Você está na página 1de 188

Sistemas Agroflorestais e

Desenvolvimento com
Proteção Ambiental
perspectivas, análises e tendências
Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
Embrapa Florestas
Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

Sistemas Agroflorestais e
Desenvolvimento com
Proteção Ambiental
perspectivas, análises e tendências

Editores
Luciano Javier Montoya Vilcahuamán
Jorge Ribaski
Antonio Maciel Botelho Machado

Colombo, PR
2006
Exemplares desta publicação podem ser adquiridos na:
Embrapa Florestas
Estrada da Ribeira, km 111 - CP 319
83411-000 - Colombo, PR - Brasil
Fone/ Fax: (41) 3675-5600
Home page: www.cnpf.embrapa.br
E-mail: sac@cnpf.embrapa .br
Para reclamações e sugestões fale com o ouvidor:
www.embrapa .br/ouvidoria

Comitê de Publicações da Unidade


Presidente: Luiz Roberto Graça
Secretária-Executiva: Elisabete Marques Oaida
Membros: Álvaro Figueredo dos Santos, Edilson Batista de Oliveira,
Honorino Roque Rodigheri, lvar Wendling, Maria Augusta Doetzer Rosot,
Patrícia Póvoa de Mattos, Sandra Bos Mikich, Sérgio Ahrens

Supervisor editorial: Luiz Roberto Graça


Revisor de texto: Mauro Marcelo Berté
Normalização bibliográfica: Elizabeth Câmara Trevisan e Lidia Woronkoff
Editoração eletrônica: Rodrigo Comparin
Ilustração da capa: Joel Ferreira Penteado Júnior
1ª edição - 1ª impressão (2006): 500 exemplares

Todos os direitos reservados.


A reprodução não-autorizada desta publicação, no todo ou em parte,
constitui violação dos direitos autorais (Lei no 9.610).

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação - CIP


Embrapa Florestas

Sistemas agroflorestais e desenvolvimento com proteção


ambiental : perspectivas, análises e tendências /
Editores: Luciano Javier Montoya Vilcahuamán, Jorge
Ribaski , Antonio Maciel Botelho Machado. - Colombo
: Embrapa Florestas, 2006.
186 p.
ISBN 85.89281.10-8
1. Agrofloresta - Sustentabilidade. 2. Certificação
agroflorestal. 1. Montoya Vilcahuamán , Luciano Javier. li.
Ribaski, Jorge. Ili. Machado, Anton io Maciel Botelho.
COO 634.99 (21. ed.)
© Embrapa 2006
Sumário
Prefácio ..................................................................................................................................... 7

O repensar da lógica econômica na produção amazônica: a


importância dos Sistemas Agroflorestais em escala de
paisagem rural e na construção social da verificação
participativa de serviços ambientais do PROAMBIENTE
Luciano Mansor de Mattos .............................................................................................. 9

Aplicabilidade efetiva de dispositivos legais que incidem


sobre o uso da terra rural no quadro de um desenvolvimento
agroflorestal ecológico e socialmente sustentável
Jean C. L. Oubois ................................................................................................................. 37

Organização da produção e comercialização de produtos


agroflorestais: o caso da colônia agrícola nipo-brasileira de
Tomé-Açu, Pará
Alfredo Kingo Oyama Homma........................................................................................ 51

Sistemas Agroflorestais, monitoramento e contexto de


sustentabilidade
Sau/o Barbosa Lopes ......................................................................................................... 79

Sistemas Agroflorestais: contribuições para a


sustentabilidade
Irene Maria Cardoso, Helton Nonato de Souza, Verónica Rocha
Bonfim, Renata Lúcia Souto, Anôr Fiorini de Carvalho, Gustavo
Bediaga de Oliveira, David Gjorup Feita/ ................................................................ 97

Indicadores biofísicos de Sistemas Agroflorestais


Paulo Henrique Caramori, A/ex Carneiro Leal, Heverly Morais,
Renzo Gorreta Hugo, Carlos Armênio Kathounian, Leocádio
Grodzki e Vanderley Porfírio da Silva ....................................................................... 115

Indicadores sociais, econômicos e ambientais de SAFs


Geraldo Stachetti Rodrigues ........................................................................................... 129
Conocimiento local en el manejo de recursos naturales de la
etnia Shipibo - Conibo, Rio Ucayali, Pucallpa, Peru
Julio Alegre; Luís Arévalo; N. Luque , L. Joshi ............................................... ..... 135

Certificação da produção agroflorestal: conceitos,


oportunidades e tendências
Luís Fernando Guedes Pinto e Eduardo Trevisan Gonçalves .................. 147

A certificação agroflorestal no Instituto Biodinâmico-I8D


Pedro Jovchelevich 155

Qualidade da produção e agregação de valor em Sistemas


Agroflorestais
Amilton João Baggio ........................................................................................................... 159

Políticas públicas e financiamento para o desenvolvimento


agroflorestal no Brasil
Peter H. MaY........................................................................................................................... 167
Prefácio
A preocupação com o meio ambiente, do mesmo modo com o
desenvolvimento de sistemas produtivos sustentáveis, que levem em
conta a produtividade biológica, aliada a aspectos socioeconômicos e
ambientais, torna-se cada vez mais necessária no cenário mundial. Com
isso, percebe-se uma maior conscientização da importância do
componente florestal, proporcionando o surgimento de novas alternativas
para sua introdução em diferentes sistemas produtivos, como os Sistemas
Agroflorestais (SAFs ).
O debate em torno dos SAFs vem sendo realizado há alguns anos.
Após o sucesso das quatro edições do Congresso realizadas nas Regiões
Norte e Nordeste do País, e com o intuito de ampliar mais o debate e
apresentar informações diversificadas e inovadoras sobre o tema, o V
Congresso Brasileiro de Sistemas Agroflorestais - V CBSAF foi realizado
na Rgião Sul, em Curitiba, Paraná, no período de 25 a 28 de outubro de
2004, onde o tema foi "SAFs: desenvolvimento com proteção ambiental",
edição promovida pela Embrapa Florestas e a Sociedade Brasileira de
Sistemas Agroflorestais.
Nesta publicação, pesquisadores, professores, extensionistas e
técnicos de instituições públicas e privadas abordam temas sobre as
perspectivas e tendências dos SAFs. Aspectos importantes para
direcionar novas demandas e futuros trabalhos de pesquisa, extensão e
ensino, demonstrado serem os SAFs opções de sistemas produtivos
capazes de aumentar os níveis de produção agrícola, animal e florestal
obedecendo aos princípios da sustentabilidade.
Os promotores do V CBSAF, que estruturaram o evento em
conferências, painéis, exibição de pôsteres e de aprese_ntação oral de
trabalhos voluntários, estes dois últimos disponibilizados em Anais,
passam, nesta obra, a oferecer os trabalhos dos painelistas convidados.
Para tal, consultaram-se e convidaram-se os painelistas para elaborar os
vários assuntos abordados, constituindo, assim, os capítulos que
compõem esta obra. Os resultados apresentados são próprios da
pesquisa e/ou experiência dos autores. Os editores procederam à
formatação e à correção ortográfica sem, no entanto, alterar o conteúdo
dos trabalhos. Deste modo, os conceitos, os dados apresentados, as
idéias, as opiniões e conclusões enunciadas em cada capítulo são de
inteira responsabilidade dos autores, bem como a descrição das
referências bibliográficas e citações.
Na oportunidade, agradecemos aos patrocinadores do V CBSAF:
Ministério da Agricultura , Pecuária e Abastecimento; Ministério do Meio
Ambiente; Ministério do Desenvolvimento Agrário/Secretaria Nacional de
Agricultura Familiar; Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico; Votorantin Celulose e Papel; The Nature Conservancy,
Pontifícia Universidade Católica do Paraná; Secretaria do Planejamento
8

do Estado do Paraná/Programa Paraná Biodiversidade; Federação da


Agricultura do Paraná/Serviço Nacional de Aprendizagem Rural; Instituto
Ambiental do Paraná; ltaipu Binacional; Agência de Desenvolvimento da
Mesorregião do Vale do Ribeira; Associação Gaúcha de Empresas
Florestais; Berneck Aglomerados S/A e Conselho Federal de Engenharia,
Arquitetura e Agronomia.

Os Editores
Colombo, PR, Setembro de 2006
O repensar da lógica econômica na produção
amazônica: a importância dos Sistemas
Agroflorestais em escala de paisagem rural e na
construção social da verificação participativa de
serviços ambientais do PROAMBIENTE
Luciano Mansor de Mattos
Engº Agrônomo MSc. Pesquisador da Embrapa.
E-mail: luciano.mattos@embrapa.br

1. O repensar da lógica econômica

O recente histórico de ocupação humana da fronteira amazônica


é indissociável do modelo de desenvolvimento do capital, em
detrimento do social, que vem predominando há muitos anos na
América Latina. Pouca ou nenhuma importância estratégica vem
sendo dedicada ao trabalho (com valor cultural agregado)
despendido pelos povos amazônicos ou ao meio ambiente como
fonte de recursos naturais, sendo apenas considerada a
acumulação de capital como objetivo central, desprezando-se as
melhores formas de distribuição desse capital e do acesso
igualitário e permanente aos recursos naturais. Por conseguinte, é
essencial que qualquer proposta de desenvolvimento para a
Amazônia venha reconsiderar o modelo vigente. A segurança
social, as tradições culturais locais e a qualidade ambiental devem
caminhar juntas com a viabilidade econom1ca, fato que
inevitavelmente nos faz refletir a respeito das formas de
desenvolvimento apresentadas pelas diferentes correntes de
pensamento da economia.

Traçando, de forma bastante sucinta, uma "linha cronológica" do


pensamento econômico, é possível constatar um "ciclo" que tem
início no pensamento clássico e que retorna à origem com o
surgimento de uma das correntes da economia ecológica, o
ecologísmo popular, evidentemente, guardadas suas diferenças,
épocas e contextos históricos. Os economistas clássicos
consideravam a renda de qualquer atividade produtiva como sendo
oriunda de três tipos de ativos: terra (recursos naturais), trabalho
(recursos humanos) e capital (recursos monetários) (SEBILLOTTE,
1982; GROPPO, 1991). Mas os economistas neoclássicos, tratando
(l

a economia dentro de uma racionalidade industrial, minoraram o


ativo terra de seus modelos e se concentraram somente em
trabalho e capital (como se a terra, fonte de recursos naturais, não
tivesse importância para os processos produtivos). Quando essas
teorias foram aplicadas aos países em desenvolvimento, depois da
Segunda Guerra Mundial e, principalmente, na última década com
a corrente neoliberal, o enfoque ao ativo trabalho também foi
considerado secundário, já que para essa corrente a mão-de-obra
nos países periféricos é tratada como excedente, sendo o
desenvolvimento visto quase inteiramente como poupança e
investimentos, isto é, capital. Todavia, o ciclo toma o "caminho de
volta" nos últimos anos, rebatizando os ativos terra, trabalho e
capital como capital natural, capital social e capital monetário,
respectivamente.

Primeiro veio a inserção do capital social (ou reinserção do


trabalho) nas abordagens de desenvolvimento econômico. A
recente incorporação do termo capital social ao vocabulário das
instituições internacionais de desenvolvimento é um sinal dos
tempos, em contraposição à ênfase dominante nos anos 80
atrelada ao ideário do Consenso de Washington. O ativo capital
social está dentro de uma nova noção de economia solidária, que
elimina qualquer tipo de garantia econômica ou patrimonial de um
indivíduo quando este busca acesso ao crédito ou outra forma de
fomento à produção. A garantia passa a ser dada de outra forma,
assim como a instituição cessante tem outro perfil. A dissolução
quase generalizada dos grandes sistemas financeiros estatais e o
desinteresse dos bancos privados em lidar com populações
vivendo próximas à linha da pobreza suscitaram o interesse por
novas formas institucionais de organização para acesso ao crédito
nos meios rural e urbano. Os mais estudados são os asiáticos
Grameen Bank de Bangladesh, Bank for Agriculture and
Agricultura/ Cooperatives da Tailândia e Vil/age Banks da
Indonésia, além dos exemplos sulamericanos do Bancosol da
Bolívia, Sistema Cresa/ do Estado do Paraná, Brasil, e ainda ,
algumas iniciativas de prefeituras municipais do Brasil com o Banco
do Povo . Mas em todo o mundo já se acumulam importantes
expenencias de construção de novas modalidades de
financiamento às atividades econômicas. A mais conhecida
organização de crédito popular hoje é o Grameen Bank. Ele faz
pequenos empréstimos a indivíduos organizados em grupos, e os
beneficiários não oferecem garantias nem contrapartidas: o
reembolso é garantido pelo aval do grupo e pela possibilidade de
obter empréstimos futuros; os empréstimos (que são em dinheiro e
não visam a uma atividade específica) são reembolsados
regularmente em pequenas parcelas no prazo de um ano. A
organização dos grupos é lenta e o montante dos empréstimos
cresce também lentamente, com procedimentos de empréstimos
muito simples, havendo uma grande proximidade social entre os
funcionários que concedem os empréstimos e os clientes. Outra
característica importante do Grameen Bank é a boa remuneração
recebida por seu corpo técnico, condição decisiva para o sucesso
destas iniciativas. Portanto, o ativo capital social é o que vem
sendo tratado nas ciências sociais como um conjunto de
características, entre elas, confiança, normas e sistemas, que
contribuem para aumentar a eficiência da sociedade, facilitando as
ações coordenadas. O capital social é, antes de tudo, a resposta ao
ceticismo neoclássico em relação à ação coletiva (REPETTO et ai.,
1989; MERICO, 1996; BITTENCOURT & ABRAMOVAY, 2000;
ABRAMOVAY, 2001).

BERKES & FOLKE (1994) complementam esse raciocínio


quando expõem que as características da organização social, como
confiança, normas e redes de trabalho e/ou comunicação, facilitam
a coordenação de ações produtivas . O termo "capital social" é
usado por muitos cientistas sociais para se referirem à riqueza da
organização social, sendo que OSTROM (1990) também usa o
termo capital institucional para se referir às estruturas e habilidades
das organizações, isto é, para designar o "capital" de instituições
que a sociedade tem a sua disposição.

O retorno do ativo terra, ou capital natural, vem do reconhe-


cimento de algumas linhas de pensamento em que a evolução da
economia humana não tem como fator limitante a tecnologia, mas o
fornecimento constante dos recursos naturais (e sua conseqüente
capacidade de renovação). Como pondera MERICO (1996), nossa
relação com o ambiente natural encontrou uma barreira intrans-
ponível: os limites da biosfera. A mudança paradigmática em curso
aparece como um elemento reorganizador dos processos
econômicos, cujo eixo principal é a busca da sustentabilidade. A
crença de que o avanço tecnológico e o acúmulo de capital
monetário são perfeitos substitutos para o capital natural é um dos
1.t..

pilares do pensamento economIco conservador. Esse típico


argumento econômico neoclássico cai por terra quando é inserida a
questão de escala da economia em relação à capacidade de
suporte dos ecossistemas, quando se percebe que o próprio
crescimento econômico, além de certos limites, tem gerado custos
muito elevados na reparação das externalidades ambientais, não
havendo, em muitos casos, dinheiro ou tecnologia capazes de
substituir os serviços ambientais proporcionados pela biodiversidade,
ciclo hidrológico, regulação climática , proteção da camada de
ozônio e outros. Sendo assim, a orientação do desenvolvimento
deve considerar a inserção dos processos econômicos nos limites
da biosfera. A importância dos métodos de valoração ambiental
decorre, portanto, não só da necessidade de se dimensionarem
impactos ambientais, internalizando-os à economia, mas também
da necessidade de se evidenciarem custos e benefícios decorrentes
da expansão da atividade humana.

Mas a simples consideração do capital natural nos processos


produtivos não parece ser uma garantia ou solução definitiva de
sustentabilidade. MARTÍNEZ ALIER (1998) lembra que existem
dois tipos de abordagens para a inserção do capital natural nos
processos econômicos: a Economia Ambiental e a Economia
Ecológica . Se simplesmente forem "internalizadas as externalidades"
ambientais previstas na Economia Ambiental, ou seja, uma vez
computados os custos e serviços ambientais ocultos e imputados
aos seus responsáveis econômicos, triunfa outra vez a lógica de
mercado. Ao mesmo tempo, continua sendo permitida a
apropriação concentrada dos recursos naturais (com preço mais
alto) e sendo dado o direito de poluir e posteriormente remediar. A
simples valoração dos recursos naturais significa somente protegêlos
do esgotamento através da restrição do consumo, restrição essa
que seria conseguida através da elevação dos preços,
consequentemente, reservando somente aos mais capitalizados o
acesso aos recursos. Como se vê, pouco ou quase nada de novo
há aqu i (a não ser a inserção do verde com a mesma lógica de
"mercado"), repetindo-se as mesmas conseqüências e exclusão
social. Já o conceito de Economia Ecológica não exclui, mas
também não se convence com a simples argumentação de
internalização das external idades, tendo como pressupostos
principais a garantia de socialização do aceso aos recursos
naturais e a nula possibilidade de ausência das gerações futuras
aos mercados atuais.

BERKES & FOLKE (1994) definem capital natural pelo conjunto


de três componentes principais: (1) recursos não renováveis, como
petróleo e minerais, que são extraídos dos ecossistemas, (2)
recursos renováveis, como madeira, recursos hídricos e recursos
pesqueiros, que são produzidos e mantidos pelos processos e
funções dos ecossistemas e (3) serviços ambientais, como a
manutenção da qualidade da atmosfera e das condições climáticas,
operação dos ciclos hidrológicos, suprimento de água potável,
capacidade ambiental de assimilação de resíduos, processos de
polinização, conservação de solos, reciclagem de nutrientes,
manutenção da variabilidade genética e preservação da
biodiversidade, e de maneira geral, manutenção das formações
vegetais naturais ou enriquecidas em escala de paisagem rural.

Por conseguinte, BERKES & FOLKE (1994) e MERICO (1996)


alertam que a abordagem da economia ecológica vem no sentido
de garantir as mínimas condições de sustentabilidade para manu-
tenção do estoque de capital natural, sendo que alguns pressupos-
tos básicos devem ser seguidos no uso do capital natural, qualquer
que seja o processo produtivo:
• a escala humana de exploração precisa ser limitada à
capacidade de manutenção do capital natural (ex: substituir a lógica
linear da economia para a lógica cíclica da economia ecológica);
• progresso tecnológico necessita ser conceituado como meio de
exploração econômica compatível com o aumento da eficiência no
restabelecimento das funções ecológicas dos sistemas (ex:
revalidar cientificamente as tecnologias, inserindo o conceito de
sustentabilidade e renovabilidade dos recursos naturais);
• taxas de exploração de recursos naturais renováveis não
podem exceder sua capacidade de regeneração (ex: exploração
madeireira sob manejo florestal criterioso, com inventário validado
cientificamente);
• emissões de resíduos não podem exceder a capacidade de
assimilação do meio ambiente (ex: retornar a água limpa usada
para irrigação ao curso d'água nas mesmas condições que dele foi
retirado);
• recursos não renováveis precisam ser explorados dentro de
uma taxa equivalente a criação de alternativas renováveis (ex: uso
do álcool como combustível em substituição à gasolina);
• a queda de produtividade econômica, a queda de qualidade de
vida e a degradação do capital natural possuem vínculos muito
estreitos. Logo, a importância do capital natural e a relação entre o
capital natural e o capital humano são de fundamental interesse na
economia ecológica. Mas a exclusiva consideração desses dois
tipos de capital reduz os elementos essenciais na análise da
sustentabilidade. Uma análise mais completa de conceitos de
interdependência da economia e do meio ambiente exige atenção
de sistemas sociais, culturais, políticos e econom1cos como um
todo. De fato, a abordagem de capital natural por si só parece
insuficiente e incompleta, se não a cruzarmos com o
comportamento humano e os fatores de uso deste capital natural.
BERKES & FOLKE (1994) vêm nessa direção quando usam o
termo "capital cultural" para se referirem às relações entre
sociedades humanas e o meio e às adaptações para lidar com o
ambiente natural, incluindo fatores como instituições políticas e
sociais, ética ambiental e conhecimentos ecológicos tradicionais da
sociedade.

O termo capital natural refere-se aos fatores de relação entre as


sociedades humanas e seu meio, além das adaptações para lidar
com o ambiente natural e ativamente modificá-lo. A diversidade de
modos para lidar com o meio ambiente é uma parte significativa do
capital natural e, talvez, tão importante quanto a diversidade
biológica . Portanto, capital cultural é a interface entre o capital
natural e o capital manufaturado. Nossas visões de mundo, valores,
conhecimentos e instituições moldam a maneira com que nós
tratamos o meio ambiente. O capital cultural traz uma importante
regra sobre como usar o capital natural para criar capital
manufaturado. Deste modo, o capital manufaturado nunca é um
valor neutro, mas um produto da evolução dos valores e normas
culturais.

2. O protagonismo social para a sustentabilidade da


Amazônia

É bastante salutar diferenciar os tipos de movimentos ecológicos


aue existem no mundo. Há movimentos ecológicos que nascem da
abundância e outros da pobreza, e não se trata de contrapor países
pobres de países ricos, mas as causas que fizeram constituir esses
diferentes movimentos ecológicos. Os movimentos ecológicos do
mundo desenvolvido, na sua maioria, são centrados na busca da
melhoria da qualidade de vida, já que os problemas de eqüidade
social já estão razoavelmente atendidos. Essas ações se traduzem
de várias maneiras, como a preocupação com a conservação dos
grandes mamíferos ou protestos contra a perda de paisagem. Já
nos países em desenvolvimento há também outro tipo de
movimento ecológico, o ecologismo popular, que se configura como
um movimento social, onde a questão central é mais de
sobrevivência que de qualidade de vida. Esse tipo de movimento
havia sido pouco percebido no mundo, até que o assassinato de
Chico Mendes, em dezembro de 1988; o fez entrar pelas vias de
comunicação de todo o globo. Os seringueiros e castanheiros do
Estado do Acre, durante muitos anos, lutaram pelo reconhecimento
de suas reservas extrativistas, temendo que a pressão da pecuária
extensiva dos grandes latifúndios viesse a por em risco as áreas de
floresta primária de onde tiram sua produção. A causa de manter a
floresta em pé, para esse grupo social, se deve ao seu modo de
vida, pois a diversidade biológica do ecossistema amazônico está
intimamente associada à diversidade cultural desses povos da
floresta. Logo, podemos até chamar esse movimento de ecológico,
mas é, sobretudo, um movimento social com base produtiva
ecológica.

Um dos principais desacordos entre a economia e a ecologia


deriva do fato de que a natureza é cíclica, enquanto que nossos
sistemas produtivos são pensados linearmente. Nossas atividades
comerciais extraem recursos, transformando-os em produtos e em
resíduos, e vendem os produtos aos consumidores, que descartam
ainda mais resíduos depois do consumo. Os padrões sustentáveis
de produção e de consumo precisam ser cíclicos, imitando os
processos cíclicos da natureza. Mas efetivar essas idéias não é tão
simples quanto escrevê-las. Como ressalta MARTÍNEZ ALIER
(1998), a economia, sob o ponto de vista ecológico, não tem um
padrão de medida comum. Os economistas ficam sem teoria do
valor e as avaliações das externalidades muitas vezes são tão
arbitrárias que não podem servir de base para políticas ambientais
racionais. Por outro lado, as políticas ambientais não podem se
basear unicamente em uma racionalidade ecológica, já que a
Ecologia, como ciência, não pode explicar a distribuição territorial
da espécie humana, os valores culturais e as assimetrias e
desigualdades sociais, espaciais e temporais no uso dos serviços e
recursos da natureza. Assim, o empirismo e as técnicas de produção
rural das populações tradicionais precisam ser valorizadas, visando
à busca de novos paradigmas produtivos cíclicos e sustentáveis ao
longo do tempo.

Outro entrave conceituai é que a questão ambiental tem sido


tratada, dentro do pensamento econômico, somente no âmbito da
microeconomia. A microeconomia, como regra, se ocupa de uma
análise custo-benefício de uma atividade localizada, definindo a
escala ótima de produção. Vê-se que não há dimensão macro-
econômica na questão ambiental. A microeconomia é parte de um
sistema maior, no caso, a macroeconomia, que também é parte e
dependente de um sistema ainda maior, a biosfera (MERICO,
1996). Agregando esse fato ao perfil da produção familiar, o desafio
da economia ecológica torna-se maior. Como frisa ABRAMOVAY
(1998), o que caracteriza o campesinato é a fusão entre a unidade
de produção e a de consumo. Se na microeconomia estes dois
elementos são objetos de tópicos distintos (a teoria da produção e
a teoria do consumidor), um dos desafios básicos que a existência
do campesinato lança para a teoria é exatamente a elaboração de
um modelo unificado.

Sendo a produção camponesa uma forma em que há o


predomínio relativo do valor de uso sobre o valor de troca, ou seja,
a reprodução material se repousa mais nos intercâmbios ecológicos
com a natureza que nos intercâmbios econômicos com o mercado,
então, na unidade camponesa, deve existir todo um conjunto de
estratégias, tecnologias, percepções e conhecimentos que façam
possível a reprodução social sem desprezo da renovabilidade dos
recursos naturais e dos ecossistemas (TOLEDO, 1991 ).

No caso específico da Amazônia, para assegurar a viabilidade


econômica da produção de alimentos de maneira concomitante
com a busca de qualidade ambiental, garantia de reprodução social
das propriedades familiares e respeito às tradições culturais, há de
serem criados mecanismos e incentivos econômicos que prevejam
a cobertura dos custos ambientais de produção e a remuneração
de serviços ambientais. A questão do fogo na Amazônia é um dos
exemplos mais aplicáveis para esse caso nas últimas décadas.
Produzir sem o uso do fogo é muito mais oneroso, e em muitas
vêzes, o não uso do fogo elimina a viabilidade econômica da
produção. Por outro lado, a produção trabalhada de forma mais
equilibrada, inclusive sem o uso do fogo, gera serviços ambientais
como desmatamento evitado, absorção do carbono atmosférico e
conservação de solo, água e preservação da biodiversidade.

Considerando que a sociedade está cada vez mais crítica em


relação às condições do meio ambiente, principalmente no caso da
Amazônia, se não forem criadas políticas públicas que propiciem
direcionar a produção rural para uma forma mais equilibrada,
considerando o protagonismo e conhecimentos tradicionais dos
povos da floresta, continuarão sendo reproduzidos os mesmos
impactos. Mas o custo para conservar o meio ambiente não pode
ser arcado simplesmente pelos usuários da terra, pois os
respectivos serviços ambientais prestados com modos de produção
mais equilibrados geram benefícios que extrapolam as cercas
dessas propriedades, atingindo toda a sociedade.

Muitos programas de serviços ambientais já vigoram pelo


mundo, sendo implementados por meio de políticas públicas
nacionais, conforme demonstra BISHOP (2001 ). Este estudo nos
traz o alerta de o que se pretende para a Amazônia já está sendo
executado com relativo sucesso em todos os continentes. Na Costa
Rica, há um exemplo bem característico que se aproxima da
Amazônia, onde pequenos proprietários de terra, que correspondem à
40% de todas as unidades de produção rural, estão se
beneficiando de uma nova fonte de renda de carbono, através de
um mecanismo que remunera a manutenção da floresta em pé ou
sua regeneração. A fonte de capital para isso vem da taxação da
exploração do petróleo, embutindo nas empresas exploradoras a
obrigação de se responsabilizarem pela parte que lhes cabe sobre
emissão de carbono. Ademais, essa remuneração colabora para
diminuir a sazonalidade característica da renda agrícola. Outro bom
exemplo para a Amazônia é a Lei de Orientação Agrícola e os
chamados Le Contrat Territorial D'Explotation {CTE), adotados na
França, que consagram a multifuncionalidade da produção
agrícola. As intervenções por créditos públicos têm como
características o desenvolvimento economIco sustentável, a
preservação da longevidade das explorações, a criação de
1f
--~-----

empregos rurais, a priorização da instalação de jovens agricultores


e o fortalecimento dos agricultores como produtores de serviços
ambientais e de paisagens rurais (ver www.cta.agriculture .fr). O
contexto histórico do desenvolvimento da Amazônia e os exemplos
internacionais mostram que basta vontade política para redirecionar
a região ao caminho da sustentabilidade.

Para colocarmos nos eixos as ações produtivas na Amazônia,


urge a valorização do protagonismo dos movimentos sociais rurais,
o apoio aos novos desenhos institucionais locais e uma nova lógica
econômica calcada em valores ecológicos. Segundo NORTH
(1994 ), as instituições formam a estrutura animadora da sociedade,
e as instituições políticas e econômicas, conseqüentemente,
formam a base determinante para a performance econômica. O
tempo, como a relação entre mudanças sociais e econômicas, é a
dimensão em que os processos de aprendizado dos seres
humanos moldam os meios de evolução institucional. Logo, faz-se
necessário compreender a natureza das instituições e a maneira
que elas afetam a sua performance econômica, para então
caracterizar a natureza das mudanças institucionais.

No entanto, a mudança qualitativa de uso da terra na Amazônia


encontra entraves, pois muitos benefícios ambientais não podem
ser atingidos sem o proporcional reconhecimento dos custos
financeiros inerentes da transição agroflorestal, seja por uma
estratégia diferenciada de aplicação do crédito rural ou por uma
ampla política pública de compensação e/ou remuneração de
serviços ambientais. Esse ônus financeiro pode ser classificado
como "custo de transação", que NORTH (1994) define como os
custos específicos que estão sendo trocados e os esforços para o
conseqüente acordo entre as partes envolvidas (ex: produtores
rurais como prestadores de serviços ambientais, governo federal
como regulador e sociedade como receptora de serviços
ambientais). Leis formais, normas informais e esforços coletivos
moldam a performance econômica. No entanto, enquanto as leis
podem ser mudadas do dia para a noite, as normas informais,
geralmente, mudam gradualmente, havendo a necessidade de se
considerar essas relações sociais de confiança pré-existentes no
manejo dos bens comuns (isto é, os recursos naturais).
Comportamentos e instituições são afetados por relações
sociais. A eliminação das relações sociais na análise econômica
remove os problemas da ordem intelectual plural, restringindo-os a
mínima esfera econômica. GRANOVETTER (1985) tece críticas a
esse comportamento dos economistas neoclássicos que têm aceito
que "processos de mercado" não são objetos desejáveis de análise
de estudos sociológicos, pois dentro de suas lógicas (não tão
lógicas), as relações sociais trazem uma abordagem marginal, e
não central, das sociedades modernas.

A crítica de GRANOVETTER (1985) demonstra-se pertinente


quando nos remetemos a analisar o processo de criação da política
pública do PROAMBIENTE (Programa de Desenvolvimento
Socioambiental da Produção Familiar Rural). Nascido no Grito da
Amazônia 2000 (evento anual em que os movimentos sociais rurais
amazônicos apresentam à sociedade e ao governo federal suas
principais pautas de reinvidicações), o PROAMBIENTE é uma
proposta de política pública que se originou da discussão dos
movimentos sociais rurais da Amazônia sobre a necessidade de se
superar a dicotomia entre produção rural e conservação ambiental,
tendo como proponentes as Federações dos Trabalhadores na
Agricultura (FETAGs), Movimento Nacional dos Pescadores
(MONAPE), Coordenação das Organizações Indígenas da
Amazônia Brasileira (COIAB), Conselho Nacional dos Seringueiros
(CNS) e Grupo de Trabalho Amazônico (GTA). Enquanto projeto da
sociedade civil, o PROAMBIENTE existiu durante quase três anos
(2000-2002), se configurando no Governo Lula como política
pública sob responsabilidade da Secretaria de Políticas para o
Desenvolvimento Sustentável do Ministério do Meio Ambiente, a
partir do novo Plano PluriAnual (2004-2007), passando por um
período de transição entre projeto da sociedade civil (2000-
2002) e política pública (2004-2007) no ano de 2003 (alocado,
provisoriamente, no Subprograma de Projetos Demonstrativos -
PDA e no Fundo Nacional de Meio Ambiente - FNMA).

O PROAMBIENTE tem como desafio unir, num mesmo programa,


(1) gestão compartilhada entre o governo federal e a sociedade civil
organizada por meio do Conselho Gestor Nacional (atendendo à
bandeira histórica dos movimentos sociais rurais de controle social
da política pública), (2) gestão participativa local por meio dos
Conselhos Gestores dos Pólos (com participação das organizações
20
--- - - - - - - - - - - - - - - -- -- - - - - - - - ·- ------

organizações de produtores do Pólo, organizações não-


governamentais parceiras, prefeituras municipais e órgãos públicos
locais), (3) elaboração participativa do Plano de Desenvolvimento
Sustentável do Pólo (abordando aspectos de fora das propriedades,
como integração, beneficiamento, escoamento e comercialização
da produção do Pólo e infra-estrutura) com implementação em
parceria com as prefeituras da base territorial do Pólo, (4)
elaboração dos Planos de Utilização das Unidades de Produção
(abordando os objetivos do manejo em escala espacial e temporal)
com a participação ativa de todos os membros da família, (5)
certificação participativa (por meio de acordos comunitários) e
remuneração dos serviços ambientais prestados à sociedade (tais
como redução do desmatamento, sequestro de carbono
atmosférico, restabelecimento das funções hidrológicas dos
ecossistemas, conservação e preservação da biodiversidade,
conservação dos solos e redução da inflamabilidade da paisagem
rural). Para tal, vêm sendo trabalhados mecanismos para o
fortalecimento de organizações sociais dos Pólos do PROAMBIENTE
(Pólos são grupos de 400 a 500 famílias, configuradas em várias
comunidades, que estabelecem seus acordos comunitários, que
para se efetivarem, exigem grande relação de confiança entre os
grupos comunitários, sendo uma das principais inovações e
desafios do programa), (b) geração de emprego e renda para agentes
agroflorestais (sobretudo para jovens rurais), (c) assessoria técnica
e extensão rural prestada por uma entidade eleita pelos produtores
e produtoras, (d) incentivo econômico para a produção rural
sustentável (via crédito rural) e (e) incentivo econômico por meio de
compensação ou remuneração de serviços ambientais.

Ainda que a gênese do PROAMBIENTE esteja ligada à articulação


de vários movimentos sociais rurais amazônicos, é notório o
protagonismo de duas entidades no processo de construção do
programa: a Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras na
Agricultura do Estado do Pará (FETAGRI-PA) e a Federação dos
Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do Estado de
Rondônia (FETAGRO). Não por acaso, seus ex-presidentes na
época da construção do programa (2000-2002) ocupam hoje
mandatos de deputado estadual do Pará e deputado federal de
Rondônia, respectivamente. Mas a relação institucional com os
conceitos do programa fica clara quando nos voltamos para as
origens desses dois ex-presidentes, sendo um deles oriundo da
"FVPP - Fundação Viver, Produzir e Preservar" (Altamira - Pará) e
o outro da "APA - Associação de Produtores Alternativos" (Ouro
Preto o·oeste - Rondônia).

Box 1: FVPP - Fundação viver, produzir e preservar

Na Transamazônica se desenvolveu, a partir do início da década


de 70, uma situação social operada pelos governos militares, com o
deslocamento de milhares de camponeses do Centro-Sul e
Nordeste do País, dentro de uma estratégia geopolítica de
ocupação da fronteira e integração nacional de fluxos de bens e
serviços. Mas a pretendida estratégia não se confirmou, adquirindo
a conformação do modelo agroexportador característico do Centro-
Sul , fartamente subsidiado pelo Estado, com a tecnificação
expropriando milhares de agricultores familiares. As identidades de
colonos banidos da terra natal minaram o sentimento de grande
parte das famílias migradas para a Transamazônica, com as
adversidades do ambiente e as condições de abandono se
agravando, a partir de 1974, devido ao fim dos subsídios. Diante de
tantas adversidades, incluindo os desafios de redescobrir a
natureza, uma parcela significativa de colonos da Transamazônica
criou suas organizações e conformou um campo de forças que os
representaria nas ações e mobilizações para pleitear investimentos
públicos e valorização social. Isso marca a região até o presente
momento, caracterizada por uma mobilização social de destaque e
uma forte tradição adquirida de produção mais equilibrada pela
tecnologia empírica da "roça sem queima" e por sistemas
agroflorestais, aparecendo a "Fundação Viver, Produzir e
Preservar" (FVPP), em Altamira (Pará) como um dos mais fortes
exemplos nesse sentido (MONTEIRO, 1996; 1996; TUCKER et ai.,
1998).
Box 2: APA-Associação de produtores alternativos

Durante os anos 50, com a escassez de terras aráveis na Região Sul,


muitas propriedades rurais não tinham como suportar a sucessão familiar
em suas áreas. Com isso, houve um processo intenso de ocupação
humana das fronteiras agrícolas da Região Centro-Oeste, com a
migração das novas gerações. O processo de ocupação humana das
áreas de Cerrados logo se configurou, com a abertura de grandes áreas
para a introdução de plantios de forma mecanizada. O que antes era
solução para os antigos problemas, tomou-se a repetição dos mesmos,
ou seja, quase duas décadas depois, novamente a "antiga" nova fronteira
agrícola torna-se significativamente ocupada, fazendo com que a
migração rural seguisse para a região ecotonal entre Cerrados e
Amazônia. A partir dos anos 80, portanto, o estado de Rondônia sofre
uma grande pressão nos seus recursos naturais, com significativas
conseqüências sociais e ambientais. Porém, devido às particularidades
do ecossistema amazônico, a reprodução do mesmo padrão de
produção do Sul e Centro-Oeste não surtiu bons resultados, colocando a
produção familiar em situação de alta vulnerabilidade. Exatamente em
função dessas adversidades é que surge a "Associação de Produtores
Alternativos" (APA), em Ouro Preto D'Oeste (Rondônia), um grupo
organizado voltado à fortalecer a produção agroecológica e agroflorestal
de seus membros, desde a produção dentro da propriedade com os
denominados "produtores técnicos", passando por uma assistência
técnica própria e diferenciada, até o processo coletivo de beneficiamento
e comercialização de seus produtos alternativos. Inicialmente, a atividade
desenvolvida foi a apicultura (produção de mel), que pressupõe a
eliminação do fogo do sistema de produção, somente obtida por meio de
uma ação coletiva de troca de diárias e relação de confiança para evitar
focos acidentais de incêndio florestal (fator que inibe a intensificação de
sistemas agroecológicos e agroflorestais na Amazônia). A partir do
sucesso desta primeira iniciativa, partiu-se para a implantação de
sistemas agroflorestais com espécies regionais frutíferas: (cupuaçú,
araçá-boi, graviola); palmeiras: (pupunha e açaí) e essências florestais
(freijó-louro, mogno, bandarra, andiroba). Ao todo são 500 hectares
reflorestados, num total de 800 mil plantas de mais de 30 espécies
diferentes. Os sistemas agroflorestais são uma alternativa sustentável de
produção, com técnicas diferenciadas de manejo, que buscam a
recuperação dos solos e de áreas degradas, bem como a criação de
alternativas econômicas geradoras de trabalho e renda familiar.
3. A importância dos sistemas agro-florestais na escala
de paisagem rural

Nesse item, pretende-se fazer uma breve demonstração da


importância dos sistemas agroflorestais no manejo integrado da
unidade de produção familiar rural e na escala de paisagem rural.
Simularam-se duas situações (cobertura vegetal e estoque de
carbono) em dois cenários distintos para uma mesma unidade de
produção familiar rural de 100 hectares:
Cenário 1 - Unidade de produção sem PROAMBIENTE: percentual
de cobertura vegetal por tipo de uso da terra ao longo do tempo
(dez anos) e linha de base de estoque de carbono ao longo do
tempo (dez anos).
Cenário 2 - Unidade de produção com PROAMBIENTE: percentual
de cobertura vegetal por tipo de uso da terra ao longo do tempo
(dez anos) e linha de base de estoque de carbono ao longo do
tempo (dez anos).

Abaixo são apresentadas as descrições por hectare de tipo de


uso da terra nas unidades de produção sem e com PROAMBIENTE,
percentual de cobertura vegetal por tipo de uso da terra ao longo
do tempo para o cenário sem PROAMBIENTE (Figura 1), linha de
base de estoque de carbono ao longo do tempo sem PROAMBIENTE
(Figura 2), percentual de cobertura vegetal por tipo de uso da terra
ao longo do tempo para o cenário com PROAMBIENTE (Figura 3),
linha de base de estoque de carbono ao longo do tempo com
PROAMBIENTE (Figura 4 ):

Cenário 1 - Unidade de produção sem PROAMBIENTE:


33ha de Pasto Extensivo (20 cabeças de gado)
2ha de Roça Tradicional de Arroz/ Feijão / Mandioca / Milho
20ha de Capoeira (Sistema de Rotação da Roça)
15ha de Floresta Secundária (Sistema Roça+ Pasto Abandonado)
30ha de Mata Explorada
Criação Extensiva de Pequenos Animais
24

Cobertura Vegetal - Linha de Base

100%

-(1)
o
..J
80%

o 60%
□ Pastagem Degradada
11 Capoeira/Juq uira
"C
11)
40% □ Capoeira/Roça
...
<(
(1)

■ Mata
20%

0%
Hoje 2 4 6 8 10
Ano

Figura 1. Cobertura Vegetal sem PROAMBIENTE.

Estoque de Carbono - Linha de Base

40 0 0 - r - - - - - - - - - - - - - - - - ,
ú,
o 3500
"C
~ 1nnn j □ Pastagem Degradada
,g_ 2500 Capoeira/Juquira
o 2000
e: 1□ Capoei ra/Roca
o 1500
...
.e
11) 1000 1 ~ _Mata
(.)
500
o
Hoje 2 4 6 8 1n
Ano

Figura 2. Estoque de Carbono sem PROAMBIENTE.


Cenário 2 - Unidade de produção com PROAMBIENTE
20ha de Pasto (30 cabeças de gado)
4ha de Sistemas Agroflorestais
1ha de Roça Semi-Intensiva de Arroz/ Feijão/ Mandioca / Milho
10ha de Capoeira (Sistema de Rotação da Roça)
35ha de Floresta Secundária Manejada
30ha de Mata Explorada
Criação de 100 galinhas, 15 porcos e 15 Caixas de Abelhas

Cobertura Vegetal - PROAMBIENTE

-Q)

o
100%
80%
-r----------- ■ SAF
...J □ Pastagem
o 60%
"C □ Capoeira Manejo
ra 40%
...
Q)

<(
□ Capoeira/Roça

20% ■ Mata

0%
Hoje 2 4 6 8 10
Ano

Figura 3. Cobertura Vegetal com PROAMBIENTE.

Estoque de Carbono - Proambiente


4500
ui'
o 4000
"C
ra 3500 ■ SAF
ãi
e: 3000 □ Pastagem
o 2500
!::.. □ Capoeira Manejo
o 2000
e: □ Capoeira/Roca
o 1500
...ra 1000
.e
■ Mata
(.) 500
o
Hoje 2 4 6 8 10
Ano

Figura 4. Estoque de Carbono com PROAMBIENTE.


26

Se analisarmos, isoladamente, cada tipo de uso da terra, pode-


se erroneamente concluir que o sistema agroflorestal em si
colabora muito pouco com a cobertura florestal, o estoque de
carbono da unidade de produção e busca de escala de paisagem
rural, no entanto, dentro de uma proposta de manejo integrado dos
sistemas de produção, somente a partir da introdução dos sistemas
agroflorestais, é possível estabilizar o desmatamento das unidades
de produção e reverter a tendência negativa (Cenário 1) para
positiva (Cenário 2) da linha de base de estoque de carbono. Esse
exercício é interessante para provocar o debate sobre os conceitos
de adicionalidade e elegibilidade de projetos no Mecanismo de
Desenvolvimento Limpo (MDL), previsto no Protocolo de Quioto.

As regras do MDL estabelecem que, para ser elegível, um


projeto tem que ser adicional em assimilação de carbono em
comparação a uma situação sem projeto. Ou seja, considerando
que um hectare de floresta primária da Amazônia tem, em média,
160 toneladas de carbono por hectare, e que um sistema
agroflorestal deve assimilar em torno de 80 toneladas de carbono
por hectare ao longo de vários anos, então, o sistema agroflorestal
na Amazônia, para as regras do MDL, não é elegível. No entanto,
além de não haver garantias que a área com floresta primária
permanecerá em pé (o que nos traz a necessidade de também
debater a relevância do MDL em assumir a modalidade
"desmatamento evitado", além do "seqüestro de carbono",
principalmente para o caso do Brasil, que tem em dois terços de
sua emissão proveniente do desmatamento da Amazônia), com
esses conceitos, as regras do MDL ignoram ações coletivas de
manejo integrado das unidades de produção que vêm sendo
trabalhadas no PROAMBIENTE, que não só são adicionais em
estoque de carbono (basta comparar as Figuras 2 e 4 ), mas
substancialmente, estimulam a ação coletiva e os laços de
confiança comunitários a partir da verificação participativa de
serviços ambientais.

