provenientes de países
terceiros. Estas directivas estabelecem requisitos regulamentares específicos no que
respeita às questões consideradas mais sensíveis dos produtos em questão, muito
embora adoptem uma abordagem HACCP relativamente a outras questões.

No que respeita aos produtos alimentares não abrangidos por estas disposições
específicas, aplica-se a directiva genérica relativa à higiene dos produtos alimentares
(Directiva 93/43/CEE). Esta directiva envolve uma abordagem mais geral em relação à
gestão do risco, a qual se baseia nos princípios HACCP e na elaboração de códigos
facultativos de boa prática de higiene alimentar.

24
A coexistência destes vários actos conduziu a numerosas críticas de inconsistência e
incoerência. Assim, por exemplo, o n° 2 do artigo Io da directiva genérica de higiene
requer que a Comissão analise a relação entre as normas comunitárias especificas de
higiene e as da directiva genérica, e, se necessário, apresente propostas.

Como primeira fase deste processo, a Comissão lançou uma vasta consulta sobre as
relações entre as regras de higiene veterinárias verticais que se aplicam aos produtos
alimentares de origem animal. Para o efeito, os serviços da Comissão elaboraram um
guia de determinadas regras que regem a produção, comercialização e importação de
produtos de origem animal destinados ao consumo humano. O guia prevê a
consolidação num único texto, que abrange igualmente as importações de países
terceiros, de 14 directivas diferentes relativas à saúde pública e veterinária.
Determinados princípios comuns, como os HACCP, passariam a abranger todas as
directivas, sendo suprimidas certas disposições desnecessariamente pormenorizadas e
contradições entre os vários actos.

Simultaneamente, a Comissão lançou um processo de consulta sobre as possibilidades


de simplificação das regras. A Comissão solicitou especificamente observações das
partes interessadas sobre os seguintes pontos:
- Papel dos instrumentos facultativos, como as normas ou códigos de conduta no
domínio da higiene veterinária;
- Requisitos em termos de controlo da temperatura;
- Necessidade e adequação de derrogações em relação às pequenas e médias empresas;
- Dimensão internacional das regras de higiene veterinária;
- Papel do autocontrolo por parte dos fabricantes e papel das autoridades públicas;
- Procedimentos de autorização e procedimentos de aprovação de estabelecimentos;
- Marcação de conformidade.

Foram igualmente levantadas outras questões relativas à inclusão na legislação


respeitante à higiene de disposições de qualidade ou rotulagem não directamente
relacionadas com a higiene alimentar.

Uma vez clarificadas as relações entre as directivas específicas verticais relativas à


higiene, haverá que analisar a relação entre elas e a directiva genérica respeitante à
higiene alimentar. Neste contexto, afigura-se adequado dar prioridade à garantia de
existência de um corpo legislativo coerente e consistente no domínio da higiene
alimentar. A melhor maneira de a obter é a aplicação dos princípios HACCP e a
restrição das disposições prescritivas pormenorizadas aos casos em que sejam
consideradas essenciais.

No entanto, importa salientar que é possível algumaflexibilidadeno modo como os


princípios HACCP são concebidos e aplicados. De acordo com as directrizes do
Codex Alimentarius relativas à aplicação do Ponto de Controlo Crítico da Análise de
Risco, o HACCP é um sistema que identifica riscos específicos e medidas preventivas
com vista ao seu controlo. O sistema abrange sete princípios:

1. Identificar os riscos potenciais associados à produção alimentar em todas as suas


fases, desde o crescimento, transformação, fabrico e distribuição até ao local de

25
consumo. Avaliar a probabilidade de ocorrência de riscos e identificar as respectivas
medidas de controlo.

2. Determinar os pontos/procedimentos/etapas operacionais que podem ser


controlados para eliminar riscos ou minimizar a probabilidade da sua ocorrência
(pontos de controlo críticos _ critical control points (CCP)).

3. Definir os limites críticos que há que observar para que os CCP estejam sob
controlo.

4. Estabelecer um sistema de monitorização do controlo dos CCP que envolva testes


ou observações calendarizados.

5. Definir as medidas correctivas a adoptar caso a monitorização indique que um dado


CCP não está sob controlo.

6. Instituir procedimentos de verificação que incluam testes e procedimentos


suplementares por forma a confirmar que o sistema HACCP esta a funcionar
correctamente.

7. Documentar todos os procedimentos e registos adequados a estes princípios e à


respectiva aplicação.

A directiva genérica de higiene implementa a legislação comunitária relativa aos cinco


primeiros princípios. No entanto, não se considerou necessário estabelecer requisitos
formais em relação à verificação e documentação. Cada empresa alimentar dispõe da
flexibilidade necessária para poder decidir quais os requisitos necessários, sem prejuízo
da supervisão por parte das autoridades competentes. Por outro lado, dada a natureza
dos produtos alimentares em questão, os princípios básicos de autoverificação
constantes das directivas relativas à higiene veterinária incluem regras pormenorizadas
sobre a conservação de registos escritos destinados a ser apresentados às autoridades
competentes. Este exemplo ilustra a necessidade de algumaflexibilidadena concepção
e implementação da regulamentação de higiene alimentar para se assegurar um elevado
grau de protecção e se minimizar simultaneamente os encargos regulamentares das
empresas. A busca da consistência e da coerência não deve conduzir à imposição de
um sistema uniforme caso tal não seja adequado.

Reconhece-se geralmente que, para que seja eficaz, qualquer sistema legislativo de
higiene alimentar deve abranger toda a cadeia alimentar, desde a produção primária até
ao local de consumo. A directiva genérica relativa à higiene alimentar abrange todas as
fases da produção e distribuição alimentar que se seguem à produção agrícola
primária. No entanto, não existe legislação genérica comunitária que abranja a higiene
dos produtos de origem não animal na fase de produção agrícola primária. A Comissão
solicita observações sobre se as regras existentes de garantia da segurança e higiene
dos produtos primários de origem não animal, como as regras sobre os resíduos de
pesticidas e os contaminantes, são ou não suficientes.

No que respeita aos produtos alimentares de origem animal, a fase de produção


primaria é abrangida pelas regras de higiene veterinária. Estas directivas abrangem

26
todas as fases desde a produção primária até à distribuição. No entanto, a venda a
retalho é geralmente excluída do âmbitos das regras de higiene veterinária, aplicando-
se, portanto, a directiva genérica relativa à higiene. A Comissão solicita observações
sobre se a venda a retalho de produtos de origem animal deve ou não continuar a ser
abrangida pela directiva genérica ou sobre se deve passar a ser incluída no âmbito das
directivas de higiene veterinária.

7. Qualidade alimentar

Na sua comunicação de 1985 relativa à realização do mercado interno no sector


alimentar, a Comissão afirmou que deixaria de apresentar propostas de legislação
vertical que estabelecessem especificações qualitativas relativas a categorias específicas
de produtos. A Comissão afirmou que, em vez disso, passaria a recorrer à rotulagem,
bem como à aplicação de instrumentos facultativos, para criar as bases do
reconhecimento mútuo das regras nacionais, em conformidade com os princípios
estabelecidos pelo Tribunal de Justiça.

De acordo com esta abordagem, a questão das normas e da certificação de qualidade a


nível do mercado interno (relativas quer a produtos quer a empresas) seria da livre
iniciativa dos operadores. Obviamente, no entanto, estes instrumentos deveriam ser
utilizados em conformidade com as regras relativas à informação enganosa e não
devem criar entraves às trocas comerciais. Além disso, para assegurar a fiabilidade
destes instrumentos, os operadores devem ser incentivados a aderir às normas
reconhecidas a nível internacional e europeu, nomeadamente às das séries ISO 9000 e
EN 29 000. Subsequentemente, a Comissão adoptou uma série de iniciativas genéricas
destinadas a fomentar o desenvolvimento de uma política europeia de qualidade.

No sector agrícola, adoptou-se uma abordagem bastante diferente. Não é possível,


dados os objectivos específicos da PAC, prever a supressão do estabelecimento de
especificações qualitativas relativas à composição dos produtos. No âmbito das
organizações comuns de mercado, são necessárias especificações de qualidade, como
sucede no caso de o apoio financeiro ser prestado por intermédio do orçamento
comunitário.

Foram introduzidas medidas específicas no que respeita à promoção e certificação da


qualidade, designadamente no domínio do desenvolvimento rural. Estes instrumentos
dizem respeito aos produtos agrícolas biológicos, aos certificados de carácter
específico relativos a produtos tradicionais e a menções geográficas protegidas.

Em termos gerais, a Comissão considera que as diferentes abordagens do mercado


interno e da legislação agrícola não conduzem a inconsistências ou distorções da
concorrência. No entanto, no contexto da simplificação das regras de higiene
veterinária, poderá valer a pena rever as disposições relativas à qualidade constantes da
legislação. Em princípio, afigura-se que, caso sejam necessárias, as disposições
relativas à qualidade devem constar de legislação específica no domínio da qualidade e
ser suprimidas da legislação veterinária, a menos que se tenha estabelecido uma sua
ligação com a saúde. A Comissão solicita observações sobre esta questão.

27
8. Rotulagem dos alimentos

A Directiva 79/112/CEE do Conselho, relativa à rotulagem, apresentação e


publicidade dos géneros alimentícios, foi explicitamente concebida para constituir o
único enquadramento legislativo das regras obrigatórias de rotulagem dos produtos
alimentares. Esta directiva foi já alterada muitas vezes. As alterações mais recentes,
adoptadas pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho em 1996, introduzem o princípio
da declaração quantitativa dos ingredientes (QUID) e alteram as regras de rotulagem
do nome comercial do produto, para atender à jurisprudência recente do Tribunal de
Justiça. A Comissão tenciona apresentar o mais rapidamente possível uma proposta de
consolidação formal da directiva.

A Directiva 79/112/CEE baseia-se no princípio da rotulagem funcional. A directiva


destina-se a assegurar que os consumidores disponham dos dados essenciais quanto à
composição do produto, ao respectivo fabricante e aos métodos de armazenamento e
preparação necessários para garantir ao consumidor quer segurança quer uma
concorrência leal. Os produtores e os fabricantes poderão incluir dados adicionais
desde que estes sejam exactos e não induzam o consumidor em erro.

Para além das regras constantes da Directiva 79/112/CEE, vários actos de carácter
vertical incluem disposições específicas e obrigatórias relativas à rotulagem, como
sucede com as regras comunitárias relativas ao vinho, aos frutos e vegetais frescos e
aos ovos, bem como as directivas específicas relativas aos géneros alimentícios
destinados a uma alimentação especial. A Comissão solicita observações sobre o
interesse da consolidação destas disposições dispersas num único acto relativo à
rotulagem ou sobre se, com vista a uma maior flexibilidade, é preferível que estes
requisitos continuem a ser estabelecidos em actos específicos.

Recentemente, manifestou-se alguma preocupação sobre o grau de pormenor


desnecessário de determinados aspectos das regras de rotulagem. Em particular,
verificaram-se casos, quer a nível comunitário quer nacional, em que a legislação
requereu que dados já constantes da rotulagem, como a lista de ingredientes, fossem
repetidos de forma mais clara noutra parte do rótulo. No caso Sauce Béarnaise, no
entanto, o Tribunal reconheceu que, em muitos casos, os dados constantes da lista de
ingredientes são suficientes para informar o consumidor.

