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PALOMA DOS REIS COIMBRA DE SOUZA

A TOMADA DE CONTROLE DE COMPANHIA ABERTA:

A POISON PILL À BRASILEIRA

Dissertação de Mestrado

Orientador: Prof. Dr. José Alexandre Tavares Guerreiro

Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo

São Paulo

2011
PALOMA DOS REIS COIMBRA DE SOUZA

A TOMADA DE CONTROLE DE COMPANHIA ABERTA:

A POISON PILL À BRASILEIRA

Dissertação de Mestrado apresentada ao


Departamento de Direito Comercial da
Faculdade de Direito da Universidade de
São Paulo como requisito parcial para a
obtenção do grau de mestre, sob a
orientação do Professor Doutor José
Alexandre Tavares Guerreiro

Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo

São Paulo

2011
ÍNDICE

INTRODUÇÃO ..................................................................................... 4

CAPÍTULO 1. OFERTA PÚBLICA: DEFINIÇÃO E NATUREZA


JURÍDICA .......................................................................................... 12

1.1. Definição ................................................................................... 12

1.2. Natureza Jurídica ...................................................................... 17

1.3. Distinções Terminológicas .......................................................... 19

1.4. A Oferta Voluntária e suas Vantagens ......................................... 32

1.5. Legislação Brasileira sobre Oferta Pública ................................. 36

CAPÍTULO 2. A TOMADA DE CONTROLE: INTERESSES


ENVOLVIDOS E MODELOS DE REGULAÇÃO .................................. 42

2.1. A Tomada de Controle e Interesses Envolvidos ............................. 42

2.2. Modelo de Regulação Norte-Americano ....................................... 57

2.3. Modelo de Regulação Europeu e Inglês ....................................... 71

2.4. Modelo Norte-Americano v. Modelo Europeu/Inglês ..................... 84

2.5. O Modelo Brasileiro ................................................................... 92

CAPÍTULO 3. POISON PILL: DO MODELO NORTE-AMERICANO AO


BRASILEIRO ..................................................................................... 98

3.1. Classificação dos Mecanismos de Defesa ..................................... 99

3.1.1. Defesas Preventivas e Remediativas ...................................... 100


3.1.2. Defesas Estruturais, Estatutárias e Contratuais ..................... 102
3.2. Poison Pill Clássica ................................................................. 104

3.3. Experiência Brasileira ............................................................. 112


3.3.1. Novo Mercado e Cláusulas Estatutárias (“Poison Pills à
Brasileira”) ................................................................................. 118
3.3.2. Parecer de Orientação da CVM n o 36/2009 ........................... 147
3.3.3. Casos de Oferta Hostil no Cenário Brasileiro ........................ 151
CAPÍTULO 4. A POISON PILL À BRASILEIRA EM NÚMEROS ....... 163

4.1. Controle Definido e Poison Pill ................................................. 165

4.2. Poison Pill e Penalidades .......................................................... 166

4.3. Gatilho .................................................................................... 167

4.4. Remoção da Pílula ou Dispensa da Oferta Pública ..................... 167

4.5. Tabelas .................................................................................... 168

CONCLUSÃO ................................................................................... 177

BIBLIOGRAFIA ............................................................................... 181

RESUMO .......................................................................................... 197

RIASSUNTO ..................................................................................... 199


ABREVIATURAS

AMEC Associação de Investidores no Mercado


de Capitais
City Code City Code on Takeovers and Mergers
CMVM Comissão do Mercado de Valores
Mobiliários (Portugal)
Código Civil Lei n o 10.406, de 10 de janeiro de 2002
CVM Comissão de Valores Mobiliários
Diretiva Diretiva 2004/25/CE, de 20 de maio de
2004
IPOs Initial Public Offerings (ofertas
públicas iniciais)
Lei acionária Lei n o 6.404, de 15 de dezembro de
1976
Lei das Sociedades por Ações Lei n o 6.404, de 15 de dezembro de
1976
OPA Oferta Pública de Aquisição de Ações
Panel City Panel on Takeovers and Mergers
Parecer 36/2009 Parecer de Orientação da CVM n o 36, de
23 de junho de 2009
Regulamento de Listagem Regulamento de Listagem do Novo
Mercado
Revista de Direito Bancário Revista de Direito Bancário e do
Mercado de Capitais
Revista de Direito Mercantil Revista de Direito Mercantil, Industrial,
Econômico e Financeiro
SEC Securities and Exchange Commission
INTRODUÇÃO

O objeto do presente estudo consiste na análise, à luz da


experiência estrangeira e da conjuntura institucional e legislativa brasileira
atual, dos mecanismos de defesa contra investidas indesejadas de tomada
de controle de companhia aberta de que vêm se valendo as companhias
brasileiras, comumente denominadas poison pill (pílula de veneno).

A relevância do tema impõe-se em face do movimento de


dispersão acionária que o mercado de valores mobiliários brasileiro vem
presenciando nos últimos anos 1, o que propicia palco fértil para a tomada
de controle.

Historicamente, as sociedades brasileiras, em regra, sempre se


apresentaram como companhias com controle bem definido, notadamente de
caráter majoritário, tendo em vista a existência de grande concentração
acionária. Essa conjuntura, pode-se dizer, deriva quer da origem familiar
das sociedades brasileiras, quer do atraso histórico no desenvolvimento do
capitalismo nacional.

1
So b r e, v. L. R. MO R AE S , A p u lv er i za çã o d o co n tro le d e co mp a n h ia s a b e r ta s , i n
R evi s ta d e Di re ito B a n c á rio 3 2 ( 2 0 0 6 ) , p p . 4 9 - 8 4 , esp ec ial me nt e p p . 4 9 - 5 7 .
4
Com efeito, o movimento que hoje é observado no mercado
brasileiro já era perceptível no mercado norte-americano pós-Crise de
1929, como amplamente estudado por A. A. B ER LE e G. C. M E A N S , em
clássica obra 2. Tais autores observaram que, dada a grande dispersão
acionária das macroempresas americanas, fenômeno interessante era
percebido: a separação entre a propriedade das ações da companhia e o
controle sobre esta, separação que se apresentava mais acentuada quanto
maior a dispersão acionária.

Em seu estudo, A. A. B E R LE e G. C. M EA N S analisaram a


passagem da antiga forma de sociedade – que poderia ser considerada
apenas um alter ego do dono do negócio 3 – para aquilo que denominam de
corporações quase-públicas (quasi-public corporation), definidas como
aquelas em que há acentuada separação entre propriedade e controle, tendo
em vista a multiplicidade de proprietários de ações (os acionistas). 4

Em sua análise, apontam a existência de cinco formas de


controle interno da sociedade anônima: controle com quase complet a
propriedade acionária; controle majoritário; controle obtido mediante
expedientes legais; controle minoritário; e controle administrativo ou
gerencial.

A classificação apresentada é revisitada e criticada por F. K.


C O M P A R A TO , que a reduz a quatro espécies de controle, conforme o grau
crescente de separação entre propriedade acionária e controle, a saber:
controle totalitário, controle majoritário, controle minoritário e controle
gerencial. 5

2
Th e Mo d e rn Co rp o ra tio n a n d P r iva te P ro p er ty, No va I o r q u e, Ma c mil la n, 1 9 4 0 ,
p a s si m. A e st e r e sp ei to , aliá s, i nte r e ss a nt e a p a s sa ge m na o b r a d e F. K. CO MP AR AT O,
e m q ue o a u to r al ud e ao f ato d e q u e j á Kar l M a r x, e m s u a o b r a O Ca p i t a l, v is l u mb r a v a
es te fe nô me no d a d i sso ciaç ão e n tr e p r o p r ied ad e e co n tr o l e d o s meio s d e p r o d u ção ( c f .
F. K. C OMP AR AT O, O p o d e r d e Co n t ro le n a S o ci ed a d e A n ô n i ma , 3 ª ed ., R io d e
J ane ir o , Fo r e n s e, 1 9 8 3 , p . 3 6 , nt. 1 ; no me s mo se n tid o , F. K. C OMP AR AT O, A sp ec to s
ju r íd i co s d a ma cro - emp rê sa , São P a u lo , Re v i st a d o s T r ib u na i s, 1 9 7 0 , p p . 7 1 -7 3 )
3
I s to é, aq ue le q u e ap e n as u ti li za a r o up a ge m d e so c ied ad e p ar a d ar fo r ma a se u p r ó p r i o
in v e st i me n to , s ua s a ti v i d ad es e s ua s p r ó p r ia s tr a n saçõ e s ne go c ia is .
4
Th e Mo d e rn Co rp o ra t io n ... ci t. ( n t. 2 , su p ra ) , p . 4 .
5
F. K. CO MP AR AT O, O p o d er d e Co n t ro l e... ci t. ( n t. 2 , su p ra ) , p . 5 7
5
Nota-se, com isso, que a separação entre propriedade e
controle se pode dar em diversos graus. Assim, numa sociedade em que
haja controle majoritário, por exemplo, apenas com relação ao controlador
há ainda associação entre controle e parte da propriedade, enquanto que
para o restante dos acionistas – minoritários – permanece a divisão entre
propriedade e poder de controle (já que este é detido apenas pelo acionista
majoritário). Por outro lado, há sociedades em que a dispersão acionária é
tão acentuada que o controle pode ser detido com parcela reduzida do
capital social, em verdade menor que a maioria do capital votante (controle
minoritário), caso em que a grande maioria do capital social apresenta a
separação entre sua propriedade e controle.

Por fim, é possível ainda vislumbrar a separação quase


completa entre propriedade e controle, como naquelas sociedades em que
nenhum acionista individualmente ou agrupado possui mais que parcela
ínfima das ações votantes de dada companhia. É neste cenário, ex atamente,
que toma lugar o assim chamado controle gerencial. 6

Desse modo, à exceção do controle totalitário, em qualquer um


destes outros modelos – majoritário, minoritário ou gerencial – é
incontestável a efetiva separação entre propriedade e controle, ainda que
em maior ou menor grau.

É sobretudo num cenário em que as companhias são


controladas por grupos minoritários ou mesmo por seus administradores em
que se vislumbra campo fértil para a ocorrência das chamadas ofertas
públicas de aquisição de ações voluntária 7, um dos principais instrumentos
para a tomada de controle. 8 O motivo é claro: numa companhia em que haja

6
“U nd er s uc h co nd it io ns co ntr o l ma y b e he ld b y t he d ir ecto r s o r ti t ul ar ma n a ger s wh o
ca n e mp lo y t h e p r o x y m ac hi ne r y to b eco me a se l f -p er p e t ua ti n g b o d y, e v en t ho u g h a s a
gr o up t he y o wn b u t a s ma ll fr ac tio n o f t h e sto ck o ut st a nd i n g” , c f. A. A. B E R LE J R . e
G. C. ME AN S, Th e Mo d ern Co rp o ra t io n ... ci t. ( nt . 2 , su p ra ) , p . 5 .
7
Se g u nd o o ar ti go 2 5 7 d a Lei d as So c ied ad e s p o r Açõ e s, a o f er t a p úb l i ca vo l u n tár ia é
vo l tad a p ar a a aq ui si ção d o co ntr o le.
8
Co n so a n te ad ver te F. K. C O M P A R A T O , a “o p e r ação d e ta ke- o ve r b id r ep r e se nt a u ma
no va mo d al id ad e d e a q ui s ição d e co n tr o l e a cio nár io , ap li cá ve l à s co mp a n hi as d e
co n t ro le m in o ri tá r io , o u sej a, àq ue la s c uj o n úcl eo d e d ir e ção n ão a ti n g e, i so lad a me n t e ,
6
controle majoritário, eventual oferta pública de aquisição de controle
poderia ser neutralizada pela simples negativa do controlador em realizar o
negócio.

Na legislação pátria, a oferta pública que visa à aquisição do


controle da companhia-alvo está regulada desde a década de 70, na Lei das
Sociedades por Ações (Lei n o 6.404, de 15 de dezembro de 1976) 9,
consoante a previsão do caput do artigo 257 da lei. 10 Entretanto, o tema
ficou adormecido no Brasil, nas últimas décadas, tendo em vista a
manutenção do sistema de prevalência de sociedades familiares e com alta
concentração acionária, sendo verdadeiro o comentário de F. K.
C O M P A R A TO de que a previsão de disciplina das ofertas públicas de
aquisição, na Lei das Sociedades por Ações, foi “incontestável progresso
legislativo”. 11

A preocupação básica na elaboração do anteprojeto que acabou


tornando-se a Lei das Sociedades por Ações de 1976 foi o desenvolvimento
do mercado de valores mobiliários brasileiro. Essa preocupação está bem
retratada na Exposição de Motivos da lei, conforme o item 4 abaixo
transcrito:

4. O Projeto visa basicamente a criar a estrutura


jurídica necessária ao fortalecimento do mercado
de capitais de risco no País, imprescindível à
sobrevivência da empresa privada na fase atual da
economia brasileira. A mobilização da poupança
popular e o seu encaminhamento voluntário para o

5 0 % d o cap it al vo t a nte ” ( F. K. C OMP AR AT O, No va s fo rma s ju ríd ica s d e co n cen t ra çã o


emp re sa r ia l , i n R ev i sta d e D ir ei to Me rca n t il 5 ( 1 9 7 2 ) , p . 1 3 4 ) .
9
Do r a v a nte r e f er id a ap en as co mo Le i d a s So cied ad e s p o r Açõ es, l e i a cio nár ia o u,
ai nd a, ap e na s le i, se n ão ho u v er q ua lq uer o u tr a i nd i caç ão .
10
Ar t. 2 5 7 . A o fer ta p úb lic a p ar a aq ui si ção d e c o nt r o le d e co mp a n hia a b er ta so me n te
p o d er á ser fe it a co m a p ar ti cip ação d e i n st it u içã o fi na n ce ir a q ue g ar a n ta o cu mp r i me n t o
d as o b r i gaç õ e s a s s u mid a s p e lo o fer ta n te ( d es ta ca mo s) .
11
F. K. CO MP AR AT O, O p o d er d e Co n t ro le... ci t . ( n t. 2 , su p ra ) , p . 2 1 2 . Co mo v er e mo s
o p o r t u na me n te, a ma tér i a e st á tr a tad a na S eção VI I d o Cap í t ulo X X d a lei, no s ar t i go s
2 5 7 a 2 6 3 , se nd o cer to q ue a le i a nt er io r , D ecr eto - Le i n o 2 .6 2 7 , d e 2 6 d e o u t ub r o d e
1 9 4 0 , n ão c u id o u e xp r es sa me n te d o t e ma.
7
setor empresarial exigem, contudo, o
estabelecimento de uma sistemática que assegure
ao acionista minoritário o respeito a regras
definidas e eqüitativas, as quais, sem imobilizar o
empresário em suas iniciativas, ofereçam atrativos
suficientes de segurança e rentabilidade.

A Lei n o 10.303, de 31 de outubro de 2001, reforçou essa busca


pela mobilização da poupança interna em prol do mercado de valores
mobiliários, criando e reinserindo mecanismos legais de proteção ao
acionista minoritário.

A escolha do legislador de utilizar leis mais protetivas como


instrumento para fomentar o mercado interno não é descabida: a doutrina
aponta a existência de mecanismos legais de proteção como um eficiente
meio para o aumento da participação de investidores no mercado de ações,
contribuindo para a maior dispersão – e conseqüente pulverização – do
capital das grandes companhias abertas. 12 Essa também parece ser a idéia
inspiradora do Novo Mercado da BM&F-Bovespa (Bolsa de Valores,
Mercadorias e Futuros S.A.), cujo regulamento traz uma série de garantias
aos investidores das companhias listadas no seguimento.

Porém, do modo como inicialmente desenhada, a proposta legal


de maior proteção aos acionistas minoritários em pouco ou nada contribuiu
para a mudança do perfil do controle nas sociedades anônimas brasileiras.
Com efeito, tendo em vista a natureza familiar das companhias brasileiras,
no anteprojeto que deu origem à lei acionária, optou-se por um modelo que
atendesse a ambos os interesses: dos controladores, de um lado, e dos
minoritários, de outro.
12
So b r e, v. A. J O SU Á, Go ve rn a n ça co rp o ra t iv a e teo ria d a a g ên cia , Di s ser t ação d e
Me str ad o d e fe nd id a na Fac u ld ad e d e Di r ei to d a Un i ver s id ad e d e São P au lo , São P a ulo ,
2 0 0 5 , p p . 4 4 - 4 5 . E m o ut r o s e nt id o , e n te nd e nd o q ue a d i sp er são ac io nár ia n ão d er i va
ne ce s sar i a me n te d a ma io r p r o t eção co n f er id a ao s ac io ni s ta s não co nt r o lad o r e s p e l a
es tr ut ur a l e gal d o p a ís , co mo d e mo n s tr a a e xp er iê n cia i n g le sa e a no r te -a me r i ca na, J .
CO F FE E J R., Th e r i se o f d i sp e r sed o wn e r sh ip : th e ro l e o f la w in th e sep a ra tio n o f
o wn e r sh ip a n d co n t ro l, in Co lu mb ia La w a n d E co n o mi cs Wo rkin g P a p e r n . 1 8 2 ( 2 0 0 1 ) ,
p p . 6 9 e s s., d i sp o ní v el [ o n - lin e] i n h t tp : / /p a p e rs .s s rn .co m/p a p er. ta f? a b s tra ct
_ id =2 5 4 0 9 7 [ 0 3 .0 1 .2 0 1 1 ] . P ar a o auto r , a e x p lic ação d a gr a nd e d i s p er s ão acio n ár ia
exp er i me n t ad a naq u el es me r cad o s d e r i va d a a u to -r e g u la ção a q ue e s tão s ub me tid o s.
8
Para tanto, a redação original da lei acionária possibilitou a
emissão de ações representativas de até dois terços do capital social como
ações preferenciais sem direito a voto 13, o que possibilitaria o despejo de
número considerável de ações de uma mesma companhia no mercado
(fomentando o mercado de ações) e, ao mesmo tempo, a manutenção do
poder de controle com pequena parcela do capital social.

Essa estrutura legal fez com que, diferentemente do que ocorre


nos países de tradição jurídica anglo-saxônica, no Brasil, o principal
instrumento para a diluição do capital social da companhia aberta fosse a
emissão de ações preferenciais sem direito a voto. Isso porque tal
expediente favorece, a um só tempo, a diluição do capital, de um lado, e a
manutenção do controle majoritário, de outro. 14 Com isso, não houve
mudança significativa no perfil do poder de controle das companhias
brasileiras, que permaneceu sendo concentrado.

De fato, consoante estudo realizado por N. E IZ IR IK 15 com base


em dados publicados pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) quase
uma década depois da promulgação da Lei das Sociedades por Ações, o
mercado acionário brasileiro mantinha-se extremamente concentrado. Com
base em tais dados (que datam de dezembro de 1985), o autor chega à
conclusão de que, no Brasil, a estrutura de poder dentro das sociedades
anônimas é pouco ou nada democrático, o que seria reflexo da concentração
de riquezas no país. Em face dessa constatação, o autor adverte sobre a

13
At u al me n t e, es se mo n t an te é li mi tad o a 5 0 % d o cap ita l so c ia l, c f. ar ti go 1 5 , § 2 º d a
L ei d a s So c ied ad e s p o r Açõ e s ( Ar t. 1 5 . As açõ e s, co n fo r me a na t ur e za d o s d ir e ito s o u
va n ta ge n s q ue co n fir a m a se u s ti t ul ar e s, s ão o r d i nár i a s, p r e fer e n ci ai s, o u d e fr ui ção .
( ...) § 2 o O n ú me r o d e a çõ es p r e f er e nc ia is se m d ir ei to a vo to , o u s uj ei t as a r es tr i ção no
ex er c ício d es s e d ir e ito , não p o d e ul tr ap a s sar 5 0 % ( c i nq üe nt a p o r c e nt o ) d o to ta l d a s
açõ e s e mi t id a s. ( R ed aç ã o d ad a p e la L ei nº 1 0 .3 0 3 , d e 2 0 0 1 ) )
14
Ne s se s e nt id o , A. C AR V AL H AL , A in f l u ên cia d a e s tru tu ra d e g o ve rn a n ça
co rp o ra t iva n o va lo r, a la va n ca g e m e p o l ít ica d e d iv id en d o s d a s emp r esa s b ra si lei ra s
d e ca p ita l a b e rto , i n R e vi sta d e D i rei to M er ca n til , I n d u s tr ia l , E co n ô m i co e F in a n ce i ro ,
v. 1 3 3 , p . 1 0 1 .
15
O mi to d o “ co n t ro l e g eren cia l” – a lg u n s d a d o s e mp í ri co s , i n R DM 6 6 ( 1 9 8 7 ) , p p .
1 0 3 -1 0 6 . No ar t i go , o a uto r fa z u m le va n ta me n t o e mp ír ico d a d i s tr ib u iç ão ac io nár ia na s
co mp a n hi as b r a s il eir a s p ar a, co m b a se no cr i té r io ad o tad o p o r p ar te d a d o utr i na no r t e -
a mer i ca na p ar a a f er ir a p r es e nça d o co n tr o l e ge r en ci al ( q ua l sej a, ne n h u m a cio n is ta o u
gr up o d e ac io ni st as a g i nd o e m co nce r to d et er ma i s q u e 1 0 % d as a çõ e s co m d ir e ito a
vo t o ) , a n al is ar a e xi st ê n cia d e co n tr o l e ger e n ci a l na s so c ied ad e s a nô ni m as b r as il eir as .
9
quase impossibilidade fática de existir a prática de ofertas públicas de
aquisição de ações voluntárias visando à tomada do poder de controle da
companhia-alvo (o chamado tender offer ou takeover bid da experiência
norte-americana e inglesa, respectivamente) no mercado de valores
mobiliários nacional. 16 Com base em dados quase duas décadas mais
recentes, é possível afirmar que tal vaticínio não se confirmou.

Isso porque, com o grande desenvolvimento do mercado de


valores mobiliários experimentado na última década no Brasil, mormente
com a criação do Novo Mercado na BM&F-Bovespa – dentre cujos
requisitos encontra-se a necessidade de dispersão acionária mínima– o tema
começa a ganhar grande relevo prático, merecendo abordagem mais detida.

A idéia de trabalhar o presente tema surgiu a partir do


amadurecimento do mercado de valores mobiliários brasileiro, a partir dos
anos 2000, que resultou em uma dispersão acionária cada vez mais
significativa. Como marco inicial, podemos citar a companhia Natura
Cosméticos S.A., que abriu seu capital em 2004, estreando a era das
grandes IPOs (initial public offerings – ofertas públicas iniciais) e das
denominadas, no Brasil, poison pills (muitas vezes referida nos estatutos
das companhias do Novo Mercado da BM&F-Bovespa como “cláusulas de
garantia de dispersão acionária” ou “cláusulas de proteção de dispersão
acionária”).

Após a abertura do capital da Natura, muitas outras se


seguiram, num período de grande euforia no mercado brasileiro,
ocasionando o aumento na dispersão acionária. Não tardou para que logo
uma dessas cláusulas de garantia de dispersão acionária fosse posta à
prova, como ocorreu na tentativa frustrada da Sadia em comprar sua então
concorrente, a Perdigão.

Todo esse cenário fez com que os estudiosos e, sobretudo, os


operadores do direito se voltassem para esse fenômeno recente no Brasil –
mas que já conta com muitos anos de ex periência no exterior: a tomada de

16
N. E I Z I RI K, O mi to ... c it. ( n t. 1 5 , su p ra ) , p . 1 0 6 .
10
controle da companhia aberta. É nesse contexto que se insere o presente
estudo.

Assim, a proposta é analisar os mecanismos de que se valem as


companhias brasileiras no intento de obstar a tomada indesejada de
controle. A análise é feita à luz da experiência estrangeira, em que
encontramos muitos outros meios de defesa, mas cujo uso na prática
brasileira ainda se encontra em estágio inicial.

Visa-se, assim, realizar a análise das conjunturas fáticas e


legislativas no concernente ao tema, à luz da experiência de outros sistemas
– a exemplo do norte-americano e do inglês – com o objetivo de contribui r
para este novo capítulo que ora se inicia no desenvolvimento do mercado
de capitais nacional.

Trata-se de tema palpitante, muito discutido nos últimos anos


não só nos bancos acadêmicos, mas sobretudo no âmbito daqueles que
atuam no mercado de valores mobiliários nacional. Com isso,
imprescindível o estudo da já existente experiência brasileira, embora
pequena, no que tange ao tema, mormente das chamadas cláusulas
assecuratórias de dispersão acionária, muito freqüente nos estatutos das
companhias listadas no seguimento do Novo Mercado da BM&F-Bovespa.

11
CAPÍTULO 1
OFERTA PÚBLICA: DEFINIÇÃO E NATUREZA JURÍDICA

1.1. Definição

No âmbito do mercado de valores mobiliário, é possível


apontar várias espécies de ofertas públicas. Com apoio em A. M.
C O R D E IR O 17, podem ser citadas, sem preocupação de exaustão, as seguintes
modalidades:

a) Oferta de subscrição: ocorre quando da emissão de novas


ações (ou outros valores mobiliários) pela companhia, as quais são postas à
disposição dos interessados para subscrição.

b) Oferta de venda: trata-se de venda de ações já subscritas.

