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Obras de Aterro

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Síntese dos principais aspectos a considerar
no dimensionamento de barragens de solo e
de solo-enrocamento:
a) Estabilidade dos taludes
b) Evitar galgamento (folga e cota do coroamento)
c) Largura do coroamento
d) Acção sísmica e altura da onda de cheia
e) Filtros e drenos/ Percolação no corpo da barragem
f) Protecção dos paramentos

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a)Estabilidade dos taludes

Do ponto de vista da segurança, quanto menos


inclinados forem os taludes maior será a segurança
mas também tanto maior será o custo.
O dimensionamento deverá procurar a inclinação
máxima compatível com os materiais empregues e
as condições de fundação.

Intervalos mais comuns para variação da inclinação:


• Solos: 1:2 (V:H) e 1:3,5 (V:H)
• Enrocamentos: 1:1,5 (V:H) e 1:2 (V:H)

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No projecto é necessário estabelecer a inclinação do


paramento de montante e do de jusante. Pode ser
importante introduzir banquetas a jusante para
garantir a estabilidade do talude, para facilitar a
inspecção ou para protecção do maciço.

O dimensionamento é feito através do cálculo de um


factor de segurança FS que se impõe que seja maior
do que um valor mínimo (geralmente, FS>1,5).

O cálculo faz-se recorrendo a programas de cálculo


automático (Slope - solos, Slide - rochas, entre
outros). Há, no entanto, algumas regras que podem
ser seguidas em pré-dimensionamento.

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a.1) Paramento de montante


O dimensionamento é feito para a fase
construtiva e para a situação de esvaziamento
rápido.
O primeiro enchimento não é crítico pois as forças
de percolação actuam como acção estabilizadora.

Para esvaziamento rápido, as pressões intersticiais


não têm tempo de se dissipar e poderá haver
instabilização. Este problema só é importante para
maciços homogéneos. Neste caso, considera-se
FS=1,3 para pequenas barragens e FS=1,4 para
grandes barragens (RSB).

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Distribuição de pressões intersticiais numa barragem


zonada após descarga rápida

Maciço de montante com permeabilidade baixa

Maciço de montante com permeabilidade alta


Alonso et al. (2008)

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a.2) Paramento de jusante

O dimensionamento é feito para a fase de pleno


armazenamento pois é quando há percolação
neste paramento.
A fase de construção só é crítica se se gerarem
pressões intersticiais (medidas pelo parâmetro ru)
devidas ao processo de compactação.

O paramento de jusante pode ser mais inclinado


do que o paramento de montante porque não há
problemas de esvaziamento rápido.

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Inclinação de taludes

Marcelino (2007)

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• Com base no tipo de solos


(Design of Small Dams, US Bureau of Reclamation)

Inclinação máxima dos taludes - maciços homogéneos


Talude de montante (H/V) Talude de jusante (H/V)
Classificação Esvaz. Rápido
GW,GP,SW,SP Permeável, não adequado Permeável, não adequado
GC,GM,SC,SM 2,5/1 3,0/1 2,0/1
CL,ML 3,0/1 3,5/1 2,5/1
CH,MH 3,5/1 4,0/1 2,5/1

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Inclinação máxima dos taludes – barragens zonadas

Esvaziamento
Tipo Material Maciços Material do Núcleo Montante Jusante
Rápido
Zonada,
Enrocamento, GC,GM,SC,SMCL,
núcleo não crítico 2,0/1 2,0/1
GW, GP, SW, SP ML,CH,MH
mínimo
Enrocamento, GC,GM 2,0/1 2,0/1
Zonada, não
GW, GP, SW, SP SC,SM 2,25/1 2,25/1
núcleo
máximo CL,ML 2,5/1 2,5/1
CH,MH 3,0/1 3,0/1

Enrocamento, GC,GM 2,5/1 2,0/1


Zonada, sim
GW, GP, SW, SP SC,SM 2,5/1 2,25/1
núcleo
máximo CL,ML 3,0/1 2,5/1
CH,MH 3,5/1 3,0/1

