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6 Série:

Educação na Cidade e Humanidades

Identidade Pomerana
Uma Viagem Formativa Desvelando Conflitos Soterrados
Z

Swami Cordeiro Bérgamo


Sandra Soares Della Fonte

Gepech
Grupo de Estudos e Pesquisas sobre
Educação na Cidade e Humanidades
Identidade Pomerana
Uma Viagem Formativa Desvelando Conflitos Soterrados
Z

Swami Cordeiro Bérgamo


Sandra Soares Della Fonte

1ª Edição

Vitória
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Espírito Santo – IFES
2018
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CPI)
Biblioteca Nilo Peçanha do Instituto Federal do Espírito Santo – Campus Vitória

B493i Bérgamo, Swami Cordeiro.


Identidade pomerana [recurso eletrônico] : uma viagem formativa desvelando conflitos
soterrados / Swami Cordeiro Bérgamo, Sandra Soares Della Fonte. – 1. ed. - Vitória : Instituto
Federal do Espírito Santo, 2018.
102 p. : il. ; 30 cm. (Série educação na cidade e humanidades; 6)

ISBN: 978-65-86361-09-4 (E-book)

1. Imigrantes -- Santa Maria de Jetibá (ES) -- História e crítica.


2. Pomerânios -- Arquitetura -- Espirito Santo (Estado). 3. Arquitetura de habitação -- Estudo de
casos. 4. Imigrantes -- Espírito Santo (Estado).
5. Identidade social -- Santa Maria de Jetibá (ES). 6. Professores -- Formação. I. Della Fonte,
Sandra Soares. II. Instituto Federal do Espírito Santo. III. Título.

CDD 21 – 325.1098152
Elaborada por Marcileia Seibert de Barcellos – CRB-6/ES - 656

Material didático público para livre reprodução.


Material bibliográfico eletrônico.

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Av. Vitória, 1729 – Jucutuquara - Vitória-Espírito Santo – CEP 29040-780

Comitê Científico do Material Educativo:


Prof. Dr. Erineu Foerste
Prof.ª Dr.ª Priscila de Souza Chisté Leite
Prof.ª Dr.ª Rosali Rauta Siller

Capa e Editoração:
Swami Cordeiro Bérgamo

Imagem da Capa:
Obra artesanal de Kristian Wener Lima (2017), dedicada à sua professora Kellen de Souza Lima.

Produção e Divulgação:
Programa de Mestrado Profissional em Ensino de Humanidades (PPGEH)/ Ifes
Instituto Federal do Espírito Santo – Campus Vitória

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Diretora de Pesquisa e Pós-Graduação

ATONIO DONIZETTI SGARBI


Coordenador do Mestrado Profissional em Ensino de Humanidades
Autores

Swami Cordeiro Bérgamo Sandra Soares Della Fonte

Possui graduação em Possui graduação em


Licenciatura em Filosofia pela
História pela Universidade Federal
Faculdade de Filosofia, do Espírito Santo –
Ciências e Letras de UFES (2002) e
Colatina – FAFIC graduação em
(1997), especialização (Pós-Graduação Educação Física pela mesma
Lato Sensu) em História do Brasil pela universidade (1993). Fez mestrado em
Universidade Federal do Espírito Santo – Educação (linha Filosofia da Educação)
UFES (2000), especialização (Pós- pela Universidade Metodista de
Graduação) em Gestão Pública pelo Piracicaba – UNIMEP (1996) e doutorado
Instituto Federal de Educação, Ciência e em Educação pela Universidade Federal
Tecnologia do Espírito Santo – IFES de Santa Catarina – UFSC (2006), com
(2015) e curso profissionalizante em estágio de doutoramento na School of
Técnico em Metalurgia pela Escola Education da University of Nottingham
Técnica Federal do Espírito Santo – (Inglaterra-2003-2004). Integra o Grupo
ETFES (1992). Atualmente é mestrando de Estudos e Pesquisas sobre Educação
em Ensino de Humanidades (IFES), na Cidade e Humanidade
integrante do Grupo de Estudos e (GEPECH/IFES). É professora da UFES
Pesquisas sobre Educação na Cidade e desde 1997 e do Mestrado Profissional
Humanidade (GEPECH/IFES) e professor Ensino de Humanidades (IFES) desde
da Escola Estadual de Ensino 2016.
Fundamental e Médio Graça Aranha, em Lattes ID:
Santa Maria de Jetibá - ES. http://lattes.cnpq.br/9396743098041438
Lattes ID:
http://lattes.cnpq.br/2885483487395819
Lista de siglas

APSAD-VIDA – Associação de Produtores IDAF – Instituto de Defesa Agropecuária e


Santamarienses em Defesa da Vida Florestal
AVES – Associação dos Avicultores do Estado do IECLB – Igreja Evangélica de Confissão Luterana
Espírito Santo no Brasil
BANESTES – Banco do Estado do Espírito Santo IELB – Igreja Evangélica Luterana do Brasil
S.A. IFES – Instituto Federal de Educação, Ciência e
CAF Serrana – Cooperativa dos Agricultores Tecnologia do Espírito Santo
Familiares da Região Serrana do Espirito Santo IJSN – Instituto Jones dos Santos Neves
CEASA – Centrais de Abastecimento do Espírito INCAPER – Instituto Capixaba de Pesquisa,
Santo Assistência Técnica e Extensão Rural
CONTAG – Confederação Nacional dos IPTU – Imposto Predial e Territorial Urbano
Trabalhadores na Agricultura MAPA – Ministério da Agricultura, Pecuária e
COMTUR/SMJ – Conselho Municipal de Turismo Abastecimento
de Santa Maria de Jetibá MDA – Ministério do Desenvolvimento Agrário
COOPEAVI – Cooperativa Agropecuária Centro- MPA – Movimento dos Pequenos Agricultores
Serrana MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
CUT – Central Única dos Trabalhadores Terra
DPM – Destacamento de Polícia Militar PPGEH – Programa de Pós-Graduação em Ensino
EEEFM – Escola Estadual de Ensino Fundamental de Humanidades
e Médio PROEPO – Programa de Educação Escolar
ES – Espírito Santo Pomerana
ETFES – Escola Técnica Federal do Espírito Santo PPP – Projeto Político-pedagógico
FAFIC – Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras RS – Rio Grande do Sul
de Colatina SC – Santa Catarina
FETRAF – Federação dos Trabalhadores na SICOOB – Sistema de Cooperativas de Crédito do
Agricultura Familiar Brasil
GEPECH – Grupo de Estudos e Pesquisas sobre STRSMJ – Sindicato dos Trabalhadores Rurais
Educação na Cidade e Humanidades Agricultores e Agricultoras Familiares de Santa
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Maria de Jetibá
Estatística UFES – Universidade Federal do Espírito Santo
UFSC – Universidade Federal de Santa Catarina
Sumário

Apresentação ................................................................................................. 10

Capítulo I
A viagem formativa ........................................................................................ 14
Santa Maria de Jetibá .................................................................................... 17

Capítulo II
O baú de viagem ............................................................................................ 22
 Campo e Cidade; Rural e Urbano ......................................................................................... 23
 Educação na Cidade ............................................................................................................. 25
 Cultura e Identidade ............................................................................................................. 28
 Enxaimel e o neo-enxaimel .................................................................................................. 32
 Re-germanização ................................................................................................................. 39
 Re-pomeranização ............................................................................................................... 40

Capítulo III
Desvelando os conflitos soterrados .............................................................. 50
 Arquitetura estereotipada: turismo e a identidade de “fachada” ...................................... 51
 Pela Cidade: trajeto e mapa urbanos .................................................................................. 64
 Arquitetura tradicional pomerana: a casa antiga e o modo de vida .................................. 66
 Pelo Campo: trajeto e mapa rurais ...................................................................................... 78
 Arquitetura da produção: entre o agronegócio e a agricultura familiar ............................ 80

Considerações finais
Álbum de viagem ........................................................................................... 94

Referências .................................................................................................... 98
Se o arranjo da cidade e da urbanidade como um todo é, por si, um agente
educativo e investe na formação subjetiva de seus habitantes, torna-se
premente aprender a ler a grafia social inscrita nessa ordenação citadina.

Sandra Della Fonte, 2018.


Apresentação

IDENTIDADE POMERANA
Uma viagem formativa desvelando conflitos soterrados
2018
Apresentação

Este material educativo (e-book) é uma descendentes construíram desde sua


síntese da dissertação homônima, chegada ao território capixaba.
apresentada ao Programa de Pós-
O objetivo geral da investigação é
Graduação em Ensino de Humanidades
problematizar, recorrendo aos
do Instituto Federal do Espírito Santo
pressupostos da Educação na Cidade,
(PPGEH-IFES), como requisito parcial do
elementos da atual identidade pomerana
Mestrado Profissional em Ensino de
construídos a partir de estereótipos que
Humanidades. Sendo uma pesquisa
camuflam os conflitos e lutas desse grupo
vinculada ao Grupo de Pesquisa em
étnico-cultural no município de Santa
Educação na Cidade e Humanidades
Maria de Jetibá-ES; bem como
(GEPECH), buscou-se neste subsídios
transformar tal problematização em
teóricos-reflexivos, notadamente na
subsídios para a elaboração de material
relação entre cidade e educação, em uma
educativo, na forma de e-book,
concepção contra-hegemônica,
direcionado a docentes atuantes na
materialista-histórica e dialética.
Educação Básica (formadores em
A pesquisa formula a seguinte pergunta formação).
central: quais conflitos se colocam na
Para analisar as edificações, foram feitas
construção da atual identidade do povo
visitas in loco com o devido registro
pomerano na cidade de Santa Maria de
fotográfico e anotações. Além da
Jetibá-ES e como esses conflitos se
produção bibliográfica de cunho
encontram em evidência ou soterrados
acadêmico e não acadêmico, também se
na configuração arquitetônica das
recorreu a fontes diversas: fotos de
edificações neste município?
livros, sites oficiais da Prefeitura e da
Para responder tal indagação, tomou-se Cooperativa Agropecuária Centro-
como objeto de análise algumas Serrana (COOPEAVI), legislação e
construções arquitetônicas que, de documentação oficial do município,
alguma maneira, expressam modos de jornais e material publicitário.
vida que os pomeranos e seus

[ 10 ]
Assim, em busca de uma compreensão para uma “identidade de fachada”,
reflexiva e crítica sobre as inquietações vinculada a interesses turístico-
propostas, organizou-se este livro como econômicos; a casa tradicional
uma jornada ao saber, sendo o caminho a pomerana, vinculado ao modo de vida
se percorrer disposto em três capítulos: dos primeiros imigrantes que chegaram
1) a viagem formativa; 2) o baú de nesta região; por fim, a indústria do
viagem; 3) desvelando os conflitos agronegócio na forma de granjas
soterrados. Por fim, as considerações automatizadas que movimentam uma
finais compõem o álbum dessa viagem. cadeia produtiva ampla em
contraposição à agricultura familiar de
Assim, o capítulo I trata do material
camponeses com propriedade de
educativo, posto como uma viagem
pequeno ou médio porte.1 Sugere-se
formativa na concepção da Bildung.
ainda dois trajetos contra-hegemônicos:
Expõe ainda o território a ser explorado:
pela cidade e pelo campo.
Santa Maria de Jetibá. No capítulo II
organiza-se o referencial teórico central Trazer tal problematização torna-se
desta investigação sobre os temas: promissor na apreensão histórica da
cidade/campo e urbano/rural; educação identidade pomerana. Ao se materializar
na cidade; cultura e identidade; enxaimel nos diversos espaços de formação, pode
e neo-enxaimel; re-germanização e re- tornar-se mais uma proposta mediadora
pomeranização. O capítulo III consiste no a ser utilizada pelos atores sociais da
coração deste e-book. Nele são educação e da comunidade pomerana,
analisados três tipos de construção que até na formulação e prática de políticas
arrogam para si a identidade pomerana. públicas, visando à emancipação crítica
São eles: os prédios com “estilo do sujeito histórico.
germânico” (neo-enxaimel) que apontam

1 O pequeno produtor rural ou agricultor familiar envolvidas, define oficialmente o agricultor


compõe o campesinato, que seria “o conjunto familiar como “aquele que pratica atividades no
daqueles que trabalham na terra e possuem seus meio rural, atendendo aos seguintes requisitos:
meios de produção: ferramentas e a própria terra. não detenha, a qualquer título, área maior do que
[...] Há pequenos agricultores ou fazendeiros que quatro módulos fiscais; utilize
são proprietários ou arrendatários da terra e predominantemente mão-de-obra [força de
podem, dentro de limites, dispor dela, de seus trabalho] da própria família nas atividades
produtos e do próprio trabalho da maneira que econômicas do seu estabelecimento ou
julgarem mais conveniente” (DORE, 1988, p. 76). empreendimento; tenha renda familiar
Este, embora detentor dos meios de produção, predominantemente originada de atividades
dentro das relações classistas possui um papel econômicas vinculadas ao próprio
político e um modo de vida diferenciados nas estabelecimento ou empreendimento; dirija seu
relações sociais de produção (BOTTOMORE, estabelecimento ou empreendimento com sua
1988), notadamente no Brasil após a política família” (PICOLOTTO, 2014, p. 77). Inclui ainda
migratória instituída no período imperial. No silvicultores, aqüicultores, extrativistas
Brasil, a Lei da Agricultura Familiar (Lei n. artesanais rurais, pescadores, indígenas e
11.326/2006), concepção conjuntural possível e quilombolas.
resultante do embate das forças sociais
[ 11 ]
A cidade não conta o seu passado, ela o contém como as linhas da mão,
escrito nos ângulos das ruas, nas grades das janelas, nos corrimãos das
escadas, nas antenas dos pára-raios, nos mastros das bandeiras, cada
segmento riscado por arranhões, serradelas, entalhes, esfoladuras.

Italo Calvino, 2002


A Viagem Formativa
Capítulo I

IDENTIDADE POMERANA
Uma viagem formativa desvelando conflitos soterrados
2018
A Viagem Formativa

Você gosta de viajar? O que acha de mesmo tempo, o elemento definidor, o


percorrer um novo trajeto, mesmo em processo e o resultado da cultura”
um local aparentemente conhecido? (SUAREZ, 2005, p. 193). Por isso, ela o
Surpreender-se, ainda que pisando no compreende como formação cultural.
solo batido de seu cotidiano? É possível? Além disso, a autora mostra que uma das
Sim, é possível. Prepare-se, pois este é figuras históricas associadas a essa
um convite para iniciar uma viagem. formação foi a experiência da viagem.

O presente material apresenta-se como Berman (1984 apud SUAREZ, 2005) diz
uma viagem formativa, representada na que, para F. Schlegel, a lei da viagem é a
concepção da Bildung: da alteridade, isto é, o outro como chave
de apreensão de si. A formação cultural
O projeto da Bildung, de acordo com os
pensadores frankfurtianos, é realizar a traduz um aventurar-se de encontro com
meta da humanidade, qual seja, o pleno
desenvolvimento do indivíduo (em sua a alteridade; ao experimentar o diverso
totalidade). De acordo com a concepção
adorniana (1996), a Bildung não deveria
de si, o viajante tem a chance de voltar e
ser reduzida a uma simples educação no decifrar-se melhor, de modo mais pleno
sentido da padronização, da socialização,
elementos incompatíveis com a (SUAREZ, 2005).
autonomia, a experiência, a
emancipação. A Bildung, como
apropriação subjetiva da cultura, diz o Para o propósito deste estudo, orientar a
autor, só se legitima como exercício
crítico e autocrítico, de caráter elaboração do material educativo como
emancipador, indo além da
semiformação (ADORNO, 1996 apud
uma “viagem formativa” representa
MANFRÉ, 2009). propor uma experiência de sair de si, do
A partir dessa orientação, propõe-se, que existe de mais familiar, e visitar o
nesse e-book, uma incursão na cidade de outro, aquilo que é extraordinário, fora
Santa Maria de Jetibá na forma de uma do lugar comum do viver de cada
“viagem formativa”. Ao discutir o termo individualidade. Nesse sentido, adota-se
alemão Bildung, Suarez (2005) observa a compreensão de que
que ele se impõe a partir da segunda
A ‘grande viagem’ que caracteriza a
metade do século XVIII com um caráter Bildung não consiste em ir a um lugar
qualquer, não importa aonde, mas, sim, lá
bastante dinâmico, “[...] exprimindo, ao onde nos possamos formar e educar
(SUAREZ, 2005, p. 195).

[ 14 ]
No caso específico, a viagem formativa se estereotipado e plastificado como
opõe à redução da cultura a um produto produto turístico ou o que é identidade
mercadológico que engessa a identidade historicamente constituída pelo povo
pomerana ou a homogeneíza. pomerano.

Trata-se de lançar-se sobre esse Para tanto, sugere-se que a atual


território (Figura 1) da cultura do povo identidade pomerana não pode
pomerano de fato e sobre o que a cidade prescindir da referência de classes
pode externar ou silenciar, os conflitos sociais.2
latentes ou soterrados, o que está sendo

Figura 1- Mapa político do município de Santa Maria de Jetibá - ES

Fonte: Google (2018). Disponível em: <encurtador.com.br/cfrGS>. Acesso em: 01 dez. 2018.

2 A compreensão de classe adotada referencia-se detentores de tais meios e possuidores apenas da


na tradição marxista inaugurada a partir das força de trabalho (classe trabalhadora operária e
obras de Marx e Engels. Seu uso neste trabalho camponesa). A tradição marxista, embora tenha
remete à sociedade capitalista ocidental, um complexo debate sobre esta questão, também
especialmente do século XIX em diante. Vale-se reconhece outras gradações na estrutura de
da concepção básica da divisão social em dois classes da sociedade burguesa, camadas
grupos principais de interesses antagônicos: a) os intermediárias ou de transição, amplas e
proprietários dos meios de produção e do capital diversas, como a classe média e o campesinato
(classe burguesa e os donos de terras); e b) os não (BOTTOMORE, 1988).
[ 15 ]
Aos primeiros, a morte.

Aos segundos, a miséria/sofrimento.

Aos últimos (terceiros), o pão.3

3Ditado popular pomerano que expressa a dificuldade de cada geração. Em pomerano: “For dai airste de
dood. For dai twaite dai nood. For dai drüre dat brood” (TRESSMANN, 2005, p. 74).
Santa Maria de Jetibá

Foto 1- Visão panorâmica de Santa Maria de Jetibá [196-?].


Santa Maria de Jetibá4 é um
município localizado na
região central serrana do
Espírito Santo (ES), de clima
tropical de altitude,
característico pela forte
presença de descendentes
de imigrantes pomeranos,5
que chegaram neste
território a partir da
segunda metade do século
XIX.6 Fonte: Acervo particular de Helmar Potratz.

No início do século XXI, desenvolve-se a


Estabeleceram-se pela prática
grafia pomerana, o uso da língua e escrita
predominante da agricultura familiar,
na rede pública de ensino e a
mantendo a oralidade cotidiana da língua
cooficialização destas em lei municipal.
pomerana (especialmente o bilinguismo
pomerano/português).

4 Quando distrito do município de Cachoeiro de Brasil. O termo povo tradicional pomerano ou


Santa Leopoldina (antigo Porto Cachoeiro de povo pomerano é utilizado para se referir aos
Santa Leopoldina e atual Santa Leopoldina), esta descendentes de pomeranos como grupo,
região era nominada de Jequitibá. Pelo decreto- conforme reconhecimento a partir dos Decretos
lei estadual nº 15177 (31/12/1943), Jequitibá é Presidenciais nº 6.040/2007 (institui a Política
alterada para Jetibá. Pela lei estadual nº 4067 Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos
(06/05/1988), Jetibá torna-se o Santa Maria de Povos e Comunidades Tradicionais) e nº
Jetibá (IBGE, [19--?]). 8.750/2016 (institui o Conselho Nacional dos
Povos e Comunidades Tradicionais).
5 Adota-se, neste estudo, o mesmo critério
estabelecido na dissertação de Sintia Bausen 6“[...] Na época em que os primeiros pomeranos
Kuster (2015, p.39) para as terminologias: imigraram para o ES, em 1859, a Pomerânia era
pomeranos, descendentes de pomeranos e povo uma Província da Prússia (Prussien). A Província
tradicional pomerano. Assim, o termo pomeranos Prussiana da Pomerânia surgiu em 1817. A antiga
é utilizado para identificar o grupo de imigrantes Pomerânia ou Pomerânia Oriental situava-se nas
europeus, falantes da língua pomerana, que veio costas do mar Báltico, entre as atuais Alemanha e
para o Brasil a partir do séc. XIX. Já descendentes Polônia e os países escandinavos” (TRESSMANN,
de pomeranos refere-se às pessoas de hoje, com 2006, p. 365).
ancestralidade pomerana e que nasceram no
[ 17 ]
Foto 2 – Estrutura de madeira em casa de enxaimel no Espírito Santo

Fonte: Ervin Kerckhoff ([19--]).


Disponível em: <https://secult.es.gov.br/bpes-lanca-livro-de-fotografia-sobre-a-saga-p-2>. Acesso em 24 jul. 2018.

Em Santa Maria de Jetibá, as regiões institucionalizados pela Igreja Luterana.


citadinas e camponesas estão O comércio veio do contato com outros
entrelaçadas por situações que grupos da região. O isolamento inicial da
fomentam o trânsito entre si (comércio, comunidade pomerana se quebra em
casamentos, festa da colheita, função dessa relação externa. Isso
celebrações religiosas etc.), sendo que a também gera a diversificação social do
maioria integra o campo, com um modo trabalho para além da agricultura.
de vida rural.7 Contudo, desde a chegada
Um certo viés industrial passa a ser
dos imigrantes pomeranos, o município
assumido progressivamente em Santa
tem passado por modificações diversas.
Maria de Jetibá a partir do
A preocupação principal dos primeiros desenvolvimento da avicultura que, em
colonos foi a própria sobrevivência. A especial na década de 2000, adquire uma
vida era basicamente rural e se afirmava face de agronegócio mais vigorosa. Trata-
com auxílio dos rituais religiosos, se da inserção nacional do município no

7 O censo demográfico de 2010 mostra que


65,48% da população de Santa Maria de Jetibá
reside no campo (BRASIL, 2010).
[ 18 ]
capitalismo brasileiro. Essa dinâmica Concomitante, há também resistências a
ocorre gradativamente no contexto do esse processo por meio de práticas da
grande movimento da Revolução Verde,8 agricultura sustentável, com a
iniciada na década de 1950, quando valorização do plantio a partir de
ocorre o uso massivo de agrotóxicos no sementes crioulas (não são
processo produtivo de alimentos9 geneticamente modificadas) e técnicas
(BRASIL, 2017). que não se utilizam de produtos tóxicos.
Nesse caso, onde Santa Maria de Jetibá
Figura 2 – Automatização: auge da avicultura em
Santa Maria de Jetibá também é referência, o esforço é
recuperar conhecimentos tradicionais de
plantio e produção a partir da herança
dos antepassados.

