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Contos

Idílio Cândido Neto


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Contos - Idilio Candido Neto
2023
Contos
Houve  um  tempo  que  eu  escrevia  com  uma  maior 
constância. 
Relendo esses escritos originais, de mais de 27 anos 
de existência, entendo agora que foi a forma como lidei 
com  muitas  frustrações  e  ilusões  que  como  uma  pessoa 
jovem, eu estava imersa.
Uma  ansiedade  de  algo  que  naquele  momento  me 
parecia  intangível  e  como  eu  obstinadamente  descrevi 
através  das  personagens  de  cada  conto.  Naquele 
momento,  fui  montando  uma  sequência  de  histórias 
independentes, mas ao mesmo tempo com elementos de 
possível  conexão  entre  cada  conto,  assim  podendo 
conectá­las  das  mais  variadas  formas  e  ordem,  não 
havia uma linearidade determinada. 
Não  há  um  começo,  um  meio  e  um  fim  entre  estes 
contos. Aconselho a ter isso em mente ao le­los.
A  releitura  desses  contos  me  trouxe  também  a 
necessidade  consciente  de  finalmente  expô­los  para 
todas  as  pessoas  interessadas,  mas  tenham  paciência, 
são  textos  de  uma  pessoa  jovem,  com  pouca  vivência  e 
muita ilusão.
Me  fiz  de  pessoa  revisora  do  meu  eu  mais  jovem, 
procurando  atualizar  e  refinar  alguns  momentos, 
mantendo a essência de cada um desses contos.
Fica  aqui  meu  agradecimento  antecipado  a  cada 
pessoa  que  disporá  de  seu  precioso  tempo  na  leitura 
desse  material,  seja  qual  for  o  rumo  que  essa  leitura 
faça.

Atenciosamente por Idílio Cândido
Contos
A praça
Versão um
Versão dois
Trivialidades
A carta
Uma prosa
O escritor
Conflito do apaixonado deslocado em meio ao mar
Estorinha de amor
A caminho
Desabafo poético a uma dama inacessível
A meia furada
Lições
Lamúrias
Paranoía
Sonho ambicioso
O eremita (Reflexões da 23 hora)
Reflexões de fim de ano
Pusulânime
A última ópera das pessoas oprimidas
Delírios
Em resumo
A prova
A praça

A  tarde  desponta  vermelha,  fria  e  quieta 


agitando­se  a  esperar  o  chegar  da  noite,  é  sempre 
assim, esperar. Espero e ando, ando…
Apesar  do  frio,  estou  quente,  talvez  seja 
minha  blusa  ou  a  excitação  do  por  vir?  Sejam  as 
duas  coisas.  O  tempo  não  passa.  Me  encontro  indo 
em direção a uma praça, aliás, é a praça que tenta 
se  encontrar  comigo.  Os  bancos  cinzas  não  me 
agradam, vou ao parquinho, sento em uma balança. 
Quieto, agonizo ao som da gaita triste que toco.
Aos  poucos  me  afasto  da  praça,  não  meu 
corpo,  minha  mente  e  para  onde  vou?  Passado, 
futuro  ou  para  o  agora  transcendental?  A  fome  de 
vida minha e consequente alheia aumenta.
Privado em meu mundo, na minha realidade 
virtuosa  imagino,  é  meu  esse  imaginar?  Sou 
resultado  ou  resultante  da  sociedade?  Não  sei, 
repito  apenas  como  sei  que  minha  criança  irá 
repetir.
Da  carteira  retiro  uma  foto,  de  uma  pessoa, 
e  que  linda  que  ela  é.  Uma  desconhecida,  nome 
sicrana,  fulana,  beltrana,  qualquer  um,  nome 
variável,  beleza  absoluta.  Cabelos  jogados  para  o 
lado,  compridos  e  bem  tratados.  Olhos  brilhantes? 
Sou  tão  esquivo  do  olhar  das  mulheres  que  me 
escapa tal beleza, pois os olhos, mais que janelas de 
uma  pessoa,  são  portas  para  a  alma.  Não  sei  ver 
almas.  Os  lábios  carnudos,  cegam,  só  tê­los,  nada 
mais. Que face tão lisa, não sofre nunca? Nem uma 
ruga,  nada.  Pode  ser  tão  perfeita  mesmo  ou  que 
vejo é realmente o que só quero ver?
Não  me  importa,  com  tanto  que  passe  o 
tempo e que possa sair dali, está frio. Tiro do casaco 
uma  garrafinha  de  conhaque,  bebo  uma  golada 
faiscante.  Acendo  meu  cigarro,  mais  fumaça,  dos 
carros ou do fumo? 
Uma  gangorra  range  ao  longe,  uma  balança 
xia, é criança.
Algumas correm para o escorregador, outras 
para o gira­gira.
Calmamente às olho, registro na mente cena 
bucólica  de  praça,  já  tão  narrada  como  cigarros, 
portas, crianças e loiras.
Aos  poucos  a  mente  serena  pela  inquietude 
de  redor.  No  ar  poeira  e  gritos.  Me  levanto, 
retirando  do  lugar  a  magia,  ora  bolas,  para  que 
magia?  Saio  simplesmente  dali,  bato  o  pó  de  meu 
casaco preto.
Caminho,  um  banco  da  periferia  da  praça, 
muitos  transeuntes  passam  por  ali.  Me  distraio 
olhando­os,  é  uma  madame  com  seu  cachorrinho 
todo  em  paparicado,  um  velho  com  sua  bengala  e 
chapéu,  são  moleques  descalços  que  sem 
perspectiva, não sabem se vão, se iam, não sabem?
Me  assusto,  um  toque  leve  e  persistente,  o 
que será?
­Olhe,  moço,  deixou  cair.  É  sua  namorada?  ­ 
Apenas um menininho do parque.
­É  sim,  obrigado  ­  Peguei  a  foto,  meio  suja, 
limpei­a  e  sai.  O  garoto  correu  para  a  areia.  Mais 
que  tentamos  esquecer,  o  tempo  se  encarrega  de 
colocar menininhos curiosos em nossos caminhos. 
Uma lágrima escorreu, ela não veio. 
Nunca virá, com certeza, nunca!
Versão um

É tarde, por volta de três horas. O sol forte 
como  se  quisesse  iluminar  o  universo.  Repito,  são 
três  horas,  Marcelo  acorda  devagar, 
preguiçosamente.  Sua  companheira,  seminua,  ficou 
um pouco mais, cansada de tanto amor.
Marcelo caminha devagar, o mundo para ele 
estava  calmo.  No  banheiro  olha  no  espelho  a  sua 
face  e  se  admira,  meia  hora  de  vaidade  que  se  vai. 
Calmamente faz a barba, sempre se admirando, são 
curiosos  esses  que  têm  uma  boa  vida.  Sua  cara 
gorda,  mostra  o  seu  grau  de  preocupação  com  a 
vida,  nenhuma.  Seu  pai  a  tinha  por  ele  e  que  em 
breve  também  pararia  de  se  preocupar,  Marcelo 
estudava para substituí­lo.
Família de posses, pequena, mais rica e com 
grande influência.
Da  cozinha  vinha  o  cheiro  de  panquecas, 
Mariana cumpria seu papel de mulher e fazia o que 
seu  futuro  marido  gostava,  panquecas  e  amor. 
Marcelo,  típico  símbolo  burguês  juvenil,  moreno, 
forte  e  alto  se  vestia  no  quarto,  sentado  na  cama 
desarrumada a poucas horas, já eram seis horas. Já 
haviam comido e saiam para um passeio.
Na  porta  de  sua  casa,  havia  um  carro 
importado elétrico com um mês de uso.
­Sabe  Mariana,  preciso  trocar  este  carro.  ­ 
parado  diante  do  veículo  azul  metálico.  ­  O  que 
acha? Perguntou sem olhá­la.
A  moça  loira,  não  mais  que  vinte  e  alguma 
coisa, de cabelos compridos não tinha vontade, uma 
fantoche  que  Marcelo  gostava,  ela  vacilou,  não  era 
tão  fantoche  como  Marcelo  acreditava,  ela  era  mais 
sombra e sutil, humana, é claro.
­Podia  ficar  mais  um  pouco,  eu  gostei  do 
design,  bem  moderno  e  jovem,  última  moda  na 
Europa.  ­  Uma  voz  fraca  e  dissimulada  dava  a 
entender a quem ouvia “troca, não me faz diferença, 
o dinheiro é seu, é você que manda”.
­Vou  trocar  então,  modelo  igual,  mas  de 
outra cor, Mariana. Marcelo sentencioso e seguro, é 
bom ter tanta segurança, para os negócios, é claro.
­Está  bem  querido.  ­  No  íntimo  de  Mariana, 
ela  refletia,  amava  Marcelo  e  seu  dinheiro,  quero 
dizer, seu capital. Era bom amar, pensava Mariana.
O  carro  avançava  depressa,  dentro  o  cheiro 
de  perfume  caro  dos  dois  sufocava,  denso  o  ar, 
Mariana ligou o ar condicionado.
Começara  uma  chuva  de  fim  de  tarde,  que 
logo  se  transformou  em  tempestade  de  verão.  O 
tempo  virará  pensava  Marcelo,  “cedo”  sol  forte  e 
agora  esta  chuva,  esse  mundo  é  fantástico,  sorriu 
para Mariana.
­Que foi querido? ­vaidosa, queria fiscalizar o 
que  o  namorado  pensava,  humana,  aliás  todas  as 
pessoas, ah!
­Você  é  muito  linda,  linda  demais!  Beijou­a 
na boca, namorado apaixonado.
Uma poça d’água, ao longe vinha um homem, 
velho  parecia.  Marcelo  passa  rápido  pela  poça,  o 
homem  já  molhado  e  ainda  mais  agora  levanta  as 
mãos:
­FILHA …
Mariana  sorri,  Marcelo  também.  Foi  sem 
querer,  mais  que  homem  sem  esportiva,  pois  é, 
essas pessoas que levam uma boa vida são curiosas.
Marcelo para o carro na porta do restaurante, 
Mariana  desce.  Marcelo  deixa  o  carro  com  o 
manobrista, lhe dá alguns reais.
­Obrigado, doutor!
­Cuida  bem  dele.  ­  Dinheiro  é  pouco,  mas  o 
carro  é  investimento  pequeno,  mas  necessário  para 
um futuro empresário, ajuda a construir a imagem.
Enquanto  isso,  Mariana,  no  restaurante,  sob 
o pretexto de ter ido ao banheiro, beijava e rebeijava 
o  garçom  em  um  corredor  escuro  do  restaurante,  é 
realmente,  essas  pessoas  de  bem  com  a  vida  são 
sem dúvidas, curiosas.
Versão dois

Não  era  a  chuva  que  chateava,  era  ele, 


impotente  diante  dos  fatos  que  não  irreversíveis,  
eram  complexos  demais  para  seu  entender  e  como 
não  bastasse  tudo  isso,  ainda  por  cima  vem  um 
carro  de  bacana  a  toda  velocidade  e  lhe  dá  um 
banho,  se  bem  que  ele  estava  molhado,  bem 
ensopado.  Foi  mais  um  banho  moral  que  lhe 
mostrou  uma  coisa:  era  preciso  mudar,  mas  que  e 
por  quê?  Não  sabia  a  resposta,  tudo  tão  incerto, 
acontecendo  em  forma  de  avalanche.  Uma  filha 
doente,  outro  preso  e  os  dois  pequenos  sempre  com 
fome, ele também tinha fome.
Andava  devagar,  debaixo  do  braço  direito, 
embrulhado  no  já  encharcado  saco  amarelo,  um 
pedaço  de  pão,  refeição  do  dia,  muito  aguardado 
pela  família,  ele  não  tinha  culpa  do  que  acontecia, 
ou será que tinha? Para a mulher, ele tinha, mas ela 
nunca  lhe  disse,  afinal  ele  sofria  tanto  quanto 
todas, era a vida, era castigo de Deus, em fim, era o 
preço  alto,  de  um  carro  novo  por  mês,  ela  achava 
que era menos, a ingenuidade e a simplicidade é tão 
dolorosa!
A  chuva  havia  amenizado,  José  olhava  as 
gotas  que  se  definhavam  lá  fora,  estava  em  um 
boteco  perto  de  sua  casa,  o  líquido  transparente  no 
copo  tinha  duas  finalidades,  esquentar  do  frio  da 
chuva  e  esconder  sua  consciência  da  vergonha,  ele 
não  era  incapaz,  precisava  de  confiança,  de  algo 
para lhe depositar sua esperança, Deus? O Estado? 
Seus filhos não seriam doutores, já sabia.
Bebeu de um trago o conteúdo do copo, disse 
ao dono do bar para colocar em sua conta mais uma 
pinga, mais uma ilusão de coragem por ser ingênuo? 
Ou estava cônscio? E se em vez de uma pinga, uma 
bala,  por  que  não  uma  guerra?  Que  tinha  para 
perder,  um  punhado  de  carne  que  diziam  ser  sua 
família.
Chegou em casa, quer dizer, um rascunho de 
casa,  feita  de  diversos  tipos  de  tijolos,  o  que 
conseguia  arranjar.  A  sala  minúscula,  molhada 
pelas  goteiras  do  telhado  abrigava  as  poucas  coisas 
que a família conseguia arrumar, uma televisão com 
tubo  e  um  sofá  velho,  onde  estavam  a  observar  a 
vida atrás da tela, algo está errado, o que será?
Atormentado,  José  entrou  rapidamente  pela 
sala  e  foi  ao  quarto  igualmente  simplório  como  a 
sala, onde uma cruz estava pregada na parede, uma 
cama completava o quarto e nela despejou seu corpo 
cansado  e  molhado.  Tanta  pergunta  sem  resposta, 
que se limitou a viver e esperar para que tudo acabe 
tão rápido como havia começado.
O  sono  pesado  foi  despertado  pelo  barulho 
na cozinha, seu filho que havia saído da cadeia que 
conversava alto.
­Eu  juro  mãe,  foi  trabalho  honesto  que  eu 
arrumei.  ­  O  rapaz  falava  olhando  a  senhora  a  sua 
frente, ela já fora mais bonita e despreocupada.
­Que emprego é esse? … igual aos outros que 
arrumou!  ­  Dizia  a  mulher  meio  rouca,  de  olhos 
vermelhos com uma das crianças nos braços.
­Mãe, é emprego bom, de manobrista, eu juro 
que  é!  ­  O  jovem  se  calou,  entrará  na  cozinha  seu 
pai,  ou  aquilo  que  um  dia  foi  seu  pai,  trabalhador 
em  empresa  importante,  mas  agora  mais  um 
desempregado  pelas  modernidades  corporativas  e 
liberais.
­Mulher, não amole o rapaz, o importante é o 
que ganhou.­ José meio dormindo ainda, olhava em 
cima  da  mesa  algumas  notas  de  Real,  eram  notas 
altas. ­ Quem somos para corrigir alguém?
­Mas…  ­  A  mulher  esboçou  cara  de 
desagrado.
­BASTA!  ­  José  a  olhou  com  os  olhos 
vermelhos,  mesclados  de  cansaço  e  raiva.  Saiu  da 
cozinha,  voltou  para  o  quarto,  deitou­se  e  dormiu. 
Importante é ter dinheiro, pensava, tinha que haver 
solução  para  tanto  sofrimento,  não  está  certo,  não 
está.
Trivialidades

