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A CRUZ E O

CÁLICE

Úlfilas- MMXXIII
A páscoa é a data mais importante do calendário
cristão, recorda-se o sacrifício de Cristo na cruz, e sua
ressurreição após três dias. O objetivo desse pequeno
folheto é continuar a exposição do nosso livreto
prévio “O Natal Solar”, onde o simbolismo do Natal
através das eras e sua conexão com a busca da
restauração de uma Idade Dourada é demonstrada. É
necessário enfatizar que os trabalhos do P A R V V S
L V P V S tomam por fontes diversas tradições
distintas, sendo sempre o objetivo ir além das
presunções ordinárias características da plebe. Nessa
Páscoa veremos a conexão do Santo Graal e a busca
pela imortalidade, porém devido a extensão do tema
– que torna necessária uma possível “2ª edição” mais
completa que poderá ser publicada posteriormente –
serão abordados apenas três símbolos, a árvore e seu
fruto da imortalidade, a bebida ambrósia, ambos
expressando a imortalidade divina em diversas
tradições, e o tema da dama de cavalaria.
Antes do conteúdo simbólico é interessante
observar que a lenda do Graal tem muitas versões,

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podendo ser um cálice, uma pedra ou mesmo um livro
a depender da fonte. A versão que foi escolhida é a
mais conhecida, onde o Graal é um cálice que foi
utilizado por Jesus durante a última ceia, e também
para coletar o sangue de Cristo durante a sua
crucificação, por José de Arimateia, que o teria
levado até à Ilha mítica de Avalon, onde sua Ordem
teria mantido o Graal em segurança até chegar às
mãos do Rei pescador já na época de Perceval,
quando José é ferido por um golpe na virilha,
decorrente da quebra de sua castidade.
O graal aparece na corte do Rei pescador ao lado
de uma espada e uma lança ensanguentada, levadas
por uma procissão que desperta a curiosidade de
Perceval, que contém seu desejo devido à um
conselho recebido quando ainda garoto, que dizia
para não fazer perguntas em cortes reais. Ao não fazer
a pergunta, Perceval se perde de seu destino enquanto
cavaleiro do Graal, como é mais tarde explicado por
uma bruxa de sotaque celta, já na Corte do Rei Arthur.
O graal apresenta inúmeras virtudes e qualidades
sobrenaturais, porém nos focaremos em uma em
específica, a cura e o prolongamento supranatural da
vida, como verificados nos contos Le Mort D’Arthur,
Parzifal entre outros, onde o Graal cura feridas
profundas dos cavaleiros e prolonga a vida de Reis.

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Verificamos então paralelos com uma certa virtude
“ambrósia”, isso é, imortal.
Creio que seja interessante lembrar que a lenda
do Graal é de origem diversa, a lenda de Perceval na
versão de Chrétien de Troyes tem suas origens na
narrativa galesa do herói Peredur, com elementos de
mitos escandinavos como veremos em breve, além da
influência mais profunda dos mitos celtas presentes
em toda a lenda.
Por ora, creio que esse pequeno contexto seja o
suficiente para nos concentrarmos nos símbolos que
serão expostos no presente livreto.

A ÁRVORE E SEU FRUTO

Em diversas tradições existe um símbolo


corrente de frutos que ao serem consumidos causam
a imortalidade ou juventude, como as maçãs divinas
da Deusa escandinava Idunn, que confere aos Aesir e
Vanir sua juventude, ou os pomos dourados das
Hespérides, que são colhidos por Hércules no seu
décimo-primeiro trabalho, ou ainda o pêssego da
imortalidade dos mitos chineses. Nos mitos celtas
insulares entre irlandeses e bretões, existem inúmeras
lendas sobre maçãs divinas que estão relacionadas à
Ilhas onde os homens não morrem, nem adoecem,
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uma dessas ilhas se chama Emain Ablach, onde a
palavra “ablach” se mostra cognato da ilha mítica do
Ciclo Arturiano Avalon, ambas significando macieira
ou maçã, em referência aos frutos milagrosos, a
mesma Ilha Avalon que é o destino de José de
Arimateia e seus cavaleiros junto do santo cálice. A
árvore que contém os frutos geralmente é identificada
como correspondente da Árvore do Mundo, o Axis
Mundi de inúmeras tradições.

