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A Magna Questão 1

A MAGNA QUESTÃO

AFLITO e trabalhado por teorias as mais várias, desde as


inteligentes e verossímeis, até às absurdas e impenetráveis, agita-se o
espírito humano ante a magna e dolorosa questão: Existe Deus? E
desfalece quase perante a mudez das coisas infinitas, com ímpetos de
revoltar-se contra a indevassabilidade dos domínios eternos.
E esquece que esse próprio anelo insatisfeito, essa verdadeira
agonia espiritual, é evidência de que há de haver um Ente superior – fim
último dessas cogitações. Sim, porque outra explicação não se pode dar
da presença no coração humano dessa aspiração ao infinito, desse
incontido anseio ao qual nenhuma coisa transitória é capaz de satisfazer.
Mas vamos, primeiro, às evidências mais concretas e fáceis.
Conta-se que Galileu, ao expiar na masmorra o crime de haver
descoberto o movimento da Terra, foi certo dia visitado por um amigo
que lhe perguntou se cria na Divindade. O sábio apontou para uma
palhinha que se via no chão sombrio, e disse: – Esta hastezinha seca
basta para me provar à saciedade a existência de Deus!
Isto está bem em harmonia com a observação de Linneu, ao
terminar o estudo dos órgãos de uma folha: "Segui as pegadas do Eterno,
contemplando Suas obras;" e com as palavras de Cuvier: "O que quiser
encontrar a Deus não precisa fazer mais que dissecar uma pena." Tinha
razão, pois, Luís de Agassiz quando, ao iniciar as aulas de biologia, se
dirigiu à sua classe nestes termos:
– Antes de nos aprofundarmos nos segredos da Natureza, volvamos
o coração ao Deus da Natureza.

A Mecânica Celeste

Foi essa mesma Natureza que, em seus revérberos universais,


arrancou a Voltaire, o príncipe dos ateus, a confissão para ele paradoxal,
e que alguém teve a curiosidade de pôr em rima:
A Magna Questão 2
"Assombra-me o Universo
E eu crer procuro, em vão,
Que exista um tal relógio
E relojoeiro não!"
E este Universo, até onde estenderá as suas raias? Em que ponto se
encontrarão as orlas de sua colcha de estrelas? Quais as dimensões do
espaço? Ou não será ele infinito? Onde o sábio que nos decifre esses
mistérios? Se ao menos os homens reconhecessem, na limitação de seus
conhecimentos, a necessária existência de um Ser ilimitado, Todo-
Poderoso!
Eis o nosso planeta, a pequenina Terra. Um grãozinho de areia
perdido na imensidade do espaço. Mas esse grãozinho de areia tem
quarenta milhões de metros de circunferência.
Que é isto, porém, em contraste com o Sol, 1.300.000 vezes maior?
Fosse ele oco, e caber-lhe-iam nas entranhas a Terra e a Lua, esta a girar
livremente, dentro de sua órbita, em torno de seu planeta principal! Teve
alguém a paciência de calcular concretamente a distância da Terra ao
Sol: se neste se pusesse um artilheiro e assestasse um canhão contra um
determinado habitante de nosso planeta, a vítima poderia, depois de
despedida a bala, pôr-se a construir pachorrentamente uma casa,
estabelecer-se nela e habitá-la, sossegado, durante vinte e cinco anos. Só
no fim desse prazo é que o projétil o viria alcançar.
Ponhamo-nos à janela numa noite estrelada, e admiremos a
grandiosidade do mundo sideral: aqui o nosso conhecido Cruzeiro do
Sul; ali a faixa brilhante da Via Láctea, como a deitar uma ponte de luz
através do abismo do firmamento; acolá a constelação do Órion, com seu
misterioso "espaço aberto," em forma de funil, e tendo de diâmetro vinte
e sete bilhões de quilômetros! E é tudo isto, uma partícula infinitesimal
do Universo! Não concordaremos então com aquele sábio que exclamou:
"O astrônomo que não acredita em Deus é louco!" e com Platão, que
dizia: "Para crer em Deus basta erguer os olhos ao céu?" e com o próprio
A Magna Questão 3
Kant, que achava ser o mais importante da astronomia o descobrir-nos
ela "o abismo de nossa ignorância!"
Alfa Centauro, por exemplo, que é a estrela mais próxima da Terra,
dista de nós 300.000 vezes mais que o Sol, ou seja, quatro anos-luz.
(Ano luz é a distância que a luz percorre num ano. Sua velocidade é de
300.000 quilômetros por segundo.) E imagine-se que estrelas há que de
nós se acham a 100, 200, 400, milhares, sim, milhões de anos!
E quantos outros sóis, iguais e superiores ao nosso, não há no
universo, e quantos mundos a gravitar em torno deles! Pois que a
fotografia, aplicada a um telescópio moderno, revela mais de um bilhão
de estrelas! Nossa Via Láctea tem mais de 100 bilhões de estrelas e há
bilhões de galáxias semelhantes!
"Haverá," pergunta Cícero, "quem possa imaginar que esta disposição
das estrelas, e este céu tão exuberantemente adornado, pudesse jamais ter
sido formado por um fortuito concurso de átomos?"
Conta-se que o imperador Trajano perguntou um dia ao rabino
Josué: – Onde está o seu Deus?
– Ele está em toda parte, foi a resposta do doutor judeu.
– Pode o senhor mostrar-mO?
– Meu Deus não pode ser contemplado. Vista alguma resistiria ao
fulgor de sua glória. Posso, porém, mostrar a Vossa Majestade um de
Seus embaixadores.
Trajano concordou, e juntos saíram ao jardim, onde o Sol fulgia em
todo o seu resplendor meridiano.
– Levantai os olhos e vede, disse o rabino, apontando para o Sol; eis
ali um dos embaixadores de meu Deus
– Mas não o posso fitar! exclamou o imperador; sua luz é ofuscante
demais!
– Não podeis olhar face a face uma das criações de Deus, e
pretendeis ver o próprio Criador?
'Trajano emudeceu e pôs-se meditativo.
A Magna Questão 4
Durante a Revolução Francesa procurou-se por todos os meios
apagar do espírito do povo a idéia de Deus e da religião, já queimando
Bíblias, já fechando igrejas ou prendendo os crentes. Um dos heróis
dessa cruzada ímpia afirmou a um piedoso camponês que a igreja da
aldeia seria destruída, para não haver o que trouxesse ao povo a
lembrança da Divindade. A isto replicou o campônio:
– Então o senhor terá que apagar as estrelas!
Por isso Hume, que se dizia cético, exclamou certa vez, ao passear
em companhia de Adão Ferguson, numa noite estrelada:
– Adão, existe Deus!
Mas, desçamos dessas alturas, antes que delas nos despenhemos em
vertigem. Olhemos um pouco para dentro de nós mesmos. Que
maravilha, o nosso corpo!