Por volta das cinco horas, como de costume, 
Artur  se  levantou.  Se  dirigiu  a  cozinha  e  colocou  a 
água  e  o  pó  de  café  na  cafeteira  italiana  e  a  levou 
ao    fogo.  Na  sequência,  também  a  frigideira  onde 
chapou o pão.
Enquanto fazia  seu rotineiro café da manhã, 
olhava  pela  janela  sua  vizinha  que  também 
acordava  aquela  hora.  Ele  ainda  não  criou  a 
coragem  necessária  para  com  ela  falar,  já  sabia, 
nunca falaria.
Sentou­se  à  mesa  e  lentamente  tomou  seu 
café  e  comeu  seu  pão,  bem  chapado.Terminada  a 
pequena  refeição,  jogou  a  pequena  louça  na  pia  e 
saiu, estava frio e o vento da manhã inconveniente. 
Sua vizinha também saiu.
Talvez se falasse a ela agora, nesse momento 
de  ainda  dormência,  ela  talvez  não  ligaria  muito  e 
surgisse  aí  algo,  uma  ilusão,  apenas  e  só.  Acendeu 
seu  cigarro  e  soltou  a  trava  da  moto,  pedalou  uma, 
duas,  três  vezes  e  a  moto  estava  funcionando. 
Esperou o tempo passar e o cigarro acabar. Do outro 
lado o mesmo procedimento ocorria por parte de sua 
vizinha, ele talvez nunca note, ela também.
O  som  contínuo  do  motor  da  moto,  o  som  ao 
longe de uma música agitada prenunciava o dia que 
começava,  lentamente  outros  sons  se  faziam  notar. 
O  vento  trazia  agora  o  cheiro  misturado  de  café, 
tabaco e gás carbônico. Artur montou em sua moto e 
acelerou, ela começou a se mover lentamente.
Rapidamente  já  estava  em  seu  serviço, 
sentado  a  desenhar  e  escrever  roteiros  de  história 
em  quadrinhos,  todos  estranharam  sua  presença, 
mas não ligavam, cumpria bem sua função.
Não  muito  longe  dali,  uma  mulher  descia  de 
sua  moto  e  a  trancava,  feito  esta  operação  sua 
quatro lances de escada e abria a porta de vidro do 
hospital  municipal  da  cidade.  Mais  um  dia  de 
serviço,  pensava  a  médica,  onde  será  que  aquele 
rapaz  da  frente  trabalha,  acorda  cedo  também, 
refletia.
­Depressa  Dra  Luiza,  seu  paciente  do  leito  7 
está  tendo  um  novo  ataque,  parece  mais  grave…!  ­ 
Uma  enfermeira  não  muito  alta,  acima  do  peso, 
toda de branco se dirigia a ela toda afobada.
­Bem, bom dia Margarida, vamos lá vê­lo, é o 
… esqueci o nome!  Encarou a enfermeira, pensando 
que a experiência a ensinou a diagnosticar. A vida é 
uma  professora  que  sempre  cobra  as  lições  que 
ensina.
Mais  uma  folha  de  papel  amassada,  jogada 
ao  lixo  já  cheio  de  bolas  de  papel,  e  se  alguma 
pessoa,  curiosa,  fosse  neste  lixo  e  abrisse  uma  
dessas  bolas,  veria  surpreso  um  rascunho  de 
mulher,  aliás,  se  abrisse  todas  as  bolas  de  papel, 
seriam  o  retrato  da  mesma  mulher,  de  ângulos 
diferentes.  O  que  leva  a  tal  obstinação? 
Curiosidade, certamente.
O  lençol  branco  cobriu  a  cabeça  sem  vida 
daquele homem, Lu, como as suas companheiras de 
trabalho  a  Luiza,  estava  transtornada  ao  lado  da 
cama  e  as  enfermeiras  já  tinham  ido  tomar  as 
providências  de  rotina  para  o  caso  do  óbito. 
Precisava  beber  e  arejar  a  mente,  saiu  do  quarto, 
mas não sem antes assinar o prontuário médico e a 
folha  de  notificação  do  óbito  e  olhar  mais  uma  vez 
para  o  cadáver  encoberto  em  lençol.  Um  bom  copo 
de  café  amargo  melhoraria  seu  estado,  pena  do 
homem, não poderá mais beber.
Havia  um  bar  onde,  depois  do  expediente  de 
serviço,  ficava  lotado.  Artur  estava  lá  tomando  um 
conhaque.
A  porta  se  abriu  e  Luiza  entrou 
acompanhada  de  dois  sujeitos  de  branco,  pessoas 
trabalhadoras da saúde.
Um barulho de moto lá fora do bar, ela é algo 
inacessível, cativa por tal inviabilidade.
Ao  sentar,  Lu  notou  um  desenho,  parecia 
com ela, que teria feito?
A carta

As  vezes  quando  estava  chateado,  ia  ao 


velho  armário  e  mexia  nas  velhas  notas  que  ali  se 
encontravam.  Por  ocasião  de  um  fato  que  me 
desgostava,  encontrei  em  meio  ao  calhamaço 
empoeirado  de  papéis,  uma  carta  que  não  fazia 
parte de meus escritos.
Transcrevo­a  aqui,  porque  às  vezes  nos 
chateamos  e  às  vezes  encontramos  coisas  que  não 
queremos compreender.

“De  algum  lugar,  inverno  do  décimo  ano 


bissexto do século XX.

Esta  carta  não  é  para  passar  notícias  ou 


pedir alguma. Foi­se o tempo de notícias, esta é mais 
uma  folha  que  amarela  ao  sabor  do  tempo  e  junto 
impressa palavras de desabafo.
Como  tal,  descarto  sua  opinião,  apenas 
ignore­a  se  chegar  em  suas  mãos,  fardo  amargo  é 
esta, nada mais.
Quantas  vezes  tive  alimento,  mas  não  queria 
comer,  quantas  pessoas  fiquei,  mas  sem  amor,  e 
agora  tanto  faz.  Só  queria  me  lembrar  que  o  que 
realmente queríamos estava tão longe, onde não vale 
apenas ir, tens que ficar por lá. Foram­se os amigos, 
as  pessoas  amadas,  as  aventuras  e  os  desgostos,  a 
velhice  tira  as  perspectivas,  impõe  sua  indiferença. 
Sei  que  não  adianta,  temos  que  continuar  nosso 
papel  de  indigentes  históricos,  tanto  faz.  Lembro  de 
meu otimismo e vontade de vencer, mas a quem e por 
quê? Isso é que não me lembro, seria eu, meu grande 
adversário?  Se  for,  venci,  tenho  consciência  da 
infinidade humana, mas o preço então foi muito alto 
e  o  desgaste,  acho  que  não  vale  a  pena.  O  que 
acrescentou em mim foi, como já disse, indiferença e 
desconfiança  perante  a  certeza.  A  esperança  dói  se 
exaurindo  e  a  frieza  fazendo  casa.  É  a  experiência, 
boas  ou  não,  lapidando  a  pedra,  trazendo  a  forma, 
como  uma  pessoa  escultora,  martelo  de  talhe  e 
punção, lascas que se vão, lapidando, formas…
Lembro­me  de  certa  ocasião  que  uma  amiga, 
apaixonada, me disse que eu nunca tinha amado até 
aquele  momento  e  ela  amava  e  chorava  por  isso,  eu 
tinha  então  dezoito  anos  e  por  tanto  concordei, 
sabendo que no meu íntimo, já havia aos treze uma 
pessoa, linda, angelical. Essa amiga amiga de vinte 
e  nove  menospreza­me,  não  relativizou  as  idades 
psicológicas,  mais  isso  é  outro  caso,  o  fato  é  que 
emocionalmente estava apto e a muito tempo para o 
amor,  para  viver,  é  o  amadurecimento  precoce, 
padrão anormal para o normal.
Sinto  por  escrever  algo  chato,    mas  já  havia 
avisado!  Escrever  obscenidades  ou  picuinhas  do 
cotidiano?
Me  “oprimo”,  me  venço,  me  sensibilizo,  me 
gozo,  me  vivo  e  assim  passo  os  dias  morro  e  vivo 
cada dia ecleticamente.
Como  dizia  alguém,  nunca  amei,  nunca  vivi, 
nunca  sofri,  vegeto  indigente  na  margem  da 
sociedade, o resto da minha vida.
Termino com uma mísera satisfação, a de ter 
feito  algo  assim,  um  alerta  a  quem  dispuser  de 
tempo  e  paciência  de  ler  um  breve  e  confuso  escrito, 
da  insatisfação.  Me  desculpe,  não  por  mim,  mas 
pela ilusão que não consegui ser.

Adeus!”
Uma prosa

Sol  já  baixo  do  entardecer,  revelando  as 


pessoas  mais,  mais  um  dia  que  se  vai  e  tudo  se 
repetiu, como nos primeiros dias de seu surgimento 
na  terra.  Esse  mesmo  Sol  que  ilumina  gente 
simples  que  trabalha  na  roça,  é  o  mesmo  Sol  que 
esquenta  dondocas  e  pessoas  frescas  donas  de 
coisas.Na mesa de bar, duas companheiras de longa 
data,  conversavam  descontraidamente  entre  duas 
garrafas de cerveja e um copo de pinga.
Na mesa do lado, um sujeito menos relaxado 
está  em  conflito  com  seu  copo  de  pinga,  cena  boçal 
por tanto e tão pouco que me envergonho de narrar, 
mas algo dentro de mim me leva  a escrever algo tão 
rude,  talvez  pelo  medo  que  tal  cena  se  acabe  e  em 
seu  lugar  cenas  estadunidense  se  torne  comum, 
como já está acontecendo. Bem voltemos aos rincões 
de meu Deus de onde tiro essa heroica cena.
Enquanto  um  leva  a  bebida  incolor  a  boca  e 
faz  careta,  o  outro  ri  e  enrola  fumo  em  uma  palha. 
Na  mesa  do  lado  não  se  pode  mais  falar,  está 
mórbido, encolhido dentro do seu problema que nem 
mesmo  eu,  o  escritor,  posso  tentar  resolver,  apenas 
entendo que seja algo secular, pois todos, todos não, 
a  maioria  dos  problemas  se  repetem  desde  os 
primórdios, muda os tempos e as pessoas, mas seus 
problemas  continuam  os  mesmos,  afeto,  comida  e 
trabalho. Percebe­se então certa apatia que cria um 
revoltado,  um  lutador  ou  um  alienado.  A  nossa 
personagem é por certo uma revoltada.
No  bar  se  escuta  um  som  parecido  com  uma 
caixa  de  abelhas,  que  é  na  realidade,  ao  ouvido 
treinado,  um  rádio  tocando  uma  moda  de  viola  que 
muitas pessoas caboclas que marejam os olhos, mas 
que  baixam  os  chapéus  de  palha,  para  esconderem 
as  lágrimas,  matutas  como  o  dono,  por  vergonha, 
por  alegria,  não  sei,  não  sou  uma  pessoa  cabocla, 
sou uma espécie animal da cidade e aqui, o bagulho 
é louco, e não temos para chorar, para ouvir música 
que  entendemos  e  podemos  cantar  depois  ou 
assobiar  na  beira  de  um  rio  ou  lagoa  enquanto 
admiramos  a  natureza  que  resta.  Afortunado,  raro, 
espera que o dia passe, sem explicação, sem porquê, 
porque é difícil o mais elementar, viver.
O  cheiro  neste  bar  é  pesado,  diferente  do 
pesado  da  cidade  que  é  uma  mistura  podre  de  mil 
odores.  O  cheiro  ali  é  do  palheiro,  das  pingas,  do 
suor de um, de mais um dia trabalhado.
Lá  fora,  o  cheiro  da  terra,  de  poeira 
levantada  pelo  vento  não  é  tão  forte  com  a  fumaça 
dos  escapamentos  dos  ônibus  desregulados, 
amarrotados  de  pessoas  que  querem  vencer  ou 
morrer  tentando,  sufocadas  naquela  lata  sem  óleo, 
prestes  a  ser  aberta  com  um  abridor  de  latas, 
sardinhas, abatidas, sem cabeça…nos pontos.
As nossas amigas, aquelas pessoas, já tomo a 
liberdade, falam da carestia, do milho, da mandioca 
e  das  pessoas  amadas  e  principalmente  da 
esperança em suas crianças, crianças que irão para 
cidade  “grande”.  (Grande  em  miséria,  grande  em 
abandono,  grande  em  insensibilidade,  pequena  em 
amor e calor humano. Mas tanto faz, o bar talvez já 
fechado,  destruído,  as  suas  frequentadoras  nas 
casas de seus filhos ou barracos, esperando morrer. 
Já  a  pessoa  da  mesma  cena,  da  mesa  do  lado  deve 
estar por aí, jogada as baratas com um copo na mão, 
na carteira, uma foto da amada, e no peito uma dor 
secular que espera uma resposta que a acalente.
O escritor