No entanto, foi também manifestada preocupação por outros aspectos das regras de
rotulagem nem sempre conduzirem à informação adequada do consumidor. A título de
exemplo, a Comissão solicitou recentemente a alteração das regras de rotulagem para
que fossem apresentados mais dados sobre a eventual presença de alergéneos
conhecidos nos produtos alimentares, mesmo em caso de níveis muito reduzidos ou de
vestigiais. Foram também expressas críticas quanto às regras actuais relativas à
rotulagem de ingredientes compostos nos produtos alimentares. Ao abrigo da actual
legislação, não é necessário indicar separadamente os ingredientes de um ingrediente
composto se este representar menos de 25% do produto acabado. Assim, por exemplo,
se uma tarte contiver menos de 25% de massa, basta incluir a menção 'massa" na lista
de ingredientes, não sendo necessário indicar separadamente os ingredientes da pasta.
Sugeriu-se que este limite superior de 25% é demasiado elevado e deve ser reduzido
para porventura 5%.

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Para além dos requisitos de rotulagem obrigatórios e fundamentais, foi adoptada
legislação comunitária sobre a apresentação de dados adicionais facultativos por parte
dos produtores ou fabricantes. Assim, por exemplo, a nível da Comunidade a
rotulagem nutricional não é obrigatória. No entanto, se os fabricantes pretenderem
incluir menções ou dados nutricionais, devem fezê-lo de acordo com uma estrutura
normalizada. De modo análogo, o Regulamento (CEE) n° 2092/91 do Conselho
estabelece regras que regem a utilização do rótulo biológico no que respeita aos
vegetais e aos seus produtos e a Comissão propôs recentemente regras quanto à
utilização deste rótulo nos produtos de origem animal.

Importa que a legislação comunitária crie um equilíbrio adequado entre requisitos de


rotulagem obrigatórios e fundamentais e a utilização de instrumentos facultativos. A
Comissão solicita observações sobre se a legislação existente reflecte um equilíbrio
adequado.

Como acima referido, os produtores e os fabricantes podem incluir livremente as


menções que pretenderem na rotulagem dos produtos alimentares desde que tais
menções sejam correctas e não sejam enganosas. A responsabilidade pela verificação
de tais menções incumbe aos Estados-membros. Nos últimos anos, a variedade de
menções constante da rotulagem dos alimentos e da publicidade dos produtos
alimentares aumentou drasticamente. As menções ligadas à saúde constituem um
problema específico, uma vez que os alegados efeitos benéficos de um dado produto
alimentar poderão ser objecto de debate científico, o que impossibilita que as
autoridades competentes verifiquem tal menção. A Comissão está consciente de certos
casos em que os Estados-membros adoptaram posições diferentes quanto à aceitação
de determinadas menções, o que conduziu a problemas de livre circulação dos
produtos alimentares em questão. Numa dada fase, a Comissão admitiu apresentar
legislação específica relativa às menções constantes dos alimentos através da definição
das circunstâncias em que determinadas menções podem existir. No entanto, este
trabalho deparou com várias dificuldades técnicas e foi parado, pelo menos
temporariamente. Em vez disso, optou-se agora pelo reforço das disposições relativas
à directiva respeitante à publicidade enganosa. A Comissão solicita especificamente
observações sobre a abordagem a adoptar a nível comunitário para regulamentar as
menções, não só as relativas à composição (como 'ligeiro" ou 'magro'), como
também as respeitantes à saúde e outros tipos análogos de menções que estão a ser
cada vez mais utilizados nos chamados alimentos funcionais.

Além disso, em 1997 a Comissão pretende designadamente empreender a revisão da


directiva relativa à rotulagem nutricional, por forma a actualizar determinadas
disposições da directiva afimde que atenda a dados científicos novos. Neste contexto,
a Comissão solicita especificamente observações sobre se a rotulagem nutricional deve
ser tornada obrigatória e se os dados nutricionais requeridos são suficientes para
garantir a informação adequada do consumidor. Esta será uma ocasião para que a
Comissão analise outras observações relativas a essa directiva. A nível internacional,
estão também a ser analisadas as normas relevantes do Codex Alimentarius.

Por último, foi adoptada recentemente a regulamentação dos alimentos novos, que
incluem, nomeadamente, os que contêm ou sejam produzidos a partir de OGM. Esta

29
regulamentação estabelece requisitos de rotulagem no que respeita à presença de
determinados materiais, como, por exemplo, OGM. A Comissão atribui elevada
importância à implementação correcta destas regras de rotulagem.

30
PARTE IV
MANUTENÇÃO DE UM ELEVADO GRAU DE PROTECÇÃO

1. Observações de ordem geral

O n° 3 do artigo 100o-A do Tratado requer que a Comissão adopte um elevado grau


de protecção nas respectivas propostas relativas à saúde, segurança e protecção do
ambiente e dos consumidores. O artigo 129° do Tratado estabelece que os requisitos
de protecção da saúde constituem uma componente das demais políticas comunitárias.
Além disso, o artigo 129o-A requer que a Comunidade contribua para um elevado grau
de protecção dos consumidores através de medidas adoptadas em aplicação do artigo
100o-A no âmbito da realização do mercado interno e de medidas específicas de apoio
e complemento à política seguida pelos Estados-membros em defesa da saúde, da
segurança e dos interesses económicos dos consumidores e para lhes facilitar uma
informação adequada.

No discurso que proferiu no Parlamento Europeu, em 18 de Fevereiro de 1997, o


Presidente da Comissão apelou à elaboração gradual de uma política alimentar
adequada, com especial incidência na protecção do consumidor e da sua saúde. Neste
contexto, a União deve dotar-se dos meios necessários de acção, tendo em conta dois
imperativos:
- A maior participação do Parlamento no processo decisório; para este efeito, a
Comissão passará a recorrer mais ao artigo 100o-A no que respeita às propostas de
carácter veterinário efitossanitáriocujo principal objectivo seja a saúde do consumidor
e procurará, simultaneamente, persuadir a Conferência Intergovernamental de que
todas as decisões legislativas sejam tomadas por co-decisão;
- A necessidade de atribuir à Comunidade competências reais no domínio da saúde;
por conseguinte, a Comissão apresentou uma proposta concreta de revisão
aprofundada do artigo 129° à CIG, que envolve três grandes aperfeiçoamentos:
- Um processo aperfeiçoado de coordenação das políticas dos Estados-
membros;
- Se necessário, a possível harmonização a nível comunitário no domínio da
saúde humana;
- A co-decisão nas questões relativas à saúde.
No que respeita à segurança alimentar, não pode haver cedências. O Tratado requer
que a Comissão adopte um elevado grau de protecção nas suas propostas e assegure
que as suas políticas reflictam integralmente os requisitos em termos de saúde pública.
Este grau de protecção deve ser permanentemente revisto, e, se necessário, deverá ser
adaptado por forma a atender a novos dados ou à reavaliação dos dados existentes. O
objectivo da presente parte é analisar o modo como tais objectivos são reflectidos nas
políticas comunitárias de gestão do mercado interno e da política agrícola comum e
solicitar observações sobre eventuais aperfeiçoamentos.

2. Papel dos pareceres científicos na elaboração da legislação relativa à segurança


alimentar
Em termos gerais, a Comissão considera que a consulta prévia de peritos científicos
independentes é o melhor meio de se garantir a objectividade científica e a consistência

31
da análise de risco aquando da elaboração das regras relativas à saúde pública. Para
que seja eficaz, o processo de avaliação do risco deve abranger toda a cadeia
alimentar. Assim, por exemplo, quando se avalia a segurança de um produto químico
presente num alimento, há que analisar todas as fontes de exposição do ser humano a
tal produto, incluindo a sua presença como contaminante nos alimentos e na água de
beber, bem como a exposição do ser humano decorrente da sua utilização como
aditivo alimentar, pesticida ou medicamento veterinário. No sector alimentar, há vários
Comités Científicos responsáveis, nomeadamente o Comité Científico da Alimentação
Humana (SCF), o Comité Científico Veterinário, o Comité Científico dos Pesticidas, o
Comité Científico da Nutrição Animal e o Comité Científico da Toxicidade e
Ecotoxicidade. A abordagem integrada da avaliação de risco pode requerer a consulta
de vários destes comités. A avaliação de risco efectuada por cada um deles abrange
características específicas não abordadas nos restantes comités, como a boa prática
veterinária ou agrícola. É, portanto, necessário o envolvimento de vários comités,
muito embora a coordenação seja essencial para evitar a repetição da avaliação de um
mesmo risco ou a duplicação desnecessária de esforços.

Além disso, importa referir que incumbe ao Comité dos Medicamentos Veterinários,
que está ligado à Agência Europeia de Avaliação dos Medicamentos sediada em
Londres, a avaliação da segurança dos resíduos dos medicamentos veterinários nos
produtos alimentares de origem animal.

Vários actos legislativos comunitários prevêem a consulta obrigatória do SCF antes da


adopção de legislação que possa ter implicações em termos de saúde pública, como
sucede no que respeita aos aditivos, aos contaminantes, à higiene alimentar, aos
materiais em contacto e aos alimentos novos.

Para que o processo de avaliação científica possa ser credível e mereça a confiança do
público, há que dar garantias suficientes de objectividade e independência em relação
ao parecer científico recebido. Tendo em conta este objectivo, a Comissão
desenvolveu uma nova abordagem em relação aos pareceres científicos, a qual está
descrita na Comunicação relativa à saúde dos consumidores e à segurança alimentar
recentemente apresentada ao Conselho e ao Parlamento Europeu. Esta nova
abordagem irá reforçar os três grandes princípios da qualidade científica,
independência e transparência dos comités científicos, uma vez que:

- Assegura que as qualificações e competências científicas sejam os critérios de


selecção dos membros dos comités científicos e que o processo de selecção seja
transparente no que respeita ao Parlamento Europeu, aos Estados-membros, aos
operadores económicos e aos consumidores;
- Assegura que os membros dos comités científicos não tenham interesses que possam
colidir com o requisito de que forneçam pareceres independentes. Neste contexto,
alargar-se-ão os requisitos e procedimentos de declaração de interesses;
- Implementa uma política global de transparência em relação a todo o processo dos
pareceres científicos. Em termos mais concretos, as instituições europeias e as
autoridades nacionais, bem como todas as partes interessadas, incluindo os
consumidores, quer individualmente quer por intermédio das respectivas associações,
irão ter acesso a informação sobre os métodos de trabalho e os pareceres dos comités.

32
Além disso, a integração de todos os comités científicos na mesma Direcção-Geral da
Comissão irá assegurar uma maior sinergia e uma melhor coordenação dos respectivos
trabalhos.

A Comissão irá igualmente prosseguir as suas actividades no sentido de que:

- Se consolide o princípio da obtenção do parecer do Comité Científico comunitário


competente antes da elaboração de disposições comunitárias relativas aos produtos
alimentares que possam afectar a saúde pública (muito embora sejam necessárias
algumas excepções, nomeadamente em caso de medidas de salvaguarda urgentes);

- Se utilize um único procedimento para avaliar todos os riscos (princípio 'Uma porta,
uma chave");

Por outro lado, importa realçar as limitações do papel dos comités científicos. Quer a
nível comunitário quer mundial, existe uma distinção clara entre a avaliação do risco e
a gestão do risco. De acordo com as definições que estão a ser analisadas pelo Codex
Alimentarius, a avaliação do risco é um processo científico que consiste na
identificação e caracterização dos perigos, na avaliação da exposição e na
caracterização dorisco.Por outro lado, a gestão do risco é o processo de ponderação
das alternativas políticas face aos resultados da avaliação de risco, e, se necessário, de
selecção e implementação de modalidades de controlo adequadas, incluindo medidas
regulamentares. Muito embora a avaliação de risco possa ser delegada em organismos
científicos consultivos, a gestão do risco incumbe às autoridades regulamentares, e, a
nível comunitário, ao Conselho, à Comissão e ao Parlamento Europeu.