4. Verificação participativa de serviços ambientais

O grande diferencial do PROAMBIENTE está na proposta de


reconhecimento dos serviços ambientais prestados à sociedade. O
programa prevê a avaliação de seis tipos de serviços ambientais:
redução do desmatamento, absorção do carbono atmosférico,
conservação da água, conservação do solo, preservação da
biodiversidade e redução do risco de fogo. Mas a remuneração de
serviços ambientais só passa a ser possível a partir da existência
de indicadores que comprovem a prestação desses serviços. Logo,
durante a fase de projeto da sociedade civil (2000-2002), foram
construídos os "Padrões de Certificação de Serviços Ambientais".
Este referencial é a base para estipular os produtores com direito à
remuneração de serviços ambientais.

De acordo com MATTOS & PEREIRA (2003), os beneficiários


do programa devem cumprir uma série de exigências sócio-
ambientais para recebimento dos serviços ambientais prestados à
sociedade, logo, para uma avaliação do cumprimento dessas
exigências, faz-se necessária a existência de indicadores. Para
melhor entendimento do funcionamento do PROAMBIENTE e da
remuneração dos serviços ambientais, dividamos os seis serviços
ambientais em dois grupos: o grupo de serviços que possuem
indicadores diretos (redução do desmatamento e absorção do
carbono atmosférico, que têm a biomassa como indicador) e que
serão verificados pelo monitoramento ambiental; e o grupo de
serviços que não possuem indicadores indiretos (água, solos,
biodiversidade e redução do risco de fogo) e que serão verificados
indiretamente, através do cumprimento de um conjunto de
Princípios e Critérios que compõem os Padrões de Certificação de
Serviços Ambientais do PROAMBIENTE.

Para o primeiro grupo, está em discussão, com o Sistema de


Proteção da Amazônia (SIPAM) e Embrapa Monitoramento por
Satélites, a metodologia de trabalho, que deve envolver o
georreferenciamento dos Pólos, a interpretação de imagens de
satélite de vários anos consecutivos para a montagem de mapas
evolutivos de uso da terra, a construção da linha de base de
carbono dos Pólos (anterior ao PROAMBIENTE) e a adicionalidade
de carbono a partir do funcionamento do PROAMBIENTE.
Tabulados esses dados, pretende-se computar os créditos de
carbono gerados em cada Pólo, para que, eventualmente, possam
ser negociados dentro do MDL (caso haja mudanças nas atuais
regras para o período pós 2012) ou em mercados alternativos de
carbono já existentes. Se obtidos recursos financeiros com os
créditos de carbono (hipótese que julgo muito remota), a idéia
inicial da proposta do PROAMBIENTE é usar esses recursos como
- - - -- - - -----..- -- ---- - - ... - ----.

complemento do fundo de serviços ambientais a ser criado (mas


que até agora o Governo Federal deu poucas garantias de fazê-lo).

Já para o segundo grupo de serviços ambientais (água, solos,


biodiversidade e fogo), um processo participativo foi estabelecido
para a montagem dos "Padrões de Certificação de Serviços
Ambientais" do PROAMBIENTE. Primeiramente, no início de 2002,
o projeto da sociedade civil (2000-2002) promoveu uma parceria
com o Instituto de Certificação e Manejo Florestal e Agrícola, o
IMAFLORA, que apresentou um documento base, propondo
Princípios e Critérios de Certificação. A partir desse documento,
durante um ano, com apoio da Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária (Embrapa), Instituto de Pesquisa Ambiental da
Amazônia (IPAM), Federação dos Órgãos para Assistência Social e
Educacional (FASE) e do próprio IMAFLORA, os técnicos dos 11
Pólos Pioneiros do PROAMBIENTE organizaram Oficinas de
Certificação, que contaram com a participação das principais
lideranças rurais da região e dos produtores beneficiários do
programa. Após amplo processo de discussão, os Princípios e
Critérios foram revisados e modificados, assim como foram
sugeridos indicadores para cada Critério. A união dos resultados
advindos de todos os Pólos permitiu o fechamento dos "Padrões de
Certificação de Serviços Ambientais" do PROAMBIENTE e a sua
metodologia de verificação de serviços ambientais. Os "Padrões de
Certificação de Serviços Ambientais" apresentam a seguinte forma
básica, conforme a Tabela 1:

Tabela 1. Padrões de Certificação de Serviços Ambientais


(PROAMBIENTE)
PRINCIPIOS CRITERIOS
1.1 O Grupo Comunitário deve respeitar todas as leis nacionais,
estaduais e municipais.
1 - Obediência às
1.2 Devem ser respeitados todos os acordos internacionais dos
Leis e aos Princípios
quais o Brasil é signatário.
de Certificação de
1.3 O Grupo Comunitário deve demonstrar um compromisso de
Serviços Ambientais
longo prazo com os Padrões de Certificação de Serviços
do PROAMBIENTE
Ambientais aplicados pelo Programa Proambiente e Acordos
Comunitários.
2.1 Devem ser valorizados os costumes, experiências e a
cultura das populações locais.
2.2 Não deve haver discriminação de cor, credo, posição política,
gênero, local de origem e idade nas relações sociais dos Grupos
Comunitários.
2.3 As atividades de produção devem ser realizadas de modo
2 - Relações Sociais seguro, sem causar prejuízos à saúde dos membros das fam ilias
e dos trabalhadores temporários e permanentes.
2.4 O trabalho de menores de 18 anos só será aceitável quando
compatível com a cultura local, em atividades não penosas e
quando não resultar em prejuízo da educação formal e saúde dos
mesmos.
2.5 As relações empregatícias devem ter caráter justo.
3 - Direitos, Deve-
res e Responsabi-
3.1 Devem ser evidenciados os direitos de uso da terra e dos
lidades de Posse e
recursos naturais a longo prazo.
Uso da Terra e dos
Recursos Naturais
4.1 As Unidades de Produção devem identificar seus custos de
produção e gerar produtos e/ou serviços que permitam a sua
4 - Benefícios
sustentabilidade econômica.
Econômicos da
4.2 As Unidades de Produção devem estimular a otimização do
Unidade de
uso da terra e processamento local da produção, evitar a
Produção
dependência de um único produto e fortalecer as economias
familiar e local.
5.1 O Plano de Utilização deve conter:
a) Dados cadastrais, conforme exigência do Programa
Proambiente.
b) Histórico do crédito rural, conforme exigência do Programa
Proambiente.
c) Mapa atual da Unidade de Produção, descrevendo os tipos
de uso da terra (Áreas de Produção; Áreas de Preservação
Permanente; Reserva Legal).
d) Mapa futuro da Unidade de Produção, descrevendo os tipos
5 - Serviços
de uso da terra (Áreas de Produção; Áreas de Preservação
Ambientais
Permanente; Reserva Legal).
·e) Objetivos do manejo da produção e conservação ambiental
(Áreas de Preservação Permanente; Reserva Legal).
0 Priorização dos pontos de conversão, apontando demandas
de insumo, mão-de-obra e capital, além de cronograma de
execução a curto, médio e longo prazo.
5.2 Os produtores do Programa Proambiente devem estar
capacitados para garantir a implementação dos Planos de
Utilização das Unidades de Produção.
30

6.1 O manejo das Unidades de Produção deve contribuir para a


recuperação e conservação dos solos.
6.2 As Unidades de Produção devem buscar a redução do uso
de insumos químicos e adubos de alta solubilidade. O uso de
organismos transgênicos é proibido.
6.3 O manejo das Unidades de Produção deve contribuir para a
6- Plano de recuperação e conservação dos recursos hídricos.
Utilização da 6.4 O manejo das Unidades de Produção deve contribu ir para o
Unidade de aumento da diversidade local de espécies, bem como para a
Produção recomposiçã'o da biodiversidade.
6.5 As Unidades de Produção devem buscar a eliminação ou
uso controlado do fogo e contribuir para minimizar o risco de fogo
acidental em áreas vizinhas.
6.6 O manejo das Unidades de Produção deve ser
compreendido de · forma integral no território para possibilitar
prestação de serviços ambientais em escala de paisagem.

A certificação do PROAMBIENTE possui interfaces com a


formação da equipe de assessoria técnica e extensão rural do
programa, isto é, cada Pólo possui 15 agentes agroflorestais, 4
técnicos de nível médio e 1 técnico de nível superior com formação
em Ciências Agrárias. Os agentes agrofloretais são produtores do
próprio Pólo, eleitos pelos beneficiários do programa. Portanto,
cada Pólo de 500 famílias irá formar em torno de 15 sub-grupos
(com média de 30 à 35 famílias em cada sub-grupo) liderado pelo
seu agente agroflorestal eleito.

A metodologia de verificação de serviços ambientais de água,


solos, biodiversidade e fogo do PROAMBtENTE prevê um sistema
misto de certificação, ou seja, pressupõe uma primeira etapa de
certificação participativa, que culmina com a elaboração de Acordos
Comunitários, e uma segunda etapa de Certificação Convencional,
que é finalizada com as Auditorias de Certificação.

Primeiramente, cada sub-grupo do. Pólo se reúne e estabelece


seu Acordo Comunitário, . que aponta os compromissos coletivos
para o cumprimento dos Planos d'e Utilização das Unidades de
Produção e dos Padrões de Certificação de Serviços Ambientais do
PROAMBIENTE. _Após um ano de execução, o sub-grupo deve
rever seu Acordo Comunitário e apontar seus cumpridores e não-
cumpridores. A Entidade Executora do Pólo deve compilar os
Acordos Comunitários de todos os sub-grupos do Pólo sob sua
responsabilidade técnica e enviar à Gerência do PROAMBIENTE.
Em seguida, pela proposta original do PROAMBIENTE, entidades
cadastradas pelo programa e acreditadas pelo Instituto Nacional de
Metrologia (INMETRO) irão realizar Auditorias de Certificação para
verificar os Acordos Comunitários. Como não é possível se realizar
auditorias em 100% do Pólo, a cada ano, por volta de 10% dos
sub-grupos devem ser auditados, fechando auditoria 100% ao
longo de dez anos.

Para os sub-grupos não auditados, vale o que diz o Acordo


Comunitário. Já para os sub-grupos auditados, temos duas
situações possíveis: a) quando o Acordo Comunitário congruir com
a Auditoria de Certificação, da mesma forma, vale o Acordo
Comunitário; b) quando a Auditoria de Certificação não congruir
com o Acordo Comunitário, vale a Auditoria de Certificação. A
remuneração de serviços ambientais proposta para o PROAMBIENTE
(mas ainda não viabilizada pelo Governo Federal) é na ordem de
meio salário mínimo por mês, com validade de um ano, quando
novo processo de verificação é desenvolvido. Este valor de meio
salário mínimo é considerado a cota 100% da remuneração de
serviços ambientais (e o valor corresponde, grosseiramente, ao
custo de eliminação do fogo do sistema de produção).

Para as duas situações em que vale o Acordo Comunitário (sub-


grupos não auditados ou com Acordos Comunitários congruentes
com a Auditoria de Certificação), os produtores cumpridores
passam a receber cota 100%, e os não cumpridores cota 75%. No
ano seguinte, os não cumpridores que mais uma vez faltarem com
os seus compromissos coletivos têm uma redução para cota 50%,
e assim sucessivamente, passando por cota 25% e chegando a
cota 0%. Se passarem a cumprir os Acordos Comunitários,
retornam ao recebimento da cota 100% (independentemente da
cota que estejam). Já aqueles produtores que estiverem cumprindo
seus compromissos coletivos permanecem na cota 100%.

No entanto, nas situações em que vale a Auditoria de


Certificação (sub-grupos auditados e com Acordos Comunitários
não congruentes com a Auditoria de Certificação), os produtores
apontados como cumpridores no Acordo Comunitário, mas
apontados como não cumpridores pela Auditoria de Certificação,
não terão direito à remuneração, ficando na cota 0%. Já os
32

apontados como cumpridores pelos Acordos Comunitários e pela


Auditoria de Certificação recebem cota 75% por ser conivente com
um Acordo Comunitário não verídico, mesmo tendo cumprido suas
obrigações individuais. Por fim, os apontados como não cumpridores
pelo Acordo Comunitário e pela Auditoria de Certificação ficam com
a cota 50%, tendo redução de 25% por não cumprir suas
obrigações individuais e 25% por ser conivente com um Acordo
Comunitário não verídico.

Pela metodologia apresentada acima, pode-se perceber que em


algumas situações, mesmo não tendo cumprido suas obrigações
individuais, alguns produtores terão direito a uma remuneração
com descontos. Isso se deve pelo fato do valor da remuneração de
serviços ambientais, como explicam Mattos & Pereira (2003), ter
sido estipulado pelo custo de intensificação do uso da terra e
eliminação do uso do fogo no sistema de produção. Destarte,
pressupõe-se que esse recurso é o montante demandado pelo
produtor para promover mudanças qualitativas no uso da terra, e
conseqüentemente, para propiciar o cumprimento da concepção do
programa. Sendo assim, a manutenção de parte de sua
remuneração é a forma de estimulá-lo a trabalhar uma nova forma
de uso dos recursos naturais e um exercício coletivo para chegar
ao seu objetivo final.

5. Desafios futuros do PROAMBIENTE

Após dois anos de vigência como política pública (2004-05), o


Governo Federal ainda não conseguiu viabilizar os mecanismos e
instrumentos econômicos para colocar em prática a certificação e
remuneração de serviços ambientais propostas pelos movimentos
sociais rurais criadores do PROAMBIENTE. Considerando que o
Governo Federal assumiu a proposta como política pública, há um
risco político do mesmo fechar o mandato não tendo consolidado a
mais inovadora concepção de política pública rural já vista no
Brasil. No entanto, temos que considerar também que o caráter
sistêmico do PROAMBIENTE encontra dificuldades de implementação
na forma cartesiana de operação da máquina pública (onde os
vários itens propostos pelo programa encontram atribuições em
diferentes Ministérios, que têm dificuldades de operar
simultaneamente um mesmo programa ou integrar seus
respectivos calendários de execução financeira) .
Considerando que o fundo de serviços ambientais (ou alternativa
correspondente) ainda não foi constituído pelo Governo Federal, é
necessária a atenção para as várias experiências internacionais de
uso de bens comuns analisadas por Ostrom (2000), que
demonstram que, de maneira geral:
• Quando não há uma boa estratégia de comunicação entre os
usuários de bens comuns, a tendência é de haver sobre-exploração
dos recursos a um nível agregado que se aproxima ao nível
previsto pela teoria convencional sobre propriedade coletiva - a
exemplo da teoria da "Tragédia dos Comuns" de Hardin (1968);
• Quando há uma boa estratégia de comunicação entre os
usuários de bens comuns, são obtidos benefícios conjuntos
substancialmente maiores;
• Quando os pagamentos de serviços ambientais são
relativamente baixos, a comunicação cara a cara permite aos
usuários alcançar e manter acordos próximos ao nível ótimo de
apropriação de recursos;
• Quando os pagamentos de serviços ambientais são muito
altos, alguns participantes ficam tentados a não cumprir (ou burlar)
os acordos; os resultados conjuntos melhorados são mais baixos
que nas situações de pagamentos de serviços ambientais
relativamente baixos.
• Se é oferecida a oportunidade de participar de um
monitoramento com alto custo de transação e a efetiva aplicação
de sanções, os usuários tornam-se dispostos a pagar para punir os
que sobre-exploram o recurso comum;
• Quando os usuários discutem abertamente e acordam seus
próprios níveis de uso e seus sistemas de sanções, o não
cumprimento dos acordos se mantém em níveis muito baixos e os
resultados se aproximam do nível ótimo.

Por fim, o PROAMBIENTE é uma inovadora proposta de desen-


volvimento rural. Conforme ressalta Sen (2000), o desenvolvimento
consiste na eliminação de privações de liberdade que limitam as
escolhas e as oportunidades das pessoas de exercerem sua
condição de gente. As liberdades não são apenas os fins
primordias do desenvolvimento, mas os seus meios principais,
sendo que as liberdades econômicas e políticas se reforçam
mutuamente, em vez de serem contrárias umas as outras. Assim,
atenta-se particularmente para a expansão das capacidades das
pessoas de levar o tipo de vida que elas valorizam. Essas
34

capacidades podem ser aumentadas pelas políticas públicas, mas


também, por outro lado, a direção da política pública pode ser
influenciada pelo uso efetivo das capacidades participativas do
povo. Esses ideais interagem com o processo de construção
participativa do PROAMBIENTE, que partiu de uma análise dos
problemas da aplicação do crédito rural do Fundo Constitucional de
Financiamento do Norte (FNO), o principal mecanismo econômico
de desenvolvimento rural da Amazônia, para a criação de uma
política pública que valoriza o novo caráter multifuncional do
produtor familiar rural. A remuneração de serviços ambientais
propostos pelo PROAMBIENTE é a amostra mais evidente da nova
concepção de desenvolvimento rural, que almeja acabar com a
dicotomia entre produção rural e conservação ambiental, além de
compartilhar entre produtores e sociedade a responsabilidade
sobre o meio ambiente. Desse modo, a metodologia de verificação
participativa de serviços ambientais proposta pelo PROAMBIENTE,
que une certificação participativa e certificação convencional, é um
claro exercício que virá proporcionar um processo contínuo de
conscientização ambiental, compromisso coletivo comunitário,
credibilidade externa do processo, e sobretudo, liberdade aos povos
da floresta para traçar seu futuro comum .. Consolidar o PROAMBIENTE
é, no mínimo, uma demonstração de respeito aos movimentos
sociais que almejam protagonismo no desenvolvimento da
Amazônia .

6. Referências
ABRAMOVAY, R. O capital social dos territórios: repensando o
desenvolvimento rural. IV Encontro da Sociedade Brasileira de
Economia Política. Porto Alegre, 2001.

ABRAMOVAY, R. Paradigmas do capitalismo agrário em questão. São


Paulo-Campinas: HUCITEC-UNICAMP, 2ed . 1998.

BERKES, F. ; FOLKE, C. lnvesting in Cultural Capital for Sustainable Use


of Natural Capital. ln: JANSSON, A.M.; HAMMER M.; FOLKE, C.;
COSTANZA, R. (eds). lnvesting in Natural Capital: The Ecological
Economics Aproach to· Sustainability. Washington (DC): ISEE/lsland
Press, p.128-149. 1994.

BISHOP, Josh. Markets for forest environmental services - preliminary


findings. ln : Ili Katoomba Group (www.forest-trends.org.br).
Teresópolis/RJ . March, 2001.
BITTENCOURT, G.A. & ABRAMOVAY, R. Inovações institucionais no
financiamento à agricultura familiar: o Sistema Cresa!. li Encontro da
Sociedade Brasileira de Nova Economia Institucional. Campinas.
Março, 2001 .

GRANOVETTER, M. Economic Action and Social Structure: The Problem


of Embeddedness. American Journal of Sociology, vai. 91, issue 3,
p.481-510, 1985.

GROPPO, P. Diagnósticos de sistemas agrários: una metodologia


operativa. FAO-RLAC. 1991 .

HARDIN, G. The Tragedy of the Commons. Science, vai. 162, p.1243-48.


1968.

MARTÍNEZ ALIER, J. Da Economia Ecológica ao Ecologismo Popular.


Blumenau, FURB. 1998.

MATTOS, L. & PEREIRA, C. Análise da Viabilidade Econômica do


Proambiente. Belém: IPAM (arquivo). 2003.

MERICO, L.F.K. Introdução à Economia Ecológica. Blumenau, FURB .


1996.

MONTEIRO, R. Informação e redes de interação no novo ciclo de


mobilização dos pequenos agricultores da Transamazônica. Belém.
204p. 1996. Dissertação (Mestrado) - Núcleo de Altos Estudos
Amazônicos, Universidade Federal do Pará.

NORTH, D. Economic Performance Through Time. American Economic


Review. American Economic Association, vol 84 (3), p.359-68 . 1994.

OSTROM , E. Governing the Commons: the evolution of institutions


for collective action. Cambridge: Cambridge University Press . 1990.

OSTROM, E. EI Gobierno de los Bienes Comunes: la evolución de las


instituciones de acción colectiva. México: Fondo de Cultura Económica.
2000 .

REPETTO, R.; MAGRATH, W; WELLS, M.; BEER, L.; ROSSINI, F.


Wasting assets: natural resources in the national income accounts.
Washington, World Resources lnstitute. 1989.

SEBILLOTTE, M. Jornais de Departament de Agronóme de INRA.


Vichy. 1982.
36

SEN, A. Desenvolvimento como Liberdade. São Paulo: Companhia das


Letras. 2000.

TOLEDO, V.M. La sociedad rural, los campesinos y la cuestion ecológica.


Ecologia Política. n.1. 1991.

TUCKER, J.M.; BRONDIZIO, E.S; MORAN, E.F .. Rates of forest regrowth


in Eastern Amazônia: a comparison of Altamira and Bragantina regions.
lnterciência, 23(2): 64-73. 1998.

VEIGA, J.E. da. O desenvolvimento agrícola: uma visão histórica. São


Paulo: EDUSP-HUCITEC. 1991 .
Aplicabilidade efetiva de dispositivos legais que
incidem sobre o uso da terra rural no quadro de
um desenvolvimento agroflorestal ecológico e
socialmente sustentável
Jean C.L. Dubois
Rede Brasileira Agroflorestal - REBRAF .
E-mail: jean@rebraf.org .br

1. Introdução

Não obstante a existência de um Código Florestal e de outros


dispositivos legais textualmente muito claros persiste uma fraca
aplicação efetiva das imposições legais, principalmente no que se
refere, entre outros aspectos, à manutenção ou restauração de
Áreas de Proteção Permanente (APPs) e de Áreas de Reserva
Legal (RL) e, no caso mais específico do Biorna da Mata Atlântica,
à proibição do corte de estágios médios ou avançados de regeneração
da Mata Atlântica, inclusive para uso agrícola temporário.

O presente trabalho tem como objetivo principal o de argumentar


a favor da necessidade de harmonizar a legislação e reconhecer o
uso de sistemas agroflorestais adensados e adequadamente
biodiversificados como modalidade de restauração de APPs e de
Áreas de Reserva Legal.

Os ajustes deveriam se apoiar em critérios de manutenção de


bons níveis de biodiversidade nas paisagens rurais (biodiversidade
interna dos sistemas de produção, entre eles os SAFs; corredores
ecológicos e outras formas de conectividade entre remanescentes
florestais, entre outros). Assim, harmonizar, de um lado, as exigências
de preservação e conservação e, por outro lado, a necessidade de
melhorar os níveis da renda gerada nas propriedades rurais. Para
tal efeito, é imprescindível tomar em conta as realida-des sociais do
meio rural produtivo. Entre os elementos dessas realidades sociais
rurais, convém mencionar o estado de pobreza de grande parte dos
pequenos agricultores e a descapitalização que está afetando hoje
muitos proprietários rurais de médio e de maior porte. Os ajustes
deveriam ser elaborados por um grupo de trabalho multidisciplinar
coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente e contando, entre
38

outros membros, com profissionais do desenvolvimento rural


dotado de sólido grau de convivência com os agricultores e as
comunidades rurais.

Cabe citar que está em fase de debate no Ministério do Meio


Ambiente, inclusive no Conselho Nacional de Meio Ambiente -
CONAMA e em outros ministérios interessados, entre eles o Ministério
do Desenvolvimento Agrário - MOA, a necessidade de reanalisar o
Código Florestal e outros dispositivos legais que incidem sobre o
binômio conservação-desenvolvimento rural sustentável.

Dessa forma, o presente trabalho visa analisar de forma crítica


determinados dispositivos legais, as principais causas de sua
inaplicabilidade efetiva e propor soluções possíveis, destacando
principalmente a contribuição de sistemas agroflorestais biodiversificados
do tipo "forest gardens" indonésios, apresentando áreas basais
relativamente elevadas.

2. Análise crítica de determinados dispositivos legais e


as principais causas de sua aplicabilidade efetiva

Serão comentados aqui dispositivos que incidem sobre:


• a manutenção ou restauração de Áreas de Proteção Permanente
(APPs): com referência especial à mata ciliar e ao uso agrícola ou
agroflorestal de ladeiras;
• a manutenção ou restauração da Reserva Legal (RL) e seu
manejo com fins econômicos;
• a proibição do corte de estágios médios de regeneração da
Mata Atlântica, inclusive para uso agrícola temporário.

As principais causas da inaplicabilidade efetiva desses dispositivos


legais referem-se a:
1. As dimensões continentais do Brasil e a insuficiência dos
recursos orçamentários destinados aos serviços oficiais de pesquisa,
extensão florestal/agroflorestal e tarefas de acompanhamento e
fiscalização por parte das instituições governamentais.

2. Excessivos dispositivos legais que incidem simultaneamente


sobre conservação da Natureza e usos produtivos da terra, que
foram elaborados e sancionados sem adequado conhecimento da
realidade social do meio rural , surgindo dessa forma fatores que
favorecem a inaplicabilidade efetiva desses dispositivos legais.

3. Falta de recursos financeiros para fins de investimento na


propriedade rural. Esta situação afeta a grande maioria dos
pequenos agricultores em todo o país. Níveis graves de
descapitalização afetam, também, muitos médios e "grandes
proprietários" rurais. Por outro lado, as medidas de exceção quanto
à aplicação da lei, não deveriam beneficiar exclusivamente os
agricultores familiares. Também, a definição oficial de "agricultura
familiar" deveria ser submetida a uma revisão no que se refere ao
requisito "No mínimo 80% da renda bruta familiar anual é
proveniente da exploração agropecuária ou extrativa". No caso de
dezenas de milhares de pequenos agricultores, a renda bruta
familiar proveniente do uso da terra na propriedade é inferior a 50%
da renda familiar total, porém a soma da renda gerada na
propriedade e da renda gerada fora da propriedade raramente
ultrapassa dois salários mínimos. No âmbito da regulamentação
dos dispositivos legais, os níveis de descapitalização deveriam ter
mais peso que os requisitos oficiais mencionados na definição atual
da agricultura familiar (superfície da propriedade e renda gerada na
propriedade).

4. A descapitalização faz com que, em poucas exceções, o


pequeno agricultor não tenha os recursos financeiros necessários
para comprar os insumos (adubos minerais; meios de irrigação,
etc.) requeridos para assegurar, a médio prazo, a sustentabilidade
de seus cultivas de ciclo curto. Não possuem recursos para adquirir
insumos e nem os serviços técnicos (elaboração e aprovação de
projetos técnicos ad hoc) requeridos para a execução de trabalhos
de recuperação de APPs e de Reserva Legal, inclusive o material
para implantar as cercas para isolar as áreas reflorestadas dos
fatores de degradação.

5. A proibição de derruba e corte de capoeiras ainda jovens no


Biorna Mata Atlântica, mesmo apresentando características
dendrométricas que os dispositivos legais julgam suficientes para
interditar o corte, foi elaborada e aprovada com as melhores das
intenções. Infelizmente, esta proibição incita os pequenos
agricultores a encurtar o período de pousio florestal, causando
dessa forma uma forte aceleração dos processos de degradação
40

da terra. A derruba da vegetação é autorizada somente em


capoeiras incipientes (macegas e capoeiras pouco desenvolvidas)
as quais, na realidade, ainda não preencheram seu papel de
recuperação da fertilidade natural do solo. Lembramos que a
seqüência "capoeira - lavoura branca - capoeira" é um sistema
silviagrícola seqüencial tradicional em toda a faixa tropical do nosso
planeta. O encurtamento da duração do pousio florestal, prescrito
por dispositivo legal no Biorna da Mata Atlântica, é de fato danoso
ao meio ambiente e aumenta, indiretamente, o risco de maiores
pressões antrópicas negativas, inclusive invasões e destruição de
povoamentos florestais nativos, dentro dos limites das Unidades de
Conservação - UCs.

Estudos e análises de solo e de erosão realizados pela


Embrapa-CNPAB (Centro Nacional de Agrobiologia) na Região
Serrana do Rio de Janeiro (Bom Jardim-Barra Alegre) indicam
claramente que o pousio florestal, nas condições da região
estudada deveria ser de sete anos. Nas condições de clima e solos
dessa região, os dispositivos legais atuais, na prática, proíbem o
corte de capoeiras com mais de três anos o que, na prática, é
atualmente impossível. Para ilustrar este requisito, tomaremos
como exemplo a Resolução SMA 47-03, publicada no Diário Oficial
do Estado de São Paulo no dia 27 de novembro de 2003 (Texto
reduzido aos artigos de interesse para debate, em anexo).
Contextualmente, esta Resolução incide sobre a recuperação de
áreas degradadas, inclusive, implicitamente, a restauração de
APPs e Reserva Legal. Conforme esta Resolução, o proprietário
rural obrigado a restaurar áreas degradadas em escala superior a
um hectare, quando esta propriedade não apresentar adequado
potencial de auto-regeneração, deverá executar esta recuperação
mediante o plantio de mudas de, no mínimo, 80 (oitenta) espécies
arbóreas das formações vegetais de ocorrência regional. Mesmo
no caso de proprietário com recursos financeiros suficientes, onde
será que ele irá comprar mudas ou sementes de 80 espécies
arbóreas regionais nativas e reunir conhecimentos seguros sobre a
auto-ecologia das espécies e sobre tecnologia de tratamento de
sementes e de produção de mudas de todas essas espécies? A
própria Resolução reconhece a necessidade de realizar pesquisas
a respeito . Não existem atualmente, condições para aplicar os
requisitos da Resolução SMA 4 7-03 numa escala social e
geograficamente significativa. Quando existe localmente um
adequado potencial de auto-regeneração, a execução dos
trabalhos de recuperação florestal deverá avaliar este potencial no
que se refere à presença (árvores matrizes remanescentes) ou
chegada de propágulos (sementes) em função da presença de
remanescentes florestais próximos. Na realidade, para muitas
regiões, ainda não existe uma base adequada de conhecimentos
para efetivar esta avaliação. Os trabalhos de recuperação requerem
um projeto técnico - objeto de aprovação ou desaprovação pelo
órgão público competente - e, no caso de propriedades pequenas,
exige uma Anotação de Responsabilidade Técnica (ART),
substituindo a necessidade de um projeto técnico. Muitos agricultores
não têm como pagar a elaboração de um projeto técnico ou a
obtenção de uma ART.

6. Em alguns Estados situados no Biorna da Mata Atlântica


(inclusive no Estado do Rio de Janeiro), os dispositivos legais
federais incidindo sobre o corte de capoeiras para uso agrícola
ainda não foram regulamentados.

7. Com freqüência, a proibição por lei do uso agrícola em


ladeiras íngremes (encostas de morros com mais de 45 graus de
inclinação) é socialmente inaplicável em pequenas propriedades
rurais, pelo menos nas propriedades nas quais a quase totalidade
de sua extensão ocorre em declives escarpados.

3. Soluções possíveis

3.1. Permitir o uso de SAFs biodiversifacados no âmbito de


APPs e Reserva Legal
A existência de tecnologias mais baratas desenvolvidas por
diversas instituições de pesquisa, para a recuperação de APPs e
RL, implica numa forma de superar as barreiras representadas pelo
dispositivo legal associado à recuperação de matas ciliares com
grande número de espécies. Porém, convém considerar que muitos
agricultores de pequeno, médio e maior porte não têm recursos
financeiros ou encontram-se descapitalizados e, portanto, na fase
inicial dos processos de restauração/reflorestamento, o plantio de
um número relativamente limitado de espécies nativas deveria ser
autorizado, na medida em que reúna preferencialmente espécies
nativas que atraem agentes de disseminação, capazes de promover
4L

uma progressiva biodiversificação espontânea das áreas reflorestadas


ou revegetadas com Sistemas Agroflorestais - SAFs.

Os agricultores e pecuaristas descapitalizados dificilmente darão


início a procedimentos de restauração de APPs, caso as áreas
plantadas não pudessem gerar um retorno financeiro.

Os dispositivos legais existentes deveriam ser objeto de ajustes,


visando à possibilidade de desenvolver nas APPs atividades
geradoras de renda com manejo dos recursos naturais em regime
de rendimento sustentado e manutenção de altos níveis de
biodiversidade nativa.

No âmbito da agricultura familiar, determinadas atividades


geradoras de renda (apoiadas no manejo de produtos não
madeireiros) deveriam ser autorizadas em até 100% da extensão
das APAs. Em propriedades maiores, elas seriam autorizadas em,
por exemplo, até 50% da extensão das APPs.

Atividades geradoras de renda deveriam ser contempladas no


processo de reajuste dos dispositivos legais, referentes as APPs e
Reserva Legal, tais como:
• a implantação de agroflorestas multi-estratas, com elevado
grau de biodiversidade interna e elevada área basal (por exemplo:
40% da área basal observada em florestas primárias da região);
• a colheita de sementes de espécies florestais nativas visando a
sua comercialização, principalmente no contexto de projetos ou
programas de reflorestamento;
• o aproveitamento do potencial de produção apícola, apoiado
no manejo de abelhas nativas;
• o manejo e aproveitamento para autoconsumo e/ou comercia-
lização de plantas medicinais nativas da flora local.

A título de exemplo, na comunidade de Guapiruvu (Sete Barras,


SP), alguns agricultores estão convertendo seus bananais, até
recentemente manejados na forma de monocultivo "a pleno sol" e
objeto de aplicações sistematicamente exagerados de agrotóxicos,
em sistema silvibananeiro biodiversificado: uma espécie arbórea
nativa é plantada (Schizo/obium parahybum = guapiruvu ou
guapuruvu); as árvores nativas adultas preexistentes são protegi-
das, formando bancos de matrizes; um número crescente de outras
espec1es nativas surge por aporte espontâneo de propágulos
(espécies zoócoras); um sub-bosque amplamente biodiversificado
se desenvolve e não é mais objeto de capinas "radicais". São feitas
apenas capinas seletivas da baixo impacto. Num desses bananais
visitado pelo autor em maio de 2004 (DUBOIS, 2004) - e em via de
conversão há quatro anos, encontrou-se uma vegetação com mais
de 4 7 espécies nativas, entre elas muitas espécies medicinais
(principalmente piperáceas). O número de animais e aves da fauna
local está aumentando, indicando que o grau de biodiversidade de
todos os andares aumentará progressivamente e que, portanto,
esse tipo de exploração silvibananeiro poderá funcionar como
corredor ecológico. E o que é fundamental para o agricultor: se
cada hectare do bananal produz hoje menos bananas, o fato de
não aplicar mais agrotóxicos, rebaixa o custo de produção; a
comercialização de bananas beneficiadas (bananas desidratadas)
aumenta a renda familiar e esta se apresenta com boas perspectivas
de um incremento ainda maior, mediante o beneficiamento e a
comercialização de plantas medicinais. Sistemas silvibananeiros,
com estas características deveriam ser admitidos como alternativa
para restauração de APPs e Reserva Legal.

3.2. Facilitar a legalização referente ao cultivo e/ou manejo


sustentado de plantas medicinais na Reserva Legal e
APPs
Em APPs e Reserva Legal, a produção de plantas medicinais no
sub-bosque poderia gerar renda para os agricultores. Em
monografia de conclusão de curso na UFSC, Gemina C. Cabral
Born (BORN, 2003) dá ênfase ao papel potencial das plantas
medicinais nativas como instrumento e estratégia de desenvolvimento
regional sustentável e conservação da biodiversidade. Ela enfatiza
também, a valorização dos conhecimentos tradicionais preservados
nas comunidades locais. O biólogo Walter Steenbock, Chefe da
FLONA em Caçador, SC, chama a atenção sobre este potencial
(RIBEIRO, 2004), assinalando, porém a existência de um grande
entrave: de acordo com a legislação ambiental, para manejo de
espécies medicinais, é necessário plano técnico baseado em
estudos científicos . Contudo, no Brasil, no tocante a quase todas as
plantas medicinais nativas, hoje comercializadas regionalmente,
não existem conhecimentos científicos sobre cultivo e manejo
dessas plantas. E, portanto, as atividades objetivando a produção
dessas plantas são "ilegais".
44

3.3. Permitir o uso temporário de espec1es exóticas nos


procedimentos de restauração de APPs e de Reserva Legal
Nesse sentido, convém considerar e autorizar, como uma das
possíveis estratégias, a formação de eucaliptais em contato com
remanescentes de florestas nativas. Existem por exemplo, no
Estado do Rio de Janeiro, numerosos eucaliptais plantados há 1O -
20 anos, em contato com florestas nativas e que hoje se
apresentam com as seguintes características: (i) redução drástica
do número de eucaliptos por hectare, em conseqüência de
desbaste natural e (ii) formação de sub-bosque constituído por
espécies florestais nativas (Dubois, observações de campo) . A
adoção dessa estratégia deveria ser promovida principalmente no
intuito de facilitar o aumento de área de RPPNs e a conectividade
entre UCs já existentes. O uso de "eucaliptais de transição" deveria
ser objeto de melhorias de tipo técnico, principalmente no que
tange sua implantação na modalidade "taungya" e a realização de
desbastes visando acelerar a formação de sub-bosque nativo e, em
seguida, a exploração comercial dos eucaliptos, deixando todo o
espaço vital para as espécies nativas. Os sucessivos desbastes e a
exploração comercial dos eucaliptos geram uma renda que
constituirá um argumento decisivo nas tomadas de decisões
conservacionistas por parte de proprietários rurais.

3.4. Regulamentar o uso agrícola com cultivas de ciclo curto


em relevos de topografia acidentada
Deve-se proibir rigorosamente cultivar a terra "morro abaixo":
nesse caso pode ocorrer intensa erosão. Preparar a terra "virando
o terreno" com arado puxado pelo boi, em linha de nível, já por si
mesmo refreia bastante a erosão.

Conforme observações de campo feitas na Região Serrana do


Rio de Janeiro, a orientação das ladeiras exerce forte influência:
nas "noruêgas" (terras frescas e mais úmidas de encostas menos
batidas pelo sol) a erosão é menor que nas "soalheiras" (ladeiras
mais quentes e mais ensolaradas).

Na região de Boa Vista de Cima (perto de São Pedro da Serra,


RJ), pode-se observar encostas da categoria "noruêga", cultivadas
há 48 anos, com quatro a cinco anos de "capoeira" entre períodos
de dois anos de cultivo, principalmente de inhame. Essas encostas,
quando mantida a floresta nativa no seu topo e cultivadas em linhas
de relevo, não apresentam sinais aparentes de erosão. Na realidade,
deve ocorrer erosão laminar, porém sem provocar a formação de
ravinas ou voçorocas.

Nas encostas, a lei deveria permitir o uso do modelo de


produção em faixas alternadas (SAFs zonais, com estratificação
horizontal): nesse modelo, faixas arborizadas formadas mediante
plantio ou faixas de capoeira são mantidas entre as faixas
cultivadas ou ocupadas por pastagens. Essas faixas arborizadas,
em função das espécies perenes ali manejadas, podem gerar um
retorno financeiro.

Num segundo passo, poder-se-ia pensar em difundir uma


agricultura em aléias, com dispositivos antierosivos envolvendo a
formação de sebes verdes ("barreiras vivas"), em linhas de
contorno, ocupando menos espaço entre as faixas reservadas aos
cultives agrícolas (anuais, persistentes ou perenes). As "barreiras
vivas" são constituídas com gramíneas antierosivas, preferencialmente
capim vetiver (Vetiveria zizanioides) e espécies fruteiras (DUBOIS
et ai., 1996).

4. Referências
BANCO MUNDIAL, 1990. Capim vetiver: a barreira vegetal contra a
erosão. Washington, D.C. US, The World Bank, 1990. 78 p.

BORN, G. C. C. Plantas medicinais da Mata Atlântica - Vale do Ribeira,


SP: extrativismo e sustentabilidade. Florianópolis, UFSC. Monografia de
conclusão de curso de Biologia, Universidade Federal de Santa Catarina,
Florianópolis, 2003.

DUBOIS, J. C. L. Um bom exemplo de conversão de bananal envenenado


em bananal ecológico sombreado. Rio de Janeiro, REBRAF. 2004.
www.rebraf.com.br .

DUBOIS, J.C.L., VIANA, V.M. e ANDERSON A. B. Manual Agroflorestal


para a Amazônia. Rio de Janeiro, REBRAF. 1996, 228 p.

GOVERNO FEDERAL, 1965. Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965


(Código Florestal). Brasília, D.O.U. 16.09.1965.
4b

GOVERNO FEDERAL, 1993. Decreto nº 750, de 10 de fevereiro de 1993


(Dispõe sobre o corte, a exploração e a supressão de vegetação primária
ou nos estágios avançado e médio de regeneração da Mata Atlântica, e
dá outras providências).

RIBEIRO, A. Biólogos rediscutem o uso de ervas medicinais (autor:


Ribeiro, A.). A Notícia - www.an .com .br - geral / Meio Ambiente / acesso
em 26 abr. 2004.

SECRETARIA DE ESTADO DO MEIO AMBIENTE/SÃO PAULO, 2003.


Resolução SMA 47-03. São Paulo, SMA (Diário Oficial do Estado de São
Paulo - Meio Ambiente, de 27-11 -2003).
ANEXO

Resolução SMA 47-03

Publicada no Diário Oficial do Estado de São Paulo - Meio


Ambiente de 27 de novembro de 2003. (Texto reduzido aos artigos
de interesse para debates)

Art. 1º - A recuperação de áreas degradadas exige elevada


dfversidade, que pode ser obtida com o plantio de mudas e/ou
outras técnicas tais como semeadura direta, indução e/ou
condução da regeneração natural.
§ 1 - O caput deste artigo não se aplica para áreas de
recuperação com menos de um hectare, nas quais deverão ser
utilizadas, no mínimo, 30 espécies.
§ 2 - Respeitando-se as formações de ocorrência, recomenda-se
à utilização de espécies ameaçadas de extinção, e/ou atrativas da
fauna associada. ·
§3 - As espécies escolhidas deverão contemplar os dois grupos
ecológicos: pioneiras (pioneiras e secundárias iniciais) e não
pioneiras (secundárias tardias e climácicas), considerando-se o
limite mínimo de 40% para qualquer dos grupos.
§4 - Com relação ao número de indivíduos por espécie,
nenhuma espécie poderá ultrapassar o limite máximo de 20% do
total do plantio.

Art. 2° - A recuperação florestal de áreas degradadas nas


formações de floresta ombrófila, floresta estacionai semidecidual e
savanas florestadas (cerradão), será efetivada mediante o plantio
de mudas de, no mínimo, 80 (oitenta) espécies arbóreas das
formações vegetais de ocorrência regional, exemplificadas na
listagem do Anexo a esta resolução, não excluindo espécies
levantadas regionalmente. ·

Art. 4° - Para formações ou situações de baixa diversidade de


espécies arbóreas, tais como: florestas estacionais deciduais,
formações paludosas e de restinga, manguezal, além das áreas
rochosas, o número de espécies a ser utilizado será definido por
projeto técnico circunstanciado, a ser aprovado no âmbito da
Coordenadoria de Licenciamento Ambiental e de Proteção de
48

Recursos Naturais - CPRN, considerando-se a maior diversidade


possível.

Art. 5° - Para projetos de recuperação mediante plantio, o solo


deverá ser devidamente preparado, atentando para as
recomendações técnicas de conservação de solo, de calagem e
adubação, do controle inicial de competidores, além de isolar a
área dos fatores de degradação.
§ 1 - A manutenção das áreas restauradas deverá ser executada
por, no mínimo, 18 meses após o plantio, incluindo o controle de
formigas, capinas e/ou coroamentos, adubação e outros, conforme
avaliação técnica do responsável pelo projeto.
§ 2 - Tendo como objetivo final a recuperação da floresta, será
admitida a ocupação das entrelinhas, com espécies para adubação
verde e/ou de interesse econômico, por até dois anos, desde que o
projeto utilize princípios agroecológicos.