No  ar  o  cheiro  do  cachimbo,  misturado  é 


claro  com  o  de  bebida  alcoólica.  No  estômago  um 
gosto  enjoado,  uma  ideia  que  se  formava.  Em  cada 
toque da máquina, uma palavra, um erro, uma frase 
para a história pessoal que pode se fixar. Tudo isso 
com  a  pitada  de  um  sinistro  que  se  formava,  o 
futuro!  Tenho  comoção  de  mim,  tento  a  todo  custo 
viver o presente, ganho mácula no passado.
A janela está fechada, dentro do meu claustro 
não  precisa  mais  do  que  isto,  uma  janela  fechada 
que  abre  a  janela  da  imaginação  e  me  proporciona 
momentos agradáveis. Ontem mesmo foi um dia que 
não era propício ao brilho do Sol (e por consequente 
de  meu  sorriso),  mas  foi,  é  assim  que  tem  que  ser, 
pois o que escrevo vem do vento e para a brisa estão 
entregues minhas frases.
Mais  que  um  choro  de  criança  mimada,  me 
envergonho de ser pusilânime entregue aos delírios 
psicóticos e tácitos que escrevo, mais culpado do que 
vítima, fortaleço meu pesar escrevendo, uma doença 
que se cura com a própria moléstia: escrever.
E  vi  pessoas  passarem!  E  escrevi  cartas 
românticas,  de  ódio,  para  quem  gosto,  para  quem 
nunca  conheci,  tudo  aqui  nesses  escritos.  E  agora 
repetindo,  neste  certo  momentos,  como  já  tinha 
previsto,  uns  dormem  com  suas  pessoas 
companheiras, uns bebem sozinhos, outros morrem, 
outros morrem e eu?
Eu,  escrevo,  apontando  a  transcendência  do 
ser  que  eu  mesmo  formo,  que  crio    entre  linhas  e 
drinks.
Contornando tudo, vejo a doce pele macia da 
amante  que  está  deitada  na  minha  cama  a  me 
esperar,  percebe  que  estou  escrevendo  a  seu 
respeito,  pois  olha­me  com  olhar  cúmplice  de  meus 
escritos, espertinha!
Voltando ao que realmente tenho a dizer, que 
entre  um  copo  de  ilusão  e  um  corpo  de  prazer,  que 
entre uma música que vem do rádio e o arfar do ato 
que  se  consome,  aqui  um  pedaço  de  quem  percebe 
mais do que escreve sobre a vida.
Para  os  momentos  bons,  esquecimento,  para 
os  maus,  uma  eterna  lembrança,  mais  que  uma 
cicatriz em qualquer parte do corpo. Todo dia antes 
de dormir, convoco ante minha presença, o esboço de 
tudo  que  pode  ser  feito  e  durmo  pensando  em 
corrigir  tudo,  uma  posição  sexual  mal  efetuada, 
uma  poesia  sem  sentido,  uma  palavra  que  esqueci 
de  dizer,  amanhã  será  tarde  para  hoje,  mas  não 
para  depois  de  amanhã,  temos  tempo  para  se 
erguer.
Uma  barreira  ultrapassada,  uma  cama 
desfeita,  um  pudor  que  se  foi  sem  pressa,  sem 
ressentimento,  falta  sentimento  para  dar  gosto  aos 
atos  e  atos  para  que  deem  gosto,  tudo  bem! 
Reacendo o cachimbo e escrevo mais, meio de tentar 
contornar tal falta e os defeitos uma vaia, por serem 
defeitos.
Ao  longe,  um  toque  de  corneta,  uma  balada 
de  violão  e  tudo  para  a  magia  da  escrita,  para 
tristeza  dantesca  da  dama  encolhia  como  um  peça 
sem  saída  em  partida  de  xadrez,  uma  dama 
encolhida na cama, sem vergonha, ruboriza­se?
Quando  um  escritor  deixa  de  escrever  por 
fatores que abalam o sentimento (sempre as pessoas 
amadas,  adoram  assassinar  as  pessoas  que 
escrevem!),  ele  vai  ao  encontro  do  destino, 
empregando a sua arte de escrever, vivendo e assim 
consome seu ego material que seria um devaneio em 
meio  ao  papel,  virgem  como  era  a  mulher  que 
amava. Assim castigada pela falta de expiração que 
ele nunca vai retornar e a ela, também.
Deixando  de  escrever,  o  escritor  deixa  parte 
de  seu  mundo  atrofiar  e  atrofiando,  esquece  de 
sentir os sabores das aventuras e se torna amargo e 
taciturno  e  por  tal,  ele  se  opaca  e  sombrio  falece 
intelectualmente,  se  torna  maleável  e  parcial,  vira 
enfim  uma  coisa  que  a  ex­amada  sempre  via  e  por 
isso nunca se entregou.
Conflito do apaixonado
deslocado em meio ao
mar
“Para males extremos, remédios extremos.” 
Hipócrates

Você  de  certo  já  viu  um  pôr­do­sol  bonito, 


talvez  vários  mas  não  igual  a  este,  pois  este  ao  se 
pôr  leva  consigo  as  amarguras  do  mundo  em  que 
vivemos e nunca as trará de volta, não é só isso, ele 
como se previsse nossas intenções, interrompe tudo 
com  uma  magia  rara,  demonstrando  aos  olhos  sua 
colorida  iluminação,  mais  tudo  vago  e  distante  com 
sua  lonjura  temporal,  enfim,  o  que  podemos  fazer, 
esperar e aplaudir!
Já  abaixo  deste  show  solar  tão  maravilhoso, 
tudo  está,  por  estar  vai  mudar  e  ao  efetuar  tal 
mudança  se  encontram  sempre,  com  gritos 
silenciosos que se calam.
Numa  rua,  alheio  ao  pôr­do­sol  e  as 
mudanças  está  uma  cidadã,  caminha  devagar  mas 
vigorosamente,  caminha  como  se  a  terra  aos  seus 
pés  fosse  tapete  aprumado  de  mármore,  essa 
cidadã,  está  acima  de  todas  e  não  mais  precisa, 
nada  a  menos  falta,  não  é  acomodada  e  nem 
manipulada,  não  é  hipócrita,  não  poderia  ser 
mesmo que quisesse, ela não podia ser, pois não é de 
falar  muito,  frequentou  faculdade,  mas  não 
terminou, era ensino cheio de vícios e sua alma não 
gosta  de  ver  algo  tão  podrido  e  conservador,  sua 
índole  é  para  aprender  e  viver,  não  para  repetir 
erros que as outras pessoas cometem.
Não  é  a  senhora  perfeita  e  nem  mesmo  se 
lembra  de  todas  as  besteiras  que  já  fez,  foram 
muitas!  Agora,  está  a  caminhar,  ao  longe  vem  o 
vento  da  noite  e  o  som  abafado  da  cidade  que 
começa  a  se  desligar  e  criar  os  fantasmas  da  noite, 
são  os  mendigos,  os  ladrões,  os  bacanas  de  carro 
importado,  os  filhinhos  de  papai  que  querem  se 
mostrar,  são  as  garotas  e  garotos  de  programa,  as 
pessoas  trans  com  seus  toques,  viciadas  em  busca 
de  drogas,  pessoas  novas  e  velhas  que  fazem  da 
cidade  como  ser  natural  apesar  da  desigualdade  de 
sua  aplicação,  é  a  sociedade  que  numa  miscelânea 
maquiavélica junta e separa as pessoas, provocando 
as ambiguidades, inevitáveis e dolorosas!
Nossa  cidadã    está  alheia  a  este  furacão 
social  e  por  isso  ela  também  está  para  o  furacão 
social,  indigente.  Mas  a  indigência  é  um  labirinto  
sem  saída  e  um  título  para  nossa  cidadã,  ela  só 
queria  ser  o  que  é,  apenas  e  nada  mais,  sem  lisura 
na palavra e sem perdão para os atos e nem para os 
mesmos, elogios.
O que essa cidadã espera da sociedade? Amor, 
carinho,  respeito?  Não  sabemos,  apenas  esperamos 
que  o  que  seja,  venha  rápido  e  que  seja  breve,  tem 
que  ser,  não  importa  o  que  aconteça,  tem  que  ser  e 
pronto, sem mais e nem menos, ser e acabou.
Tal  cidadã  tenta  ser  neutra  e  isso  é 
prejudicial a ela e a sociedade que mesma sem uma 
ordem  ou  um  caminho,  precisa  de  todas  as  suas 
cidadãs,  pois  a  partir  delas  é  que  ela  existe  e  sem 
elas perde razão de ser.
Tendo  ela  tentado  em  se  adaptar  e 
compreender  está  sociedade  e  não  conseguiu, 
começou  a  ter  problemas,  pequenos  conflitos 
psicológicos,  pequenas  pontas  do  iceberg  que  se 
chocou  contra  tudo  que  surgiu  à  sua  frente. 
Sabendo  da  neurose  que  desponta,  pediu  a  si 
solução  para  seu  mal,  desajustado  social,  ela  ou  a 
própria sociedade?
Caminha ainda alguns metros naquela ponte 
onde  carros  passam  a  toda  velocidade,  buscando 
sabe­se lá o que com tanta pressa? Desta ponte que 
cobre  um  rio  caudolento  e  sujo,  nossa  cidadã  se 
precipita  nas  amarguras  do  por  vir,  a  morte.  Se  a 
morte  fosse  mesmo  a  cura  para  tantos  males  e  a 
solução  adequada,  ainda  se  fosse  resposta  para 
muitas  questões,  perderíamos  algo  que  tentou  ser 
feliz  e  significativamente  sublime  acima  de  nós, 
nossa própria vida. (Mas não entendemos!).
Estorinha de amor

Era  uma,  a  muito  tempo  atrás,  não  faz 


tempo  assim,  numa  favela  distante,  também  não 
muito  distante,  existia  uma  pessoa,  uma  jovem, 
dezoito  verões  que  estava  apaixonada  por  uma 
rapaz  que  não  era  rico,  mas  de  família  estável,  de 
boa aparência que gostava da vida e tinha amizades 
de montão.
A  jovem,  por  muito  tempo  teve  timidez  de 
falar  ao  jovem  que  o  amava,  uma  pena  já  que  o 
jovem  também  gostava  dela,  mas  tinha  medo  de 
onde  essa  moça  morava,  bem  não  era  medo, 
vergonha  é  o  termo  certo.  Certo  dia,  a  jovem 
adoeceu  e  todas  as  pessoas  na  comunidade  não 
sabia  o  que  acontecia  com  ela,  bem  que  as  mais 
experientes,  senhoras  vividas  já  tinham 
diagnosticado o mal, o amor.
O  moço  sabendo  que  sua  amiga,  mais  uma 
jovem  que  o  amava,  estava  doente,  não  foi  vê­la, 
tinha ele nada menos que medo, então orava de bem 
longe para a melhora de sua amada platônica.
Sabe­se lá o porquê, ela começou a melhorar, 
talvez a reza, talvez o fim da ilusão, não se sabe.
O  tempo  passou  e  um  dia,  um  carro  novo, 
elétrico, estacionou na frente do nosso moço rezador, 
por  ali  ninguém  sabia  quem  era  ou  qual  o  motivo 
daquela visita. O moço menos ainda.
Desceu  do  carro  uma  mulher  muito  bem 
arrumada, de uns, uns… difícil dizer, muito bonita, 
devia ter uns vinte cinco anos, não saberia dizer, só 
escrevo,  como  uma  pessoa  que  escreve  e  que  pode 
optar  por  muitos  recursos  e  artifícios  para  que  sua 
arte  tenha  alguma  valia  neste  mundo  de  apegos 
materiais, bem, a jovem dama caminhou até a porta 
da  casa  e  o  chamou,  que  por  intermédio  da  mãe, 
desconfiada,  via  o  alvoroço  dos  olhos  bisbilhoteiros 
que concentravam em seu portão. 
Nosso  galã,  tímido  como  era,  demorou  um 
pouco para saber do que se tratava.
­Oi,  em  que  posso  ajudar?  ­  disse  sem  muita 
convicção,  ao  olhar  a  moça  em  sua  frente,  era 
estranhamente familiar.
­Não  está  me  reconhecendo?  Mudei  tanto 
assim…?  ­  Retirou  os  óculos  de  sol,  ele  a  observou 
ainda  mais  curioso,  a  reconhecendo,  estava  muito 
bonita!  ­  Bem,  isso  não  importa  mais,  apenas 
precisava  vir  aqui  lhe  dizer  algumas  palavras, 
podemos  conversar  em  um  lugar  mais  reservado?  ­ 
Os olhares curiosos já formaram uma multidão.
­Vamos  ao  meu  quarto,  se  não  se  importar, 
nossa,  como  você  está  bem!  ­  A  curiosidade 
aumentava cada vez mais. Seguiram para o quarto, 
arrumado  e  simples,  após  entrarem,  ele  fechou  a 
porta, sem a trancar.
­Vim  lhe  agradecer  por  ter  me  abandonado, 
pois  sem  o  seu  abandono,  não  estaria  bem  hoje. 
Olhou  bem  nos  olhos  dele,  percebia  uma  mescla  de 
confusão  e  surpresa.  ­  Graças  a  você,  a  sua 
insensibilidade,  me  conheci  e  conheci  alguém  que 
me  respeita,  é  uma  pessoa  abastada,  nos  casamos, 
com  o  apoio  dela,  terminei  a  faculdade  de 
arquitetura  e  estamos  indo  morar  na  Europa.  Mas 
precisava muito lhe agradecer! Muito obrigada!!! 
­Fico  feliz!  ­  um  tanto  desconcertado  e  no 
íntimo, pedaços se espalharam no chão.
­Adeus!  ­  ela  saiu  e  olhou  mais  uma  vez 
aquela  pessoa  que  foi  por  ela,  amada.  Colocou  seus 
óculos, entrou no carro e saiu rapidamente.

Possíveis morais da estória:
­Amor de pobre dura pouco;

­Primeiro amor não morre, é trocado;

­Amor de uma, solidão de duas, oportunidade 
para as terceiras.
A caminho

O  sujeito  andava,  meio  capenga  da  perna 


esquerda,  ia  adiante  decididamente.  A  frente 
apenas  algumas  luzes  marcavam  a  existência  de 
pessoas na vila em que o homem ia. O tempo estava 
quente  e  abafado,  que  fazia  uma  pessoa  suar,  o 
homem suava.
Haveria  explicação  para  uma  pessoa 
caminhar tarde da noite? Será que uma pessoa não 
pode  sair  apenas  de  sua  casa  e  andar,  mesmo  que 
tarde  da  noite?  Eu  mesmo,  as  tardes  da  noite 
passava a escrever, sentindo o ar da madrugada e o 
cheiro  do  orvalho  e  era  muito  bom,  e  quando  não 
estava  escrevendo,  estava  ao  de  alguma  pessoa,  me 
cansando  de  tanto  amor,  bem  não  igual  a  andar, 
mais cansa.
O  homem  parou,  respirou  profundamente  e 
tornou a seguir a trilha da vila, ia bem embalado a 
ponto  de  arregaçar  as  mangas  da  camisa  já 
molhadas  de  suor,  arregaçou  também  as  barras  da 
calça e se ia.
Ao chegar em uma curva perto do rio, parou. 
Ouviu  o  pio  de  uma  coruja  e  o  silêncio  da  noite. 
Uma  brisa  leve  começou  a  balançar  as  folhas  das 
árvores, o murmúrio do rio acalmava.
Como  tinha  parado  para  ouvir  tudo  isso, 
ficou.  Havia  parado  por  outro  motivo,  estava 
tentando lembrar porque estava ali.
Suas vistas estavam embaçando lentamente, 
mas faltava tão pouco!
Mais alguns passos e chegaria ao rio em que 
a água era cristalina como a alma de um ser criança 
e  ali  repousaria,  em  meio  ao  ambiente  mais  fresco, 
seu  corpo  cansado,  era  o  que  ansiava,  era  pouco  o 
que  uma  pessoa  cansada  queria,  um  lugar  para 
descansar  e  sonhar  com  os  mais  variados  anseios  e 
desejos que sua mente poderia criar, tal e igual aos 
mais fantástico ser imaginário, Deus, um Deus que 
tem um limite, o ilimitável!
Caiu lentamente como cai uma folha de uma 
árvore, flutuando até o chão. Ao colidir ao chão 
respirou profundamente e um gemido grave saiu de 
sua boca queimada dos dias quentes debaixo do Sol, 
a cultivar a roça. Ali deitado começou a tremer e 
sentir o mal estar que há muito o atormentava, 
piorar, um grito falhou.
Aos poucos foi perdendo a consciência de que 
o que, tudo vago e incerto até desligar 
completamente.
Ao acordar estava deitado em uma cama de 
hospital, ligado a um soro por um acesso venoso e 
uma enfermeira estava observando­o, ele, doente?
Percebeu lentamente que flutuava e aos 
poucos a imagem do quarto de hospital desaparecia, 
uma luz clara e um som suave chegava ao seus 
ouvidos, um riacho?
Desabafo poético a uma
dama inacessível