Desde a vinda dos primeiros imigrantes


até o tempo atual, a diversificação social
do trabalho engendrou não apenas a
alteração do modo de vida, como também
o surgimento de grupos diversos com
lugares distintos na produção e no
usufruto da riqueza produzida.

O próprio território do município passou


a ser atravessado por esses conflitos, por
vezes ocultos, como será tratado adiante.

Fonte: Santa... (2018).10

8 Revolução Verde é um processo de escala deixou um legado de danos ambientais, exagero


mundial que marca a passagem da agricultura no uso dos agrotóxicos e modelos de produção
tradicional para a agricultura intensiva em que estão se esgotando” (AZEVEDO, 2014).
insumos (agricultura moderna ou convencional),
caracterizado pela “[...] utilização de uma 9 Segundo o Censo Agropecuário 2017
tecnologia baseada no uso de sementes de alta (resultados preliminares), em Santa Maria de
produtividade, agroquímicos e Jetibá há 3.817 estabelecimentos que utilizam
motomecanização” (BIANCHINI; MEDAETS, agrotóxicos e 1.208 que não utilizam (BRASIL,
2013, p. 2). Para Balsan (2006 apud NUNES, 2017).
PINTO, 2009), as modificações não se restringem
à produção, mas afetam igualmente a vida das 10SANTA Maria é o maior produtor de ovos do
populações rurais, desde alterações ambientais, País. A Tribuna, Vitória, ano LXXX, 28 set. 2018.
econômicas e até sociais. “A Revolução Verde Economia, p. 22.
[ 19 ]
Poucos de nós temos em mente que o passado é um direito do ser
humano. Pensamos em passado como algo a ser lembrado ou esquecido,
mas não lhe damos o valor devido de identidade cultural

Corona, 2012
O Baú de Viagem
Capítulo II

IDENTIDADE POMERANA
Uma viagem formativa desvelando conflitos soterrados
2018
O baú de viagem

Esta viagem formativa inicia-se antes de (2015), Márcia Cristina Bergamin


sua partida. O destino final compõe uma (2015), Síntia Bausen Kuster (2015),
parcela da trajetória. Ao vivenciar o Edineia Koeler (2016) e Lucilene Buss
caminho, com suas descobertas e (2018).
contratempos, compartilhando o
Outrossim, recorreu-se pontualmente a
percurso com novos sujeitos
outras obras, que estão dispostas em
(formadores em formação),
seus respectivos tópicos. Igualmente,
compreende-se que o saber é resultante
delimitou-se o referencial teórico e
de uma dinâmica processual. Assim,
conceitual, destacando as categorias:
preparar-se para a viagem é um ato que
já é parte dela própria.  Campo e Cidade, Rural e Urbano;
 Educação na Cidade;
Conhecer previamente o caminho a ser
 Cultura e Identidade;
percorrido exige um diálogo com quem
 Enxaimel e o neo-enxaimel;
passou por ele ou próximo a ele. Trata-se
de fazer escolhas, organizar a bagagem  Re-germanização;

(material e imaterial), selecionando o  Re-pomeranização.

que vai levar, observando o que pode ser


Após arrumar o baú de viagem, segue a
útil nesta jornada. É a intensa experiência
experiência de desvelar o território
de buscar as fontes e as referências
cultural de Santa Maria de Jetibá.
teóricas de uma pesquisa.
Foto 3- Baú Pomerano.
Neste andamento, após criterioso
levantamento, optou-se por fundamentar
este estudo, principalmente, nas
pesquisas de Ismael Tressmann (2005),
Carmo Thum (2009), Adriana Vieira
Guedes Hartuwig (2011), Bianca
Aparecida Corona (2012), Mauricio Fonte: Acervo do Museu da Igreja Luterana (IECLB),
Sede, Santa Maria de Jetibá.
Biscaia Veiga (2013), Adriele Schmidt Foto: Swami C. Bérgamo, 2017

[ 22 ]
Campo e Cidade, Rural e Urbano

Há diversos critérios conceituais sobre


a) cidade e campo: como
esses termos. Porém, delimita-se aqui
território, materialidade,
que “[...] cidade e urbano são conceitos
meio e espaço
distintos, assim como campo e rural
construídos/modificados;
também o são” (NUNES; PINTO, 2009,
b) urbano e rural: como
n.p.). Mas, qual seria a distinção
modos de vida, relações
conceitual essencial entre estas
sociais, formas abstratas;
categorias? Nunes e Pinto (2009, n.p.,
que vão além das fronteiras
grifo nosso), apresentam:
da cidade e, inversamente,

[...] o rural e o urbano como modos de


das balizas do campo.
vida, como conceitos relacionais que
contemplam cultura, costumes e
hábitos, e assim vão além do Dentro de um processo dialético, tais
território, da materialidade.
categorias são decorrentes do
Talaska, Silveira e Etges (2014, n.p., grifo
desenvolvimento histórico da sociedade,
nosso), no mesmo sentido, concluem:
que, por sua vez, é conexo ao modo de
Essas abordagens teóricas indicam a produção hegemônico, mediado pela
apreensão de que pode-se conceber
cidade-campo e urbano-rural como divisão técnica e social do trabalho,
categorias diferenciadas [...]. As
primeiras, campo e cidade, entendidas
materializado pelo trabalho, em uma
enquanto materialidade, meio, relação espaço-tempo.
condição e produto da sociedade,
espaços construídos/modificados que
manifestam em seus conteúdos os Isto posto, toca ressaltar que, como
processos contraditórios de
desenvolvimento histórico da sociedade. condição e produto da sociedade, o
E as segundas, o urbano e o rural,
compreendidas enquanto relações vínculo cidade-campo (espaço) e urbano-
sociais, ou seja, formas abstratas,
também condição e produto do rural (modo de vida) se relacionam em
desenvolvimento histórico da sociedade, um processo histórico e dialético (vivo,
mas que extrapolam os limites
morfológicos da cidade e, no sentido em constante transformação, não
inverso, os limites do campo.
definitivo). Portanto, é fundamental
Em suma, ambas pesquisas
pensar dialeticamente, vendo que o
compreendem tais categorias assim:
urbano e o rural passam pela lógica
contínua da afirmação (tese), negação
[ 23 ]
(antítese) e negação da negação (síntese) Estes simbolismos são muito potentes,
(TALASKA; SILVEIRA; ETGES, 2014). cristalizam-se e generalizam-se em
atitudes emocionais poderosas que
Dessa forma, o espaço geográfico não só
se transforma e se configura em campo perpetuam no tempo e no espaço,
ou cidade, mas mantém traços que não
são simplesmente puros de um ou de perpassando gerações. Apresentam-se
outro. Assim, no interior das relações
urbanas ou rurais existem forças que se
no senso comum em simplificações
embatem, pois mantém características divididas em associações positivas e
de polos opostos. Estas forças tendem
para a afirmação e para a negação de negativas das representações sociais de
características urbanas e rurais
(TALASKA; SILVEIRA; ETGES, 2014, n.p., campo e cidade (WILLIAMS, 2011, p. 11):
grifo nosso).

Cabe ainda abordar as representações


a) campo: forma natural de
sociais das categorias campo-cidade e
vida – de paz, inocência e
rural-urbano. Ou seja, são os conceitos
virtudes simples (positivo);
construídos socialmente, a visão da lugar do atraso, ignorância e
sociedade. Na conceituação entre campo limitações (negativo);
e cidade, ressalta-se a importância de se
b) cidade: centro de
levar em consideração as representações realizações – de saber,
que cada uma dessas morfologias comunicação e luz
espaciais possui no imaginário social. (positivo); lugar do barulho,
Não para adotá-las, mas entende-las no mundanidade e ambição
seu uso comum ou ideológico. Para (negativo).

Lefebvre (2011, p.36-37, grifo nosso),


estas não estão desassociadas de sua Com as transformações históricas da
materialidade histórica, em especial da divisão técnica e social do trabalho e dos
divisão social do trabalho: meios de produção, sendo tais inovações
engendradas e absorvidas amplamente
A divisão social do trabalho entre a
cidade e o campo corresponde à pela cidade, ampliou-se o hiato entre
separação entre trabalho material e o
trabalho intelectual, e por conseguinte campo e cidade. Assim, forma-se mais
entre natural e o espiritual. A cidade
incumbe o trabalho intelectual: funções distinção (NUNES; PINTO, 2009):
de organização e de direção, atividades
políticas e militares, elaboração do
conhecimento teórico (filosofia e
ciências). [...] O campo, ao mesmo tempo a) campo: associado ao
realidade prática e representação, vai passado (retrocesso);
trazer as imagens da natureza, do ser, do
original. A cidade vai trazer as imagens
do esforço, da vontade, da subjetividade,
b) cidade: visão de futuro
da reflexão, sem que essas (progresso).
representações se alastrem de atividades
reais. Dessas imagens confrontadas irão
nascer grandes simbolismos.

[ 24 ]
Educação na Cidade

Para Chisté e Sgarbi (2015, p. 110), Junto a esta concepção, em consonância


Educação na Cidade se apresenta com pensadores como Dermeval Saviani
e Paulo Freire, a proposta da Educação na
“[...] como sendo aquela Cidade compreende que não há
que promove a neutralidade no ato de educar e de ler o
humanização, o
empoderamento e a mundo, sendo assim uma opção político-
construção da ideológica, uma escolha. Até a omissão ou
cidadania plena que
visa à transformação uma dita “neutralidade”, são posições
social”. políticas, que, em geral, favorecem o
status quo.
Ao compor tal definição, os autores,
Não existe olhar neutro do mundo que
optam em seguir um caminho diverso ao nos cerca. Todo processo pedagógico
da mercantilização da educação, que é está repleto de aspectos ideológicos,
políticos e culturais [...] (VASCONCELOS;
motivada pelos interesses corporativos CHISTÉ, 2018, p. 55).

empresariais (maximização do lucro, Como diz Freire,


novos mercados e propagação da
[...] a leitura crítica de mundo se funda
ideologia liberal) e segue a lógica da numa prática educativa crescentemente
desocultadora de verdades. Verdades
reprodução da sociedade capitalista.
cuja ocultação interessa às classes
Assim, a Educação na Cidade objetiva dominantes da sociedade (FREIRE, 2007
apud CHISTÉ; SGARBI, 2015).
proporcionar uma visão crítica e
Ou, como expõe Saviani, abalizado em
emancipatória do estudante perante o
Gramsci, que cabe
mundo do trabalho e no exercício de sua
cidadania. [...] entender a educação como um
instrumento de luta. Luta para
estabelecer uma nova relação
Tal perspectiva se materializa quando a
hegemônica que permita construir um
Educação é entendida como atividade na
novo bloco histórico sob a direção da
qual educadores e educandos,
classe fundamental dominada da
mediatizados pela realidade, aprendem e
sociedade capitalista – o proletário [...]
extraem dela o conteúdo da
(SAVIANI, 2013 apud BATILANI, 2015, p.
aprendizagem, atingindo um nível de
72).
consciência elevado, capaz de
impulsioná-los a atuar na realidade
visando à transformação social (CHISTÉ; Em outras palavras, em uma concepção
SGARBI, 2015, s.p.).
desveladora de verdades ocultadas e

[ 25 ]
conflitos soterrados, a educação escolar O processo de intencionalidade e
pode ser construída como um sistematização, no qual o educador é
instrumento de luta contra-hegemônica, fundamental, na proposta da Educação
mas a favor das classes populares e de na Cidade, segundo Vasconcelos e Chisté
sua emancipação. (2018, p. 50), deve se ater
preliminarmente a algumas questões,
Nesse sentido, compreendemos que
educar na cidade pressupõe o como segue:
desvelamento de seus espaços, muitas
vezes configurados para reproduzir a
sociedade desigual em que vivemos.
Essas contradições precisam ser • Qual potencial
reveladas por meio de uma educação que transformador tem a
empodere os sujeitos e os impulsionem cidade?
a, coletivamente, criar meios de
transformar as condições de exploração • Que locais podem
em que estão hodiernamente problematizar o que
submetidos. (VASCONCELOS; CHISTÉ, está posto?
2018, p. 46).
• Que estratégias podem
Assim, o seu diálogo com a cidade, como ser pensadas nesses
espaços que contribuam
intencionalidade educativa, pressupõe com a problematização
que da realidade?
• Como pode a cidade
[...] Educação em seu sentido amplo contribuir com o
depreende processos de apropriação de processo de
conhecimentos diversos e pode ser
efetivada em variados locais. Assim,
humanização dos
consideramos que é possível educar em sujeitos?
diferentes espaços, sejam eles a escola, a
• Que lugares da cidade
rua, o museu, os monumentos históricos,
os prédios, as pinturas dos muros, os podem contribuir com o
parques ecológicos, as praças, as processo de
instituições bancárias, os postos de humanização?
saúde, os hospitais, os centros
comunitários, o comércio em geral, a • Como planejar a visita
igreja, etc. Basta para isso termos a a esses espaços?
intenção e condições objetivas para fazê-
lo (VASCONCELOS; CHISTÉ, 2018, p. 49- • Como dar
50). continuidade as
reflexões iniciadas na
Deste modo, cabe ao educador visita no espaço escolar?
desenvolver e estabelecer este olhar
sensível como uma opção político- Tal problematização revela a relação
pedagógica. Antes de tudo, cidade e educação a ser estabelecida.
Assim, a Educação na Cidade não propõe
[...] o educador deve contemplar a cidade,
pensar a cidade, extrair de cada espaço a tutela política do Poder Público para
dela as lições que possam dar mais vida
às pessoas, humanizar os cidadãos. Essas sua implementação. Ou seja, sua prática
são algumas chaves de leitura da cidade
e de seus espaços (CHISTÉ; SGARBI, está na postura (olhar) do professor e da
2015, p. 105).
professora ou da escola, através de seu
Projeto Político Pedagógico (PPP).

[ 26 ]
A proposta de Educação na Cidade, por oferecer, as reflexões possíveis de serem
exemplo, não exige que a Municipalidade levantadas diante da realidade
ou o Estado assine uma carta de historicamente constituída no espaço.
intenções formais para ser realizada. Portanto, trata-se de ver e extrair tudo o
que for capaz de instigar percepções e
A Educação na Cidade,11
inspirar transformações.
metaforicamente, pode ser vista como
um movimento de guerrilha, usando as É nesse horizonte que perpassam as
brechas do território para lançar análises sobre a identidade pomerana em
“ataques pontuais” e constantes, latentes Santa Maria de Jetibá e elabora-se a
de intencionalidade e sistematização, viagem formativa ao “visitar” as
com ações educativas contra- construções nela presentes, seja no
hegemônicas. campo ou na cidade.

Assim, torna-se um desafio desvelar o


potencial educativo que a cidade pode

11“A expressão Educação na Cidade é aquela que CNPq, reúne-se no Ifes (campus Vitória) e visa: 1)
se aproxima mais efetivamente da proposta do discutir as relações entre a cidade e a educação a
Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Educação na partir de áreas do conhecimento relacionadas
Cidade (GEPECH)”, conforme evidencia Eliana com as humanidades; 2) planejar, executar e
Kuster no prefácio do livro Educação na Cidade: avaliar formações de professores da educação
conceitos, reflexões e diálogos (MARTINELLI básica que contribuam com reflexões sobre os
FILHO; CÔCO; CHISTÉ; DELLA FONTE, 2018, espaços da cidade; 3) sistematizar materiais
p.13); obra resultante do trabalho deste grupo. O educativos que discutam e apresentem propostas
GEPECH, que integra uma das linhas pesquisa do educativas relacionadas com a cidade (GEPECH,
grupo “Artes Visuais, Literatura, Ciências e acesso em 26 jul. 2018).
Matemática: diálogos possíveis” cadastrado no
[ 27 ]
Cultura e Identidade

Em geral, na atualidade, o tema da Nesta perspectiva, Wood (1996, p.126)


identidade é visto sob um olhar alerta especialmente para a percepção de
culturalista, muito característico do que que
Ellen Wood (1996; 1999) chama de
agenda pós-moderna. Segundo Wood “[...] o capitalismo está
(1999, p.15), o pós-moderno rejeita a se tornando tão
universal, tão garantido,
ideia de processo e causalidade histórica que passa a ser
inteligível, expressa como princípios a invisível”.

ênfase na natureza fragmentada do


mundo e a impossibilidade de uma Igualmente, Ahmad (1999) ressalta que é

política emancipadora na visão preciso estar atento para não cair neste

“totalizante”, ou seja, apresenta um campo movediço. Apresentando a crítica

“ceticismo epistemológico e um aos Estudos Culturais, observa:

derrotismo político profundos”. Não podemos simplesmente incluir um


Entretanto, por outro lado, há processos pouco de economia aqui, um tanto de
tecnologia acolá. Temos que ser capazes
importantes tangidos por este de localizar fatos isolados em um
processo histórico complexo, e para isso
(identidades, opressões, poderes, precisamos de um considerável preparo
teórico. Nos seus primórdios, os autores
política ambientalista, discursos, dos estudos culturais estavam
plenamente conscientes de tudo isso, e
linguagem e cultura) que necessitam de alguns procuraram permanecer fiéis a
uma abordagem materialista: tais origens, aliás bastante prosaicas. No
todo, porém, os estudos culturais
transformaram-se em um dos muitos
Não é preciso aceitar os pressupostos estilos do capitalismo de consumo que
pós-modernos para enxergar todas essas eles se propunham a estudar (AHMAD,
coisas. […] Não há, com efeito, melhor 1999, p. 107-108).
confirmação do materialismo histórico
que o vínculo entre cultura pós-moderna Tais observações retomam um dos
e um capitalismo global segmentado,
consumista e móvel. Nem tampouco uma desafios aqui propostos: desvelar o olhar
abordagem materialista significa que
temos que desvalorizar ou denegrir as sobre a cultura e a identidade do povo
dimensões culturais da experiência
humana. Uma compreensão materialista
tradicional pomerano para além dos
constitui, ao contrário, passo essencial mecanismos de sua mercantilização
para liberar a cultura dos grilhões da
mercantilização (WOOD, 1996, p. 125). estereotipada ou estratificada em um
passado nostálgico idealizado. Ou seja,

[ 28 ]
precisa observar a contextualização Enquanto os demais animais são aquilo
histórica, as relações materiais de que são programados biologicamente a
manutenção e reprodução da vida dos serem, o que o ser humano é depende do
sujeitos desta localidade, em sua seu viver, do que ele produz para
condição singular e, ao mesmo tempo, satisfazer suas variadas necessidades e
vinculada a universalidade humana. de como produz, isto é, de todas as
relações que estabelece para realizar
Em sua forma geral, a identidade remete
essa produção (relação com a natureza,
para aquilo que dá distinção a uma
com outros seres humanos, com os
situação, a uma coisa, a uma instituição, a
instrumentos de trabalho, com o produto
uma pessoa ou grupo a ponto de
do trabalho etc.).
individualizá-los. Ao aprofundar essa
indicação, percebe-se que a identidade Sob essa lógica, a identidade remete à
remete para o que faz com que algo ou essa estrutura econômica. Aqui, porém,
alguém seja o que é. Por isso, vincula-se cabe seguir a observação de Karel Kosik:
ao debate da essência, ao elemento estrutura econômica não significa fator
nuclear que caracteriza o ser das coisas. econômico. Enquanto este remete para o
mundo limitado da propriedade, da
Longe de toda uma tradição que define a
renda e do dinheiro ou da posse, aquele
identidade de modo estático e
tem um sentido ontológico e aponta para
apriorístico, sugere-se pensar a
o “[...] homem no processo de produção e
identidade de um grupo humano a partir
reprodução da própria vida social”
de algumas contribuições marxistas. N’A
(KOSIK, 1995, p. 116).
ideologia alemã, Marx e Engels (2007)
insistem que viver é produzir as O processo de produzir e reproduzir a
condições e os meios para existir. Por sua vida e, assim, criar a sua identidade
isso, o modo como os seres humanos pessoal e coletiva tem como centro o
produzem esses meios não pode ser visto trabalho, ação tipicamente humana. Em
apenas como reprodução da sua contraste com o sentido corriqueiro de
existência física, mas como manifestação emprego ou profissão, o trabalho como
de suas vidas e, portanto, do que eles são categoria marxista diz respeito ao
em um dado momento:
“[...] processo de que participa o homem
e a natureza, processo em que o ser
Tal como os indivíduos exteriorizam sua humano, com sua própria ação,
vida, assim são eles. O que eles são impulsiona, regula e controla seu
coincide, pois, com sua produção, tanto intercâmbio material com a natureza. [...]
com o que produzem como também com Atuando assim sobre a natureza externa
o modo como produzem. O que os e modificando-a, ao mesmo tempo
indivíduos são, portanto, depende das modifica sua própria natureza” (MARX,
condições materiais de sua produção 1985, p. 211).
(MARX; ENGELS, 2007, p. 87).

[ 29 ]
O trabalho envolve uma dupla relação: O mundo humano ou cultural consiste no
conjunto das produções materiais e
com a natureza e com outro humano, pois simbólicas criadas pelo ser humano em
decorrência do seu trabalho. Nesse caso,
não se transforma a natureza o ser humano se coloca naquilo que ele
produz, isto é, ele se objetiva, coloca o
isoladamente. seu ser no produto. Portanto, toda
produção cultural traz a marca do
Nas Teses contra Feuerbach, Marx humano, materializa o nosso modo de
existir em um determinado momento, o
considera que a essência humana não é que produzimos e como produzimos
nossa vida (DELLA FONTE, 2018, p. 49).
abstrata nem está no indivíduo único.
A depender das relações sociais a riqueza
Nas suas palavras, “Em sua efetividade é
cultural produzida pode ser acessada por
o conjunto das relações sociais” (MARX,
todos ou destinada a determinados
1987, p. 162). Com essa afirmação, Marx
grupos. Em uma sociedade desigual, a
demarca que o ser do humano não é dado
classe social indica o lugar a partir do
antes do seu viver.
qual se produz a vida, se acessa o
Por seu turno, esse viver remete ao patrimônio cultural e se tem consciência
encontro do humano com duas desse processo.
alteridades: a natureza e o outro ser
A existência de classes sociais expressa
humano. Além disso, vincular o ser do
uma sociedade em conflito. Não se trata
humano ao conjunto das relações sociais
aqui de apontar costumes, modos
indica o caráter histórico do fazer-se
distintos de experimentar a sexualidade,
humano. O que é o ser humano é o que ele
modos diversificados de se vestir ou de
tem feito de si, o que e como tem
se alimentar, enfim, de formas de existir
construído o seu viver ao longo do tempo
distintas, mas que podem conviver,
ou durante um mesmo momento
complementar-se, enriquecer-se. A
histórico.
existência de classes sociais fala de
Nesse sentido, a identidade humana é contradições antagônicas:
dada por uma diversidade de modos de
[...] sociedades em que vigoram a
se tornar humano. Em outros termos, a propriedade privada fazem emergir
grupos cuja multiplicidade não
identidade é o que traz a singularidade de impulsiona o desenvolvimento
um grupo, em um determinado compartilhado. Aqui a diferença se torna
sinônimo de desigualdade. O diverso se
momento, ao produzir a vida (o modo de transforma no desigual, no
irreconciliável. Dessa maneira, instaura-
produção da vida), se relacionando com a se uma contradição antagônica entre
classes sociais. Entre elas, existe o
universalidade da humanidade em seu confronto e a incompatibilidade, pois,
para que uma possa se desenvolver, a
conjunto. outra precisa ser explorada. À riqueza de
uma corresponde a vida miserável da
Chama-se patrimônio cultural tudo o que outra (DELLA FONTE, 2016, p. 218).