17
A. M. C O RD E I RO, Ofe r ta s p ú b l ica s d e a q u is içã o , i n R ev i sta d a O rd e m d o s
A d vo g a d o s 5 6 ( 1 9 9 6 ) , p . 4 9 9 . Va le r e ss al tar q u e, na le gi s laç ão b r a si le i r a, há d i ver sa s
o ut r a s mo d a lid ad es d e o fer ta s p úb l ic as , co n fo r m e e n u mer a ção d i sp o s ta no ar ti go 2 º d a
I n str u ção No r ma ti v a d a CV M n o 3 6 1 , d e 5 d e ma r ço d e 2 0 0 2 .
12
c) Oferta de permuta: ocorre quando há permuta de ações entre
os interessados.

d) Oferta de aquisição: consiste na proposta de aquisição das


ações pretendidas pelo ofertante. Para tanto, este deve dirigir sua oferta aos
detentores das ações visadas, oferecendo em troca determinado valor.

Dentre tais modalidades, é a última – mais especificamente a


oferta pública de aquisição de ações voluntária – a que apresenta maior
relevância para o tema a ser abordado no presente estudo.

No Direito brasileiro, as diversas modalidades de ofertas


públicas, no âmbito do mercado de valores mobiliários, encontram-s e
reguladas na Instrução Normativa da CVM n o 361, de 5 de março de 2002 18.
Consoante seu artigo 2º, V, é voluntária a oferta pública disciplinada pelo
artigo 257 da Lei das Sociedades por Ações. Tal oferta, pela letra da lei,
tem por objetivo a aquisição do controle da companhia visada pelo
ofertante.

Assim, a oferta pública de aquisição de controle pode ser


definida como a oferta voluntária, cujo proponente – que pode ser pessoa
física, grupo de pessoas ou sociedade – tem por objetivo adquirir o controle
de determinada companhia aberta diretamente dos seus acionistas.

Em sendo voluntária, não se confunde com o negócio previsto


no artigo 254-A da Lei das Sociedades por Ações, também conhecido por
oferta pública de aquisição de ações obrigatória, pois a necessidade de sua
realização decorre da lei. Com efeito, a oferta obrigatória é imposta, pela
lei, toda vez em que há a alienação onerosa do controle de companhia
aberta. Nessa hipótese, exige o artigo 254-A que o adquirente do controle
estenda sua oferta aos demais acionistas não controladores, ofertando-lhes

18
So b r e o s t ip o s d e o fe r ta s p úb l ica s r e g u lad as p elo d ip lo ma ci tad o tr atar - se - á ma i s
ad ia n te, ai nd a ne st e cap í tu lo .
13
preço por ação equivalente, no mínimo, a 80% do valor pago pelas ações do
controlador. 19

A principal diferença entre os dois tipos de oferta, além da


obrigatoriedade ou não de sua realização, reside no fato de que a oferta
voluntária é meio para a aquisição do controle da companhia, enquanto a
oferta obrigatória é condição para a celebração do negócio. De fato, a
alienação de controle de companhia aberta, nos moldes do artigo 254-A,
revela-se verdadeiro negócio societário típico, a ser modulado em
consonância com o disposto na lei, e observada a regulamentação da CVM
(sobretudo a Instrução Normativa CVM n o 361, de 5 de março de 2002). Ou
seja, a alienação deve ser contratada, obrigatoriamente, sob a condição de
que o adquirente realize a oferta pública aos demais acionistas. Tem-se,
assim, que essa condição é da essência do próprio negócio. 20

Como decorrência lógica do acima apontado, outra diferença


faz-se presente: enquanto a oferta voluntária é realizada previamente à
aquisição do controle, visto que é o meio do qual se vale o ofertante para
atingir o fim almejado (aquisição do controle), a oferta obrigatória ocorre
após ou concomitantemente à concretização da transferência onerosa do
controle, pois é a ocorrência desse evento que desencadeia a necessidade d a
oferta obrigatória.

Ademais, conforme ressalta J. A. T. G U ER R E IR O , a diferença


entre os dois tipos de ofertas públicas encontra-se, ainda, na finalidade

19
So b r e a o fer t a p úb li ca o b r i gató r ia p r e v i sta no ar ti go 2 5 4 - A, v. R. N. P R ADO , Of er ta
P ú b li ca d e A çõ es Ob r ig a tó r ia s n a s S . A .: Ta g A lo n g , São P a ulo , Q ua r t i er La ti n , 2 0 0 5 ,
p a s si m.
20
Di ver sa me n te d o q ue e m ger al o co r r e, a c o nd ição , na aq u i siç ão d e co n tr o l e d a
co mp a n hi a ab er t a, n ão é e le me n to acid e nt al ( o u p ar t ic u lar ) d o ne gó ci o j ur íd ico , ma s
an te s e s se n cia l ( o u ele m en to c ate go r ia l e s se n cia l ) , p o r e xp r e s sa d i sp o s iç ão le g al :
Ar t. 2 5 4 - A. A a li e naç ã o , d ir e ta o u i nd i r et a, d o co ntr o le d e co mp a n h i a ab er ta so me n te
p o d er á s er co ntr at ad a s o b a co nd ição , s u sp e n s i va o u r e so l ut i va, d e q ue o ad q ui r e nt e s e
o b r i g ue a faz er o fer t a p úb l ic a d e aq ui si ção d a s açõ e s co m d ir e ito a vo t o d e p r o p r ied ad e
d o s d e ma is a cio n is ta s d a co mp a n hi a, d e mo d o a lhe s a s se g ur ar o p r eço no mí n i mo i g ua l
a 8 0 % ( o it e nta p o r ce n to ) d o va lo r p a go p o r ação co m d ir eito a vo t o , i nt e gr a nt e d o
b lo co d e co ntr o le. ( gr i f a mo s)
So b r e o s e le me n to s ca te go r i ai s e s se n cia i s e o s p ar ti c ular e s, v. A. J . AZ E V E D O,
Neg ó cio Ju ríd ico – E x i st ên cia , V a lid a d e e E f ic á cia , 4 ª ed ., São P a ulo , Sa r ai v a, 2 0 0 2 ,
p p . 3 5 e s s.
14
almejada com cada uma delas: a oferta voluntária tem por escopo a
aquisição do controle da companhia, enquanto o objetivo da oferta
obrigatória consiste na proteção patrimonial dos acionistas minoritários,
que não são partes no negócio de transferência do controle. 21

Destaque-se ainda que a oferta de aquisição voluntária não


segue o mesmo procedimento da oferta obrigatória 22. Assim, respeitados os
parâmetros previstos nos artigos 257 e seguintes da Lei das Sociedades por
Ações, o ofertante tem liberdade para estabelecer as condições em que o
negócio será feito. 23

Em face do exposto, define-se a oferta pública voluntária como


a proposta de aquisição das ações pretendidas pelo ofertante, dirigida aos
detentores das ações visadas, oferecendo em troca determinado valor (que
pode ser dinheiro ou ações, no caso de permuta). Atente-se para o fato de
que a oferta pública voluntária disciplinada pela Lei das Sociedades por
Ações refere-se apenas àquela oferta voltada para a aquisição do controle,
conforme expressamente previsto no caput do artigo 257 da lei.

A doutrina aponta a oferta voluntária como forma de aquisição


originária do controle. 24 A relevância da distinção entre aquisição
originária e derivada do poder de controle está diretamente ligada à
aplicação do regime legal instituído pelo artigo 254-A da Lei das
Sociedades por Ações, acima mencionado, conforme explicado a seguir.

21
A l ien a çã o d e Co n t ro le d e Co mp a n h ia A b er ta : O P a p e l d a s I n s ti tu i çõ e s F in a n c ei ra s,
in R e vi sta d e D i re ito Me rca n ti l 3 0 ( 1 9 7 8 ) , p . 1 1 6 .
22
Co n fo r me o ar ti go 2 º , in ci so I V, d a I n s tr ução No r ma ti va d a CV M n o 3 6 1 /0 2 , “o fe r ta
vo l u n tár ia é aq ue la q u e n ão d e ve r ea liz ar - se se g u nd o o s p r o c ed i me nto s esp ec í fico s
es tab e lec id o s na ci tad a I n str u ção p a r a q ua lq uer o fer ta o b r i ga tó r i a”.
23
“D ú v id a não h á, p o r ta n to , q ua n to ao f ato d e q ue, na o fer ta vo l u n tár i a , o o f er ta n te é
ab so l uta me nt e l i vr e p ar a e stab el ecer o s p r o ce d i me nto s q u e e n te nd er co n ve ni e nt es e
cab í ve i s na p r o p o s ta d e ce leb r a ção d e u m co nt r ato d e aq ui si ção d e açõ e s q u e e le
fo r mu l a ao co nj u nto d e acio n is ta s d a co mp a n hi a al vo ” ( L. L. C ANT I DI AN O, A n á li se d o
ca so S a d ia x P e rd ig ã o : u ma t en ta tiva d e “ta ke o ver ”, i n S o c ied a d e A n ô n ima – 3 0 a n o s
d a Lei 6 .4 0 4 /7 6 , co o r d . R. R. M . C AST RO e L . S. AR AG ÃO, São P a u lo , Qu ar t ier L at i n,
2007, p. 226).
24
A. L AMY FI L HO e J . L. B U L HÕE S P E D RE I R A, A L ei d a s S .A . , v . I I , 2 ª ed ., Rio d e
J ane ir o , Re no var , 1 9 9 6 , p . 6 7 6 ; L. L. C ANT I DI AN O, A lien a çã o e A q u is içã o d e
Co n t ro le, i n R ev is ta d e Di re ito Me rca n ti l 5 9 ( 1 9 8 5 ) , p . 6 5 ; G. D. C. P E RE I R A,
A li en a çã o d o P o d e r d e Co n t ro le, São P a ulo , Sa r ai va, 1 9 9 5 , p . 3 3 .
15
A aquisição derivada pressupõe a pré-existência do controle
que se pretende adquirir. Isso, contudo, não é suficiente: é imprescindível
que aquele que vai perder o controle exerça algum papel na transferência,
ainda que seja concordando com a operação, visto que, do contrário, estar-
se-ia diante de hipótese de aquisição originária (apropriação). A idéia
central, portanto, é a de transferência do controle, e somente é possível
transferir aquilo que já existe. Assim, o que determina se a aquisição é a
título derivado é a existência de relação causal entre a perda do controle
para uma parte, e a aquisição do controle, pela outra. 25

A aquisição originária, por sua vez, pode ocorrer tanto numa


situação de inexistência de controle acionário definido, quanto diante de
controle minoritário (que não será transferido), hipótese em que a aquisição
de novo controle implicará a perda deste último. 26

Por conta disso, não se pode falar em alienação de controle


quando diante de aquisição originária, pois, em verdade, não há
transferência do controle de um titular para outro, mas sim o surgimento do
controle para um, e a perda do controle pelo antigo titular – muitas vezes
até mesmo contra sua vontade.

Ora, a alienação onerosa do controle de companhia aberta –


condição a desencadear a necessidade da oferta prevista no artigo 254-A da
lei – somente ocorre em havendo transferência onerosa do controle. Ou
seja, pressupõe a pré-existência de controle, que será transferido
onerosamente. Na falta dessa condição, como ocorre na aquisição originária
do controle, não há incidência da norma do artigo 254-A.

Ademais, no caso de oferta voluntária de aquisição de controle,


torna-se desnecessária a realização de posterior oferta obrigatória, visto
que a oferta voluntária já é dirigida à totalidade dos acionistas com ações
votantes da companhia visada, sejam controladores ou não, em iguais

25
So b r e, v . F . C. P O NT E S DE MI R AN D A, T ra ta d o d e Di re ito P r iva d o , t. V, Rio d e
J ane ir o , B o r so i, 1 9 5 5 , p p . 1 4 e s s.
26
G. D. C. P E RE I R A, A li en a çã o d o P o d er ... c it. ( nt . 2 4 , su p ra ) , p . 3 3 .
16
condições, o que se mostra até mais vantajoso que a oferta prevista no
artigo 254-A.

1.2. Natureza Jurídica

Da definição vista acima, resta clara a natureza jurídica d a


oferta voluntária de aquisição de controle como sendo oferta contratual.
Com efeito, trata-se de declaração unilateral de vontade (declaração
negocial 27) dirigida a sujeitos indeterminados, mas determináveis (os
acionistas da companhia-alvo), com o fito de se estabelecer contrato de
compra e venda ou permuta de ações. 28

É oferta que tem por escopo a celebração de negócio cujo


objeto é a aquisição do bloco de ações que garante o controle da
companhia-alvo. Dirigida não a um, mas a número indeterminado de
acionistas, a oferta dá origem a tantas ordens de venda quantos forem os
aceitantes, mas a reunião de todos esses negócios dá origem a um único
contrato (artigo 261 da Lei das Sociedades por Ações). 29

Trata-se, assim, de proposta irrevogável (consoante o disposto


no artigo 257, §2º, da Lei das Sociedades por Ações) 30 dirigida a número

27
So b r e ne gó c io j ur íd ico e d ec lar ação n e go c ial , v . A. J . AZ E VE D O, Neg ó cio Ju r íd i co e
Dec la ra çã o Neg o c ia l: No çõ es Ge ra i s e F o r m a çã o d a Dec la ra çã o N eg o cia l, te s e d e
tit u lar id ad e ap r e se n tad a à Fa c uld ad e d e D ir e it o d a U ni v er s id ad e d e São P a ulo , S ão
P au lo , 1 9 8 6 , p a s si m.
28
M. C AR V AL HO S A, O f er ta P ú b l ica d e A q u is iç ã o d e A çõ e s, R io d e J a n eir o , I B E ME C,
1 9 7 9 , p p . 1 9 -2 0 .
29
M. C AR V AL H O S A, Co men tá r io s à Le i d e S o ci ed a d es A n ô n ima s, v. 4 o , t. I I , 2 ª ed .,
São P a u lo , Sar a i va, 2 0 0 3 , p . 2 1 0 .
30
Ar t. 2 5 7 . ( .. .)
§ 2 º A o f er ta d e ver á t er p o r o b j eto a çõ e s co m d ir ei to a vo to e m n ú mer o s u f ici e nte p ar a
as se g ur ar o co n tr o l e d a co mp a n hi a e ser á i r r e vo gá v el. ( gr i f a mo s )
T r ata -s e d e o fer ta ir r e vo gá v el te nd o e m v i sta q u e, e nq ua n to o fer ta q ue é , s ub me te - se ao
r eg i me g er a l p r e v is to n o Có d i go Ci vi l, e m q ue a r e gr a é a ir r e vo gab il id ad e d a p r o p o st a
17
maior ou menor de acionistas indeterminados, porém determináveis, por
meio da qual o policitante propõe aos acionistas da companhia-alvo a
celebração de contrato de compra ou permuta de ações.

Ressalte-se, ainda, que se enquadra na categoria de oferta


pública, a teor do artigo 429 do Código Civil Brasileiro, a saber:

Art. 429. A oferta ao público equivale a proposta


quando encerra os requisitos essenciais ao
contrato, salvo se o contrário resultar das
circunstâncias ou dos usos.

Parágrafo único. Pode revogar-se a oferta pela


mesma via de sua divulgação, desde que
ressalvada esta faculdade na oferta realizada.

A primeira característica da oferta pública é a indeterminação


dos destinatários da proposta (declaração in incertam personam), o que não
significa, necessariamente, que a proposta dirige-se a todas as pessoas, mas
sim a determinada categoria delas. No caso da oferta pública voluntária,
tem-se que tal categoria é definida pelos acionistas detentores de ações
com direito a voto da companhia-alvo. 31

Outra característica das ofertas públicas consiste no modo pelo


qual ela é formulada: é feita por meio de proposta dirigida
indiscriminadamente às pessoas que sejam titulares de ações de
determinada companhia.

Tem-se, ainda, o requisito da publicidade da oferta, que é


essencial, uma vez que o conhecimento público da oferta é relevante não
apenas para os acionistas a quem ela é dirigida, como também à própria
companhia visada e à comunidade dos negócios em geral. Aliás, é por meio
da publicidade da oferta que se abre a possibilidade de ofertas concorrentes

a p r azo d et er mi n ad o – co mo só i a co nt ecer co m a o fer ta p úb l ica d e aq u is ição d e a çõ e s


vo l u n tár ia. So b r e o c a r áter ir r e vo g á vel d a o fer ta, c f. M. C AR V A L HO S A, O fe rta
P ú b li ca ... ci t. ( nt . 2 8 , s u p ra ) , p p . 2 4 -3 0 .
31
M. C AR V AL H OS A, Of er ta P ú b l ica . .. c it. ( nt. 2 8 , su p ra ) , p . 2 1 .
18
ou mesmo de tomada de medidas defensivas por parte da companhia-alvo,
de seus acionistas ou administradores. 32

A oferta que não é pública foge ao escopo deste trabalho. Se o


interessado no controle não se utiliza da via pública para adquiri-lo, resta-
lhe então a via particular, negociada de forma amigável junto aos atuais
controladores da companhia visada. Se o negócio obtiver êxito, é caso de
incidência do artigo 254-A, e não do artigo 257 da lei (este sim relevante
para o objeto de nosso estudo).

1.3. Distinções Terminológicas

Assentada a definição e a natureza jurídica da oferta pública


voluntária, é importante diferenciar alguns termos que serão muito
utilizados no transcorrer do trabalho, tais como a noção de takeover,
takeover bid, takeover hostil, takeover defenses ou medidas defensivas,
tender offer, tomada de controle, entre outros. Vejamos.

Na experiência norte-americana, as ofertas públicas de


aquisição de ação voluntária são conhecidas como tender offers, que é a
contração da expressão “offer to buy, conditioned on receipt of sufficient
tenders”. Já na Inglaterra, as ofertas voluntárias que visam tomar o
controle da companhia são conhecidas por takeover bids, e encontram-se
reguladas pelo City Code on Takeover and Mergers (“City Code”). 33

Para logo se vê, portanto, que as expressões tender offer e


takeover bid – quando a primeira também visa à tomada de controle – são
expressões sinônimas, equivalendo ao fenômeno das ofertas públicas

32
M. C AR V AL H OS A, Of er ta P ú b l ica . .. c it. ( nt. 2 8 , su p ra ) , p . 2 2 .
33
A. M . CO R DE I RO , O fe rta s p ú b li ca s. .. c it. ( nt. 1 7 , su p ra ) , p . 5 0 1 .
19
voluntárias de aquisição de controle do Direito Brasileiro (artigo 257 da
Lei das Sociedades por Ações).

A tender offer, no direito norte-americano, pode-se processar


de modo amigável, quando a oferta é negociada com a administração da
companhia-alvo, ou de modo hostil, quando se dá ao arrepio daquela.
Assim, fala-se em tender offer hostil quando o ofertante almeja adquirir
ações da companhia-alvo contra a vontade da administração desta. Note-se
que o adjetivo hostil, na realidade norte-americana, refere-se em regra aos
administradores da companhia visada, e não aos seus acionistas, para quem
a oferta será sempre amigável (afinal, compete a eles decidir se irão vender
suas ações ao ofertante ou não, o que será feito com base em sua percepção
de quão vantajosa é a oferta 34). Essa constatação deve-se à grande
pulverização das ações da maior parte das grandes companhias norte-
americanas, cenário este propício ao estabelecimento do chamado controle
gerencial, que é aquele em que a companhia é controlada não pelos seus
acionistas, mas sim por seus administradores, em face da ausência de
acionista ou grupo de acionistas com participação relevante no capital
social.

O assim chamado poder de controle gerencial deita suas bases


no fenômeno da separação entre propriedade acionária e poder de controle.
Vejamos.

À primeira vista, o poder de controle interno de uma sociedade


apenas se poderia fundar na propriedade acionária. Essa constatação,
porém, mostra-se errônea diante do fenômeno da separação entre
propriedade acionária e poder de comando empresarial, conforme
amplamente estudado por A. A. B ER LE e G. C. M E A N S 35. Essa separação é
decorrência da grande dispersão acionária que foi observada pelos autores
citados nas companhias norte-americanas. Com um número grande de
34
Co n so a n te ad v er te A. M. C O R D E I R O , a “ad mi ni s tr aç ão d a so c ied ad e vi s ad a não é,
p o r é m, d o na d a so c ied a d e: e s se p ap e l cab e ao s acc io ni st a s” ( Da to ma d a d e so ci ed a d e s
( ta keo ve r ): e fec ti va çã o , va lo ra çã o e técn ica s d e d efe sa , i n R e vi sta d a Ord em d o s
A d vo g a d o s 5 4 ( 1 9 9 4 ) , p . 7 6 7 ) .
35
A. A. B E R LE J r . e G. C . M E ANS , Th e Mo d e rn Co rp o ra t io n ... ci t. ( nt . 2 , su p ra ) ,
p a s si m.
20
acionistas, cada qual detendo parcela ínfima do capital social votante,
dificilmente o poder de comando da companhia seria exercido pelos
acionistas, assim dispersos.

Em verdade, ou o poder de comando seria exercido por


pequeno grupo de acionistas reunidos, detentores de pequena porcentagem
do capital social, mas com poder de comando sobre o todo, ou mesmo o
poder de comando empresarial sequer seria exercido pelos acionistas
(proprietários), mas sim pelos administradores da companhia. No primeiro
caso, a separação entre propriedade e controle não seria completa, mas
apenas com relação ao grande corpo acionário disperso, não controlador. Já
no segundo caso, a separação seria total.

Assim, em face do fenômeno da separação entre propriedade e


controle, A. A. B ER LE e G. C. M EA N S constataram outras formas possíveis
de controle sobre a sociedade anônima. São elas: controle com quase
completa propriedade acionária, controle majoritário, controle obtido
mediante expedientes legais, controle minoritário e controle administrativo
ou gerencial. 36 Tal enumeração, após revista e criticada por F. K.
C O M P A R A TO , pode ser reduzida a quatro espécies de controle, no entender
deste autor, conforme o grau crescente de separação entre propriedade
acionária e controle, a saber: controle totalitário, controle majoritário,
controle minoritário e controle gerencial. 37

Nas palavras de T. A S C A R E L L I 38, o controle pode ser definido


como a possibilidade de um ou mais sujeitos impor a própria decisão à
assembléia-geral da sociedade.

Na legislação brasileira, a definição legal de acionista


controlador da sociedade anônima está disposta no art. 116 da Lei das
Sociedades Anônimas, que diz:

36
Th e Mo d e rn Co rp o ra t io n ... ci t. ( n t. 2 , su p ra ) , p p . 7 5 e s s.
37
O p o d e r d e Co n t ro l e... cit. ( nt. 2 , su p ra ) , p p . 4 7 -4 8 .
38
P ro b le mi Giu rid ic i, t. I , Mi lão , Gi u f f r è, 1 9 5 9 , p . 2 6 7 , nt. 2 3 .
21
Art. 116. Entende-se por acionista controlador a
pessoa, natural ou jurídica, ou o grupo de pessoas
vinculadas por acordo de voto, ou sob controle
comum, que:

a) é titular de direitos de sócio que lhe assegurem,


de modo permanente, a maioria dos votos nas
deliberações da assembléia-geral e o poder d e
eleger a maioria dos administradores da
companhia; e

b) usa efetivamente seu poder para dirigir as


atividades sociais e orientar o funcionamento dos
órgãos da companhia.

A definição legal de acionista controlador é cristalina e apóia-


se no princípio majoritário (consoante artigos 129 e 140, IV da Lei das
Sociedades por Ações), ou seja, é controlador aquele que possui direitos de
sócio que lhe assegurem a maioria nas deliberações da assembléia-geral.

Apenas isso, entretanto, não é suficiente para caracterizar o


controle. Necessário, ainda, que o controlador possua tais direitos de mod o
permanente e que o exerça de modo efetivo, como demanda a alínea “b” do
dispositivo mencionado. O controle da sociedade não pode ser esporádico
ou episódico: é necessário esse caráter de permanência a que faz referência
o texto legal.

Se é assim, pode-se concluir que o percentual que garante a


priori o exercício do poder de controle de modo permanente, nos quadros
do princípio majoritário, é o da maioria absoluta, isto é, metade das ações e
mais uma ação do capital votante. Ressalte-se, porém, que essa constatação
não se baseia em termos concretos, relativos à experiência vivida, mas em
termos abstratos.

Tal conclusão não ignora, assim como aponta a ressalva feita


acima, a possibilidade de o poder de controle ser detido por acionista que
detenha menos da metade do capital com direito a voto, pois quer mediant e

22
acordo de acionistas, quer simplesmente em virtude da experiência
consagrada na prática das assembléias gerais, marcadas pelo absenteísmo
dos acionistas, pode acontecer de esse acionista controlar a companhia.

Por conta desse caráter variante do controle, o legislador


brasileiro optou por não utilizar um percentual fixo para determinar o
acionista controlador, como ocorre em diversas legislações.