Começo  esta  com  tanto  e  tanto  para  sentir 


que  em  meio  ao  tumulto  desse  tudo,  só  um  é 
concreto  e  em  evidência,  o  que  alimento  por  você. 
Até  este  presente  momento  pensei  em  tudo,  nas 
mais  variadas  artimanhas  para  conseguir  ao 
mínimo  sua  atenção  de  desprezo,  ao  menos  isso, 
mais  em  vão,  que  consegui  foi  mais  saudade  ao 
sentimento que gostaria de ter por você e tenho, não 
nego,  só  que  de  uma  forma  platônica,  indigente  e 
absurdamente lacônica, enfim, tentei ser o que você 
gostaria  que  eu  fosse,  sua  posse  amorosa  e 
fracassei,  no  entanto  deixou  em  mim  marca  que 
jamais  apagará  a  mágoa  que  pesará  em  meu 
epitáfio e junto ao cravo vermelho que já plantei.
Tudo  começou  quando  te  vi,  sempre  na 
primeira  vez,  quando  desmaiei  tamanho  o  choque 
que  levei.  Me  recompus  diante  da  desordem  que 
você havia feito dentro de mim, Estranho é que tudo 
passa  pela  visão,  o  desejo  ligado  a  forma  que 
olhamos,  analiso  agora  e  acredito  que  se  eu  fosse 
cego  e  pressentisse  você,  teria  o  mesmo  choque,  a 
mesma  reação,  você  é  uma  mágica  gostos  que  em 
outra  dimensão,em  qualquer  lugar  ou  momento 
histórico,  seria  você  sem  erro!  O  amor  que  sinto 
transcende  o  tempo  e  o  lugar,  futuro,  presente  ou 
passado,  está  impregnado  em  mim  que  me  torna 
eterno, mas, tão fácil escrever!
Te  imaginei  nas  mais  variadas  formas  e 
jeitos,  tanto  que  sei  mais  que  seu  próprio  ser!  Sei 
cada tique, cada costume, hábito ou vício, todos seus 
medos e anseios que até você não conhece ou ignora, 
que não liga, mais eu sim, tudo que está relacionado 
a você muito me interessa, posso até dizer que estou 
formado  em  você,  pois  você  é  a  razão  de  meu 
pequeno  ser,  de  meu  existir.  Compreendo  cada  mm 
de  você,  apenas  tenho  uma  dúvida,  por  que  me 
rejeitas tanto?
Me formei por você e você me rejeita! É o que 
mereço? Deve ser, culpado único de sua indiferença, 
aceito  teu  castigo  e  me  enveredo  nos  vícios  e  erros, 
quero pagar meu erro, ser teu amante platônico!
Foi  tão  discreto  quanto  possível,  invejando 
suas  amigas,  suas  pessoas  namoradas  e  parentes, 
passivo,  pois  no  fundo  queria  matá­las,  todas!  Sim, 
a  morte  para  todas,  o  amor  renuncia  a  todas  e  a  si 
próprio  e  só  uma  realidade  possível,  a  sua!  Sou  tão 
pusilânime  que  misturo  o  amor  que  sinto  com  o 
medo de sua rejeição, tenho medo de te magoar!
Desconfio  do  porque  que  nunca  reparou  em 
minha  existência,  é  o  sonho  gigantesco  de  ter  o 
imensurável  Sol  das  melhores  coisas  e  para  tê­las, 
todos  os  meios  são  válidos.  Não  te  culpo,  culpo  o 
sistema  que  te  distorceu  o  amor  puro  e  limpo,  mas 
por  que  se  ilude  dessa  forma,  por  que  não  me  vê 
como realmente sou?
Tentei  entrar  no  sistema,  vencer,  comprar 
tudo  que  sonhou  e  que  poderia  sonhar,  não 
consegui,  enquanto  gastava  tempo  em  adquirir 
aquilo  que  pudesse  te  atrair,  você  já  estava  em  um 
mundo  diferente,  saindo  com  com  pessoas  ricas, 
esperta!
Sei  que  não  adianta  gastar  mais  tempo,  fui 
vencido.  Suas  ambições  pessoais  são  inacessíveis 
para mim.
Se um dia ler isso, não se culpe, não adianta, 
pois  culpa  e  ação  estão  desassociados  e  sei  que  não 
vai  mover­se  para  impedir  os  acontecimentos  que 
traçou,  suas  ilusões  são  maiores  que  sua  noção  de 
realidade,  e  nem  sua  pena  por  mim  vai  mudar  tal 
jeito de pensar!
Você  está  certa!  Segurança,  a  satisfação  de 
todas,  as  necessidades  estão  acima  de  sentimentos 
de  amor  mais  profundos!  Ou  será  que  são 
consequências do mesmo? Não sou, não sei só sei da 
certeza  de  uma  coisa,  o  que  sentia  por  você  era 
amor.
O absurdo maior é que nem mesmo cada gota 
que  saiu  de  mim  consegue  discernir  se  os  fatos  são 
como  deveriam  ser,  você  sendo  usada,  ou  seu 
capricho  fetichista  de  usar  as  que  têm  usam.  A 
resposta  eu  sei,  mas  me  engano,  quero  fingir  de 
inocente como você finge seus orgasmos!
Desculpe  minhas  palavras,  estou  abalada 
emocionalmente,  e  além  disso,  minhas  desculpas 
para  quem?  Afinal  é  uma  estranha  que  já  foi  em 
algum  lugar  de  meu  passado  remoto  razão  de  meu 
viver  e  que  não  lerá  uma  vírgula  do  que  escrevo, 
pois não se interessa por uma pessoa derrotada que 
escreve  palavras  obtusas  como  os  moteis  que  já  foi. 
Estou  triste,  isto  era  para  ser  alegre  e  acabou 
assim, em palavras derradeiras de uma pessoa tola 
que  idealizou  um  amor  equivocado,  crente  na  força 
do amor… que idiota fui, lamento!
A meia furada

É  possível  que  não  se  possa  escrever  mais 


nada a respeito do que nos cerca, e a cada passo nos 
afastamos  tanto  de  nós,  como  das  outras,  que  coisa 
infame!  Perco  cada  dia,  a  sanidade  e  pasme,  estou 
virando  um  monstro  e  ninguém  percebe  e  bem  pior 
do que a metamorfose kafkiana. 
Que deprimente! 
Não  importa  também,  escrevo  mais  é  para 
fazer  um  registro  de  mim  para  mim  mesmo,  leia 
bem  o  que  escrevo,  prezado  ser  que  venho  a  se 
transformar, talvez nem mais ligue para sentimento 
que tem, mas já teve um e lúcido, bem diferente do 
que é agora, tinha sonhos e queria ser querido, mas 
o destino é mesmo irônico conosco, não concorda?
Ao  final,  o  que  me  sobrou,  nada  …? 
Absolutamente  nada,  nem  lágrimas  tenho  mais, 
que  crueldade  fiz  comigo,  me  reprimi  de  tal  forma 
que  não  ficou  nem  o  que  nos  diferencia  de  outros 
seres  vivos,  por  que  teimo  em  ser  tão  perverso 
comigo, heim? Não adianta agora mudar, o que está 
feito, está feito.
Não  podemos  mudar  o  que  nos 
transformamos,  monstros  que  matam  crianças  de 
nossos  sentimentos,  isto  é  ser  adulto,  assassinar 
nossos  sonhos  e  nos  alienar  de  tal  forma  que  o 
melhor  é  estar  tão  impregnado  que  não  dê  margem 
para  o  questionamento  de  nossos  atos,  como 
podemos  olhar  o  espelho  e  ver  nosso  sentimento 
trucidado  por  um  conjunto  doloroso  de  meias 
verdades, e não poder nem mesmo chorar? 
É  uma  monstruosidade  sem  limites!  É  um 
flagelo  sem  escrúpulos,  é  um  penar.  Tanto  sonho  e 
nem mesmo uma palavra de gratidão, e precisamos 
tanto… quem se importa? se nem o escritor ao ler o 
que escreve se comove.
Em  meio  às  meias  furadas,  neste  precipício, 
estou  arrasado.  Tudo  te  cobra  uma  postura  e  ao 
meu  redor  só  incertezas,  os  mais  ou  menos  desta 
vida,  os  ambíguos  desta  coisa  que  é  o  ambiente  em 
que vivo!
Sinceramente  tento  descobrir  qual  o  meu 
maior  erro,  quero  para  de  pensar  e  fugir,  não 
consigo e a culpa me atormenta, não é fácil admitir 
se  anafrodita,  com  tantas  pessoas  bonitas  por  aí  a 
esperar algum tipo de pessoa encantada, talvez seja 
isso,  nunca  foi  uma  pessoa  encantada,  um  sapo 
talvez!  Talvez  não,  sou  um  nada,  um  nada…  uma 
meia furada que tinha serventia na medida que não 
tinha furo.
Meu  calvário  é  minha  solidão  que  nenhuma 
pessoa  compreende,  que  aumenta  meu  desespero  é 
toda manhã sem uma pessoa ao meu lado, sem um 
mero  carinho,  sem  uma  companheira  que  eu  possa 
dizer  bobagens  e  para  ela  escrever  aquilo  que 
escondo  a  sete  chaves,  a  essência  de  minha  poética 
idílica.
Mas uma meia furada não faz par.
Lições

Todos  os  dias  pensava  naquela  pessoa, 


todos os dias a mesma pessoa. Laconicamente, todos 
os  dias  queria  possuí­la  mas  nada  acontecia.  Eu 
estava  fechado  em  meu  mundo,  trancado,  sem 
possibilidade de romper este ostracismo.
Eu  precisava  romper  com  minhas  convicções 
destrutivas,  mas  como?  Toda  minha  volta  era  uma 
sombria  realidade  onde  as  pessoas  mendigas 
“viviam”  de  sobreviver,  onde  todos  os  meus  sonhos 
não  passavam  de  pesadelos  hediondos,  enfim, 
minha  perspectiva  diante  de  poder  eu,  uma  pessoa 
brasileira  pobre  ter  aquela  pessoa  era  impossível. 
Por  tal  desventura,  registro  liquidificadoramente 
algo que para alguém tenha algum sentido.
De  uma  beleza  peculiar,  daquelas  belezas 
desprezadas  ou  menores  no  panteão  das  lindezas 
das  pessoas  vulgares.  Isso  é  bom,  muito  bom.  Seus 
negros  cabelos  longos,  contrastando  com  sua  pele 
clara,  e  acrescento  a  esse  espetaculo  olhos  negros, 
profundos,  que  olhos!!!  Neles  contemplamos  o 
cosmo,  o  infinito  do  universo  e  seus  maiores 
mistérios.  Uma  certeza,  uma  convicção  emanava 
desses olhos, jóias da mãe natureza.
Como  posso  dizer  a  essa  pessoa  que  a  amo? 
Não faço ideia! Preciso de uma, mas não tenho, que 
tormento! Procuro todo dia uma forma de expressar 
isso que me corrói a lucidez.
Primeiro,  me  coloco  no  divã  e  me  analiso… 
criteriosa,  ainda  mais  sendo  a  pessoa  analista  a 
analisada.  Não  tem  local  no  subconsciente  que 
possa  esconder  um  só  sentimento.  Tudo  está 
exposto!  Estou  em  uma  sinuca  de  bico,  há 
entendimento?  Como  posso  conquistá­la?  O  que 
falta  e  o  que  já  tentei?  Escrevo  um  desabafo, 
destoado, confuso, desleixado, sem nexo.
A  oportunidade  não  surgiu,  se  bem,  que  a 
oportunidade  é  quem  a  faz  acontecer,  o  medo  do 
fazer  pelo  terror  do  fracasso.  Tantos  fracassos, 
sufocam  algum  êxito  efêmero.  Atualizado,  o  que 
fazer?  Como  inverter  tudo  isso?  Uma  ligação,  uma 
conversa,  tenho  uma  oratória  tão  deplorável  como 
essas  frases  desconexas.  Imagine  a  verborragia  e  o 
circunlóquios  massantes,  nunca  o  caos  teria  tanto 
material.  Pelas  desventuras  passadas,  um  sólido 
afastamento, um auto­confinamento selado por uma 
mente  atormentada,  espera  o  rompimento  através 
de  algum  aleatório  gesto  de  sorte  brindar­me…Não 
devo esperançar­me por tal privilégio!
Lamúrias

O   abandono  social  em  que  vivo,  é  uma 


decadência  em  minha  virtude  e  como  pêndulo, 
minha  vida  oscila  para  otimismo  e  para  o 
pessimismo.
Morreram  todas  as  minhas  ilusões,  a 
amargura  dos  desamores  se  solidificaram  em  craca 
irremovível.
Estou  ausente  a  cada  passo,  removo  no  meu 
coração  as  memórias  sórdidas  de  um  passado 
ausente.  Não  tive  e  não  terei,  esta  é  a  sina  que 
carrego  indelével  de  minha  consciência.  Ouço 
pássaros.
As moscas varejam ao meu redor.
Tenho  à  minha  frente  o  sentimento  de 
amanhã, amanhã nunca mais, cartas de suicidio as 
dizem amanhã nunca mais, tal como o corvo de Poe.
Aonde  estou?  Distante  de  mim,  milhares  de 
kms  em  plena  devassidão  humana,  o  tormento  que 
ronda  é  reflexo  intrínseco  de  minha  solidão.  O 
silêncio  desértico,  escaldante,  caminho  léguas  em 
minha  mente  em  rumo  dos  desfiladeiros,  onde 
absorto  flutuo  entre  uma  curva  sinuosa  a  direita  e 
um clítoris a esquerda.
Olho  a  distância  que  meus  devaneios 
constroem, não tenho compromisso, não tenho nada 
e  a  esperança,  a  donzela  irônica  que  me  faz 
esquecer  as  dores  de  todos  os  dias,  cada  dor,  um 
amor que deflorado no mundo platônico, afirmo não 
existir.
Este  momento  derradeiro  em  que  nada 
satisfaça  ou  desfaça  as  ações  tomadas,  continuo  só. 
As gotículas negras ferem a massa cinzenta de meu 
cérebro,  temo  minha  degeneração  muito  mais  do 
que a solidão urbana em que agonizo. Quando mais 
me socializo, mais só fico, aumento meu sofrimento 
e nada.
Mereço  todas  as  dores  e  o  abandono  em  que 
estou,  aos  poucos  me  desumanizar,  me  desvinculo 
desta  merda  em  que  vivo,  se  isso  entra  no  que  se 
pode chamar viver.
As  bandeiras  desfraldadas,  meus  gritos 
roucos, minha subversão artificial e uma certeza em 
um discurso: 