é resultado do trabalho. Desse modo,

[ 30 ]
Dessas considerações, podemos extrair Para superá-las, estabeleceram relações
alguns desdobramentos para este mais horizontais entre si a partir do
estudo: contexto rural (SCHMIDT, 2015, p. 31).
No decorrer da história, o povo

A identidade pomerana diz


pomerano com seus traços culturais mais

respeito aos modos de ser na homogêneos sofre uma diversificação


produção material e simbólica nas suas atividades produtivas
da existência do povo tradicional (BERGAMIN, 2015).
pomerano, desde sua chegada ao
O desafio de discutir a identidade
Brasil e às terras capixabas até a
atualidade. pomerana na atualidade é perceber que
se, por um lado, algumas marcas
Considerando o caráter histórico
culturais se mantiveram e ainda dão
do viver do povo pomerano, essa
identidade tem se transformado coesão a esse grupo, por outro, a

ao longo do tempo. identidade de classe pode ter sido


alterada.

Ao chegarem ao Espírito Santo, os A possibilidade de fazer essa análise pela


pomeranos ocupam um lugar social arquitetura pomerana parte do suposto
muito específico. Originalmente, tinham de que, como produtos do trabalho
profissões distintas, predominando a humano, essas construções trazem a
ocupação de agricultor.12 Contudo, ao marca identitária do viver do povo
chegarem em solo brasileiro, pomerano em determinados momentos
enfrentaram dificuldades em comum. em seus conflitos.

12 “As levas de imigrantes, após 1871, eram empresas, estavam destacados alguns pré-
provenientes de ações dos ‘armadores’, que requisitos. Entre eles, que os imigrantes fossem
constituíram empresas de imigração. [...] No agricultores (tolerava-se apenas 10% de não-
contrato firmado entre o governo provincial e as agricultores)” (THUM, 2009, p. 123).
[ 31 ]
Enxaimel e o Neo-enxaimel

Para compreender o processo de É fundamental ressaltar que o enxaimel é


reinvenção da cultura germânica por uma técnica e não um estilo (VEIGA,
meio da arquitetura, é importante saber 2013; GISLON, 2013; WITTMANN, 2016).
sobre o enxaimel e o neo-enxaimel. Pois, erroneamente, é comum esse tipo
Angelina Wittmann, mestre em de associação, sobretudo à cultura
Urbanismo, História e Arquitetura das germânica, surgindo expressões como
Cidades pela Universidade Federal de “estilo alemão”, “estilo germânico” (como
Santa Catariana (UFSC), possibilita uma na Lei n.º 270/1995, de Santa Maria de
compreensão técnica e historicamente Jetibá-ES), “estilo dos Alpes”, “estilo
contextualizada do conceito do gótico”, “estilo colonial”, “estilo
enxaimel: enxaimel”, dentre outras.

O método construtivo enxaimel é a No Brasil, esta relação deve-se ao fato de


denominação dada à estrutura de
madeira, que articulada horizontal, que esta técnica veio com os imigrantes
vertical e inclinada formam um conjunto
rígido e acabado através do encaixe dos (especialmente alemães)13 a partir do
caibros de madeira. Somente. É o
conceito atual e pode mudar de acordo
século XIX, sendo utilizada em algumas
com o recorte do período histórico, ou regiões do Brasil (Espírito Santo, Santa
mesmo de acordo com o conceito do
termo alemão – Fachwerk. Catarina e Rio Grande do Sul), com
Fachwerk significa textualmente
“treliça” – espaço de uma parede feita a caracterizações próprias em cada Estado,
partir da estrutura de caibros preenchida
com material entrelaçado e dependendo do material de construção
posteriormente preenchido com barro.
[...]
disponível, relevo, condições econômicas
O enxaimel é uma técnica construtiva e dos construtores, proximidade ou não de
não um estilo, como muitos denominam.
Surgiu a partir da construção de outras culturas e centros urbanos:
edificações feitas de toras e troncos de
árvores beneficiados sem a tecnologia “Contudo, não deixam de ser legítimos
das máquinas modernas, mas sim com
machados, enxós, facões feitos, enxaimeis” (WITTMANN, 2016, s.p.).
geralmente, por artesões, ou
agricultores, a partir de uma estrutura de
madeira pronta para suportar grandes
cargas (WITTMANN, 2016, grifo do
autor).

13
Wittmann (2016) não se refere aos pomeranos.
Provavelmente os inclui no grupo de imigrantes
alemães.
[ 32 ]
Outro ponto a destacar, conforme a Por utilizar muita madeira, foi caindo em
contribuição de Wittmann (2016) sobre desuso. Assim, a partir da Baixa Idade
o enxaimel (Fachwerk), refere-se a sua Média, com a escassez de madeira, o
contextualização temporal e regional. A enxaimel (contemporâneo do Blockbau)
arquiteta urbanista observa que esta tornou-se hegemônico, mantendo-se
técnica, em seu princípio rudimentar, é assim até o século XVIII, mesmo
identificada desde o neolítico e está passando por variações (WEIMER, 2005
presente em várias partes do mundo. apud VEIGA, 2013, p. 77).
Mas, o conceito geralmente adotado para
Mesmo na Alemanha medieval, o
os estudos no Brasil refere-se à Idade
enxaimel teve sistemas distintos
Média europeia, quando vigoraram as
dependendo da região. Certamente, não
guildas.14
cabe aqui o aprofundamento técnico, mas
Até a Baixa Idade Média, a técnica de é necessário um registro mínimo para
construção predominante na Europa era uma melhor compreensão da aplicação
o Blockbau, que consistia na do neo-enxaimel no Brasil.
sobreposição de troncos roliços de
Assim, registra-se basicamente três
madeira desbastados em dois lados
sistemas construtivos de enxaimel
opostos e que eram encaixados nas
alemão (WEIMER, 2005 apud VEIGA,
extremidades (Figura 3).
2013):

Figura 3- Casa contemporânea construída com a antiga técnica do Blockbau

Fonte: a) Von Theonly1 (2006); e, b) Von Giacomo1970 (2007).


Blockhaus. Disponível em < https://de.wikipedia.org/wiki/Blockhaus>. Acesso em 17 jul. 2018.

14
As guildas eram corporações de ofício nas edificações somente a madeira (evitava-se cravo,
(associações) formadas por profissionais prego ou parafuso de metal em uma edificação
manufatureiros (alfaiates, sapateiros, pedreiros, Fachwerk). Caso usasse, isto não significaria que
ferreiros, etc.), visando defender seus respectivos deixaria de ser um Fachwerk, mas a “reputação” do
interesses. O seu surgimento está relacionado ao artesão poderia ser abalada, pois os ferreiros
renascimento comercial e urbano ocorrido na Europa pertenciam a outra guilda (WITTMANN, 2016).
durante a Baixa Idade Média. Nesse tempo, era usual
[ 33 ]
a) baixo-saxão (Niedersächsisch), ao norte (Figura 4): provavelmente o mais antigo e o
mais simples dos três sistemas, caracterizado por usar vários esteios, uns próximos dos
outros, sendo as portas e janelas inseridas exatamente no espaço entre estes esteios,
tendo pouca ou nenhuma escora (peças diagonais), de forma que o desenho na fachada da
casa lembra, às vezes, um tabuleiro de xadrez (como nas casas de Goslar);15

Figura 4– Sistema construtivo baixo-saxão e seu uso em casas na cidade de Goslar (Alemanha)

Fonte: a) Weimer (1994 apud VEIGA, 2013, p79); b) Veiga (2013, p.79).

b) alemânico (Alemannisch), no sudeste da atual Alemanha, especialmente na Baviera


(Figura 5): caracterizado pelo grande afastamento dos esteios principais (peças verticais),
exigindo peças horizontais mais robustas e grande quantidade de escoras, formando
desenhos variados com peças inclinadas (Figura 6), como a Cruz de Santo André, a
“mulher suaba” (Schwäbisches Weibel) e o “homem selvagem” (Wilder Mann); e,

Figura 5– Sistema construtivo alemânico e seu uso em cidades do sul da Alemanha

Fonte: a) Weimer (1994 apud VEIGA, 2013, p. 80); b) Veiga (2013, p. 81).

15 Goslar é uma cidade da Alemanha localizada no distrito de Goslar, estado de Baixa Saxônia.
[ 34 ]
Figura 6 - Detalhe e uso em edificação dos encaixes Schübisches Weibel e Wilder Mann

Fonte: a) Weimer (2005 apud VEIGA, 2013, p. 81); e, b) Veiga (2013, p. 81).

c) franco (Frankisch), no sudoeste, incluindo a Alsácia (Figura 7): ocorre uma espécie de
fusão entre os dois sistemas anteriores, com mais escoras e estas podendo ser curvas ou
serem usados vários tipos de inclinações na mesma edificação, com ampla exploração
estética.

Figura 7– Sistema construtivo franco e seu uso na cidade de Strasbourg16 (França)

Fonte: a) Weimer (1994 apud VEIGA, 2013, p. 82); e, b) Veiga (2013, p. 83).

Weimer (2005 apud VEIGA, 2013), ao caracterizar cada um desses tipos de enxaimel,
registra que os imigrantes germânicos que chegaram ao Brasil no século XIX são oriundos
de locais onde era usual o enxaimel baixo-saxão. Assim, sendo este o modo de construir
casas que conheciam, aplicaram esta técnica primeiramente na construção de uma
habitação mais simples, de rápida elaboração. E, posteriormente, em uma casa definitiva.
Em ambas situações, ocorreram adaptações valendo-se dos materiais disponíveis.

16 Strasbourg é uma cidade francesa localizada na fronteira entre França e Alemanha.


[ 35 ]
Por sua vez, Grossmann (2006 apud decorativas (VEIGA, 2013, p. 91). Para a
VEIGA, 2013) registra as alterações inquietação de Weimer (2005 apud
estéticas ocorridas sob influências do VEIGA, 2013), é justamente este
contexto histórico a partir do decadente enxaimel com tijolos que se
ressurgimento comercial e das cidades verifica em larga presença no nordeste
europeias na Baixa Idade Média, catarinense. De fato, no Brasil, há
acompanhando as tendências e diferenças de sua aplicação conforme a
movimentos artísticos (Renascimento, região. Em Santa Catarina, os primeiros
Barroco, Classicismo, Romantismo e imigrantes inicialmente usam o
Historicismo), principalmente nas preenchimento em barro ou taipa,
cidades. Weimer (2005 apud VEIGA, conforme a maioria das casas na
2013) assinala que, com a Revolução Alemanha. Mas, posteriormente,
Industrial e a escassez de madeira, observadas as características do clima,
restringiu-se o emadeiramento e se optou-se por tijolos, tendo a maior parte
adotaram outros meios disponíveis em das casas deixando-os visíveis (VEIGA,
escala maior, como pedra (fundação), 2015, p.97-98). Segundo Weimer (2005
tijolo (preenchimento) e metal foram apud VEIGA, p.98), no Rio Grande do Sul,
empregados. o barro foi mais empregado no
preenchimento dos tramos, sendo o tijolo
Segundo Veiga (2013), a princípio, o
utilizado raríssimas vezes. Além disso, as
enxaimel torna-se obsoleto no século
paredes eram pintadas de branco e as
XIX, mais pela carência de matéria-prima
madeiras mantidas à mostra (VEIGA,
do que pela técnica em si. Ocorreram
2015, p. 98).
adaptações e o seu desuso não foi
uniforme. O uso de tijolos visíveis no Grossmann (2006 apud VEIGA, 2013)
enxaimel europeu marca um momento destaca que, desde o século XVIII, com o
de transição, não sendo um material neoclassismo na Europa, muitas paredes
tradicional na Alemanha, especialmente eram rebocadas ou pintadas por uma
no campo, mas podendo ser encontrado questão estética (esconder a madeira
atualmente exemplares em algumas estrutural do enxaimel). Da segunda
cidades no norte da Alemanha. metade do século XIX até o início do
século XX, com a inspiração do
Também é possível encontrar escassos
movimento romântico, inicia-se um
exemplares que utilizavam o tijolo como
revivalismo do enxaimel (com a madeira
elemento estético, com tonalidades e
exposta), adotado principalmente pela
posições diferentes, imitando a Cruz de
burguesia urbana, como elemento de
Santo André ou outras possibilidades
decoração (estética mais romantizada),

[ 36 ]
com casas construídas em terreno Nesse contexto de re-germanização, o
próprio (em destaque), não mais neo-enxaimel apresenta-se como uma
geminadas em ruas estreitas. Dessa arquitetura artificial que, segundo Veiga
forma, o enxaimel passou a ser visto (2013), imita as formas do antigo
como um elo identitário ao passado enxaimel, mimetizando sua aparência,
medieval longínquo e idealizado. com pouco ou sem qualquer
compromisso com a fidelidade histórica.
Este movimento historicista da
Alemanha pode então ser considerado
uma primeira manifestação de uma Veiga (2013) revela que o neo-enxaimel
arquitetura neo-enxaimel, uma vez que o
enxaimel foi trazido novamente ao recria apenas o resultado visual do que
presente em função de seu valor estético
(VEIGA, 2013, p. 92).
seria a aplicação do enxaimel, sem
qualquer efeito estrutural. Mais que isso,
Assim, Veiga (2013) conclui que o neo-
em muitas situações, cria uma
enxaimel de Santa Catarina (1970-1980)
arquitetura Kitsch17 ou pastiche.18
não foi o primeiro caso que trouxe o
enxaimel como estética para o presente. Trata-se de uma “arquitetura de fachada”
E o que seria o neo-enxaimel? Aceita-se para a produção de uma “identidade de
aqui o entendimento adotado por Veiga fachada”:
(2013) para quem o
Nas cidades re-germanizadas não bastou
transformar o patrimônio autêntico19 em
mero objeto de contemplação ou de
neo-enxaimel está associado ao entretenimento. Foi-se além, criando
uma arquitetura Kitsch por natureza [...].
processo de implementação de O neo-enxaimel, chamado
uma política cultural que utiliza pejorativamente de enxaimelóide ou
enxaimeloso por seus opositores, não
o discurso de resgate da tem compromisso nenhum com a
veracidade histórica e nem se preocupa
identidade e da tradição em preservar ou perpetuar a antiga
germânica, valendo-se da técnica do enxaimel. Seus encaixes de
madeira são apenas de fachada,
arquitetura; porém, Veiga geralmente pregadas nas paredes,
criando um estilo e dando apenas um
evidencia o seu caráter político e efeito visual (VEIGA, 2013, p. 62, grifo do
comercial. autor).

17
Kitsch indica a ideia de uma estética inautêntica ou
de qualidade inferior. Por volta de 1860, o termo 19
Ao utilizar a expressão “patrimônio autêntico”,
original em alemão começou a ser usado no sentido Veiga (2013) refere-se ao patrimônio cultural,
atual. O verbo verkitschen, em alemão, significa notadamente arquitetônico, estabelecido em Santa
“[...] trapacear, receptar, vender alguma coisa no Catarina originalmente pelos imigrantes europeus
lugar do que havia sido combinado” (MOLES, 1975, que chegaram nessa região no século XIX,
p. 10 apud VEIGA, 2013, p. 123). constituído do encontro entre culturas (europeias e
18
brasileira) e a realidade material disponível neste
Pastiche, neste caso, referindo-se ao neo- tempo e lugar.
enxaimel, seria a imitação do efeito visual de uma
técnica construtiva com o intuito de se passar por
autêntico (VEIGA, 2013, p. 124).
[ 37 ]
Sobre a re-germanização20 ocorrida na sociedade local, a burguesia vinculada à
década de 1990 na paisagem urbana do atividade comercial e turística, em
município de Forquilhinha (SC), Gislon consonância com agentes políticos que
(2013) traz registros semelhantes: viabilizam tal propósito por meio de
políticas públicas que promovem uma
Essa imitação é conhecida como estilo
enxaimel (ou popularmente como “falso reinvenção falsa e estereotipada da
enxaimel”, “enxamelóide”, “enxaimel
fake”, “neo enxaimel”). Ela nada mais é cultura, aparentemente sem um
que uma construção em alvenaria
comum, que depois de concluída recebe
compromisso mais apurado com a
um tratamento na fachada para que se história, a cultura, o patrimônio e a
pareça com o sistema de encaixe alemão,
o enxaimel. Esse tratamento, na maioria identidade dos imigrantes e seus
das vezes, consiste em uma simples
pintura em forma de “X”, ou raramente, descendentes; além de desconsiderar
no uso de ripas de madeira aplicadas à
fachada, sem função estrutural. Essas outros sujeitos sociais de origem étnico-
construções são muito criticadas pela
sua artificialidade, tanto entre
cultural não germânica, mas que também
historiadores, quanto entre arquitetos constituem a vida no município.
(GISLON, 2013, p. 25).

Em outras palavras, trata-se da É a sobreposição dos interesses de uma


reconstituição de uma estética e de um classe social e sua expressão política
modo de vida que não existiram na sobre o conjunto da sociedade, valendo-
realidade histórica do cotidiana do se de recursos públicos e da
imigrante e seus descendentes no Brasil. apropriação/distorção da cultura de um
Mas se impõe no presente pelo forte povo. Este é um conflito soterrado que
interesse econômico de uma parcela da deve ser desvelado.

20 Veiga (2013, p. 20) chama de re-germanização população local. Para Veiga, a re-germanização é
esta política cultural revivalista em Santa Catarina, um exemplo de invenção das tradições, conforme
especialmente entre anos 1970-1980, que traz denominou Hobsbawn (1997), “[...] uma vez que
determinadas características estéticas alusivas a uma certas características culturais, apresentadas como
ideia de germanidade ao presente. Porém, esta algo contínuo, foram forjadas, tendo sido trazidas à
acabou transmitindo uma falsa ideia de cidade do presente para atender uma nova função
germanidade, por criar uma imagem estereotipada depois de um longo período de interrupção”
(Kitsch) da imigração alemã e por induzir os (VEIGA, 2013, p. 21).
visitantes da cidade a crerem que estas
características seriam representativas de toda a
[ 38 ]
Re-germanização

Como mencionado anteriormente, o trata cultura como mercadoria para o


termo re-germanização é aqui utilizado consumo turístico remete suas origens
tendo como referência os estudos de no sul do Brasil à década de 1970:
Veiga (2013), sendo esta uma política
Nesta nova época, já considerada como
cultural revivalista que traz pós-moderna, a cultura é vendida como
mercadoria e a indústria turística vem
determinadas características estéticas de conquistando cada vez mais espaço. Nos
anos 1970, Blumenau e Joinville já
uma ideia de germanidade ao presente. tinham se consolidado como centros
Todavia, esta política acabou industriais e vinham obtendo um grande
crescimento econômico [...]. Neste
transmitindo uma falsa ideia de contexto, com o intuito de incrementar
sua economia, Blumenau começa a se
germanidade, geralmente reduzindo-a à reinventar como cidade germânica
para o turismo. Assim, a construção de
cultura alemã ou teuto-brasileira, edificações em estilo neo-enxaimel teve
um objetivo bem diferente dos
criando uma imagem estereotipada movimentos historicistas anteriores ao
(Kitsch) da imigração alemã movida modernismo (VEIGA, 2013, p. 60, grifo
nosso).
fundamentalmente por interesses
A re-germanização e seus
econômicos e políticos.
desdobramentos constituídos a partir de
O mecanismo de re-germanização foi Blumenau e outras cidades catarinenses
implementado com muita intensidade no ganham notoriedade nacional, tornando-
Estado de Santa Catarina pela adesão da se referência para outros estados. Em
iniciativa particular, articulado com a Santa Maria de Jetibá-ES, este movimento
gestão do poder público, por meio de é mais recente,21 mas segue trajetória
legislações e realização de eventos. semelhante aos Estados do sul do país,
Segundo Veiga (2013), esta política que embora em ritmo mais comedido.

