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DESENVOLVIMENTO
I. Introdução
“Nestes trabalhos procuramos dar sempre uma atenção especial ao homem, aos problemas que
o afligiam, às suas relações com a terra e às relações existentes entre uns e outros visando à
utilização da terra. O regime de propriedade e a estrutura fundiária, os sistemas de cultura e de
criação e as relações de trabalho no campo foram aspectos que sempre nos interessaram nos
trabalhos anteriores” (p.04).
“[...] escrevemos o presente ensaio que aborda o problema das relações de trabalho entre os
proprietários de terra e os trabalhadores sem terras no Nordeste brasileiro [...] [Sem deixar de
correlacionar] as relações existentes entre os sistemas de exploração da terra e as condições do
meio natural” (p. 04).
“[O problema que perpassa o Nordeste brasileiro] é não só geográfico como também histórico,
social e, sobretudo, econômico” (p. 05).
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e o Nordeste do gado, observando entre um e outro, hoje, o Nordeste da pequena propriedade e
da policultura e, ao Oeste, o Meio-Norte, ainda extrativista e pecuarista” (p. 13).
“A Região da Mata e do Litoral Oriental estende-se desde o Rio Grande do Norte até o Sul da
Bahia, sempre ocupando as terras situadas a Leste da região nordestina” (p. 13).
“A umidade do ar e as taxas pluviométricas anuais diminuem do litoral para o interior, mas
encontrando mais ao Oeste, a escarpa da Borborema, aumentam novamente devido à queda de
chuvas orográficas” (p. 15).
“A região da Mata e do Litoral Oriental pode ser considerada a mais importante do Nordeste
porque nela se concentra grande parte da população (29,8%), assim como porque nela se
localiza a parte mais importante de seu parque industrial e sua atividade agrícola de plantation;
mas, representa apenas uma pequena porção do Nordeste (menos de 18,2%)” (p. 20-21).
“O Agreste, [...] é uma região de transição entre a Mata e o Sertão [...]. Assim, o que caracteriza
o Agreste é a diversidade de paisagens que ele oferece em curtas distancias, funcionando quase
como uma miniatura do Nordeste, com suas áreas muito secas e muito úmidas” (p. 21).
“O Agreste ocupa uma área equivalente à ocupada pela Mata [...]” (p. 24).
“A falta d’água é, inegavelmente, o mais sério problema enfrentado pela população Agrestina
desde os tempos coloniais, embora não a atinja em proporções tão acentuadas como ocorre no
Sertão” (p. 28).
“O chamado Polígono das Secas não se circunscreve apenas ao Sertão [...]” (p. 28).
“No Sertão e Litoral Setentrional, graças a sua vastidão, encontramos uma série de
diversificações regionais que se exprimem não só pelas condições naturais como também pelas
formas de atividade humana” (p. 30).
“Como as chuvas se concentram nos primeiros meses do ano – de janeiro a junho – e caem
principalmente no verão sob a forma de grandes aguaceiros, o seu clima é considerado seco e a
região é recoberta por uma vegetação de caatinga” (p. 33).
“Se o estio se prolonga [no Sertão], se há falta d`agua e o gado não tem, na caatinga, o que
comer, os vaqueiros derrubam as ‘ramas’ das árvores, queimam os ‘espinhos’ de certas
cactáceas como o mandacaru, o facheiro e o xiquexique, do mesmo modo queimam a
macambira, e dão ao gado como alimento. Costumam, ainda, quando podem, fazer migrações
do gado para as serras, para as margens dos grandes açudes ou do Rio São Francisco, ou para
outras áreas que estejam molhadas, a fim de que o mesmo aguarde a volta da chuva aos seus
campos” (p. 34).
“[...] é bem caracterizado no conjunto sertanejo aquilo que podemos chamar de a ribeira do São
Francisco. [...] O grande rio nordestino atravessa áreas das mais secas do Nordeste” (p. 37).
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“[...] o Rio São Francisco tem um regime muito irregular; apesar de ser, na área por ele cortada,
o único rio permanente, seu volume d`agua oscila consideravelmente entre o inverno e o verão.
Daí variar a sua descarga de apenas 900 a 1000m³ por segundo, no inverno, para 10000 a
12000m³ no verão” (p. 37).
“O grande traço que de união da região sertaneja, porém, apesar de toda essa diversificação que
apresentamos, é o clima, e no clima é, sobretudo, o problema da seca que flagela periodicamente
o Sertão, o que constitui preocupação constante do sertanejo” (p. 38).
