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Organizadoras

Sandra Aparecida Riscal


Beatriz Alves de Oliveira
Merilin Baldan

A coordenação
pedagógica e a
gestão democrática

1a edição

São Carlos, SP
2016
© 2016, das autoras

Supervisão
Douglas Henrique Perez Pino

Revisão Linguística
Clarissa Galvão Bengtson
Daniel William Ferreira de Camargo

Editoração Eletrônica
Izis Cavalcanti

Capa e Projeto Gráfico


Izis Cavalcanti

Ficha catalográfica elaborada pelo DePT da Biblioteca Comunitária da UFSCar

A coordenação pedagógica e a gestão democrática / organizadoras:


Sandra Aparecida Riscal, Beatriz Alves de Oliveira, Merilin Baldan.
C778c ── São Carlos : Pixel, 2016.
203 p.

ISBN: 978-85-69206-13-2

1. Coordenação pedagógica. 2. Gestão democrática. 3.


Especialização. 4. Educação. I. Título.

CDD: 371.207 (20a)

CDU: 37
CAPÍTULO 7

O planejamento
pedagógico-democrático
Sandra Aparecida Riscal

Cada escola é um espaço único, com uma história individual de relações entre
diferentes agentes. Para que o planejamento pedagógico possa ter alguma chance
de ser objeto de ação dos diferentes agentes, ele deve ser capaz de representar,
ao menos em parte, suas intenções e expectativas. Em geral, as expectativas não
coincidem, e, frequentemente, mesmo no interior das diferentes categorias – entre
docentes, entre pais ou entre alunos –, há uma única opinião ou consenso. Por isso,
a elaboração do planejamento está associada ao Projeto Político-Pedagógico (PPP)
da escola e constitui o aspecto especificamente pedagógico da implementação das
intenções políticas negociadas na elaboração do PPP. Um planejamento democrático
exige a criação de um espaço público e democrático, no qual todos possam apresen-
tar suas posições e ser ouvidos, abrindo-se, ao fim, o debate para a negociação de
posições.

É necessário reafirmar se tratar de um processo que pode levar a muitas


tensões e conflitos, mas essa é uma característica da ação democrática. Não é o
caminho mais fácil, porém, sem dúvida, é o que pode trazer os melhores resultados
políticos e educacionais a longo prazo.

Por isso, na elaboração do planejamento, deve-se evitar a tentação de aplicar


modelos ideais homogeneizantes. Tem-se de partir do real, que é relacional e con-
traditório, porque constituído de agentes reais em conflito.

O planejamento precisa ter como fundamentos éticos os seguintes princípios:

• o papel social da escola;


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• o reconhecimento da alteridade (do outro);


• a interação da escola com a comunidade local;
• o papel da escola na construção da autonomia intelectual e do desenvolvi-
mento cultural, social e científico;
• a ação pedagógica como uma ação política.

O momento do planejamento deve levar em consideração as questões premen-


tes que resultem na deficiência do processo de aprendizagem dos alunos ou que
produzam a exclusão do processo social.

Um dos pontos que precisam ser considerados é o fato de que, ao dizer que,
entre os fundamentos do planejamento, estão o papel social da escola, o reconheci-
mento da alteridade e a interação da escola com a comunidade, asseveramos que a
própria compreensão do papel da escola deve ser pensada em termos sociais e que
todo o seu currículo e conteúdo devem partir desses pontos.

Na condição de uma das principais instituições responsáveis pela socialização


e constituição de sujeitos sociais, a escola deve assumir um caráter diferente daque-
le para o qual foi tradicionalmente projetada.

Isso significa que os conteúdos não mais podem ser pensados como conheci-
mentos universais e impessoais, com validade universal. O papel e o estado daquilo
que seja conhecimento estão sendo postos em questão, e é fundamental que os
agentes escolares compreendam que o processo de inclusão social exige uma pos-
tura político-democrática implicando a abertura não apenas do espaço escolar, para
a participação da comunidade, mas também do currículo, para a inclusão de formas
de conhecimento até hoje excluídas – que, por serem rejeitadas, desprovidas e des-
tituídas desse estatuto, acabam excluindo toda uma população da escola.

A proposta de planejamento apresentada aqui visa a possibilitar a troca e a


integração de saberes entre comunidade, alunos e docentes, de modo a valorizar a
condição de conhecimento do aluno e de sua comunidade.

Tanto a cultura popular, por mais que, ao docente, pareça alheia ao universo de
formação, quanto a cultura das galeras ou redes sociais devem ser compreendidas
pelos agentes escolares, que, em vez de desprezá-las, podem enriquecer o processo
educativo com a sua integração às diretrizes curriculares da instituição.

O que apresentaremos, então, são diretrizes para discussão na escola entre


comunidade, alunos e docentes, com o intuito de demonstrar que é possível – e
muitas experiências têm demonstrado – reconhecer o saber do outro e integrar esse
saber às estratégias de ensino da escola.
94 A coordenação pedagógica e a gestão democrática

1. PLANEJAMENTO E PRECONCEITO
Um dos primeiros pontos a serem abordados é o preconceito, que subjaz a mui-
tos dos conteúdos trabalhados nas escolas. A reflexão sobre a alteridade, isto é, o
respeito pelo outro em sua diferença, é um dos fundamentos das novas concepções
curriculares. Trataremos desses aspectos nas disciplinas que apresentarão concei-
tos teóricos e tarefas de ação nesse sentido. Por isso, um dos primeiros temas são os
preconceitos, que têm como consequência o bullying – assunto que contemplaremos
no curso.

Nossa intenção é já garantir que o planejamento reserve espaço para as tare-


fas e discussões com a comunidade escolar que serão feitas a partir das disciplinas,
para que elas não sejam artificialmente abordadas.

Um dos principais aspectos deste curso é o seu caráter não apenas teórico mas
também de intervenção, e, para que isso ocorra adequadamente, é necessário que
as preocupações apontadas sejam integradas à globalidade do planejamento.

A educação e a escola têm um importante papel na constituição dos preconcei-


tos e na reprodução das práticas sociais preconceituosas. Por isso, é fundamental,
para a implementação de uma sociedade democrática, a adoção, por parte da esco-
la, de ações que apontem para a superação desses preconceitos.

Um exemplo é o predomínio de livros didáticos e paradidáticos nos quais a figura


da mulher é ausente ou caracterizada como menos qualificada que a do homem; isso
contribui para uma imagem de inferioridade feminina, por um lado, e de superioridade
masculina, por outro. As cores rosa para meninas e azul para meninos, os papéis
representados nas brincadeiras e a ausência das crianças negras nas salas de nível
mais avançado vão, entre outras questões, demarcando e referendando, no interior do
espaço escolar, as posições machistas e racistas que persistem em nossa sociedade.
Também o reforço dos meios de comunicação a figuras masculinas fortes, musculosas
e violentas e a figuras femininas dóceis e meigas (com a consequente rejeição a meni-
nos mais dóceis e meigos e a meninas fortes) é exemplo desse problema.

A escola representa um espaço privilegiado para a alteração do processo de


discriminações e preconceitos, pois abriga, em seu interior, todas as distintas for-
mas de diversidade, quer sejam de origem social, étnico-racial, cultural, sexual ou
de gênero. É, portanto, um espaço que deve ser aproveitado para a construção de
caminhos que eliminem os preconceitos e as práticas discriminatórias. A escola de-
mocrática e formadora de indivíduos capazes de exercer a cidadania, com dignidade,
tem de educar para a valorização da diversidade.
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Esse ponto é importante na tomada de posição que determina o caminho do


planejamento. A democracia social deve constituir um de seus principais pilares:
quando se fala em participação democrática, tem-se a participação de todos, inde-
pendentemente de qualquer outra condição ou avaliação.
Entre as diferentes culturas, sejam indígenas, africanas, asiáticas ou europeias,
só se pode avaliar seu valor por meio dos significados que elas próprias atribuem às
suas ações. Não se pode mais falar numa trajetória civilizatória, que transformaria o
selvagem em civilizado, pois não há nenhuma maneira de estabelecer um padrão de
desenvolvimento sem que se tenha como base a superioridade de uma das culturas.
O estabelecimento de um único padrão civilizatório é a negação daquilo que seria
a mais impressionante característica humana: a sua capacidade de se constituir de
forma diferente em tempos diferentes e em espaços diferentes, de enfrentar a diver-
sidade de problemas e obstáculos impostos pelos eventos históricos de forma variada
e própria, em um processo contínuo de reinventar-se e superar-se.
Não há trajetórias culturais que não sejam únicas, e a diversidade de expe-
riências e de sentidos atribuídos à própria vida é o maior testemunho da vocação
humana para a diversidade.
Posta desse modo, a diversidade cultural não é uma coleção de culturas em
diferentes estágios transitórios no caminho rumo à civilização ou uma apresenta-
ção de experimentos civilizatórios malsucedidos, mas a própria manifestação da
liberdade humana, que, longe de uma trajetória preestabelecida e determinada, se
inventa e se constitui, a cada instante, em distintos espaços, criando, em situações
específicas, a própria história coletiva.
Nesse sentido, considerar o processo de planejamento como um momento de
criar experiências de respeito à diversidade é um caminho necessário para a produ-
ção de uma democracia social.

2. O PLANEJAMENTO
O planejamento é um processo de administrar diferenças ou oposições entre
os diversos membros da comunidade escolar, propiciando, assim, a democracia, com
a participação de todos.

De acordo com o dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2015), planeja-


mento é o ato ou efeito de planejar; é a preparação de um trabalho, de uma
tarefa, com o estabelecimento de métodos convenientes. É a planificação
ou determinação de um conjunto de procedimentos, de ações visando à
realização de um determinado projeto.
96 A coordenação pedagógica e a gestão democrática

O planejamento deve ser compreendido como uma atitude crítica do educador


visando a levar todo o coletivo da escola (professores, diretor, funcionários, alunos
e pais) à reflexão sobre o papel da instituição e sobre o processo de ensino. O
planejamento é um processo que deve possibilitar a reflexão radical dos problemas
da educação escolar e envolve a atuação concreta dos educadores, pais e equipe
escolar no cotidiano do trabalho pedagógico, em suas ações e situações, com a
permanente interação entre educadores e educandos.