21
Veiga (2013, p. 166, grifo nosso) chega a existência da Casa Pomerana ou não a tem como uma
mencionar Domingos Martins e Santa Maria de construção em enxaimel, tendo em vista que registra:
Jetibá em seu trabalho, como locais onde também “[...] um discurso de tradição estética/arquitetônica
“tem sido construído exemplares que imitam ou também se mostra como frágil, uma vez que na
remetem à estética do enxaimel”. Entretanto, alega época de estabelecimento destes imigrantes,
não dispor de informação sobre a existência nestes praticamente não se construiu casas de enxaimel”
locais de algum exemplar em enxaimel ou grande (VEIGA, 2013, p. 166).
quantidade dos mesmos. Parece desconhecer a
[ 39 ]
Re-pomeranização

Entende-se que a re-pomeranização22 é Como na re-germanização, percebe-se na


um processo de valorização da cultura re-pomeranização motivações vinculadas
pomerana, distinguindo-a com nitidez da a interesses econômicos (turismo e
equivocada concepção de germanidade seguimentos afins) e políticos (uso de
restrita à cultura alemã ou teuto- símbolos identitários coletivos para
brasileira.23 Visa-se, com isso, o projeto de poder de um determinado
fortalecimento dos vínculos histórico- grupo).24 Porém, mesmo nestes aspectos,
identitários e de pertencimento entre há outros interesses envolvidos:
seus membros, em movimentos internos econômico (manutenção material da
e externos a esta comunidade, vida, respeitando ou valorizando o modo
perpassando por elementos de de vida pomerano), político (voz e vez
reconstituição da autoestima e de uma em espaços de poder e políticas públicas
ideia de nacionalidade originária própria específicas para o povo pomerano),
(a Pomerânia), por meio de iniciativas cultural comunitário (associações
particulares, institucionais, culturais sem fins lucrativos), religioso
coletivas/comunitárias e do poder (igrejas mantendo ou adotando a língua
público. pomerana)25 e científico-educacional

22 Propõe-se o conceito de re-pomeranização, considerados todos como ‘alemães’, até mesmo pela
levando em consideração a especificidade dos literatura da área”.
artefatos extraídos da experiência constituída e
observada a partir de Santa Maria de Jetibá-ES. 24
É recorrente em várias eleições em Santa Maria de
Por certo, o termo sugerido busca na re- Jetibá que um determinado grupo político registre
germanização parte dos apontamentos para sua suas coligações com o nome de “Azul e Branco”
construção conceitual. Veiga (2013) faz uma (HILARIO..., [20--]) ou “Azul, Branco e Vermelho”
diferenciação ou uma subdivisão do processo da (TSE, 2004, 2016), remetendo a signos do povo
re-germanização, tendo uma forma pomerano, respectivamente, às cores das bandeiras
“mercadológica” e outra “com real objetivo de se do município e da Pomerânia (onde há um grifo
resgatar a história e as tradições”. Esta dualidade pintado em vermelho). Trata-se de um exemplo desta
configura um paradoxo passível de coexistência. apropriação no âmbito político eleitoral.
O que também pode ser considerado na
compreensão da re-pomeranização.
25
Destacam-se as igrejas Luteranas (IECLB e IELB ).
Mas, também, desde 2016, em Santa Maria de Jetibá,
23
Segundo Thum (2009, p. 141), as pessoas que Testemunhas de Jeová adotam encontros semanais e
ingressaram no Brasil como “Imigrantes Prussianos” impressos em pomerano. Mantêm o site JW.ORG
eram grupos culturais heterogêneos, que, (Jehovaas Tüügen, em pomerano) com materiais
posteriormente, foram “equivocadamente (vídeos, artigos, textos, cursos online etc.)
disponíveis em mais de mil idiomas, inclusive em
pomerano (grafia e dublagem).
[ 40 ]
(educadores/pesquisadores individuais condução exercida pelo protagonismo de
e instituições de ensino/pesquisa). lideranças desta comunidade, que atuam
(individualmente ou institucionalmente)
Certamente, todos esses elementos não
nas frentes ora citadas (econômico,
permanecem estanques, há momentos e
político, religioso, cultural comunitário e
pontos de contato. Atuam
científico-educacional).
independentes, em paralelo, imbricados
ou correlacionados. Conforme se Assim, não é um movimento com
estabelece algum grau de organização envolvimento direto de toda a
sobre pontos em comum, mesmo que comunidade pomerana. Por certo, muitos
eventualmente ou com laços mais soltos, agricultores que vivenciam diariamente
inclusive para além da esfera local o modo de vida do povo tradicional
(estadual, nacional e internacional), as pomerano não têm conhecimento do que
ações desses caracterizam-se como um está sendo discutido ou encaminhado
movimento – o movimento pomerano. como demanda do movimento pomerano
em suas frentes. O que não é uma
Esse movimento pomerano,
peculiaridade desse tipo de atuação
dialeticamente, integra e também
social no Brasil, mas é uma questão posta
caracteriza o processo da re-
para o próprio movimento.
pomeranização. Ele move e é movido,
com momentos de ascensão, estagnação Figura 8 - Cartaz do II PomerBR (2012)

(ou aparente estagnação) e, diante dos


desafios ou datas históricas
demarcatórias, posto em movimento
novamente. Não é homogêneo e possui
divergências em algumas questões, que
aqui não cabe o aprofundamento. Mas,
segue impelido pela cultura pomerana
Fonte: PomerBR (2012). Disponível em:
(cuja expressão mais forte é a língua, mas encurtador.com.br/vSUZ8. Acesso em: 1 nov. 2018.

também é além dela), da qual a grande Contudo, são evidentes as


maioria de seus membros se originam transformações advindas do movimento
e/ou estão envolvidos. Trata-se de um pomerano, mesmo que ocorrendo em
movimento que, de modo geral, tem sua aparente silêncio: PROEPO,26

26 O Programa de Educação Escolar Pomerana de Jetibá sobre o PROEPO datam 1991. Mas, este
(PROEPO) oficializa o ensino da língua pomerana foi efetivado apenas em 2005, primeiro como um
como educação intercultural bilíngue (pomerano projeto em cinco municípios (Laranja da Terra,
e português) nas escolas de alguns municípios do Domingos Martins, Pancas, Santa Maria de Jetibá
Espírito Santo. Os primeiros registros da e Vila Pavão). Após 2007, torna-se um programa
Secretaria Municipal de Educação de Santa Maria (KUSTER, 2015).
[ 41 ]
POMERBR,27 lei da cooficialização da Por outro lado, a pomeraneidade também
língua pomerana (Lei n.º 1136/2009), é resultado de uma construção histórica,
inclusão do povo pomerano na Política podendo passar por ressignificações
Nacional de Desenvolvimento (KRONE, 2014) inerentes ao seu tempo e
Sustentável dos Povos e Comunidades lugar. Um desses processos pode ser a
Tradicionais e no Conselho Nacional dos re-pomeranização, seja esta
Povos e Comunidades Tradicionais, constituindo-se como: a) política de
dentre outros. Isso é igualmente a re- reinvenção do passado (notadamente
pomeranização. quando reiterada, conduzida ou
instituída pelo poder público); e/ou b)
É importante distinguir pomeraneidade
possibilidade de (re)descobrir
da re-pomeranização. Esta última refere-
historicamente esse passado e
se a um processo histórico no qual seus
compreender criticamente sua própria
sujeitos possuem um engajamento, com
pomeraneidade.
diferentes graus de consciência sobre
este. A pomeraneidade, por sua vez, De fato, observando os estudos de Thum
considerando os estudos de Carmo Thum (2009) e Krone (2014), percebe-se um
(2009) e Evander Eloí Krone (2014), indicativo de que o processo da re-
expressa a relação com o ato de exercer, pomeranização também foi ou está sendo
mesmo inconscientemente, o modo de vivenciado em outras comunidades
vida pomerano ou vivenciar o “ser pomeranas no Brasil. Mas, certamente,
pomerano” presente no indivíduo ou na demarcada por suas trajetórias
coletividade de seu tempo. O elemento específicas.
característico mais evidente desta
Origens demarcatórias
pomeraneidade é a língua:
Quando a re-pomeranização torna-se
No processo cotidiano do uso da língua, o perceptível em Santa Maria de Jetibá? É
Pomerano é presente em todas as
situações sociais, sendo falado, qualitativo perceber a gênese da re-
conjuntamente, com o Português. Essa
situação demarca uma condição de pomeranização vendo-a brotar (talvez
pomeraneidade, no uso da linguagem,
da qual todos participam. É usada com
inconscientemente) durante a própria
mais frequência pelos mais velhos, com re-germanização. Deste modo, nota-se
menor frequência pelos mais novos,
compreendido por todos (THUM, 2009, que a re-germanização antecede a re-
p. 277, grifo nosso).

27 Em 2010, após diálogo entre as comunidades povo pomerano, pois dá visibilidade às ações que
pomeranas do Rio Grande do Sul e Espírito Santo, estão pulverizadas pelo Brasil afora. As pesquisas
iniciou esses encontros nacionais (PommerBR) e experiências compartilhadas pelos
que reúnem descendentes, pesquisadores, participantes do evento têm fortalecido a luta,
entusiastas e ativistas interessados na cultura e defesa e promoção da cultura e língua pomerana”
história do povo pomerano (KUSTER, 2015). Este (ibid., p. 70).
evento “[...] é um processo de empoderamento do
[ 42 ]
pomeranização, mas há fluídos de ambas Embora podendo incorrer em eventuais
nas mesmas. lacunas, convém apontar alguns itens
expressivos que representam iniciativas
Em Santa Maria de Jetibá, ainda durante
ou buscas pela valorização da cultura e
a re-germanização, verifica-se que há o
história do povo pomerano em Santa
interesse pela cultura do povo pomerano
Maria de Jetibá, num recorte de vinte
e o desejo genérico de sua valorização.
cinco anos (1975-2000). Confira:
Mas, como isso seria possível?

Ações de valorização da cultura pomerana em Santa Maria de Jetibá (1975-2000).


ACONTECIMENTO SUJEITO HISTÓRICO DATA
Documentário: Die Pommeraner (Os Pomeranos). TV Gazeta (ES) / Amylton de 1977
Almeida (texto), Vladimir Godoy
(direção) e Maura Miranda
(apresentação).
Reabertura da única escola de Alto Santa Maria. Comunidade de Alto Santa Maria. 1979
Igreja de Jetibá: um século de existência (livro). Edgar Vollbrecht e Dario G. 1982
Schaeffer.
Primeiro texto em pomerano do jornal O Semeador. IECLB / Rodolfo Gaede. 8 dez.1983
Projetos: A interferência do dialeto Pomerano na Marineuza Plaster Waiandt. [ca. 1990]
Alfabetização; Dicionário para escolas bilíngües e Dicionário
para uma escola bilíngue (1991).
Projeto Pró-Pomerano. Marineuza Plaster Waiandt e 1991
Charlotte Emmerich.
Museu da Imigração Pomerana em Santa Maria de Jetibá. Prefeitura Municipal de Santa 1991
Maria de Jetibá.
A imigração e aspectos da cultura pomerana no Espírito Jorge Kuster Jacob. 1992
Santo (livro).
O município de Santa Maria de Jetibá: o município mais Francisco Schwarz. 1993
pomerano do Espírito Santo (livro).
Descobrindo raízes: aspectos geográficos, históricos e Helmar Röelke. 1996
culturais da Pomerânea (livro).
Início da produção cinematográfica em pomerano com o Martin Boldt. 1997
filme Pommer Spos (Diversão Pomerana).
Proposta de Grafia Experimental para a Língua Pomerana Ismael Tressmann, Joana Bahia, 1997
(seminário). Helmar Röelke, IECLB e
Secretarias Municipais de
Educação e de Cultura e Turismo.
A construção da subjetividade no cotidiano da Educação Rosali Rauta Siller . 1999
Infantil (dissertação).
O “Tiro da Bruxa”: Identidade, Magia e Religião entre os Joana Bahia. 2000
Camponeses Pomeranos do Estado do Espírito Santo (tese).
Estudo Comparativo das Construções Verbais Complexas e Ismael Tressmann. 2000
da Ordem Oracional entre as línguas Cinta Larga (Tupi-
Mondé) e Pomerana (Germânica) (dissertação).
Fonte: Os Pomeranos (1977), Vollbrecht e Schaeffer (1982), Jacob (1992), Schwarz (1993), A Língua ... (1997), SEBRAE (2005),
Hartuwig (2011) , Magalhães (2012), Kuster (2015), Rosa (2015), Koeler (2016). Nota: Quadro produzido pelo autor.

[ 43 ]
Embora importantes, todos estes fatos obter conquistas sociais [...]” (KRONE,
2014, p. 5).
não caracterizam o que está sendo
Krone (2014), em sua dissertação sobre
definido aqui como re-pomeranização.
a construção da pomeraneidade no
Então, diante deste imbricamento, como
extremo sul do Brasil, apresenta também
explicar as iniciativas de valorização da
uma contribuição possível de ser válida
cultura pomerana antes da re-
para Santa Maria de Jetibá:
pomeranização?

“[...] é exatamente em um contexto que


É necessário considerar que, mesmo com pode ser caracterizado como de
contraestigmatização em que estão
o uso cotidiano da língua pomerana e a inscritos os recentes processos de
vivência do modo de ser pomerano nos valorização do patrimônio cultural
pomerano e de construção de uma nova
círculos familiares e comunitários, pomeraneidade” (KRONE, 2014, p. 81,
grifo nosso).
historicamente o silenciamento do povo
De fato, como dito, os pomeranos e seus
pomerano tem ocorrido sob a aba dos
descendentes vêm sofrendo
poderes religioso, escolar, econômico e
historicamente ações de silenciamento e
da linguagem, especialmente nos espaços
de estigmatização em solo brasileiro, o
públicos fora da localidade ou mesmo no
que deixou marcas em seu modo de ser.
âmbito local (THUM, 2009, p. 341).
Por outro lado, adotou-se também
Porém, um processo de transformação
formas de sobrevivência e resistências
gradual estava em curso desde os anos
diversas (da solidariedade até o silêncio).
1980 e ganhando consistência.
Dentre estas, constitui-se um gradativo
No contexto do reconhecimento dos processo de contraestigmatização, de
direitos de caráter multiétnico e autoafirmação étnico-cultural e de busca
plurilinguístico ao engajamento de identitária.
pesquisadores apontados por Hartuwig
A principal manifestação desta
(2011), Krone (2014) destaca
resistência cultural é a manutenção viva
igualmente a emergência de novos
da língua pomerana,28 que incorpora em
sujeitos de direitos, desde os anos 1990,
seu entorno um conjunto de signos, visão
com a adoção de políticas públicas de
de mundo e modo de vida que o povo
patrimonialização no Brasil.
pomerano congrega (individualmente e
“[...] Grupos sociais historicamente coletivamente) até o presente, como
marginalizados têm se apropriado da
categoria patrimônio, colocando seus sujeitos da história.
saberes, fazeres, tradições e
manifestações culturais como meio para

28 “A língua pomerana constitui uma das cultural de um povo tradicional brasileiro”


dimensões articuladoras, para reconhecimento (FOERSTE, 2014, s.p.).
dos pomeranos atualmente no cenário das lutas
coletivas por direitos sociais. Ela é patrimônio
[ 44 ]
Isto posto, é possível inferir que a re- Por certo, há iniciativas que antecedem,
pomeranização se insere em um contexto perpassam e vão além destes itens na
caracterizado pela contraestigmatização busca pela valorização da cultura e língua
do povo pomerano. Inclusive, sendo este pomerana em vários espaços públicos ou
um processo já presente em grau institucionais no Espírito Santo. Contudo,
diferenciado dentro da re-germanização. o recorte aqui adotado considera o
caráter da centralidade demarcatória
Deste modo, considerando a perspectiva
(ponto de confluência e também de
da contraestigmatização e a
expansão) da contraestigmatização em
proeminência identitária da língua
um processo impactante na organização
pomerana,29 é possível adotar o
e mobilização coletiva, inclusive nas
reconhecimento linguístico do pomerano
políticas públicas, com uma
dicionarizado e sua inserção no sistema
fundamentação científica e identitária
educacional como sendo critérios
própria sobre a língua e a cultura do povo
histórico-demarcatórios da re-
pomerano, especialmente em Santa
pomeranização em Santa Maria de Jetibá,
Maria de Jetibá. Portanto, não se trata da
materializado pelos elementos centrais:
primogenitura dos acontecimentos ou
desqualificação das demais iniciativas.
a) Publicação do Dicionário
Enciclopédico Pomerano- Assim, tanto o PROEPO quanto o
Português e do livro-texto dicionário pomerano-português e o livro
em língua pomerana, Upm Land – Up Pomerisch Sprak possuem
intitulado “Upm Land – Up uma história ancestral ampla e com
Pomerisch Sprak” (Na roça múltiplas contribuições. Enquanto
em língua pomerana), pontos demarcatórios, a relevância está
ambos de autoria do doutor
no processo do seu entorno, que abarca
em linguística Ismael
seus trajetos, seus significados e o que
Tressmann;
representam para além.
b) Implantação do PROEPO
(inicialmente como projeto e Em outras palavras, o PROEPO e as obras
depois como programa). citadas de Tressmann (dicionário e livro)
são resultado da jornada histórica de
resistências do povo pomerano.

29Segundo Hartuwig (2011, p. 42), Carmo Thum imigrantes sob influência germânica. Assim, a
(2009) ao analisar a produção acadêmica sobre a cultura pomerana não foi apenas silenciada, mas
história da imigração no Brasil, encontra uma também depreciada, quando as narrativas e
versão oficializada e generalizante desta, que documentos oficiais forjam a língua pomerana
homogeneíza a cultura alemã como a cultura dos como dialeto.
[ 45 ]
Sobretudo, são simultaneamente ponto
Em síntese, a re-pomeranização
de confluências destas e de partida para
é um movimento semelhante à
a sua expansão, permitindo visualizar o
re-germanização voltado para
antes e o depois com nitidez.
cultura pomerana, tendo seu

Deste modo, validada pela insígnia da auge nas duas primeiras décadas
do século XXI em Santa Maria de
pesquisa científica e com registro oficial
Jetibá. Há elementos
em um dicionário etnolinguístico, dentro
estereotipados como
de uma sociedade constituída nas
mercadoria turística e sua
relações de poder do conhecimento
apropriação por frações
racional e letrado, a língua pomerana
políticas em seus projetos de
deixa definitivamente a pecha de dialeto. poder. Mas, há também outros
Este é um fato extremamente relevante componentes próprios do povo
na trajetória do povo pomerano. tradicional pomerano, por vezes
ressignificados ao modo de vida
De fato, este parece ser o elemento que
vigente de seus descendentes.
faltava para canalizar o sentimento Assim, a materialização das
pulverizado de “valorização do povo temáticas coletivas relacionadas
pomerano”. Como efeito, o ser pomerano à cultura pomerana, seja na
se vê respaldado perante o outro e a si esfera da sociedade civil ou
mesmo. como política pública, advém
desta comunidade e, em geral,
Trata-se de um potente catalisador da por intermédio tanto do
postura de contraestigmatização no movimento pomerano quanto
movimento pomerano. do grupo hegemônico local
vigente.
Deste modo, entende-se principalmente
Em outras palavras, como dito, a
o PROEPO e o Dicionário Pomerano
re-pomeranização pode se
(TRESSMANN, 2006) como pontos
constituir, dialeticamente, como:
impulsionadores ou disseminadores de
a) política de reinvenção do
um conjunto de ações para além do passado (notadamente quando
campo educacional e que integram a re- reiterada, conduzida ou
pomeranização. instituída pelo poder público);
e/ou b) possibilidade de
(re)descobrir historicamente
este passado, compreendendo-o
criticamente.

[ 46 ]
Anotações

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[ 47 ]
Em outras palavras, desvendar suas ruas e seus nomes, suas sedes
administrativas, os recortes de seus bairros, a concentração de sua
população, suas praças e parques, os monumentos públicos, suas formas
arquitetônicas, a localização de suas indústrias e fábricas, o seu ritmo do
trabalho, a sua condição ambiental-ecológica, seus lugares de encontros,
suas rotas de mobilidade, a sua distribuição da riqueza material e
simbólica e seus confrontos de classe.

Sandra Della Fonte, 2018.


Desvelando Conflitos
Soterrados
Capítulo III

IDENTIDADE POMERANA
Uma viagem formativa desvelando conflitos soterrados
2018
Desvelando conflitos soterrados

Neste capítulo, nosso objetivo é discutir O segundo refere-se à casa tradicional


os conflitos postos na atual identidade pomerana, muito próxima do modo de
pomerana a partir de três modelos de vida dos primeiros imigrantes que
construção presentes no município de chegaram a Santa Maria de Jetibá.
Santa Maria de Jetibá (ES).
Por último, foca-se a arquitetura
O primeiro deles diz respeito a um característica da indústria do
modelo de edificação com “estilo agronegócio na forma de granjas
germânico” (neo-enxaimel), estimulado automatizadas em contraste com o modo
pelo poder público local. de vida camponês da agricultura familiar

[ 50 ]
Arquitetura estereotipada
Turismo e a identidade de “fachada”

A viagem formativa passa agora a percorrer a cidade,


voltando o olhar para suas edificações, atento às PROBLEMATIZAÇÃO:
potencialidades educativas que esta oferece. Neste Refletir sobre o uso da
percurso, constata-se que é na segunda gestão do arquitetura como instru-
mento da construção de
município (1993-1996) que se inicia a adoção da política uma identidade mercado-
rizada, que serve a
da re-germanização que, mais à frente, seguirá com a re- interesses turísticos-
comerciais e até político-
pomeranização. Este marco histórico pode ser ideológicos em nome de
estabelecido com a identificação dos seguintes atos: uma suposta valorização
cultural.

a) criação da Secretaria de Cultura, Esporte e Turismo DIÁLOGO TEÓRICO:


(Lei nº 217/1994), separando-a da pasta da Educação;
Estudos sobre a
b) criação do Conselho Municipal de Turismo (COMTUR) arquitetura neo-enxaimel
em Santa Catariana, re-
e do Fundo Municipal de Turismo (Lei n° 221/1995); germanização e re-
pomeranização.
c) incentivo ao uso do dito “estilo germânico” nas
edificações (Lei n.º 270/1995); 30 PRINCIPAIS FONTES:

d) obra em neo-enxaimel na então nova sede da Jacinta Milanez Gislon


(2013), Maurício Biscaia
Prefeitura (antigo Hotel Kerckhoff); e, Veiga (2013), leis, jornais,
e) obra em neo-enxaimel da então Secretaria Municipal edificações e fotos.

de Cultura, Esportes e Turismo.

30Essa lei altera o Código Tributário, concedendo isenção de Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU)
para novas construções e reformas de prédios cujo projeto arquitetônico fosse aprovado e classificado de
“estilo germânico”, sendo assim objeto de averbação no Cadastro Imobiliário da Divisão de Tributação da
Secretaria Municipal de Finanças. Garante o benefício por um período de cinco anos a partir da expedição
do “habite-se” (prédios novos) ou do primeiro dia do exercício fiscal seguinte ao término da reforma
(prédios reformados e anteriormente cadastrados). Em situações que suscitem dúvidas sobre o estilo
arquitetônico da construção ou reforma, a lei possibilita ao poder Executivo Municipal constituir uma
comissão de “profissionais especializados” para classificar e julgar o caso em questão (SANTA MARIA DE
JETIBÁ, 1995e). Em 2009, tal benefício passou para dez anos, ainda em vigor (SANTA MARIA DE JETIBÁ,
2009). Porém, conforme Ofício n.º 890/2018/PMSMJ/SECGAB, consta a informação da Superintendência de
Tributação da Secretaria de Fazenda da Prefeitura Municipal de Santa Maria de Jetibá (PMSMJ) que
“nenhum contribuinte obteve a isenção de IPTU, para imóveis construídos, reformados em estilo germânico
que trata a Lei 270/1995” (SANTA MARIA DE JETIBÁ, 2018b). Esta situação é inusitada e intrigante. O efeito
da legislação santa-mariense não demonstra corresponder à mesma pujança estética da arquitetura neo-
enxaimel identificada nas cidades de Santa Catarina por Veiga (2013) e Gislon (2013).
[ 51 ]
A Mensagem nº 056/95 do Executivo que história arquitetônica estabelecida
encaminha para a Câmara Municipal o originalmente na região.
Projeto de Lei nº 055/95 (isenção de Foto 4 - Antiga Secretaria de Cultura, Esporte e
Turismo de Santa Maria de Jetibá
IPTU de imóveis em “estilo germânico”)
revela nitidamente a intenção de
constituir uma identidade cultural no
presente a partir da arquitetura:

O Município de Santa Maria de Jetibá,


busca a sua identidade cultural, de
origem e colonização germânica,
incentivando a construção e a reforma de
prédios, com projetos arquitetônicos, em Fonte: IBGE ([19--])31.
estilo germânico nas suas fachadas,
esquadrias e telhados (SANTA MARIA DE Outra edificação logo adaptada ao neo-
JETIBÁ, 1995b, grifo nosso).
enxaimel em Santa Maria de Jetibá foi a
O primeiro local a ser implementado o sede da Prefeitura, nominada de Centro
neo-enxaimel foi a antiga sede do Centro Administrativo Municipal (Foto 5). Na
de Informações Turísticas/Secretaria ocasião, tratava-se da nova sede,
Municipal de Cultura e Turismo (Foto 4), localizada à rua Herman Miertschink,
localizada no núcleo comercial da cidade, esquina com a rua Francisco Schwartz,
na bifurcação da avenida Frederico no Centro. Oficialmente a Administração
Grulke com a rua Florêncio Augusto Municipal justificou tal mudança
Berger, Centro. Apesar de a estética desta alegando centralidade administrativa,
edificação se aproximar do enxaimel economia e seu propósito estético-
baixo-saxão, muito empregado na região cultural para a cidade:
de origem da maioria dos imigrantes do
Procurou-se dar ao antigo prédio um
município, os arcos da fachada, as partes aspecto de estilo germânico enxaimel
com a simulação de tijolos e as janelas de com pintura azul e branco, as cores
tradicionais da Pomerania. (SANTA
metal com grades denunciam a MARIA DE JETIBÁ, 1995c, p. 5, grifo
nosso).
adaptação realizada no local.
A Prefeitura funcionou neste imóvel até
Assim como ocorreu em Santa Catarina, a dezembro de 2008, quando foi
prioridade foi simular o efeito visual que transferida para sua sede atual. Apesar
remetesse às origens europeias dos do discurso oficial remeter a alguns
primeiros imigrantes, aparentemente signos da cultura pomerana, é possível
com pouco compromisso em representar notar o uso da Cruz de Santo André e sua
uma investigação mais profunda sobre a

31Secretaria Municipal de Cultura, Esportes e catalogo.html?id=438594&view=detalhes>.