Art. 7° - Para a recuperação de áreas degradadas mediante


outras técnicas, associadas ou não ao plantio de mudas, deverá
ser apresentado um projeto específico, contendo:
a) avaliação da paisagem;
b) avaliação do histórico de degradação da área;
c) retirada dos fatores de degradação;
d) avaliação dos processos de regeneração natural;
e) aproveitamento do potencial de auto-recuperação.

Parágrafo único - A não presença e/ou expressão deste potencial


de auto-recuperação adotar-se-ão as medidas previstas no artigo 2.

Art. 8° - A execução dos trabalhos de recuperação florestal


deverá observar os seguintes aspectos:
1 - O solo deverá ser preparado em consonância com a estratégia
de recuperação adotada, atentando para as recomendações técnicas
de conservação de solo, de calagem, adubação e aplicação de
matéria orgânica, com destaque para análise físico-química do
solo;
li - Avaliação do potencial de auto-recuperação dessas áreas
no que se refere: à presença ou chegada de propágulos (sementes
ou indivíduos remanescentes), oriundos do banco de sementes e
da "chuva" de sementes, dependendo da área - objeto de recuperação
e da vizinhança, em função da presença de remanescentes
florestais próximos;
Ili - Avaliação do histórico e uso atual da área, no que se refere
às práticas culturais, como alteração da drenagem do solo, retirada
ou revolvimento periódico do solo, uso de herbicidas e outros;
IV - Em situações onde for observada a regeneração natural de
espécies nativas, no pré e pós-plantio, esta deverá ser aproveitada
na recuperação da área, estimulando e conduzindo os indivíduos
regenerantes através de práticas silviculturais;
V - A área de recuperação deverá ser isolada dos fatores de
degradação;
VI - Deverá haver controle de formigas cortadeiras e de espécies
competidoras indesejáveis, especialmente gramíneas e cipós.

Art. 9° - Na recuperação de áreas de restinga, manguezais e


formações paludosas, deverá ser promovida a restauração da
hidrodinâmica no solo e, no caso de áreas com aterro, retirada ou
revolvimento anterior do solo, de suas características físico-
químicas.

Art. 1O - A Secretaria do Meio Ambiente, de forma integrada com


outras Secretarias de Estado, Universidades, Instituições
Científicas, Ministério Público, outras esferas de governo e
organizações não governamentais, estimulará o desenvolvimento
de pesquisas e extensão, bem como o aprimoramento do conhecimento
científico das medidas estabelecidas nesta resolução, visando:
1 - Ampliar os conhecimentos sobre ecologia das espécies e
formações florestais, e sobre tecnologia de produçãó de sementes
e mudas;
11 - Estabelecer modelos alternativos, visando à obtenção de
maior eficiência e menor custo, para recuperação de áreas
degradadas;
Ili - Capacitar proprietários rurais e produtores de mudas e/ou
sementes para práticas de restauração e produção, com
diversidade florística e genética, de sementes e mudas de espécies
nativas.
IV - Estimular processos de certificação de viveiros florestais,
que garantam a produção de mudas com diversidade florística e
genética.
Art. 11 - O cumprimento integral das disposições contidas nesta
Resolução deverá ser exigido nos seguintes casos:
1 - Recuperação de áreas degradadas ou reflorestamentos
exigidos como condição para a emissão de licenças ambientais por
órgãos integrantes do SEAQUA;
li - Recuperação de áreas degradadas ou reflorest211T1ent c s
exigidos com o objetivo de promover a reparação de dano
ambientais que foram objeto de autuações administrativas;
Ili - Recuperações ambientais ou reflorestamentos previ stos em
Termos de Ajustamento de Conduta firmados com a SMA;
IV - Projetos implantados com recursos públicos sujeitos à
aprovação de órgãos integrantes do SEAQUA;
§ 1° - Nos casos previstos neste artigo deverá ser exigido
projeto técnico, contendo todas as informações necessárias à sua
análise, que deverá ser anexado ao processo administrativo que
trata do licenciamento, autuação ou TAC, ou deverá ser tratado em
processo administrativo específico a critério do órgão responsável.
§ 2° - Poderão ser dispensados da apresentação de projeto
técnico, com a devida anotação de responsabilidade técnica (ART),
a recuperação de áreas com até 1 ha ou localizadas em
propriedades rurais com até 2 módulos rurais.

Art 12 - Para fins de acompanhamento e para evitar conflitos


com as atividades de fiscalização, os projetos de recuperação e
reflorestamento de áreas consideradas de preservação permanente
pela Lei Federal 4771/65 para sua implantação deverão ser
submetidos previamente ao DEPRN, independentemente da
necessidade de licenciamento ou aprovação de projeto.
Parágrafo único: O DEPRN deverá estabelecer procedimentos a
serem observados para o cumprimento deste artigo.

Art. 13 - Esta resolução entra em vigor na data de sua


publicação, revogando-se as disposições em contrário.
Organização da produção e comercialização de
produtos agro-florestais: o caso da colônia
agrícola nipo-brasileira de Tomé-Açu, Pará 1
Alfredo Kingo Oyama Homma, D.Se.
Agrônomo, Dr. em Economia Rural , Pesquisador
da Embrapa Amazônia Oriental, Belém, Pará.
E-mail: homma@cpatu.embrapa.br

1. Introdução

A experiência da imigração japonesa em Tomé-Açu e seu


modelo de desenvolvimento agrícola para as condições da região
amazônica têm despertado grande interesse da área acadêmica
(RELATOS ... ), 1967; FLOHRSCHUTZ et ai., 1983; PARÁ, 1995;
HOMMA et ai., 1995; ALUMÍNIO DO BRASIL S.A., 1997; TOMÉ-
AÇU, 1999; YAMADA, (1999). O amplo debate que se polarizou
com relação às reservas extrativistas, a partir da década de 1980,
resultou, também, na vertente que passou a enfatizar os Sistemas
Agroflorestais (SAFs) como modelo ideal para a Amazônia. Os
SAFs têm sido considerados como uma solução para promover o
desenvolvimento rural das áreas tropicais. Entre as vantagens dos
SAFs, incluem-se aquelas que promovem menores impactos
ambientais.

Os SAFs, em teoria, assegurariam a sua sustentabilidade


econômica e ambiental e com isso poderiam reduzir os desmatamentos
e queimadas e a migração de produtores na Amazônia. A queda na
produtividade seria mais lenta, reduzindo dessa forma a freqüência
da migração para novas áreas.

Os SAFs implantados na colônia nipo-brasileira de Tomé-Açu


decorreram da busca de alternativas com a disseminação do
Fusarium nos pimentais, que surgiu timidamente em 1957 e que
passou a devastar os plantios a partir da década de 1970 e da
queda de preços decorrente da expansão desordenada dos
plantios. A expansão dessa lavoura demonstrou a capacidade de
resposta dos agricultores paraenses aos sinais de mercado e

1 Esta pesquisa contou com a colaboração dos recursos do Projeto de Apoio a Desenvolvimento
de Tecnologia Agropecuária para o Brasil (Prodetab).
52

preços favoráveis. Nos anos de 1980 a 1983, o Brasil liderou a


produção mundial de pimenta-do-reino e nos anos de 1980 a 1982
e em 1984, alcançou a posição de maior exportador mundial de
pimenta-do-reino, graças à produção paraense. Em apenas
cinqüenta anos após a sua re-introdução, o Brasil ultrapassou
milenares produtores dessa especiaria, como a lndia, Indonésia e a
Malásia (RONSENGARTEN JR., 1973; PRUTHI, 1979;
PULSEGLOVE et ai., 1981). Em 1991, o Brasil alcançou a máxima
produção nacional de pimenta-do-reino, com 50 mil toneladas e,
em 1981, exportou a quantidade máxima, com quase 4 7 mil
toneladas.

A busca de alternativas econômicas fizeram com que sistemas


consorciados, em rotação e seqüencial, com cultivos perenes e
anuais fossem implantados, visando aproveitar áreas antes,
durante e depois do plantio da pimenta-do-reino (HOMMA, 1998a;
1998b). Essa profusão de culturas e combinações tornaram, com
foco no mercado, a proliferação de dezenas de SAFs nos
municípios ao redor de Tomé-Açu, ativos, desativados e outros que
desapareceram. O objetivo deste trabalho seria mostrar a dinâmica
dos SAFs, na colônia nipo-brasileira de Tomé-Açu, tendo como
eixo principal a cultura da pimenta-do-reino, cuja permanência
depende do mercado e de eventos como pragas e doenças,
realçando a importância do contínuo desenvolvimento de novas
alternativas econômicas. Há um processo de produção coletiva de
conhecimentos tecnológicos baseado através de observações e
que são democratizados entre os membros da colônia (KANIYOTI,
2000). O capital social representado pela organização em torno da
cooperativa, o nível educacional e a aglutinação para resolver os
problemas coletivos constituíram razões para superar as
dificuldades desde a implantação da colônia, em 1929 (PUTNAM,
2005).

Os ciclos econômicos na Amazônia sempre têm apresentado


uma fase de expansão, de apogeu e o seu declínio, com a
transferência de mazelas e problemas para o ciclo seguinte, sem
conseguir a sua efetiva manutenção. A existência de retardameQto
científico-tecnológico na Amazônia, a incapacidade de geraçã() de
conhecimentos para superar os problemas surgidos, a adoção de
políticas equivocadas e sujeitas a flutuações têm se constituído nas
principais limitações para a maioria dos ciclos econômicos e que
não foi diferente para o cultivo da pimenta-do-reino.

A cultura da pimenta-do-reino mostrou a capacidade de resposta


dos agricultores japoneses e brasileiros quando as condições de
preços e mercados são favoráveis. Mostrou, também, o alto custo
ambiental dessa atividade, pela contínua incorporação de novas
áreas, fugindo do espectro das doenças e do crescimento do
mercado e da grande demanda de estacas para servirem de
tutores e de práticas de conservação de solos não recomendáveis.

A região amazônica não se cansa de procurar a sua vocação


econômica, muitas têm sido as tentativas de fazer desta região
tropical um pólo de desenvolvimento agrícola . A introdução da
pimenta-do-reino na Amazônia foi uma experiência singular, que os
novos ventos do ambientalismo tendem a reavaliar, quanto à busca
de uma nova dimensão, com vistas a reduzir o seu passivo
ambiental. A plena compreensão das lições do passado são
importantes para determinar os rumos para inserir a lavoura da
pimenta-do-reino em bases mais sustentáveis.

Apesar da introdução da pimenta-do-reino em escala comercial


ser creditada aos imigrantes japoneses em Tomé-Açu, em 1933,
por Makinossuke Ussui, a sua presença no País remonta desde os
primórdios do Brasil Colônia. Em 1819, von Martius, na sua viagem
pela Amazônia no período 1818-1820, observou a existência de
pés de pimenta-do-reino nos quintais de Belém . Mas foi a partir do
final da li Guerra Mundial, com a destruição dos pimentais da
Malásia e da Indonésia e do estímulo forçado para a produção de
alimentos para atender as tropas de ocupação japonesa, é que os
preços da pimenta dispararam, levando a euforia para a colônia de
Tomé-Açu, sem precedentes, como o ciclo da pimenta-do-reino.

2. Análise e discussão

A seguir, procura-se enfocar os eventos mais importantes


ocorridos no desenvolvimento da cultura da pimenta-do-reino e na
consolidação dos SAFs e quanto à organização da produção e
comercialização de produtos agropecuários na consolidação desse
processo.
54

1926
• No dia 28 de maio, chegou, em Belém, o vapor Denis, da
Booth Line, trazendo a missão científica japonesa, chefiada por
Hachiro Fukuhara, procedentes de New York, para a escolha da
área para servir de base para a Nambei Takushoku Kabushiki
Kaisha (Companhia Nipônica de Plantações do Brasil S/A), que
ficou conhecida como Nantaku.

1928
• Em 11 de agosto, empresários japoneses, em Tóquio, liderados
pela Kanebo, criaram a Nantaku, com um capital de 1O milhões de
ienes (equivalente a US$ 4.576.000,00).
• No dia 23 de agosto, Hachiro Fukuhara partiu de Yokohama
com destino a New York, para outra coleta de informações sobre a
Amazônia e chegou em Belém no dia 7 de outubro, efetuando
gestões para a instalação da Nantaku, em janeiro de 1929, sendo o
seu primeiro presidente, com um capital registrado de 4 mil contos
de réis, começando suas atividades em 1ºde junho de 1929.
• Um grupo de japoneses partiu de Yokohama, no dia 25 de
agosto, chegando em Belém, no navio ltapura, no dia 15 de
novembro, do qual fazia parte Osamu Hoshimo, ficou encarregado
de proceder ao reconhecimento topográfico da área, a abertura de
estradas para a localização dos lotes, a hospedaria para os
imigrantes, entre outras providências, uma vez que os imigrantes
estariam chegando no ano seguinte.
• O governador Dionísio Sentes concedeu através da Lei 2.746,
de 13 de novembro, a Hachiro Fukuhara, para a imigração
japonesa, 600.000ha de terra em Acará, 400.000ha em Monte
Alegre, e três lotes de 10.000ha, em Marabá, na zona da Estrada
de Ferro de Bragança e em Conceição do Araguaia.

1929
• No dia 24 de julho daquele ano, partiu do porto de Kobe, no
Japão, o navio Montevideo Maru, chegando no Rio de Janeiro no
dia 7 de setembro. No dia seguinte embarcava no navio Manila
Maru, chegando em Belém no dia 16 de setembro, com 189
japoneses, que seguiram no barco Tefé para o município de Tomé-
Açu, chegando no dia 22 de setembro.
• Em 1º de junho, a Nantaku iniciou suas atividades em Tomé-
Açu, cujos primeiros precursores já se encontravam desde 11 de
abril. e receberam as primeiras 43 famílias de imigrantes que
partiram do porto de Kobe em 24 de julho.
• Em 27 de outubro, partiu do porto de Kobe o navio Santos
Maru, com a segunda leva de imigrantes japoneses até o Rio de
Janeiro, chegando em Belém em 19 de dezembro, pelo navio La
Plata Maru, o segundo navio fretado pela Osaka Shosen Kabushiki
Kaisha, que ancorava em Guajará, desembarcando mais 242
imigrantes, sendo 192 destinados ao Acará e 50 pessoas,
pertencentes a nove famílias, foram para Maués, Estado do
Amazonas, para trabalharem na Amazon Kogyo Kabushiki Kaisha.

1930
• Ocorreu a terceira leva de imigrantes japoneses para Tomé-
Açu, trazida pelo navio Buenos Aires Maru, perfazendo 362
famílias, em 21 viagens até o encerramento, em 1937.

1931
• Os imigrantes criam a Cooperativa de Verduras de Acará.

1933
• Em abril Makinossuke Ussui, representante da Nantaku, partiu
do porto de Kobe, no navio Hawai Maru, com a décima terceira leva
de imigrantes, e ao desembarcar em Cingapura, para cremar uma
imigrante idosa falecida à bordo, trouxe 20 mudas de pimenta-do-
reino, que daria outros rumos à agricultura na Amazônia.

1935
• Falência da Companhia Nipônica. Responsabilizando-se pelas
divergências ocorridas entre os colonos, o presidente da Companhia,
Hachiro Fukuhara, retorna ao Japão.
• Mudança do nome da Cooperativa de Verdura para Cooperativa
Industrial do Acará.
• No dia 3 de abril a Nantaku se retira de Tomé-Açu, levando ao
fechamento das fazendas de administração direta, da Estação
Experimental de Açaizal, da colônia de Monte Alegre e da Fazenda
Castanhal, bem como à abolição dos colonos em regime
assalariado e a redução do quadro de funcionários.
• Das 20 mudas conduzidas por Makinossuke Ussui, cultivadas
na Estação Experimental de Açaizal, sob os cuidados de Kozo
Yoshida, apenas duas conseguiram sobreviver. Em 1935, quando a
fazenda foi fechada pela Nantaku, com o encerramento de suas
-- -------------------

atividades em Tomé-Açu, Tomoji Kato, vindo na primeira turma de


imigrantes, e Enji Saito, que veio na segunda turma, transportaram
as mudas para seus respectivos lotes e foram os primeiros
plantadores da pimenta asiática. Estes agricultores japoneses,
Tomoji Kato, falecido em 31 de dezembro de 1956 e Enji Saito, que
suicidou-se em 4 de agosto de 1958, em São Paulo, foram os
precursores da redescoberta da pimenta-do-reino no Brasil.

1942
• Declaração de guerra entre o Brasil e o Japão em 28 de janeiro
e em 17 de abril, os bens dos imigrantes japoneses, em Tomé-Açu,
como aparelhos de rádio, embarcações, armas, livros, entre outros,
foram confiscados pelas autoridades brasileiras e a colônia foi
transformada em Colônia Estadual de Tomé-Açu (Ceta), trazendo
grandes prejuízos financeiros para os colonos japoneses. Com
isso, apenas 49 famílias permaneceram na colônia.
• Torpedeamento do navio Baependi, do Lóide Brasileiro, no dia
18 de agosto, por um submarino alemão, houve um furor popular,
onde as casas dos imigrantes japoneses, alemães e italianos foram
incendiadas e seus ocupantes foram presos, tanto em Belém
quanto em Manaus.

1945
• O preço do quilo da pimenta-do-reino subiu de 5 mil réis para
100 mil réis em 1946.

1946
• Liberação da Colônia Estadual de Tomé-Açu, pelo interventor
federal Octávio Meira.

1947
• A produção da pimenta-do-reino ocupava o terceiro lugar no
volume das vendas dos colonos de Tomé-Açu.
• Primeiro ano em que a produção de pimenta-do-reino entrou
no Relatório da Cooperativa Agrícola de Acará, posteriormente
mudado para Cooperativa Agrícola Mista de Tomé-Açu (Camta),
em 1949.
Tabela 1. Início da expansão da pimenta-do-reino no Brasil. Número de
cooperados e de pés de pimenta-do-reino e produção na
Colônia de Tomé-Açu, Pará, no período de 1947-1960.

Número 12imenteiras
Produção
Ano Cooperados Mais de 3 Menos de 3
Total (kg)
anos anos
1947 58 30.550 12.905 17.645 21 .065
1948 53 48.450 13.905 34.545 38.361
1949 59 65.490 30.560 34.930 69.338
1950 61 104.700 48.450 56.250 80.000
1951 62 176.375 65.490 110.885 294.016
1952 65 253.555 104.700 148.855 465.332
1953 78 332.655 105.370 227 .285 650.000
1954 78 443.893 176.575 267.318 800.000
1955 103 564.453 252.905 311.548 890.000
1956 103 670.443 295.057 375.386 1.200.000
1957 103 767.230 403 .613 363.617 1.800.000
1958 176 820.665 459.363 361.302 2.300 .000
1959 186 916.500 584.000 332.500 2.300.000
1960 219 1.193.800 834.900 358.900 2.368.000
Fonte: COOPERATIVA AGRÍCOLA MISTA DE TOMÉ-AÇU (1975).

1949
• A Cooperativa Industrial de Acará tem seu nome mudado para
Cooperativa Agrícola Mista de Tomé-Açu (Camta) no dia 30 de
setembro, e Henkichi Hiraga, agrônomo formado pela Universidade
de Tóquio, que chegou em 1931 e foi direto para Monte Alegre,
onde permaneceu por oito anos, foi eleito como primeiro
presidente.

1950
• O volume de venda da pimenta-do-reino com 10% na participação
global já ocupava o primeiro lugar.

1951
• Início das pesquisas com dendê, com cumaru procedente de
Cametá e de pimenta-do-reino, no IAN.

1952
• Com a grande alta nos preços da pimenta, a comunidade
japonesa conhece a era de ouro. As duas mudas iniciais de
pimenta se multiplicaram, chegando a 440 mil pés plantados
somente pelos cooperados da Camta, cuja produção anual chegou
a 800 toneladas.

O boom da pimenta-do-reino em Tomé-Açu começou a se


manifestar no segundo semestre de 1952, e entre 1953 e 1954,
quando a colônia conheceu o verdadeiro período de ouro do
chamado "diamante negro" da Amazônia (ÁLBUM ... , 1955;
COOPERATIVA ... , 1957). A li Guerra Mundial, que trouxe tantos
transtornos aos imigrantes japoneses na Amazônia, foi também
a razão desse sucesso, devido à destruição das plantações de
pimenta-do-reino e da prioridade para a produção de alimentos
básicos principalmente, na Malásia e Indonésia, pelas tropas de
ocupação japonesa.
O período que vai de 1947 até 1968 se caracterizou por uma
grande prosperidade entre os imigrantes japoneses em Tomé-
Açu e aqueles que se dedicaram ao plantio da pimenta-do-reino,
principalmente em Santa lzabel do Pará e Castanhal. Como sinal
dessa opulência, em 15 de novembro de 1954, por ocasião das
festividades do 25º aniversário da Colônia de Tomé-Açu, que
contou com a presença do governador Alexandre Zacarias de
Assunção, foi inaugurado o aeroporto Dionísio Sentes, em
Tomé-Açu, onde os principais clientes eram os japoneses
plantadores de pimenta-do-reino (ÁLBUM .. ., 1955).

1953
• Primeira exportação de 35 toneladas de pimenta-do-reino
produzidas em Tomé-Açu para a Argentina (30 toneladas) e para a
Alemanha (5 toneladas).
• Em 25 de junho partiu do porto de Kobe, no navio América
Maru, a primeira leva de 28 famílias do pós-guerra, destinadas à
colônia de Tomé-Açu.

1954
• Comemorações dos 25 anos da chegada dos colonos japoneses
em Tomé-Açu com a implantação do busto de Hachiro Fukuhara em
frente à sede da Cooperativa Agrícola Mista de Tomé-Açu (Camta).

1955
• A produção de pimenta-do-reino no Estado do Pará conseguiu
atingir a auto-suficiência nacional.

1956
• Maria Celene Cardoso de Almeida, quando de seu regresso de
um curso de especialização, em Porto Rico, introduziu no Brasil
pela Universidade Federal Rural de Pernambuco, a acerola que
seria cultivada no Estado do Pará no final da década de 1980.
• Realizou-se pela Camta a primeira exportação de pimenta-do-
reino no Estado do Pará.

1957
• Criação da Cooperativa Central dos Plantadores de Pimenta-
do-reino no Estado do Pará, que teve duração efêmera, fechando
em 1960, em face da dualidade de propósito com a Camta, cujo
número de associados cresceu de 62 em 1951, para 219 em 1960,
alcançando 271 em 1965, 314 em 1970 e 389 em 1971.
• Aparecimento do Fusarium so/ani f sp. piperis nos pimenta is
de Tomé-Açu, na localidade de Mariquita, daí ter denominado
inicialmente como mal de Mariquita.

1958
• Instalação da Colônia Agrícola Ephigênio Sales, de imigrantes
japoneses, na Estrada Manaus-ltacoatiara, para produção de
hortaliças, aves, frutas e pimenta-do-reino.

1959
• Primeira exportação de pimenta branca para os Estados
Unidos e, por volta de 1965, ocorreu aumento na produção da
pimenta branca, o que levou alguns locais a conflitos, com relação
à poluição de cursos de água.

1960
• Utilização no processo de beneficiamento e secagem de
pimenta-do-reino dos secadores, como o da Matheus Torres & Cia,
que tinha tradição na fabricação desses equipamentos para grãos.

1961
• O fitopatologista Fernando Carneiro de Albuquerque publica o
primeiro trabalho sobre pimenta-do-reino na Amazônia, enfocando
sobre a podridão das raízes e do pé da pimenta-do-reino.
60

1962
• O Decreto 1.209, de 20 de junho estabeleceu normas com as
especificações para a padronização, classificação e comercialização
da pimenta-do-reino, que seria reformulado pela Lei 6.305, de 15
de dezembro de 1975, que entrou em vigor pela Portaria 26, de 17
de janeiro de 1980.

1963
• Primeiro aparecimento do "vírus do mosaico-do-pepino", nos
pimentais de Tomé-Açu.

1964
• Comemorações dos 35 anos da chegada dos colonos
japoneses em Tomé-Açu com a implantação do busto de Sanji
Muto, o financista que acreditou na Amazônia, em frente a
Associação Cultural de Tomé-Açu.

1966
• Aparecimento da virose do Mosaico do Pepino, nos plantios de
pimenta-do-reino.
• Ocorrência dos primeiros casos de doenças nos pés de
pimenta.

1968
• Enxertia da pimenta-do-reino com Piper colubrinum Link, como
tentativa para controle das enfermidades causadas por
Phytophthora palmivora Butl. e Fusarium solani f. piperi.

1970
• Em junho, Akihiro Shirokihara obteve sementes de mamão
hawaii, desenvolvidas na University of Hawaii, da variedade
Sunrise Solo, permitindo que Azuma Maruoka, em 1971, obtivesse
a primeira safra de mamão hawaii, no Município de Santo Antônio
do Tauá.
• Introdução de novas cultivares de pimenta-do-reino pelo United
States Department of Agriculture, em Mayaguez, Porto Rico, que
seriam posteriormente introduzidas pela Embrapa Amazônia
Oriental.
1971
• Agreement Establising Pepper Community foi aberto para
assinatura em Bangkok, Tailândia, no período de 16 de abril de
1971 a 31 de agosto de 1977.
• A Indonésia foi o primeiro país a assinar a filiação para a
Pepper Community, no dia 2 de abril. A Índia e a Malásia filiaram-
se no dia 21 de abril.
• Publicação do livro Cultura da Pimenta-do-reino na Região
Amazônica por Fernando Carneiro de Albuquerque e José Maria
Pinheiro Condurú.

1972
• Fundação da Pepper Community, com o depósito do
Agreement of Establishing Pepper Community nas Nações Unidas,
no dia 26 de julho.
• A produção de pimenta bate seu recorde histórico de 5 (cinco)
mil toneladas em Tomé-Açu.
• Em novembro foi aberta a rodovia Tomé-Açu conectando com
a rodovia Belém-Brasília

1973
• Em 11 de dezembro, o Governador Fernando Guilhon inaugurou
a rodovia Tomé-Açu/Belém, quebrando a dependência do
transporte fluvial.
• Narao Tamasu e Noburu Oya introduziram diretamente do
Hawaii, sementes de mamão, efetuando um grande plantio em São
Francisco do Pará, cuja produção obtida em abril de 1974 teve
grande aceitação no mercado de Belém e a partir de 1975, no
mercado de São Paulo.

1974
• Instalação do Instituto Experimental Agrícola Tropical da
Amazônia - INATAM, pelo governo japonês, em Tomé-Açu e
reinaugurado com a presença do Ministro da Agricultura, Alysson
Paulinelli, em 1977.
• As chuvas excessivas e as pragas de solo reduzem de forma
fatal a produção da pimenta de Tomé-Açu.

1975
• As exportações de pimenta-do-reino representavam 35,02% do
62

valor das exportações do Estado do Pará. Foi a participação


máxima atingida.

1976
• Em dezembro, José Rubens Gonçalves, técnico do Ministério
da Agricultura, do Estado do Pará, em viagem à Índia, conseguiu
conduzir estacas para a Amazônia da variedade Panniyur,
adquirida de um viveirista em Trichur, desenvolvida pela Pepper
Research Station, localizada em Panniyur, Taliparamba, Estado de
Kerala.

Esta variedade se caracterizou por ter espiga mais longa


comparada com a variedade Cingapura introduzida por
Makinossuke Ussui. Em 1981, o CPATU procedeu a novas
introduções mediante consultoria do técnico indiano, P. K. V.
Nambiar, e de visita de_pesquisadores brasileiros àquele país,
permitindo alargar a base genética, antes restrita a apenas uma
variedade.

1977
• Em 28 de janeiro, foi fundada a Associação Brasileira de
Exportadores e Produtores de Pimenta-do-reino (ABEP), tendo
como primeiro presidente Mário Tocantins Lobato.

1979
• Em . 27 de junho, o deputado federal Brabo de Carvalho
apresentou o Projeto de Lei n2 1.439, visando à criação do Instituto
da Pimenta-do-reino - IPR, com sede em Belém, PA e jurisdição
sobre as Regiões Norte e Nordeste.
• Em 29 de outubro, o Presidente João Figueiredo, atendendo a
exposição de motivos do Ministro Ramiro Saraiva Guerreiro,
encaminhou mensagem ao Congresso Nacional, para se tornar
membro da Comunidade Internacional da Pimenta-do-reino, aberta
a assinatura em Bangkok, Tailândia, no período de 16 de abril a 31
de agosto de 1971. Esta mensagem foi aprovada pelo Senado
Federal em setembro de 1980, passando o Brasil a compartilhar
com a Índia, Indonésia, Malásia e Madagascar e a vigorar com a
assinatura do Decreto-Lei 86.230, de 28 de julho de 1981.
• Difusão da tecnologia de propagação de mudas de pimenta-
do-reino com estacas de um nó.
1980
• A Pepper Community, na 8ª Sessão realizada no período de 15
a 17 de setembro, em Kochi, Índia, mudou o nome para
lnternational Pepper Community.
• No dia 4 de dezembro, o Brasil passou a fazer parte da
lnternational Pepper Community.

1981
• Realização da Sixth Meeting of the lnternational Pepper
Community, Permanent Panei on Techno Economic Studies, em
Belém, no período de 7 a 11 de dezembro. Foi a primeira reunião
dessa entidade no Brasil.
• O Brasil tornou-se membro da Comunidade dos Países
Produtores de Pimenta-do-reino, com a entrada em vigor do
Decreto-Lei 86.230, de 28 de julho, assinado pelo Presidente João
Figueiredo e o Ministro das Relações Exteriores Ramiro Saraiva
Guerreiro.
• Distribuição de mudas de pimenta-do-reino Bragantina BR-01 e
Guajarina BR-02 aclimatadas a partir de mudas da variedade
Panniyur.
• No final do ano, Belém sediou a 7ª Reunião da lnternational
Pepper Community e, no período de 19 a 22 de outubro de 1982, a
1Oª Reunião da lnternational Pepper Community, que se repetiu em
1990 e em 1995.

1982
• A produção de pimenta-do-reino no Estado do Pará alcançou a
posição de primeira produtora e exportadora mundial desse
produto.
• Realização do encontro da lnternational Pepper Community,
Permanent Panei on Techno Economic Studies, no Rio de Janeiro.
• O Ministro da Agricultura Amaury Ângelo Stabile aprova as
Normas de Sanidade, Qualidade e Embalagem de Pimenta-do-
reino, através da Portaria 112, de 1O de maio.
• Presença de Salmonel/a oranienburg na pimenta-do-reino
brasileira importada pela Noruega.
64

Os ciclos econômicos da pimenta-do-reino

O ciclo econômico da pimenta-do-reino é composto por oito


fases, conforme figura 1.

Primeira fase - Apesar de ser uma cultura introduzida desde


1933, pelos imigrantes japoneses na colônia de Tomé-Açu, teve o
seu crescimento acelerado a partir da década de 1950 favorecido
pelo mercado de pós-guerra, devido a destruição dos pimentais do
Sudeste Asiático pelas tropas de ocupação japonesa. Caracteriza-
se pelo monocultivo e por ser plantio exclusivo de colonos
japoneses e seus descendentes e dos altos preços internacionais.
O cultivo da pimenta-do-reino inaugurou a agricultura de NPK e de
mecanização agrícola na Amazônia, antes voltada basicamente
para a coleta de produtos extrativos e de roça de derruba e queima.

Segunda fase - Na década de 1960, a economia da pimenta-


do-reino teve forte impulso face a democratização da cultura com o
crescimento de médios e grandes agricultores brasileiros e sua
expansão no Nordeste Paraense, nas margens das estradas
existentes, em especial na Micro-região Bragantina. O aparecimento
do Fusaríum, em 1957, teve conseqüências no processo produtivo,
causando a redução da vida útil dos pimentais e implicando na sua
constante renovação e a procura de novas áreas. As principais
características da segunda fase foram a democratização do cultivo
da pimenta-do-reino entre os produtores locais, a redução da vida
útil das pimenteiras decorrentes da expansão do Fusaríum, a
mudança espacial das áreas de plantio a medida que doença se
expandia, mantendo-se pimentais em produção e pimentais em
crescimento visando a sua substituição e a convivência com a
doença.

Terceira fase - O período que vai de 1970-1978, que antecedeu


ao segundo choque do petróleo, apresentou algumas características
bem distintas (STANIFORD, 1973a, STANIFORD, 1973b,
NOGUEIRA, 1973; TSUKAMOTO, 1973; TSUCHIDA, 1978). Houve
um interesse muito grande pelos produtores no sentido da
diversificação das atividades, havendo a introdução e a expansão
de culturas como o mamão hawai e o melão, bem como de plantios
de cacau, maracujá, dendê, entre as principais (HOMMA &
MIRANDA FILHO, 1979; NASCIMENTO & HOMMA, 1984 ). A
política agrícola em vigor favorecia com crédito rural e aquisição de
insumos agrícolas a juros subsidiados. Mesmo a despeito da
expansão do Fusaríum, a produção de pimenta-do-reino
apresentava grande crescimento.

Quarta-fase - A marca dominante deste período ( 1978-1982) é


que o Brasil chega a ser o primeiro produtor mundial de pimenta-
do-reino bem como o maior exportador (TAKETA, 1982;
FLOHRSCHUTZ, 1983). No setor produtivo, como reflexo da
conjuntura econômica nacional e mundial, os preços da pimenta-
do-reino começam a decrescer, sobem os preços dos insumos
agrícolas, bem como a redução do crédito rural. Outros reflexos no
setor produtivo se fazem sentir com a adoção da pecuária, de
culturas alimentares e, na Microrregião Bragantina, da expansão do
algodão.

Quinta fase - No período que vai de 1982 a 1987, com os


baixos preços no mercado internacional e as mesmas limitações do
período anterior, as altas taxas inflacionárias levaram a estagnação
do setor, sobretudo no segmento de médios e grandes produtores
de pimenta-do-reino. Este aspecto fez com que a produção de
pimenta-do-reino apresentasse um decréscimo na produção e na
exportação. O cacau e o mamão atingem o máximo de participação
no valor da produção comercializada, em 1983, com 19,42% e
14,16%, respectivamente {Tabela 1).

Sexta fase - Compreende o período de 1988 a 1991, com a


continuação do quadro recessivo nacional, a expansão dos
pimentais envolveu o segmento de pequenos produtores, que
dependendo de mão-de-obra familiar e da pouca utilização de
insumos modernos, apresentava alguma competitividade
(TSUNODA, 1988; UNE, 1988; BARROS, 1990; SUBLER & UHL,
1990). A cultura da pimenta-do-reino se transformou, como se
fosse uma agricultura de subsistência e desaparecendo com a
entrada do Fusaríum, nas diversas áreas espaciais. Um fato
importante a destacar é que apesar da crise, a produção e a
exportação de pimenta-do-reino atingem novo recorde mundial em
1991, idêntico àquele verificado em 1982.

Sétima fase - Período que vai de 1992 a 1999 que se


caracteriza pela crise no setor decorrente dos baixos preços
66

internacionais. Os grandes produtores passam a negligenciar em


tratos culturais, levando ao abandono de pimentais, abrindo espaço
para pequenos produtores que apresentam maior capacidade de
sobrevivência (MARGOLIS, 1992). Em 1993, o valor da produção
comercializada de pimenta-do-reino atinge o menor valor de
participação, com 12, 17% (Tabela 2). As pressões ambientais
começam a refletir na expansão das pimenteiras afetando a
incorporação de novas áreas de floresta densa e da obtenção de
moirões. Um fato novo que passa despontar é o avanço da
fruticultura face à visibilidade das frutas amazônicas no contexto
nacional e internacional, proporcionada pela questão ambiental. A
produção comercializada de maracujá, em 1993, atinge o seu
apogeu com 49,94%, e de acerola, em 1994, com 26,10%.

Oitava fase - A partir de 2000, ocorre a alta de preços da


pimenta-do-reino decorrente da desvalorização cambial de 14 de
janeiro de 1999. Há um recrudescimento nos financiamentos de
novas áreas de pimentais no Estado do Pará, com recursos do
FNO, que passaram a ter reflexos nos anos subseqüentes
(HOMMA, 2003). Os altos preços da pimenta-do-reino trazem
insegurança aos produtores decorrentes de roubos nas
propriedades e durante o transporte da pimenta-do-reino e, até de
assassinatos de produtores japoneses. Os pequenos produtores de
pimenta-do-reino passam a incorporar cultivos de fruteiras perenes,
como o cacaueiro, o cupuaçuzeiro e açaizeiro, bem como fruteiras
anuais como o maracujazeiro, aproveitando as estacas das
pimenteiras, antes ou após a morte das pimenteiras. O destaque no
valor da produção comercializada é para a polpa de cupuaçu
(27,04%) e polpa de açaí (19,59%), em 2000 (Tabela 2). A busca
de novas alternativas futuras dizem respeito com a expansão de
bacurizeiros e uxizeiros enxertados, que deverão tornar-se
novidades para as próximas décadas.

1982
• Retidas 13 partidas de pimenta-do-reino contaminada pela
Salmonella .

1985
• Recuperação dos preços, voltando-se à época dourada da
pimenta. Os produtores se beneficiam muito com isso e a Camta se
ergue novamente.
• Onze das 26 partidas de pimenta-do-reino analisadas pelo
governo americano apresentaram 42% de contaminação pela
Salmonella.
• Laboratórios do American Spice Trade Association (Asta) e do
Tropical Development and Research lnstitute (TDRI) registraram
incidência de 40% de todas as partidas de pimenta-do-reino
brasileira.

1986
• A partir de janeiro todas as partidas de pimenta-do-reino
brasileira ficam sujeitas à retenção automática nos Estados Unidos,
sendo liberado depois da descontaminação.

1987
• Em fevereiro, a Delegacia Federal de Agricultura do Estado do
Pará promove uma reunião para resolver o problema da
contaminação de pimenta-do-reino pela Salmonella.
• Presença de Salmonella em partida de pimenta-do-reino
exportada pelo Brasil.

1989
• O Conselho Nacional do Comércio Exterior, através da
Resolução 176, de 27 de junho, aprova as normas gerais para
padronização, classificação e fiscalização da pimenta-do-reino
destinada à exportação.

1990
• Realização da 18th Session and Meeting of Pepper Exporters-
lnternational Pepper Community, Belém, Pará, no período de 3 a 8
de dezembro.

1992
• Adesão da Tailândia na lnternational Pepper Community, no
dia 23 de dezembro, bem como de Sri Lanka e Micronésia na 20ª
IPC Session, realizada em Madras, Índia, no período de 20 a 21 de
agosto, como Associate Members.
• Aparecimento do Fusarium oxysporum Schel, Fr. nos pimentais
dos Municípios de Tomé-Açu, Santa lzabel do Pará e, mais tarde
em Capitão Poço.
68

1993
• Realização do I Seminário sobre a Cultura da Pimenta-do-
reino, no período de 9 a 11 de dezembro, promovido pela Embrapa
Amazônia Oriental e Associação Brasileira dos Produtores e
Exportadores de Pimenta-do-reino (Abep ).

1994
• No dia 28 de janeiro, o Governador Jader Barbalho concedeu a
isenção de 13% do ICMS, através do Decreto 2.278, que foi
prorrogado no dia 21 de dezembro, no final do governo de Carlos
Santos, pelo Decreto 3.147.

1995
• A tradicional Escola de Samba de Belém, o Rancho Não Posso
me Amofiná, consagrou-se campeã do Carnaval de 1995, com uma
apologia sobre a pimenta-do-reino introduzida pelos imigrantes
japoneses.
• Realização do 23ª Encontro da lnternational Pepper Community,
Permanent Panei on Techno Economic Studies em Belém, no
período de 7 a 11 de agosto.
• Estabelecimento da Organização Mundial do Comércio no dia
1º de janeiro, com a participação inicial de 76 países.
• Em novembro, o Ministério da Agricultura oficializou uma
comissão multi-institucional para resolver o problema da
contaminação de Salmonella na pimenta-do-reino.

1996
• Realização o Seminário Internacional sobre Pimenta-do-reino e
Cupuaçu, no período de 17 a 19 de dezembro, na Embrapa
Amazônia Oriental, patrocinado pela JICA, em Belém, Pará.

1997
• No período de 31 de maio a 2 de junho, visita do imperador
Akihito e da imperatriz Michiko, a Belém, para reverenciar os
imigrantes japoneses na Amazônia.
• Acordo de cooperação entre os governos da República
Dominicana e do Japão. Em 15 de agosto, iniciaria o treinamento
de técnicos daquele país sobre pimenta-do-reino no Brasil.
(X1000t)

..
• Policult1vo
(~::~
Me lão
Maracujá:
• Facilidade de Crédito
• Q-a mie expansão da à rea
• Largho uso de insumos

1• FASE ~FASE ~FASE 6" FASE

•Monocuíl ivo • Democratizaçáo da culllra


• Produbres japoneses • Redução davidaU11
• Enfoque 'problema doença'
· Mudança espacia l
• Convivência com a doença
, Pimenb l de risco e expansão
, Mercado em baixa
• Custo de insumos alto
, Redução de crédib
...,
• Mu<lançadea 6vklade
• Algod,O • Me<cadoem baixa
• Pecuária , Custo de insumos alto
-Cu lturas alimentares • Polit'Ca cambial
• h l açtlo elevada
12 •Juros elevados
I
8 6 4 2
" - - - Produção (Pará)
- - - Exportação (Brasil)
•Mercacloembaixa
• Cusbde insumos alto
• Alanço frut'culUra
• Pequenos produtores
• Desva 'ii zação ca mbla 1
• Roubo pimenta
·Mora expansão

• Crise ambiental

O 1 00 51 6 63 64 5 6 7 6 69 1 2 3 4 5 6 7 8 9 O 1 92 93
A NO
Figura 1. Fases da cultura da pimenta-do-reino no Estado do Pará e suas principais características.
....
e:
Tabela 2. Percentagem na participação do valor da produção comercializada entre os cooperados da CAMT A, 1974-
1989.
1974 1975 1976 1977 1978 1979 1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989
Pimenta
99,17 96,1 7 89,58 78,98 77,21 76,84 73,04 70 ,41 49,90 46,71 66,59 75,84 79,14 78,42 82,07 80,75
reino
Maracujá 0,03 2,22 4,56 11 ,03 16,78 11 ,63 6,66 6,06 14,16 13,80 7,50 5,28 7,73 7,25 7,20 7,27
Cacau 0,47 0,95 1,26 6,16 4,15 8,06 15,02 14,37 13,89 19,42 14,65 12,19 7,97 10,52 7,61 6,49
Melão 0,33 0,66 4,43 3,30 0,99 1,25 0,27 0,38 0,97 0,51 0,20 0,16 0,06 0,01
Mamão 0,17 0,53 0,69 0,86 2,99 4,78 11 ,97 14,16 6,80 2,48 0,93 0,55 0,29 0,38
Pimentão 0,18 0,54 0,34 0,82 1,15 0,79 0,17 0,37 0,15 0,05
Ovo 0,91 0,92 1,06 1,04 0,54 0,51 0,75 0,45 0,36
Fei ão 0,68 0,82
Milho 2,71 0,13
Borracha 0,80 0,67 1,12 0,96 0,59 0,66 0,23
CueuaS:U 0,12 0,26 0,31 0,45 0,96 1,23 3,00
Limão 0,06 0,63 0,61 0,46 0,31 0,68
Dendê 0,40
Acerola
Cardamono
Baunilha
Guaraná 0,36 0,38 0,27 0,25
Abóbora 0,55 0,47 0,55
Graviola 0,34 0,14 0,32 0,33
Abacate 0,12 0,03 0,04
Pe ino 0,13
Outros 0,82 0,77 1,58 3,37 2,10 0,60 0,22 0,11 0,56 0,58 0,80
TOTAL 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00
Fonte: HOMMA et ai., (1995) para o período 1974-1994.
• Na 25ª IPC Session realizado em Kochi, no período de 1O a
11 de outubro, foi aprovada a inclusão de Sri Lanka como membro
integral. Nessa reunião, foi aprovada a inclusão de Papua New
Guiné como Associate Member.
• Em julho, tem início o Programa de Detecção e Descontaminação
da Bactéria Salmonella em Pimenta-do-reino.

1998
• Adesão da Papua New Guinea, na lnternational Pepper
Community, na 25ª IPC Session realizado em Kochi, Índia, no
período de 1O a 11 de outubro.
• Na 26 ª IPC Session realizada em Kuta, Bali, no período de
26 a 29 de outubro, foi discutida a reformulação do IPC com a
inclusão de todas as especiarias e com o nome lnternational Spice
Community (ISC).
• No período de 4 a 5 de julho, foi realizado o Primeiro Encontro
Estadual para Avaliação do Programa de Detecção e
Descontaminação da Bactéria Salmonella em Pimenta-do-reino,
em Bragança.