“Todo Sertão possui clima quente com temperaturas médias anuais em torno de 25º C – que
varia de uma estação para outra – e com uma amplitude térmica anual inferior a 5ºC, como
acostuma acontecer nas regiões de baixa latitude” (p. 38).
“Tudo corre normalmente, com uma estação de fartura e outra de privações, se não advém a
seca. Esta surge quando, com o verão, não vêm as chuvas. O sertanejo está sempre preocupado
com a possibilidade de uma seca, já que desde os tempos coloniais ela se vem repetindo, com
maior ou menor intensidade, mas com uma periodicidade impressionante” (p. 38).
“O Meio-Norte compreende extensa área do Piauí e do Maranhão onde dominam os cerrados,
nas chapadas e interflúvios, e a floresta de cocais nas baixadas e nas várzeas” (p. 40).
“[Os contrastes das paisagens da região] nos levam a considerar o Meio-Norte como uma área
de transição entre o Nordeste, o Norte e o Centro-Oeste do país” (p. 40).
“A chamada Guiana Maranhense é uma porção amazônica, drenada pelos rios Gurupi e Turiaçu,
em território maranhense” (p. 41).
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“[...] as condições naturais favoreceram o desenvolvimento de uma civilização eminentemente
agrária [...]” (p. 53).
“A cana-de-açúcar acompanhou os conquistadores olindenses sempre que estes encontraram
condições de clima e solo que permitissem a sua cultura” (p. 55).
[...] o problema principal, o mais sério, era o da mão de obra, de vez que os trabalhadores eram
necessários não só a cultura da cana – plantio, limpa e colheita – como à fabricação e ao
transporte do açúcar e ainda à cultura de mantimentos e aos serviços domésticos. Os índios não
satisfaziam a essa necessidade de mão-de-obra; [...]” (p. 56).
“Por essas razões [necessidade e falta de mão-de-obra], desde os primeiros tempos, houve
sempre a importação de africanos para o Brasil, e escravidão negra e indígena coexistiram desde
o início da colonização [...]” (p. 57).
“[...] o negro, representante de uma civilização agrícola e já acostumado ao regime servil na
África, oferecia maior produtividade no trabalho que o indígena. Daí preferirem os
proprietários, apesar do alto preço, adquirir escravos negros a escravizar índios [...]” (p. 57).
“[Havia também a necessidade] de importar técnicos da Europa, os quais eram quase sempre
israelitas. [Estes] aproveitavam a ocasião para deixar o Velho Mundo justamente quando grande
era a pressão exercida pela Inquisição contra o povo Judeu” (p. 58).
“Eles [os Técnicos Israelitas] e os pequenos lavradores iriam construir o núcleo central de uma
classe média rural que, pouco numerosa e dominada pela aristocracia do açúcar, manter-se-ia
como classe até a proletarização quase total, imposta nos últimos anos pela concentração
fundiária resultante do aparecimento das grandes usinas” (p. 58).
2- Os Holandeses e a Escravidão
“[Os holandeses] conquistaram uma colônia com economia organizada em função da produção
açucareira, visando ao abastecimento do mercado externo [...]. A intenção dos holandeses não
era destruir esta civilização já consolidada, mas tomar aos portugueses as posições, os lucros e
os privilégios que aqui usufruíam” (p. 59).
“[...] tentando apenas substituir os portugueses, inicialmente, nos negócios do açúcar, e depois
se dedicando mais ao comércio deste produto que à sua produção, os holandeses, apesar de
desenvolverem consideravelmente a cidade do Recife e a vida urbana na área sob o seu domínio,
não introduziram modificações sensíveis nem nas técnicas de produção do açúcar, nem nas
relações de trabalho no campo. Dominaram militar e politicamente grande área do território
brasileiro, mas a produção do açúcar continuou em mãos portuguesas [...]” (p. 66-67).
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3- O Desenvolvimento Econômico e as Relações de Trabalho na Segunda Metade do
Século XVII e no Século XVIII
“No período que se estende desde a expulsão dos holandeses (1654) até a abertura dos portos
brasileiros às nações amigas (1808) a agricultura canavieira no Brasil atravessou fases de crise
e de esplendor” (p. 67).
“[...] apesar dos seus altos e baixos, [a produção de açúcar] deu à potência colonizadora, em
todo o seu período de domínio sobre o Brasil, mais rendas do que mineração do ouro” (p. 67).
“Em toda a região estruturou-se, nesse período, uma sociedade aristocrática dividida em classes.
No ápice aparecia a figura do senhor-de-engenho [...]” (p. 71).