O planejamento é um instrumento orientador do trabalho e pode determinar a


transformação da realidade da escola e das salas de aula. Sua eficiência, entretanto,
depende do compromisso pedagógico-político dos docentes, diretor, pais, funcioná-
rios e alunos, pois sua elaboração é um contínuo processo de ação-reflexão-ação,
exigindo uma atitude crítica de todos os envolvidos.

Em um trabalho de 1990, Fusari alerta sobre os seguintes problemas, relativos


à forma como os professores veem o planejamento na escola:

• os professores creem que não seja necessário o planejamento do tra-


balho pedagógico, porque estão acostumados às constantes improvisa-
ções em suas atividades cotidianas;
• para muitos professores, o planejamento é concebido como um proce-
dimento burocrático que não tem relação com as atividades desenvolvi-
das durante a aula;
• é comum a afirmação de que os professores, simplesmente, copiam ou
reproduzem o planejamento de anos anteriores, não indicando as ativi-
dades que, de fato, serão realizadas.

Essas práticas, segundo Fusari, impossibilitam a organização do trabalho


pedagógico.

O trabalho pedagógico não pode ser uma constante improvisação, sem a definição
de objetivos e a coordenação de atividades entre os diferentes agentes escolares. Não
se pode mais deixar o professor em solidão e sabedoria próprias decidir o que precisa
ser aprendido ou não. Se a escola é, fundamentalmente, uma instituição social, é neces-
sário que o planejamento também o seja, e, para isso, devem-se criar condições para
uma discussão coletiva.

Na prática docente atual, o planejamento tem-se reduzido à ativi-


dade em que o professor preenche e entrega à secretaria da escola
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um formulário. É preciso assumir que é possível e desejável superar


os entraves colocados pelo tradicional formulário, previamente tra-
çado, fotocopiado ou impresso, em que são delimitados centímetros
quadrados para os ‘objetivos, conteúdos, estratégias e avaliação’
(FUSARI, 1998, p. 44).

A proposição de um planejamento democrático de caráter crítico e social passa


pela necessidade consciente de o docente e o coordenador pedagógico rejeitarem
modelos prontos dele, delimitado e baseado em técnicas de planejamento e ensino.
Se, por um lado, o modelo pronto apresenta facilidade e rapidez, por outro des-
considera a própria conjuntura escolar e resulta em algo formulado sem lugar de
aplicação no real.

O planejamento deveria constituir o momento de um processo em que o pro-


fessor assume o papel de educador, isto é, toma uma postura crítica de reflexão
sobre o próprio trabalho e o seu sentido e significado para a vida dele e a do aluno.

É importante desencadear um processo de repensar em todo o ensino, buscando


um significado transformador para os elementos curriculares básicos:

• objetivos da educação escolar (para que ensinar e aprender?);


• conteúdos (o que ensinar e aprender?);
• métodos (como e com o que ensinar e aprender?);
• tempo e espaço da educação escolar (quando e onde ensinar e
aprender?);
• avaliação (como e o que foi efetivamente ensinado e aprendido?)
(FUSARI, 1998, p. 44).

O planejamento não é o simples ato de preencher um formulário ou estabelecer


objetivos, metodologias etc.; o planejamento é um processo e, por isso, dinâmico,
sempre em discussão e atualização, visando a programar o que, como e quando
será feito. O planejamento, após o processo de discussão e elaboração, torna-se um
instrumento formal, ou seja, um documento oficial da escola no qual se registram as
análises e proposições formuladas pelos diversos agentes escolares.

A escola democrática exige:

• um planejamento que esteja voltado para o desenvolvimento cultural e de-


mocrático da população;
• um planejamento que leve em consideração a origem social, as condições
materiais de vida e os aspectos culturais dos alunos, de modo a preparar
crianças e jovens para a vida e o trabalho;
98 A coordenação pedagógica e a gestão democrática

• um planejamento que conte com professores competentes, seguindo as


orientações gerais da política educacional, da legislação educacional e dos
PCNs vigentes no país, e com a comunidade.

2.1 O planejamento tem início pelo diagnóstico


Para atingir os fins da atividade escolar, é necessário que cada escola estabele-
ça uma política de ação própria, garantindo o acesso, a permanência e a aprendiza-
gem efetiva dos alunos. Por isso, é preciso identificar os problemas da escola, utilizar
os indicadores internos e externos que permitam reconhecê-los, categorizá-los, isto
é, organizá-los em categorias, estabelecendo-se os prioritários, e propor ações efi-
cientes, para solucionar todos eles. Essas atividades são desenvolvidas no período
de diagnóstico do planejamento. É a partir dos dados concretos, representados pela
situação dos alunos e pela análise dos sucessos e fracassos dos outros períodos, que
se pode produzir o diagnóstico, que deve apontar os pontos positivos e os negativos
dos processos anteriores. A indicação dos problemas deve produzir uma reflexão
sobre suas causas, para a identificação dos fatores – que têm de ser atacados, para
a sua solução.

Em muitos casos, os indicadores são considerados apenas números a serem


colocados em tabelas, para a aferição da média, do desvio-padrão e da dispersão.
Esses procedimentos, apesar de pertinentes, não terão significado se não forem
seguidos de uma discussão aprofundada do seu significado. Isso significa que a abor-
dagem qualitativa dos dados é mais importante do que a elaboração de infindáveis
planilhas de diagnóstico.

Outro grande problema que, muitas vezes, impede uma reflexão coletiva sobre
o planejamento é a ideia de que cada professor pode estabelecer os conteúdos como
bem entender. O conhecimento torna-se, assim, propriedade privada do professor,
perdendo o seu caráter de construção cultural e social ou coletiva.

O estabelecimento das metas de aprendizagem e de conteúdo das disciplinas


deve ser objeto de discussão e decisão coletivas e atender aos princípios determina-
dos coletivamente no PPP da escola.

O diagnóstico precisa produzir um rol de problemas a serem atacados durante


o período letivo, devendo, por isso, apresentar os objetivos específicos e as metas
que determinarão os conteúdos, as ações e os métodos e recursos empregados.
Salienta-se que esses pontos não devem ser mais alguns itens a serem preenchidos,
mas resultado de uma tomada de posição política do coletivo da escola em face dos
problemas detectados.
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É necessário considerar e analisar a situação e os problemas da escola por


meio de um diagnóstico que seja formulado com os indicadores internos e externos.
A partir do diagnóstico, então, são estabelecidos os objetivos gerais, que constitui-
rão a política da escola, dando as bases para a elaboração do projeto pedagógico.

2.2 Os indicadores
A elaboração do diagnóstico deve seguir indicadores externos e internos que
possibilitem a compreensão mais global dos problemas da escola.

Indicadores externos: dados disponíveis em instituições públicas e centros


de pesquisa, como o MEC (Ministério da Educação) e o Inep (Instituto Nacional de Es-
tudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, do MEC), correspondendo às metas
do Ideb e à análise de participação da escola nas avaliações em grande escala, como
a Prova Brasil e a Provinha Brasil. Esses indicadores podem orientar a política da
escola. Índices como o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) e o Ideb (Índice de
Desenvolvimento da Educação Básica), além de dados do IBGE (Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística) e do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) sobre
renda, taxa de analfabetismo, concentração de renda, inserção precoce de crianças
no mercado de trabalho, condições de moradia (água, esgoto etc.), taxas de esco-
larização, escolaridade dos pais, distorção idade-série e grau de escolarização da
população local, podem contribuir significativamente para estabelecer os objetivos
da educação e conduzir as finalidades das ações a serem implementadas. Informa-
ções sobre repetência, evasão, quantidade de alunos com idade acima da adequada
para a série e baixo desempenho em avaliações externas, como o Saeb (Sistema
de Avaliação da Educação Básica) e o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), são
elementos que permitem instituir metas para as ações a serem sugeridas no projeto.

Indicadores internos: perfil dos alunos atendidos pela escola e das famílias,
além das expectativas e aspirações da comunidade. É necessário conhecer os alu-
nos, com as características de sua vida, e as relações familiares. O reconhecimento
das condições de vida dos alunos e das famílias é prioritário para a elaboração do
planejamento. A comunidade deve participar da definição dos objetivos da escola,
e o professor deve conhecer o aluno a quem vai ensinar, para saber o que e como
ensinar. É preciso também propor ações e tarefas que estimulem a imaginação, a
observação e o raciocínio e levem em consideração as características econômicas,
sociais e culturais locais. Um dos aspectos mais importantes é a análise dos resulta-
dos obtidos no ano anterior, por meio de estudos bimestrais. Essa análise não pode
ser apenas quantitativa, com a produção de médias a partir das notas nas diferentes
matérias, mas também qualitativa, livre de preconceitos (Fulano não tem jeito! ou
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Esse não vai de jeito nenhum!), com o levantamento das dificuldades desses alunos
e das condições que produziram seu fracasso.

É necessário ainda analisar como é a gestão curricular e pedagógica da escola


e como ela influencia o desempenho do aluno. É necessário ainda reconhecer a
experiência e as especialidades de cada professor e propor ações que estejam de
acordo com as especificidades de cada um. É necessário conhecer e ampliar as
experiências bem-sucedidas. Devem-se ainda verificar todos os espaços físicos da
escola, avaliando se precisam de reforma, se são adequados, se estão sendo bem
utilizados e se podem servir a algum outro uso. Finalmente, é importante compreen-
der como se desenvolvem as relações entre a escola e as famílias e entre a escola
e as entidades do bairro, como associações de moradores, igrejas e comunidade em
geral (universidades, escolas, órgãos oficiais e administração municipal).

2.3 O estabelecimento de metas


O planejamento deve partir de um diagnóstico sobre a comunidade por meio
dos indicadores internos e externos. Esse diagnóstico deve ser determinado através
da caracterização da escola (por exemplo, situação social e organização) e do perfil
de professores e técnicos. Além disso, devem-se elencar as condições de melhor e
de pior aproveitamento da escola, as experiências positivas e negativas, os resulta-
dos quantitativos e uma análise qualitativa.

A partir do diagnóstico, deve-se efetuar uma reflexão sobre a situação escolar.


Essa reflexão deve ser realizada por meio do estabelecimento de categorias a serem
analisadas e de suas condições de satisfação. Assim, para cada categoria, pode-se
ver se as condições estão satisfatórias, sendo, portanto, pontos fortes da escola, ou
se elas precisam melhorar, constituindo, então, pontos fracos (por exemplo, ensino
de português na série X e dificuldades de leitura dos alunos Y e Z).