1999
• No período de 12 a 13 de maio, é realizado a reunião sobre a
Pimenta-do-reino, em Belém, Pará, promovido pelo Ministério da
Agricultura e do Abastecimento.
• O Governador Almir Gabriel, através do Decreto 3.720, de 8
de novembro, concede Medalha da Ordem do Mérito Grão-Pará,
no Grau Oficial pós-mortem para Enji Saito e Tomoji Kato, pelos
trabalhos com a pimenta-do-reino e a Ryota Oyama pela
aclimatação da juta, por ocasião das comemorações do 70 anos
da imigração japonesa no Pará.
• Grande alta nos preços da pimenta-do-reino culminando com
expansão dos plantios e de assaltos aos produtores.
• O Ministério da Agricultura e do Abastecimento, através da
Portaria 30, de 3 de maio, publicada no Diário Oficial da União de
1O de maio, determina que a partir de 1º de maio de 2000, toda
pimenta-do-reino exportada deve estar acompanhada do
Certificado Fitossanitário e da Declaração Adicional, garantindo o
produto livre de Sa!monella.
72

2001
• No dia 14 de agosto, os dirigentes da Associação Brasileira
dos Exportadores e Produtores de Pimenta-do-reino solicitaram ao
Governo Estadual o aumento da cota do uso de energia elétrica
decorrente do aumento da safra de pimenta-do-reino estimada em
30%, em relação ao ano anterior
• No período de 29 de outubro a 3 de novembro, foi realizado
em Belém, a 29ª Reunião da lnternational Pepper Community.

2002
• No dia 11 de outubro, acontece o "I Festival da pimenta-do-
reino", no Município de Baião, Estado do Pará, com comentários
sobre fusariose e murcha amarela.
• Em 03/07 a Asahi Foods Co Ltd. entra com o pedido de
patente do processo de extração de gordura de sementes de
cupuaçu, desenvolvido por Nagasawa Makoto e Numata Hiroyuki,
plagiando técnica desenvolvida pela Embrapa Amazônia Oriental
desde 1982.

2003
• No dia 9 de janeiro, a organização não-governamental
Amazonlink descobre o registro de cupuaçu pela Asahi Foods,
fazendo com que o Grupo de Trabalho Amazônico (GTA),
Amazonlink, APA Flora e outros, protocolassem em 20 de março,
o seu cance-lamento.

2004
• No dia 01/03, o Escritório de Marcas do Japão (JPO) em
Tóquio cancelou o registro como marca comercial do cupuaçu,
solicitado pela multinacional japonesa Asahi Foods.

3. Considerações finais

Procurou-se, através do exemplo dos agricultores nipo-


brasileiros de Tomé-Açu, tirar ilações a respeito do tema
Organização da Produção e Comercialização de Produtos
Agropecuários. Deve-se mencionar que a organização da
produção e da comercialização não foram feitas artificialmente,
mas decorreram de um longo aprendizado, favorecida pelas
características culturais dos agricultores nipo-brasileiros. É
interessante mencionar que o espírito cooperativo está presente
nos pequenos agricultores, ribeirinhos , extrativistas, posseiros,
entre outros, pela prática do mutirão e troca de dias que tende a
se desagregar quando assume caráter formal.

No contexto econômico, os SAFs adotados pelos agricultores


nipo-brasileiros em Tomé-Açu não devem ser analisados em um
corte seccional. O atual estágio constitui uma fase do processo
evolutivo, cujas origens remontam desde o início das suas
atividades em 1929. O desenvolvimento de determinadas culturas,
o crescimento do mercado para produtos específicos, o
aparecimento de pragas e doenças, a constante busca de novas
alternativas, a atitude positiva quanto ao risco e, sobretudo, a
organização dos produtores, constituem possíveis relações de
causa-efeito que culminaram no atual processo produtivo. O eixo
indutor dessas mudanças parecem estar relacionadas com o
sucesso e os proble-mas decorrentes, posteriormente, com a
cultura da pimenta-do-reino. O desenvolvimento dos SAFs não
decorreu de uma política implícita, mas das perspectivas de
mercados e da estratégia de utilização das terras. Muitos SAFs
existentes não apresentam nenhuma importância econômica ou já
foram importantes no passado ou são incompatíveis em termos de
utilização de mão-de-obra.

Pode-se observar que as mudanças nos SAFs estão


estritamente vinculadas aos preços da pimenta-do-reino, como
uma das causas. Os baixos preços da pimenta-do-reino e a
disseminação do Fusarium levaram os produtores a procurarem
novas alternativas econômicas. A crise nessas novas alternativas
fazem com que os produtores estejam sempre atentos a novas
mudanças. Dessa forma, no futuro, outras atividades
completamente distintas poderão ocupar o espaço das atuais
culturas (baunilha, uxi, bacuri, pau-rosa, noni, etc). As atividades
dos colonos envolvem mais de trinta produtos em diversas
combinações, onde os produtores se especializam para
determinados processos produtivos.

Estes aspectos empíricos levam a indicar que os SAFs estão


em constante transformação . Não existe um SAF, mas um
conjunto de SAFs que no decorrer do tempo, com as
transformações do mercado, dos preços dos produtos, pragas e
doenças, entre outros, fazem com que os produtores promovam
74

constantes mutações ao longo do tempo. Os SAFs não podem ser


considerados como opção permanente, mas adequando-se para
cada categoria de produtores. A sustentabilidade dos SAFs não
pode ser considerada apenas endogenamente, mas também
levando em conta as trocas exógenas efetuadas. O episódio
envolvendo o registro da marca cupuaçu pela multinacional
japonesa Asahi Foods, cujo cancelamento ocorreu em 1º de
março de 2004, evidencia quanto às precauções nas exportações
de produtos amazônicos, com cláusulas que estabeleçam direitos
de propriedade a curto e a longo prazos.

A alegada importância de se colocar os produtos não-


madeireiros, a organização de sua extração e comercialização
como maneira de promover o desenvolvimento de maneira ampla
para a Amazônia apresenta grandes limitações. O limite da oferta
extrativa para atender ao crescimento do mercado, custo de
produção mais elevado do que os plantios racionais e a extração
econômica nem sempre garante a sustentabilidade biológica e
vice-versa. Esta mesma assertiva seria válida para os produtos
orgânicos, que devem ser vistos como nichos de mercado. Estas
agendas ditas positivas não podem ser efetuadas em detrimento
do conjunto maior de produtores e de uma sustentabilidade
egoísta, efetuada de forma exógena em vez de endógena. A
carência de infra-estrutura, onde, por exemplo, no Estado do Pará,
apenas 12% das estradas federais, estaduais e municipais estão
asfaltadas e 39% das propriedades rurais dispõem de energia
elétrica, constituem barreiras ao desenvolvimento de agroindústrias
e conseqüente organização da produção e comercialização de
produtos. A dimensão dos mercados desses produtos constitui,
também, limites para a expansão dos SAFs em grande escala na
Amazônia, como a de promover a recuperação de áreas alteradas,
no Mecanismo de Desenvolvimento Limpo.

4. Referências
ÁLBUM comemorativo do 252 aniversário de fundação da Colônia de
Tomé-Açu, Estado do Pará, 1929-1954. Tomé-Açu: Cooperativa Agrícola
Mista de Tomé-Açu, 1955.

ALUMÍNIO DO BRASIL S. A. O sol nascente na Amazônia. Rio de


Janeiro: 1997. 91p.
BARROS, S.M. Sustainability and social adaptation in the Brazilian
Amazon : the Japanese of Tomé-Açu, 1929-89. Berkeley: University of
California, 1990. 93p. Tese Mestrado.

COOPERATIVA AGRÍCOLA MISTA DE TOMÉ-AÇU. Roteiro ilustrado


da Colônia de Tomé-Açu. Tomé-Açu, 1957. 52p.

FLOHRSCHUTZ, G.H.H. Análise dos estabelecimentos rurais do


município de Tomé-Açu, Pará; um estudo de caso. Belém: Embrapa-
CPATU, 1983. 44p. (Embrapa-CPATU. Documentos, 19).

FLOHRSCHUTZ, G.H.H.; HOMMA, A.K.O. ; KITAMURA, P.C.; SANTOS,


A.I.M. O processo de desenvolvimento e nível tecnológico de
culturas perenes: o caso da pimenta-do-reino no nordeste paraense.
Belém: CPATU, 1983. (EMBRAPA-CPATU. Documentos, 23)

HOMMA. A.K.O. A civilização da pimenta-do-reino na Amazônia. ln:


HOMMA, A.K.O (ed .). Amazônia: meio ambiente e desen-volvimento
agrícola. Brasília: EMBRAPA-SPI, 1998. p.61-91.

HOMMA, A.K.O. A imigração japonesa na Amazônia, 1915-1945. ln:


HOMMA, A.K.O (ed.). Amazônia: meio ambiente e desenvolvimento
agrícola . Brasília: EMBRAPA-SPI, 1998. p.1-31.

HOMMA, A.K.O. História da agricultura na Amazônia: da era pré-


colombiana ao terceiro milênio . Brasília: Embrapa Informação
Tecnológica, 2003 . 274p.

HOMMA, A.K.O.; MIRANDA FILHO, L. Análise da estrutura produtiva


da pimenta-do-reino no Estado do Pará, 1977/78. Belém: Embrapa-
CPATU, 1979. 68p. (Embrapa-CPATU. Comunicado Técnico, 20).

HOMMA, A.K.O.; WALKER, R.T.; CARVALHO , R.A.; FERREIRA, C.A.P.;


CONTO, A.J.; SANTOS, A.I.M.; SCATENA, F.N . Dinâmica dos sistemas
agroflorestais : o caso dos agricultores nipo-brasileiros em Tomé-Açu,
Pará . ln: COSTA, J.M.M. (org.). Amazônia: desenvolvimento
econômico, desenvolvimento sustentável e sustentabilidade de
recursos naturais. Belém: UFPa/NUMA, 1995. p.37-56.

KANIYOTI, D. Modernization without the market? The case of the Soviet


East. ARCE, A. & LONG, N. (ed.). Anthropology, development and
modernities. New York: Routledge, 2000. p.52-63.

MARGOLIS, M. The last new world: the conquest of the Amazon


frontier. New York: W. W. Norton, 1992. 367p.
NASCIMENTO, C.; HOMMA, A. Amazônia : meio ambiente e tecnologia
agrícola. Belém: Embrapa-CPATU, 1984. 282p. (Embrapa-CPATU.
Documentos, 27).

NOGUEIRA, A.R. Considerações gerais sobre imigração japonesa para


o Estado de São Paulo entre 1908 e 1922. ln: SAITO, H.; MAEYAMA, T.
Assimilação e integração dos japoneses no Brasil. Petrópolis: Vozes,
1973. p.56-68.

PARÁ. Governo do Estado. Arigatô. Belém: Secretaria de Estado de


Cultura. 1995. 248p.

PRUTHI, J.S. Spices and condiments. New Delhi : National Book Trust,
1979. 269p.

PULSEGLOVE, J.W.; BROWN, E.G.; GREEN, C.L.; ROBBINS, S.R.J .


. Spices. New York: Longman, 1981. v.1. 439p.

PUTNAM, R.D . (4 ed .). Comunidade e democracia: a experiência da


Itália moderna . Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 2005. 260p.

RELATOS históricos da Cooperativa Agrícola Mista de Tomé-Açu.


Belém, 1967.

RONSENGARTEN Jr., F. The book of spices. New York: Piramid


Books, 1973. 4 75p.

STANIFORD, P. Competição e conflito entre os imigrantes japoneses em


uma comunidade no Norte do Brasil. ln: SAITO, H.; MAEYAMA, T.
Assimilação e integração dos japoneses no Brasil. Petrópolis: Vozes,
1973. p.346-357.

STANIFORD, P. Nihon ni itemo sho ga nai. ln: SAITO, H.; MAEYAMA, T.


Assimilação e integração dos japoneses no Brasil . Petrópolis: Vozes,
1973b. p.32-55.

SUBLER , S.; UHL, C. Japanese agroforestry in Amazonia: a case study


in Tomé-Açu, Brazil. ln: ANDERSON, A. B. ed. Alternatives to
deforestation: steps toward sustainable use of the Amazon rain forest.
New York: Columbia University Press, 1990. p.152-166.

TAKETA, G.S. Experiências práticas de consórcio com plantas perenes


no município de Tomé-Açu, Pará. ln: SIMPÓSIO SOBRE SISTEMAS DE
PRODUÇÃO EM CONSÓRCIO PARA EXPLORAÇÃO PERMANENTE
7DOS SOLOS DA AMAZÔNIA, 1980, Belém. Anais. Belém: Embrapa-
CPATU, 1982. p.213-226 . (Embrapa-CPATU. Documentos, 7).
TOMÉ-AÇU. Edição comemorativa de 70 anos da Imigração Japonesa
em Tomé-Açu. [S.l.:s.n.], 1999. 14p.

TSUCHIDA, N. The Japanese in Brazil, 1908 - 1941. Los Angeles:


University of California, 1978. 398p. Tese Doutorado.

TSUKAMOTO, T. Sociologia do imigrante: algumas considerações sobre


o processo migratório. ln: SAITO, H.; MAEYAMA, T. Assimilação e
integração dos japoneses no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1973. p.13-31.

TSUNODA, F. Canção da Amazônia: uma saga na selva. Rio de


Janeiro: Francisco Alves, 1988. 185p. (Coleção Romance).

UNE, M.T. Pimenta-do-reino no Estado do Pará: uma avaliação dos


efeitos da tecnologia sobre a produtividade. Revista Brasileira de
Geografia, Rio de Janeiro, v.50, n.2, p.75-98, abr/jun. 1988.

YAMADA, M. Japanese immigrant agroforestry in the Brazilian


Amazon: a case study of sustainable rural development in the tropics.
University of Florida, 1999. 821 p. (Ph.D. Thesis).
Sistemas Agroflorestais, monitoramento e
contexto de sustentabilidade 1
Saulo Barbosa Lopes
Engº. Floresta l, MSc. Pesquisador da Fu ndação
Zoobotânica do Rio Grande do Sul.
E-mai l: barbosa lopes@fzb .rs.gov.br

1. Introdução

Sempre se diz que os Sistemas Agroflorestais (SAFs) são mais


sustentáveis que os sistemas agrícolas convenci onais. Para tanto ,
vários argumentos, comparações e dados são utilizados para
sustentar esta hipótese. Mas será que são mesmo? Será que na
prática eles se comportam como nos nossos experimentos?
Quando os fatores sociais e organizacionais se somam aos
econômicos e ecológicos, sem que possamos controlá-los e
separá-los, o que acontece?

Estas indagações foram o ponto de partida de nossas


investigações, na tentativa de operacionalização do conceito de
sustentabilidade. Utilizando-se um conjunto de indicadores e
compondo um Índice de sustentabilidade, foram analisados e
comparados seis sistemas agroflorestais em utilização na região
dos vales dos Rios Caí e Taquari, no Rio Grande do Sul.

Objetivou-se fazer uma análise comparativa da sustentabilidade 2


dos sistemas agroflorestais estudados, levando em consideração o
contexto no qual os mesmos são desenvolvidos (condicionantes
técnicos, ambientais, econômicos e organizacionais, dados em
função dos arranjos institucionais3 utilizados) diferenciando padrões
e caracterizando especificidades determinantes da maior ou
menor sustentabilidade dos sistemas estudados.

1 Para maiores detalhes ver Lopes, 2001 e 2002.


2 A noção de sustentabilidade que orienta os propósitos deste trabalho identifica-se com a
visão alternativa à noção neocl ássica de desenvolvimento que, a exemplo de Altieri
(1995) e Fernandez (1995), opõe-se à idéia de uniformização ecológica, cultural e
tecnológica, mas afi rma a manutenção da produtividade e resiliência dos sistemas, com
equid ade na di visão de beneficias.
3 Conjunto de instituições com o qual determinada empresa , organização ou unidade de
produção re lacion a-se para desenvolve r suas ativid ades, conformando parcerias que
viabilizam e potencializam seus obj etivos e resultados.
ou

2. Metodologia

O método utilizado compõe-se dos seguintes procedimentos:


• caracterização da região e da estrutura e funcionamento dos
sistemas de produção, a partir de dados secundários e com
auxílio de entrevistas estruturadas;
• composição dos indicadores e plotagem dos gráficos tipo
radar (ver Figura 1); •
• envolve uma etapa de padronização estatística, para el iminar
os efeitos de diferenças de escala e de unidades de medida e a
soma de uma constante de valor 5, para eliminar valores
padronizados iguais ou menores que zero, uma vez que a média
harmônica, utilizada para o cálculo do Índice de Sustentabilidade,
não tolera valores iguais a zero ou negativos.

1 1. Manejo do sistema de produção


2. produtividade da terra
10 2
3. produtividade do trabalho
---, 4. resiliência econômica
9 1 3 5. relações com os mercados
6. renda líquida
7. qualidade do solo (visão do agricultor)
8 4
8. impactos em outros sistemas
1 9. tomada de decisões na propriedade
7 5
1O. participação comunitária e institucional
6 1O. participação comunitária e institucional
Figura 1. Indicadores utilizados e exemplo de gráfico tipo radar que
representa os valores dos indicadores.

Os indicadores são compostos a partir da valoração de


aspectos relacionados às práticas produtivas, econômicas,
ambientais e organizacionais de cada exploração. E cada gráfico
é composto de dez indicadores de sustentabilidade, cada qual
com seus descritores específicos (ver Anexo 1).

• cálculo dos Índices de Sustentabilidade (IS), a partir da média


harmônica dos valores médios (padronizados) registrados por
indicador;
• classificação das unidades de produção em grupos por
sistemas agroflorestais e arranjos institucionais, e análise
comparativa a partir dos índices e padrões de sustentabilidade
verificados.
Os indicadores escolhidos para a análise proposta situam-se
em quatro diferentes perspectivas da sustentabilidade, conforme o
esquema mostrado na Figura 2, abaixo:

Indicadores
"~ Indicadores
9 e 10
1, 2 e 3
T, .
ecmco-
\
produtiva

\ . Ambiental Econômica 1

Indicadores
7e8
/ Indicadores
4, 5 e 6

Figura 2. Distribuição dos indicadores em dimensões da


sustentabilidade

3. Resultados e discussão

Nas Tabelas 1 e 2, pode-se observar as médias harmônicas


dos indicadores, destacando-se em negrito os valores máximos e
em sublinhado os valores mínimos relativos a cada indicador
utilizado.

Destacam-se na tabela acima os sistemas Acácia


negra/Eucalipto + melancia; Citros + espécies florestais nativas e
Acácia/Eucalipto + gado, os quais apresentam os melhores
resultados, seguidos de perto pelo sistema Citros + cultivas de
subsistência.

Estes, não só apresentam maiores Índices de Sustentabilidade


pelo método utilizado, como também apresentam os padrões mais
equilibrados, com os pontos mais fortes e mais fracos distribuídos
entre as diversas perspectivas de sustentabilidade consideradas
(Figura 3).
82

Tabela 1. Resultados por Sistema Agroflorestal


Médias por SAF

s s t e m a
Indicador
Acácia / Acácia / Acácia / Citros + .
1· t 1· t - t fl t . C1tros + Erva-mate +
euca Ip o+ euca Ip o euca 1Ip o ores ais S b C . S b • t· ·
Subsistência +Melancia + Gado nativas u sis encia u sis encia
1 (manejo
do sistema
4,66 5,36 4,58 5,24 5,03 4,76
de produ-
ão
2 (produtivi-
dade da 4,96 4,76 4,81 5,91 5,12
terra
3 (produtivi-
dade do tra- 4,82 5,48 5,67 5,10 4,62 4 44
balho
4 (resiliên-
cia econô- 4,65 5,59 5,15 4,54 4 48 4,83
mica
5 (relações
com os 4,88 5,01 4,85 4J3 4,91 4,72
mercados)
6 (renda
4,93 5,77 5,60 4,81 4,60 4 41
líquida)
7 (qualidade
4,94 4,33 5,94 5,20 5,03
do solo)
8 (impactos
em outros 5,01 5,12 4,75 4,57 4,92
sistemas
9 (tomada
de decisões
4,66 5,11 4,80 5,01 4, 57 4,91
na proprie-
ade
1O (partici-
pação co-
4,69 4,88 4,21 5,45 5,22 4,76
munitária e
institucional)
IS 4,69 5,17 4,87 5, 11 4,82 4,73

O sistema espécies florestais exóticas + melancia apresenta o


melhor índice de sustentabilidade. apesar de ser um sistema que,
como se sabe, utiliza insumos químicos como condicionante de
produção, devido a sua suscetibilidade a pragas e moléstias, o
que lhe confere um baixo desempenho na dimensão ambiental.
Para alcançar o maior Índice de Sustentabilidade, então, apóia-
se no bom desempenho econômico do componente não-florestal
do sistema, o qual é explicado pela demanda cativa, pela forma
predominante de venda direta e pela valorização alcançada pelo
produto.
A/Ex Melancia Citrosx Nativas AJE x Gado Citros x Subsistência

fJ
Figura 3. Gráficos dos sistemas agroflorestais em destaque,
configurando padrões diferenciados.

Já o sistema Erva-mate+ cultives de subsistência, antecipadamente


acreditado por muitos como dotado de alto potencial de
sustentabilidade, composto de cultivo perene nativo com poucas
pragas e moléstias e mercado garantido, apresenta, pelo método
utilizado, o segundo menor Índice de Sustentabilidade.

O principal fator
Erva-mate x Subsistência explicativo para tal
frustração de expectativas
é o baixo desempenho no
hemisfério técnico-
econômico (ver Figura 4 ),
onde a baixa
produtividade da terra e do
trabalho são fatores
préponderantes. Isto se
relaciona ao fato de ser a
erva-mate um cultivo
extensivo perene, no qual
a colheita pode ser feita
pela própria agroindústria,
o que acaba se refletindo no desempenho econômico.
Da mesma forma, o progressivo aumento do número de
produtores e a cartelização das agroin-dústrias pressionam para
baixo o preço pago aos agricultores, impingindo-lhes margens de
lucro decrescentes, com refle-xos sobre os indicadores
84

produtividade da terra, do trabalho e da renda líquida (diminuição


do valor agregado).
Por outro lado, o desempenho nas dimensões ambiental e
organizacional, que não podem ser considerados fracos, tendo em
vista o baixo uso de insumos químicos derivado da baixa
suscetibilidade a pragas e moléstias, também não ajudam no
desempenho global do sistema, alcançando valores apenas
medianos.

No que se refere à dimensão ambiental, isso pode se dever,


em parte, aos indicadores escolhidos e à composição dos seus
respectivos descritores, que, assim, retratam apenas uma faceta
da complexa dimensão ambiental, não incorporando elementos
que permitam uma análise mais completa dos sistemas
estudados.

Já no que se refere à dimensão organizacional, o principal fator


contentor de um melhor desempenho parece ser a forma de
relacionamento com as agroindústrias e/ou cooperativas para as
quais fornece sua matéria-prima, mantendo relações de
dependência e formas de tomada de decisões nas quais tem
pouca ou nenhuma participação.

Há que se considerar também que os quatro sistemas


destacados em nossa análise encontram-se em diferentes
estágios de consolidação e massificação, indo desde aqueles
utilizados há praticamente um século (sistemas com acácia negra)
a sistemas com menos de dez anos de desenho e utilização (caso
dos sistemas que combinam citros com espécies florestais
nativas).

Com base nisso e nos resultados apresentados, poder-se-ia


especular que os sistemas mais antigos e adaptados (não apenas
por serem antigos, mas pelo tempo de adaptação dos sistemas
produtivos) são os que reúnem o maior número de condições
favoráveis à sua manutenção no tempo, seja em termos de
adaptação a condições locais e regionais específicas, seja pela
utilização de tecnologias e práticas apropriadas, garantindo
maiores níveis de eficiência e refletindo-se sobre os Índices de
Sustentabilidade encontrados.
Entretanto, o sistema Citros + espécies florestais nativas, que
está entre os destacados nesta análise, é praticado há menos de
dez anos na região, mas demonstra um excelente potencial de
sustentabilidade, mostrando equilíbrio entre as quatro dimensões
da sustentabilidade consideradas, adaptação ao ambiente sócio-
cultural em que é desenvolvido, cuidados com o meio ambiente,
eficiência produtiva e viabilidade econômica.

De outro lado, sistemas tradicionais e antigos como Acácia +


cultivas de subsistência e Erva-mate + cultivas de subsistência,
embora bastante adaptados às condições locais e regionais de
produção, mostram-se, contudo, fracos no conjunto, com desempenho
baixo em indicadores que poderiam ser considerados como os
mais fortes para os seus respectivos padrões, levando-os a atingir
baixos Índices de Sustentabilidade e a apresentar padrões
desequilibrados.

Na verdade, esta é uma característica específica dos sistemas


de subsistência, nos quais o objetivo da produção é, em grande
parte, a reprodução familiar pura e simples, com a busca de um
certo excedente para trocas. Em nosso estudo, isso fica claro
quando se consideram os resultados em termos de objetivos
citados para os sistemas analisados, nos quais cerca de 50% dos
entrevistados relatam que o objetivo de utilizar um sistema
agroflorestal é tão somente adequar a possibilidade ou necessidade
de produção à disponibilidade qualiquantitativa de mão-de-obra.

Fica então a sugestão da incorporação de variáveis relacionadas


à disponibilidade e grau de ocupação/adequação da mão-de-obra
ao sistema e à escala de produção na análise de sustentabilidade
de pequenos estabelecimentos familiares. Segundo foi constatado
neste estudo e a exemplo de autores como MOURA (2002), esta
variável tem sido uma das mais citadas como relevantes para
avaliações neste tipo de estabelecimento(s).

Como vemos na Tabela 2, o arranjo em destaque, devido ao


melhor resultado, é o arranjo associativo, no qual se ressalta o
equilíbrio no desempenho das diferentes dimensões, com alto
nível de organização social e de cuidados com o meio ambiente
dos agricultores por ele representados, embora apresentando a
menor renda líquida entre todos os arranjos estudados (Figura 5).
86

Tabela 2. Resultados por Arranjo Institucional


Médias por arranjo institucional
A r r a n i o
Ind icador
lnteqrado Individual Associativo
1 (manejo do sistema de produção) 4,78 4,87 4,95
2 (produtividade da terra) 4,73 5,00 4,95
3 (produtividade do traba lho) 4,78 4,99 4,84
4 (resiliência econômica) 4,79 4,90 4,84
5 (relações com os mercados) 4,91 4,64 4,92
6 (renda líquida) 4,88 5,05 4,67
7 (qualidade do solo) 4,60 4,82 5,06
8 (impactos em outros sistemas) 4,77 4,63 5,10
9 (tomada de decisões na propriedade) 5,02 4,57 4,79
1O (participação comunitária e
4,69 4,66 5,01
institucional)
IS 4,79 4,81 4,91

A5sociativo
O desempenho alcançado por
este arranjo é fruto da organização
dos agricultores e da sua
participação nas instituições às
quais são associados e o indicador
1O (participação comun itária e
institucional) é bem representativo
neste sentido.

Entre os descritores que compõem


o referido indicador, encontramos
referências aos assuntos mais
debatidos nas reunioes e assembléias, aparecendo com
freqüência, ao lado de assuntos relacionados à produção e
comercialização, os assuntos familiares, de ordem educacional,
saúde e gênero, mostrando diversidade e equilíbrio de interesses
e objetivos.
A participação em associações ou cooperativas parece levar
então a um fortalecimento geral do modo de exploração e
reprodução do sistema produtivo, talvez devido ao crescimento
técnico e cultural que a organização permite, já que nesse tipo de
organização ocorre maior discussão sobre uma gama variada de
assuntos, relacionados aos mais diversos aspectos da produção e
necessidades dos associados, tendo também maior participação
destes nas tomadas de decisões.

Seguindo nossa análise, temos o arranjo individual, que possui


um bom desempenho no hemisfério técnico-econômico, mas
também o menor desempenho relativo no hemisfério ambiental-
organizacional.

Este arranjo chama atenção por apresentar esta espec,e de


equilíbrio contraditório, registrando os maiores valores em quatro
indicadores, no hemisfério técnico-econômico e os menores em
outros quatro, sendo três destes no hemisfério socioambiental
(Figura 6).

A contradição é configu-rada porque, operando individualmente,


têm mais liberdade para vender seus produtos a uma gama maior
de compradores potenciais, a melhores preços ou condições, mas
o que acaba ocorrendo é que mais de 80% dos mesmos não têm
opções para venda de seus produtos, vendendo para "quem
aparece", seja para o consumidor final, indústria, cooperativa ou,
na maior parte das vezes, para intermediários.

Vê-se então que, por estarem desvinculados de redes mais ou


menos consolidadas de fluxo insumo-produto, estes agricultores
acabam tendo dificuldades na comercialização de produtos e levando
desvantagem comparativa na aquisição de insumos e de
alimentos. Até certo ponto, a
possibilidade de explorar Individual
oportunidades de mercado para
a venda de seus produtos
reflete-se de maneira positiva
sobre a renda líquida, que é a
maior entre os arranjos estu-
dados, mas, por outro lado, as
instabilidades destes mesmos
mercados os deixam mais
vulneráveis.
88

O arranjo integrado é o que apresenta o mais crítico desempenho


global, embora não muito distanciado do arranjo individual, mas,
notoriamente, constituindo-se no mais desequilibrado dos três
estudados. O desempenho nas perspectivas ambiental, técnico-
produtiva e parte da econômica é bastante baixo, levando ao pior
desempenho global dentre os arranjos estudados (Figura 7).

No caso da perspectiva técnico-produtiva, a baixa produtividade


da terra e do trabalho verificados Integrado
decorrem, principalmente, do
baixo valor agregado com a
produção. Já na perspectiva
econômica, o baixo desempenho
está associado à falta de garantias
econômicas ou produtivas que
permitam resistir a perturbações
bruscas e/ou duradouras no
cenário político-econômico, dentro
da idéia de resiliência.

Observa-se, então, que o atendimento a padrões agroindustriais de


qualidade e quantidade de produto entregue ao processo
industrial resulta muito ruim para o agricultor, diminuindo-lhe a
produtividade da terra, do trabalho, sua renda líquida e
depauperando seus recursos naturais pela sua intensiva e
"otimizada" utilização.

Sustentabilidade x Operacionalização
Estes resultados, alguns deles surpreendentes, têm
explicações nos detalhes dos dados e da metodologia. Por um
lado, há questões de mercado e de organização técnica e social
(realidades surpreendentes), por outro, há fatores como a
influência dos resultados de uns indicadores sobre os outros.
Valores altos ou baixos em alguns indicadores ou dimensão
tendem a "puxar" o valor do Índice de Sustentabilidade como um
todo, mesmo com o uso da média harmônica, cujo objetivo
principal de sua escolha era justamente minimizar estes efeitos.
Da mesma forma, quando se olha os gráficos que representam
os diferentes sistemas e arranjos institucionais, independente do
Índice por eles alcançados, vemos que cada um deles configura
um "padrão" que se equilibra com maior ênfase sobre uma ou
duas dimensões da sustentabilidade, enquanto outras apresentam
deficiências, o que configura claramente a idéia de "padrão de
sustentabilidade" exposta por Carvalho (1993)4 (Figura 8).
As.sociativo lndivídual lntegado Erva.mate x Subsistência

Cilros x Nativas Citros x Subsistência


NEx"'1elancia NExGado
1

--------...:JJ1i~
~ -------
1 \

Figura 8. Gráficos dos sistemas estudados mostrando padrões diferenciados

As variáveis escolhidas e a sua composição na forma de


indicadores também têm influência sobre o resultado final. Este
resultado, ou a sustentabilidade expressa, só diz respeito a
algumas facetas dos sistemas, explicitadas pelo pequeno conjunto
de indicadores escolhido e a condições locais e temporais
específicas. Possivelmente, em outro tempo e local ou com
diferentes variáveis, os mesmos sistemas pudessem mostrar
resultados diferentes.

Por exemplo: se os indicadores ambientais escolhidos pudessem


abranger mais facetas da complexa dimensão ambiental, para
além da avaliação social da qualidade do solo e sobre o destino
dos resíduos sólidos, é provável que os resultados ambientais dos
sistemas seriam outros, principalmente no caso do sistema
Essências florestais exóticas + melancia e do sistema Citros +
essências florestais nativas, contrapostos exatamente pelos
cuidados ambientais. Talvez o desempenho do sistema erva-mate
+ cultivas de subsistência também fosse alterado, aproximando-o
mais de nossas expectativas "ecológicas".

4 Carvalho (1993) atribuiu o termo "padrão de sustentabilidade" ao formato dado a um


determinado sistema a partir da influência de uma série de condições, limites ou
restrições, internas e externas ao mesmo e a combinação específica que se estabelece
entre estes sobre uma ou mais unidades de produção locais.
90

Assim, o que se verifica é que, em cada local, as condições e


combinações de fatores são diferentes e, portanto, o que pode ser
considerado sustentável em um local, em outro pode não ser, e
mesmo apresentando índices quantitativos de sustentabilidade
semelhantes, pode ter padrões completamente diferenciados,
indicando condicionamentos econômicos, ambientais e
organizacionais muito distintos.

Então, as variáveis e a composição de variáveis que melhor


darão idéia da sustentabilidade serão aquelas que, na
interlocução com a sociedade, forem citadas/identificadas como
relevantes, em relação a aspectos importantes da realidade que
possam sinalizar estados e mudanças ocorridas no sistema ao
longo do tempo, principalmente quando nesta interlocução for
trabalhada a noção de sustentabilidade.

A escolha/composição de indicadores é o grande desafio nesta


empreitada de operacionalizar o conceito de sustentabilidade,
pois, principalmente no caso de indicadores sociais, os
parâmetros mais fáceis de serem avaliados variam de acordo com
o local e com o tempo, à medida que os elementos do sistema se
desenvolvem e amadurecem e os processos e relações entre eles
se combinam, tornando difícil o processo de identificação e
limitação dos parâmetros a serem incluídos, bem como sua
composição na forma de indicadores.

Quando se analisa um sistema agroflorestal do ponto de vista


da sustentabilidade, deve-se também levar em conta que o
mesmo não é desenvolvido de forma estanque, mas sim de modo
dinâmico, compondo um sistema produtivo que, para garantir a
reprodução social dos produtores e suas famílias, está associado
a outros sistemas de cultivo ou criações de características
completamente diferenciadas e cujas características e influências
sobre os sistemas analisados têm de ser levadas em conta, assim
como as questões institucionais locais.

Assim, podemos considerar que o serviço de extensão rural


(que não está em análise neste trabalho) esteja desenvolvendo
um trabalho muito bom na região de Taquari, onde o sistema
Eucaliptus x Melancia está sendo desenvolvido, que os sistemas
de produção - que incluem o subsistema agroflorestal - sejam
equilibrados nas suas trocas de material e energia, ou que
mercados mais próximos também influenciem decisivamente.
Então, é menos mérito do sistema de produção em si ou dos
agricultores, mas isso só mostra que a sustentabilidade não é algo
que se possa atingir e avaliar estanquemente, devendo-se levar
em conta todo o contexto.

Não é o agricultor ou organização isolada que vão atingir


condições de competitividade e sustentabilidade, no sentido amplo
do termo. Estas serão resultado de um contexto no qual exista
convergência de um conjunto amplo de atores em torno de
objetivos minimamente comuns, capaz de direcionar as intervenções
a um desenvolvimento que busque o aproveitamento de recursos
endógenos, vantagens comparativas e capacidades e oportunidades
locais. E isso fica claro pelos resultados obtidos na análise dos
arranjos institucionais.

Qualquer agroecossistema específico é modelado por fatores


locais, regionais e globais. E a sustentabilidade é resultado de um
conjunto complexo de condições que são menos dependentes de
componentes ecológicos, econômicos ou sociais individuais do
que das qualidades emergentes oriundas da sua interação.

A dependência em relação a processos ecológicos internos


para a manutenção da fertilidade e manejo das pragas implica
relações e estruturas sociais muito diferentes daquelas conectadas
ao uso intensivo de insumos, prontamente disponíveis na forma
de "receitas", para ser inseridos, resolvendo os problemas
encontrados.

As mudanças nas práticas locais andam lado a lado com as


mudanças no contexto social geral, elas não ocorrem
isoladamente (GLIESSMAN, 2000) e o(s) arranjo(s) que
"conferem" sustentabilidade são resultantes das opções e
oportunidades sociais, da regulação estatal (leis e ação do estado)
e das oportunidades de mercado.

4. Conclusões

A metodologia utilizada, mesmo vislubrando-se necessidades


de aperfeiçoamento na forma de escolha e composição de
92

indicadores, é bastante eficaz. Permitiu a análise comparativa de


sistemas agroflorestais e arranjos institucionais, identificando
padrões típicos, especificando seus pressupostos básicos e
realçando seus pontos fortes e debilidades.

A mesma pode servir ao aperfeiçoamento de sistemas produtivos,


de políticas públicas e programas institucionais voltados à
agricultura, uma vez que permite especificações, comparações e o
trabalho com metas produtivas, organizacionais, econômicas e
ambientais.

Entretanto, o trabalho com indicadores e sua utilização para


fins de monitoramento é limitado. Estes são apenas instrumentos
de análise e podem levar a leituras equivocadas se tomados como
suficientes, por que não constituem a realidade própria que está
em análise, mas apenas um recorte, uma simplificação, necessitando-
se de informações complementares (triangulação e contexto) para
uma interpretação consistente.

A tendência a afirmar que um sistema de produção é melhor do


que outro apenas com base no valor do índice numérico de
sustentabilidade pode, portanto, se traduzir em erro, pois se
desconsideram questões como, por exemplo, a adaptação do
sistema a condições locais e regionais específicas, cuja combinação
particular de fatores pode gerar padrões mais harmônicos e
equilibrados, que talvez globalmente se aproximem mais da
concepção de sustentabilidade adotada do que um índice obtido a
partir de artifícios de transformação de atributos qualitativos em
quantitativos.

É fundamental que a concepção de sustentabilidade que


embasa o trabalho esteja claramente presente na mente dos
pesquisadores e seja enunciada no trabalho. E também deve
haver critérios para a tomada de decisão a respeito de qual a
melhor forma de conduzir o processo para que os resultados se
aproximem ao máximo dessa concepção de sustentabilidade, mas
sempre haverá um espaço de opções e de arbítrio, maior ou
menor.

Aumentar o número de indicadores ou o número de variáveis


em sua composição pode ser uma forma de incorporar uma maior
quantidade de elementos importantes, permitindo uma avaliação
mais completa da sustentabilidade. Mas, trabalhar com muitos
indicadores ou com composições muito amplas, tornará o processo
de cálculo mais complexo, dificultando sua utilização pelos
agricultores, a realização de análises pontuais de variáveis,
monitoramentos específicos e o trabalho com metas produtivas.

Da mesma forma, um grande número de indicadores pode,


pela dificuldade de desagregação, de coleta de dados e de análise
interrelacionai, introduzir um viés de instrumentalidade artificial
que torne os resultados, mesmo sendo comparáveis, de pouca
utilidade para o aperfeiçoamento dos sistemas estudados ou de
políticas públicas que procurem reforçar sistemas agrários ou
sistemas de produção específicos.

Na busca de sociedades sustentáveis, que é o objetivo mais


amplo de todos os que se interessam pela questão da
sustentabilidade, a participação social constitui elemento
essencial, por que é a busca de parcerias, apoios, relações com
os poderes constituídos, instituições governamentais e não-
governamentais que cria condições (contexto) para avanço e
sucesso de qualquer proposta, viabilizando o desenvolvimento e a
consolidação de sistemas produtivos.

É precisamente isso que constitui os chamados "arranjos"


institucionais, isto é, o conjunto de instituições com as quais
determinada empresa ou organização se relaciona para
desenvolver sua atividade, conformando um "campo" ou uma rede
de relações que é, em última análise, o que vem a potencializar
seus resultados em termos de alcance de objetivos propostos e
metas produtivas, organizacionais, econômicas e ambientais.

Os arranjos institucionais constituem, assim, o vetor da


sustentabilidade, na medida em que, enquanto conjunto de
instituições e relações, forjam objetivos comuns e o espaço que
permite o desenvolvimento de pressupostos, tecnologias e
métodos apropriados, que é o que vai garantir o crescimento da
sustentabilidade dos sistemas preconizados, com a satisfação
crescente das necessidades socioculturais das comunidades
envolvidas e a potencialização dos resultados econômicos e
ambientais.
4

5. Referências
AL TIERI, M.A. Agroecology: the Science of Sustainable Agriculture.
2.ed. Boulder: Westview, 1995. 433p.

CARVALHO, H.M. Padrões de sustentabilidade: uma medida para o


desenvolvimento sustentável. Curitiba, 1993.

FERNANDEZ, X.S . A sustentabilidade nos modelos de desenvolvi-


mento rural: uma análise aplicada de agroecossistemas. Lagoas-
Marcosende: Univ. de Vigo, 1995. 265p . Tese (Doutorado em Economia)
- Universidade de Vigo, Dep. de Economia Aplicada, Lagoas-
Marcosende, 1995.

GLIESSMAN, S.R. Agroecologia: processos ecológicos em agricul-


tura sustentável. Porto Alegre: Editora da Universidade (UFRGS), 2000.

LOPES, S. B. Arranjos institucionais e a sustentabilidade de


sistemas agroflorestais: uma proposição metodológica. Porto
Alegre: Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural
(PGDR/UFRGS), 2001 . (Dissertação de Mestrado). Disponível em ·
www.ufrgs.br/pgdr/dissertações.

LOPES, S. B. Arranjos institucionais e a sustentabilidade dos siste-


mas agroflorestais: a importância das formas de organização.
Cadernos de Ciência e Tecnologia. V19, n.3, p.377-406, Brasíliá:
EMBRAPA, 2002. •

MOURA, L. G. V. Indicadores para avaliação da sustentabilidade em


sistemas de produção da agricultura familiar Porto Alegre: Programa
de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural (PGDR/UFRGS), 2002.
(Dissertação de Mestrado). Disponível em
www.ufrgs.br/pgdr/dissertações.
ANEXO

Quadro-Resumo de indicadores e descritores

Indicadores Descritores
Por que opta por um sistema de prod ução de base florestal?
Por que utilizar um sistema agroflorestal?
Qual o tipo de conhecimento disponível/necessário para manejo
1. Manejo do sistema de
do SAF?
produção
Nivel de capacitação ou cursos para manejo do SAF.
Disponibilidade, forma e freqüência com que recebe Assistência
Técnica .
2. Produtividade da terra Produtividade da Terra
3. Produtividade do trabalho Produtividade do Trabalho
Saídas possíveis em caso crítico de frustração ou colapso de
safra
4. Resiliência econômica
Práticas ou ações utilizadas como garantia contra adversidades
climáticas e/ou político-econômicas
Venda da produção
5. Relações com os mercados Aquisição de insumos externos à propriedade
Procedência dos Alimentos
6. Renda líquida Renda Líquida
Qualidade média atribuída pelo agricultor ao solo
7. Qualidade do solo (visão do Fatores de análise ou critérios (citados) com que o agricultor
agricultor) analisa essa qualidade
Práticas de Conservação de solo utilizadas
Destino dos Resíduos Líquidos (Esgoto)
8 .Impactos em outros sistemas
Destino dos Resíduos Sólidos (Lixo)
Objetivos perseguidos
9. Tomada de decisões na Forma de tomada de decisão
propriedade Nível do debate (maior grau de instrução entre os envolvidos na
tomada de decisão)
Nivel de participação geral nas instituições da comunidade
Benefícios obtidos nessa participação comunitária
Distribuição dos benefícios gerados pela instituição-chave
(igualitária entre todos os produtores ou não?)
Freqüência anual com que os produtores/associados são
10. Participação comunitária e
chamados para reuniões pela instituição-chave e por outras
institucional
relacionadas ao arranjo institucional envolvido
Número médio de agricultores ou associados presentes a essas
reuniões
Assuntos mais freqüentemente tratados nessas reuniões
Forma de tomada de decisões no grupo / instituição-chave
Sistemas Agroflorestais: contribuições para a
sustentabilidade
Irene Maria Cardoso 1, Helton Nonato de
3
Souza 2, Verónica Rocha Bonfim , Renata
4 5
Lúcia Souto , Anôr Fiorini de Carvalho ,
6
Gustavo Bediaga de Oliveira , David Gjorup_
Feital
1
Professora do Departamento de Solos da
Universidade Federal de Viçosa.
E-mail: lrene@ufv.br; 2 e 4 Mestrados em Solos e
Nutrição da UFV; 3 Doutoranda em Ciências
7
Florestais da UFV; 6 ª Graduados de Eng.
Florestal e Geografia da UFV.