Enfim, além do localização do Santo Graal na


Ilha de Avalon, das maçãs divinas da Imortalidade,
São Alberto Magno, professor de São Tomás de
Aquino, que também era alquimista e astrônomo, nos
conta que “O sangue de Cristo é o fruto da árvore da
Vida”, recordando a identidade comum da Árvore da
vida do Jardim do Éden e o Cristo crucificado,
portanto, assim como as maçãs divinas de Avalon, o
sangue de Cristo contido no Cálice de José de
Arimateia seria o fruto da Árvore da Vida, e via para
a eternidade.
Para complementar a interpretação do símbolo,
as ilhas míticas onde heróis repousam em estado de
abundância e saúde, onde a morte não alcança, como
a Ilha dos abençoados grega, ou a Tír na nÓg “terra
dos jovens” ou “terra da juventude”, permaneceram
no imaginário europeu mesmo depois da
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cristianização como no exemplo famoso da Ilha de
São Brandão, identificada pelo monge medieval
como o Paraíso Terrestre, chamada também de Ilha
Braezil ou Hy Brazil, em referência ao nome popular
do cinábrio na Irlanda medieval. Essas ilhas tem um
significado polar, junto ao trono e à montanha
simbolizam o centro imóvel, imperturbável. A
montanha também aparece com residência do Graal
no castelo de Munsalväsche, sendo relacionado por
vezes ao castelo cátaro em Monserrat, na Catalunha.
Mais tarde retornaremos ao símbolo da montanha.
Um trecho do Romance do Graal de Chrétien de
Troyes é possivelmente derivado diretamente do mito
escandinavo do roubo das maçãs da Deusa Idunn,
onde Loki ao ser ameaçado de morte pelo gigante
Thjazi, é corrompido a deixar Idunn e suas maçãs da
juventude fora das muralhas de Asgard, dizendo que
havia visto maçãs como as suas crescerem em uma
floresta. Thjazi então toma a forma de um falcão e
rapta tanto Idunn quanto suas maçãs. Ao perderem
suas maçãs os Deuses passam a envelhecer rápido,
perdendo forças. Odin então incumbe Loki na tarefa
de recuperar as maçãs e a Deusa das garras dos
odiosos gigantes. Loki toma emprestado de Freyr um
cinto mágico que o permite mudar de forma, e ele
então se torna também um falcão e se dirige à morada
gelada dos gigantes, onde com a ajuda do cinto

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transforma a Deusa e suas maçãs numa noz, e leva de
volta até Asgard, porém o gigante o acompanha na
forma falconídea, até uma emboscada onde os Deuses
matam a Tjhazi com um golpe de lança, seus olhos
são arrancados e posicionados no céu como estrelas,
como as maçãs foram restituídas junto à Idunn, e os
Deuses retornaram ao consumo dos divinos frutos,
sua juventude foi então renovada. Já na lenda
cavaleiresca, um cálice – embora não o graal, acredito
que seja um símbolo equivalente que perdeu sua
identificação com o santo cálice devido ao caráter
sedimentar da obra de Troyes – é roubado da Corte de
Arthur pelo cavaleiro vermelho, inimigo da távola
redonda, deixando o Rei Arthur e sua esposa
devastados, catatônicos. O Rei, incapacitado de
buscar vingança por si próprio, incumbe ao novo
cavaleiro Perceval que recupere o cálice. Perceval
então se dirige ao salão do cavaleiro e o desafia para
um duelo de lanças, onde usando uma lança de caça
dada pelo Rei Arthur, fere o cavaleiro vermelho no
olho, arrancando-o e vencendo o duelo e restituindo o
cálice ao seu devido lugar, e causando a recuperação
do Rei de sua Esposa Ginevra.
O motivo encontrado nesses mitos, onde um
inimigo de aspecto gigantesco rouba a substância
imortalizadora é recorrente como veremos nos
próximos tópicos e, em realidade une os temas da

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fruta e da bebida como diferentes manifestações de
um mesmo símbolo.

A BEBIDA AMBRÓSIA

Primeiramente, é praticamente um consenso


entre os acadêmicos que as bebidas dos mitos tinham
contrapartes reais em ritos estabelecidos, ligados à
guerra e à poesia. As bebidas da imortalidade nos
diversos mitos são também associadas à variados
efeitos, que podem ser ligados ao frenesi guerreiro,
inspiração poética e sabedoria divina, o caso indiano
do Soma – do sânscrito “pressionar” – ou ainda
Amrita – do sânscrito “imortal”, cognato do grego
Ambrosia – que confere todos os efeitos citados a
depender de quem consome. Indra e seus guerreiros
semidivinos, os Maruts, bebem do Soma antes da
batalha por exemplo, assim como néctar grego – do
grego antigo “além da morte” – é consumido pelos
Olímpicos antes da batalha contra os Titãs no poema
de Hesíodo, e confere força aos Deuses. Ambas as
substâncias, a védica e a grega, são por vezes ligadas
ao mel, à doçura e ao hidromel. Por vezes o vinho
grego presente nos ritos dionisíacos e eleusianos foi
chamado de “methu” – intoxicante, derivado da raiz
indo-europeia *médʰu, que significa mel ou hidromel

