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NATAL SOLAR

ÚLFILAS-2022
O Natal no Ocidente abandonado pelos Deuses adquiriu um
caráter meramente festivo, recreativo e foi instrumentalizado
como um meio de aumentar o consumo no fim-de-ano. No
entanto, as raízes simbólicas desse evento são profundas e
realmente divinas.
Para começar é necessário esclarecer alguns pontos
importantes, o Natal é extremamente complexo e misto, como
toda a espiritualidade Ocidental e combina os elementos básicos
da própria civilização que o gerou, o elemento nórdico, o
elemento greco-romano e o elemento cristão. Em várias tradições
o símbolo do solstício de inverno marca o início de uma retomada
da Luz sobre as Trevas, da Ordem sobre o Caos, portanto várias
dessas tradições que compreenderam o Cosmos como
manifestação de princípios superiores acabaram por enxergar uma
importância enorme no acontecimento do dia a partir do qual o
Sol triunfaria glorioso sobre a escuridão.
Porém, é possível notar uma coerência nos símbolos de
todas essas civilizações, nomeadamente, o Reinado sacro, o Axis
Mundi, o Sol e o retorno de uma Idade de Ouro.
A Idade de Ouro
Para começar irei me centrar no tema da Idade de Ouro,
encontraremos a menção mais clara ao tema na tradição Romana,
onde o festival da Saturnália figurava como um retorno ao
Reinado de Saturno sobre a terra, quando os homens não
adoeciam, nem guerreavam ou morriam, quando as frutas eram
doces como mel e os campos não necessitavam de trabalho.
Durante o festival da Saturnália, que durava do dia 17 de
dezembro ao dia 23 de dezembro, os laços sociais romanos se
tornavam tênues, trocavam presentes e sacrificavam em honra aos
Deuses pedindo uma prosperidade comparável a Idade do Ouro.
O filósofo neoplatônico Porfírio associou essa liberdade da
Saturnália como símbolo de uma “libertação das almas para a
imortalidade”. Esse conceito de anos dourados está presente em

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inúmeras tradições e principalmente nas tradições indo-europeias,
e o homem desse período é marcado pela união com o divino, a
imortalidade, a austeridade, a felicidade e de certa forma, um
caráter real. No mito platônico o homem primordial figura como
um andrógino, representando o caráter uno, além das dualidades,
e quando Zeus percebe o poder que os homens poderiam ter,
resolve separar em dois seres, o homem e a mulher, e os torna
também mortais. Nos Vedas o período chamado de Satya Yuga
era também caracterizado pela Unidade e sacralidade, onde os
homens eram governados por Deuses, havia um só Império, uma
só escritura sagrada e uma só língua, assim os homens
conheceram um período de prosperidade e paz. No mito
germânico a Era de Ouro se torna presente depois do Ragnarok
(crepúsculo do divino), onde uma boa parte dos Deuses morrem
em combate contra os monstros liderados por Loki, assim como
os homens morrem em meio a desastres naturais, porém após o
conflito acabar, os poucos Deuses sobreviventes liderados por
Baldr se reúnem nos escombros de Asgard para recomeçar o
Mundo, e um casal de humanos que havia se escondido em uma
floresta recomeçam a vida num mundo onde de novo, os frutos
são doces como mel, os campos não precisam ser trabalhados e a
doença não existe.
Certamente o leitor se lembrou de um tema bíblico
semelhante, o Jardim do Éden, onde Adão e Eva viviam sem
conhecer a doença, o trabalho e a morte até cometerem o pecado
original de consumir o furto da árvore do conhecimento do bem e
do mal.
É dito por certos místicos cristãos que Cristo estava
prefigurado em Adão, assim como durante sua crucificação no
Monte Calvário, seu sangue teria banhado os ossos de Adão que
estariam enterrados na montanha. Segundo a tradição cristã, o
sacrifício perfeito de Cristo teria redimido os pecados dos
homens, assim como o batismo purgaria o pecado original,

