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CAPACITAÇÃO

CÓDIGO DE ÉTICA
E DOCUMENTOS
PSICOLÓGICOS
APOSTILA
APOSTILA DIDÁTICA
DIDÁTICA
CONTEÚDO
CONTEÚDO
PROGRAMÁTICO
PROGRAMÁTICO

OS PRINCÍPIOS ÉTICOS E TÉCNICOS QUE EMBASAM A


PRODUÇÃO DOS DOCUMENTOS PSICOLÓGICOS,
CONFORME A RESOLUÇÃO 6/2019;

A LINGUAGEM TÉCNICA UTILIZADA NA PRODUÇÃO DOS


DOCUMENTOS PSICOLÓGICOS;

OS OBJETIVOS, MODELOS E CONTEÚDOS QUE DEVEM


CONSTAR NA PRODUÇÃO DOS SEGUINTES
DOCUMENTOS:

- DECLARAÇÃO;
- ATESTADO PSICOLÓGICO;
- RELATÓRIO PSICOLÓGICO;
- RELATÓRIO MULTIPROFISSIONAL;
- LAUDO PSICOLÓGICO;
- PARECER PSICOLÓGICO.
CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA

RESOLUÇÃO CFP 06/2019 COMENTADA


ORIENTAÇÕES SOBRE ELABORAÇÃO DE DOCUMENTOS ESCRITOS
PRODUZIDOS PELA(O) PSICÓLOGA(O) NO EXERCÍCIO PROFISSIONAL

I- Apresentação

A elaboração de documentos escritos produzidos pela(o) psicóloga(o) em


sua prática profissional tem sido pauta no Sistema Conselhos de Psicologia
desde 2001, com o objetivo de fornecer diretrizes para as(os) psicólogas(os),
e garantir maior uniformidade e qualidade na produção desses documentos.
Na construção histórica das normativas a respeito desta temática,
destacamos as seguintes resoluções que versaram sobre elaboração de
documentos escritos produzidos por psicólogas(os): Resolução CFP n.º
30/2001, posteriormente revogada pela Resolução CFP n.º 17/2002 e pela
Resolução CFP n.º 07/2003.
A Resolução CFP n.º 07/ 2003, revogada pela atual normativa, contemplava
um Manual de Elaboração de Documentos Escritos produzidos pela(o)
psicóloga(o), com foco na prestação de serviços decorrentes de avaliação
psicológica e organizado sobre os seguintes itens: princípios norteadores;
modalidades de documentos; conceito/finalidade/estrutura; validade e
guarda dos documentos.
Considerando a complexidade do exercício profissional da(o) psicóloga(o), a
Resolução CFP n.º 06/2019 foi construída de modo a ampliar o leque de
documentos psicológicos para aqueles decorrentes do exercício profissional
nos mais variados campos de atuação, fornecendo os subsídios éticos e
técnicos necessários para a elaboração qualificada da comunicação escrita.
Nesse sentido, a presente Resolução avança ao separar os documentos que
são provenientes de avaliação psicológica de outros relativos às diversas
formas de atuação da(o) psicóloga(o), ao estabelecer o Relatório
Multiprofissional e, também, ao regulamentar aspectos referentes ao
destino e envio de documentos e fatores relacionados à entrevista
devolutiva.
Este documento foi produzido com o objetivo de orientar as(os)
psicólogas(os) sobre a Resolução CFP n.º 06/2019, de grande importância
para a categoria profissional, destacando a responsabilidade da(o)
psicóloga(o) ao produzir documentos psicológicos.
Brasília, 11 de setembro de 2019.
Grupo de Trabalho da APAF para revisão da Resolução n.º 07/2003 -
Conselho Federal de Psicologia
Grupo de Trabalho para elaboração da versão comentada da Resolução CFP
nº. 06/2019, composto por: Alessandra Gotuzo Seabra, Caroline Barbosa
Roseiro, Losiley Alves Pinheiro, Mari Ângela Calderari Oliveira, Mércia
Capistrano Oliveira e Comissão Consultiva em Avaliação Psicológica do CFP.

II - Comentários e Fundamentações sobre a Resolução


RESOLUÇÃO n.º 6, DE 29 DE MARÇO DE
2019

Institui regras para a elaboração de


documentos escritos produzidos pela(o)
psicóloga(o) no exercício profissional e
revoga a Resolução CFP n.º 15/1996, a
Resolução CFP n.º 07/2003 e a Resolução
CFP n.º 04/2019.

O CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, no uso das atribuições legais e


regimentais, conferidas pela Lei n.º 5.766, de 20 de dezembro de 1971;
CONSIDERANDO que a(o) psicóloga(o), no exercício profissional, tem sido
solicitada(o) a apresentar informações documentais com objetivos diversos
e a necessidade de editar normativas que forneçam subsídio à(ao)
psicóloga(o) para a produção qualificada de documentos escritos;
CONSIDERANDO os princípios éticos fundamentais que norteiam a atividade
profissional da(o) psicóloga(o) e os dispositivos sobre avaliação psicológica
contidos na Resolução CFP n.º 10/2005, que institui o Código de Ética
Profissional do Psicólogo — diploma que disciplina e normatiza a relação
entre as práticas profissionais e a sociedade que as legitima —, cujo
conhecimento e cumprimento se constitui como condição mínima para o
exercício profissional;
CONSIDERANDO que a Psicologia no Brasil tem, nos últimos anos, se
deparado com demandas sociais que exigem da(o) psicóloga(o) uma
atuação transformadora e significativa, com papel mais ativo na promoção
e respeito aos direitos humanos, ponderando as implicações sociais
decorrentes da finalidade do uso dos documentos escritos produzidos
pelas(os) psicólogas(os);
CONSIDERANDO que, com o objetivo de garantir a valorização da
autonomia, da participação sem discriminação, de uma saúde mental que
sustente uma vida digna às pessoas, grupos e instituições, a(o) psicóloga(o)
encontra-se inserida(o) em diferentes setores de nossa sociedade,
conquistando espaços emergentes que exigem normatizações que balizem
sua ação com competência e ética;
CONSIDERANDO que a(o) psicóloga(o) deve pautar sua atuação profissional
no uso diversificado de conhecimentos, técnicas e procedimentos,
devidamente reconhecidos pela comunidade científica, que se configuram
nas formas de avaliação e intervenção sobre as pessoas, grupos e
instituições;
CONSIDERANDO que a(o) psicóloga(o) deve atuar com autonomia
intelectual e visão interdisciplinar, potencializando sua atitude investigativa
e reflexiva para o desenvolvimento de uma percepção crítica da realidade
diante das demandas das diversidades individuais, grupais e institucionais,
sendo capaz de consolidar o conhecimento da Psicologia com padrões de
excelência ética, técnica e científica em favor dos direitos humanos;
CONSIDERANDO que a(o) psicóloga(o) deve: construir argumentos
consistentes da observação de fenômenos psicológicos; empregar
referenciais teóricos e técnicos pertinentes em uma visão crítica, autônoma
e eficiente; atuar de acordo com os princípios fundamentais dos direitos
humanos; promover a relação entre ciência, tecnologia e sociedade;
garantir atenção à saúde; respeitar o contexto ecológico, a qualidade de
vida e o bem-estar dos indivíduos e das coletividades, considerando sua
diversidade;
CONSIDERANDO a complexidade do exercício profissional da(o)
psicóloga(o), tanto em processos de trabalho que envolvem a avaliação
psicológica como em processos que envolvem o raciocínio psicológico, e a
necessidade de orientar a(o) psicóloga(o) para a construção de documentos
decorrentes do exercício profissional nos mais variados campos de atuação,
fornecendo os subsídios éticos e técnicos necessários para a elaboração
qualificada da comunicação escrita;
CONSIDERANDO que toda a ação da(o) psicóloga(o) demanda um raciocínio
psicológico, caracterizado por uma atitude avaliativa, compreensiva,
integradora e contínua, que deve orientar a atuação nos diferentes campos
da Psicologia e estar relacionado ao contexto que origina a demanda;

CONSIDERANDO que um processo de avaliação psicológica se caracteriza


por uma ação sistemática e delimitada no tempo, com a finalidade de
diagnóstico ou não, que utiliza de fontes de informações fundamentais e
complementares com o propósito de uma investigação realizada a partir de
uma coleta de dados, estudo e interpretação de fenômenos e processos
psicológicos;
CONSIDERANDO a função social do Sistema Conselhos de Psicologia em
contribuir para o aprimoramento da qualidade técnico-científica dos
métodos e procedimentos psicológicos;
CONSIDERANDO a Resolução CFP n.º 01/1999, que estabelece normas de
atuação para as(os) psicólogas(os) em relação à questão da orientação
sexual; Resolução CFP n.º 18/2002, que estabelece normas de atuação para
as(os) psicólogas(os) em relação ao preconceito e à discriminação racial; a
Resolução CFP n.º 01/2009, alterada pela Resolução CFP n.º 05/2010, que
dispõe sobre a obrigatoriedade do registro documental decorrente da
prestação de serviços psicológicos; a Resolução CFP n.º 01/2018, que
estabelece normas de atuação para as(os) psicólogas(os) em relação às
pessoas transexuais e travestis, e a Resolução CFP n.º 09/2018 que
estabelece diretrizes para a realização de Avaliação Psicológica no exercício
profissional da(o) psicóloga(o), regulamenta o Sistema de Avaliação de
Testes Psicológicos (SATEPSI) e revoga as Resoluções n.º 02/2003,
n.º 06/2004 e n.º 005/2012, e Notas Técnicas n.º 01/2017 e 02/2017;
CONSIDERANDO que as(os) psicólogas(os) são profissionais que atuam
também na área da saúde, em conformidade com a caracterização da
Organização Internacional do Trabalho, Organização Mundial da Saúde e
Classificação Brasileira de Ocupação;
CONSIDERANDO que o artigo 13, parágrafo 1.º, da Lei n.º 4.119, de 27 de
agosto de 1962, estabelece que é função da(o) psicóloga(o) a elaboração de
diagnóstico psicológico;
CONSIDERANDO a Resolução n.º 218, de 06 de março de 1997, do Conselho
Nacional de Saúde, que reconhece as(os) psicóloga(os) como profissionais
de saúde de nível superior;
CONSIDERANDO a decisão deste Plenário em sessão realizada no dia 23 de
fevereiro de 2019;

RESOLVE:

Capítulo I
Disposições Gerais
Art. 1.º Instituir as regras para a elaboração de documentos escritos
produzidos pela(o) psicóloga(o) no exercício profissional.
Parágrafo único. A presente Resolução tem como objetivos orientar a(o)
psicóloga(o) na elaboração de documentos escritos produzidos no exercício
da sua profissão e fornecer os subsídios éticos e técnicos necessários para a
produção qualificada da comunicação escrita.
Art. 2.º As regras para a elaboração, guarda, destino e envio de documentos
escritos produzidos pela(o) psicóloga(o) no exercício profissional, referido
no artigo anterior, encontram-se dispostas nos seguintes itens:
I - Princípios fundamentais na elaboração de documentos psicológicos;
II - Modalidades de documentos;
III - Conceito, finalidade e estrutura;
IV - Guarda dos documentos e condições de guarda;
V - Destino e envio de documentos;
VI - Prazo de validade do conteúdo dos documentos;
VII - Entrevista devolutiva.

Art. 3.º Toda e qualquer comunicação por escrito, decorrente do exercício


profissional da(o) psicóloga(o), deverá seguir as diretrizes descritas nesta
Resolução.
§ 1.º Os casos omissos, ou dúvidas sobre matéria desta normativa, serão
resolvidos pela orientação e jurisprudência firmada pelos Conselhos
Regionais de Psicologia e, naquilo que se aplicar, solucionadas pelo
Conselho Federal de Psicologia, de acordo com os termos previstos no artigo
6.º, alíneas g e h da Lei n.º 5.766/1971, artigo 13, item XII, do decreto
n.º 79.822/1977, artigo 22 do Código de Ética Profissional do Psicólogo
(Resolução CFP n.º 010/2005), ou legislações que venham a alterá-las ou
substituí-las, preservando o mérito aqui disposto.
§ 2.º A não-observância da presente norma constitui falta ético-disciplinar,
passível de capitulação nos dispositivos referentes ao exercício profissional
do Código de Ética Profissional do Psicólogo, sem prejuízo de outros que
possam ser arguidos.
Capítulo II
Disposições Especiais

Seção I
Princípios Fundamentais na Elaboração de Documentos Psicológicos

Documento Psicológico
Art. 4.º O documento psicológico constitui instrumento de comunicação
escrita resultante da prestação de serviço psicológico à pessoa, grupo ou
instituição.

§ 1.º A confecção do documento psicológico deve ser realizada mediante


solicitação da(o) usuária(o) do serviço de Psicologia, de seus responsáveis
legais, de uma(um) profissional específico, das equipes multidisciplinares ou
das autoridades, ou ser resultado de um processo de avaliação psicológica.

§ 2.º O documento psicológico sistematiza uma conduta profissional na


relação direta de um serviço prestado à pessoa, grupo ou instituição.

§ 3.º A(O) psicóloga(o) deverá adotar, como princípios fundamentais na


elaboração de seus documentos, as técnicas da linguagem escrita formal
(conforme artigo 6.º desta Resolução) e os princípios éticos, técnicos e
científicos da profissão (conforme artigos 5.º e 7.º desta Resolução).

§ 4.º De acordo com os deveres fundamentais previstos no Código de Ética


Profissional do Psicólogo, na prestação de serviços psicológicos, as(os)
envolvidas(os) no processo possuem o direito de receber informações sobre
os objetivos e resultados do serviço prestado, bem como ter acesso ao
documento produzido pela atividade da(o) psicóloga(o).

Princípios Técnicos
Art. 5.º Os documentos psicológicos devem ser elaborados conforme os
princípios de qualidade técnica e científica presentes neste regulamento.
§ 1.º Os documentos emitidos pela(o) psicóloga(o) concretizam informações
fundamentais e devem conter dados fidedignos que validam a construção
do pensamento psicológico e a finalidade a que se destina.
§ 2.º A elaboração de documento decorrente do serviço prestado no
exercício da profissão deve considerar que este é o resultado de uma
avaliação e/ou intervenção psicológica, observando os condicionantes
históricos e sociais e seus efeitos nos fenômenos psicológicos.
§ 3.º O documento escrito resultante da prestação de serviços psicológicos
deve considerar a natureza dinâmica, não definitiva e não cristalizada do
fenômeno psicológico.
§ 4.º Ao produzir documentos escritos, a(o) psicóloga(o) deve se basear no
que dispõe o artigo 1.º, alínea "c", do Código de Ética Profissional do
Psicólogo, prestando serviços psicológicos de qualidade, em condições de
trabalho dignas e apropriadas à natureza desses serviços, utilizando
princípios, conhecimentos e técnicas reconhecidamente fundamentados na
ciência psicológica, na ética e na legislação profissional.
§ 5.º Na realização da Avaliação Psicológica, ao produzir documentos
escritos, a(o) psicóloga(o) deve se basear no que dispõe o artigo 2.º da
Resolução CFP n.º 09/2018, fundamentando sua decisão, obrigatoriamente,
em métodos, técnicas e instrumentos psicológicos reconhecidos
cientificamente para uso na prática profissional da(o) psicóloga(o) (fontes
fundamentais de informação), podendo, a depender do contexto, recorrer
a procedimentos e recursos auxiliares (fontes complementares de
informação).
§ 6.º A(O) psicóloga(o) deve resguardar os cuidados com o sigilo profissional,
conforme previsto nos artigos 9.º e 10 do Código de Ética Profissional do
Psicólogo.
§ 7.º Ao elaborar um documento em que seja necessário referenciar
material teórico técnico, as referências devem ser colocadas,
preferencialmente, em nota de rodapé, observando a especificidade do
documento produzido.
§ 8.º Toda e qualquer modalidade de documento deverá ter todas as laudas
numeradas, rubricadas da primeira até a penúltima lauda, e a assinatura
da(o) psicóloga(o) na última página.

Princípios da Linguagem Técnica


Art. 6.º O documento psicológico constitui instrumento de comunicação
que tem como objetivo registrar o serviço prestado pela(o) psicóloga(o).
§ 1.º A(o) psicóloga(o), ao redigir o documento psicológico, deve expressar-
se de maneira precisa, expondo o raciocínio psicológico resultante da sua
atuação profissional.
§ 2.º O texto do documento deve ser construído com frases e parágrafos
que resultem de uma articulação de ideias, caracterizando uma sequência
lógica de posicionamentos que representem o nexo causal resultante de seu
raciocínio.
§ 3.º A linguagem escrita deve basear-se nas normas cultas da língua
portuguesa, na técnica da Psicologia, na objetividade da comunicação e na
garantia dos direitos humanos (observando os Princípios Fundamentais do
Código de Ética Profissional do Psicólogo e as Resoluções CFP
n.º 01/1999, 18/2002 e 01/2018, ou outras que venham a alterá-las ou
substituí-las).
§ 4.º Os documentos psicológicos devem ser escritos de forma impessoal,
na terceira pessoa, com coerência que expresse a ordenação de ideias e a
interdependência dos diferentes itens da estrutura do documento.

§ 5.º Os documentos psicológicos não devem apresentar descrições literais


dos atendimentos realizados, salvo quando tais descrições se justifiquem
tecnicamente.

Princípios Éticos
Art. 7.º Na elaboração de documento psicológico, a(o) psicóloga(o) baseará
suas informações na observância do Código de Ética Profissional do
Psicólogo, além de outros dispositivos de Resoluções específicas.
§ 1.º De modo especial, deverão ser observados os Princípios Fundamentais
e os seguintes dispositivos normativos:
I - artigo 1.º, alíneas “b”, “c”, “f”, “g”, “h”, “i”, do Código de Ética Profissional
do Psicólogo;
II - artigo 2.º, alíneas “f”, “g”, “h”, “j", “k”, “q”, do Código de Ética Profissional
do Psicólogo;
III - artigo 11, do Código de Ética Profissional do Psicólogo;
IV - artigo 12, do Código de Ética Profissional do Psicólogo;
V - artigo 18, do Código de Ética Profissional do Psicólogo.
§ 2.º Devem ser observados, ainda, os deveres da(o) psicóloga(o) no que diz
respeito ao sigilo profissional em relação às equipes interdisciplinares, às
relações com a justiça e com as políticas públicas, e o alcance das
informações na garantia dos direitos humanos, identificando riscos e
compromissos do alcance social do documento elaborado.
§ 3.º À(Ao) psicóloga(o) é vedado, sob toda e qualquer condição, o uso dos
instrumentos, técnicas psicológicas e experiência profissional de forma a
sustentar modelo institucional e ideológico de segregação dos diferentes
modos de subjetivação.
§ 4.º Sempre que o trabalho exigir, poderá a(o) psicóloga(o), mediante
fundamentação, intervir sobre a demanda e construir um projeto de
trabalho que aponte para a reformulação dos condicionantes que provocam
o sofrimento psíquico, a violação dos direitos humanos e a manutenção ou
prática de preconceito, discriminação, violência e exploração como formas
de dominação e segregação.
§ 5.º A(O) psicóloga(o) deve prestar serviço responsável e de qualidade,
observando os princípios éticos e o compromisso social da Psicologia, de
modo que a demanda, tal como formulada, seja compreendida como efeito
de uma situação de grande complexidade.
§ 6.º É dever da(o) psicóloga(o) elaborar e fornecer documentos
psicológicos sempre que solicitada(o) ou quando finalizado um processo de
avaliação psicológica, conforme artigo 4.º desta Resolução.
§ 7.º A(O) psicóloga(o) fica responsável ética e disciplinarmente pelo
cumprimento das disposições deste artigo, sem prejuízo da
responsabilidade civil e criminal decorrentes das informações que fizerem
constar nos documentos psicológicos.

Seção II
Modalidades de Documentos

Art. 8.º Constituem modalidades de documentos psicológicos:

I - Declaração;
II - Atestado Psicológico;
III - Relatório:
a) Psicológico;
b) Multiprofissional;
IV - Laudo Psicológico;
V - Parecer Psicológico.

Seção III
Conceito, Finalidade E Estrutura

DECLARAÇÃO - Conceito e finalidade

Art. 9.º Declaração consiste em um documento escrito que tem por


finalidade registrar, de forma objetiva e sucinta, informações sobre a
prestação de serviço realizado ou em realização, abrangendo as seguinte
informações:

I - Comparecimento da pessoa atendida e seu(sua) acompanhante;


II - Acompanhamento psicológico realizado ou em realização;
III - Informações sobre tempo de acompanhamento, dias e horários.

§ 1.º É vedado o registro de sintomas, situações ou estados psicológicos na


Declaração.

Estrutura
§ 2.º A declaração deve apresentar as informações da estrutura detalhada
abaixo, em forma de itens ou texto corrido:
I - Título: "Declaração"
II - Expor no texto:
a) Nome da pessoa atendida: identificação do nome completo ou nome
social completo;
b) Finalidade: descrição da razão ou motivo do documento;
c) Informações sobre local, dias, horários e duração do acompanhamento
psicológico.
III - O documento deve ser encerrado com indicação do local, data de
emissão e carimbo, em que conste nome completo ou nome social completo
da(o) psicóloga(o), acrescido de sua inscrição profissional e assinatura.

Comentários e Fundamentação:
A Declaração é o documento psicológico mais objetivo e sucinto entre
todos. Responde a solicitações pontuais que visam a informar situações que
envolvem dia(s), horários e tempo de atendimento da(o) paciente/cliente
e/ou da pessoa que a(o) acompanha.
Diferente do Atestado Psicológico, a declaração NUNCA deve apresentar
registro de sintomas, estados psicológicos, ou qualquer outra informação
que diga respeito ao funcionamento psicológico da pessoa atendida.
A especificação da finalidade do documento é essencial e refere-se a um
item obrigatório. É por meio da identificação da finalidade ou motivo do
documento que a(o) psicóloga(o) se resguarda em relação ao uso dado ao
documento depois de sua entrega.
ATESTADO PSICOLÓGICO - Conceito e finalidade
Art. 10 Atestado psicólogo consiste em um documento que certifica, com
fundamento em um diagnóstico psicológico, uma determinada situação,
estado ou funcionamento psicológico, com a finalidade de afirmar as
condições psicológicas de quem, por requerimento, o solicita.
§ 1.º O atestado presta-se também a comunicar o diagnóstico de condições
mentais que incapacitem a pessoa atendida, com fins de:
I - Justificar faltas e impedimentos;
II - Justificar estar apto ou não para atividades específicas (manusear arma
de fogo, dirigir veículo motorizado no trânsito, assumir cargo público ou
privado, entre outros), após realização de um processo de avaliação
psicológica, dentro do rigor técnico e ético que subscrevem a Resolução CFP
n.º 09/2018 e a presente, ou outras que venham a alterá-las ou substituí-
las;
III - Solicitar afastamento e/ou dispensa, subsidiada na afirmação atestada
do fato.
§ 2.º Diferente da declaração, o atestado psicológico resulta de uma
avaliação psicológica. É responsabilidade da(o) psicóloga(o) atestar
somente o que foi verificado no processo de avaliação e que esteja dentro
do âmbito de sua competência profissional.
§ 3.º A emissão de atestado deve estar fundamentada no registro
documental, conforme dispõe a Resolução CFP n.º 01/2009 ou aquelas que
venham a alterá-la ou substituí-la, não isentando a(o) psicóloga(o) de
guardar os registros em seus arquivos profissionais, pelo prazo estipulado
nesta resolução.
§ 4.º Os Conselhos Regionais podem, no prazo de até cinco anos, solicitar
à(ao) psicóloga(o) a apresentação da fundamentação técnico-científica do
atestado.

Estrutura

§ 5.º A formulação desse documento deve restringir-se à informação


solicitada, contendo expressamente o fato constatado.
I - As informações deverão estar registradas em texto corrido, separadas
apenas pela pontuação, sem parágrafos, evitando, com isso, riscos de
adulteração.
II - No caso em que seja necessária a utilização de parágrafos, a(o)
psicóloga(o) deverá preencher esses espaços com traços.
§ 6.º O atestado psicológico deve apresentar as informações da estrutura
detalhada abaixo:
I - Título: "Atestado Psicológico";
II - Nome da pessoa ou instituição atendida: identificação do nome completo
ou nome social completo e, quando necessário, outras informações sócio
demográficas;
III - Nome da(o) solicitante: identificação de quem solicitou o documento,
especificando se a solicitação foi realizada pelo Poder Judiciário, por
empresas, instituições públicas ou privadas, pela(o) própria(o) usuária(o) do
processo de trabalho prestado ou por outras(os) interessadas(os);
IV - Finalidade: descrição da razão ou motivo do pedido;
V - Descrição das condições psicológicas do beneficiário do serviço
psicológico advindas do raciocínio psicológico ou processo de avaliação
psicológica realizado, respondendo a finalidade deste. Quando
justificadamente necessário, fica facultado à(ao) psicóloga(o) o uso da
Classificação Internacional de Doenças (CID) ou outras Classificações de
diagnóstico, científica e socialmente reconhecidas, como fonte para
enquadramento de diagnóstico;
VI - O documento deve ser encerrado com indicação do local, data de
emissão, carimbo, em que conste nome completo ou nome social completo
da(do) psicóloga(o), acrescido de sua inscrição profissional, com todas as
laudas numeradas, rubricadas da primeira até a penúltima lauda, e a
assinatura da(o) psicóloga(o) na última página.
§ 7.º É facultado à(ao) psicóloga(o) destacar, ao final do atestado
psicológico, que este não poderá ser utilizado para fins diferentes do
apontado no item de identificação, que possui caráter sigiloso e que se trata
de documento extrajudicial.
Cabe ressaltar que, em geral, em processos legais e da justiça do trabalho a
descrição no documento do número do CID que caracteriza o diagnóstico do
paciente é imprescindível. Nestes casos, a solicitação de autorização por
escrito da pessoa atendida para divulgação do número do CID no
documento se faz necessária.