Poderão ocorrer dificuldades específicas caso, dada a incerteza ou a ausência de dados


científicos, o comité científico não possa efectuar uma avaliação de risco integral.
Nesse caso, face à obrigação de se assegurar um elevado grau de protecção, afigura-se
necessário adoptar uma abordagem cautelosa em relação à gestão do risco, através da
aplicação do princípio da precaução.

O programa-quadro de investigação comunitário deveria também envidar esforços no


que respeita à investigação e às aplicações destinadas a aumentar os conhecimentos e
aperfeiçoar as técnicas que permitam melhorar a avaliação dos riscos epidemiológicos
e alimentares e a sua redução.

Um outro problema é a recolha de dados necessária para a avaliação de risco. No que


respeita às novas substâncias, o requerente é claramente responsável pela recolha e
apresentação dos dados necessários para a análise. Como forma de apoio aos
requerentes, utilizam-se directrizes e documentos análogos para descrever os dados
necessários para a avaliação. No entanto, podem surgir dificuldades na obtenção dos
dados necessários no que respeita aos contaminantes, ou a novos factores de risco
relativos a substâncias já existentes. Para responder a esta questão, a Comunidade
estabeleceu procedimentos de cooperação científica entre os Estados-membros e a
Comissão no que respeita à análise das questões científicas relativas aos alimentos.

3. Cooperação científica no domínio dos alimentos

33
Os princípios que regem o processo de cooperação científica foram formalizados na
Directiva 93/5/CEE, relativa à assistência dos Estados-membros à Comissão e à sua
cooperação na análise científica de questões relacionadas com os produtos alimentares,
adoptada em 25 de Fevereiro de 1993.

Esta Directiva estabelece o princípio de que os Estados-membros devem adoptar as


medidas necessárias para permitir que as autoridades e organismos competentes
cooperem com a Comissão e lhe prestem a assistência de que carece na análise
científica de questões de interesse público relativas aos alimentos, nomeadamente no
domínio da saúde pública, em campos como os associados à medicina, nutrição,
toxicologia, biologia, higiene, tecnologia alimentar, biotecnologia, alimentos e
processos novos, técnicas de avaliação dorisco,físicae química.

Para que o processo de cooperação possa decorrer eficazmente, cada Estado-membro


deve designar uma só autoridade responsável pela cooperação com a Comissão e pela
distribuição do trabalho aos organismos adequados. As principais tarefas do processo
de cooperação científica são questões relativas:

- à elaboração de protocolos de avaliação do risco de componentes alimentares e dos


métodos de elaboração da avaliação nutricional;
- à avaliação da adequação da dieta em termos nutricionais;
- à análise de dados de testes apresentados à Comunidade e à elaboração de uma
monografia destinada ao SCF;
- à execução de levantamentos sobre a ingestão de alimentos;
- à execução de investigações relativas aos componentes das dietas em vários Estados-
membros ou a contaminantes alimentares biológicos ou químicos;
- ao apoio à Comissão na observância dos compromissos internacionais da
Comunidade graças à disponibilização de competências nas questões de segurança
alimentar.

Com base nas sugestões provenientes dos Estados-membros e nas suas próprias
prioridades, a Comissão deverá elaborar e actualizar um inventário de tarefas no que
respeita à cooperação científica. O inventário inclui uma descrição resumida das
tarefas, o nome dos países coordenadores, o nome de outros países que participam nas
tarefas e a data-limite para a sua conclusão. O actual inventário apresenta uma série de
tarefas relativas à recolha de dados sobre contaminantes químicos e microbiológicos
dos alimentos, aromatizantes, a ingestão dietética e análises de exposição e de aspectos
científicos da nutrição.

A gestão de cada tarefa incumbe ao instituto coordenador. A Comissão ocupa-se da


gestão global do processo de cooperação científica. Os custos das tarefas são
suportados sobretudo pelos Estados-membros em questão. A Comissão concede um
apoiofinanceirolimitado adicional para cobrir os custos decorrentes da coordenação e
da organização de reuniões com peritos dos Estados-membros. Embora se não possa
ainda formular um julgamento definitivo, os resultados preliminares sugerem que a
cooperação científica constitui um meio útil e muito económico de congregar dados e
recursos relativos a determinadas questões.

34
Por outro lado, importa reconhecer o carácter complementar do processo de
cooperação científica em relação ao papel do SCF. No domínio da avaliação de risco,
a cooperação científica destina-se à recolha e fusão dos melhores dados disponíveis
existentes nos Estados-membros sobre uma dada questão. Estes dados são então
transmitidos ao SCF, constituindo uma base sólida para a avaliação de risco por ele
efectuada, mantendo o SCF o seu papel de principal fonte de consulta da Comissão
sobre questões científicas de ordem alimentar. Na sua qualidade de centro congregador
de capacidades científicas independentes, o Centro Comum de Investigação também
deve contribuir para esta política.

4. Abordagem de riscos graves e urgentes para a saúde pública

Toda a legislação comunitária inclui cláusulas de salvaguarda no que respeita à


protecção da saúde pública. Estas cláusulas permitem que os Estados-membros
estabeleçam restrições à comercialização de um produto ou substância caso haja bons
motivos para pressupor que constituem um perigo, mesmo que estejam em
conformidade com a regulamentação comunitária existente. Em 1984, instituiu-se
formalmente um sistema de alerta rápido destinado ao intercâmbio de informação
sobreriscosgraves e imediatos para a saúde e segurança dos consumidores, o qual foi
subsequentemente incluído na Directiva 92/59/CEE. Se necessário, a Comissão pode
convocar rapidamente reuniões dos comités científicos relevantes para analisar tais
riscos.

Além disso, graças à realização do mercado interno, a Comunidade passou a dispor de


competências importantes, nomeadamente ao abrigo da Directiva 92/59/CEE, relativa
à segurança geral dos produtos, para poder intervir e retirar do mercado interno
produtos que constituam riscos graves e imediatos para os consumidores. No entanto,
ao abrigo da Directiva 92/59/CEE, a Comissão apenas pode intervir com base em
dados apresentados pelos Estados-membros.

Por outro lado, a Comissão adoptou uma comunicação sobre a abordagem de


situações urgentes no âmbito da implementação das regras comunitárias (COM(93)
430 final, de 16 de Dezembro de 1993). Esta descreve os instrumentos já
implementados em várias áreas e propõe tópicos de análise e debate.

Além disso, tendo em conta as directivas de saúde veterinária e a Directiva


93/43/CEE, relativa à higiene, a Comissão pode em determinados casos adoptar
medidas de emergência provisórias, que poderão entrar imediatamente em vigor desde
que sejam ratificadas por um procedimento de comité rápido. O Tribunal de Justiça, na
sua decisão de 12 de Julho de 1996 sobre a aplicação de medidas provisórias
apresentadas pelo Reino Unido contra as medidas de emergência em relação à BSE
impostas pela Comissão, reconheceu que, na aplicação destes procedimentos, há que
atribuir enorme importância à protecção da saúde pública, mesmo que tal se
sobreponha a prejuízos graves e até mesmo irreparáveis de interesses comerciais e
sociais.

Há, no entanto, uma grande diferença no que respeita ao âmbito das competências da
Comissão decorrentes das cláusulas de salvaguarda no domínio das directivas
veterinárias e ao da directiva genérica relativa à higiene. As cláusulas de salvaguarda

35
das directivas veterinárias aplicam-se quer a riscos decorrentes de produtos importados
de países terceiros, quer às trocas intracomunitárias. A cláusula de salvaguarda
constante do artigo 10° da directiva genérica de higiene, por seu turno, limita-se aos
riscos decorrentes de produtos importados de países terceiros. A Comissão solicita,
portanto, observações sobre a necessidade de alargamento do âmbito desta última
cláusula de salvaguarda para que passe a abranger os produtos das trocas
intracomunitárias.

Se existir um risco grave em relação a várias categorias de produtos que desencadeie,


portanto, procedimentos de emergência, deverá existir uma coordenação adequada que
assegure a consistência das várias medidas adoptadas. É também essencial garantir a
perfeita compreensão dos procedimentos por parte de todas as pessoas envolvidas na
abordagem de riscos graves, incluindo as autoridades competentes dos Estados-
membros, os consumidores e a indústria.

Por último, a experiência sugere poder ser necessário aperfeiçoar as disposições


relativas à abordagem e responsabilidade da comunicação ao público em caso de risco
grave. A implementação de procedimentos de alerta rápido e de salvaguarda requer a
cooperação e a confiança recíproca dos Estados-membros, bem como a análise
completa das necessidades dos consumidores e da indústria. Muito embora os dados
relativos a riscos graves para a saúde associados a produtos alimentares devam ser
acessíveis ao público o mais rapidamente possível, importa evitar alertas falsos e
mensagens alarmistas. Verificou-se já a adopção de medidas relativamente a uma
categoria inteira de produtos quando se tratava apenas de uma questão relativa a um
produto específico. Sempre que possível, os dados e advertências dirigidos ao público
devem referir-se a produtos específicos e ser proporcionais ao grau de risco.

A Comissão solicita observações sobre as medidas que poderiam ser tomadas para
aumentar a capacidade da Comunidade no que respeita à abordagem de riscos graves e
urgentes para a saúde pública associados a produtos alimentares.

5. Emergências radiológicas

Em situação normal (ou seja, não acidental), a protecção em relação à contaminação


dos produtos alimentares por substâncias radioactivas é assegurada pela Directiva
80/836/EURATOM, que será revogada em de 13 de Maio de 2000. Esta directiva será
substituída pela Directiva 96/29/EURATOM.

Após o acidente de Chernobil, foram igualmente adoptadas várias disposições relativas


a situações acidentais. As disposições actualmente em vigor após o acidente de
Chernobil constam do Regulamento n° 737/90 do Conselho, de 22 de Março de 1990,
que suplementou e adaptou a regulamentação até então vigente. Este regulamento
permanecerá em vigor até ao fim de Março de 2000.

O sistema aplicável em futuros acidentes está previsto no Regulamento n° 3954/87, de


22 de Dezembro de 1987, que estabelece que, em caso de acidente, a Comissão poderá
impor um valor máximo predeterminado de níveis de contaminação admitidos. Estas
medidas de emergência poderão então ser adaptadas tendo em conta o carácter e
âmbito exactos do incidente em questão.

36
O Regulamento n° 89/2219/CEE, de 18 de Julho de 1989, proíbe a exportação de
produtos alimentares cujo grau de contaminação exceda os níveis máximos autorizados
na Comunidade.

Em 14 de Dezembro de 1987, o Conselho adoptou a Decisão 87/600/EURATOM,


relativa a regras comunitárias de troca rápida de informações em caso de emergência
radiológica. De acordo com este mecanismo, o intercâmbio de informação também
abrange os níveis de actividade medidos nos produtos alimentares e na água para
beber.

6. Zoonoses

Nos termos das definições constantes da legislação comunitária, as zoonoses são


doenças e/ou infecções susceptíveis de serem transmitidas naturalmente do animal para
o homem. As zoonoses mais importantes que podem ser transmitidas por via alimentar
incluem:

- Contaminações víricas, como as por vírus de Norwalk e a hepatite A, por intermédio


do marisco;
- Infecções bacterianas, como as por salmonelas, Campylobacter, E. Coli, B. melitensis
e a tuberculose bovina;
- Intoxicações bacterianas, como a enterotoxemia estafilocócica e o botulismo;
- Infestações por protozoários, como as por Cryptosporidium e a toxoplasmose;
- Infecções por céstodes, como por Cysticercus bovis e Cysticercus cellulosae;
- Infecções por nematodes, como a triquinose.