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• Com base em ábacos de estabilidade (em desuso)


Michalowski (2002)
F – factor de
segurança
φ’- ângulo de
resistência ao
corte
c- coesão
γ- peso volúmico
β- inclinação do
talude
h- altura máxima
da barragem
ru- coeficiente de
pressão
intersticial
u
ru =
γh

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Problema de aplicação I:
Verifique a segurança da pequena barragem de 14m de altura
representada na figura. Em pré-dimensionamento adoptaram-se
as inclinações 1:3 e 1:2,5 nos paramentos de montante e
jusante, respectivamente. O material destes dois maciços tem
peso volúmico de 18kN/m3, com φ’=30º e c=5kPa. Durante a
construção foram geradas pressões intersticiais devidas à
compactação tais que ru=0,1.

GP GP
CL

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b) Evitar galgamento ou overtoping
b.1) Folga
A folga de uma barragem é definida como a
diferença entre a cota do coroamento e o NMC.
A fixação de um valor para a folga depende dos
seguintes parâmetros:

• Ondulação causada pelo vento


(depende das características
hidrológicas e geométricas da albufeira)
• Ondulação causada por sismos
As ondas dependem também da variação da
profundidade da albufeira e da inclinação e
rugosidade do maciço de montante.

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Não há um valor mínimo


regulamentar. O seu valor
pode ser estimado em função
do comprimento do maior
segmento de recta que é
possível traçar na albufeira a
partir da barragem (fetch):

Folga (m) Fell et al. (1992)

Fetch (km) Recomendada mínima


<1,5 1,2 1,0
1,5 1,5 1,2
5,0 2,0 1,5
7,5 2,5 1,8
15,0 3,0 2,0
Marcelino (2007)

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b.2) Cota do coroamento
A cota de coroamento CC define o nível de segurança
da barragem em relação a quaisquer fenómenos que
possam ter como consequência o galgamento.
A fixação do seu valor depende do NMC e do NPA
fixados no dimensionameno hidráulico:
• CC> NPA + folga seca + altura de onda
devida a vento excepcional (v=160km/h,
ICOLD, 1993)
• CC> NMC + 1,5×altura de onda devida a
vento habitual (v=80km/h, ICOLD, 1993)
Para além dos outros factores já mencionados, a definição da
altura de onda em função da velocidade do vento tem em
consideração a probabilidade da ocorrência do vendaval.

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c) Largura do coroamento
A largura do coroamento deve ser estabelecida
considerando:

• Utilização (passagem de veículos)


• Altura da barragem
• Aspectos construtivos

O RSB impõe o valor mínimo de 3m (ou 3,7m - fase


construtiva). Caso se preveja tráfego no maciço, o
valor mínimo é 5m.

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Uma maior largura do coroamento corresponde a uma


maior segurança em caso de sismo para prevenir os
efeitos negativos de um escorregamento.

Maciço de jusante Maciço de jusante


sem galgamento com galgamento

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Existem algumas expressões propostas por vários


autores/ regulamentos estrangeiros. Todas dependem
da altura da barragem h (Marcelino, 2007):

h
Bureau of reclamation (1977) Lc =   + 3,3
5
Preece Lc = 1,1 h + 1
Regulamento Japonês para zonas
sísmicas Lc = 3,63 h − 3
Comisión Interministerial de Normas
Sismoresistentes de Espanha (1968)
Lc = 3 + 1,53 h − 1,5

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d) Acção sísmica

De acordo com o RSB, as barragens de Portugal


devem ser dimensionadas para resistir às acções
sísmicas.
Devem ser usados os métodos de cálculo pseudo-
estáticos para a análise da situação de pleno
armazenamento. No entanto, também é necessário
analisar a estabilidade de barragens para sismos
actuantes noutras fases de vida da obra.
O factor de segurança mínimo a admitir é F=1,0.

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Em casos excepcionais podem aceitar-se valores de F


inferiores a 1,0 desde que se verifique que as
deformações resultantes do sismo sejam admissíveis.

