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O Meio de Comunicação Entre Deus e o Homem 1

O MEIO DE COMUNICAÇÃO ENTRE DEUS E O HOMEM

N OS albores da história humana, comunicava-Se Deus com o


homem face a face. Interveio, porém, o pecado, velando à nossa
raça o semblante divino e cavando um abismo intransponível entre
humanidade e Divindade.
Expulsos nossos primeiros pais do paraíso, nem por isso os excluiu
Jeová do círculo de Sua clemente misericórdia. Anjos visitavam
freqüentemente o triste casal exilado, confortando-o e revelando-lhe os
pormenores de um vasto plano delineado nos concílios celestiais, e cujo
fim era a reabilitação do gênero humano. Lábios angélicos, pois,
distilavam amorosamente na chaga viva dos corações que curtiam a
angústia da separação de Deus, o bálsamo de uma suavíssima história – a
história da redenção.
Nasceu Caim, e com ele o primeiro homicida. Multiplicou-se o mal
mais depressa que o bem. Prevaleceu. E triunfou, quase. Mas não
faltaram nunca as almas puras, os homens retos. Poucos, por vezes, mas
nunca inexistentes. Esses poucos, os Setes, Enoques, Noés, Abraões,
Isaques, Jacós e outros, foram transplantando para as gerações sucessivas , a
maravilhosa história do Salvador por vir, o Messias desejado. E, dada a
grande longevidade dos patriarcas, especialmente os antediluvianos, não
é de estranhar que a tradição se conservasse pura, porquanto era por
assim dizer controlada por várias gerações a um tempo. Assim é que
vivia ainda Sete quando nasceu Lameque, pai de Noé, e não era morto
Noé quando apareceu Terá, pai de Abraão. Da morte deste até ao
nascimento de Moisés mediaram dois séculos e meio apenas – período
abrangido por vários patriarcas, isto é, Isaque, Jacó, Levi, Coate e Anrão.
Com Moisés, apareceu o primeiro escritor da Bíblia. Isolado nos
desertos de Midiã, a pascer as ovelhas de seu sogro Jetro, inspirou-o o
Senhor a registar a gênese do mundo. E surgiu assim o Gênesis, esse
epítome de história e pré-história, admirável por sua concisão e clareza,
seguido dos demais quatro livros do Pentateuco.
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Mais mil e quinhentos anos, durante os quais outros homens santos
escreveram, por inspiração divina, os outros livros que formam o cânon
do Velho Testamento, e encarnava-Se, na humilde Belém, o Filho
unigênito de Deus, o Verbo Divino, a Palavra feita vida. De então até ao
ano 90 da era cristã, escreveram-se os volumes componentes do cânon
do Novo Testamento.
Os manuscritos sagrados foram compilados aos poucos, através da
antiga dispensação e dos dois primeiros séculos da nova, como veremos
adiante.
"Não é a Escritura Sagrada produto de um homem ou de um concílio
ou decreto de autoridade humana, Acrescentou-se um livro a outro, até
chegarmos ao fim dos tempos do Velho Testamento. Depois do cativeiro
babilônico, todos os livros sobre os quais não havia dúvida, e que eram
geralmente aceitos, foram coligidos e dispostos por Esdras, Neemias e seus
cooperadores. Esses livros constituíram as Sagradas Escrituras do tempo de
nosso Senhor. São mencionados por Josefo e sempre aprovados por Jesus.
O Novo Testamento foi-se acrescentando da mesma forma, livro a livro,
epístola a epístola, por parte de homens cheios do Espírito de Deus." 1

Que Garantias Temos?