Foram adoptadas regras comunitárias específicas no que respeita a várias infecções


bacterianas, como a tuberculose bovina e a brucelose bovina, ovina e caprina, com
vista ao respectivo controlo e erradicação da população animal (e, desse modo, à sua
eliminação da população humana). Estes programas baseiam-se no princípio de se
testarem animais vivos e se abaterem todos os que apresentem reacções positivas. Em
certos casos, também se utiliza a vacinação com vista à redução dos níveis de infecção
na população animal. Registaram-se sucessos assinaláveis no que respeita à
tuberculose e brucelose bovinas, sendo o sucesso menor no tocante à brucelose
ovina/caprina.

Toda a legislação comunitária relativa à higiene dos produtos de origem animal


destinados ao consumo humano prevê um certo número de disposições que servem
para controlar o risco de disseminação de zoonoses a partir da população animal ou
humana. Estas disposições são quer específicas, como a inspecção antes e após o abate
dos animais nos matadouros, quer de carácter geral, como requisitos relativos à
construção e funcionamento higiénicos das instalações de transformação alimentar e
disposições relativas às condições mínimas de transformação e às temperaturas de
armazenamento/transporte.

Para além destas directivas verticais, que directa ou indirectamente estabelecem


medidas com vista ao controlo das zoonoses, o Conselho adoptou a Directiva
92/117/CEE, relativa às medidas de protecção contra zoonoses e certos agentes

37
zoonóticos em animais e produtos de origem animal afimde evitar focos de infecção e
de intoxicação de origem alimentar. Os requisitos desta directiva são essencialmente
destinados à monitorização e controlo de uma série de zoonoses. Os Estados-membros
devem apresentar anualmente um relatório sobre a ocorrência, as tendências e as
fontes de infecções zoonóticas (na população humana, nos animais domésticos, nos
alimentos para animais e nos animais selvagens) durante o ano anterior. A directiva
também prevê medidas de monitorização, controlo, e, em última análise, erradicação
de determinados serótipos invasivos de Salmonella em efectivos de aves reprodutoras.

A experiência sugere que alguns dos limites temporais previstos para que os Estados-
membros tomassem determinadas medidas eram excessivamente optimistas e que é
necessário rever certas disposições técnicas da directiva.

A Comissão solicita, portanto, observações sobre possíveis melhoramentos desta


directiva.

Opções relativamente ao controlo das zoonoses

Dada a sua natureza, os agente zoonóticos encontram-se em pelo menos duas espécies
de hospedeiros. Em não poucos casos, existe todo um leque de hospedeiros diferentes
que podem estar infectados, não existindo necessariamente doença clínica evidente em
todos os animais afectados (como sucede com a Salmonella). Por conseguinte, os
programas de erradicação e controlo podem actuar em várias fases do ciclo infeccioso,
podendo ser necessária a utilização de mais do que uma abordagem. Para além dos
princípios gerais de higiene em todas as fases da cadeia alimentar, abordados no
presente Livro Verde, poderá recorrer-se a estratégias específicas, as quais incluem:

- A erradicação do agente da população animal ou do ambiente;


- A redução do nível de infecção na população animal de modo a que já não constitua
uma ameaça para a saúde humana (por exemplo, através do processamento dos
alimentos para animais, de programas de vacinação, do tratamento de animais
infectados e da destruição de animais infectados com doença clínica aparente);
- A remoção do agente da cadeia alimentar (por exemplo, através de um tratamento
específico durante o processamento das matérias-primas, por forma a que o agente seja
destruído);

A erradicação é geralmente a opção mais dispendiosa, não só por ser necessário


organizar programas de testes que requerem muitos recursos e trabalho, como também
para destruir os animais infectados. A erradicação apenas é viável se existir um teste
com sensibilidade e especificidade adequadas aplicável a animais vivos e apoio por
parte das explorações. Além disso, o seu sucesso apenas é provável se existir um leque
restrito de hospedeiros (que não abranja um leque significativo de formas selvagens).
Esta abordagem pode justificar-se se a doença conduzir a problemas significativos em
termos de saúde pública, saúde veterinária ou económicos (como sucede com a
tuberculose e a brucelose bovinas).

A redução envolve toda uma série de medidas que abrangem vários pontos do ciclo de
produção de animais vivos. É frequentemente utilizada como precursor de um
programa de erradicação completa. Mesmo que o objectivo não seja esse, os

38
programas coordenados de redução dos níveis de doença na população animal podem
ter impacto significativo no grau de exposição dos consumidores ao risco de infecção.
Estes programas requerem geralmente um elevado grau de cooperação entre os
produtores, os fornecedores, os transformadores e os serviços oficiais.

A remoção do agente da cadeia alimentar envolve geralmente o processamento dos


alimentos por intermédio de um método específico, independentemente da existência
ou não do agente. É particularmente útil se a detecção do agente for demasiado
onerosa ou pouco fiável. Pode envolver o tratamento térmico, a secagem, a cura, a
transformação em pickles, a congelação, etc. Ainda que eficaz, esta abordagem não
impede por via de regra uma possível reinfecção (assim, por exemplo, a carne
cozinhada armazenada junto com carne crua éfrequentementeresponsável por surtos
de intoxicação alimentar).

7. Introdução da obrigação geral de garantia da segurança e higiene dos


alimentos

A legislação comunitária existente impõe uma série de obrigações específicas aos


produtores alimentares para que os produtos alimentares observem os requisitos
previstos nas regras comunitárias. A nível nacional, no entanto, os Estados-membros
deram mais um passo em frente. Para além de transporem a legislação comunitária
existente, também introduziram nas respectivas legislações nacionais uma obrigação
geral de segurança alimentar. Assim, as empresas alimentares deverão assegurar que só
sejam colocados no mercado alimentos seguros, higiénicos e adequados ao consumo
humano. Todas as empresas alimentares que comercializem alimentos que não
respeitem estas condições cometem uma infracção ao abrigo da legislação do Estado-
membro em questão e estão sujeitas a penalidades criminais ou administrativas.

O objectivo da presente secção é solicitar comentários sobre a adequação de


obrigações gerais análogas nas empresas alimentares para assegurar que os alimentos
sejam seguros, higiénicos e adequados ao consumo humano. Importa sublinhar que
uma tal obrigação geral de segurança e higiene seria uma obrigação directa das
empresas alimentares para com as autoridades competentes ao abrigo da legislação
administrativa ou penal do Estado-membro em questão. Seria, portanto, totalmente
distinta da responsabilidade dos produtores em relação aos consumidores no que
respeita a produtos deficientes, a qual é abordada na próxima secção. Além disso, a
introdução de uma obrigação geral não implicaria a introdução de um novo sistema de
aprovação prévia ou notificação pelos Estados-membros.

7.1 Actual situação a nível comunitário

Muito embora a legislação alimentar comunitária estabeleça uma série de obrigações


específicas no que respeita às empresas alimentares, a verdade é que, excepto no que
respeita à directiva genérica relativa à segurança dos produtos, não inclui de momento
uma obrigação jurídica geral de que apenas possam ser colocados no mercado
alimentos seguros, higiénicos e adequados para consumo humano. As directivas
específicas abordam esta questão de várias maneiras: algumas das directivas verticais
de higiene estabelecem um requisito específico de que determinados produtos sejam
adequados para o consumo humano; outras directivas verticais estabelecem um

39
requisito implícito análogo; e a directiva genérica relativa à higiene estabelece que a
preparação, transformação, fabrico, embalagem, transporte, manuseamento e venda ou
fornecimento de produtos alimentares se processe de modo higiénico.

O n° 1 do artigo 3 o da Directiva 92/59/CEE, relativa à segurança geral dos produtos,


requer que os produtores apenas possam colocar no mercado produtos seguros. No
entanto, levantaram-se dúvidas sobre se o conceito de segurança dos produtos
estabelecido na Directiva 92/59/CEE é claramente diferente do requisito de que os
produtos alimentares devam ser seguros, higiénicos e adequados para o consumo
humano. Assim, por exemplo, os alimentos podem ser adulterados com substâncias
que não constituem por si só um risco para a saúde e não tornam o produto alimentar
inseguro na acepção da Directiva 92/59/CEE. No entanto, estes produtos alimentares
não são geralmente considerados adequados para o consumo humano.

A introdução de uma obrigação geral de segurança alimentar e higiene poderia,


portanto, servir para reforçar o grau de protecção do consumidor a nível da
Comunidade, ao encorajar todas as empresas alimentares a introduzir procedimentos
de segurança e controlo interno. Esta obrigação de segurança pode também contribuir
para simplificar a legislação alimentar comunitária em áreas em que as disposições
genéricas bastem para garantir a segurança dos produtos. No entanto, seria também
necessário assegurar que a introdução de uma nova obrigação de segurança e higiene
não conduza à criação de entraves às trocas comerciais no mercado interno. Por
conseguinte, todas as medidas devem ser compatíveis com os princípios em que o
mercado interno assenta, nomeadamente com as regras do Tratado relativas à livre
circulação de mercadorias.

7.2 Âmbito da obrigação geral de segurança e higiene

Para que seja eficaz, qualquer nova obrigação geral de segurança e higiene deve em
princípio aplicar-se a toda a cadeia alimentar, desde a produção primária até à venda
final do produto alimentar ao consumidor. Deve igualmente atender ao facto de que as
interacções entre produtores, fabricantes e distribuidores se estão a tornar cada vez
mais complexas. Assim, por exemplo, os produtores primários têm frequentemente
obrigações contratuais para com os fabricantes ou distribuidores para que observem
determinadas especificações relativas à qualidade ou segurança. Os distribuidores
dispõem de cada vez mais produtos com nome comercial próprio e desempenham um
papel fundamental na concepção dos produtos.

Esta situação nova deveria conduzir a uma maior responsabilidade conjunta ao longo
de toda a cadeia alimentar e não a responsabilidades individuais dispersas. Cada elo da
cadeia alimentar deveria tomar as medidas necessárias para garantir a segurança
alimentar no contexto das suas próprias actividades específicas, através da aplicação
dos princípios HACCP e de outros instrumentos análogos. Se um determinado
produto for considerado de má qualidade, há que analisar a responsabilidade de cada
um dos elos da cadeia de acordo com o facto de ter ou não assumido as suas próprias
responsabilidades específicas. A título de exemplo, poderia afigurar-se errado em
princípio que o retalhista alimentar fosse considerado responsável pela presença de
uma quantidade excessiva de aditivos alimentares nos produtos enlatados, em relação

40
aos quais não tem qualquer controlo. No entanto, se no ponto de venda for detectada
contaminação microbiológica de carnes frias cortadas e cozinhadas, será necessário
investigá-la para determinar se a contaminação ocorreu em virtude de higiene
deficiente aquando do fabrico, da não observância da cadeia de frio aquando da
distribuição ou do armazenamento e manuseamento deficientes no local de venda.

Levanta-se, portanto, a questão da chamada diligência devida. Se uma empresa


alimentar comercializar um produto alimentar que não observe os requisitos de
segurança prescritos pela legislação comunitária ou nacional, essa empresa, ao abrigo
da legislação do Estado-membro em questão, poderá ser sujeita a sanções criminais ou
administrativas. No entanto, nalguns Estados-membros, a empresa não ficará sujeita a
elas caso comprove que adoptou todas as medidas ao seu alcance para assegurar que o
alimento observa os requisitos jurídicos ('diligência devida'). Por conseguinte, a
observância da diligência devida constitui um meio absoluto de defesa num
procedimento judicial ou administrativo subsequente. Noutros Estados-membros,
porém, o operador continua a ser responsável, apesar de se atender ao facto de a
empresa ter exercido a diligência devida para reduzir as sanções impostas.