“Em segundo lugar na escala social dessa aristocracia canavieira estavam os lavradores que,
por não poderem instalar engenhos, embora dispusessem de terras, ou por não terem terras,
moíam ou cultivavam a cana no engenho do senhor” (p. 73).
“Toda a organização político-social se orientava no sentido de garantir ao senhor-de-engenho
o exercício pleno do seu poder sobre suas terras, agregados e dependentes” (p. 74).
“[...] o lavrador [cultivava cana para os engenhos, em terras próprias ou arrendadas] tinha
melhor situação que o morador, roceiro que cultivava produtos de subsistência, e os
empregados, uma vez que estes, recebendo salários, estavam mais vinculados ainda ao senhor-
de-engenho. Depois destes estavam os escravos, que eram considerados como coisa e tinham
um tratamento semelhante ao dispensado aos bois e cavalos” (p. 75).
“Os moradores, em geral mestiços que viviam nos engenhos, constituíam uma elevada
porcentagem da população rural livre. Geralmente conseguiam dos senhores-de-engenho
autorização para desbravar um pequeno pedaço de mato e estabelecer uma choupana e um
roçado” (p. 75).
“[...] vivendo como verdadeiros animais em senzalas infectas, mal alimentados, sem direitos e
sem conforto, foram os escravos, por mais de três séculos, o sustentáculo da economia
açucareira nordestina” (p. 80).
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“[...] a cana-de-açúcar que, considerada até então como cultura imperial, apossara-se das terras
[...] destruíra as matas, afugentara os animais e só permitia que outras lavouras se
desenvolvessem, qual vassalas, nas áreas em que ela não podia, nas condições da época,
medrar” (p. 84).
“Quanto ao problema da mão-de-obra, o período que hora estudamos [Séc. XIX] é aquele em
que se travou séria batalha entre o trabalho escravo e o assalariado [...]” (p. 88).
“Com as restrições ao tráfico e sua posterior abolição, a lei do ventre livre e a venda de grande
parte da população escrava para os cafezais do Sul [...], diminuía o número de escravos e os
trabalhadores assalariados iam aumentando a sua contribuição na produção da indústria
açucareira” (p. 90).
“Só certos trabalhos mais pesados, como o corte, transporte e manipulação das canas,
continuavam a ser feitos quase unicamente por escravos” (p. 92).
“[...] havia [no Nordeste, após a abolição da escravatura] aquela formidável reserva de mão-de-
obra representada pelos moradores que, devido as suas ínfimas condições de vida, à sua
ignorância e às condições de trabalho então existentes, facilmente seria absorvida, como foi
pela agroindústria do açúcar” (p. 92).
“Também o escravo que se viu liberto de uma hora para outra, sem nenhuma ajuda, sem terras
para cultivar, sem assistência dos governos, sentiu que a liberdade adquirida se constituía
apenas no direito de trocar de senhor na hora que lhe aprouvesse. Transformou-se em
assalariado, em ‘morador de condição’, continuando a habitar choupanas de palha ou senzalas,
a comer carne seca com farinha de mandioca e a trabalhar no eito de sol a sol [...]” (p. 92).
“[...] a crise do açúcar posterior à abolição resultou mais da falta de mercado externo [...], do
que da libertação dos escravos. Esta foi feita na hora em que as condições econômicas e sociais
estavam a exigir tal medida, que não foi progressista, uma vez que o escravo liberto não deu
qualquer perspectiva de uma boa colocação para seu trabalho” (p. 93).
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“[...] as antigas sesmarias, de dimensões comunais, foram sendo desmembradas pelos
primitivos proprietários à proporção que os filhos se tornavam adultos [...]. Com a usina, esse
processo de divisão, de retalhamento de propriedades não só foi detido, como se passou a
formar um processo de concentração fundiária [...]” (p. 96-97).
“Há, assim, usinas que controlam dezenas de engenhos, concentrando em suas mãos vales
inteiros” (p. 97).
“A grande concentração fundiária tornou-se um dos mais graves problemas do Nordeste,
sobretudo nas áreas de elevadas densidades demográficas como a Mata e o Agreste. Tal fato
tornou a região açucareira da Mata uma área de forte tensão social e de choques entre
proprietários e assalariados” (p. 100).
“Há ainda usinas que possuem lavradores, isto é, pequenos plantadores de cana que dispõem de
áreas onde cultivam alguns hectares, lavrando pessoalmente a terra com seus familiares e
empregados [...]” (p. 102).
“A tendência das grandes usinas, porém, é cultivar terras próprias, eliminando os fornecedores.
Querem, além do lucro industrial, o agrícola [...]” (p. 103).