Um quadro com as categorias delimitadas possibilita a definição dos objetivos


gerais do projeto pedagógico, o estabelecimento das ações políticas da escola e
a indicação das prioridades. Para que se demarquem as prioridades, é necessário
selecionar e consolidar os pontos fortes e enfrentar e propor soluções para os pontos
considerados fracos. Nesse sentido, é importante que se procure verificar a possibili-
dade de desenvolver atividades que articulem os pontos fortes aos fracos. Por exem-
plo, uma boa equipe de futebol ou de músicos na comunidade escolar pode ajudar a
atrair crianças e pais que não demonstram interesse pela educação. A abertura da
escola para jogos, festividades, concursos e atividades voltados à comunidade pode
resultar na redução da violência e no maior respeito pelo trabalho desenvolvido na
escola.
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Assim, ao fim da fase de estabelecimento de metas, deve-se obter um quadro


em que sejam apresentados os objetivos gerais de acordo com os dados de cada
uma dessas categorias. Em seguida, devem-se articular os objetivos específicos,
vinculando-os aos conteúdos a serem trabalhados, o que determinará as metas e
ações que podem ser levadas adiante.

2.4 O planejamento propriamente dito corresponde à elaboração do plano


de ação
O estabelecimento das ações a serem realizadas deve levar em consideração
mais um aspecto: a verificação de custos e fontes para seu financiamento. Dessa
forma, as diferentes atividades devem ser acompanhadas do seu custo e das ações
que possibilitarão o seu financiamento – caso isso seja necessário.

É importante que as ações apresentadas sejam objetivas e exequíveis, poden-


do ser realizadas pelo corpo de agentes escolares com os meios e no tempo de que
dispõem. Várias ações não são executadas, porque, após o impacto de uma sugestão
que pareceu a todos maravilhosa, se descobre que o seu custo, as condições de sua
realização ou o tempo necessário para a sua execução as tornam inviáveis. Muitas ve-
zes, pequenas ações, localizadas em salas de aula e classes específicas de alunos e
pais, propiciam resultados mais frutíferos que grandes projetos, ousados, mas de difícil
execução. Se a escola, entretanto, estiver numa comunidade disposta a atuar e a levar
adiante um projeto ambicioso, essa atividade deverá ser incentivada, como forma de
possibilitar uma maior integração da comunidade às atividades escolares.

As ações devem ser planejadas por meio de um cronograma de ação. A cada


aspecto considerado fraco no diagnóstico, constituindo uma meta a ser enfrentada,
têm de estar associadas ações que visem à sua melhora e ao seu fortalecimento.

Assim, precisa ser elaborado um rol de ações com a indicação do objetivo que
se pretende atingir com determinada ação. As ações devem ser organizadas em
ordem cronológica, seguindo a emergência com a qual têm de ser implementadas e
as condições materiais e de tempo necessárias para o seu planejamento e execução.

Para cada ação, deve ser definido um responsável por sua execução. Todos,
de acordo com o tipo de tarefa e a especificidade da ação exigida, devem ser en-
volvidos. Pais e alunos de séries mais adiantadas podem participar de projetos de
recuperação ou de desenvolvimento de atividades com outros alunos.

Para cada uma das atividades, devem ser definidos os métodos de ação, os
recursos didáticos e materiais a serem empregados e o tempo previsto para o seu
102 A coordenação pedagógica e a gestão democrática

desenvolvimento. Caso seja preciso recurso financeiro extra, terá de ser estabeleci-
do o modo de financiamento.

Finalmente, cada atividade deve vir acompanhada do local em que será desen-
volvida e da data e horário previstos. É importante que se pense também em ativi-
dades que se realizem fora do espaço escolar, em colaboração com a comunidade.

Será, então, produzido um documento com o diagnóstico e as metas e ações pre-


vistas que virá acompanhado de um cronograma de sua execução. Essa é a estrutura do
documento denominado Planejamento Pedagógico das Atividades.

2.5 A avaliação do processo e a implementação das atividades


A avaliação do planejamento não pode ser pontual, devendo integrar o processo
de sua implementação. Durante o desenvolvimento das ações, é possível verificar se
os objetivos definidos estão adequados, o que poderia ser mudado para seu aperfei-
çoamento e se as ações estabelecidas são executáveis no tempo e da forma como se
deu o planejamento. Finalmente, é necessário que nenhuma ação perca de vista as
metas que tinha como objetivos, de maneira a constatar se o que havia sido projetado
foi atingido.

É necessário também que se faça uma avaliação geral para analisar a ade-
quação entre os objetivos e metas propostos e as ações desenvolvidas. Além do
acompanhamento de verificação de cada item proposto, é preciso que se avaliem a
participação e o interesse dos diferentes agentes do processo e os efeitos das ações
e dessa participação na aprendizagem dos alunos.

Finalmente, é necessário que se estabeleçam as ações que tiveram efeito po-


sitivo e aquelas que não surtiram efeito ou tiveram efeito negativo, os aspectos que
apresentaram dificuldades em sua execução e as consequências do processo para a
relação entre escola e comunidade.

2.6 O professor como mediador do projeto pedagógico e do trabalho em


sala de aula
A principal tarefa imposta pelo planejamento democrático é a adoção do traba-
lho coletivo como forma fundamental de ação pedagógica. Isso apresenta uma série
de dificuldades na sua implementação; uma das maiores na realização do projeto
político-pedagógico é acreditar que a ação pedagógica seja de caráter individual,
dizendo respeito, unicamente, a uma ação do professor dentro de sua sala de aula e
à sua relação na transmissão de conteúdos para os alunos.
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A realização dos objetivos apontados exige um trabalho coletivo, e, frequente-


mente após sua elaboração, o projeto pedagógico é posto em segundo plano, vendo-
-se sua produção como uma mera exigência legal ou modismo, e não como uma
oportunidade de mudança e renovação da ação educativa. Ao fim, todos fazem as
coisas como sempre fizeram.

A prática educativa que se encontra pressuposta na elaboração coletiva do


planejamento concebe o processo educacional como um instrumento promotor da
autonomia da escola e seus agentes. Para que isso seja alcançado, os diferentes
agentes devem estar imbuídos da convicção de que a educação não se processa
por meio de ações individuais, isoladas e fragmentadas, mas na interação e reflexão
coletivas do cotidiano escolar, das questões mais simples às mais complexas.

Todos os agentes da escola devem poder se constituir como sujeitos da educa-


ção, vivenciando os atos de ensinar, de pesquisar e de aprender de acordo com as
diferentes percepções e concepções envolvidas nesse processo. É o conjunto dessas
percepções, com a riqueza de sua diversidade, que deve compor o planejamento
pedagógico.

O planejamento pedagógico é fruto de um trabalho coletivo e, por isso, expres-


sará as ideias, histórias de vida e crenças de todos os que participaram de sua con-
cepção e elaboração. Porque reflete a relação entre aquelas pessoas ali agrupadas,
é único para cada escola.

Os professores, assim como os demais agentes educacionais, são sujeitos con-


cretos e vivem em um período histórico específico, em um contexto social específico
e em circunstâncias específicas. Trazem em sua bagagem intelectual situações viven-
ciadas como referenciais, teóricas e práticas e uma série de experiências que devem
ser objeto de reflexão e análise, todas elas essenciais para a elaboração do projeto
de ação educacional. Exatamente por terem histórias individuais, os professores não
podem assumir a sua posição como a única ou melhor a ser adotada por todos.

É necessário que todos os docentes envolvidos na ação educacional


compreendam que suas concepções são o resultado de um processo social e histórico,
e é a experiência social e histórica coletiva que deve ser tomada como base para a
construção do conhecimento.

A postura que se espera do profissional da educação, cujo fundamento é a


democratização da sociedade, é política, porque suas ações devem visar ao bem
coletivo; ética, porque ele deve ter como compromisso o respeito a si e aos outros;
e pedagógica, porque ele é o principal articulador entre o trabalho institucional de
elaboração do planejamento e a sua realização na ação cotidiana da escola.
104 A coordenação pedagógica e a gestão democrática

O profissional da educação deve estar atento ao caráter coletivo do trabalho


pedagógico, que não é individual nem solitário, porque a ação pedagógica não pode
ser um procedimento individual e solitário. Isso significa que a participação na ela-
boração do planejamento implica assumir uma postura que busque, na interação
coletiva, o material e o meio de reflexão e ação. Trata-se de reconhecer a ação cole-
tiva nas situações práticas da escola, na elaboração dos planos, na ação pedagógica
e na avaliação do trabalho. Nessa perspectiva, a atuação docente não se articula
apenas ao conteúdo das matérias com as quais trabalha mas também ao contexto
das construções sociais e coletivas.

A atuação do professor como agente do processo democrático exige a cons-


tante análise, reflexão e compreensão da sua prática, ao construir saberes por meio
da interação com os demais agentes e de um trabalho de pesquisa social sobre a
cultura local da escola, pesquisando e sistematizando novos saberes e reelaborando,
persistentemente, os conteúdos de aprendizagem.

Os docentes, nessa concepção, acabam se tornando agentes coletivos, porque


se tornam conscientes de que, isoladamente, não conseguem produzir um trabalho
educacional.

O processo de planejamento deve levar em consideração as singularidades e


diferenças individuais e a participação de todos os sujeitos da escola, potencializan-
do, pelo trabalho de reflexão coletiva, a criatividade e as capacidades. A interação
entre os diferentes sujeitos ocorre nas situações de ensino, de pesquisa e de inves-
tigação das situações desafiadoras.

2.7 O planejamento a ser encaminhado para avaliação


O planejamento encaminhado para avaliação deve seguir o modelo normalmente
usado pela escola. Tanto as escolas do sistema estadual de ensino quanto muitas
secretarias municipais de educação possuem modelos próprios. As tarefas indicadas
para realização na escola devem ser incorporadas a esse planejamento.

Todas as atividades indicadas para incorporação ao planejamento provocam


maior integração entre docentes, equipe gestora, alunos e comunidade, ao mesmo
tempo que criam condições para a compreensão e o conhecimento de formas ar-
tísticas específicas de grupos sociais distintos. Os alunos terão a possibilidade de
conhecer práticas culturais mais eruditas, como a música, a literatura e a pintura.
Da mesma maneira, muitas tarefas procurarão aproximar a cultura do aluno e seu
entorno da vida escolar, integrando-a ao processo educativo e possibilitando aos
docentes compreender aspectos da criatividade dos alunos. Exemplos desses casos
estão nas atividades de pichação, fotos e filmes.
105

As disciplinas do curso de Coordenação Pedagógica terão todo o material ne-


cessário para as oficinas que deverão ser desenvolvidas com os alunos e professores
para o projeto Escola Descolada. Na biblioteca do curso, na plataforma Moodle, os
professores poderão encontrar apostilas sobre a produção de filmes (com celular)
e a confecção de histórias em quadrinhos, além de fotos e textos para estudos de
gênero e sexualidade, de arte abstrata, de modernismo etc.