“Sou o fel destilado em sociedade consumista”

Eu espero como cão espera o acaso, eu espero 
o  acaso.  Exigiam  de  mim  também  lealdade, 
fidelidade  iguais  a  de  um  cão.  Eu,  cão  adestrado,  a 
esperar  a  ordem  da  pessoa  minha  dona  e  senhora. 
Até  onde  eu  iria  viver?  A  pessoa  minha  dona  e 
senhora  sabe,  ela  afinal  é  sabedoria  onipotente  de 
tudo! Afinal é a relação mais próxima de Deus. Nós, 
cães,  não  temos  deuses,  mas  a  pessoa  que  é  minha 
dona e senhora tinha um, um que dava razão para o 
que  buscava,  não  era  ela  fiel  a  Deus,  mas  Deus 
estava a seu serviços…
Eu esperava aliviado de não precisar pensar 
nas  minhas  ignorâncias  e  idéias.  Eu  apenas 
esperava, sentado na balança do parquinho, ela está 
atrasada,  penso.  Ela  nunca  virá,  somente  no 
devaneio de minha mente distorcida e dispersa pela 
avalanche  ideológica  desta  minha  sociedade  e  para 
quê?  Não  há  nenhuma  finalidade  em  minha  dor, 
com as de outras milhões de pessoas, não era nada, 
há  televisão,  as  redes  sociais  (virtuais),  prostitutas 
e  religiões  que  preenchem  as  necessidade  de  viver, 
viver uma subvida, isto é uma realidade, mas o que 
posso  fazer?  Onde  estão  as  pessoas  revolucionárias 
das diversas gerações. 
Uma  pessoa  rebelde  de  ontem,  uma 
revolucionária  de  momento  para  uma  pessoa 
reacionária  no  amanhã,  transitam  entre  as 
embalagens que descartamos a cada segundo.
Paranóia

Por  ser  a  quarta  que  tento  escrever  para 


aquela que conquistou­me e não conseguir, acredito 
que  ou  devo  refletir  ou  esquecê­la.  Simplesmente 
não  posso  esquecê­la  e  refletir,  estou  apaixonado 
demais para isso.
Antigamente  era  mais  fácil,  flores,  alguns 
“eu  te  amo”  e  estava  resolvido…  garanto  que  não 
vou  muito  longe  com  isso.  Abandonei  a  caneta  e 
olhei  o  teto,  é  preciso  ser  um  bruxo,  assim  era  só 
enfeitiça­la  e  pronto,  que  solução  ridícula,  talvez 
acender  umas  velas  e  incenso.  Meu  quarto  precisa 
de  uma  geral,  deixa,  amanhã  eu  arrumo,  agora 
preciso  escrever  para  ela.  Talvez  se  eu  ir  ao 
shopping  surja  alguma  inspiração,  sempre  tenho 
inspirações lá e alucinações também.
Mas  se  dramatizar  minha  pusilanimidade  e 
dilatar  minhas  pupilas  diante  da  droga  que  é  o 
amor,  talvez  fique  cego  e  morra  com  tudo  ao  meu 
alcance  e  não  posso  ver  ao  tocar,  engraçadamente 
(acaso)  ou  por  força  do  destino,  exatamente  agora 
está tocando uma música sobre esse assunto.
Me  assusto,  é  horrível  ter  que  em  vez  de 
pensar em acertos futuros, tenha que corrigir erros 
passados mas só assim terei força para escrever.
O problema é o seguinte, existem milhões de 
pessoas,  e  essa  formam  milhares  de  pares,  mas  as 
vezes  por  ignorância  ou  falta  de  oportunidade 
acontece  que  para  uma  pessoa  exista  dezenas  de 
pretendentes, nem sei se a pessoa tem isso!
É  desconfortante  ter  que  pensar  nisso.  Às 
vezes  me  ocorre  certas  coisas,  como  não  viver 
sozinho,  pois  é  difícil  entender  o  contrário,  que 
muitos vivem tendo uma multidão em todos os lados 
e  não  poder  gritar  por  ajuda  pois  ninguém 
entenderia  e  taxaria  aos  risos  sarcásticos  que 
estariam  em  presença  de  uma  pessoa 
desequilibrada.  Difícil  é  viver  em  uma  falsa 
coletividade,  com  a  cabeça  lotada  de  tolices 
ideológicas,  nos  transformando  em  neuróticos 
suicidas  pela  busca  de  “um  lugar  ao  sol”,  bah! 
Coisas para idiotas, “um lugar ao sol”!
A  sensação  de  estar  perdido  sem  ter  uma 
direção,  é  para  mim  desconfortante  e  angustiante, 
imagino então as pessoas que conheço, alguma com 
o  triplo  da  minha  idade  mas  de  mente  oca  que 
fazem  da  mentira  e  da  violência,  uma  diretriz  de 
vida por estarem mais perdidos do que eu. Ou será 
que  não  sei  o  que  escrevo,  isso  daqui  algumas 
décadas afirmei com certeza, mas agora escrevo.
Por que sou assim? 
Preciso  escrever  e  não  consigo  mesmo 
sabendo  que  disso  depende  minha  felicidade  ou 
tristeza,  talvez  está  ansia  de  mostrar  algo  que  vem 
do  coração  mas  com  receio  que  não  seja  a  resposta 
satisfatória,  ora,  convenhamos  que  são  das 
experiências  que  somo  feitos,  mas  e  essa,  essa  dor 
que  sinto  no  peito  e  que  ator  de  teatro  nenhum 
conseguiria  dramatizar?  Seria  então  com  um 
moribundo  tentando  viver  e  duas  pessoas  tentando 
ajuda­lo  sendo  que  uma  dessas  pessoas  recorre  a 
todos  os  recursos  imagináveis  e  nada  adiante,  o 
moribundo  morre,  a  pessoa  que  tudo  fez,  se  vê 
incapaz,  e  a  outra  que  tudo  assistiu  sorri  e  chora. 
Preciso  escrever,  mas  agora  não  só  para  minha 
pessoa  amada,  para  o  mundo  que  tira  e  coloca  a 
esmo,  que  abre  seu  inocente  peito  a  todas  e  essas 
todas que tem como princípios apenas ódio e rancor.
A  bagunça  de  minha  mente  transparece  em 
tudo  e  não  aceito  o  estilo  de  vida  de  uma  pedra, 
acho  que  por  burrice.  Mas  eu  escrevo  os  beijos  que 
não esqueço, que nunca lhe dei, ou nossos sonhos de 
um futuro juntas mas sem passado, o que escrevo?
Eu  vejo  que  sou  um  herói,  lógico,  um  herói 
por  omissão  que  enfrenta  mil  perigos  sem  sair  de 
baixo  da  coberta,  com  medo  que  a  realidade  nua  e 
crua  me  passe  uma  rasteira  e  eu,  herói,  não  possa 
voltar  ao  meu  leito  cripta  e  repousar  segundos 
eternos.
Acredito  que  sou  feliz  por  me  odiarem,  sem 
ter nada feito para tal ódio, em me satisfaço iludido 
em  que  tudo  é  belíssimo,  mesmo  que  as  pessoas 
critiquem  e coloquem feiura , mas que sou para ser 
assim, um deus? Uma pessoa crucificada em cadeia 
nacional  com  direitos  reservados?  Nada,  sou  uma 
semi pessoa, semi infantil, medroso e temeroso pelo 
mundo  que  me  aguarda,  cheio  de  preconceito  pelo 
que  não  conheço,  por  não  me  conhecer.  Quero 
escrever,  mas  o  que  me  impede,  como  já  delirei,  é  o 
desconforto  de  saber  que  não  terei  uma  carícia  ou 
um  “você  é  que  eu  quero”...  mas  o  escarnio 
escarrado de ódio agudo seguido de uma indiferença 
pisante, arrogante e destruidora.
Mas como sou imbecil, se não tentar, se não 
escrever, se não transformar a idéia em ação, nunca 
a  resposta  que  acho  que  terei  será  real  e  eu  assim 
nunca  terei    essa  dor  real  mas  ela  será  persistente 
em minha mente.
Acordo  de  meus  pesadelos,  olho  o  caderno  e 
a  caneta,  faço  um  desenho,  pego  minha  calça, 
preciso  de  ar,  irei  beber.  No  caminho  cruzo  uma 
pessoa conhecida, está na pior, mas o que é estar na 
pior? Olho para ela, para ver alguns sinais do que é 
estar  na  pior,  não  parece  doente,  financeiramente 
está  muito  melhor  do  que  eu,  mas  ali  está  o  sinal, 
ou  a  falta  dele,  como  eu,  vaga  pelo  mundo  de 
incertezas,  se  questionando  de  coisas  inúteis,  para 
passar  o  tempo  até  neuroticamente  explodir  e 
desaparecer  com  um  sopro,  que  tragédia 
contemporânea!
E o pior, altamente contagiosa!
Minha  bebida  amarga  e  quente  piora  meu 
estado, o desânimo me consola, já não irei escrever, 
vou  falar  com  ela  pessoalmente,  poupando  assim 
tinta e papel. Isso me excita, garanto que será uma 
experiência,  pior  ou  melhor,  não  sei.  Viro  o  copo, 
lembro da piada com bebida e sorrio, olho a mesa ao 
lado  e  tenho  um  saudosismo  bobo,  ao  ver  pessoas 
mais  jovens  a  beberem,  obliterando  a  consciência, 
mas que besta sou!
Pago a bebida, me levando e me decido ir até 
a  casa  dela  a  pé,  vou  ao  carro  e  o  levo  até  o 
estacionamento,  faz  um  tempão  que  não  ando,  isso 
me  fará  bem,  terei  tempo  para  meditar  os  prós  e 
contras dessa platônica relação.
Uma  floricultura,  tenho  uma  percepção, 
flores  seriam  uma  advertência,  mas  anônimas  não 
fariam  mal.  Entro  e  vejo  vasos  e  arranjos,  uma 
pessoa  com  ar  jovial  e  calma.  Avaliando­a,  aponto 
para o vaso com arranjo de rosas brancas, gostei … 
inocente  como  o  amor  que  sinto,  neurótico  como  as 
roupas da psiquiatria que convivi. Esse arranjo com 
um  cartão  com  duas  palavras  “breve  entenderá!”,  
chegará antes de mim.
Traio  a  mim  sonhando  acordado  enquanto 
ando que ela será uma nobre e eu um guerreiro que 
a defenderá de todo mal, uma verdade absoluta, um 
dogma.
Caminho,  a  mente  piscando,  alertando  que 
algo  não  está  certo,  porque  está  tudo  funcionando 
bem.  Mas  não  ligo,  estou  feliz,  acho  que  o  quarto 
onde estava depressivo.
Passo  por  uma  loja,  pelo  vitrine,  vejo  a 
pessoa  atendente  realizando  seu  serviço,  e  se  não 
fosse,  se  ela  estivesse  representando,  assim  como 
eu, uma faz de conta de auto­enganação. Não parece 
que  está  se  enganando,  estou  me  enganando,  não 
sou tão idiota assim… será?
Neste  ritmo,  chego  formado,  tratado  ou 
tratante  de  mim.Observo  as  pessoas  na  rua,  uma 
correndo,  outra  gritando,  aquela  lá  roubando,  essa 
pagando  a  vista,  a  outra  a  prazo,  protagonistas  e 
antagonistas dessa encenação.
Ela  vale  a  pena  de  qualquer  sacrifício  e  não 
vale, uma pessoa de capa de revista, meu padrão de 
beleza,  meu  padrão  de  beleza,  de  uma  revista?  A 
caminhada  entre  arvores  percebo  um  padrão 
irritantemente  neurótico  nesse  suposto  amor,  uma 
obsessão  de  ter  para  depois  descartar…  ela  não 
merece isso.
Tenho  que  transformar  essa  paixão 
obsessiva  (inocente  é  claro!)  em  amor  e  carinho 
longevo.
Catástrofe  eu  chamaria  isso,  amar  alguém 
que  nem  sabe  que  você  existe.  Exótico  também. 
Agora  tenho  inspiração,  posso  escrever  um  livro,  só 
que  em  fala,  saber  dosar  as  palavras,  seus 
significados e se preparar para o pior. Nem sei mais 
o  que  comi  e  nem  que  hora  é.  O  que  quero  é 
terminar  logo,  minha  convicção  depois  dessa 
dramatização  toda  será  mais  uma  camada  nessa 
cebola  de  emoções.  Prever  de  antemão  o  que 
acontecerá,  em  qual  mão  tem  a  pedra,    excitante  e 
perigoso.
O  fim  está  próximo,  não  é  uma  profecia,  é 
um fato pois estou diante do portão dela. O que me 
separa  são  alguns  metros  elásticos,  físicos  e 
mentais,  porque  o  meu  mundo  e  o  dela  não 
combinam e nunca combinarão. Minha estrada só se 
cruzou  com  a  dela  pelo  acaso,  pelas  circunstâncias 
disso  somos  todas  nós,  dessa  crença  de  que  algo  de 
melhor virá. Mesmo sabendo tudo isso invoco forças 
as entidades, mas só a coragem que preciso. Aperto 
a  campainha,  uma  pessoa  abre  a  porta,  sinto  meu 
coração  bater  aceleradamente  e  minha  cara  corar, 
um  lugar  distante  e  solitário  é  que  preciso,  decido 
depois  do  que  vier,  hei  de  virar  um  eremita!  Na 
Amazônia,  bem  longe!  Mas  nenhuma  distância 
física  separa  um  pensamento  apaixonado  do  seu 
objeto de amor. A pessoa chega ao portão, seus olhos 
brilhantes,  um  sorriso  meigo  e  um  longo  cabelo 
acetinado.
Mas  algo  se  destaca  em  seu  cabelo?  Uma 
rosa!