O Corpo Humano

Admiremos a perfeição e complexidade dos aparelhos que regem os


cinco sentidos deste "caniço pensante" que na definição de Pascal é o
homem – aparelhos que constituem verdadeira fábrica, tão vividamente
descrita nesta bela página de Klug:
"Poucos homens há que façam idéia da fábrica grandiosa exata e
engenhosamente ramificada, que representa o corpo humano.
"Aí temos o gabinete do diretor, o cérebro. Para as diferentes funções
do estabelecimento acham-se, na direção geral, repartições inferiores, que
trabalham continuamente na mais perfeita união de vistas com o diretório
central. Um grosso cabo, a medula espinal, com um sem-número de
ramificações, os nervos, transmitem, como uma rede telegráfica, as ordens
da administração para as diferentes estações, isto é, os órgãos do corpo.
"Aí temos duas estações telefônicas, os ouvidos, que através da linha
do nervo auditivo despacham as impressões sonoras para a grande central
situada no cérebro. [Encerram os ouvidos, num espaço de menos de uma
polegada cúbica, vinte e quatro mil filamentos nervosos, capazes de
apreender doze oitavas. Nossos melhores pianos, com seu volume enorme,
não comportam mais de seis e meia.]
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"Aí temos o aparelho fotográfico da vista, que não precisa senão de
uma única chapa sensível para receber um número ilimitado de retratos
sempre novos, primando nas cores deslumbrantes do original. Além de que,
cada chapa é remetida instantaneamente à central óptica do cérebro e
conservada num escaninho especial, podendo ser reproduzida ad libitum.
"Aí temos dois laboratórios de análise química: o olfato e o gosto.
"Aí temos uma dupla bomba aspirante e premente, o coração, que
através das artérias, sistema de canalização indizivelmente prático e
engenhoso, faz circular o sangue por todas as partes do corpo. [Este
trabalho mecânico eqüivale a erguer o seu próprio peso a mais de
quatrocentos metros por hora.]
"Aí temos o sistema de filtração automática dos rins e da pele.
"Aí temos a grande instalação calorífica, que é o aparelho digestivo, o
qual, com perda mínima de combustível, irradia calor constante por todo o
organismo, expelindo, por meio dos pulmões, os gases nocivos.
"Aí temos uma serraria e uma máquina de trituração, que corta e
esmiuça o material de que se nutre esse aparelho de combustão.
"Aí temos um autômato musical, a laringe – maravilhoso órgão em
miniatura – onde os pulmões, traquéia e cordas vocais representam as
peças correspondentes a foles, someiro e tubos – instrumento suscetível de
infinitos timbres, tonalidades e nuances melódicas.
"Aí temos, no esqueleto e sistema muscular, uma construção ideal de
alavancas e transmissores. Especialmente na construção dos ossos vemos
utilizadas magistralmente as últimas conquistas da mais moderna
engenharia.
"Eis a obra-prima do corpo humano. Sois capazes de negar que por
aqui andou mão de mestre? Que aqui deixou rastos luminosos uma
inteligência criadora, uma onipotência sapientíssima?" 1

Não admira, pois, que houvesse Galeno, finda a dissecação de um


cadáver, exclamado: "Oh! que hino acabo de entoar à glória do Criador?"
Descemos das estrelas para o homem. Grande foi a descida, mas
não menores ou menos altas as maravilhas que deparamos no mundo
humano. Desçamos mais um degrau, tão-somente para escalar outro na
escada maravilhosa.
A Magna Questão 6
O Instinto dos Animais

Contemplemos por dois minutos o prodígio do instinto dos irracionais .