Comentários e Fundamentação:
O atestado é oriundo de um processo de avaliação psicológica, realizado
para verificar determinada situação ou condição do estado psicológico
(diagnóstico psicológico). Ressalta-se que o diagnóstico psicológico a que se
refere o Art. 10 não corresponde a diagnóstico nosológico, mas sim a
descriçao de estado psicológico relativo aos construtos avaliados. Desta
forma, o atestado psicológico serve para informar sobre a saúde mental do
avaliando a partir de evidências científicas encontradas no âmbito da ciência
psicológica.
Nos processos de avaliação psicológica compulsória, o documento a ser
emitido pela(o) psicóloga(o) deverá ser o atestado psicológico. Contudo,
quando solicitado, a(o) psicóloga(o), além do atestado psicológico pode
emitir também um laudo psicológico.
Vale ressaltar que o documento atestado psicológico indica a necessidade
de afastamento e/ou dispensa da pessoa baseado na avaliação de aspectos
psicológicos. Contudo, cabe observar aspectos legais relativos a esse
afastamento e/ou dispensa. Por exemplo, nos casos em que a(o)
psicóloga(o) perceba a necessidade de afastamento laboral da pessoa
atendida por um período superior a quinze dias, a orientação, de acordo
com a legislação brasileira, é encaminhar a pessoa atendida ao INSS.
A(o) psicóloga(o) deve manter em seus arquivos uma cópia dos atestados
psicológicos emitidos, junto a todo o material resultante do processo
avaliativo, protocolado com data, local e assinatura de quem recebeu o
documento, para fins de comprovação e fiscalização.

RELATÓRIO PSICOLÓGICO - Conceito e finalidade


Art. 11 O relatório psicológico consiste em um documento que, por meio de
uma exposição escrita, descritiva e circunstanciada, considera os
condicionantes históricos e sociais da pessoa, grupo ou instituição atendida,
podendo também ter caráter informativo. Visa a comunicar a atuação
profissional da(o) psicóloga(o) em diferentes processos de trabalho já
desenvolvidos ou em desenvolvimento, podendo gerar orientações,
recomendações, encaminhamentos e intervenções pertinentes à situação
descrita no documento, não tendo como finalidade produzir diagnóstico
psicológico.
I - O relatório psicológico é uma peça de natureza e valor técnico-científico,
devendo conter narrativa detalhada e didática, com precisão e harmonia. A
linguagem utilizada deve ser acessível e compreensível à(ao) destinatária(o),
respeitando os preceitos do Código de Ética Profissional do Psicólogo.
II - Deve ser construído com base no registro documental elaborado pela(o)
psicóloga(o), em conformidade com a Resolução CFP n.º 01/2009 ou
resoluções que venham a alterá-la ou substituí-la.
III - O relatório psicológico não corresponde à descrição literal das sessões,
atendimento ou acolhimento realizado, salvo quando tal descrição se
justifique tecnicamente. Este deve explicitar a demanda, os procedimentos
e o raciocínio técnico-científico da(o) profissional, bem como suas
conclusões e/ou recomendações.
Estrutura

§ 1.º O relatório psicológico deve apresentar as informações da estrutura


detalhada abaixo, em forma de itens ou texto corrido.
I - O relatório psicológico é composto de cinco itens:
a) Identificação;
b) Descrição da demanda;
c) Procedimento;
d) Análise;
e) Conclusão.

Identificação
§ 2.º Neste item, a(o) psicóloga(o) deve fazer constar no documento:
I - Título: "Relatório Psicológico";
II - Nome da pessoa ou instituição atendida: identificação do nome completo
ou nome social completo e, quando necessário, outras informações sócio
demográficas;
III - Nome da(o) solicitante: identificação de quem solicitou o documento,
especificando se a solicitação foi realizada pelo Poder Judiciário, por
empresas, instituições públicas ou privadas, pela(o) própria(o) usuária(o) do
processo de trabalho prestado ou por outras(os) interessadas(os);
IV - Finalidade: descrição da razão ou motivo do pedido;
V - Nome da(o) autora(or): identificação do nome completo ou nome social
completo da(o) psicóloga(o) responsável pela construção do documento,
com a respectiva inscrição no Conselho Regional de Psicologia.

Descrição da demanda
§ 3.º Neste item, a(o) psicóloga(o), autora(or) do documento, deve
descrever as informações sobre o que motivou a busca pelo processo de
trabalho prestado, indicando quem forneceu as informações e as demandas
que levaram à solicitação do documento.
I - A descrição da demanda constitui requisito indispensável e deverá
apresentar o raciocínio técnico-científico que justificará procedimentos
utilizados, conforme o parágrafo 4.º deste artigo.

Procedimento
§ 4.º Neste item, a(o) psicóloga(o) autora(or) do relatório deve apresentar
o raciocínio técnico-científico que justifica o processo de trabalho utilizado
na prestação do serviço psicológico e os recursos técnico-científicos
utilizados, especificando o referencial teórico metodológico que
fundamentou suas análises, interpretações e conclusões.
I - Cumpre, à(ao) psicóloga(o) autora(or) do relatório, citar as pessoas
ouvidas no processo de trabalho desenvolvido, as informações objetivas, o
número de encontros e o tempo de duração do processo realizado.
II - Os procedimentos adotados devem ser pertinentes à complexidade do
que está sendo demandado.

Análise
§ 5.º Neste item devem constar, de forma descritiva, narrativa e analítica,
as principais características e evolução do trabalho realizado, baseando-se
em um pensamento sistêmico sobre os dados colhidos e as situações
relacionadas à demanda que envolve o processo de atendimento ou
acolhimento, sem que isso corresponda a uma descrição literal das sessões,
atendimento ou acolhimento, salvo quando tal descrição se justificar
tecnicamente.
I - A análise deve apresentar fundamentação teórica e técnica.
II - Somente deve ser relatado o que for necessário para responder a
demanda, tal qual disposto no Código de Ética Profissional do Psicólogo.
III - É vedado à(ao) psicóloga(o) fazer constar no documento afirmações de
qualquer ordem sem identificação da fonte de informação ou sem a devida
sustentação em fatos e/ou teorias.
IV - A linguagem deve ser objetiva e precisa, especialmente quando se
referir a informações de natureza subjetiva.

Conclusão

§ 6.º Neste item, a(o) psicóloga(o) autora(or) do relatório deve descrever


suas conclusões, a partir do que foi relatado na análise, considerando a
natureza dinâmica e não cristalizada do seu objeto de estudo.

I - Na conclusão pode constar encaminhamento, orientação e sugestão de


continuidade do atendimento ou acolhimento.
II - O documento deve ser encerrado com indicação do local, data de
emissão, carimbo, em que conste nome completo ou nome social completo
da(o) psicóloga(o), acrescido de sua inscrição profissional, com todas as
laudas numeradas, rubricadas da primeira até a penúltima lauda, e a
assinatura da(o) psicóloga(o) na última página.
III - É facultado à(ao) psicóloga(o) destacar, ao final do relatório, que este
não poderá ser utilizado para fins diferentes do apontado no item de
identificação, que possui caráter sigiloso, que se trata de documento
extrajudicial e que não se responsabiliza pelo uso dado ao relatório por
parte da pessoa, grupo ou instituição, após a sua entrega em entrevista
devolutiva.

Comentários e Fundamentação:
A presente Resolução inova na distinção entre Relatório e Laudo Psicológico,
visando a abarcar os diversos contextos, serviços e demandas em que a
comunicação escrita a ser elaborada por psicólogas(os) pode ocorrer. Desse
modo, a Resolução acolhe uma pluralidade de procedimentos, observações,
análises e referenciais de atuação que possam ser comunicadas com
finalidade informativa ou de intervenção pontual, resguardando-se a
autonomia profissional para definir métodos e técnicas a serem relatados e
o sigilo inerente à relação estabelecida com pessoas, grupos ou instituições
atendidas.
O Relatório Psicológico deverá atender aos objetivos dos serviços prestados;
portanto, poderá abranger finalidades diversas a depender do contexto de
solicitação. Podem ser elaborados Relatórios Psicológicos decorrentes de
visitas domiciliares, para fins de encaminhamento, sobre um único
atendimento — como em situações de orientação ou de acolhimento nos
serviços — para prestar informações de referência e de contra-referência;
para subsidiar atividades de outros profissionais, entre outras situações que
já ocorrem no exercício profissional, desde que constitua instrumento de
comunicação escrita resultante da prestação de serviço psicológico à
pessoa, grupo ou instituição, conforme artigo 4.º. Assim, deverá referir-se à
atuação da(o) psicóloga(o) e atender às Resoluções CFP n.º 01/2009 e
n.º 05/2010, que dispõe sobre a obrigatoriedade do registro documental
decorrente da prestação de serviços psicológicos bem como todas as
diretrizes éticas da profissão.
Importante distinguir o Relatório Psicológico de outros documentos
informativos que sejam de caráter administrativo ou protocolares, tais
como Relatórios de Atividades ou relatos em ofícios, que são documentos
frequentemente assinados por psicólogas(os), especialmente em serviços
públicos, mas que não são elaborados com fim de relatar o atendimento
psicológico realizado.
A estrutura descrita para o Relatório refere-se aos conteúdos que devem
constar no documento. O Relatório Psicológico refere-se a contextos e
solicitações diversas, entre os quais poderíamos mencionar
encaminhamentos, relatos de estudo de caso, relatórios de visita domiciliar,
relatórios para solicitação de ampliação de número de sessões para planos
de saúde. No item finalidade a(o) psicóloga(o) deverá apontar o contexto
e/ou solicitação que originou o documento.
O Relatório será elaborado a partir da demanda e/ou da solicitação, com
base no registro documental, ressaltando-se, porém, que não se trata de
transcrição ou de sistematização em texto desses registros. Os registros
abrangem todas as informações referentes aos serviços psicológicos ou, em
equipes multiprofissionais, também a outros atendimentos, providências e
decisões tomadas. A construção do Relatório deve tomar esses registros
como base, mas não se limita ao seu conteúdo. Portanto, se os registros são
a base do Relatório, então o trabalho desenvolvido, a demanda atendida e
a finalidade da solicitação do documento fazem parte de sua estrutura, e
devem direcionar a argumentação analítica e/ou a comunicação
informativa, a depender dos objetivos da solicitação e dos direitos das(os)
usuárias(os), salvo contextos previstos no Código de Ética Profissional do
Psicólogo e nas legislações vigentes.
Conforme o Código de Ética Profissional do Psicólogo, a solicitação de
documentos decorrentes de serviços psicológicos é condicionada ao acordo
de trabalho ou aos objetivos do serviço prestado, o que depende da relação
e contratualidade entre psicóloga(o) e pessoa(s) atendida(s) e de deveres
legais. Um apontamento importante é esse artigo parecer conflitar com as
disposições da Resolução CFP n.º 08/2010, quando diz que é vedado: “I -
Produzir documentos advindos do processo psicoterápico com a finalidade
de fornecer informações à instância judicial acerca das pessoas
atendidas, sem o consentimento formal destas últimas à exceção de
Declarações, conforme a Resolução CFP n.º 07/2003.”
Contudo, a Resolução define que se apresente a finalidade do documento e
a descrição da demanda de modo a propiciar a diferenciação necessária a
partir de cada contexto de solicitação. Isto é, a(o) psicóloga(o) tem
autonomia para decidir quais procedimentos, observações e análises serão
comunicados, a depender dos contextos de solicitação, o que estará
condicionado a resguardar as diretrizes, normativas e princípios éticos da
profissão, os quais são orientados pelo respeito e defesa dos direitos e
dignidade da pessoa humana e das coletividades, destacando-se,
especialmente, as alíneas de “e” a “h”, do artigo 1.º, bem como as alíneas
“a”, “b”, “c”, “f”, “g”, “j” e “k” do artigo 2.º do Código de Ética Profissional.
Os procedimentos a serem descritos no Relatório dizem respeito a descrição
de toda e qualquer atividade, técnica, argumentação técnico-científica e
considerações éticas utilizadas na prestação de serviço psicológico e devem
basear-se em evidências científicas.
O Relatório abrange descrições e narrativas que sejam referidas aos
procedimentos adotados, à demanda da solicitação e à evolução do
trabalho, quando houver. Pode referir-se a ações e a relatos pontuais, como
nos casos de encaminhamentos e de relatórios de visitas, ou pode referir-se
a uma exposição analítica maior, quando necessário. Ainda que contemple
análises ou considerações críticas, não cabe juízos de valor e opiniões
pessoais que não possuam respaldo na ciência psicológica. As descrições
literais apenas serão justificáveis quando forem necessárias à argumentação
desenvolvida no texto e para evidenciar o contexto de que se trata, e não
como resposta a solicitações que extrapolem a condição dos serviços
psicológicos e que prejudiquem o sigilo e outras prerrogativas éticas da
profissão.
Recomenda-se que, na conclusão, seja retomada a finalidade da emissão do
documento, registrado a entrevista devolutiva para a entrega do
documento, indicadas as possibilidades de encaminhamento ou de
continuidade dos serviços psicológicos, além de outras orientações. Essas
recomendações são fundamentais em contextos nos quais os Relatórios
Psicológicos possam subsidiar decisões pessoais e institucionais que tragam
impactos para a vida da(s) pessoa(s) atendidas, o que ocorre regularmente
nos serviços públicos e em contextos que envolvem processos judiciais.
Nesse sentido, além dos prazos definidos pelas normativas e manuais
referentes a métodos e técnicas de avaliação psicológica, que podem ser
considerados aqui por analogia, devem ser explicitados na conclusão
argumentos técnicos e éticos que delimitem não apenas a finalidade do
documento, mas também a validade temporal das informações prestadas
no documento, ressaltando-se a natureza dinâmica e não cristalizada do
objeto de estudo bem como das intervenções, ações ou análises realizadas.
RELATÓRIO MULTIPROFISSIONAL - Conceito e finalidade
Art. 12 O relatório multiprofissional é resultante da atuação da(o)
psicóloga(o) em contexto multiprofissional, podendo ser produzido em
conjunto com profissionais de outras áreas, preservando-se a autonomia e
a ética profissional dos envolvidos.
I - A(o) psicóloga(o) deve observar as mesmas características do relatório
psicológico nos termos do artigo 11.
II - As informações para o cumprimento dos objetivos da atuação
multiprofissional devem ser registradas no relatório, em conformidade com
o que institui o Código de Ética Profissional do Psicólogo em relação ao
sigilo.

Estrutura
§ 1.º O relatório multiprofissional deve apresentar, no que tange à atuação
da(o) psicóloga(o), as informações da estrutura detalhada abaixo, em forma
de itens ou texto corrido.
I - O Relatório Multiprofissional é composto de cinco itens:
a) Identificação;
b) Descrição da demanda;
c) Procedimento;
d) Análise;
e) Conclusão.

Identificação

§ 2.º Neste item, a(o) psicóloga(o) deve fazer constar no documento:


I - Título: "Relatório Multiprofissional";
II - Nome da pessoa ou instituição atendida: identificação do nome completo
ou nome social completo e, quando necessário, outras informações sócio
demográficas;
III - Nome do solicitante: identificação de quem solicitou o documento,
especificando se a solicitação foi realizada pelo Poder Judiciário, por
empresas, instituições públicas ou privadas, pela(o) própria(o) usuária(o) do
processo de trabalho prestado ou por outros interessados;
IV - Finalidade: descrição da razão ou motivo do pedido;
V - Nome das autoras(res): identificação do nome completo ou nome social
completo das(os) profissionais responsáveis pela construção do documento,
com indicação de sua categoria profissional e o respectivo registro em órgão
de classe, quando houver.

Descrição da demanda
§ 3.º Neste item, a(o) psicóloga(o), autora(or) do documento, deve
descrever as informações sobre o que motivou a busca pelo processo de
trabalho multiprofissional, indicando quem forneceu as informações e as
demandas que levaram à solicitação do documento.
I - A descrição da demanda constitui requisito indispensável e deverá
apresentar o raciocínio técnico-científico que justificará procedimentos
utilizados pela(o) psicóloga(o) e/ou pela equipe multiprofissional, conforme
o parágrafo 4.º deste artigo.
Procedimento

§ 4.º Devem ser apresentados o raciocínio técnico-científico, que justifica o


processo de trabalho realizado pela(o) psicóloga(o) e/ou pela equipe
multiprofissional, e todos os procedimentos realizados pela(o) psicóloga(o),
especificando o referencial teórico que fundamentou suas análises e
interpretações.

§ 5.º A descrição dos procedimentos e/ou técnicas privativas da Psicologia


deve vir separada das descritas pelas(os) demais profissionais.

Análise

§ 6.º Neste item orienta-se que cada profissional faça sua análise
separadamente, identificando, com subtítulo, o nome e a categoria
profissional.

§ 7.º A(O) psicóloga(o) deve seguir as orientações que constam no § 5.º do


artigo 11 desta resolução (item Análise do Relatório Psicológico).
I - O relatório multiprofissional não isenta a(o) psicóloga(o) de realizar o
registro documental, conforme Resolução CFP n.º 01/2009 ou outras que
venham a alterá-la ou substituí-la.

Conclusão
§ 8.º A conclusão do relatório multiprofissional pode ser realizada em
conjunto, principalmente nos casos em que se trate de um processo de
trabalho interdisciplinar.

§ 9.º A(O) psicóloga(o) deve elaborar a conclusão a partir do relatado na


análise, considerando a natureza dinâmica e não cristalizada do seu objeto
de estudo, podendo constar encaminhamento, orientação e sugestão de
continuidade do atendimento ou acolhimento.
I - O documento deve ser encerrado com indicação do local, data de
emissão, carimbo, em que conste nome completo ou nome social completo
dos profissionais, e os números de inscrição na sua categoria profissional,
com todas as laudas numeradas, rubricadas da primeira até a penúltima
lauda, e a assinatura da(o) psicóloga(o) na última página.
II - É facultado à(ao) psicóloga(o) destacar, ao final do relatório
multiprofissional, que este não poderá ser utilizado para fins diferentes do
apontado no item de identificação, que possui caráter sigiloso, que se trata
de documento extrajudicial e que não se responsabiliza pelo uso dado ao
relatório multiprofissional por parte da pessoa, grupo ou instituição, após a
sua entrega em entrevista devolutiva.

Comentários e Fundamentação:
Esta modalidade de documento contempla a atuação em equipes
multiprofissionais e permite a elaboração conjunta, a responsabilidade
compartilhada e referenciais interdisciplinares, resguardando-se a
autonomia das demais categorias profissionais e do contexto de cada
serviço/equipe multiprofissional.
Na atuação profissional, especialmente nas áreas da saúde, da assistência
social e do judiciário, tem se consolidado a nomenclatura “Relatório
Psicossocial”; porém, com a variedade de contextos e de composição das
equipes, a elaboração de relatórios com esta denominação abarca
organização textual e referenciais de intervenção e de argumentação
técnica muito variados. A Resolução acolhe essa diversidade e não define
qualquer impedimento para que seja utilizada essa denominação. Da
mesma forma, como define-se na modalidade de Relatório Psicológico, o
documento deve conter como título “Relatório Multiprofissional”. Contudo,
pode receber subtítulos diversos e variar em sua organização textual, a
depender do serviço, da demanda e da solicitação, resguardando a
necessidade de constar as informações especificadas na presente
Resolução. Desta forma, o Relatório Multiprofissional pode referir-se a
Relatório Informativo, Relatório de Encaminhamento, entre outras,
inclusive, podendo ser fruto de uma única intervenção/atendimento – nos
casos, por exemplo, de visitas domiciliares, atendimentos para orientação
ou de acolhimento, estudos de caso, mediação de conflitos, participação em
grupos, procedimentos de saúde realizados em equipe, entre outros.
Importante ressaltar o dever de assumir responsabilidades profissionais
somente por atividades para as quais esteja capacitado pessoal, teórica e
tecnicamente (Código de Ética Profissional, artigo 1.º, b), considerando-se
que as demandas em equipes multiprofissionais possam gerar solicitações
que extrapolem as atribuições da psicologia ou que excedam a possibilidade
de observação e análise a partir dos procedimentos realizados, ou ainda,
que não sejam pertinentes aos referenciais técnicos da(o) profissional.
Reforça-se também a observância das alíneas de “e” a “h”, no artigo 1.º do
Código de Ética Profissional, que concernem aos direitos de usuárias(os) dos
serviços psicológicos, que devem ser inegociáveis nos diversos contextos de
solicitação desses Relatórios e de outros documentos psicológicos, ainda
que sejam solicitações feitas não pela(o) usuária(o), mas por outros
profissionais, serviços e agentes públicos, inclusive quando advindas de
demandas e determinações do judiciário. O Relatório Multiprofissional é
proveniente da atuação multidisciplinar, interdisciplinar ou transdisciplinar.
Cabe observar, quanto à atuação em equipe multiprofissional, que diversos
procedimentos e referenciais são empregados e construídos de modo inter
ou transdisciplinar e, portanto, sua escrita pode ser em conjunto com outros
profissionais. Contudo, quando a atividade desenvolvida no atendimento a
pessoa/grupo/instituição consistir em métodos e técnicas privativos da
Psicologia, estes devem ser relatados em itens diferente dos demais
profissionais, destacando que foram utilizados apenas pela(o) psicóloga(o)
da equipe. Em todos os casos, a estrutura do Relatório Multiprofissional
deve contemplar o estabelecido Resolução, e conforme haja acordo com as
regulamentações das outras profissões envolvidas. A orientação para que a
análise seja destacada na organização textual também se direciona a
evidenciar argumentações, referenciais, observações, métodos e técnicas
específicos e privativos da Psicologia. Caso as informações relatadas não se
baseiem em métodos e técnicas privativas da Psicologia, a redação deste
item pode ser em conjunto com outros profissionais, nos casos em que se
trate de processos de trabalho interdisciplinares. Recomenda-se, porém,
que essa compreensão seja explicitada no texto, conforme regulamentação
das demais categorias profissionais envolvidas. Assim como na Análise, a
Conclusão pode ser redigida em conjunto com outros profissionais nos casos
em que se trate de processos de trabalho interdisciplinares. É importante o
profissional encerrar o documento com data, local e assinatura a fim de
atestar a veracidade das informações apresentadas no documento. Da
mesma forma, a rubrica em todas as páginas assim como a numeração das
mesmas é uma segurança ao profissional do conjunto do documento
elaborado.

LAUDO PSICOLÓGICO - Conceito e finalidade


Art. 13 O laudo psicológico é o resultado de um processo de avaliação
psicológica, com finalidade de subsidiar decisões relacionadas ao contexto
em que surgiu a demanda. Apresenta informações técnicas e científicas dos
fenômenos psicológicos, considerando os condicionantes históricos e
sociais da pessoa, grupo ou instituição atendida.
I - O laudo psicológico é uma peça de natureza e valor técnico-científico.
Deve conter narrativa detalhada e didática, com precisão e harmonia,
tornando-se acessível e compreensível ao destinatário, em conformidade
com os preceitos do Código de Ética Profissional do Psicólogo.
II - Deve ser construído com base no registro documental elaborado pela(o)
psicóloga(o), em conformidade com a Resolução CFP n.º 01/2009, ou outras
que venham a alterá-la ou substituí-la, e na interpretação e análise dos
dados obtidos por meio de métodos, técnicas e procedimentos
reconhecidos cientificamente para uso na prática profissional, conforme
Resolução CFP n.º 09/2018 ou outras que venham a alterá-la ou substituí-
la.
III - Deve considerar a demanda, os procedimentos e o raciocínio técnico-
científico da profissional, fundamentado teórica e tecnicamente, bem como
suas conclusões e recomendações, considerando a natureza dinâmica e não
cristalizada do seu objeto de estudo.
IV - O laudo psicológico deve apresentar os procedimentos e conclusões
gerados pelo processo de avaliação psicológica, limitando-se a fornecer as
informações necessárias e relacionadas à demanda e relatar: o
encaminhamento, as intervenções, o diagnóstico, o prognóstico, a hipótese
diagnóstica, a evolução do caso, orientação e/ou sugestão de projeto
terapêutico.
V - Nos casos em que a(o) psicóloga(o) atue em equipes multiprofissionais,
e havendo solicitação de um documento decorrente da avaliação, o laudo
psicológico ou informações decorrentes da avaliação psicológica poderão
compor um documento único.
VI - Na hipótese do inciso anterior, é indispensável que a(o) psicóloga(o)
registre informações necessárias ao cumprimento dos objetivos da atuação
multiprofissional, resguardando o caráter do documento como registro e a
forma de avaliação em equipe.
VII - Deve-se considerar o sigilo profissional na elaboração do laudo
psicológico em conjunto com equipe multiprofissional, conforme estabelece
o Código de Ética Profissional do Psicólogo.

Estrutura

§ 1.º O laudo psicológico deve apresentar as informações da estrutura


detalhada abaixo, em forma de itens.
I - O Laudo Psicológico é composto de seis itens:
a) Identificação;
b) Descrição da demanda;
c) Procedimento;
d) Análise;
e) Conclusão;
f) Referências.

Identificação

§ 2.º Neste item, a(o) psicóloga(o) deve fazer constar no documento:


I - Título: "Laudo Psicológico";
II - Nome da pessoa ou instituição atendida: identificação do nome completo
ou nome social completo e, quando necessário, outras informações sócio
demográficas;
III - Nome do solicitante: identificação de quem solicitou o documento,
especificando se a solicitação foi realizada pelo Poder Judiciário, por
empresas, instituições públicas ou privadas, pela(o) própria(o) usuária(o) do
processo de trabalho prestado ou por outras(os) interessadas(os);

IV - Finalidade: descrição da razão ou motivo do pedido;


V - Nome da(o) autora(or): identificação do nome completo ou nome social
completo da(do) psicóloga(o) responsável pela construção do documento,
com a respectiva inscrição no Conselho Regional de Psicologia.