Mas, que garantia se nos oferece de ser a Bíblia a autêntica


Escritura Sagrada, o livro inspirado por Deus e destinado a ser nossa
regra de fé e conduta? Como veio até nós? Merecerá a confiança que o
mundo cristão nela deposita? É firme a base sobre a qual repousa a
estrutura do cristianismo?
Vejamo-lo sucintamente, nas páginas a seguir.
Partamos do fato da existência da Escritura, hoje, em nosso meio.
Isso, ninguém negará, pois é ela vista por toda parte. Fato é também
existir ela desde longa data. Com efeito, já era antiga quando se inventou
a impressão com tipos móveis. Foi ela o primeiro livro que Gutenberg
imprimiu em rústico prelo de madeira, acionado a mão. A Escritura
Sagrada, saiu do primeiro prelo de Gutenberg, no ano de 1455.
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O Velho Testamento foi originalmente escrito em hebraico, exceto
alguns capítulos de Daniel (2:4 até fim de 7) e poucos versículos do livro
de Esdras, que o foram no dialeto aramaico. Posteriormente foi traduzido
para o grego por um grupo de setenta sábios judeus, por ordem de
Ptolomeu Filadelfo, rei do Egito, que ocupou o trono de 285 a 247 antes
de Cristo. Iniciaram os setenta esse trabalho cerca do ano 285.
O Novo Testamento foi originalmente escrito em grego, salvo o
livro de S. Mateus, que o foi em hebraico, sendo depois vertido para
aquela língua. Já cedo se fizeram traduções da Escritura completa, sendo
a mais cuidada a de Jerônimo, feita de 383-405 depois de Cristo.

Como Foi Inspirada

Mas afinal, perguntará o leitor, de que maneira se deu a inspiração


divina da Bíblia? Ora, é claro que Deus não ditou a Escritura aos homens
como o professor faz um ditado aos alunos, ou o comerciante ao datilógrafo.
"Quando Deus inspirava homens a escreverem, não desaparecia a
personalidade do escritor, nem alterava ele o seu estilo. O Espírito de Deus
infalivelmente dirigia a comunicação da verdade divina segundo o próprio
vocabulário do escritor, e de acordo com o seu estilo particular. Inspiração
implica que o Espírito, por um misterioso controle que está além de nossa
compreensão, atuou de tal modo sobre os homens escolhidos, enquanto
escreviam os livros da Escritura, que eram guiados sobrenaturalmente na
comunicação da vontade de Deus. Sua personalidade individual, seus traços
intelectuais particulares, e mesmo a forma de estilo de sua expressão
literária tinham toda a liberdade. Deles se serviu o Espírito divino, dirigindo e
controlando o produto de tal forma que resultou a palavra de Deus, viva, e
que permanece para sempre." 1

Suposições Falsas

Conjeturam alguns ter sido a Escritura obra do Concílio de


Laodicéia, celebrado em 364 de nossa era. Outros há que a atribuem ao
Concilio de Nicéia, em 325.
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Vejamos se procedem essas suposições. Celso, filósofo que viveu
em Roma no segundo século e se tornou célebre pelos seus ataques ao
Cristianismo, contra este escreveu uma obra denominada A Palavra da
Verdade. Deste livro não existe hoje nenhum exemplar, mas Orígenes
(185-254), em réplica ao mesmo, transcreveu-lhe longos trechos, nos
quais se encontram mais de oitenta referências ao Novo Testamento.
Ora, Celso escrevera o livro para refutar a veracidade do Novo
Testamento, e não a sua existência. De maneira que, querendo embora
prejudicar a fé na autenticidade divina dessa parte da Escritura, prestou-
nos o inestimável serviço de confirmar a existência da mesma, naquela
época remota. Claro é que, se existia o Novo Testamento no segundo
século de nossa era, não podia ele ser produto dos concílios acima
mencionados, que só se celebraram mais de um século depois.
Aliás, mesmo antes de Celso, fizera coisa semelhante Marcion, no
princípio do segundo século.