Turismo: Santa Maria de Jetibá, ES. Disponível Acesso em 17 jul. 2018.
em: <https://biblioteca.ibge.gov.br/biblioteca-
[ 52 ]
caracterização Kitsch, com a repetição da Frederico Grulke (n.º 477 a 517). Nesta
pintura em “X”, na aplicação do neo- composição (Foto 6 e 7), adaptada no
enxaimel. Tais itens, como já tratado, período inicial da re-germanização, os
distanciam-se do enxaimel baixo-saxão. edifícios acompanham a caracterização
do telhado do Pommerhaus Hotel,
Foto 5 - Prefeitura de Santa Maria de Jetibá (1995)
favorecendo a impressão de unidade
estética. Tendo paredes geminadas,
reproduz o efeito das vilas medievais
europeias. Assim, embora apenas o hotel
tenha empregado o neo-enxaimel em sua
fachada por completo, em um olhar
desatento, passa a sensação de que as
demais seguem a mesma estética.
Fonte: Santa Maria de Jetibá (1995c).

Assim, percebe-se que iniciar o uso do Foto 6- Edificações re-germanizadas na entrada de


Santa Maria de Jetibá (2018)
neo-enxaimel nesses imóveis não foi
aleatório. Trata-se, afinal, da
representação material da concepção
política vigente, conduzida pela
Secretaria que integrava as pastas de
Cultura e Turismo, coirmãs de um
mesmo projeto.

Ao ganhar um status de Secretaria, as Foto: Swami C. Bérgamo, 2018.

ações voltadas para o turismo adquirem Foto 7 - Edificações re-germanizadas em Santa Maria
de Jetibá (2018)
mais autonomia e força enquanto projeto
político neste momento. Mesmo quando
a cultura (alemã ou pomerana) é
abordada, esta mantém um vínculo com
o interesse turístico. Há uma
naturalização da mercadorização das
manifestações culturais (materiais e
imateriais), assim recriadas ou reduzidas
a estereótipos palatáveis ao consumo. Foto: Swami C. Bérgamo, 2018.

O Pommerhaus Hotel (Foto 8) foi o


No trajeto por Santa Maria de Jetibá,
primeiro comércio com vínculo direto ao
destaca-se um conjunto de edifícios
turismo a aderir ao neo-enxaimel em
privados localizados na avenida
Santa Maria de Jetibá. É recorrente o uso
[ 53 ]
de sua imagem (fotos e vídeos) para a projeto político vigente para a cidade
divulgação da cidade ou em registros nesse período: a visão arquitetônica-
pessoais de turistas. Observa-se uma urbanística da re-germanização. Ou seja,
preocupação com a qualidade estética, Santa Maria de Jetibá reinventava-se
tendo optado pela madeira em várias como cidade germânica para o turismo.
partes de sua confecção, interna e
Nesse passo, a implantação do neo-
externamente. Entretanto, do ponto de
enxaimel em Santa Maria de Jetibá
vista arquitetônico, percebe-se a
também segue como a construção de
influência da re-germanização do sul do
uma identidade de “fachada”, dispondo-
país presente, por exemplo, no uso da
se ao espetáculo estético até onde a vista
Cruz de Santo André, a sacada nos
alcança.
quartos e alguns detalhes imitando
tijolos expostos. Características que Assim como ocorreu em Blumenau (SC),
certamente agradam aos hóspedes e em alguns casos a aplicação do neo-
cumpre o seu papel dentro do contexto enxaimel limitou-se a ser instalado na
da re-germanização voltada para os fachada voltada para rua principal, onde
interesses do turismo. Porém, afasta-se é visível aos turistas, para formar a
do enxaimel baixo-saxão e aproxima-se melhor visão fotográfica, junto de outras
do enxaimel alemânico, muito presente edificações em neo-enxaimel. Nas
na Baviera. Um sistema de enxaimel laterais, contudo, não há as tábuas
inexistente originalmente na região de ornamentais, revelando um prédio
Santa Maria de Jetibá, especialmente comum, em formato de caixa como
ausente na casa pomerana. qualquer outro deste tipo (VEIGA, 2013,
p. 137). Isso só demonstra o intuito do
Foto 8– Pommerhaus Hotel (2018)
efeito estético para fins turísticos ou
valorização imobiliária com o mínimo de
custo possível.

Em Santa Maria de Jetibá, a edificação


(Foto 9) situada na avenida Frederico
Grulke, a principal da cidade, próxima da
antiga sede da Secretaria de Cultura e
Foto: Swami C. Bérgamo, 2018.
Turismo (atual DPM) e do Pommerhaus
Embora o nome do hotel faça referência Hotel, é um caso assim.
aos pomeranos, este é escrito em alemão
e em caligrafia gótica (alegorias a um
passado teuto medieval). Trata-se do
[ 54 ]
Foto 9 – Edificação da família Berger (2018) na alvenaria. Também nesta edificação
não são ocultos os canos de vazão da
água de lavagem e a antena exposta
completa a cena Kitsch.

Esta não seria a única edificação


identificada como uma arquitetura Kitsch

Foto: Swami C. Bérgamo, 2018.


no uso do neo-enxaimel. Veiga (2013)
cita vários casos da cidade de Blumenau.
Notando em detalhe o edifício (Fotos 10
Em Santa Maria de Jetibá, vale trazer o
e 11) situado à frente do Pommerhaus
exemplo do edifício (Foto 12) localizado
Hotel, nº 480, identifica-se com nitidez a
à rua dos Imigrantes, de propriedade da
adaptação desmedida das tábuas sobre o
família Bergamaschi, que adotou o neo-
prédio já existente.
enxaimel logo no início da re-
Foto 10 - Edifício à frente ao Pommerhaus Hotel
germanização. Esse traz um uso muito
peculiar do “estilo germânico”: um
edifício moderno adornado em suas
laterais com linhas inclinadas marrons
em ziguezague que, supostamente,
teriam a intenção de simular um efeito
causado pelo enxaimel. O telhado é uma

Foto: Swami C. Bérgamo, 2018.


tentativa de imitação do “estilo
germânico” ou talvez do estilo mansarda.
Foto 11– Detalhe do uso de neo-enxaimel em prédio Foto 12 - Edifício na rua dos Imigrantes

Foto: Swami C. Bérgamo, 2018.

A madeira sequer cobre os pilares da Foto: Swami C. Bérgamo, 2018.

varanda. Um desatino estético, tendo em Nessa linha da arquitetura Kitsch, com o


vista que a madeira no enxaimel original uso aleatório e exagerado de elementos
cumpre justamente a função de visuais do enxaimel, há ainda o prédio
sustentação da estrutura, papel situado na avenida Frederico Grulke,
correspondente da pilastra ou da coluna parte da loja de Material de Construção
[ 55 ]
Sperandio (Foto 13). A obra mescla do enxaimel, com reboco da parede e uso
enormes janelas de vidro com a aplicação da cal (Foto 14), sendo branca (CORONA,
de tábuas formando linhas em 2012; VEIGA, 2013; BUSS, 2018).
ziguezague e letras “M” ou “W”, Foto 14 - Detalhe de Casa Pomerana (Família Schmidt)
incompatíveis com o efeito estético do
enxaimel. Ambas as obras representam a
banalização do neo-enxaimel.

Foto 13- Arquitetura Kitsch do neo-enxaimel

Foto: Swami C. Bérgamo, 2016.

As residências abaixo (Fotos 15 e 16)


estão uma de fronte a outra, na rua Dr.
Martinho Lutero, Centro de Santa Maria
de Jetibá. As mesmas apresentam neo-
enxaimel com “tijolos” visíveis. Além de
dispor o emadeiramento de forma
Foto: Swami C. Bérgamo, 2018. pastiche, ignorando a função estrutural
Outra evidência do reduzido do enxaimel e o alinhamento com as
compromisso com a pesquisa histórica janelas em sua disposição, elas
da arquitetura identitária dos imigrantes contribuem para compor na memória
europeus instalados na região, coletiva uma falsa história sobre a
notadamente os pomeranos, é o uso do realidade vivenciada pelos imigrantes
neo-enxaimel com revestimento que que constituíram este município.
imita tijolos aparentes, simulando o Foto 15 – Neo-enxaimel imitando tijolos visíveis

preenchimento dos tramos. Como foi


anteriormente tratado, a utilização de
tijolos desta forma (sem reboco) é uma
característica muito presente em Santa
Catarina (VEIGA, 2013, p. 98).
Diferentemente, no Rio Grande do Sul e
no Espírito Santo prevaleceu a utilização
do barro32 ou do tijolo de barro cru
Foto: Swami C. Bérgamo, 2018.
(adobe) no preenchimento dos espaços

32 Para preencher os tramos de madeira usava-se preenchidas com barro atirado com a mão,
a técnica de pau-a-pique do tipo sopapo, também formando assim paredes leves, com cerca de
conhecida como taipa de mão. Consiste em uma quinze centímetros de espessura (CORONA,
estrutura de varas de madeira entremeadas na 2012, p. 59; BUSS, 2018, p. 45).
forma de grade, amarradas entre si por cipós,
[ 56 ]
Foto 16 – Desvelando a arquitetura de fachada Uma outra edificação que também utiliza
o efeito dos tijolos visíveis em parte de
sua fachada é a sede administrativa da
Cooperativa Agropecuária Centro-
Serrana (COOPEAVI) (Foto 17), que
ocupa um local de destaque muito maior
Foto: Swami C. Bérgamo, 2018. no núcleo comercial da cidade, na
O detalhe do prédio em obras (Foto 16) avenida Francisco Schwartz. Em 2009, foi
revela a superficialidade das aplicações de realizada uma reforma neste prédio,
peças de fachada que caracteriza o neo- introduzindo o neo-enxaimel em suas
enxaimel (neste caso, com a imitação da características.
madeira e dos tijolos).

Foto 17 – Sede da COOPEAVI em Santa Maria de Jetibá

Foto: Swami C. Bérgamo, 2018.

Observe que a reforma ocorre no período COOPEAVI , é perceptível esta


de pleno processo de re-pomeranização aproximação na adaptação realizada
da cidade de Santa Maria de Jetibá, sobre o antigo prédio. Certamente uma
quando se comemorava os 150 anos de tentativa coerente com a visão da re-
imigração pomerana no Espírito Santo. pomeranização, onde a inspiração não é
mais as casas da Baviera ou as cidades re-
Apesar do uso dos tijolos e a dimensão
germanizadas do sul do país, mas sim a
espetacular do prédio, o posicionamento
região da antiga Pomerânia e a Casa
das tábuas aproxima-se do sistema
Pomerana existente no próprio
baixo-saxão, utilizando vários esteios,
município.
uns próximos dos outros. Em um
enxaimel original, as portas e janelas Porém, olhando atentamente, na outra
deveriam ser inseridas exatamente no lateral do prédio, há muitos elementos
espaço entre estes esteios. Embora isso diagonais, o que não é tão presente no
não ocorra perfeitamente no edifício da sistema baixo-saxão. Este descompasso
[ 57 ]
estético, pode aproximar esta Foto 18 – Prefeitura Municipal de Santa Maria de Jetibá – ES (fundos)

arquitetura do pastiche.

Próximo à sede da COOPEAVI ,


seguindo o trajeto formativo,
mais adiante depara-se com
opulentos edifícios públicos em
neo-enxaimel. São as novas
sedes administrativas da
Foto: Swami C. Bérgamo, 2016.
Prefeitura (Fotos 18 e 19) e da
Câmara Municipal (Fotos 20 e Foto 19 – Prefeitura Municipal de Santa Maria de Jetibá – ES (frente)

21) de Santa Maria de Jetibá,


ambas compreendidas no que
ficou denominado “Praça dos
Três Poderes”,33 por congregar
as edificações do Executivo,
Legislativo e do Judiciário.

Ambos os prédios foram Foto: Swami C. Bérgamo, 2018.

construídos em momentos
Foto 20 – Câmara Municipal de Santa Maria de Jetibá – ES (fundos)
próximos, em um contexto
econômico de prosperidade e em
inteira intensidade do
movimento de re-pomeranização
(SANTA MARIA DE JETIBÁ,
2012). Tais edificações
inspiraram-se na arquitetura da
casa pomerana (Pomerisch Huus,
Foto: Swami C. Bérgamo, 2016.

33A instalação de um espaço com essa finalidade desenvolvimento urbano. Certamente, poderia
é antiga em Santa Maria de Jetibá. As Leis do ter o deslocamento do núcleo comercial da cidade
Plano Plurianual nº 88/1991 (Prefeitura e para outro bairro, influenciando o fluxo de
Câmara) e 139/1993 (Prefeitura, Câmara e consumo e alterando o valor venal das
Fórum) já previam esta dotação, visando propriedades e imóveis. O grupo de comerciantes
“concentrar os serviços públicos municipais em localizados no Centro saiu vitorioso,
um único local, possibilitando o acesso da determinando o atual ponto da Praça dos Três
população e racionalizando o atendimento” Poderes. Esse processo representa um dos
(SANTA MARIA DE JETIBÁ, 1993). Porém, conflitos soterrados apontados como
ocorreu uma disputa quanto à sua instalação, possibilidade de pesquisa na história do
envolvendo interesses de grupos políticos e município. As atas das sessões da Câmara são
econômicos. Acreditava-se que a sua localização uma indicação de fonte interessante, bem como
era determinante na ocupação e no as Leis nº 409/1998 e 438/1999.
[ 58 ]
Foto 21 – Câmara de Santa Maria de Jetibá (frente) Maria de Jetibá, como anteriormente
apresentados.

Entretanto, é notório a espetacularização


da cultura por meio da arquitetura.
Considerando as dimensões desses
imóveis e o cenário arquitetônico na
ampla área em que estão inseridos, é
Foto: Swami C. Bérgamo, 2018.
possível ter esta percepção. Como em
em pomerano), com características
outros imóveis já descritos, há ainda a
próximas do enxaimel baixo-saxão.
problemática do fenômeno Kitsch. Por
Ressaltam-se as cores azul e branco
exemplo, a disposição das faixas brancas
presentes nas casas pomeranas e na
(Prefeitura) ou marrom (Câmara) não
bandeira do município. Esses edifícios
compõem com coerência sequer uma
ostentam ainda o brasão municipal em
imitação da função estrutural do
pontos de destaque. A presença desses
enxaimel. As janelas da Prefeitura e os
elementos visa potencializar
balaústres de ambas edificações também
simbolismos compatíveis à elaboração
se distanciam das características de
da narrativa política de enaltecimento da
várias casas pomeranas da região.
cultura pomerana.

A observação das imagens da Prefeitura


Nessas obras, não há os exageros de
Municipal de Santa Maria de Jetibá
elementos estéticos presentes na
(antiga e atual), em momentos históricos
arquitetura neo-enxaimel de algumas
distintos, é um revelador exercício para
cidades de Santa Catarina, com o uso
perceber o uso do neo-enxaimel nos
excessivo da Cruz de Santo André ou os
períodos da re-germanização e re-
tijolos visíveis, exceto em uma parte da
pomeranização. Em comum, há uma
fachada da PMSMJ (Foto 19). Também se
composição Kitsch em ambas (Figura 9).
diferenciam de alguns exemplares do
neo-enxaimel da própria cidade de Santa

Figura 9 - Sedes da Prefeitura de Santa Maria de Jetibá (antiga e atual)

Fonte: a) Santa Maria de Jetibá (1995c); e, b) Foto: Swami C. Bérgamo (2018).

[ 59 ]
Esta estética neo-enxaimel nas sedes dos auge. Em 2009, este foi inaugurado
Poderes municipais não é uma dentre as atividades comemorativas dos
exclusividade de Santa Maria de Jetibá. 150 anos da imigração pomerana no
Desde 1982, Blumenau-SC já tinha Espírito Santo. Em sua base, registra-se
adotado o neo-enxaimel na arquitetura em alto-relevo algumas cenas da
da nova Prefeitura (Foto 22), em igual trajetória das famílias dos imigrantes,
formato “caixotão”. narrando sua partida da Europa, chegada

Foto 22 – Prefeitura Municipal de Blumenau – SC (2011) no Espírito Santo, abertura da primeira


estrada (organização coletiva para a
sobrevivência e instalação), a sede da
primeira cooperativa e o brasão do
município (Fotos 23, 24, 25, 26 e 27).

Foto 23 – Monumento em Homenagem aos 150 anos da


Imigração Pomerana no ES
Fonte: Veiga (2013, p. 134).

Segundo Veiga (2013, p. 134), o prefeito


de Blumenau, em entrevista ao jornal A
Notícia,34 em 1982, traz

“[...] em seu discurso a reprodução da


visão romantizada da colonização,
enaltecendo o mito fundacional da
cidade, para que se justificasse a
implantação da nova arquitetura”.
Foto: Swami C. Bérgamo, 2018.

É o que ocorre também em Santa Maria


de Jetibá-ES, seja na re-germanização ou Foto 24 – Brasão do Município de Santa Maria de Jetibá

na re-pomeranização.

O monumento (Foto 23) representando a


família pomerana,35 circunscrito no
conjunto arquitetônico dos Poderes
neste município, consagra a
materialização e o simbolismo do Foto: Swami C. Bérgamo, 2018.

processo de re-pomeranização em seu

34Em Santa Maria de Jetibá, existia um jornal 35 Trata-se do Monumento em Homenagem aos
homônimo. Em agosto de 2015, ao completar 150 anos da Chegada dos Imigrantes Pomeranos
seus 25 anos de existência, este alterou sua no Espírito Santo (28 de junho de 1859). A obra
denominação para Nova Notícia, embora foi concebida pelo artista plástico Geruelson
mantendo a contagem das edições e dos anos de Chaves Rodrigues e sua inauguração ocorreu em
publicação. 27 de junho de 2009, em cerimônia inserida nas
atividades comemorativas a esta data histórica,
conforme consta em sua placa inaugural.
[ 60 ]
Foto 25 – Representação do embarque dos pomeranos Este monumento também traz outro
no porto de Hamburgo
atributo da re-pomeranização. Diferente
de tempos anteriores, o simbólico desta
escultura oficial remete a uma imagem
coletiva e impessoal, não focalizando em
personalidades notórias.36 Mais do que
simular os primeiros imigrantes colonos,
Foto: Swami C. Bérgamo, 2018.
esta obra pode aproximar-se da
Foto 26 – Representação da chegada dos pomeranos realidade do pomerano mais humilde, em
em Vitória - ES
sua simplicidade autêntica, com sua
família.

O homem, um agricultor, pés descalços,


de chapéu para proteger do sol, mangas e
calças arregaçadas, com sua ferramenta
Foto: Swami C. Bérgamo, 2018. de trabalho. A mulher, uma agricultora e

Foto 27 – Representação da abertura da primeira trabalhadora do lar, de chinelo, calça em


estrada no morro Marquardt
baixo do vestido (proteção do frio e dos
mosquitos), lenço na cabeça e o filho no
colo, em segundo plano, atrás do marido.
Certamente, uma construção patriarcal,
mas imperceptível ao senso comum.

Foto: Swami C. Bérgamo, 2018.


Na perspectiva do observador alheio, a
obra ganha vida. É como se essas
Foto 28 – Representação da primeira Cooperativa
Avícola em Santa Maria de Jetibá “pessoas” parassem por um instante suas
tarefas cotidianas para contemplar tudo
o que foi construído pela força de seu
trabalho e dedicação, ao mesmo tempo
em que sabem que há muito serviço pela
frente. Sob os seus pés, a base de sua

Foto: Swami C. Bérgamo, 2018. história.

36 Na re-pomeranização, a promoção de agradecimentos. Em geral, a construção desta


“personalidades notórias” (autoridades, políticos, narrativa (cautelosa ou envolvente), traz alguns
empresários etc.) não se apresenta na obra em si, ingredientes: humildade, deferência à Deus,
mas nos discursos públicos (inaugurações, alusão à elementos coletivos e a exaltação do
cerimônias, festas, entrevistas etc.), em povo pomerano e sua cultura.
impressos ou em faixas e placas de
[ 61 ]
Embora a simbologia possa trazer um identitários de outrora não são mais os
certo romantismo, uma narrativa épica mesmos, pois há diferenças advindas do
que a data comemorativa tende a processo histórico, sobretudo pelo
construir, esta família pomerana, tal qual posicionamento enquanto classe social.
a estátua apresenta, existe de fato ainda Deste modo, manter a crença em uma
em Santa Maria de Jetibá, especialmente identidade estática, como o monumento,
no campo, com o seu modo de vida comum a todos, pode construir a ideia
rural.37 Assim, trata-se de um signo que ilusória que há entre o povo pomerano
estabelece uma simpatia muito forte com uma unidade entre iguais.
a maioria da população local,
Schmidt (2015, p. 39) diz que
fortalecendo uma imagem auto
afirmativa da cultura e história do povo
“[...] a identidade
pomerano. Por outro lado, tal sentimento
pomerana é um
pode ser usado como uma poderosa processo de permanente
construção e não pode
ferramenta política38 ou ideológica, para
ser percebida como algo
ocultar ou soterrar conflitos presentes imutável e acabado [...]”.
nesse processo histórico.
Tressmann (2005), criticando a visão de
De fato, ao chegarem no território onde é
que a cultura é inabalável, apresenta o
a atual Santa Maria de Jetibá, as famílias
aspecto dinâmico da cultura pomerana e
de imigrantes eram, em geral, como são
sua relação de continuidade:
representadas pelo monumento.
Pertenciam à mesma classe social, [...] a cultura é um processo dinâmico
produzido no tempo histórico, de acordo
embora na Europa se ocupassem de com uma situação social. Esta é
construída, reinventada e recriada a todo
ofícios diversos. No Brasil, estavam todos o momento; trata-se mais de um
processo de interação do que de
sujeitos a extremas condições adversas. isolamento. [...]
Como diria Bergamin (2015), [...] As transformações que se deram
entre os pomeranos guardam, assim,
encontravam-se em situação de penúria. uma relação de continuidade com as
práticas culturais da época anterior à
imigração; o passado e o presente estão
Com o passar dos anos, essa igualdade relacionados (TRESSMANN, 2005, p.
164).
social não está dada mais. Os laços

37 “A cultura pomerana, baseada na organização SUSTENTÁVEL DOS POVOS E COMUNIDADES


da vida diária familiar e no trabalho na lavoura, TRADICIONAIS, 2016a).
pouco mudou desde a chegada dos primeiros
imigrantes europeus. É alto o grau de 38O conteúdo e o próprio impresso intitulado “O
permanência de tradições e valores originais, Progresso em Revista” (SANTA MARIA DE
mantendo o espírito de família, a religiosidade, a JETIBÁ, 2012), como síntese publicitária dos
língua e o comunitarismo de uma forma que já mandatos subsequentes da mesma gestão
praticamente não existe mais na Europa” municipal (2005-2008 e 2009-2012), são
(COMISSÃO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO exemplos da apropriação política dos signos
presentes na re-pomeranização.
[ 62 ]
Concluindo esta etapa da viagem Igualmente, é importante perceber que
formativa, percebe-se que as edificações nenhuma das leis de Santa Maria de
abordadas nesse breve trajeto, de alguma Jetibá, aqui abordadas, contemplam os
forma, estão repletas de elaborações proprietários das casas tradicionais
históricas problemáticas, de pomeranas com qualquer benefício,
superficialidades dos signos culturais da especialmente as localizadas no campo
reprodução da vida, de reinvenções (Foto 30). Este fato só fortalece a tese de
espetaculosas da memória (tradições que tal legislação seguiu um padrão
inventadas)39 e de construções de adotado por cidades turísticas do sul do
identidades de fachadas. A arquitetura Brasil, calcado predominantemente na
materializada, seja pela re-germanização re-germanização (mais teuta e menos
ou pela re-pomeranização, são marcas pomer) via a adoção do neo-enxaimel
dos diversos tempos presentes como expressão dessa dita valorização
simultaneamente por toda a cidade. cultural.