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– assim como Porfírio em seu comentário sobre a
Odisseia, na caverna das ninfas relaciona o mel citado
com a ambrosia dos Deuses. Em um mito irlandês as
já citadas maçãs são descritas como “doces como
mel”, e ainda no caso irlandês, o Deus ferreiro
Gobiniu teria feito uma cerveja mágica capaz de
causar imortalidade aos que bebessem. No caso
germânico o hidromel leva o título como bebida
intoxicante divina, extraída do sangue – semelhante
ao sangue de Cristo “fruto da árvore da vida” – de um
Deus chamado Kvasir– do nórdico “amassar”,
possivelmente relacionado ao ato de pressionar os
favos de mel para extração do líquido, assim como
proposto no caso védico – que nasce do cuspe dos
Aesir e Vanir. O Deus é assassinado por anões, seu
sangue misturado com água e então a mágica bebida
feita. Gigantes então roubam o precioso líquido, e
levam até uma caverna dentro de uma montanha,
onde é guardado por uma giganta. Odin sabendo do
poder da bebida decide rouba-la para garantir que não
caia em mãos erradas, se transforma em águia e vai
até a montanha, onde se transforma em cobra para
passar pelos buracos no solo da montanha e chegar
até à giganta Gunnöld, que guarda o hidromel em três
recipientes. Odin então seduz a giganta e se deita com
ela por três dias e três noites, após isso, bebe dos três
recipientes, e se transforma em águia de novo para
voar até Asgard, onde ele divide o hidromel da poesia
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com os outros Deuse e heróis, porém, no caminho
Odin deixa um pouco do líquido escapar pelo bico, e
dessa porção perdida surgem os maus poetas.
Esse mito claramente se faz similar ao mito
referido anteriormente do roubo das maçãs, assim
como ao mito védico onde o demônio Rahu rouba a
bebida amrita dos Deuses e como punição é
decapitado, porém já tendo consumido da bebida e se
tornado imortal, seu corpo e sua cabeça se tornam
duas entidades separadas, os nódulos lunares na
astrologia védica se chamam Rahu e Ketu, em
referência ao mito.
A bebida no mito indiano possui uma
personificação, o Deus Soma, Deus da Lua, que
também é aprisionado em uma montanha e salvo por
Agni em sua forma aquilina, Shyena. Em outros mitos
relatados nos hinos do RigVeda Brihaspati se
aventura em montanhas em busca do líquido
milagroso.
O símbolo polar já mencionado da montanha se
faz presente nesses mitos, onde as montanhas são
depositórios do doce néctar divino que deve ser
resgatado por Deuses e Heróis. As montanhas
aparecem ainda como morada dos Deuses védicos
com o monte Meru, gregos com o Olímpo, nórdicos
com o Valhalla que se localiza numa montanha,
irlandeses com o monte Errigal, e por fim na própria
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tradição bíblica se tem o Monte Sinai, onde Moisés
viu a hierofania da sarça ardente, ou ainda no novo
testamento onde Cristo é crucificado no monte
Calvário, onde seu sangue santo que cura o lanceiro
romano que o fere o lado, também banha os ossos do
homem primordial que o prefigurou. A montanha é
sagrada para todos os povos por ser vista como um
ponto de conexão com os céus, acima de tudo o que é
meramente humano. O escritor italiano Julius Evola
descreve ter visto luzes durante um estado alterado de
consciência num cume em uma de suas diversas
aventuras como montanhista, e segundo o mesmo, o
ato de escalar uma montanha pode purificar a alma do
indivíduo, como uma atividade ascética que mescla a
mais pura ação no ato da escalada, mas ao chegar nos
picos nevados, onde o ar é rarefeito, a luz é ofuscante
e tudo mais parece pequenino, a contemplação e um
estado meditativo podem ser atingidos pelo
montanhista. Ainda no tema da montanha, Julius
Evola identifica duas características heroicas, a
solidão e o gelo. Portanto a localização do cálice
sagrado e das bebidas imortais em uma montanha não
deve ser ignorada.
Ainda no tema do líquido imortal, existe a
menção de Cristo como “a fonte de água viva” ou
ainda o Espírito Santo como “água da vida”, ambos
os termos sendo semelhantes ao termo usado para o