Eu  ainda  lembro  da  cara  dela,  daquele 


sorriso  e  da  rosa.  Sim,  uma  rosa  branca  em  seu 
cabelo  era  sinal  que  estava  certo,    eu  certo?  Se 
estivesse,  ela  estaria  agora  do  meu  lado,  mas  ela 
não aceitou ficar do meu lado. O por que da desfeita 
ainda  me  é  nebuloso,  mas  quando  olho  no  espelho 
tenho uma sensação de desprezo e vergonha de mim 
mesmo.  Me  envergonho  por  não  conseguir 
conquistá­la,  mas  se  ela  soubesse  de  todas 
tentativas que tive e que só me ferrei, talvez tivesse 
complacência por mim mas não quero ser amado por 
pena, tenho um orgulho oras!
Mas  aquela  rosa  me  comoveu  e  transformou 
meus sentimentos bizarros em um só: amor!
A  tensão  em  que  eu  estava  mais  aquele 
choque  me  confundiu.Não  consegui  transformar 
meus  pensamentos  em  palavras.  A  única  coisa  que 
fui capaz de fazer, foi dizer: Entendeu? ­ e  mais um 
beijo, evitado!
O  desastre  iminente  já  estava  anunciado, 
apenas não queria aceitar. Ela apenas agradeceu as 
flores,  entendeu,  mas  não  era  eu  quem  ela 
esperava,  me  devolveu  a  rosa  de  seu  cabelo  e  se 
desculpou  pela  cena  e  por  ter  alimentado  um 
sentimento não correspondia. 
Nunca  mais  voltei  para  casa,  nem  ao  meu 
trabalho,  um  errante,  ainda  carrego  essas 
lembranças na mente. Abandonei a todas, tudo que 
consegui  juntar,  tudo,  não  me  importo  mais  com 
nada, nem comigo. Importo sim com a arrogância e 
a indecisão, asco as bondades e perfeições.
Quando  penso  em  todos  os  acontecimentos, 
as  decepções  que  tive,  só  me  resta  uma  saída:  a 
felicidade de estar só e só eu percebo. Só aí sento e 
aprecio  o  mundo,  não  tenho  compromisso  e  nem 
amores,  e  posso  sem  nenhum  preconceito,  apreciar 
a  vida  que  ao  meu  lado  vem  e  vai.  Estou  lavado  de 
tudo  que  é  bom  demais  e  tudo  que  é  ruim  demais, 
sou  eu,  um  ser  humano,  mais  nada,  sem  um  valor 
pré definido, sem entregar a ninguém, apreciando o 
mundo,  a  esquecer  todas  as  dores  que  tive  e  se 
escorre  uma  lágrima  nesse  período,  sinto­me 
tristemente  feliz,  como  uma  rosa,  uma  rosa  branca 
em um cabelo acetinado, amado para sempre.
Desde daquela hora, daquele infeliz dia, essa 
data  me  açoita  como  uma  maldição  doentia.  Eu 
transformei  a  zona  de  amizade  em  amor,  que 
imbecil sou, um incapaz da vida que nem cheguei a 
viver. Pago com minha vida e lágrimas a esse amor 
impossível.
Por  ser  maçante  essa  obcecada  e  sem 
sentido,  atesto  agora  que  eu  a  substitua  ou  uive 
para  lua,  invocando  as  saudades  do  tempo  que  se 
passou. Virarei  eremita. Mas eu sinto sua falta, se 
há  alguma  força  ou  forma  de  trazê­la  ou  ir  mais 
uma vez em seu encontro, se manifeste!
A paranóia desse amor unilateral, platônico, 
será  a  chave  eterna  que  nunca  abrirá  a  porta 
fechada da minha vida! Para que eu nunca esqueça 
ficam esses registros kármicos. 

_________

Este  manuscrito  foi  encontrado  em  uma  das 


mãos  de  uma  pessoa  indigente  falecida,  seu  estado 
era lastimável, na outra mão, uma rosa branca seca.
Sonho ambicioso

Quando você saiu sem me tocar e nem um 
único,  da  porta  que  fechaste  com  força,  beijo 
mandar, percebi naquele momento que outra ilusão 
havia  acabado.  Por  que  toda  vez  só  a  mim,  o 
espectro da ilusão derruba?
Te olho de longe, de meu mundo fechado e às 
vezes  ela  irradia  uma  luz  tênue  e  de  querer  você, 
mas não me percebes! Farol pálido que esta luz!
Ao  menos  suas  mão  macias  uma  vez  tocou 
meu rosto, ao menos uma vez me olhaste com raiva 
e  desprezo  e  deixaste  as  marcas  de  tuas  mãos 
suaves  em  minha  face,  marcas  estas  que  do  rosto 
sumiram,  mas  do  coração  não.  Foi  um  terremoto, 
mais  um  que  abala  minha  estrutura  e  destrói  mais 
ainda o que me resta de humanidade.
O  abandono  de  minha  existência  é  a  prova 
cabal de que sou uma anafrodita neste mundo.
Quero  e  busco  em  cada  mulher  seu  traço, 
amo  a  todas  e  nenhuma  me  quer.  Sou  assim 
implacavelmente  idiota  e  mediocre,  adjetivos  que 
me deste no auge de seu repudio.
Intervalo, tomo ar para poder descrever toda 
estas  coisas,  estou  no  meu  eremitério  em  busca  do 
sentido,  mas  não  o  vejo,  não  te  vejo.  Tua  voz 
zombeteira  está  ao  meu  ouvido,  atrapalha  meus 
sentidos.
Quando  caminho  sem  rumo,  sem  prumo, 
atordoado com todas as dores que tomei, observo as 
pessoas  iguais  a  desfilarem  com  seu  discurso 
individualista,  te  vejo  no  meio  deste  turbilhão,  até 
você! Do que tenho mais medo é ser igual, explorada 
igual e não poder amar, sonho ambicioso este, amar, 
pelo menos para mim. Enquanto rumo ao meu fim, 
sei  que  não  terei,  sei  que  vai  ler  tardiamente  e 
quem  sabe  até  procurar  até  me  entender,  só  que  já 
estou sozinho a muito tempo, estou frio, quem sabe 
… morto para amar! Ou um temeroso que inverte o 
seu  medo  pusilânime  em  vez  de  viver  apenas  uma 
vez  mais  amor.  Penso  em  você,  já  é  pela  milésima 
vez,  embriagada  ao  som  de  uma  bossa  nova,  quero 
flutuar ao seu encontro, ter mais uma vez seu asco 
ao vivo, ver meu rosto monstruoso, minhas mazelas, 
minha subversão é pensar em você! É não tê­la por 
ser  grotesca  escritora,  uma  onanista  das  letras, 
uma  tarada  das  frases  verborrágicas,  hemorrágicas 
de  tesão,  de  vontade,  de  ter  você  perto  de  mim!  Já 
pensei  em  lapidar  o  mais  puro  diamante,  uma 
poesia  só  sua,  como  os  montes  que  já  escrevi,  mas 
com o ponto final, não fico satisfeita. Todas passam 
por tal dificuldade?
Espero que não. Esperar que o que me resta, 
meus  dentes  caiam,  que  sozinho  em  um 
apartamento  repleto  de  recordações  e  poemas 
embolorados,  aff,  em  meio  caos  do  passado  e  do 
amargor  do  futuro,  eu  ainda  bêbada  com  sua 
partida,  de  minha  partida  vida,  procurando  mais 
uma  garrafa  de  lembrança,  eu  ainda  olhando  as 
fotos coloridas e de meus sonhos em branco e preto, 
aspire  um  pouco  de  poeira  esquecida,  que  me 
esqueça  junto.  Não  me  atrevo  mais  a  tentar  te 
entender  e  nem  vou  mais  a  sua  porta  declamar 
versos  e  prosas  de  meu  amor.  Não  vou  mais  tentar 
compreender  os  motivos  que  me  levaram  a  mais 
uma ilusão, seu existir me feriu.
O  compasso  de  meu  coração  desarranjado  é 
uma  batida  grave  de  sofrer.  Cada  decepção, 
construo  um  degrau  a  mais  no  poço  em  que  me 
encontro e o desço com toda minha ilusão, precisa ir 
tão longe assim?
Mas  você  foi  para  tão  longe  de  minha  vida, 
mas precisa ir tão longe assim?
Não gosta de mim, é verdade, afinal, por que 
haveria  de  gostar,  se  não  “tenho”?  Não  tenho  nada, 
atributos  físicos,  inteligência,  um  fracasso  em 
pessoa.  Já  até  abracei  uma  solução,  me  iludir  com 
um fim sem teu beijo, sem teu carinho, sem teu riso 
adorável.  Longe  de  você  sou  só  uma  sombra 
abstrata, uma lástima bêbada e mal tratada.
“Sempre precisei de um pouco de atenção, só 
sei  do  que  não  gosto,  desses  dias  tão  estranhos,  há 
poeira e sombras pelo cantos”. (Renato Russo)
O eremita (Reflexões da
23 hora)

Estou só, aguardando o transporte precário 
que  me  levará  para  minha  cripta.  O  vento  gélido 
esmurra  minhas  orelhas,  a  solidão  insensibiliza 
meu  coração.  Repito,  estou  só,  como  sempre,  como 
sempre  estarei  sem  companhia,  sem  amor,  uma 
anônima sombra que imóvel, tremendo, vê os carros 
passarem, vê sua vida se esvair ao esperar. Esperar 
que tudo não passe sem me levar.
A  lua  cheia  está  entre  os  eucaliptos,  a  semi­
escuridão  cria  e  destrói  sonhos.  O  ranger  dos 
troncos, o esvoaçar das folhas quebram o silêncio de 
minha angústia, são 23h.
Olho  novamente  ao  relógio,  olho  novamente 
ao redor, não quero acreditar que só estou. Caminho 
nervoso.  Olho  o  bueiro,  está  repleto  de  baratas, 
encontrei afinal companhia digna de minha espera. 
As  baratas  bailam  como  se  eu  fosse  digno  de  seu 
show.  Não  me  vêem  como  um  abandonado,  ali 
perante  elas,  apenas  mais  um.  Deixo­as  em  suas 
corridas. Olho novamente o relógio, 23h,
O  tempo  me  zomba  a  cara  e  o  amor,  o 
coração.  Ao  esperar,  só,  reflito  e  aflito  chego  a 
pensar  que  nunca  verei  outra  pessoa,  uma  pessoa 
bonita. Balanço minha cabeça, desperto do sono em 
que me encontro,  assovio uma canção. A fumaça vai 
alto,  meu  delírio  também,  quantas  horas  se 
passaram,  inúmeras  e  nenhuma.  Nenhuma  que 
tenha  valido  a  pena  de  minha  pena,  todas  essas 
horas se acumularam em uma sombria espera de ir 
sem  saber  se  vai  chegar  ou  se  vai  voltar.  Olho  no 
relógio, são 23h.
Estou  preso  ali,  e  não  importa  onde  esteja, 
sempre  ali  me  vejo  a  esperar  e  a  esperar  e  a 
esperar...  Alucinado,  rascunho  um  grito,  mas  está 
asfixiado  e  não  a  ninguém  a  me  ajudar.  Tenho 
medo,  tenho  sede,  quero  esquecer  que  sou  humano, 
que preciso amar. Mas como posso fugir, se já estou 
só, já estou fora. Lentamente ouço um barulho, este 
se  multiplica,  são  grilos  e  sapos,  corujas  a  caçar 
ratos,  sou  um  deles,  espero  minha  ratoeira  ou  uma 
coruja.
Lembro­me  de  cenas,  histórias  e  fatos  que 
me  marcaram,  e  afinal  só  estou,  posso 
simplesmente  lembrar  e  rir,  o  tempo  não  passa,  ou 
quero  acreditar  que  não.  Tenho  que  acreditar,  pois 
ainda  são  23h,  que  hora  estranha  esta,  Estou  só 
sem  nada  ou  ninguém  para  conversar  ou  discutir. 
Mas  posso  escrever  este  momento  e  lê­lo  até  o 
transformar  em  mais  um  momento  de  meu  existir. 
A  lógica  me  persegue,  que  se  dane  tal  pessoa. 
Preciso  não  ter  lógica  e  esta  é  tão  fácil  de  ser 
aliciada,  viciada  em  sofisma,  dou­lhe  o  que  quer,  e 
afinal tempo é que não falta.
Até  este  momento,  em  revista  a  tudo  que 
vivi,  não  tinha  afirmado  que  meu  estado  de 
abandono  fosse  obra  fecunda  de  um  ser,  eu  e  mais 
ninguém  o  agente  precursor  desta  minha  reclusão 
social  amorosa.  Em  meu  eremitério  urbano, 
pusilanimemente  construo  uma  teorética  circular  e 
verborrágica  que  me  serve  de  lastro  para  suportar 
este ciclo de paixão­rejeição­solidão, que a cada giro 
me  distancia  mais  de  mim.  Olho  o  relógio,  me 
decepciono,  são  23h.  Como  vou  romper  com  esta 
situação,  não  mais  é  o  esperar  que  me  aflige,  mais 
toda  a  minha  vida  circunlóquia  e  dispersiva  que  se 
atenua as 23h, um alerta que tenho que romper com 
tudo,  mas  não  sei  e  não  atrevo,  posso  ser  a  única 
vítima deste provável malogro. Tenho esboçado meu 
futuro,  e  meu  futuro  é  fruto  amargo  de  desamor  e 
tristeza,  desamor  construído  dos  foras  que  levei  e 
que  imaginei.  Tristeza  de  ver  a  cada  dia  o  mesmo 
sonho  ser  destruído,  um  sonho  tão  simples,  amar! 
Mas são 23h, hora do desespero, hora de minha dor 
se eternizar e eterna está. Olho mais uma vez a lua 
cheia, cheia de esperança que isto não passe de um 
sonho  ruim,  mas  já  é  tão  ruim  que  é  realidade  de 
minha vida urbanóide.
Interrupção: O céu escuro convulsiona minha 
mente, vomito e vejo girar uma multidão de mesma 
cara e a mesma miserável vontade, de subir sobre o 
maldito sangue de seus iguais. Quero vomitar mais 
um  pouco,  mas  sei,  que  ódio  tenho  de  meu  saber!!! 
Saber  que  você  fdp,  está  lendo  esta  merda  de  tal 
forma  que  daqui  a  pouco  terá  esquecido  e  esquece 
porque, porque é uma pessoa mesquinha, só pensa e 
olha o que seu umbigo sujo está a fazer. Não é capaz 
de  perceber  que  somos  uma  rede  emaranhada  e 
embaraçada.  Não  tem  culpa?  Ninguém  tem. 
Ninguém  tem  que  trabalhar,  viver  debaixo  de 
desigualdades  e  não  lutar  por  seus  direitos.  Mas 
quando  estiver  a  definhar,  seus  parentes  a 
despedaçar suas parcas riquezas, vai perceber cheio 
de razão que poderia ser diferente!
Segue:
São 23 h
Reflexões de fim de ano