“[...] a tendência é o banguezeiro tornar-se fornecedor proprietário, depois fornecedor rendeiro
e, finalmente, ter de deixar a terra que possui e lavrou durante quase toda a vida” (p. 104).
“[Os Foreiros] surgiram ainda na época da escravidão e eram homens que viviam em áreas mais
distante dos engenhos, cultivando lavouras de subsistência e pagando ao proprietário um
pequeno aluguel anual. Nas épocas de maior trabalho nos engenhos – plantio e colheita –
costumavam os foreiros dar ao proprietário alguns dias de trabalho por semana, às vezes
gratuito, às vezes por ínfimos salários; era a ‘condição’ ou o ‘cambão’ [...]” (p. 104).
“[...] entre 1945 e 1955, foi grande a área outrora ocupada por foreiros, que foi conquistada pela
cana-de-açúcar e grande o número de foreiros que teve de afastar-se da atividade a que se
dedicava” (p. 106).
“Os trabalhadores assalariados também denominados, em certas áreas, de ‘trabalhadores de
eito’, ‘cassacos’ e ‘ eiteiros’ constituem a imensa maioria dos trabalhadores rurais da área
açucareira. [...] podem ser agrupados em três categorias: os moradores que residem na
propriedade em que trabalham, os trabalhadores ‘de fora’, que vivem nas cidades, vilas e
povoações da zona, constituindo a maioria da população das mesmas, e os ‘corumbas’ ou
‘caatingueiros’ que residem no Agreste e Sertão, mas se deslocam todos os anos para a zona
canavieira durante a safra, a fim de participar da colheita. Fazem, assim, uma migração sazonal,
uma vez que com as primeiras chuvas voltam para a sua terra” (p. 106).
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“Á proporção que o processo usineiro evolui, a área cultivada com cana vai aumentando e os
proprietários não só restringem os sítios dos moradores, tirando-lhes as áreas mais favoráveis,
como exigem dos mesmos cinco ou seis dias de serviço por semana nos seus canaviais, o que
impede os trabalhadores de cuidarem dos seus roçados. Vai então se processando
gradativamente a proletarização da massa camponesa” (p. 107).
“A proletarização e, consequentemente, o empobrecimento cada vez maior do trabalhador rural,
leva o mesmo ao descontentamento, à insatisfação. Os proprietários, compreendendo isto,
realizam pequenos trabalhos de assistência que servem de meros paliativos, sem consequências
positivas, ou exercem medidas drásticas, violentas, para conter os anseios populares” (p. 109).
“Sem esta mão-de-obra Agrestina [migrante, em geral], as usinas do Nordeste dificilmente
conseguiriam realizar as suas moagens com as grandes safras dos dias atuais” (p.111).
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2- O Surto Algodoeiro no Agreste e o Desenvolvimento do Trabalho Assalariado
“O algodão operou, após os meados do século XVIII, uma verdadeira revolução agrária no
Agreste” (p. 132).
“As culturas [de algodão] eram feitas, inicialmente, na própria região da Mata, mas penetraram
cada vez mais para o interior, uma vez que à proporção que se distanciavam do litoral,
encontravam condições naturais mais favoráveis ao seu desenvolvimento” (p. 133).
“O algodão era por natureza uma cultura mais democrática que a cana-de-açúcar. Não só os
grandes proprietários, utilizando mão-de-obra escrava e assalariada cultivavam-no, como
também pequenos proprietários, foreiros e moradores” (p. 133).
“A industrialização mais barata e menos urgente que a da cana, colocou o beneficiamento do
algodão nas mãos de comerciantes que, [...] estabeleciam-se em cidades, vilas e povoações [...].
Daí ter contribuído desde os primeiros tempos para o desenvolvimento da vida urbana, ao
contrário do que ocorria com a cana-de-açúcar. Ainda hoje as cidades localizadas no Agreste
são maiores e tem mais movimento comercial que as da região da Mata” (p. 133).
“[O algodão permitia] partilhar com uma cultura de subsistência a terra que ocupava,
permitindo ao pequeno agricultor produzir em uma mesma área, com um só trabalho de
preparação da terra e de limpeza das culturas, o alimento e o produto comercial” (p. 133).
“[...] muitas pessoas de parcos recursos enriqueceram [devido ao rush algodoeiro], ascenderam
de status social, passando a conviver em igualdade de condições com os orgulhosos senhores-
de-engenho. As pessoas de cor que conseguiram essa ascensão em poucos anos, foram
chamadas em certas áreas os ‘brancos do algodão’ ” (p. 134).