Vede na migração das aves uma de suas grandes manifestações. Quem é
que indica a essas criaturas o rumo a seguir, em seus percurso de
milhares de quilômetros, através de terras e mares sem fim? E que
princípio as leva a empreender essas viagens em bandos, como se se
combinassem mutuamente?
Página bem digna de Maeterlinck – se de Maeterlinck possuíssemos
o engenho – dar-nos-ia, com efeito, a vida das abelhas, cujo instinto se
diria antes um profundo conhecimento de engenharia e cálculo.
"Cada favo," diz Melo Leitão, professor de zoologia do Museu Nacional,
"é formado por duas camadas de células, opostas pelas bases, que são
formadas por três losangos, de maneira que as células de um lado alternam
regularmente com as do outro. Essa disposição permite a maior economia
de material e vantagem indiscutível à solidez da construção. Os ângulos
desses rombos (109° e 20'' para os maiores e 70° e 32' para os menores)
correspondem rigorosamente aos cálculos de Koenig, Cramer e Lalanne." 2
A mesma sabedoria se não fora instinto – apresentam-nos as
formigas, porém já em sentido diferente. Menos peritas na construção de
suas vivendas, não o são na atividade, organização e previdência – esta
última qualidade, proverbialmente consagrada na fábula da cigarra e da
formiga. Quem as ensinou a manter verdadeiros "estábulos", onde
alojam com todo o cuidado certos insetos, que lhes servem de vaquinhas
leiteiras? Vede-as a chupar desses animálculos o líqüido adocicado que
segregam. E falam-nos de formigas costureiras, guerreiras, de outras que
têm cemitérios, e coisas quejandas, que se julgariam incríveis não
confirmasse a boca do nosso próprio campônio os estudos dos naturalistas .
Herbert Noyes, na revista John ó London Weekly, discorrendo sobre
as térmitas, faz a seguinte confissão:
A vida das térmitas não é acessível à compreensão humana. Nem a
hereditariedade nem a evolução podem explicar suficientemente os milagres
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por elas realizados. Nenhum cientista conseguiu explicar razoavelmente a
força que guia esses insetos." 3
Poderia haver uma confissão mais eloqüente e mais comprobatória
da ignorância humana em face da onisciência divina?
Dentre as vespas, todas exímias artistas, parece destacar-se a
denominada amófila. Esta deposita seus ovos nas costas de uma lagarta.
Sabe que sua prole tem de ter ao seu alcance alimento forte e nutritivo ao
sair dos ovos, o que só se dará depois de sua morte. Ora, para que a
lagarta não apodreça antes de servir de alimento ao filho que vai nascer,
a amófila não a mata, mas apenas lhe paralisa todos os movimentos,
dando-lhe habilmente nove picadas, pois que são nove os centros
motores que devem ser paralisados. Vibra-lhe depois mais três ferroadas
no tórax e com a mandíbula dá várias pancadas na cabeça da vítima, que
sendo reduzida à imobilidade completa, sem estar morta, não fica, pais,
sujeita à lei da decomposição. Ao partir n larva o seu ovo, depara
abundância de alimento. E o mais curioso é que ela ataca primeiramente
os órgãos que menos falta fazem à vítima, de maneira que a vida desta se
prolongue o tempo necessário, e ela não apodreça.
A vida das aranhas seria outra página a acrescentar aqui. Delas diz
Melo Leitão, que constróem lar permanente, empregam utensílios de
caça, conheceram a aerostação antes do homem, havendo mesmo uma
ordem de aracnídeos que se aproveitam de outros animais como meios
de transporte.
O castor é um arquiteto que edifica verdadeiras casas em pleno rio,
como se nossos antepassados lhe houvessem revelado o segredo das
habitações lacustres. Com os afiados dentes derruba troncos, descasca-
os, ergue diques sobre os quais constrói sua casa, cujas paredes
argamassa com barro e areia.
"O que mais tem maravilhado os técnicos, é a linha sempre arqueada
do dique, de curva mais ou menos acentuada, seguindo a força da corrente,
de modo que um observador competente poderia, da curva desses diques,
ter idéia aproximada do ímpeto da mesma.... No interior das cabanas, em
plataformas dispostas contra o muro circular, fazem os habitantes os leitos,
A Magna Questão 8
com fibras de madeira, nas regiões florestais, ou com ervas; continuamente
renovam esses colchões, levando para fora as fibras ou ervas sujas, e
trazendo outras limpas e frescas.
"Em alguns lugares do oeste americano o problema da irrigação
apresenta graves dificuldades. O castor faz aí pequenos açudes que,
reunidos em grande número, formam lagos muito úteis à irrigação e por isso
o Governo Americano procura proteger por todos os modos esses pequenos
roedores.
"Exemplo característico da obra útil do castor é dado pelo rio Santo
Antônio, no Novo México. Esse rio corre por amplo e fértil vale: perto da
nascente uma colônia de castores, escolhendo a localidade com a
perspicácia de peritos engenheiros, construiu seus açudes e recolheu
quantidade d'água suficiente para irrigar alguns mil acres de terreno.
"Quando as condições tal exigem, empreendem os castores trabalhos
gigantescos. Se dois lagos são separados por terreno plano e nu, põem-nos
em comunicação, cavando um canal de um metro de largura e meio metro
de profundidade, havendo casos em que não recuam mesmo diante das
dificuldades apresentadas por terrenos acidentados. Recorrem igualmente à
construção de canais quando o bosque está muito longe da cidade, tendo
por fim o mais fácil transporte sobre água." 3
Observa Chateaubriand que "Reamur nunca predisse as vicissitudes
das estações com a certeza desse castor, cujos celeiros, mais ou menos
abundosos, indicam, no mês de junho, a maior ou menor duração dos
gelos de janeiro." 4
E já que falamos em todos esses animais que são verdadeiros
arquitetos e engenheiros, não olvidemos o nosso joão-de-barro. Quem já
não viu suas casitas resistentes, cuidadosamente coladas na travessa dos
postes telegráficos ou nas altas forquilhas das árvores? Quem lhe
ensinou a arte de pedreiro, e a ciência meteorológica de construir sua
vivenda com a porta para o lado menos açoitado pelos ventos e chuvas?
Fato que está sem dúvida ao alcance da observação de todos, é a
transformação que se verifica na galinha doméstica, quando lhe cabe a
responsabilidade de defender a prole ameaçada. Arisca e medrosa antes
de chocar, passa a revestir-se de uma coragem e agressividade que a
torna respeitada até dos homens! Uma dessas aves tivemos, que correu
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atrás de uma menina e, saltando-lhe em cima, vibrou-lhe formidável
bicada no lábio, arroxeando-o.
Que dizer da migração das aves ? Quem lhes dirige o trajeto certo,
através de milhares de quilômetros, e isso todos os anos? Pois é sabido
que aves existem que voam do Alasca ao Havaí, numa distância de 3.300
km. Certa galinha transpõe 5.000 km, do Japão para o oeste da Austrália;
outra espécie deixa a Sibéria, rumo da Nova Zelândia, num percurso de
15.000 km. Há uma espécie de gaivotas que voam 17.000 km, das
proximidades do pólo Norte para o sul.
"Nada melhor para excitar nossa admiração," observa John Fisher,
"que o espetáculo da migração dos peixes. Fiel ao lugar de seu
nascimento, o peixe para ali volta como a andorinha ao ninho que a viu
nascer."
Passeando um dia junto à cachoeira do rio Piracicaba, tivemos
ocasião de nos deleitar com essa cena: Cardumes de peixes tentavam
escalar aos saltos a volumosa queda d'água, afrontando a sua violência.
Alguns não o conseguiam da primeira vez. Dorsos luzentes de peixes de
todos os tamanhos rebrilhavam ao sol, numa dança coreográfica e que se
diria quase ritmada ao som das águas escachoantes! Essa migração, ou
piracema, fazem-na tanto os peixes marinhos como os fluviais. As
enguias, na época da desova deixam os mares da Europa e vão até ao
golfo do México, atravessando o Atlântico, e voltando depois ao lugar da
partida.
No inverno, os habitantes de nossos ribeirões vão descendo para
águas menos frias e mais profundas, onde mais facilmente se abriguem
contra os seus inimigos, pela maior opacidade das águas. E quantos
outros interessantíssimos aspectos não nos apresenta o fundo dos mares e
rios!
Depois de uma profundidade de cerca de mil metros, o oceano
apresenta-se completamente escuro. O Prof. Piccard, conhecido por suas
pesquisas submarinas, verificou a existência de peixes a mais de 11.000
metros de profundidade. Naquelas trevas palpáveis, como encontrarão
A Magna Questão 10
alimento esses animais? A sabedoria divina proveu-os de órgãos
irradiadores de luz, verdadeiros faróis. "Há os que se acham munidos de
complicados órgãos luminosos, com lentes, refletores e dispositivos para
acender e apagar a luz. A matéria luminosa na maioria dos casos é
produzida por certas bactérias luminosas, como se encontram também
nas células dos vaga-lumes." 5