REFERÊNCIAS
FUSARI, J. C. O planejamento do trabalho pedagógico: algumas indagações e tentativas de
respostas. São Paulo: FDE, 1998. p. 44-53.
HOUAISS. Grande dicionário da língua portuguesa. 2015. Disponível em: <http://houaiss.uol.
com.br/>. Acesso em: 14 dez. 2015.
CAPÍTULO 8

O papel do coordenador
pedagógico na gestão
democrática da escola
e na elaboração do projeto
político-pedagógico
Sandra Aparecida Riscal

A coordenação pedagógica é uma função de origem recente nas escolas pú-


blicas. O debate sobre a necessidade de um agente que exercesse as atividades de
coordenação do trabalho pedagógico começou a ganhar corpo na década de 1980,
tornando-se esse profissional reivindicação do movimento de sindicatos e associa-
ções docentes como uma das formas de democratizar o processo educativo.

Este artigo apresenta, de forma sumária, algumas características do papel do


coordenador pedagógico na gestão democrática da escola e na implementação das
políticas educacionais. Isso implica compreender a dimensão político-pedagógica de
sua função.

O centro do trabalho do coordenador pedagógico é a organização do trabalho


educativo na escola, que deve ser executado em colaboração com a comunidade
escolar e consiste na articulação, no planejamento, na execução e na avaliação das
ações pedagógicas realizadas no âmbito escolar.

Como se trata de uma atividade recente, boa parte das tarefas realizadas pelo
coordenador pedagógico está ainda em estágio de discussão e consolidação. A au-
sência de uma definição precisa do papel do coordenador pedagógico tem resultado
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em muitos desvios de função e no estabelecimento de um universo muito vasto e


desarticulado de atividades, que, em geral, transformam o coordenador em uma
espécie de faz-tudo da escola.

Uma das tarefas que mais têm pesado sobre os ombros dos coordenadores
são aquelas encaminhadas pelas secretarias e órgãos administrativos municipais
e estaduais de educação. São relatórios encaminhados à escola que devem ser
preenchidos pelos coordenadores e docentes e, depois, tabulados, cujos resultados
têm de ser enviados às respectivas secretarias. Consistem em formulários, planilhas
estatísticas ou documentos que os coordenadores devem garantir que sejam pre-
enchidos pelos docentes de sua escola e devolvidos no prazo determinado, em um
processo sem fim, que acaba ocupando todo o tempo que deveria ser dedicado ao
trabalho pedagógico, desvirtuando a finalidade da função.

Esse tipo de atividades deveria ser realizado por meio de um planejamento ori-
ginado da própria escola e com objetivos estabelecidos também pela própria escola.
Realizadas da forma como são, elas perdem seu valor heurístico, porque acabam
não representando adequadamente as atividades da escola e de seus agentes, que
consideram tais relatórios como um empecilho ao seu trabalho, e não como um
instrumento auxiliar na solução dos problemas escolares.

O coordenador é, assim, transformado em agente burocrático das instâncias


administrativas, fazendo o papel, muitas vezes, de controlador e fiscalizador dos
professores – atribuição que pouco corresponde às funções pedagógicas que deveria
cumprir e que, além de tudo, prejudica a implementação das ações necessárias.
Visto como fiscal do sistema de ensino pelos docentes, o coordenador acaba se
tornando um inimigo, e não um colaborador nas atividades pedagógicas.

Além disso, em geral, por não conhecerem exatamente o papel dos coordena-
dores pedagógicos, os diretores lhes encaminham as tarefas mais inusitadas. Sem-
pre que ocorre um problema, mas não há na escola um responsável designado para
a tarefa, o coordenador pedagógico é acionado, para dar uma solução. Eis algumas
tarefas que estão fora do escopo de suas atividades, mas que, muitas vezes, lhe são
atribuídas: acompanhar alunos ao posto de saúde quando ficam doentes, substituir
professores ausentes, preencher toda sorte de relatórios sobre a escola e solucionar
problemas materiais que exigem a arrecadação de fundos etc.

Uma ação particularmente difundida e considerada por muitos especialistas


como uma das funções precípuas dos coordenadores é a formação dos professores
em serviço. Trata-se, aqui, de uma séria confusão entre o papel do coordenador
como articulador do trabalho docente e a sua condição de articulador de um projeto
108 A coordenação pedagógica e a gestão democrática

coletivo. Se considerarmos o fato da diversidade de campos de atuação dos docen-


tes das escolas, percebe-se que essa não pode ser tida como sua principal atividade.

A ideia de que as HTPCs seriam utilizadas pelos coordenadores para a apresen-


tação, a leitura e o estudo de textos com vistas à melhoria da formação não pode
ser considerada como uma formação em serviço. As HTPCs (Horas de Trabalho Peda-
gógico Coletivo) deveriam ser dedicadas à discussão do processo de construção do
trabalho coletivo na escola, debatendo-se os problemas das aulas e dos conteúdos,
as soluções possíveis e os projetos a serem implantados. A ênfase, aqui, deveria ser
dada ao conceito de trabalho pedagógico coletivo, não à formação em serviço – um
desvio do papel do coordenador na escola.

A tarefa de formação em serviço é complexa e implica a constituição de um


diagnóstico das defasagens e dos problemas da formação dos docentes, exigindo
um programa de atividades específicas para esse fim e atendendo a todas as neces-
sidades dos docentes da escola. Não pode, portanto, ser imputada a um só profes-
sor; deve constituir, antes de tudo, uma tarefa do sistema responsável pela escola,
que não pode, simplesmente, dela se eximir, pondo todo o seu peso nas costas dos
coordenadores. Esse é mais um aspecto das recentes reformas implementadas pelo
Estado, que visam a reduzir o papel do governo nas atividades escolares, deixando
a cargo da comunidade escolar a solução dos problemas que deveriam ser por ele
solucionados, como a falta de recursos e a contratação de serviços de limpeza.

As HTPCs deveriam servir para a discussão dos problemas da escola e a ava-


liação do andamento do projeto pedagógico e sua articulação com os projetos de
ensino e de aula, de forma a garantir constante reflexão sobre sua aplicação e os
resultados obtidos.

É claro que, nesses momentos, podem ser discutidos textos que venham a
contribuir para a prática docente e para a articulação e interação entre as discipli-
nas. Esse aspecto, entretanto, não pode ser encarado como essência da atuação
dos coordenadores nem como formação em serviço. São equívocos como esse que
confundem ainda mais o já complexo rol de atividades dos coordenadores, amplian-
do a sensação de dificuldade de sua atuação e de indeterminação de suas funções.

A formação em serviço não pode ser reduzida a algumas poucas horas e posta
sob a responsabilidade de um professor que, sozinho, é obrigado a procurar aten-
der às necessidades dos demais docentes. Para atender a essas necessidades, os
sistemas de ensino devem criar ou adotar cursos já oferecidos para esse fim, possi-
bilitando aos profissionais uma formação digna da importância de suas atividades.
109

As HTPCs deveriam ser compreendidas como um momento de trabalho coletivo


por meio do qual a gestão democrática do projeto pedagógico seria posta em prática,
propiciando a compreensão de seu papel em uma escola cuja forma de gestão exige
a participação de todos e o trabalho coletivo. A introdução da gestão democrática
determinou um novo ordenamento da escola, que exige do docente abertura e dispo-
sição para negociação constante tanto entre os pares, na definição das estratégias de
ensino ou avaliação, quanto com relação aos objetivos e aos conteúdos preconizados,
sempre com vistas à flexibilização das formas de exercício de poder institucionais e à
introdução de formas de colaboração entre os agentes escolares.

Isso significa que é necessário abrir mão da estrutura única e segura de conte-
údo e ensino preconizada pelos modelos hierarquizantes e disciplinares tradicionais.
É fundamental, para a constituição de uma escola democrática, o reconhecimento da
cultura do aluno como legítima e passível de ser objeto de estudo e conhecimento,
analisada e compreendida no âmbito curricular. A incorporação ao plano curricular
escolar da cultura do aluno e da comunidade onde a escola se situa pode ser um
instrumento de redução de tensões, porque permite uma nova relação de tempo e
espaço, familiares e reconhecidos pelo aluno. O problema, agora, é levar o docente,
formado nas estruturas tradicionais, a retomar o aprendizado de formas e práticas
sociais que, por toda a sua vida, considerou exatamente como aquelas que deveriam
ser eliminadas da escola – essa deveria ser a tarefa primordial do coordenador peda-
gógico e das práticas debatidas durante as HTPCs.

1. O COORDENADOR E SEU PAPEL NA ESCOLA


O coordenador é um dos membros da equipe gestora da escola. Seu papel é fun-
damental, porque constitui elo entre o projeto político-pedagógico e a comunidade –
docentes, pais, alunos e direção. Em sua condição de organizador do trabalho coletivo,
o coordenador orienta o sentido que devem assumir as atividades escolares, pro-
curando adequar os conteúdos programáticos e os projetos coletivos às propostas
apresentadas pelo projeto político-pedagógico da escola.

Articular os interesses dos diferentes setores da escola, buscar formas de in-


tegração pedagógica entre alunos e docentes e fazer que os conteúdos estudados
na escola levem em consideração a cultura local e os problemas enfrentados pela
comunidade são tarefas importantes e das mais difíceis de implementar.