Genuinidade do Novo Testamento

De um trecho de Orígenes ressalta que já no ano 225 depois de


Cristo existiam todos os 27 livros do Novo Testamento. Referindo-se ao
livro de Josué e às trombetas a cujo sonido ruíram os muros de Jericó,
diz ele:
"Quando apareceu nosso Senhor Jesus Cristo, enviou os Seus
apóstolos como sacerdotes, levando as trombetas da gloriosa e divina
doutrina da pregação evangélica. Vai na frente Mateus, que é o primeiro a
fazer soar a trombeta sacerdotal; em seguida Marcos, depois Lucas e João,
cada qual tange a sua; depois deles faz-se ouvir Pedro, com ambas as
trombetas de suas epístolas; posteriormente Tiago, assim como Judas. Em
seguida João, apesar de haver anteriormente feito ressoar a trombeta, volta
a fazê-lo, em suas epístolas e no Apocalipse; igualmente Lucas, referindo os
atos dos apóstolos. Apresenta-se afinal aquele que disse: 'Tenho para mim,
que Deus a nós, apóstolos, nos pôs por últimos.' I Coríntios 4:9. E quando,
como trovões fez ressoar a trombeta de Suas catorze epístolas, derribou
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pela base as muralhas de Jericó, assim como todos os instrumentos bélicos
da idolatria e todas as teorias filosóficas." 2
E mesmo cem anos antes, nos primórdios do segundo século, existia
já uma tradução do Novo Testamento, a mais antiga e afamada, para o
arameano, denominada Peschito. Continha todos os livros menos quatro
epístolas de S. João e S. Pedro, e o Apocalipse. Isto, sem dúvida, adverte
Schuberth, por não haverem ainda essas cartas chegado às igrejas
arameanas. Sabe-se ser tão remota essa tradução porque Eusébio diz que
o historiador eclesiástico Hegesipo extraiu citações da mesma. Ora,
viveu esse Hegesipo no tempo de Adriano (117-138).
Cerca do ano 200, disse Tertuliano, o grande doutor de Cartago, o
qual viveu de 160 a 240, em sua obra Adversus Hereticos, que as
autênticas cartas originais de S. Paulo se achavam ainda conservadas
pelas igrejas de Corinto, Filipos, Tessalônica, Éfeso e Roma, onde
podiam a esse tempo ser vistas.
Santo Irineu, mártir, que viveu de 120 a 200, foi discípulo de
Policarpo, contemporâneo do apóstolo S. João, com quem se dava. Esse
Irineu menciona por nome os quatro evangelhos.
Pápias, que viveu de 80 a 164, e a quem Irineu se refere como tendo
sido "ouvinte de João", foi autor de uma Exposição dos Discursos do
Senhor e atesta que S. Mateus e S. Marcos escreveram os "sagrados
oráculos". Pais da igreja como Policarpo (80-166), Clemente, que
morreu no ano 101, e Inácio de Antioquia, martirizado em 115, deixaram
em seus escritos muitas referências ao Novo Testamento, bem como
transcrições de quase todos os livros do mesmo. Com efeito, são tantas
essas citações bíblicas dos pais da igreja, que com elas se poderia
reconstruir todo o Novo Testamento, com exceção de catorze versículos
apenas!
Interessante é notarmos que já em vida dos próprios apóstolos havia
uma coleção de livros do Novo Testamento, pois a eles se encontram
referências em várias epístolas, como por exemplo em II S. Pedro 3:15 e 16,
onde este apóstolo alude a uma carta paulina, enquanto S. Judas, nos
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versículos 17 e 18 de sua epístola, menciona as de Paulo e Pedro. Daí
concluir-se que já nos tempos apostólicos existia uma coleção de
escrituras do Novo Testamento.

Genuinidade do Velho Testamento

Quanto ao Velho Testamento, é digna de nota a seguinte


observação do célebre historiador judeu Flávio Josefo, que viveu de 37 a
95 de nossa era, sendo, pois, contemporâneo dos santos apóstolos:
"Coisa alguma melhor se pode comprovar que nossas Santas
Escrituras; elas não podem jamais ser objeto de qualquer divergências de
opiniões; porquanto entre nós só reconhecemos aquilo que os profetas
escreveram há vários séculos, instruídos, como eram eles, pela inspiração
do próprio Deus. Entre nós absolutamente não se encontra, como entre os
gregos, grande cópia de livros que se distanciam e combatem mutuamente;
temos deles apenas vinte e dois, que contêm tudo que entre nós sucedeu, e
que merecem toda a fé. Cinco são de Moisés. Os profetas, que vieram
depois de Moisés, registaram em treze outros livros (1, Josué; 2, Juizes com
Rute; 3, Samuel; 4, Reis; 5, Crônicas; 6, Esdras com Neemias; 7, Ester; 8,
Jó; 9, Isaías; 10, Jeremias com as Lamentações; 11, Ezequiel; 12, Daniel;
13, os doze profetas menores), o que sucedeu desde a morte daquele
[Moisés] até ao governo de Artaxerxes, enquanto os quatro livros restantes
(Salmos, Provérbios, Eclesiastes e Cântico dos Cânticos) encerram hinos de
louvor, compostos em honra de Deus, assim como direções sobre a conduta
moral." 2
Aliás, já antes disso, no terceiro século antes de Cristo, Jesus, filho
de Sirac, alude à "lei de Moisés," aos "profetas" e aos "outros livros",
expressão que coincide com a divisão que se fazia do Velho Testamento,
e a que Cristo Se refere em S. Lucas 24:44 – a "lei de Moisés", os
"profetas" e os "salmos". "Vemos, pois, "afirma Schuberth, "que logo
depois da conclusão das escrituras do Velho Testamento por Malaquias,
já existia uma coleção completa dos livros, que Ptolomeu II, nos meados
do terceiro século, mandou traduzir para o grego, tradução que se
conhece como Septuaginta."
O Meio de Comunicação Entre Deus e o Homem 7
E por certo, já que vimos não poder ser refutada a genuinidade do
Novo Testamento, não é de desprezar o testemunho que ele apresenta em
favor do Velho, fazendo referências a todos os seus livros menos seis, e
deles citando passagens.