Também as Plantas

Conta-se que, encontrando-se certa vez nos Alpes um pastorzinho e


um velho professor, este mostrou àquele, através de uma lente, mimosa
pétala de uma ordinária flor alpina. Daí a instantes o pequeno se pôs a
chorar desconsoladamente. Espantado, o professor instou com ele para
que dissesse o que tinha.
– É que estou a pensar que tantas vezes pisei estas florinhas tão
belas! – explicou afinal o pequeno.
Quantas vezes também nós, desprevenidos da lente poderosa do
Espírito de Deus, passamos sem ver, e sem ver apisoamos
impiedosamente as sublimes flores da Natureza e da Palavra divina!
Que mundo colorido e vasto apresenta ao nosso estudo e observação ,
o reino das flores e das plantas! Que sabedoria se revela, por exemplo, na
providência divina para a fecundação das sementes e reprodução dos
vegetais! E pensar em que existem plantas carnívoras, que prendem
insetos em verdadeiros alçapões, digerindo-os, por meio de um líqüido
venenoso que segregam, ao passo que outras, chamadas hospedeiras, os
abrigam "com requintes de cuidados, como bons soldados que os
defendem!"
Não há muito um professor da Universidade de São Paulo realizou
uma conferência sobre o "movimento das plantas trepadeiras," o qual é
visível em algumas plantas, e noutras invisível à vista desarmada.
"Assim," disse o professor, "as plantas trepadeiras, com gavinhas,
destacam-se pela sensibilidade destas que, ao contato de um dedo ou de
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um lápis, fazem um movimento bem visível, enrolando-se com grande
rapidez. Além disso, todo o ápice da planta está em movimento contínuo,
fazendo giros que põem as gavinhas em contato com todos os suportes
vizinhos.
"As plantas volúveis enroscam-se nos suportes com o próprio caule.
Este não é sensível ao contato. Para atingir o suporte, faz os mesmos
movimentos giratórios que a planta de gavinhas. Ao alcançar o suporte,
deixa transparecer outra sensibilidade, desta vez uma sensibilidade
geotrópica, o chamado geotropismo lateral, que faz que se dê um laço lateral
que envolve o suporte.
"Mas, até aos últimos anos não foi possível esclarecer tudo. Hoje,
dispomos de filmes com que podemos representar os movimentos em ritmo
acelerado. Desse modo, foi possível esclarecer mais o mecanismo desses
movimentos tão complexos."
Um olhar ao mundo animal e vegetal, enfim, faz-nos concordar com
Liebig, que disse: "Sentimo-nos penetrados de admiração ao considerar a
sabedoria infinita com que o Criador distribuiu entre os animais e as
plantas, os meios necessários para realizar suas funções e todas as
atividades vitais."