As  luzes  piscam  e  a  cada  piscar,  pisca 


também  flash  backs  na  minha  vida,  Lembranças 
vagueiam  para  além  e  aquém  de  mim.  Estou  só. 
Devo  assim  permanecer,  momentaneamente  a 
esperar  que  venha  a  sumir  este  estado  em  algum 
ano vindouro.
Espero  demais  uma  alma  feminina  que  me 
realize. Estou demais, a cada ano pioro. A cada ano 
aprofunda­se mais esta sina que carrego, e é no fim 
do  ano  que  isso  explode,  deixando  mazelas  em  meu 
coração  humano.  Mazelas  que  metamorfoseiam  em 
ser  diferente  do  que  sou,  ser  aberrante  que  ao 
tentar evitar, venho a ser. Não culpo ninguém, pois 
não  se  pode  culpar  o  culpado  que  não  se  sabe 
culpado. Perdoado está, mas a vítima e executor vão 
continuar  neste  dilema,  nesta  falta  de  amor.  Como 
este processo está intrínseco a minha alma, granjeio 
uma  resposta  plausível,  condeno  primeiro  a  mim, 
depois aos outros, em seguida a sociedade, e por fim 
a Deus. Disperso, balbuciante, vejo ruir meu castelo 
de cartas, meus sonhos e minhas esperanças. E por 
quê?  Por  ter  o  mais  ambicioso  sonho  (  para  mim  é 
claro !), ter uma pessoa companheira.
Para  cada  indivíduo,  seu  maior  sonho  é 
irrealizável,  pois  providência  divina,  com  toda  sua 
sapiência  (duvido  que  exista  tal!)  prepara  o  vivente 
para  que  se  frustre  ao  fim  do  ano  com  a 
possibilidade  do  ano  que  vem  e  a  impossibilidade 
desde  findo  ano.  Mais  ainda,  prova­o  a  cada 
momento santo, pois o que pede é o resumo sacro de 
sua vida. Está finda esta primeira reflexão.
Não  cheguei  a  lugar  nenhum.  Vejo  minhas 
vitórias,  se  parecem  com  pontos  dispersos  sem 
nexos, sem encaixes, se é que precisam. Foram doze 
anos  esperando  alguém,  doze  anos  que  se 
mostraram  indigestos,  mas  por  persistência  fui 
conduzindo­os em uma crescente decepção, em uma 
angústia desesperada. Agora o projeto para o futuro 
é uma resposta contínua do passado, queira ou não 
queira,  terei  todo  fim  do  ano,  a  mesma  desilusão, 
construindo  textos  absurdos  e  obsoletos  com  minha 
vida.  Mas  deixa  para  lá,  as  migalhas  que  me 
sobram  me  consolam  (mas  expludo  às  vezes,  sem 
por que, porque estou só ?!)
Mesmo que agora me venha uma esperança, 
não  tenho  certeza,  como  posso?  Surge  a  cada 
momento  uma  brasa  minúscula  que  procura 
reacender meu coração, mas em vão, a ilusão acaba.
Pusilânime

As vezes quando me encontrava sozinho em 
meu apartamento, me sentia vazio, então seguia até 
a janela e ficava olhando a vida noturna da cidade. 
Com  uma  bebida  quente,  olhava  e  via  a  fumaça 
fugir  para  as  estreias,  ficava  pensando  e  olhando, 
marcava  uma  estrela  e  a  ela  começava  recitar 
palavras de amor, ela era a única que me escutava.
Após  minhas  crises,  ninguém,  antes 
ninguém e me pedem para não ser duro, mas o que 
é  ser  mau?  Então  o  que  faço?  Me  diga  por  favor, 
quem  sabe,  não  me  deixe  com  essa  ansiedade  que 
queima.
Nessas  horas  eu  pegava  o  telefone  e  ligava, 
desistia,  ela  não  se  interessa,  afinal  não  quero 
incomodar,  eu  sou  uma  pedra  no  sapato,  então  a 
idéia,  por  que  não  pular  ?  Não  era  homem  o 
suficiente  ?  Então  a  solidão  que  tinha  ia  sumindo, 
acalmando,  para  explodir  daqui  alguns  dias,  horas 
ou anos mais tarde. Dormia com um peso em minha 
consciência, sou um nada,
Quantas  vezes  me  peguei  querendo  realizar 
um  ato  mais  significativo,  que  a  chamasse,  não 
conseguia. Não me importava com quem saísse, com 
quem  andava,  com  tivesse  algum  tipo  de  relação,  o 
que importava é que ela me amasse e me desse essa 
segurança.
Não  podia  saber,  eu,  um  nada,  era  também 
uma concha fechada pelo tempo. Meu saber era dos 
outros,  não  meu,  nunca  sentiram  por  mim  amor, 
piedade sim, nunca amor, como será amar ?
Dirigia um carro, me tornei importante. para 
quem ? Para mim mesmo ? Só queria ter tempo para 
me  entender,  ou  amar.  Minha  fibra  desapareceu, 
não  consigo  mais  mudar  o  sentido,  o  meu  sentido 
não me vale nada, não significa nada, sou mais um 
a margem do tempo esperando uma mão.

Que crime cometi ? Estar vivo !
Viver  é  crime  ?  Parece  que  sim,  somos 
julgados  pelos  nossos  semelhantes  diariamente, 
sem  nunca  ter  direito  de  saber  o  por  quê.  Mas  de 
repente,  param  de  nos  julgar,  não  mais  existimos, 
paramos  no  tempo,  ninguém  se  interessa  por  você, 
ninguém, me ouviu! Sabe o que significa ninguém ? 
Nada,  absolutamente  nada  se  interessa  por  você.  E 
como  se  tivesse  uma  doença,  evitam  e  procuram 
outras  coisas  com  umas  desculpas  que  você  não  faz 
o tipo delas e aí me pergunto o que fiz ? Estar vivo !
Tenho  que  me  recompor,  tomar  fôlego,  tenho 
algo  importante  a  fazer,  apagar  fantasmas  que 
nunca  existiram  e  que  criei.  Acredito  que  ninguém 
virá  bater  na  porta  e  dizer  :"­Pare  !  Olhe  ao  seu 
redor,  agradeça  a  deus  pelo  que  tem  ."  Pelo  que 
tenho e não pelo que sou, sendo que pensem que há 
um  espelho  que  liga  o  que  você  é  ao  que  você  tem, 
pura  distorção  alienada.  E  se  viessem  pela  minha 
aparência? Mas ninguém virá.
Terei  que  formar  essas  cenas  mentalmente, 
me tornei tolo, lógico tenho medo.
Medo, fraco, um covarde perante o tempo que 
permaneci  sentado,  criando  mundos  sem  vivê­los, 
um pusilânime jogado ao nada, se é que o nada me 
quer.

Aquela  pequena  figura,  que  minha  vergonha 


amou,  nunca  saberá  que  gostei  dela,  eu,  um 
pusilânime  que  a  amou  !  Que  surpresa  tive  ao 
constatar  isso,  eu  sentado,  imóvel,  a  me  descobrir, 
me vi que amava e impotente, não conseguia dizer a 
ninguém.
Meu  deus  !  Que  faço,  eu  sei  amar,  sou 
importante ! Eu ? Um frágil e inútil covarde, doente 
pelo  que  sei  que  posso  fazer  mas  não  o  faço.  Não, 
ninguém  sabe  o  que  faço,  o  que  sinto,  eu, 
mendigando  uma  simples  palavra  de  afeto  de  outra 
pessoa, que miserável covarde era ?
Me  disfarçava,  ela  não  podia  saber.  Coloquei 
as  mais  variadas  máscaras,  louco,  revolucionário, 
mas  enfim  a  verdadeira  face  sobrepunha,  a  de  um 
pusilânime  inútil,  sim  inútil,  eu  não  prestava  nem 
para  viver,  nem  a  honra  de  matar,  a  honra  de 
cometer haraquiri e sujar minhas próprias mãos de 
meu sangue, não me agradava, me
atormentava  e  será  que  pusilânime  para  o 
resto  da  vida  serei  ?  Este  tormento  que  me  tira  o 
sono, que me queima será eterno ?
Estou  melhor,  à  medida  que  esqueço  que 
existo, que sou um inútil, desprezado pôr todos, que 
me aprofundo em minha destruição lenta e dolorosa 
me  alegra,  esse  tormento  que  carrego  em  minha 
costas  me  esmagará,  então  serei  jogado  se 
interessarem  a  uma  vala  qualquer,  eu,  um 
pusilânime,  um  nada  que  se  transformou  em  algo 
incômodo,  um  cadáver  alienado  de  tanto  desamor 
que  conseguiu  arrumar.  O  que  espero  de  mim  ?  O 
que os outros esperam de mim ?
É  muito  desconfortável  saber  que  existem 
milhões  de  seres  nesses  pequeno  mundo,  mas  que 
ninguém,  ninguém  mesmo  se  interessa  pela 
bobagem  de  alguém  que  seja  um  sonho,  uma 
dificuldade, mas eu, um pusilânime, covarde, inútil, 
me  preocupo  se  tiver  chance,  se  me  darem  chance. 
Que  digo,  tolas  palavras  falo,  alguém  se  interessar 
pôr um pusilânime ! Há, há, há, há, há ...
Estou  lúcido,  há  sangue  em  meu  corpo,  sou 
um organismo que possui milhões de células unidas 
para  um  propósito,  viver,  independente  que 
pertençam  a  um  guarda,  ladrão,  político,  cantor, 
atriz,  escritor,  estudante,  só  querem  viver,  que 
fariam  elas  se  soubessem  que  era  um  pusilânime 
que as movia ? Será que abandonaram suas funções 
em  protesto  ?  Nem  ligariam,  ninguém  liga,  não 
seriam elas as primeiras.

Me  acalmei,  novamente  a  uma  esperança, 


um intervalo, uma luz no fim do túnel, nada passou 
de um susto, eu sou importante, a uma morena que 
me ama Será ?
Meu  problema  é  ser  profundo  com  minha 
doença, com minha covardia. Exijo dela mais do que 
ela  pode  me  oferecer.  Descontente  descubro  em 
lugares  impossíveis  a  urna  pessoa  normal,  mas  eu 
era  normal,  bem  era  isso  o  que  os  médicos  diziam, 
concordei, ué, que mais podia fazer, dizer a eles que 
tinha  pusilânime,  ririam  de  mim.  Talvez  um 
psicólogo, quem sabe ?
Me destruo, sei bem !
Mas  ninguém  sabe  como  é  estar  em  uma 
multidão,  sem  personalidade,  querer  sair,  gritar  e 
ao  contrário,  ficar  imóvel  olhando,  com  medo, 
covardemente parado, vendo os outros a se amarem, 
a  serem  felizes  por  ousarem  e  eu  como  uma  pedra, 
um  pusilânime  sem  motivo  a  compreender  mais  do 
que devia e pagar por isso.
Não, não, preciso mudar, virar herói, mostrar 
a mim mesmo que posso e mudar .
O que fiz de mal, para não ser compreendido 
pelas  pessoas  que  conheço?  Um  pusilânime  nunca 
acha  que  todos  se  interessam  por  ele,  era  isso  que 
sentia,  ninguém  gostaria  de  estar  do  meu  lado,  do 
lado de um covarde.
Agora  que  percebo  o  que  sou,  estou  mais 
confortado,  espero  que  a  campainha  toque  e  que  ao 
abrir, uma pessoa diga
­  Que  fisionomia  estranha,  você  está  tão 
bonita!
A última ópera das
pessoas oprimidas

A  noite  surgiu  majestosa.  O  chão  cheio  de 


sangue,  fabricava  ilusões  demoníacas,  havia  em 
cada olhar morto a sensação de algo por fazer, algo 
que ficou no mundo vivo. Todas as almas que ali se 
encontravam  tinham  família?  Apesar  de  serem 
apenas  militares,  havia  algo  de  humano  ali.  Tudo 
que  as  pessoas  fazem  é  lutar  em  busca  de  uma 
realidade doentia, que as motivam a viver mais um 
dia,  mesmo  que  esse  dia  seja  um  grande  equívoco. 
Em  meio  aquele  dantesco  cenário,  em  meio  aos 
cadáveres  putrefatos,  uma  ninfa  dourada  está  a 
dançar como se seus delicados pés pisassem em um 
felpudo  tapete  de  lã  e  não  a  pedaços  de  carne 
deformados  do  que  um  dia  foram  partes  de  seres 
vivos, de humanos.
  Sua  beleza  deslumbrante  era  a  visão 
encarnada  dos  nossos  sonhos  mais  secretos  e 
primários, ela ali a dançar e rodopiar, indiferente ao 
ambiente  tenebre,  era  a  morte  que  majestosa  fazia 
a colheita da essência humana, a cada passo, a cada 
rodopio uma luz se apagava.
Os  abutres  repicavam  sua  refeição 
malcheirosa,  alheios  a  dança  da  morte  e  seu 
significado,  o  banquete  farto  que  o  apocalipse  se 
dera  era  uma  dádiva  que  não  se  podia  desprezar,  e 
os  vermes  trabalhavam  tão  bem  como  as  grandes 
aves.  Se  eles  soubessem  que  aqueles  corpos  não 
seriam  retirados,  não  teriam  pressa.  Se  dera  o 
conflito  final,  a  era  humana  sumira,  a  Terra  em 
frangalhos,  agoniza  o  preço  pago.  Toda  aquela 
aviltes  condenou  a  humanidade  a  uma  catástrofe 
climática e ambiental sem precedentes.
Não  haverá  outro  começo,  outro  gênesis. 
Aquelas  militares  foram  enganadas,  retiram  sua 
racionalidade,  na  verdade  viraram  bucha  de 
canhão,  explodiram  com  granadas  seus  corpos,  sua 
mente  já  oca  pela  bomba  atômica  do  totalitarismo 
capitalista,  o  sonho  de  ter  uma  pessoa  amada  nos 
braços, uma casa e uma vida confortável.
Onde  está  qualquer  divindade?  Por  que  com 
todo  o  poder,  negligenciou  as  pessoas  de  morrerem 
felizes? Simplesmente, por sua fútil existência, pois 
de que serve uma divindade tão boba, que faz o que 
gosta,  de  ver  sofrer  pessoas  que  pensam.  Bem  se 
considere  satisfeita  onipotente  ser,  a  humanidade 
que tanto a atormentava morreu, não resta nada, só 
destroços  da  grande  e  prepotente  raça  humana. 
Qual a lição que o magnânima, a incomensurável, a 
inatingível divindade, sabedora de todos seres vivos, 
chegou? Talvez, nunca dê ciência aos seres vivos.
Os mortos mereceriam sua atenção ! Além da 
ninfa conceder o sono eterno, conforte­as divindade, 
pois  muitas  ali,  naquele  campo  de  batalha,  caíram 
com esta esperança, de ter com você, poderosa nada, 
alguma  explicação.  Não  vai  fazer  nada,  não  é!  Seu 
poder é tão grande que não significa nada, nada de 
milagres, você é uma farsa e eu sei muito bem, nada 
de  almas,  tudo  uma  grande  besteira.  Acha­me  uma 
herege,  mas  sabe  muito  bem  que  não  sou,  fui 
seguidora  fanática,  fiel  e  sincera  e  que  recebi  em 
troca,  migalhas,  e  esse  insuportável  conhecimento 
das  verdades  e  que  não  posso  mudar  e  nem  me 
afastar, pior de tudo sou culpada! 
Não  vou  assumir  toda  essa  culpa  sozinha, 
bondosa divindade, você é tão culpada corno eu sou, 
mais  uma  diferença,  eu  estou  morta  e  você  a 
eternidade  de  sua  culpa,  seja  feliz  com  todo  seu 
remorso,  pois  a  ninfa  sugou  todas  as  almas  do 
mundo humano e não mais brincarás conosco. 
Talvez  em  outra  galáxia,  com  outros  seres, 
mais  tolos  do  que  nós,  humanos,  você  brinque 
melhor  e  fique  feliz,  e  seja  sublime  e  radiante. 
Esqueça  de  nós,  humanos,  desde  o  começo  fomos 
errados, mas consertamos o erro com nossa morte e 
assim termina. 
Durma  bem  divindade,  sonhe  com  os  seres 
angelicais que você criou!
Delírios