Nem Erros nem Fraudes

Remontamos, assim, à própria origem das Escrituras Sagradas, o


livro inspirado por Deus e destinado a ser a divina carta de guia aos
homens. Mas, intervirá ainda algum tardio Tomé, não terá havido erros
ou fraudes por parte das pessoas que copiaram os livros?
O trabalho dos copistas era feito com castigado esmero. Havia entre
os judeus uma classe de pessoas cuja ocupação era copiar o texto sagrado .
Chamavam-se, por isso mesmo, escribas, ou massoretas. Antes de
receberem permissão para iniciar o trabalho, exigia-se que contassem o
número das palavras e mesmo das letras do manuscrito que iam copiar.
"Sabiam exatamente quantas palavras e quantas letras havia em Todo
o Velho Testamento, e em cada um dos livros do mesmo. Sabiam qual era a
palavra central em todo o volume, e qual a mesma em cada um dos livros.
Estavam cientes de quantas mil vezes cada letra ocorria nos manuscritos
originais Não lhes era permitido fazer rasuras. Se, depois de feito o trabalho,
descobriam um erro, eram obrigados a destruir aquela cópia e fazê-la de
novo. Não podiam mudar uma letra depois de ter sido copiada. Seus
enganos não podiam ser corrigidos mas tinham de ser destruídos." Assim,
compreende-se facilmente que "o texto original foi maravilhosamente
preservado através dos séculos. A Providência sobre ele velava; a poderosa
mão divina interveio em favor dele, e assim é que possuímos hoje o que
Deus deu aos homens santos da antigüidade." 1
Ora, milhares de massoretas, através de trinta séculos, estiveram a
copiar o texto sagrado. Homens eruditos de inúmeras nações se
entregavam à sua tradução. E embora esta não se deva em si considerar
divinamente inspirada, mas apenas o texto original, seria bem fácil
descobrir incoerências e fraudes, se as houvesse. Pessoas de índoles e
inclinações diversas, em diferentes épocas e ambientes, e sob as mais
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variadas circunstâncias, empenharam-se nessa tarefa. No entanto, as
divergências encontradas nos vários textos são tão insignificantes que
não influem absolutamente no todo.
E que atividade têm desenvolvido os críticos, em trabalhos de
confronto e à procura de incoerências! Uns, de má fé, para depois cantar
vitória contra o Livro Sagrado; outros, para mais aprofundarem sua
confiança no mesmo. Estes conseguiram plenamente o seu desiderato;
aqueles, porém, viram mais que perdido o esforço enorme.
Diz Gaussen, conhecido teólogo de Genebra, em sua magnífica
obra Theopneustia, enumerando alguns desses esforços expendidos pelos
críticos, que John Henry Michaelis, por exemplo, a esse trabalho dedicou
trinta anos de sua vida; Kennicott passou nesses estudos dez anos e
consultou 581 manuscritos hebraicos; o professor Rossi examinou 680 –
todos estes relativos ao Velho Testamento. E quanto ao Novo, destacam-
se as investigações de Mill, Bengel, Wetstein e Griesbach, havendo este
último consultado 333 manuscritos, dos evangelhos tão-somente; mais
tarde fizeram estudos críticos Nolan, Mathaei, Lawrence e Hug e,
especialmente, Scholz, que examinou 674 manuscritos dos evangelhos,
200 dos Atos dos Apóstolos, 256 das epístolas de S. Paulo, 93 do
Apocalipse.
"Ora," conclui o eminente teólogo genebrino, "posto que se tenha
recorrido a todas as bibliotecas em que se encontram cópias dos livros
sagrados, a fim de que dessem seu testemunho; conquanto se tenham
estudado as elucidações dadas pelos pais da igreja de todos os séculos;
embora se tivessem confrontado todas as versões arábicas, arameanas,
latinas, armênias e etíopes; se bem que todos os manuscritos, de todos os
países e épocas, desde o terceiro até ao décimo sexto séculos, tenham sido
coligidos e examinados mil e uma vezes, por inúmeros críticos, os quais
ansiosamente buscavam algum texto novo que lhes fosse a recompensa e a
glória das exaustivas vigílias; ainda que sábios, não satisfeitos com as
bibliotecas do Ocidente, tivessem visitado as da Rússia, levando as suas
pesquisas até aos mosteiros do Monte Athos, da Turquia Asiática e do Egito,
para ali buscar novos instrumentos do texto sagrado – coisa alguma se
