Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
zad da d ã Pa I
Discoid lupus erythematosus: * Faculdade de Medicina
Veterinária e Zootecnia - USP
*CarlosEduardolarsson1-CRMV-SPn° 1037
MaryOtsukal - CRMV-SP n° 8503
I Professor Titular do Departamento de Clínica Médica - FMVZ - USP
1 Médica VeterináJia do Serviço de Dermatologia do Hospital Veterinário - FMVZ - USP
RESUMO
Em função de sua grande ocorrência em serviço especializado de dermatologia, vinculado ao Hospital
Veterinário da Universidade de São Paulo, revisam-se os principais aspectos do lúpus eritematoso
discóide, no que se refere às suas etiopatogenia, epidemiologia, aos aspectos sintomáticos e lesionais
(em carnívoros e herbívoros domésticos), diagnóstico e protocolo de terapia. Enfocam-se dados bra-
sileiros (paulistas e cariocas) e norte-americanos, relativos à magnitude de ocorrência frente às de-
mais doenças auto-imunes diagnosticadas, segundo as variáveis: definição racial, sexual e idade de
carnívoros domésticos, comparando-os àqueles evidenciados em pacientes humanos.
29
LARSSON, C. E.; OTSUKA, M. Lúpus eritematoso discóide - LED: revisão e casuística em serviço especializado da Capilal de São Paulo! Discoitl Iuplls erytliematosl/s:
general rev;ew anti a ser;es of cases of a speciolizetl serv;ce in the city of São POLllo, fim:.;I! Rev. educo contin. CRMV~SI) I Cofltiw/Ous Etlucatioll loumol CRMV~SP,
São Paulo, volume 3, fascículo I, p. 029 - 036, 2000.
Tabela J - Freqüências das manifestações clínicas do LES em cães e no homem. Também, na etiopatogenia do
LES canino, aventou-se o papel desem-
Manifestação Cão Homem penhado por retrovírus, pelos vírus
Febre 100 55-86
vacinais da cinomose, da hepatite, da
Poliartrite
para-influenza e do parvovírus; em
90,6 89-100
Nefropatia
cães e camundongos, pelos hormôni-
65.3 40-60
Dermatopatia
os estrogênicos com incidência maior
60 25-70
Linfoade/esplenomegalia 49.3 20-67
em fêmeas e uma aparente proteção
Anemia hemolítica 13.3
conferida pelos andrógenos e pelas
12.4
Trombocitopenia drogas antiestrogênicas utilizadas em
4 8-50
Miosites 8 -
modelos experimentais com murinos,
Pleuropericardite por fatores ambientais (alimentos e
8 25-56
Neuropatias 1.6
radiação actínica) e por drogas, no
40
Polineurites 1.3
homem (procainamída, hidralazina, iso-
2.5-20
niazida, penicilamina, anticonvulsivan-
Fonte: CHABANNE et ai., (1999).
tes e anticonceptivos) e, nos outros
A etiopatogenia é, ainda, basicamente desconhe- animais, por imunógenos.
cida na medicina, seja humana, seja veterinária. Difere, De todo esse mecanismo multi fatorial, descrito
em termos gerais, de uma aparente etiologia multifatori- para o LES, apenas a radiação ultravioleta é considerada
ai, relatada nos animais e no homem, acometidos pelo como um fator desencadeante ou perpetuante do LED
LES. em cães, em eqüinos e no próprio homem (SAMPAIO el
No LES considera-se haver uma origem genética, ai., 1982; OLIVRY, 1996; SCOTT et ai., 1996). Cerca
predispondo tanto pacientes humanos como caninos a de 50% de cães com LED manifestam agravamento do
desenvolver esta modalidade. De fato, existe determina- quadro frente à exposição solar cotidiana (SCOTT et ai.,
do percentil de incidência da doença e de anomalias so- 1996).
rológicas em ascendentes de famílias de pacientes, hu- No LE canino, a patogenia das lesões de pele é ain-
manos e caninos, com LES. Segundo PROENÇA el ai., da incerta. Têm-se como características da apresentação
(1989), na Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa das lesões tegumentares: a fotossensibilidade (tanto ao UVA
de Misericórdia de São Paulo (FCMSCM), no período de como ao UVB), a lesão de ceratinócitos (associados a lin-
1982-1988, pôde-se identificar 4% de pacientes acometi- fócitos T e a macrófagos), a infiltração linfocitária (no ho-
dos por LES, que possuíam uma história familiar do qua- mem há predomínio de plasmócitos, todavia, consideram-
dro clínico. Em veterinária, em linhagens de cães Berger se os linfócitos b como importantes), a produção de auto-
Alemães, considera-se que a presença de haptotipos (an- anticorpos e a deposição de imunocomplexos.