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elixir da imortalidade na alquimia ocidental “aqua
vitae”, também sendo um composto químico usado na
produção de vinhos chamado de “alma do vinho” ou
“espírito do vinho”. Não se deve ignorar também o
fato de que em alguns manuscritos alquímicos a
imagem da ressureição de Cristo aparece como um
símbolo para o elixir da imortalidade. A titulo de
curiosidade é possível ainda recordar de uma lenda
acerca dos monges da Ordem dos Cartuxos, que
estariam em posse de uma receita do elixir da vida,
que envolveria 130 ervas e flore e outros ingredientes
secretos, mas teria como componente principal o
vinho.

A DAMA

Outra figura notória é a “mulher transcendente”,


presente nos temas heroicos e iniciáticos de todo
mundo como no mito Helênico figuram as hespérides,
ninfas filhas de Hesperis que guardam os frutos
divinos já citados, ou ainda as Musas, filhas de
Mnemósyne – do grego “memória” – que inspiram os
poetas segundo a tradição grega, ou ainda Hebe que
serve ambrosia e néctar aos Deuses e heróis, se
casando com Hércules após sua apoteose. Outro
exemplo interessante são as valquírias – do nórdico

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antigo “aquelas que escolhem os mortos” – que
resgatam os heróis caídos no campo de batalha, seu
pai Odin seria o aquele que escolhe de fato os
guerreiros dignos de ocuparem um espaço no
Valhalla, o salão dos heróis. Ainda na tradição
germânica temos a Deusa já citada Idunn, relacionada
à cura e que porta as maçãs da juventude. No mundo
indo-ariano todo Deus tem sua contraparte feminina,
sua Shakti – do sânscrito “poder” –, entre os budistas
tibetanos existe um tipo de divindade chamado
Dakini que guia o Yogi na jornada ascética e é
representada como uma mulher de aparência
aterrorizante portando um kapala – pote ou copo feito
de crânio humano – contendo amrita, a poção da
imortalidade. Entre os iranianos existe o conceito de
Fravashi – termo também por vezes portando o
significado de “escolher” – que é o nome dado à alma
dos heróis mortos, que podem se mostrar na forma de
uma bela e jovem mulher, ou como uma idosa feia, de
acordo com os feitos do homem. Chegando mais
perto do Ciclo do Graal, temos a Deusa da soberania
celta, relacionada à cavalos brancos e ao hidromel,
por vezes chamada de “égua branca” e em certos
mitos irlandeses figura como esposa mística dos Reis.
Sabe-se que os irlandeses realizavam, como todos os
povos indo-europeus, sacrifícios de cavalos em
cerimônias reais que por vezes também envolviam o
hidromel, que como vimos é um símbolo frequente
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pra imortalidade, mas o tema do Reinado Sacro ficará
pra uma exposição posterior. Outra figura notável dos
mitos celtas são as fadas das ilhas ocidentais das
maçãs, como vimos num tópico anterior, além da
Deusa da Guerra e da Morte Morrigú, que por vezes
é comparada às valquírias germânicas por estar
relacionada à morte de heróis e voar sobre campos de
batalha na forma de um corvo, guiando suas almas ao
Outro-Mundo.
Bem, no campo ritual é sabido que no mundo
celto-germânico a mulher por vezes aparece como
parte da iniciação de um guerreiro numa ordem
militar, ou bando de guerra. O motivo da participação
histórica da mulher nessa iniciação é também
contraparte da participação do bando de guerra nos
costumes de casamento da antiga Europa, onde uma
mulher ao se casar, deixava de integrar a família de
seu pai para integrar a família do seu novo patriarca,
o marido. A passagem era concretizada pelo rapto
simbólico praticado pelo esposo e seus irmãos de
escudo, esse ritual ecoa no costume moderno onde o
noivo ao passar pela soleira da porta, carrega a noiva
nos braços. O motivo histórico desse envolvimento é
possivelmente devido ao costume das irmandades
guerreiras indo-europeias, onde os rapazes da
aristocracia passariam por um longo processo de
iniciação na virilidade, a começar pelo corte do