O coordenador acaba se perdendo em meio às distintas tarefas que lhe são


atribuídas. A principal dessas atividades deveria ser garantir a aprendizagem dos
alunos pela articulação dos trabalhos dos docentes de sua escola. Ocorre que a
110 A coordenação pedagógica e a gestão democrática

escola atual, ao mesmo tempo que é deficitária em termos de recursos materiais e


pessoais, responsabiliza o coordenador por inúmeras atividades, em geral sem rela-
ção umas com as outras. Não é responsabilidade do coordenador manter as salas de
aula limpas, fiscalizar a entrada e saída dos alunos, substituir professores ausentes,
tratar de assuntos financeiros e administrativos, solucionar problemas de saúde dos
alunos ou acompanhá-los a médicos ou dentistas, cuidar da higiene deles, organizar
os horários de uso da biblioteca, ajudar a secretaria no período de matrícula etc.
Muitas das tarefas impostas ao coordenador têm origem nas secretarias de ensino,
que lhe atribuem atividades de supervisão e de orientação dos docentes da escola.
É, em geral, atribuída a ele a tarefa de elevar o Ideb da escola ou melhorar os re-
sultados nas avaliações externas. O coordenador se torna, assim, um representante
das secretarias de educação, quando deveria, em parceria com elas, representar a
escola. Diante das dificuldades enfrentadas pela escola, o coordenador pedagógico,
juntamente com a direção e o conselho escolar, que compõem a equipe gestora,
deveria ser o que luta pelos interesses da escola e os defende.

Muito se fala da necessidade de o coordenador ser um líder do processo peda-


gógico na escola. Esse conceito é originário da área de administração empresarial.
Tanto na empresa quanto na escola, trata-se de um conceito equivocado, que con-
funde coordenação de tarefas com liderança. A liderança é característica pessoal e
individual. Um líder é alguém que se segue, porque se acredita que esteja sempre
certo. Segue-se um líder quando se confia nele e, por isso, não se precisa pensar,
porque o líder pensa por todos e dirige a todos pelo melhor caminho. O líder tem
como sua principal característica o carisma, uma capacidade de atrair a confiança de
todos os que o seguem sem questionar motivos. O líder dirige, indica o caminho que
todos devem seguir. Entretanto, não se pode garantir que todos os coordenadores
pedagógicos tenham o elã carismático que caracteriza a liderança; além disso, essa
é uma característica da administração tradicional, em que a determinação do fazer
é imputada ao chefe, que sabe o que deve ser feito.

Já o coordenador é um articulador; ele não impõe uma direção aos trabalhos,


mas garante que todos participem e, coletivamente, deliberem sobre o caminho a
ser seguido. Assim, as decisões não caem, exclusivamente, sobre suas costas, e os
resultados são para o bem ou para o mal, de responsabilidade de todos os que parti-
ciparam. Por esse motivo, o trabalho de coordenação exige que, ao fim do processo,
o coletivo de professores reavalie o resultado das ações implementadas, de forma a
regular as novas ações pelos sucessos e fracassos obtidos.

Por isso, mais do que liderar, é preciso que o coordenador seja capaz de re-
alizar um exercício de percepção e sensibilidade para identificar as necessidades
111

dos alunos e da escola. Seu papel é possibilitar aos docentes um espaço para que
reflitam sobre suas práticas. Sem uma reflexão sobre sua experiência, a prática é
cega, porque não se debruça sobre si mesma, isto é, sobre o que e como foi feito.

Para ser formadora, a prática precisa voltar-se a si mesma, e esse é o papel


da reflexão, que, submetida ao juízo crítico, pode elevar-se para além da simples
experiência e tornar-se formadora de si, porque, ao reavaliar o seu desempenho,
acaba buscando novas formas de orientação da própria prática, tornada, assim,
transformadora.

O coordenador não precisa ficar, o tempo inteiro, levando textos para os pro-
fessores, porque não é parte de sua formação o conhecimento dos conteúdos de
todas as áreas e disciplinas. Seu trabalho é pedagógico, e isso significa que seu
papel é propiciar reflexão sobre as práticas docentes. Essa é a dimensão teórica do
trabalho pedagógico, que deve possibilitar aos docentes reflexão sobre suas práticas
e incentivar o trabalho coletivo na construção do projeto pedagógico da escola.

Para tanto, é necessário ouvir todos os professores publicamente, para que


eles possam refletir sobre suas práticas coletivamente – ouvir significa não apenas
escutar mas também considerar e debater todas as questões levantadas, respei-
tando as opiniões dos sujeitos do trabalho pedagógico. O direito de ser ouvido e
o respeito e consideração pelo que todos dizem são a principal característica da
democracia.

O sucesso do trabalho coletivo está diretamente ligado à forma como o que


se diz se torna objeto de reflexão e ação. Quando todos são ouvidos e as soluções
encontradas são o resultado da participação de todos, eliminam-se a hierarquia, o
exercício de poder de um sobre todos e o controle. Agindo dessa forma, o coordena-
dor não se torna um líder que dirige um rebanho que, embora submisso, não quer
ser governado, mas o articulador do trabalho coletivo. Um dos grandes problemas
enfrentados em discussões desse tipo são as tensões e lutas para impor sua posição
por parte de docentes ou grupos organizados de docentes da escola. Essas tensões
são absolutamente normais, devendo, sim, ocorrer se o trabalho for, de fato, co-
letivo. Não se pode desejar que todos pensem da mesma forma; as diferenças de
opinião são importantes.

O coordenador deve compreender que seu trabalho não é produzir o consen-


so, porque, no consenso, algumas opiniões, principalmente as da minoria, acabam
sendo ignoradas pela maioria. As tensões devem, sim, vir à tona, porque alguns
dos maiores problemas nas instituições é abafar e esconder embaixo do tapete as
discordâncias, o que resulta em boicotes ao trabalho – propostos por aqueles que
112 A coordenação pedagógica e a gestão democrática

se sentiram ignorados. Assim, é preciso que todos conheçam e compreendam as


objeções dos demais, para que se possam discutir um acordo, uma negociação em
que cada parte tenha sua opinião respeitada e participante da solução encontrada.

O coordenador pedagógico é, dessa forma, um interlocutor privilegiado, cujo


papel é mediar e conciliar as diferentes opiniões docentes e proporcionar a revisão
do projeto político-pedagógico à luz dessas divergências.

Com relação aos docentes, individualmente o coordenador não pode ser conce-
bido como formador, no sentido de informar e construir os conteúdos das disciplinas.
O papel de formador do coordenador reside em seu conhecimento pedagógico, com
que pode colaborar para a organização da rotina de trabalho e dos conteúdos a se-
rem abordados nas aulas a partir da proposta pedagógica da escola e para a seleção
de material, também do ponto de vista pedagógico.

É importante que se compreenda que não existem receitas prontas daquilo


que deva ser feito nem tarefas esquematizadas que atendam a todas as escolas.
Para cada escola, o fazer pedagógico se dá de forma diferente, porque cada docente,
cada aluno e cada agente têm repertórios, gostos, preferências, experiências, expec-
tativas e histórias social e individual distintos. A comunidade em que cada escola se
localiza também é parte importante da constituição escolar e exige um estudo e um
diagnóstico, para que se compreenda de que maneira as questões sociais, econô-
micas, culturais e políticas influenciam a vida escolar. O coordenador deve propiciar
que cada uma das características individuais e socioculturais da comunidade escolar
se manifeste, fazendo que, em cada escola, sejam construídas ações diferentes e
adequadas a sua estrutura. Isso significa que não há um modelo de ação e que cada
escola, por meio do coletivo de seus agentes, constrói a própria prática.

O trabalho do coordenador é, acima de tudo, garantir a construção política do


projeto pedagógico – político significa, assim, por meio da participação de todos. Co-
tidianamente, seu trabalho é garantir que o projeto pedagógico seja posto em prática
pelos agentes escolares, por isso deve preparar e planejar, juntamente com os profes-
sores, um cronograma com temas para discussão na reunião semanal de HTPC.

Os temas das discussões devem resultar dos problemas detectados pelo diag-
nóstico e versar sobre assuntos que sejam importantes para os docentes. É rele-
vante que essas reuniões abordem temas de interesse coletivo e, efetivamente,
contribuam para o trabalho coletivo da escola. Devem ser estimuladas também as
discussões de docentes por área e por série, tratando da articulação daquilo que
é abordado entre uma série e as séries que precedem e sucedem, assegurando
coerência e organicidade ao que é ensinado, de modo que tanto alunos quanto do-
centes encontrem sentido e significado nos conteúdos. A partir desse panorama,
113

é importante discutir com os docentes novas formas e estratégias de aula, possi-


bilitando a troca de experiências e a busca de soluções e fundamentação teórica
coletivamente.

Finalmente, é tarefa do coordenador implementar a discussão coletiva dos


resultados das avaliações externas e o significado dos resultados em cada turma e
série, usando-os para elaborar o planejamento das disciplinas.

2. O COORDENADOR PEDAGÓGICO E A GESTÃO DEMOCRÁTICA


DA ESCOLA
Um dos principais aspectos da ação do coordenador é a articulação dos docen-
tes em torno de uma proposta pedagógica da escola. A concepção que fundamenta
a coordenação pedagógica é a necessidade de construir um processo de cooperação
entre os diferentes agentes da escola, cujo objetivo seria garantir a participação de
todos (gestores, pais, comunidade e alunos) na elaboração do projeto pedagógico.
Tomado nessa perspectiva, o trabalho do coordenador seria, prioritariamente, a ges-
tão pedagógica entendida como a criação de um espaço democrático de discussão
das ações de ensino-aprendizagem realizadas na escola.

A construção de uma dinâmica colaborativa deve surgir de um processo de


problematização da experiência vivida na escola, do questionamento por todos do
papel da escola e do alcance da garantia do cumprimento desse papel.

A elaboração do projeto pedagógico da escola é, assim, a atividade prioritária


do coordenador pedagógico, que deve, para a sua constituição, não apenas incenti-
var a participação de todos mas também possibilitar a existência de um espaço para
que sua discussão e elaboração sejam coletivas.

Esse ponto é um dos aspectos fundamentais da concepção de gestão demo-


crática da escola. Em geral, relaciona-se a ideia de gestão democrática apenas às
atividades de direção, acreditando-se que ela se refira somente à democratização
dos processos de administração da unidade escolar. Entretanto, a gestão pedagógica
é parte das atividades de gestão e, por isso, a partir da discussão da implementa-
ção de um processo de democratização da escola, passou a fazer parte também
das atividades da equipe gestora, constituída do diretor e do coordenador – corres-
ponsáveis pela gestão político-pedagógica da escola. A esses dois personagens é
acrescentado o conselho escolar, elemento essencial da democratização do espaço
escolar e também responsável pela gestão da escola.
114 A coordenação pedagógica e a gestão democrática

Essa concepção ainda não se generalizou a todos os sistemas de ensino, que


acabam pondo todo o peso da gestão apenas sobre o diretor. Em razão disso, em
muitos sistemas de ensino, o coordenador pedagógico não é sequer nomeado ofi-
cialmente ou constituído como um cargo do sistema. Em outros casos, os coordena-
dores são indicados por diretores e supervisores sem um prazo de atuação definido,
podendo ser destituídos a qualquer momento, sem a garantia de continuidade de
seu projeto de gestão. Obedecendo muito mais a critérios políticos externos do que
a interesses da própria comunidade escolar, a nomeação de coordenadores tornou-
-se mais uma moeda no jogo das redes de poder.