• Cálculo simplificado (solo puramente friccional):

Forças estabilizadoras
N tan φ ' = ( P cos α − kP sin α ) tan φ '
Forças instabilizadoras
P sin α + kP cos α kP
(sismo) Fa =Ntanφ’
Coeficiente de segurança
α P
(cos α − k sin α ) tan φ '
F=
sin α + k cos α

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• Ábacos para a verificação da estabilidade
Michalowski (2002)

F – factor de
segurança
φ’- ângulo de
resistência ao
corte
c- coesão
γ- peso volúmico
β- inclinação do
talude
h- altura máxima
da barragem
Khg – aceleração
horizontal

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A fixação a CC também depende da acção sísmica:


• CC> NMC + 1,5×altura de onda devida ao sismo

Altura da onda devida ao sismo Hsismo:

k hT gh
H sismo =
2 Normas espanholas de 1968

kh – coeficiente sísmico
T – período predominante
g – aceleração da gravidade
h – altura de água a montante

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Problema de aplicação II:


Verifique a segurança do talude de jusante da pequena
barragem de 14m de altura estudada anteriormente para uma
acção sísmica que se possa traduzir por uma aceleração
horizontal kh=0,2g.
Dados importantes: inclinações 1:3 e 1:2,5 nos paramentos de
montante e jusante, respectivamente; material destes dois
maciços com peso volúmico de 18kN/m3, com φ’=30º e
c=5kPa.

GP GP
CL

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e) Filtros e drenos

Filtro
Dreno

Uma barragem nunca é estanque e é necessário


introduzir filtros e drenos no seu interior para que a
percolação se faça de forma controlada.

Os materiais dos filtros e dos drenos têm que ser


dimensionados em função dos materiais usados
no restante corpo da barragem.

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e.1) Materiais para filtros e drenos

Os filtros são construídos com areias e os drenos


são construídos com areões/britas. Os materiais
provém geralmente de explorações de inertes.

Filtros
• Critérios propostos por Terzaghi e Cedergren (1973)
Condição Objectivo
Assegura a capacidade de retenção pelo filtro das
D15 (filtro) ≤ 5d85 (base)
partículas de solo a proteger

D15 (filtro) ≥ 5d15 (base) Assegura um adequado contraste entre os materiais

Destina-se a minimizar a segregação durante a


Cu=D60/D10 ≤ 20
construção

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• Critérios propostos por Sherard e Dunningan (1989)
Material a proteger Condição
Argilas e siltes finos com mais de 85% de
D15<9d85 e D15≤ 0,7mm
material passado no peneiro nº 200
Siltes e argilas arenosas com 40% a 80%
de material passado no peneiro nº 4 D15≤ 0,7m
passado no peneiro nº 200
Areias silto-argilosas com menos de 15%
D15≤ 4d85 e d85 pode ser 85% da curva
da parte passada no peneiro nº 4 passado
granulométrica do material integral
no peneiro nº 200
Solos grosseiros de baixa permeabilidade
com menos de 15% passado no peneiro nº D15≤ 4d85 e D15≤0,7mm
200

E ainda:
As areias dos filtros não podem conter partículas finas que comprometam o funcionamento
desejado, pelo que se limita a 15% a percentagem passada no peneiro nº 200
Dmáx <50mm (peneiro 2”)
O diâmetro do
A percentagem passada no peneiro nº 4 é >40% peneiro nº4 é 4,76mm

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Drenos

Os drenos servem para conduzir para jusante os


caudais afluentes ao sistema de filtros.