descobriu que pudesse lançar dúvida sobre qualquer das passagens dantes
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consideradas certas. Todas as variantes, quase sem exceção, deixam
intatas as idéias essenciais de cada frase, dizendo respeito apenas a pontos
de importância secundária, tais como a inserção ou omissão de um artigo ou
conjunção, a colocação de um adjetivo antes ou depois de seu substantivo,
ou a maior ou menor exatidão de uma construção gramatical." 3
Poderia haver motivo para dúvida se todos esses investigadores
tivessem sido crentes fervorosos na autenticidade escriturística. Neste
caso, poder-se-ia considerar suspeito o seu testemunho. Tal, porém, não
se deu.
Acresce que a maneira em que se faziam os manuscritos até 1800
anos atrás, faculta o reconhecimento da genuinidade do texto sagrado.
Expliquemos melhor: Naqueles tempos escrevia-se sobre pergaminho ou
papiro, os quais se enrolavam depois. As letras eram todas maiúsculas,
chamadas também unciais, e as palavras uniam-se entre si. Não havia
pontuação nem divisão alguma entre as palavras. (De passagem
advertiremos aqui que a divisão da Escritura em versículos e capítulos,
assim como a pontuação, foi obra posterior, nada tendo que ver com a
direta inspiração divina. Daí se compreende a existência de
pequeníssimas divergências com o original, aliás fáceis de descobrir.)
Qualquer manuscrito nas condições acima descritas tem de ser,
forçosamente, antigo. Assim é que em cidades soterradas há muitos
séculos, e hoje postas à luz pela pá dos exploradores, se têm descoberto
bibliotecas cujos livros, ou antes, rolos de pergaminho, são escritos
justamente desse modo.
Mas, aventurará talvez ainda o leitor, não podem esses manuscritos
bíblicos ter sido assim escritos simplesmente para iludir a boa fé? Não há
nisso possibilidade de fraude? Só objetará isto quem não tenha lido a
Escritura Sagrada. Sim, porquanto não é ela um livro que agrade ao
coração humano, desculpando-lhe as mazelas. Ao contrário, condena o
mal, expondo o culpado.
Tivesse havido por parte dos escritores ou copistas a malévola
intenção de iludir, por certo que se teriam servido de outra forma e outra
idéia. Esta defesa, entretanto, escusado é acrescentar, em vista do que até
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aqui já se disse, sobre os outros vários meios de identificação da
autenticidade do cânon escriturístico.
Apesar de todo o cuidado dos copistas, compreende-se que, embora
os manuscritos originais, inspirados por Deus, fossem isentos de
qualquer erro, no processo de copiá-los se insinuassem pequeninos erros
que "de modo nenhum nos afetam a salvação nem nos impedem de
aprender o sentido do grande drama bíblico que começa no jardim do
Éden e termina com a descida da Nova Jerusalém." 4
Deus nosso Senhor velou sobre a Sua mensagem aos homens – a
Escritura Sagrada. "Sua Palavra, como um todo, forma uma cadeia
perfeita, ligando-se uma porção a outra e explanando-se mutuamente. Os
verdadeiros indagadores da Verdade não precisam errar, pois não só é a
Palavra de Deus clara e singela ao mostrar o caminho da vida, como
também o Espírito Santo nos é concedido como guia para podermos
identificar esse caminho." 5
João Wesley fulminava com o seguinte argumento os descrentes na
inspiração da Escritura: "A Bíblia foi concebida por uma das seguintes
entidades: 1. – Por homens bons ou anjos; 2. – Por homens maus ou
demônios; 3. – Ou então por Deus.
"1. – Não pode ter sido concebida por homens bons nem por anjos,
porque nem uns nem outros poderiam escrever um livro em que
estivessem mentindo em cada página escrita, quando lá punham as
seguintes frases: 'Assim diz o Senhor', sabendo perfeitamente que o
Senhor nada dissera e tudo fora inventado por eles.
"2. – Não pode ter sido concebida por homens maus ou pelos anjos
maus, porque seriam incapazes de escrever um livro que ordena a prática
de todos os grandes deveres, proíbe os pecados e condena ao castigo
eterno.
"3. – Portanto, concluo que a Bíblia foi concebida por Deus e
inspirada aos homens."
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Humberto de Campos e a Fé