Da mesma forma que o diretor, o coordenador é parte importante da equipe


gestora. A gestão democrática não é uma atividade que se restringe à administração
material e física da escola; ela inclui esses e outros aspectos, porque, na perspectiva
de uma escola democrática, não se podem separar as ações políticas das pedagógi-
cas, que devem ser pensadas como aspectos distintos de uma mesma questão – a
gestão da escola.

É nesse movimento, que não fragmenta as esferas curriculares, administrativas


e de ensino e aprendizagem, que se apresenta a perspectiva da gestão democrática
da escola como processo emancipatório – e o coordenador pedagógico é parte es-
sencial desse processo, não podendo, portanto, ser tomado como um coadjuvante
na gestão, que teria seu centro na direção da escola.

Há uma tendência mais do que centenária na educação brasileira que põe o


aspecto pedagógico em segundo plano em relação à esfera política e administrativa.
Essa tendência corresponde a uma tradição que sempre considerou a pedagogia
como uma prática secundária, prioritariamente exercida por mulheres, enquanto a
direção, por exigir um conhecimento mais especializado, é destinada aos homens.
Assim, no passado, a feminização do magistério correspondeu a uma valorização das
atividades, no interior da escola, que não eram de natureza pedagógica e que eram,
geralmente, exercidas por homens, como a direção. Apesar de a direção da escola
também ter acompanhado o processo de feminização, incentivado pelas antigas ha-
bilitações – cursadas concomitantemente ao curso de Pedagogia –, ela permaneceu
a atividade de posto mais importante da escola, estando todos os demais aspectos
subordinados a ela. Essa tendência inverte e perverte o papel da escola, que deveria
ter, em sua função pedagógica, o centro de todas as atividades, porque é a ela que
corresponde a atividade-fim, a saber, a educação dos alunos.

Com a concepção de gestão democrática, a escola passou a ser compreendi-


da como um espaço em que as decisões devem ser coletivizadas – e, entre essas
115

decisões, a prioritária é a pedagógica. Ocorre que, tradicionalmente, os professores


tendem a não desejar compartilhar a decisão sobre o que e como ensinam, uma vez
que consideram ser uma atividade privada – resultado de escolha pessoal. Ainda que
se considerem os aspectos subjetivos do processo de ensino e a autonomia didática
que deve ser garantida aos docentes em seus aspectos políticos, isto é, aqueles
que devem ser objeto de deliberação coletiva, a determinação dos princípios que
norteiam os conteúdos programáticos constitui, por sua finalidade, uma atividade de
caráter público.

A concepção de gestão democrática aponta, precisamente, para este ponto:


não cabe mais ao professor, solitariamente, a determinação de que e como ensinar.
Além das normatizações gerais, estabelecidas pelos sistemas de ensino, devendo
ser cumpridas pela escola, os agentes escolares têm de discutir coletivamente o
currículo, os conteúdos e os métodos de ensino. Dessas ações, deve resultar um pro-
jeto pedagógico da escola que corresponda às diferentes proposições e concepções
presentes entre docentes, gestores, pais e alunos.

A presença de pais e alunos nas decisões da escola apresenta-se, cada vez


mais, como um dos pontos mais importantes da vida escolar. Temas que, frequen-
temente, têm assolado as escolas e tornado mais difícil a vida de coordenadores e
professores, como a indisciplina, a violência e o uso de drogas, podem ser mais bem
diagnosticados e combatidos se forem debatidos e pensados coletivamente, como
um problema de todos – e não apenas de determinado professor, coordenador ou
diretor.

O projeto de gestão democrática não comporta mais uma escola onde cada
professor cuide dos próprios conteúdos como se cuida de um problema pessoal e
privado. A escola é uma instituição pública, e os professores, agentes públicos, re-
presentantes do Estado em sala de aula. Os conteúdos e o processo didático são
temas vitais e constituem o próprio fundamento da vida escolar. Uma relação auto-
ritária com a formulação do projeto pedagógico dá à escola uma feição autoritária,
contrariando não apenas a política educacional em vigor mas também o próprio
processo de democratização da sociedade.

Acostumados à concepção tradicional de escolas fechadas sobre si mesmas


e geridas autoritariamente, muitos gestores, coordenadores e docentes recusam
a possibilidade de uma ação cooperativa da gestão pedagógica. As desculpas da
não participação são muitas: falta de interesse, inércia, acomodação, descrença ou,
simplesmente, negação.
116 A coordenação pedagógica e a gestão democrática

Por esse motivo, é importante explorar um pouco mais a constituição da ges-


tão democrática como eixo em torno do qual devem ser articuladas as atividades
pedagógicas da escola.

3. A GESTÃO DEMOCRÁTICA E O PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO


DA ESCOLA
O projeto político-pedagógico é um dos instrumentos inovadores da escola
democrática, pois é o momento em que todos os seus membros (não apenas do-
centes mas também pais, alunos e funcionários) se reúnem para estabelecer como
ela vai se organizar para atingir os objetivos fundamentais da educação, que é a
aprendizagem efetiva de todos os alunos.

O projeto político-pedagógico é o documento que define as intenções da esco-


la, para que ela realize um trabalho de qualidade. É o resultado do desejo coletivo
e constitui um compromisso do coletivo de alcançar as metas estabelecidas após a
discussão e participação de todos. Em uma escola democrática, as decisões são
tomadas coletivamente e o planejamento das atividades é realizado com a participa-
ção de toda a comunidade escolar.

A elaboração do PPP exige o desenvolvimento da capacidade de identificar os


problemas e as alternativas para solucioná-los e de administrar os recursos finan-
ceiros próprios de acordo com essas alternativas. Essas reflexões terão início pela
discussão do diagnóstico, do estabelecimento das metas e da avaliação institucional
da escola.

A instituição escolar, para realizar os seus objetivos, deve ser organizada de


forma a estabelecê-los com clareza, a planejar as ações a fim de atingir esses fins e
a avaliar se tais objetivos foram alcançados, para, a partir desses dados, retomar e
reformular o projeto de ação. Isso significa que a instituição escolar deve ter um pro-
jeto que organize o seu trabalho pedagógico, que precisa ter como base os alunos e
a comunidade à qual eles pertencem.

O projeto é uma ação que resulta de um planejamento que pretende realizar,


em um futuro, as ideias e os desejos que se alimentam no presente. O projeto é o
resultado da ação de apresentar, em um plano de ação, a descrição de um empre-
endimento que se deseja realizar. Esse plano estabelece os fins e os objetivos que
orientam a ação – em nosso caso, a ação educacional da escola –, e, a partir desses
fins e objetivos, determinam-se as metas anuais, que podem incluir as metas semes-
trais, as bimestrais e as mensais. Trata-se de planejar, dentro de um cronograma, as
117

ações adequadas, para que se atinjam os fins estabelecidos como ideais ou desejados
no início do processo.

Isso significa que um projeto não é, simplesmente, um documento escrito, mas


o resultado de um processo que exige reflexão sobre o que se deseja e sobre como
se pode realizar esse desejo e do planejamento das ações que viabilizarão a realiza-
ção de tal desejo. Essas ações, para que se realizem, devem contar com o compro-
misso de todos os que são responsáveis por elas. No caso da escola, os responsáveis
pelas ações são os alunos, os pais ou responsáveis, os professores, os gestores, os
funcionários e a comunidade onde está situada. Esses são os agentes escolares, e
é necessária a interação de todos esses agentes para que se alcancem os objetivos
que se desejam para a escola.

Por isso, diz-se que esse projeto é pedagógico, uma vez que seu fundamento
são as atividades pedagógicas da escola, e político, já que ele resulta da vontade
política dos agentes escolares, que, coletivamente, deliberam sobre sua elaboração.

Tendo em vista o que foi exposto, podemos definir preliminarmente o projeto


político-pedagógico como um documento que demarcaria as intenções da escola do
desejo coletivo da comunidade escolar.

Sua missão equivale à de um maestro. Em vez de músicos, ele rege professo-


res, para que esses repensem nos princípios e objetivos educacionais, reconstruam
os conhecimentos curriculares, revejam os critérios de avaliação, reinventem os mo-
dos de interação entre educador e educando e recriem os métodos de ensino intra e
extraescolares. É desse modo que sua atuação contribui efetivamente para a escola
cumprir sua função.

O projeto não pode ser tomado apenas como um documento a ser encaminha-
do às autoridades educacionais; ele deve ser o resultado de um processo coletivo,
118 A coordenação pedagógica e a gestão democrática

porque os objetivos educacionais da escola são coletivos e dizem respeito a todos os


que participam da ação educativa.

A ação política e a ação pedagógica devem ser compreendidas como dimen-


sões de um mesmo processo, de uma mesma ação, devendo ter atendidas essas
duas concepções, pois remetem à concepção de práxis educativa.

O projeto da escola é o resultado de um processo com duas dimensões


que não se separam e que se determinam mutuamente: a dimensão
política e a dimensão pedagógica.

O conceito de práxis remete à interação entre a atividade teórica e a prática.


Sua base é a concepção de que o homem é o sujeito de sua história e de que suas
ações são o resultado da interação entre a projeção intelectual que faz da realidade
e as condições materiais e objetivas que essa própria realidade apresenta. A práxis
é um processo de contínua avaliação e superação das concepções que norteiam as
ações conscientes dos homens no sentido de transformar não apenas a ação mas
também o próprio pensamento dos homens. São parte da práxis, do fazer humano,
a interação com a comunidade política e cultural em que se vive, determinando seu
modo de pensar, e a constante atualização desse pensar teórico quanto às questões
impostas pela realidade concreta. A práxis educativa remeteria, assim, à interação
entre teoria e prática, implicando um constante processo de reflexão sobre os con-
ceitos norteadores das ações e o significado concreto dessas ações, com vistas a
nortear as seguintes. É, portanto, um processo sempre em via de superação, uma
vez que cada ação norteia uma nova concepção teórica dessa ação.