Descrição da demanda
§ 3.º Neste item, a(o) psicóloga(o), autora(or) do documento, deve
descrever as informações sobre o que motivou a busca pelo processo de
trabalho prestado, indicando quem forneceu as informações e as demandas
que levaram à solicitação do documento.
I - A descrição da demanda constitui requisito indispensável e deverá
apresentar o raciocínio técnico-científico que justificará procedimentos
utilizados, conforme o parágrafo 4.º deste artigo.

Procedimento

§ 4.º Neste item, a(o) psicóloga(o) autora(or) do laudo deve apresentar o


raciocínio técnico-científico que justifica o processo de trabalho realizado
pela(o) psicóloga(o) e os recursos técnico-científicos utilizados no processo
de avaliação psicológica, especificando o referencial teórico metodológico
que fundamentou suas análises, interpretações e conclusões.
I - Cumpre, à(ao) autora(or) do laudo, citar as pessoas ouvidas no processo
de trabalho desenvolvido, as informações objetivas, o número de encontros
e o tempo de duração do processo realizado.
II - Os procedimentos adotados devem ser pertinentes à complexidade do
que está sendo demandado e a(o) psicóloga(o) deve atender à Resolução
CFP n.º 09/2018, ou outras que venham a alterá-la ou substituí-la.

Análise

§ 5.º Nessa parte do documento, a(o) psicóloga(o) deve fazer uma exposição
descritiva, metódica, objetiva e coerente com os dados colhidos e situações
relacionadas à demanda em sua complexidade considerando a natureza
dinâmica, não definitiva e não-cristalizada do seu objeto de estudo.
I - A análise não deve apresentar descrições literais das sessões ou
atendimentos realizados, salvo quando tais descrições se justifiquem
tecnicamente.
II - Nessa exposição, deve-se respeitar a fundamentação teórica que
sustenta o instrumental técnico utilizado, bem como os princípios éticos e
as questões relativas ao sigilo das informações. Somente deve ser relatado
o que for necessário para responder a demanda, tal qual disposto no Código
de Ética Profissional do Psicólogo.
III - A(o) psicóloga(o) não deve fazer afirmações sem sustentação em fatos
ou teorias, devendo ter linguagem objetiva e precisa, especialmente quando
se referir a dados de natureza subjetiva.
Conclusão

§ 6.º Neste item, a(o) psicóloga(o) autora(or) do laudo deve descrever suas
conclusões a partir do que foi relatado na análise, considerando a natureza
dinâmica e não cristalizada do seu objeto de estudo.
I - Na conclusão indicam-se os encaminhamentos e intervenções,
diagnóstico, prognóstico e hipótese diagnóstica, evolução do caso,
orientação ou sugestão de projeto terapêutico.
II - O documento deve ser encerrado com indicação do local, data de
emissão, carimbo, em que conste nome completo ou nome social completo
da(o) psicóloga(o), acrescido de sua inscrição profissional, com todas as
laudas numeradas, rubricadas da primeira até a penúltima lauda, e a
assinatura da(o) psicóloga(o) na última página.
III - É facultado à(ao) psicóloga(o) destacar, ao final do laudo, que este não
poderá ser utilizado para fins diferentes do apontado no item de
identificação, que possui caráter sigiloso, que se trata de documento
extrajudicial e que não se responsabiliza pelo uso dado ao laudo por parte
da pessoa, grupo ou instituição, após a sua entrega em entrevista
devolutiva.

Referências

§ 7.º Na elaboração de laudos, é obrigatória a informação das fontes


científicas ou referências bibliográficas utilizadas, em nota de rodapé,
preferencialmente.

Comentários e Fundamentação:
Destaca-se o caráter específico do laudo psicológico, diferenciando-o do
relatório psicológico. O laudo é fruto de um processo de avaliação
psicológica diante de uma demanda específica e deve apresentar os itens
descritos no § 1.º, com destaque para o procedimento conduzido, a análise
realizada e a conclusão gerada a partir desse processo de avaliação. Em
contrapartida, o relatório não envolve um processo de avaliação psicológica.
O registro documental, em conformidade com a Resolução CFP n.º 01/2009
e a Resolução CFP n.º 005/2010, inclui os “documentos produzidos pela(o)
psicóloga(o) para o usuária(o)/instituição do serviço de psicologia prestado”
e os “documentos resultantes da aplicação de instrumentos de avaliação
psicológica”, a serem arquivados conforme determinado pelas resoluções
citadas.
O título "Laudo Psicológico" deve ser usado independentemente da
orientação ou especificidade teórico-metodológica do processo. Se quiser,
o(a) psicólogo(a) poderá colocar um subtítulo especificando o processo, por
exemplo, "Laudo Psicológico – Avaliação neuropsicológica”.
O laudo psicológico deve apresentar todos os itens da estrutura
identificados separadamente.
Em Procedimento, é necessário explicitar os recursos usados, as fontes
fundamentais e complementares usadas, segundo a Resolução CFP n.º
09/2018, com citação de sua base técnica-científica e uso de referências.
Conforme os incisos V, VI e VII, o laudo psicológico poderá compor um
documento único com a equipe multiprofissional, caso as conclusões
necessárias para responder à demanda inicial sejam derivadas da integração
das avaliações individuais dos profissionais da equipe, ou seja,
ultrapassando suas avaliações disciplinares e demandando a análise
conjunta. Nesse caso, deve-se resguardar as práticas privativas da(o)
psicóloga(o), assim como sigilo profissional, conforme o inciso VII, de forma
que apenas estejam descritos os resultados necessários para que a análise
integrada seja realizada. Todos os itens de Estrutura devem estar presentes.
Ainda que alguns itens possam ser apresentados de forma conjunta no
documento multiprofissional (tais como Identificação, Descrição da
demanda, Conclusão e Referências), deve-se garantir a apresentação dos
itens Procedimento e Análise com uma redação independente por parte
da(o) psicóloga(o), pois eles fazem referência a métodos, técnicas e
procedimentos específicos da(o) profissional psicóloga(o).
A conclusão deve estar em harmonia com os demais itens do Laudo
psicológico. Nem todos os itens descritos no inciso I precisam estar descritos
na Conclusão, porém, é necessário que seja apresentada uma conclusão a
partir dos resultados e análise realizados e que alguma orientação de
encaminhamento/intervenções ou diagnóstico/hipótese diagnóstica ou
orientação/sugestão de projeto terapêutico seja oferecida.
A hipótese diagnóstica ou o diagnóstico devem ter base técnica-científica. A
critério da(o) psicóloga(o), poderão ser usados documentos classificatórios
mundialmente reconhecidos na área da saúde mental, tais como a
Classificação Internacional das Doenças (CID) ou o Manual Diagnóstico e
Estatístico de Transtornos Mentais (DSM) em suas edições mais atuais, bem
como outras teorias reconhecidas na psicologia, desde que devidamente
referenciadas. Deve-se consultar a legislação vigente a fim de garantir a
escrita apropriada a demanda.
A citação de referências é obrigatória no Laudo Psicológico. Orienta-se que
sejam colocadas em notas de rodapé a fim de que o documento seja
finalizado com a data e assinatura do profissional. Não deve ser colocada
em folha a parte, pois esta poderia ser destacada do conjunto do
documento, o que o tornaria incompleto. Destaca-se que as referências,
além de descritas em nota de rodapé, devem ser citadas ao longo do texto
como usual em materiais técnico-científicos. Por exemplo, ao nomear um
instrumento de avaliação usado, apresentar no texto a citação do manual
com sobrenomes e data e, no local apropriado (nota de rodapé), apresentar
a citação completa.

PARECER PSICOLÓGICO - Conceito e finalidade


Art. 14 O parecer psicológico é um pronunciamento por escrito, que tem
como finalidade apresentar uma análise técnica, respondendo a uma
questão-problema do campo psicológico ou a documentos psicológicos
questionados.

I - O parecer psicológico visa a dirimir dúvidas de uma questão-problema ou


documento psicológico que estão interferindo na decisão do solicitante,
sendo, portanto, uma resposta a uma consulta.
II - A elaboração de parecer psicológico exige, da(o) psicóloga(o),
conhecimento específico e competência no assunto.
III - O resultado do parecer psicológico pode ser indicativo ou conclusivo.
IV - O parecer psicológico não é um documento resultante do processo de
avaliação psicológica ou de intervenção psicológica.

Estrutura

§ 1.º O parecer psicológico deve apresentar as informações da estrutura


detalhada abaixo, em forma de itens.
I - O Parecer é composto de cinco itens:
a) Identificação;
b) Descrição da demanda
c) Análise;
d) Conclusão;
e) Referências.

Identificação
§ 2.º Neste item, a(o) psicóloga(o) deve fazer constar no documento:
I - Título: "Parecer Psicológico";
II - Nome da pessoa ou instituição objeto do questionamento (ou do
parecer): identificação do nome completo ou nome social completo e,
quando necessário, outras informações sócio demográficas da pessoa ou
instituição cuja dúvida ou questionamento se refere;
III - Nome do solicitante: identificação de quem solicitou o documento,
especificando se a solicitação foi realizada pelo Poder Judiciário, por
empresas, instituições públicas ou privadas, pela(o) própria(o) usuária(o) do
processo de trabalho prestado ou outros interessados;
IV - Finalidade: descrição da razão ou motivo do pedido;
V - Nome da(o) autora(or): identificação do nome completo ou nome social
completo da(o) psicóloga(o) responsável pela construção do documento,
com a respectiva inscrição no Conselho Regional de Psicologia e titulação
que comprove o conhecimento específico e competência no assunto.

Descrição da Demanda
§ 3.º Destina-se à transcrição do objetivo da consulta ou demanda. Deve-se
apresentar as informações referentes à demanda e finalidades do parecer.
I - A descrição da demanda deve justificar a análise realizada.

Análise
§ 4.º A discussão da questão específica do Parecer Psicológico se constitui
na análise minuciosa da questão explanada e argumentada com base nos
fundamentos éticos, técnicos e/ou conceituais da Psicologia, bem como nas
normativas vigentes que regulam e orientam o exercício profissional.

Conclusão
§ 5.º Neste item, a(o) psicóloga(o) apresenta seu posicionamento sobre a
questão-problema ou documentos psicológicos questionados.

I - O documento deve ser encerrado com indicação do local, data de


emissão, carimbo, em que conste nome completo ou nome social completo
da(o) psicóloga(o), acrescido de sua inscrição profissional, com todas as
laudas numeradas, rubricadas da primeira até a penúltima lauda, e a
assinatura da(o) psicóloga(o) na última página.
II - É facultado à(ao) psicóloga(o) destacar, ao final do parecer, que este não
poderá ser utilizado para fins diferentes do apontado no item de
identificação, que possui caráter sigiloso, que se trata de documento
extrajudicial e que não se responsabiliza pelo uso dado ao parecer por parte
da pessoa, grupo ou instituição, após a sua entrega ao beneficiário,
responsável legal e/ou solicitante do serviço prestado.

Referências
§ 6.º Na elaboração de pareceres psicológicos, é obrigatória a informação
das fontes científicas ou referências bibliográficas utilizadas, em nota de
rodapé, preferencialmente.

Comentários e Fundamentação:
De acordo com a definição, o Parecer Psicológico é um documento em que
a(o) parecerista emite o seu ponto de vista fundamentado cientificamente
sobre uma questão solicitada que está relacionada ao âmbito da Psicologia
e, portanto, não é decorrente de avaliação ou intervenção psicológica
realizada pela parecerista. O parecer pode ser unicamente teórico, fruto do
conhecimento científico da profissional acerca de um tema (questão
específica ou ampla). Exemplo de situações onde se aplica a emissão de um
parecer são: quando alguém solicita um parecer sobre se “o teste de
Rorschach é confiável e válido para o seu uso no contexto jurídico”. Neste
caso, o parecerista, especialista na área, irá emitir um parecer
demonstrando cientificamente como o teste Rorschach é adequado para
avaliação neste caso e contexto específico.
Quando há a solicitação de apreciação de um documento produzido por
outra(o) psicóloga(o). Por exemplo, em situações de perícias psicológicas
em que é solicitado à(ao) psicóloga(o) assistente técnica(o) de uma das
partes um parecer acerca do Laudo Psicológico elaborado pela perita
nomeada pelo juiz. Neste caso, a análise do documento é feita, avaliando se
o documento atende os preceitos científicos, técnicos e éticos da Psicologia.
Assim, a(o) assistente poderia, com base em estudos científicos, questionar
resultados de testes (ou de outras técnicas) aplicados pela(o) perita(o), fazer
objeções aos seus diagnósticos e conclusões, como também apoiá-los,
sempre fundamentando-se na ciência, na técnica e normativas da
Psicologia.
A construção do parecer precisa ser bem fundamentada, de forma que as
contestações ou ratificações apontadas no documento analisado fiquem
explícitas. Por isso, esse tipo de documento demanda uma expertise.
Como nos demais documentos produzidos pela(o) psicóloga(o), as
referências devem ser colocadas preferencialmente em nota de rodapé
pois, por se tratar de um documento, é aconselhável que este termine com
a data e assinatura de quem o emite.

Seção IV
Guarda dos Documentos e Condições de Guarda

Art. 15 Os documentos escritos decorrentes da prestação de serviços


psicológicos, bem como todo o material que os fundamentaram, sejam eles
em forma física ou digital, deverão ser guardados pelo prazo mínimo de
cinco anos, conforme Resolução CFP n.º 01/2009 ou outras que venham a
alterá-la ou substituí-la.
§ 1.º A responsabilidade pela guarda do material cabe à(ao) psicóloga(o),
em conjunto com a instituição em que ocorreu a prestação dos serviços
profissionais.
§ 2.º Esse prazo poderá ser ampliado nos casos previstos em lei, por
determinação judicial, ou em casos específicos em que as circunstâncias
determinem que seja necessária a manutenção da guarda por maior tempo.
§ 3.º No caso de interrupção do trabalho da(do) psicóloga(o), por quaisquer
motivos, o destino dos documentos deverá seguir o recomendado no artigo
15 do Código de Ética Profissional do Psicólogo.

Comentários e Fundamentação:
A necessidade de guarda do material se faz pelo zelo e segurança da(o)
psicóloga(o). Assim, em caso de fiscalização ou questionamentos, a(o)
profissional terá condição de apresentar o material que levou à sua
conclusão técnico científica.
O material, de fato, pertence à instituição em que foi realizado o serviço,
porém, cabe à(ao) psicóloga(o) adequar o local para garantir o sigilo
necessário, de acordo com as resoluções vigentes, a saber o Código de Ética
Profissional e a Resolução CFP n.º 01/2009.
Em caso de desligamento da(o) psicóloga(o), o material permanece na
instituição. O repasse deve seguir ao indicado no Código de Ética
Profissional, e inclui a entrega do material com termo de repasse à nova
profissional que venha a assumir o serviço ou lacre junto à fiscal do CRP da
jurisdição.
Destaca-se que cabe à(ao) psicóloga(o) que realizou o serviço ou
intervenção concluir o trabalho com a emissão do documento que atenda à
demanda realizada. Assim, não restarão pendências em sua atuação,
mesmo por ocasião do desligamento.

Seção V
Destino e Envio de Documentos

Art. 16 Os documentos produzidos pela(o) psicóloga(o) devem ser


entregues diretamente ao beneficiário da prestação do serviço psicológico,
ao seu responsável legal e/ou ao solicitante, em entrevista devolutiva.
§ 1.º É obrigatório que a(o) psicóloga(o) mantenha protocolo de entrega de
documentos, com assinatura do solicitante, comprovando que este
efetivamente o recebeu e que se responsabiliza pelo uso e sigilo das
informações contidas no documento.
§ 2.º Os documentos produzidos poderão ser arquivados em versão
impressa, para apresentação no caso de fiscalização do Conselho Regional
de Psicologia ou instâncias judiciais, em conformidade com os parâmetros
estabelecidos na Resolução CFP n.º 01/2009 ou outras que venham a alterá-
la ou substituí-la.

Comentários e Fundamentação:
O beneficiário do serviço prestado sempre tem direito ao documento final,
mesmo que este tenha sido solicitado por órgãos ou instituições. Neste
caso, cabe a entrevista devolutiva, que deve funcionar como uma
elucidação verbal daquilo que está escrito no documento. Sugere-se que,
quando se tratar de resultados pra CNH ou Polícia Federal, entre outros,
para o órgão seja liberado apenas aquilo que o beneficiário necessita para o
trâmite de suas ações, ficando a(o) psicóloga(o) com a cópia do documento
completo que foi repassado ao cliente, assinado por este, comprovando a
entrega.
Respeitando a Resolução CFP n.º 11/2018, que trata de atendimentos
realizados por TICs, em caso de entrega de documentos neste parâmetro, é
obrigatória a assinatura (certificação) digital da profissional e o protocolo de
entrega pode ser a resposta ao endereço de correio eletrônico de envio, em
que o cliente confirma o recebimento.
Sugere-se a emissão de uma cópia do documento produzido em que o
usuário assina que recebeu uma cópia idêntica e data; tal material deve ser
acrescentado ao registro documental do usuário e arquivado em conjunto.
Caso isso não seja possível por algum motivo como, por exemplo, pela
evasão da(o) paciente, sugere-se o registro do contato e tentativa de
devolutiva no prontuário do mesmo.
Ressalta-se que os documentos que podem ser entregues às(aos) pacientes
são os aqui apresentados nesta Resolução e não protocolos de testes
psicológicos.
Sugere-se a guarda física deste material; porém, em caso de registros ou
prontuários eletrônicos, todo material adicional à intervenção que tenha
sido utilizado precisa estar salvaguardado, por exemplo, em caso de uso de
testes psicológicos, a folha de protocolo deve ser escaneada e anexada ao
registro digital.

Seção VI
Prazo de Validade do Conteúdo dos Documentos

Art. 17 O prazo de validade do conteúdo do documento escrito, decorrente


da prestação de serviços psicológicos, deverá ser indicado no último
parágrafo do documento.
§ 1.º A validade indicada deverá considerar a normatização vigente na área
em que atua a(o) psicóloga(o), bem como a natureza dinâmica do trabalho
realizado e a necessidade de atualização contínua das informações.
§ 2.º Não havendo definição normativa, o prazo de validade deve ser
indicado pela(o) psicóloga(o), levando em consideração os objetivos da
prestação do serviço, os procedimentos utilizados, os aspectos subjetivos e
dinâmicos analisados e as conclusões obtidas.

Comentários e Fundamentação:
Este item deve ser considerado para os seguintes documentos: Atestado
Psicológico, Laudo Psicológico e Relatório Psicológico. A permanência deste
item na Resolução foi considerada com o objetivo de assegurar a informação
do caráter dinâmico e não determinista do funcionamento dos fenômenos
psicológicos envolvidos em processos avaliativos e de intervenção dos quais
decorrem os documentos emitidos pela(o) profissional da Psicologia.
Desta forma, é essencial que a(o) psicóloga(o) se aproprie com fundamentos
teóricos, técnicos e éticos para se valer da natureza da finalidade de seu
processo de trabalho no que diz respeito a decisão sobre a validade a ser
indicada. Em cada situação a(o) psicóloga(o) deve ter autonomia para
decidir se este item será exposto por meio de informação cronológica, que
pode estar relacionada as normativas que dizem respeito aos
procedimentos utilizados, ou a outras normativas inerentes ao próprio
processo de avaliação psicológica (por exemplo, em um concurso público a
avaliação realizada terá validade somente para aquele fim). De outra forma
a validade pode estar relacionada aos aspectos qualitativos de uma
determinada fase do desenvolvimento do sujeito envolvido no processo de
trabalho da(o) psicóloga(o) como, por exemplo, em um processo de
psicoterapia de um adolescente, fase esta onde muitas mudanças são
esperadas e que o funcionamento dos fenômenos psicológicos podem
alterar-se e, portanto, há necessidade de um acompanhamento frequente
e sistemático.
Neste item a(o) psicóloga(o)também pode considerar uma validade a partir
de um prognóstico favorável levando em consideração a efetivação do
encaminhamento sugerido. Da mesma forma com um prognóstico
desfavorável caso não haja intervenção sugerida, podendo assim
recomendar nova avaliação em um tempo cronológico determinado pelo
resultado do raciocínio psicológico do profissional que resultou no
prognóstico.
Assim, é importante que a(o) psicóloga(o) compreenda que não há um
modelo de prazo de validade para todos os casos. O que vai prevalecer para
esta determinação é o entendimento da natureza do que está sendo
avaliado e da finalidade do documento que está sendo produzido. É
importante que seu documento expresse a dinamicidade dos fenômenos
psicológicos assim como os condicionantes históricos e sociais que atuam
sobre eles.

Seção VII
Entrevista Devolutiva

Art. 18 Para entrega do relatório e laudo psicológico, é dever da(o)


psicóloga(o) realizar ao menos uma entrevista devolutiva à pessoa, grupo,
instituição atendida ou responsáveis legais.
§ 1.º Na impossibilidade desta se realizar, a(o) psicóloga(o) deve explicitar
suas razões.
§ 2.º Nos demais documentos produzidos com base nesta resolução, é
recomendado à(ao) psicóloga(o), sempre que solicitado, realizar a
entrevista devolutiva.
Art. 19 Esta resolução entrará em vigor em 90 dias a partir da data de sua
publicação.
Art. 20 Revogam-se a Resolução CFP n.º 15/1996, a Resolução CFP
n.º 07/2003 e a Resolução CFP n.º 04/2019, sem prejuízo das demais
disposições em contrário.

Rogério Giannini
Conselheiro Presidente
Conselho Federal de Psicologia
DOCUMENTOS PSICOLÓGICOS: OS LAUDOS E OS
PROBLEMAS EM TORNO DE SUA ELABORAÇÃO

Rodrigo da Silva Almeida1


Dionísio Souza da Silva2
Mariana Lemos Braz3
Maria Sônia da Silva Crispim4
Gabriela Costa Moura5

Psicologia

ciências humanas e sociais

ISSN IMPRESSO 2317-1693


ISSN ELETRÔNICO 2316-672X

RESUMO

Ao longo de sua prática, o psicólogo tem sido solicitado em vários contextos a


elaborar documentos psicológicos, que se dividem em: declaração, atestado, relatório/
laudo e parecer psicológicos. O presente artigo tem como objetivo investigar sobre os
documentos psicológicos e os problemas em torno de sua elaboração. Para tanto, a
metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica, sendo o recorte deste trabalho o lau-
do psicológico, um instrumento usado sistematicamente para comunicar os resultados
de um processo avaliativo, atendendo a demanda das mais diversas áreas. Entretanto,
essa tarefa costuma ser a mais evitada pelo psicólogo, pois boa parte dos informes ela-
borados tem sido criticada por sua precária validade. Em resposta a isso, a categoria
mobilizou-se em torno dos problemas advindos da escrita e as constantes falhas téc-
nicas, incoerências e imprecisões, instituindo o Manual de Elaboração de Documentos
Produzidos por Psicólogos decorrentes de Avaliação Psicológica. Entretanto, apesar do
Manual contribuir para que o psicólogo não incorra em falhas básicas, o mesmo não é
suficiente para impedir os erros. Portanto, é necessário desconstruir o caráter ilusório
atribuído à Psicologia, como se esta oferecesse instrumentos para a compreensão inte-
gral ou mágica do sujeito.

PALAVRAS-CHAVE

Documentos Psicológicos. Informe Psicológico. Laudo Psicológico.

Ciências humanas e sociais | Maceió | v. 3 | n.1 | p. 131-148 | Novembro 2015 | periodicos.set.edu.br


132 | Cadernos de Graduação

ABSTRACT

Throughout his practice, the psychologist has been asked in various contexts to de-
velop psychological documents, which are divided into: declaration, certificate, psy-
chological report and opinion. This article aims to investigate the psychological doc-
uments and issues around its development. Therefore, the methodology used was
literature, and the clipping of this study the psychological report, an instrument used
to systematically communicate the results of an evaluation process, meeting the de-
mand from various fields. However, this task is often the most avoided by psychologist
because much of the elaborate reports have been criticized for their poor validity.
In response, the category mobilized around the issues arising from the writing and
constant technical failures, inconsistencies and inaccuracies, instituting the Docu-
ment Preparation Manual produced by psychologists arising from Psychological As-
sessment. However, despite the Manual contribute to the psychologist does not incur
basic flaws, it is not enough to prevent errors. It is therefore necessary to deconstruct
the illusory character attributed to psychology, as if it offered tools for a complete
understanding of the subject or magic.

KEYWORDS

Psychological Documents. Psychological Inform. Psychological Report.

1 INTRODUÇÃO

Ao longo de sua prática o psicólogo tem sido solicitado em vários contextos a


elaborar algum tipo de documento psicológico. Entretanto, a literatura especializada
fornece dados que possibilitam compreender que essa é a tarefa que costuma ser
mais evitada por esse profissional, pois compromete muito quem a exerce. A difi-
culdade está no fato de ser necessário muito conhecimento, experiência clínica e
dedicação; fazendo com que o profissional inseguro a evite. Isso se justifica porque
boa parte dos informes elaborados tem sido criticada por sua precária validade e des-
prezada como algo obsoleto (ARZENO, 1995).