Os céticos, em geral, sorriem publicamente daqueles que repousam o


espírito em alguma esperança sobrenatural, mas intimamente, sentem inveja
dos que ainda têm, na Terra, as bênçãos da fé. Mesmo... esse mestre da
incredulidade elegante, que foi Anatole France, encanto e veneno de duas
gerações literárias, arrependia-se, na velhice, de não haver conservado a
primitiva simplicidade de coração. "É preciso não demolir – dizia ele – nós
seriamos os primeiros a nos arrependermos.... Renan confessava não ter
podido, jamais, eliminar do seu coração, integralmente, a idéia de Deus. 'No
fundo,' confessa, 'eu sou sempre governado por uma fé, que não tenho
mais'." Não há nenhuma civilização fundada sobre o ateísmo. – Crítica, 3.ª
Série.

Os Apócrifos

As Sagradas Escrituras, também chamadas Bíblia – do grego biblos,


que quer dizer livros – compõem-se de sessenta e seis livros, dos quais
trinta e nove no Velho Testamento e vinte e sete no Novo. Bíblias há que
trazem, além destes, catorze outros. São os chamados apócrifos.
Estes "existiam já no tempo de Cristo, mas não foram admitidos pelos
judeus no cânon do Antigo Testamento, porque não tinham nenhum original
hebraico, e não eram considerados como inspirados por Deus. Seu estilo
prova que eram parte da literatura grego-judaica da Alexandria, dos três
últimos séculos anteriores a Cristo; e como a Septuaginta, versão grega da
Bíblia hebraica, reconheceu a mesma origem, ia amiúde acompanhada
destes escritos gregos que não eram inspirados, adquirindo eles assim uma
circulação generalizada. Josefo e Philo, do primeiro século, excluíram-nos
do cânon; no Talmude não se acha deles vestígio; e das várias listas do
Antigo Testamento feitas nos primeiros séculos, infere-se claramente que
não fizeram nem fazem parte do cânon hebreu.
"Nem Cristo nem os apóstolos os citam nem lhes deram sua sanção;
não têm nenhum elemento profético; não foram reconhecidos pelos pais
cristãos; e seu próprio conteúdo os condena pela abundância de erros e
absurdos. Alguns deles, todavia, são de valor pelos informes históricos que
apresentam, por tratar de assuntos sucedidos em um período de meio
O Meio de Comunicação Entre Deus e o Homem 12
século antes de Cristo; e por suas máximas morais e de prudência e pelas
ilustrações que dão, da vida na antigüidade." 6
Pelo seu valor histórico e moral, "as igrejas primitivas permitiam a sua
leitura como elemento de edificação e os recomendavam aos catecúmenos,
porém os excluíam do cânon." 7
Vê-se, pois, que a Bíblia que não tenha os apócrifos, não pode ser
tida como "falsa", servindo aos mesmos fins que aquela, de aquisição
mais difícil. Em quase todos os países há sociedades bíblicas ou agências
encarregadas da disseminação da Palavra divina. Esta é hoje publicada
em mais de mil línguas! Qual a obra literária cujas traduções atinjam
esse número?
Em 130 anos as Sociedades Bíblicas publicaram 823.429.764
exemplares desse volume. Num só ano foram vendidos trinta milhões.
Só no Brasil já se distribuíram mais de 40 milhões. Nos anos de 1963,
1964 e 1965 ocupou o Brasil o segundo lugar, na aquisição de Bíblias. E
a procura cresce constantemente. Sendo embora um livro que não fala ao
coração natural, pois que lhe condena as tendências perversas, aumenta
sempre e sempre o círculo de seus leitores e o número de línguas em que
se encontra.