1. Introdução

A Zona da Mata mineira tem sofrido com a intensa devastação


dos remanescentes de Mata Atlântica localizados na região devido
à ação antrópica. O Centro de Tecnologias Alternativas da Zona
da Mata (CTA-ZM), organização não-governamental que atua na
região, em parceria com Sindicatos dos Trabalhadores Rurais
(STR's) e Universidade Federal de Viçosa (UFV), desenvolveu
uma experimentação participativa com Sistemas Agroflorestais
(SAF's) junto a agricultores familiares em diversos municípios da
Zona da Mata mineira. Esta experiência foi sistematizada de forma
participativa. O presente trabalho objetiva discorrer sobre algumas
das contribuições dessas experiências para a sustentabilidade no
contexto regional. Nas diferentes fases da experiência foram
identificados atributos de sustentabilidade, como produtividade,
estabilidade/resiliência, eqüidade e autonomia . Estes atributos
apontam o potencial dos SAF's em contribuir para o
desenvolvimento da região no que tange aos aspectos sociais,
culturais, ecológicos e econômicos, bem como para reverter o
quadro de degradação sócio-ambiental existente.

2. Contexto regional e experimentação participativa com


SAFs na Zona da Mata, MG

A Zona da Mata de Minas Gerais está inserida no biorna Mata


Atlântica, uma das cinco primeiras entre as 25 reservas de
biodiversidade mais ameaçadas do planeta - os chamados "hot-
9B

spots" (MYERS, 2000). A regIao é declivosa e com solos


profundos, características que, associadas aos índices de
precipitação (média anual variando de 1.100mm a 1.800mm),
propiciam a formação de inúmeras nascentes e pequenos cursos
d'água. Diante destas características, vanas áreas são
consideradas de preservação permanente e apresentam restrição
legal de uso e manejo (FREITAS et ai., 2004). Até meados do
século passado, encontrava-se na Zona da Mata de Minas Gerais
uma extensa cobertura vegetal, mas ao longo de sua história
sofreu um desmatamento intenso, o que levou a alteração drástica
da paisagem natural com fortes impactos ambientais. O modelo
de agricultura dominante na região, fundamentado na Revolução
Verde, aprofunda ainda mais os problemas ambientais, causando,
por exemplo, a erosão do solo, a contaminação das águas e a
perda da produtividade dos agroecossistemas. A agricultura
familiar é predominante e os agricultores familiares utilizam suas
terras principalmente com pastagem e café, quase sempre
consorciado com culturas de subsistência como milho, feijão,
mandioca.

Entretanto, a "mata" sempre representou uma fonte de


recursos para a agricultura familiar, por isto os agricultores tem
consciência da necessidade da conservação dos maciços
florestais, o que, aliado ao longo período de ocupação, permitiu o
acúmulo de um riquíssimo patrimônio cultural representado pelo
conhecimento da população em relação aos ecossistemas locais.
No entanto, a pobreza generalizada e a falta de perspectivas de
sobrevivência no campo contribuem sobremaneira para o
aumento da pressão sobre os recursos naturais. Procurando
soluções para este problema, o Centro de Tecnologias
Alternativas da Zona da Mata (CTA-ZM), ONG que atua na região
desde 1988, em parceria com os Sindicatos dos Trabalhadores
Rurais (STR's) e o Departamento de Solos da Universidade
Federal de Viçosa (DPS/UFV), desenvolveram uma experimentação
participativa com Sistemas Agroflorestais (SAF's), em conjunto
com agricultores familiares em diversos municípios da Zona da
Mata mineira. Esta experimentação participativa, iniciada em
1993, foi sistematizada de 2003 a 2004 (Sousa et ai., 2005), de
forma também participativa, envolvendo 17 agricultores
experimentadores, distribuídos em sete municípios (Araponga,
Tombos, Divino, Carangola, Eugenópolis, Espera Feliz e
Miradouro).

A hipótese para a sistematização era de que, com a


experimentação participativa com SAFs, vários resultados haviam
sido alcançados e várias lições aprendidas, e que estas lições
emergiriam no processo de sistematização participativa. A
sistematização permitiria também com a reflexão coletiva a construção
de um conhecimento novo, necessário para o fortalecimento da
agricultura familiar e a consolidação das propostas agroecológicas na
região . Objetivou-se com a sistematização elucidar estas lições e
a construção deste conhecimento novo, através da discussão e da
reflexão coletiva de todo o processo.

O método adotado foi adaptado de HURTADO (2001) e


constou de leitura, organização e síntese de todo o material
bibliográfico existente, visitas às propriedades, entrevistas semi-
estruturadas, encontros envolvendo técnicos, agricultores,
pesquisadores, professores e estudantes da UFV. Quando
apropriado, foram utilizadas técnicas do Diagnóstico Rápido
Participativo, como linha do tempo, mapas, diagramas de Venn,
análises de fluxos (HORNE e STUR, 2003; GUIJT, 1999). Foram
compilados, sintetizados e discutidos com os agricultores dados
de várias pesquisas envolvendo os agricultores experimentadores.
Tais pesquisas abordaram aspectos de uso, manejo, ocupação e
conservação dos solos, decomposição e ciclagem de nutrientes
pelas plantas (leguminosas e espontâneas). O presente trabalho
objetiva discorrer sobre algumas das contribuições dessas
experiências com SAF's para a sustentabilidade no contexto
regional.

3. Histórico da experimentação participativa com SAFs

A descrição histórica da experimentação foi resgatada durante


um encontro com os experimentadores, utilizando a linha do
tempo (GUIJT, 1999). O processo de experimentação foi
dinâmico, mas, com o resgate histórico, foi possível caracterizar
cinco fases distintas: 1. sensibilização para proposta ; li.
implantação dos SAFs; Ili. complexificação dos sistemas; IV.
avaliação e redesenho dos sistemas e; V. sistematização
participativa da experiência . Em cada uma destas fases houve
100

diferenças na intervenção institucional, na qualidade do solo, na


quantidade de árvores utilizadas, nos custos e gastos, na
produtividade e na qualidade do café. As principais características
destas fases são apresentadas a seguir.

Como estratégia de sensiblização e implantação da experimentação


participativa com SAFs, o CTA-ZM promoveu várias atividades.
Inicialmente, agricultores e/ou técnicos visitaram propriedades
com SAFs no Espírito Santo, Bahia, Colômbia e Costa Rica .
Foram os primeiros contatos com consórcio de árvores com café,
despertando grande interesse local. Essa estratégia foi essencial
para aumentar a consciência entre os agricultores e técnicos
sobre as potencialidades dos SAFs, mais particularmente sobre
sua viabilidade para a região e as técnicas utilizadas no manejo
dos sistemas.

Vários encontros e reuniões foram realizados com os agricultores


para discutir os desenhos, o manejo e a localização dos SAFs. Foi
também realizado Diagnóstico e Desenho de sistemas (D&D,
ICRAF, 1983) em duas propriedades, o que permitiu a troca e a
socialização de saberes entre técnicos e agricultores,
aprofundando a discussão sobre quais as espécies e os desenhos
a serem testados. Os principais tipos de sistemas possíveis foram
discutidos nas propriedades dos agricultores interessados na
experimentação, porém o desenho de SAF e as espécies a serem
utilizadas foram decididos de forma autônoma por cada família.

No final de 1994 e início de 1995, iniciou-se a implantação das


experiências. Foram implantadas 39 experiências, compreendendo
25 comunidades de 11 municípios (dentre eles os municípios
participantes do processo de sistematização). Foram 37 sistemas
com café e dois em áreas de pastagem. Cada experiência com
café possuía em média 1.000m2 , e as árvores foram plantadas
preferencialmente entre as linhas do café. No geral, utilizaram-se
áreas com aproximadamente 9.300pés de café, com espaçamento
de 3 x 1,5m, perfazendo 41.800m 2 , totalizando em torno de 9.400
árvores introduzidas, além daquelas que surgiram espontâneamente
(CARDOSO et ai., 2001 ).

Para a implantação dos SAFs, foram escolhidas as áreas


consideradas "piores", ou seja, as áreas mais degradadas dentro das
propriedades. Os desenhos dos SAFs foram planejados para atender
ao conjunto de critérios previamente levantados, principalmente no
que se refere às funções do componente arbóreo, como
sombreamento, ciclagem de nutrientes, diversificação da produção,
produção de lenha e madeira, conservação de redes de drenagem e
conservação/melhoria de pastagens (sistemas silvipastoris), e
principalmente, nas áreas de produção de café, para a conservação
e a recuperação do solo.

Para o aprofundamento da experimentação com SAFs o CTA-


ZM, contratou por curto prazo Ernst Gõtsch, como consultor
externo. Com esta consultoria, promoveram-se capacitações de
técnicos e de agricultores sobre agrofloresta e foram dadas novas
orientações sobre o desenho e o manejo dos SAFs. Os desenhos
conjuntamente construídos anteriormente foram substituídos por
outros, diminuindo o espaçamento e inserindo novas espécies,
algumas com comportamento desconhecido regionalmente.
Conseqüentemente, com esta nova proposta, aumentou-se a
complexidade de cada SAF.

Em 1996, também em Araponga, iniciou-se o monitoramento


participativo piloto das experiências, através de parceria com o
IIED-UK (Instituto Internacional para Meio Ambiente e
Desenvolvimento - Reino Unido). Os objetivos a serem monitorados,
os indicadores e a metodologia a ser utilizada foram decididos
coletivamente. Os objetivos e os indicadores priorizados foram:
custos de produção (indicador: custo das despesas variáveis
como mão-de-obra, fertilizantes e corretivos, etc.); diversidade da
produção (indicador: número de espécies vegetais no sistema);
produção (indicador: quantidade de cada produto como café,
frutas, lenha e etc); cobertura do solo (indicador: porcentagem de
solo coberto); saúde do solo e ciclagem de nutrientes
(indicadores: "análises mais aprofundadas sobre o solo"). O
monitoramento destes dois últimos objetivos foi deixado sob
responsabilidade da UFV. Os pesquisadores da UFV envolvidos
com o trabalho acreditavam que para atender ao pedido dos
agricultores, pesquisas acadêmicas em qualidade do solo e
ciclagem de nutrientes deveriam ser feitas (CARDOSO et ai.,
2001 ). Desde então, vários projetos foram desenvolvidos
principalmente pela UFV, em especial pelo DPS, e pela EPAMIG
(Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais) em
lUL

parceria com o CTA-ZM e STR's. Foram realizadas várias teses


nas áreas experimentais dos agricultores. O monitoramento dos
demais objetivos foi feito pelos próprios agricultores em suas
propriedades, o que os permitiu aprofundar suas observações
sobre o sistema. Observou-se, por exemplo, que embora o
objetivo de conservação dos solos tivesse sido alcançado, havia
ainda baixa produção nas áreas de SAF's, o que gerou
insatisfação em alguns agricultores. Os resultados e conclusões
do monitoramento subsidiaram a reflexão sobre a experimentação
com SAFs também em outros municípios que não Araponga. Após
reuniões e discussões, os agricultores redesenharam seus
sistemas, diminuindo o adensamento e a quantidade de espécies
e eliminando aquelas espécies que apresentaram competição
comprovadamente elevada com o café.

Mesmo com o redesenho, a continuidade da experimentação


estava comprometida devido a pouca produção e à necessidade
de mão-de-obra para o acompanhamento e condução dos
experimentos, diminuindo o tempo disponível para a dedicação às
outras atividades geradoras de renda. Estes problemas foram
discutidos coletivamente e surgiu então a proposta de um subsídio
financeiro para os experimentadores. Foram estabelecidos
coletivamente às condições e os critérios para o apoio às
experiências de SAFs. Para definir os critérios do subsídio, os
agricultores definiram SAFs como sendo aqueles que "possuem
pelo menos um estrato arbóreo diversificado, um estrato arbustivo
(o café necessariamente, podendo ter outras espécies), um
estrato herbáceo, podendo ser leguminosa introduzida como
adubação verde, vegetação espontânea, alimentícia etc". Ou seja,
somente os experimentadores de SAFs com café receberiam
subsídio. As regras para receber o subsídio foram bastante
,, flexíveis, possibilitando inclusive a alocação dos recursos em
outras áreas da propriedade e não necessariamente nos SAFs,
desde que contribuísse para a continuidade da experimentação
pelo agricultor. O subsídio possibilitou a continuidade de várias
experiências, pois contribuiu com a sustentação financeira dos
agricultores, permitindo a espera do retorno econômico com a .
produção tanto do café, quanto da diversificação de produtos.

O final do subsídio coincidiu com uma articulação regional para


a produção de café orgânico, visando à certificação. Foi elaborado
então o Plano Estratégico do Café (CTA-ZM, 2002). Com este
plano, ora em execução, objetiva-se melhorar a qualidade do café,
buscar estratégias de comercialização e em alguns casos fazer a
conversão para café orgânico certificado, muitos destes em SAF's.
Na busca de recomendações úteis à execução do plano,
sistematizou-se de forma participativa a experimentação com
SAFs na região.

4. O que mostrou a sistematização?

A observação dos agricultores sobre o papel das espécies


arbóreas e autonomia dos mesmos no manejo dos SAFs gerou
grande complexidade de desenhos e manejes dos sistemas. Ao
longo das experiências muitas espécies foram eliminadas e outras
privilegiadas. Entretanto, o critério principal de introdução ou
retirada de espécies arbóreas do sistema foi à compatibilidade das
árvores com o café, o que significa baixa competitividade por
água, luz e nutrientes. Os principais indicadores de compatibilidade
utilizados foram o bom aspecto fitossanitário do café no consórcio
e o sistema radicular profundo do componente arbóreo. Além da
compatibilidade com o café, outros critérios para a escolha das
espécies arbóreas foram a produção de biomassa, cujo indicador
foi a quantidade de resíduo produzido, seja através da queda
natural das folhas ou poda; a mão-de-obra necessária, indicada
pelo caducifolismo, facilidade de poda, arquitetura dos ramos e
aquisição de mudas; a diversificação da produção, indicada pela
quantidade e qualidade da produção de alimentos para o ser
humano, animais domésticos ou silvestres e para a produção de
madeira para construções rurais e ou lenha.

Atualmente, em torno de 82 espécies diferentes são utilizadas


nos SAFs, com média de 12 árvores, além do café. A área
manejada varia de 1.000m 2 a 5.000m 2 , havendo grande
diversidade de espécies por área, sendo grande parte destas
espécies nativas. As principais espécies arbóreas utilizadas são:
Abacate (Persea sp); Açoita-cavalo (Luehea speciosa); Ameixa
(Eriobotrya japonica); Banana (Musa sp); Cajá-manga (Spondias
/útea); Capoeira-branca (Solanum argenteum); Castanha-mineira
(Bombax sp); Cedro-toona (Toona ciliata); Embaúba (Cecropia
hololeuca ); Eritrina (Erythrina vema); Fedegoso (Senna
macranthera); Flor-de-Maio (Tibouchina sp); lngá (/nga vera); lpê-
104

preto (Zeyheria tuberculosa); Mamão (Carica papaya); Mulungu


(Erythrina mulungu); Papagaio (Aegiphi/a sel/owiana); Pau-mulato
(Ca/ycophylum spruceanum); Uva-do-japão (Ovenia dulcis). As
mais rejeitadas por apresentarem alta competição com o café
foram o Angico (Annadenanthera peregrina) e o Jacaré
(Piptadenia gonocantha ).

Deve-se procurar espécies arbóreas com facilidade de


aquisição de mudas, por isto a preferência por espécies
espontâneas como o papagaio e a capoeira branca, pois, neste
caso, não há necessidade de plantio das mesmas, apenas de
manejo.

O componente herbáceo, seja como planta de cobertura do


solo ou alimentícia, é tão importante que os agricultores o
incluíram na definição de SAFs. As plantas alimentícias são
importantes não só como fonte de alimento para os seres
humanos, mas também para os animais domésticos ou silvestres.
Como planta de cobertura de solo, o componente herbáceo
funciona como adubação verde, protegendo o solo contra erosão
e ciclando nutrientes. Ao utilizar as espécies espontâneas para
esta função, diminui a necessidade de introdução de outras
espécies, como as leguminosas. O plantio de leguminosas pode
representar, em relação às espécies espontâneas, aumento da
mão-de-obra, em especial em terrenos declivosos como os
encontrados na região. Porém, o manejo de determinadas
espécies espontâneas pode ser mais difícil do que algumas
espécies de leguminosas. Sendo assim, uma associação das duas
práticas (manejo das espécies espontâneas e de leguminosas) pode
ser importante para uma maior sustentabilidade da propriedade. O
componente herbáceo é importante também porque desempenha
papel chave na biodiversidade associada, como por exemplo, a
atração de polinizadores.

Para garantir a entrada necessária de luz no café, estimada em


torno de 30% (JARAMILLO, 2003), o espaçamento entre as
espécies deve ser observado. A indicação geral é de que as
copas das árvores não devem se tocar. Logo, se dentro da
lavoura as árvores estiverem muito juntas, deve-se retirar alguns
indivíduos. Se estiverem muito esparsas, pode-se adicionar mais
indivíduos. Outra indicação é fazer podas, principalmente no
inverno, ou usar espécies caducifólias, que perdem as folhas no
inverno, momento de maior necessidade de entrada de luz no
sistema para garantir a floração. Além disto, as copas das árvores
devem ser elevadas para uma altura maior que o café, ou seja,
deve-se fazer a poda das "saias" das árvores.

Segundo os agricultores, a partir dos SAF's o manejo de suas


propriedades foi alterado, ocorrendo uma maior diversificação e
integração entre os agroecossistemas, aumentando a relação
custo/benefício da produção do café com reflexos no orçamento
familiar. A forma diferenciada de manejo influenciou agricultores
vizinhos levando-os a manterem as árvores também em suas
propriedades. Houve então efeito positivo na cobertura florestal na
região promovendo em alguns casos impactos positivos em quantidade
e qualidade da água. Porém no início, os experimentadores sofreram
várias críticas e desconfiança por parte dos vizinhos. Muitos eram
chamados de loucos, por deixarem árvores e "mato" no meio da
lavoura.

A comparação entre os sistemas de café em monocultivo


(convencional) e os sistemas de café agroflorestal foi feita por
AL VORI SANTOS (informações pessoais, 2004 ). O número de
plantas de café por hectare e a produtividade por pé de café foram
menores nos sistemas agroflorestais, portanto a produção de café
por hectare foi menor, mas o retorno econômico foi maior devido
ao menor custo de produção e maior oferta de outros produtos.
Entretanto, faz-se necessário realizar uma análise econômica
mais acurada dos sistemas, pois segundo relato de alguns
agricultores, a produtividade de café em SAF's é igual a
produtividade do café convencional, e não menor.

A diversificação de espécies com a introdução das frutíferas


potencializou ainda mais os SAF's, diversificando os alimentos
para a família, para a criação animal, para a fauna , ou para a
venda . Muitos agricultores mantêm espécies frutíferas nas
lavouras destinadas exclusivamente à fauna local. Alguns
produtos têm sobressaído nos SAF's como a banana e o abacate,
demandando futuramente atenção mais detalhada para o seu
melhor aproveitamento.
106

As áreas manejadas tiveram papel importante no suprimento


de madeira para muitas famílias, enquanto que para outras
demonstrou potencial para tal. A madeira retirada foi usada para a
melhoria da infra-estrutura da propriedade (por exemplo, mourões
e pequenas construções) e lenha. Em alguns casos de excedente,
houve venda de espécies de maior valor econômico (especialmente
o cedro australiano). O suprimento de lenha e de madeira para as
famílias é um aspecto ambiental e econômico relevante, pois
elimina a pressão de uso sobre os remanescentes de mata
enquanto recursos energéticos e para infra-estrutura, conjugando
alternativa de renda e orçamento familiar.

O aporte orgânico introduzido no sistema pela vegetação


arbórea, arbustiva ou herbácea contribuiu para elevar a matéria
orgânica no solo. Houve aumento de matéria orgânica leve
responsável pela estabilidade dos agregados do solo, o que
favorece a resistência à erosão. Verificou-se também o aumento
nas diferentes formas de matéria orgânica responsáveis pela
ciclagem de nutrientes. Da mesma forma, houve uma redução na
acidez trocável do solo, diminuindo a necessidade de calagem.
Com isto, promoveram-se melhorias na capacidade do solo em
disponibilizar nutrientes, como o cálcio, magnésio, fósforo e
nitrogênio. Os SAFs também melhoram a atividade micorrízica do
solo em profundidade, fundamental para a ciclagem de fósforo no
sistema. Estudos sobre erosão demonstraram que nos SAF's
houve menor perda de solo quando comparados a sistemas
convencionais (monocultivos), ocorrendo em conseqüência menor
perda de matéria orgânica e nutrientes (CARVALHO et ai., 2000;
MENDONÇA et ai., 2001; CARDOSO et ai., 2003; PEREZ et ai.,
2004).

A diversificação da vegetação revalorizou as atividades como a


apicultura, os cuidados com a pastagem, e promoveu a integração
entre sistemas. Porém, de forma geral, ainda há pouca integração
com a criação animal na propriedade. O conforto no local de
trabalho no dia-a-dia ocasionado pelo sombreamento é um
benefício também ressaltado pelos(as) experimentadores(as). No
último período da experimentação, embora não mensurada, os
agricultores relatam redução no ataque de pragas e de doenças
no café, possivelmente pela existência em maior número de
inimigos naturais, melhorias no estado nutricional das plantas,
aumento de lesmas e minhocas refletindo melhor condição de
umidade e porosidade do solo, aumento no número de lagartos,
de variedade de espécies herbáceas, arbustivas, arbóreas
(madeireiras e frutíferas), aumento em quantidade e diversidade
de pássaros e presença eventual de animais de pequeno e médio
porte (mão-pelada, jaguatirica, macacos, cobras, tatu etc.).

A área de experimentação trouxe ensinamentos que serviram


para toda a família, para toda a propriedade e para a comunidade
de uma forma geral. No entanto, a experiência com SAF's foi
predominantemente masculina e personificada no papel do
responsável pelo SAF: o experimentador. Esta situação gerou
pouca participação da família nas definiçpes e orientações ao
longo do processo, o que caracteriza uma desigualdade nos
papéis para a tomada de decisões. Talvez na família - mulheres,
filhos, parentes - possam existir diferentes expectativas e
aspirações individuais para culturas e manejo diferentes daqueles
adotados pelo responsável. A igualdade dos papéis e o maior
envolvimento familiar tende a gerar um aumento da cumplicidade
para com o SAF, gerando impactos positivos nas relações
internas e externas à propriedade.

Resumidamente, pode-se dizer que a experimentação gerou


uma consciência profundamente agroecológica, manifestada em
práticas tais como redução/eliminação da capina, manutenção de
algumas espécies arbóreas espontâneas, mesmo em lavouras de
café em monocultivo, preocupação com qualidade e quantidade
da água na propriedade, abandono do uso de agrotóxicos e do
fogo, importância da cobertura do solo e da matéria orgânica, etc.

A sistematização das experiências contribuiu para a reflexão


coletiva de todo o processo desenvolvido, incorporação de novos
aprendizados, revisão de conhecimentos, reunificação de grupos
de atores e promoção de trocas de experiências sobre os
aspectos ligados aos SAF's, a agroecologia e à agricultura
familiar. Contribuiu ainda para a compreensão de processos
relacionados ao uso dos solos, utilização dos espaços da
propriedade rural, valorização dos recursos naturais disponíveis,
com a perspectiva de se obter alternativas para a melhoria no
sistema de produção da agricultura familiar, aliadas com a
108

conservação do meio-ambiente, de forma coerente com hábitos e


costumes locais.

5. Experimentação dos SAF' s e contribuição para a


sustentabilidade no contexto regional

Sustentabilidade refere-se à capacidade de um agroecossistema


em manter sua produção ao longo do tempo, apesar das
restrições ecológicas e socioeconômicas. Os agroecossistemas
sustentáveis diferenciam-se dos sistemas convencionais não
apenas em níveis de produtividade por região ou por unidade de
mão-de-obra ou insumo, mas também por apresentar uma maior
estabilidade/resiliência, eqüidade, flexibilidade e autonomia
(AL TIERI, 2002).

Com o objetivo de analisar a sustentabilidade dos sistemas


agroecológicos, partindo de uma visão sistêmica e não
compartimentalizada, foi realizado em 2000, pelo CTA-ZM, o
estudo "Monitoramento de Impactos Econômicos de Práticas
Agroecológicas", com o desafio de contrapor os procedimentos
convencionais que têm sido utilizados para a análise econômica
da agricultura familiar e da agricultura sustentável. Estes são, em
geral, insuficientes ou simplesmente inadequados para incorporar
outros elementos à análise da sustentabilidade econômica, como
a existência de variáveis não quantificáveis, a integração de
parâmetros biofísicos e agronômicos com processos econômicos,
entre outros (ALMEIDA e FERRARI, 2005).

Além de alguns pressupostos conceituais e metodológicos, o


Monitoramento de Impactos Econômicos de Práticas Agroecológicas,
realizado pelo CTA-ZM, descreveu atributos associados ao
conceito de sustentabilidade que permitem identificar e analisar,
de forma sistêmica, os impactos econômicos das inovações
agroecológicas (Almeida e Ferrari, 2005), sendo eles: Produtividade
é a capacidade de o agroecossistema prover o nível adequado de
bens, serviços e retorno econômico às famílias em um determinado
período. Estabilidade/Resiliência refere-se à capacidade do
sistema de absorver efeitos de perturbações graves, retornando
ao estado de equilíbrio. Flexibilidade é a capacidade do sistema
de se adaptar a mudanças (econômicas, tecnológicas, biofísicas
etc.) em longo prazo. Eqüidade é a capacidade de o sistema
gerir, de forma justa e equilibrada, suas relações sociais (internas
e externas) e com o meio físico. Autonomia é a capacidade do
sistema regular e controlar suas relações com agentes externos.

Nas diferentes fases da sistematização, estes atributos de


sustentabilidade foram identificados e são apresentados,
sinteticamente, a seguir:

Na fase li (Implantação dos SAFs) foram identificados


elementos relacionados aos atributos autonomia e eqüidade. Os
agricultores tiveram total autonomia desde a escolha da área para
a instalação da experiência até o desenho e manejo dos SAF's. O
aumento da utilização de espécies diversas provocou a necessidade
de suprimento de mudas. Na primeira etapa deste período, as
mesmas eram provenientes de viveiros externos, já na etapa final,
os(as) agricultores(as) acumularam conhecimentos suficientes e
autonomia para a produção de suas próprias mudas. Outro
aspecto importante diz respeito à metodologia adotada nessa
fase, caracterizada pela eqüidade nos papéis sociais e em relação
ao meio ambiente, refletidos no diálogo entre técnicos e agricultores e
a relação que estes estabeleciam com a natureza.

A fase Ili (Complexificação dos Sistemas) caracterizou-se pelo


aumento do número de espécies e de indivíduos por área, com a
introdução de espécies desconhecidas. Com estas modificações,
ocorreu queda da produtividade do café. As propostas implantadas
nesta época foram baseadas em experiências externas à região.
Durante essa fase, os agricultores e técnicos não tiveram
autonomia nos processos de tomada de decisão, o que certamente
ocorreu em função da inexperiência e da ansiedade por respostas
que satisfizessem as demandas em um curto espaço de tempo.
Porém, nesta fase, houve um maior aprofundamento em
agroecologia, tanto por técnicos quanto por agricultores . Os
princípios da sucessão ecológica, por exemplo, foram entendidos
por todos. Por outro lado, nesta fase , foi realizado um
monitoramento participativo, em que os aspectos a serem
monitorados foram decididos coletivamente e o monitoramento foi
feito pelos próprios agricultores em suas propriedades. Como
resultado, foi observado que, embora o objetivo de conservação
dos solos fora alcançado, detectava-se ainda baixa produção nas
áreas de SAF's. O monitoramento serviu de reflexão para toda a
11 U

equipe técnica e agricultores e contribuiu para a valorização das


relações estabelecidas entre os parceiros, devido à forma com
que as dificuldades foram enfrentadas, principalmente quanto às
dificuldades financeiras dos experimentadores, ocasionada pela
baixa produtividade dos SAFs. A reflexão coletiva de forma
transparente e responsável orientou soluções alternativas para a
continuidade da experiência nas fases seguintes.

Após as dificuldades enfrentadas na fase Ili, os agricultores, de


forma autônoma , redesenharam seus sistemas, retirando espécies
e incluindo outras. Os sistemas se restabeleceram após um
período de pouca produção, mostrando-se com isto resilientes. A
flexibilidade também foi verificada, pois houve capacidade de
adaptação à nova situação. A autonomia se manifestou com a
continuidade das experimentações, quando os agricultores
baseando-se no acúmulo das suas observações e nas dificuldades
até então enfrentadas, passaram a aplicar os princípios
agroecológicos em toda a propriedade. Tais princípios passaram a
ser discutidos com mais propriedade nos espaços de participação
dos agricultores, como sindicatos, igrejas, etc. Nessa fase, o
reconhecimento do valor das espécies (madeireiras, frutíferas, de
cobertura, leguminosas, arbóreas nativas/espontâneas) permitiu
aos agricultores seu uso adequado para cada situação,
reproduzindo-as de forma autônoma dentro de suas propriedades.

Com a crise financeira e com acúmulo de conhecimento, os


agricultores diversificaram os SAFs com produtos que lhes
permitiram uma maior variedade de produtos para consumo
familiar (maior soberania e segurança alimentar) e para o comercio,
refletindo em maior autonomia e flexibilidade frente ao mercado,
tanto na oferta de produtos a serem comercializados quanto na
maior independência na aquisição de produtos, para o consumo
na propriedade. Estes são elementos importantes para a
sustentabilidade dos SAFs, com reflexos no contexto regional.

Para aumentar a autonomia em relação à utilização de insumos


externos, é necessário aprofundar os mecanismos de ciclagem de
nutrientes, para potencializar a utilização da biomassa e auto-
fertilização dos sistemas. É também necessária uma maior
integração com a criação animal na propriedade.
O aprendizado com a área de experimentação trouxe
ensinamentos que serviram para toda a família, sem ocorrer,
entretanto, muitos avanços na eqüidade de gênero. Os
ensinamentos serviram para toda a propriedade e comunidade de
uma forma geral, contribuindo para consolidar os SAFs como uma
proposta de sistema produtivo viável para promover a sustentabilidade
da região. Resumidamente, os SAFs contribuíram para a formação de
uma consciência profundamente agroecológica, manifestada nas
práticas e ou temas como: importância da cobertura do solo e da
matéria orgânica; redução/eliminação da capina; aumento na
eficiência da ciclagem de nutrientes; controle da erosão; alternativas
de adubação com redução no uso de adubos químicos; sombreamento,
diminuindo a insolação; reconhecimento e valorização de espécies
arbóreas nativas; preocupação com qualidade e quantidade da
água; diversificação da produção; abandono do uso de
agrotóxicos; melhoria na qualidade da produção; valorização da
fauna como componente natural de todo o sistema; maior espírito
de cooperação e solidariedade.

6. Considerações finais

Um das grandes limitações e ao mesmo tempo um dos


grandes potenciais para a implantação dos SAFs na Zona da Mata
são as características ambientais da região e a legislação
florestal. Esta contradição se dá porque grande parte das áreas
das propriedades é considerada de preservação permanente,
porém, devido ao pequeno tamanho das propriedades, tais áreas
são continuamente utilizadas pelos(as) agricultores(as). Entretanto,
pelas características ambientais e adaptabilidade do café e
pastagens à sombra, a região pode ser considerada apta aos
sistemas agroflorestais. Isto evidencia a necessidade de
flexibilização da legislação para que o potencial da região seja
utilizado, isto é, o uso pelos pequenos agricultores, das áreas de
preservação permanente (APP's) com sistemas agroflorestais.

As árvores são consideradas um componente essencial nos


sistemas produtivos agroecológicos e seu potencial e função não
se restringe ao fornecimento de sombra dentro dos cafezais, mas
ao aumento da biodiversidade (associada e planejada), água
(quantidade e qualidade) e diversificação da produção, com
potencial, portanto de contribuir para o restabelecimento da
- - -112
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - --- -

paisagem da Zona da Mata. Os SAFs como desenhado na Zona


da Mata, possuem um caráter integrador das propostas para o
"fortalecimento dos solos" da região. O manejo da vegetação
espontânea e das leguminosas introduzidas, o plantio de plantas
alimentícias e de árvores com o objetivo de proteção e
conservação do solo, ciclagem de nutrientes, diversidade de
produção, entre outros, ocorrem de forma integrada no tempo e no
espaço, constituindo, sem dúvida, uma alternativa de manejo, uso
e ocupação do solo que concilia aspectos produtivos e de
conservação ambiental, tão necessária à região. Porém, falta
ainda um reconhecimento por parte das instituições deste
potencial e, como consequencia, ações regionais para sua
utilização, inclusive para interligar unidades de conservação
importantes como o Parque Estadual da Serra do Brigadeiro, o
Parque Nacional do Caparaó e outras.

7. Referências
ALMEIDA, S. G. E FERRARI, E. Por uma nova agricultura econômica
para a agricultura ecológica. Revista Ação Ambiental - Agroecologia .
Divisão Gráfica Universitária/UFV, Viçosa, n. 31 :24-29, mai/jun 2005.

ALTIERI, M. Agroecologia: bases científicas para uma agricultura


sustentável. Guaíba: Agropecuária, p. 592, 2002.

CARDOSO, 1. M., BODDINGTON, C., JANSSEN, B. H., OENEMA, O.,


KUYPER, T. W. Distribution of mycorrhizal fungai spores in soils under
agroforestry and monocultural coffee systems in Brazil. Agroforestry
Systems, 58:33-43, 2003.

CARDOSO, I.M., GUIJT, 1., FRANCO, F. S., CARVALHO, P. S. E


FERREIRA NETO, P. S. Continuai learning for agroforestry system de-
sign: university, NGO, and farmer partnership in Minas Gerais, Brazil.
Agricultura! system, n. 69: 235-257, 2001.

CARVALHO, A. F. E FERREIRA NETO, P.S. Evolving leaning in


designing agroecological farming systems with small-scaler farmers in
Zona da Mata, Brazil. ln: Guijt, 1., Berdegué, J. A., Loevinsohn, M. e Hall,
F. (eds). Depening the basis of rural resource management. Proceedings
of a workshop . ISNAR, The Hague, NL, 2000. p. 73-88 .

CTA-ZM (Centro de Tecnologias Alternativas da Zona da Mata). Plano


· Estratégico para o café agroecológico produzido por agricultores fami lia-
res da Zona da Mata do Estado de Minas Gerais - Projeto Sustentabili-
dade Econômica com base na valorização da biodiversidade em
sistemas agrícolas familiares. Viçosa, MG (Relatório Interno), 2002.

FREITAS, H.R., CARDOSO, I.M., JUCKSCH, 1. Legislação ambiental e


uso da terra: o caso da Zona da Mata de Minas Gerais. Boletim Informa-
tivo, Revista Brasileira de Ciência do Solo, n. 29: 22-27, 2004.

GUIJT, 1. Monitoramento Participativo: conceitos e ferramentas


práticas para a agricultura sustentável. Tradução de Annemarie H. 1a.
Ed. Rio de Janeiro: ASPTA. 1999, 143p.

HORNE, P.M. E STÜR, W.W .. Developing agricultura! solutions with


smallholder farms - how to get start with participatory approaches. Aciar
monograph no. 99, 120p. 2003. Australia. Disponível em:
<http ://www.ciat.cgiar.or.

HURTADO, A. D. Guía Metodologica para la Sistematizacion de


Experiencias dei Secretariado Rural. Lima: Peru, 2001. 62 p.

ICRAF. Resources for Agroforestry Diagnosis and Design, Nairobi,


Kenya, 1983. n. 7,292 p. ICRAF Working paper.

JARAMILLO, B. C. Avaliação do desenvolvimento vegetativo e repro-


dutivo de cafeeiros sob níveis de sombreamento e adubação. 2003.
Viçosa: UFV, Dissertação (Mestrado em Fitotecnia) - Departamento de
Fitotecnia, Universidade Federal de Viçosa, Viçosa.

MENDONÇA, E. S.; LEITE, L. F. C. E FERREIRA-NETO, P. S. Cultivo do


Café em Sistema Agroflorestal: uma Opção para Recuperação de Solos
Degradados. Árvore 25: 375-383. 2001.

MYERS, N., MITTERMEIER, R. A., MITTERMEIER, C. G., DA


FONSECA, G. A. B. AND KENT, J., Biodiversity hotspots for con-
servation priorities. Nature n. 403: 853-858, 2000.

PEREZ, A. M. M., JUCKSCH, 1., MENDONÇA, E. S. E COSTA, L. M. Im-


pactos da implementação de um sistema agroflorestal com café na quali-
dade do solo. Revista Agropecuária Técnica, n. 25: 25-36, 2004.

SOUSA, H. N., CARDOSO, I.M., CARVALHO, A.F., GJORUP, D.F., OLI-


VEIRA, G. B., SOUTO, R. L. E BONFIM, V. R. Sistematização das
Experiências com Sistemas Agroflorestais do CTA - Relatório Final.
Viçosa-MG, 147 p. 2005.
Indicadores biofísicos de Sistemas
Agroflorestais
Paulo Henrique Caramori1, A/ex Carneiro
2 2
Lea/1, Heverly Morais , Renzo Gorreta Hugo ,
Carlos Armênio Kathounian1, Leocádio
1 3
Grodzki e Vander/ey Porfírio da Silva
1
Pesq uisador do IAPAR, Londrina, PR.
E-mail: caramori@iapar.br; 2 Bolsista do Consórcio
3
Brasileiro de Pesquisas e Desenvolvimento do Café ;
Pesq uisador da Embrapa Florestas.

1. Introdução

A retirada ou a introdução de árvores em um ambiente agrícola


ou pastoril implica em modificações sensíveis no microclima, em
razão das alterações na interceptação da radiação solar incidente
e conseqüente alteração dos balanços energético e hídrico. De
uma maneira geral, com a introdução de árvores, ocorre
diminuição dos ventos, atenuação dos extremos térmicos
(redução das máximas e aumento das mínimas), redução da
radiação solar global e fotossintética, diminuição da radiação
líquida durante o dia e redução das perdas radiativas durante a
noite, minimizando os danos de geadas. A seguir, é feita uma
discussão sobre as principais modificações microclimáticas que
podem ocorrer nos sistemas e suas conseqüências sobre a
produtividade . Os comentários e resultados aqui apresentados
são frutos das experiências dos autores e não representam uma
exaustiva revisão sobre o tema.

2. Efeitos biofísicos em sistemas agroflorestais

2.1. Efeitos sobre a radiação solar e a temperatura


A radiação solar global, que envolve todos os comprimentos de
onda do espectro solar, é a fonte primária de energia para todos
os processos biológicos que ocorrem na superfície da terra. As
espécies vegetais se adaptaram ao regime radiativo regional ao
longo dos anos, ajustando a sua fisiologia para operar de acordo
com as demandas decorrentes do potencial energético. O homem,
ao disseminar as espécies, forçou a sua readaptação a ambientes
aos quais nem sempre ela se adaptou durante o processo
evolutivo. Por exemplo, no caso da espécie Coffea arábica (café),
116

cultivada a pleno sol, verifica-se, em anos de alta produtividade,


que o potencial de produção é muito maior do que a planta
consegue suprir sem o auxílio de grande quantidade de insumos e
água. Em condições de total exposição à radiação solar, a planta
é estimulada a produzir plenamente, arriscando-se à se depauperar
caso não tenha os nutrientes necessários para atender a demanda
dos frutos. Por outro lado, sob sombreamentos densos, provocados
por espécies de copas frondosas, com sistemas radiculares
superficiais e em altas populações, pode haver severa quebra de
produtividade nas espécies associadas de menor porte, devido
principalmente à intensa competição por luz. A espécie de porte
mais elevado, ao interceptar a radiação solar incidente, absorve
os comprimentos de onda que são utilizados na fotossíntese,
deixando passar parte do infravermelho (WILLEY, 1975). Assim,
as plantas que estão localizadas dentro da área sombreada
recebem luz de baixa qualidade para a fotossíntese, com reflexos
negativos sobre o seu potencial produtivo.

O dossel formado pelas árvores de porte dominante exerce


cobertura parcial ou total sobre as demais, interceptando parte da
radiação que chega à superfície durante o dia, mas também as
perdas noturnas serão evitadas pelo anteparo que impede a
superfície do solo e as plantas do extrato inferior de se resfriarem.
A melhor forma de quantificar esta interferência é por meio da
medição da radiação líquida disponível entre as copas das plantas
do extrato inferior e das árvores de sombra. Esta energia é
medida por instrumentos denominados radiômetros líquidos ou
saldos radiômetros. A radiação líquida é a energia que será
utilizada nos processos de evaporação, transpiração, aquecimento
do ar e do solo, fotossíntese e sínteses bioquímicas.

Durante o dia, grande parte desta energia líquida disponível é


utilizada na evapotranspiração (calor latente) e no aquecimento do
ar e do solo (calor sensível). Durante a noite, a superfície
aquecida perde calor continuamente, resfriando-se principalmente
pelos processos de radiação e condução. Quanto mais exposto a
céu aberto e quanto menor for o teor de umidade atmosférica,
mais intensa será a perda radiativa. As árvores e suas copas
acima dos cafeeiros funcionam como anteparos que interceptam a
radiação emitida pela superfície e a emitem de volta, impedindo o
excesso de resfriamento noturno. Assim, em noites com geadas,
as temperaturas das folhas das plantas protegidas podem
permanecer entre 1 e 4º C mais elevadas do que o ambiente
externo totalmente exposto a céu aberto (CARAMORI et ai.,
1999). No Paraná, os estudos com sistemas agroflorestais em
lavouras de café foram enfocados sob o ponto de vista de controle
de geadas. Experimentos conduzidos pela equipe do IAPAR e
publicados no período de 1985 a 2004 evidenciaram que a
proteção temporária, durante a fase de formação, com espécies
de hábito anual e arbustivo, e a proteção permanente, com uma
população relativamente pequena de árvores, possibilitou a proteção
contra geadas ocorridas nas últimas décadas (CARAMORI et ai.,
1987; CARAMORI et ai., 1995; CARAMORI et ai., 1996;
CARAMORI, 1997; CARAMORI & MORAIS, 1999; CARAMORI et
ai., 1999; CARAMORI et ai., 2001; MORAIS et ai., 2003; MORAIS
et ai., 2004). A copa das espécies de porte mais alto reduz a
velocidade de perda de calor por irradiação nas noites de geada,
dificultando o abaixamento da temperatura ao nível necessário
para causar dano.

Durante o dia, a redução da temperatura nos períodos mais


quentes é bem mais pronunciada. A temperatura máxima das
folhas de café em ambiente arborizado com guandu foi de até
10ºC menor que a temperatura das folhas de cafeeiros expostos a
pleno sol (MORAIS et ai., 2003).

2.2. Efeitos sobre o balanço hídrico


Os efeitos sobre o balanço hídrico dependem das
características da espécie, incluindo sistema radicular, hábito de
crescimento, uso de água, da densidade de plantio e do balanço
hídrico regional. Espécies que têm alto consumo hídrico, com
sistema radicular localizado na mesma faixa de absorção da
espécie associada e em regiões de balanço hídrico desfavorável
podem causar competição severa por água. Por outro lado,
espécies com sistema radicular pivotante e profundo, com boa
eficiência de uso de água e em densidades adequadas, podem
contribuir para atenuar o microclima dentro do dossel, reduzindo a
demanda hídrica da espécie associada e até atenuando o
problema do déficit hídrico. A distribuição da água no perfil do solo
tende a se alterar em relação aos padrões observados a pleno sol.
Em condições de sombreamento denso ou sob as copas das
árvores, a camada superficial do solo (cerca de O a 10cm),
118

normalmente coberta pelos restos vegetais, apresenta-se mais


úmida (MORAIS et ai., 2004). Nas camadas mais profundas, este
comportamento é variável e altamente dependente da espécie,
densidade e disponibilidade hídrica. Em estudos comparativos
com algumas espécies, verificamos que a grevílea e a bracatinga
apresentam baixa competitividade com cafeeiros, enquanto que a
leucena, em períodos secos prolongados e sob altas densidades,
pode provocar estresses acentuados à espécie associada. Neste
aspecto, espécies que perdem as folhas e entram em senescência
durante o período mais seco do ano são interessantes para
reduzir a competição hídrica.