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restaurando a possibilidade de um retorno ao estado edênico.
Portanto Cristo seria o caminho para o retorno à Idade do Ouro.
Existe ainda um outro tema onde Cristo se encaixa, o tema
do restaurador, aquele que salvará o Mundo num momento de
dissolução assim como o herói Kalki dos hindus, Imam Mahdi do
islão, o Buda Maitreya, possivelmente Baldr como vimos no mito
germânico, assim como os vários Reis atestados nos folclores
Europeus. Um desses Restauradores que é pouco lembrado, é o
Cônsul Menino da IV Écloga de Virgílio, onde o poeta romano
indica o nascimento de um Cônsul que "restauraria a Idade de
ouro Saturnina, seria líder de heróis, filho de Júpiter e guiado por
Minerva, mataria a serpente e a erva daninha", assim os cristãos
medievais reconheceram nessa figura a imagem de Cristo, e
chamaram a Virgílio "O profeta dos pagãos". E de fato Cristo
também é um desses restauradores das tradições, no Apocalipse é
retratado como um cavaleiro derrotando um dragão, figura que se
tornou um motivo muito famoso na arte dos primeiros cristãos
germânicos, que preferiam essa imagem heroica de Cristo ao
Cristo crucificado.
Cristo então combina em seu simbolismo o Homem
primordial, o caminho para o retorno ao estado desse mesmo
homem primordial e também o próprio restaurador da Idade de
Ouro. Assim como a alquimia sob o véu da metalurgia esconde o
caminho para a purificação da alma em ouro, rumo a deificação,
ou o caminho iniciático dos mistérios mediterrâneos através da
chamada subida da alma pelas esferas planetárias figuradas nos
estágios da iniciação.
O Sol, Mithras e Jesus Cristo
Quando os soyboys "I fucking love science" querem iniciar
uma discussão com a intenção de desbancar o cristianismo, eles
trazem à mesa o tema de Sol Invictus, Mithras e o Natal ( não se
engane, eles querem desbancar todas as religiões nessa atitude,
pois partem do princípio de que os antigos povos não-cristãos

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eram ignorantes e supersticiosos, então desejam associar o
cristianismo ao mesmo aspecto ignorante e supersticioso), pois
bem, vamos limpar um pouco as coisas aqui. De fato tanto Sol
Invictus quanto Mithras, identificados como a mesma divindade,
tinham suas datas de nascimento no dia 25 de Dezembro no Dies
Natalis Solis Invicti, no entanto nenhum deles nasceu de uma
virgem como tanto se propaga, nem Mithras teve 12 discípulos.
Mithras nasce de uma pedra, acontecimento milagroso que pode
ser interpretado de duas formas distintas segundo Julius Evola em
seu livreto "O caminho da Iluminação", a pedra como Axis Mundi
(tema a ser abordado em breve), portanto como centro ou polo, ou
a pedra como figura representante da matéria bruta, de onde
Mithras se liberta no nascimento. A ligação entre Mithras e Jesus
reside no fato de que os dois podem figurar o ato ascético da
mortificação do corpo material do homem, Mithras com seu touro
e Cristo com ele mesmo, assim como no mito onde ambas as
figuras "vencem as águas", Cristo andando sobre ela, e Mithras
nadando contra a correnteza de um rio, simbolicamente retratando
a superação do caos. As semelhanças rituais se devem ao fato de o
cristianismo ter se desenvolvido num ambiente de religiões de
mistério assim como o mitraísmo, não por ser uma cópia do
mesmo.
Já a relação de Cristo com o Sol é mais aceita, onde Cristo
aparece como o Sol da Justiça, é associado ao ouro alquímico,
com a imagem de sua ressureição aparecendo em diversos
manuscritos alquímicos. Foi também associado ao próprio Hélios
na figura do famoso "Helios Christos".
O ouro é o metal que se relaciona ao Sol, à realeza, ao mel e
ao hidromel assim como à imortalidade, sabedoria e à verdade.
Um dos símbolos menos explorados que detém certa relação com
o ouro alquímico é o hidromel, que era famosamente produzido
no fim de ano entre os escandinavos, e figura nos mitos nórdicos
como bebida consumida pelos guerreiros tombados que vivem no
Valhalla, e o hidromel da poesia, bebida responsável pela