No que se refere especificamente aos laudos psicológicos, observou-se que inú-


meras são as denúncias que têm chegado ao Conselho Federal de Psicologia (CFP)
contra psicólogos que os elaboram de forma duvidosa, e sem nenhum tipo de validade
verificável. Entretanto, o laudo psicológico, resultante do processo de avaliação psicoló-
gica diagnóstica ou de um processo terapêutico, retrata o cerne da atividade do psicó-
logo e por isso essa atividade não pode deixar de ser exercida. Diante disso, a presente
pesquisa se justifica por sua relevância em divulgar orientações sobre como elaborar
documentos psicológicos de forma correta e por discutir especificamente sobre os lau-
dos psicológicos e os processos ideológicos que permeiam a sua construção.

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Cadernos de Graduação | 133

Assim, o presente artigo discorrerá sobre os documentos psicológicos, deten-


do-se especificamente nos laudos psicológicos, onde será feita uma discussão sobre
os problemas em torno de sua elaboração. Inicialmente é apresentada a metodologia
do artigo, que consiste numa revisão bibliográfica sobre o assunto supracitado. A in-
trodução está dividida em três tópicos: o primeiro apresenta brevemente as principais
características dos documentos psicológicos. O tópico de número dois discorre so-
bre os tipos de documentos psicológicos e apresenta as peculiaridades de cada um;
seguido pelo terceiro tópico, que apresenta as tipologias de informes psicológicos,
sendo recortados os seis tipos mais comuns, que terão finalidades diferentes, a de-
pender da demanda. Posteriormente, nos resultados e discussões, aborda-se o breve
processo histórico sobre o surgimento dos laudos psicológicos e as necessidades de
regulamentar essa atividade do psicólogo.

2 METODOLOGIA

O presente artigo consiste numa revisão de literatura sobre a temática da elabo-


ração de documentos psicológicos e os problemas em torno de sua elaboração, nas
seguintes plataformas de pesquisa: Medline, Portal CAPS, Redalyc, Google Acadêmi-
co, Scielo, BVS-Psi, Site do CFP e Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações
(BDOT). Foram usados os seguintes descritores: documentos psicológicos, informe
psicológico e laudos psicológicos. Foi feita uma filtração por ano, sendo pesquisados
somente os produzidos a partir de 2003. Foram levantados dezesseis textos on-line,
divididos em seis artigos científicos, sendo descartados três deles; seis monografias,
sendo descartadas quatro e quatro teses de doutorado, sendo descartadas duas.

Ainda, foram consultados cinco livros impressos na biblioteca do Centro Universi-


tário Tiradentes (UNIT), em Maceió-AL. Assim, a elaboração deste artigo contou com o
embasamento total de 13 referências. O motivo para o descarte dos outros textos foi por
eles não atenderem aos requisitos previamente estabelecidos no recorte temático do
presente artigo. O restante dos trabalhos atenderam ao objetivo da pesquisa, servindo
de embasamento para as discussões e questionamentos apresentados.

3 BREVE PROCESSO HISTÓRICO SOBRE O SURGIMENTO DOS LAUDOS


PSICOLÓGICOS E SUAS NECESSIDADES DE REGULAMENTAÇÃO

Para Shine (2009) o laudo psicológico é um documento no qual as contradições


dos pedidos e dos desejos se fazem presentes na escritura que visa “congelar” uma
dinâmica e propor saídas pragmáticas e juridicamente válidas. Ou seja, é o meio de
apresentação do trabalho pericial e dever ser entendido como uma comunicação téc-
nico-científica de natureza oficial e que tem como destinatário o juízo que solicitou a
perícia. Além disso, o laudo em sua forma escrita possui um valor intrínseco e extrín-
seco a pesquisa como fonte de estudo pelo qual é possível fazer a conjugação dos

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conhecimentos de uma disciplina do saber, que é a Psicologia; comunicada a leigos,


porém doutores em outra área do conhecimento humano: os operadores do Direito.

Dessa forma, o psicólogo, assumindo a demanda judicial de realizar perícia psi-


cológica, torna-se um auxiliar da justiça. Para elaborar um laudo, o psicólogo precisa
estar inscrito no seu respectivo Conselho Regional de Psicologia. Isso significa que,
teoricamente, todos os psicólogos estão aptos para exercer essa atividade pericial.
Entretanto, se teoricamente todo graduado em Psicologia é especialista nessa ciência
e profissão e pode ser perito, também é verdade que os profissionais se especializam
e que certas áreas podem estar totalmente fora desse campo (SHINE, 2009).

O psicólogo mais recomendado para essa atividade é o psicólogo judiciário.


Esse especialista deve passar em concurso público e assumir suas funções nos di-
versos locais de competente. Porém, no que se refere à criação dessa modalidade
de especialidade, ainda não há nenhuma exigência formal extra para que qualquer
psicólogo devidamente inscrito no CRP possa atuar como perito, especialista em sua
área de atuação, e nomeado para tal mister na justiça. Caso o perito careça de conhe-
cimento técnico ou científico o mesmo poderá ser substituído (SHINE, 2009).

Para chegar ao momento atual, os laudos psicológicos passaram por um pro-


cesso histórico. Diante disso, o presente tópico do trabalho discorrerá de forma breve
sobre como foi o surgimento dos Laudos Psicológicos em território brasileiro, levando
em consideração Sather (2008), ao afirma que para estudar os textos psicológicos é
preciso levar-se em conta o momento histórico que os originaram. Posteriormente
será explanado sobre alguns dos problemas que permeiam a sua elaboração.

Desde que o primeiro curso de graduação em psicologia foi oficializado no


Brasil, estão presentes reflexões e revisões acerca da formação do psicólogo. Sendo
assim, pode-se considerar a inquietação com a preparação do profissional e a neces-
sidade de melhora na área como questões analisadas há algum tempo.

Segundo Noronha e outros autores (2010) a formação profissional deve ser eficien-
te para garantir uma preparação adequada aos futuros psicólogos, pois se espera que os
testes sejam utilizados por profissionais capacitados a aplicá-lo e interpretá-lo de forma
adequada, já que a maioria das críticas aos testes, além de suas características intrínsecas,
se referem, também, ao uso inadequado dos resultados por profissionais não qualificados.

Dessa forma, o percurso da Psicologia no Brasil atravessa primeiramente o


ensino nos cursos de medicina. No começo dos anos quarenta, quando a forma-
ção psicanalítica no Rio de Janeiro e em São Paulo principiou-se restritamente aos
médicos. Com o surgimento da industrialização o trabalho psicológico foi forte-
mente requisitado na demanda de tornar mais técnica a seleção de pessoal, seja na
adequação do homem à função ou na formação de lideranças para as empresas.

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Cadernos de Graduação | 135

Pouco depois do início desse tipo de trabalho, a Psicologia foi regulamentada como
profissão no Brasil em 1962, e com ela se iniciam, também, as exigências do laudo
psicológico para admissões, promoções e deslocamento de pessoal nas empresas
brasileiras (SATHER, 2008).

Esse processo teve ampla e rápida expansão nas escolas, onde os psicólogos fo-
ram sendo incorporado, também, com a função de avaliar crianças, montar classes e
fazer encaminhamentos, por meio de laudos, para escolas especializadas, que pudes-
sem corroborar para a devida assistência a crianças com problemas de aprendizagem
ou desenvolvimento (SATHER, 2008); processo que contribuiu para a rotulação dos
psicólogos como “máquinas de fazer laudos” (BARRETO; SILVA, 2011).

A partir de 1994, o laudo foi reconhecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS)
como atestado que justifica a permissão de licença de saúde ou afastamento junto à
previdência social. Após a instituição da regulamentação das condições para a con-
cessão de atestados psicológicos com o propósito de anuir à licença saúde – realiza-
da nesse mesmo ano – em 1996, dois anos depois, o CFP regulamenta a concessão
de atestados para tratamento de saúde por problemas psicológicos- Resolução CFP
n° 015/96 (SATHER, 2008).

Segundo Sather (2008) como fruto de uma mobilização da categoria sobre os


problemas advindos da escrita profissional e as constantes falhas técnicas, incoerên-
cias e imprecisões que sempre a permearam, comprometendo o entendimento e a
eficácia dos laudos, foi instituído o Manual de Elaboração de Documentos Produzidos
por Psicólogos decorrentes de Avaliações Psicológicas, no ano de 2001. O objetivo foi
criar um instrumento que responda as dúvidas mais comuns dos profissionais da área
e evite erros frequentes cometidos por eles.

Para Shine (2009) essa primeira iniciativa do CFP de normatizar os documentos


elaborados a partir de avaliações psicológicas com a Resolução n° 30/2001, foi revi-
sada posteriormente pela Resolução n° 17/2002 e finalmente, em 2003, chegou-se à
Resolução n° 007/2003, que está em vigor até o presente momento e revoga as duas
anteriores. A autora questiona sobre a rapidez com que as versões se sucederam,
processo que na opinião dela é o reflexo da grande dificuldade em se chegar a um
consenso satisfatório nessa área.

Sather (2008) corroborando com a autora Shine (2009), afirma que aparente-
mente as promulgações foram feitas emergencialmente, já que foram publicadas três
resoluções uma após a outra, sinalizando o anseio de resolver problemas, mesmo que
com a perpetração de erros e correções. Assim, é questionável por que após tantos
anos só nesse momento ser normatizada uma atividade tão corriqueira como essa,
uma vez que as atribuições legais datam de 1971.

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136 | Cadernos de Graduação

Reflete-se que o Manual não serve apenas para a orientação de profissionais,


mas, sobretudo, ao entrar em vigência, serve como argumento normativo para pena-
lidade daqueles que o não cumprirem. Entretanto, ao vigorar, o Manual serve como
argumento normativo para a punição daqueles que não o cumprem, mesmo sendo
autorizados a elaborarem laudos, pois, agora, frente a esse instrumento, não estão
(ou podem não estar) qualificados a fazê-lo. O que, na aparência, protege a categoria
pode, então, inversamente, puni-la (SATHER, 2008).

Dessa forma, na justificativa do CFP para elaboração do referido Manual, consi-


dera-se que o psicólogo tem sido solicitado a apresentar informações documentais no
exercício profissional, destacando a necessidade de referências para subsidiar a elabo-
ração qualificada de documentos decorrentes de uma avaliação psicológica. Tal de-
manda levou ainda em conta a frequência com que representações éticas surgem a
partir de queixas que questionam a qualidade dos documentos escritos (SHINE, 2009).

É dever das instituições de ensino superior possibilitar aos estudantes o


desenvolvimento de habilidades e competências necessárias para a realização da
avaliação psicológica. No Brasil a formação dos profissionais nos cursos de graduação
em Psicologia tem se mostrado insuficiente na aplicação e avaliação de testes, sem o
uso de uma análise crítica e mais apurada (NORONHA ET AL., 2010).

Além disso, a linguagem psicológica está impregnada da construção de sujeitos e


controle das populações, o que torna os laudos psicológicos um instrumento de poder
que além de classificar os sujeitos psicológicos promovem o discurso sobre a própria
profissão no âmbito de suas técnicas, funções, métodos, verdades etc.; os laudos psi-
cológicos são uma forma de poder que podem implicar em práticas de dominação e
controle. Dessa forma, estudar um texto qualquer tendo em vista sua emergência e
sobrevida deve remeter não só a examinar sua coerência interna e coesão textual, mas
também os mecanismos políticos que os estão contextualizando (SATHER, 2008).

Shine (2009) observa que o grande desafio colocado é apresentar uma lingua-
gem precisa, principalmente quando se refere os dados de natureza subjetiva. Na opi-
nião dela, é muito mais fácil “falar” do que “fazer”, principalmente porque não existe
um momento específico de treino na própria formação do psicólogo. Na opinião dela,
seria necessária uma disciplina de especialização em Psicologia Jurídica nas grades
do curso de Psicologia no Brasil. Todavia, sabe-se que esse é um processo difícil, ten-
do em vista que a ênfase na formação generalista do psicólogo em território brasileiro
ser contrária a inserção de disciplinas de especialização.

Padilha, Noronha e Fagan (2007) sugerem que é necessário que os psicólogos rea-
lizem cursos de atualização e se insiram em programas de pós-graduação para aprimorar
o conhecimento necessário para a construção e o uso dos instrumentos de avaliação.

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Cadernos de Graduação | 137

Além disso, a discussão dos problemas éticos que ocorre na disciplina de ética
profissional não dá conta das nuances e especificidades de uma atuação particular.
No que se refere à Resolução do CFP de n° 007/2003, sem dúvida alguma é uma con-
tribuição válida para os psicólogos que elaboram documentos decorrentes de uma
avaliação psicológica, uma vez que permite uma distinção entre os diversos tipos de
documentos, dando uma diretriz mínima para a sua construção (SHINE, 2009).

Entretanto, apesar do Manual contribuir para que o psicólogo não incorra em


falhas básicas, ele não é suficiente para impedir erros do psicólogo em uma área em
que é desconhecida a relação dinâmica das forças institucionais em jogo. Então, para
alcançar esse objetivo a normatização do Manual não tem e nem teria como dar conta
do conhecimento de uma atuação em uma especialidade como a Psicologia Jurídica.

Dessa forma, fica claro que a formação do psicólogo ainda não se voltou para
um melhor treino para a apresentação de dados obtidos no processo de avaliação
psicológica. Isso se justifica porque durante a formação dos graduandos em Psicolo-
gia, é comum que o ensino e o tratamento em Psicodiagnóstico são finalizados no
exato momento de se redigir um relatório psicológico; implicitamente dizendo que
após se recolher os dados necessários, de qual forma for, bem como os resultados,
não fosse tão importante o processo de transmiti-los (SHINE, 2009.

Portanto, é necessário desconstruir esse caráter ilusório que muitas vezes é


atribuído à ciência psicológica, como se ela oferecesse instrumentos para a com-
preensão integral ou quase mágica do sujeito. Isso se justifica porque a realida-
de demonstra que a Psicologia, independentemente da linha teórica empregada,
dispõe apenas de técnicas que possibilitam interpretações possíveis a respeito do
comportamento humano (FERNANDES, 2011).

4 CARACTERÍSTICAS BÁSICAS DOS DOCUMENTOS PSICOLÓGICOS

De acordo com Reppold e Serafini (2010) um grande problema quanto à ela-


boração dos documentos psicológicos se dá pelo fato de que o ensino da avaliação
psicológica e de suas técnicas, se utilizam de referenciais teóricos e científicos muitos
deles já ultrapassados, ou seja, bibliografia retrograda e não oficial, resumos e apostilas
elaborados por professores, que não acompanham a produção atual da área. O resulta-
do disso é o despreparo dos futuros profissionais em relação ao domínio de técnicas de
avaliação validadas e as diversas competências que estão na matriz do que as Diretrizes
Curriculares elucidam como condições mínimas para atuação de um psicólogo.

O CFP, no ano de 2003, ao estabelecer a Resolução nº 007/2003, institui o Ma-


nual de Elaboração de Documentos Escritos produzidos pelo psicólogo decorrentes
de avaliação psicológica. De acordo com a presente resolução, os documentos psico-
lógicos são documentos oriundos de um processo de avaliação psicológica e por isso

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possuem um valor técnico-jurídico, assumindo um caráter de comunicação oficial,


sendo sustentados por princípios científicos e formalizações.

Ao elaborar um documento psicológico, atividade exclusiva do profissional de


Psicologia, este deve principalmente observar as normas contidas no Código de Ética
Profissional do Psicólogo, o Manual de Elaboração de Documentos Decorrentes de
Avaliações Psicológicas, e utilizar-se dos instrumentais técnicos disponíveis, como os
métodos e as técnicas psicológicas, para a coleta de dados a respeito de um indivíduo
ou grupo, podendo, também, fazer uso de outros materiais e documentos produzidos
anteriormente e pertinentes à avaliação em questão (CONSELHO..., 2003).

No que se refere à estrutura gramatical dos documentos, o psicólogo preci-


sa considerar ainda três princípios fundamentais: clareza, concisão e harmonia. A
clareza é uma ordenação que possibilita a compreensão do leitor em uma redação
bem estruturada e definida, expressando absolutamente o que se quer comunicar.
Já a concisão implica numa linguagem precisa e profissional, evitando significações
da linguagem popular ou uma redação prolixa. E a harmonia possibilita a correlação
adequada das frases, evitando cacofonias (CONSELHO..., 2003).

A presente resolução orienta que a validade dos documentos psicológicos deve


considerar a legislação vigente nos casos já definidos. Caso não haja definição legal, o
psicólogo, utilizando-se de fundamentos, deverá indicar o prazo de validade, observan-
do as características avaliadas, as informações obtidas e os objetivos da avaliação. Se o
psicólogo não julgar possível o estabelecimento de um prazo, deverá informar o caráter
situacional e temporal dos dados de uma avaliação psicológica (CONSELHO..., 2003).

5 TIPOS DE DOCUMENTOS PSICOLÓGICOS

Segundo a Resolução do Conselho Federal de Psicologia (CFP), de número


007/2003, existem os seguintes tipos de documentos psicológicos: Atestado Psico-
lógico, Relatório/Laudo Psicológico, Declaração e Parecer Psicológico. A resolução
ainda esclarece que a Declaração e o Parecer Psicológico não são documentos de-
correntes de avaliação psicológica. Todavia, devido ao fato de ambos aparecerem
como se o fossem, são incluídos no referido Manual. Explicita-se a seguir sobre as
quatro tipologias de documentos:

5.1 ATESTADO PSICOLÓGICO

Consiste num documento elaborado pelo profissional da Psicologia que certifi-


ca uma determinada situação ou estado psicológico, visando afirmar sobre as condi-
ções psicológicas de que, por requerimento, o solicita com os fins de: justificar faltas
e/ou impedimentos do solicitante; justificar estar apto ou não para atividades espe-
cíficas, após realização de um processo de avaliação psicológica, enquadrada dentro

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do rigor técnico e ético que subscreve a referida resolução e solicitar afastamento e/


ou dispensa do solicitante, subsidiado na afirmação atestada do fato, em acordo com
o disposto na Resolução CFP n° 015/96. Também, é importante deixar claro que a ela-
boração desse tipo de informe psicológico deve restringir-se à informação solicitada
pelo requerente, contendo expressamente o fato constatado (CONSELHO..., 2003).

Em relação à estrutura do atestado, sua formação deve se restringir à informa-


ção que o requerente solicite, contendo exatamente o fato constatado, e ainda que
seja um documento de caráter simples, deve obedecer algumas determinações, tais
como ser exprimido em papel timbrado ou apresentar o carimbo na subscrição do
documento, onde deve constar o nome e sobrenome do psicólogo, juntamente com
sua inscrição profissional (“Nome do psicólogo / Nº da inscrição”).

O atestado deve conter, ainda: o registro do nome e sobrenome do cliente,


como também a finalidade do documento explicitada; o registro da informação do
sintoma, situação ou condições psicológicas que venham justificar o atendimento,
afastamento ou falta, podendo estar sujeito a ser registrado sob indicativo do código
da classificação internacional de doenças em vigor; o registro da data e local da ex-
pedição do atestado; também o registro do nome completo do psicólogo bem como
sua inscrição no CRP e/ou o carimbo com as mesmas informações; e por último a as-
sinatura do psicólogo acima de sua identificação ou do carimbo (CONSELHO..., 2003).

Assim, os registros devem estar separados apenas pela pontuação, sem parágrafos,
evitando, com isso, riscos de adulterações. Na necessidade de usar parágrafos, o psicó-
logo deverá fazer o preenchimento dos espaços com traços. O atestado emitido com
a finalidade expressa no item 2.1Alínea b, da resolução citada, deverá guardar relatório
correspondente ao processo de avaliação psicológica realizado, nos arquivos profissio-
nais do psicólogo, pelo prazo estipulado nessa resolução, no item V (CONSELHO..., 2003).

5.2 RELATÓRIO/ LAUDO PSICOLÓGICO

Para Shine (2009) o relatório ou laudo psicológico é um documento técnico e


científico na área da Psicologia que precisa preencher determinados requisitos. Isso
porque o laudo é uma representação descritiva acerca de situações e/ ou condições
psicológicas e suas determinações históricas, sociais, políticas e culturais, pesquisa-
das no processo de avaliação psicológica. Sem deixar de citar que o termo laudo está
diretamente ligado ao trabalho pericial, apresentando assim uma conotação especí-
fica dentro do Direito, onde é considerado como uma peça escrita e fundamentada
que permite aos peritos exporem suas observações e estudos feitos por eles, regis-
trando as conclusões da perícia.

Vendramin (2014) acrescenta que ao solicitar a elaboração de um laudo psicoló-


gico o magistrado equipara à ação do psicólogo perito com a de um inspetor policial,

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cujo objetivo é investigar e formular prova. Então, o laudo é um instrumento utilizado


pela Psicologia Jurídica e apto a transmitir as conclusões resultantes de uma avaliação
psicológica, possuindo como parâmetro basilar todos os conhecimentos oriundos da
Psicologia Clínica tradicional aplicada ao contexto forense e, quando elaborado respei-
tando as orientações do Conselho Nacional de Psicologia, pode ser considerado um
instrumento apto a servir como base probatória em determinado processo legal.

Então, o relatório ou laudo psicológico como todo documento, deve ser sub-
sidiado em dados obtidos e analisados, à luz de um instrumental técnico, como por
exemplo: entrevistas, dinâmicas, testes psicológicos, observação, exame psíquico e
intervenção verbal, consubstanciando em referencial técnico-filosófico e científico
adotado pelo psicólogo (CONSELHO..., 2003).

A finalidade desse documento será a de apresentar os procedimentos e conclusões


gerados pelo processo de avaliação psicológica, relatando a respeito do encaminhamen-
to, das intervenções, do diagnóstico, do prognóstico e evolução do caso, orientação e su-
gestão de projeto terapêutico e, caso haja necessidade, solicitação de acompanhamento
psicológico, limitando-se a fornecer apenas as informações estritamente necessárias, re-
lacionadas à demanda, solicitação ou petição (CONSELHO..., 2003).

Então, o laudo psicológico é um instrumento usado como forma sistemática de


comunicar os resultados de um processo avaliativo, sendo de grande utilidade para
atender a demanda de profissionais nas mais diversas áreas, envolvendo a tomada de
decisão ou encaminhamentos (SILVA; ALCHIERI, 2011).

Por ser uma peça de natureza e valor científicos, o laudo psicológico precisa con-
ter narrativa detalhada e didática, apresentando clareza, precisão e harmonia, tornan-
do-se acessível e compreensível ao destinatário. Para que isso seja possível, os termos
técnicos precisam estar acompanhados de explicações e/ou conceituação retiradas dos
fundamentos teórico-filosóficos que os sustentam (CONSELHO..., 2003). Além disso, o
laudo psicológico apresenta em sua estruturação cinco itens obrigatórios:

• I. Identificação: Parte superior do primeiro tópico do documento com a finalidade


de identificar: o autor/relator – quem elabora; o interessado – quem solicita; o assun-
to/finalidade – qual a razão/finalidade (CONSELHO..., 2003). Enfatizando ainda que:

No identificador AUTOR/RELATOR, deverá ser colocado o(s)


nome(s) do(s) psicólogo(s) que realizará(ão) a avaliação, com
a(s) respectiva(s) inscrição(ões) no Conselho Regional.

No identificador INTERESSADO, o psicólogo indicará o nome


do autor do pedido (se a solicitação foi da Justiça, se foi de
empresas, entidades ou do cliente).

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No identificador ASSUNTO, o psicólogo indicará a razão, o motivo


do pedido (se para acompanhamento psicológico, prorrogação
de prazo para acompanhamento ou outras razões pertinentes a
uma avaliação psicológica) (CONSELHO..., 2003, p. 8).

• II. Descrição da demanda: Parte destinada à narração das informações referen-


tes à problemática apresentada e dos motivos, razões e expectativas que produ-
ziram o pedido do documento. Também se deve apresentar a análise que se faz
da demanda de forma a justificar o procedimento adotado (CONSELHO..., 2003).

• III. Procedimento: A descrição dele apresentará os recursos e instrumentos


técnicos utilizados para coletar as informações (número de encontros, pessoas
ouvidas etc.) à luz do referencial teórico-filosófico que os embasa. O procedi-
mento adotado deve ser pertinente para avaliar a complexidade do que está
sendo demandado (CONSELHO..., 2003).

• IV. Análise: Parte do documento na qual é feita uma exposição descritiva de


forma metódica, objetiva e fiel dos dados colhidos e das situações vividas rela-
cionados à demanda em sua complexidade. Além disso:

Como apresentado nos princípios técnicos, “O processo de


avaliação psicológica deve considerar que os objetos deste
procedimento (as questões de ordem psicológica) têm
determinações históricas, sociais, econômicas e políticas, sendo,
as mesmas, elementos constitutivos no processo de subjetivação.
O DOCUMENTO, portanto, deve considerar a natureza dinâmica,
não definitiva e não cristalizada do seu objeto de estudo”.

Nessa exposição, deve-se respeitar a fundamentação teórica que


sustenta o instrumental técnico utilizado, bem como princípios
éticos e as questões relativas ao sigilo das informações. Somente
deve ser relatado o que for necessário para o esclarecimento
do encaminhamento, como disposto no Código de Ética
Profissional do Psicólogo (CONSELHO..., 2003, p. 9).

Para finalizar esse item, o psicólogo não deve fazer afirmações sem susten-
tação em fatos e/ou teorias, devendo ter linguagem precisa, principalmente
quando se referir a dados de natureza subjetiva, expressando-se de maneira
clara e exata (CONSELHO..., 2003).

• V. Conclusão: Nela, o psicólogo vai expor o resultado e/ou considerações so-


bre a sua investigação a partir das referências que subsidiaram o trabalho. As
considerações geradas pelo processo de avaliação psicológica devem transmitir

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ao solicitante a análise da demanda em sua complexidade e do processo de


avaliação psicológica como um todo (CONSELHO..., 2003).

O presente manual ainda ressalta a importância de sugestões e projetos de traba-


lho que contemplem a complexidade das variáveis envolvidas durante todo o processo.
Depois da narração conclusiva, o documento é encerrado, com indicação do local, data
de emissão, assinatura do psicólogo e o seu número de inscrição no CRP (CFP, 2003).