“Os grandes proprietários de terras, após a abertura dos portos, eufóricos com os altos preços
do algodão, organizavam verdadeiras plantations desse produto. Cultivavam-no
aristocraticamente, como faziam com a cana-de-açúcar” (p. 134).
“[...] compreenderam os proprietários que a ‘rama’ do algodão e a palha do milho poderiam ser
ração suplementar para o gado nos meses mais secos [...]. Passaram, então, a ceder ‘pela palha’,
terra aos moradores de suas propriedades, das vilas e dos povoados próximos” (p. 136).
“O trabalho escravo não era, porém, o mais rendoso para a cultura algodoeira [...]. Não tinha,
como a cana, de ser cuidado todo o ano [...]. Daí irem os fazendeiros do Agreste gradativamente
substituindo o trabalho escravo pelo livre [...]” (p. 136-137).
“Na segunda metade do século XIX, quase um século após o surto algodoeiro, novo produto
viria a transformar as paisagens agrestinas, devastar grandes áreas de mata nos brejos e ampliar
a contribuição da agricultura à economia regional – o café” (p. 137).
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“Encontrando condições favoráveis e mão-de-obra assalariada barata, quando a escravidão já
estava prestes a expirar, o café tornou-se a cultura comercial de maior importância dos brejos
do Agreste pernambucano e alagoano [...]” (p. 139).
“[...] o Agreste essencialmente pecuário do século XVIII, tornou-se dominantemente agrícola
nos séculos XIX e XX; a agricultura com a melhoria das condições técnicas, o aumento da
densidade demográfica e a construção de boas estradas que ligam a região às capitais de Estado,
assim como a maior divisão da propriedade, vai cada vez mais se diversificando, tornando a
região policultora e contribuindo, de forma superior à Mata e ao Sertão, para o abastecimento
das grandes cidades nordestinas” (p. 140).
“A pecuária vai perdendo cada vez maiores áreas; entretanto vai se tornando uma atividade
econômica altamente compensadora, pois vai passando dos padrões culturais mais extensivos
para os intensivos [...]. (p. 140-141).
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“A comparação entre o nível de vida do pequeno proprietário e do trabalhador assalariado já é
um forte argumento em favor de uma maior democratização da terra, de uma política que vise
a maior divisão da propriedade” (p. 145).
“O pagamento em moeda, substituindo a ‘quarta’, de uso ainda generalizado no Sertão [...] não
representa uma melhoria para o vaqueiro, mas uma inferiorização sobre a remuneração anterior,
pois o proletariza e impede que, como ocorria no passado, ele tenha a oportunidade de tornar-
se fazendeiro” (p. 151).
“A utilização do restolho de cultura na alimentação dos animais leva o fazendeiro a manter
relações econômicas com grande número de agricultores; são os rendeiros [...]” (p. 152).
“A elevada densidade do Agreste e as precárias condições de vida aí dominantes transformaram
a região em um centro de emigração, e por isso muitos dos seus filhos têm abandonado a terra
e se fixado nas cidades maiores, nas capitais litorâneas [...] ou seguindo em ‘paus-de-arara’ para
o Rio, São Paulo, Norte do Paraná e Brasília” (p. 154).
“[Tal fato] muito preocupou senhores-de-engenho e usineiros que sentiam a falta de braços cada
vez maior em seus partidos de cana e em suas moendas” (p. 154-155).
“Nas regiões fumicultoras já temos outro tipo de relação de trabalho. Essas regiões formam
importantes manchas em terras arenosas no Agreste nordestino” (p. 157).
“O fumo, que é lavoura extremamente trabalhosa, mas remuneradora, é cultivado por
arrendatários ou meeiros e pequenos e médios proprietários [...]” (p. 157).
“É o fumo uma lavoura que exige cuidados especiais, adubação e tratamento demorado antes
que seja lançado no mercado; daí serem as áreas onde é cultivado de alta densidade demográfica
e ser o salário do trabalhador rural mais elevado” (p. 157).
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“Reconhecendo o domínio da terra [aos grão-senhores] e tornando-se seus foreiros, [os
vaqueiros, que desbravaram o Sertão] estabeleciam-se com o curral e as reses no que chamavam
de ‘sítio’ pagando anualmente um foro [...]” (p. 162).
“As grandes distâncias e as dificuldades de comunicação fizeram com que aí [no Sertão] se
desenvolvesse uma civilização que procurava retirar do próprio meio o máximo, a fim de
atender as suas necessidades” (p. 164-165).
“O gado para chegar ao mercado consumidor fazia intermináveis caminhadas, havendo pessoas
especializadas na condução destes animais” (p. 167).