Nas consultas preliminares, a Comissão recebeu vários pedidos no sentido de que a


introdução de uma obrigação geral de segurança alimentar na legislação comunitária
fosse acompanhada pela introdução da defesa da "diligência devida".

A Comissão está consciente de que o apuramento dos factos e circunstâncias que


podem sujeitar o operador a sanções criminais ou administrativas é uma questão
complexa que depende muito da estrutura dos vários sistemas jurídicos nacionais.

No entanto, a Comissão considera igualmente que a tomada em consideração pelo


sistema de sanções da obrigação de adoptar todas as medidas ao seu alcance para
garantir a segurança alimentar constitui um meio importante para reconhecer a
responsabilidade das empresas na garantia de que os respectivos produtos estejam em
conformidade com a regulamentação. Por conseguinte, a não observância desta
obrigação deve conduzir a sanções mais duras caso os produtos não estejam em
conformidade com a regulamentação, enquanto que a sua observância deve conduzir
ou à aplicação da defesa da diligência devida ou, no mínimo, a sanções menos pesadas.

A questão da defesa da diligência devida deve também ser analisada tendo em conta o
possível alargamento do âmbito da obrigação de segurança à produção primária.

A Comissão solicita observações pormenorizadas sobre esta questão.

8. Aplicação do princípio da responsabilidade pelos produtos no sector alimentar

A Directiva 85/374/CEE do Conselho, relativa à responsabilidade decorrente dos


produtos defeituosos, estabelece o princípio de que o produtor é responsável por
qualquer defeito dos seus produtos. A directiva aplica-se aos produtos alimentares,
bem como a outros produtos. No entanto, a definição de produto constante do artigo
2° da directiva exclui as matérias-primas agrícolas e a caça. Para efeitos do disposto na
directiva, entende-se por matérias-primas agrícolas os produtos do solo, da pecuária e
da pesca, excluindo os produtos que tenham sido objecto de uma primeira

41
transformação. Em princípio, portanto, os produtos agrícolas não transformados e a
caça estão excluídos do âmbito da directiva relativa à responsabilidade pelos produtos,
muito embora os Estados-membros possam optar por disposições que os abranjam.
Até ao momento, apenas a Grécia, o Luxemburgo, a Finlândia e a Suécia recorreram a
esta opção.

Nos últimos anos, registaram-se cada vez mais pedidos, provenientes nomeadamente
das organizações de consumidores, com vista à inclusão no âmbito da directiva relativa
à responsabilidade pelos produtos das matérias-primas agrícolas não transformadas.
Estes pedidos tornaram-se ainda mais insistentes em virtude do problema da BSE.

Em princípio, a inclusão das matérias-primas agrícolas não transformadas no âmbito da


directiva relativa à responsabilidade pelos produtos poderia constituir um passo
importante para a protecção dos consumidores ao abrigo da legislação comunitária.
No entanto, não se deveria crer que um tal alargamento constitua a solução para todos
os problemas que possam eventualmente ocorrer. O artigo 4o da directiva prevê que
cabe ao lesado a prova do dano, do defeito e do nexo causal entre o defeito e o dano.
A experiência comprovou ser muito difícil identificar a fonte precisa dos surtos de
doenças alimentares. Quanto maior o lapso de tempo entre a exposição aos produtos
alimentares contaminados e o início dos sintomas, maiores serão as dificuldades. No
caso específico da BSE, e mesmo que se venha a provar uma relação com a nova
variante de doença de Creutzfeldt Jakob, o período de incubação muito longo em
questão significa que será provavelmente impossível provar que um determinado
produto é responsável pelo dano causado.

Uma outra questão é a dificuldade da identificação do local de produção do produto


alimentar a partir do respectivo local de venda. A Comunidade adoptou recentemente
medidas por forma a assegurar a identificação do local de produção dos produtos
bovinos, tendo havido sugestões de que estas regras possam ser alargadas a outros
produtos de origem animal. Há que decidir igualmente se as novas regras de
documentação da origem devem ser incluídas em instrumentos jurídicos de carácter
compulsivo ou se devem antes ser abrangidas por instrumentos facultativos. Sabe-se
que vários dos grandes retalhistas e distribuidores alimentares estão a desenvolver
sistemas destinados a melhorar a identificação da origem dos produtos alimentares.
Neste contexto, importa recordar que o n° 3 do artigo Io da directiva relativa à
responsabilidade pelos produtos estabelece que, se o produtor não puder ser
identificado, os fornecedores serão considerados os produtores.

Nestas circunstâncias, afigura-se que o alargamento do âmbito da directiva relativa à


responsabilidade pelos produtos às matérias-primas agrícolas não transformadas não
deve ser considerado uma alternativa ao desenvolvimento de regras adequadas de
segurança dos produtos e a sistemas oficiais de controlo eficazes, mas sim como uma
medida adicional específica. A Comissão solicita observações sobre esta questão.

9. Satisfação das novas aspirações dos consumidores

Até ao momento, a principal preocupação da legislação alimentar comunitária foi


assegurar a livre circulação de produtos alimentares na Comunidade, sobretudo graças
a legislação alimentar harmonizada. Em contrapartida, a legislação alimentar

42
comunitária não abordou de forma exaustiva nem questões nutricionais nem meios de
resposta às preocupações do público em geral. O presente Livro Verde, que surge
numa altura em que há grandes preocupações do público em relação aos alimentos e à
saúde, constitui uma oportunidade para lançar um debate sobre novas abordagens
destas questões, no âmbito quer da política alimentar de carácter geral quer da
legislação específica.

A legislação alimentar constitui um dos principais componentes da política relativa aos


alimentos e à nutrição. Poderá desempenhar um papel na maior consciencialização dos
cidadãos comunitários no que respeita às respectivas aquisições alimentares e dietas e
à preparação de refeições, bem como contribuir para os incentivar a fazer escolhas sãs
que possam conduzir à melhoria da sua saúde e à diminuição da morbilidade e da
mortalidade prematura. Neste processo, a colaboração entre o sector da saúde, os
consumidores, os governos, a indústria e a própria Comunidade seria benéfica para
todas as partes envolvidas.

A Comissão solicita observações sobre qual a abordagem que deve ser adoptada a
nível comunitário no que respeita à nutrição e à saúde, quais as iniciativas que deverão
ser lançadas e quais as implicações em termos de alteração da legislação alimentar
comunitária.

Além disso, os consumidores têm vindo a ficar cada vez mais apreensivos com os
métodos de produção dos respectivos alimentos. Cada vez mais consumidores
pretendem assegurar que os alimentos que ingerem sejam produzidos sem que o
ambiente seja afectado e respeitando o bem-estar dos animais das explorações.
Acontecimentos recentes, nomeadamente o receio da transmissão da BSE ao ser
humano, demonstraram a preocupação de que determinados métodos de produção
possam também ter impacto na segurança alimentar.

Outros debates incidiram no impacto ético e ambiental de progressos científicos


recentes, como a utilização de OGM em produtos alimentares e a aplicação de técnicas
de clonagem.

A legislação comunitária já contém muitas disposições destinadas a responder a estas


preocupações. A utilização de pesticidas e de medicamentos veterinários na produção
alimentar rege-se por regras estritas, destinadas a assegurar que a referida utilização
seja a mínima compatível com a boa prática agrícola e veterinária. Estão a ser
estabelecidos limites para assegurar que os resíduos de pesticidas e de medicamentos
veterinários, bem como de contaminantes de origem agrícola ou ambiental, não
constituam um risco para a saúde dos consumidores. A Comunidade adoptou
igualmente regras relativas ao bem-estar dos animais das explorações. O teor destas
regras não se integra no âmbito do presente Livro Verde. No entanto, elas levantam
duas questões importantes directamente relevantes para a legislação alimentar: a
questão da segurança e a da informação do consumidor.

No que respeita à segurança alimentar, não são possíveis compromissos. A secção


anterior da presente parte descreveu o modo como a avaliação do risco e as técnicas
de gestão do risco se integram nas políticas comunitárias para o sector alimentar. A
manutenção de um elevado grau de protecção implica, porém, a inadequação da

43
autorização de alimentos ou de métodos de produção alimentar inseguros sujeitos a
requisitos de rotulagem. Se não forem seguros, não devem ser autorizados.

No que respeita à rotulagem, actualmente a Directiva 79/112/CEE apenas requer que


os rótulos mencionem dados sobre os processos ou tratamentos caso a omissão de tal
informação possa ser uma fonte de confusão para o consumidor, como por exemplo se
os produtos forem apresentados em pó, liofilizados, ultracongelados, concentrados ou
fumados. Além disso, há que rotular sempre os produtos alimentares irradiados. No
entanto, a legislação comunitária não requer a menção na rotulagem dos métodos ou
processos de produção que não tenham impacto nas características alimentares do
produto acabado. Verificaram-se recentemente, aquando da análise da proposta da
Comissão de Regulamento relativo aos alimentos e ingredientes alimentares novos,
debates entre o Parlamento, o Conselho e a Comissão sobre em que medida haveria
que impor um requisito de rotulagem sistemática aos produtos alimentares produzidos
por intermédio da biotecnologia moderna.

Em termos gerais, a experiência sugere que, caso haja um pedido genuíno dos
consumidores de mais informação sobre determinados aspectos de um produto
alimentar, os produtores e os distribuidores satisfazem-nafrequentementenuma base
facultativa, por exemplo através da rotulagem, de informação por via telefónica ou da
Internet. Poderá ser necessário analisar a necessidade de novas iniciativas comunitárias
com vista ao desenvolvimento de tais iniciativas facultativas. Além disso, em
determinados casos, como sucedeu com o recente esquema de rotulagem da carne de
bovino, poderá ser adequado prever medidas obrigatórias. A Comissão solicita
observações sobre esta questão.

44
PARTE V

ASSEGURAR A IMPLEMENTAÇÃO EFICAZ DAS REGRAS DO MERCADO


INTERNO

1. Generalidades

Agora que a harmonização das legislações nacionais do sector alimentar foi já


conseguida em larga medida, importa assegurar que o mercado interno funcione de
modo eficaz, por forma a que conduza às vantagens aguardadas pelos produtores e
consumidores.

O relatório Sutherland de Outubro de 1992 ('The Internal Market after 1992; Meeting
the Challenge") e o Conselho Europeu reconheceram a necessidade de assegurar a
gestão eficaz do mercado interno. Uma série de comunicações da Comissão ao
Conselho sublinhou igualmente a necessidade do funcionamento eficaz do mercado
interno:

- A gestão do reconhecimento mútuo das regras nacionais após 1992 (COM(93) 669
final, de 15 de Dezembro de 1993);
- Desenvolvimento da cooperação administrativa no domínio da execução e da
aplicação da legislação comunitária no âmbito do mercado interno (COM (94) 29 final,
de 16 de Fevereiro de 1994);
- Tirar o melhor partido do mercado interno (COM (93) 632final,de 22 de Dezembro
dè 1993);
- Plano de acção para o mercado interno (COM(97)184).
Mais recentemente, o Conselho Mercado Interno adoptou uma série de resoluções
destinadas a assegurar que as regras que regem o funcionamento do mercado interno
sejam o mais simples e claras possível. As possibilidades de simplificação da legislação
alimentar comunitária foram abordadas em pormenor na Parte II e não irão ser aqui
repetidas.