O Testemunho da Razão

Não nos permite o espaço nem o escopo desta obra, demorar-nos


por mais tempo neste capítulo de zoologia e botânica, malgrado a
fascinação que sobre nós ele exerce.
Se a Revelação, como veremos nos capítulos seguintes, descerra a
cortina que nos vela a Divindade, apresentando-nos ao coração um Deus
amoroso e solícito pelo bem-estar de suas criaturas, a Natureza e a Razão
confirmam plenamente aquela, mostrando-nos à inteligência o mesmo
Deus. Se é verdade que não O podemos ver pelos olhos da Razão, mais
verdade ainda é que esta confirma exuberantemente a Sua existência.
Estamos, pois, com Volta, o grande físico do século passado, que, depois
de muitas energias gastas no estudo do ateísmo, declarou: "Se a Razão
não pode negar a Deus, a consciência mO revela."
A Magna Questão 12
Dizia já Anaxágoras, o filósofo grego do quinto século antes de
Jesus Cristo, que só podia explicar a harmonia do Universo pela crença
em uma "inteligência ordenadora," que é "independente, todo poderosa,
única e infinita."
Argumentava Platão: Somos contingentes (isto é, poderíamos
deixar de existir). O contingente implica a existência do necessário.
Logo, existe o necessário, que é Deus. Mais tarde Descartes, defendendo
o mesmo silogismo, acrescenta-lhe este formoso pensamento: "É preciso,
pois, concluir que do simples fato de que eu existo, e que a idéia de um
Ser soberanamente perfeito, isto é, de Deus se acha em mim, se
demonstra evidentemente a existência de Deus." E, falando na idéia do
infinito, diz: "Foi Deus que, criando-me, pôs em mim esta idéia, para que
fosse como a marca do obreiro impressa sobre a sua obra."
É de Aristóteles o silogismo seguinte: "Existe o movimento; o
movimento supõe um motor imóvel; Deus é este motor, que move e por
nada é movido."
É de Sócrates este outro: "Toda ordem supõe uma causa inteligente.
Ora, o mundo mostra em tudo uma ordem admirável. Logo, o mundo
supõe uma causa inteligente."
Dizia ainda Sócrates: "Em tudo há leis (1ei natural, lei moral); estas
leis supõem um legislador, pois não pode haver efeito sem causa; esse
legislador é Deus." O próprio Kant aceitou esta prova, que é a do
"imperativo categórico".
Muito linda é a chamada prova dos artistas: "Temos na alma uma
sede de perfeição absoluta, manifestada por três amores: o amor do Bem,
o amor do Belo e amor do Verdadeiro. Ora, essa sede natural, insaciável,
requer a existência do objeto desses amores, como a razão suficiente dos
mesmos. Logo, existe Deus, o Bem, o Belo, o Verdadeiro absolutos."
Dizia Liszt que este argumento era o que mais o "seduzia." Esse
Bem, Belo e Verdadeiro, em nenhum sistema religioso se manifestam
como no Cristianismo. "É certo" diz o conhecido naturalista Jorge
Romanes, citado por A. Rowell, "que nem a filosofia, nem a ciência ou a
A Magna Questão 13
poesia já produziram em pensamento, conduta ou beleza, resultados que
se pudessem com ele comparar. É a maior exibição que já se viu na
Terra, do belo, do sublime e de tudo o mais que fala a nossa natureza
espiritual!" 6
Não menos convincente que a prova dos artistas, é a etnológica: A
humanidade em geral crê na existência de Deus (segundo estatísticas,
96% dos habitantes do mundo são crentes). Mesmo os selvagens, se bem
que feiticistas e rudes na exteriorização de sua crença, acreditam que
existe a Divindade. Ora, se a humanidade inteira, com a multiplicidade
de suas raças e através de todas as épocas, tem crido e crê em Deus, deve
para isso haver razão.
"Existe Deus," conclui Kant, "porque entre a felicidade e a virtude
deve haver uma união definitiva, e só um Ser superior, justo, santo e
onipotente pode realizar esta união que fará eternamente feliz o homem
virtuoso."
Dizia o sensista Locke: "Os sinais visíveis de Sua extraordinária
sabedoria e poder tão manifestamente reluzem em todas as abras do
Criador que, refletindo seriamente, toda criatura racional deve concluir
que existe Deus."
Atentem para a declaração de Locke os discípulos de Comte, cujas
teorias agnósticas são bem semelhantes, se não iguais, às daquele, pois
com ele ensinam que "só o sensível é objeto de conhecimento". Esta
teoria, aliás, cai por terra ao primeiro sopro do raciocínio. Quanta coisa
há, em torno de nós, que sabemos infalivelmente certa, sem a podermos
provar! Efetivamente, do berço ao túmulo, a vida está cheia de pontos de
fé, que não pomos em dúvida. A grande maioria dos conhecimentos que
a criança adquire na escola, repousa tão-somente sobre a fé implícita.
Quão poucas, as ciências demonstráveis por a mais b!
Ademais, como podemos certificar-nos de não nos estarem iludindo
os nossos sentidos? Sobre o calor, a eletricidade, a gravidade e outras
forças, diz Bettex, eles só nos mostram alguma coisa. "Para o cristão o
cosmos visível é um reflexo e efeito do cosmos invisível."
A Magna Questão 14
Acrescenta D. G. Portig:
"Um estudo mais profundo revela estar a ciência natural cheia de
hipóteses. Reconhecem-no os mestres verdadeiramente grandes; apenas os
de segunda e terceira grandeza se iludem a si e aos outros, quando dão por
verdade científica aquilo que não passa de suposição. Destas suposições,
escreveu Dreher: 'Todas as hipóteses da ciência natural exata se baseiam
em previsões que ao nosso pensamento se afiguram indignas de confiança.'
Assim no caso do átomo; da atração, na qual um corpo atua onde ele não se
encontra, o que já Newton achava inexplicável; na teoria das ondas de luz
etc. 'O que é a eletricidade e por que a eletricidade positiva não é negativa,
não sabemos,' respondeu-me, a uma pergunta, um professor de física. Toda
a ciência é para o homem o que é para o navio o velame. Este o deve
ajudar, e sem ele nada consegue o barco; mas, que lhe valem as velas,
faltando o vento?" 7
Farias Brito, o conhecido filósofo nortista, e sem duvida o maior
que o Brasil já produziu, teve esta formosa frase: "Há um princípio
último que tudo explica, uma verdade suprema que tudo ilumina: esta
verdade é o Deus vivo e real que mantém em equilíbrio o mecanismo do
mundo. Negar a Deus é negar a razão do mundo."
E outro pensador patrício, Vicente Cândido Figueiredo de Saboia,
considera a existência de Deus uma "verdade demonstrada pelo livro da
Natureza, pelo livro da alma e pelo livro da História." 8
Será o mundo obra do acaso? Porventura as letras de um belo
poema, atiradas do alto de um arranha-céu, se alinhariam em versos e
estrofes ao chegar à terra? "Se o encontro dos átomos," diz Cícero, citado
por Emílio Salim, "pôde formar um mundo, porque não forma hoje um
pórtico, um templo, uma cidade? Isto seria menos complicado." 9
Passeando Voltaire um dia no parque de Ferney, povoação francesa
onde residia, interpelou a um menino que ali se achava:
– Escute, meu pequeno, você vê essa árvore carregada de frutas?
pois elas lhe pertencem todas, se me disser onde está Deus. O pequeno
ficou embaraçado mas, depois de meditar um pouco, respondeu com
vivacidade:
– E o senhor, poderá me dizer onde é que Ele não está?
A Magna Questão 15
Voltaire bateu em retirada.
É bem verdade o que diz Bacon: "Só nega a Deus aquele a quem
convém que Ele não exista." Por isso nos importa tomar a peito o
conselho de Roussea: "Conservai sempre vossa alma em condições de
desejar que Deus exista e dEle não duvidareis jamais."
"Há quem negue o Infinito", diz Vítor Hugo; "alguns, também,
negam o Sol: são os cegos."
"A negação absoluta, o ateísmo puro", diz Lecomte Du Noüy, evoca a
reação da mosca que se atira contra a vidraça e, recusando-se a tirar uma
conclusão lógica da contradição entre o sentido da vista e o sentido do tato,
obstina-se durante horas, isto é, durante uma parte importante de sua
existência, a procurar passar através dessa muralha na qual ela não crê,
porque a não vê." 10