Exemplificativamente, no direito inglês, em face do disposto


no City Code, a configuração jurídica do controle, para efeitos de oferta
pública obrigatória de ações (mandatory offers), tem em conta percentual
pré-fixado de ações votantes: a aquisição de 30% das ações votantes de
uma companhia é suficiente para caracterizar a aquisição do poder de
controle e dar ensejo à oferta obrigatória. 39

No direito francês, o artigo 233-3 do Código Comercial dispõe


que o controle deriva da detenção de direitos de voto que assegurem a
maioria nas deliberações da assembléia-geral, assim como pelo poder de
eleger ou destituir a maior parte dos membros dos órgãos de
40
administração . Essa definição de controle aproxima-se ao disposto no

39
Co n fo r me a Re gr a 9 .1 d o Ci ty Co d e : “E x cep t wi t h t he co ns e nt o f t he P ane l, wh e n : ( a)
an y p er so n a cq uir es, wh et her b y a ser i e s o f tr a n sac tio n s o ver a p e r io d o f t i me o r no t, a n
in ter es t i n s h ar e s wh i c h ( tak e n to ge t her wi t h s h ar e s i n wh ic h p er so n s a cti n g i n co nc er t
wi t h h i m a r e i n ter es ted ) car r y 3 0 % o r mo r e o f th e vo t i n g r i g h t s o f a c o mp a n y; o r ( b )
an y p er so n , to ge t her wi th p er so ns act i n g i n co nc er t wi t h hi m, i s i nt er es ted i n s har es
wh ic h i n t he a g gr e ga te car r y no t le s s t h a n 3 0 % o f t he vo ti n g r i g ht s o f a co mp a n y b u t
d o es no t ho ld s h ar e s car r yi n g mo r e t h a n 5 0 % o f s uc h vo t i n g r i g h ts a nd s uc h p er so n, o r
an y p er so n ac ti n g i n co nc er t wi t h hi m, acq u ir e s a n i nter e st i n a n y o t h er s ha r e s wh i c h
in cr e as es t he p er ce n ta ge o f s har e s c ar r yi n g vo ti n g r i g ht s i n wh ic h h e i s in ter es ted , s uc h
p er so n s ha ll e xte nd o f fe r s, o n t he b a s is se t o ut i n R ul e s 9 .3 , 9 .4 a nd 9 .5 , to t h e ho ld er s
o f a n y c la s s o f eq u it y s har e c ap i tal wh e t her vo t i n g o r no n - vo ti n g and a l so to t he
ho l d er s o f a n y o t h er c l as s o f tr a n s f er ab le se c u r it ie s c ar r yi n g vo t i n g r i g ht s. O f f er s fo r
d i f fer e n t cla s se s o f eq ui t y s ha r e cap i ta l mu s t b e co mp ar ab le ; t h e P an el s ho u ld b e
co n s u lted i n ad va n ce i n s uc h c as es . An o f fe r wi l l no t b e r eq u ir ed u nd e r t hi s R u le wh e r e
co n tr o l o f t he o f f er ee co mp a n y is acq u ir ed a s a r e s u lt o f a vo l u nt ar y o f f er ma d e i n
acco r d a n ce wi t h t he Co d e to a ll t he ho ld er s o f vo ti n g eq u it y s ha r e c a p ita l a nd o t her
tr a n s fer ab le s ec ur i ti e s c ar r yi n g vo ti n g r i g ht s” .
40
Ar ti go L . 2 3 3 -3 , I . - U ne so c ié té e st co ns id ér é e, p o ur l 'ap p l ica tio n d e s sec tio n s 2 e t 4
d u p r és e nt c hap i tr e , co m me e n co n tr ô la nt u ne a u tr e:
1 ° Lo r sq u 'e lle d é ti e nt d ir ect e me n t o u i nd ir ecte me nt u ne fr a ct io n d u cap i ta l l ui
co n f ér a n t l a maj o r i té d e s d r o it s d e vo te d a n s l es as se mb lé es gé nér ale s d e ce tte so ci été ;
2 ° Lo r sq u 'el le d isp o s e s eu le d e l a maj o r ité d e s d r o it s d e vo te d a n s c et te so c iét é e n v er t u
d 'u n a cco r d co nc l u a ve c d 'a utr es a s so c ié s o u a ctio n n air es e t q u i n 'e s t p as co n tr ai r e à
l 'i n tér êt d e l a so ci été ;
23
artigo 116 da lei brasileira. Contudo, no direito francês há a presunção de
que a detenção de 40% das ações votantes já seria suficiente a caracterizar
o controle, caso nenhum outro acionista detenha participação maior. 41

A legislação italiana, a seu turno, está mais preocupada em


definir percentual a partir do qual é obrigatória a apresentação de oferta
pública do que em definir o que é o controle. Assim, transferidos mais de
30% do capital votante de uma companhia, surge a obrigação de fazer a
oferta pública. 42 Essa preocupação justifica-se pela exigência da Diretiva
Européia sobre takeover de que cada Estado-membro determine o
percentual a partir do qual será necessária a realização de oferta
obrigatória no caso de aquisição de controle. 43

Pelo exposto, é lícito concluir que a definição de poder de


controle é ainda uma tarefa dramática. Várias legislações tentam amenizar
essa tarefa estipulando critérios numéricos para a sua aferição. Mesmo aí
os critérios não são concordes, variando de legislação para legislação,
havendo mesmo aquelas que não pré-definem percentual algum, a exemplo
do direito brasileiro.

Essa dificuldade na definição do controle decorre do fato de o


controle societário não ser uma situação jurídica determinada, mas sim uma
situação de fato, a que se atribuem conseqüências jurídicas. Conforme j á
foi apontado por T. A S C A R E L L I :

3 ° Lo r sq u 'el le d éte r mi n e e n f ai t, p ar l es d r o i ts d e vo te d o nt el le d i sp o s e, l es d éc i sio n s


d an s le s a s se mb lée s g é n ér al es d e c et te so c iét é;
4 ° Lo r sq u 'el le es t a s so ciée o u a ct io n nai r e d e cet te so c ié té et d i sp o s e d u p o u vo ir d e
no m me r o u d e r é vo q ue r la maj o r ité d es me m b r es d es o r g a ne s d 'ad mi n i str at io n, d e
d ir ec tio n o u d e s ur ve il la nc e d e cet te so cié té.
41
Ar ti go L. 2 3 3 -3 , I I : - E lle e s t p r és u mée e x er cer ce co ntr ô le lo r sq u 'el le d i sp o s e
d ir ec te me n t o u i nd ir e ct e me nt, d 'u n e fr act io n d es d r o it s d e vo te s up ér ie ur e à 4 0 % e t
q u 'a uc u n a u tr e a sso ci é o u act io n na ir e n e d é t ie nt d ir e cte me nt o u i n d ir ec te me n t u ne
fr a ct io n s up ér ie ur e à la si e n ne.
42
C f. ar t i go 1 0 6 ( 1 ) d o Decr eto L e gi sl at i vo n º 5 8 d e 2 4 d e fe v er e ir o d e 1 9 9 8 : 1 .
C hi u nq u e, a se g u ito d i acq ui st i a tito lo o n er o s o , ve n ga a d et e ner e u na p ar t ecip az io ne
s up er io r e a ll a so g lia d el tr e nta p e r ce n to , p r o muo ve u n 'o f fer ta p ub b lic a d i acq u i sto
s ul la to t al ità d el le azio n i o r d i n ar ie .
43
So b r e a D ir e ti v a E ur o p éia me n c io nad a, v. Cap í tu lo 2 , it e m 2 .3 . , in f ra .
24
“ (...) il controllo inceve non indica una
determinata situazione giuridica, ma una
situazione di fatto che può derivare da rapporti
giuridici diversi, attenendo (e quand’anche
esecutato da un solo soggetto) non già al tipo del
rapporto, mas a modalità di fatto e a modalità di
fatto relative alla situazione comparativa dei vari
interessati nella società.”. 44

Essa natureza do controle, juntamente com a definição abstrata


de acionista controlador utilizada pela lei brasileira, faz com que o poder
de controle somente possa ser aferido no caso concreto. Não sendo ainda
possível a análise em concreto, o parâmetro legal faz com que o intérprete
apreenda a figura do acionista controlador, a priori e em abstrato, como
aquele que detém a maioria absoluta das ações votantes ou direitos de
acionista que correspondam a tanto.

Como já mencionado, essa conclusão não nega o fato de poder


existir controle sem a detenção da maioria absoluta das ações com direito a
voto. Se assim fosse, bastaria que a lei tivesse definido como acionista
controlador aquele que detém a maioria absoluta das ações votantes. Mas
essa não foi a opção do legislador: além de prever que o controlador é
aquele que detém participação no capital votante capaz de lhe assegurar a
maioria nas deliberações, exige que o controle seja efetivamente exercido.

Com isso, pode acontecer de o poder de controle ser exercido


por quem não tenha a maioria absoluta das ações votantes, mas que consiga
impor suas decisões e exercer efetivamente o comando da companhia: é o
chamado controle minoritário. 45 No extremo, como já assinalado, é possível

44
I n tema d i t ito li a z io n a ri e so cie tà t ra so c i età , i n S a g g i d i Di r it t o Co m me rc ia l e,
Mil ão , Gi u f fr è, 1 9 5 5 , p . 2 5 2 , d e sta ca mo s. No me s mo s e nt id o , a n al is a nd o o p o d er na
so c ied ad e a nô ni ma so b o en fo q ue so cio ló gi co , J . A. T . GUE R RE I R O , S o cio lo g ia d o
P o d er n a S o c ied a d e A n ô n ima , i n R evi s ta d e Di re ito Me rca n ti l 7 7 ( 1 9 9 0 ) , p p . 5 0 -5 6 .
45
J á T . A S C A R E L L I es ta va ate n to p ar a o fe nô m eno d o co ntr o le mi n o r i tár io , a ss i m o
d esc r e ve nd o : “V ’ è cio è fr eq u e nte me nt e n el le s o cie tà u n so cio o u n gr up p o d i so c i ( a
lo r o vo l ta p er so ne f i si c he o so c ie tà) – c h e no n p er ciò d e ve e s ser e p r o p r iet ar io d el la
ma g g io r a n za d el le p ar t ecip a zio n i az io nar i e, e s se nd o sp es so i l co ntr o llo a ss ic ur ato
an c he d a p ar te cip a zio n i as s ai i n fer io r i a lla ma g gi o r a nz a d e ll e a zio n i – c he, d i f at to ,
25
até mesmo o controle exercido pelos administradores da companhia,
presente sobretudo nas companhias cujo capital encontra-se pulverizado no
mercado, sendo que nenhum acionista isoladamente possui ações em
montante significativo. Esses tipos de controle, porém, somente são
aferíveis no caso concreto.

Para o presente estudo, que tem por pressuposto a tomada do


controle por meio de oferta pública de aquisição de ações, têm maior
interesse teórico as categorias de controle minoritário e gerencial, as quais
passarão a ser exploradas em seguida, sem, contudo, maior aprofundamento
científico, haja vista que este não é o tema central a ser analisado n a
presente dissertação. 46

O controle minoritário dá-se quando o poder sobre a sociedade


funda-se em participação acionária inferior à metade do capital votante. É
denominado de working control pela doutrina norte-americana, 47 e de
controle difuso no âmbito do Novo Mercado da BM&F-Bovespa. 48

Segundo nos dá notícia F. K. C O MP A R A TO 49, o fenômeno do


controle minoritário parece estar ligado à existência de duas ordens de

d isp o n e d e lla ma g g io r an za ne ll e a s se mb lee e el e g ge g li o r g a ni s o cia li e ne i c u i


co n f r o nti gl i a ltr i ( e ve n t ua li) az io ni st i ( d is i nt er e s sat i o i mp o t e nt i) as s u mo no
eco no mi ca me n te la v es t e d i r isp ar mi ato r i c h e fi na n zia no u n ’a ti vi tà d a a ltr i d ir et ta. Ne i
r ap p o r ti i nter n i q u e sto fe no me no è ta n to p i ù gr a v e q u a nto mi no r e la p ar tec ip az io ne
so c ial e c he, i n li n ea d i fa tto , p er met te i l co n t r o llo , co me ap p u nto a v vi e ne q ua nd o l e
azio n i so no d i f f u se n el p ub b lico , v uo i p e l na t ur ale as se n te is mo d i mo lt i azio n is ti , v uo i
p el d is i nt er e s se d i q ue st i, v uo i a ttr a ver so no t i ar ti f ic i ( q ua li l ’ i nce tt a d i p r o c ur e) . ..
es se nd o d el r e s to o r ma i ne ll e gr a n d i s si me so c iet à i l n u me r o d i azio n i st i tal e c h e al lo r o
ef f et ti vo i nt er ve n to no n co r r i sp o nd er eb b er o s ale cap a ci d i co n ter ner li” ( I n t ema d i
tito li ... c it . ( nt . 4 4 , su p r a ) , p p . 2 5 3 -2 5 4 ) .
46
A i n ve st i ga ção e e s t ud o d o s fe nô me n o s d o co ntr o le mi no r it ár io e d o co n tr o le
ger e nc ial n ão e stão co mp r ee nd id o s no â mb ito ma i s r e str ito d es te t r a b al ho , p e lo q ue
r e met e mo s o lei to r às se g u i nte s o b r a s, p ar a ma io r ap r o f u nd a me n to no te ma : F. K.
CO MP AR AT O, O p o d e r d e Co n t ro l e... ci t. ( n t. 2 , su p ra ) ; A. A. B E R LE J r . e G. C .
ME ANS , Th e Mo d e rn C o rp o ra t io n ... ci t. ( nt . 2 , su p ra ) .
47
F. K. CO MP AR AT O, O p o d er d e Co n t ro l e... ci t. ( n t. 2 , su p ra ) , p . 4 7 .
48
O co ntr o le mi no r itá r io é r e fer id o co mo co n tr o le d i f u so no â mb i to d o No vo M er cad o
d a B M & F -B o ve sp a , co n fo r me o it e m 2 .1 d e s e u Re g u la me n to : “‘ Co n t ro le Di fu so ’
si g n i fi ca o P o d er d e Co nt r o le e xer c id o p o r acio n is ta d ete n to r d e me no s d e 5 0 %
( ci nq üe n ta p o r c e nto ) d o cap i tal so c ia l, a s si m co mo p o r g r up o d e ac i o ni s ta s q ue não
sej a si g n at ár io d e a co r d o d e vo to s e q ue n ão es tej a so b co n tr o l e co m u m e ne m a t ue
r ep r e se nt a nd o u m i nt er e s se co mu m”.
49
O p o d e r d e Co n t ro l e... cit. ( nt. 2 , su p ra ) , p . 4 7 .
26
acionistas dentro da grande sociedade anônima – o acionista-empresário e o
acionista-capitalista – distinção esta presente desde a sociedade
50
comandita. Enquanto os primeiros constituem pequeno grupo de
empresários, exercendo efetivamente o poder de comando da sociedade, os
últimos são apenas investidores de capital, com objetivos de poupança ou
especulativo.

Apesar de a Lei das Sociedades por Ações – e a legislação


brasileira em geral – referir-se mais acentuadamente ao fenômeno do
controle majoritário, 51 é inegável o reconhecimento do controle minoritário,
ainda que de modo implícito, em alguns de seus dispositivos. Assim é que
a lei fixa regra de quorum de instalação para a assembléia-geral, que em
primeira convocação instala-se com a presença de, no mínimo, um quarto
do capital social com direito a voto e, em segunda convocação, com
qualquer número (artigo 125). 52

O mesmo pode ser dito da regra do artigo 135, sobre o quorum


de instalação de assembléia tendente à alteração do estatuto social. Diante
disso, é possível, teoricamente, que o detentor de apenas uma única ação
constitua validamente a assembléia. A hipótese, aliás, não é irreal,
conforme informa F. K. C O MP A R A TO 53, que noticia a sua ocorrência na
França, e teve sua validade reconhecida pelo Judiciário francês.

50
A so c ied ad e co ma nd i ta ( ar t i go s 1 0 4 5 e s s. d o Có d i go Ci v il) é car a ct er izad a p o r d u as
esp é ci es d e só c io s : o s ó cio -e mp r e sár io ( co ma n d itad o ) , q u e é aq u el e r esp o n sá v el p el a
co n se c ução d a e mp r e s a, e o só cio - i n ve st id o r ( c o ma nd it ár io ) , c uj o p r i n cip a l o b j et i vo é
au f er ir l ucr o s.
51
A tí t ulo d e e xe mp lo , p o d e mo s c itar a d e f i niç ão d e so cied ad e co ntr o lad a o fer e cid a
p ela L ei Co mp le me nt ar n o 1 0 1 , d e 4 d e ma io d e 2 0 0 0 , e m se u ar t i go 2 º , I I , a sab er :
Ar t. 2 o P ar a o s e fe ito s d es ta L ei Co mp le me n ta r , en te nd e - s e co mo :
( ...)
I I - e mp r e sa co n tr o l ad a : so c ied ad e c uj a ma io r i a d o cap ita l so cia l co m d ir eito a vo to
p er te n ça, d ir e ta o u i nd ir eta me n te , a e nte d a Fed e r ação ; ( ...) .
52
Ar t . 1 2 5 . Re ss al v ad a s as e xce çõ e s p r e vi st a s e m le i, a a s se mb lé ia - g er al i ns ta lar - se - á,
e m p r i me ir a co n vo ca ção , co m a p r e se nç a d e acio ni s ta s q u e r ep r e se n te m, no mí n i mo , 1 /4
( u m q u ar to ) d o cap i ta l s o cia l co m d ir e ito d e vo t o ; e m se g u nd a co n vo ca ç ão i n sta lar - se - á
co m q ualq u er n ú me r o .
53
“T eo r ic a me n te, p o r ta n t o , u m só acio n i st a, d e te nto r d e u ma ú nic a ação , p o d e co n st it u ir
a as se mb lé ia. A h ip ó t es e, al iá s, nad a te m d e ir r eal ; el a o co r r e u e f et i va me n te na Fr a n ça,
27
O controle gerencial, por sua vez, é aquele que não está
fundado na participação acionária, mas sim em prerrogativas diretoriais.
Surge em face da acentuada dispersão acionária, situação que permite a
assunção de fato do controle pelos administradores, os quais se
transformam, assim, num órgão que se auto-perpetua no poder por meio de
complexos mecanismos de representação dos acionistas em assembléia
(proxy machinery), explorando ao máximo o absenteísmo dos acionistas. 54

Para F. K. C O MP A R A TO 55, visto assim, o controle gerencial


seria forte argumento em prol da teoria institucionalista da sociedade
anônima, haja vista que se o poder de controle não mais se funda na
propriedade acionária, transcende em certa medida à vontade individual ou
coletiva dos acionistas, aproximando a sociedade anônima a uma espécie de
“fundação lucrativa”. Os deveres fiduciários impostos aos administradores,
porém, trazem de volta a noção contratualista, pois determinam que os
administradores ajam sempre no interesse da companhia, interesse este que
pode ser reduzido ao interesse comum dos sócios.

No Brasil, em contraponto à realidade norte-americana, a


freqüência do controle gerencial é substancialmente menor. As companhias
brasileiras ainda são fortemente marcadas pela presença do controle dito
majoritário (aquele exercido por quem tenha a maioria absoluta das ações
com direito a voto). Todavia, nos últimos anos, tem sido crescente, embora
ainda reduzido, o número de sociedades com controle minoritário (ex ercido
por quem tenha menos da metade das ações com direito a voto, mas ainda
assim possui participação significativa).

Por conta disso, nas companhias brasileiras, diferentemente do


que ocorre nos Estados Unidos da América, os principais atingidos pel a

e fo i r e co n hec id a co mo leg al p elo J ud i ciár io ”, cf. O p o d e r d e Co n t ro le... c it. ( nt . 2 ,


su p ra ) , p . 4 9 .
54
F. K. CO MP AR AT O, O p o d er d e Co n t ro l e... ci t. ( n t. 2 , su p ra ) , p . 5 2
55
O p o d e r d e Co n t ro l e... cit. ( nt. 2 , su p ra ) , p . 5 4 .
28
oferta pública de aquisição de controle são os controladores minoritários ,
além de a própria administração. 56

A relevância de estudar o controle minoritário, assim como o


gerencial, no que tange ao escopo desta dissertação, está na constatação de
que é em companhias que apresentam esses perfis de controle empresarial
em que há probabilidade de ocorrer o chamado takeover hostil.

Por takeover entende-se, propriamente, a tomada do controle


de uma companhia 57. Ocorre toda vez em que há alteração da titularidade do
poder de comando da companhia. Assim, quando ocorre a alienação do
controle ou sua aquisição por outros meios, o resultado é a tomada d e
controle da companhia visada.

Quando não negociada diretamente com o atual controlador


minoritário da companhia-alvo – ou sua administração, na falta daquele – a
tomada voluntária 58 de controle de companhia aberta pode-se dar por duas
outras vias: (i) mediante escalada acionária ou (ii) por meio do lançamento
de oferta pública de aquisição de ações.

A primeira via – escalada acionária – consiste na paulatina


aquisição de ações da companhia-alvo diretamente no mercado de valores
mobiliários, até que seja atingido o percentual almejado. Além de moroso e
pouco seguro, esse método está sujeito aos sabores do mercado de ações,
além dos entraves regulatórios, tais como a Instrução Normativa CVM n o
358, de 3 de janeiro de 2002, que impõe o disclosure nas operações de
compra de participação acionária relevante (5% ou mais de espécie ou
classe de ações representativas do capital de companhia aberta) no mercado

56
So b r e o s i nte r e ss es at i n gi d o s na s o p er açõ e s d e to mad a d e co ntr o le, v. Cap ít u lo 2 ,
ite m 2 .1 ., in f ra .
57
A. M. C O R D E I R O , te nd o e m v is ta a d e f i ni ção d a e xp r e s são i n gl e sa ta keo ve r ( to mad a
d e co nt r o le d e so c ied ad e) , p r o p õ e a u ti li zaç ão d a e xp r e s são “to mad a ” o u “to ma d a d e
so c ied ad e” co mo t r ad uç ão p ar a o ver n ác u lo , c f . Da to ma d a d e... ci t. ( n t. 3 4 , su p ra ) , p .
7 6 1 . No p r es e nte tr ab a l ho , ad o tar e mo s a e xp r e s são “to mad a d o co n tr o l e ” o u “to mad a d o
p o d er d e co n tr o l e”, e xp r e s são j á co ns a gr ad a en tr e nó s, p o r e xe m p lo , p o r E . L .
T E I XE I R A e J . A. T . G UE R RE I RO , Da s S o ci ed a d es A n ô n ima s n o D ir ei to B ra s ile i ro , v.
I I , S ão P a ulo , B u s h at s k y , 1 9 7 9 , p . 7 5 5 e s s.
58
Di z -s e “to mad a vo l u n t ár ia ” p ar a a f as tar o u tr a s fo r ma s d e tr a n s fer ê nc ia d e co nt r o le ,
q ue p r e sci n d e m d a vo nta d e d o ad q ui r e nt e, co mo no ca so d e s uc es s ão ca u sa mo r ti s.
29
de valores mobiliários. 59 O disclosure pode levar à frustração da tomada de
controle por meio da escalada acionária pelo seguinte motivo: uma vez
anunciada a intenção de adquirir o controle, o mercado acionário pode
reagir no sentido de elevar o valor daquelas ações, tornando a operação
proibitivamente onerosa. Ou mesmo pode dar ensejo à tomada de medidas
de proteção por parte dos controladores atuais. Daí a sua clara desvantagem
com relação ao segundo modo, que é a oferta pública, a qual já foi acima
definida.

Aliás, é à oferta pública que se refere a tender offer hostil, a


qual, vista assim, serve de instrumento ao takeover. Ou seja, a oferta é
meio para alcançar o fim, representado pela tomada de controle que,
quando ocorre contra a vontade dos detentores atuais do controle, é
considerada hostil.

Para logo se vê que, assim como ocorre com a oferta, o


takeover também pode ser considerado amigável ou hostil, conforme seja
realizado com ou sem o consentimento da administração/controlador da
companhia-alvo, respectivamente. 60

Note-se que o adjetivo hostil que qualifica a tomada de


controle, igualmente, não se refere à sociedade visada, nem aos acionistas

59
Di sp õ e o ar ti go 1 2 d a I n str u ção : Ar t. 1 2 . O s acio n is ta s co n tr o l ad o r es, d ir e to s o u
ind ir e to s, e o s a cio n is ta s q ue e le g er e m me mb r o s d o Co n sel ho d e Ad mi ni s tr aç ão o u d o
co n se l ho f i sca l, b e m co mo q ualq u er p e s so a nat ur a l o u j ur íd i ca, o u gr u p o d e p e s so a s ,
ag i nd o e m co nj u nto o u r ep r e se n ta nd o u m me s mo i n ter e s se, q ue at i n g ir p ar ti cip a ção ,
d ir et a o u i nd i r et a, q ue c o r r esp o nd a a 5 % ( ci n co p o r ce nto ) o u ma i s d e e s p écie o u cla s s e
d e açõ e s r ep r e se n ta ti va s d o cap i ta l d e co mp a n h i a ab er ta, d e ve m e n via r à co mp a n h ia as
se g u i nte s i n fo r ma çõ e s: ( ...)
I I – o b j etivo d a p ar t ic i p ação e q u a nt id ad e vi s a d a, co n te nd o , se fo r o caso , d ec lar ação
d o ad q u ir e n te d e q ue s u as co mp r a s não o b j eti v a m a lt er ar a co mp o s iç ão d o co n tr o l e o u a
es tr ut ur a ad mi n i st r at i va d a so cied ad e ;
( ...)
§ 1 o E s tá i g ua l me nt e o b r ig ad a à d i v ul g ação d as me s ma s i n fo r ma çõ e s a p es so a o u gr up o
d e p es so a s r ep r e se nt a nd o u m me s mo i nter e ss e, t it ul ar d e p ar ti cip a ção a c io n ár i a i g ua l o u
s up er io r ao p er c e nt u al r ef er id o no ca p u t d e st e ar t i go , a c ad a vez q ue a r e f er id a
p ar ti cip ação se e le v e e m 5 % ( c i nco p o r c e nto ) d a e sp éc ie o u c l as se d e açõ e s
r ep r e se nt at i va s d o c ap i t al so c ial d a co mp a n hi a.
§ 2 o As o b r i gaçõ es p r e v is ta s no ca p u t e no § 1 o s e e st e nd e m ta mb é m à aq u is ição d e
q ua i sq uer d ir e ito s so b r e as açõ e s e d e ma i s va lo r es mo b il iár io s a li me n ci o nad o s. ( ...)
60
A. M . CO R DE I RO , Da to ma d a d e... cit . ( nt . 3 4 , su p ra ) , p . 7 6 7 .
30
dela. Em verdade, quem pode se sentir atingido pela tomada de controle é,
no caso de controle gerencial, os administradores da companhia-alvo, pois
é inegável que uma nova composição acionária poderá determinar o seu
afastamento. Já no caso de companhia cujo controle seja minoritário,
também o detentor deste será atingido pelo takeover, pois perderá seu
poder sem receber qualquer contrapartida.