“[...] costumavam os proprietários pagar ao encarregado do transporte quatrocentos réis por
cabeça, em uma época em que um boi valia, na Bahia, de quatro a sete mil-réis” (p. 167).
“Desse modo, foi a pecuária quem conquistou para o Nordeste a maior porção de sua área
territorial. Complementou a área úmida agrícola com uma atividade econômica indispensável
ao desenvolvimento da agroindústria do açúcar e ao abastecimento das cidades nascentes.
Carreou para o Sertão os excedentes de população nos períodos de estagnação da indústria
açucareira [...]” (p. 167-168-170).
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“Após o período do rush algodoeiro, passaram os agricultores sertanejos a regular sua vida
amanhando a terra, ajudando-se uns aos outros e procurando obter tanto o produto comercial
por excelência – o algodão – como produtos alimentícios” (p. 176).
“Pelo calendário agrícola [...] observa-se que, morando em uma propriedade, tinha o
trabalhador que dividir o seu trabalho entre o roçado próprio e o do patrão. O trabalho para o
patrão era, às vezes, remunerado em dinheiro, caso em que o morador necessitava pagar renda
da terra que cultivava para si em dinheiro ou em parte da produção; outras vezes ele tinha a
terra para cultivar sem pagar rendas, mas obrigava-se a dar três dias de serviços gratuitos para
o proprietário, estando, assim, sujeito ao ‘cambão’ ” (p. 176-177).
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“A ‘sujeição’ típica da região da Mata também é encontrada no Agreste e no Sertão. Por ela os
foreiros se obrigam a dar ao dono da terra um dia semanal de trabalho gratuito. É o famoso
‘cambão’ [...]” (p. 186).
“Nessas fazendas que engordam de quatro a cinco mil bois por ano, usam o trabalho
assalariado” (p. 187).
“A jornada de trabalho começa ao nascer do Sol para interromper-se as dez horas [...].
Condições de trabalho tão pesadas fazem com que grande parte dos sertanejos desta área
procure migrar para o Sul do país [...]” (p. 187).
“[...] o desenvolvimento da pecuária [...] acarreta uma maior circulação monetária e elimina
gradativamente as tradicionais formas de parceria” (p. 187).
“Nas margens do Rio São Francisco e em suas ilhas vem se desenvolvendo consideravelmente
nos últimos anos, graças à irrigação, a atividade agrícola. As principais culturas são a cebola, a
cana-de-açúcar e as fruteiras [...]. A abundância de água e o desenvolvimento da agricultura
vieram dar serviço, em condições estáveis e com possibilidades de renda superiores ao trabalho
na pecuária, a trabalhadores sem terras. Os maiores lucros, porém, ficam com os proprietários
da terra que pouco cultivam” (p. 188).
“Nos vales secos do Rio Grande do Norte e do Ceará o interesse maior dos grandes proprietários
volta-se para a exploração da cera de carnaúba [...]” (p. 191).
“[...] a cera de carnaúba não tinha grande valor econômico e inúmeras palmeiras foram
derrubadas para ceder terras à lavoura [...]. Hoje, quando a cera esta valorizada e sua exportação
dá ao proprietário rendas [muito altas] [...], os carnaubais nativos são conservados e até fazem
cultura de carnaubais [...]” (p. 191).
“Pela extensão ocupada pelos carnaubais e pela multiplicidade de aplicações dos produtos da
carnaubeira, podemos afirmar que há um verdadeiro complexo cultural na região, uma
verdadeira civilização da carnaúba” (p. 193).
“No Cariri e nas serras frescas há um contraste muito grande com as áreas sertanejas vizinhas.
Os habitantes destes verdadeiros oásis de verdura no meio do deserto cinzento de caatingas,
geralmente não gostam até de ser chamados de sertanejos [...]. Estas ‘manchas úmidas’,
determinadas ora pelas condições climáticas, ora pela estrutura geológica, constituem
verdadeiros oásis no meio do peneplano semiárido” (p. 200).
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“Na conquista e ocupação do Meio-Norte distinguimos duas direções do povoamento e de
ocupação do espaço. O litoral, inicialmente disputado entre franceses e portugueses, foi
ocupado por povoamento oriundo de Olinda [...]. Ao mesmo tempo, de criadores de gado
oriundos da Bahia [...] se espraiaram pelas terras drenadas pelo Rio Parnaíba” (p. 205).
2- A Ocupação do Território
“Por muito tempo essa nova capitania permaneceu muito pobre, com a sua economia baseada
na economia de subsistência e no apresamento do indígena, que era utilizado no trabalho
agrícola ou vendido como escravo para áreas mais prósperas [...]” (p. 206).