A Historicidade de Jesus

Por muito tempo houve quem pretendesse negar a própria


existência histórica de Jesus Cristo. Hoje, mesmo entre as hostes atéias,
está atrás dos tempos quem descreia de Sua passagem por nosso planeta.
O filósofo inglês John Stuart Mill, ateu declarado, é por certo
insuspeito no testemunho que deu:
"Inútil é dizer que o Cristo exibido nos evangelhos não é histórico, e
que não podemos saber quanto daquilo que é admirável tenha sido
acrescentado pela tradição de Seus seguidores. ... Quem dentre Seus
discípulos, ou dentre os prosélitos deles, teria sido capaz de inventar as
palavras registadas como de Jesus, ou de imaginar a vida e o caráter dos
evangelhos? Certo, não o seriam os pescadores da Galiléia; nem tampouco
Paulo, cujo caráter e idiossincrasia eram de espécie totalmente diversa;
muito menos os escritores cristãos primitivos." 11
"Jesus de Nazaré – são palavras de outro conhecidíssimo incrédulo,
Herberto Jorge Wells – é sem esforço a figura dominante na História. Refiro-
me a Ele, naturalmente, como homem, pois concebo que como homem é
que o historiador O tem de tratar, da mesma forma que o pintor O tem de
pintar como homem. . . . Pretender que Ele jamais tenha vivido, que os
registos de Sua vida sejam invenções, é mais difícil e suscita mais
A Magna Questão 16
problemas na vereda do historiador, do que aceitar como fato os elementos
essenciais das histórias evangélicas."12
É bem semelhante o testemunho de H. L. Mencken, moderno
escritor e jornalista ateu:
"A historicidade de Jesus já não é mais posta seriamente em dúvida
por ninguém, quer cristão, quer incrédulo.... Não é fácil justificar Seu singular
e estupendo êxito. Como foi que uma pessoa que em Sua vida só teve a
sorver a amarga taça da ignomínia, Se pôde erguer, na morte, a tão vasta
estima, a tão incomparável poder e renome que abalasse o mundo?" 13
Aliás, não fosse o testemunho de autores modernos como os que
acabamos de citar, ser-nos-ia mais que suficiente a palavra de escritores
dos primeiros séculos, como Plínio o Moço, Suetônio, Tácito e
Tertuliano, que todos corroboram a historicidade de Jesus, em suas obras
Cartas de Plínio o Moço, Vida dos Doze Césares, Anais e Apologeticus,
respectivamente.