O objeto desta dissertação restringe-se à tomada de controle


alcançada pela segunda via mencionada acima – a da oferta – e, mais
especificamente, à analise das medidas defensivas de que as companhias
brasileiras têm lançado mão para frustrar as investidas do ofertante, quando
inconvenientes. Assim, as menções feitas no texto às expressões
“takeover”, “tomada de sociedade” ou “tomada de controle” devem ser
compreendidas nesse sentido mais estrito (decorrente de uma oferta hostil),
a menos que expressamente ressalvado.

Por fim, as medidas defensivas – ou takeover defenses –


consistem em mecanismos de que a companhia visada, seus acionistas ou
administradores podem valer-se para impedir ou dificultar eventual
takeover indesejado. Na experiência norte-americana, tais medidas são
comumente denominadas de “shark repellents” (repelentes de tubarão),
sendo a mais comum delas as “poison pills” (pílulas de veneno).

Advirta-se, porém, que embora a expressão poison pills diga


respeito a apenas uma das espécies do gênero medidas defensivas, a
doutrina brasileira, como se verá, já consagrou a expressão ora como forma
genérica de se referir às takeover defenses, ora como denominação ao tipo
de proteção estatutária que as companhias brasileiras adotam (aqui tratadas
como “poison pill à brasileira), e que guardam pouca semelhança com a
pílula clássica. Opta-se, assim, por utilizar as expressões já consagradas no
âmbito jurídico, tais como companhia-alvo, poison pill e cláusula pétrea,
apesar de se reconhecer sua imprecisão.

31
1.4. A Oferta Voluntária e suas Vantagens

As ofertas públicas de aquisição de ações surgiram como


interessante instrumento de aquisição de controle, ou mesmo de sociedade,
mais célere e com menos desfavores que os modos clássicos de aquisição,
como: reorganização societária (tais como a fusão e incorporação);
aquisição de controle (que sempre envolve negociação com os
controladores atuais da companhia visada ou com sua administração); ou
compras paulatinas de ações da companhia visada no mercado de ações
(escalada acionária). 61

A oferta tem maior relevo prático naqueles casos em que o


interessado em adquirir o controle da companhia-alvo não tenha tido
interesse ou não tenha obtido sucesso em negociações com os acionistas ou
grupo de acionistas da sociedade visada 62 (em se tratando de companhia
submetida a controle minoritário), ou com os seus administradores (nos
casos de controle gerencial).

Na prática norte-americana, a doutrina dá notícia de que aquele


que quer tomar o controle de uma companhia pública (= aquela que possui
ações negociadas no mercado de valores mobiliários) contra a vontade de
sua administração possui dois meios para tanto: iniciar uma proxy fight
(briga por procurações) ou lançar oferta pública de aquisição das ações da
companhia almejada. Este segundo modo é o chamado tender offer hostil. 63

É justamente nesse ponto em que é possível vislumbrar as


vantagens da realização de oferta pública para aquisição de controle de

61
F. K. CO MP AR AT O, A sp ec to s ju r íd ico s. .. c it. ( n t. 2 , su p ra ) , p p . 3 1 -3 2 .
62
E . L. S. V AZ e J . P . B . N AS CI M E NT O, P o d e re s d a a d min is t ra çã o n a o fe rta h o s til d e
a q u is içã o d e co n tro le n o d ire ito co mp a ra d o ( med id a s d e fen si va s e p o iso n p i ll s ), i n
Di re ito S o c ie tá r io Co n temp o râ n eo , v. I , co o r d . E . V. A. N . F R AN Ç A, S ão P a ulo ,
Q uar t ier L a ti n, 2 0 0 9 , p . 3 9 0 .
63
A. R. P I NT O, Th e I n te rn a t io n a l iza tio n o f th e Ho s ti le Ta keo v er Ma rk et: I t s
I mp l ica t io n s fo r Ch o ic e o f La w in Co rp o ra te a n d S ecu r it ie s La w, i n B ro o k lin Jo u rn a l
o f. I n t e rn a cio n a l La w 1 6 ( 1 9 9 0 ) , p . 5 7 , n t. 4 .
32
determinada companhia, uma vez que tal medida permite que a aquisição
seja feita ao arrepio da vontade de eventual controlador minoritário e,
muitas vezes, em face de uma administração recalcitrante. Tornam-se,
assim, desnecessárias eventuais negociações com o controlador para a
aquisição do controle da companhia almejada (operação que, em regra,
envolve pagamento de prêmio ao alienante 64), assim como o lançamento da
oferta prevista no artigo 254-A da lei, visto que a aquisição levada a cabo
por meio de oferta pública constitui modo de aquisição originário de
controle.

Na experiência estrangeira, é indiscutível que as ofertas


públicas de aquisição de ações podem trazer vantagens não só ao ofertante
como também aos acionistas da companhia-alvo: para o ofertante, de um
lado, a oferta pública de aquisição de ações permite atingir os titulares das
ações que se pretende adquirir, de modo eficiente, rápido e econômico, e
ainda que contra a postura da administração da companhia visada, ora
reticente, ora mesmo francamente contrária à operação; de outro lado, para
os acionistas destinatários da oferta, esta também é vantajosa, visto que
garante preço de venda sempre melhor que aquele que a ação apresenta na

64
Ap e sar d a d i sc u s são ac er ca d a na t ur ez a j ur íd i c a d o p o d er d e co nt r o le d as so c ied ad e s
p o r açõ e s, é i n e gá ve l q u e el e p o s s u i ap r eci á ve l va lo r e co nô mi co , co r r el ato ao p o d er d e
d ir i g ir a e mp r e s a. A E x p o si ção d e Mo ti vo s d a L ei d as So ci ed ad e s p o r Açõ e s é e xp r es sa
ao ad mi ti - lo ( “to d a ec o no mi a d e me r cad o at r ib ui va lo r eco nô mico ao co n tr o le d a
co mp a n hi a, i nd ep e nd e nt e me nt e d o v alo r d a s aç õ es q u e o as se g u r a m; o v alo r d a s a çõ e s
r es u lta d o s d ir e ito s, q u e co n fer e m, d e p ar t ic ip ação no s l ucr o s e no ac er vo l íq uid o d a
co mp a n hi a, e nq ua nto q ue o d e co ntr o le d eco r r e d o p o d er d e d eter mi n ar o d est i no d a
e mp r e sa, e sco l her se u s ad mi ni s tr ad o r e s e d e f i ni r s ua s p o lí tic as ”) . É j us ta me n te p o r
co n ta d e s se va lo r eco nô mi co q ue, no mer cad o , o b lo co d o co n tr o l e d a co mp a n h ia p o s s ui
va lo r ma io r d o q ue a si mp le s so ma d o va lo r d a s açõ e s q ue o co mp õ e m. P r o va d i s so é a
p r ev i são d o ar ti go 2 5 4 - A d a Le i d a s So c ied ad e s p o r Açõ e s, q u e p r e v ê a o b r i gato r ied ad e
d e o fer ta p úb l ica d e aq u is ição d a s açõ e s r e st a nt es, e m ca so d e al ie na çã o d o co ntr o l e d e
co mp a n hi a ab er t a, p o r v alo r co r r e sp o nd e n te a, p elo me n o s, 8 0 % d o p a g o p ar a a s açõ e s
d o b lo co d e co n tr o l e. O r a, s e a l ei f az t al p r e v is ão , é p o r q ue p ar t e d o p r es s up o sto d e
q ue es sa o f er t a – ai nd a q u e fei ta co m b a se e m 8 0 % d o va lo r p a go p ela s açõ e s d o
co n tr o l ad o r – p o s s ui , e m r e gr a, p r eço ma is at r ati vo d o q ue aq ue le q ue a aç ão p o s s uir ia
e m co nd içõ es no r ma i s. No p o n to , co mo le mb r a m C. S A L O M Ã O F I L H O e M. S. R I C H T E R
J Ú N I O R , o f u nd a me n to d a o b r i ga to r ied ad e d a o f er ta p úb li ca p r e vi st a no ar t i go 2 5 4 - A é
“o r e s sar ci me n to d e u m e le me n to d o at i vo d a e mp r e sa e não o p a ga me n to d e u m
co r r e sp ec ti vo e x cl u si v a me n te a q ue m o d e té m” ( I n te re s se S o c ia l e P o d er e s d o s
A d min i st ra d o re s n a A l ie n a çã o d e Co n t ro l e, i n R evi sta d e D i rei to Me rca n til 8 9 ( 1 9 9 3 ) ,
p. 67).
33
cotação da bolsa de valores, além de garantir o tratamento rigorosamente
igualitário entre os destinatários da oferta. 65

Vários estudos procuraram apontar as vantagens e


desvantagens do takeover, na experiência estrangeira. 66 A título de
exemplo, são comumente apontadas como vantagens, normalmente
caracterizadas pela maximização do valor das ações da companhia tomada,
as seguintes: o ganho de sinergia decorrente da junção de duas companhias;
dentro do pressuposto de que o fato gerador do takeover seria a
subvalorização das ações da companhia-alvo por conta de sua má gestão, o
takeover é vantajoso pela expectativa de valorização das ações quando a
companhia tomada voltar a ser bem administrada; a própria ameaça do
takeover é benéfica na medida em que reduz os custos de monitoramento da
administração, cuja atuação é mais eficiente diante do temor da ocorrência
do takeover; o recebimento de valor superior ao de mercado pelas ações
vendidas ao ofertante. Com efeito, há evidências de que o takeover,
especialmente do tipo hostil, aumenta a riqueza dos acionistas, no curto
prazo. 67

A possibilidade de takeover contribui, ainda, para diminuir a


assimetria informacional entre os administradores da companhia-alvo e
seus acionistas. Conforme noticia F. K. C O MP A R A TO , nos famosos casos
Courtaulds v. ICI, na Inglaterra, e Compagnie Saint-Gobain v. Société
Boussois-Souchon-Neuvesel, na França, houve intenso conflito entre as
sociedades envolvidas, em conseqüência do qual várias informações sobre a
real situação das sociedades vieram à tona, mostrando que seus negócios

65
F. K. C OMP AR AT O, A sp ec to s ju ríd ico s... ci t. ( n t. 2 , su p ra ) , p . 3 4 . So b r e o p r i nc íp io
d a i g uald ad e d o s ac io n is ta s, v. M. L . B . A. CI NT R A, Of er ta p ú b l ic a d e co mp ra d e
a çõ es , i n R ev i sta d e D ir eito M er ca n t il 1 3 0 ( 1 9 7 4 ) , p . 1 4 3 .
66
So b r e, v., e ntr e o utr o s, M. C . J E N SE N , Ta keo v er s: Th ei r Ca u se s a n d Co n seq u en ce s,
in Jo u rn a l o f E co n o mi c P er sp ec ti ve s 2 , n. 1 ( 1 9 8 8 ) , p p . 2 1 -4 8 , d i sp o n ív el [ o n - lin e] i n
h ttp : // s srn .co m /a b st ra c t =1 7 3 4 5 5 [ 0 3 .0 1 .2 0 1 1 ] ; R. R OM AN O, A Gu id e to Ta keo ve r s:
Th eo ry, E v id en c e, a n d R eg u la tio n , i n Th e Ya l e Jo u rn a l o n R eg u la tio n 9 ( 1 9 9 2 ) , p p .
1 1 9 -1 8 0 ; J . C. CO AT E S, E xp la in in g V a r ia t i o n s in Ta k eo ve r Def en se s: B la m e th e
La wye r s, i n Ca l ifo rn ia La w R e vie w 8 9 ( 2 0 0 1 ) , p p . 1 3 0 1 -1 4 2 1 .
67
M. VE NT O RU Z Z O, Th e Th i rt een th Di rec ti ve a n d th e Co n t ra st s B e t w een E u ro p ea n
a n d U.S . Ta keo ve r R eg u la t io n : D if fe ren t ( R eg u la to r y ) Mea n s, N o t S o D if fe ren t
(P o li ti ca l a n d E co n o m i c) E n d s? , i n B o cco n i L eg a l S tu d ie s R es ea r ch P a p er n . 0 6 -0 7
( 2 0 0 5 ) , p p . 9 -1 0 , d i sp o n ív el [ o n - l in e] i n h t tp : / / s s rn .co m/a b st ra c t=8 1 9 7 6 4 [ 0 3 .0 1 .2 0 1 1 ] .
34
eram muito mais lucrativos do que os administradores faziam parecer aos
seus acionistas.

A revelação dessas informações fez-se necessária para que os


administradores provassem aos acionistas que o valor ofertado não fazia
justiça ao real valor da companhia. O grande beneficiário com isso tudo,
conclui F. K. C O M P A R A TO , foi o acionista:

“Antes francamente desprezado e considerado


como um mal necessário, passou depois,
repentinamente, à posição de criança mimada de
pais bilionários, instados a visitar as fábricas da
sua emprêsa e a formular suas sugestões sôbre a
melhor direção dos negócios”. 68

Porém, é igualmente inegável que tal operação pode acarretar


prejuízos, seja aos próprios acionistas, seja aos administradores (que se
vêem ameaçados diante de novo controle, a ensejar a mudança da direção
da companhia), seja ainda à própria companhia, que se pode ver
prejudicada pelos mecanismos de defesa eventualmente adotados pela su a
administração em reação à oferta 69, ou mesmo pelos objetivos que
animaram a tomada do controle.

Isso ocorre porque, de acordo com relatos da experiência


estrangeira, com o takeover, as finalidades do adquirente, em regra, giram
em torno das seguintes possibilidades apontadas pela doutrina 70:

(i) realizar a junção da sociedade adquirida à adquirente, em


busca de sinergias, por meio da coordenação, colaboração ou ajuda mútua;

(ii) realizar aquisição mais fácil e menos custosa da sociedade


visada;

68
A sp e cto s ju r íd i co s ... c it . ( n t. 2 , su p ra ) , p p . 4 0 -4 1 . E e m se g u id a, co n cl u i : “J á se d is se
q ue a ‘ta k e -o ver b id ’ r eab r i u u ma no va er a d o ‘c ap i tal i s mo sel v a ge m’ , e h a ver á se m
d ú v id a q u e m id e n ti f iq u e na o p er a ção u ma esp écie d e g uer r a à s a ve s sa s, e m q u e o s
gr a nd e s co mb a te m e o s p eq u e no s ap r o ve it a m”.
69
F. K. CO MP AR AT O, A sp ec to s ju r íd ico s. .. c it. ( n t. 2 , su p ra ) , p . 3 4 .
70
A. M . CO R DE I RO , Da to ma d a d e... cit . ( nt . 3 4 , su p ra ) , p . 7 6 4 .
35
(iii) pôr fim à atuação concorrente;

(iv) perceber lucros imediatos, por meio do desmantelamento e


subseqüente venda dos principais ativos da sociedade adquirida.

Ora, nas duas últimas finalidades apontadas, os prejuízos, não


só para a companhia e seus acionistas, como também para a comunidade em
que a sociedade atua, são mais facilmente perceptíveis. Aliás, com relação
à última dessas finalidades, a literatura especializada entende que o
takeover com tal objetivo (chamado de takeover financeiro) seria
condenável, visto que põe fim à riqueza, trazendo danos sociais, tais como
perda de empregos e quebra na produção. Em que pese tais conseqüências
danosas, são admitidos na prática norte-americana, embora no direito
europeu a tendência seja condená-lo. 71

Em virtude desses inconvenientes que a oferta pública pode


apresentar, os países não tardaram em regulamentar a matéria, em muitos
casos – como na França e na Inglaterra – exigindo a prévia aprovação da
oferta pelas autoridades competentes.

Essa fase de aprovação prévia, porém, traz como ponto


negativo, além do retardamento da operação, a possibilidade de quebra de
sigilo. 72 No Brasil, demanda-se o registro prévio da oferta apenas no caso
em que envolva permuta de ações, conforme o artigo 257, §1º, da Lei das
Sociedades por Ações.

1.5. Legislação Brasileira sobre Oferta Pública

A Lei das Sociedades por Ações anterior (Decreto-lei n o 2.627,


de 26 de outubro de 1940) não tratava nem do controle, nem da figura do

71
A. M . CO R DE I RO , Da to ma d a d e... cit . ( nt . 3 4 , su p ra ) , p . 7 6 8 .
72
F. K. CO MP AR AT O, A sp ec to s ju r íd ico s. .. c it. ( n t. 2 , su p ra ) , p p . 3 4 -3 5 .
36
controlador. Conseqüentemente, também não trouxera disciplina sobre a
aquisição e alienação do controle da sociedade anônima.

Já a atual lei acionária (Lei n o 6.404, de 15 de dezembro d e


1976), por sua vez, inovou, trazendo a definição de acionista controlador
(artigo 116) e disciplinando tanto a oferta pública de aquisição de ações
obrigatória, em seus artigos 254-A 73 e 255, quanto a aquisição de controle
mediante oferta pública voluntária, em seus artigos 257 a 263.

Além do delineamento fundamental do instituto pela Lei das


Sociedades por Ações, foi atribuída competência regulamentar à Comissão
de Valores Mobiliários (CVM) no que tange às ofertas públicas.

No âmbito disciplinar da CVM, as diversas modalidades de


ofertas públicas de ações estão regulamentadas pela Instrução Normativa da
CVM n o 361, de 5 de março de 2002. São elas: oferta pública para
cancelamento de registro (artigo 4º, §3º); oferta pública por aumento de
participação do controlador (artigo 4º, §6º); oferta pública por alienação de
controle (artigo 254-A); e a oferta voluntária, que se desdobra em (i) oferta
pública para aquisição de controle de companhia aberta (artigo 257, sendo
todos os dispositivos citados da lei acionária), (ii) oferta pública voluntária
simples (visa à aquisição de ações, não do controle) e (iii) oferta
concorrente. 74

O traço comum entre todas essas modalidades e o que as


caracteriza como ofertas públicas é, justamente, a utilização de algum meio
de publicidade em sua veiculação 75, conforme se pode aferir dos §§3º e 4º
do artigo 2º da Instrução 76.

73
A o fe r ta p úb l ica o b r i g ató r i a e s ta va p r e vi s ta, o r i gi nar ia me n t e, no ar t i go 2 5 4 d a lei ,
q ue fo i r e vo gad o e m 1 9 9 7 p ela Le i n o 9 .4 5 7 . O at ua l ar ti go 2 5 4 - A fo i i nc l uíd o p el a Le i
n o 1 0 .3 0 3 , d e 2 0 0 1 .
74
T o d as es sa s mo d al id a d es e s u a s r esp ec ti va s d ef i ni çõ e s e nco n tr a m- s e p r ev i sta s no
ar ti go 2 º d a I n s tr ução N o r mat i va d a C VM n o 3 6 1 , d e 5 d e mar ço d e 2 0 0 2 .
75
A. F. A. L OP E S , A s o fe rta s p ú b l ica s vo lu n tá r ia s p a ra a a q u is içã o d o co n tro le, i n
R evi s ta d e Di re ito E mp r esa ria l 6 ( 2 0 0 6 ) , p p . 1 7 0 -1 7 1 .
76
Ar t. 2 º . ( ...)
§ 3 o P ar a o s e fe ito s d e st a I n str uç ão , co ns id er a -s e OP A a o f er t a p úb lic a ef et u ad a fo r a d e
b o ls a d e v alo r es o u d e e nt id ad e d e mer c ad o d e b alcão o r g a niz ad o , q ue vi s e à aq ui si ção
37
Note-se, todavia, que a oferta pública de aquisição de controle
prescinde de registro prévio junto à CVM, exceto no caso de envolver total
ou parcialmente permuta de ações, caso em que o artigo 257, §1º, da lei
exige o prévio registro para que a oferta seja lançada. Nos demais casos,
basta que a CVM seja notificada da oferta dentro de vinte e quatro horas
contadas de sua primeira publicação (artigo 258, p.ú.).

Demais, a lei prescreve alguns requisitos que o ofertante deve


observar, para tornar a oferta válida. Os requisitos podem ser divididos em
dois grupos: requisitos substanciais e requisitos de forma. Há ainda regras
sobre o processamento da oferta. 77 Vejamos.

Dentre os requisitos substanciais, tem-se a obrigatoriedade de


participação de instituição financeira que garanta o cumprimento das
obrigações assumidas pelo ofertante. 78 A finalidade dessa exigência é
ressaltar a seriedade e higidez da oferta, garantindo a sua viabilidade
econômica. A instituição financeira garantidora responde subsidiariamente,
no caso de o ofertante não cumprir sua obrigação. 79

A necessidade de participação de instituição financeira está


aliada à irrevogabilidade da oferta (artigo 257, §2º): juntas, essas

d e açõ e s d e co mp a n h ia ab er t a, q ua lq uer q ue s ej a a q ua nt id ad e d e a ç õ es v is ad a p e lo
o fe r ta n te.
§ 4 o P ar a o s e f ei to s d o p ar á gr a fo a n ter io r , co n sid er a - se p úb l ic a a o f er ta q ua nd o fo r
ut il iz ad o q ua lq uer m eio d e p ub lic id ad e d a o fer ta d e aq ui s i ção , i nc l us i ve
co r r e sp o nd ê nc ia, a n ú nc i o s e le tr ô nico s o u e s fo r ç o s d e aq ui s ição .
77
Di vi s ão p r o p o s ta p o r E . L . T E I XE I R A e J . A. T . GUE R RE I RO, Da s S o cied a d e s. .. c it.
( n t. 5 7 , su p ra ) , p . 7 6 1 .
78
Nes se p a r t ic ul ar , a ss i m co mo na p o s s ib i lid ad e d e mel ho r ar o v a lo r d a o f er t a
in ic ia l me n te p r o p o s to e m não me no s q ue 5 %, o u no r e g i me d a o fer ta co nco r r e nte ,
ve mo s a fo r te i n fl u ê nci a q ue a le g i sla ção fr a nc esa d a ép o ca e xer c e u so b r e o l e gi sl ad o r
b r as ile ir o , co mo d e i xa e nt r e ver o s co me n tár io s t r açad o s p o r F. K. CO MP AR AT O, No va s
fo r ma s ju ríd ica s.. . c it. ( nt . 8 , su p ra ) , p . 1 3 7 .
79
Nes se se nt id o , F . M AR T I NS, Co men tá r io s à Lei d a s S o c ied a d e s A n ô n i ma s, v. I I I , 2 ª
ed ., Rio d e J a ne ir o , F o r en s e, 1 9 8 5 , p . 3 8 4 . Co nt r a, e n te nd e nd o q u e a i n s ti t uiç ão
f i na nc eir a r esp o nd e so li d ar ia me n t e co m o o f er t a nt e, M. C AR V AL H O S A, Co m en tá rio s à
Lei d e S o c ied a d es A n ô n i ma s, v. 4 º , t. I I , 3 ª ed ., São P a u lo , Sar a i va, 2 0 0 9 , p . 2 1 8 .
38
características da oferta pública evitam a ocorrência indesejada de ofertas
temerárias ou com finalidades meramente especulativas. 80

Um segundo requisito substancial está na qualidade e


quantidade de ações objeto da oferta: deverão ser ações com direito a voto
em quantidade suficiente para assegurar o controle da companhia (artigo
257, §2º). Como já ressaltado anteriormente, a oferta pública prevista no
artigo 257 da lei tem por objeto a aquisição do controle, donde essa
exigência.

É requisito substancial, ainda, o registro prévio da oferta junto


à CVM, no caso de a oferta conter permuta de valores mobiliários (artigo
257, §1º).

Como requisitos de forma, temos, além da exigência de forma


escrita, a observância dos requisitos trazidos pelo artigo 258 da lei 81, dentre
os quais se destaca o prazo de validade da oferta, que não pode ser inferio r
a vinte dias (artigo 258, V), e as informações sobre o ofertante (artigo 258,
VI). Como se verá no capítulo que cuida da regulação do takeover, tais
requisitos são imprescindíveis para que os acionistas da companhia-alvo
possam formar sua opinião sobre o mérito da oferta, aceitando-a ou
rejeitando-a de forma bem informada.