“A criação da Companhia Geral do Grão-Pará e do Maranhão em 1756 [...], iria transformar o
Maranhão em uma colônia produtora de artigos de exportação [...]” (p. 207).
“A Companhia passou ainda a fornecer créditos aos colonos a fim de que adquirissem os
escravos negros, as sementes selecionadas de algodão e de arroz e pudessem avançar o
povoamento e a ocupação do espaço nas margens dos rios navegáveis” (p. 207).
“Os criadores de gado [povoadores baianos], vivendo vida rude e distante dos centros
exportadores, forneciam carne e animais de trabalho para a região litorânea e couro para a
exportação [...]. Era grande o contraste entre a área de criação de gado, que ocupou praticamente
toda a porção meridional e central do Piauí e do Sul do Maranhão [...] e a área produtora de
arroz, algodão e açúcar [...]” (p. 208).
“[...] nos fins do século XVIII o Maranhão era, depois de Pernambuco, a maior capitania
exportadora de algodão, destacando-se ainda como exportadora de arroz e de couro” (p. 210).
“Enquanto isto ocorria no Maranhão, o Piauí continuava dedicado à pecuária, exportando o
gado vivo para a Bahia ou transformando-o em charque em suas oficinas” (p. 211).
3- O Problema da Mão-de-Obra
“Durante os primeiros tempos em que o Meio-Norte não se integrava na economia de
exportação, as culturas tinham expressão relativamente pequena e necessitavam de poucos
braços. O indígena era suficiente para atender às suas necessidades” (p. 212).
“Com a criação da Companhia Geral do Comércio do Grão-Pará e do Maranhão, iniciou-se o
tráfico africano em larga escala [...]” (p. 213).
“[...] o ‘algodão’, apesar de branco, tornou preto o Maranhão” (p. 213).
“A abolição da escravidão, em 1888, veio agravar seriamente a economia da área agrícola,
embora só afetasse indiretamente a área de pecuária. Com a libertação, os negros abandonaram
as fazendas e engenhos. Embrenharam-se pelos cocais e pelas florestas, retirando facilmente
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das mesmas o seu sustento. Havia abundancia de terras devolutas, desocupadas [...] podendo
viver numa economia fechada, amonetária de subsistência. Os engenhos e as plantações
ressentiram-se da falta de mão-de-obra e regrediram” (p. 213).
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2- A Dualidade da Legislação Rural
“Ao analisarmos a legislação rural brasileira, observamos que há na mesma uma dualidade
representada pelos dois estatutos básicos – O Estatuto do Trabalhador Rural e o Estatuto da
Terra” (p. 226).
“Os governos que se seguiram, tentando consolidar um modelo capitalista e concentrador de
renda, estimularam a aplicação do Estatuto do Trabalhador Rural e a proletarização do
trabalhador rural [...]. Passaram a financiar a mecanização da agricultura e facilitar a expulsão
dos trabalhadores para as cidades, vilas e povoações, tirando a estes o controle dos instrumentos
de produção e a possibilidade de complementação salarial com lavouras de subsistência” (p.
227-228).
“O Estatuto da Terra [entretanto], [...] visava desenvolver uma política de reforma agrária e de
colonização. [...] Autorizava a desapropriação de terras e a implantação de grandes programas
de colonização tanto nas áreas desapropriadas como naquelas em ocupação” (p. 228).
“Dentro de um modelo econômico capitalista, monetarista era natural que as diretrizes do
Estatuto da Terra, procurando criar uma sociedade rural estável e com boa qualidade de vida,
fossem suplantadas pela política de proletarização rural não preconizada, mas facilitada pelo
Estatuto do Trabalhador Rural e pelas leis que o complementaram” (p. 229-230).
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“[...] a SUDENE [Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste] foi criada em hora
oportuna visando coordenar a aplicação de verbas públicas no Nordeste, visando salvar a região
do flagelo do subdesenvolvimento que, mais que das secas, a vitimava” (p. 236).
“Lendo-se o Plano Diretor da SUDENE observa-se que analisando os problemas regionais, o
nosso órgão máximo de planejamento [...] não oferece medida diretas visando elevar em um
curto prazo as condições de vida desta população rural” (p. 236-237).
“[...] a melhoria das técnicas de produção, o aumento da rentabilidade da terra, sem medida
complementares em defesa do trabalhador do campo, até hoje, no Brasil, apenas tem carreado
mais dinheiro para os bolsos dos ricos proprietários, continuando os que mourejam a terra a
viver nas condições de vida as mais precárias” (p. 237).