Divindade de Jesus

Mas, não nos salva Jesus histórico. Temos de reconhecê-Lo como o


Cristo, o Ungido de Deus, sobre-humano e divino.
Flávio Josefo, o conhecido historiador judeu que viveu de 37 a 95
A. D., diz em suas Antigüidades Judaicas (trad. de José Roberto
Monteiro de Campos, Lisboa, 1792):
"Neste mesmo tempo vivia Jesus, que era um Homem sábio, se
todavia O devemos considerar simplesmente como um homem; tanto Suas
obras são admiráveis! Ele ensinava todos aqueles, que faziam gesto de
ouvir, e de serem instruídos da verdade; e foi ouvido, e acompanhado, não
só de muitos Judeus, mas também de muitos gentios. Era CRISTO. Os
principais da nossa Nação O acusaram na presença de Pilatos, e ele O
mandou crucificar. Os que O amaram durante a Sua vida, não O
abandonaram depois da sua morte. Ele lhes apareceu vivo, e ressuscitado
ao terceiro dia, como os Santos Profetas o tinham profetizado, e predito que
faria muitos milagres. DEle é que os cristãos tomaram o seu Nome." 14
A Magna Questão 17
São de um dos maiores, se não o maior dentre os cultores das letras
portuguesas, as frases lapidares que se lêem a seguir:
"Jesus disse que era o Messias.
"Messias, Filho de Deus, propriamente Deus.
"Umas provas deu-as aos discípulos que Lhas pediam, e outras
espontaneamente às multidões, que as não pediam.
"Urgia que as profecias se cumprissem em Jesus. Urgia que Sua vida
terrena se manifestasse por atos de impulso sobrenatural. Cumpria que as
Suas predições se realizassem no correr dos tempos.
"Jesus, desde o presepe onde nasceu até ao sepulcro donde Se ergue
triunfante, corresponde às máximas e mínimas condições de vida e morte
preditas no Velho Testamento.
"O Novo Testamento abriu-me o seu tesouro de provas; a História,
pregão eterno proferido por bocas insuspeitas sobre a ruína da nação
amaldiçoada, confirma com superabundância de fatos humanos a obra
divina singelamente referida nas tradições dos evangelistas. Pareceu-me
que a vida e morte sobrenatural de Jesus de Nazaré é um dos sucessos
mais cabalmente provados e irrecusáveis, no entendimento de quem estudar
desprevenidamente aquela mais sublime e transformativa fase da
humanidade. Desde que esta luz da divindade do Salvador se fez em meu
espírito socorri-me do dogma cristão, sempre que rebeliões de raciocínio,
dúvidas resultantes, febres de entrar com a inteligência, aos segredos do
Criador, me levaram ao perigo de achar engenhosos os filósofos
racionalistas." 15
(É-nos penoso deixar de transcrever longos trechos dessa obra
enternecedora e convincente.)

Os Motivos do Ateu

Não admira que o materialismo ateu tenha legiões de adeptos, pois


é sempre mais fácil negar que afirmar, demolir que construir e, como
dele disse Hoeffding, "esta doutrina se pode vulgarizar facilmente. É
pueril, fala à imaginação, é de fácil acesso." Chama-lhe Farias Brito
"filosofia do desespero."
A Magna Questão 18
O mesmo ateu, como disse alguém, que reconhece pela impressão
de um pé de selvagem na areia a presença do homem, nega a Deus cuja
mão se acha impressa sobre o universo inteiro.
O conjunto de ensinos e teorias negativistas não passa de um
castelo de cartas que rui ao sopro da sã razão.
Com efeito, para o ateísmo não existe base razoável. O que em
geral se dá é ocultarem-se no subconsciente do incrédulo determinados
motivos que o conduzem às conclusões que procura.
Há, por exemplo, o interesse. Infelizmente, constitui este ainda a
mola principal de quase todas as ações dos homens. A adesão à verdade
implica renúncia de vícios e paixões pressupõe sacrifícios. Julgue
embora o indivíduo ser profundamente sincero, quão fácil é abrigar nos
refolhos do subconsciente o indigno empecilho do interesse!
O desamor da verdade é outro motivo. A verdade única e
insubstituível não tolera uma aceitação incompleta. Diante dela seria isto
idolatria.
"Amar a verdade, como ela merece ser amada," diz Leonel Franca, "é
pô-la acima de tudo, dos nossos interesses e das nossas ambições, dos
nossos sentidos e das nossas paixões desregradas; é querer sinceramente
que ela seja a única luz da nossa vida.... No dia em que amarmos a verdade
a ponto de estarmos dispostos a lhe sacrificarmos tudo, nesse dia
começaremos a ser dignos dela, nesse dia a encontraremos." 16
Não sabendo explicar tudo o que diz respeito à Divindade, irrita-se
o incrédulo por ver diante de si um mistério que à mente finita não é
dado devassar em todos os seus escaninhos, e revolta-se contra a intuição
inata da existência dessa Divindade. É isto fruto do orgulho intelectual
da criatura, no desejo irrealizável de emancipar-se de seu Criador. "A fé
é essencialmente humilde," disse alguém.
"Um dos mais acérrimos inimigos de Cristo, do século passado, foi
Nietzsche. Que teria, porém, sentido no íntimo? Conta a Sra. Overbeck
como, em uma entrevista com ela, disse:
– Por tudo, não abandone a Cristo! É grande e poderoso o pensamento
nEle... (Ao isso dizer, percebia-se-lhe um nó na garganta. Tinha a fisionomia
transtornada, mas logo assumiu um aspecto duro, e observou:)
A Magna Questão 19
– Eu, O abandonei. Quero criar coisas novas. Não quero e não devo
retroceder. Mas vou perder-me em minhas paixões. Elas fazem de mim um
joguete. Estou constantemente me confundindo. Mas pouco me importa isso ." 17
Nunca nos deixemos, prezado leitor, embair pelas paixões, pela
materialidade do mundo ambiente, sufocando o prazer da luta pela
conquista da verdade, no interesse próprio, no orgulho ou qualquer outra
qualidade menos digna.