2.3. Efeito sobre os ventos


O vento é uma importante variável envolvida na produtividade
das culturas em geral. No caso do cafeeiro, que é uma planta de
baixa tolerância aos ventos, ocorrem prejuízos na fotossíntese
com velocidade acima de 2m/s (CARAMORI et ai., 1986) e danos
mecânicos nas folhas, que são portas de entrada para fungos e
bactérias. Ventos excessivos aumentam a transpiração, podendo
agravar problemas de deficiência hídrica em épocas secas ou de
grande demanda.

Tanto a associação de árvores distribuídas, como em renques,


contribui para reduzir os ventos extremos, criando um microclima
mais favorável. Resultados obtidos por SILVA (1998) com um
sistema silvipastoril de grevílea e brachiaria mostraram que a
introdução de renques espaçados de cerca de 25 metros
contribuiu para formar um microclima mais ameno no interior da
pastagem, que resultou em melhor qualidade do pasto e aumento
do conforto térmico animal. Quando se faz a opção por renques,
alguns cuidados são necessários. O primeiro passo é identificar a
direção predominante dos ventos. Existem duas situações
práticas: os ventos frios de inverno, que na Região Sul do Brasil
normalmente têm direção predominante de Sudoeste e Sul; e o
vento predominante ao longo do ano, que tem direção variável de
acordo com a região e configurações regionais do relevo. Os
renques devem ser instalados de preferência em direção
perpendicular aos ventos que afetam o ambiente a ser protegido.
A proteção efetiva dos renques diminui progressivamente com a
distância entre eles, sendo reportada em distâncias de até dez
vezes a altura (LEAL, 1986), mas, em regiões frias, deve-se
manejar a parte inferior das árvores, abrindo-se canais para
permitir a drenagem do ar frio, evitando-se assim danos à espécie
forrageira.

3. Efeitos biofísicos sobre a produção

3.1. Efeitos na produtividade do sistema


A associação de árvores com lavouras agrícolas ou pastos
pode resultar em competição, dependendo das características das
espécies, densidade de sombreamento e manejo da copa. Em
geral, na área de influência da copa da espécie de porte mais alto,
há maior competição por luz, podendo resultar em perda de
produção da espécie de porte inferior, mas essa perda pode ser
compensada pelo aumento de produção na área fora da projeção
da copa, ou em anos que sucedem geadas e pela maior
estabilidade da produção (CARAMORI et ai., 1995). Observações
de Ângelo Paes de Camargo (comunicação pessoal, 1997) e
dados experimentais como os apresentados por BAGGIO et ai.
(1997) indicam que rendimentos mais estáveis podem ser obtidos
com 25% a 35% de sombreamento de lavouras de café. O número
máximo de árvores para se chegar a esse nível de sombra
depende da(s) espécie(s) e do seu manejo.

A literatura produzida na América Central também indica


janelas de luz variáveis entre 20% e 60% da radiação
fotossinteticamente ativa para produção de café em SAFs.
Sombras muito homogêneas, ainda que parciais, podem resultar
em uma luz de baixa qualidade, pela retirada dos comprimentos
de onda mais ativos na fotossíntese (WILLEY, 1975). Os
resultados experimentais de CARELLI et ai. (2001) com
coberturas de sombrite evidenciaram redução de produção em
cafeeiros da cultivar Obatã com até 30% de sombreamento.
Assim, melhor efeito se deve obter de sombras que permitam a
entrada de fachos de luz não filtrados. Sombreamentos densos
provocam grandes quebras de produção, inviabilizando o cultivo
econômico (CARAMORI et ai., 1987; MORAIS et ai., 2003).

No caso da proteção contra geada, a questão se inverte, e a


preocupação passa a ser sobre o número mínimo de árvores
necessárias para se conseguir o nível de proteção desejado. Em
uma área onde não ocorreram geadas durante o período
120

experimental, BAGGIO et ai. (1997) observaram que, com até 70


árvores de grevílea/ha não houve quebra de produção de café. Já
em uma área sujeita a geadas freqüentes, CARAMORI et ai.
(1996) obtiveram máxima produção de café associado com 250
árvores de bracatinga/ha distribuídas no cafezal.

3.2. Efeitos dos SAFs na qualidade dos produtos obtidos


Dependendo das condições térmicas e hídricas e da
localização geográfica, as plantas em geral apresentam um
comportamento fenológico típico ao longo do ano (CAMARGO &
CAMARGO, 2001 ). Em cafeeiros, havendo suprimento de
nutrientes de acordo com a demanda da planta, os frutos
passarão por um processo normal de desenvolvimento e
maturação (PEZZOPANI et ai., 2003), com todo o potencial para
se obter um produto de boa qualidade. Entretanto, sob condições
de pleno sol e produção elevada, a ocorrência de excesso de
temperatura e deficiência hídrica podem provocar a má formação
dos grãos, resultando em menor tamanho e elevada porcentagem
de chochos e mal granados, com quebra no rendimento. Em um
estudo de arborização de café com guandu, realizado no ano
2001/2002, no Paraná, em que as temperaturas e a deficiência
hídrica foram elevadas, o sombreamento moderado contribuiu
para reduzir o excesso de radiação e a temperatura no interior do
cafezal, reduzindo o número de grãos chochos e mal formados e
melhorando significativamente a renda de benefício (CRUZ et ai.,
2003). Os efeitos positivos de temperaturas amenas sobre
características de qualidade do café como acidez, aroma, corpo e
outros foram demonstrados por ANDROCIOLI FILHO et ai. (2003).

No cafeeiro a pleno sol, o amadurecimento é forçado pelo


excesso de radiação solar e temperatura, não propiciando ao fruto
desenvolver as propriedades organalépticas que conferem
qualidade à bebida. Não é raro observarem-se frutos que passam
rapidamente do estágio de verde a maduro, sem o devido acúmulo
de massa necessário para a sua formação adequada, ocasionando
elevado número de grãos chochos, malformados e com peneiras
baixas. Ao reduzir o excesso de produção e desacelerar o
processo de maturação, uma arborização bem manejada pode
atenuar esses problemas e propiciar a colheita de grãos melhor
formados, de peneiras maiores e com melhor qualidade de
bebida.
Em pastagens, o excesso de temperatura e radiação também
pode levar a uma deterioração na qualidade e palatabilidade da
forrageira. Resultados de SILVA (1998) evidenciaram que sob
condições de sombreamento moderado de renques de grevílea
houve uma sensível melhora na qualidade de uma pastagem de
brachiaria no Noroeste do Paraná. Este efeito foi ainda mais
crítico durante o inverno, em que a pastagem sem árvores foi
atingida por geadas e a pastagem arborizada foi protegida,
permanecendo em condições de vegetar.

4. Características de espécies para utilização em SAFs

A escolha das espécies de árvores a implantar em Sistemas


Agroflorestais é um ponto central para o sucesso desta prática. O
primeiro critério é definir o problema climático principal a ser
atenuado. Onde a geada é a preocupação maior, é essencial que
a espécie de porte mais elevado mantenha a copa bem enfolhada
no inverno e que tenha um crescimento rápido. Nas regiões com
menor risco de geadas, onde a seca no inverno é mais
pronunciada, e, portanto, o risco de competição por água é maior,
devem-se preferir espécies que perdem suas folhas no inverno.

O segundo critério é qual o produto prioritário para geração de


renda ao produtor. Se o componente agropastoril (produção de
grãos, frutos ou forrageira) é o foco exclusivo, a preferência em
geral recai sobre as leguminosas, porque a fixação de N que elas
realizam contribui para reduzir o custo de produção. Se o produtor
vê no SAF uma oportunidade para diversificar fontes de renda, a
prioridade vai para árvores cujos produtos têm valor de mercado
em sua região, podendo recair em frutíferas, árvores para serraria,
etc. Do ponto de vista de manutenção da biodiversidade e para a
diminuição do risco de insucesso da exploração, o plantio de
várias espécies é mais indicado, mas o manejo se torna mais
complexo.

Além da escolha da(s) espécie(s), o efeito sobre a especIe


agrícola depende do número de árvores, da forma da copa, da
densidade da sombra e do manejo das podas.
1LL

5. Resultados da experimentação com arborização


conduzidas no Paraná

A título de ilustração, apresentamos a seguir alguns resultados


sobre o cafeeiro de experimentos com grevílea, leucena, bracatinga
e guandu.

Tendo em vista a necessidade imediata de proteger os


cafeeiros contra a geada, trabalhou-se com espécies de
crescimento rápido, como a bracatinga e o guandu, que podem
ser combinados com espécies de maior valor madeireiro, porém
de crescimento mais lento. Tanto o guandu (CARAMORI et ai.,
1999) quanto a bracatinga (CARAMORI et ai., 1996) se mostraram
excelente alternativas para proteção inicial do cafezal.

A bracatinga, por ser uma espécie subtropical, adapta-se bem


às regiões de climas mais amenos, com temperatura média anual
inferior a 22ºC e altitudes superiores a 500m, características das
áreas ao sul da região cafeeira do Paraná. Apresenta a vantagem
de rápido crescimento, chegando a crescer quatro metros no
primeiro ano. Possui o inconveniente de se quebrar com facilidade
quando plantada muito isolada e tem longevidade limitada (cinco a
oito anos) fora do seu ambiente ideal. É uma espécie melífera e
tem elevado poder calorífico, sendo excelente opção para
produção de lenha e carvão.

Experimentos conduzidos com a grevílea também mostraram


excelentes resultados. A grevílea possui sistema radicular
pivotante e profundo e, nos experimentos de campo, demonstrou
apresentar baixa competição com os cafeeiros e ser uma boa
opção para arborização de pastagens. Sua copa pouco densa
permite a passagem de luz direta durante períodos do dia,
diminuindo também a competição devido a este fator. Nossos
resultados mostram que uma população de 50 a 70 árvores por
hectare não diminui a produção de café, mesmo na ausência de
geadas. Proteção efetiva contra geadas foi obtida com populações
a partir de 70 árvores adultas por hectare, após a geada de 1994
(BAGGIO et ai., 1997). Renques de grevílea espaçados de 25
metros foram efetivos na proteção contra geadas no Noroeste do
Paraná e melhoraram a qualidade das pastagens (SILVA, 1998).
Espécies leguminosas que toleram podas, como a Leucaena
Jeucocephala e Leucaena diversifo/ía, propiciam biomassa para
rápida reciclagem de nutrientes e melhoria das propriedades
físicas dos solos, e apresentam ainda a vantagem de fixar
nitrogênio atmosférico. Experiências com essas duas espécies
conduzidas no IAPAR tiveram bons resultados em termos de
reposição de matéria orgânica do solo e reciclagem de nutrientes,
em solos argilosos com balanço hídrico favorável. Essas leucenas
podem ser podadas até três vezes ao ano, entre setembro e
janeiro, permanecendo em crescimento livre o restante do ano
para sombra e proteção contra geadas no inverno. As leucenas
apresentam também o inconveniente de produzir muitas sêmentes,
que germinam e exigem ao menos uma capina por ano para
eliminação da sementeira. Em áreas onde a deficiência hídrica é
um problema, a leucena pode ser contra-indicada, pois é bastante
competitiva por água.

O consórcio do cafezal com seringueira também é uma


prática altamente viável. O plantio de seringueira em uma lavoura
de café, em solo arenoso do Noroeste do Paraná, em fase de
depauperamento, propiciou a recuperação do cafezal, que
proporcionou produtividades econômicas até o sexto ano,
aumentou o crescimento e reduziu o tempo para início de sangria
de clones de seringueira (PEREIRA et ai., 2001 ).

O consórcio com algumas espécies frutíferas é outra alternativa


que pode agregar renda ao produtor e diversificar a produção. Os
experimentos de consorciação de café com banana têm mostrado
que a bananeira, desde que bem manejada, pode ser uma
excelente opção. O plantio de três a quatro covas de bananeira
nanica, espaçadas a cada seis a oito metros, no Município de
Porecatu, PR, contribuiu para amenizar o microclima e reduzir o
depauperamento do café em um período quente e seco. Neste
caso, deve-se conduzir as touceiras de bananeira, eliminando-se
a brotação e permitindo o surgimento de um novo rebentão após a
colheita do cacho e corte da planta mãe.

Para a implantação de novos cafezais, a melhor técnica


disponível atualmente é o plantio em túneis de guandu, cujo
pioneiro foi o agricultor Américo Figueiredo Netto, no Município
Abatiá, na década de 1980. Inicialmente, o guandu foi idealizado
como alternativa à cobertura das covas com madeira, praticada
nos plantios pioneiros, como alternativa para exercer sombra
sobre os cafeeiros na fase de implantação, através da formação
de um túnel resultante do cruzamento das hastes de guandu
sobre a linha de café. Com o passar do tempo, observou-se que
esta tecnologia apresenta a vantagem de melhorar o pegamento
das mudas, além de outras que serão descritas em seguida.

Em experimentos conduzidos em Londrina, Abatiá e Jesuítas,


as temperaturas das folhas do café em noites frias foram entre 2 e
4°C mais elevadas na área protegida com guandu, indicando que
geadas com temperaturas negativas até esses valores não
afetariam o cafeeiro. A geada queima as folhas do guandu, mas o
cafeeiro sob o túnel é protegido. Durante o dia, a temperatura
máxima do ar foi até ?ºC mais amena sob o guandu, provocando
uma menor taxa de transpiração e, conseqüentemente, maior
índice de pegamento das mudas, reduzindo custos com replantio
e irrigação. O sombreamento também inibe a proliferação de
ervas, reduzindo as necessidades de capina, e diminui a
infestação de pragas.

A eliminação do guandu deve ser gradual, para o cafezal ir se


ajustando ao novo nível de luz, mas o melhor calendário para a
eliminação ainda não foi definido. Aparentemente, há vantagens
em implantar árvores de crescimento mais lento, junto com as
mudas de café, e ir eliminando o guandu à medida que ele for
morrendo naturalmente, três a quatro anos após o plantio.

6. Análise dos efeitos da queima de bracatinga para


cultivo agrícola

Foi realizado um estudo para analisar as modificações ambientais


que ocorrem, após o processo de queima, em um talhão de
sistema agroflorestal tradicional de cultivo de bracatinga (Mimosa
scabrella Benth.), na Região Metropolitana de Curitiba, Paraná
(GRODZKI, 2000). O estudo constituiu-se de: i) avaliação
microme-teorológica de uma área florestada com bracatinga de
aproxima-damente três anos e uma área adjacente após a
exploração da bracatinga, com idade de sete anos; ii) quantificação
dos resíduos vegetais na área explorada; iii) avaliação do balanço
energético e do comportamento do fogo; iv) análise · dos
macronutrientes antes e depois da queima dos resíduos vegetais;
v) identificação das espécies herbáceas, arbustivas e arbóreas
' regeneradas após o fogo e vi) regeneração da bracatinga após a
queima.

As avaliações realizadas indicaram uma quantidade média de


material combustível ao redor de 24,9t.ha- 1 , sendo 4,2% de
material verde; 39,9% de serapilheira; 12,3% de material lenhoso
até 0,7cm de diâmetro; 29,4% entre 0,7cm e 2,5cm; 14,1% entre
2,6 e 7,6cm e 0,5% acima de 7,6cm de diâmetro.

Após a queima, a quantidade de material combustível residual


ficou em 8,St.ha- 1 , sendo a maior fração correspondente à
serápilheira (36,9%). Em média, foram queimados 66,20% do
material combustível. A intensidade média do fogo foi de
384,0Kcal.m- 1 .s-1 e o calor liberado por unidade de área atingiu
9367,9Kca1.m-2 .s- 1 . O tempo de residência médio do fogo foi de 12
segundos.

A temperatura do ar a 1cm do solo atingiu, durante a queima,


um valor máximo de 600ºC. Para alturas maiores (60 e 160cm), os
valores máximos foram de 287ºC e 94°C, respectivamente. As
medidas de temperatura do solo mostraram que a 2,5cm de
profundidade houve elevação de 23ºC para 24ºC, indicando que a
queima não afetou a atividade biológica pela ação da temperatura.

As medidas de amplitude térmica entre as áreas descoberta e


com bracatinga mostraram uma diferença aproximada de 2ºC,
com maiores valores para a área aberta. Os fluxos de energia
medidos na área aberta mostraram que, num dia ensolarado,
80,9% da energia recebida foi transformada em fluxo de calor
latente (energia gasta para a evaporação), 11,6% foram usados
para o fluxo de calor sensível (energia gasta para o aquecimento
do ar) e 7,4% foram para o fluxo de calor no solo (aquecimento do
solo).

As análises de nutrientes do solo após a queima evidenciaram


um acréscimo no pH, P, Mg, Ca, K e um conseqüente decréscimo
do AI++, situação que tendeu voltar ao normal três meses e meio
após a queima. Das 32 espécies vegetais que se instalaram após
a queima dos resíduos, 14 eram herbáceas e 18 arbustivas e/ou
126

arbóreas. As de maior freqüência foram Panicum sabulorum,


Cyperus hermaphroditus e lmperata brasiliensis. Dentre as
arbóreas e/ou arbustivas, além da Mimosa scabrella, foram
observadas So/anum megalochiton, Pa/icourea sp e Psycotria sp.
A análise da regeneração da bracatinga mostrou que a maior
emergência das plântulas ocorreu 15 dias após a queima, caindo
significativamente aos 30 dias e reduzindo-se a praticamente zero
aos 115 dias.

7. Referências

ANDROCIOLI FILHO, A., LIMA, F. B., TRENTO, E. J., CARNEIRO


FILHO, F., CARAMORI, P. H., SCHOLZ, M. B. S. Caracterização da
qualidade bebida dos cafés produzidos em diversas regiões do Paraná.
ln: SIMPÓSIO DE PESQUISA DOS CAFÉS DO BRASIL, 3. Porto
Seguro, BA., 2003. Anais. Brasília: Consórcio Brasileiro de Pesquisa e
desenvolvimento do Café, 2003.

BAGGIO, A. J., CARAMORI, P. H., ANDROCIOLI Filho, A., MONTOYA,


L.J.V. Productivity of southern Brazilian coffee plantations shaded by
different stockings of Grevillea robusta. Agroforestry Systems v. 37, p.
111-120, 1997.

CAMARGO, A. P.; CAMARGO, M. B. P. Definição e esquematização das


fases fenológicas do cafeeiro arábica nas condições tropicais do Brasil.
Bragantia. Campinas, SP: v.60, n.1, p.65 - 68, 2001.

CARAMORI, P.H., OMETTO, J.C.; VILLA NOVA, N. A., Costa, J. D.


Efeitos do vento sobre mudas de cafeeiro Mundo Novo e Catuaí
Vermelho. Pesquisa Agropecuária Brasileira, Brasília, v. 21, n.11, p.
1113-111 8, 1986.

CARAMORI, P. H., MANETTI FILHO, J., FARIA, R. T., ANDROCIOLI


FILHO, A. Arborização do cafeeiro com Leucaena leucocephala para
proteção contra geadas. ln: CONGRESSO BRASILEIRO DE
AGROMETEOROLOGIA, 5., 1987, Belém. Anais. Campinas: Sociedade
Brasileira de Agrometeorologia, 1987.

CARAMORI, P. H., MORAIS, H. Proteção de cafezais contra geada


através do plantio intercalar de espécies anuais ln: CONGRESSO
BRASILEIRO DE AGROMETEOROLOG IA, 11. E li REUNIÃO LATINO-
AMERICANA DE AGROMETEOROLOGIA, 2., 1999, Florianópolis.
Anais. Campinas: Sociedade Brasileira de Agrometeorologia, 1999.
p.380-380.
CARAMORI, P. H. Arborização dos Cafezais Para Proteção Contra
Geadas na Região Sul do Brasil. ln: REUNIÓN ARGENTINA DE
AGROMETEOROLOGIA, 7., Y REUNIÓN. LATINOAMERICANA DE
AGROMETEOROLOGIA, 1., Buenos Aires. Anais. Buenos Aires:
Sociedade Argentina de Agrometeorologia, 1997. p.17 - 18.

CARAMORI, P. H., ANDROCIOLI FILHO, A., BAGGIO, A. Arborização


do cafezal Com Grevilea Robusta no Norte do Estado do Paraná .
Arquivos de Biologia e Tecnologia, Curitiba, v.38, n.4, p.1031 - 1037,
1995.

CARAMORI, P. H., ANDROCIOLLI FILHO, A., LEAL, A. C. Coffee shade


with Mimosa scabrella Benth. for frost protection in southern Brazil.
Agroforestry Systems, v. 33, p. 205-214, 1996.

CARAMORI, P. H., LEAL, A. C., MORAIS, H. Temporary shading of


young coffee plantations with pigeonpea (Cajanus cajan) for frost
protection in southern Brazil. Revista Brasileira de Agrometeorologia,
Santa Maria: v.7, n.2, p.1 -4, 1999.

CARAMORI, P. H., MORAIS, H., ANDROCIOLI FILHO, A., LEAL, A. C.,


GORRETA, R., CRUZ, R. F. R. Utilização de espécies intercalares ao
cafezal para proteção contra geadas: resultados e perspectivas ln:
SIMPÓSIO DE PESQUISA DOS CAFÉS DO BRASIL, 2., 2001, Vitória
ES. Anais. Brasília: Embrapa Café, 2001. p.23 - 23.

CARAMORI, P. H. Uso de arborização para modificação do ambiente em


cafezais ln: SIMPÓSIO BRASILEIRO SOBRE FIXAÇÃO DE CARBONO
EM SISTEMAS AGRICOLAS E FLORESTAIS, 1., 2003. (CD ROM).
Londrina: Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR), 2003.

CARELLI, M. L. C.; FAHL, J. I.; ALFONSI, E. L. Efeitos de níveis de


sombreamento no crescimento e produtividade do cafeeiro. ln.
SIMPÓSIO DE PESQUISA DOS CAFÉS DO BRASIL, 2., 2001, Vitória,
ES. Resumos ... Vitória: EMBRAPA, 2001, p.16.

CRUZ, R. F. R., GORRETA, R., CARAMORI, P. H., MORAIS, H. Efeito


da arborização com guandu na primeira produção de café no norte do
Paraná ln: SIMPÓSIO DE PESQUISA DOS CAFÉS DO BRASIL, 3.,
Porto Seguro. Anais. Brasília: Embrapa Café, 2003. v.1.

GRODZKI, L. Efeitos do fogo sobre variáveis micrometeorológicas


em uma floresta de bracatinga (Mimosa scabrel/a Benth.) manejada
sob o sistema agroflorestal, em Colombo, PR. 2000. Tese (Doutorado
em Ciências Florestais) - Setor de Ciências Agrárias, Universidade
Federal do Paraná, Curitiba.
128

LEAL, A. C. Quebra-ventos arbóreos: aspectos fundamentais de


uma técnica altamente promissora. Publicação Seriada . Londrina:
IAPAR, 1986.

MORAIS, H., MARUR, C. J., CARAMORI, P. H., RIBEIRO , A. M. A.,


GOMES, J. C. Características fisiológicas e de crescimento de cafeeiro
sombreado com guandu e a pleno sol. Pesquisa Agropecuária
Brasileira, Brasília, v.38, n.10, p.1131 -1137, 2003.

MORAIS, H., MEDRI, M., CARAMORI, P. H., MARUR, C. J., RIBEIRO,


A. M. A. Leaf anatomy of Coffea arabica grown under the shade of
Pigeonpea (Cajanus cajan) and under full sun . Brazilian Archives of
Biology and Technology, Curitiba , v.4 , n.6, p.863-871, 2004.

PEREIRA, J. P., ANDROCIOLI FILHO , A. , LEAL, A. C. , RAMOS , A. L. M.


Consorciação da seringueira e cafeeiro em fase terminal : Efeito no
desenvolvimento vegetativo da seringueira e produção do cafeeiro. ln :
SIMPÓSIO DE PESQUISA DOS CAFÉS DO BRASIL, 2., Vitória. Anais.
Brasília: Embrapa Café, 2001.

PEZZOPANE, José Ricardo Macedo, PEDRO JR, Maria José,


THOMAZIELLO, Roberto Antonio, CAMARGO, M. B. P. Escala para
avaliação de estádios fenológicos do cafeeiro arábica. Bragantia.
Campinas, v.62, n.3, p.499 - 505, 2003.

SILVA, V. P. Modificações microclimáticas em sistema silvipastoril


com Grevil/ea robusta A. Cunn. Ex. R. Br. na região noroeste do
Paraná, 1998. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal de Santa
Catarina, Florianópolis.

Willey, R. W. The use of shade in coffee, cocoa and tea. Horticultura!


Abstracts v. 45, p. 791-798, 1975.
Indicadores sociais, econômicos e
ambientais de SAFs
Geraldo Stachetti Rodrigues
Ecologista, Dr. Pesquisador da Embrapa Meio
ambiente. E-mail: stacheti@cnpma .embrapa.br

1. Introdução

Uma característica do recente desenvolvimento rural no Brasil


é a diversificação de atividades alternativas, implementadas
paralelamente aos tradicionais usos agrícolas da terra, configurando
o que tem sido denominado o "Novo Rural" (CAMPANHOLA &
GRAZIANO DA SILVA, 2000). Importantes alterações socioe-
conômicas e ambientais associadas a estas atividades do Novo
Rural resultam tanto em melhorias quanto em ameaças ao
desenvolvimento sustentável dos espaços rurais, impondo a
necessidade de avaliação dos impactos associados.

Em geral, as avaliações de impacto não integram ao enfoque


ambiental mudanças econômicas, sociais, culturais e de gestão
que podem ocorrer nas comunidades envolvidas direta e
indiretamente no empreendimento, tais como distribuição de
renda, acesso à educação, acesso a serviços básicos, padrão de
consumo, acesso a esporte e lazer, conservação do patrimônio
histórico e artístico, qualidade do emprego, segurança e saúde
ocupacional, entre outras. Contudo, são estas mudanças que
efetivamente afetam o desenvolvimento local e a qualidade de
vida na comunidade, sendo que sua consideração nas AIAs
permitiriam estabelecer a necessária conexão entre avaliação de
impacto e sustentabilidade, no seu sentido amplo.

Na prática, a sustentabilidade pode ser avaliada por um


conjunto de parâmetros ou indicadores ecológicos (referentes aos
meios biótico e a biótico dos ecossistemas), combinados com
variáveis agronômicas, econômicas e sociais. Os indicadores têm
as seguintes funções: sintetizar grandes quantidades de dados;
mostrar a situação atual em relação ao objetivo almejado;
demonstrar progresso em relação às metas estabelecidas e
comunicar o estado atual aos usuários (cientistas, formuladores
de políticas públicas e sociedade) de modo a orientar a tomada de
1.JU

decisões para gestão ambiental das atividades avaliadas


(MITCHELL et ai., 1995). Este trabalho descreve um sistema
integrado de indicadores de sustentabilidade (APOIA-NovoRural)
aplicado à gestão ambiental de estabelecimentos dedicados ao
desenvolvimento de Sistemas Agroflorestais (SAFs).

2. Material e métodos

O sistema APOIA - Novo Rural consiste de um conjunto de


matrizes escalares (RODRIGUES, 1998) formuladas de maneira a
permitir a avaliação de indicadores de desempenho ambiental de
uma atividade rural no âmbito de um estabelecimento, considerando
cinco dimensões: i) Ecologia da Paisagem, ii) Qualidade dos
Compartimentos Ambientais (atmosfera, água e solo), iii) Valores
Socioculturais, iv) Valores Econômicos e v) Gestão e
Administração . O estabelecimento rural constitui-se na escala
espacial de análise, e como corte temporal adota-se a situação
anterior e posterior à implantação (ou a área com e sem
influência) da atividade avaliada.

O sistema consta de 62 indicadores, compostos a partir de


revisão de métodos de AIA descritos na literatura (NEHER, 1992:
STOCKLE et ai., 1994; BOCKSTALLER et ai., 1997; McDONALD
& SMITH, 1998; GIRARDIN et ai., 1999; BOSSHARD, 2000;
RODRIGUES et ai., 2000; ROSSI & NOTA, 2000), discussões em
grupos e "workshops", além de consultas a especialistas. Os
indicadores foram selecionados, compostos e organizados de
forma a cobrir uma ampla gama de efeitos ambientais e
aplicáveis, em sua totalidade, a quaisquer atividades rurais. O
conjunto de dimensões e indicadores, com suas respectivas
unidades de medida obtidas em campo e laboratório, bem como
as principais características do sistema APOIA-NovoRural, estão
descritos em RODRIGUES & CAMPANHOLA (2003).

A abordagem dos impactos ambientais com os indicadores do


sistema APOIA-NovoRural faz-se via matrizes de ponderação
construídas para cada indicador, em plataforma MS-Excel®. As
matrizes são elaboradas de forma a ponderar automaticamente os
dados referentes aos indicadores, e expressar graficamente o
índice de impacto resultante, como exemplificado na Figura 1.
Ta bela de número de pessoas expostas
Fatores de periculosidade Fatores de insalubridade
Segurança e o
saúde ,g .! ·e
u.
ocupacional
Fonte de ~ i
risco- ~ ·E
o:::-~

Número de
traba lhadores-
lndice de se uran a ocu 1.1
ISOcup Utili dade Equação de melhor ajuste para Utilidade
10 O Função Linear; y=(a+bx)
Coeficientes:
:4
~:! 5j
0.6
a=
b=
1.00
-0.10

2
1
º·ª
0.9
1 o
0
...
2 8 ,o
indlce d! Sal.Ide ocuiadonal
O 1 ' U-ISOcu = 0.89

Figura 1. Exemplo de matriz de ponderação para indicador de avaliação


de impacto ambiental do sistema APOIA-NovoRural.

A Figura 1 apresenta o exemplo de matriz de ponderação do


indicador Segurança e saúde ocupacional, contendo células para
entrada de dados sobre o indicador, no caso, número de
trabalhadores expostos, no exercício da atividade, a fatores de
periculosidade e insalubridade. Adicionalmente, a matriz de
ponderação inclui a expressão para o cálculo do índice de impacto
(soma de expostos/número total de trabalhadores, no presente
exemplo, índ ice de segurança ocupacional igual a 1, 1) e uma
tabela de correspondência entre índice de impacto e desempenho
ambiental em valores de Utilidade (U-ISOcup=0,89), também
expressa graficamente.

O índice de impacto do indicador é transformado por uma


função de valor (no presente exemplo representado por uma
Função Linear) que o relaciona com o desempenho ambiental da
atividade em uma escala de Utilidade (BISSET, 1987) que varia
de O a 1, a exemplo do que foi utilizado por DEE et ai., ( 1973 ),
CANTER & HILL (1979), ANDREOLI & TELLARINI (2000) e
GIRARDIN et ai., (2000). Os resultados da avaliação são
apresentados em uma planilha de AIA da atividade rural,
expressos graficamente para cada dimensão considerada,
permitindo apontar quais indicadores merecem consideração de
ajuste de manejo para adequação da gestão ambiental da
atividade. Os resultados são então agregados pelo valor médio de
Utilidade para o conjunto de indicadores em cada dimensão e
expressos em um gráfico-síntese de impacto ambiental da
132

atividade, conformando um instrumento para a ecocertificação,


segundo as condições da avaliação.

3. Resultados

As avaliações realizadas nos setores de horticultura, pesque-


pagues e agroturismo, aplicando-se o Sistema APOIA-NovoRural
(RODRIGUES et ai., 2003), têm apontado que a Dimensão
Ecologia da Paisagem representa a principal deficiência de gestão
dos estabelecimentos, com os indicadores de Áreas de Preservação
Permanente, Reserva Legal, Diversidade da Paisagem e
Diversidade produtiva sendo aqueles que mais comprometem o
desempenho ambiental dos estabelecimentos. Estes são
exatamente os indicadores mais favorecidos com a implantação
de SAFs, além de suas implicações nas Dimensões de Valores
Econômicos e de Qualidade Ambiental.

Neste momento de formação de nichos especiais de mercado,


que premiam a inserção diferenciada de produtores dedicados a
modelos produtivos sustentáveis, como aqueles que integram
Sistemas Agroflorestais, métodos que permitam avaliar,
documentar e gerir adequadamente estes modelos diferenciados
de produção, a exemplo do APOIA-NovoRural, são ferramentas
importantes no processo evolutivo de formação de um mercado
ético e solidário. Com a organização coletiva de comunidades
locais sustentáveis, a gestão ambiental dos espaços rurais
permite a denominação de origem sustentável da produção,
estendendo ao alcance social do manejo ecológico agropecuário.

4. Agradecimentos

O presente estudo recebeu suporte da Fundação de Amparo à


Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), junto ao Projeto
Rurbano Fase Ili (Instituto de Economia da Unicamp); e do
Programa de Apoio à Agricultura Familiar do Conselho de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Especial
agradecimento é dedicado aos responsáveis pelos estabelecimentos
que contribuíram para a validação do Sistema APOIA-NovoRural.
5. Referências
ANDREOLI, M.; TELLARINI, V. Farm sustainability evaluation:
methodology and practice. Agriculture, Ecosystems and Environment,
v.77, p. 43-52, 2000.

BISSET, R. Methods for environmental impact assessment: a selective


survey with case studies. ln: BISWAS, A. K.; GEPING, Q ., Eds.
Environmental lmpact Assessment for Developing Countries.
London : Tycooly lnternational, p. 3-64, 1987.

BOCKSTALLER, C.; GIRARDIN, P.; VAN DER WERF, H. M .G. Use of


agro-ecological indicators for the evaluation of farming systems.
European Journal of Agronomy, v. 7, p. 261-270, 1997.

BOSSHARD, A. A methodology and terminology of sustainability


assessment and its perspectives for rural planing. Agriculture,
Ecosystems and Environment, v. 77, p. 29-41, 2000.

CAMPANHOLA, C.; GRAZIANO DA SILVA, J. O Novo Rural Brasileiro:


uma Análise Nacional. Jaguariúna (SP): Embrapa Meio Ambiente, 2000,
190p.

CANTER, L. W.; HILL, G. L. Handbook of Variables for Environmental


lmpact Assessment. Ann Arbor (MI): Ann Arbor Science Publishers lnc.
203 p. 1979.

DEE, N.; BAKER, J.; DROBNY, N.; DUKE, K.; WHITMAN, 1.;
FAHRINGER, D. An environmental evaluation system for water resource
planning . Water Resources Research, vol. 9, n.3, p.523-535, 1973.

GIRARDIN, P.; BOCKSTALLER, C.; VAN DER WERF, H. lndicators:


toais to evaluate the environmental impacts of farming systems . Journal
of Sustainable Agriculture, v. 13, n. 4, p. 5-21, 1999.

GIRARDIN, P. ; BOCKSTALLER, C.; VAN DER WERF, H. Assessment of


potential impacts of agricultura! practices on the environment: the
AGRO*ECO method. Environmental lmpact Assessment Review, v.
20, p. 227-239,2000.

MCDONALD, G. T.; SMITH, C. S. Assessing the sustainability of


agriculture a the planning stage. Journal of Environmental
Management, v. 52, p. 15-37, 1998.

MITCHELL, G.; MAY, A.; MCDONALD, A. PICABUE: a methodological


framework for the development of indicators of sustainable development.
134

lnternational Journal of Sustainable Development and World


Ecology. v. 2, p. 104-123, 1995.

NEHER, D. Ecological sustainability in agricultura! systems: definition and


measurement. Journal of Sustainable Agriculture, v.2, n.3, p.51 -61,
1992.

RODRIGUES, G.S. Avaliação de impactos ambientais em projetos de


pesquisas: Fundamentos, princípios e introdução à metodologia .
Jaguariúna, SP: EMBRAPA-CNPMA, p. 66, 1998.

RODRIGUES, G. S.; BUSCHINELLI, e. e. de A.; IRIAS, L. J. M.; LIGO,


M. A. V. Avaliação de Impactos Ambientais em Projetos de Pesquisa
li: Avaliação da Formulação de Projetos - Versão 1. Jaguariúna (SP):
Embrapa Meio Ambiente, Boletim de Pesquisa 1O. 28 p, 2000.

RODRIGUES, G. S.; CAMPANHOLA, C. Sistema integrado de avaliação


de impacto ambiental aplicado a atividades do Novo Rural. Pesquisa
Agropecuária Brasileira, v. 38, n. 4, p. 445-451, 2003.

RODRIGUES, G. S.; CAMPANHOLA, C.; VALARINI, P. J.; QUEIROZ, J.


F. de; FRIGHETTO, R. T. S.; RAMOS FILHO, L. O.; RODRIGUES, 1. A.;
BROMBAL, J. C.; TOLEDO, L. G. de. Avaliação de impacto ambiental
de atividades em estabelecimentos familiares do novo rural.
Jaguariúna: Embrapa Meio Ambiente, 2003. 44 p. (Embrapa Meio
Ambiente. Boletim de Pesquisa e Desenvolvimento, 17).

ROSSI, R.; NOTA, D. Nature and landscape production potentials of


organic types of agriculture: a check of evaluation criteria and parameters
in two Tuscan farm-landscapes. Agricultura, Ecosystems and
Environment, v. 77, p. 53-64, 2000.

STOCKLE, C. O.; PAPENDICK, R. I.; SAXTON, K. E.; CAMPBELL, G.


S.; VAN EVERT, F .K. A framework for evaluating the sustainability of
agricultura! production systems. American Journal of Alternativa
Agricultura, v. 9, n.1-2, p. 45-51, 1994.
Conocimiento local en el manejo de recursos
naturales de la etnia Shipibo - Conibo, Rio
Ucayali, Pucallpa, Peru
2
Julio Alegre 1, Luis Arévalo ,
3 4
N. Luque y L. Josh1
1
Profesor Principal de la Universid ad Nacional
Agrari a la Molina Lima , Perú.
2
E-mail: j.alegre@lamolin a.edu.pe. Consultor
3
lndependiente, Tarapoto Perú. Estudiante
CATIE Costa Rica . 4 Científico ICRAF - ASIA.

1. Introdução

De 12 etnias asentadas en la región Ucayali, Perú se


selecciono la etnia Shipibo Conibo, con las comunidades nativas:
Limóngema , Santa Isabel de Bahuanisho, Palestina y Puerto
Bethel, Panaillo, Patria Nueva y Saposoa con el objetivo de
rescatar sus conocimientos ecológicos locales sobre el manejo de
los recursos naturales en ecosistemas inundados. Estas fueron la
fertilidad y tipo dei suelo, inundación , especies tolerantes a la
inundación, cultivas anuales, plagas, tumba y quema, pesca y
caza.

EI manejo de recursos se basa alrededor de los periodos de


inundación y de los suelos inundables. EI Conocimiento agrícola
de la etnia shipibo conibo no es muy antiguo, por lo que
presentan un mediano conocimiento sobre tipos de suelo. Se
encontrá conflictos de conocimientos entre agricultores, agricultor-
literatura; conocimiento local y conocimiento científico, lo cual sirve
para poder investigar más sobre determinadas afirmaciones de
todas las fuentes de información.

Los shipibos conibos presentan un gran conocimiento sobre


plantas medicinales, y sus actividades principales son la caza y la
pesca que es su fuente de alimento indispensable en su vida
diaria, aunque en los últimos anos están aprendiendo mas de la
agricultura a la cual le están dedicando mas tiempo.

La etnia Shipibo Conibo, pertenece ai grupo Lingüístico Pano,


quienes predominan en todo el ámbito de la región Ucayali. Esta
etnia, por varias décadas tuvo como actividad principal la
136

La etnia Shipibo Conibo, pertenece ai grupo Lingüístico Pano,


quienes predominan en todo el ámbito de la región Ucayali. Esta
etnia, por varias décadas tuvo como actividad principal la
recolección, basados en la pesca, caza, frutas, plantas
medicinales y otros. Paralelamente producían algunos cultivos de
subsistencia como la yuca y el plátano en pequenas parcelas para
complemento de su alimentación diaria. Sin embargo, son
conocedores dei manejo racional de los recursos, conociendo que
especies, en que época y que cantidades pescar, cazar y
cosechar. Son conocedores además de las diversas especies
arbóreas maderables, y especies para otros usos.

En esta última década, debido a la culturización de la etnia,


detectaron otras necesidades para las nuevas generaciones;
acordes con la evolución dei tiempo. Entre las principales
necesidades detectadas fueron la educación y la salud.

Para satisfacer estos requerimientos, los miembros de esta


etnia se vieron obligados a diversificar sus actividades, lo cual los
indujo a dedicar mucho más tiempo a la agricultura en sus
parcelas, buscando productos que les permita generar ingresos
económicos extras para el beneficio de la familia. Podemos
deducir que recién están conociendo la agricultura para mercado.
EI sistema agrícola practicado por esta etnia gira alrededor de los
suelos aluviales; los cuales presentan periodos anuales de
inundación que varía entre 2 a 3 meses, durante ese periodo de
tiempo se dedican exclusivamente a la caza y pesca, la actividad
agrícola la realizan luego de este periodo (8 a 9 meses)
aprovechando el aporte de nutrientes en el suelo por el río con las
inundaciones.

EI proceso metodológico de seguimiento y clasificación dei


conocimiento nativo así como la aplicación de un software a sido
documentado en v-arios estudios realizados en Asia y
Latinoamérica (Laxman et. ai, 2004; Sinclair and Walker 1999;
Thapa et. ai, 1995; Walker et. ai, 1997).

EI objetivo de éste trabajo fue el de rescatar los conocimientos


ecológicos local que tiene la etnia, sobre el manejo de los
recursos naturales en ecosistemas inundados, sobre la fertilidad y
tipo dei suelo, inundación, especies tolerantes a la inundación,
cultives anuales, plagas, tumba y quema, pesca y caza.

2. Procedimiento metodologico

De entre 12 etnias asentadas en la región Ucayali,


seleccionamos la etnia Shipibo Conibo, por varies factores, entre
ellos: ser la más representativa de Ucayali, por el tiempo de
establecimiento, por su distribución en la zona en estudio y por su
mayor población. Dentro de esta etnia, seleccionamos algunas de
las comunidades, las cuales están ubicadas en sectores
equidistantes a la ciudad de Pucallpa, que es la capital de la
región Ucayali.

Las comunidades nativas seleccionadas fueron siete: Limón-


gema, Santa Isabel de Bahuanisho, Palestina y Puerto Bethel,
Panaillo, Patria Nueva y Saposoa. Las primeras cuatro comuni-
dades se encuentran ubicadas aguas arriba dei río Ucayali; mien-
tras que las tres comunidades restantes están ubicadas aguas
abajo dei mismo río, tomando como punto central de referencia la
ciudad de Pucallpa. Las comunidades de Palestina y puerto
Bethel, se encuentran ubicados en una tipishca, (antiguo meandro
dei río) donde anteriormente circulaba el río Ucayali, ahora es
como una laguna, lo cual ha influenciado en sus actividades
recientes. La comunidad de Panaillo se encuentra ubicado en la
desembocadura dei río Aguaytia en el río Ucayali, lo cual
ocasiona que la comunidad se inunde totalmente en los períodos
de lluvias y aumento de caudal de ambos ríos.

La información de estas siete comunidades fue colectada en


varias fases. La primera fase fue la de reconocimiento o primera
visita. Como su nombre lo indica, permitió identificar a las
personas o grupos, así como también a las autoridades de la
comunidad, que podrían ser entrevistadas, se identificá también
las costumbres, problemáticas y como se manejaba el sistema de
autoridades en cada comunidad . Para el caso de las
comunidades ubicadas aguas arriba dei río Ucayali; en cada una
de ellas se identificaron entre 2 a 3 personas para las entrevistas.
Por lo general, las personas seleccionadas eran los líderes, en
otros casos autori-dades de la comunidad, personas con más
tiempo de hermanen-cia, o agricultores que estaban dispuestos a
138

dialogar, buscando siempre aquellas personas que tengan el


mayor caudal de conocimientos sobre el manejo de los recursos
naturales de la zona.