80
E . L. T E I XE I R A e J . A. T . G UE R RE I RO , Da s S o c ied a d e s. .. c it. ( nt. 5 7 , su p ra ) , p .
762.
81
Ar t. 2 5 8 . O i n str u me n to d e o fer ta d e co mp r a, f ir mad o p e lo o fer ta nt e e p ela i n st it u iç ão
f i na nc eir a q ue ga r a nt e o p a ga me n to , ser á p ub l ic ad o na i mp r e n sa e d e ve r á i nd i car :
I - o n ú mer o mí n i mo d e açõ e s q ue o o fer ta nt e s e p r o p õ e a ad q u ir ir e , s e fo r o c a so , o
n ú me r o má x i mo ;
I I - o p r e ço e as co nd i çõ es d e p a ga me nto ;
I I I - a s ub o r d i n ação d a o fe r ta ao n ú mer o mí n i m o d e ace it a nt es e a fo r m a d e r a te io e nt r e
o s a cei ta n te s, se o n ú me r o d ele s u ltr ap a s sar o m áx i mo f i xad o ;
I V - o p r o ced i me nto q u e d e ver á ser ad o tad o p el o s a cio n is ta s a ce ita n te s p ar a ma n i fe s tar
a s u a ac ei taç ão e e fe ti va r a tr a ns f er ê n cia d a s açõ es ;
V - o p r azo d e val id ad e d a o fer t a, q ue não p o d e r á s er i n f er io r a 2 0 ( v i nt e ) d ia s;
VI - i n fo r ma çõ e s so b r e o o f er ta n te.
P ar ág r a fo ú n ico . A o f er ta ser á co mu n i c ad a à C o mis s ão d e Va lo r e s Mo b ili ár io s d e ntr o
d e 2 4 ( vi n te e q ua tr o ) h o r as d a p r i meir a p ub l ic a ção .
39
Por fim, há ainda as regras quanto ao processamento da oferta.
Uma vez publicada, os acionistas interessados em vender suas ações devem
proceder à aceitação na forma prevista no instrumento da oferta. Note-se
que assim como a oferta, a aceitação também é irrevogável, ex vi do artigo
261 82: os aceitantes devem firmar ordens irrevogáveis de venda ou permuta.

Do modo como o procedimento está delineado na lei, é lícito


concluir que o contrato de compra e venda de ações resultante da oferta
pública qualifica-se como contrato por adesão, visto que suas condições
não são negociadas entre as partes, sendo todas pré-determinadas no
instrumento da oferta. Aos acionistas cabe apenas aceitar ou rejeitar em
bloco a oferta proposta. 83

Não obstante seja irrevogável, a lei admite a alteração da


oferta, e a conseqüente perda de eficácia das aceitações até então firmadas.
Isso ocorre quando o ofertante melhora sua oferta, nos termos do artigo
261, §1º, seja para atrair mais aceitantes, seja por conta do surgimento de
oferta concorrente. No último caso, quando divulgada oferta concorrente,
as aceitações já manifestadas perdem sua eficácia, possibilitando aos
acionistas aderirem à oferta mais vantajosa.

De resto, as ofertas públicas estão submetidas às seguintes


diretrizes, dispostas na Instrução Normativa da CVM n o 361, de 5 de março
de 2002:

- Devem ser dirigidas indistintamente aos titulares das ações


de mesma espécie e classe a que se dirige a oferta (artigo 4º, I);

- Imutabilidade e irrevogabilidade da oferta depois de feita a


publicação do edital (artigo 4º, IV);

- Responsabilidade do ofertante, nos termos do artigo 7º, I;

82
Ar t. 2 6 1 . A ace ita ção d a o f er ta d e ver á ser f ei ta na s i n st it u içõ e s f i na nc eir as o u d o
me r cad o d e va lo r e s mo b ili ár io s i nd i cad a s no in s tr u me n to d e o f er t a e o s ace it a nte s
d ev er ão fir mar o r d e n s ir r e vo gá v ei s d e ve nd a o u p er mu t a, na s co nd i çõ es o f er tad a s,
r es sa l vad o o d i sp o s to no § 1 º d o ar ti go 2 6 2 . ( d e s taca mo s)
83
E ss a é a co nc l us ão d e E . L. T E I XE I R A e J . A. T . GUE R RE I R O, Da s S o c ied a d e s... c it .
( n t. 5 7 , su p ra ) , p . 7 6 3 .
40
- Submissão a fiscalização por parte da CVM, que pode
suspender ou cancelar a oferta diante de irregularidade ou ilegalidade
invencível (artigo 4º, §2º, todos da Instrução Normativa citada);

- Manutenção da liquidez das ações, de acordo com as espécies


e classes.

Além dessas diretrizes, a doutrina aponta a necessidade de que


a oferta pública voluntária deva sempre ser feita em igualdade de condições
a todos os acionistas da companhia-alvo, como de resto ficou consignado
no artigo 4º, II, da Instrução Normativa da CVM n o 361, de 5 de março de
2002. 84

Ademais, é vedada no Direito Brasileiro a existência de oferta


pública anônima, em face do disposto no artigo 258 da lei, que impõe a
exigência de que a oferta divulgue informações sobre o ofertante. 85

84
E . L. T E I XE I R A e J . A. T . G UE R RE I RO , Da s S o c ied a d e s. .. c it. ( nt. 5 7 , su p ra ) , p .
757.
85
A. F. A. L OP E S, A s o f e rta s p ú b li ca s. .. c it. ( nt. 7 5 , su p ra ) , p . 1 7 7 .
41
CAPÍTULO 2
A TOMADA DE CONTROLE: INTERESSES ENVOLVIDOS E
MODELOS DE REGULAÇÃO

2.1. A Tomada de Controle e Interesses Envolvidos

Os dois principais modelos de regulação no que tange aos


mecanismos de defesa adotados pelas companhias abertas quando diante d e
uma oferta hostil levam em conta os interesses que podem ser atingidos no
caso de a oferta obter êxito. Por essa razão, é imprescindível, ao cuidar do
assunto, iniciar pela análise dos diversos interesses envolvidos.

Visto que a oferta hostil tem por objetivo a tomada de controle


da companhia-alvo, sem prévia negociação com o eventual acionista
controlador 86 e, tampouco, com a administração da companhia visada,
podem-se vislumbrar vários centros de interesses que restam atingidos pela
oferta.

86
Ano t e - se q u e a s r e fer ê nc ia s aq ui f ei ta s ao co nt r o le d e co mp a n h ia q u e s ej a a l vo d e
ta keo v e r ho s ti l r e fer e m - se ao co ntr o le mi n o r i t ár io ( q ua nd o d e tid o p o r acio n is ta) o u
ger e nc ial ( q ua nd o e x er c id o p o r ad mi n i s tr ad o r e s) .
42
Em primeiro lugar, pode-se apontar o interesse dos acionistas
controladores que, numa lógica capitalista, não desejarão perder sua
posição dentro do quadro acionário ou, ao menos, não sem em troca
receberem uma contrapartida (o chamado prêmio pelo controle). Ora, é
inegável que o poder de controle possui valor econômico apreciável,
correlato ao poder de dirigir a empresa. É justamente por isso que, no
mercado, o bloco de ações que detém o controle da companhia possui valor
maior do que a simples soma do valor das ações que o compõem. A própria
lei reconhece essa realidade, como fica claro no artigo 254-A da Lei das
Sociedades por Ações. 87

Em segundo lugar, tem-se o interesse dos administradores da


companhia-alvo, os quais, pela própria definição legal de acionista
controlador (artigo 116 da Lei das Sociedades por Ações) 88, são, em sua
maior parte, indicados pelo controlador da companhia. Na eventual
mudança de acionista controlador, a chance de haver mudança também nos
quadros da administração é bastante acentuada. Nunca é demais recordar
que, consoante a legislação nacional, os administradores da sociedade
anônima podem ser destituídos ad nutum (cf. artigos 140 e 143 da Lei das
Sociedades por Ações). Daí o interesse dos administradores da companhia
visada em se defender diante de oferta hostil, pois com isso estão também
defendendo seu próprio cargo.

Pode-se apontar, outrossim, o interesse dos acionistas


minoritários – entendidos aqui como aqueles que não detêm o poder de
controle sobre a companhia, e não como a minoria 89 – visto que a oferta de

87
Ne s se se n tid o , c f. n t. 6 4 d o C ap í t ulo 1 , i te m 1 . 4 ., su p ra .
88
Ar t . 1 1 6 . E nt e nd e - se p o r ac io ni st a co n tr o l ad o r a p e s so a , na t ur a l o u j ur íd ic a, o u o
gr up o d e p e s so a s vi n c ul ad as p o r ac o r d o d e vo to , o u so b co ntr o le co mu m, q u e:
a) é tit u lar d e d ir ei to s d e só cio q ue l h e as s e g ur e m, d e mo d o p er ma n e nt e, a ma io ria do s
v o t o s na s d el ib era çõ e s da a ss e mb l éia - g era l e o po der de el eg er a ma io ria do s
a d mi n i st ra do r es da co mp a n hia ; e
b ) u sa e fe ti v a me n te s eu p o d er p ar a d ir i gir as at i vid ad e s so cia i s e o r ie nt ar o
f u nc io na me n to d o s ó r g ã o s d a co mp a n h ia. ( d e sta ca mo s)
89
A r es sa l va é i mp o r t a nt e, haj a v i sta q ue o ce n á r io p r ó p r io p ar a a o co r r ên cia d e o f er t a
ho st il d e to mad a d e co n tr o le p r e s s up õ e a e xi st ê nc ia d o c h a mad o “co n tr o le mi n o r i tár io ”,
e m q ue o co nt r o le d a co mp a n h ia é d e tid o p o r p a r cel a d e acio n is ta s i n f er io r à metad e d o
cap i tal so cia l vo t a nte . Co m is so , o r es u lt ad o d a so ma tó r ia d a s p ar ti cip açõ e s d o s
43
aquisição de ações pode ser boa oportunidade para deixar a companhia,
recebendo por suas ações valor acima daquele que, ordinariamente,
receberiam numa negociação em condições normais na Bolsa de Valores. 90

Poder-se-ia cogitar, ainda, do interesse dos trabalhadores da


companhia-alvo, bem como da comunidade em que ela atua, tendo em vista
que a sociedade anônima é também regida pelo princípio da função social,
ao qual, ademais, o acionista controlador deve observância, conforme
insculpido no artigo 116, parágrafo único, da Lei das Sociedades por
Ações, a saber:

Art. 116, Parágrafo único. O acionista controlador


deve usar o poder com o fim de fazer a companhia
realizar o seu objeto e cumprir sua função
social, e tem deveres e responsabilidades para com
os demais acionistas da empresa, os que nela
trabalham e para com a comunidade em que
atua, cujos direitos e interesses deve lealmente
respeitar e atender. (destacamos)

É com base nestes diversos centros de interesse – sobretudo os


três primeiros citados – que se pode dividir em dois os modelos
regulatórios dos mecanismos de defesa admitidos para impedir ou dificultar
o êxito de uma oferta pública de aquisição de controle: de um lado, o
sistema europeu, fortemente influenciado pelo sistema inglês, e, de outro, o
sistema norte-americano.

acio n is ta s n ão co n tr o l a d o r es s up la n ta a p ar tic ip ação d o s co n tr o lad o r es, co n st it u i nd o


ver d ad e ir a ma io r ia q ue , p o r é m, não d eté m o c o nt r o le . P ar a il u str ar , n u ma co mp a n h ia
cuj o co nt r o le sej a d e tid o co m ap e na s 3 0 % d o c ap it al vo t a nt e, a gr a nd e ma s sa a cio n ár ia
d isp er s a, n ão co n tr o l ad o r a, é d o mo nt a nt e d e 7 0 % – s ão a ma io r ia , ma s não s ão
maj o r itár io s. Ne s se s e nt id o , ali á s, j á ass e ver o u L. L. C A N T I D I A N O q u e “e m no s sa le i, a
no ç ão d e ac io ni s ta mi n o r itár io r ep r es e nt a u m atr ib u to q ue é ma i s q u ali ta ti vo d o q u e
q ua n ti ta ti vo , u m sta tu s, cuj o r e fe r e nc ial n ece s s ár io é o p o d er d e co ntr o le e não ap e na s
o d ir e ito d e vo to ” ( A lien a çã o e A q u i siçã o . .. c it. ( n t. 2 4 , su p ra ) , p . 6 4 ) .
90
P o r r azõ es clar a s, p ar a ser a tr a ti va , a o fer ta d e aq ui si ção d e a çõ e s d e ve o f er ec er ao s
acio n is ta s d a co mp a n hia -a l vo va lo r d e aq ui s ição s up er io r àq uel e p elo q u al a s açõ e s sã o
ne go ciad a s na B o l sa d e V alo r es. N es s e se nt id o , E . L . T E I X E I R A e J . A. T .
GUE R RE I R O, Da s S o c ied a d e s... c it. ( nt . 5 7 , su p ra ) , p . 7 5 7 ( “De fa to , tr a ta - se d e
co nd ição e s se nc ia l ao ê xi to d a o fer ta q ue o p r eço o fer ec id o d e v a ser s up er io r ao d e
b o ls a o u d e b al cão ”) .
44
O primeiro (sistema europeu) confere aos acionistas
destinatários da oferta a decisão sobre o sucesso da investida, privilegiando
a tutela dos interesses dos acionistas da companhia-alvo. Com isso, em tal
sistema, a atuação dos administradores da companhia-alvo fica restrita,
subordinada aos acionistas. Já no segundo modelo (norte-americano), a
decisão sobre os rumos da oferta é atribuída aos administradores da
companhia-alvo, que assim possuem maior liberdade de atuação. Isso,
contudo, não implica a exclusão da vontade dos acionistas do processo
decisório, visto que esses são os verdadeiros destinatários da oferta. 91

O critério a informar a divisão dos modelos de regulação nos


dois sistemas apontados refere-se, justamente, à atuação da administração
da companhia-alvo em face de uma oferta hostil. Com efeito, numa visão
panorâmica desses dois sistemas, a atuação dos administradores pode ir
desde a total neutralidade até a utilização de mecanismos sofisticados de
defesa, como é o caso das pílulas de veneno (poison pills).

A adoção ou não dessas defesas vai depender não só do sistema


adotado na legislação local, como também variará conforme o interesse qu e
se pretende defender: se dos acionistas, da companhia ou, ainda, da
administração. Aliás, ver a atuação dos administradores como o divisor de
águas entre esses dois sistemas faz sentido, visto que, historicamente, o
órgão encarregado da mediação entre interesses dos acionistas e o interesse
social é a administração. 92

Analisando os interesses atingidos no caso de alienação de


controle (em que há transferência do poder do controlador atual para o
adquirente), C. S A L O M Ã O F ILH O 93 sustenta que duas ordens de interesses
devem ser resguardadas: (i) interesses externos, relativos ao interesse
público em geral na manutenção de um livre mercado de aquisições de

91
E . F. OI O L I , O fe r ta P ú b li ca d e A q u i si çã o d o Co n tro le d e Co mp a n h ia s A b e rta s,
Di s ser t ação d e Me st r ad o ap r es e ntad a à Fac u ld ad e d e D ir e ito d a U ni v er s id ad e d e São
P au lo , 2 0 0 8 , p . 7 6 .
92
Ne ss e se nt id o , C. S AL OM ÃO FI L HO, O No vo Di re ito S o c ie tá rio , 2 ª ed ., S ão P a ulo ,
Mal h eir o s, 2 0 0 2 , p . 1 2 9 .
93
O No vo Di re ito ... c it . ( nt . 9 2 , su p ra ) , p p . 1 2 6 -1 2 8 .
45
companhias, em virtude do qual acionistas, trabalhadores e investidores
sairiam beneficiados; e os (ii) interesses internos, que se dividem em dois
grupos: interesses dos acionistas e interesses dos trabalhadores.

Seguindo-se a lógica dos interesses externos, a adoção de atos


ou medidas tendentes a dificultar ou obstar a alienação de control e
importaria aumento nos custos da operação, tornando-a desinteressante, o
que prejudicaria aquele interesse (manutenção de livre mercado de
aquisições).

No concernente aos interesses internos, temos o interesse dos


trabalhadores, que está ligado à manutenção da empresa, isto é, da estrutura
produtiva, da qual decorrem seus postos de emprego. Há, ainda, o interesse
dos acionistas minoritários, estes divididos em dois grupos: minoritário-
especulador – cujo principal interesse é o lucro a curto prazo, em vista de
que o sobrepreço oferecido pelo potencial adquirente do controle seria
suficiente – e o minoritário-investidor, cujos interesses aproximam-se aos
dos trabalhadores: manutenção da estrutura produtiva mais adequada e de
sua posição acionária, para que possa auferir os dividendos que a sociedade
pode proporcionar-lhe no longo prazo.

Aqui surge um segundo grupo de interesse a ser tutelado: o


interesse social, de que seriam titulares os minoritários-investidores e os
trabalhadores, conforme concluem C. S A LO M Ã O F ILH O e M. S. R IC H TER
J Ú N IO R 94. Esse interesse social, em sua concreção objetiva 95, seria
entendido como o interesse na manutenção da empresa e também na
maximização dos lucros.

Nesse caso, pode-se indagar: como este interesse (o social), de


que os acionistas também são titulares, seria tutelado em eventual
alienação de controle?

94
I n te re s se S o cia l... cit . ( nt . 6 4 , su p ra ) , p p . 6 8 - 6 9 .
95
A e xp r e ss ão i nt er e s se s o cia l ( o u i nt er e ss e d a co mp a n h ia) é r eco r r e n te n a lei a cio n ár ia
( ex e mp l i fi ca ti va me nt e, cit a m- s e o s ar ti go s 1 1 5 ; 1 1 7 , § 1 º , “c” e “e” ; 1 5 4 ; 1 5 5 , I I ; 1 5 6 ) ,
ma s é se mp r e ut il izad a d e fo r ma g e nér ica, não c o nt a nd o co m d e f i niç ão l eg al.
46
A pergunta faz sentido visto que a legislação, como posta,
tutela apenas os interesses egoísticos (ou particulares) daqueles grupos: no
caso de alienação de controle, os trabalhadores são tutelados pelas leis
trabalhistas, enquanto que o interesse particular dos minoritários-
investidores é tutelado pela garantia de oferta pública obrigatória, nos
termos do artigo 254-A da lei. Essas soluções legislativas, no entanto, não
são suficientes para tutelar aquele outro interesse, o interesse social (=
manutenção da empresa e maximização dos lucros).

E a preocupação é legítima, visto que para esse segundo grupo


de interesse – representado pelos trabalhadores e minoritários-investidores
enquanto titulares do interesse social – já não seria tão recomendável a
manutenção de mercado livre de aquisição de companhias. Isso porque tal
aquisição poderia comprometer a preservação de uma estrutura produtiva
eficiente.

Com efeito, numa análise casuística, é possível apontar várias


situações em que a alienação do controle ensejaria o desatendimento do
interesse social, assim entendido. Pode-se imaginar, por exemplo, o caso
em que o pretenso adquirente do controle seja pessoa cuja fama, do ponto
de vista empresarial, não convenha à companhia visada. Ou o caso em que a
aquisição do controle dar-se-ia por meio de financiamentos de terceiros, e o
adquirente, em não dispondo de meios suficientes para honrar os débitos,
utilizar-se-ia do patrimônio social para saldá-los (como no caso das
operações de leveraged buyout 96). É possível imaginar, ainda, a aquisição
feita por concorrente. 97

Porém, não se pode olvidar, por outro lado, que há situações


em que tornar a alienação de controle da companhia mais dificultosa

96
P o r meio d a o p er a ção d e leve ra g ed b u yo u t, o ad q ui r e nt e d as a çõ e s v is ad a s r ea liz a
end i vid a me n to j u n to a b an co s p ar a faz er fr e nt e à a q ui si ção e , e m r e g r a, o fer ece co mo
gar a nt ia d a d í v id a o s at i vo s d a p r ó p r ia co mp a n h ia ad q uir id a. Ne ss e s e nt id o , a d e fi n ição
fo r n ecid a p e lo B la ck’ s La w D ic tio n a ry ( 1 7 ª ed ., S t. P a u l, W e st Gr o up , 1 9 9 9 , ver b e t e
b u yo u t) : “lev era g ed b uy o ut. T he p ur c h as e o f a p ub lic l y h eld co r p o r a tio n ’ s o u t sta nd i n g
sto c k b y i ts ma n a ge me nt o r o ut sid e i n ve sto r s, fi na n ced ma i nl y wi t h f u nd s b o r r o wed
fr o m i n ve s t me n t b a n ker s o r b r o ker s a nd u s u. s ec ur ed b y t h e co r p o r at io n ’ s a s se ts ”.
97
C. S AL O M ÃO FI L HO, O No vo Di re ito . .. c it. ( n t. 9 2 , su p ra ) , p p . 1 2 7 - 1 2 8 .
47
também pode não atender ao interesse social, na medida em que pode
dificultar a obtenção de recursos essenciais à continuidade e ao bom
funcionamento da atividade social, em períodos de crise, por exemplo. 98

Nesse ponto, ante a insuficiência dos mecanismos legais para a


tutela do interesse social, surgem os mecanismos de defesa contra a tomad a
de controle indesejada, como solução para a tutela daquele interesse
desprotegido. Tais mecanismos, normalmente, são postos em prática pelos
administradores da companhia visada, haja vista que a tomada de controle
hostil é mais comum naquelas sociedades que possuem capital pulverizado,
em que o poder de controle acaba sendo exercido pelos administradores.

. A questão que fica, entretanto, é saber a quais interesses a


adoção de mecanismos de defesa visa proteger: da companhia, dos
acionistas, dos administradores?

Em regra, o interesse a ser tutelado seria sempre o social, até


por expressa previsão legal, que atribui aos administradores o dever de
sempre agir em busca do interesse da companhia (artigo 154 99), cuja
titularidade, como visto acima, pertence aos acionistas.

Há precipuamente duas teorias sobre o interesse social


(expressão utilizada para referir-se ao interesse da companhia): teoria
contratualista e teoria institucionalista. 100

Em síntese, a teoria contratualista, bem desenvolvida por P. G.


J A EG ER , identifica o interesse social com o interesse comum dos acionistas
(relacionado ao status socii). É dizer: vê-se na sociedade uma relação

98
So b r e, v. Cap ít u lo 3 , it e m 3 .3 .2 , in f ra .
99
Ar t . 1 5 4 . O ad mi n is tr ad o r d e ve e xer cer as a tr ib u içõ e s q u e a le i e o es ta t uto l he
co n f er e m p ar a lo gr ar o s fi n s e no i n ter e s se d a co mp a n hi a, sa ti s f ei ta s a s e xi gê n ci as d o
b e m p úb l ico e d a f u n ção so c ia l d a e mp r e sa.
100
Não se nd o o te ma ce ntr al d es ta d i s ser taç ão , o t e ma r e fer e nte ao i n ter es se so ci al s er á
aq u i tr atad o ap e na s n aq u ilo q ue i nt er e ss e à an ál i se a ser fe ita . P ar a mel ho r
ap r o f u nd a me n to no te m a, v. C . S AL OM ÃO F I L HO, O No vo Di re ito S o cie tá r io , 3 ª ed .,
São P a u lo , M al he ir o s, 2 0 0 6 , p p . 2 5 -5 0 ; P . G. J AE GE R, L’ in t er es s e so c ia le , M ila no ,
Gi u f fr è, 1 9 6 3 , p a s si m; P . G. J AE GE R, L’ in t ere s se so c ia l e r iv i sita t o (q u a ren t’ a n n i
d o p o ), i n G iu ri sp ru d en z a Co m me rcia le, n. X X VI I , p ar t e I , fa s c. 1 ( 2 0 0 0 ) , Mil ão , p p .
7 9 5 -8 1 2 ; W . R AT HE N AU, La r ea l tà d el la so cie tà p e r a z io n i – r if le s sio n e su g g e ri t e
d a ll’ e sp e r ien za d eg li a f fa r i, i n R iv i sta d e lla S o cie tà , n. V, f a sc. 4 -5 ( 1 9 6 0 ) , Mi lão , p p .
9 1 2 -9 4 7 .
48
contratual, em busca dos interesses dos contratantes, os sócios.
Posteriormente, P. G. J A EG ER revê seu entendimento, passando a identificar
o interesse social com o “shareholder value”, que corresponde ao interesse
dos sócios no aumento de valor das próprias ações (e não o interesse na
distribuição dos dividendos, como entendia outrora). Exemplo do perfil
contratualista é encontrado na idéia de interesse da companhia esposada
pelo artigo 115 da Lei das Sociedades por Ações.

Já a teoria institucionalista, desenvolvida por W. R A TH EN A U ,


liga o interesse social ao desenvolvimento da empresa em si, entendida
como ente dotado de interesses próprios, diversos dos interesses dos
acionistas. Deve, assim, abranger interesses outros, tais como o interesse
do Estado, dos trabalhadores e dos consumidores. Na Lei das Sociedades
por Ações brasileira, igualmente, encontram-se evidências da teoria
institucionalista, como se pode ver nos artigos 116 e 117.

Pelo exposto, inegável que a lei acionária brasileira tem perfil


misto, ora aproximando-se do perfil contratualista, ora do institucionalista.
Apesar disso, para a análise que se segue, o perfil a ser adotado é o
contratualista, haja vista que a resposta à indagação feita anteriormente
(quais interesses são tutelados pelos mecanismos de defesa) passa,
necessariamente, pela chamada teoria da agência.