Portanto, o laudo uma vez escrito, constitui-se num ótimo objeto de pesquisa.
Isso se justifica porque ele é algo relativamente identificável e sua leitura permite
determinar os elementos essenciais de um caso, ou seja, as informações básicas; de-
vendo ser de fácil leitura (SHINE, 2009).

5.3 DECLARAÇÃO

Consiste num documento que objetiva informar a ocorrência de fatos ou si-


tuações objetivas relacionados ao atendimento psicológico, visando declarar três
questões: 1) Comparecimentos do atendido e/ ou do seu acompanhante, quando
necessário; 2) Acompanhamento psicológico do atendido e, finalmente, fornecer 3)
Informações sobre as condições do atendimento, o que inclui o tempo de acompa-
nhamento, os dias e os horários. Além disso, esse documento não deve apresentar o
registro de sintomas, situações ou estados psicológicos (CONSELHO..., 2003).

No que tange a estruturação, a declaração deve ser redigida em papel tim-


brado, semelhantemente ao atestado psicológico, apresentar na subscrição do
documento o carimbo, onde deve haver o nome e sobrenome do psicólogo, so-
mado a sua inscrição profissional (“Nome do psicólogo / Nº da inscrição”). A decla-
ração deve apresentar o registro do nome e sobrenome do solicitante, igualmente
a finalidade do documento, (por exemplo, para fins de comprovação); também
deve conter o registro de informações requeridas em relação ao atendimento (por
exemplo: se faz acompanhamento psicológico, em quais dias, em qual horário);
juntamente com o registro da data e local da expedição e o registro do nome
completo do psicólogo, sua inscrição no CRP ou o carimbo com as mesmas infor-
mações; e por último, deve ter a assinatura do psicólogo sobre sua identificação
do carimbo (CONSELHO..., 2003).

5.4 PARECER PSICOLÓGICO

É um documento fundamentado e resumido a respeito de uma questão focal do


campo da Psicologia, cujo resultado pode ser indicativo ou conclusivo. Sua finalidade
é apresentar uma resposta esclarecedora, no campo do conhecimento psicológico,
por meio de uma avaliação especializada, de uma “questão-problema”, com o objeti-
vo de esclarecer dúvidas que estão interferindo na decisão, sendo, dessa forma, uma

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resposta a uma consulta, exigindo daquele que responde competência no assunto


(CONSELHO..., 2003). Em relação à estrutura:

[...] O psicólogo parecerista deve fazer a análise do problema


apresentado, destacando os aspectos relevantes e opinar
a respeito, considerando os quesitos apontados e com
fundamento em referencial teórico-científico.

Havendo quesitos, o psicólogo deve respondê-los de forma sintética e convin-


cente, não deixando nenhum quesito sem resposta. Quando não houver dados para a
resposta ou quando o psicólogo não puder ser categórico, deve-se utilizar a expressão
“sem elementos de convicção”. Se o quesito estiver mal formulado, pode-se afirmar
“prejudicado”, “sem elementos” ou “aguarda evolução”. (CONSELHO..., 2003, p. 9-10).

Dessa forma, o parecer apresenta em sua estruturação quatro itens importantes:


1) A identificação, onde deve ser identificado o nome do parecerista e sua titulação,
bem como o nome do autor da solicitação e sua titulação; 2) A exposição de moti-
vos, que deve destinar-se a transcrição do propósito da consulta e dos quesitos ou à
apresentação das indagações levantadas pelo solicitante, devendo se expor a questão
em tese, sem ser necessário detalhar os procedimentos usados; 3) A análise, onde a
discussão desse tipo de documento se constitui na análise meticulosa da questão ex-
planada, esgrimida com base nos alicerces necessários, seja no âmbito ético, técnico
ou no próprio corpo conceitual da psicologia; assim, é indispensável pautar-se nas
normas de referências de trabalhos científicos para o embasamento de suas citações
e informações; e finalmente, 4) A Conclusão, onde o psicólogo explicitará seu posi-
cionamento, respondendo à questão levantada e em seguida, informar o local e data
em que foi elaborado para assim assinar o documento (CONSELHO..., 2003).

6 O INFORME PSICOLÓGICO E SEUS DIFERENTES TIPOS

De acordo com Arzeno (1995), o informe psicológico é um resumo das conclu-


sões diagnósticas e prognósticas do caso estudado e inclui muitas vezes as recomen-
dações terapêuticas adequadas ao mesmo. O informe deve constar em cada conjunto
de documentos elaborados pelo psicólogo, tanto no trabalho institucional ou particular.
Além disso, a linguagem do informe dever ser breve e simples, de forma que seja com-
preensível a todos; onde sua escrita ocorre diante da solicitação de alguém. O docu-
mento poderá ser desde uma breve síntese a um trabalho mais elaborado.

Dentre os tipos de informe destacam-se seis:

1) A um colega: Apresenta uma linguagem técnica e faz referência concreta ao


material de teste do qual foi extraída esta ou aquela conclusão; fazendo uma
descrição minuciosa da estrutura básica da personalidade, das suas ansiedades

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mais primitivas, de suas defesas mais regressivas e das mais maduras (ARZENO,
1995); podendo fazer uso, dentre outras ferramentas, das técnicas projetivas
(VERTHELYI, 2009).

2) A um professor: O informe deve ser breve, referindo-se exclusivamente ao


que o professor precisa saber, expresso em linguagem cotidiana, devendo ainda
ser tomadas precauções para que não transpareçam intimidades do caso que
não se refiram ao campo pedagógico (ARZENO, 1995).

3) A um advogado: Inicialmente deve-se tomar cuidado com os termos utili-


zados e com as informações que serão oferecidas. Normalmente esse tipo de
informe se refere a algum tipo de perícia que terá peso numa sentença, pro-
cesso que o torna um trabalho difícil, especialmente no campo penal. Além da
desconfiança e reticência do sujeito a ser estudado, o psicólogo tem sobre si
a esperança daquele que designou esse profissional; no intuito de encontrar,
nesse informe, elementos que forneçam uma maior força aos seus argumentos,
sejam estes advindos da defesa ou da promotoria (ARZENO, 1995).

Arzeno (1995) acrescenta que é muito difícil que o sujeito acredite na parciali-
dade desse informe, sendo inclusive comum ele lançar sobre o psicólogo um olhar
acusador ou então tentar seduzi-lo com uma atitude cúmplice. Além disso, esse
informe deve ser expresso sem termos inequívocos e apresentar afirmações que
não deixem margem para que sejam usadas conforme convier à causa. Uma vez
elaborada a conclusão a respeito da dúvida que levou à solicitação da investigação,
é conveniente que se justifique essa conclusão, utilizando como apoio alguns pon-
tos do material, não se esquecendo de sempre comunicar-se em termos claros de
uso corriqueiro no âmbito forense.

4) A um empresário: Também se lida nesse tipo de informe com a desconfian-


ça e as resistências do indivíduo que aspira a obter um trabalho e vem fazer o
psicodiagnóstico porque é obrigado a tal. Ao mesmo tempo, também existe a
pressão do diretor da procura ou pelo proprietário da empresa no sentido de ser
dado um informe favorável ao candidato que venha melhor “recomendado”. É
comum que surjam questões que dizem respeito à ética profissional, que sem-
pre deve ser mantida pelo psicólogo. Dessa forma, ele deve dizer o necessário
de tal forma que posa ser interpretado com objetividade e não venha a ser uti-
lizado para prejudicar o indivíduo em questão (ARZENO, 1995).

5) Ao pediatra, neurologista, fonoaudiólogo etc.: Geralmente tais profissionais


estão interessados em receber informação a respeito da presença ou não de
transtornos emocionais que corroborem para certa sintomatologia cuja origem
não pode ser atribuída à alguma parte anatômica ou fisiológica. Assim, esse
informe irá se referir somente ao registro ou não de transtornos emocionais, à

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sua gravidade e à conveniência de um tratamento psicológico do sujeito, da sua


família etc.; esse paciente retornará então ao profissional que o enviou, pois este
não é paciente do psicólogo (ARZENO, 1995).

6) Aos pais: Apesar de raros, podem ser solicitados informes por esses sujeitos. Nes-
se caso, deve-se primeiramente saber o motivo da solicitação do informe, para que
a partir disso o psicólogo possa saber a chave da forma como deverá fazê-lo. Nor-
malmente decorre do desejo de conservar algo escrito para que lhes sirva como
um auxílio para a memória sobre tudo o que foi falado (ARZENO, 1995).

7 CONCLUSÃO

Ao longo de sua prática o psicólogo tem sido solicitado em vários contextos a ela-
borar algum tipo de documento psicológico, que se divide em: Declaração, Atestado Psi-
cológico, Relatório/Laudo Psicológico e Parecer Psicológico. Dentre estes, destaca-se o
laudo psicológico, que é um instrumento usado como forma sistemática de comunicar
os resultados de um processo avaliativo, atendendo a demanda das mais diversas áreas.

Além disso, a linguagem psicológica está impregnada da construção de sujeitos


e controle das populações o que os torna um instrumento de poder que, classifica os
sujeitos psicológicos e promove o discurso sobre a própria profissão. Já o informe psi-
cológico é um resumo das conclusões diagnósticas e prognósticas do caso estudado
e inclui muitas vezes as recomendações terapêuticas adequadas ao mesmo, devendo
constar em cada conjunto de documentos elaborados pelo psicólogo. Entretanto, a
literatura afirma que essa tarefa costuma ser a mais evitada por esse profissional, por-
que boa parte dos informes elaborados tem sido criticada por sua precária validade.

Em resposta a isso, a mobilização da categoria sobre os problemas advindos da


escrita profissional e as constantes falhas técnicas, incoerências e imprecisões dos
laudos foi instituído o Manual de Elaboração de Documentos Produzidos por Psicólo-
gos decorrentes de Avaliações Psicológicas. Entretanto, apesar do Manual contribuir
para que o psicólogo não incorra em falhas básicas, ele não é suficiente para impedir
erros do psicólogo. Dessa forma, é necessário desconstruir esse caráter ilusório que
muitas vezes é atribuído à ciência psicológica, como se ela oferecesse instrumentos
para a compreensão integral ou quase “mágica” do sujeito.

REFERÊNCIAS

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148 | Cadernos de Graduação

Recebido em: 30 de maio de 2015


Avaliado em: 26 de agosto de 2015
Aceito em: 31 de agosto de 2015

1. Acadêmico do curso de Psicologia do Centro Universitário Tiradentes – UNIT/AL. E-mail:


rodrigoalmeida1122@hotmail.com
2. Acadêmica do curso de Psicologia do Centro Universitário Tiradentes – UNIT/AL. E-mail: sonia-
crispim@ hotmail. com
3. Acadêmica do curso de Psicologia do Centro Universitário Tiradentes – UNIT/AL. E-mail:
marianalemosbr@gmail.com
4. Acadêmica do curso de Psicologia do Centro Universitário Tiradentes – UNIT/AL. E-mail:
marianalemosbr@gmail.com
5. Mestre em Psicologia pela Universidade Federal de Alagoas – UFAL. Docente do curso de Psicologia do
Centro Universitário Tiradentes – UNIT/AL. E-mail: gabrielamourapsi@gmail.com

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Avaliação Psicológica On-line: considerações a partir da pandemia do novo coronavírus

(Covid-19) para a prática e o ensino no contexto à distância1

Online Psychological Assessment: Considerations from coronavirus disease (Covid-19)

pandemic for remote practice and teaching

Aline Riboli Marasca2

Denise Balem Yates3

Andreia Mello de Almeida Schneider4

Luan Paris Feijó5

Denise Ruschel Bandeira6


1

Resumo

As restrições impostas pelo distanciamento social decorrente da pandemia do novo coronavírus

exigiram adaptações dos psicólogos a uma nova realidade de trabalho que privilegia atividades

remotas. O ensino e a prática em Avaliação Psicológica foram algumas das áreas afetadas,

demandando que psicólogos, conselho profissional e sociedades científicas discutam diretrizes

para o contexto da pandemia. Também, ainda que exista um aumento de cursos à distância, são

apontadas restrições para o ensino de técnicas psicológicas em ambiente on-line. Visto as

mudanças no cenário de trabalho e a necessidade de adaptação à situação atual, este estudo busca

1
Manuscrito submetido à Revista Estudos em Psicologia (Campinas), na Seção Temática “Contribuições da Psicologia no contexto d a pandemia da Covid-19”
2
Doutoranda em Psicologia. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil. Contato:
aline.marasca@gmail.com
3
Doutora em Psicologia. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Centro de Avaliação Psicológica, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil.
4
Doutora em Psicologia. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil.
5
Doutorando em Psicologia. Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Programa de Pós-Graduação em Psicologia, São Leopoldo, Rio Grande do Sul, Brasil.
6
Professora Doutora em Psicologia. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil.
discutir a viabilidade de processos de Avaliação Psicológica on-line e apontar direções para seu

aperfeiçoamento. Procura-se também apresentar possibilidades para ensino e supervisão a

distância. Discutem-se evidências científicas e regulamentações nacionais e internacionais que

embasam essas práticas. Por fim, reforça-se a necessidade do desenvolvimento de tecnologias que

permitam conduzir o processo de maneira ética e segura.

Palavras-chave: Prática psicológica; Tecnologia da Informação; Ensino; Pandemias

Abstract

With the restrictions imposed by the social distancing resulting from the new coronavirus

pandemic, psychologists deal with a new reality of work that privileges remote activities. Teaching

and practice in psychological assessment were some of the affected areas, requiring psychologists,

professional councils and scientific societies to discuss guidelines for the pandemic context.

Although there is an increase in distance learning courses, restrictions are indicated for teaching

psychological assessment techniques in the on-line environment. Given the changes in the work

scenario and the need of adaptation to the context, this study intends to discuss the viability of on-

line psychological assessment processes and point out guidelines for their improvement. It also

seeks to present possibilities for distance education and supervision. Scientific tests and national

and international regulations that support these practices are discussed. The need to develop

technologies that will allow the process to be conducted in an ethical and safe manner is reinforced.

Key-words: Psychological Practice; Information Technology; Teaching; Pandemics


Introdução

A Avaliação Psicológica (AP) realizada por meios de tecnologias da informação e da

comunicação (TICs) foi uma das atividades regulamentadas como possibilidade de atuação do

psicólogo a partir da Resolução nº 11/2018 (Conselho Federal de Psicologia [CFP], 2018a). Nela

está prevista a AP, considerando o uso de testes psicológicos com padronização e normatização

específicas para a modalidade on-line, e a supervisão entre profissionais, desde que para ambos os

serviços os psicólogos tenham registro ativo no respectivo Conselho Regional. A partir do que é

descrito no documento, entende-se que a AP on-line pode ser conduzida em diferentes contextos,

desde que atenda às premissas e restrições regulamentadas pelas resoluções vigentes. Entre as

restrições, estão o atendimento de pessoas ou grupos em situação de urgência e emergência e de

casos de violação de direitos ou de violência, o que foi modificado temporariamente pela

Resolução nº 04/2020 (CFP, 2020). O atendimento de crianças e adolescentes pode ocorrer

mediante o consentimento de um dos responsáveis legais, desde que ponderada sua viabilidade

técnica (CFP, 2018a). Em decorrência das medidas de distanciamento social impostas pela Covid-

19, a Resolução CFP nº 04/2020 também buscou facilitar o cadastramento de psicólogos para a

prestação de serviços on-line (CFP, 2020).

Internacionalmente, desde o final da década de 1990, são utilizadas as TICs para a

avaliação das funções cognitivas, na época, realizada por telefone (Desmond, Tatemichi, &

Hanzawa, 1994). Nos Estados Unidos, diretrizes que incluem AP e testagem estão vigentes desde

2013 (American Psychological Association [APA], 2013) e, em decorrência da Covid-19 novas

orientações que abrangem a segurança dos instrumentos, a qualidade dos dados obtidos, os

intervalos de confiança a serem utilizados e os padrões éticos e técnicos foram divulgadas, (APA,

2020). Nesse contexto, diversos estudos elencaram as vantagens do atendimento psicológico


remoto, entre eles o acesso a serviços que poderiam não estar disponíveis em determinadas regiões

e a redução de custos, como de deslocamento e de espaço físico (Martin, Millan, & Campbell,

2020; McCord, Bernhard, Walsh, Rosner & Console, 2020). Além disso, pode ser uma solução

quando o atendimento presencial não é viável, como, por exemplo, a vigência da determinação de

distanciamento social em virtude da pandemia

No entanto, no Brasil, a utilização das TICs nas distintas áreas da psicologia é incipiente

quando comparada ao contexto internacional. Verifica-se uma carência na experiência e formação

dos profissionais brasileiros para utilização das TICs na prática clínica (Feijó, Silva, & Benetti,

2018; Hallberg & Lisboa, 2016). Considera-se que, na área de AP, devido à recência da Resolução,

essa realidade não seja diferente.

Para se ter uma ideia da carência, são apresentadas duas histórias reais relatadas aos

autores. A primeira é de um psicólogo clínico, que realiza psicodiagnóstico. Em uma entrevista

para uma atividade acadêmica, ele relatou que, em razão da possibilidade de AP online, adaptou

um instrumento de avaliação de sintomas depressivos, restrito a psicólogos e com parecer

favorável no Sistema de Avaliação de Testes Psicológicos (SATEPSI) somente para aplicação

presencial, para um formulário online e gratuito, a fim de utiliza-lo com seus pacientes. A segunda

história é de uma psicóloga, que atua em vara de família em uma cidade do interior do Mato

Grosso, a 750 km de distância de Cuiabá, sendo esta a cidade de referência para que a profissional

pudesse adquirir testes psicológicos, realizar cursos e supervisão. Durante um congresso em Porto

Alegre, afirmou que, assim como ela, suas colegas se sentem desamparadas nas avaliações

relacionadas a disputa de guarda, sem material adequado, sem orientação e supervisão na cidade

onde residem e atuam como psicólogas.


Essas duas histórias são recortes do que é perceptível na prática profissional: a falta de

treinamento adequado e de instrumentalização profissional para atuação nesse contexto. No

primeiro caso, vemos o psicólogo interferir na validade e fidedignidade do instrumento, à medida

que utiliza um teste psicológico de aplicação presencial de maneira on-line, o que pode

comprometer os resultados, ferindo o previsto no Código de Ética Profissional, na Resolução do

CFP nº 11/2018 e os direitos autorais da publicação. No segundo caso, é possível notar que a

produção do conhecimento científico, muitas vezes vinculada aos grandes centros urbanos, poderia

ser disseminada em cidades do interior por meio de atividades remotas. Além disso, a construção

de plataformas para cursos, material de apoio e supervisão à distância conseguiriam alcançar esses

profissionais, permitindo que realizassem um trabalho de melhor qualidade.

É reconhecido que o uso de TICs amplia as possibilidades de atuação profissional e auxilia

no desenvolvimento de estratégias para enfrentar os possíveis obstáculos da prática (Feijó, Silva,

& Benetti, 2018). No entanto, diferentemente do volume de estudos sobre processos psicoterápicos

realizados em ambiente virtual, a literatura ainda é escassa ao descrever a prática da AP on-line.

Por consequência, diante das abruptas medidas de distanciamento social impostas pela Covid-19,

os profissionais que atuam com AP se viram com processos presenciais interrompidos e pouca

qualificação para atender a essas e a novas demandas de maneira remota. Com o intuito de

contribuir para boas práticas na área, o presente estudo pretende discutir a viabilidade de processos

de AP on-line e apontar direções para seu aperfeiçoamento, tomando como base a literatura

científica e diretrizes nacionais e internacionais. Além disso, busca-se apresentar possibilidades

para o ensino e a supervisão em AP na modalidade à distância.

A prática da Avaliação Psicológica on-line


Assim como os processos de AP realizados presencialmente, a prática por meio das TICs

deve seguir as especificações técnicas e éticas próprias da AP (CFP, 2018b). Contudo, sua

viabilização requer a adição de cuidados específicos para que ocorra de maneira segura, eficaz e

ética no ambiente virtual (McCord et al., 2020). Com base nas diretrizes do CFP, orientações de

órgãos internacionais, relatos de pesquisa e observações sobre como é a AP atualmente no Brasil,

alguns apontamentos e reflexões são necessários a fim de criar possibilidades para sua efetivação

no território nacional.

Antes de iniciar a avaliação on-line, é fundamental conhecer a demanda e pertinência para

um processo em modalidade remota. A Resolução nº 11/2018 (CFP, 2018a) indica as premissas e

restrições para que ela ocorra. Porém, além do exposto pela Resolução, outras situações são

passíveis de reflexão por parte do profissional. Em especial, devem ser consideradas as

características da pessoa a ser atendida, como idade, condições físicas e cognitivas, fatores

culturais e outros dados como familiaridade com o uso de tecnologia, disponibilidade de acesso a

aparelhos eletrônicos e qualidade da conexão à internet (Luxton, Pruitt, & Osenbach, 2014).

Por exemplo, uma pessoa poderia apresentar algumas limitações para o processo avaliativo

on-line, como ter dificuldade em manejar as TICs, apresentar fadiga ou desconforto físico causado

pelo uso da tecnologia, evidenciar alguma restrição que a impossibilite de uma total compreensão

auditiva, visual ou de agilidade motora. Ainda, a ansiedade para lidar com computadores e outros

recursos pode afetar as respostas emitidas em um teste psicológico nesse ambiente (Eckford &

Barnett, 2016). Pondera-se que algumas restrições físicas e cognitivas não necessariamente irão

impossibilitar a realização da avaliação. Contudo, essas devem ser conhecidas a fim de que sejam

empregadas técnicas mais adequadas ou que contem com o suporte eventual de uma terceira pessoa

no processo (Luxton, Pruitt, & Osenbach, 2014), o que no Brasil ainda carece de pesquisas.
Outras características do caso poderão ser determinantes para não adotar a opção on-line.

Na área clínica, a presença de certos diagnósticos de transtornos mentais, o tipo de sintoma

apresentado pelo paciente (como sintomas psicóticos) e o uso de substâncias, podem ser

indicadores de risco para processos conduzidos nessa modalidade (APA, 2013). No contexto

judicial ou em outros de avaliação compulsória, o aspecto de não voluntariedade do avaliando para

a realização do procedimento é uma condição que pode apresentar implicações para o resultado

pretendido (Ofício-Circular 63/2020/GTec/CG-CFP, 2020). Nesse sentido, antes de iniciar a

avaliação, o psicólogo deve ponderar os benefícios e possíveis prejuízos da prática.

A análise de benefícios e riscos é um dos aspectos abordados no contrato a ser estabelecido

com o avaliando. De modo geral, em um processo de AP, é desejável que seja esclarecido o que é

AP, quais os benefícios para o avaliado, como ela será conduzida (em relação à duração, o contato

com informantes e os documentos derivados do processo), além de combinações acerca de horários

e honorários, se aplicável. No contexto virtual, deve ser reforçada a ênfase no sigilo, alertando para

a não autorização de gravações de áudio ou vídeo, além de inteirar quais informações serão

repassadas e quem terá acesso a elas, o psicólogo deverá ter clareza sobre a segurança do ambiente

virtual que utiliza como mediador do processo de avaliação (CFP, 2018a).

O psicólogo também necessita atentar para outros aspectos do setting que tendem a ser

mais controlados quando a avaliação ocorre presencialmente. É importante orientar que o

avaliando esteja em um ambiente confortável, com privacidade, sem distrações e seguro de que

não será interrompido (APA, 2013). Esse aspecto é relevante não só para maior garantia do sigilo

das informações, mas também para assegurar maior precisão na condução dos testes psicológicos.

Para tanto, sugere-se o uso de um contrato por escrito, em que essas orientações, além de
explicadas, sejam formalmente aceitas pelo avaliando, a fim de resguardar o psicólogo que conduz

o processo e a validade das informações resultantes da avaliação (Lustgarten & Elhai, 2018)

Apesar de termos poucos dados de pesquisa acerca do processo de AP on-line, o uso de

testes psicológicos em ambiente virtual e suas diferenças em relação à versão de lápis e papel é

expresso na literatura (APA, 2020). A construção ou adaptação de um instrumento psicológico

envolve um rigoroso trabalho de pesquisa e reunião de evidências que embasam a utilidade de seus

resultados e interpretações para serem aplicados em determinados contextos (Andrade &

Valentini, 2018). Dessa forma, apenas exportar os estímulos de um instrumento para ferramentas

on-line não garante que eles sejam visualizados pelo avaliado da mesma forma como seriam em

um atendimento presencial, por exemplo, em relação às suas cores, ao tamanho ou a outras

características que o definem. Sendo assim, como estabelecer se as respostas do paciente são

compatíveis à interpretação preconizada no manual se há uma variação nos estímulos empregados?

Por sua vez, escalas e inventários administrados pela internet tendem a ter alta correlação

com suas versões em lápis e papel, mas não é possível assumir em todas as situações que suas

propriedades psicométricas serão idênticas (Pritchard, Stephan, Zabel, & Jacobson, 2017). Alguns

argumentos para isso são possíveis efeitos de desinibição e mudanças na motivação dos

respondentes em ambiente on-line, diferentemente da amostra comparativa que esteve em

aplicação presencial (Reips, Buchanan, Krantz, & McGraw, 2016). Também é importante reiterar

que é vedado ao psicólogo interferir na validade e fidedignidade de instrumentos e técnicas

psicológicas (CFP, 2005), o que seria o caso de usar em modo on-line um teste que não possui

evidências de validade para tal método de aplicação.