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“cordão umbilical” onde ele se separa da esfera da
mãe e da casa, e passa aos poucos a ser introduzido
no âmbito do Estado. Esse processo culmina no fim
na formação de um bando guerreiro, onde os jovens
iriam passar por um período longe de suas casas em
busca de terras e posses. Nessas jornadas os jovens
passariam a ser identificados como lobos ou cães, e
um deles seria escolhido como líder do bando através
de oráculos ou jogos sacros, como o jogo de dados.
Os costumes permaneceram vivos de diversas formas
no mundo indo-europeu, porém para não me estender
mais nesse tópico, focaremos num aspecto
importante, o casamento. O jovem indo-europeu só
poderia se casar após integrar-se inteiramente ao
círculo dos homens. Geralmente as mulheres desses
rapazes viriam de terras estrangeiras onde haviam
empreendido conquistas de terra e gado, como vemos
no rapto das mulheres sabinas na história mítica de
Roma. É notório também o fato de que as próprias
ordens de cavalaria medievais têm origem nessas
irmandades, através da organização germânica do
comitatus, onde um bando guerreiro jura lealdade a
um príncipe ou nobre.
Toda essa explicação prévia para apontar dois
aspectos do nosso tema cavaleiresco, a Dama da
cavalaria, e a “Dama do Graal”. A dama da cavalaria
é a mulher da nobreza para a qual o cavaleiro jura

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lealdade até a morte, batalhas foram travadas por
cavaleiros para ganhar o favor de determinada dama,
e geralmente a mesma tinha o papel de agir como
vínculo deste com a virtude. As damas também
participariam do rito de investidura cavaleiresco por
vezes dando banhos purificatórios nos novos
cavaleiros investidos. Certas vezes na literatura
trovadoresca a morte em batalha aparece como um
prazer, em virtude do amor da Dama pelo cavaleiro.
Nas lendas do Santo Graal, a figura mais
intrigante de Dama é Senhora Elaine de Cobernic – à
título de curiosidade durante as pesquisas para o
artigo, me deparei com a etimologia do nome
“Elaine” que estaria relacionado ao grego Helena, de
raiz indo-europeia *Swelénā , que seria o nome
reconstruído de uma Deusa da luz Solar, derivada do
PIE *swel- “brilhar, queimar” – , descendente de José
de Arimatéia que engana por meios mágicos o
cavaleiro Lancelot, fazendo-o pensar que se tratava
de sua amada, e se deita com o mesmo para gerar o
maior cavaleiro de todos os tempos, Galaaz, o
cavaleiro digno do Santo Graal e da espada de Davi,
tido por uma manifestação de Cristo por alguns
hereges medievais. A dama Elaine também é dada
como portadora do santo cálice, mostrando-o para o
cavaleiro Lancelot.

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A mulher transcendente portadora da
imortalidade é uma figura ligada à própria alma do
herói, sua potência – shakti – em direção à
imortalidade, é como um fluido que o torna Rei. O
papel da mulher em relação ao homem nas sociedades
tradicionais geralmente se estabelece dessa forma, o
viril centro imóvel e a energia feminina em
movimento ao redor do centro. Julius Evola em seu
“Metafísica do Sexo” defende que o impulso sexual
deriva da vontade de restaurar a unidade primordial
dos sexos, como no andrógino primordial de Platão
ou como presente na doutrina Hermética da alquimia,
onde a alma e o espírito passam por um “divórcio”,
para a purificação da alma e posterior casamento, a
reunião desse andrógino que caracteriza o estado
primordial, como já visto no nosso trabalho prévio “O
Natal Solar”.

CONCLUSÃO
Bem, acredito que o artigo tenha ficado bastante
rico em informações que fundamentem o ponto que
estabeleci, a demanda do Santo Graal é a empresa
heroica pela restauração olímpica do estado divino do
homem, como já foi representado em diversas
tradições, os símbolos da Ilha Mágica, a Dama
transcendente, a montanha, a substância

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imortalizadora conectam a demanda do Graal tanto à
tradição que veio a prevalecer no Ocidente quanto
aquelas que já haviam cessado a existência, mantendo
os temas característicos da Tradição Ocidental, sob
uma nova linguagem.
Existem outros tópicos que poderiam ser
abordados, como as relíquias da lenda do Graal e os
Deuses célticos, ou ainda a relação com o Reinado
Sacro, com os gibelinos ou ainda o minnesänger,
trovadores alemães e os mistérios órficos, mas esses
temas serão abordados numa possível “edição
completa” desse trabalho, menos referente à Páscoa e
mais focada na empresa do Graal em si.
Por fim gostaria de desejar uma ótima Páscoa a
todos os leitores do P A R V V S L V P V S.

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FIM.

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