Consoante adverte A. J O S U Á 101, na aplicação da teoria da


agência ao Direito Brasileiro, é necessária a adoção da teoria contratualista
a respeito da noção de interesse social. 102 Isso se faz necessário para que
seja possível identificar a relação entre acionistas controladores e não
controladores, nas companhias com controle definido, e a relação
estabelecida entre acionistas, de um lado, e administradores-controladores,
de outro, nas companhias em que há controle gerencial, bem como a
identificação do interesse social com o interesse comum dos acionistas,
101
Go ve rn a n ça co rp o ra ti v a ... ci t. ( n t. 1 2 , su p ra ) , p . 1 3 .
102
Co n fo r me A. M. C O R D E IR O , a b u sc a p o r i n ter es se so c ia l d i ver so d o in ter es s e d o s
acio n is ta s ser i a tar e fa v ã – não e x i ste m i n str u me n to s té c nico -j ur íd ico s cap aze s d e d a r
co r p o a i n ter es se so cia l d i ver so d aq ue le r es u lt an te d a vo ntad e l e gal m en te e xp r e ss ad a
p elo s só c io s ( c f. A. M . CO R DE I RO, A OP A e sta tu tá ri a co mo d e fe sa co n t ra to ma d a s
h o st i s, i n R ev i sta d a O r d em d o s A d vo g a d o s 5 8 , t. I ( 1 9 9 8 ) , p p . 1 3 3 -1 3 4 ) .
49
enquanto tais. 103 Ressalte-se que a teoria da agência preocupa-se
fundamentalmente com essa relação entre acionistas ou acionistas e
administradores, denominada relação de agência, desconsiderando debates a
respeito dos interesses de outros (terceiros interessados).

Tomado o interesse social segundo a concepção contratualista


(= interesse comum dos acionistas) 104, temos que se o interesse a ser
tutelado é de titularidade de uma parte (acionistas), mas sua defesa é posta
em prática por outra (pelos administradores), estamos diante de típica
relação de agência.

A relação de agência e suas conseqüências estão, assim,


estritamente ligadas à separação entre propriedade acionária e poder de
controle, pois é essa separação que ocasiona aquela distinção entre
titularidade de interesse e sua gestão, dando ensejo aos denominados
problemas de agência e conseqüentes custos de agência (agency costs). 105

A teoria da agência estuda, assim, os conflitos e custos


resultantes da separação entre a propriedade e o controle do capital ou,

103
Co nso a nte r e s sa lt a B . C L A R K E , ao a na li sar a Dir e ti v a E ur o p éi a so b r e Ta keo v er , o
in ter es s e d a co mp a n hi a, no R ei no U n id o , s e mp r e fo i t id o p o r r ep r es e nta r o inter e ss e d o s
acio n is ta s ( “I n t he co m mo n la w j ur isd ic tio n s t he ter m ‘ ac ti n g i n t he in ter es t s o f t h e
co mp a n y’ i n t h e co n te x t o f fid uc iar y d ut ie s ha s t yp i cal l y b e e n vi e we d as act i n g i n t h e
in ter es t s o f s h ar e ho ld er s – B . C L AR K E , Ta keo ver R eg u la tio n : Th ro u g h th e R eg u la to ry
Lo o k in g Gla s s - CL P E R es ea r ch P a p e r 1 8 /2 0 0 7 , in Co mp a ra t iv e R es e a rch in La w &
P o li ti ca l E co n o my, v. 3 , n . 5 ( 2 0 0 7 ) , p . 1 6 , d isp o n í ve l [ o n - l in e] i n
h ttp : // s srn .co m /a b st ra c t id =1 0 0 2 6 7 5 [ 0 3 .0 1 .2 0 1 1 ] ) .
104
Ap ó ia - se , aq ui, n a a ná li se d o ar ti go 1 1 5 d a le i ap r e se n tad a p o r L . G. P . B . L E ÃE S ,
se g u nd o a q ua l se e n t end e “o i nt er e ss e d a c o mp a n h ia, não co mo o so mató r io d o s
in ter es s es p r i v ad o s d o s só cio s, ne m co mo u m in ter e s se a utô no mo d e s vi n c ulad o d o s
in ter es s es d o s ac io ni s ta s d a co mp a n h ia, ma s co mo o i n ter e s se co mu m d o s só cio s ( q u a
so c ii e não e nq ua nto i n d iv íd uo s) , no r t ead o no se n tid o d a r e al iza ção d o o b j eto so c ial ”
( Co n fli to d e in te re s se s e ved a çã o d e vo to n a s a s semb lé ia s d a s so ci ed a d es a n ô n ima s, i n
R evi s ta d e D ir ei to Me rc a n til 9 2 ( 1 9 9 3 ) , p . 1 0 7 ) . É ne s se s e nt id o q ue a e xp r e s são ser á
ad o tad a na a n ál i se q ue s e s e g ue.
105
“Si nc e t he r e lat io n s hip b et we e n t he s to c k ho ld e r s a nd t he ma n a ger s o f a co r p o r at io n
f it s t he d e fi n it io n o f a p ur e a g e nc y r el at io n s hip , it s ho u ld co me as no s ur p r i se to
d is co ver t hat t he is s u es as so c iat ed wi t h t he ‘ sep ar at io n o f o wn e r s hip a n d co n tr o l ’ i n t h e
mo d e r n d i f f u se o wn er s hip co r p o r a tio n ar e i n ti ma te l y a s so ci ated wi th t he ge n er a l
p r o b le m o f a ge nc y. ” ( M. C. J E N SE N e W . H. ME CK L I N G, Th eo r y o f th e F i r m:
Ma n a g e ria l B eh a v io r, A g en cy Co s t s a n d Own e r sh ip S t ru ctu re, i n Jo u rn a l o f F in a n c ia l
E co n o m ic s 3 , n. 4 ( 1 9 7 6 ) , p . 6 , d i sp o n í ve l [ o n - lin e] i n h ttp : // s srn .co m/ a b st ra c t=9 4 0 4 3
[ 0 3 .0 1 .2 0 1 1 ] ) .
50
como prefere A. J O S U Á 106, as relações entre os detentores do poder de
controle de uma companhia e aqueles que possuem interesses econômicos
nela, mas não lhe detêm o controle.

Na linha de M. C. J EN S EN e W. H. M E C K LIN G , a relação de


agência é definida como o contrato pelo qual uma ou mais pessoas,
denominadas principais, atribuem a outra (o agente) a execução de alguns
serviços em seus interesses, incluindo a outorga de poder de decisão ao
agente. 107

O problema de agência surge do fato de que, em havendo a


separação entre propriedade e o controle do capital, cada qual destes
elementos ficará nas mãos de pessoas diversas: no caso da sociedade
anônima, a propriedade do capital pertence aos acionistas (principais),
enquanto o controle do capital fica ao cargo dos administradores da
companhia (agentes), no caso das macro-empresas, com capital pulverizado
e sem controle definido, ou a cargo do acionista controlador, no caso de
sociedade com controle definido. Se ambas as partes buscarem a
maximização de suas utilidades, surgirá daí o conflito de interesses entre
principais e agentes, visto que os últimos tenderão a não atuar sempre nos
melhores interesses dos primeiros.

Tendo em vista que o objetivo do presente trabalho é tratar dos


mecanismos de defesa em face de tomada hostil de controle, e que só há
possibilidade de falar em tomada de controle hostil se o poder de controle
na companhia é do tipo minoritário ou gerencial, na aplicação da teoria da
agência, então, teremos dois tipos de interesses em jogo: de um lado, o
interesse dos proprietários das ações despidos do poder de controle
(separação propriedade – controle), que são os denominados principals, e
de outro lado os detentores do poder de controle, que pode tanto ser um

106
A. J O S U Á, Go v ern a n ça co rp o ra tiva ... c it. ( nt. 1 2 , su p ra ) , p . 9 .
107
Th eo ry o f th e F i rm … c i t. ( nt . 1 0 5 , su p ra ) , p . 5 .
51
grupo minoritário de acionistas (controle minoritário), quanto os
108
administradores (controle gerencial), que são denominados agentes.

No Brasil, não é típico o controle gerencial (inclusive, a lei


refere-se expressamente a um acionista controlador em seu artigo 116),
motivo pelo qual a relação de agência não se estabelece, em regra, entre
administradores, de um lado, e acionistas, de outro, mas sim entre
controladores e administradores a eles vinculados como agentes e
acionistas não controladores como principais.

A teoria da agência trabalha, fundamentalmente, com duas


noções: conflito de interesses e custos de transação. O conflito surge do
embate entre os interesses particulares daqueles entre os quais se
estabelece a relação de agência, tendo em vista que, na lógica econômica,
tais indivíduos buscam sempre maximizar seus resultados. Conseqüência
direta disso são os custos de transação, que são aqueles em que uma das
partes numa relação de agência incorre na busca da maximização de seus
proveitos; ou, visto de outro modo, custos incorridos para minimizar o
problema da agência (conflito de interesses entre as partes na relação).
Nesse sentido, são mais especificamente denominados custos de agência
(agency costs). 109

Desse modo, os custos de agência são os custos de transação


suportados pelos principais, na busca de mecanismos de fiscalização da
atuação dos agentes, para resguardar seus interesses.

M. C. J EN S E N e W. H. M EC K L IN G definem o custos de agência


como a soma (i) dos custos de monitoramento pelo principal, (ii) dos gastos

108
Fr i se - s e q ue a teo r ia d a a gê nc ia v eio p ar a exp li car o p r o b le ma d o co n f li to d e
in ter es s es ad v i nd o d a d isp er s ão d o cap i ta l d as gr a nd es co mp a n hi as ab er ta s. U ma
p r o p o st a d e so l uç ão p ar a ta l p r o b le ma e st á na d eno mi n ad a go ver na n ça c o r p o r ati v a, c uj o
o b j eti vo é d i mi n u ir o s c u sto s d e a gê n cia , p o r m eio , so b r e t ud o , d a r ed uç ão d a a s si me tr i a
d e i n fo r ma çõ e s e n tr e a ge n te s e p r i nc ip ai s. As si m, p o d e - se a f ir ma r q ue a s eq üê nc ia
ló g ic a d o s aco nt ec i me n to s s er i a: cap it al d i sp e r so ; sep ar ação p r o p r i ed ad e e co n tr o l e;
co n f li to d e i nt er e s se s ( p r i nc ip al x a ge n te s ) ; p r o b l e ma d e a gê n c ia; go v er na nç a
co r p o r at i va. No p r e se nt e tr ab a l ho , d ar - se - ã o ap e na s o s p r i me ir o s p a s so s d e ss a
seq üê n ci a, d e i xa nd o d e tr a tar d a go ver na n ça co r p o r at i va, v i sto q u e o te ma fo ge ao
esco p o ma is r e str ito d es te e s t ud o .
109
A. J O S U Á, Go v ern a n ça co rp o ra tiva ... c it. ( nt. 1 2 , su p ra ) , p . 1 9 .
52
para incentivar o agente a atuar em benefício do principal; e (iii) das
perdas residuais, decorrentes do fato de que é impossível para o principal
ou para o agente, a um custo zero, assegurar que o último tomará sempre as
melhores medidas do ponto de vista do principal. 110

Os custos de agência podem ser apresentados em quatro


categorias: despesas de monitoramento (dos agentes); despesas com
cobertura de seguro (para ressarcir os principais da má gestão/gestão
desonesta dos agentes); custos de oportunidade (perdas decorrentes da
demora na tomada de decisão sobre novas oportunidades) e despesas d e
estruturação (estrutura de compensação aos agentes, para incentivá-los na
maximização da riqueza dos principais). 111

Nota-se que os custos de agência são maiores quanto mais


marcante for a separação entre propriedade e controle. Isso acontece porque
quanto maior a dispersão acionária da companhia (e, conseguintemente, a
separação entre propriedade e controle), mais acentuada é a possibilidade
de maximização dos interesses dos administradores (agentes) ante a
assimetria informacional que se estabelece entre os agentes, de um lado, e
os acionistas não controladores, de outro. 112

A assimetria de informações entre agente e principal é usual n a


relação de agência, em que o agente, de ordinário, possui informações com
relação à companhia que não são compartilhadas com o principal. Isso pode
favorecer ações oportunistas por parte dos agentes, na busca de benefícios
individuais, em detrimento da maximização dos resultados do principal.

Essa assimetria de informações, muitas vezes, pode estar na


raiz de uma tentativa de takeover: como conseqüência da falta de
informações, em tese, as ações detidas pelos acionistas não controladores
(principais) restariam subvalorizadas no mercado. Investidores mais
experientes, ao notarem isso, podem valer-se da situação para, uma vez
110
Th eo ry o f th e F i rm … c i t. ( nt . 1 0 5 , su p ra ) , p p . 5 -6 .
111
A. P . SE G AT T O -M E N DE S e K. C. R O CH A, Co n t r ib u içõ e s d a teo r ia d e a g ên cia a o
es tu d o d o s p ro ce s so s d e co o p e ra çã o te cn o ló g i ca u n iv e rs id a d e- emp re s a , i n R ev is ta d e
A d min i st ra çã o 4 0 ( 2 0 0 5 ) , p p . 1 7 3 -1 7 4 .
112
A. J O S U Á, Go v ern a n ça co rp o ra tiva ... c it. ( nt. 1 2 , su p ra ) , p . 2 0 e p p . 7 2 e s s.
53
tomado o controle da companhia e substituída sua administração, em busca
de maior eficiência, alavancar o preço das ações, que futuramente poderão
vender, tendo como recompensa a diferença do valor de venda e de compra
das ações. 113

Não é à toa, assim, que o mercado pelo controle societário,


caracterizado pela ocorrência de takeovers hostis, tem sido apontado como
um dos mecanismos para mitigar as conseqüências advindas da assimetria
de informação: para evitar uma tomada hostil de controle – e subseqüente
troca da administração – os administradores de uma companhia com ações
negociadas em bolsa devem buscar maior eficiência em sua administração e
conseqüente maximização do investimento feito pelo principal (o que pod e
ser representado, por ex emplo, pelo aumento do valor da ação no mercado
de valores mobiliários). 114

A atuação mais eficiente da administração reflete no valor das


ações da companhia no mercado, diminuindo acentuadamente a diferença
entre valor de mercado da ação e seu valor econômico, tornando menos
atraente a tomada de controle. O resultado disso é a diminuição dos custos
de agência. 115

A possibilidade de ocorrência de takeover hostil, então, é uma


forma de incentivar os administradores a atuarem de modo mais eficiente,
na busca dos interesses que devem zelar. 116 Por conseqüência, diminuem os
custos de monitoramento, típicos da relação de agência.

113
“T h e lo we r t he sto c k p r ice, r e la ti ve to wh at i t co uld b e wi t h m o r e e f fic ie n t
ma n a ge me n t, t he mo r e attr ac ti ve t he t a keo ve r b eco me s to t ho s e wh o b eli e ve t h at t he y
ca n ma na g e t he co mp a n y mo r e e f fi cie n tl y. And th e p o t e nt ial r et ur n fr o m t he s ucc es s f u l
ta keo ve r a nd r e vi ta liz at i o n o f a p o o r l y r u n co mp an y ca n b e e no r mo us ” – H. G . M AN NE ,
Me rg e r s a n d th e Ma r ket fo r Co rp o ra te Co n t ro l , i n F o u n d a t io n s o f Co rp o ra t e La w, o r g.
R. R OM AN O, No va I o r q ue, Fo u nd at io n P r e ss , 1 9 9 3 , p . 2 2 4 .
114
É o q ue no t ici a F. K . C O M P A R A T O ao co me nt ar o s c a so s Co u rta u l d s v. I CI , na
I n g lat er r a, e Co mp a g n ie S a in t- Go b a in v . S o cié té B o u s so i s- S o u ch o n - Neu ve se l, na
Fr a nç a, j á r e f er id o s no Cap ít u lo 1 , ite m 1 .4 . So b r e, v. A sp e cto s ju r íd i c o s... ci t. ( n t. 2 ,
su p ra ) , p p . 3 8 -3 9 .
115
A. J O S U Á, Go v ern a n ça co rp o ra tiva ... c it. ( nt. 1 2 , su p ra ) , p . 8 1 .
116
Nes s e se n tid o , F. H. E AST E RB RO OK e D. R. FI S C HE L, Ma n a g e m en t’ s F id u cia ry
Du ty a n d Ta keo ve r D efen se s – Th e P ro p e r R o le o f a Ta rg et’ s Ma n a g e men t in
R esp o n d in g to a T en d e r O ff er , i n F o u n d a tio n s o f Co rp o ra te La w, o r g . R. R OM AN O,
54
Visto assim, poderíamos concluir que a adoção de medidas
defensivas pode atender a uma série de interesses, a depender do caso
concreto. O importante a destacar é que a adoção ou não dos mecanismos
de defesa, se feita de modo abusivo, leva à corrupção dos objetivos de sua
utilização.

A existência de um livre mercado pelo controle acionário


(market for corporate control) pode ser benéfica para o interesse da
companhia e dos acionistas, na medida em que força a administração a ser
mais eficiente, sob pena de ser substituída. Por outro lado, a existência
ostensiva de takeovers hostis pode gerar insegurança e instabilidade na
administração da companhia, pois esta atuaria sempre com uma espada na
cabeça ante a iminência de perda do cargo, comprometendo os
investimentos em longo prazo da sociedade. 117

Para evitar essa instabilidade na administração, são utilizados


os mecanismos de defesa, que nesse caso teriam por objetivo resguardar a
estabilidade dos administradores, num primeiro plano, para indiretament e
resguardar o interesse da companhia (na expectativa de que os
administradores, mais seguros, teriam melhor atuação). No ex tremo, porém,
tais medidas podem levar ao entrincheiramento da administração, 118 tendo
como resultado o aumento dos custos de agência.

O entrincheiramento consiste na auto-perpetuação dos


administradores em seus cargos, pouco importando a qualidade de sua
atuação, visto que a utilização daqueles expedientes defensivos torna

No va I o r q ue , Fo u nd at io n P r e s s, 1 9 9 3 , p p . 2 5 8 - 2 6 2 ; E . F. F AM A, A g en cy P ro b l em s a n d
th e Th eo ry o f th e F ir m, in Th e Jo u rn a l o f P o li ti ca l E co n o my 8 8 , n. 2 ( 1 9 8 0 ) , p . 2 9 4 .
117
C. S A L O M Ã O F I L H O e M. S. R I C H T E R J Ú N I O R a p o n ta m q u e a e xi st ê nc ia d e o b stá c ulo s
ao li v r e me r cad o d e aq u is ição d e co n tr o l e d e co mp a n h ia s ( e, p o r ta nto , à to mad a ho st il
d e co ntr o le) j á fo i r e la cio nad a ao s uce s so d as eco no mi a s e m q u e t ai s o b st ác u lo s s ão
i mp la n tad o s, a e xe mp lo d o J ap ão e d a Ale ma n ha ( na d éc ad a d e 9 0 ) , p o is vi ab i liz a a
p r o gr a maç ão e d e s e n vo lv i me n to d e i n ve s ti me nto s a lo n go p r azo . A id éi a é e vi tar
ma no b r a s co nce n tr a cio n is ta s, e m p r o l d o a u me nto d a cap a cid ad e p r o d ut i va i n ter n a d a
so c ied ad e ( I n t er e ss e S o c ia l... ci t. ( n t. 6 4 , su p ra ) , p . 6 8 ) .
118
So b r e, v. L. A. B E B CH UK e A. CO HE N, Th e c o st s o f en tr en ch ed b o a r d s, i n Jo u rn a l
o f F in a n cia l E co n o m i cs 7 8 ( 2 0 0 5 ) , p p . 4 0 9 -4 3 3 ; J . VE L AS C O, Th e en d u rin g
ill eg i ti ma cy o f th e p o i s o n p ill , i n Th e Jo u rn a l o f Co rp o ra t io n La w 2 7 ( 2 0 0 2 ) , p p . 3 8 1 -
423.
55
virtualmente impossível a tomada de controle contra a vontade da
administração.

De se mencionar, ainda, um mecanismo de defesa


especialmente desenvolvido para resguardar os administradores de eventual
tomada hostil de controle: o pára-quedas dourado. Por esse expediente, os
administradores do alto escalão da companhia receberiam vultosas quantias
a título de indenização na ocorrência de tomada hostil de controle. Em
princípio, o mecanismo é previsto para assegurar a estabilidade da
administração. Porém, em alguns casos, o prêmio assegurado aos
administradores é tão atraente que, do ponto de vista deles, a tomada de
controle hostil passa a ser vantajosa. Em face disso, os administradores, ao
invés de atuarem na busca do interesse da companhia, passam a atuar na
defesa de seus próprios interesses.

Por fim, os mecanismos de defesa podem ser utilizados para


salvaguardar o interesse de eventual acionista ou grupo de acionistas (que
detenha o controle da companhia com menos da metade do capital social
votante) em manter sua posição de controlador. A utilização adequada da
medida defensiva, nesse caso, pode ser benéfica à sociedade na medida em
que auxilia na dispersão acionária, visto que o controlador não precisa ter
mais da metade do capital social para assegurar o controle da companhia.

Por outro lado, a previsão abusiva do mecanismo de defesa,


como ocorre, por ex emplo, na previsão de expedientes que tornam a sua
remoção praticamente impossível (como acontece com as chamadas
“cláusulas pétreas” apostas nos estatutos de muitas companhias listadas no
Novo Mercado da BM&F-Bovespa 119), levaria ao engessamento da
companhia, impossibilitando, por vezes, a celebração de negócios benéficos
ao interesse social.

Diante do exposto, vê-se que definir, a priori, qual ou quais os


interesses protegidos pelos mecanismos de defesa não é tarefa fácil. Os
dois modelos de regulação que veremos a seguir acabam, cada qual, por se

119
So b r e, v. Cap ít u lo 3 , it en s 3 .3 .1 . e 3 .3 .2 ., in f ra .
56
inclinar para a defesa de um ou de outro interesse. Na sistemática da lei
brasileira, o que se pode afirmar, no momento, é que a adoção de algum
mecanismo de defesa deve ter em vista, em princípio, o resguardo sempre
do interesse social, seja a medida sendo adotada por acionista controlador
(no caso de controle definido), ante a expressa previsão legal do artigo 116
da lei, que lhe atribui o dever de observar o interesse da companhia, seja a
adoção realizada pela administração (no caso de controle gerencial), tendo
em vista a previsão contida no artigo 154 da Lei das Sociedades por Ações.

Vejamos, então, os dois modelos de regulação no que tange aos


mecanismos de defesa diante de oferta pública de aquisição de controle.

2.2. Modelo de Regulação Norte-Americano

Nos Estados Unidos da América, o primeiro diploma a


disciplinar as ofertas públicas de aquisição de ações, em âmbito federal, foi
o Williams Act, de 1968, que adicionou as seções 13 (d) e (e) e 14 (d) e (e)
ao Securities Exchange Act, de 1934. Pode-se dividir a disciplina do
Williams Act, no que tange ao tema, em três grandes grupos: (i) previsão de
disclosure obrigatório; (ii) regras anti-fraude; e (iii) medidas de proteção
aos acionistas destinatários da oferta. Em síntese, as principais alterações
introduzidas pelo Williams Act dizem respeito à transparência de tais
operações.

Com efeito, a principal preocupação do Williams Act foi prover


aos acionistas da companhia-alvo tempo e suficiente informação sobre o
ofertante e suas intenções, para que pudessem tomar sua decisão com
relação à oferta de modo bem informado. O meio previsto para tanto foi a
exigência de realização de disclosure: sempre que pessoa ou grupo adquira
mais de 5% das ações votantes de uma companhia, deve proceder ao

57
disclosure da operação, dentro de 10 dias, conforme determina a seção 13
(d) do Securities Exchange Act.

Essa busca por maior transparência e divulgação de


informações veio para conter a prática abusiva que ficou conhecida por
“Saturday night special” 120. Essa manobra consistia no lançamento de
tender offer por curto período de tempo e segundo a regra de que apenas
seriam compradas as ações dos primeiros que aceitassem a oferta, até o
montante ofertado (“first come, first served basis”). Tal estratégia
pressionava os acionistas a aceitarem a oferta, sem ter tido tempo de
analisá-la melhor, ante o risco de não venderem suas ações e, num segundo
passo da aquisição, serem colocados para fora da sociedade recebendo
valor inferior pelas ações. A preocupação, assim, foi fornecer mais tempo e
informações aos acionistas, para que estes pudessem analisar a oferta e
decidir sobre sua aceitação de modo mais consciente. 121

Para tanto, a legislação federal incumbiu-se de regulamentar o


processo pelo qual se deva dar a oferta pública de aquisição de ações na
prática norte-americana, trazendo as exigências e requisitos legais a serem
observados. Contudo, a doutrina aponta que a regulação federal da matéria
é pouco rigorosa, caráter que normalmente é indicado como justificativa
para a relativamente leniente regulação norte-americana sobre as práticas
defensivas. 122 A título de exemplo, o Williams Act não trata da

120
J . ARM OU R e D . A. S KE E L J R., Wh o Wr it es th e R u le s fo r Ho st il e T a keo ve r s, a n d
Wh y? – Th e P ecu lia r Div erg en ce o f U .S . a n d U. K. T a keo v e r R eg u la tio n , i n Th e
Geo rg eto wn La w Jo u rn a l 9 5 ( 2 0 0 6 /2 0 0 7 ) , p . 1 7 3 4 .
121
V. V. CO OK E , Do e s t h e E u ro p ea n Co m mu n i t y h a ve a fa ta l a tt ra c ti o n fo r h o s til e
ta keo v e rs? A co mp a r is o n o f th e E u ro p ea n Co m mi s sio n ’ s P ro p o se d Di r ect iv e o n
Ta keo ve r B id s a n d th e Un i ted S ta t es E xp er ien c e, i n Wa sh in g to n a n d Le e La w R e vi ew 4 7
(1990), p. 664.
122
C. KI R CH NE R e R. W . P AI NT E R, Ta keo v e r De fen se s Un d e r De la wa re La w, th e
P ro p o sed Th ir teen th E U Di re ct ive a n d th e Ne w Ge rma n Ta k eo ve r La w: Co mp a r iso n a n d
R eco m men d a tio n s fo r R efo rm, i n Th e A me ri ca n Jo u rn a l o f Co mp a ra t i ve La w L, n. 3
(2002), p. 454.
58
obrigatoriedade de realização de oferta em caso de alienação ou aquisição
de controle 123.