Si los entrevistados demostraban disponibilidad para


conversar, se continuaba con la entrevista. En muchas ocasiones,
esta no funcioná y en algunas comunidades se llegaron a
entrevistar a 1 ó 2 personas y en otros casos no se puda
entrevistar a ninguna persona; algunas veces esta también fue
debido ai tiempo de permanencia dentro de cada una de las
comunidades.

En esta misma etapa pero para las comunidades ubicadas


aguas abajo dei rio Ucayali las entrevistas se realizaron en forma
individual y grupal. Durante las entrevistas grupales; en muchas
de las preguntas hechas a los integrantes dei grupo, antes de dar
sus respuestas surgía una conversación-discusión entre ellos y
finalmente llegaban a un acuerdo-respuesta, la cual se anotaba
para el presente trabajo. Estas visitas se realizaron conjuntamente
con la ONG NON NETE conformada por los miembros de esta
etnia, ellos nos facilitaron las entrevistas con la ayuda de un
intérprete, para mejorar nuestra comunicación y entendimiento
directo. En total se entrevistaron a 24 personas, de los cuales se
seleccionaron 13 para crear la base de datas dei conocimiento
local ecológico.

En la segunda etapa o segunda visita en ambos sectores, se


buscó información de los agricultores seleccionados, realizándose
entrevistas con preguntas nuevas o complementarias a las ya
obtenidas, para clarificar las respuestas anteriores; debido a que
en algunos casos habian contradicciones en las afirmaciones
mencionadas por los agricultores, y contradicciones con la
literatura revisada, adicionalmente se visitaron las chacras en los
dias de trabajo revisando periódicamente la información obtenida,
siendo importante la disponibilidad de horarios para las entrevistas
para conseguir el nivel de confianza requerido. La entrevista giró
alrededor de los tópicos elegidos, y en ocasiones se puda notar el
gran conocimiento sobre plantas medicinales y su uso
(recolecciones).
Las entrevistas fueron no formales, grabadas con permiso de
los entrevistados y en algunos casos fueron escritas para facilitar
nombres y los términos shipibos que es el idioma oficial de la etnia
Shipibo-Conibo.
La información obtenida, fue almacenado en la base de
conocimiento dei AKT5, realizándose constantes revisiones,
ingresando la fuente (nombre dei agricultor), nombre de la
comunidad. Luego se procedió a la representación esquemática
de la información utilizando el software AKT5, desarrollándose de
este modo la base de conocimiento (AKT5 - the Agroecological
Knowledge Toolkit puede ser adquirido enforma libre de la pagina
web www.bangor.ac.uk/afforum) ya que provee las facilidades
necesarias para un record explicito, acceso y evaluación dei
conocimiento local nativo. Esta disefíado para representar en
forma jerárquica la información, mostrando los sinónimos y
explorando las relaciones de causas y efectos. En las fases
finales se involucra una prueba de generalidad (o distribución) dei
conocimiento a lo largo de comunidades múltiples. De la población
meta se toma una muestra mas grande en forma randomizado
(Walker et. ai 1997) para explorar que tan representativo es la
base dei conocimiento. Para detalles en las que se incluye la
racionalidad dei alcance y el manual de sofware AKT5 ver Dixon
et. ai, 2001.

La tercera fase dei estudio o también llamada fase de


comprobación, consistió en seleccionar ai azar el 25% de las
preguntas realizadas en las entrevistas en las dos primeras etapas
en un tipo de encuesta con preguntas cerradas, colocándolas
como oraciones de aseveración o negación para que los
entrevistados seleccionen el tipo de respuesta según su
conocimiento en general; cuidando que los pobladores
entrevistados no hayan participado de las entrevistas previas.

3. Resultados

A continuación se presentan los resultados obtenidos según los


tópicos estudiados. Estes resultados reflejan los conocimientos
que poseen los miembros de las diferentes comunidades
entrevistadas, sin importar su ubicación con respecto a Pucallpa,
la ciudad capital de la región.
140

3.1. Fertilidad dei suelo


En la Figura 1, se observa las causas que los nativos atribuyen
a la fertilidad dei suelo, ai mismo tiempo las causas o relaciones
con la poca fertilidad y las consecuencias que se originan de un
suelo con baja fertilidad. Atribuyen buena fertilidad a los suelos
escuros, no gredosos, suelos con un contenido de humedad y
contenido orgánico; la presencia dei crecimiento (mayor volumen
de agua en la época de lluvias) dei río influye en el incremento dei
contenido de nutrientes dei suelo y por lo tanto en la fertilidad dei
mismo . La descomposición de las hojas aumenta la fertilidad dei
suelo, adicionalmente, el tiempo de barbecho influye en el
contenido de nutrientes existente. AI mismo tiempo senalan que
un suelo con poca fertilidad origina cambias en el desarrollo de
sus cultivas, como el maíz, la yuca, plátano (cultivas principales de
las comunidades nativas).

Cuando el suelo es pobre en fertilidad, las principales malezas


indicadoras de ello son el shuashui (nombre científico, no
identificado), el arrocillo (Rottboel!ía exaltata) y el gramalote
(Axonopus spp.). EI mapu mai(suelo duro) y mai joshin (suelos
rojos), son suelos con muy baja fertilidad, donde si bien los
cultivas crecen, ellos reconocen y hacen la observación de que el
fruto no desarrolla, como por ejemplo: mazorcas pequenas de
maíz, plantas pequenas, los racimos de plátano tienen poca
cantidad de dedos y además son de baja calidad y por lo tanto
baja producción pues el numero de cosecha es menor.

3.2. Tipos de suelos:


La etnia Shipibo-Conibo, identifican los siguientes tipos de
suelo:
Camanin - Tierra no inundable
Maicon - Tierra inundable apta para la agricultura
Tashba Canin - Tierra inundable, bajial
Mai huiso - Tierra negra
Mai joshin - Tierra roja
Mana mai - Tierra de altura no inundable
Naco - Lodo
Mapo mai - Tierra gredosa
Mashi mai - Tierra arenosa
La primera columna es la denominación de los suelos en el
idioma Shipibo-Conibo.

3.3. lnundación de Suelos


EI manejo de los recursos naturales de las comunidades que
viven cerca ai río Ucayali, gira alrededor de los periodos de
inundación que sucede anualmente, con cada creciente durante
los meses de Diciembre a Abril. AI retirarse el río deja los suelos
negros, con mayor humedad, por lo tanto mayor fertilidad, dejando
playas que son aprovechadas para sembrar cultivas anuales como
maíz, arroz, caupí y maní (Figura 2).

slash and b intensive_agric lture


...déc"""ómpOSition 1allow l•nd - - presence
guaba length
leaf
___... efÓsiÕ'i-l........_
-flooded.:Sõli-- IÍ soil shuashubi

soil
organic_conte 1
mapo_mai arrocillo
presence

1
maijoshin gramalote

yute
presence

raceme raceme platano


platano platano productivity
size quality tree
,----~•wth
banana_death

L___J
~ - ---' :~

- - - i > i pl•nts
1
developmerrt

torourco
presenee

Figura 1. Grafice de las relaciones de la fertilidad dei suelo, analizados


con el programa AKT 5.(Laxman et. ai, 2004).

Las variedades de plátano común no son tolerantes a la


inundación debido a su sistema radicular superficial, el cual se
pudre y la planta tiende a caerse, lo que no sucede con las
variedades de plátanos sapucho y campeón, que toleran estas
periodos de inundación. En algunas de las comunidades, los
14l

cultivas de raíces tuberosas como son el caso de la sachapapa


(Dioscorea sp), y el dale dale (Calathea al/ouia), no se cultivan
por las inundaciones, rescatando también que estas son cultivas
nativos muy importantes para su dieta. La variedad de yuca
(Manihot scu/enta) a sembrar también esta en función de los
periodos de inundación, prefieren utilizar variedades de período
vegetativo menores a un ano, los shipibos se preparan para estas
períodos de escasez de alimentos preparando farifia, en base a la
harina de la yuca.

deforast:ation
forost

ra infall
frocuency

platano_comun campeon Sipus ho


s - - - - - - -1.l' - - - - r o o t_s\tstem root_system root_system
/<leaÍh ___ .
platano_com-;" l ' - - - --'11
1

··---- ~ /
soil
feltilty
sachapapa
I' - - - - - presence

~
L__J farinha
' - -- - - presence

troe
'----~~:h
Figura 2. Relaciones importantes con respecto a la inundación de los
suelos.

3.4. Especies tolerantes a periodos de inundación


Las siguientes especies frutales fueron identificadas como
tolerantes a la inundación:
• Pan de Árbol (Artocarpus sp.)
• Plátano Campeón (Musa sp.)
• Plátano Sapucho (Musa sp.)
• Mango (Manguifera indica)
• Camu-camu (Myrciaria dubia.)
• Coco (Cocos nucifera)
• Perna rosa (Sysigium jambos)
• Caimito (Pouteria caimito )
• Shimbillo (/nga sp.)

Para estas dos últimas especies, se establecieron contradicciones


entre las comunidades. En algunas comunidades afirmaban que
ambas especies soportaban la inundación y en otras no. Según la
revisión de literatura realizada solamente el caimito es tolerante a
la inundación. Estas son contradicciones establecidas entre el
conocimiento de las comunidades, así como también con lo
reportado por la literatura.

3.5. Especies Maderables


Dentro de las especies maderables tolerantes a la inundación,
los agricultores identificaron las siguientes:

• Bolaina (Guazuma crinita)


• Capirona (Capirona decorticans)
• Quinilla (Manilkara bidenta)
• Lupuna (Chorisia sp)
• Caoba (Swithenia macrophila)
• Cedro (Cedrel/a spp)
• Moe na (Ocotea sp)
• Catahua ( Hura crepitans)

3.6. Tumba y quema


Los shipibos conibos, realizan la tumba y quema según la
cantidad de troncos y estacas que contenga el terreno, esta
actividad les facilita todas las actividades agrícolas, como siembra
y deshierbo, así mismo las cenizas que se desprende de la quema
otorgan fertilidad ai suelo, incrementando el contenido de
nutrientes y desapareciendo algunas plagas como las termitas
(Figura 3).

3.7. Plagas
La inundación plaga es el curuince (Atta cephalotes), es un tipo
de hormiga defoliadora que afecta mucho los cultives de yuca y
especies frutales, esta plaga solo existe en lugares donde no hay
144

inundación (figura 3), las inundaciónes donde se presentan los


periodos de inundación total no tienen problemas con esta plaga.
stalk and trun
quantitative

,,- slash and bu


1 1and - -
\.
~
)

comejen
--
population /
soil
- fertility
' ~

facility
land - soil
sowing_laborun ----
' .-,,. nutrient_conten

ground
weediness -
----
,,,
termite
-, population

ashes
presence
-- /

_., dêâth
- / pest_and_ins
'
__..,.~.,..,.,,
Figura 3. Relaciones entre la tumba y quema con los diferentes
procesos productivos en los suelos inundables.

4. Conclusiones y recomendaciones

EI Manejo de Recursos se basa alrededor de los períodos de


inundación y de los suelos inundables. EI Conocimiento agrícola
de la etnia shipibo conibo no es muy antiguo, por lo que
presentan un mediano conocimiento sobre tipos de suelo.

Se encontró conflictos de conocimientos entre agricultores,


agricultor-literatura; conocimiento local y conocimiento científico, lo
cual sirve para poder investigar más sobre determinadas
afirmaciones de todas las fuentes de información.

Los shipibos conibos presentan un gran conocimiento sobre


plantas medicinales, y sus actividades principales son la caza y la
pesca que son su fuente de alimento indispensable en su vida
diaria, aunque en los últimos anos están aprendiendo mas de la
agricultura a la cual están dedicando mas tiempo.

Como recomendaciones se podría sugerir


Estudiar mas el flujo de conocimiento: ancestral, experiencias,
extensionista, etc.
Clarificar porque los conocimientos están en conflictos.
Comparar base de conocimiento en lugares contrastantes.

5. Referencias
DIXON HJ, DOORES, JW, JOSHI AND L SINCLAIR FL (2001)
Agroeco/ogica/ Knowledge Too/kit for Windows: Methodo/ogical
Guidelines, Computer Software and Manual for AKT5. School of
Agricultura! and Forest Sciences, University of Wales, Bangor, UK, 171
pp .

LAXMAN J., L. ARÉVALO, N. LUQUE, J. ALEGRE AND F. SINCLAIR (in


review). Local eco/ogica/ knowledge in Natural resource management.
Workshop "Bridging scales and epistemologies" Kumming May 2004.

SINCLAIR FL AND WALKER DH (1999) A utilitarian approach to the


incorporation of local knowledge in agroforestry research and extension.
ln: Buck, L.E., Lassoie, J.P. and Fernandes, E.C.M . (eds) Agroforestry in
Sustainable Agricultura! Systems. CRC Press LLC, Boca Raton, Florida,
USA: 245-275.

THAPA B, SINCLAIR FL AND WALKER, DH (1995) lncorporation of


indigenous know/edge and perspectives in Agroforestry development.
Part 2: case study on the impact of explicit representation of farmers'
knowledge. Agroforestry Systems 30, 249-261.

WALKER DH, SINCLAIR FL, JOSHI L AND AMBROSE B (1997)


Prospects for the use of corporate knowledge bases in the generation,
management and communication of knowledge at a front-line agricultura/
research centre. Agricultura! Systems 54(3): 291-312 .
Certificação da produção agroflorestal:
conceitos, oportunidades e tendências
1
Luís Fernando Guedes Pinto e
2
Eduardo Trevisan Gonça/ves
1
Engº. Agrônomo, Dr. lmaflora - Instituto de
Manejo e Certificação Florestal e Agrícola.
E-mail: luisfernando@imaflora.org.
2
Engenheiro Agrônomo Coordenador do
Programa de Certificação Agrícola IMAFLORA

1. Introdução

A certificação é um mecanismo que atesta determinado


produto quanto a certas características ou foi produzido em um
processo que atende à critérios estabelecidos. Funciona como um
instru-mento de mercado que busca diferenciar produtos e
produtores, através de incentivos econômicos (UPTON E BASS,
1995). Os benefícios potenciais da certificação variam de acordo
com o grupo de interesse em questão: i) produtores podem
receber sobrepreço por seus produtos, acessar novos mercados
ou garantir os já existentes, obter financiamentos especiais, além
de valorizarem a imagem institucional; ii) consumidores podem
adquirir produtos com características especiais, que garantam a
qualidade do produto ou a forma como foi produzido.

Por outro lado, a certificação também implica em custos diretos


e indiretos. Para os produtores, os custos diretos são: i) pagar os
processos de avaliação e auditoria externos e ii) custos de
manutenção do certificado, incluindo taxas e auditorias de
monitoramento. Os custos indiretos se referem à adequação do
seu empreendimento aos padrões do sistema de certificação que
adotar e podem ser nulos ou elevados, de acordo com a situação
de sua propriedade frente ao exigido pelo sistema. Embora a
certificação possa resultar em ganhos econômicos significativos,
com sobre-preço de 10% a 100%, esta lógica não deve ser
esperada para todos os tipos de produtos e mercados.

Por freqüentemente tratar de assuntos de interesse público,


como a conservação de recursos naturais e o desenvolvimento
social, a certificação necessita de uma estrutura institucional que
141:l

garanta sua credibilidade e permita a participação dos diversos


grupos de interesse relacionados. Isto deve incluir:
a) Desenvolvimento de padrões - os padrões (ou normas) são
a tradução e o detalhamento da mensagem contida na certificação
de um produto ou processo produtivo. A concessão de um
certificado é feita quando os certificadores verificam a conformidade
do produto ou processo com os padrões em questão. Assim, a
definição dos padrões deve ser feita em um processo participativo
e equilibrado entre os grupos de interesse, sejam eles
econômicos, sociais e ambientais, num processo de negociação
que vise ao consenso.
b) Regulamentação - os sistemas de certificação devem ser
regulamentados de forma que a atuação e os papéis dos
certificadores, os direitos e deveres de produtores e consumidores
e a forma de desenvolvimento e atualização de padrões sejam
estabelecidas. Para tanto, em geral, deve-se criar a instância do
credenciador, garantindo-se também a representação dos grupos
de interesse envolvidos nesta instância.
c) Processo de avaliação - deve ser público, garantindo aos
grupos de interesse afetados pelo empreendimento avaliado o
direito de manifestar suas visões sobre o mesmo, ainda que a
decisão da certificação seja independente e de exclusiva
responsabilidade do certificador.

A experiência do lmaflora com a certificação socioambiental,


tanto florestal como agrícola, tem mostrado que alguns princípios
adicionais são fundamentais para garantir a credibilidade e o bom
funcionamento deste instrumento:
a) Padrões universais - deve haver padrões para determinado
setor (agricultura, florestas ou outro) que possam ser aplicados
em qualquer situação e região. Exemplos: a atividade deve
garantir a conservação do solo ou o bem-estar das populações de
entorno. Todavia, os padrões gerais devem ser interpretados, ou
eventualmente, adaptados para cada realidade biofísica e
socioeconômica.
b) Caráter voluntário - a certificação é um mecanismo de
mercado e não deve ser obrigatória.
c) Independência - a avaliação de desempenho ou conformidade
de um empreendimento deve ser feita por um certificador
independente, sem conflito de interesse com o empreendimento
ou algum grupo relacionado. Há também iniciativas de auto-
certificação ou certificação participativa. Neste caso, é
fundamental haver transparência e mecanismos que garantam a
credibilidade do sistema.
d) Não discriminatória - qualquer empreendimento deve ter o
direito de passar por um processo de avaliação com fins de
certificação. Todavia, somente a conformidade com os padrões
pode garantir a certificação ao final do processo. O sistema deve
garantir que todo tipo de produtor tenha acesso à certificação e
seus benefícios, levando-se em conta os custos e necessidades
de organização formal dos produtores. Pequenos produtores que
se consideram excluídos pelos custos e burocracia dos processos
de certificação defendem a auto-certificação ou certificação
participativa como alternativa para suas cooperativas ou
organizações sociais.
e) Transparente - as avaliações com fins de certificação
devem ser públicas e permitir que qualquer parte interessada
tenha conhecimento das suas etapas e métodos usados nas
avaliações. Todavia, deve-se garantir a confidencialidade de
informações estratégicas de empreendimentos avaliados.
f) Consistência técnica - tanto os padrões como os métodos
de avaliação devem estar apoiados no estado da arte do
conhecimento sobre o tema em questão.
g) Reconhecimento social - a sociedade deve reconhecer o
valor de um sistema de certificação e confiar na mensagem
passada por um certificado presente em um produto ou
empreendimento.

2. Certificação e SAFs

Existem várias modalidades de certificação que são


aplicadas hoje em sistemas agrícolas ou florestais e, portanto,
possivelmente para sistemas agroflorestais. Todavia, devido à
grande identificação de Sistemas Agroflorestais-SAFs com
questões relativas à conservação de recursos naturais e aspectos
sociais da pequena produção, abordaremos os que parecem mais
diretamente aplicados para esta realidade: os com abordagem
social, ambiental ou sócio-ambiental. Logo, não abordaremos
sistemas como certificados de origem regional ou qualidade
específicas, como características organolépticas superiores. Estes
podem ser aplicados para produtos agroflorestais, como cafés
150

especiais ou queijos regionais, e exemplos podem ser verificados


no trabalho de SPERS E CHADDAD (1996).

A certificação socioambiental foi criada com o intuito de


promover e incentivar mudanças nos setores produtivos, tendo
como referência o conceito de desenvolvimento sustentável
(Figura 1). Assim, visa atestar e diferenciar produtos feitos de maneira
economicamente viável, socialmente justa e ambientalmente
adequada, havendo iniciativas tanto para o setor florestal como
agrícola (VIANA et ai., 1996; FERRAZ et ai., 2000).

AMBIENTALMENTE ADEQUADO

ECONOMICAMENTE SOCIALMENTE
VIÁVEL JUSTO
Figura 1. Representação do referencial teórico da certificação sócio-
ambiental.

Apesar da diversidade de sistemas de certificação agrícola ou


florestal, não há nenhum que lide exclusivamente com sistemas
agroflorestais. Isto é, não há nenhum certificado ou selo
garantindo que um produto é oriundo de um SAF e que carregue
a(s) mensagem(s) relativa(s) a este sistema. Entretanto, os
produtores agroflorestais poderiam se candidatar a praticamente
todos os sistemas de certificação agrícolas ou florestais já
existentes, dependendo das características de seu sistema de
produção; considerando principalmente escala de produção,
aspectos sócio-econômicos, uso de agroquímicos, tipo de produto
(agropecuário, florestal madeireiro ou não madeireiro)- Tabela 1.
Tabela 1. Características dos principais sistemas de certificação
potencialmente aplicáveis para sistemas agroflorestais.
Foco*
Sistema Mensagem/meta Produtos Ambiental Social
FSC- florestais -
Conselho de florestas bem madeireiros e ++ ++
Manejo manejadas não-
Florestal madeireiros
conservação de
SAN- Rede
recursos naturais
de culturas
e ++ ++
Agricultura agrícolas
desenvolvimento
Sustentável
humano
principalmente
IFOAM-
culturas
Federação
agrícolas e
Internacional
produtos
do ++ +
produto orgânico pecuários.
Movimento
também
de
produtos
Agricultura
florestaís não- ·
Orgânica**
madeireiros
FLO-
culturas
Organização
contribuir agrícolas.
de
positivamente possível para + ++
Rotulagem
para pequenos produtos
de Comércio
produtores florestais não-
Justo
madeireiros
empresas
SAI- agrícolas e
condições de
Contabilidade florestais;
trabalho ++
Social qualquer
decentes e justas
Internacional indústria ou
servi o
empresas
agrícolas e
sistema de florestais;
ISO 14.000 +
gestão ambiental qualquer
indústria ou
servi o
* baseado em Shanley et ai., (2002) e comparações de padrões.
** há vários outros sistemas de certificação orgânica, tanto nacional,
como internacionalmente.
Portanto, não parece necessano criar um selo ou certificado
agroflorestal. Deve-se considerar que a criação de um novo
sistema de certificação requer uma estrutura institucional
complexa e a criação de um mercado que realmente beneficie o
produtor e diferencie o produto dos demais existentes. Este é um
processo custoso e de longo prazo. Logo, do ponto de vista do
produtor, a questão passa a ser qual dos sistemas existentes
escolher. Como já dissemos, a decisão dependerá da proximidade
de seu sistema de produção dos padrões dos sistemas de
certificação e dos reais benefícios econômicos ou de outra
natureza que cada sistema poderá lhe oferecer.

Todavia, ainda é possível que somente um sistema de


certificação não atenda suas necessidades. Por exemplo, uma
propriedade pode ter produção de madeira de agroflorestas bem
manejadas, produtos agrícolas orgânicos e ser um pequeno
produtor. Potencialmente, a madeira pode ser certificada somente
pelo FSC, os produtos agrícolas por sistemas orgânicos e de
comércio justo. Além disso, o mercado pode responder de
maneira diferenciada por produto e por tipo de certificado. O
mercado de cacau orgânico pode ser mais interessante, mas o de
banana de comércio justo pode ser mais vantajoso.

Assumindo-se que a produção em sistemas agroflorestais é


"certificável" em relação a outros sistemas agrícolas ou florestais,
por serem naturalmente benéficos do ponto de vista ambiental e
social (esta assunção pode nem sempre ser verdadeira),
apresenta-se dois desafios para os produtores: se adequar às
exigências de padrões de um ou mais sistemas de certificação e
pagar os custos diretos de um ou mais sistemas. Frente a este
desafio, as principais tendências no momento são:
• certificações conjuntas, onde um certificador avaliaria os
padrões de mais de um sistema de certificação. Em somente um
processo, o produtor poderia receber mais de um certificado,
simplificando o processo e diminuindo os custos diretos.
• certificação em grupo, onde grupos de produtores recebem
apenas um certificado, dividindo os custos para a obtenção e
manutenção do certificado. Esta opção requer organização dos
produtores e um desempenho similar entre todos os membros do
grupo.
• criação de fundos seja em financiadores ou certificadores,
para financiar os custos diretos da certificação de pequenos
produtores.

3. Conclusões

A certificação pode cumprir importante papel para estimular e


amplificar a adoção de sistemas agroflorestais, apesar de não
haver nenhum sistema de certificação exclusivo para SAFs. A
escolha do sistema ideal deve variar entre produtores em função
do mercado e do seu sistema de produção. Os custos podem ser
a variável mais limitante para adoção do sistema por parte de
pequenos produtores, mas há opções para viabilizar a certificação
deste público. Os benefícios econômicos ou de outra natureza
podem ser esperados, mas não em todos os casos ou como
regra.

4. Referências
FERRAZ, J.M .G.; PRADA, L DE S.; PAIXÃO, M. Certificação socI0-
ambiental do setor sucroalcooleiro. São Paulo: Embrapa-lmaflora-Fase,
2000 . 192p.

SHANLEY, P; PIERCE, A.; LAIRD; GUILLEN, A. Tapping the market:


certification & management of non-timber forest products. Londres:
Earthscan , 2002.456p.

SPERS, E.E.; CHADDAD F.R. O papel da qualidade na Europa. ln Filho


et ai, O agribusiness europeu. São Paulo: Pioneira, 1996. 132p.

UPTON, C; BASS, S. The forest certification handbook. Londres:


Earthscan publications, 1995. 219p.

VIANA, V.M.; ERVIN, J.; DONOVAN, R.Z.; ELLIOTT, C.; GHOLZ, H.


Certification of forest products : issues and perspectives. Washington:
lsland press, 1996. 261p.
A certificação agroflorestal no Instituto
Biodinâmico-lBD
Pedro Jovchelevich
Instituto Biodinâmica.
E-mail: pedr.jov@biodinamica .org.br

1. Introdução

A Associação de Certificação Instituto Biodinâmica - IBD é uma


instituição sem fins lucrativos, localizada em Botucatu, SP,
fundada em 1999, que desenvolve atividades de inspeção e
certificação agropecuana e processamento para produtos
orgânicos, biodinâmicos e extrativistas. O IBD tem atuado em
diversas áreas do Brasil e América do Sul, auxiliando no
desenvolvimento de um padrão de agricultura sustentável
baseada em novas relações econômicas, sociais e ecológicas.

Desde então, tem buscado se adequar às exigências cada vez


maiores de um mercado em desenvolvimento. Assim, em 1995
(na época como um ramo de atividade da Associação Brasileira
de Agricultura Biodinâmica), o IBD conquistou o credenciamento
IFOAM (lnternational Federation of Organic Agriculture
Movements) e em 1999 o ISO 65, tornando-se a única entidade
brasileira habilitada internacionalmente a conceder a Certificação
para produtos Orgânicos e Biodinâmicos. Mais recentemente,
credenciou-se no sistema JAS (mercado japonês) e USDA
(mercado americano) e lançou um selo complementar para um
padrão de qualidade superior ambiental e social, o chamado selo
Ecosocial.

Atualmente, acompanha projetos localizados em todo território


nacional e alguns países da América Latina, com a maior
concentração nos Estados de São Paulo e Paraná. Estes projetos
envolvem praticamente todos os produtos agrícolas e extrativistas
não-madeireiros como soja, trigo, feijão, milho, café, suco de
laranja, algodão, hortaliças, guaraná, urucum, óleo de dendê, óleo
de babaçu, erva-mate, castanha-de-cajú, cana-de-açúcar e seus
deri-vados, mel, palmito pupunha e até mesmo algodão e tecidos,
e produtos de origem animal como gado de corte e leite, frangos e
ovos.
156

Estão envolvidos neste trabalho atualmente cerca de 4 mil


produtores alcançando uma área próxima a 130 mil ha, o
que ainda é pouco, se considerado o potencial agrícola do
Brasil e as áreas de produção de outros países da Europa. Destes
4 mil produtores, aproximadamente 90% são pequenos
agricultores familiares organizados em dezenas de associações e
cooperativas .

2. O processo de certificação IBD

A certificação é um processo de fiscalização e inspeção das


propriedades agrícolas e processos de produção, para verificar se
o produto está sendo cultivado e/ou processado de acordo com as
normas de produção orgânicas/biodinâmicas. O foco da produção
não é o produto, mas a propriedade como um todo e o processo
de produção. A certificação exige uma série de cuidados, desde a
desintoxicação do solo até o envolvimento com projetos sociais e
de preservação do meio ambiente. Assim, uma vez credenciada, a
propriedade pode gerar vários produtos certificados, que irão
receber um selo de qualidade, desde que observados requisitos
de qualidade, rastreabilidade, sustentabilidade e padrão de vida
dos trabalhadores. O 180 trabalha com três selos: Orgânico,
Orgânico/ EcoSocial e Demeter.

Um produto Orgânico é muito mais que um produto sem


agrotóxicos e sem aditivos químicos. É o resultado de um sistema
de produção agrícola que busca manejar de forma equilibrada o
solo e demais recursos naturais (água, plantas, animais, insetos,
etc.), conservando-os a longo prazo e mantendo a harmonia
desses elementos entre si e com os seres humanos. Para ofertar
ao consumidor alimentos saudáveis e mais nutritivos, o agricultor
necessita trabalhar em harmonia com a natureza, recorrendo aos
conhecimentos de diversas ciências como a agronomia, ecologia,
sociologia, economia e outras. A produção orgânica obedece a
normas rígidas de certificação que exigem, além da não utilização
de agrotóxicos e drogas venenosas, cuidados elementares com a
conservação e preservação de recursos naturais e condições
adequadas de trabalho.

Quando a propriedade, além de orgarnca, tem programas


sociais em andamento (alfabetização de adultos, saúde da mulher,
etc.) e programas ambientais em desenvolvimento (recuperação
da reserva legal, educação ambiental, etc.), a propriedade pode
pleitear o selo ECOSOCIAL.

O produto Demeter é aquele proveniente da agricultura


biodinâmica. Precursora da agricultura orgânica, a agricultura
biodinâmica vem sendo desenvolvida desde 1924, fundamentada
nos princípios da Antroposofia, ciência espiritual introduzida por
Rudolf Steiner. Na prática biodinâmica o agricultor exerce uma
atuação consciente na ampla tarefa de entender todas as
possíveis relações (dinâmica) entre os diversos seres vivos (bio)
presentes no seu ambiente de trabalho. Inclui no seu fazer o
estudo dos ritmos cósmicos, ligados à Lua, Sol e Planetas, e suas
interre-lações, e as conseqüências disto na prática agrícola. O
agricultor busca fazer de sua propriedade um organismo
integrado, com a entrada mínima de recursos e insumos de fora
da propriedade. Utiliza os preparados biodinâmicos, elaborados a
partir de ervas medicinais, esterco e sílica aplicada de forma
homeopática. Esses preparados, que são aplicados no solo, nas
pilhas de composto e nas plantas, levam consigo forças
sanadoras, equilibrando o sistema solo-planta-animal. Os
produtos biodinâmicos são conhecidos por sua vitalidade e
qualidade nutricional.

3. Certificação agroflorestal

Na busca de um manejo mais adaptado às características dos


ecossistemas tropicais, várias fazendas têm estruturado sistemas
de produção agroflorestais, principalmente quando a cultura
principal é o café. Em São Paulo, Espírito Santo, Pernambuco,
Bahia, Rondônia e Minas Gerais, existem exemplos de café
agroflorestal em diferentes intensidades de manejo.

Há fazendas que estão trabalhando apenas com especIes


exóticas leguminosas, as quais são plantadas na linha do café e
podadas anualmente após a colheita. Outros produtores
trabalham com regeneração natural e plantio de espécies nativas.
Outra parte do manejo é o uso de espécies arbóreas para semi-
sombreamento do café. Em Rondônia há SAFs mais complexos
com diferentes espécies de uso comercial consorciadas, como
pupunha, cacau, cupuaçu, babaçu e madeiras de lei como o
mogno e freijó.
158

Um dos conceitos básicos da Agricultura Biodinâmica


(certificação Demeter) é transformar a propriedade numa espécie
de organismo agrícola, onde as várias partes da propriedade se
relacionem de maneira harmônica. Na prática busca-se diminuir
ao máximo a dependência de matéria orgânica proveniente de
fora da propriedade, no sentido de um sistema realmente
sustentável ecologicamente. Neste sentido, a utilização de
espécies arbóreas leguminosas e não leguminosas tem um
importante papel a cumprir, seja pelos processos de fixação
biológica de nitrogênio, seja pelos processos de ciclagem de
nutrientes efetuados pelas raízes das árvores em grandes
profundidades. Sabe-se também, atualmente, da importância da
adubação lenhosa com aparas de madeira ramificada para
qualidade da matéria orgânica do sistema agrícola. Em
ecossistemas tropicais e subtropicais, os SAFs são um
componente essencial de uma propriedade biodinâmica.

Um dos grandes problemas da certificação é a qualidade dos


insumos usados para adubação orgânica. A procedência desta
matéria orgânica tem o limite de quantidade disponível e, de outro
lado, de possível contaminação por agrotóxicos, como no caso de
biomassa proveniente de agricultura convencional intensiva,
estercos de frango e suínos de criação industrial e outros. Neste
sentido, os SAFs que possibilitam diminuir a quantidade de
matéria orgânica adquirida de fora do sistema têm um importante
papel a desempenhar.

4. Conclusão

A pesquisa em agricultura orgânica, biodinâmica e em sistemas


agroflorestais está apenas no início. Muitos produtores estão na
vanguarda buscando desenvolver sistemas agroflorestais adaptados
às suas condições locais. Do ponto de vista da certificação, este é
um caminho que deve ser incentivado para a garantia de
qualidade do produto final.

5. Referências
JOVCHELEVICH, P. Normas de produção orgânicas, Associação de
Certificação Instituto Biodinâmica, Botucatu, 2005.

JOVCHELEVICH, P. Normas de produção Demeter, Associação


Rr,::,c:ili:>ir<> rl,:, Anrir1 ilt1 ir,:, Rinrlin::imir::i Rnh 1r.r1h J . 2005.
Qualidade da produção e agregação de valor em
sistemas agroflorestais
Amilton João Baggio
Engº Florestal, Dr., Pesquisador da Embrapa
Florestas. E-mail: baggio@cnpf.embrapa .br

1. Introdução

A evolução da consciência coletiva acelerou-se com a


globalização do conhecimento, em todos os níveis da atividade
humana. Desta forma, tanto o modo de tratar o meio ambiente
como os meios de produção de alimentos são questionados por
fronteiras cada vez mais próximas assim como por aquelas
distantes. Recusas de alimentos contaminados, por países
importadores, e litígios entre propriedades lindeiras, por prejuízos
ambientais, são exemplos corriqueiros . Os problemas ambientais,
sejam locais ou globais, aliados à valorização da qualidade de
vida, começam a mudar atitudes no meio rural, estimuladas
também por fatores econômicos.

O avanço da agricultura orgânica é evidente em todo o planeta,


porém mais enfático nos países europeus (15% a 20% ao ano) e
norte americanos (10% a 20% ao ano). Em termos de número de
propriedades, cabe destacar a Itália (56.440 propriedades com
1,23 milhão de ha), a Alemanha (14.703 propriedades, com 632
mil ha) e o Brasil, que apresenta 803 mil ha distribuídos por cerca
de 14 mil propriedades (LERNOUD, 2004). Nesta evolução, o
Paraná ocupa espaço expressivo, pois em cinco anos (1996 a
2003), o número de propriedades convertidas saltou de 450 para
3.908, aumentando em 12 vezes a produção (de 4.265 para
52.270 ton/ano) (HAMERSCHMIDT e LUNARDON, 2004).

Apesar de sua comprovada viabilidade econômica, esta forma


de agricultura, praticada e nomeada de diferentes maneiras
(orgânica, biológica, biodinâmica), por si só não atende ao
espectro das atuais necessidades da sociedade (ambientais,
sociais, políticas, legislativas, territoriais, etc.) e exigências do
mercado (oferta a preço acessível). Desta forma, e mais
modernamente, evoluiu a linha da agroecologia, que inclui
fundamentalmente a participação dos produtores familiares,
160

naqueles fatores que ultrapassam as porteiras da propriedade,


estimulando assim a formação de pólos de produção uníssonos.

Nesse sentido, a valorização dos produtos oriundos de


propriedades ou pólos agroecológicos tende a superar inclusive os
orgânicos baseados somente em insumos, devido ao fato de nem
sempre atenderem aos apelos ambientais e sociais, quando
inseridos apenas como agronegócio.

A própria certificação diferenciada, atualmente sendo discutida


no meio rural, possivelmente pode separar de modo formal esses
dois estilos de produção, num futuro próximo. Na produção
agroecológica, as práticas agroflorestais ocupam espaço nobre e
indispensável, tanto no preenchimento de lacunas ambientais
(aumento da biodiversidade, produção e qualidade da água,
amparo à fauna, reciclagem de nutrientes, produção de matéria
orgânica) como sociais (oferta de empregos, melhoria da saúde) e
econômicas (diversificação na oferta de produtos, valorização da
paisagem e da produção).

Este trabalho tem por objetivo abordar um panorama geral


sobre a inserção dos Sistemas Agroflorestais-SAFs, no paradigma
da agroecologia, comparando com sistemas convencionais
(agroquímicos e orgânicos).

2. Qualidade da produção em SAFs

Os assuntos referentes à qualidade da produção em SAFs


podem ser analisados sob diversos prismas. No caso dos
alimentos (quer sejam de origem vegetal ou animal), medicinais e
especiarias, há um pleno reconhecimento das vantagens da
produção orgânica (comparada com a agroquímica),
principalmente em termos de valor nutritivo, riscos à saúde e
cuidados ambientais.

Nesse sentido, cabe ressaltar que o aspecto visual dos


produtos tem pouca relação com a qualidade aqui referida,
embora seja também importante pela valorização de mercado. A
questão da segurança alimentar; discutida normalmente em
termos de abastecimento da população, é mais relevante quando
focada na diversificação da produção e ausência de agrotóxicos,
pelo menos para produtores e consumidores, pela diminuição do
risco de doenças degenerativas.

Por outro lado, a propriedade rural diversificada tende a preencher


as necessidades nutricionais e sanitárias da família e do meio
produtivo, resultando em maior resistência a doenças, e inclusive
meios próprios para combater muitas delas.

Outro fator que implica na qualidade, para o caso de produtos


processados, é a metodologia empregada. Como exemplo, a
desidratação de frutas e verduras mantém melhor qualidade
nutricional do que cozimentos em geral.

Quanto ao componente florestal, cuidados de implantação e


manejo vão condicionar a qualidade dos produtos, segundo o
objetivo pretendido para os mesmos. Assim, é recomendável
utilizar o melhor material genético disponível, para a espécie
selecionada (estacas, sementes, mudas), plantar segundo a
necessidade das plantas, implantar no arranjo espacial ótimo para
o sistema pretendido e cuidados com a manutenção e manejo
(podas / desbastes).

No caso de espécies para produção de madeira visando a


usos nobres (mobiliário, artesanato, construções , laminados,
etc.), a aparência, a forma e a trabalhabilidade são
fundamentais. Se o objetivo da associação é produção de
biomassa para condicionamento do solo, lenha ou outros
produtos, implantação e manejo de espécies adequadas são
igualmente importantes, porém aparência e forma podem ser
irrelevantes. O componente florestal também pode ser tratado em
forma orgânica, em todas as fases do seu ciclo, adicionando um
"delta" de qualidade, pelo menos ambiental, sem influenciar
negativamente no sítio e adjacências.

A produção orgânica, realizada em propriedades que seguem o


paradigma da agroecologia, acrescentam ainda as qualidades
"socialmente justas" e "ambientalmente correté;l", com benefícios
óbvios para produtores e sociedade. Segundo a linha seguida pelo
Research lnstitute of Organic Agriculture, da União Européia, esta
produção não pode ser centrada em "preços" mas sim em
sustentabilidade e empregos (FiBL, 2002).
. ..
L

3. Agregação de valor em sistemas agroflorestais

No Brasil, em forrna geral, as questões relativas à agregação


de valor são pouco desenvolvidas, no meio rural, tanto na
produção convencional como na orgânica, tornando o país um dos
mais deficitários nesse sentido. Com a produção orgânica, apesar
da existência de um mercado que movimenta cerca de US$ 200
milhões ao ano, apenas uma pequena parte é processada
(principalmente do café e da soja). Assim, nossa rentabilidade
média é muito pequena (US$ 249,00/ha), quando comparada com
os EUA (US$12.630,00/ha) ou Alemanha (US$ 4.745,00/ ha).
Face à tendência do mercado mundial de orgânicos, que tem uma
previsão de negócios estimada em cerca de US$ 100 bilhões, até
2006, nossos números são bastante modestos (LERNOUD, 2004 ).

A agregação de valor pode ser conceituada em forma pontual


(produtos) ou mais ampla, envolvendo outras partes da cadeia
produtiva, a comunidade, a propriedade, o sistema familiar e os
sistemas de produção. Na propriedade rural, ela pode iniciar pelo
próprio imóvel, na conservação dos seus recursos e melhoria da
paisagem. Por outro lado, o sistema familiar é valorizado na
medida em que adquire conhecimento, ressaltando-se, neste
caso, a educação ambiental e a saúde nutricional. Como
resultante, os sistemas de produção também tendem a adquirir
valor, principalmente quando são introduzidas práticas
agroecológicas. Neste cenário, a produção que sai ao mercado, já
com preços diferenciados, pode ainda receber alguma forma de
processamento, seja mínimo ou complexo, dentro ou fora da
propriedade.

A propriedade ainda poderá exigir investimentos, pois deverá


estar com suas áreas de preservação permanente e reserva legal
devidamente conservadas ou recompostas, e livres de usos
inadequados (animais nas reservas, nascentes e riachos, p. ex.).
Além disso, práticas permaculturais ou agroflorestais são
indispensáveis, para ratificar sistemas de produção biodiversos e
ambientalmente aceitáveis. Em uma propriedade agroecológica, a
certificação da produção tende a agregar maiores valores (selo
diferenciado), comparando com as produções convencionais, ou
simplesmente orgânica.
Outra forma de agregar valor à propriedade é a ocupação de
espaços improdutivos ou pouco produtivos. Espécies rústicas,
como muitos pínus e eucaliptos, podem ser plantadas em terrenos
mais pobres, divisórias ou beiras de estradas. Leguminosas
lenhosas para produção perene de biomassa nitrogenada é outra
possibilidade. Cercas de palanques podem ser transformadas em
cercas vivas, e assim por diante.

Porteira afora, a união de esforços dos proprietários,


principalmente em se tratando de nichos produtivos de condições
semelhantes (microbacia, p. ex.), pode levar a uma certificação
com denominação de origem sustentável, garantindo mercado e
agregando valor à comunidade.

Quanto aos sistemas de produção, sempre que haja algum


benefício resultante de mudanças, ocorre agregação de valor. Na
transformação de monocultivos em SAFs podem ser citados
inúmeros exemplos. A arborização de pastagens implementa a
população de "besouros-vira-bosta", que além de destruir larvas
de insetos maléficos aos animais (como a mosca-do-chifre), reduz
a permanência do esterco na pastagem, ganhando área produtiva
e favorecendo a reciclagem de nutrientes. Ademais, as árvores
abrigam pássaros que se alimentam também de insetos
hematófagos. Sabe-se ainda que sistemas bem implantados
aumentam a natalidade animal, lactação e ganho de peso, devido
á melhoria do conforto térmico e bem-estar animal. Na
arborização de cultivas, normalmente, há ganhos de rentabilidade
devida à amenização de fatores climáticos, aumento da fertilidade
do solo e produção diversificada com ocupação do espaço aéreo.

Com relação aos produtos, os aspectos referidos no item 2


(incremento de qualidade) refletem naturalmente em agregação
de valor, em uma ou mais fases da cadeia produtiva. Os produtos
biológicos, como vêm sendo tratados no mercado global,
requerem, em última instância, uma linha de conduta uníssona,
desde a produção de sementes e mudas até o tipo de embalagem
final.

O processamento dos produtos alimentícios, condimentos e


medicinais, normalmente feito por métodos caseiros tradicionais
(embutidos, fermentados, destilados, etc.), muitas vezes podem
164

ser otimizados de formas diversas. Uma delas, com inúmeros


exemplos de sucesso no meio rural é a união de produtores na
formação de agroindústrias de porte compatível com as
produções, criando marcas e meios de comercialização próprios,
e, principalmente, canais de venda direta aos consumidores.
Quanto à produção florestal, também há possibilidades de
processamento local, como é o caso da madeira serrada, que
pode sofrer pelo menos um desdobro em bruto, com o uso de
serrarias móveis, que podem ser adquiridas por associações entre
produtores.

