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Resumo - O presente artigo visa explorar um estudo de caso para discutir sobre concepção e
criação de jogos educativos para cursos na modalidade a distância. A partir da experiência
das autoras em gestão e implementação de cursos a distância, é proposta a análise do
contexto de aplicação de um jogo e os desafios pedagógicos para eficiência deste recurso
didático. O objetivo é abrir uma discussão proveitosa sobre a relação entre mídias digitais e
estratégias educacionais, considerando aspectos comunicacionais e dialogismo. Será
traçada, como fio condutor da análise, uma abordagem sociocultural sobre EAD e os
pressupostos teóricos que corroboram a proposta do jogo. Em seguida, apresenta-se o
problema que desafiou a solução tecnológica e o planejamento que se seguiu para
elaboração do projeto, assim como as etapas de produção e implementação.
Palavras-chave: educação a distância, mídia digital, jogo educativo.
Abstract - This article aims to explore a case study to discuss the design and creation of
educational games for distance learning courses. Based on the experience of the authors in
the management and implementation of distance courses, it is proposed the analysis of the
context of application of a game and the pedagogical challenges for the efficiency of this
didactic resource. The objective is to open a useful discussion about the relationship
between digital media and educational strategies, considering communication aspects and
dialogism. A sociocultural approach to distance education and the theoretical assumptions
that corroborate the proposal of the game will be drawn as the guiding thread of the
analysis. Next, we present the problem that challenged the technological solution and the
planning that followed to elaborate the Project, as well as the stages of production and
impementation.
Key words: distance education, digital media, educational game.
1
Referência em educação profissional, o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac) foi criado em
1946 com objetivo de ofertar formação técnica de qualidade. Sua criação coincide com a história do Brasil,
em plena pós Segunda Guerra, e a necessidade de investimento nacional para formação de mão de obra
qualificada para industrialização do país. Fonte: http://www.EaD.senac.br/noticias/2016/01/senac-70-
anos-uma-historia-que-esta-so-comecando/. Acessado em Julho de 2018.
2
O censo realizado pela ABED é um documento de pesquisa e referência que apresenta dados relevantes
relativos às atividades de educação a distância (EAD) no Brasil, abrangendo todos os níveis educacionais do
sistema de ensino. Os dados disponibilizados possuem uma amostra aderente, significativa e confiável
sobre a EAD no Brasil, por este motivo subsidiam uma análise mais precisa em termos de diagnóstico e
propostas de melhorias para EAD. Fonte: http://abed.org.br/censoEaD2016/
Censo_EAD_2016_portugues.pdf
de alunos em cursos a distância está entre as faixas de 26 e 30 anos e entre 31 e 40 anos. Os
dados demonstram que “essa alta incidência de alunos após a idade típica da graduação é
significativamente maior na educação a distância (EAD) que nos cursos presenciais” (CENSO
EaD 2016, P. 88). Já com relação à certa predominância feminina, os dados apontam que “as
mulheres se encontram em 54% nas instituições educacionais com fins lucrativos e 55% nas
entidades sem fins lucrativos. Nas instituições públicas, a proporção do público feminino é
ainda maior: 59% nas instituições públicas federais, 64% nas estaduais e 66% nas
municipais” (Ibid. p.86).
Trata-se de um perfil mais diferenciado que condiciona por certo as estratégias e o
planejamento para cursos a distância. É, portanto, com um olhar voltado para a qualidade
do ensino que a perspectiva do aluno deve ser primordialmente situada. De acordo com
Colombo et al. (2004), no planejamento deve-se desenvolver estratégias de ação, prever
desdobramentos, estabelecer regras e iniciativas de controle e acompanhamento e, claro,
aperfeiçoamento do processo. O público-alvo é sempre o ponto de partida e chegada – é ele
quem dá as diretrizes para a implementação do modelo de gestão do processo ensino-
aprendizagem e, também é para a sua satisfação que os esforços da gestão são destinados.
Porém, deve ser ressaltada a necessidade de melhoria contínua da qualidade de formação
que o sistema de EAD deve ser capaz de oferecer. A satisfação dos estudantes com o
conhecimento em construção move todo o sistema de gestão da qualidade da formação.
A estrada percorrida até aqui desvendou um campo aberto de muitas possibilidades.