Diretrizes estabelecidas pela International Test Comission (ITC, 2005; 2017) e nas

Standards for Educational and Psychological Testing (American Educational Research


Association [AERA], American Psychological Association [APA], & National Council on

Measurement in Education [NCME], 2014) apontam especificidades para o desenvolvimento ou

adaptação de instrumentos mediados por TICs no que diz respeito à padronização, à normatização

e às evidências de validade dos resultados extraídos neste contexto. Esses cuidados também são

traduzidos na Resolução nº 11/2018 (CFP, 2018a), que enfatiza a necessidade de estudos de

padronização e normatização específicos para a modalidade remota.

Até maio de 2020, a lista de testes favoráveis do SATEPSI para aplicação on-line/remota

contava com quatro instrumentos, sendo que esses avaliam atenção, personalidade e interesses

pessoais. Além desses, outros 17 atualmente são listados no SATEPSI como instrumentos que

permitem a aplicação informatizada, ou seja, por intermédio do computador, mas presencialmente

com o avaliando. A Nota Técnica nº 07/2019 (CFP, 2019a) pontua que o formato de aplicação

informatizada não equivale à aplicação on-line/remota, que se refere a aplicação a distância do

teste. Desse modo, entende-se que cabe ao psicólogo a análise e o estudo do manual do teste

psicológico para identificar se a padronização permite o uso online/remoto, ou se permite a

aplicação informatizada, mas presencial.

Outros aspectos são pontuados como limitações em relação à utilização dos testes

psicológicos na modalidade on-line. Entre eles, o baixo controle do psicólogo acerca do ambiente

de testagem e as possíveis interrupções devido à qualidade da conexão à internet (APA, AERA, &

NCME, 2014). Em tarefas dependentes de tempo, por exemplo, uma falha na rede de internet pode

comprometer a utilização do resultado. Apesar de orientações para o avaliando sobre tais questões,

estas ainda podem ser inevitáveis em certas ocasiões.

Em outra direção, são reforçados os pontos positivos da aplicação de testes psicológicos

mediados por TICs. A tecnologia pode auxiliar na precisão de algumas medidas, como o tempo de
reação ou o rastreio do movimento ocular (Poletti et al., 2017; Schmand, 2019). Em determinados

contextos, o uso de testes em versão informatizada pode aumentar a interação com o examinando,

apresentar maior riqueza dos estímulos, fornecer maior segurança e rapidez para o armazenamento

dos protocolos respondidos, assim como facilitar a pontuação e interpretação dos resultados

(Oliveira, Bandeira, & Giacomoni, 2019). Assim, é reforçada a importância da pesquisa para o

desenvolvimento e adaptação de tais instrumentos, a fim de contribuir com o trabalho do psicólogo

e ampliar suas possibilidades de atuação. No contexto nacional, algumas iniciativas nesse sentido

estão sendo delineadas por editoras de testes psicológicos e outras empresas já oferecem

plataformas para facilitar a integração dos dados dos instrumentos aplicados e a elaboração de

documentos decorrentes da AP.

Um dos principais produtos da AP é a emissão de documentos psicológicos. No entanto,

até o momento, não são fornecidas diretrizes particulares para a produção de documentos

derivados da AP on-line. No contexto de distanciamento social decorrente da Covid-19, o CFP

emitiu recomendações sobre a elaboração de documentos psicológicos para o Poder Judiciário,

indicando que estes sejam datados e devam situar que foram produzidos no período de pandemia

(Ofício-Circular 63/2020/GTec/CG-CFP, 2020). Também pode ser pertinente informar que a

avaliação foi realizada em formato on-line e em consonância com as resoluções específicas do

CFP para a prática.

De forma geral, a Resolução nº 06/2019 do Conselho Federal para elaboração de

documentos (CFP, 2019b), bem como o Código de Ética Profissional (CFP, 2005), enfatizam o

cuidado acerca do conteúdo confidencial do material. Assim, é importante que o psicólogo possa

se cercar de procedimentos que aumentem a garantia da segurança das informações compartilhadas

no documento. Entre as considerações possíveis para a prática, estão o uso de arquivos em formato
protegido e a utilização de certificação digital de assinaturas. No futuro, com a popularização da

atividade, é provável o desenvolvimento de plataformas digitais para compartilhamento desses

documentos a partir de usuário registrado e senha fornecidos pelo profissional para o solicitante.

Assim como as plataformas para videoconferência, recomenda-se que esses aplicativos utilizem

criptografia de ponta a ponta ou sejam certificadas pela Health Insurance Portability and

Accountability Act (HIPAA), que propõe padrões mínimos de proteção de confidencialidade de

informações de saúde, ou pela Health Information Technology for Economic and Clinical Health

Act, a qual expandiu o escopo da HIPAA (Twist, Hertlein, & Haider, 2016).

Por fim, torna-se importante realizar algumas ponderações acerca do estabelecimento dos

honorários. Um argumento frequentemente lançado como vantagem dos atendimentos

psicológicos on-line é a redução dos custos para sua viabilização. Por um lado, para o psicólogo,

é abonada a onerosa manutenção de uma sala de consultório, seja de um imóvel próprio ou locado,

assim como os gastos com transporte, estacionamento privado, entre outros. Por outro lado, é

possível notar que outros custos acabam se somando para dar condições ao trabalho remoto. Entre

eles, podemos citar a mensalidade para o uso de plataformas que garantam a segurança das

informações, possíveis taxas transacionais que incidem sobre o valor de cada consulta, uma boa

rede de internet e um computador com qualidade de áudio e vídeo. Da mesma forma, para

assegurar a validade dos documentos emitidos em formato on-line, pode-se somar o custo de

confecção e atualização da assinatura digital certificada. Além disso, são mantidos os custos da

aquisição de manuais de testes psicológicos e seus protocolos on-line. Assim, tais valores devem

ser examinados no momento da fixação dos honorários e talvez sugiram que é ilusória a

expectativa de que o trabalho remoto gere uma redução de custos para o avaliador.
O ensino da Avaliação Psicológica em contexto de educação a distância

Há alguns anos se discute a formação e o ensino da AP no Brasil. A carência de uma

formação sólida se percebe de modo concreto quando mais de 60% dos processos éticos

conduzidos no CFP se referem a infrações relativas ao processo de AP e aos documentos derivados

desse processo (Zaia, Oliveira, & Nakano, 2018). Segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais

para os cursos de graduação em Psicologia, o curso deve seguir sendo generalista (Ministério da

Educação [MEC], 2019). Isso reforça a necessidade de que aqueles que desejam atuar na área de

AP devem buscar formação complementar e supervisão, antes de aceitar conduzir um trabalho,

pois é uma especialidade do psicólogo que requer ampla fundamentação em teorias psicológicas,

domínio no uso de testes psicológicos, instrumentos e técnicas, cuidados éticos e habilidade para

contextualização dos resultados e integração dos dados coletados durante o processo (Bueno &

Peixoto, 2018; Gouveia, 2018; Muniz, 2018; Schneider, Marasca, Dobrovolski, Muller, &

Bandeira, no prelo).

Em meio a uma formação carente, surge a possibilidade do ensino a distância. Cursos de

extensão e aulas em cursos de graduação e pós-graduação vêm mudando com o uso das TICs. Já

se previa que a tecnologia seria um componente integrante da formação em psicologia (Deane,

Gonsalvez, Blackman, Saffioti, & Andresen, 2015), mas com o surgimento da necessidade do

distanciamento social imposta pela Covid-19, o ensino on-line da AP é uma prática que vem se

consolidando e deve permanecer mesmo após a pandemia.

O Código de Ética Profissional determina, no Art.18, que “o psicólogo não divulgará,

ensinará, cederá, emprestará ou venderá a leigos instrumentos e técnicas psicológicas que

permitam ou facilitem o exercício ilegal da profissão” (CFP, 2005). O psicólogo, professor de


psicologia que ministrará as aulas relacionadas à AP, não deve, assim, disponibilizar na internet

materiais que facilitem a disseminação de conteúdos relacionados a testes psicológicos.

Isso ratifica, mesmo no ensino presencial, a não disponibilização de apresentações em

PowerPoint ou PDF, por exemplo, em ambientes de ensino como o Moodle ou e-mail, com

conteúdos restritos a psicólogos e estudantes de psicologia, que permitam que o aluno baixe a

informação e a compartilhe com quem achar conveniente. Em tempos de distanciamento social,

em que os professores precisaram adaptar suas aulas para um formato totalmente on-line, aulas,

mesmo que transmitidas ao vivo, podem ser gravadas para revisão do conteúdo, fazendo com que

o professor não tenha controle dos rumos que essa gravação pode tomar, o que acaba por ferir o

Art. 18 mencionado. Embora essas situações possam acontecer também no contexto presencial,

quando apresentados na prática remota, a disseminação deste conteúdo pode ser ainda maior, tendo

em vista a facilidade de já estar disponível de modo digital.

Tais riscos de divulgação de conteúdo exclusivo ocorrem também em modalidades de

ensino presencial, pois os alunos podem gravar em áudio ou vídeo as aulas, ou ainda fotografar as

projeções sem que o professor perceba. Dessa forma, sugerem-se algumas estratégias de cuidado

específicas para essas questões. Inicialmente, antes de ministrar aulas com conteúdos exclusivos

(presencial ou remotamente), é importante discutir com os alunos os danos que podem advir da

não observância do Art. 18 do Código de Ética Profissional (CFP, 2005). Depois, solicitar a

assinatura (ou concordância por alguma forma digital legalmente válida) de um Termo de

Compromisso estabelecendo que o aluno se comprometa a não divulgar imagens, áudios ou vídeos

das aulas sob quaisquer formas. Outra estratégia simples indicada aos professores de AP é inserir

nos slides e materiais impressos uma marca d’água indicando que o material foi elaborado somente

para fins didáticos e não pode ser distribuído. Essas sugestões, individualmente, podem não
garantir efetivamente que os alunos não compartilhem as informações de trato exclusivo dos

psicólogos. Contudo, se aplicadas simultaneamente, podem aumentar a consciência de uma

postura ética, um aspecto fundamental de ser apresentado na formação do profissional.

Para os cursos da área de AP, idealmente, poderiam ser utilizadas plataformas

criptografadas, além de senha com validade por um período restrito (ex.: 60 dias). Tal limitação

reduz a chance de compartilhamento de dados, bem como garante a atualidade das informações.

Cursos com acesso “vitalício” correm o risco de se tornarem obsoletos em uma área em que

frequentemente ocorrem atualizações de padronização, normas, estudos de precisão e evidências

de validade, além de revisões nas Resoluções CFP, gerando o risco de o aluno acessar materiais

obsoletos.

A prática de supervisão em ambiente virtual

A supervisão pode ser definida como uma formação intensiva ou treinamento, focada em

casos clínicos representativos da realidade profissional e que provê apoio, dirige e orienta o

trabalho de colegas (supervisionandos) por um profissional da área da saúde qualificado ou com

experiência comprovada (Wright, Brabender, & Pade, 2019). No caso da supervisão em AP, esta

deve ser administrada por psicólogo com experiência na área (Wright, Brabender, & Pade, 2019),

podendo ser complementada por discussões e treinamento com profissionais de outras áreas da

saúde.

As competências clínicas da AP, similares à psicoterapia, envolvem técnicas de entrevista,

conhecimento de princípios e padrões éticos, competências multiculturais, habilidades

diagnósticas e habilidades interpessoais. Há ainda competências específicas à área da AP, tais

como conhecimentos psicométricos, seleção de instrumentos, administração e levantamento de


testes, interpretação e integração de achados, desenvolvimento de indicações terapêuticas, escrita

de documentos e habilidades de devolução (Vannucci, Whiteside, Saigal, Nichols, & Hileman,

2017).

Algumas das técnicas de supervisão utilizadas em AP são a supervisão individual e

coletiva, a discussão de casos, a checagem da aplicação e levantamento de testes, a leitura dos

relatos de atendimento, a supervisão da escrita dos documentos, o acompanhamento da avaliação

em sala de espelhos, gravação em áudio e/ou vídeo das avaliações (Yates, 2016). As formas de

supervisão on-line em psicologia, por sua vez, permitem o uso de recursos como videoconferência

(individual ou em grupo), compartilhamento de dados na nuvem (textos, áudios e vídeos) e o uso

de softwares de seguimento dos resultados clínicos (Hagstrom, & Maranzan, 2019). Tais recursos

sugerem a possibilidade de transposição da supervisão presencial em AP para a supervisão on-line

sem maiores dificuldades. Contudo, alguns cuidados devem ser tomados para a garantia do sigilo

e segurança dos dados compartilhados pela internet, bem como para a manutenção de um processo

de supervisão ético e com qualidade.

Situações como a pandemia de Covid-19 demonstram como a supervisão a distância pode

vir a ser útil para os profissionais da área da AP. Além de períodos de distanciamento social, a

supervisão on-line permite aproximar profissionais e supervisores de regiões distantes, bem como

garantir a manutenção da supervisão em momentos em que o contato presencial não possa ocorrer.

Pode-se discutir se haveria um custo menor para a oferta de supervisão on-line, em virtude desta

poder ser oferecida a partir da residência do supervisor, sem exigir um consultório ou outro local

de trabalho. Entretanto, assim como destacado na seção da prática da AP deste artigo, outros custos

podem se somar quando se ministra a supervisão remota como, por exemplo, a adoção de
plataformas criptografadas para evitar que as informações discutidas entre os profissionais sejam

hackeadas por terceiros.

É importante considerar que a supervisão à distância também gera alguns desafios para o

supervisor, como a aparente redução do controle do processo, ao não poder manusear os protocolos

aplicados pelo supervisionando (que geralmente coloca uma “pilha” de materiais sobre a mesa, ao

quais o supervisor vai visualizando e selecionando). Tal dificuldade exige clareza no contrato de

trabalho entre o supervisor e o supervisionando: como esta ocorrerá? A supervisão é voltada para

todo o processo ou limitada à revisão de aplicação e levantamento de algum(ns) instrumento(s)?

Caso seja voltada para todo o processo de avaliação, o supervisionando deverá enviar todos os

protocolos aplicados. Isso será virtualmente ou fisicamente? Tais decisões irão influenciar na

duração e consequentemente no valor da(s) supervisão(ões).

Alguns outros aspectos precisam ser levados em conta no estabelecimento da supervisão à

distância, como a familiaridade dos usuários com o ambiente virtual, a necessidade de uma boa

conexão para uso de videoconferência, e o uso de aplicativos ou plataformas que garantam

segurança no compartilhamento de imagens de protocolos, documentos, vídeos e áudios de

pacientes. É importante lembrar que esse cuidado não deveria ser restrito aos casos de supervisão

on-line, mas também a casos de revisão de documentos feitos por supervisores que atendem seus

supervisionandos presencialmente e que habitualmente os enviam por e-mail.

É útil ressaltar que supervisões esporádicas à distância entre supervisor e supervisionando

que já se conhecem parecem ocorrer na prática, no entanto, ainda é incomum o estabelecimento

de relacionamentos de supervisão exclusivamente remota. A teleconferência e a videoconferência

em um ambiente de supervisão podem representar soluções para a necessidade de conveniência,

disponibilidade e distância física. Os usuários devem ser instruídos a verificar as informações e


credenciais dos supervisores antes de contratarem os serviços (Deane et al., 2015), assim como os

supervisores precisam garantir as credenciais dos supervisionandos (serem psicólogos ou

estudantes de psicologia).

Atualmente, ainda existem poucos estudos voltados à eficácia da supervisão em AP

presencial (Vannucci et al., 2017), sendo mais comuns estudos e diretrizes sobre supervisão e

treinamento em psicoterapia ou atendimento psicológico em saúde (APA, 2014). A isso se soma a

necessidade de verificação das práticas de supervisão de AP on-line, visando compreender quais

estratégias são mais efetivas na transmissão de conhecimento prático aos alunos, que

possivelmente não se dão da mesma forma nos contextos presenciais e on-line.

Considerações Finais

A regulamentação de atividades psicológicas on-line contribuiu para ampliar as

possibilidades de atuação do psicólogo brasileiro e desempenhou um papel central na adaptação

ao novo cenário de trabalho imposto pelas restrições da pandemia da Covid-19, indicando que esse

formato tende a se expandir e consolidar. No entanto, a complexidade do ambiente virtual suscita

reflexões para a prática e o ensino de maneira ética e segura, em especial em uma área delicada

como a AP.

Considerando os recursos disponíveis, é possível que a AP on-line seja administrável, neste

momento, de maneira limitada e em situações pontuais. Reforça-se a necessidade de pesquisas que

demonstrem evidências de validade e confiabilidade dos escores de uma maior variedade de testes

para aplicação on-line ou remota, assim como o desenvolvimento de outras tecnologias que

favoreçam e tornem segura a condução da AP on-line. Ainda, pondera-se que o psicólogo, antes
de assumir a realização de um processo de AP on-line, considere sua capacitação teórica e técnica

para a atividade, o que envolve também a competência para o uso de TICs.

No contexto do ensino de AP on-line, estratégias de segurança devem focar em reduzir a

chance de disseminação de conteúdos relacionados a testes psicológicos e em aumentar a

consciência ética entre estudantes e profissionais da Psicologia. Além do cuidado com o não

compartilhamento de dados, o professor de AP deve prezar pela atualidade das informações

oferecidas nos cursos de plataformas on-line.

Situações como a pandemia de Covid-19 demonstram como a supervisão à distância pode

vir a ser útil para os profissionais da área da AP. Recomenda-se na supervisão as mesmas

precauções com sigilo e restrições ao compartilhamento de dados da AP on-line. Novos estudos

são necessários para a análise da eficácia da supervisão em AP tanto presencial como on-line.

Aproximar-se da tecnologia e da inovação, sem perder de vista os referenciais da ciência

psicológica, é uma medida que tende a contribuir com a expansão e a especialização da área. É

relevante ressaltar o papel dos professores e dos supervisores como guardiões da qualidade e da

ética na área da AP on-line.


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518 518

Laudo Psicológico:
Operacionalização e Avaliação
dos Indicadores de Qualidade
Psychological Report: Operationalization
and Evaluation of Quality Indicators

Laudo Psicológico: Operacionalización


y Evaluación de los Indicadores de Cualidad

Fábio Henrique
Vieira de Cristo e Silva
Universidade de Brasília

João Carlos Alchieri


Universidade Federal
do Rio Grande do Norte
Artigo

PSICOLOGIA: CIÊNCIA E PROFISSÃO, 2011, 31 (3), 518-535


519
PSICOLOGIA:
CIÊNCIA E PROFISSÃO, Fábio Henrique Vieira de Cristo e Silva & João Carlos Alchieri
2011, 31 (3), 518-535

Resumo: A falta de cuidado na elaboração do laudo tem gerado denúncias contra psicólogos, e necessita
de estudos para aprimorar tal atividade. Este trabalho avaliou a guarda, a estrutura e o preenchimento dos
documentos produzidos por sete psicólogos peritos em trânsito. Selecionaram-se os laudos dos motoristas
profissionais que se submeteram à avaliação psicológica em uma clínica credenciada em dois momentos:
aquisição da permissão (2002) e renovação/mudança de habilitação cinco anos depois (2007). Os critérios de
qualidade foram definidos e operacionalizados com base nas resoluções do Conselho Profissional. Dos 839
motoristas selecionados para participar do estudo tendo seus laudos avaliados, esperava-se encontrar igual
quantidade de laudos. Foram encontrados 67 laudos, tanto em 2002 quanto em 2007, o que evidenciou
problemas na guarda. Analisaram-se os 67 laudos de 2007, sendo indicados vários problemas na estrutura
(inexistência de identificação do psicólogo; em vez da conclusão, foi identificado parecer final; não foi
expresso o local de realização dos exames) e no preenchimento dos laudos (uso excessivo de abreviações
na escrita; incorreções na denominação dos instrumentos; ausência dos resultados e não integração dos
dados obtidos no processo avaliativo). São sugeridas avaliações sistemáticas na elaboração e na guarda dos
laudos como indicadores de qualidade da avaliação psicológica, o que possibilitará intervenção eficiente/
eficaz com base em critérios precisos.
Palavras-chave: Laudos psicológicos. Psicologia do Trânsito. Controle de qualidade. Atuação do psicólogo

Abstract: The lack of care in the preparation of the psychological report has generated complaints against
psychologists, requiring studies to improve this professional practice. This study evaluated the storage, the
structure and the completion of the documents produced by seven traffic psychologists. The psychological
Este trabalho foi reports of professional drivers who were submitted to a psychological evaluation at an accredited clinic
parcialmente were selected in two phases: upon acquisition of permission (2002) and upon renewal/change of the license
derivado da five years later (2007). The criteria of quality were defined and operationalized based on the resolutions
dissertação
defendida pelo of the Professional Council. Out of the 839 drivers selected to participate in the study whose reports were
primeiro autor evaluated, it was expected an equal amount of psychological reports to be found. Sixty-seven reports were
(Silva, 2008), que found, both in 2002 and 2007, highlighting problems at storage. The 67 reports elaborated in 2007 were
contou com o
apoio financeiro analyzed, and several problems were indicated in the structure (no identification of the psychologist; a final
do CNPq. Uma statement was identified, rather than the conclusion; the location of the examinations was not expressed) and
versão preliminar completion of the reports (overuse of abbreviations in writing; mistakes while naming the instruments; lack
deste artigo foi
apresentada of results and non-integration of data obtained in the evaluation process). A systematic assessment of both
no V Encontro the elaboration process and storage conditions of the reports are suggested as indicators of the psychological
da Associação assessment quality, enabling efficient/effective intervention based on precise criteria.
Brasileira de
Rorschach e Keywords: Psychological report. Traffic psychology. Quality control. Psychologist performance.
Métodos Projetivos.
Agradecemos ao Resumen: La falta de cuidad en la elaboración del laudo ha generado denuncias contra psicólogos, y necesita
CNPq pela bolsa
de doutorado estudios para el perfeccionamiento de dicha actividad. Ese trabajo ha evaluado la guardia, la estructura y
concedida ao el relleno de los documentos producidos por siete psicólogos especialistas en tránsito. Se han seleccionado
primeiro autor e los laudos de los conductores profesionales que se han sometido a la evaluación psicológica en una clínica
de produtividade
ao segundo. acreditada en dos momentos: adquisición de la permisión (2002) y renovación/cambio del permiso para
Agradecemos a conducir cinco años después (2007). Los criterios de cualidad se han definido y puestos en marcha basados
Lílian de Oliveira, en las resoluciones del Consejo Profesional. De los 389 conductores seleccionados para participar del estudio
Célia Cristina
Aragão, Thiago con sus laudos evaluados, se esperaba encontrar igual cantidad de laudos. Se han encontrado 67 laudos,
Paulinho, Maria tanto en el 2002 como en el 2007, lo cual ha evidenciado problemas en la guardia. Se han analizado los
Cristina de Cristo e 67 laudos del 2007, y se han identificado varios problemas en la estructura (inexistencia de identificación
Marcelo de Cristo
pelo apoio recebido del psicólogo; en el lugar de la conclusión, se ha identificado un dictamen final; no ha sido mencionado
no desenvolvimento el sitio de la realización de los exámenes); y en el relleno de los laudos ha habido uso excesivo de abrevia-
deste trabalho, e ciones en la escrita, incorrecciones en la denominación de los instrumentos, ausencia de los resultados y
aos pareceristas
anônimos pelos una no integración de los datos obtenidos en el proceso evaluativo). Se sugieren evaluaciones médicas en
comentários la elaboración y en la guardia de los laudos como indicadores de cualidad en la evaluación psicológica, lo
úteis na versão cual posibilitará una intervención eficiente/eficaz con base en criterios precisos.
preliminar deste
artigo. Palabras clave: Laudo psicológico. Psicologia del transito. Control de calidad. Actuación Del psicólogo.