As dimensões pedagógica e política são partes constitutivas de uma mesma


ação e podem ser compreendidas ao tratarmos da concepção de educação como um
processo que tem como fim a formação dos futuros cidadãos do país. Toda ação pe-
dagógica seria, nesse sentido, uma ação política, porque traz em si uma concepção
do cidadão que se deseja formar e uma da sociedade que se planeja. A concepção de
uma ação pedagógico-democrática implicaria pensar essa ação como a realização
dos objetivos coletivos de toda a população, e não de um setor específico dessa
mesma população.

Por esse motivo, para que a educação possa se constituir como uma ação
promotora da democracia, ela deve ser conduzida, desde o início de seu processo,
de forma democrática, garantindo que todos os agentes (alunos, pais, professores,
gestores, funcionários e comunidade da escola) participem das decisões que norte-
arão essa ação.
119

Para Veiga (2003), o projeto político-pedagógico é, por um lado, um proces-


so permanente de reflexão e discussão dos problemas da escola, em bus-
ca de alternativas viáveis à efetivação de sua intencionalidade; por outro,
propicia a vivência democrática necessária para a participação de todos os
membros da comunidade escolar e o exercício da cidadania.

Podemos, agora, compreender que o que caracteriza o projeto político-peda-


gógico é o seu processo de construção, pois se constitui como a instauração de um
processo democrático de decisão na escola e estabelece a organização de um tra-
balho pedagógico baseado em um debate democrático, permitindo superar a com-
petitividade e o autoritarismo das relações entre os diferentes agentes da educação
escolar. Esse processo é denominado de gestão democrática.

A elaboração do PPP depende do desenvolvimento da capacidade de identificar


os problemas e de estabelecer as alternativas para solucioná-los e exige a determi-
nação de estratégias para o enfrentamento desses problemas da escola por meio de
um plano e um cronograma, para a aplicação de tais estratégias.

O PPP se distingue do PP, porque aquele trata, além das questões pedagógicas,
das questões administrativas, financeiras e materiais da escola; já este é um aprofun-
damento das questões de caráter pedagógico, que são diagnosticadas e apresentadas
no PPP. O PPP estabelece uma política de gestão, definindo as finalidades e os objeti-
vos que a comunidade escolar determinou para a vida escolar. Seu caráter é pluria-
nual e aponta objetivos de curto, médio e longo prazo; já o PP é anual e corresponde
ao enfrentamento de problemas de natureza pedagógica, como dificuldades de uma
turma de alunos numa determinada disciplina, estratégias de ação para levar adiante
um projeto interdisciplinar (por exemplo, a implantação de uma horta) e ainda o deli-
neamento de ações para a execução do PDA da escola ou para a elevação do Ideb. Por
isso, o PP deve ser claro e objetivo, apresentando objetivos e estratégias concretos,
mas flexível e adequado a cada situação, sendo avaliado e reformulado a cada ano. O
projeto pedagógico é a diretriz para a elaboração dos planos de ensino e dos de aula,
porque é por meio dos objetivos e estratégias apontados e elaborados coletivamente
que os professores determinam como tais objetivos e estratégias serão abordados e
postos em prática em suas aulas.

A gestão democrática é a concepção segundo a qual todos os envolvidos


na vida escolar devem participar da construção de seu projeto político-pe-
dagógico. É um princípio que estabelece que toda ação ou decisão tomada
com relação à escola deve ser coletiva e de conhecimento de todos. Para
120 A coordenação pedagógica e a gestão democrática

que se estabeleça um processo de gestão democrática, deve ser consti-


tuído na escola um órgão colegiado – o conselho escolar –, permitindo
a participação da comunidade escolar na definição, realização, avaliação
e fiscalização das atividades escolares. Os princípios norteadores das ati-
vidades da escola, deliberados coletivamente, devem estar expressos no
projeto político-pedagógico.

Assim, o PPP é um primeiro momento, em que toda a comunidade escolar es-


tabelece os princípios que regerão suas atividades. Nesse sentido, é a Constituição
da escola, porque diz o que a escola é e como deve funcionar. O PP é a objetivação,
para cada ano, dos princípios estabelecidos no PPP e, por isso, tem caráter mais con-
tingente, porque toma como base, para sua elaboração, os resultados pedagógicos
do ano anterior e determina as estratégias de enfrentamento dos problemas. Os
planos de ensino apresentam um projeto coletivo para cada disciplina, englobando
as diferentes séries e articulando os conteúdos e as estratégias dessas séries com
os objetivos previstos no PPP e no PP. O plano de ensino deve garantir, assim, a
organicidade e a integração dos conteúdos de uma disciplina entre os professores
responsáveis por sua docência, assegurando coesão. O plano de aula é o projeto
que cada docente elabora de acordo com as diretrizes do PP e do plano de ensino.

Então, o planejamento dirige-se de uma macroesfera a uma microesfera, em


termos de aspectos pedagógicos. PPP, PP, PE e PA devem estar articulados e em
consonância, e, para isso, é necessária a participação de todos: em conjunto, toda
a comunidade estabelece os fins da educação na escola e, em colaboração, todos
discutem as estratégias para pôr em prática os fins apontados no PPP, na forma de
um projeto que articule as diferentes disciplinas em torno desse objetivo. O PP deter-
mina um planejamento para cada disciplina, articulando e dando coerência à ação dos
diferentes docentes, que objetivam e materializam os planos em seu plano de aula.

Essas etapas são, muitas vezes, seguidas apenas burocraticamente. Muitos


docentes copiam planos de anos anteriores, que, depois de encaminhados aos ór-
gãos administrativos que os solicitaram, são engavetados e esquecidos – até que
seja necessária a elaboração de novos planos, no ano seguinte.

Nesses casos, a comunidade escolar perde de vista os objetivos de sua exis-


tência, e cada aula, cada disciplina e o trabalho dos docentes são fragmentados e
desarticulados, não fazendo sentido quando tomados como um todo.

A participação de toda a comunidade nesse processo é importante para a sua


eficácia. Do ponto de vista da educação tradicional, a participação da comunidade é
121

um transtorno, porque os pais e alunos não teriam competência para participar dessa
discussão, que deveria ser reservada a quem tem formação para isso. Ocorre que a
formação do docente não é um conjunto de conhecimentos já prontos que só precisa
de uma sala de aula para ser aplicado. Os conteúdos não são neutros, e a escolha des-
se ou daquele conteúdo e da forma como é ensinado atende a interesses distintos. Por
isso, é relevante que se discuta com quem deve interessar o que é ensinado na escola,
para que se estabeleça a melhor forma de materializar esse interesse. Participando
da determinação dos objetivos e reconhecendo, nos planos de ensino e nos planos de
aula, o resultado de um projeto elaborado com a participação de todos – alunos, pais
e comunidade em geral –, se reconhecerá na escola, que passará a ser, de fato, sua,
tornadas públicas. Quando a comunidade não participa da elaboração do PPP e do PP, o
conteúdo se apresenta como algo distante, que atende ao interesse apenas do profes-
sor. Nesse sentido, há uma privatização da escola, porque o docente realiza somente
os próprios interesses, esquecendo que a educação é um processo coletivo.

O PP é um processo que pode ser dividido em três momentos distintos, corres-


pondendo a etapas que requerem ações diferentes. A primeira etapa corresponde
à sua elaboração e exige um processo de planejamento, diagnóstico e estabeleci-
mento de metas que culminem com a elaboração de um plano de ação. A segunda
etapa, por sua vez, corresponde à sua execução. Finalmente, na terceira etapa, ao
fim do processo, é necessário um momento para a avaliação dos resultados do PP.
Essa avaliação deve apresentar reflexão sobre os pontos positivos e os negativos e
possibilitar a reelaboração do planejamento (replanejamento) do PPP.

4. O PLANEJAMENTO DO PPP
O projeto político-pedagógico é um instrumento de ação coletiva e, por isso,
deve ser elaborado coletivamente. Para que se atinjam os objetivos pretendidos, é
preciso um trabalho de planejamento das atividades e necessidades da escola.

O planejamento é um processo de administrar diferenças ou oposições entre


os diversos membros da comunidade escolar, possibilitando, assim, a democracia,
com a participação de todos. Partindo-se dos objetivos propostos, no momento do
planejamento se estudam os melhores meios e se estabelece um conjunto coorde-
nado de ações para atingir tais objetivos. Planejar é estabelecer um plano com um
roteiro de ações cuja finalidade seja alcançar os objetivos propostos.

O planejamento deve ser compreendido como uma atitude crítica do educador


visando a levar todo o coletivo da escola – professores, diretor, funcionários, alunos
e pais – à reflexão sobre o papel da escola e o processo de ensino. O planejamento é
122 A coordenação pedagógica e a gestão democrática

um processo que deve pensar de forma radical os problemas da educação escolar em


sua totalidade e envolve a atuação concreta dos educadores, pais e equipe escolar
no cotidiano do trabalho pedagógico, em suas ações e situações, com permanente
interação entre educadores e educandos.

O planejamento é um instrumento orientador do trabalho e pode determinar a


transformação da realidade da escola e das salas de aula. Sua eficiência, entretanto,
depende do compromisso pedagógico-político dos docentes, diretor, pais, funcioná-
rios e alunos, pois sua elaboração é um contínuo processo ação-reflexão-ação, que
exige uma atitude crítica de todos os envolvidos.

O planejamento é dinâmico, pois é um processo sempre em discussão e atu-


alização que visa a programar o que, como e quando será feito. Além disso, o pla-
nejamento, após o processo de discussão e elaboração, torna-se um instrumento
formal, isto é, um documento oficial da escola, no qual se registram as análises e
proposições formuladas pelos seus diversos agentes.

A escola democrática exige:

• um tipo de planejamento que esteja voltado para o desenvolvimento cultural


e democrático da população;
• um planejamento que leve em consideração a origem social, as condições
materiais e os aspectos culturais dos alunos, de modo a preparar crianças e
jovens para a vida e o trabalho;
123

• um planejamento que siga as orientações gerais da política educacional, da


legislação educacional e dos PCNs vigentes no país, assim como a participa-
ção da comunidade no processo de elaboração do plano da escola.