Falar hoje em educação do futuro, tecnologias educacionais, cultura digital e cibercultura
ousa anunciar os bons ventos que sopram para uma nova, dinâmica e interativa sociedade
pós-moderna. Discutir sobre cultura digital implica também em discutir sobre sociedade em
termos de produção material e consumo. Os passos largos da humanidade em direção a um
próspero futuro são movidos também por uma máquina do capital que gira por força de
energias econômicas. Nesta seara sociológica argumenta-se, como bem apontou Manuel
Castells (1999), sobre as imbricadas relações entre sociedade e o Estado como agentes
fundamentais no processo de desenvolvimento tecnológico. Tal postura busca suprimir
qualquer determinismo tecnológico, posto que o que se coloca é tecnologia mediada por
interação humana (em sua acepção clássica de ação em meio a uma relação).
Na carona desta corrente teórica, podemos afirmar a estreita relação que se dá entre
cultura, tecnologia e sociedade. O autor Marcos Silva (2009) investe nessa perspectiva
sociocultural para tratar de educação online3 com vista a uma educação libertadora e
autônoma, na qual os aprendizes, em detrimento do lugar de meros consumidores e
expectadores, passam a intervir no processo de aprendizagem. Silva defende esse princípio
para uma verdadeira educação cidadã. A condição do aluno que recebe passivamente o
conteúdo (situação não exclusiva da educação a distância) evidencia a relação demasiada
desigual entre professor e aluno, na qual emissor e receptor são postos estaticamente. O
fracasso ou a desistência é culpa de um outro, aquele que não foi capaz de ajudá-lo, e o
3
Apropriamos o conceito de educação on-line para discutir sobre educação a distância, porém ressaltando que
ambos os conceitos resguardam distinções. Para melhor entendimento ver em SILVA, Marcos. Avaliação da
aprendizagem em educação online. Edições Loyola: São Paulo, Brasil, 2009.
professor estaria nesse papel de salva-vidas à beira de uma piscina em que a água não passa
dos joelhos. Os termos autonomia e independência são, a todo tempo, usados para justificar
uma suposta característica singular do aluno que estuda a distância.
Contudo essa autonomia, independente da modalidade de ensino, só pode se
apresentar nos termos de uma relação dialógica, como preconizou Bakhtin, e que poderia
ser resumida como processo no qual o aluno é também um interlocutor e testemunha de
um ato comunicativo, ele é mobilizado na sua singularidade a responder ao professor
(AMORIM, 2014). Esse ato não é mecânico ou automático, mas ocorre em meio a uma arena
de pensamentos, onde os sujeitos carregam suas histórias e memórias e utilizam desse
arsenal para comunicar. Não há uma caixa vazia na qual o professor preenche o conteúdo.
Os significados são construídos, reconstruídos e o aluno participa ativamente desse
processo. A questão é dispor de ferramentas que mobilize esse aluno e estarmos atentos ao
fato preocupante de que ambientes virtuais de aprendizagem estão a reproduzir esquemas
de avaliação passivos pouco construtivos para os alunos4.
Trabalhamos com a ferramenta Moodle para hospedagem de cursos virtuais5. As
atividades avaliativas e o conteúdo do curso ficam hospedados nesse ambiente de acesso
individual, mas que possui também instrumentos de construção colaborativa. O conteúdo
hospedado pode ser apresentado em diferentes formatos, telas, PDFs, vídeos, artigos,
imagens etc. A variabilidade de objetos de aprendizagem pode ser uma estratégia
interessante para criação de conteúdos originais e dinâmicos para EAD. A partir deste ponto
do nosso trabalho, justificamos a relevância da adoção e incremento da modalidade a
distância, pensada a partir dos conteúdos didáticos. Em pesquisa de satisfação realizada com
nossos alunos, identificamos alguns pontos críticos:
Aluno 1: textos muito longos acabam ficando maçantes e desfocam o interesse dos
alunos no conteúdo.
Aluno 2: os links disponibilizados sempre dão problema! Nunca consigo assistir, e
noto que é uma reclamação recorrente da maioria dos alunos. Com isso, vamos
buscar no Google outras fontes de pesquisa. E isso compromete e muito a
avaliação do foco temático.
Aluno 3: Eu, estou cursando adm e colocaria como ponto negativo a apostila que é
entregue é pouco utilizada pelos alunos, os conteúdos não são claros e objetivos
fazendo com quer os alunos busquem tirar as dúvidas no Google que é meu caso.
Aluno 4: Após o conteúdo passado, tem as atividades para fazer, sendo que falta
clareza e as vezes até matéria referente as atividades, deixando a gente confuso e
com dificuldade para fazê-las, onde acabo desanimando, pois o tempo que perco
para tentar interpretar e procurar informações adicionais no Google é absurdo.