A redução de custos é outro importante fator para a


competitividade do produto rural processado, iniciando pela
utilização de equipamentos baratos e materiais disponíveis, como
secadores solares e microusinas (eletricidade, álcool, biodiesel,
biogás). Em muitos casos, a utilização de sucatas e resíduos
orgân icos preenchem estas necessidades.

Com relação aos insumos agrícolas, sua mera substituição


(químicos por orgânicos) pode ser mais econômica que possíveis
perdas na produção. Experimentos monitorados durante 21 anos
deram maior credibilidade à eficiência da agricultura biológica,
quando foi comprovada uma redução de 34 a 53% nos custos de
fertilização e combustíveis fósseis, e de 97% na proteção das
plantas.

Neste período, considerando que foram testados diversos tipos


de cultivas, a produção média caiu em apenas 20%, comparando
com os tratamentos convencionais (Maeder et ai., 2002). O
aumento contínuo dos insumos industriais possivelmente segue
ampliando estas diferenças, pois somente da safra 2003 para
2004 o preço dos adubos subiu em média 40% (GLOBO RURAL,
2004 ). Cabe lembrar que os adubos orgânicos têm como base
resíduos agropecuários, agroindustriais e urbanos, além de
biomassa verde.

4. Considerações finais

O primeiro passo para agregar valor à produção agroflorestal


que será comercializada é a mudança de atitude do produtor,
convertendo a sua propriedade em agroecológica, o que vai além
da mera mudança de insumos. Este esforço exige capacitação
contínua, que será mais eficaz em ações comunitárias (associações,
cooperativas, ONGs, instituições públicas interessadas e com
conhecimento de causa).
Um outro aspecto importante é a atuação das instituições que
apóiam uma agricultura saudável (governamentais, ONGs ou do
terceiro setor), no sentido de pressionar os governos (em todas
instâncias, principalmente municipais) para estimular o consumo
das produções orgânicas. Como exemplo, o governo federal
instituiu recentemente o programa de compra direta do
produtor, para os hortifrutigranjeiros, visando ao abastecimento de
instituições públicas, como a merenda escolar.

Este programa, erroneamente, não privilegia a produção


orgânica, apesar de suas vantagens. Outra faceta da agregação
de valor qualitativo refere-se à saúde pública. Alimentos saudáveis
são aqueles que provêm de plantas e animais sadios (não apenas
livres de doenças, mas também de agrotóxicos acumulados). Um
incremento na produção e consumo de alimentos orgânicos
naturalmente levará à redução de gastos do Ministério da Saúde,
no atendimento de intoxicações e doenças degenerativas
causadas pelo acúmulo de venenos e remédios.

5. Referências
CUSTOS de produção da soja. Globo rural. Rio de Janeiro: Rede Globo,
27/08/2004. Programa de televisão.

FIBL - RESEARCH INSTITUTE OF ORGANIC AGRICUL TURE. Activity


Report. Berlin: FiBL, 2002. 73p.

HAMERSCHMIDT, I; LUNARDON, M.T. Evolução da Agricultura


Orgânica no Paraná. Curitiba : SEAB/DERAL-EMATER/PR, 2004. 3p.

LERNOUD, A. P. Joint venturas creating added value. Markets,


production and social results in Latin América. ln: Biofach, 2004,
Nürnberg. Trabalho apresentado. 10p.

MAEDER, P.; FLIESSBACH, A.; DUBOIS, D.; GUNST, L.; FRIED, P.


NIGGLI, U. Soil fertility and biodiversity in organic farming. Science,
Washington, n.296, p.1694-1697, 2002.
Políticas públicas e financiamento para o
desenvolvimento agroflorestal no Brasil
PeterH. May
PhD, Economista de Recursos Naturais,
Secretário Executivo da REBRAF.
E-mail: peter@rebraf.org.br

1. Introdução

Os Sistemas Agroflorestais (SAFs) constituem alternativas de


uso da terra, consorciando culturas agrícolas ou pastagens com
espécies florestais. Na sua grande maioria, as ONGs e entidades
de extensão voltadas para o desenvolvimento rural sustentável
estão difundindo o uso de SAFs com reflexos positivos sobre a
renda familiar, a recuperação de terras degradadas e a geração
de serviços ambientais. A adoção de SAFs no Brasil continua
crescendo. Porém, apresenta uma série de falhas, as quais, para
serem corrigidas, requerem maior apoio financeiro e medidas
inovadoras nas políticas públicas.

Com o objetivo de definir estratégias participativas para


acelerar e aprimorar o desenvolvimento agroflorestal
principalmente no âmbito da agricultura familiar -, dando
prioridade a critérios e diretrizes que devem governar as políticas
públicas e as estratégias de apoio financeiro, numa iniciativa do
Instituto Rede Brasileira Agroflorestal (Rebraf), realizou-se o
seminário nacional "Políticas Públicas e Financiamento para o
Desenvolvimento Agroflorestal no Brasil", entre os dias 18 a 20 de
agosto de 2004, na Finatec / Universidade de Brasília (UnB). 5

O seminário foi composto por cinco mesas, lideradas por um


coordenador - função desempenhada por um indivíduo fortemente
envolvido com a implantação de práticas agroflorestais ou
alternativas de uso do solo junto a produtores rurais - e por

5 O evento contou com patrocín io da Fundação Ford e Fundação Charles Maye r pelo
Prog resso do Homem (FPH) , e foi realizado em parceri a com o Projeto de Apoio ao
Monitoramento e Análise (AMA), do Programa Piloto para a Proteção das Florestas
Tropicais do Brasil , vi ncu lado á Secreta ria de Coordenação da Amazônia do Ministério do
Meio Ambiente, com o Instituto Interna cional de Educação do Brasil (I EB) e com o Centro
Mundial de Ag roflorestas (lcraf).
executores de programas governamentais e de financiamento. Ao
coordenador coube fazer uma breve apresentação dos problemas
que os produtores rurais enfrentam quanto ao acesso e à
utilização de programas de política e fomento governamentais -
nacionais e internacionais - destinados àquelas práticas e ao
grupo alvo em causa. A apresentação dos coordenadores foi
seguida por painéis, nos quais os executores de programas
governamentais e de financiamento debateram idéias sobre como
estes programas podem se tornar mais acessíveis e eficazes.

Os temas abordados e os coordenadores dos respectivos


painéis foram os seguintes:
1) Políticas e financiamento necessários para dar suporte às
parcerias em pesquisa, extensão, assistência técnica e documentação
agroflorestal (Coordenador: Jorge Luiz Vivan, Rede de
Capacitação em SAFs da Mata Atlântica-CONSAFs);
2) Beneficiamento e comercialização de produtos agroflorestais
(Coordenador: Luiz Villares, Amigos da Terra-Amazônia Brasileira-
AdaT);
3) SAFs e Segurança Alimentar no meio rural (coordenador:
Maria Adelina Souza, Movimento Interestadual de Quebradeiras
do Coco Babaçu-MIQCB);
4) Crédito rural, compensações para serviços ambientais,
apoios financeiros (Coordenador: Raul Couto, Fase-PA);
5) Revisão de dispositivos legais que afetam a viabilidade de
SAFs e o uso adequado do solo rural (Coordenador: Jean Dubois,
Rebraf).

Após amplo debate entre membros dos painéis e integrantes


da platéia, composta ao todo de 72 representantes de diversas
organizações governamentais, de pesquisa e ONGs do Brasil,
América Latina e Europa, seguiu-se a formação de grupos de
trabalho temáticos visando à produção de diretrizes concretas e
viáveis capazes de acelerar e otimizar o desenvolvimento
agroflorestal no Brasil. Neste artigo, resume-se os principais
resultados dos trabalhos dos grupos, e as recomendações para
próximos passos nessa direção.
2. Resultados

2.1. Parcerias entre Organizações não Governamentais e


Governo - entraves e oportunidades
O primeiro grupo de trabalho constatou a presença em muitos
casos do que foi chamado de "participação excludente" de grupos
subjacentes numa parceria entre agentes que detém poder
desigual no relacionamento. Diferenças estruturais garantem
acesso a recursos por parte das entidades maiores ou mais bem
vinculadas politicamente, ou que estejam mais bem estruturadas
em termos técnicos. Diferenças estruturais garantem acesso a
recursos por parte das entidades maiores e levam os financiadores
a ignorarem grupos sociais isolados, não organizados ou sem
acesso às redes. As parcerias terminam deixando para trás as
entidades que tem menor capacidade para levar a cabo as ações
previstas. Ressalta-se este tipo de defasagem principalmente
entre populações tradicionais e populações indígenas.

O grupo reivindicou a necessidade de transparência e


visibilidade de informações e ações. Há uma falta de mecanismos
de interlocução entre órgãos públicos e organizações sociais.
Não se encontram organizações estruturadas para permitir o
compartilhamento efetivo da informação.

Além disso, existem níveis desiguais de participação e


protagonismo. A desigualdade (entre agentes externos e
comunidades, entre organizações governamentais e ONGs) deve
ser assumida por ambas as partes. Ela deve ser superada no
compromisso que se constrói quando da própria gênese de um
projeto de parceria (editais, temas).

Cada cultura tem sua linguagem, a qual está relacionada à


uma estrutura lógica. Assim, quando da formulação de projetos,
estas diferenças criam grandes descompassas entre expectativas,
conceitos e projetos dos distintos grupos envolvidos.

A fragilidade institucional das pequenas organizações resulta


na falta de estrutura das organizações para fazer frente às
exigências burocrático-administrativas, bem como a falta de apoio
financeiro para criar e manter esta estrutura. Muitos fundos não
custeiam a parte contábil e muitas instituições têm sérios
170

problemas nesta área, e falta apoio financeiro e técnico para criar,


consolidar ou reformular as instituições.

O "tempo burocrático" ignora a dinâmica sócio-ambiental, ciclos


ecológicos e agrícolas, bem como os tempos das populações
locais. Ciclos de financiamento raramente levam em conta estas
dinâmicas, o que deve ser reavaliado na concepção de editais,
tempos de financiamento, mesmo sistemas de avaliação.

Os sistemas de informação e fluxo de informação são


desiguais entre os parceiros. É necessária a construção de um
foco compartilhado sobre o tema da parceria. Uma linguagem
comum, construída sobre compromissos reais com as populações
locais, é o ponto de partida para estabelecer um diálogo. O seu
estabelecimento deve ser estimulado durante o processo prévio
de elaboração de um projeto, com base nestes compromissos. Os
sistemas atuais potencializam quem tem possibilidade de
compreender e acessar a linguagem e informação, aumentando a
exclusão de atores despreparados.

A indefinição do papel das organizações governamentais e


não-governamentais na pesquisa e levantamento de dados leva à
existência de "universos paralelos de informação", e uma
ignorância mútua sobre o fluxo de informação: quem está fazendo
o que, e como está fazendo. Isto resulta em muitos casos de
sombreamento, repetição de trabalhos e mesmo competição pelas
mesmas fontes de recursos, quando um sistema de redes
complementares poderia potencializar recursos e capacidades.

Apesar destas limitações, no âmbito global, há um clima


favorável para realização de parcerias entre governo, sociedade
organizada e agricultores, visando ao desenvolvimento de
sistemas agroflorestais. Há um debate mundial sobre o papel que
a agricultura tem nos Sistemas de Uso da Terra e na paisagem
como um todo, e que papel os SAFs poderiam desempenhar no
futuro do planeta e no futuro da sobrevivência da sócio e
biodiversidade.

A situação política do país mostra uma disputa por modelos de


desenvolvimento rural com envolvimento de diferentes escalões
da representação política, desde a esfera municipal até o nível
federal. Nunca ficou tão claro que existem vias de
desenvolvimento diferentes e que existe uma disputa política
dentro do perfil de poder nacional (e no próprio governo) por qual
modelo deva ser utilizado pela sociedade. Nunca foi tão evidente
o momento de a sociedade organizada tomar parte ativa na
geração de propostas.

No âmbito mais localizado, são as experiências concretas, seja


de recu rsos, capacidades e sistemas de uso da terra baseados
em SAF em funcionamento. Com respeito à disponibilidade de
recursos, existem atividades e experiência acumulada em
iniciativas de base local que poderiam alavancar políticas públicas
mais ousadas. Neste contexto e suas interações, existem
capacidades individuais desenvolvidas em acúmulo de habilidades
fundamentais (técnicas, gerenciais, relacionais) que poderiam ser
potencializadas. Finalmente, existem capacidades institucionais
desenvolvidas, as quais poderão ser potencializadas pela criação
e articulação permanente de organizações e indivíduos criativos
em redes e movimentos organizados.

Os grupos de trabalhos interministeriais fazem parte deste


processo social favorável. Se existe um debate por modelo de
desenvolvimento, este debate está acontecendo também nestes
grupos, e é onde o exercício de consenso e mesmo de disputa
estará acontecendo no plano político. Este espaço também
oportuniza os sistemas agroflorestais, uma vez que estes
precisam de uma abordagem interdisciplinar e, portanto, de um
arranjo político-institucional compatível, se o objetivo é o
desenvolvimento de políticas públicas que contemplem a
diversidade e a complexidade social, ecológica e econômica.

Dado este clima de apoio à parceria e condições sociopolíticos


favoráveis, considera-se importante dar prioridade, sobretudo à
consolidação e compatibilização de informação e redes de
informação. Recursos complementares e pessoal capacitado
devem ser previstos e mobilizados para esta atividade de apoio.
Para os grupos interessados em promover a adoção de SAFs
participarem dos processos de definição de políticas, precisa-se
de pessoal capacitado e previsão de recursos de apoio para a
consolidação e compatibilização de informação e redes de
informação. Uma vez fortalecidas e compatibilizadas, as redes
172
----~-------·---

locais e regionais poderão ser conectadas às redes nacionais e


internacionais. Isto aumentará sua visibilidade e transparência,
bem como sua capacidade de enraizamento às lógicas locais e
regionais de desenvolvimento. Neste contexto, aumenta a
transparência e a capacidade de autocrítica, na medida em que a
circulação crítica de informação pode enriquecer cada
componente da rede.

Uma proposta concreta foi formulada para a criação de um


"balcão de ofertas e demandas de parcerias" para
SAF/Desenvolvimento Rural Sustentável. No curto prazo, devem
ser relacionados e divulgados os projetos em andamento e as
demandas de conhecimentos individuais e parcerias institucionais,
promovendo o intercâmbio tanto de capacidades como de
experiências. Para isto, devem ser previstos recursos e logística,
visando coordenar e facilitar o processo. No âmbito do próprio
seminário, foram levantadas várias possibilidades de oferta e
demanda de parcerias, intercâmbios e colaborações, algumas já
acertadas. Porém, para que este ambiente seja institucionalizado
num espaço virtual, é fundamental a viabilização de pessoal
qualificado, infraestrutura e espaço físico de operação. Esta
"interface facilitadora de redes" poderia qualificar e consolidar
rapidamente muitas atividades e projetos em andamento.

Outra iniciativa seria a provisão de "Financiamento do Projeto


do Projeto": Os editais devem incorporar a necessidade de uma
etapa prévia (denominada aqui de "o projeto do projeto"), o qual
permitiria às populações participarem de modo efetivo na
concepção e lógica do projeto, aumentando a inclusão social e a
sua eficácia. Se considerarmos, por exemplo, o PDPI (PDA para
Povos Indígenas), a distância entre aldeias e os parcos recursos
das organizações (geralmente indígenas) que irão elaborar os
projetos, esses fatores implicam em que os projetos sejam cada
vez mais pobres em participação na sua concepção, e assim
menos qualificados e participativos na sua execução.

2.2. O Mercado Potencial para Produtos Originários de SAFs


Os participantes deste Grupo de Trabalho enfatizaram que a
falta de capital de giro, ou o custo deste crédito é incompatível
com a escala de produção do SAF. Esta falta faz com que as
associações e cooperativas não possuam o capital para pagar o
associado por sua produção mediante a entrega, induzindo uma
preferência natural para comercialização terceirizada, ou seja, via
intermediário com pagamento mediante entrega, gerando lucro
reduzido. A ausência de linhas de crédito específicas para
impulsionar a fase inicial da comercialização cria um círculo
vicioso, no qual a necessidade por "venda casada" inviabiliza a
possibilidade de se explorar formas mais lucrativas de
comercialização. A falta de um "overhead" inicial, capaz de suprir
os gastos diretos com a produção inicial, potencializa a fragilidade
estrutural das associações.

A falta de acesso à matriz energética por muitos grupos de


produtores também representa uma barreira à agregação de valor
aos produtos. A utilização de maquinário, via de regra movida à
energia elétrica, torna fator limitante para o pequeno produtor.
Observa-se que nas associações de produtores falta acesso à
infra-estrutura energética mínima, e se tiverem necessidade de
utilizar grupos de geradores independentes, ficam sujeitos às
oscilações de voltagem. Como resultado, não conseguem
estabelecer uma linha de produção confiável, de qualidade
constante e com prazos de entrega sistemáticos.

Neste contexto, observa-se a criação de inúmeros obstáculos


(políticos, técnicos e financeiros) para a comercialização de
produtos beneficiados, competitivos e de qualidade, tornando
pouco atrativo lançar linhas de comercialização independentes.
Entende-se, que dentro do atual contexto político-financeiro, o
pequeno produtor de SAFs não dispõe de condições mínimas
para comercialização direta de seus produtos, fator que estimula a
concentração de mercado. Há uma carência de identificação
prévia e clara de potenciais mercados para produtos dos SAFs.
Acesso a informações sistematizadas e consolidadas sobre o
mercado potencial para produtos oriundos de SAFs (por micro,
mesmo e macro região) é uma forma objetiva de fortalecer a
comercialização via associação e/ou cooperativas de pequeno e
médio porte.

De posse de informações fidedignas, tecnicamente embasadas,


haveria maior possibilidade de se incentivar mecanismos de
crédito para a fase preparatória à comercialização dentro de um
sistema de responsabilidade compartilhada produtor/técnico/órgão
de fomento. Esta responsabilidade tripartite gera um lastro
de responsabilidade entre os pólos ativos e passivos, onde tanto
os lucros poderiam ser compartilhados como os prejuízos
também. Embora a margem de lucro seja mínima, assegurar o
comprometimento técnico com a escolha adequada de culturas a
serem desenvolvidas gera confiabilidade para os possíveis
órgãos de fomento. Vale lembrar que o componente arbóreo é um
investimento de médio a longo prazo. Assim, deve ser bem
planejado para evitar problemas, de acordo com o potencial do
mercado e do consumo local.

Em resposta a estes entraves, sugere-se, no caso do capital de


giro, a abertura de linhas de fomento, nos mesmos moldes do
PRONAF, direcionado especificamente para processos de
beneficiamento e comercialização (específico para a fase pós-
colheita, não se limitando apenas à assistência técnica). Um
incentivo indireto poderia ser gerado pela redução no ICMS
incidente em produtos de SAFs.

Com respeito à matriz energética, há necessidade de um


estímulo á utilização de sistemas de energia alternativa (ex:
energia solar, energia eólica, etc.). O aproveitamento da produção
dos pequenos produtores nos programas de estímulo à produção
de biodiesel (pendente de análise técnica quanto à viabilidade), é
outra recomendação.

Pelo lado do comércio, sugere-se estimular o consumo


solidário intra-regional, ampliando o horizonte de comercialização,
através da identificação de consumidores potenciais, e o acesso a
informações confiáveis sobre o mercado consumidor, assegurando
a competitividade e rentabilidade da produção dos SAFs. Deve-se
ainda instituir um mecanismo de apoio ou fomento, que propicie a
divulgação em escala comercial dos produtos dos SAFs. Através
do esclarecimento ao consumidor sobre o diferencial dos produtos
agroflorestais, pode-se estabelecer uma relação solidária entre o
produtor e um eventual comprador. Para isso, sugeriu-se criar
uma rede 'ou "balcão virtual" de negócios que pudesse fazer esta
ligação. Outra forma de divulgação pode se dar através da
participação dos produtores em feiras regionais e exposições
onde os produtores possam levar seus produtos, sendo
necessário, contudo um apoio específico para este tipo de
divulgação.

Para viabilizar estas propostas, estima-se necessário


estabelecer mecanismos de divulgação, de baixo custo, dos
produtos beneficiados e da matéria prima bruta via rede . Um
estímulo específico à participação dos pequenos produtores e
suas associações em feiras e exposições de âmbito nacional
também é recomendado para identificar e facilitar a
comercialização tanto da matéria prima bruta como dos produtos
já beneficiados pelas associações e cooperativas. Finalmente,
reivindica-se apoio direcionado à assistência técnica para a
padronização da apresentação dos produtos aos consumidores
através do uso de embalagens e rótulos, atendendo às normas da
Vigilância Sanitária, Conteúdo Nutricional, entre outros.

Em comentários da platéia, lembrou-se que quem consome os


produtos agroflorestais, geralmente, é a classe média, como se
observa em muitas feiras . No entanto, se conhece experiências de
venda direta para prefeituras que distribuem para escolas,
creches, nos quais os impostos cobrados pelos produtos fica
sujeito à redução, fazendo com que o público consumidor possa
ser ampliada pela compra institucional. Entende-se ainda que a
divulgação ampla das possibilidades de comercialização de
produtos com valor agregado para mercados considerados
"alternativos", embora estreitos, pode contribuir para o
fortalecimento dos pequenos e médios produtores.

2.3. Segurança Alimentar e SAFs


Destaca-se a ausência de um marco legal para SAFs, de
abrangência nacional (i.e ., Política Nacional de SAFs). Observa-se
que a adoção deste marco legal deveria se traduzir no
comprometimento político do Estado, priorizando políticas públicas
para regulamentar particularidades atinentes à SAFs, elevando o
Sistema Agroflorestal à componente basilar no combate à fome e
desnutrição no País.

Observa-se uma fragilidade endógena no estabelecimento de


salvaguardas da soberania nacional alimentar. A segurança
alimentar não estar classificada como tema estratégico, integrante
da questão "Defesa Nacional", estratégica na garantia da
- - - - - - - ---- -- ------ --- . -

soberania alimentar, a guisa do entendimento que: assegurar a


segurança alimentar da população é dever estatal inalienável.

Considera-se que, ao não integrar o elenco de prioridades nacionais,


a falta de fomento à pesquisas técnico-científicas focadas no
fortalecimento de mecanismos de produção de alimentos para
auto-consumo, sob a dinâmica de Sistemas Agroflorestais, acaba
por agravar a dinâmica do ciclo composto por pobreza, miséria,
desnutrição, altos índices de evasão escolar, e desemprego. A
ausência de linhas de fomento, específicas para pesquisas sobre
SAFs no Brasil, retro-alimenta o ciclo pernicioso da fome e da
pobreza, no médio e longo prazo. Lembra-se que este fator acaba
elevando os índices de pobreza rural e desnutrição no campo
(especialmente nas Regiões Norte e Nordeste do país).

Adotando-se políticas públicas, com especial ênfase na


geração de conhecimento e informação técnico-acadêmica,
aplicável às particularidades intrínsecas dos pequenos produtores
rurais, especialmente os produtores de baixa renda, e
observando-se as peculiaridades regionais, étnicas e culturais de
cada localidade, inicia-se um programa eficaz de combate à fome
e à pobreza, calçado nos princípios da dignidade e do direito à
cidadania.

Este entrave estende-se à precariedade da assistência técnica


na escolha das culturas e sementes para as lavouras, adequadas
às condições endófitas, climáticas e etno-culturais de cada
localidade. Considera-se que a escolha inadequada de sementes
de qualidade é uma das conseqüências da baixa prioridade dada
às linhas de fomento às pesquisas para desenvolver sementes
crioulas de qualidade, de fácil acesso e em quantidade suficiente
para suprir o mercado nacional.

Entende-se que as metodologias atuais, adotadas nos


programas de saúde pública e de assistência social, apresentam-
se inadequadas. Neste sentido, enfatiza-se a ineficácia da
disseminação de informação, de fácil internalização, sobre
educação alimentar, questões de limpeza e higiene e, práticas
elementares de economia doméstica, visando otimizar o uso de
insumos regionais na alimentação, adequadas ao paladar e
adaptáveis aos costumes culinários de cada comunidade. Deve-se
incluir nisto o estímulo à introdução de novas culturas agrícolas,
de alto valor nutricional, palatáveis e adaptáveis aos hábitos
locais, aumentando a gama de alimentos que integram o cardápio
alimentar.

Observa-se, ainda, a ausência de componente específico no


Programa Fome Zero, focado na priorização nacional de
implementação de SAF's, visando primeiramente a auto-suficiência
alimentar de cada núcleo familiar. Considera-se que dado o fato
do Programa Fome Zero não abordar a questão dos SAF's, sob o
prisma da produção familiar para autoconsumo, não houve a
mobilização necessário do sistema financeiro, para disponibilizar
linhas de fomento capazes de tornarem os SAF's economicamente
viáveis.

Ressalta-se que, como conseqüência direta da falta de linhas


de fomento específicas para produção agroflorestal de pequenos
produtores rurais, há um estímulo indireto a concentração de
terras (muitas vezes por meio de grilagem), para o plantio de
monoculturas em grande escala, nem sempre se observando os
princípios da sustentabilidade sócio-ambiental. A exemplo disto,
cita-se o empreendimento de Tucuruí, na região Transamazônica,
onde 90% do financiamento do PRONAF foi utilizado para a
implementação da bovinocultura, segundo relatou um dos
participantes deste Grupo de Trabalho.

Apesar das limitações das políticas públicas discutidas acima,


reconhecem-se os avanços realizados para abrir novas linhas de
crédito no PRONAF (e.g., o PRONAF-Mulher) que atende às
demandas específicas. O PRONAF Florestal também se destaca
como avanço na elaboração de políticas públicas para SAFs.

No que se refere às comunidades de quilombolas, entende-se


que o Programa Fome Zero impulsionou o trabalho de atendimento
aos núcleos rurais onde vivem populações remanescentes de
quilombos. Sabe-se da existência de aproximadamente 743
comunidades quilombolas em todo o Brasil, dos quais 36 já
receberam o título de posse da terra. Neste contexto, observa-se
que além do reconhecimento, identificação e titulação das terras
de quilombos, firmou-se convênio, com a Fundação Palmares,
para levar saneamento básico àquelas comunidades. Com isto,
viabilizaram-se os meios para que as comunidades quilombolas
possam garantir, parcialmente, sua segurança alimentar.

Com base neste exame das políticas públicas que afetam a


relação entre segurança alimentar e SAFs, propõe-se criar um
marco legal, capaz de atender a necessidade de ser instituir uma
política de segurança alimentar, que inclui o acesso a alimentos.
Entende-se que, num segundo momento, este marco legal possa
se estender às ações no campo do abastecimento e
comercialização. Enfatiza-se que, implementar políticas públicas
de combate à pobreza, miséria, fome e desnutrição, atende ao
objetivo principal que é: viabilizar a produção sustentável de
alimentos saudáveis, tradicionalmente consumidos pela população
local, vis-à-vis a dinâmica tradicional da cultura agrícola em
sistema familiar - ou seja, produção primeiramente destinada para
o auto-consumo.

Para reforçar esta estratégia, faz-se necessano assegurar


linhas de fomento que viabilizem a necessidade de produção de
alimentos, dando prioridade absoluta à produção para auto-
consumo de famílias rurais. Considera-se que este é um marco
político fundamental no atendimento às necessidades primárias de
alimentação, nutrição, minimização da miséria, pobreza e da
degradação social. Estas propostas pressupõem que os
mecanismos de fomento tenham vinculação à comprovação prévia
de regularização fundiária, evitando-se desta forma a
concentração de terras e o incentivo às monoculturas.

Deve-se ainda elevar a questão de "soberania alimentar" ao


status de política pública de prioridade nacional número 01,
observando-se o direito democrático dos povos de definir suas
políticas alimentares, baseadas em critérios sócio-etno-culturais,
que garantam o acesso à uma alimentação saudável e nutritiva.
Lembra-se, por pertinência, que este é um direito humano
reconhecido pela Organização das Nações Unidas (ONU).

Isto ocorrendo, acredita-se que a abordagem política e


institucional dada ao Programa Fome Zero será o de tornar as
comunidades e os produtores de SAFs auto-suficientes,
evitando investimentos sem retorno em políticas de "doação
de alimentos", que não preparam os beneficiários para
alcançarem a sustentabilidade alimentar, econômica e
ambiental.

Investir em políticas públicas, de médio e longo prazo é


primordial para assegurar o alcance de um desenvolvimento
nacional sustentável, sob todos os prismas. Para tanto, a
segurança alimentar deve fazer parte integrante do projeto de
soberania nacional, pois pressupõem estratégias agroalimentares
comprometidas com as especificidades do nosso País. Segundo
entendimento manifesto de Roberto Porro, ICRAF, é importante
assegurar a participação das populações tradicionais na definição
de políticas públicas de SAFs, buscando adequar as propostas
técnicas às necessidades locais.

Entende-se que, para abordar a questão da desigualdade


social, desnutrição e do desconhecimento de formas de
aproveitamento de insumos alimentares diversos, é preciso incluir
políticas públicas direcionadas à educação alimentar, à educação
para o consumo sustentável e à organização dos consumidores.
Aumentando-se o leque de produtos agrícolas consumidos pelos
produtores rurais de SAFs, necessariamente há um aumento na
qualidade nutritiva da alimentação, propiciando um incremento na
qualidade de vida local. Destaca-se ainda que, esta prática, ao
longo do tempo, tende a reduzir a demanda por alimentos
suplementares, distribuídos atualmente em caráter emergencial.

Além da educação, precisa-se vincular os mecanismos de


fomento à pesquisa técnico-científica às necessidades nacionais
de se criar referenciais teórico-científicos sobre: SAFs; cultivo de
culturas adequadas às peculiaridades regionais; mecanismos de
incremento para os sistemas produtivos de SAFs; e, formas de
baixo custo capazes de potencializar a conservação e o uso
sustentável dos recursos naturais de cada região.

Ao se criar um sistema de fomento para programas de


pesquisas, diretamente condicionando à produção de propostas
viáveis de políticas públicas locais, regionais e nacionais, na qual
se apresentam soluções para problemas concretos intrínsecos do
sistema produtivo em SAFs, assegura-se a retribuição social dos
investimentos feitos pela sociedade, por meio do pagamento de
impostos isto é, considerando-se que linhas de fomento para
180

aprimoramento acadêmico e pesquisa são pagos com dinheiro


oriundo dos cofres públicos, nada mais justo que direcionar os
investimentos para atender às necessidades prementes da
população, assegurando o desenvolvimento sustentável e
socialmente eqüitativo do País.

Outro viés desta mesma proposta é a inegável necessidade de


integração das universidades, instituições de pesquisas e sociedade
civil para definir uma agenda de pesquisa e do currículo
universitário direcionado às necessidades do pequeno produtor.
Apresenta-se como primeiro passo o estimula à articulação entre
os departamentos de Engenharia Florestal e de Agronomia, por se
considerar que os sistemas agroflorestais abrangem uma temática
de caráter transversal.

Outro aspecto fundamental é vincular o estágio profissionalizante


ao treinamento e à capacitação dos pequenos produtores no
campo, por estudantes universitários das mais diversas áreas
temáticas de estudo.

Entende-se como de importância crase, a implementação de


redes de sementes crioulas, para tentar quebrar o monopólio das
grandes empresas multinacionais, produtoras de sementes.
Vincula-se a esta proposta específica, a criação de uma política
de estímulo tecnológico, fomento para linhas de produção local de
sementes crioulas, e assistência técnica no campo. Especificidades
sobre uma proposta de política de agrobiodiversidade foram
apresentadas pelo Dr. Paulo Kageyama (MMA/SBF) no seminário.

A implementação em escala da prática do "Quintal Escola", que


se entende como uma grande oportunidade para toda a
comunidade rural. Adotar-se esta política significa disponibilizar
um local de atuação oportuno para a disseminação dos SAFs.
Inicialmente, a atuação seria focada na melhoria dos hábitos
alimentares dos alunos e da comunidade; aproveitando-se o local
para a introdução de novas espécies de interesse e de
conservação das populações tradicionais; e, também como local
adequado para realizar o treinamento e assistência técnica aos
familiares dos alunos.
2.4. Crédito e Serviços Ambientais
Apesar dos SAFs terem mérito reconhecido sobre os aspectos
sócio-econômicos e ambientais, não possuem notoriedade, no
cenário atual, quanto ao crédito, o que dificulta a adoção destes
sistemas. O crédito se torna um empecilho apesar de serem
reconhecidos os benefícios que os SAFs trazem. Formas
diferenciadas de crédito para os SAFs por meio do reconhecimento
dos seus serviços ambientais podem se constituir uma via para a
sustentabilidade desses sistemas.

Os bancos aceitam fornecer financiamentos específicos para


produtos e não para a unidade produtiva como um todo. Para a
viabilidade dos SAFs ou para planejamento sustentável de uma
unidade produtiva é muito complicado propor o financiamento de
uma única parcela, pois passa-se a ter uma contabilidade
individualizada por parcela dentro de sua unidade produtiva. O
ideal seria que os bancos aceitassem o financiamento da unidade
de produção familiar.

Não existem recomendações técnicas que sejam fundamentadas


o suficiente, que tenham base em pesquisa e validação de
experiência prática, as quais permitiriam uma aceitação por parte
dos bancos, de técnicas e práticas ligadas aos SAFs. As
recomendações técnicas vinculadas à aprovação de crédito vêm
dos centros de pesquisa, onde não há validação do conhecimento
empírico. Além disso, inexiste um intercâmbio, ou elo de
interlocução entre o produtor - que possui o conhecimento
empírico - e os centros acadêmicos que poderiam colaborar com
a validação desse conhecimento.

Existem dificuldades de comunicação entre os gestores, a


política de créditos e os agentes intermediários tais como bancos,
assistência técnica e extensão rural-ATER, pesquisa e o crédito
vinculado. Às vezes, o crédito existe e os potenciais usuários não
ficam sabendo de sua existência, nem de como proceder. Então,
existe uma interrupção na comunicação. As oportunidades podem
existir, mas as pessoas não sabem como aproveitar ou sequer
passam a conhecer estas oportunidades.

O crédito está vinculado a uma série de tecnologias as quais


nem sempre o agricultor reconhece. Por exemplo, há produtores
que "tomam" empréstimos, compram todos os agroquímicos e não
os utiliza por não acreditar no método. No entanto, existe um
compromisso com o banco, pois o mesmo acredita que a
aquisição de tais produtos esteja associada com a redução de
risco de produtividade, o que está vinculado a um conhecimento
produzido exclusivamente por centros de pesquisa ou pela
academia.

Hoje temos um cenário que se mostra positivo a respeito das


oportunidades existentes para a atuação das políticas públicas.
Com o surgimento do Programa de Desenvolvimento Sócio-
ambiental da Produção Familiar Rural-PROAMBIENTE, proposta
surgida das bases produtivas, se corrobora a compensação dos
serviços ambientais, e isto está sendo discutido favoravelmente
dentro do governo, inclusive para difusão ao nível nacional e não
somente na Região Amazônica. Sua forma de funcionamento,
partindo da organização de base, e do conhecimento empírico dos
agricultores, permite que hoje se crie um outro formato de crédito
e também de remuneração por serviços ambientais, o que valida o
conhecimento empírico fundamentado em comprovação científica
na associação entre usos do solo e serviços ecossistêmicos.

Existe uma rede de experiências em SAFs, desenvolvida com o


envolvimento de diversos atores locais, apoiado pelo FNMA,
consistente com prioridades governamentais. Essas redes ainda
estão dispersas. A interlocução entre essas redes e a documentação
de experiências em SAFs pode fortalecer a aceitação de técnicas
agroflorestais pelos órgãos de financiamento.

Apesar da transversalidade não ocorrer plenamente, há uma


conjuntura política favorável, ou seja, existe um foco na agricultura
familiar e existem ações interministeriais que estão articuladas.

Em termos de propostas para superar os entraves identificados,


o grupo de trabalho sugeriu como prioridade a de_finição de um
protocolo mínimo de princípios ou indicadores consensuais entre
produtores e pesquisadores com referência à implantação e
manutenção de SAFs, contemplando aspectos voltados a qualidade
de vida, desempenho econômico e serviços ambientais. As
experiências já existem; não está se partindo do zero. Assim,
poder-se-ia construir um projeto coletivo entre esses diversos
atores para o desenvolvimento de protocolo mínimo, para que os
bancos e até mesmo os créditos vinculados possam ter um
embasamento sólido para monitoramento de riscos e validação
dos projetos. A partir destes princípios, o produtor poderia planejar
a sua unidade produtiva. Os indicadores de serviços ambientais,
na verdade, serviriam assim não apenas para remuneração direta
por serviços, mas também para facilitação de créditos e
planejamento pelo produtor.

Uma segunda proposta tem a ver com a implementação pelos


agentes financeiros de uma política de crédito que permite ao
produtor adotar arranjos espaciais e temporais mais flexíveis, e
que haja uma abertura com relação ao uso de insumos. Este seria
ligado aos princípios, serviços e produtos definidos mediante
projetos amparados no protocolo acima descrito. De outro modo, o
protocolo serviria para que o produtor estivesse muito mais
próximo do técnico que prepara o seu projeto, não ficando a
mercê deste.

Há uma demanda articulada para a expansão do PROAMBIENTE


para outros biornas. Embora este seja uma idéia dos formuladores
do programa, não se sabe se e como vai transcorrer. Existem
formas diferenciadas de créditos para SAFs por meio do
reconhecimento de seus serviços ambientais que podem se
constituir numa via para sustentabilidade destes sistemas. Embora
o crédito constitua num gargalo, os serviços ambientais e o
reconhecimento destes podem servir para que se viabilize estes
sistemas e eles possam se multiplicar.

Há uma necessária interlocução entre pesquisa, extensão e


produtores rurais visando difundir conhecimentos. Existem muitos
dados produzidos sobre SAFs, inclusive sobre indicadores
ambientais e serviços ambientais, mas que estão em linguagem
pouco acessível devido à pequena interatividade entre os setores
de pesquisa, extensão e produtores. É necessário que haja uma
interlocução muito maior, em linguagem acessível, tanto para os
técnicos que elaboram projetos quanto aos produtores que
utilizam o crédito . É necessário que esta linguagem se flexibilize
no processo da criação deste protocolo e da leitura das
experiências que são obtidas.
- - -84- - - - - - - - - - - -----

Finalmente, propõe-se a constituição de uma rede para


elaboração de um protocolo, unindo pesquisa, ONGs, produtores,
ATER e ministérios, partindo-se de experiências já existentes.
Pretende-se promover o encontro de pessoas de cada setor para
que se comece a consolidar um projeto único que pode ocorrer
nas diversas regiões do País, utilizando uma metodologia
acordada entre esses atores e que se possa construir em um ou
dois anos um protocolo mínimo de indicadores ou princípios.
Numa segunda etapa, propõe-se uma gestão junto a agentes
financiadores para adoção deste protocolo, com garantia técnica e
financeira para operação de créditos para SAFs. É necessário que
seja inserido o MOA, Ministério de Desenvolvimento Agrário, neste
processo, para que haja uma consideração e respaldo na política
nacional da ATER pública, envolvendo-a também dentro desta
proposta de encaminhamento diferenciado, tanto do crédito
quanto da análise, e da orientação quanto à utilização destes
princípios.

2.5. Harmonização da Legislação Conservacionista com os


Requisitos do Desenvolvimento Rural Sustentável
Atualmente existe um conflito que impede uma relação
harmoniosa do "binômio conservação-desenvolvimento rural
sustentável" do qual vários palestrantes no seminário se referiram.
É fundamental que este conflito seja superado através do
reconhecimento da compatibilidade entre a adoção de certos usos
do solo e a conservação dos recursos naturais e a biodiversidade.
Existe um atraso na evolução do arcabouço legal comparado com
a mudança dos paradigmas das políticas públicas. Há um conflito
entre a permanência da legislação proibitiva e medidas de política
que procuram a convivência. As políticas públicas estão evoluindo
positivamente de forma mais rápida mas não são acompanhadas
com a mesma velocidade pelos dispositivos legais, o que pode
impedir a aplicação prática das políticas públicas inovadoras.
Exemplos desta morosidade incluem os seguintes:
• a efetiva inaplicabilidade de diversos dispositivos legais, tanto
no Código Florestal quanto em outros decretos, tais como no
decreto federal que incide sobre o uso da capoeira no biorna da
Mata Atlântica, dificulta a não adoção de SAFs como alternativa;
• falta de divulgação ou plena aplicação de alguns dispositivos
legais, como a compensação ambiental, consultas públicas, etc,
que podem ser utilizados para facilitar a implementação de
projetos e sistemas agroflorestais;
• a obtenção do licenciamento ambiental por populações rurais
acarreta em muitas dificuldades. O acesso é dispendioso,
burocrático, além de ser amplamente desconhecido pela
agricultura familiar.

A restauração de Áreas de Proteção Permanente (APPs) e


Reservas Legais (Rls) com a implantação de SAFs representa
uma possível modalidade de recuperação ambiental com uso
sustentável, atrativa para o produtor rural. Porém, os SAFs hoje
praticados não apresentam, na sua maioria, nível suficiente de
diversidade biológica interna para permitir que esta opção
pudesse ser sempre autorizada para os mencionados objetivos de
restauração.

A existência de tecnologias mais baratas desenvolvidas no


Estado de São Paulo para recuperação de APPs e RL implica
numa forma de superar as barreiras representadas pelo
dispositivo legal associado à recuperação de matas ciliares com
grande número de espécies. Porém, convém considerar que
muitos agricultores não têm recursos financeiros ou encontram-se
descapitalizados. Portanto, na fase inicial dos processos de
restauração/reflorestamento, o plantio com um número
relativamente limitado de espécies nativas deveria ser autorizado,
na medida em que reúna preferencialmente espécies nativas que
atraem agentes de disseminação (cfr. zoocoria), capazes de
promover uma progressiva biodiversificação espontânea das
áreas reflorestadas ou re-vegetadas com SAFs.

Está em fase de debate no Ministério do Meio Ambiente,


incluindo o CONAMA e outros ministérios interessados, entre eles
o MOA, a necessidade de reanalisar o Código Florestal e outros
dispositivos legais que incidem sobre o "binômio conservação-
desenvolvimento rural sustentável".

3. Conclusões

As propostas encaminhadas incluíram a formação de um grupo


de trabalho para elaborar propostas para o aprimoramento e
adaptação de dispositivos legais identificados como de difícil
186

aplicação. Deverão participar, pelo menos, o MMA, MOA, MAPA,


MOS, Ministério da Justiça e entidades representativas dos
agricultores, bem como ONGs de apoio. O grupo de trabalho
adotaria o diálogo via grupo de discussão, além de ter reuniões
eventuais. A maior parte do trabalho seria feita via internet de
forma participativa e debates.

Uma segunda proposta inclui a elaboração de linhas e


diretrizes que permitam a implantação e o uso de SAFs
adensados e biodiversificados no âmbito da restauração de APPs
e RL. Para isso, seria ainda aconselhável acompanhar a
tramitação da discussão da proposta no CONAMA e outros fóruns
de discussão competentes.

Finalmente, recomenda-se a sistematização e divulgação de


iniciativas exitosas de licenciamento ambiental que permitem o
acesso facilitado dos agricultores (p.ex., licenciamento em grupos,
licenciamento experimental para geração de conhecimento,
desburocratização do processo, etc.). A inclusão digital crescente
dos agricultores e principalmente de suas associações e
serviços de apoio, ONGs, etc., pode representar uma
oportunidade de divulgação de dispositivos legais de interesse
para o desenvolvimento agroflorestal via internet. Hoje em dia,
mesmo na Amazônia, as associações e ONGs tem acesso à
internet. Isto pode compensar um pouco a dimensão continental
do Brasil.

4. Referências
REBRAF/MMA. Políticas Públicas e Financiamento para o
Desenvolvimento Agroflorestal no Brasil, 18 a 20 de agosto de 2004,
Brasília. - Brasília: Abaré, 2005.

REBRAF. Website: http://www.rebraf.org.br.

CONSAFs. Website: http://www.rebraf.org.br/consafs.


.,....

Você também pode gostar