A presente parte destina-se a analisar as actuais medidas destinadas a garantir a


implementação efectiva da legislação comunitária a nível do mercado interno e a
solicitar sugestões sobre o seu aperfeiçoamento.

2. Transposição e aplicação da legislação comunitária

Para assegurar o fimcionamento adequado do mercado interno, é claramente


necessário monitorizar a transposição das directivas comunitárias por parte dos
Estados-membros e verificar que as regras comunitárias sejam aplicadas
correctamente. A Comissão patrocinou uma série de estudos específicos sobre a
implementação das directivas relativas aos produtos alimentares, estando a ser
analisados os resultados desses estudos. Os casos de implementação incorrecta serão
debatidos com os Estados-membros em causa.

45
Para além da legislação nacional de transposição da legislação comunitária, é frequente
que as autoridades nacionais emitam instruções ou directrizes quanto à sua
implementação que devem ser aplicadas pelos organismos de controlo oficiais,
especialmente se a legislação tiver um âmbito muito lato. Estas directrizes destinam-se
a assegurar que a legislação seja aplicada de modo uniforme no Estado-membro em
questão e a solucionar problemas práticos de implementação.

No entanto, estas directrizes podem causar problemas de gestão do mercado interno se


os Estados-membros adoptarem interpretações diferentes da legislação, o que conduz
à não aplicação uniforme das disposições em todo o mercado interno. Importa,
portanto, que haja transparência a nível comunitário e que estas diferenças sejam
superadas em caso de divergência.

Há vários anos que a Comissão adoptou a prática de trabalho informal de apresentar as


questões relativas à implementação da legislação comunitária aos Comités
Permanentes. Adoptou-se essa mesma abordagem sempre que surgiram dificuldades
imprevistas aquando da implementação da legislação. Estas discussões conduziram
frequentemente a acordo entre as autoridades competentes dos Estados-membros e a
Comissão sobre o modo como a legislação deve ser interpretada ou aplicada. A
Comissão considera que se trata de um procedimento útil que há que preservar e que
as conclusões dos Comités devem estar mais acessíveis às partes interessadas, no
pressuposto de que tais conclusões não têm estatuto jurídico formal e de que, em caso
de diferendo, a responsabilidade pela interpretação da legislação comunitária incumbe
em última análise ao Tribunal de Justiça.

Por último, por uma questão de transparência, todas as partes em questão devem ser
incentivadas a debater abertamente a implementação e aplicação da legislação
comunitária num fórum em que os Estados-membros possam ser consultados e em que
vários interesses socioeconómicos possam manifestar as respectivas opiniões. Para este
efeito, a Comissão solicita comentários sobre o interesse da convocação de reuniões
periódicas com representantes dos Estados-membros, dos produtores, da indústria, do
comércio e dos consumidores para debater questões gerais relativas à implementação
da legislação comunitária. Excluir-se-iam, porém, do âmbito de tais reuniões questões
relativas à não observância da legislação comunitária por parte da legislação nacional,
as quais continuariam a ser abordadas em conformidade com os procedimentos
vigentes na Comissão.

3. Controlo e aplicação

De acordo com o Tratado, a responsabilidade pelo controlo e aplicação das regras


comunitárias incumbe sobretudo às autoridades competentes dos Estados-membros. A
legislação comunitária tem vindo tradicionalmente a adoptar a prática dos Estados-
membros de estabelecer regras específicas para a inspecção dos alimentos de origem
animal e princípios mais gerais para a inspecção de outros alimentos.

O principal papel da Comunidade no domínio do controlo não é substituir os controlos


e a execução efectuados pelas autoridades competentes dos Estados-membros, mas
sim verificar o modo como elas estão a implementar a legislação relevante nos
respectivos países.

46
Para assegurar a independência e a eficácia das actividades de controlo empreendidas a
nível comunitário, a Comissão procedeu à revisão da organização dos seus serviços de
inspecção e controlo e apresentou ao Conselho e ao Parlamento Europeu uma
comunicação sobre a suafriturapolítica neste domínio. Dado o contributo importante
das actividade de controlo no que respeita à implementação eficaz da legislação
comunitária, a qual envolve a cooperação entre a Comissão e as autoridades nacionais,
a Comissão solicita observações das partes interessadas sobre esta sua nova política.

3.1 Controlos veterinários

A legislação relativa aos controlos dos alimentos de origem animal no sector


veterinário está totalmente harmonizada a nível comunitário, através de directivas
verticais que estabelecem as medidas de controlo de cada produto ou classe de
produtos (carne fresca, carne de aves de capoeira, produtos à base de carne, peixe e
produtos das pescas, leite e produtos lácteos, etc.). Estas regras estão actualmente a
ser analisadas com vista à elaboração de uma versão codificada e simplificada (ver
ponto 8.1 da parte II).

Na actual hierarquia de controlos, o produtor é o primeiro responsável pela elaboração


de alimentos adequados para consumo humano; as autoridades nacionais de controlo
são responsáveis pela aplicação quotidiana das regras comunitárias relativas aos
produtos específicos em questão; e o organismo de inspecção da Comissão é
responsável pela verificação de que as autoridades nacionais estejam a aplicar as regras
comunitárias de modo eficaz e uniforme. Será necessário analisar a actual divisão de
responsabilidades no que respeita ao controlo dos alimentos. Esta questão terá de ser
abordada no âmbito do actual processo de simplificação da legislação veterinária,
tendo em conta a análise interna da Comissão sobre os seus serviços de inspecção e
controlo.

A Comissão patrocina cursos de formação periódicos que congregam inspectores


veterinários de vários Estados-membros com vista à coordenação do modo como
abordam a aplicação da legislação comunitária.

O Gabinete Comunitário de Inspecção e Controlo Veterinário e Fitossanitário foi


incumbido da execução de verificações pontuais nos Estados-membros e em países
terceiros que exportem para a Comunidade animais ou produtos animais. Este
Gabinete foi recentemente transferido para a DG XXTV (Política dos consumidores),
e, para reconhecer as suas funções, passou a designar-se 'Gabinete Comunitário de
Controlo de Qualidade e Auditoria dos Produtos". Está incumbido de monitorizar as
acções das autoridades de controlo nacionais no que respeita à verificação da
implementação da legislação comunitária relevante, muito embora as não substitua.
Actualmente, este Gabinete apenas está em condições de desempenhar uma parte das
suas funções previstas na legislação comunitária.

A Comissão analisou o papel, responsabilidades e modo de funcionamento deste


Gabinete e apresentou uma comunicação sobre esta questão ao Conselho e ao
Parlamento Europeu.

47
3.2 Outros controlos oficiais dos produtos alimentares

A legislação comunitária estabeleceu os princípios gerais sobre o controlo oficial dos


produtos alimentares. O controlo envolve a inspecção, a amostragem e a análise, a
inspecção da higiene do pessoal e a análise de material escrito e documental e dos
sistemas de verificação instituídos pelas empresas. As inspecções irão abranger todas
as fases da produção, fabrico, importação para a Comunidade, transformação,
armazenamento, transporte, distribuição e comércio. Os produtos destinados a outros
Estados-membros comunitários devem ser controlados com cuidado idêntico ao
utilizado nos produtos destinados a ser comercializados no Estado-membro em
questão e um produto não pode ser excluído de um controlo apenas por se destinar a
ser exportado pela Comunidade.

Além disso, foram desenvolvidos procedimentos de cooperação administrativa entre os


Estados-membros sobre questões relativas ao controlo e à aplicação, por forma a
assegurar que os controlos necessários se processem de modo eficaz e uniforme a nível
de toda a Comunidade. Por conseguinte, a Comissão institui anualmente um programa
coordenado de controlo dos produtos alimentares. Os Estados-membros procedem ao
intercâmbio de dados estatísticos sobre o funcionamento dos sistemas de controlo, o
número de inspecções efectuadas e o carácter das infracções detectadas. As
autoridades competentes dos Estados-membros devem prestar-se reciprocamente
assistência administrativa em todos os procedimentos de supervisão relacionados com
as disposições legais e com as normas de qualidade aplicáveis aos produtos
alimentares, bem como em todos os procedimentos de infracção da legislação
alimentar. No âmbito do programa Karolus, está a verificar-se um intercâmbio de
inspectores alimentares nacionais. Para além disso, foi instituída uma pequena unidade
comunitária centralizada de controlo alimentar, destinada a verificar a equivalência e a
eficiência dos sistemas nacionais de controlo. Estes inspectores estão actualmente a
concluir o seu primeiro programa de visitas a cada um dos Estados-membros.

Estas actividades destinam-se a facilitar o funcionamento do mercado interno, através


da criação de uma confiança recíproca entre os inspectores nacionais, deixando assim
de ser necessário repetir controlos de produtos produzidos noutros Estados-membros.

No entanto, há que sublinhar que os organismos oficiais de inspecção dos Estados-


membros dispõem de recursos limitados e não podem inspeccionar todos os lotes de
todos os produtos colocados no mercado, cujo consumo de produtos alimentares é
estimado em cerca de 500 000 ecus.

Além disso, tendo em conta os procedimentos de controlo da qualidade e segurança


desenvolvidos pela indústria nos últimos anos, não seria adequado proceder a
inspecções oficiais sistemáticas.

Assim, as inspecções oficiais em todos os países industrializados estão a incidir cada


vez mais na adequação e fiabilidade dos procedimentos de controlo interno das
empresas sobre a observância dos objectivos de conformidade dos produtos. Isto
significa que os recursos públicos estão a ser usados mais eficazmente, uma vez que as
autoridades de inspecção podem concentrar o seu esforço nas empresas cuja actividade

48
dê origem a preocupação e reduzir afrequênciadas inspecções oficiais das empresas
que tenham introduzido sistemasfiáveise adequados de controlo.

Afigura-se, portanto, adequado, caso se imponha uma obrigação de segurança às


empresas alimentares, incluir nas disposições comunitárias um requisito geral de que os
organismos oficiais de inspecção determinem a intensidade e a frequência das
inspecções não só em função do nível de risco associado aos produtos alimentares e às
operações em questão, como também em função da adequação e fiabilidade dos
procedimentos internos introduzidos pelas empresas para assegurar e verificar que os
produtos alimentares observam as normas estipuladas. A aplicação deste princípio iria
harmonizar as disposições gerais sobre a inspecção dos produtos alimentares com o
artigo 8o da directiva genérica relativa à higiene alimentar, a qual prevê que todas as
instalações alimentares sejam inspeccionadas com uma frequência que depende do
risco a elas associado. Além disso, no que respeita ao funcionamento dos sistemas de
controlo, há que atender devidamente a novos instrumentos que estão a ser
desenvolvidos pela indústria, como indicadores da frescura, os quais podem ser
utilizados para detectar se existiu ou não uma falha na cadeia de frio aquando da
distribuição de um produto.

Por último, manifestou-se preocupação pela falta de transparência de determinados


aspectos das actividades de inspecção e controlo alimentar e pelo não acesso dos
consumidores aos trabalhos dos sistemas de inspecção. Estas questões foram
abordadas na Comunicação da Comissão relativa à saúde dos consumidores e à
segurança alimentar.

4. Sanções

Na sua comunicação sobre o papel das sanções na implementação da legislação


comunitária relativa ao mercado interno (COM(95) 162 final), a Comissão concluiu
que as sanções estabelecidas pelos Estados-membros no que respeita à legislação sobre
infracções ao mercado interno deveriam ser equivalentes às sanções previstas em
disposições equivalentes da legislação nacional, eficazes, proporcionadas e dissuasivas.
Estes princípios gerais foram adoptados pelo Conselho Mercado Interno, na sua
Resolução de 6 de Junho de 1996. Afigura-se, portanto, que estes princípios devem ser
introduzidos na legislação alimentar comunitária. A Comissão solicita observações
sobre esta questão.