Quem faz o conteúdo da plataforma tem que ter mais cuidado para passar as
informações, há muitos erros de português.
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Jussara Hoffman argumenta sobre a prática docente, muitas vezes abusiva, com relação às notas dos alunos.
Pratica-se, segundo a autora, um “reducionismo do significado da avaliação”. A verdadeira avalição deve
abarcar a trajetória do aluno, valorizando suas histórias e experiências individuais (HOFFMANN, 2004). 5
Modular Object-Oriented Dynamic Learning Environment, um software livre, de apoio à aprendizagem,
executado num ambiente virtual.
Era evidente que ocorriam algumas pontas soltas em nossos cursos. Acessar esses
dados em cursos, já em operação, poderia ser traduzido como uma experiência assustadora,
posto que desenvolver conteúdos didáticos requer um longo processo de produção e
envolve profissionais das mais diferentes áreas. Mas havia ali um grande problema que não
poderia se repetir. A tarefa era rever a construção de alguns de nossos materiais, que não
estavam facilitando a vida do professor e tampouco davam condições autônomas de estudo
para o aluno. O conteúdo é certamente um componente essencial de uma oferta de
educação a distância (EAD). Existem vários tipos que podem ser ofertados, assim como são
as várias formas de produzi-lo e disponibilizá-lo. Em meio aos avanços tecnológicos do século
XXI, o grande desafio das instituições é desenvolver materiais didáticos que favoreçam o
aprendizado, o engajamento e a motivação.
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O projeto integrador é uma atividade de caráter integral que busca reunir as principais competências
aprendidas durante o módulo ou curso. Pode ter a função de um portfólio, na medida em que o aluno
desenvolve projetos parciais associados a cada módulo.
Tínhamos uma base metodológica consistente que orientaria o desenvolvimento do
tipo de mídia a ser utilizada no jogo, bem como os recursos gráficos interativos. Embora haja
um arsenal de recursos tecnológicos e diferentes mídias, um projeto de jogo educativo deve
contemplar princípios gerais como: boa estrutura, objetivos claros, unidades pequenas,
participação planejada, integralidade, repetição, síntese, simulação e variedade,
modularidade, feedback e avaliação (MOORE e KERSLEY, 2013). Um importante passo havia
sido dado e agora a estrutura do jogo poderia ser estabelecida. Nesta etapa, ilustrador,
designer gráfico e programador integram o projeto dando os contornos mais gráficos e
interativos do trabalho. A estrutura pressupunha que:
• As fases do jogo contêm tarefas cotidianas do ambiente de trabalho;
• Cada fase possui 5 (cinco) jogadas, e cada jogada dura até 2 (duas) semanas,
totalizando as 10 semanas previstas de estudo do Módulo;
• Conforme o aluno avança no estudo do Módulo, ele estará apto a realizar as
ações previstas nas jogadas.
Exemplo: a fase 1 do Jogo está diretamente associada ao projeto integrador do
Módulo: Plano Operacional de Marketing e Venda de uma Empresa. Nessa fase, o aluno,
por meio da seleção de uma Startup, realiza pesquisa de marketing; define o negócio base
da empresa e analisa dados, competências previstas no Projeto Integrador.
A cada fase do jogo o aluno tinha a oportunidade de interagir com um setor diferente
da empresa e realizar atividades pertinentes a cada área, sempre em consonância com sua
atuação profissional. A criação do jogo teve como premissa desenvolver, por meio de uma
experiência educacional, lúdica e desafiadora, uma competência inerente à prática
profissional. Ademais, segundo Ollivier (2012) a aprendizagem baseada em tarefas é uma
abordagem, uma variação do aprender fazendo7. Desta forma, o aluno pode, mesmo não
estando em um ambiente profissional, realizar atividades de forma independente e
interativa, tomando decisões baseadas nos conteúdos vistos no curso.
O recurso de TICs pode oferecer um aprendizado diferenciado, apesar disso, a
simples disponibilização de uma atividade tecnologicamente atual e inovadora não é
suficiente para garantir o aprendizado. Por este motivo a criação do jogo envolveu muitas
áreas de conhecimento, da educação à programação. Conforme descreve Kenski (2015), o
modo de produção das equipes EAD deve pressupor soluções educacionais por uma equipe
multidisciplinar, pois a pluralidade de olhares e contribuições é capaz de gerar produtos de
maior qualidade.