É  madrugada, estou a escrever. Observo a 
tela  luminosa  e  vejo  as  palavras  se  formarem  em 
sua  face,  silêncio  se  faz  presente.  Ao  longe  ouço 
sirenes.
Que madrugada estranha! 
Sonolento,  percebo  minha  volta  oscilar  e 
embaçar,  uma  onda  furnigera  toma  todo  o  quarto. 
Minha  cabeça  aos  poucos  tomba  no  teclado  do 
computador.
Sinto  aos  poucos  um  odor  adocicado  e 
ferroso, sinto uma náusea e acordo assustado, onde 
está meu quarto ?
O  olhos  cheios  de  fumaça,  lacrimejam  e 
custam a se acostumar com o ambiente, onde estou? 
Percebo  lentamente  que  estou  entre  escombros  de 
um prédio, ao chão cadáveres mutilados, uma chuva 
intermitente  lava  aqueles  corpos,  pisco  pensando 
ser um sonho mais, não é! 
É real ! É assustador!
Caiu  uma  gota  rubra  no  chão,  uma  lágrima 
escarlate,  tinha  em  sua  textura  cristalizada  a  dor 
cega  e  muda  que  arremata  as  pessoas,  e  eu,  mero 
mortal vi seres celestiais surgirem em volta de mim 
com  sua  espadas  flamejantes  ferindo  as  pessoas 
restantes  em  meio  aquela  destruição.  Tanta  dor 
surgia  e  ia,  aquelas  entidades  celestiais  ceifavam 
vidas como se em um campo de trigo estivessem.
Uma  avidez  por  terminar  com  as  dores  das 
pessoas,  terminar  com  a  sua  própria  dor,  mas  não 
acabavam,  quanto  mais  exterminavam  pessoas, 
mais sede de morte tinham e com mais força e ódio 
matavam. 
O  sangue  espirrava  por  todos  os  lados, 
observava a tudo mas as entidades não me levavam, 
passavam por mim, indiferentes com a minha dor…
Por  mais  que  gritasse,  o  som  só  eclodia 
dentro de mim! 
Que visão alucinada, via muitas das pessoas 
a  dançarem  ao  lado  dessas  entidades  celestiais  e  a 
elas  se  entregarem  com  a  maior  naturalidade. 
Matavam e se relacionavam com tais pessoas.
Mais uma gota caiu, uma lágrima cristalina, 
e  eu  vi,  a  beleza  do  mundo,  pois  já  estava 
novamente  só,  o  infinito  verde  das  florestas  me 
faziam  serenar.  Ao  longe  o  barulho  de  cachoeira,  e 
apenas  isso.  O  mundo  havia  transpirado  toda  dor 
em meu corpo, e também uma de suas realidades.
Estava só, sem amor, esperando a benção de 
morrer ao ver minha tristeza novamente se resumir 
em um grito trancafiado dentro de minha mente.
 Em resumo

Não me dizem bom dia. Pedem ou ordenam 
que suas vontades sejam saciadas. 
Não me agradecem tão pouco.
Por  mais  um  dia  espero,  não  me  vem  o 
amanhã que anseio, um sonho distante, meu?
Cada dia que rompe, rompe minha ilusão. 
Não me dizem afetos.
Triste  e  só,  caminho  a  servir,  a  não  viver 
para sobreviver, sonhos se vão.
Vejo  cada  minuto  ruir  e  ir  sem  a 
possibilidade  de  voltar,  perco  a  cada  instante  a 
possibilidade  de  encontrar  um  sentido,  Não  me 
dizem porquê…
Construo palavras para que meu dia não seja 
vazio como meu coração. Não me dizem sim.
No  meio  perdido,  entre  o  trabalho  ingrato  e 
repetitivo  me  encubro  sem  a  necessidade  de 
entender, precisa? Não sei, não me dizem, descubro 
a  esmo  que  trancafiado  não  vejo  o  céu  e  todo  um 
montante  de  coisas  que  poderia  viver  ou  fazer  e 
talvez, que sabe, ser até mais completo.
O  trabalho  é  uma  jaula  do  espírito,  retira 
deste  toda  a  sua  vitalidade  e  transforma  a  pessoa 
aprisionada,  quem  vai  notar?  Em  uma  coisa 
desfigurada  igual  a  milhares  de  outras  coisas. 
Quando isso vai parar?
Caminho  sem  ao  menos  saber  o  sentido. 
Quero  parar,  não  devo!  Tenho  medo  se  tal  parar 
prejudique quem não me diz. Todo ponto em que me 
lembro  estou  aqui,  neste  momento  angustiado,  sem 
um apoio, nem que fosse uma escora pontuda que ao 
se  apoiar  penetrasse  na  carne,  rompesse  órgãos  … 
um terrível apoio seria, mas ao menos um apoio.
Não  devo,  devo?  Explanam  suas  razões 
importantes e aceito. Não me dizem para que.
(...) Qual o tempo que passou? Não sei.
Agarrado  a  minha  pequena  e  medíocre  vida 
espero que passe esta tormenta. Não passa. A chuva 
desaba e destrói.
Destrói  minhas  idéias  fracas  e  conceitos 
vagos. 
A  angústia,  depois  de  certo  tempo  corrompe 
as bases tradicionais, geram nestes a dúvida de ter, 
ter algo que ama e toda sua conseqüências. Não me 
dizem porquê. 
O  que  esperam  de  mim  ?  Tenho  um  dever 
para cumprir ? Qual será?
Traduzo  em  palavras  todas  as  mágoas,  tão 
variadas soam estas que me perco em descrevê­las. 
Sofro a cada minuto repetindo a aspereza de 
não ter. 
Não tenho, em resumo!!!
A prova

O fato de estar aqui escrevendo, me impede 
de  estar  ao  lado  de  alguém.  Poderia  até  estar 
escrevendo ao lado dessa pessoa, mas não estou. 
Que  me  falta  uma  pessoa  é  um  fato,  fato  e 
fatos  estão  por  aí.  Será  este  rabisco  uma  loucura 
obscena que eu tento extravasar esta solidão amorfa 
novamente? 
Estou  só,  tomando  um  chimarrão,  ouvindo 
risos e uma música aleatória. 
Não queria!
Queria  estar  com  alguém,  falando  e  fazendo 
atos de amor. 
Já  não  mando  flores,  flores  são  piegas?  Não 
sei.
Estou  triste,  procuro  sarar  a  tristeza  com 
palavras que esboço.
Todo  dia  vejo  as  pessoas  e  me  olho  no 
espelho, quem…? 
Por mais que digam que posso vir até a ter, já 
perdi a esperança. 
Quero finalizar isso! 
Mas até isso se nega a se consumir. 
Queria ligar para G., mas não! Ela não liga. 
Queria  escrever  à  A.,  mas  não  escrevo,  ela 
não escreve. 
É, no amor precisa de reciprocidade.
Mas  quem  sou  eu  para  falar  de  amor,  de 
algum idílio candido que não consigo.
Mais fácil é falar de desamor. 
Tenho  uma  lista  invejável  de  foras.  O  papel 
vai registrá­los.
Primeiro  se  me  lembro  bem,  eu  estava 
genuflexo em frente a garota. 
Genuflexo em frente a garota, friso.
Que  cena  deprimente,  talvez  não  fosse  a 
primeira,  mas  ela  não  quis  nem  saber.  As  vezes 
penso que a maioria das pessoas não acreditam que 
uma outra pessoa possa ter sentimento, de péssima 
aparência não.
Atraente,  nunca  fui,  eu  sei  e  este  saber  me 
causa  entraves.  Saber  de  antemão  que  será 
rejeitada, dói. 
Como  sei  ?  Estou  só,  escrevendo  estas  linhas 
toscas que me saem aos montes. 
Monte  de  merda  que  bem  poderia  ser  uma 
carta  de  amor.  Já  nem  sei  se  consigo  escrever  isso, 
carta  de  amor,  mandar  flores,  a  ser  da  pessoa 
amada, "amiga" (friend zone).
Uma  pessoa  não  me  entende.  Um  monte 
também.
Já extravasei em choro, verso e prosa. 
Já disse a mesma coisa de diversos modos. 
Tautologia  pura  e  cínica  para  com  todas. 
Olho  as  pessoas,  as  observo,  acreditam  no  que 
geram para acreditar, acreditam que geram. 
Me  geraram,  não?  Me  engulam  então!  Mas 
estou só ...
Sei  que  existem  milhões  que  passam  por 
isso. 
Mas  ficar  tantos  anos  na  mesma,  sem 
ninguém, se transformando em palhaça que alguém 
ri  e  não  reflete,  já  na  face  refletida  de  otária  que 
sou. 
Que obsessão é esta? 
Esta  de  querer  amar  uma  única  pessoa, 
achá­la  tão  linda  com  seus  defeitos,  que  obsessão  é 
esta que crio e que não existe na realidade? 
Em qual tragédia grega resume minha vida?
A  R.  me  deu  um  fora,  e  mais  uma  dúzia  de 
pessoas também. Isso dói. Que dor!!!
­Quem  me  quer?  (grito  no  leilão,  eco  no 
vazio)
O silêncio das décadas arcam minhas costas, 
vejo  em  cada  dia,  um  ano  sem  ninguém,  mais  um 
ano sem você, envelheço na cidade! (Já ouvi isso em 
algum lugar!).
Pergunto  se  eu  mesmo  cavei  esta  cova  que 
agora me deito. 
Eco no vazio.
 É isso deus? (eco no vazio)
Só você me houve, minha mente, somos boas 
parceiras, não é? 
E,  somos.  Me  entende,  mas  não  te  entendo, 
conhece  meus  segredos  mais  secretos,  mas  não 
conheço os seus.
Parece  loucura,  e  é.  Se  alguém  se  atrever  a 
ler isso, não aconselho, vai entender? Creio que não, 
quem sabe! 
Esta angústia de tinta e papel é testemunha.
Não me iludo, não faço um monte de coisas. 
Quero amar, só e simplesmente. Grito.
Que grito é esse, que aperto forte é esse que 
sonho todos dias?
Amar ? ?
Esboço  uma  fé  em  deus,  mas  acaba  no 
esboço.  Não  quero  nenhum  favor,  apenas  alguém. 
Amanhã virá certo, acordado e que vejo?
O  céu  azul,  sol  vida,  mas  nada  de  uma 
pessoa  amada  que  me  beije  com  paixão  e  me  aceite 
do jeito que sou, que leia isso e se comova, deite do 
meu  lado  e  pergunte  sobre  a  sinceridade  e  o 
"momento" de tal sofrer. Bobagem. Escrevo com dor 
de cabeça, ressaca de solidão. 
Extravaso  no  papel  e  ele  aceita.  Que  delícia, 
penso.  Uma  pessoa,  alguém  ao  meu  lado  me 
beijando e conversando coisas diversas. 
Que  bom,  se  a  bondade  pode  ser  exprimida 
de  forma  livre  de  sua  conotação  vulgar  do  senso 
comum.
A  sublime  presença,  um  só  dia  inteiro  pelo 
menos,  dessa  pessoa,  que  briga  e  me  abraça  ao 
mesmo  tempo  é  tão  prazerosa.  Invidia  le  coppie! 
Mas farei parte?
Não!  Fico  na  inveja.  Prova  disso,  estou 
escrevendo. 
Há de perguntar, tem alguém com você? 
Se houvesse o sentido deste texto seria outro, 
bem diferente. Posso fazer isso? Não sei. Sempre só 
estou, só permaneço!
Minha  alma  gêmea  vai  ler  isso?  Não  sei  e 
não creio,
A  certeza  do  existir  agora  é  transplantada 
para  este  papel,  uma  máquina  que  congela  um 
momento. Aceita é claro, sem ressalvas. A certeza é 
essa: Estou só, na solidão de meu pensamento.
Parte de mim aceita, outra não.
Parte de mim ri, outra não.
Amargor  é  que  fica  de  resumo,  meu  medo  é 
que  este  amargo  fique  mais  tempo  e  quando 
acontecer  (esperança  ?!?)  eu  não  consiga  preparar 
coisas para dizer e escrever Lembro da C., V., P., do 
futuro que me parece o passado , sempre só. 
Esses nomes, são isso, nomes de pessoas que 
desencadeiam  lembranças  estranhas  ,  boas  e  más, 
pois estou só.
Não  aguento  mais!  Uma  pessoa  pelo  meu 
reino, uma Julieta para meu ego Romeu.
Um sentir com mais teor.
Rima com amor! Mas estou só.
A  rima  é  com  pavor,  horror  desse  monstro 
que vejo no espelho! Eu?!
Queria  estar  alienado,  mas  estou  chateado, 
com  insônia  na  noite  dia  de  outono,  esperando  não 
sei  o  quê.  Eu  sei  o  quê!  Uma  preciosa  presença  de 
alguém e não um sonho imbecil.
Não  preciso  de  psicologia  para  isso.  O 
problema  é  esta  equação  construída  nas  linha  que 
chegam até aqui.
Toda  vez  que  chego  a  me  aproximar  de  uma 
pessoa, acontece algo, ou ela já tem alguém, ou quer 
ter alguém que não seja eu (horrendo ser!) ou sei lá, 
não  me  quer  em  resumo,  vem  com  aquele  papo 
furado  de  amizade,  vai  se  danar  com  sua  amizade, 
já  tenho  a  solidão  que  é  a  mais  fiel  companheira. 
Uma companheira que compartilha dores e amores, 
sonhos e realidades. E minha zona de amizade está 
bem populosa.
A  prova  é  este  texto  mal  acabado,  mal 
acompanhado,  mal  formatado.  Um  improviso 
esquecido, abandonado por décadas em um canto de 
armário,  fermentando  a  tristeza  ácida  e  amarga, 
que em algum momento se tornará um ótimo blend 
envelhecido  de  desespero  aprovado  pela  amiga 
solidão. Cheers!
9
Ao  final,  o  que  me  sobrou,  nada  …? 
Absolutamente  nada,  nem  lágrimas  tenho  mais, 
que  crueldade  fiz  comigo,  me  reprimi  de  tal  forma 
que  não  ficou  nem  o  que  nos  diferencia  de  outros 
seres  vivos,  por  que  teimo  em  ser  tão  perverso 
comigo, heim? Não adianta agora mudar, o que está 
feito, está feito.
Não  podemos  mudar  o  que  nos 
transformamos,  monstros  que  matam  crianças  de 
nossos  sentimentos,  isto  é  ser  adulto,  assassinar 
nossos  sonhos  e  nos  alienar  de  tal  forma  que  o 
melhor  é  estar  tão  impregnado  que  não  dê  margem 
para  o  questionamento  de  nossos  atos,  como 
podemos  olhar  o  espelho  e  ver  nosso  sentimento 
trucidado  por  um  conjunto  doloroso  de  meias 
verdades, e não poder nem mesmo chorar? 

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