tígeno DLA-77) teriam um valor preditivo da enfermida- Na Figura I, dispõe-se, de forma esquemática, o
de (OLIVRY, 1996). suposto mecanismo etiopatogênico responsável pelo de-
--
sencadeamento dos
Luz solar
(UVAlB)
-- --
Citotoxicidade
AC - dependente
quadros de LED, qual
seja: a indução, pela ra-
diação ultravioleta
(UVA e UVB), da ex-
express(io alllo-anligênica 1
pressão de auto-antíge-
nos (citoplasmáticos e
OUEJI..~TJ.\·OClTO DA ,\JEUBR.·jA~ Atratantes (lL I) nucleares), na superfície
- 8.·1.5:-/ L I inroci l:írios da membrana celular
dos ceratinóticos. Sub-
1
seqüentemente, há a
ANA
atividade linfoc. B
IgM
- Citotoxicidade (TNFa.
[L 3.6.8)
30
LARSSON, C. E.; OTSUKA, M. Lúpus eritematoso discóide - LED: revi ão e casuística em serviço especializado da Capital de São Paulo I Discoid lupus el}'lhemoIOSlls:
general review and a series of cases of a speciali~ed service in lhe city of São Paulo, Brazill Rev. educo contin. CRMV-SP I Cominuous Educalion }oumal CRMV-SP,
São Paulo, volume 3, fascículo I, p. 029 - 036, 2000.
31
LARSSON, C. E.; OTSUKA, M. Lúpus eritematoso discóide - LED: revisão e casuística em serviço especializado da Capital de São Paulo I Discoid /upus el)'thelllatosus:
general revielV and a series of cases of a specialized service in lhe city of São Pau/o, Brazi/I Rev. educo contin. CRMV-SP I Contil1uous Education Jouma/ CRMV-SP,
São Paulo, volume 3, fa cículo I, p. 029 - 036, 2000.
• Felinos
Também, apresentam lesões (alopecia, eritema,
escamas e crostas), predominantemente, faciais e auri-
culares, com igual tendência àquela dos eqüinos, para a
despigmentação tegumentar nasal (KIMM e NOXON,
1985).
• Caninos
Figura 3: Prevalência de LED em cães, segundo a definição racial e Inicia-se o quadro pela discromia progressiva do
raça. Serviço de Dermatologia da FMVZlUSP, 1986-1998 plano nasal (de negro transforma-se numa coloração
acinzentada ou azul escura) com concomitante subs-
tancial modificação na arquitetura desta região (de as-
pecto losângico e áspero, dito em "calçamento de pe-
dra", torna-se liso), aspecto este que auxilia na diferen-
ciação di agnóstica com o vitiligo, uma vez que super-
põem-se eritema e descamação nasal. Em fases tardi-
as, surgem lesões erodo-ulcerativas e crostosas. A der-
matite nasal, vista em 95,4% dos casos, com certa fre-
qüência tem o aspecto típico em "asa de borboleta" ou
Fêmea - em "vespertílio", tal como o evidenciado em pacientes
37% humanos. Estas lesões nasais são vistas, inicialmente,
na porção dorsal, na junção muco-cutânea ou ao longo
Figura 4: Prevalência de LED em cães, segundo o sexo. Serviço de das porções ventral ou mediaI, das dobras alares, ten-
Dermatologia da FMVZlUSP, 1986-1998 dendo a evoluir para toda região nasal incluindo a ponte
(Figuras 5 a 9).
Aparentemente, nos cães acometidos pelo LED, Menos freqüentemente se têm lesões auriculares
em São Paulo (Figuras 3 e 4), inexiste predisposi- (25%), perioculares (19%), labiais (12,5%), palatinas
ção relativa à definição racial (57,0% em animais (12,5%), distais dos membros (12,5%), sob a forma de
com raça definida, sendo, todavia, mais freqüente em pododermatite generalizada (OLIVRY, 1996), e na ge-
animais entre o segundo e quinto ano de vida (68%) nitália. Por vezes, há lesões estritamente nasodigitais
e, curiosamente, dentre os machos (63%). SCOTT (6,2%) ou auriculares (SCOTT et ai., 1983).
et aI., (1996), nos EUA, e CARLOTTI (1989), na A dor e o prurido são de intensidade variável, no
França, afirmaram inexistir predisposição sexual ou geral de pouca importância (OLIVRY, 1996). O prurido
etária. relatado por 10,5% daqueles pacientes humanos (PRO-
No que tange aos animais de raça definida (Figu- ENÇA et aI., 1989), é de intensidade variável, e igual,
ra 3), aqueles mais acometidos no Brasil (São Paulo) são segundo o decurso evolutivo, nos animais acometidos.