Laudo Psicológico: Operacionalização e Avaliação dos Indicadores de Qualidade


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PSICOLOGIA:
CIÊNCIA E PROFISSÃO, Fábio Henrique Vieira de Cristo e Silva & João Carlos Alchieri
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A produção de documentos psicológicos está documentos psicológicos. Esses indicadores


no rol de atribuições dos psicólogos, sendo poderão ser usados posteriormente para
o laudo um desses documentos. O laudo avaliar laudos psicológicos produzidos em
psicológico é um instrumento frequentemente outros contextos de trabalho.
usado como forma sistemática de comunicar
os resultados de um processo avaliativo, e Conceito, finalidade, estrutura
pode ser útil aos profissionais de diversas
e guarda de documentos
áreas para ajudar na tomada de decisão e/
ou realização de encaminhamentos. Uma
psicológicos
vez que as conclusões nele apresentadas
podem contribuir para o planejamento de O laudo ou relatório psicológico é um
intervenções eficazes, a produção do laudo instrumento de natureza e valor científico que
tem sido considerada uma das expressões descreve situações, condições psicológicas
da competência do psicólogo (Cruz, 2002; e suas multideterminações investigadas no
Guzzo & Pasquali, 2001). Entretanto, a falta decorrer do processo de avaliação psicológica.
de zelo na guarda desses documentos e/ou de Sua finalidade é relatar o encaminhamento,
rigor em sua elaboração tem gerado debates as intervenções, o diagnóstico, estabelecer
e denúncias contra psicólogos (Conselho prognóstico e a evolução do caso, além de
Federal de Psicologia – CFP, 2003; Patto, orientar, sugerir e/ou solicitar uma proposta
1997; Salazar, 1996). Avaliar a qualidade terapêutica (CFP, 2003). No caso da perícia no
dos laudos, portanto, é fundamental para trânsito, o laudo psicológico é um documento
aprimorar a atuação do psicólogo, sendo legal em que é realizada a síntese do
necessários levantamentos sistemáticos para processo avaliativo e que comunica aos órgãos
identificar quais são, especificamente, as competentes de trânsito e ao candidato, na
falhas cometidas. entrevista devolutiva, se este apresenta ou
não desempenho condizente para dirigir, isto
Neste artigo, relata-se um processo de é, se está apto, inapto temporário ou inapto
investigação que avaliou empiricamente as (CFP, 2009b).
principais características referentes à guarda,
estrutura e qualidade do preenchimento A estrutura do laudo é mais complexa do
dos laudos psicológicos elaborados por que a das demais modalidades (declaração,
psicólogos peritos examinadores de trânsito. atestado psicológico e parecer psicológico),
A escolha de focar esse grupo profissional possui cinco itens relacionados à identificação,
justifica-se, primeiramente, pelo impacto à descrição da demanda, ao procedimento, à
social dos resultados expressos nos laudos análise e à conclusão (CFP, 2003). O Conselho
no trânsito. Uma vez que a avaliação Federal de Psicologia (2003, 2009a) orienta
psicológica é um requisito obrigatório que se deve guardar os documentos de
para a concessão da carteira nacional de avaliação psicológica em arquivos seguros
habilitação (CNH) no Brasil, para cada e de acesso controlado, sendo esse um
candidato à habilitação, é produzido, no dos princípios éticos básicos do processo
mínimo, um laudo psicológico, sendo que avaliativo. O arquivamento dos testes e do
milhões de pessoas adquirem anualmente laudo (protocolo) deve ser feito por um
a permissão para dirigir (www.denatran. período que pode variar de acordo com os
gov.br); em segundo lugar, assume-se que casos previstos em lei, por determinação
os laudos produzidos por psicólogos peritos judicial ou quando necessário; contudo,
em trânsito são um exemplo específico para o CFP estabelece um período mínimo
se operacionalizar e avaliar a qualidade dos de cinco anos para a guarda de todos os

Laudo Psicológico: Operacionalização e Avaliação dos Indicadores de Qualidade


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CIÊNCIA E PROFISSÃO, Fábio Henrique Vieira de Cristo e Silva & João Carlos Alchieri
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documentos escritos e do material usado em de informes psicológicos, especialmente no


suas fundamentações. trânsito, publicada em periódicos científicos
(Silva, no prelo; Silva & Alchieri, 2008). De
A recomendação dada aos psicólogos peritos maneira geral, aborda-se o que é e para que
em trânsito é que o laudo seja arquivado serve o laudo psicológico, como produzi-lo,
junto aos protocolos dos testes, sendo além de discussões sobre elementos teórico-
emitido posteriormente um resultado final em filosóficos. Santos e Silva Neto (2000), por
documento próprio (CFP, 2009b). Ressalta-se, exemplo, propõem uma ética do cuidado
aqui, mudança quanto à resolução anterior, na expressão de termos técnicos usados pelo
que solicitava ainda a elaboração de um psicólogo perito de trânsito nos atestados,
parecer final em documento próprio, após o laudos e pareceres. O profissional deve primar
término do laudo (CFP, 2000); na resolução para que a comunicação seja inteligível aos
atual, a produção do parecer não foi demais envolvidos no processo para o efetivo
contemplada. No caso de interrupção do trabalho em equipe. Essa ética discutida pelos
serviço, o material deverá ser transferido para autores pode ser estendida às outras áreas da
o psicólogo substituto ou deverá ser lacrado Psicologia, uma vez que a comunicação não
até a sua chegada. Ocorrendo a sua extinção, é exclusiva da perícia no trânsito.
o Conselho Regional de Psicologia deverá
ser acionado para definir ou acompanhar Indicações práticas gerais são feitas por outros
o encaminhamento desse material, que é autores para a elaboração do laudo. Cruz (2002)
restrito (CFP, 2005). sugere evitar a emissão de juízos de valor, de
dogmas, de incorreções teóricas e técnicas,
A elaboração de laudos psicológicos é orientada
além de impropriedade na escrita e de uso de
por um conjunto de resoluções do CFP que
termos. De modo semelhante, Wechsler (2001)
os psicólogos devem obrigatoriamente seguir,
considera que o psicólogo deve evitar ser
dentre elas: o Manual de Elaboração de
influenciado, em suas conclusões, por aspectos
Documentos Escritos (CFP, 2003), o Código
religiosos, preconceitos e características físicas
de Ética (CFP, 2005) e a Resolução que
Cunha (2000) do indivíduo; deve usar linguagem adequada
dispõe sobre a obrigatoriedade do registro
discute o laudo aos destinatários, incluindo as recomendações
argumentando documental decorrente da prestação de
serviços psicológicos (CFP, 2009a); considera- específicas. Sugere também elaborar o relatório
que, para ser
cientificamente se, portanto, falta ético-disciplinar passível de maneira clara, abrangendo os diversos
adequado, aspectos do sujeito, especialmente a natureza
é necessário
de punição deixar de observar essas normas.
selecionar, Na perícia de trânsito, especificamente, dinâmica e circunstancial dos resultados.
organizar e cabe ao profissional seguir, ainda, o Manual
integrar os dados Outros autores discutem a estrutura e
para Avaliação Psicológica de Candidatos
no processo de
comunicação. à Carteira Nacional de Habilitação e conteúdo dos laudos. Cunha (2000) argumenta
Condutores de Veículos (CFP, 2009b), como que, para ser cientificamente adequado, é
também a resolução do Conselho Nacional necessário selecionar, organizar e integrar
de Trânsito – CONTRAN (2008), que dispõe os dados no processo de comunicação.
sobre a avaliação psicológica de condutores. Sugere, na elaboração do laudo, atenção
ao conteúdo da mensagem, respeitando a
Características de um laudo com identidade e as características do receptor, isto
qualidade técnico-científica é, usar terminologia e linguagem adequadas
ao seu nível sociocultural, intelectual e
Além das normatizações do CFP, existe emocional. Por sua vez, Guzzo e Pasquali
pouca literatura brasileira sobre a produção (2001) recomendam que devem ser incluídos

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CIÊNCIA E PROFISSÃO, Fábio Henrique Vieira de Cristo e Silva & João Carlos Alchieri
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nos laudos os instrumentos utilizados, o quanto ao sigilo e segurança; não possuir


objetivo e o nome de cada uma deles, assim local exclusivo para o trabalho do psicólogo
como especificados os resultados brutos e e local próprio para avaliação individual e
padronizados de cada teste; sugerem, ainda, coletiva, nem local adequado para a guarda
evitar excesso de termos técnicos e sentenças do material de avaliação psicológica.
abreviadas. Anastasi e Urbina (2000) enfatizam
a necessidade de fornecer explicações De modo geral, tanto as discussões teóricas
apropriadas e compreensíveis tanto dos quanto as orientações práticas apresentadas
resultados quanto das recomendações são aplicáveis a qualquer área da Psicologia.
feitas aos indivíduos. Além disso, sugerem Entretanto, será que cada área não possuiria
que os psicólogos ofereçam oportunidades elementos específicos que deveriam ser
para discutir seus informes, uma vez que considerados ao se avaliar a qualidade dos
eles podem produzir reações emocionais laudos psicológicos, isto é, termos técnicos,
negativas que demandarão acolhimento ao tempo disponível para a produção dos
solicitante e/ou aos responsáveis. As autoras documentos e condições de trabalho?
recomendam o preparo do laudo mesmo que Assume-se que as falhas na elaboração dos
não seja solicitado, como forma de registro laudos psicológicos possuem características
para futuras consultas, de organização de gerais semelhantes nas diversas áreas, mas,
ideias e de insights interpretativos sobre a
além disso, há falhas que são típicas de
intervenção.
cada uma delas, por isso a escolha de
uma área nesse trabalho (Silva, no prelo).
Alguns trabalhos identificaram problemas
Este artigo focou a avaliação da guarda, a
na elaboração e na guarda de documentos
estrutura e o preenchimento dos laudos e,
psicológicos. Uma fiscalização realizada
para isso, procedeu-se à operacionalização
em 36 empresas de recursos humanos pelo
e à avaliação de indicadores da qualidade
Conselho Regional de Psicologia de São
técnico-científica desses documentos. Espera-
Paulo – CRPSP, em 2006, identificou que,
se, com o trabalho, proporcionar elementos
em 60% dos casos, os laudos psicológicos
para futuras intervenções técnicas no âmbito
apresentavam problemas, tais como: ausência
da produção de documentos escritos pelo
do nome completo do profissional, ausência
psicólogo, de maneira geral, e do psicólogo
da expressão psicólogo e do número de
perito em trânsito, de maneira específica.
registro no Conselho no carimbo e folhas
dos laudos sem rubricas e/ou não assinadas.
Sobre a fundamentação teórica envolvida Método
no processo, 55% apresentaram alguma
referência teórica, além de manuais e testes Material
psicológicos. No caso do uso de testes,
65% dos participantes utilizavam cópias Selecionaram-se os laudos psicológicos dos
dos instrumentos/cadernos de respostas ou motoristas que exercem atividade remunerada
não faziam mensuração, e 20% utilizavam de transporte de bens ou de pessoas de
testes sem o parecer favorável no Sistema qualquer tipo de habilitação, escolaridade
de Avaliação dos Testes Psicológicos. O CFP e sexo que se submeteram a dois processos
(2006), por sua vez, em uma ação junto de avaliação psicológica, em dois períodos
às clínicas credenciadas aos Detrans de 20 de tempo: o primeiro na aquisição da
Estados brasileiros, identificou que, dos 111 permissão para dirigir, em 2002, e o segundo,
psicólogos peritos em trânsito entrevistados, na renovação e/ou mudança de habilitação,
18% afirmaram: não ter condições adequadas em 2007, momento da investigação atual.

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Uma população de 839 laudos foi definida procedimento, análise e conclusão) e 3) para
com base nesses critérios, sendo encontrados, avaliar o preenchimento dos laudos – verificar
efetivamente, os laudos de 127 motoristas que se os subitens dos itens obrigatórios foram
se submeteram à avaliação psicológica em preenchidos ou não, e de maneira correta e
2002. Desses, foram encontrados, pela clínica clara, isto é, se expressaram as informações
credenciada, 67 laudos elaborados em 2007, adequadas em cada item, sendo usados e
que constituem a amostra pesquisada. São explicitados os termos técnicos/conceitos
apresentados aqui os resultados das análises corretamente.
descritivas efetuadas nos laudos de 2007,
cujo formato é padronizado, composto por Como subitens, tem-se definidos: 3.1)
20 subitens com respostas abertas e fechadas. identificação (deve constar o nome do
Esses laudos, além de mais recentes, foram psicólogo, o número do CRP, o nome do
produzidos no período da atual resolução que interessado e o assunto/finalidade), 3.2)
rege a elaboração de documentos psicológicos descrição da demanda (informações sobre
(CFP, 2003). a problemática e os motivos para elaborar
o documento, além de justificativa para os
Na época do estudo, 15 profissionais procedimentos), 3.3) procedimento (recursos
trabalhavam com avaliação psicológica e instrumentos), 3.4) análise (exposição
descritiva e objetiva dos dados/situações
de condutores no Estado. O material
relacionadas à demanda) e 3.5) conclusão
encontrado/recebido e analisado no estudo
(resultado da demanda e do processo em sua
foi elaborado por sete profissionais (laudos
complexidade). Os demais subitens exigidos
que apresentaram identificação): o psicólogo
pelo CFP são designados aqui como: 3.6)
A elaborou 13 laudos (19%), o psicólogo
outros requisitos obrigatórios (local, data de
B elaborou sete laudos (10%), o psicólogo
emissão, assinatura, número do CRP e rubrica
C, quatro laudos (6%), o psicólogo D, três
em todas as laudas, com assinatura na última).
laudos (4,5%), o psicólogo E elaborou dois
A coleta se iniciou em maio de 2007 e
laudos (3%), o psicólogo F elaborou dois
terminou em maio de 2008, sendo realizadas
laudos (3%) e o psicólogo G, um laudo (1,5%).
buscas nos arquivos de duas instituições: três
Em 35 casos restantes (53%), foi impossível
buscas no departamento de trânsito do Estado
identificar o profissional a partir do laudo, o
(laudos de 2002), e duas buscas na clínica
que significa que a amostra selecionada pode credenciada (laudos de 2007). Mediante
não representar a população-alvo. autorização, os pesquisadores e colaboradores
coletaram os laudos de 2002, armazenados em
Procedimentos todas as caixas-arquivo (89) no departamento
de trânsito, onde se encontravam os arquivos
Os critérios de avaliação adotados para da clínica anteriormente credenciada.
verificar o material foram definidos com As buscas foram realizadas com base em
base na resolução CFP n° 007/2003: 1) listagens que continham informações sobre
para verificar a guarda do material – os a população de motoristas escolhida a partir
pesquisadores deveriam encontrar o material dos critérios da pesquisa. As listagens foram
dos motoristas selecionados nos arquivos de disponibilizadas pela empresa terceirizada
2002 e 2007, sendo que as buscas em 2007 junto ao departamento de trânsito para
só ocorreram nos casos em que os laudos produzir as carteiras de habilitação.
de 2002 haviam sido encontrados, 2) para
avaliar a estrutura do laudo – identificar os Em meados de 2003, a clínica que auxiliou
cinco conjuntos de itens básicos e obrigatórios a pesquisa foi conveniada, razão pela qual
(identificação, descrição da demanda, lhe foram solicitados somente os exames de

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2007 daqueles motoristas cujos protocolos estar na base do problema. Em um processo


haviam sido encontrados nos arquivos de de fiscalização, o CFP (2006) evidenciou a
2002. Essas solicitações foram feitas por ausência de local apropriado para guardar
ofício em que constavam informações para os testes e laudos em algumas clínicas de
facilitar as buscas (dia, mês, ano, cidade e avaliação psicológica de motoristas. Isso
local de aplicação dos testes). Com o auxílio parece indicar a necessidade de considerar
de uma das funcionárias da instituição, as condições de trabalho dos psicólogos
realizaram-se as buscas, sendo a primeira peritos em trânsito, especialmente os que
parte do material enviado aos pesquisadores prestam serviço para clínicas privadas. A
em setembro de 2007 e a segunda, em abril responsabilidade da guarda do material é
de 2008. Como até o período de maio de compartilhada com essas instituições, que
2008 a clínica ainda não havia terminado devem dispor de condições que permitam
as buscas dos laudos e protocolos restantes, armazenar o material sigiloso de maneira
decidiu-se, assim, encerrar a coleta. Por meio segura e com acesso privado (CFP, 2009a).
desse procedimento, buscou-se avaliar a
guarda do material psicológico dos motoristas A guarda adequada do material possibilita
profissionais, produzido tanto em 2002 fácil e rápida recuperação dos documentos,
(aquisição da habilitação) quanto em 2007 de modo que sirvam como meio de prova
(renovação da habilitação). idônea para instruir processos disciplinares
e de defesa legal, possibilitar a orientação/
Resultados e discussão fiscalização sobre o serviço prestado e a
responsabilidade técnica adotada, além
Os resultados serão apresentados e discutidos de ser útil à produção e ao acúmulo de
em três subseções: guarda do material, conhecimento científico, à pesquisa e ao
avaliação da estrutura e, finalmente, avaliação ensino, especialmente em uma atividade tão
da qualidade do preenchimento dos laudos. criticada como a avaliação psicológica de
motoristas (CFP, 2009a; Silva, 2008; Silva &
1. Guarda do material Alchieri, 2010). Nas próximas subseções, são
apresentados e discutidos os resultados das
A guarda dos laudos foi avaliada a partir análises feitas nos laudos coletados quanto
da definição de um grupo de motoristas à sua estrutura: identificação, descrição da
atendidos em um período de tempo. Dos demanda, procedimento, análise, conclusão
839 motoristas identificados inicialmente, e outros requisitos obrigatórios.
encontraram-se efetivamente 67 laudos,
que constituem a amostra pesquisada. Isso 2. Avaliação da estrutura do laudo
significa que aproximadamente 92% dos
laudos não foram encontrados. Todavia, 2.1.Identificação: nesse item, conforme
os documentos psicológicos devem ser o CFP (2003), deveria obrigatoriamente
guardados observando-se a responsabilidade constar o nome do psicólogo, o número do
tanto do psicólogo quanto da clínica registro profissional, o nome do interessado
credenciada (CFP, 2003, 2009a). Além e o assunto ou a finalidade do documento.
disso, existem procedimentos que garantem Contudo, foram verificados apenas os
o acesso ao material nos casos de extinção do subitens de identificação do interessado:
serviço psicológico (CFP, 2005). Tal situação nome, idade, RG, UF, escolaridade, profissão
sugere falhas, no mínimo, no processo de e categoria. Não foram contemplados,
arquivamento do material, sendo que a nessa parte do laudo, subitens destinados
ausência de espaço físico adequado pode às informações do psicólogo. Mesmo sem

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essas informações nesse item, esperava-se submetido aos exames psicológicos a pedido
que elas estivessem contempladas ao final da autoridade executiva estadual de trânsito
do laudo, como a assinatura, o carimbo e o (Brasil, 2002).
número do CRP, contudo, vários documentos
não apresentaram essas informações, 52%, 2.3. Procedimentos: deveriam estar descritos
52% e 46%, respectivamente, conforme será os recursos e os instrumentos; verificou-se o
exposto na subseção 3.6. Ressalta-se que, ao registro de observações e dos instrumentos
realizar a avaliação, o psicólogo deve fornecer usados para avaliar a área percepto-motora
essas informações aos respectivos DETRANs e a reacional, o equilíbrio psíquico e as
por meio de um sistema de informação, habilidades específicas. Considera-se que os
sendo possível, dessa maneira, identificar o subitens obrigatórios foram contemplados na
profissional. Isso, entretanto, não justifica a estrutura do laudo.
sua ausência no próprio laudo, o que é uma
obrigação do psicólogo (CFP, 2003, 2009a). 2.4. Análise: nesse item, deveria constar a
Sem elas, seria bastante difícil e moroso o exposição descritiva e objetiva dos dados ou
processo de buscar nos arquivos os laudos das situações relacionadas à demanda. Nos
informados pelo sistema, como, de fato, laudos pesquisados, constam os resultados
esta pesquisa demonstra, dedicando um ano obtidos pelos candidatos nos instrumentos,
contudo, os campos disponíveis no
inteiro para a coleta dos dados.
documento (padronizados) são insuficientes
para uma exposição descritiva e objetiva
2.2. Descrição da demanda: deveriam constar
dos dados ou das situações relacionadas
as informações sobre a problemática, os
à demanda, conforme exigido pelo CFP
motivos para elaborar o documento e a
(2003), e constituem, portanto, uma limitação
justificativa dos procedimentos. Na estrutura
da estrutura dos laudos que devem ser
do laudo, todavia, consta, relacionado a esse
preenchidos pelos psicólogos.
item, o motivo de mudança da categoria; não
existem subitens relacionados à problemática
2.5. Conclusão: deveriam, obrigatoriamente,
e à justificativa dos procedimentos. Por um
constar os resultados da demanda e do
lado, considerando a avaliação psicológica
processo em sua complexidade. Em vez dessa
de candidatos à CNH um processo rotineiro,
denominação, identificou-se parecer final,
alguns psicólogos podem argumentar que
caracterizando não conformidade com a
não existe problemática/justificativa nesse
resolução do CFP (2003), que pode evidenciar
caso, por ser obrigatório. Por outro, convém
confusão entre o conceito de laudo e parecer,
destacar que compreender e expressar, também encontrada na literatura (Salazar,
minimamente, os aspectos contextuais do 1996), ou uma interpretação equivocada das
indivíduo auxiliará o psicólogo na escolha orientações do Conselho Federal de Psicologia.
dos procedimentos mais adequados junto ao A Resolução em vigor à época do estudo, n°
candidato (CFP, 2009b). Além disso, alguns 012/2000, indicava a elaboração de um parecer
casos requerem procedimentos específicos final em documento próprio após a finalização
que devem ser descritos e justificados, como do laudo. Nesse sentido, o laudo analisado
na avaliação de candidatos com limitações parece contemplar os dois documentos em um.
físicas e quando houver indícios de deficiência Na nova resolução, a produção do parecer não
física, mental ou de progressividade de foi contemplada (CFP, 2009b).
doença que possa diminuir a capacidade
para conduzir o veículo. Em caso de acidente 2.6. Outros requisitos obrigatórios: nesse
grave, o condutor nele envolvido poderá ser item, deveriam constar, por sua vez, o local,

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a data de emissão, a assinatura, o carimbo, O subitem 2, idade, foi registrado em todos


o n° do CRP e a rubrica em todas as laudas, os laudos, mas sem padronização; alguns
devendo a última ser assinada. No laudo profissionais preencheram somente a idade
analisado, não consta o local onde ocorreram (38 - 57%), outros, a data de nascimento
os exames. A rubrica do profissional em todas (13 - 19%), e outros, ambas as informações
as laudas, com a assinatura na última, não se (16 - 24%). Embora a forma como tenha
aplicou neste estudo, pois todos os laudos sido registrada essa informação não seja
não passaram de uma lauda. considerada um problema, ressalta-se que
erros na identificação da idade podem
Em síntese, os problemas aqui evidenciados implicar erros nos resultados dos testes, uma
comprometem a qualidade técnico-científica vez que o percentil atribuído ao candidato
dos laudos avaliados no aspecto concernente tem por base essa informação (CFP, 2009b).
à estrutura recomendada pelo CFP (2003). A
estrutura do laudo é importante, pois ajuda O subitem 3, número da identidade, foi
a organizar e a sistematizar a comunicação preenchido em todos os laudos, sendo que a
do processo avaliativo e dos resultados, unidade federativa (RG/UF) não foi registrada
enfim, a maneira pela qual o perito chegou em 16 casos (24%). A ausência de registro
a determinada conclusão. Uma vez que dessa informação pode gerar dificuldades para
sejam mal estruturados e/ou elaborados, encontrar os dados dos candidatos no sistema
podem causar problemas de entendimento de informação usado no departamento de
por parte de quem o recebe, produzindo, em trânsito; muitos registros são agrupados por
consequência, intervenções sem resultados unidade federativa.
efetivos (Guzzo & Pasquali, 2001; Santos &
Silva Neto, 2000). Necessário se faz, ainda, O subitem 4, escolaridade (ver Tabela 1), não
aprofundar a análise do preenchimento, em foi respondido em um laudo. Nos demais, a
que se verificará o que foi ou não expresso resposta variou: alguns psicólogos registraram
pelos psicólogos. É apresentado e discutido, a somente a série (a última série concluída ou
seguir, o preenchimento dos 20 subitens que a série em andamento), outros, o nível de
compõem a estrutura dos laudos avaliados. ensino (denominações antigas do sistema
educacional, por exemplo, 2° ou 1° grau
3. Avaliação da qualidade do e primário, e denominações atuais, como
preenchimento dos laudos ensino médio, ensino superior) e outros
registraram ambas as informações. Além
Todos os informes foram preenchidos à disso, observaram-se abreviações, como
mão. Em 20 laudos (30%), os profissionais para segundo grau e segundo grau completo
preencheram os dados de identificação do (2° g. e 2° grau c.) e ensino médio (EM). Essa
candidato com grafite, o que possibilita a informação, assim como a idade, é importante
ocorrência de fraudes no processo. Ver a para atribuição correta dos resultados da
Tabela 4 para uma síntese dos resultados avaliação em termos de percentis (CFP,
dessa subseção. 2009b). É importante destacar que, não
raro, existem candidatos que só conhecem
3.1. Identificação. O subitem 1, nome a nomenclatura antiga, e mesmo o psicólogo
do usuário, foi preenchido em todos os explicando, não conseguem informar que
laudos, alguns de difícil leitura pelo uso de escolaridade seria na denominação atual. O
abreviações, o que dificultou a localização psicólogo, então, registraria a informação tal
do material nos arquivos. qual diz o candidato.

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Tabela 1. Preenchimento do item escolaridade

Escolaridade N % Escolaridade N %

1° grau 5 7,5 1° ano 2° grau 2 3


1° grau completo 1 1,5 2° ano do 2° grau 1 1,5
1° CP (1° grau) 1 1,5 2°ano 1 1,5

3° série primário 1 1,5 EM 7 10


3° série 1 1,5 Ensino médio completo 2 3
5° série 1 1,5 Ensino médio 2 3
6° 2 3 EM incompleto 1 1,5
7° 1 1,5 Ensino médio com. 1 1,5
8° 4 6 Ensino médio completo - 5° 1 1,5

2° grau completo 12 18 3° grau incompleto 2 3


2° grau 10 15 3° em andamento 1 1,5
2° g. 2 3 3° grau 1 1,5
2° completo 1 1,5 Superior 1 1,5
2° grau c. 1 1,5 Sem resposta 1 1,5

Total 67 100

Nota: Os conteúdos desta e das tabelas posteriores foram retirados, na íntegra, dos laudos pesquisados.

O subitem 5, profissão, não foi preenchido em dois laudos; não foi verificada padronização nas
respostas, que variaram entre o trabalho realizado, a profissão atual e a profissão pretendida
pelo candidato quando adquirisse a habilitação. A maioria (32 - 47,5%) foi categorizada como
motorista (seja de caminhão, de carro particular, de carro pequeno, de ônibus, de Kombi ou
taxista), moto táxi, motoboy ou motoqueiro. Os demais registros não tiveram relação direta com
a profissão de motorista (p. ex., desempregado, estudante, autônomo, dedetização) ou não
foram preenchidos. A amostra pesquisada foi de motoristas profissionais, sendo esperado nesse
item um detalhamento maior sobre a atividade do indivíduo, de modo que o psicólogo pudesse
realizar a sua intervenção de maneira focada. Esses resultados indicam falta de padronização no
registro do dado para torná-lo útil, pois essa informação deveria ter sido colhida e esclarecida na
entrevista inicial para ser registrada objetivamente no laudo, que é a última etapa do processo
avaliativo. Sabendo qual o tipo de veículo que o motorista dirige/pretende dirigir e sua profissão, o
psicólogo pode: avaliar o candidato de acordo com o tipo de veículo a ser conduzido, considerar
essa informação na análise abrangente dos resultados dos testes e no direcionamento de sua
intervenção na entrevista devolutiva. Na prática profissional, essa informação parece irrelevante,
pois motoristas que exercem atividade remunerada (profissionais) e não remunerada (não
profissionais) são avaliados da mesma forma, com os mesmos testes. Entretanto, é reconhecida a
necessidade de uma sistematização mais objetiva das habilidades mínimas desses diferentes tipos
de motoristas (CFP, 2009b). O uso em pesquisa dos resultados das inúmeras avaliações feitas nas
clínicas credenciadas poderia colaborar com essa sistematização.