Conclusão

Assim, pois, existe Deus. Este fato está plenamente de acordo com
a Razão, com a Ciência. Como disse Balfour, "a ciência não confuta a
religião, antes a reforça com novo argumento." 18 E secunda a conhecida
declaração de Bacon: "Um pouco de filosofia natural, e o primeiro
contato com ela, predispõem a opinião para o ateísmo; mas, ao contrário,
muita filosofia natural, e o aprofundar-se nela, levam a mente dos
homens à religião."
Nenhum, absolutamente nenhum postulado humano conseguiu até
hoje provar a inexistência de Deus. Tudo que tem dito a ciência,
falsamente assim chamada, não passa de hesitantes conjecturas,
hipóteses contraditórias.
E não há, como tantos julgam, nenhuma contradição ou incoerência
entre a Fé e a Razão. O grande abismo que muitos vêem entre os dois,
tem como origem a injustificável complexidade que tantos sistemas
religiosos, antigos e modernos, emprestam a doutrinas em si claras e
incontroversas. Torcem-nas por tal forma que se tornam contrárias à sã
maneira de raciocinar e à razão lógica. Daí, também, a dificuldade que
muitos encontram em exercer fé, a singela e infantil fé pregada por
Cristo, tão ao alcance dos homens! Teorias humanas, ensinamentos
provindos do mistificante coração do homem, de tal maneira quiseram
complicar o conceito da fé, que esta se eleva a uma altura quase
inatingível, vista através desse prisma falso.
A Magna Questão 20

Sursum corda, pois, amigo leitor que sofre os embates da dúvida


ruinosa? Seja sincero consigo mesmo. Acaso a convicção íntima que lhe
vibra no cérebro, não é a mesma que lhe põe frêmitos no coração?
Não nos sentimos todos nós, habitantes deste planeta, como
verdadeiros desterrados? Quem não sofre no âmago da alma esse travor
do exílio? Quem não sente o coração torturado pela dor agonizante de
uma grande separação que nosso íntimo diz ter havido, nalgum tempo,
na vida da raça humana? Sim, é a separação dolorosa que, entre
Divindade e humanidade, causou a entrada do pecado. Este sentimento, o
próprio Criador no-lo pôs no coração.
E – glória das glórias! – chegará o dia em que há de haver um
universal amplexo de paz, de união, de felicidade. Dia virá, e não longe,
em que o Céu baixará à Terra e se alçará a Terra ao Céu, e se estreitarão
num longo, num eterno abraço de reconciliação! E, olhos desanuviados
das contingências terrenas, coração aberto de par em par aos influxos da
nova vida e da nova criação, galgaremos nós mesmos as alturas do Ser
necessário e a eternidade do Verbo divino!

Referências:
1. Crença e Descrença, J. Klug.
2. A Vida Maravilhosa dos Animais, C. de Meio Leitão.
3. O Estado de São Paulo, 30-10-1935.
4. O Gênio do Cristianismo, Chateaubriand.
5. Kraft und Licht, 4-6-1961.
6. Thoughts on Religion, J. Romanes.
7. Die Bibel Gottes Wort, F. Bettex.
8. Noções de História da Filosofia, Leonel Franca.
9. De Natura Deorum, Cícero.
10. A Dignidade Humana, Lecomte Du Noüy.
11. Nature, the Utility of Religion and Theism, Stuart Mill.
12. A Voz da Profecia, A. Rowell.
A Magna Questão 21
13. Treatise on the Gods, H. L. Mencken.
14. Antigüidades Judaicas, Livro XVIII, Cap. IV, Flávio Josefo.
15. Divindade de Jesus, Camilo Castelo Branco.
16. Psicologia da Fé, L. Franca.
17. Er ist unser Leben.
18. A Dúvida, Sherwood Eddy.

Reflexões de J. Balmes

EXISTE um ser autor de todas as coisas? A tristeza apodera-se do


coração com a só idéia de que a cegueira e maldade de alguns homens
torne necessário um estudo sério e detido para provar uma verdade escrita
na Terra e no céu com caracteres tão claros e resplandecentes, caracteres
entendidos com suma facilidade por todos os povos, em todos os tempos e
países, e que, ao tratar-se de Deus, a filosofia tenha de ser coisa diversa de
um cântico de amor e louvores ao supremo Criador, semelhante ao que
entoam de contínuo a Terra e o firmamento....
As conseqüências morais do ateísmo são a sua mais eloqüente
refutação. Sem Deus não há vida futura, não há legislador supremo, não há
nada que possa dominar na consciência do homem: a moral é uma ilusão; a
virtude, uma bela mentira; o vício, um amável proscrito ao qual convém
reabilitar. Em tal caso, as relações entre marido e mulher, entre pais e filhos,
entre irmãos, amigos, são simples fatos naturais que não têm nenhum valor
na ordem moral. A obrigação é palavra sem sentido, quando não há quem
possa obrigar; e faltando Deus, não há nada superior ao homem.
Assim desaparecem todos os deveres, rompem-se todos os vínculos
domésticos e sociais; só deveremos atender aos impulsos da natureza
sensível, evitando a dor e procurando os prazeres. Quem não retrocede ao
ver destruída deste modo a harmonia do mundo moral? Quem não se sente
consolado, refletindo que isto é unicamente uma hipótese insensata? Quem
não sente renascer no espírito a luz e a esperança, ao pensar que Deus está
na origem de todas as coisas, criando e ordenando as leis do universo
moral, e escrevendo-as com caracteres indeléveis na consciência da criatura
inteligente? – Psicologia e Teodicéia.

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