“[...] só poderemos alcançar melhores êxitos na modificação de nossa velha estrutura fundiária,
mesmo através da colonização, se conseguirmos [...] uma reforma constitucional que permita
uma fácil desapropriação de terras, quando de interesse social” (p. 249-250).
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CONCLUSÃO
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da estrutura capitalista enquanto produto da mesma. Todavia, como ocorre esse processo
contraditório de manutenção do camponês face as estruturas atuais do sistema econômico em
que vivemos? O capitalismo cria, a partir de sua penetração intensa no campo brasileiro e
tentativa de dominação completa dessa classe, condições para que o camponês se rebele, resista
e lute por seus direitos, ou seja, o capitalismo tenta extinguir o campesinato, mas não o
consegue, pois neste processo, abre espaço para a resistência? Ou então, o capital realmente
necessita deste sujeito, de relações especificamente impróprias a ele, para ampliar-se,
desenvolver-se e impor sua hegemonia?
Simplesmente, o desenvolvimento desse sistema é intrinsecamente contraditório. Ao passo em
que ele tenta liquidar relações de trabalho que não sejam essencialmente próprias a sua lógica,
necessita delas e cria oportunidades para que elas se perpetuem e resistam. O campesinato
nordestino é fruto da expansão capitalista, é produto das contradições dessa expansão. A
intenção aqui, porém, não é demonstrar como os camponeses sobrevivem meio a expansão dos
domínios capitalistas e aos ataques a eles dispendidos (a migração para terras devolutas, por
exemplo, como ocorrem na região da Guiana Maranhense, é uma das formas de resistência que
encontram). Nem mesmo fazer uma análise detalhada das ferramentas as quais os capitalistas
lançam mão para a manutenção do camponês, uma vez que não teríamos, arcabouço teórico
suficiente para realizar tal ensaio.
Podemos, entretanto, enfatizar o papel fundamental do Estado nesse processo. Estado que,
sendo subsidiário ao capitalismo, se ajoelha diante do capital, é escravo do mesmo e, utilizando
seu poder, assegura as relações de produção tanto quanto forem adequadas a lógica desse
sistema. Portanto, além de subvencionar a produção realizada em bases capitalistas, seu regime
se volta vez ou outra a manutenção do trabalhador rural, uma vez que este é conveniente ao
capitalismo. Desse modo, portanto, o Estado banca com as despesas necessárias para manter o
camponês, despesas que surgem justamente da desigualdade exercida pelo sistema econômico
ao qual se alia. Contudo, de maneira alguma este Estado irá promover medidas que
desestruturem a ordem socioeconômica vigente, ou seja, não irá realizar medidas que acabem
com a expropriação, exploração e empobrecimento constante do trabalhador do campo e que
impeçam o capitalista de extrair não só o sobretrabalho do trabalhador assalariado, mas também
a renda da terra produzida pelo camponês.
Este problema, que perpassa o campo do Nordeste brasileiro assim como do restante do
território nacional, entretanto, não é recente. Ele se modificou ao longo de nossa história, é
claro, mas substancialmente é o mesmo: a propriedade privada da terra enquanto direito e a
estrutura fundiária vigente desde os tempos da colonização, como bem quis enfatizar Andrade
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ao longo de toda sua obra. O desenvolvimento do modo capitalista de produção no campo se
dá primeiro e fundamentalmente pela apropriação da terra pelo capital. A consequente
desigualdade exercida por este sistema deriva dessa premissa. Nossa atenção, portanto, deve
focar-se nesse ponto nevrálgico, questão essencial em qualquer análise do campo.
Enfim, vivemos no sistema capitalista e, portanto, é preciso entender o campesinato dentro
desse contexto. A luta e resistência do campesinato contra a submissão completa ao capital se
expressa por diferentes mecanismos, segundo as condições históricas particulares de cada
espaço geográfico. Entretanto, reconhecer que o camponês é moldado pelo capitalismo não é o
suficiente. Se não nos concentrarmos em encontrar soluções que auxiliem a massa rural, que
moureja a terra dia após dia, sob condições precárias de trabalho, na busca de melhores
condições de vida e na luta contra o capital e o Estado capitalista, com nada estaremos
contribuindo para a mudança desse quadro social.
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REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS
ANDRADE, Manuel Correia de. A terra e o homem no Nordeste. 4ª ed., São Paulo, Livraria
Editora Ciências Humanas, 1980.
OLIVEIRA, Ariovaldo U. de. A agricultura camponesa no Brasil. São Paulo, Contexto, 1991
OLIVEIRA, Ariovaldo U. de. Modo capitalista de produção e agricultura. São Paulo, Ática,
1986.
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