O subitem 6, categoria de habilitação (ver Tabela 4), não foi preenchido em três laudos e, em
outros dois, não foi identificado o tipo de habilitação, mas a palavra carro. Ressalta-se que o
Código de Trânsito Brasileiro (Brasil, 2002) define que os candidatos poderão habilitar-se em
categorias que variam de A a E, sendo que o automóvel corresponde à categoria B. Assim,

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como argumentado no subitem anterior, a categoria também é importante do ponto de vista


do planejamento da avaliação psicológica e da entrevista devolutiva. Apesar disso, 22 laudos
(33%) apresentaram informações não relacionadas a esse item: alguns psicólogos preencheram o
tipo de serviço realizado (p. ex., se mudança ou renovação de habilitação) eventualmente com
o uso de abreviações, e outros (7 - 10%), com o número do Registro Nacional de Condutores
Habilitados (RENACH) antes da(s) letra(s) da categoria.

3.2. Descrição da demanda. O subitem 7, motivo de mudança de categoria (ver Tabela 2), foi
preenchido inadequadamente em quatro casos, indicando, em vez do motivo, o tipo de serviço
(mudança ou renovação), não tendo sido preenchido em 25 casos (37%). Isso pode evidenciar
que o item não se aplica a alguns candidatos, como nos casos de renovação da CNH, o que não
implicaria, necessariamente, mudança de categoria. Ressalta-se a presença da seguinte resposta:
“Pretendo dirigir carro de porte grande”, o que pode indicar que o próprio candidato preencheu
esse item do laudo. É oportuno ressaltar que o laudo psicológico é um documento científico,
razão pela qual deve ser preenchido pelo psicólogo que possui a capacitação necessária (CFP,
2003). Talvez algumas das falhas no preenchimento desse laudo possam ser explicadas pelo fato
de o preenchimento ter sido feito pelo próprio candidato à revelia da lei. Nos demais laudos,
não se teve evidência semelhante. Em vários laudos, os psicólogos usaram abreviações.

Tabela 2. Preenchimento do item motivo de mudança da categoria

Motivo N % Motivo N %

Trabalho 6 9 manipular veículo maior 3 4,5


para profissionalizar-se 2 3 para dirigir caminhão 2 3
mais oportunidade de emprego 1 1,5 pretendo dirigir carro de grande porte 1 1,5
profissionalizar-se 1 1,5 vai adquirir caminhão próprio 1 1,5
para poder trabalhar 1 1,5
profissionalmente exigência da empresa 2 3
trabalhar dirigir van 1 1,5 mud. no trabalho 1 1,5

Renovação 5 7,5
renov. 4 6 A-D 1 1,5
renovação de exames 2 3 AB-AD 1 1,5
renov CNH vencida 1 1,5
validade renov. 1 1,5 colocado atividade remunerada 1 1,5
Ren. + mud. – p/ profissionalizar-se 1 1,5
renovação + mudança. 1 1,5 para se algum dia eu vier a precisar 1 1,5
por causa de trabalho
vai dirigir caminhão
renovação + mud. cat (ativ. 1 1,5 Sem resposta 25 37
remunerada)
Total 67 100

3.3. Procedimento. No subitem 8, observações, a maioria dos laudos (55 - 82%) não teve qualquer
registro. Nos casos em que isso foi feito (12 - 18%), verificaram-se abreviações e alguns registros
que se relacionavam aos itens já contemplados no laudo, como: local de residência do candidato
([...] desde criança e reside em [...]), situação emocional ou problemas do candidato (apresenta
tartamudez e tio doente no hospital), identificação do candidato ([...], solt., mora c/ pais e “[...],

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solt., mora c/ pais e 01 irmão), testes aplicados anteriores, abreviações: AC (41 - 61,2%),
(PLG/TD e TCA, abreviações de palográfico, TC-B (4 - 6%) e TC-A (2 - 3%).
TADIM e TACOM-A), escolaridade (cursando
2° ano do EM) e informações gerais dos No caso da atenção difusa, foram aplicados
resultados e da retestagem (resultado de três testes (Teste de Atenção Difusa 1 –
05.06 lançado em 12.06.07, pois apareceu TEDIF-1, Teste de Atenção Difusa para
8 dias antes; reteste c/ 10 dias por iminência Motorista – TADIM, e sua segunda versão, o
de perder emprego). Conforme se verifica, TADIM-2), sendo que 21 laudos (31%) não
esse subitem não foi destinado ao registro de explicitaram os testes usados; também foram
observações sistemáticas do comportamento identificadas abreviações: TD para TADIM (34
do candidato, especialmente durante a - 51%), TD-2 ou TD2 para TADIM-2 (2 - 3%
testagem; algumas informações já estavam e 1 - 1,5%, respectivamente) e TF1 ou TDF-
contempladas em outros subitens. 1 para TEDIF-1 (2 - 3%, 4 - 6%, e 3 - 4,5%,
respectivamente).
O subitem 9, testes da área percepto-reacional
e motora, não foi preenchido em 20 laudos Os resultados dos subitens 9 a 11 indicam
(30%). Nos documentos que apresentaram que todos os testes possuem o parecer
essa informação, identificou-se a aplicação favorável; entretanto, também indicam falta
de testes de inteligência (Teste não Verbal de informação e clareza na expressão dos
de Inteligência – R-1, e Teste de Raciocínio testes usados, contrariando as normas do
Lógico – TRAP-1). Alguns psicólogos usaram CFP (2003).
abreviações não padronizadas para identificá-
los: R-1 (25 - 37%), R1 (15 - 22%), TRAP-1 3.4. Análise. No subitem 12, resultados
(4 - 6%) e TRAP (3 - 4,5%). Em 11 laudos das áreas percepto-reacional e motora, 20
(16,5%), o teste Atenção Concentrada (AC) laudos (30%) não apresentaram os resultados
foi colocado nesse subitem incorretamente, obtidos pelos candidatos (ver Tabela 3). Nos
uma vez que se caracteriza como um teste laudos que apresentaram essa informação,
de habilidade específica, subitem 11. observaram-se variadas formas de expressá-la
(p.ex., MS para médio superior, MI para médio
O subitem 10, testes do equilíbrio psíquico, inferior, S para superior, e + e - para indicar
não foi preenchido em 22 laudos (33%). bom ou mau desempenho no teste).
Nos documentos que apresentaram essa
informação, identificou-se a aplicação do No subitem 13, resultados do equilíbrio
Teste de Personalidade Palográfico, assim psíquico, 21 laudos (31%) não apresentaram
como o uso das seguintes abreviações: PLG os resultados, sendo identificado o uso de
(44 - 66%) e PG (1 - 1,5%). abreviações (p.ex.: ok!, I, +/-, -, apto, - e MI,
ver Tabela 3). Destaca-se que ok foi usado
No subitem 11, testes das habilidades na maioria dos casos. Abreviações como: ok,
específicas, foram usados testes para ok!, apto e + foram usadas para indicar bom
avaliar a atenção concentrada e a atenção desempenho. Inversamente, as abreviações
difusa. No caso da avaliação da atenção +/-, Reg. ou I foram usadas para indicar que
concentrada, foram usados três testes o candidato se saiu mal no exame, de maneira
(Atenção Concentrada Suzy Cambraia – AC e regular ou inferior; o resultado, porém, não
Teste de Atenção Concentrada para Motorista fica claro.
formas A e B – TACOM-A e TACOM-B).
Esse item não foi preenchido em 20 laudos No subitem 14, resultados das habilidades
(30%), identificando-se, conforme os subitens específicas (ver Tabela 3), consta a avaliação

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da atenção concentrada, mas 20 laudos (30%) não explicitaram os resultados. No caso da atenção
difusa, 21 laudos (31%) também não o fizeram, e foi verificado, também, conforme os itens
anteriores, o uso de abreviações. Em geral, não constam os escores brutos nos resultados, nem
os percentis. Em vários casos, os profissionais usaram as conclusões, isto é, apto/inapto, o que só
deve ser atribuído ao final do laudo no item conclusão (CFP, 2003). Os resultados são expressos
por meio de abreviações, o que os torna pouco claros e precisos. Guzzo e Pasquali (2001)
afirmam que um laudo com qualidade técnico-científica deve não só expressar os instrumentos
utilizados, o objetivo e o nome de cada uma deles, como também especificar os resultados brutos
e padronizados de cada teste, evitando o excesso de sentenças abreviadas.

Os resultados dos testes não foram discutidos à luz do entendimento dinâmico das condições
do analisando, tampouco foram relacionados com as informações obtidas por meio da
entrevista, das observações ou da teoria. Aspectos semelhantes foram evidenciados no contexto
organizacional. O Conselho Regional de Psicologia de São Paulo - CRPSP (2006) identificou que,
sobre a fundamentação teórica envolvida no processo, pouco mais de 50% apresentaram alguma
referência teórica, além de manuais e testes psicológicos. Apesar disso, Wechsler (2001) considera
que o psicólogo deve usar linguagem adequada aos destinatários que inclua os diversos aspectos
do sujeito, especialmente a natureza dinâmica e circunstancial dos resultados. Cunha (2000),
por sua vez, sugere que, para que a comunicação seja cientificamente adequada, é necessária
a realização da seleção, da organização e da integração dos dados no processo de comunicar.

Tabela 3. Exemplos de preenchimentos dos itens relativos aos resultados dos testes

Área percepto-reacional Equilíbrio psíquico Habilidades específicas


e motora Atenção concentrada Atenção difusa

Resultado N % Resultado N % Resultado N % Resultado N %

MS 10 15 Ok 15 22 MS 10 15 MS 11 16
MI 8 12 MI 10 15 S 9 13 M 10 15
S 8 12 +/- 7 10 M 9 13 Apto 7 10
Apto 7 10 Apto 6 9 Apto 7 10 MI 7 10
M 3 4,5 ok! 4 6 MI 3 4,5 I 3 4,5
MI (g) 3 4,5 + 2 3 I 3 4,5 apto – S 2 3
apto – S 2 3,0 I 1 1,5 apto – S 1 1,5 S 2 3
I 2 3,0 Reg. 1 1,5 apto – MI 1 1,5 apto – MI 1 1,5
apto – MI 1 1,5 apto – M 1 1,5 MI (g) 1 1,5
+ 1 1,5 + 1 1,5 + 1 1,5
M/Sup. (apto) 1 1,5 - 1 1,5 M/Inf. (apto) 1 1,5
- 1 1,5 M/Inf. (apto) 1 1,5
sem resposta 20 30 sem resposta 21 31 sem resposta 20 30 sem resposta 21 31
Total 67 100

3.5. Conclusão. O subitem 15, parecer final (ver Tabela 4), não foi preenchido em dois laudos
(3%). Dezesseis laudos (24%) apresentaram essa informação usando abreviações na escrita, tais
como, está apto p/ con (AD) e no momento apto p/ CNH D, para expressar que o candidato está
apto para conduzir ou para adquirir a carteira de habilitação do tipo AD ou D. Quatro candidatos
foram considerados inaptos. Alguns laudos não têm conclusão; em outros, falta clareza devido
ao uso de abreviações. Apesar disso, a conclusão do laudo deve descrever a tomada de decisão
técnica do profissional, deve concluir sobre algo, sem margem de dúvidas, de forma que se
tenha certeza do resultado da avaliação (CFP, 2003). Deve-se, ainda, evitar impropriedade na

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escrita e no uso de termos (Anastasi & Urbina, 2000; Cruz, 2002; Santos & Silva Neto, 2000).
Considerando conjuntamente a avaliação dos itens procedimentos e análise, apresentados nas
subseções anteriores, assim como a existência de poucos candidatos inaptos, parecem existir
evidências de que alguns peritos chegaram às suas conclusões sem que os indivíduos tenham sido
plenamente avaliados. Não foi verificada nenhuma recomendação aos candidatos, especialmente
àqueles considerados inaptos. Entretanto, o CFP (2003) e Wechsler (2001) indicam que se devem
constar no laudo recomendações específicas, que incluam os diversos aspectos do sujeito. Guzzo
e Pasquali (2001), por sua vez, reivindicam maior atenção à produção de laudos na formação
dos psicólogos, pois muitos profissionais têm reproduzido nos documentos apenas os resultados
dos testes, sem considerar os aspectos contextuais de desenvolvimento dos indivíduos. Segundo
os autores, laudos com essas características contribuem apenas com os requisitos legais, mas são
ineficazes do ponto de vista da tomada de decisão.

3.6. Outros requisitos obrigatórios. Verificou-se o devido preenchimento do subitem 16, data,
em todos os laudos. No subitem 17, assinatura do usuário, observou-se que dois laudos (3%) não
estavam assinados. Dos laudos assinados, 20 (30%) foram assinados com caneta e 45 (67%) com
lápis grafite, o que possibilita a ocorrência de fraudes. No subitem 18, assinatura do psicólogo,
35 laudos (52%) possuíam apenas a rubrica, não sendo possível identificar quem elaborou o
documento.

No subitem 19, o carimbo não foi usado em 35 laudos (52%). No caso dos que apresentaram
o carimbo, isto é, 32 laudos, analisou-se a legibilidade do nome do profissional com base na
nitidez (legível; moderadamente legível, quando era possível observar o nome do profissional,
porém com dificuldade, devido à pouca nitidez da tinta, e ilegível, quando o nome ou parte
dele estava completamente apagado). Quatro carimbos foram considerados ilegíveis, e três,
moderadamente legíveis.

O subitem 20, número do registro profissional (CRP), não foi preenchido em 31 laudos (46%).
No caso dos que apresentaram o registro no carimbo, foi analisada a legibilidade do CRP de
maneira semelhante ao item 19 (legível, moderadamente legível e ilegível). Dos 36 laudos
com CRP no carimbo, três foram considerados moderadamente legíveis e um foi considerado
ilegível. Em relação aos subitens obrigatórios dessa seção, outro estudo encontrou problemas
semelhantes, dentre eles: ausência do nome completo do profissional, ausência da expressão
psicólogo e do número de registro do Conselho no carimbo e folhas dos laudos sem rubricas e/
ou não assinadas (CRPSP, 2006).

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Tabela 4. Sumário da análise do preenchimento dos laudos psicológicos

Subitens avaliados no laudo Resultado

1. Nome do usuário Registrado em todos os documentos. Todos os laudos foram preenchidos à mão. Uso de
abreviações e caligrafia de difícil leitura em muitos laudos.
2. Idade Registrada em todos os laudos, todavia, identificou-se uma variação no modo de registro.
Alguns registraram a idade (n=38 - 57%), outros apenas a data de nascimento (13 - 19%)
e outros, ainda, ambas as informações (16 – 24%).
3. Número da identidade e Registradas em todos os casos, porém, em 16 (24%) laudos, não foi registrada a UF.
unidade federativa (UF)

4. Escolaridade Registrada em todos os laudos, entretanto, com o uso de terminologias diferentes, p. ex.,
2° ou 1° grau e ensino médio, ensino superior. Demais problemas: em alguns casos, foi
colocada a última série concluída; em outros, a série em andamento, em outros, ainda,
o nível de escolaridade completa, incompleta ou não divulgada.
5. Profissão Registrada em todos os laudos, contudo, sem uma padronização em grupos de motoristas;
em alguns casos, foi registrada a profissão atual e, em outros, a profissão pretendida do
candidato depois da aquisição da habilitação. Os demais registros não tiveram relação
direta com a profissão de motorista (p. ex., desempregado, estudante, autônomo,
dedetização) ou não tiveram resposta.
6. Categoria de habilitação Em três laudos, não houve preenchimento; em outros dois, não foi identificado o tipo de
pretendida habilitação, mas a palavra carro. Apesar de não solicitado, 22 (33%) laudos informaram,
em acréscimo, o tipo de serviço solicitado, isto é, mudança e/ou renovação da habilitação:
AD – renovação, AD – mudança, D – renov., Ren. AB, Ren. + Mud. – AD, D – mud.,
A – Renovação, B renov.
7. Motivo de mudança da Em 25 (37%) casos, não aparecem os motivos, e, em quatro (6%) casos, o item foi
categoria preenchido indicando o tipo de serviço solicitado.

8. Testes e Área percepto- Vinte laudos (30%) não apresentaram os testes usados, nem os resultados. Uso de siglas
resultados motora e não padronizadas (R1 e TRAP). Os resultados apresentam diferentes designações ou a
reacional* classificação abreviada (apto, MI, I, apto – MI, +).
Equilíbrio Vinte e dois laudos (33%) não apresentaram os testes usados, nem os resultados. Uso de
Psíquico* siglas não padronizadas (“PLG” ou “PG” para o palográfico). Os resultados apresentaram
diferentes designações (ok!, i, +/-, -, apto, -).
Habilidades Quarenta e um laudos (61%) não apresentaram os testes usados, nem os resultados. Uso
específicas* de siglas não padronizadas (TC-B para o teste TACOM-B). Os resultados apresentaram
diferentes designações ou com abreviação da classificação (apto, M,, I, +, -).
9. Parecer final Deveria ser denominada conclusão, em vez de parecer final. Não foi expresso em dois
(3%) laudos e 16 (24%) laudos apresentam abreviações na escrita (está apto p/ con (AD),
no momento apto p/ CNH AD, no momento apto p/ CNH D, Está apto p/ con (AE), cond
apto, cond apto p/ CNH (AD), Inapto T). Quatro candidatos foram considerados inaptos.
As conclusões apresentadas não transmitem a análise da demanda em sua complexidade
e do processo de avaliação psicológica como um todo.
10. Data Registrada em todos os laudos.
11. Assinatura do usuário Dois (3%) laudos não estavam assinados; 45 (67%) estavam assinados com lápis grafite.
12. Assinatura do psicólogo Todos assinaram, todavia, em 35 (52%) laudos constavam apenas a rubrica, sem o carimbo
e carimbo exigido, não sendo possível identificar quem realizou a avaliação psicológica, e 35 (52%)
laudos não apresentaram o carimbo com as informações profissionais.
13. N° do CRP Não constaram em 31 (46%) laudos, apesar de ser obrigatório.

* O presente estudo ocorreu durante a vigência da resolução CONTRAN n° 080/1998, que apresentava essas denominações. A resolução
CONTRAN n° 267, de 15 de fevereiro de 2008, atualmente em vigor, estabelece: tomada de informação, processamento de informação,
tomada de decisão, comportamento e traços de personalidade (www.denatran.gov.br).

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Conclusões com o uso de juízes, embora tenham sido


operacionalizados indicadores objetivos com
Os resultados evidenciaram vários problemas base nas resoluções do CFP e na literatura
nos aspectos descritos e avaliados nos destinada a avaliar a qualidade. A criação de
registros localizados no período, alguns mais medidas ou índices de erro é indicada para
graves do que outros. Em relação à guarda, sintetizar as informações sobre os laudos, e
menos de 10% dos laudos psicológicos da as pesquisas futuras deverão considerar esses
população-alvo foram encontrados para aspectos.
as análises desta pesquisa. Na estrutura do
laudo padronizado, não foi verificado um Os resultados de estudos anteriores (CFP,
dos cinco itens obrigatórios, a conclusão; 2006; CRPSP, 2006) indicam algumas
em vez dele, havia o parecer final, sem falhas do psicólogo e das instituições.
os subitens relativos ao psicólogo (nome Esperava-se, portanto, até certo ponto,
e número do CRP). Também não foi encontrar falhas na guarda e na elaboração
registrado o local de realização dos exames. dos laudos neste estudo, mas não nas
A análise do preenchimento evidenciou proporções aqui evidenciadas e em quase
outros problemas, ressaltando-se: 1) o uso todos os elementos pesquisados. Isso leva aos
excessivo de abreviações, 2) a ausência ou seguintes questionamentos: por que a maior
a expressão inadequada dos instrumentos parte dos laudos não foi encontrada? Por que
e de seus resultados e 3) a não integração os laudos tinham tantas falhas? Responder a
dos dados da entrevista, da observação, essas questões transcende o escopo deste
dos testes e da teoria na análise, o que trabalho, que buscou identificar quais as
pode comprometer as conclusões dos falhas dos peritos em trânsito na elaboração
profissionais. e na guarda dos laudos psicológicos.

É possível concluir que a maior parte dos Estudos futuros deverão pesquisar as
laudos psicológicos analisados não possui a possíveis implicações (emocionais, p. ex.) de
qualidade técnico-científica recomendada laudos sem qualidade para os candidatos –
pelo Conselho Federal de Psicologia. Deve- especialmente os considerados inaptos –, para
se ter cautela, no entanto, com qualquer outros profissionais (tomada de decisão) ou
generalização, visto que os resultados mesmo para a sociedade. Deverão investigar,
podem não refletir as características típicas igualmente, o que provoca tais falhas, seja no
tanto da população de psicólogos do trânsito, seja nas outras áreas da Psicologia,
Estado (53% dos documentos não tinham a considerando a realidade desses profissionais
identificação) quanto dos laudos produzidos e o perfil da população que procura os
por eles junto aos motoristas profissionais em serviços psicológicos. Alguns elementos
2007, devido à baixa frequência de laudos podem ser destacados além daqueles
encontrados. É possível que laudos mal apontados pelo CFP (2006), tais como: a
elaborados tenham aparecido mais vezes falta de tempo realizar todo o processo de
na amostra, seja porque foram avaliados avaliação psicológica, a pouca experiência
os documentos de alguns profissionais mais e/ou a falta de conhecimento sobre a
do que de outros, seja porque os laudos elaboração de documentos psicológicos, os
bem elaborados não foram cobertos na baixos valores pagos pelas clínicas de alguns
amostra selecionada a partir do método Estados para avaliar um candidato ou, ainda,
usado. O ato de avaliar dos pesquisadores o pouco interesse que parece ser dado, talvez,
também pode ter introduzido erros de a esses profissionais, inclusive por parcela da
julgamento, que devem ser minimizados categoria profissional.

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Nessa linha, as avaliações sistemáticas 2001), pode ser também indiretamente a


e constantes da guarda e da elaboração expressão (negativa ou positiva) de elementos
dos laudos podem oferecer importantes contextuais importantes. As condições de
indicadores não só de qualidade dos trabalho podem ter um papel moderador da
documentos escritos mas também indicadores expressão das competências profissionais, isto
da qualidade do trabalho do psicólogo. O é, más condições de trabalho desfavorecem
código de trânsito estabelece os aspectos a expressão das competências do psicólogo
a serem fiscalizados, porém relacionam-se na elaboração dos laudos, especialmente a
mais ao credenciamento e às instalações daqueles profissionais que prestam serviço
físicas. Avaliar a guarda e a qualidade dos atendendo várias pessoas diariamente
laudos ofereceria indicadores objetivos da (Silva, no prelo). Isso ocorre, por exemplo,
avaliação psicológica, uma vez que o laudo na perícia de trânsito, em que o número
é a última etapa e poderá refletir possíveis de pessoas que tiraram a habilitação vem
falhas no processo. Isso possibilitaria entender aumentando a cada ano, sem que se aumente
eventuais dificuldades e planejar intervenções o número de psicólogos credenciados na
em benefício dos psicólogos e da população, mesma proporção. Além disso, muitos
a partir do aprimoramento e da qualificação psicólogos também não têm clínica própria,
da atividade (p. ex., cursos, treinamentos,
prestando serviço para clínicas que pagam
mudanças na organização do serviço e/
valores baixos para avaliar um candidato, o
ou das rotinas de trabalho). A estratégia
que pode ser um fator de precarização do
metodológica usada neste estudo, portanto,
trabalho cujo impacto deve ser investigado.
poderá ser útil para os DETRANs e os CRPs
Em síntese, sugere-se a expansão do foco
no cumprimento e na intensificação de
de análise, considerando a qualidade do
suas funções: orientação e fiscalização das
laudo psicológico além da expressão da
entidades e profissionais credenciados, o que
competência técnica do psicólogo, incluindo
possibilitaria intervenção eficiente/eficaz com
também o papel exercido pelas condições
base em critérios precisos.
de trabalho na redação e guarda do material.
Talvez esse seja um grande desafio para os
Aprofundando ainda mais o nível de
estudos posteriores sobre a produção de
análise, a produção de laudos pode ser mais
documentos psicológicos.
do que a expressão da (in)competência
profissional (Cruz, 2002; Guzzo & Pasquali,

Fábio Henrique Vieira de Cristo e Silva


Doutorando, Laboratório de Psicologia Ambiental, Instituto de Psicologia, Universidade de Brasília, Brasília – DF – Brasil.
E-mail: fabiodecristo@gmail.com

João Carlos Alchieri


Doutor, Prof. Adjunto do Departamento de Psicologia, Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Universidade
Federal do Rio Grande do Norte – Rio Grande do Norte - Brasil.
E-mail: jcalchieri@gmail.com

Endereço para envio de correspondência:


Universidade de Brasília, Campus Darcy Ribeiro, Instituto Central de Ciências Sul, Instituto de Psicologia, Laboratório
de Psicologia Ambiental. Brasília, DF. CEP 70900-100.

 Recebido 19/7/2010, 1ª Reformulação 10/2/2011, Aprovado 5/5/2011.

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