Foto 29- Antiga casa pomerana na propriedade rural da família Schmidt (Alto Santa Maria)

Foto: Swami C. Bérgamo, 2016

Assim, essa política privilegia a constituição mercadorizada de um padrão estético


estereotipado na recriação de uma memória coletiva como “típica” da cultura germânica
local, em detrimento da valorização e preservação de uma arquitetura original ou mais
próxima da originalmente utilizada pelos pomeranos que chegaram na região da atual
Santa Maria de Jetibá. Portanto, em termos de legislação, esta é uma condição que ainda
não foi observada e persiste até os dias atuais.

39 “Por ‘tradição inventada’ entende-se um estabelecer certos valores e comportamento


conjunto de práticas, normalmente reguladas por através da repetição, o que implica,
regras tácita ou abertamente aceitas; tais automaticamente; uma continuidade em relação
práticas, de natureza simbólica, visam ao passado” (HOBSBAWN, 1997, p. 9).
[ 63 ]
Pela cidade
Trajeto e mapa urbanos em Santa Maria de Jeti bá (Sede) 40

B) Antiga sede da
Secretaria Municipal de Cultura

A) Composição
de edifícios
em neo-enxaimel

C) Efeito Kitsch
em prédio com neo -enxaimel

D) Sede da COOPEAVI

E) Monumento do Imigrant e Pomerano


e Praça dos Três Poderes

40 Fotos de Swami C. Bérgamo, exceto item B (IBGE, [19--]).


[ 64 ]
Figura 10 – Roteiro contra-hegemônico urbano em Santa Maria de Jetibá - ES (Sede)

Fonte: Google (2018). Disponível em: < encurtador.com.br/hxFR7>. Acesso em: 01 dez. 2018.

Legenda:
(A) Pommerhaus Hotel.
(B) Edificação Pública em neo-enxaimel.
(C) Prédio em neo-enxaimel (efeito Kitsch).
(D) Sede da Coopeavi.
(E) Prefeitura Municipal (frente).
(F) Câmara Municipal (frente).
(G) Monumento do Imigrante Pomerano e Câmara Municipal.
(H) Monumento do Imigrante Pomerano e Prefeitura.
(I) Monumento do Imigrante Pomerano.

[ 65 ]
Arquitetura tradicional pomerana
A casa anti ga e o modo de vida

Nesta etapa da viagem formativa opta-se pelo campo e


pela vivência do rural. Pretende-se conhecer as PROBLEMATIZAÇÃO:
peculiaridades que caracterizam a arquitetura da Conhecer as peculiar-
tradicional casa pomerana,41 suas raízes históricas, seus dades que caracterizam a
arquitetura da tradicional
significados culturais e identitários que compõem o modo casa pomerana, suas
raízes históricas, seus
de vida do povo pomerano. Busca-se conhecer as políticas significados culturais e
identitários que
públicas envolvidas nesta questão e os impactos do compõem o modo de vida
processo de mercadorização da cultura. Traz ainda neste do povo pomerano.

diálogo a experiência do memorial Waiand’s Huus com a DIÁLOGO TEÓRICO:


trajetória da professora Marineuza Waiand e a resistência Estudos sobre o modo de
da comunidade rural de Alto Santa Maria, em Santa Maria vida pomerano
(identidade, cultura e
de Jetibá-ES. resistências) e sobre a
arquitetura enxaimel
adaptada à realidade
Inicia-se este caminho constatando um fato impactante. brasileira pelos primeiros
Enquanto a política pública privilegia o inautêntico, imigrantes: a casa
pomerana.
valendo-se do neo-enxaimel, as edificações com real valor
PRINCIPAIS FONTES:
histórico acabam sendo destruídas, seja pela deterioração
natural com o tempo ou deliberadamente para gerar Bianca Aparecida Corona
(2012), Adriele Schmidt
algum ganho econômico ao proprietário. Nesta última (2015), Edineia Koeler
(2016), Claudete Beise
condição, identificam-se duas motivações principais: a) Ulrich, Edineia Koeler e
Erineu Foerste (2017) e
uma inserida dentro do processo de crescimento urbano Lucilene Buss (2018).
e a valorização imobiliária na cidade; e b) a
comercialização de “madeira de demolição” para a
construção civil de edificações coloniais ou móveis.42

41Refere-se à casa construída pelos imigrantes pomeranos, com técnica enxaimel, sistema próximo ao
baixo-saxão, com adaptações impostas pela realidade material e climática existente no Espírito Santo.
Também chamadas de “antiga casa pomerana” ou “típica casa pomerana” ou simplesmente “casa
pomerana”.

42Sobre o comércio das casas tradicionais pomeranas em Santa Maria de Jetibá, encontra-se um registro
significativo e uma denúncia explícita sobre esta prática no livro de autoria de Bianca Aparecida Corona,
publicado em 2012, com o título Pomerisch Huss: a casa pomerana no Espírito Santo.
[ 66 ]
No início dos anos 2000, forte indicativo que é necessário
despertar indagações para refletir sobre
[...] se constatava escassez de bibliografia
sobre a tipologia arquitetônica a cidade atual e para onde ela segue. Uma
pomerana, assim como o descaso por sua
conservação. Mais que isso, também se cidade que nas últimas décadas vivencia
constatou uma destruição inescrupulosa
das casas pomeranas para obtenção do
uma intensa transformação econômica,
que se conhece como “madeira de que tem gerado diretamente alterações
demolição”, principal matéria-prima
para a confecção de móveis e objetos de no seu modo de reprodução material da
decoração que, atualmente, ocupam lutar
de destaque na arquitetura de interiores. vida e suas relações socioculturais. Nas
Essa descoberta iniciou uma verdadeira
“luta de conscientização” dentro das palavras de Corona (2012, p.17):
comunidades pomeranas do Espírito
Santo, ganhando repercussão nacional,
ganhando defensores, forjando
Semeia-se a
ferramentas de resistência, entre as
quais a presente obra que obteve o apoio redescoberta, a
imprescindível da Secretaria [Estadual] reaproximação do povo
de Cultura do Espírito Santo (CORONA, pomerano com sua
2012, p. 15-16). própria residência.
Estando Santa Maria de Jetibá no
contexto histórico da re-pomeranização, Portanto, é central saber: quais são as
a administração municipal adotou a características da arquitetura residencial
postura de apoiar a mobilização ocorrida pomerana em Santa Maria de Jetibá (ES)?
na comunidade pomerana contra a
Corona (2012, p. 47) registra que a
destruição das casas para o comércio da
organização da casa do imigrante
madeira de demolição (FERNANDES,
pomerano no Espírito Santo assemelha-
2009, p. 3-7).
se à organização da casa dos camponeses
Por outro lado, o poder público não pomeranos ainda na Europa, com
alterou sua legislação para estimular a influência inclusive na planta baixa de
manutenção da casa tradicional suas residências, da implantação até a
pomerana, seja no campo ou na cidade. relação com o seu entorno.
Por sua vez, a mobilização para impedir a
Isto posto, destaca-se as características
destruição da casa pomerana torna-se
gerais da casa pomerana no Espírito
também muito limitada, especialmente
Santo (CORONA, 2012, p. 53-73; BUSS,
na malha urbana, devido ao crescimento
2018, p. 43-47):
do mercado imobiliário.

Assim, a casa tradicional pomerana na


cidade torna-se um empecilho ao
“progresso” que emerge da nova Santa
Maria de Jetibá do século XXI. Este é um

[ 67 ]
a) Localização: a casa é construída ao Figura 11 - Esquema de implantação da casa do imigrante
pomerano
“pé do morro”, tendo vegetação ao
fundo, com a cumeeira paralela à
estrada, sempre depois de uma curva
(revelando-se aos poucos aos
passantes), objetivando não ser
avistado facilmente, percebendo com
antecedência a aproximação de
estranhos, garantindo a proteção da
família.
Fonte: Corona (2012).
b) Edificações do entorno: além da
casa principal, que pode ser c) Recursos naturais: a casa fica
geminada com outras destinadas aos próxima de uma fonte de água
filhos, há em seu entorno as seguintes potável (rio, lago, nascente, etc.),
edificações: o paiol (em geral foi a tendo aos fundos o pomar e a mata
primeira moradia da família e que (em geral, a Mata Atlântica ou
passa ter a função de depósito), o remanescente desta) e na frente um
forno à lenha (usado para assar pequeno jardim com flores e uma
principalmente pães e bolos), a horta (às vezes na lateral).
cozinha (as mais antigas são feitas
d) Sistema construtivo e planta baixa:
fora da casa, devido ao temor de
a casa pomerana é sempre
incêndios, pois usava fogão à lenha),
retangular, em tamanhos diversos,
o banheiro (destinado às
construída sobre pilotis (moleques)
necessidades fisiológicas, ficava fora
de sustentação, que elevam a casa
da casa, sendo um fosso coberto com
acima do chão, formando um porão
uma casinha de madeira com um
alto e aberto.43 Não possui corredor,
orifício no piso), um local para a
sendo a sala o ambiente central e os
criação de animais (curral,
demais cômodos estão dispostos em
chiqueiro ou galinheiro) e uma cerca
sua volta. Na parte frontal da sala, há
de lascas de madeiras ao redor da
o acesso à varanda retangular, que
casa.

43 Na Europa, o porão era fechado e erguido com material), proteção (dificultava o acesso de
pedras. No Brasil, essa foi uma solução animais selvagens ou peçonhentos) e higiene
encontrada pelos imigrantes para três (circulação de ar e evitar a umidade) (CORONA,
finalidades: armazenamento (madeira e outro 2012, p. 63-67; BUSS, 2018, p. 45).
[ 68 ]
fica comprimida entre dois quartos44 Figura 12 - Planta baixa da Casa Pomerana

quadrados. A técnica construtiva é o


enxaimel em madeira45 com encaixe
reto, feito à mão, podendo ser
montadas e desmontadas. O telhado
é simples (geralmente de duas
águas), coberto com telhas de
madeira (a diante substituídas por
telhas de cerâmica).

e) Acabamento: as paredes são


Fonte: Corona (2012).
preenchidas com taipa de mão46 (pau
réguas de madeira. Após sua
a pique) ou tijolos de barro cru47
secagem, as paredes são cobertas
(adobe), técnicas usadas na Europa
com cal virgem e as janelas, portas e
para construções rudimentares,
varandas são pintadas na cor azul
como celeiros e currais ou para
celeste. Assim, a casa pomerana
moradias mais humildes. O
tradicional é caracterizada pela
fechamento das paredes era feito só
pintura branca e azul. As fachadas
após o encaixe das janelas e portas. As
diferenciam-se pela a simetria, tendo
janelas são em forma de guilhotina
em geral quatro janelas na fachada
ou abrem para fora. A janela do oitão
principal: duas no recuo da varanda,
é localizada junto ao sótão, na parte
dispostas uma de cada lado da porta
triangular formada pelo telhado de
central, e as outras duas que se
duas águas, permitindo avistar a
localizam nas alvenarias avançadas,
chegada de pessoas estranhas. O
uma à esquerda e outra à direita.
reboco é feito de barro e alisado com

44 Corona (2012) faz referência a um desses vermes, brocas, insetos e à umidade, sendo ideais
quartos (quando há uma porta de um deles para para o uso em fundações (mourões). Já nas
a varanda) como sendo o “quarto do namoro”. A esquadrias, varandas, tábuas do assoalho e
tradição vem dos tempos medievais, quando o tabeiras de telhado, era utilizado o Cedro (BUSS,
senhor feudal tinha o direito de desvirginar a 2018, p. 46).
noiva antes do casamento. Para evitar isso, existia
o quarto que permitia que o casal pudesse manter 46Taipa de mão consiste em uma estrutura de
contato íntimo antes do casamento: “Tudo era varas de madeira (ripas de palmeiras, galhos etc.)
feito de forma a entender que os pais não sabiam entremeadas na forma de gradeamento,
da visita do rapaz ao quarto da moça. Assim, amarrados com cipós e juçaras, preenchido de
independentemente da moça engravidar, barro atirado com as mãos, resultando em
armava-se uma cena de flagrante, para que, de paredes leves aproximas de 15 cm (CORONA,
toda a sorte, a notícia se espalhasse e chegasse 2012, p. 59; BUSS, 2018, p. 46).
aos ouvidos do senhor feudal, que perdia o
interesse pela jovem” (CORONA, 2012, p. 53). 47O adobe (tijolo cru) é um tijolo que não sofre
um processo de cozimento e é secado apenas ao
45Em Santa Maria de Jetibá, eram comuns a sol (CORONA, 2012, p. 60).
Graúna, Jacarandá e o Ipê. Eram resistentes aos
[ 69 ]
Em uma visão sistematizada e concisa, tradicional pomerana difere conforme as
Buss (2018, p. 47) expõe a elaboração de condições típicas de seu lugar, os sujeitos
um painel com o passo a passo do método construtores e o tempo.
construtivo da casa pomerana:
Em seus estudos sobre as construções
germânicas de Santa Catarina, Veiga
Método Construtivo da Casa Pomerana
(2013, p. 96) destaca a tradição no modo
01 Derrubada da mata e escolha do local;
como se constrói a estrutura de madeira
02 Extração e preparo das peças de madeira;
nesta técnica. Weimer (1994, p. 59 apud
Enterramento dos mourões seguindo
03
projeto do marceneiro (fundação da casa); VEIGA, 2013, p. 96-97) registra os

Os mourões enterrados ficavam com parte detalhes do procedimento aqui


de suas peças cerca de um metro acima do ordenados: a) as madeiras eram
04
solo e eram trabalhados para receber a
estrutura da casa; montadas e encaixadas primeiramente
05 As vigas eram colocadas sobre os mourões; na horizontal no chão, não diretamente

06
Estruturava-se as colunas sobre as vigas e na fundação (mourões); b) cada peça
as tramas de pau a pique;
recebia duas marcações, indicando a
Iniciava-se o encaixe das peças em
07 enxaimel, para receber as janelas, portas e parede à qual pertencia e a ordem que
outras aberturas;
ocupava dentro do tramado; c) após a
As vigas da cobertura eram assentadas
08 estrutura de madeira da parede estar
sobre as colunas;
pronta no solo, esta era desmontada,
Construía-se a estrutura da cobertura
09 normalmente em duas águas em estilo possibilitando a preparação das demais;
enxaimel;
d) montadas as estruturas de todas as
A cobertura era de tabuinhas de madeira
10 que eram presas na estrutura da paredes, estas são postas sobre a
cobertura;
fundação e constrói-se a estrutura do
11 Assentava-se o piso e o forro de madeira;
telhado; e) com a estrutura de madeira
Iniciava-se o fechamento das paredes em
12 finalizada, é realizada uma festa antes de
pau a pique ou tijolo cru;
concluir a casa; e, por fim, f) é feito a
Alisava-se o reboco e fazia-se o
13
revestimento com cal virgem; cobertura do telhado e o preenchimento

14
Instalação do lambrequim no beiral da das paredes.
cobertura e guarda-corpo na varanda;

15
Pintura das esquadrias e varandas da cor As variações ocorrem mesmo em
azul celeste;
unidades próximas dentro do próprio
Cerca de lascas de madeira com altura
16 entre um metro eram postas ao redor da município ou estado e, certamente, em
casa.
outras regiões do país (VEIGA, 2013, p.
Fonte: Buss (2018, p. 47).
100). É o que demonstra a Figura 13, na
Aqui retrata-se uma realidade mais
qual o item “a” traz o caso capixaba e os
usada no Espírito Santo, sobretudo em
demais apresentam referências gaúchas:
Santa Maria de Jetibá. Porém, a casa
[ 70 ]
Figura 13 - Plantas baixas e fachadas de casas pomeranas (Espírito Santo e Rio Grande do Sul)

Fonte: a) Corona (2012); b) Weimer (2005); e, c) Bosenbecker (2012).


Nota: figura editada por Bosenbecker; Treichel; Thum (2017, s.p.).

O modo de vida e as transformações desta tradição e seu vínculo com as


Até aqui foi possível identificar as práticas de manutenção da vida.
características da arquitetura residencial
Assim, remetendo-se à história, é
tradicional pomerana, compreendendo
importante considerar que, após meses
sua ancestralidade há tempos remotos na
de uma longa e exaustiva jornada, desde
Europa (partido arquitetônico e técnica
a Europa até chegar às terras designadas
construtiva), um saber vinculado a um
no Brasil, famílias inteiras passaram por
modo de fazer, transmitido oralmente e
muitos estorvos, adaptações (climáticas,
no lidar prático entre pessoas que não
alimentares, culturais etc.) e desalentos
eram profissionais da construção civil
(CORONA, 2012, p. 72; VEIGA, 2013, p.
(implantação e adaptação ao Brasil).
95; TRESSMANN, 2005, p. 156-157).
Porém, para além dessas informações, é
Todavia, a união e a vida comunitária de
necessário conhecer o modo como eram
colaboração mútua eram os meios para a
estabelecidas as relações que
sobrevivência, provendo-se basicamente
proporcionam a edificação da casa
da agricultura de subsistência. Porém,
pomerana, especialmente no momento
esse isolamento e essa comunhão
da chegada na região serrana do Espírito
fizeram com que a comunidade
Santo, em condições bastante adversas.
pomerana mantivesse suas raízes
Trata-se de um exercício de culturais vigorosas na região (BUSS,
compreensão sobre o impacto identitário 2018, p. 35).

[ 71 ]
Assim, a solidariedade e a cooperação emocionam, estabelecendo laços de afeto
recíproca constituíam a história do povo marcantes entre seus membros. Schmidt
pomerano desde sua chegada, em efeito (2015, p. 129), ao pesquisar sobre a
das condições materiais reais para a comida na cultura pomerana nos
manutenção e reprodução de sua municípios de Santa Maria de Jetibá e
existência. Itarana (ES), compartilha desta
compreensão, identificando que “[...] a
Com o decorrer do tempo, esse modo de
partir do trabalho também é possível
fazer coletivo ganha outras dimensões do
perceber a identidade dos pomeranos”.
cotidiano, fazendo-se presente na
Assim, a autora considera o trabalho um
derrubada da mata, abertura de estradas,
marcador da identidade pomerana,
mobilização pela a assistência religiosa,
especialmente o mutirão e as relações
organização de casamentos, realização
sociais e simbólicas que perpassam o
de festas, apoio aos ritos do
trabalho agrícola e a organização coletiva
funeral/sepultamento e a construção de
das festividades que são transpassadas
casas, paióis, templos, escolas, cemitérios
pela solidariedade e reciprocidade.
e centros comunitários. É o que
caracteriza o mutirão: Atualmente, identifica-se uma
diminuição desta solidariedade e
O mutirão ou ajuntamento é um
sistema de trabalho não assalariado reciprocidade entre o povo pomerano,
entre vizinhos e amigos que implica
reciprocidade. É uma prática comum especialmente entre as gerações mais
entre os pomeranos, principalmente no
período da colheita de café, capinas,
jovens. Mas, mesmo em proporções
roçados, construção de casas, paióis, menores, estas ainda ocorrem em
preparativos do casamento ou abertura
de estradas. Tal tarefa não é remunerada, algumas tarefas semelhantes às dos
mas espera-se dos vizinhos o mesmo
gesto de solidariedade quando for antepassados e outras diferentes
necessário. O dono da casa arca com o
almoço, café da tarde e, no final dos (SCHMIDT, 2015, p.178). Tendo o
trabalhos, costuma oferecer um pequeno
baile (TRESSMANN, 2005, p. 244, grifo
exemplo da festa do casamento
nosso) pomerano,48 uma tradição ainda muito
Embora o mutirão seja uma solução significativa, notam-se alterações nas
prática para lidar com as dificuldades relações laborais que envolvem a sua
imediatas de uma comunidade, esta realização.
envolve relações sociais e culturais que