Em um trabalho de 1990, Fusari alerta para os seguintes problemas, relati-


vos à forma como os professores veem o planejamento na escola:

• Os professores estariam insatisfeitos com a concepção de planejamento


do trabalho pedagógico, porque acreditam que se possa trabalhar sem
planejamento;

• Os problemas das escolas levam os professores a fazer constantes im-


provisações em seu cotidiano, por isso eles acreditam que planejar não
adiante;

• Muitos professores acreditam que o planejamento seja burocrático e


tecnicista, não refletindo, por isso, o cotidiano da sala de aula;

• Boa parte dos professores acredita que todos os professores transcre-


vam os planos do ano anterior, não escrevendo o que realmente preten-
dem fazer.

Essas práticas, segundo Fusari (1990), impossibilitam a organização do


trabalho pedagógico, pois ele não pode ser uma constante improvisação,
sem objetivos e coordenação de atividades entre os diferentes agentes
escolares.

4.1 O diagnóstico
Para atingir os fins da atividade escolar, é necessário que cada escola esta-
beleça uma política de ação própria para garantir acesso a ela, permanência nela
e aprendizagem efetiva. Por isso, é preciso identificar os problemas da escola, uti-
lizar indicadores internos e externos que permitam reconhecer esses problemas,
categorizá-los (isto é, organizar em categorias), para que se possam estabelecer os
prioritários, e propor ações eficientes para sua solução. Essas atividades são desen-
volvidas no período de planejamento do PP.

O projeto pedagógico deve apresentar os objetivos específicos e metas que de-


terminarão os conteúdos, as ações e os métodos e recursos empregados nos planos
de ensino e nos planos de aula.
124 A coordenação pedagógica e a gestão democrática

É necessário considerar e analisar a situação e os problemas da escola por


meio de um diagnóstico formulado a partir dos indicadores internos e externos.
A partir do diagnóstico, são estabelecidos os objetivos gerais que constituirão a
política da escola, dando base à elaboração do projeto pedagógico.

4.2 Indicadores
A elaboração do diagnóstico, isto é, conhecimento da situação e dos problemas
da escola, deve seguir indicadores externos e internos que apresentem informações
e possibilitem compreensão mais global dos problemas da escola.

Indicadores externos: dados disponíveis em instituições públicas e centros


de pesquisa, como o MEC, o Inep, o Ipea, ONGs (Organizações Não Governamentais),
o IBGE e as secretarias estaduais e municipais de educação, podem orientar a políti-
ca da escola. Índices como o IDH, sobre desenvolvimento social e exclusão social, e o
Ideb e dados do IBGE e do Ipea, sobre renda, analfabetismo, concentração de renda,
inserção precoce no mercado de trabalho, condições de moradia (água, esgoto etc.),
escolarização, escolaridade dos pais e distorção idade/série, podem contribuir sig-
nificativamente para estabelecer os objetivos da educação e orientar as finalidades
das ações a serem implementadas. Dados sobre repetência, evasão, enumeração
de alunos com idade acima da adequada para a série e desempenho em avaliações
externas como o Saeb e o Enem são elementos que permitem estabelecer metas
para as ações a serem sugeridas no projeto. A rede estadual de ensino de São Paulo
possui indicadores próprios, resultantes do Saresp (Sistema de Avaliação de Rendi-
mento Escolar do Estado de São Paulo).

Indicadores internos: perfil dos alunos e das famílias, expectativas e aspi-


rações da comunidade. É necessário conhecer os alunos, as características de sua
vida e as relações familiares. O reconhecimento das condições de vida dos alunos
e das famílias é prioritário para a elaboração do planejamento. A comunidade deve
participar da definição dos objetivos da escola, e o professor deve conhecer o aluno
a quem vai ensinar, para saber o que e como ensinar. É necessário propor ações e
tarefas que estimulem a imaginação, a observação e o raciocínio e levem em consi-
deração as características econômicas, sociais e culturais locais.

Análise das condições de gestão pedagógica da escola: como é a ges-


tão pedagógica e como ela influencia o desempenho do aluno? É necessário ainda
reconhecer a experiência e as especialidades específicas de cada professor e propor
ações que estejam de acordo com as especificidades de cada um. É necessário co-
nhecer e ampliar as experiências bem-sucedidas. Devem-se ainda verificar todos
125

os espaços físicos da escola – se precisam de reforma, se são adequados, se estão


sendo bem utilizados e se existem outras possibilidades de uso. Finalmente, é im-
portante compreender como se desenvolvem as relações entre a escola e a família
dos alunos, entre a escola e as entidades do bairro, como associações de moradores,
igrejas e comunidade em geral (universidades, escolas, órgãos oficiais e administra-
ção municipal).

4.3 O estabelecimento de metas


O projeto pedagógico deve partir de um diagnóstico sobre a comunidade, uti-
lizando indicadores internos e externos. Esse diagnóstico deve ser estabelecido por
meio da caracterização da escola – sua situação social, sua organização, perfil de
seus professores e técnicos.

A partir do diagnóstico, deve-se efetuar uma análise da situação escolar, que


se dará por meio do estabelecimento de categorias a serem analisadas e de suas
condições de satisfação. Assim, para cada categoria, pode-se estabelecer se as con-
dições estão satisfatórias, sendo pontos fortes da escola, ou se é necessário que
melhorem, constituindo pontos fracos. Esse quadro com as categorias estabelecidas
possibilita a definição dos objetivos gerais do projeto político-pedagógico, o estabe-
lecimento das ações políticas da escola e a indicação das prioridades. Para que se
estabeleçam as prioridades, é necessário selecionar e consolidar os pontos fortes
e enfrentar os pontos considerados fracos, propondo-lhes soluções. É importante
que se procure verificar a possibilidade de desenvolver atividades que articulem os
pontos fortes aos pontos fracos. Por exemplo, uma boa equipe de futebol ou de bons
músicos na comunidade escolar pode ajudar a atrair crianças e pais que não tenham
interesse na educação escolar. Assim, a abertura da escola para jogos, festividades
e atividades à comunidade pode ter como resultado redução da violência e maior
respeito pelo trabalho desenvolvido na escola.

Desse modo, ao fim da fase de estabelecimento de metas, deve-se obter um


quadro em que sejam apresentados os objetivos gerais de acordo com os dados
demonstrados em cada uma dessas categorias. Em seguida, devem ser articulados
os objetivos específicos, vinculando-os aos conteúdos a serem trabalhados e deter-
minando as metas e ações que podem ser levadas adiante.

4.4 A elaboração do plano de ação


É importante que as ações apresentadas sejam objetivas e exequíveis, ou seja,
passíveis de ser realizadas pelo corpo de agentes escolares, com os meios e no
126 A coordenação pedagógica e a gestão democrática

tempo de que dispõem. Muitas ações não são executadas, porque, após o impacto
de uma sugestão que pareceu a todos maravilhosa, descobre-se que seu custo, as
condições de sua realização ou o tempo necessário para a sua execução a tornam
inviável. Muitas vezes, pequenas ações localizadas em salas de aula e classes es-
pecíficas de alunos e de seus pais propiciam resultados mais frutíferos que grandes
projetos, mas de difícil execução. Entretanto, se a escola dispuser de uma comuni-
dade disposta a atuar e levar adiante um projeto ambicioso, essa atividade deve ser
incentivada, como forma de possibilitar uma maior integração da comunidade nas
atividades escolares.

As ações devem ser planejadas por meio de um cronograma de ação. A cada


aspecto considerado fraco no diagnóstico e constituinte de uma meta a ser enfrenta-
da devem estar associadas ações que visem à sua melhora e ao seu fortalecimento.

Assim, deve ser elaborado um rol de ações juntamente com a indicação do


objetivo que se pretende atingir com cada uma delas. Essas ações devem ser or-
ganizadas em ordem cronológica, que deve seguir a emergência com a qual têm
de ser implementadas e as condições materiais e de tempo necessárias para o seu
planejamento e execução.

Para cada ação, deve ser definido um responsável por sua execução. Todos de-
vem ser envolvidos de acordo com o tipo de tarefa e especificidade da ação exigida.
Pais e alunos de séries mais adiantadas podem participar de projetos de recupera-
ção ou de desenvolvimento de atividades com alunos de séries anteriores.

Para cada uma das atividades, devem ser definidos os projetos de ação, os
métodos, os recursos didáticos e materiais a serem utilizados e o tempo previsto
para o seu desenvolvimento. Caso seja preciso recurso financeiro extra, deve ser
estabelecido o modo de financiamento.

Finalmente, cada atividade deve vir acompanhada do local onde será desen-
volvida e das datas e horários previstos. É importante que se pense em atividades
que se realizem também fora do espaço escolar, em colaboração com a comunidade.

Ao fim, será obtido um documento, com o diagnóstico e as metas e ações


previstas, seguido de um cronograma de sua execução. Esse documento define as
ações e as estratégias que serão adotadas nos planos de ensino e nos de aula.

4.5 A avaliação do processo e a implementação das atividades


A avaliação do projeto pedagógico não pode ser pontual; deve ser parte do
próprio processo de implementação do PP. Durante o próprio desenvolvimento das
127

ações, é possível verificar se os objetivos definidos estão adequados e o que poderia


ser mudado para seu aperfeiçoamento e se as ações estabelecidas são executáveis,
no tempo e da forma do planejamento. Finalmente, é necessário que nenhuma ação
perca de vista as metas que tinha como objetivo, de maneira a verificar se o que
havia sido projetado foi atingido.

Ao fim do processo, é necessário que se faça uma avaliação geral para analisar
a adequação entre os objetivos e metas propostos e as ações desenvolvidas. Além
do acompanhamento de verificação de cada item proposto no PP, é preciso que se
avaliem o processo de participação, o interesse dos diferentes agentes do processo
e os efeitos das ações e da participação na aprendizagem dos alunos.

É necessário, portanto, que se estabeleçam as ações que tiveram efeitos posi-


tivos e aquelas que não surtiram efeito ou tiveram efeito negativo; os aspectos que
apresentaram dificuldades em sua execução; e as consequências do processo para
a relação entre escola e comunidade.

REFERÊNCIAS
FUSARI, J. M. Planejamento do trabalho pedagógico: algumas indagações e tentativas de res-
postas. São Paulo: FDE, 1998. p. 44-53.
VEIGA, I. P. A. Projeto político-pedagógico da escola: uma construção coletiva. In: ______. (Org.).
Projeto político-pedagógico da escola: uma construção possível. 16. ed. Campinas: Papirus,
2003.

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