5. Gestão do mercado interno em áreas não harmonizadas

Nos sectores não harmonizados a nível comunitário, a jurisprudência do Tribunal de


Justiça constitui a base da garantia da livre circulação de produtos alimentares. O
principal instrumento de gestão do mercado interno continua a ser a aplicação do
princípio do reconhecimento mútuo, que decorre da jurisprudência do Tribunal de
Justiça no acórdão relativo ao Cassis de Dijon.

Nas suas comunicações interpretativas, a Comissão apresentou a interpretação que faz


dos princípios relativos à livre circulação dos produtos alimentares tendo em conta a
jurisprudência do Tribunal. Assim, por exemplo, na sua comunicação de 1989 sobre a
livre circulação de produtos alimentares na Comunidade, a Comissão apresentou a sua

49
interpretação das regras aplicáveis na ausência de legislação comunitária. Os Estados-
membros devem admitir nos respectivos territórios produtos alimentares legalmente
produzidos e comercializados noutros Estados-membros. Na ausência de regras
harmonizadas a nível comunitário, a importação e comercialização de tais produtos
alimentares apenas pode ser restringida se tal medida:

- for comprovadamente necessária para satisfazer os requisitos obrigatórios (saúde


pública, protecção dos consumidores, lealdade das transacções comerciais e protecção
ambiental);
- for proporcional ao objectivo pretendido; e
- for o meio que crie menos entraves às trocas comerciais para que se alcance esse
objectivo.

Nestas comunicações, a Comissão descreveu igualmente os principais problemas


específicos ligados à livre circulação de produtos alimentares, nomeadamente:

- A descrição da mercadoria (ou seja, o nome sob que o produto alimentar importado
pode ser vendido);
- A presença de aditivos nos produtos alimentares.

Subsequentemente, os principais problemas descritos nas comunicações parecem ter


sido resolvidos em larga medida, em virtude quer da harmonização da legislação quer
da evolução da jurisprudência do Tribunal. No entanto, surgiram outras áreas
problemáticas, como as referidas na secção 8 da parte II.

No passado, a Comissão dispôs de dois grandes mecanismos de gestão do mercado


interno em sectores não harmonizados:

- A análise dos projectos de regulamentação técnica nacional notificados ao abrigo da


Directiva 83/189/CEE (abordada na secção 7 da parte II);
- A investigação de queixas de infracção por parte dos Estados-membros das regras
sobre a livre circulação de mercadorias estabelecidas nos artigos 30° a 36° do Tratado.
Apesar de algumas reticências por parte da indústria no que respeita à apresentação de
queixas formais à Comissão, o sector alimentar ainda é a principal fonte de queixas
recebidas pela Comissão ao abrigo dos artigos 30° a 36° do Tratado. A Comissão
tomou várias medidas de racionalização e aceleramento dos procedimentos relativos às
queixas. Além disso, poder-se-á recorrer a uma outra alternativa, que é a apresentação
da queixa a tribunais nacionais, e, se necessário, a tomada de uma decisão a título
prejudicial do Tribunal de Justiça, em conformidade com o artigo 177°.

A partir de 1 de Janeiro de 1997, a Comissão passou a dispor de um importante


mecanismo novo de gestão do mercado interno. Em conformidade com o disposto na
Decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece um procedimento de
informação mútua relativo a medidas nacionais que derrogam ao princípio da livre
circulação de mercadorias na Comunidade, os Estados-membros devem informar a
Comissão sobre todas as medidas que impeçam a livre circulação de um tipo ou
modelo de produto legalmente produzido ou comercializado noutro Estado-membro,
sem prejuízo do disposto na decisão. A implementação progressiva deste novo
procedimento permite que a Comissão proceda a uma análise mais rigorosa da

50
verdadeira situação do mercado interno, bem como, se necessário, adopte medidas
correctivas.

A Comissão solicita observações sobre a livre circulação de produtos alimentares em


áreas não harmonizadas, nomeadamente sobre se os princípios acima descritos foram
ou não integralmente implementados a nível nacional e permanecem ou não válidos.

51
PARTE VI
DIMENSÃO EXTERNA

1. Generalidades

As implicações da legislação alimentar comunitária não se limitam apenas à


Comunidade. Em conformidade com o Acordo sobre o EEE, a legislação comunitária
aplica-se à Noruega e à Islândia e passará dentro em breve a aplicar-se ao
Liechtenstein. Os países candidatos da Europa Central e Oriental e Chipre estão a
adoptar a respectiva legislação com vista à aplicação de regras comunitárias como
forma de preparação para a adesão à Comunidade. O acordo de união aduaneira entre
a Comunidade e a Turquia prevê a harmonização da legislação e as negociações com a
Suíça estão já numa fase avançada. Vários países terceiros estão também a utilizar a
legislação comunitária, a qual reflecte de perto frequentemente as normas
internacionais relevantes estabelecidas no Codex Alimentarius, como modelo para a
respectiva legislação.

Os princípios do mercado interno aplicam-se igualmente às mercadorias provenientes


de países não membros que estejam em livre circulação. Estes produtos devem
observar todos os requisitos previstos na legislação comunitária para os produtos
produzidos a nível da Comunidade. No que respeita aos produtos alimentares de
origem animal ou vegetal, existem procedimentos específicos de inspecção e
certificação veterinária e fitossanitária que se aplicam no local de entrada na
Comunidade, bem como controlos específicos ligados às normas de qualidade de
frutos e vegetais não transformados para exportação e importação. A Comissão
também efectua inspecções em países não comunitários.

Noutros casos, não existem procedimentos específicos de inspecção ou certificação


das importações e exportações. Os controlos de produtos fazem-se de modo aleatório,
no local de entrada ou de destino, podendo as actividades dos importadores estar
também sujeitas a controlos. Poderá ser necessário analisar uma melhor coordenação
dos controlos das importações. Vale a pena recordar que os produtos alimentares
fazem parte da lista de produtos mais especificamente abrangidos pelos controlos
efectuados ao abrigo do Regulamento (CEE) n° 339/93, relativo aos controlos da
conformidade dos produtos importados de países terceiros com as regras aplicáveis em
matéria de segurança dos produtos.

Para além de ser um grande importador de alimentos, a Comunidade é também um seu


grande exportador. De facto, calcula-se que, em 1996, a Comunidade apresente um
excedente da balança comercial superior a 10 000 milhões de ecus no que respeita aos
produtos alimentares e bebidas. Nestas circunstâncias, importa assegurar que a
legislação interna da Comunidade tranquilize os seus principais parceiros comerciais e
que as exportações da Comunidade não deparem com entraves injustificados no que
respeita ao acesso aos mercados externos.

Nos últimos anos, assistiu-se a alterações importantes do sistema de trocas comerciais


multilaterais aplicável aos produtos alimentares, bem como das relações bilaterais entre
a Comunidade e os seus principais parceiros comerciais.

52
2. Dimensão multilateral

As recentes alterações introduzidas pelos Acordos OMC e as ligadas ao Codex


Alimentariustiveramimpacto na legislação alimentar.

2.1 Acordos OMC

Vários dos acordos celebrados no final do Uruguay Round tiveram repercussões


importantes no sector alimentar. O Acordo relativo à Agricultura está a ter impacto
significativo nas condições das trocas comerciais internacionais de produtos
alimentares. A implementação do Acordo relativo aos Aspectos Comerciais dos
Direitos de Propriedade Intelectual irá facilitar o reconhecimento internacional das
denominações de origem e dos certificados de especificidade que tenham sido
concedidos em conformidade com a regulamentação comunitária relevante. No
entanto, as consequências mais importantes para a legislação alimentar comunitária são
as que decorrem da alteração do Acordo relativo aos Entraves Técnicos às Trocas
Comerciais (TBT _ Technical Barriers to Trade) e do novo Acordo relativo às
Medidas Sanitárias e Fitossanitárias (SPS _ Sanitary and PhytoSanitary measures).

Estes dois acordos destinam-se a evitar que a legislação técnica com vista à protecção
da saúde humana e da segurança, à protecção da saúde e da vida do ser humano, dos
animais e das plantas, à protecção do consumidor em relação a práticas enganosas e à
protecção ambiental crie ou conduza a entraves injustificados às trocas comerciais
internacionais. A Comunidade é participante pleno em ambos os acordos, que,
portanto, se aplicam quer à legislação comunitária quer à adoptada pelos Estados-
membros.

Os acordos incentivam os membros da OMC a participar integralmente no


desenvolvimento de normas internacionais harmonizadas por forma a diminuir os
entraves às trocas comerciais resultantes de regras nacionais contraditórias. Se, ao
elaborar uma medida, um membro observar estas normas, directrizes e recomendações
elaboradas pelas organizações internacionais relevantes, considera-se que tal medida
observa o disposto nos acordos. No entanto, ambos os acordos reconhecem o direito
dos membros, enquanto entidades soberanas, estabelecerem medidas que prevejam um
maior grau de protecção do que o previsto nas normas internacionais relevantes, desde
que estas medidas não conduzam a entraves injustificáveis às trocas comerciais
internacionais.

Para fomentar a transparência, ambos os acordos prevêem a notificação dos projectos


de medidas que possam afectar as trocas comerciais internacionais, possibilitando
assim que os restantes membros da OMC formulem comentários sobre elas.

O Acordo TBT aplica-se a todos os produtos, incluindo os produtos agrícolas, e


abrange todas as medidas susceptíveis de afectar as trocas comerciais internacionais.
Não se aplica, porém, às medidas sanitárias efitossanitárias,tal como definidas no
acordo SPS.

53
Para concretizar estes objectivos, o acordo estabelece vários princípios: as medidas
adoptadas pelos países contratantes devem ter objectivos legítimos; as medidas
adoptadas devem ser adequadas ou proporcionais a tais objectivos; não devem existir
alternativas que perturbem menos as trocas comerciais internacionais; e não deve
existir discriminação.

No sector alimentar, os objectivos que, ao abrigo do Acordo TBT, podem justificar


que a parte contratante adopte medidas divergentes em relação às normas
internacionais relevantes incluem: a prevenção de práticas potencialmente enganosas
(informação enganosa), a protecção da saúde e segurança humanas, a protecção da
vida ou saúde animal e a protecção do ambiente.

A justificação das medidas adoptadas para alcançar estes objectivos legítimos podem
incluir dados científicos e técnicos, métodos de processamento relacionados e a
utilizaçãofinaldos produtos.

O Acordo SPS aplica-se a medidas:


- de protecção da vida e saúde animal e vegetal em relação aos riscos associados à
entrada, estabelecimento ou disseminação de organismos prejudiciais, doenças,
organismos vectores de doença ou organismos causadores de doença;
- de protecção da vida e saúde humana ou animal em relação aos riscos de aditivos,
contaminantes, toxinas ou organismos causadores de doença presentes nos alimentos;
- de protecção da vida ou saúde humana em relação aos riscos resultantes de doenças
veiculadas por animais, plantas ou seus produtos ou em relação à entrada,
estabelecimento ou disseminação de organismos prejudiciais;
- de prevenção ou limitação de outros danos resultantes da entrada, estabelecimento
ou disseminação de organismos prejudiciais.

O objectivo básico do Acordo SPS é preservar o direito soberano de todos os


membros recorrerem ao grau de protecção sanitária que considerem adequado e
assegurar simultaneamente que este direito não seja utilizado para fins proteccionistas
nem conduza a entraves desnecessários às trocas comerciais internacionais.