48 Utiliza-se aqui o termo para


lidar com os rituais geração). Assim, exclui dessa tentativa de
e festejos que se aproximam do casamento sistematização e registro, as festas de casamentos
tradicional pomerano, praticado originalmente realizados por descendentes de pomeranos, mas
por seus antepassados, com raízes históricas e que não utilizam como referencial o casamento
culturais europeias, adaptadas à realidade tradicional pomerano.
brasileira pelos imigrantes pomeranos (primeira
[ 72 ]
Tais mudanças afetam profundamente as conhecimento e da riqueza socialmente
integrações afetivas construídas nos gerados. Deste modo, alteram-se as
ambientes de convivência solidária e de condições socioeconômicas das famílias,
reciprocidade, repletas de sentido não sendo o mutirão uma prática
identitários e vínculos culturais com sua essencial à sobrevivência de todos.
ancestralidade pomerana, constituída
Deste modo, considerando a importância
historicamente. Pois, a relação do povo
do casamento para a comunidade
pomerano com a festa do casamento
pomerana, respeitando sua celebração
tradicional é orgânica. As pessoas
independente da forma como este é
contribuem com esse momento de várias
realizado, genericamente, é possível
formas (antes, durante e depois da festa),
verificar três tipos de festas de
conforme regras sociais compreendidas
casamento pomerano atualmente no
dentro deste círculo cultural, gerando
município de Santa Maria de Jetibá:
satisfação, valorização/honra, alegria,
troca de experiências, amizade, gentileza a) por sua condição socioeconômica e
e sentimento de cooperação e união em de classe social, há famílias que
torno do mesmo propósito (SCHMIDT, contratam buffet que oferece um
2015, p. 141). cardápio no estilo casamento
pomerano e garçons, cerimonial com
Por que a solidariedade e a decoração sofisticada e com toques
reciprocidade, tão necessárias da tradição pomerana (a mesa dos
no enfrentamento das noivos, por exemplo), serviços de
dificuldades em comum, que fotografia e filmagem (com
outrora viabilizaram a produção/edição de álbum e material
construção da casa pomerana e a
audiovisual), uma banda de forró ou
organização do casamento
DJ (com equipamento de som e
pomerano, vêm perdendo
iluminação) e um tocador de
espaço na comunidade?
concertina para o momento da dança
dos noivos;
Ocorre, de fato, é a alteração do modo de
b) há famílias que, pelo princípio da
manutenção da vida, evidenciada no
praticidade ou economia, adotam a
mundo do trabalho e contextualizada a
cobrança de ingresso dos
um processo histórico que perpassa por
desconvidados, negociam o uso de um
modificações tecnológicas, nas redes de
espaço (clube ou área de eventos) em
comunicação e logística, nos meios de
troca da comercialização de bebidas
produção, na organização social do
na festa pelo proprietário do imóvel,
trabalho e na forma da apropriação do
[ 73 ]
contratam o grupo de cozinheiras, rituais da dança dos noivos e o quebra-
alguns copeiros e o tocador de louças meras “encenações” que fazem
concertina para animar o baile e o parte de um roteiro para caracterizar
momento da dança dos noivos; e, (certificar) o evento como sendo um
c) há famílias, pela manutenção da casamento pomerano? Ou poderiam ser
tradição ou por condição econômica, uma manutenção nostálgica, distante da
em especial as que vivenciam maior vida cotidiana, das relações com as
reciprocidade e solidariedade no pessoas e seus afazeres práticos?
modo de vida rural em sua
A casa-memória e as resistências
comunidade, organizam a festa do
Com tais problematizações na bagagem,
casamento pomerano mais próximo
é necessário seguir a viagem formativa,
de suas origens, mesmo com
com o desafio de conhecer in loco a casa
pequenas alterações de ordem
pomerana, bem como experiências de
prática postas pela
manutenção da cultura e memória do
contemporaneidade.
povo tradicional pomerano com vínculos
Observando os elementos descritos, entre o modo de vida rural atual e sua
surgem questões sobre a possibilidade ancestralidade histórica. Com esse
da configuração de uma nova identidade propósito, instrumentalizados de
pomerana, com os sinais dos tempos conhecimentos sobre a casa pomerana,
atuais, transpassada por um recorte compreendendo as relações de
classista advinda da alteração dos modos solidariedade e reciprocidade deste
de reprodução da vida. povo, é possível conhecer agora o
interior desta casa.
Assim, pergunta-se: as práticas
apresentadas no primeiro caso seriam Essa estação da viagem formativa fica no
ressignificações de alguns costumes (o que Memorial Pomerano Waiandt’s Huus
é próprio do dinamismo cultural)? Ou (Foto 29), de propriedade da família
seriam reproduções de alguns rituais já Waiandt, na comunidade de Alto Santa
mercadorizados – como ocorre na Maria, interior de Santa Maria de Jetibá.
arquitetura neo-enxaimel e sua aplicação
Este trajeto tem como protagonista a
estereotipada das tábuas de madeira nas
professora aposentada Marineuza
fachadas dos prédios, vazios de sentido,
Plaster Waiandt, cuja a história pessoal e
pois não trazem ingredientes essenciais da
profissional é intrínseca aos processos de
festa do casamento pomerano
resistências e lutas por direitos sociais de
(envolvimento nos momentos da partilha,
sua comunidade.
da união, do mutirão)? Seriam, assim, os

[ 74 ]
Foto 30 – Memorial Pomerano Waiandt’s Huus “[...] se constitui em símbolo de
resistência e superação. [...] enfrentando
um sistema público cada vez mais
interessado na padronização das escolas
e em ranqueá-las por meio de resultados
de avalições externas” (ULRICH;
KOELER; FOERSTE, 2017, p. 154).

Integrada na comunidade, Marineuza51


dedica-se ao que ela chama, com afeto, de
Fonte: Waiands Huus (2016).49
“meu cantinho pomerano”, ou seja, o
Na década dos anos 1990, a comunidade Memorial Pomerano Waiandt’s Huus
de Alto Santa Maria mobilizou-se em (KOELER, 2016, p. 27).
lutas reivindicatórias pela ampliação do
atendimento educacional e por uma A casa herdada de seu sogro passou por

educação que dialogassem com os um processo de recuperação,

saberes empíricos do mundo rural. Esse integrando-se ao restante da

intenso movimento coletivo culminou na propriedade e a comunidade local,

regularização da Escola Estadual de dentro de um propósito de educação

Ensino Fundamental e Médio “Fazenda popular sobre a cultura e memória do

Emilio Schroeder” e a adoção da povo tradicional pomerano e

Pedagogia da Alternância50 nesta agroecologia (ULRICH; KOELER;

unidade de ensino (KOELER, 2016, p. 75- FOERSTE, 2017, p. 150-151). A casa-

78). Em defesa dessa escola e da memória é aberta para visitas pré-

Pedagogia da Alternância, a comunidade agendadas e tem recebido

ainda se mobiliza intensamente nos dias pesquisadores, escolas, grupos

atuais. A EEEFM Fazenda Emilio organizados e turistas.

Schroeder

49Disponível em: <https://www.facebook.com/ agricultores de Alto Santa Maria: a reabertura da


waiandshuus/photos/a.238853733167251/238 única escola desta região. Assim, mesmo sem
853739833917/?type=3&theater>. Acesso em: formação profissional e muito jovem, Marineuza
17 jul. 2018. assumiu a tarefa com engajamento a uma causa
de sua comunidade, pois o prefeito do então
50 A Pedagogia da Alternância reveza períodos de município de Santa Leopoldina somente
aprendizagem na escola e em casa, sendo esta garantiria o atendimento escolar sob a condição
uma adaptação às condições do meio dos de ter uma professora da própria localidade.
educandos (artigo 28 da LDB). Assim, integra o Marineuza, para expressar seu
conhecimento empírico ao cientificamente comprometimento e gratidão pela confiança da
sistematizado na sessão escolar. Para sua prática, comunidade, participava ativamente de outros
buscam-se integrações com os familiares e espaços da vida comunitária (igreja, ensino
associações para assegurar a efetiva interação e confirmatório, reuniões de associações etc.). Em
monitoramento dos estudantes na sessão de seu trabalho, buscou o envolvimento das famílias
alternância (KOELER, 2016, p. 79). para auxiliar a contornar as dificuldades que
surgiam. Também se valia da criatividade,
51Em 1979, Marineuza Plaster Waiandt torna-se inovando em suas práticas e contextualizando-as
professora aos quinze anos de idade para garantir à realidade rural e cultural pomerana local
uma difícil conquista coletiva das famílias de (ULRICH; KOELER; FOERSTE, 2017, p. 146-148).
[ 75 ]
Marineuza, vestida como suas assim, acabam por compor também as
antepassadas, guia os visitantes por cada memórias desta Huus.
espaço da casa com relatos bilíngues
Nessa trajetória da professora Marineuza
(pomerano e português) de suas
e da história de organização comunitária
memórias individuais e coletivas
das famílias de Alto Santa Maria, onde
relativas à cultura pomerana.
quase 100% da população da região fala
Apesar de integrar um circuito turístico o pomerano como língua materna
(Terras Pomeranas), a experiência (ULRICH; KOELER; FOERSTE, 2017, s.p.),
encontrada no Waiandt’s Huus é é possível identificar a permanência de
significativa para a cultura e a história um modo de vida característico e
pomerana, pois não se trata de um essencial à existência dos primeiros
pastiche ou uma reinvenção de costumes imigrantes pomeranos, ou seja, a
ou ainda uma encenação de um modo de presença de práticas da solidariedade, da
vida idealizado e distorcido. Em sua união e a vida comunitária de
propriedade, as tarefas rurais cotidianas colaboração mútua.
não foram abandonadas. Assim, embora
Certamente, esse aspecto da identidade
a atividade turística possa proporcionar
reflete a organização do trabalho local, ao
renda, esta é uma continuidade do modo
menos em parte. É nesta localidade, por
de vida desta família: a agroecologia, a
exemplo, ainda na década 1980, que foi
educação, a vida comunitária e a cultura
organizada e fundada a Associação de
pomerana.
Produtores Santamarienses em Defesa
Mas isso não é tudo e a viagem formativa da Vida (APSAD-VIDA), considerada a
ainda não acabou. Após percorrer os segunda associação de produtores
cômodos e os fascínios da casa-memória, alternativos52 criada no Brasil (SALLES,
de sentir os cheiros e os sabores da 2009 apud GOUVEIA, 2018, p. 139) e a
cultura pomerana, é feito um convite primeira do Espírito Santo. Dessa
para uma experiência com a natureza e o associação, originou-se outra,
toque da terra, registrando a presença de denominada a Associação de
seus visitantes com o plantio de uma Agricultores e Agricultoras de Produção
muda de alguma espécie nativa da Mata Orgânica Familiar de Santa Maria de
Atlântica, tendo ao lado desta uma placa Jetibá (Amparo Familiar), fundada em
com o nome da família ou do grupo que 2001 (GOUVEIA, 2018, p. 139).
passaram por essa experiência e que,

52
Entre o fim dos anos 1960 até o fim dos anos 1990, produziam alimentos de forma “alternativa” ao
era chamado de produtor alternativo os que convencional (GOUVEIA, 2018, p. 133).
[ 76 ]
Apesar de essa comunidade ser sobre a arquitetura tradicional da antiga
referência na produção agroecológica, a casa pomerana e sua relação estabelecida
maioria dos agricultores de Santa Maria historicamente com a vida desse povo.
de Jetibá ainda utiliza o modelo
Assim, o casamento e a casa pomerana
convencional (SANTA MARIA DE JETIBÁ,
são alguns exemplos utilizados para
2018c, s.p.). Esse tipo de produção
trazer a discussão sobre a modificação do
recorre ao uso de técnicas baseadas no
modo de vida e a reconfiguração da
modelo mecânico-químico-biológico da
identidade pomerana, a compreensão
Revolução Verde, como os insumos
dos limites de seus marcadores
químicos, agrotóxicos e sementes
identitários, o uso ideológico do discurso
geneticamente modificadas (GOUVEIA,
da valorização cultural e o risco de se
2018, p. 134).
adulterar a memória ou reduzir a cultura
Os conflitos entre as formas de produção de um povo a uma mercadoria em função
no campo na atual configuração de interesses comerciais. Por outro lado,
econômica em Santa Maria de Jetibá será dialeticamente, identificam-se
o tema abordado na próxima etapa da movimentos ou iniciativas de
viagem formativa. Por hora, após resistências às ações de mercadorização
concluir esse percurso, é posto guardar da cultura pomerana e de reinvenções do
nossos apetrechos e registros, refletindo passado.

[ 77 ]
Pelo campo
Trajeto e mapa rurais em Santa Maria de Jetibá (Alta Santa Mari a) 53

A) Mus eu da
Imigração Pomerana
Santa Maria de Jetibá
(Sede)

B) Produção agrícola em
Santa Maria de Jetibá
(campo)

C) Memorial W aiand’s Huus


Alto Santa Maria (campo)

D) Objetos do acervo da casa-memória


Memorial W aiand’s Huus
Alto Santa Maria (campo)

53 Fotos de Swami C. Bérgamo, exceto item C (Waiands Huus, 2016).


[ 78 ]
Figura 14 – Roteiro contra- rural em Santa Maria de Jetibá - ES (Alto Santa Maria)

Fonte: Google (2018). Disponível em: <encurtador.com.br/pqDOX>. Acesso em: 01 dez. 2018.

Legenda:
(A) Museu da Imigração Pomerana.
(B) Memorial Waiand’s Huus.

[ 79 ]
Arquitetura da produção
Entre o agronegócio e a agricultura famili ar

No início desse capítulo, foi anunciado a análise de três


tipos de construções que arrogam para si a identidade PROBLEMATIZAÇÃO:
pomerana, sendo estas: a) os prédios com “estilo Compreender o trajeto
germânico” que apontam para uma “identidade de histórico do estabele-
cimento industrial do
fachada”, vinculada a interesses turístico-econômicos; b) agronegócio;

a casa tradicional pomerana, vinculado ao modo de vida Desvelar os conflitos


incutidos na disputa de
dos primeiros imigrantes que chegaram a Santa Maria de concepções no modo de
Jetibá; por fim, c) a indústria do agronegócio na forma de produção agrícola em
Santa Maria de Jetibá.
granjas automatizadas que movimentam uma cadeia
DIÁLOGO TEÓRICO:
produtiva ampla em contraposição à agricultura familiar
de camponeses com propriedade de pequeno ou médio Estudos sobre o
desenvolvimento
porte. econômico deste
Município e sobre a
história da COOPEAVI .
Tendo percorrido as duas primeiras estações, dedica-se,
nesta seção, a compreender o trajeto histórico do PRINCIPAIS FONTES:

estabelecimento da industrial do agronegócio em Santa Everton Lazzaretti


Picolotto (2014), Márcia
Maria de Jetibá, atualmente materializado especialmente Cristina Bergamin (2015),
nas edificações das granjas automatizadas, analisando Joana Ferrari e Ana Paula
Costa (2014), Valter
ainda os elementos identitários do povo pomerano Bianchini e Jean Pierre
Passos Medaets (2013),
envoltos ou reivindicados nesse processo. Também se jornais, institutos e
órgãos governamentais.
propõe a desvelar os conflitos incutidos na disputa de
concepções no modo de produção agrícola, que flutuam
em meio a contraposição e a integração entre o agronegócio e a agricultura familiar.

Isso posto, com as principais granjas e seus complexos produtivos em mente, inicia-se
esse trajeto atentos ao objetivo perseguido por Bergamin (2015, s.p.) em sua pesquisa:
“[...] compreender o processo de transformação de Santa Maria de Jetibá, que vai de um
longo período de penúria dos agricultores ao crescimento econômico recente”. Se é visível
tal mudança em favor do crescimento econômico, convém perguntar não somente como
este é gerado, mas também como ocorre a sua apropriação.

[ 80 ]
Os dados54 levantados pela Secretaria h) uma das maiores cartas de crédito
Municipal de Agropecuária de Santa para a agricultura do Estado em
Maria de Jetibá tem muito a dizer sobre o 2017;
quadro atual de prosperidade no i) abastece a Ceasa Vitória com 40% de
município (SANTA MARIA DE JETIBÁ, todas as hortaliças e 70% das
2018c, s.p.): folhosas comercializadas;
j) 37% da água potável que abastece a
a) maior Produto Interno Bruto (PIB)
Grande Vitória vem do Rio Santa
Agrícola do Espírito Santo e o 46º PIB
Maria da Vitória;
Agrícola Nacional;
k) possui uma das maiores coberturas
b) possui aproximadamente um total de
vegetais do ES, com cerca de 40% de
6.275 propriedades rurais;
mata nativa preservada.
c) 75% das propriedades possuem
áreas de até 10 hectares, menor que 1
Os dados mostram que a pequena e
modulo fiscal da região (18 hectares);
média propriedade (Foto 31) são
d) 65,5 % da população reside no campo
predominantes tendo como base a
e 34,5% na cidade;
agricultura familiar. A produção e
e) maior produtor de ovos do Brasil;
comercialização da hortifruticultura se
f) responde por 93,00% da postura
destaca no cenário estadual. Mas,
comercial de ovos de galinha do
segundo Bergamin (2015), nas atuais
Espírito Santo (aproximadamente
condições técnicas, a avicultura é, de
130 avicultores) e 98,43% da
longe, a principal atividade econômica do
produção de ovos de codorna do
município. Conforme a autora:
Estado (14 avicultores);
g) referência Estadual em Produção A estruturação de uma cadeia produtiva
altamente verticalizada,55 o elevado nível
Orgânica (aproximadamente 120 de incorporação tecnológica, as
condições de temperatura favoráveis, a
produtores), com uma produção proximidade de grandes centros
consumidores, a qualidade da mão de
estimada anual/2018 de 6 mil obra [força de trabalho] e expansão do
toneladas; mercado consumidor, contribuíram
diretamente para que a avicultura de
postura se tornasse uma atividade

54 As fontes utilizadas são diversas: APSAD-VIDA para gerar o produto final. Além das granjas, os
avicultores de Santa Maria de Jetibá são
– Associação de Produtores Santamarienses em
proprietários de fábricas de ração, classificadoras
Defesa da Vida e de frotas de caminhões que viabilizam o
transporte de matéria prima para produção de
AVES , IBGE , INCAPER , IDAF , CEASA , Banco do
ração e a distribuição dos ovos. Essa estratégia
Brasil, SICOOB , BANESTES e Sindicato dos
diminui os custos e amplia o controle das etapas
Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras
da produção. Além disso, negociam
Familiares de Santa Maria de Jetibá-ES.
coletivamente a compra de matérias-primas,
reduzindo também os custos (BERGAMIN, 2015).
55 É a estratégia que prevê que a empresa
produzirá internamente os insumos necessários
[ 81 ]
competitiva em Santa Maria de Jetibá hortaliças ocorre em pequenas
(BERGAMIN, 2015, p. 183). propriedades e assentada no trabalho
familiar (BERGAMIN, 2015, s.p.).
O elevado nível tecnológico alcançado, o
Na avicultura, mesmo os de pequena ou
melhor do país, refere-se à produção
média produção conseguiram sobreviver
industrial de ovos. Assim, além do
associando-se à COOPEAVI . Fundada em
melhoramento genético já utilizado, todo
1964, esta foi crescendo gradativamente
processo produtivo foi automatizado, da
e buscando soluções para questões
cria ao empacotamento dos ovos.
práticas, viabilizando a produção e o
Segundo Bergamin (2015), tais “[...]
comércio:
inovações tornaram a avicultura de
postura bastante atrativa para o capital”. Os relatos positivos sobre a importância
da estrutura que a COOPEAVI
Foto 31 – Granja de pequeno e médio porte em Santa disponibiliza são muitos, principalmente
Maria de Jetibá. dos avicultores (FERRARI; COSTA, 2014,
p. 89).

Os agricultores familiares, porém, não


contavam com tal suporte. Das lojas da
COOPEAVI ou de empresas privadas,
conseguiam adquirir sementes
Fonte: IJSN (1985).56 Nota: Foto tirada por técnicos do geneticamente modificadas, agrotóxicos,
Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN) para execução de
projeto. p/b., 1985. fertilizantes, algum maquinário e
Se, por um lado, a avicultura de postagem equipamentos (micro trator, roçadeiras,
chegou a esse grau de desenvolvimento, motosserra etc.). O esterco57 de galinha
por outro, a agricultura passou por era comprado nas granjas:
processos diferentes:
A montante, esses agricultores estão
subordinados aos estabelecimentos
Constatou-se também, que existem comerciais locais, onde adquirem
importantes diferenças tecnológicas insumos agropecuários. Como a
entre a avicultura de postura e a assistência técnica oferecida pelos
produção de hortaliças convencionais e órgãos públicos é insuficiente para
orgânicas. Enquanto na primeira, atender à demanda dos agricultores, são
constituída somente por um produto, esses estabelecimentos que
grande parte das barreiras impostas pela recomendam a utilização de insumos,
natureza à reprodução do capital foi muitas vezes desnecessária. A jusante, os
eliminada pelas inovações técnicas, na agricultores estão subordinados a uma
segunda, constituída por inúmeras complexa rede de comercialização,
variedades de cultivos, muitas barreiras constituída por diferentes tipos de
naturais ainda permanecem. Assim, na comerciantes que se apropriam de
avicultura de postura predominam grande parte do excedente produtivo
granjas de porte grande e o trabalho (BERGAMIN, 2015, p. 184).
assalariado, enquanto a produção de

56Disponível em: <http://www.ijsn.es.gov.br propriedades fertilizantes para as hortaliças,


/bibliotecaonline/Record/16909>. Acesso em: disponível localmente, com baixo custo e que
17 jul. 2018. ainda contribui para a conservação” do solo
(BERGAMIN, 2015, p. 181).
57 Subproduto da avicultura de postagem, “[...]
trata-se de um adubo orgânico, com excelentes
[ 82 ]
Assim, não obstante o desenvolvimento temáticas e em lutas dos movimentos
da agricultura, o resultado do trabalho sociais.
desses agricultores é apropriado pelos
De fato, o associativismo é muito
chamados atravessadores (comerciantes
presente em Santa Maria de Jetibá.
que intermediam o vínculo entre o
Segundo informação da Secretaria
produtor e o mercado consumidor, seja
Municipal de Agropecuária (SANTA
este atacadista ou individual):
MARIA DE JETIBÁ, 2018c, s.p.), o setor
Considerando a escala de produção e os produtivo hortifrutigranjeiro organiza-
limites impostos pela natureza à
incorporação de inovações, a produção se atualmente em associações,
de hortaliças em Santa Maria de Jetibá
não se apresenta como uma atividade cooperativas, entidade classista,
atrativa para o capital (BERGAMIN,
2015, p. 184).
estabelecimentos de ensino e órgão
colegiado municipal:
Observe que os avicultores de pequeno e
médio porte estariam provavelmente em a) 21 associações de agricultores
situação semelhante, caso não tivessem familiares, com 2.010 associados;
se organizado coletivamente em um b) 4 cooperativas: COOPEAVI (2.466
sistema cooperativo. cooperados em Santa Maria de
Jetibá); SICOOB Santa Maria de Jetibá
A forma organizativa dos agricultores é
(7.866 cooperados); Garrafão Fruit
mais fragmentada. Muitos integram
(93 Associados); e, CAF Serrana (241
associações regionais, que lutam pela
Associados);
manutenção de estradas, organizam o
c) STRSMJ (7.374 sindicalizados);
uso coletivo de maquinários e outras
d) 2 Associações de produtos orgânicos:
demandas junto aos poderes públicos.
APSAD-VIDA e Amparo Familiar;
Outras até conseguem viabilizar meios
e) 2 escolas com pedagogia da
de acondicionamento temporário da
alternância: EEEFM Fazenda Emílio
produção e sua distribuição.
Schroeder (251 estudantes) e Escola
Também vários agricultores são Família Agrícola de São João de
sindicalizados ao Sindicato dos Garrafão (215 estudantes); e,
Trabalhadores Rurais Agricultores e f) Conselho Municipal de
Agricultoras Familiares de Santa Maria Desenvolvimento Rural Sustentável –
de Jetibá (STRSMJ), que encaminha CMDRS (ativo).
várias demandas da categoria
(assistência jurídica, previdenciária, Essa tradição organizativa remete ao
técnica etc.) representando-os em vários modo de vida estabelecido pelos
espaços colegiados, em reuniões primeiros imigrantes pomeranos que