Akita (43,7%), Pastor Alemão (18,7%) e Pinscher A tendência evolutiva é a formação de cicatrizes
(12,5%). Nos EUA (SCOTT et aI., 1996) são Col1ies e de leucodermia, de intensidade variável. Quando ocor-
(37,5%), Pastor Alemão (18,8%), Pastor de Shetland re agravamento lesional nasal, com formação de úlce-
(12,5%), Husky Siberiano (12,5%). ras atingindo arteríolas, embora raro, pode ocorrer qua-
dro hemorrágico agudo.
Quadros sintomáticos e lesionais
Diagnóstico
• Eqüinos
Topograficamente, as lesões instalam-se nas re- Baseia-se, para sua elaboração, nos dados anam-
giões cefálica (face e pavilhões auriculares) e cervical, nésicos, nos achados do exame físico e nos resultados da
32
LARSSON. C. E.; OTSUKA, M. Lúpus eritematoso discóide - LED: revisão e casuística em serviço especializado da Capital de São Paulo I Disco;d Iup/ls e')',hematos/ls:
general rev;ew a"d a series of cases of a specialized senl;ce in ,he ci'y of São Paulo. Bra:.ill Rev. educo conLin. CRMV-SI) I COI/I;WlOlIS Educm;ofl JOltma/ CRMV-SP.
São Paulo. volume 3. fascfculo I. p. 029 - 036. 2000.
Figura 5: Weimaraner eom LED - plano nasal discrômico, Figura 8: SRD -lesão facial, em vespertOio, alopécica, ccratóti-
com pcrda do solcamento típico. Lesões, vesligiais, dccor- ca e erosada. Erosão no espel ho nasal. Mimetiza aquelas de pen-
rentes da biópsia com "punch" de Keyc (CEU93). figo erilemaloso, dermatite actíniea ou demodicidose. (CEU97).
Figura 6: Pastor Alcmão com LED - coxins plantarcs ccra- Figura 9: Poodle com LED - pavilhão auricular (face medi-
lóticos mimetizando lesões vestigiais de cinomose ou aque- ai) com notável erilema, áreas erosadas, exsudativas e com
las do pênfigo foliáceo (CEU97). deposição de malerial melicérico (CEU95).
33
LARSSON. C. E.: OTSUKA. M. Lúpus eritemalOSO discóide - LED: revisão e casuíslica em serviço especializado da Capital de São Paulo! Discoid lI/pus et)'fhematoSlls:
general revielV (111(1 o series Df coses Df li specillli:ed sen1ice ill fhe cit)' Df Seio POlllo. Bra:ill Rev. educo contin. CRMV-SIJ I Cmui1luolls Educmioll lOl/mal CRMV·5P.
São Paulo. volume 3. fascículo I. p. 029 ~ 036, 2000.
34
LARSSON, C. E.: OTSUKA. M. Lúpus eritematoso discóide - LED: revisão e casuística em serviço especializado da Capital de São Paulo I DiscoM Iuplls el)'themalOslIs:
general review alld a series of cases of o speáali:.ed senlice ill lhe city of São Paulo. Brazill Rev. educo contin. CRMV-SP I Comillllolls Educotioll lOtlmof CRMV-5P.
São Paulo, volume 3, fascículo J. p. 029 - 036, 2000.
SUMMARY
As a result of its occurrence in the dermatology service ofthe Veterinary Hospital ofthe Universida-
de de São Paulo, the main aspects related to etiopathogeny, epidemiology, symptoms and lesions (both
in domestics carnivores and herbivores), diagnosis and treatment protocol of discoid lúpus erythema-
tosus are reviewed in this study. Brazilian and American data are presented and discussed in relation
to the occurrence of other auto-immune diseases according to variables such as race definition, sex
and age of domestics carnivores, which are compared to those reported in humans.