Com efeito, a legislação federal norte-americana confere ao


ofertante muita flexibilidade para determinar os contornos da oferta: não
prevê uma porcentagem mínima a ser adquirida, nem prevê a necessidade
de realizar oferta pública obrigatória no caso de aquisição do controle. As
únicas regras protetivas para os acionistas são: assegurar tratamento
igualitário a todos os acionistas aceitantes da oferta; dever de adquirir a
mesma proporção de cada um dos aceitantes no caso de a somatória das
ações dos acionistas aceitantes ser maior que o que o ofertante
comprometeu-se a adquirir (aquisição pro rata); e tempo mínimo de
duração da oferta – esta deve ficar aberta por, ao menos, vinte dias. 124

Ademais, ao regular o tender offer, a legislação federal


manteve-se neutra sobre a admissibilidade do takeover hostil. V. V.
C O O K E 125 aponta que essa neutralidade deveu-se à incerteza do Congresso
sobre os benefícios do takeover 126, deixando à legislação de cada estado a
competência para tratar do assunto. Assim, além do Williams Act, que é
norma federal, os estados americanos possuem legislação própria sobre o
tema.

Diante da neutralidade da legislação federal, os estados norte-


americanos editaram seus próprios diplomas legais, muitos dos quais
contendo previsões de caráter antitakeover. A título de exemplo, era
comum, nas legislações estaduais, a previsão de que o ofertante deveria
submeter sua oferta de aquisição a um órgão regulador local, antes de
torná-la pública. Tal previsão foi levada à análise do Judiciário, no caso
Edgar v. MITE Corp. 127, em que foi questionada a previsão contida no

123
Ao co ntr á r io d o q ue s uc ed e co m a l e gi sl ação e ur o p é ia so b r e o te ma . I g u al me n t e, a
le gi s laç ão b r a s ile ir a c u id a d a o fer ta o b r i ga tó r ia e m c aso d e aq ui si ç ão o ner o sa d o
co n tr o l e d e co mp a n h ia a b er ta no ar t i go 2 5 4 - A d a L ei d as So cied ad e s An ô ni ma s.
124
J . ARM OU R e D. A. SKE E L J R., Wh o Wr ite s th e R u le s … c it. ( nt. 1 2 0 , su p ra ) , p .
1734.
125
Do e s th e E u ro p ea n … c i t. ( nt . 1 2 1 , su p ra ) , p . 6 8 7 .
126
So b r e, v. Cap ít u lo 1 , it e m 1 .4 ., su p ra .
127
E d g a r v. MI TE Co rp ., 4 5 7 U. S. 6 2 4 ( 1 9 8 2 ) .
59
Illinois Business Take-Over Act. A exigência de prévia aprovação da oferta
pela agência estadual foi considerada conflitante com o Williams Act e
julgada inconstitucional.

Quando do julgamento da ação, em 1982, trinta e sete estados


norte-americanos já contavam com estatutos antitakeover com previsão
similar. 128 Esse tipo de legislação ficou conhecido como a 1ª geração de
estatutos antitakeover. 129

Os estados, então, desenvolveram outros métodos para limitar


a ocorrência de takeover hostil, mas que não esbarravam com a regulação
do Williams Act. Por exemplo, cita-se o “control share acquisition acts”,
pelo qual o adquirente das ações somente pode exercer seu direito de voto
depois que os demais acionistas, reunidos em assembléia-geral, aprovem a
transação; ou o “business combination control act”, que limita ou proíbe a
venda de ativos da companhia-alvo ou mudanças dramáticas nas suas
operações por período que varia entre três a cinco anos. Tais expedientes,
todavia, não são postos em prática no caso de alienação amigável do
controle. Desse modo, com tais mecanismos, fomentou-se o takeover
amigável, diminuindo a ocorrência de takeover hostil.

Porém, a principal forma encontrada pelas legislações


estaduais para prevenir o takeover foi fortalecer os poderes dos
administradores, para que agissem como representantes dos interesses
coletivos dos acionistas quando diante de uma oferta, admitindo largamente
que os administradores se valessem de medidas defensivas.

Não é por outra razão que os principais atores no contexto de


uma oferta hostil, no cenário norte-americano, são os administradores: são
eles os responsáveis de fato pelo resultado da oferta, tendo em vista que a
eles compete por em prática os denominados mecanismos de defesa.

O sistema norte-americano é, assim, fortemente marcado pela


atuação incisiva dos administradores da companhia-alvo, diante de oferta

128
V. V. CO OK E , Do e s th e E u ro p ea n … c it. ( n t. 1 2 1 , su p ra ) , p . 6 8 1 -6 8 2 .
129
J . ARM OU R e D. A. SKE E L J R., Wh o Wr ite s th e R u le s … c it. ( nt. 1 2 0 , su p ra ) , p .
1765.
60
não amigável. Entretanto, ao atribuir tanto poder aos administradores, outro
ponto central surge no que concerne à sua atuação: trata-se do potencial
conflito de interesses entre os próprios administradores e o interesse da
companhia e de seus acionistas.

Essa situação de conflito, como já se teve a oportunidade de


pontuar, deriva do fato de que a oferta para a tomada da sociedade é, em
primeiro lugar, hostil aos administradores da companhia visada, que vêem a
manutenção de seus cargos ameaçada.

Com efeito, a experiência mostra que, por vezes, o interesse a


animar a atuação dos administradores tem fulcro egoístico, não condizent e
com o interesse social. Ora, se os principais atingidos por uma oferta hostil
são os administradores, a situação agrava-se ainda mais diante da
constatação de que compete a eles, administradores, decidir sobre o sucesso
da oferta, uma vez que a decisão em adotar alguma medida defensiva parte
dos próprios órgãos de administração da companhia-alvo.

Para solucionar esse conflito de interesses, são atribuídos aos


administradores os denominados deveres fiduciários. Os deveres fiduciários
consistem no dever imposto aos administradores da companhia de agir na
busca dos melhores interesses dos acionistas. Tais deveres se desdobram no
dever de diligência e no dever de lealdade. 130

O dever de diligência pode ser entendido, seguindo a linha do


artigo 153 da Lei das Sociedades por Ações brasileira, como a exigência de
que o administrador da companhia empregue, no exercício de suas funções,
o cuidado e diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na
administração dos seus próprios negócios; já o dever de lealdade determina
que os administradores ajam segundo a boa-fé.

Com isso, visa-se conter os impulsos egoísticos dos


administradores, por meio da sua responsabilização pessoal, no caso de
quebra dos deveres fiduciários. Ou seja, os administradores possuem ampla

130
R. C. MI CH E LE T T O, Th e P o iso n P i ll : A P a n a cea fo r th e Ho s ti le Co rp o ra te
Ta keo ve r, i n Th e Jo h n Ma rsh a ll La w R ev ie w 2 1 ( 1 9 8 7 -1 9 8 8 ) , p . 1 2 8 .
61
atuação diante de uma oferta hostil; porém, essa liberdade de atuação não
lhes é conferida como um cheque em branco. Os administradores são
responsáveis pelas suas decisões e respondem por seus comportamentos
judicialmente. Dessa forma, a legislação norte-americana transforma o
controle do conflito de interesses entre administradores e companhia num
controle posterior (ex post), a ser feito no Judiciário, quando há alegação
de que houve quebra dos deveres fiduciários.

Em face disso, pode-se afirmar que o modelo norte-americano


está pautado, precipuamente, em dois pilares: o regulatório, levado a cabo
pela Securities and Exchange Commission (SEC), a qual compete verificar
se a oferta está de acordo com as exigências da lei (tais como, por ex emplo,
o necessário disclosure); e o judicial, em que é analisada a atuação dos
administradores quando diante de uma oferta hostil 131. Por conta disso, no
âmbito regulatório, os principais atores no desenrolar de uma oferta
pública, nos Estados Unidos da América, acabam sendo os juízes e os
advogados.

É por conta desse modelo de controle ex post, que o takeover


gera grande litigiosidade, estando a matéria judicialmente pautada pel a
denominada business judgment rule (regra do julgamento empresarial),
produto dos principais casos tratados nas cortes norte-americanas,
sobretudo a Suprema Corte do Estado de Delaware, onde significativa part e
das maiores companhias norte-americanas encontra-se instituída 132.

A seguir, traçar-se-á breve síntese dos principais leading cases


a pautar a matéria, para posteriormente cuidar da regra do julgamento
empresarial de modo específico.

131
J . ARM OU R e D. A. SKE E L J R., Wh o Wr ite s th e R u le s … c it. ( nt. 1 2 0 , su p ra ) , p .
1743.
132
“De la war e i s t he s tat e i n wh ic h ap p r o xi ma t el y ha l f o f A mer ica 's lar g es t co r p o r a tio n s
we r e i nco r p o r at ed ”. ( c f. J . ARM OU R e D. A. S KE E L J R., Wh o Wr i te s th e R u le s… ci t.
( n t. 1 2 0 , su p ra ) , p . 1 7 5 5 ) .
62
O primeiro caso a ser tratado é o Unocal Corp v. Mesa
Petroleum Co., decidido em 1985. 133 A companhia Mesa já possuía 13% das
ações votantes de Unocal, e lançou oferta para a aquisição de mais 27% das
ações da Unocal (por 54 dólares a ação) visando adquirir o controle da
companhia. Se obtivesse sucesso na oferta, pretendia adquirir as ações
restantes mediante a troca das ações de Unocal por outros títulos, que
alegava de valor equivalente, mas que, em verdade, possuíam valor
inferior.

Em face dos potenciais prejuízos que a investida da Mesa


poderia causar, os administradores da Unocal, após longas discussões,
lançaram uma oferta para comprar ações da própria Unocal, no montante de
49%, com o valor de 72 dólares por ação, valor este acima do que valiam.
Porém, essa recompra foi condicionada ao sucesso da oferta da Mesa, ou
seja, somente haveria a recompra das próprias ações pela Unocal se Mes a
conseguisse realizar a aquisição visada.

A idéia foi criar uma situação dúbia para os acionistas da


Unocal: se muitos acionistas não aceitassem a proposta de Mesa, para que
depois pudessem vender suas ações para Unocal a um valor superior, a
sociedade Mesa não obteria sucesso na oferta, e, portanto, nenhuma das
duas compras se realizaria.

Posteriormente, a Unocal retirou essa condição da oferta de


recompra de ações. Porém, não estendeu a possibilidade de venda das ações
pelo valor de 72 dólares para as ações já detidas pela Mesa. Foi esse o
ponto levado aos Tribunais – a diferença de tratamento entre acionistas.

O Judiciário entendeu ser possível o tratamento diferenciado.


A administração da companhia não é obrigada a recomprar ações em
condições iguais de todos os acionistas (isso já tinha ficado consolidado em
outro caso – Cheff v. Mathes 134).

133
Un o ca l v. M esa P et ro l eu m Co ., 4 9 3 A.2 d 9 4 6 ( Del. 1 9 8 5 ) . So b r e, R . C. C L AR K ,
Co rp o ra te La w, B o s to n/ T o r o nto , L it tl e, B r o wn a nd Co mp a n y, 1 9 8 6 , p p . 5 8 4 -5 8 6 .
134
Ch e ff v. Ma th es , 1 9 9 A.2 d 5 4 8 ( De l. 1 9 6 4 ) . E st e ca so co n si s te e m d e ma nd a mo v id a
p o r acio n is ta d a Ho l la nd F ur nac e Co mp a n y ( HF C) e m f ace d o d ir e to r e x ec ut i vo d e sta , o
63
Com isso, a Suprema Corte de Delaware consolidou o
entendimento de que as manobras defensivas executadas pelo órgão de
administração da companhia-alvo são válidas, desde que o propósito único
e primário não seja a defesa de seus cargos na administração, mas sim agir
de boa-fé no melhor interesse da companhia e de seus acionistas. Ademais,
a manobra escolhida deve ser proporcional à ameaça.

Um segundo precedente a ser considerado consiste no caso


MacAndrews & Forbes v. Revlon, Inc. 135 Nesse caso, julgado em 1986 pela
Suprema Corte de Delaware, o controle da companhia Revlon estava sendo
disputado por duas outras sociedades – MacAndrews & Forbes e Forstmann
Little. As duas ofertas, em princípio hostis e concorrentes, levaram a um
verdadeiro leilão do controle da Revlon, com as companhias aumentando
suas ofertas, como se num verdadeiro leilão. Num primeiro momento,
porém, a administração da Revlon posicionou-se contrariamente a tomada
de controle, haja vista a intenção das duas companhias ofertantes
(desmantelar a companhia-alvo e vender seus ativos).

Entretanto, Forstmann Little entra em negociação com os


administradores da Revlon e, por fim, lança oferta no valor de $57,25
dólares por ação. Em seguida, MacAndrews & Forbes aumenta sua oferta
para $58 dólares, mas a administração da Revlon fecha o negócio com

Sr . C h e f f, e m q ue o acio ni s ta vi sa va r e sp o n sab il izar o Sr . C he f f p el a r ec o mp r a d e açõ e s


ef et u ad a, d eco r r e nt e d a ut il iz ação d a t éc ni ca d e d efe sa d e no mi nad a ra i d er b u yo u t. P o r
me io d e st a téc n ica , o d ir eto r ap r o vo u a co mp r a d as a çõ e s d et id a s p o r u m ú ni co
acio n is ta, p o r q u a nt ia s up er io r ao v alo r d e me r cad o , t e nd o e m v is ta q ue a p r e se nç a
d aq u ele a cio n is ta na co mp a n h ia não at e nd i a ao in ter es s e so c ial . O d ir e t o r exe c ut i vo d a
HF C, e ntr eta n to , fo i ac u sad o d e ter u ti li zad o a med id a co m o f i m d e ma nt er - se n a
ad mi ni s tr aç ão d a co mp an h ia. Na d ec i são d o caso co n cr e to , a S up r e ma Co r t e d e
Del a wa r e co ns id er o u a ma no b r a u ti liz ad a p elo d ir eto r co mo s e nd o vá li d a e d e b o a - f é,
te nd o s id o e fet i vad a no in ter e s se d a co mp a n h i a. I s so p o r q u e f ico u co mp r o v ad o q ue a
p r es e nça d o ra id e r, q ue j á co nt a va co m a s se n to n a ad mi n i str ação d a co mp a n hia ,
r ep r e se nt a va r azo á vel a me aça à co n ti n u id ad e d a HF C, o q u e j us ti f ic ar i a a s ua r et ir ad a
d a co mp a n hi a med i a nte a r eco mp r a d e s ua s açõ e s p o r p r eço ac i ma d o va lo r d e mer cad o
( C. B AR C L AY , De fen s ive S t ra teg ie s to Ho s ti le Ta keo ve r A tt emp ts: Th e I mp a c t o f
No r l i n Co r p . v. Ro o ne y P ace, I n c., i n No r th e rn Ken tu cky La w R ev ie w 1 3 ( 1 9 8 6 -1 9 8 7 ) ,
p p . 8 2 -8 4 ) .
135
Ma cA n d re w s & F o rb e s v. R evlo n , I n c. , 5 0 6 A.2 d 1 7 3 , ( Del. 1 9 8 6 ) . S o b r e, v. K . J .
N ACHB AR , R e vlo n , I n c . v. Ma cA n d re w s & F o r b es Ho ld in g s, I n c. - Th e R eq u ir em en t o f
a Leve l P la yin g F ield in Co n te st ed Me rg e r s, a n d its E ff ec t o n Lo ck- Up s a n d O th e r
B id d in g D ete r ren ts , i n Dela wa re Jo u rn a l o f Co rp o ra te La w 1 2 ( 1 9 8 7 ) , p p . 4 7 3 -4 9 5 , e m
esp e ci al p p . 4 7 6 -4 7 7 e p . 4 9 2 .
64
Forstmann Little, apesar de esta ter ofertado valor menor. Esse foi o ponto
levado a juízo pela MacAndrews & Forbes.

A Suprema Corte de Delaware decidiu que os administradores


da Revlon agiram em desrespeito ao seu dever de diligência (duty of care):
quando escolheu a oferta de menor valor, a administração agiu em
detrimento dos acionistas. A partir do momento que se propôs a procurar
ofertas concorrentes para fazer frente à oferta de MacAndrews, em verdade,
aceitou a venda do controle da companhia e, a partir de então, a
administração passou agir como se leiloeiro fosse, em busca do maior valor
ofertado em benefício dos acionistas. A essa conclusão denominou-se
“Revlon duties”.

De se mencionar, ainda, o caso Smith v. Van Gorkom, 136


julgado em 1985. Nesse caso, os acionistas da Trans Union, companhia
aberta, ajuizaram ação contra Jerome Van Gorkom (que era Diretor
Executivo e Presidente da Trans Union), tendo em vista a aprovação de
operação de incorporação da companhia em outra, atribuindo-se o valor das
ações da Trans Union em $55 dólares, o que supostamente correspondia a
valor superior ao de mercado. Apenas com base nessa informação, sem
maiores diligências, Van Gorkom concordou com a incorporação, operação
que depois foi confirmada pelos acionistas, com base nas informações
prestadas.

Porém, a Suprema Corte de Delaware entendeu que apesar de


essa ser uma decisão que cabe aos administradores da companhia, no caso
concreto, eles agiram sem o devido cuidado, infringindo seus deveres
fiduciários. Com base nisso, afastou-se a proteção da regra do business
judgment rule, visto que a decisão foi tomada de forma negligente.

A partir desses precedentes, definiram-se os contornos da


chamada business judgment rule. Por essa regra, haveria matérias, no
âmbito empresarial, decididas pelos administradores que não poderiam ser
revistas pelos acionistas, nem mesmo no Judiciário.

136
S mi th v. V a n Go r ko m, 4 8 8 A.2 d 8 5 8 ( De l. 1 9 8 5 ) .
65
Essa proteção, todavia, depende da observância, pelos
administradores, de alguns requisitos: as decisões devem ser respeitadas
pelo Judiciário desde que tomadas no âmbito de competência dos
administradores, e com base na boa-fé e em informações corretas e
suficientes.

Assim, numa ação movida contra os administradores,


acusando-os de desrespeitar seus deveres fiduciários, a decisão judicial
deve pautar-se pela business judgment rule. Esta regra, tradicionalmente, é
aplicada como uma presunção de que os administradores, ao tomarem uma
decisão negocial, agiram de modo informado, de boa-fé, e honestament e
crendo que a decisão tomada atenderia o interesse da companhia. Tal
presunção acaba por atribuir o ônus da prova da má atuação dos
administradores à parte que alega a quebra dos deveres fiduciários. 137

Entretanto, o Judiciário norte-americano é mais cauteloso na


análise e aplicação da regra do julgamento empresarial quando o assunto é
a adoção de medidas defensivas pela administração, ante uma tentativa de
takeover hostil. Isso porque, apesar de ser obrigação dos administradores
agirem na defesa da companhia e de seus acionistas quando entenderem que
a tender offer pode ser-lhes prejudicial, a experiência mostra que na adoção
de mecanismos de defesa há sempre uma grande probabilidade de os
administradores estarem agindo em seu próprio interesse, em detrimento do
interesse da companhia e dos seus acionistas.

Essa cautela faz com que as cortes norte-americanas


determinem a inversão do ônus da prova: são os administradores que devem
provar que agiram de boa-fé e de forma razoavelmente bem informada ao
lançar mão de alguma medida defensiva. Apenas depois de feita essa prova
inicial é que os administradores passam a gozar daquela presunção
decorrente da business judgment rule.

R. C. M IC H E LE T TO critica esse posicionamento da


jurisprudência, até mesmo por conta do fundamento inicial da business

137
R. C . MI C HE LE T T O, T h e P o i so n P il l … c it. ( n t. 1 3 0 , su p ra ) , p p . 1 2 8 -1 2 9 .
66
judgment rule: o Judiciário prefere manter-se à margem do mérito das
decisões empresariais, visto que se considera mal preparado para substituir
a vontade de pessoas que são exclusivamente designadas para tomá-las (os
administradores).

Esse tipo de posicionamento da jurisprudência acaba


sobrecarregando os administradores, que se vêem cerceados em sua
liberdade de agir conforme o interesse da companhia, diante do seguinte
dilema: de um lado, os administradores possuem o dever de defender a
companhia e seus acionistas de ofertas hostis que lhes sejam prejudiciais;
de outro, os administradores podem ser judicialmente responsabilizados
pela decisão de usar medidas defensivas se não provarem, de plano, que
agiram em boa-fé e bem informados (segundo o posicionamento da
jurisprudência). No extremo, isso pode levar ao engessamento da
administração, com conseqüências desastrosas para o bom andamento
social. 138

O pressuposto da regra do julgamento empresarial, como


mencionado, está na constatação prática de que os administradores são mais
competentes para determinar os rumos negociais de determinad a
companhia, do que os juízes estatais. Afinal, aqueles foram especialmente
eleitos pelos acionistas para gerenciar a atividade empresarial. 139

Com isso, a business judgment rule cria um núcleo duro de


matérias afetas apenas aos administradores, não sendo passíveis de revisão
pelo Judiciário. Porém, a regra não serve de escudo impenetrável para toda
e qualquer decisão tomada pelos administradores – a proteção conferida
pela regra do julgamento empresarial apenas é válida e eficaz quando

138
Th e P o i so n P il l… ci t. ( nt . 1 3 0 , su p ra ) , p . 1 3 1 .
139
E s sa fo i a co ncl u s ão p r o fer id a no j ul g a me nto d a ap e laç ão no ca so P a ra mo u n t
Co m mu n i ca t io n s I n c. v. QV C N et wo rk I n c. ( 6 3 7 A.2 d 3 4 ( D el. 1 9 9 4 ) ) : “T h e b o ar d o f
d ir ec to r s i s t h e co r p o r a t e d eci s io n ma k i n g b o d y b es t eq uip p ed to ma k e t he se j ud g me n t s.
Acco r d i n gl y, a co u r t ap p l yi n g e n ha n ced j ud ici a l scr u ti n y s ho uld b e d e cid i n g wh et h er
th e d ir ec to r s mad e a re a so n a b l e d ec i sio n, no t a p er fec t d e ci s io n. I f a b o ar d sel ec ted
o ne o f s e ver a l r e aso n ab l e al ter na ti v es , a co ur t s ho u ld no t seco n d - g ue ss th at c ho ic e e v e n
tho u g h it mi g h t ha v e d ecid ed o t her wi se o r s ub seq ue n t e ve n t s ma y ha v e ca st d o ub t o n
th e b o ar d 's d eter mi na tio n. T h u s, co ur t s wi ll no t s ub st it u te t h eir b us i ne s s j ud g me n t fo r
th at o f t he d ir e cto r s, b ut wi l l d et er mi n e i f t h e d ir e cto r s ' d ec is io n was, o n b al a nce,
wi t h i n a r a n ge o f r e aso n ab le ne s s”. ( d e st aq ue s no o r i gi n al)
67
preenchido aqueles requisitos já definidos na jurisprudência, como a
necessidade de o administrador ser competente para decidir sobre a
matéria, e que a decisão seja tomada de forma bem informada, e de boa-fé.

Interessante notar que a regra da business judgment rule


introduz, no campo privado, regra comum no direito público no que se
refere ao atos discricionários realizados pelos administradores públicos. A
doutrina e jurisprudência brasileiras são unânimes no sentido de que o
mérito das decisões tomadas pelo administrador público, no âmbito de seu
poder discricionário, não podem ser revistas no Judiciário. Ao Judiciário
cabe apenas fazer o controle de legalidade do ato, analisando questões
legais tais como forma do ato, competência do agente etc. 140 Tem-se, pois,
que o mérito da decisão do administrador é de sua competência exclusiva,
assim como prega a business judgment rule no caso dos administradores de
sociedade anônima no direito norte-americano.

Por outro lado, existem matérias de interesse exclusivo dos


acionistas, sendo, portanto, a estes deferida a competência para deliberar
sobre elas. Contudo, entre as matérias de competência dos administradores
e aquelas de competência dos acionistas haveria um campo cinzento, em
que ambos os grupos teriam legítimo interesse em opinar. Dentro deste
campo cinzento enquadra-se, notadamente, a alienação de controle das
companhias abertas, que traz conseqüências diretas aos proprietários das
ações – acionistas – mas não deixa de ser uma decisão empresarial, de
interesse da administração. 141

A regra do julgamento empresarial, nesse passo, tem por


objetivo, justamente, informar o aplicador do direito sobre quais matérias,
dentro daquela zona cinzenta, foram validamente decididas pelos
administradores.