[ 83 ]
chegaram na região da atual Santa Maria quais sempre apresentaram severa
disciplina para o trabalho que os
de Jetibá. Como já vimos na seção diferenciava dos demais imigrantes
europeus. Tal ética tornou-se uma
anterior, trata-se da solidariedade e qualidade desse grupo humano que por
ser proveniente de uma província onde
cooperação recíproca, uma prática social não teve acesso a propriedade da terra e
já vivenciada com êxito pela comunidade, por não ter uma nação que o
representasse, encontrou na migração
presente em sua memória ancestral, para esse território uma possibilidade de
crescer economicamente por meio do
reivindicada diante da necessidade de trabalho. Além disso, a experiência com
atividades comerciais de um
superar uma dificuldade comum. Um determinado grupo de avicultores,
contribuiu para a estruturação de uma
traço da identidade pomerana ainda cadeia produtiva com elevado nível de
presente, mas alterado em consequência verticalização, que conferiu caráter
competitivo à atividade, mesmo em um
da mudança das condições materiais de contexto produtivo desfavorável
(BERGAMIN, 2015, s.p.).
manutenção e reprodução da vida.
É possível perceber a divisão social
Assim, as relações de socialização e presente no mundo do trabalho e o início
reciprocidade não são aplicadas de uma configuração classista,
igualmente por todos, mas há distinguindo-se em um grupo de pessoas
proximidade entre os grupos afins, que já que já acumulavam capital e know-how
possuem um recorte classista. Desse em atividades no ramo do comércio desta
modo, há avicultores que acumulam localidade, com condições de investir em
capital individual e proximidade classista tecnologia e na verticalização da
para se organizarem de uma forma produção avícola de postura.
própria, enquanto outros buscam uma
Por outro lado, a dimensão ética do
centralidade no cooperativismo. De
compromisso com o trabalho gera
outra maneira, os produtores da
resultados distintos dependendo da sua
agricultura familiar e os trabalhadores
condição na divisão social do trabalho: a)
rurais assalariados se articulam em
se é um camponês, dono de uma pequena
associações e sindicatos.
propriedade, trabalhando com sua
Outro aspecto cultural e identitário do família; b) se é um proletário assalariado
povo pomerano é apontado por contratado por uma empresa/
Bergamin (2015) em sua pesquisa. proprietário rural ou cooperativa; e, c) se
Refere-se ao que ela denominou de é uma cooperativa ou proprietário dos
“severa disciplina para o trabalho”. Esta meios de produção na avicultura de
integra os fatores imateriais que ajudam postagem.
a responder a sua pergunta-problema:
A situação prática destas relações no
Identificou-se como condicionante mundo do trabalho pode ser observada
imaterial a dimensão ética do trabalho
dos pomeranos e seus descendentes, os na seguinte descrição:
[ 84 ]
Como a produção de ovos é realizada Mas, na agricultura familiar, há uma
predominantemente em granjas de porte
grande, cujos proprietários são dupla exploração sofrida pelos
empresários do setor avícola, a mão de
obra [força de trabalho] empregada é trabalhadores rurais:
assalariada. Ao contratar essa mão de
obra assalariada, os avicultores
Para compensar o baixo nível de
preferem declaradamente os mecanização e também a intensa
descendentes de pomeranos, pois os subordinação da produção ao comércio,
consideram extremamente
esses agricultores se submetem a longas
comprometidos com o trabalho. jornadas de trabalho. Aquela valorização
Mesmo não sendo proprietários dos do trabalho que diferenciava o imigrante
meios de produção, esses trabalhadores
pomerano na colônia, permanece entre
desempenham suas funções como se as os seus descendentes, mas quem se
granjas lhes pertencessem, contribuindo apropria de grande parte do excedente
para o melhor desempenho da atividade
produtivo dos agricultores familiares são
(BERGAMIN, 2015, p. 183, grifo nosso).
os comerciantes. Apesar disso, esses
agricultores admitem que a partir da
Embora a indústria de produção de ovos, modernização da agricultura houve
melhora das condições de vida e
com sua automação e demais tecnologias ampliação dos rendimentos e nem de
adotadas, possua uma “reduzida longe preferem a vida pretérita
(BERGAMIN, 2015, p. 184).
capacidade de geração de empregos"
Apropriando-se da problematização de
(BERGAMIN, 2015, p. 182), a exploração
alguns elementos soterrados na relação
da força de trabalho pela mais-valia, em
do mundo do trabalho rural e sua relação
sua concepção marxista, não deixa de
com traços identitários do povo
ocorrer no processo produtivo.
pomerano em Santa Maria de Jetibá, cabe
Igualmente ocorre na agricultura, mas
conhecer mais sobre o processo de
nesta o trabalho é realizado pela família
automação da produção avícola, sem
que tem a posse de sua pequena
deter-se a conhecimentos técnicos
propriedade: “A atividade é, então,
específicos. Inicialmente, é importante
realizada por agricultores familiares e é a
observar a cadeia produtiva em sua
principal geradora de empregos em
amplitude. O fluxograma abaixo traz um
Santa Maria de Jetibá” (BERGAMIN, 2015,
modelo geral (Figura 15):
p. 184).
Figura 15 – Fluxograma da cadeia produtiva do ovo.

Fonte: Mizumoto (2014 apud AMARAL et al., 2014, p. 170).

[ 85 ]
A produção automatizada (Figura 16) segue o mesmo fluxo; entretanto, as alterações
ocorrem principalmente nas etapas indicadas como produtores de ovos e processadores de
ovos: “Os galpões de Santa Maria contam com máquinas que recolhem ovos e esterco ou
abastecem as gaiolas com água e ração, sem a necessidade de mão de obra humana [força
de trabalho]” (SAFRAES, 2015, s.p.). Além da automação, os cuidados fitossanitários e o
manejo nutricional são essenciais para manter a qualidade da produção, demandando
também investimentos em tecnologia e conhecimento.

Figura 16 – Granja condomínio e classificadora de ovos automatizadas da Coopeavi

Fonte: Coopeavi ([201-])..58

Agora a indústria de produção de ovos atinge outra dimensão. A inovação de ponta na


atualidade está no investimento em Condomínio Avícola para Postura Comercial, uma
iniciativa inédita no Brasil, implementada pela COOPEAVI desde 2016:

O projeto é uma iniciativa inédita, que está sendo implementada em Alto


Caldeirão, no município de Santa Teresa [ES], e consiste no alojamento de aves
com cotas de participação dos pequenos produtores, em um segundo momento.
Com investimento de R$ 6,5 milhões, inicialmente serão alojadas 100 mil aves no
local. A propriedade tem capacidade para alojar até 2,2 milhões de galinhas.
[...]
Este novo empreendimento funcionará no sistema de condomínio, ou seja, cada
cooperado interessado poderá adquirir uma cota de galinhas a ser alojadas nos
galpões automáticos construídos pela cooperativa. A expectativa é ter um
segundo galpão em atividade, com 100 mil aves dos cooperados, no início de
2017.
[...]
Automatização
Todos os ovos são transportados por esteiras mecânicas até a sala de
embalagem. A redução da mão de obra é de aproximadamente 90%, se
comparado com os sistemas convencionais em galpões californianos.
Já o esterco é retirado também por uma esteira diariamente e secado dentro da
mesma propriedade em uma unidade de compostagem de última geração. O
processo de secagem é feito por um misturador programado para revolver todo
o material e prepará-lo para ser transportado para as propriedades agrícolas. O
fertilizante produzido em granjas é muito procurado na região por ser de
altíssima qualidade para uso em cultivos de hortaliças e outras culturas. (SOUZA,
2016, s.p., grifo do autor).

58 Disponível em: <http://coopeavi.coop.br/?negocio/1/Avicultura>. Acesso em: 17 jul. 2018.


[ 86 ]
Empreendimentos assim, dentro da organização ministerial desde a década
doutrina cooperativista, podem parecer de 1990 (LEITE et al., 2007 apud
inclusivos. Mas, neste caso, há regras PICOLOTTO, 2014). É o que registra
restritivas, mesmo aos cooperados. Everton Lazzaretti Picolotto (2014):
Trata-se do uso crescente de uma gestão
No final do primeiro governo de
racional burguesa aplicado ao processo Fernando Henrique Cardoso (1995-
1998), foi criado o Ministério do
produtivo no campo. Desenvolvimento Agrário (MDA) para
tratar das questões relacionadas à
agricultura familiar e à reforma agrária,
De fato, a COOPEAVI vem ampliando sua enquanto o Ministério da Agricultura,
atuação dentro da lógica empresarial do Pecuária e Abastecimento (Mapa) ficava
responsável pelas atividades
agronegócio, até participando e agropecuárias empresariais (do
chamado “agronegócio”). [...]
realizando eventos de porte nacional
Assim, diferentemente da separação de
(FERRARI; COSTA, 2014). Eventos deste
outrora, observa-se atualmente uma
vulto e outras iniciativas empresariais já
ação empresarial de “integração” do
realizadas em Santa Maria de Jetibá,
agricultor familiar na cadeia produtiva
inclusive com parcerias privadas
do agronegócio. Uma tentativa de levar o
nacionais e multinacionais do
agricultor de base familiar a crer que a
agronegócio (sobretudo agroquímicos),
agricultura familiar é agronegócio.60
indicam também uma disputa ideológica
Diferenciando-se dessa visão
sobre a concepção do modo de produção
empresarial e indo além da definição
agrícola59 e, por conseguinte, de
legal (Lei n.º 11.326/2006), a agricultura
consciência de classe.
familiar para o sindicalismo trabalhista
A tensão existente entre projetos rural representa “reconhecimento social,
político-econômicos de desenvolvimento projeto político e espaço de vida”
rural antagônicos é reconhecida pelo (PICOLOTTO, 2014, p. 78).
próprio Estado brasileiro em sua

59 Na década de 1990, após intenso debate eficiente e sustentável) quando compara com o
interno e com registro de cisões no movimento de modelo de exploração patronal” (PICOLOTTO,
trabalhadores rurais (especialmente o MPA e o 2014, p. 81, grifo do autor).
MST), as entidades do sindicalismo trabalhista
(CUT , CONTAG e FETRAF ), em sua maioria, “[...] 60 “[...] as organizações sindicais de agricultores,
assumem o fortalecimento da agricultura [...] tendem a lançar acepções mais subjetivas,
familiar como centro de um projeto de ligadas à especificidade da família agricultora, ao
desenvolvimento rural para país. Para elas, a seu local de trabalho e de vida, à cultura local, à
agricultura familiar corresponde a um modelo produção de alimentos, à tradição, à diversidade,
de organização da agropecuária assentado em associando-a a um valor positivo, como
unidades familiares de produção, onde o grupo superação de uma condição de inferioridade
familiar, em geral, é proprietários dos meios de social que historicamente lhe foi atribuída. O
produção, planeja, gestiona e executa as sindicalismo [dos trabalhadores] procura
atividades produtivas e a força de trabalho é mostrar que a construção da ideia-força
predominantemente familiar. Este modelo é agricultura familiar seria resultado de lutas
considerado mais vantajoso social, econômico e políticas, culturais e morais por reconhecimento
ambientalmente (por ser mais democrático, social” (PICOLOTTO, 2014, p. 78, grifo do autor).
[ 87 ]
Considerando tais planos conflitantes, seus danos são encobertos com
evidencia-se em Santa Maria de Jetibá um campanhas publicitárias agradáveis, seus
processo de ocultação das contradições agentes políticos atuam na esfera estatal
estabelecidas no campo, especialmente para “flexibilizar” ou “desburocratizar” a
com a produção agrícola familiar legislação. Deste modo, a agricultura
orgânica, que só pelo fato de existir já põe torna-se crescentemente dependente da
em questão a produção convencional. indústria agroquímica, provocando uma
certa homogeneização das agriculturas
Como abordado no capítulo teórico, esta
mundiais e intensas agressões ao meio
é uma lógica que perpetua o processo
ambiente (BIANCHINI; MEDAETS, 2013,
iniciado com a Revolução Verde na
p. 1).
segunda metade do século XX. Enquanto

Figura 17– Agroindústria em expansão em Santa Maria de Jetibá

Fonte: Gonçalves (2018, p. 24).

[ 88 ]
Além do processo produtivo e a da avicultura financiaram a confecção e
concepção ideológica, os signos instalação de uma escultura de uma
identitários da cidade também são galinha e seu ovo (Foto 32),61 num jardim
postos em disputa. A avicultura de Santa público, no núcleo comercial da cidade,
Maria de Jetibá, ao atingir o primeiro sem autorização formal do Executivo
lugar na produção de ovos do país e Municipal. Tal fato gerou uma certa
expandir sua atuação industrial (Figura polêmica nas redes sociais e ganhou os
17), alimenta um discurso público- noticiários de alguns jornais. Apesar das
ideológico de que a riqueza gerada por posições controversas, a estátua foi
este setor, mas fundamentalmente mantida para além do período do evento.
apropriada por alguns, seja considerada
Foto 32 – Estátua de galinha em Santa Maria de Jetibá
uma conquista de todos e para todos.

Seria esta também uma forma de


ocultar os conflitos inerentes
desta produção (questões
ambientais, segurança alimentar
e nutricional, relações de
trabalho, condições vegetativas
Foto: Swami C. Bérgamo, 2018.
e de sofrimento impostas aos
animais etc.)? A apropriação de um espaço coletivo,
sem qualquer debate com os demais
Uma das formas mais antigas para que moradores da cidade ou mesmo com os
estes marcos ideológicos se façam agentes públicos, à luz da legislação,
presentes na história é pelo uso de parece apenas deixar explícito a quem de
edificações arquitetônicas, podendo ter fato pertence a cidade: às forças
um caráter artístico ou não, por iniciativa produtivas economicamente
privada e/ou do poder público. Santa dominantes. Certamente, tal fato evoca
Maria de Jetibá parece ter vivenciando uma problematização: seria essa a nova
algo assim recentemente. estética Kitsch a se impor sobre a cidade
de Santa Maria de Jetibá e seus
No dia 11 de novembro de 2018, na
habitantes?
semana que antecedeu a 2º Festa do Ovo
e da Galinha, um grupo de empresários

61 Esta escultura foi produzida pelo senhor reportam atividades do cotidiano camponês do
Adilson Geraldo Jajeski, morador do bairro Vila povo tradicional pomerano. Jajeski possui outras
Jetibá, em Santa Maria de Jetibá. Ele é conhecido habilidades laborais. Além de artesão, atua como
na cidade por seus cata-ventos de madeira, que pedreiro, carpinteiro, eletricista etc.
[ 89 ]
Se esta for a representação material da Por outro lado, há quem considere tudo
nova configuração econômica do isso perfeitamente justificado,
município, portanto política e ideológica, naturalizando a ideia que a estética da
não há de se surpreender que, em breve, cidade tenha sempre que se reconfigurar
pode ocorrer por toda a cidade obras ou em função de um potente produto
adornos semelhantes compondo a turístico, com a possibilidade de criar
paisagem em lixeiras, pontos de ônibus, novas narrativas e identidades.
praças, orelhões (hoje quase extintos),
Nessa linha ideológica, talvez possa
calçadas, edifícios públicos e privados,
ocorrer um encontro de projetos
dentre outros.
econômicos, aliando o agronegócio
Ou, ainda, em determinadas ocasiões (indústria avícola) e o turismo, outrora
(festivas, oficiais e corporativas), seja possibilidades incompatíveis.
possível ver funcionários do comércio ou
Sobre esse cenário hipotético, é possível
servidores públicos sendo induzidos a
levantar ainda algumas questões:
vestir fantasias de galináceos ou de ovos
enquanto executam suas atividades
laborais. Ou mesmo moradores, Existiriam roteiros turísticos

voluntariamente, aderindo a tais destinados a visitar as granjas


automatizadas?
adereços e transitando pela cidade, como
assim se comportassem em seu Seria construído o Museu do ovo e

cotidiano. da galinha?

Como ocultar eventuais situações


Pode parecer estranho, cômico ou até
desagradáveis ao olfato e visão
revoltante imaginar uma situação assim, do público?
porém, transportando-se para este
E as condições de trabalho
futuro/presente, imaginando-se nessa
humano e de confinamento
condição do absurdo, talvez ajude na
animal seriam desveladas ou
compreensão da artificialidade evidente soterradas?
em processos como o da re-
germanização, materializada na
arquitetura neo-enxaimel e outras
práticas.

[ 90 ]
Anotações

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[ 91 ]
Ninguém pode entrar duas vezes no mesmo rio, pois quando nele se entra
novamente, não se encontra as mesmas águas, e o próprio ser já se
modificou. Assim, tudo é regido pela dialética, a tensão e o revezamento
dos opostos. Portanto, o real é sempre fruto da mudança, ou seja, do
combate entre os contrários.

Heráclito
Álbum de Viagem
Considerações finais

IDENTIDADE POMERANA
Uma viagem formativa desvelando conflitos soterrados
2018
Álbum de viagem

Ninguém retorna de uma viagem do Foto 33 - Registros do Memorial Waiandt’s Huus.

mesmo modo que a iniciou. Viajar é um


processo de transformação. Uma viagem
plena deixa marcas na alma e na mente.
Deixa emoções, traz o brilho em nosso
olhar e cria novos laços com o percurso e
com quem compartilhou esta
experiência. Assim, viajar é um ato de Foto: Swami C. Bérgamo, 2016.

formação humana dialética e, muitas


É o propósito destas considerações finais
vezes, inesperada. Viajar é uma vivência
fazer a seleção de algumas imagens
filosófica.
preciosas para compor o álbum de

É sempre possível reviver uma viagem, recordações. Ao assim proceder,

desde que os apetrechos da memória percorremos novamente o caminho, em

sejam devidamente guardados e uma síntese de emoções e reflexões.

novamente acessados quando a vontade


Perguntou-se pelos conflitos que se
ou a necessidade motivar. De certo que as
colocam na construção da atual
pessoas do século XX recorreram, por
identidade do povo pomerano na cidade
vezes, aos álbuns de fotografias em sua
de Santa Maria de Jetibá-ES e como esses
forma física, para invocar lembranças,
conflitos se encontram em evidência ou
reviver emoções e até se surpreender
soterrados na configuração arquitetônica
entre o ontem e o hoje, já com a mente do
das edificações nesse município.
agora. Servem para instantes de
Elegemos como objeto de análise
compartilhamentos com desconhecidos
algumas construções arquitetônicas que,
ou as novas gerações ao redor, quando as
de alguma maneira, expressam modos de
narrativas surgem de cada imagem ou
vida que os pomeranos e seus
objeto, cuidadosamente selecionado ao
descendentes construíram desde sua
compor o álbum.
chegada às terras capixabas.

[ 94 ]
O álbum em nossas mãos traz edificações educativo (e-book), direcionado
que expressam aspectos históricos da especialmente aos docentes atuantes na
identidade pomerana. Os prédios com Educação Básica. Visualiza-se que este
“estilo germânico” (neo-enxaimel) que também possa ser utilizado na formação
apontam para uma “identidade de continuada do magistério. Assim, os
fachada”, vinculada a interesses próprios professores vivenciariam o
turístico-econômicos; a casa tradicional roteiro da viagem formativa proposta e
pomerana que se aproxima do modo de poderiam se inspirar, a partir da
vida dos primeiros imigrantes que especificidade de suas áreas de
chegaram a Santa Maria de Jetibá. Por conhecimento, a trabalhar aspectos
fim, a indústria do agronegócio na forma dessa discussão com os estudantes.
de granjas automatizadas que
Sabemos que sobre a identidade
movimentam uma cadeia produtiva
pomerana há muito ainda a ser discutido,
ampla em contraposição à agricultura
problematizado e aprofundado. Após a
familiar de camponeses com
chegada dessa viagem, muitas outras
propriedade de pequeno ou médio porte.
podem ser planejadas. Em um novo
Como se percebe, Santa Maria de Jetibá se papel, registram-se o desejo de novas
constitui de várias cidades sobrepostas, viagens:
pois estão presentes vários tempos
 Política de imigração nacional no
simultaneamente em cada canto do Brasil e a ideologia do
espaço. São os vestígios de cada tempo embranquecimento.
que ainda estão presentes. Estes, por sua  Colonização ou imigração
pomerana?
vez, possuem um vínculo histórico com o
 “Boas vindas”: conflito com a
modo que as pessoas se relacionam com máquina do Império Brasileiro.
a natureza e entre si, em um processo  Território em questão: conflito
dialético de manutenção da vida em entre imigrantes pomeranos e
indígenas.
sociedade. Ou seja, as relações de
 Pomeranos entre a assimilação e o
produção e sua organização social. isolamento: são ou não são
brasileiros?
A discussão suscitada sugere que a atual  Não há volta: a Pomerânia é aqui,
identidade pomerana não pode pois a terra natal não existe mais.
prescindir da referência de classes  Programa de educação bilíngue:
limitações, desafios e
sociais e dos conflitos dentro do que hoje possibilidades.
se chama de povo pomerano.  Movimento contemporâneo do
povo tradicional pomerano:
Essa problematização serviu de subsídio resistências, identidades e
antagonismos.
para a elaboração deste material
[ 95 ]
 Cooficialização da língua Viajar deixa saudades e uma enorme
pomerana: políticas públicas e
vontade de continuar, de conhecer mais,
possibilidades.
de desvelar outros lugares próximos e
 Memória mercadorizada: turismo
e marcas da germanidade distantes. Desperta novas ideias que faz
estereotipada.
querer transformar o mundo ao redor.
 Trabalhadores rurais da
agricultura familiar lutando por A viagem deve ser plena, emancipadora,
direitos no campo.
autônoma e repleta de possibilidades e
 O veneno nosso de cada dia: a
lógica do agronegócio versus a experiências. Certamente não seria assim
resistência pela vida na produção caso for reduzida a um simples roteiro
orgânica.
turístico, com diálogos padronizados,
 “De volta ao progresso”: problemas
da ocupação, urbanização, relação lugares pré-concebidos (falsamente
centro/periferia, mobilidade e recriados) ou transformada em um mero
verticalização na cidade de Santa
Maria de Jetibá. momento de socialização.
 A tentativa e o suicídio na
comunidade pomerana. Viajar é como uma vivência educacional.
 Cuidar da saúde ou tratar da Se for parcelar, fragmentada, unilateral
doença: câncer, intoxicação, ou transformada em mercadoria, limita a
alcoolismo e traumatismos na
comunidade pomerana. visão e torna-se frustrante e vazia.
 Problematizando o papel da
mulher na cultura pomerana. Espera-se que este estudo tenha

 Trabalho coletivo e resistência: proporcionado uma viagem plena, um


mutirões, festas, sindicato e processo educativo como a Bildung,
cooperativismo.
omnilateral, histórico-crítico, não
 Museu da Imigração Pomerana:
desvelar ou soterrar a história? conformista e que continue provocando

 Trabalhadores rurais e a arte inquietações.


como emancipação dos sujeitos
históricos na comunidade Que a próxima experiência formativa
pomerana.
possa ser o nosso próprio olhar sobre a
 O futuro da cultura pomerana:
ressignificações ou uma morte realidade em nossa volta!
anunciada?

[ 96 ]
Referências

IDENTIDADE POMERANA
Uma viagem formativa desvelando conflitos soterrados
2018
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Anotações

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