• Critérios propostos por Cedergren (1973)


Condição Objectivo
Assegura a capacidade de retenção pelo dreno das
D15 (dreno) ≤ 5d85 (filtro)
partículas do filtro
Assegura um adequado contraste entre os materiais do
D15 (filtro) ≥ 5d15 (filtro)
dreno e do filtro
Destina-se a minimizar a segregação durante a
Cu=D60/D10 ≤ 20
construção

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Permeabilidade
Existem expressões aproximadas que permitem
estimar a permeabilidade de solos granulares tendo
como base a sua granulometria.
Expressão de Kozeny válida para solos com menos de 5% de
partículas que passam no peneiro nº 200 (d =0,074mm)

150n 3 n – porosidade
k [m / s] =
S 2 (1 − n) 2 S – parâmetro que depende da
distribuição granulométrica
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S = f ∑ Wn Wn – percentagem em peso do
x1 × x2 material com dimensões entre x1 e x2
f – factor de forma (geralmente f=1,1)

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Problema de aplicação III:


100
Usando a expresão de 90
80
Kozeny, calcule o

Material passado (%)


70

coeficiente de 60
50

permeabilidade do solo 40
30
(n=0,25) a usar num filtro 20
10
cuja curva granulométrica 0
0 1 10 100
se apresenta na figura. Diâmetro (mm)

Peneiro D(mm) % que passa Wn (%) S'n=6/w(x1x2) WnS'n (mm-1)


# 3/8" 9.51 100 5 0.89 4.46
#4 4.75 95 35 1.95 68.13
# 10 2.0 60 50 3.91 195.28
# 16 1.18 10 5 8.47 42.36
# 40 0.425 5
S=343,1mm-1; k=3,58×10-5m/s

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e.2) Dimensionamento da capacidade do filtro


O filtro subvertical tem que ser capaz de escoar o
caudal de percolação afluente do maciço a montante.

k – permeabilidade do filtro
Capacidade de
vazão do filtro: Q = kai a – secção (ou espessura)
i – inclinação do filtro

De acordo com o RSB, deve-se considerar um


coeficiente de segurança mínimo de 100 entre a
capacidade colectora do filtro e o caudal calculado
pela análise do escoamento da barragem em
situação de pleno armazenamento.

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e.3) Dimensionamento de drenos

Uma das soluções mais Maciço de jusante


correntes adoptadas a1
Filtro de areia
em drenos considera a
existência de camadas Zona central construída com
a
de materiais com várias material mais grosseiro (dreno) 2

permeabilidades, tipo Filtro de areia a3


sanduíche.
Solo de fundação
Quando em contacto
directo com o dreno, o Escoamento em paralelo:
solo de fundação
também terá que ser Q = i ∑ k n an
considerado. n

i – gradiente hidráulico

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f) Protecção dos paramentos

f.1) Paramento de montante

O paramento de montante tem que ser protegido


da acção erosiva das ondas.

As ondas dependem do vento e das características


geométricas e hídricas da barragem (já referido).

A protecção é feita geralmente com a colocação


de uma camada de enrocamento

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O dimensionamento da camada de protecção consiste na


determinação da dimensão e composição granulométrica
das diversas camadas que a compõem:

E T E – Enrocamento
NMC
T – Filtro (transição)
S S – solo da barragem

Espessura de E: Espessura de T:
Altura da Espessura da
h>1,5D50 e h>dmáx onda (m) camada T (mm)
0-1,2 150
1,2-2,4 225
2,4-3,0 300

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Enrocamento E Filtro T

Geomembrana de protecção de S

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Dimensão D dos blocos 3 3 W


D =
4 γe

Peso característico do enrocamento, W50:


γ eH a
W50 =
K D (Ge − 1)(cot α )b
W100=4W50
γe – peso volúmico da rocha

W0=1/4W50 H – altura de projecto da onda (H=1,27Hs)


Ge- massa volúmica dos blocos de enrocamento
α- ângulo do enrocamento com a horizontal
a, b e KD são determinados experimentalmente

Taylor a=2,6 b=1 e KD=3,2


ICOLD sem danos a=3 b=0,67 e KD=3,62
ICOLD com danos a=3 b=1 e KD=4,37

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f.2) Paramento de jusante

O paramento de jusante é a zona com potenciais


problemas de erosão e de ravinamento.

A protecção consiste nos seguintes aspectos:


• Revestimento adequado da superfície
(enrocamento ou revestimento vegetal)
• Colocação de banquetas para limitar a
distância entre pontos sem drenagem controlada
• Drenagem das banquetas

Se adoptada, a espessura da camada de enrocamento


não necessita de dimensionamento especial

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