Key words: Cutaneous lupus erythematosus, Collie nose, immunemediated dermatosis of dogs.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
I - CARLOTTI, D.N. Autoimmune mediated skin diseases. J. 9 - MARTEN, R.H.; BLACKBURN, E.K. Lúpus erythemalo-
Small Animal Practice, v. 30, n. 4, p. 223-7, 1989. sus: a 5-year follow-up of 77 cases. Arch, Dermatol. v.
83, p. 430-6. 196 I.
2 - CHABANE, L.; FOURNEL, c.; RIGAL, O.: MONIER, J.c.
Canine systemic lúpus erythemalosus. Pan 11. Comp, lO - MILLARD, L.G.: ROWELL, N.R. Abnormallaboratory tesl
Cont. Ed., v. 2 I. n. 5, p. 402-21, 1999. results and their relationship to prognosis in discoid Iú-
pus erythematosus. Arch. Dermatol. v. 115. n. 9. p.
3 - GROSS, T.L.; IHRKE, P.J.; WALDER. E.J. Velerinary der- 1055-8. 1979.
malopathology~St. Louis: Mosby. 1992. p. 22-6.
35
LARSSON, C. E.: OTSUKA, M. Lúpus erilemaloso discóide - LED: revisão e casuística em serviço especializado da Capiwl de São Paulo 1Discoid lupus etylhemlllOsw;:
general re\liew lIml li series of cases of li specialized sen1ice ill lhe cilY of São Paulo. 8ro:.i11 Rev. educo contin. CRMV-SI) 1 COlllifl/wUS Educalio" Joumal CRMV-SP,
São Paulo. volume 3. fascículo I, p. 029 - 036,2000.
16 - SAMPAIO, S.A.P.; CASTRO, R.M.; RIVITTI, E.A. Afec- Systemic lúpus erythematosus. J. Am. Anim. Hosp. As-
ções_do tecido conectivo e do subcutâneo - Lúpus erite- soe., v. 19, n. 4, p. 461-79, 1983a.
matoso. In: Dermatologia básica, 2.ed. São Paulo: Ar-
tes Médicas, 1982. p. 177-9. 22 - SCOTT, D.W.; WALTO ,D.K.; SLATER, M.; SMITH,
C.A.; LEWIS, R.M. Immune-mediated dermatosis in do-
17 - SCOTT, D.W. Large animal dermatology., Philadelphia:
mestics animais: ten years after - Pari I. Comp. Cont.
Saunders, 1988. p. 314-7.
Ed., v. 9, n. 4, p. 418-34,1987.
18 - SCOTT, D.W.; MANNING, TO.; SMITH, C.A.; LEWIS,
R.M. Linear IgA dermatoses in the dog: bullous pemphi- 23 - WHITE, S.D.; ROSYCH K. R.A.W.: SCHUR, P.H Theeffi·
goid, discoid lupas erythematosus and a sub corneal pus- cacy of tetracycline and niacinamide in thc treatment of
tular dermatitis. CorneU vet., v. 72, n. 4, p. 394-402. autoimmune skin disease in 20 dogs. In: A UAL
1982. MEMBERS MEETI G AAVD & ACVD, San Francis-
co, 1990. Proeeedings American Academy of Veteri·
19 - SCOTT, D.W.; MILLER JÚNIOR, W.H.; GRIFFIN, C.E. nary Dermatology, 1990. p. 43.
Muller & Kirk dermatologia de pequenos animais.
5.ed, Rio de Janeiro: InterJivros, 1996. p. 534-43.
24 - WHITE, S.D.; ROSYCHUK, R.A.W.; SCHUR, P.H .. Inves-
20 - SCOTT, D.W.; WALTON, D.K.; MANNING, TO.; SMI- tigation of antibodies to extractable nuclear antigens in
TH, C.A.; LEWIS, R.M. Canine 1úpus erythematosus. 11 dogs. Am. J. Vet. Res.. v. 53. n. 6, p. 1019-21, 1992.
- Diseoid lupus erythematosus. J. Am. Anim, Hosp. As-
soe., v. 19, n. 4, p. 48 I-8, 1983. 25· WILLlAMS, R.E.; MACKIE, R.M.; O'KEEFE, R.; THOM-
SON, W. The contribution of direct immunofluorescence
21 - SCOTT, D.W.; WALTON, D.K.; MANNING, TO.; SMI- to the diagnosis of lúpus erythematosus. J. Cutan. Pa-
TH, C.A.; LEWIS, R.M. Canine lupus erythematous. I - tho\., v. 16, n. 3, p. 122·5. 1989.
36