Não Há Desculpa

O volume sagrado, onde Deus nos revela a Sua vontade, está hoje
ao alcance de todos. As sociedades são subsidiadas por grandes
filantropos, de maneira que se adquire um exemplar do Livro divino por
preço abaixo do próprio custo de sua produção. Há também nas livrarias
religiosas a Bíblia com os apócrifos, ilustrações, e comentários. Quem a
quiser adquirir, bem fará. Qualquer exemplar, porém, seja da tradução de
Figueiredo, de Almeida ou outra, mesmo sem gravuras e comentários,
lido com sinceridade e ânimo desprevenido, será mais que suficiente
para nos prover a salvação.
Um lar sem a Escritura Sagrada é um farol apagado. O homem que
não seja feliz possuidor de um exemplar do Livro santo, erra pelo mar da
O Meio de Comunicação Entre Deus e o Homem 13
vida como um navegante sem bússola, em nau que perdeu o leme.
Desprovidos da Bíblia, achamo-nos sem um guia seguro através do
labirinto das hipóteses e crenças puramente humanas. E a conseqüência
só poderá ser nossa confusão espiritual. A meditada e devota leitura dos
Santos Evangelhos, unicamente, nos dá firmeza aos passos e estabilidade
à fé, em meio do caráter volúvel e titubeante do humano pensamento.
Leia-a, estude-a assiduamente, caro leitor, e depois diga se ela é de
origem divina ou meramente humana. "Se alguém quiser fazer a vontade
de Deus," disse Cristo, "reconhecerá se a Minha doutrina vem dEle ou se
Eu falo de Mim mesmo." Igualmente, se alguém quiser pôr em prática os
ensinamentos do Evangelho, pela sua própria leitura se convencerá de
sua origem divina.

Referências:
1. The Bible – Is it a True Book? Carlyle B. Haynes.
2. Sammlung der biblischen Buecher, H. F. Schuberth.
3. Theopneustia, L. Gaussen.
4. Seventh-day Adventist Bible Commentary, Vol. I, pág. 15.
5. Primeiros Escritos, Ellen G. White.
6. Diccionario de la Santa Biblia, W. W. Rand.
7. Dicionário da Bíblia, John D. Davis.

Machado de Assis e a Bíblia

OS leitores nos dispensem de dizer por que a Bíblia é o livro por


excelência. Melhor que ninguém já o disse Lamartine; o grande poeta
pergunta o que não haverá nessa obra universal, desde a história, a poesia
épica, a tragédia e a filosofia, até o idílio, a poesia lírica, a elegia – desde o
Deuteronômio, Isaías e Eclesiastes, até Rute, Jeremias e o Cântico dos
Cânticos. Reuni todas essas formas do espírito humano em uma
encadernação de luxo e dizei-me se há livro mais precioso e mais digno de
figurar no gabinete, entre Milton e Homero. – Crônicas.
O Meio de Comunicação Entre Deus e o Homem 14
O Primeiro Cardeal do Brasil e a Leitura dos Santos Evangelhos

OH, se todos os homens conhecessem, amassem e meditassem os


Santos Evangelhos!
Que regra mais pura e santa, que caminho mais seguro para o homem
público, para o homem privado e para o político, do que a verdade vinda do
Céu, pregada e ensinada pela boca de um Deus e registada no livro dos
Evangelhos?
E contudo, quem o diria? Esse inestimável tesouro tem estado nestes
últimos tempos universalmente esquecido: Mil vezes, pois, abençoados os
que fomentam esse movimento e propagam a leitura dos Santos
Evangelhos!
Leia-se, pois, medite-se o livro santo dos Evangelhos. Nessa leitura,
nessa meditação fortalecem-se os espíritos, afervora-se a fé, reanima-se a
esperança e a caridade expande-se sublime em transportes inefáveis de
amor.
É o Evangelho o melhor livro de piedade; leiam-no as almas pias com
devoto recolhimento.
É um livro, divinamente inspirado, rico de ensinamentos morais; nele, e
não nas loucas máximas do século, é que havemos de procurar o tipo e a
norma de nossa vida moral....
Todas as famílias católicas tenham em seu lar o livro dos Santos
Evangelhos, leiam-no em comum, e o meditem.
Todas as almas piedosas tomem a seu cargo essa missão santa e
regeneradora: – propagar em todas as classes da sociedade a leitura dos
Santos Evangelhos.
– Cardeal Joaquim de Arcoverde.

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