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inspiração divina dos poetas e Deuses, par do soma védico,
haoma avéstico, ambrosia e néctar greco-romanos, todos ligados
ao simbolismo do ouro através do mel, da doçura e da cor
dourada, e também estariam ligados à Lua, mas esse tópico ficará
para uma exposição posterior.
O Natal e o Eixo do Mundo
Um dos símbolos mais comuns do Natal é a árvore natalina,
que geralmente é admitida como herança germânica, sendo na
verdade de origem báltica, se espalhando pela Europa pela
influência do Império alemão. A figura da árvore é comum em
toda a Europa em tapeçarias e bordados tradicionais, geralmente é
adornada com pássaros e animais e foi relacionada com o motivo
da Árvore do Mundo, comum às tradições indo-europeias,
asiáticas e algumas tradições do Novo-Mundo. A árvore de Natal
báltica então geralmente é compreendida como um símbolo do
eixo-do-mundo. A ideia de um Axis Mundi existe na narrativa
cristã como a Árvore da Vida, relacionada a árvore do épico de
Gilgamesh, assim como a árvore do Jardim das Hespérides, a
árvore do Império das lendas medievais e segundo alguns
místicos cristãos, a Cruz de Cristo também seria uma forma dessa
mesma árvore, figurando como eixo do mundo cristão.
O Natal e o Rei sagrado
O Natal comemora o nascimento de Cristo, nos mitos
cristãos o Rei dos Reis, reconhecido assim no dia de seu
nascimento pelos chamados três Reis magos, que o presenteiam
cada um com um objeto simbólico, Melquior, cujo nome quer
dizer “meu Rei é luz”, veio de Ur, na Caldeia. É ele quem oferece
o ouro, Gaspar, cujo nome quer dizer “aquele que vai confirmar”,
veio do mar Cáspio. É ele quem oferece o incenso, Baltazar, cujo
nome quer dizer “Deus manifesta o Rei”, veio do Golfo Pérsico.
É ele quem oferece a mirra. O ouro simboliza o caráter real de
Cristo, o incenso seu caráter divino e a mirra a humanidade de
Cristo.

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E ainda no aspecto da Realeza sacra, os escandinavos
tinham uma série de festivais de fim de ano, entre eles um
chamado Yule onde o Rei dos Deuses conduziria sua caçada
selvagem como prelúdio do Ragnarok, para treinar seus heróis e
recrutar novos combatentes, nesse festival em honra tanto a Odin
e Freyr (Deuses relacionados aos Reis e linhagens reais, tidos
como ancestrais da nobreza), sacrificavam-se cavalos como parte
de um rito que assegurava a autoridade do Rei com base na sua
ligação com os Deuses celebrados na Ocasião.
O sacrifício de cavalos é presente em todo o território indo-
europeu e está geralmente relacionado à soberania do Rei sobre a
terra onde ele governa, também ligado ao hidromel e aos
mistérios reais como um todo.
CONCLUSÃO
O Natal então ainda carrega no seu simbolismo tradicional
marcas de um retorno ao Tempo mítico de união com o Divino,
que traz então uma cessação da movimentação frenética dos
tempos sombrios da Idade de Ferro. Portanto o verdadeiro
"espírito natalino" se trata de uma lembrança de que não somos
apenas meros animais perdidos num grão de areia, soprados pelos
ventos do acaso e largados ao relento cósmico, mas somos
criaturas de origem divina, e nossa grande obra é restaurar a
potência herdada dessa origem.
Nas palavras de uma antiga e obscura fórmula recitada por
heróis e iniciados: "Sou filho da Mãe Terra e do Céu estrelado,
mas minha estirpe é celeste."
Um Feliz Natal aos leitores do P A R V V S L V P V S.
FIM

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