Nos 6 (seis) meses disponíveis para execução do projeto uma equipe multidisciplinar
trabalhou em conjunto para dar vida ao jogo. Professores-conteudistas, conhecedores das
7
“Aprender fazendo” é a metodologia adotada nos cursos do Senac RJ, que envolve análise e solução de
problemas, estudo de casos, projetos, pesquisas e outras estratégias didáticas que integram teoria e prática.
O enfoque é no contexto do trabalho, de modo a estimular a percepção analítica e a contextualização de
informações, o raciocínio hipotético, a solução de problemas, a apropriação de conhecimentos prévios e a
construção de novos valores e saberes. Fonte: www.rj.senac.br.
atividades da área profissional, foram responsáveis por trazer para a equipe de produção a
representação do ambiente de trabalho, detalhando o espaço físico para dar vida ao cenário
de forma mais realista. Também selecionaram atividades pertinentes à atuação do
respectivo profissional, detalhando o passo a passo da sua execução.
Os designers instrucionais atuaram em conjunto de modo a analisar como as
atividades propostas poderiam ser concebidas em forma de jogo, sem perder seu cunho
educacional, visto que a aprendizagem e o desenvolvimento das competências profissionais
são o foco do jogo. Esta interação entre as partes integrantes da equipe é de suma
importância, pois somente desta forma é possível desenvolver soluções significantes. Para
manter o aluno motivado e engajado foi proposto o acúmulo de coins (moedas), pontuações
por finalizar as atividades que promoviam um ranking. Assim, os alunos sentiam-se
desafiados a jogar mais, e com isso praticavam mais vezes cada tarefa.
Ao passo que os designers instrucionais concebiam a dinâmica das atividades,
ilustradores e designers gráficos davam vida aos cenários, aos personagens e demais
elementos do jogo. Estes elementos, que remetem ao ambiente de trabalho deveriam ser
criados de forma leve e lúdica, como pressupõem um jogo, mas sem perder o caráter
profissional e seu foco educacional. Vale ressaltar que os professores-conteudistas
validavam todas as etapas da produção do jogo, de modo a tornar o jogo o mais realista
possível e garantir que as dinâmicas propostas estavam em consonância com a prática
profissional.
Finalizadas todas estas etapas o projeto do jogo estava pronto para ser programado.
Uma equipe de programadores atuou em conjunto, pois o jogo seria hospedado no
Ambiente Virtual de Aprendizagem e a programação deveria ser compatível com a
plataforma existente. A integração entre o jogo e o ambiente era um fator de extrema
importância, pois deveriam ser coletadas informações sobre a utilização do jogo, tais como:
acesso do aluno, avanço nas jogadas, quantitativo de tentativas, pontuação obtida, entre
outros. Estes dados eram imprescindíveis para avaliarmos a aceitação desta tecnologia por
partes dos alunos e como estava cumprindo seu papel como experiência educativa e
profissional.
Esta foi uma etapa complexa, tanto pelas especificidades da programação de jogos
digitais quanto pela integração entre este componente externo e o ambiente virtual. No
decorrer destes meses contamos com uma equipe totalmente dedicada ao projeto e isto
demandou um alto custo de produção. O resultado final foi muito positivo. Conseguimos
disponibilizar o material paras turmas em operação. O novo conteúdo didático foi
considerado uma inovação. Os relatórios de acompanhamento apresentaram alto índice de
acesso diário pelos alunos. Tanto a equipe de conteudistas quanto a equipe de produção
ficaram satisfeitos com a materialidade de seus conceitos e ideias. Ao final, a produção do
jogo se tornou um processo de aprendizado para toda a equipe.
Figura 1 – Comando da atividade no ambiente virtual de aprendizagem
COLOMBO, S. S. et al. Gestão educacional: uma nova visão. Porto Alegre: Artmed, 2004.
KENSKI, Vânia M. Design instrucional para cursos on-line. São Paulo: Editora Senac São
Paulo, 2015.
MARC, Prensky. Aprendizagem baseada em jogos digitais: São Paulo: Editora Senac São
Paulo, 2012.
OLLIVIER, Bruno. As ciências da comunicação: teorias e aquisições. São Paulo: Editora Senac
São Paulo, 2012.
PALANGE, Ivete. Os métodos de preparação de material para cursos on-line. In: Educação a
Distância: O Estado da Arte. Fredric Michael Litto, Manuel Marcos Maciel Formiga (orgs.).
São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2009.
______. Sala de aula interativa: educação, comunicação, mídia clássica… São Paulo: Edições
Loyola, 2014.