As medidas adoptadas pelos membros para concretizar o grau de protecção por eles
escolhido devem basear-se na avaliação dos riscos para a saúde, tendo em conta os
dados científicos disponíveis, os processos e métodos de produção, a inspecção, os
métodos de amostragem e ensaio, e, no que respeita à vida e saúde animal e vegetal, os
factores económicos relevantes.

Estas medidas não devem ser arbitrária ou injustificadamente discriminatórias em


relação a membros em que haja condições idênticas ou análogas. Não devem ser mais
restritivas das trocas comerciais do que o necessário para que se alcance o grau de
protecção adequado, tendo em conta a exequibilidade técnica e económica. Os
membros podem introduzir ou manter medidas que conduzam a um grau de protecção
mais elevado do que o alcançado através de medidas baseadas em normas, directrizes
ou recomendações internacionais caso ele se justifique em termos científicos ou resulte
do grau de protecção que o membro decide ser adequado.

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Ao contrário do Acordo TBT, o Acordo SPS refere-se especificamente a algumas
organizações internacionais cujas normas, directrizes e recomendações considera
relevantes. Trata-se da Comissão do Codex Alimentarius, no que respeita à segurança
alimentar, do Secretariado Internacional das Epizootias, no que respeita à saúde
veterinária e às zoonoses, e da Convenção Internacional de Protecção das Plantas, no
que respeita à saúde vegetal.

Os membros da OMC que não observem as normas internacionais relevantes podem


ser interpelados de várias maneiras:

- Membros da OMC que considerem que as medidas nacionais que lhes sejam
notificadas ao abrigo dos procedimentos de notificação não estejam em conformidade
com os Acordos SPS e TBT poderão pedir uma justificação;
- As medidas nacionais podem ser submetidas aos comités responsáveis pela gestão
dos acordos; assim, por exemplo, o Acordo SPS refere que, no que respeita à
legislação com grande impacto nas trocas comerciais internacionais, cuja lista deve ser
elaborada pelo comité de gestão, os membros que não apliquem uma dada norma
internacional deverão apresentar uma justificação ao comité;
- Os diferendos podem ser ultrapassados por intermédio de painéis especiais integrados
no âmbito da OMC.

2.2 Evolução do Codex Alimentarius

Em 1962, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura e a


Organização Mundial de Saúde instituíram um comité conjunto FAO/OMS relativo ao
Codex Alimentarius destinado a elaborar normas, recomendações e directrizes com
vista à protecção da saúde dos consumidores, a assegurar a lealdade das trocas
comerciais e a facilitar as trocas comerciais internacionais. Em 1994, o Codex
apresentava 146 países membros. Criou 237 normas de artigos alimentares e 41
códigos de conduta relativos à higiene e à tecnologia alimentar. Foram avaliados 185
pesticidas, que conduziram ao estabelecimento de 3274 limites máximos de resíduos de
pesticidas. Foram igualmente avaliados 760 aditivos alimentares e 25 contaminantes,
bem como 54 medicamentos veterinários.

Em Março de 1991, numa conferência relativa às normas alimentares, aos produtos


químicos nos alimentos e às trocas comerciais internacionais, organizada pela FAO e
pela OMS em cooperação com o GATT, aproveitou-se a experiência obtida pelo
GATT para planear a evolução futura do Codex Alimentarius, bem como um novo
Acordo SPS.

O Acordo SPS atribui um estatuto de referência internacional às normas,


recomendações, directrizes e códigos de boa prática de higiene adoptados pelo Codex.

Iniciou-se uma reformulação radical das abordagens e procedimentos do Codex, por


forma a que desempenhe o papel que lhe foi atribuído no âmbito do SPS. Ela conduziu
a várias reformas destinadas a aumentar a eficácia dos procedimentos de elaboração e
adopção de normas. Além disso, está a analisar-se o conteúdo de um grande número
de normas Codex, por forma a atender aos novos Acordos OMC. No entanto, há que
clarificar e refinar ainda mais a relação do Codex com o Acordo SPS.

55
A Comunidade está empenhada em desempenhar um papel construtivo na concepção e
implementação destas novas abordagens, bem como num elevado grau de protecção da
saúde e dos consumidores, e deve certificar-se de que dispõe dos recursos necessários
para o efeito.

2.3 Consequências desta evolução para a Comunidade

Esta evolução irá acarretar várias consequências para as actividades comunitárias no


sector alimentar.

1. A Comunidade deverá cada vez mais apresentar a fundamentação científica das suas
medidas a nível internacional. As sugestões acima expostas da consulta prévia dos
comités científicos devem igualmente ser consideradas propostas ligadas às alterações
da Comunidade necessárias a nível internacional.

2. Uma vez que a Comunidade deve poder justificar medidas que divirjam das normas
internacionais relevantes, importa atender à dimensão internacional do trabalho de
avaliação científica da Comunidade. Os membros dos comités científicos da
Comunidade devem poder cooperar com os respectivos colegas, nomeadamente no
âmbito dos comités internacionais de peritos científicos, como o Comité Misto FAO-
OMS de Peritos em Aditivos Alimentares (JECFA) e a reunião Conjunta sobre
Resíduos de Pesticidas (JMPR), que são responsáveis pela elaboração de avaliações
científicas do risco, as quais constituem a base científica da elaboração das normas
Codex. Na medida do possível, há que atender a eventuais avaliações internacionais de
riscos específicos, sem diminuir, contudo, o grau de protecção a nível comunitário.

3. A nova situação constitui não só um desafio para a Comunidade, como também uma
oportunidade de assegurar que as novas medidas adoptadas pelos nossos principais
parceiros comerciais estejam em conformidade com as respectivas obrigações
internacionais. Para aproveitar ao máximo esta oportunidade, a Comunidade deve estar
preparada para mobilizar os recursos necessários para a análise das medidas elaboradas
pelos nossos parceiros comerciais. Tal apenas será possível se se verificar uma
colaboração estreita entre a Comissão, os Estados-membros e os agentes cujos
interesses estejam directamente em causa, nomeadamente a indústria e os produtores
comunitários.

4. A Comunidade deve igualmente poder desempenhar plenamente o seu papel nas


negociações efectuadas no âmbito do Codex Alimentarius e de outros fóruns que
conduzam à adopção e aceitação de normas internacionais. A participação plena da
Comunidade é essencial para assegurar a tomada em consideração dos interesses
comunitários aquando da elaboração de normas internacionais que possam ser
utilizadas como referência para avaliar a legitimidade da legislação da própria
Comunidade. A actual situação, em que a Comunidade é participante pleno nos
Acordos OMC e apenas dispõe do estatuto de observador aquando da elaboração de
normas internacionais pelo Codex, constitui uma anomalia inaceitável que há que
remediar o mais brevemente possível, através da adesão plena da Comunidade ao
Codex Alimentarius. Foi apresentada ao Conselho uma proposta neste sentido; o

56
Conselho mandatou a Comissão e iniciaram-se já negociações com o Secretariado do
Codex.

Dadas também as suas competências no domínio dafitoprotecção,e tendo em conta os


objectivos da Convenção Internacional de Fitoprotecção (IPPC _ International Plant
Protection Convention), a Comunidade está a participar na revisão da IPPC e pretende
vir a aderir a ela.

Em conclusão, há que aumentar a participação da Comunidade em iniciativas


científicas internacionais de avaliação dos riscos existentes. A Directiva 93/5/CEE,
relativa à cooperação científica, constitui já uma base para que os organismos
comunitários participem na cooperação científica internacional. A proposta do 5o
programa-quadro também prevê uma maior participação.

3. Dimensão bilateral

A evolução a nível mundial faculta igualmente um enquadramento geral em que países


individuais podem também assinar os respectivos acordos bilaterais de equivalência. O
artigo 4° do Acordo SPS promove o desenvolvimento de acordos bilaterais de
equivalência e o Comité relativo a Sistemas de Inspecção e Certificação de Alimentos
Importados/Exportados do Codex Alimentarius está igualmente a elaborar directrizes
destinadas a incentivar o desenvolvimento de acordos bilaterais. Estes acordos
permitem avaliar em termos práticos quais os sectores em que a regulamentação e as
garantias fornecidas pelos esquemas oficiais de inspecção e certificação são
consideradas equivalentes, ou seja, que, muito embora possam ser diferentes, se
considera conduzirem ao mesmo grau de protecção. O reconhecimento da equivalência
facilita as trocas comerciais através da simplificação das condições em que estas se
verificam entre os países signatários.

Estes acordos são particularmente necessários caso os sistemas legislativos se baseiem


na implementação de medidas preventivas, como as decorrentes dos princípios
HACCP, aquando da produção ou transformação. A comprovação da aplicação do
sistema apenas pode ser obtida por intermédio da inspecção das própriasfirmas,não
bastando para o efeito a inspecção do produto acabado.

Estes acordos são particularmente necessários para gerir mais eficazmente os meios
públicos de inspecção oficial sem prejudicar o grau de protecção do consumidor, uma
vez que evitam a repetição desnecessária de inspecções efectuadas de modo adequado
pelo país exportador. Além disso, poderão facilitar a cooperação técnica entre vários
países no domínio da investigação científica, bem como a elaboração da
regulamentação, dos controlos e da certificação alimentares.

Neste contexto, importa recordar que, em 21 de Setembro de 1992, o Conselho


adoptou uma decisão que autoriza a Comissão a negociar acordos de reconhecimento
mútuo entre a Comumdade e determinados países não-membros no que respeita à
avaliação da conformidade. Além disso, com base noutros mandatos atribuídos pelo
Conselho, a Comissão abriu negociações com vista a acordos bilaterais de equivalência
nos domínios veterinário efitossanitário.Foi aprovado pelo Conselho e celebrado um
acordo com a Nova Zelândia. Foi concluída e apresentada ao Conselho uma proposta

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de acordo com a República Checa. Prosseguem as negociações com outros parceiros
comerciais, nomeadamente a Austrália, o Canadá e os Estados Unidos, os países sul
americanos, designadamente a Argentina, o Chile e o Uruguai, e os países associados
da Europa Central e Oriental.

Para facilitar o desenvolvimento de acordos de equivalência fora dos domínios


veterinário e fitossanitário, haverá que ponderar a suplementação das disposições
existentes sobre os controlos oficiais por intermédio de medidas destinadas a:

- assegurar que as inspecções de produtos importados ou exportados observem as


regras internacionais, designadamente ao atenderem à proporcionalidade em relação
aos riscos, tal como foi acima proposto, e ao permitirem atender a acordos de
reconhecimento de equivalência;
- permitir que a equipa específica de funcionários comunitários responsável pela
avaliação e verificação da equivalência e eficácia dos sistemas oficiais de controlo
alimentar dos Estados-membros, tal como indicado na Directiva 93/99/CEE, possa
também cooperar com os Estados-membros na avaliação e inspecção dos sistemas
oficiais de controlo de países não membros no âmbito da negociação e gestão dos
acordos de reconhecimento de equivalência.

Além disso, a Comunidade dispõe de vários acordos bilaterais com os seus principais
parceiros comerciais sobre questões regulamentares relacionadas com o sector
alimentar, nomeadamente o diálogo transatlântico e a cooperação regulamentar.

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ISSN 0257-9553

COM(97) 176 final

DOCUMENTOS

PT 03 06 01 10

N.° de catálogo : CB-C0-97-196-PT-C

ISBN 92-78-19513-8

Serviço das Publicações Oficiais das Comunidades Europeias


L-2985 Luxemburgo

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