140
So b r e a d i scr icio n ar i ed ad e d o ad mi n i str ad o r p ú b lico , v . C. A. B . ME L L O, Cu rso d e
Di re ito A d m in i st ra tivo , 2 5 ª ed ., São P a ulo , Ma l h eir o s, p p . 9 4 2 -9 7 6 .
141
G. S. C. RI B AS, Da s a q u is içõ e s h o s ti s n a p r á tica n o r te- a me ri ca n a e a p er sp e ct iva
b ra si lei ra , i n R evi s ta d e Di re ito Me r ca n t il 1 4 1 ( 2 0 0 6 ) , p . 1 2 3 .
68
Em síntese, vê-se que o modelo de regulação norte-americano
pautou-se, inicialmente, pela autonomia dos acionistas, buscando garantir-
lhes maior participação no destino da oferta, por meio, sobretudo, das
regras de disclosure e tempo de duração mínimo da oferta. Essa foi a
preocupação do Williams Act. Porém, diante da neutralidade da legislação
federal, os estados norte-americanos foram mais a fundo na questão,
legislando de forma mais restritiva ao takeover, atribuindo maiores poderes
aos administradores e admitindo a utilização ampla de medidas defensivas.

Com a legislação antitakeover dos estados, nota-se o aumento


crescente do poder dos administradores da companhia-alvo no que concerne
ao êxito da oferta, subvertendo-se aquela preocupação inicial do Williams
Act. Conforme noticia V. V. C O O K E 142, aliás, algumas legislações estaduais
foram tão além do escopo inicial que admitem, inclusive, que os
administradores rejeitem a oferta tendo em conta interesses outros que não
o dos acionistas. Nota-se, assim, o aumento do poder dos administradores
em detrimento da autonomia dos acionistas.

Essa mudança de enfoque na legislação sobre takeover é


atribuída à forte influência que os administradores das companhias norte-
americanas possuem junto aos legisladores locais. Numa oferta hostil de
tomada de controle, como apontam L. A. B EB C H U K e A. F ER R E LL 143, apesar
de os administradores poderem estar nas duas pontas da operação – podem
ser tanto ofertantes, quanto ofertados – eles não optam por instituir a
companhia nos estados cuja legislação seja mais permissiva ao takeover, o

142
C f. Do e s th e E u ro p ea n … c it. ( nt. 1 2 1 , su p r a ) , p p . 6 8 5 -6 8 8 : “T he st ate s ta t ute s
p r o tec t tar g et s h ar e ho ld er s b y e mp o wer i n g tar get ma n a ge me n t to act a s t he
r ep r e se nt at i ve o f co ll ec ti ve s har e ho ld er i n ter e s ts wh e n ne go ti at i n g t he b id ter ms wi t h
an o f f er o r . Ho we v er , b eca u se ma n y s ta t es si mu lt a neo u sl y e x p and ed ta r get
ma n a ge me n t ’ s f id uc iar y d ut ie s to i n cl ud e r ep r es e nt at io n o f no n s har e ho ld er i n ter e s ts a nd
th e lo n g - ter m i n ter es t o f t h e tar g et co r p o r at io n it se l f, tar g et ma n a ge me nt ca n d i sr e g ar d
s har e ho ld er s ’ i n ter e s ts a nd r ej ect a b id wi t ho ut fe ar o f s ub s eq ue nt l it i g atio n fo r b r eac h
o f a fid uc iar y d u t y. M an y o f t he s ta te a n ti ta k eo v er sta t ut es ha ve tar ge t ma n a ge me n t
wi t h ab so l ut e co ntr o l o v er t he s u cce s s o f te nd er o f fer . T h u s t h e f u nd a m en ta l o b j ecti v es
and i mp l ic it a s s u mp tio n s r e ga r d i n g t a keo ver s and te nd er o f f er s i n t h e U ni ted Sta te s
no w d i f f er s i g ni f ic a nt l y fr o m le g is la to r s ’ o r i gi n al co ncep tio n s a nd fr o m t he c ur r e n t
o r ie nt at io n o f t he E ur o p ea n Co m mi s s io n”.
143
L . A. B E B CH UK e A. FE R RE L L , A n e w a p p r o a ch to ta keo ve r la w a n d reg u la to r y
co mp e ti tio n , i n V i rg in ia La w R evi e w 8 7 ( 2 0 0 1 ) , p . 1 3 5 .
69
que poderia ser-lhes benéficos, quando atuando como ofertantes. Ao
contrário, eles optam por estatutos legais antitakeover mais rigorosos, pois
são movidos por seus interesses pessoais.

Diante dessa constatação, os estados norte-americanos,


receosos de que ao adotarem legislação menos restritiva poderiam causar
verdadeira debandada das companhias incorporadas em seu território para
outros estados, acabaram por adotar legislação de caráter antitakeover, e
cada vez mais rigorosas. Essa situação deu origem a verdadeira competição
regulatória entre os estados (regulatory competition), os quais passaram a
legislar sempre na busca de estatuto legal que atrairia mais companhias
para seu território.

Essa influência dos administradores na legislação norte-


americana ultrapassa as barreiras estaduais, chegando até mesmo ao
Congresso norte-americano, mas sem sucesso. Conforme noticia R.
R O M A N O 144, de 1963 a 1987, mais de 200 projetos de lei para regular o
takeover foram apresentados ao Congresso norte-americano, em sua maioria
inclinandos para tornar mais difícil a tomada de controle. Tais projetos não
lograram sucesso, e o Williams Act continua sendo o principal diploma
federal a regular a matéria.

Entretanto, no âmbito norte-americano, a discussão mais atual


(apesar de não ser recente) sobre a regulação do takeover diz respeito à
utilidade de permitir e adotar técnicas de defesa contra a tomada de
controle. Esse debate nada mais é que a evolução natural do
amadurecimento daquele mercado que, na década de 70 e mais
acentuadamente na década de 80, vivenciou volume substancial de
operações societárias visando à tomada de controle, o que deu vazão ao
surgimento dos diversos mecanismos de defesa hoje existentes, fruto da
criatividade forense dos operadores do direito.

144
R. R OM AN O, Th e F u t u re o f Ho st il e Ta k eo ve r s: Leg i sla tio n a n d P u b l ic Op in io n , i n
F o u n d a tio n s o f Co rp o r a te La w , o r g. R. ROM AN O, No va I o r q ue, Fo u nd a tio n P r e s s,
1993, p. 282.
70
Forte doutrina posiciona-se no sentido de que a legislação
deveria restringir a atuação dos administradores no desenrolar da oferta
pública, devolvendo aos acionistas a função de dar a palavra final sobre o
sucesso da oferta. Para tanto, chegam a propor que a matéria sej a
disciplinada no âmbito federal em moldes similares ao que há na Europa
hoje. O outro lado, todavia, também conta com ferrenhos adeptos, que
defendem a utilização dos mecanismos de defesa como a melhor técnica
para lidar com o takeover. O debate continua em aberto, não havendo ainda
conclusões certeiras sobre qual seria o melhor modelo de regulação. 145

2.3. Modelo de Regulação Europeu e Inglês

Inicialmente, ressalta-se que o objeto deste subitem, que aqui


denominamos “modelo europeu”, refere-se, em verdade, ao modelo
regulatório proposto na Diretiva 2004/25/CE, diploma que regula as ofertas

145
Re f er i nd o - se a e s sa p o lê mi ca, q u e não é r ece n te, ma s co nt i n ua na p a ut a d o d i a na
d o u tr i na no r te - a mer ica n a, as s i m r e s u me J . A R M O U R e D. A. S K E E L J R .: “Fo r o ve r
t we n t y- f i v e ye ar s, a cad e mic s h a ve d eb a ted t he q u es tio n o f ho w b e s t to r e g u la te t he
ta keo ve r mar ke t. T he mo r e t he mer r ier , ar g u ed Fr a n k E a st er b r o o k a nd Da n Fi sc h el .
T heir p a s si v it y t h es i s p r o p o sed t h at ma n a ger s b e p r o h ib i ted fr o m d e fe nd i n g a gai n s t a
ta keo ve r , so t ha t t he co mp a n y 's s h ar e ho ld er s wo ul d b e t he o n es wh o d e cid ed wh et h er to
accep t t he b id . I f t h e d e ci sio n wer e le ft to t h e t ar g et 's ma n a ger s, t he m an a ger s ' i n ter e s t
in p r e ser v i n g t h eir o wn j o b s wo u ld to o o f te n o ve r co me t he ir f id el it y to t h e b e s t
in ter es t s o f t h e co mp a n y. I n r esp o n se , o t her co m me n ta to r s ar g ued t ha t ma n a ger s s ho uld
b e g i ve n a t le as t so me sco p e to s lo w d o wn an i ni tia l t a keo ver b id . On t hi s vi e w,
ma n a ger s s ho uld b e p er mi t ted to d e fe nd a gai n s t a t a keo ver to t h e e x te nt n ece s sar y to
ge t t he b e st p o s s ib le p r i ce fo r t h e co mp a n y's s ha r eho ld er s. ” ( c f . Wh o Wr i te s th e R u le s …
cit. ( n t. 1 2 0 , su p ra ) , p . 1 7 3 3 ) . So b r e, v. , ent r e o u tr o s, L. A. B E B CH UK , Le tt in g
S h a reh o ld e rs S e t th e R u le s, i n Ha rva rd La w R e vie w 1 1 9 ( 2 0 0 6 ) , p p . 1 7 8 4 -1 8 1 3 ; L . A.
B E B C HU K e A. FE R RE L L , A n ew a p p ro a ch … cit. ( n t. 1 4 3 , su p ra ) , p p . 1 1 1 -1 6 4 ; R. J .
GI L SO N, Un o ca l F ift e en Yea r s La te r (a n d w h a t w e ca n d o a b o u t i t ), i n D ela wa re
Jo u rn a l o f Co rp o ra te L a w 2 6 ( 2 0 0 1 ) , p p . 4 9 1 - 5 1 3 ; R. J . G I LS ON , Lip to n a n d R o we’ s
A p o lo g ia fo r Dela wa re : A S h o rt R ep l y, i n D ela wa re Jo u rn a l o f Co rp o ra te La w 2 7
( 2 0 0 2 ) , p p . 3 7 -5 2 ; M. L I P T ON e P . K. ROW E , P il ls , P o l ls a n d P ro f e ss o r s: A R ep l y to
P ro fe sso r G il so n , i n D ela wa re Jo u rn a l o f Co r p o ra t e La w 2 7 ( 2 0 0 2 ) , p p . 1 -5 5 ; F . H .
E AST E RB RO OK e D. R. FI S CHE L , Ma n a g e men t ’ s F id u c ia r y… c it. ( nt. 1 1 6 , su p ra ) , p p .
2 5 8 -2 6 2 ; F. H. E AST E RB RO OK e D. R. FI S CH E L, Th e P ro p e r R o l e o f a Ta rg et’ s
Ma n a g e men t in R esp o n d in g to a Ten d e r O ffe r, i n Ha r wa rd La w R ev ie w 9 4 , n. 6 ( 1 9 8 1 ) ,
p p . 1 1 6 1 -1 2 0 4 .
71
públicas no âmbito da União Européia, cujo regime, entretanto, não é
integralmente obrigatório para os seu membros integrantes, razão pela qual
não há completa uniformidade naquele continente quanto ao tema.

Feito esse alerta inicial, temos que não é possível tratar do


modelo europeu sem antes falar do modelo inglês. Isso porque o modelo
inglês de regulação do takeover exerceu forte influência na elaboração da
Diretiva européia sobre o tema. Ademais, a Inglaterra sobressai-se pelo
fato de o takeover ser objeto de auto-regulação em seu território.

Com efeito, a matéria está tratada no City Code on Takeovers


and Mergers (“City Code”), que consiste num código de condutas elaborado
por representantes dos próprios agentes atuantes no mercado de capitais
inglês, sobretudo bancos de investimento e acionistas institucionais 146. O
City Code, embora não tenha natureza legal, possui forte eficácia, e é
observado pelas companhias inglesas, tendo em vista a previsão de sanções
para aqueles que deixarem de observar suas regras.

Ao lado do City Code, posteriormente, foi criado, em 1968, o


City Panel on Takeovers and Mergers (“Panel”) que, com o advento d a
Diretiva 2004/25/CE, foi indicado como autoridade competente para
regulação e fiscalização das ofertas públicas de aquisição de ações, tend o
em vista a exigência da Diretiva de que os países membros da União
Européia assim procedessem. A partir de então, o Panel passou a contar
com poderes legais para fazer cumprir as regras do City Code. 147

146
No Re i no U nid o , “t he se l f -r e g u la to r y s ys t e m wa s o r c he str ate d p r i n c ip al l y b y t he
co m mu n i t y o f i n ve st me n t b a n ker s a nd i n st it u tio n al i n ve s to r s, al l o f wh o m r e g u lar l y r ub
s ho uld er s i n t he ‘ C it y’ , t he o n e - sq uar e - mi le d is tr i ct wh er e Lo n d o n 's b u s i ne ss
co m mu n i t y i s lo c ated ” ( J . ARM OU R e D. A. S KE E L J R. , Wh o Wr it e s th e R u le s … c it.
( n t. 1 2 0 , su p ra ) , p . 7 3 0 ) .
147
C f. Seç ão A d o C ity Co d e ( I n t ro d u c tio n ) : “T he P ane l o n T ak eo ver s a nd Mer ger s ( t h e
‘P a ne l ’) is a n i nd ep e nd e nt b o d y, e stab li s h ed i n 1 9 6 8 , wh o s e ma i n f u nct i o n s ar e to i s s ue
and ad mi n i ster t he C it y Co d e o n T a keo v er s a nd Mer ger s ( t he ‘ Co d e ’) a nd t o s up er vi se
and r e g u lat e ta keo v er s a nd o t her ma tte r s to wh i ch t h e Co d e ap p l ie s i n acco r d a n ce wi t h
th e r u le s se t o u t i n t h e Co d e. I t ha s b ee n d e si g na ted a s t h e s up er v i so r y a ut ho r it y to
car r y o ut cer tai n r e g ul at o r y f u n ctio n s i n r e lat io n to ta k eo ver s p ur s ua n t t o th e D ir e ct i ve
o n T a keo ver B id s ( 2 0 0 4 /2 5 /E C) ( t he ‘ Di r ec ti ve ’ ) . I t s sta t uto r y f u n ct io n s ar e s et o u t i n
and u nd er C h ap t er 1 o f P a r t 2 8 o f t he Co m p an ie s Ac t 2 0 0 6 ( as a me nd ed b y T h e
Co mp a n ie s Act 2 0 0 6 ( Ame nd me nt o f Sc hed u le 2 ) ( No 2 ) Or d er 2 0 0 9 ) ( t h e ‘ Ac t ’) ” .
72
A regulação na Inglaterra difere da americana, notadamente,
em três pontos: (i) na rapidez de resposta aos pleitos formulados por
qualquer das partes envolvidas numa oferta pública: essa rapidez deriva do
próprio modelo auto-regulatório adotado na Inglaterra 148, o que faz com que
a atuação do Panel seja contemporânea ao desenrolar da oferta, e não
posterior, como o modelo litigioso norte-americano (controle ex post); (ii)
dado o caráter mais flexível decorrente da auto-regulação, a atualização das
regras do City Code é mais rápida, garantido uma melhor adequação das
respostas do Panel às exigências do mercado regulado; (iii) menor atuação
de advogados no desenrolar da oferta, visto que os agentes do Panel são
retirados do próprio mercado, normalmente sendo experts em finanças e
negócios – logo, o Panel é mais orientado pelos negócios que pelas leis. 149

Pode-se dizer, assim, que enquanto o modelo inglês repousa na


auto-regulação, prevenindo litígios, pois resolve as questões pertinentes à
tomada de controle de modo ex ante, o sistema norte-americano volta-se
para o litígio, deixando para o Judiciário analisar os casos, posteriormente.

Por conta desse caráter mais ágil da regulação inglesa, há


autores que defendem ser o modelo inglês mais vantajoso, seja pela sua
maior rapidez em resolver conflitos, seja pela redução de custos
proporcionada pela baixa litigiosidade (um terço das ofertas hostis nos
Estados Unidos da América vai a litígio no Judiciário, enquanto que, n a
Inglaterra, é muito raro um takeover ser levado para análise do Judiciário,
nem mesmo os hostis). 150

Na análise da regulação européia, far-se-á remissão aos pontos


em comum, entre ela e o City Code, para evidenciar a forte influência que o
sistema inglês exerceu no processo de elaboração de uma norma comum, no
âmbito europeu, para disciplinar o takeover. Essa influência é explicada

148
R e gi st r e - se q u e ap e sar d e o P a n el a go r a co n tar co m p o d er e s le g ai s p ar a s ua at ua ção ,
p o r co nt a d a ad eq u ação d as no r ma s i nte r na s co m a Dir et i va E ur o p éi a s o b r e Ta keo v e r, o
mo d e lo fo i e co nt i n ua a ser i n sp ir ad o p e la a u to -r eg u laç ão .
149
J . ARM OU R e D. A. S KE E L J R., Wh o Wr i te s th e R u le s… ci t. ( n t. 1 2 0 , su p ra ) , p p .
1 7 4 4 -1 7 4 5 .
150
Ne s se se n tid o , J . AR M OU R e D. A. S KE E L J R. , Wh o Wr i te s th e R u le s … c it. ( nt. 1 2 0 ,
su p ra ) , p p . 1 7 4 5 -1 7 4 7 .
73
pelo fato de o Reino Unido, dentro do contexto europeu, possuir o mercado
de capitais mais desenvolvido, altamente pulverizado e líquido, o que
explica também sua maior experiência no assunto.

O esforço inicial de harmonizar as regras sobre takeover na


Europa deu-se em 1974, com a primeira minuta de proposta para uma
Diretiva sobre o tema, baseada no chamado Pennington-Report 151, elaborada
por Robert Pennington. O documento foi apreciado, mas não teve
seguimento, ficando o tema esquecido, sobretudo por conta da escassez de
operações de tomada de controle no plano europeu. Outros projetos se
seguiram a este, mas sem êxito, ante a dificuldade de atender os anseios
dos diversos países europeus.

As tentativas de harmonização culminaram com a apresentação,


em 2002, da 4ª proposta modificada da 13ª Diretiva, a qual, aliás, possuía
forte semelhança com o City Code inglês, sobretudo no que tange à regra de
neutralidade (então indicada no Princípio 7 do City Code, posteriormente
suprimida e reformulada no Princípio 3, resultante da adequação do City
Code com a Diretiva Européia sobre o tema) 152, imposta à administração da
companhia-alvo da oferta hostil, e na vedação a ela imposta de tomar
praticamente qualquer medidas defensivas em face da oferta, a menos que
autorizada pelos acionistas, em assembléia-geral realizada durante o
período da proposta. 153

Após quase três décadas de discussões, em 20 de maio de 2004,


o projeto foi aprovado e convertido na Diretiva 2004/25/CE (doravante,
apenas “Diretiva”), que regula as ofertas públicas de aquisição de ações no

151
C. KI R CH NE R e R. W . P AI NT E R, Ta keo v er De f en se s … c it. ( nt. 1 2 2 , su p ra ) , p . 4 5 5 .
152
O P r i ncíp io 3 d o Ci ty Co d e d iz : “T he b o ar d o f a n o f f er e e co mp a n y m u st act i n t h e
in ter es t s o f t he co mp a n y a s a wh o le a nd mu s t no t d e n y t he ho ld er s o f se c ur i tie s t he
o p p o r t u ni t y to d ec id e o n t h e mer it s o f t he b id ”. A id éi a ce n tr a l d o P r i n cíp io 3 é me l ho r
es mi u çad a na R e gr a 2 1 d o C ity Co d e, q u e tr az as r es tr içõ e s a ser e m o b ser v ad a s ao a gir
d e mo d o a f r us tr ar a o fe r ta.
153
C. KI R C HNE R e R. W . P AI NT E R, Ta keo ve r De fen se s… c it. ( nt. 1 2 2 , su p ra ) , p p .
4 5 6 -4 5 7 .
74
âmbito da União Européia. 154 Em seu artigo 3º, a Diretiva traça os
princípios gerais que devem nortear a realização de ofertas públicas,
constituindo o mínimo a ser observado pelos Estados-Membros, que podem
ir mais além 155:

Artigo 3º. Princípios gerais

1. Para efeitos de aplicação da presente directiva,


os Estados-Membros asseguram que sejam
respeitados os seguintes princípios:

a) Todos os titulares de valores mobiliários de


uma sociedade visada de uma mesma categoria
devem beneficiar de um tratamento equivalente;
além disso, nos casos em que uma pessoa adquira
o controlo de uma sociedade, os restantes titulares
de valores mobiliários terão de ser protegidos;

b) Os titulares de valores mobiliários da sociedade


visada devem dispor de tempo e informações
suficientes para poderem tomar uma decisão sobre
a oferta com pleno conhecimento de causa; sempre
que aconselha os titulares de valores mobiliários,
o órgão de administração da sociedade visada deve
apresentar o seu parecer no que diz respeito às
repercussões da concretização da oferta sobre o
emprego, as condições de emprego e os locais em
que a sociedade exerce a sua actividade;

c) O órgão de administração da sociedade visada


deve agir tendo em conta os interesses da
sociedade no seu conjunto e não pode impedir os

154
So b r e a tr a mi taç ão d as vá r ia s p r o p o s ta s d e d ir et i va so b r e o t e m a, v. A. M.
CO R DE I R O, A 1 3 ª Di re ct ri z d o D i rei to d a s S o c ied a d e s (o f e rta s p ú b l ica s d e a q u is içã o ),
in R e vi sta d a O rd e m d o s A d vo g a d o s 6 4 , t. I / I I ( 2 0 0 4 ) , p p . 9 7 -1 0 4 .
155
Ne s se se n tid o , A. M. C OR DE I R O, A 1 3 ª D i rec t ri z.. . c it. ( n t. 1 5 4 , su p ra ) , p . 1 0 6 .
75
titulares de valores mobiliários de decidirem sobre
o mérito da oferta;

d) Não devem ser criados mercados artificiais para


os valores mobiliários da sociedade visada, da
sociedade oferente ou de qualquer outra sociedade
interessada na oferta de que resulte uma subida ou
descida artificial dos preços dos valores
mobiliários e que falseiem o funcionamento
normal dos mercados;

e) Um oferente só deve anunciar uma oferta depois


de se assegurar de que está em plenas condições
de satisfazer integralmente qualquer contrapartida
em numerário, caso a oferta tenha sido feita nesses
termos, e depois de tomar todas as medidas
razoáveis para garantir a entrega de qualquer outro
tipo de contrapartida;

f) A sociedade visada não deve, em virtude de uma


oferta respeitante aos seus valores mobiliários, ser
perturbada no exercício da sua actividade para
além de um período razoável.

Tais princípios, em resumo, determinam que: deve ser


observado tratamento igualitário entre todos os acionistas de uma mesma
classe; os destinatários da oferta devem ter tempo e informações suficientes
para decidir se aceitam a oferta; a administração da companhia-alvo deve
emitir opinião sobre o mérito da oferta, guiando os acionistas; o preço das
ações da companhia-alvo não deve ser manipulado; o ofertante não deve
fazer a oferta a menos que se assegure de seu cumprimento; o
processamento da oferta não deve perturbar o andamento social da
companhia-alvo para além do razoável.

Da análise destes princípios básicos, não é difícil perceber que


a intenção do legislador europeu foi atribuir aos acionistas da companhia
visada o destino da oferta de aquisição de controle. Isso resta claro quando
76
da análise da regra disposta no artigo 9º da Diretiva, da qual se falará mais
adiante. Ademais, a Diretiva primou pela autonomia do acionista ao decidir
sobre o resultado da oferta, por meio da imposição de deveres legais tanto
para o ofertante quanto para os administradores da companhia-alvo no
sentido de prover informações relevantes no que concerne a oferta, para
que o acionista possa formar sua opinião de modo consistente.

Com isso, é razoável concluir que a Diretiva parte da premissa


de que a tomada de controle e as ofertas públicas possuem resultados
benéficos tanto para os acionistas quanto para o mercado em geral e que,
portanto, tais práticas devem ser incentivadas. 156 Em face disso, nota-se a
predisposição da Diretiva em evitar a criação de entraves ao takeover,
como são exemplos a regra da neutralidade imposta à administração e a
previsão contida no artigo 11 (breakthrough rule). Essa preocupação em
não prejudicar a ocorrência de ofertas públicas no cenário europeu ficou
estampada, ainda, nos próprios consideranda da Diretiva, item 16. 157

Os pontos mais marcantes da Diretiva, que merecem ser aqui


detalhados, pela sua relevância na análise do tema proposto nesta
dissertação, são especialmente três: imposição de oferta obrigatória quando
da compra do controle (artigo 5º); neutralidade da administração (artigo
9º); e a regra da não oponibilidade das restrições em matéria de
transmissão de valores mobiliários e direito de voto (“breakthrough rule”,
artigo 11). 158

156
V. V. CO OK E , Do e s th e E u ro p ea n … c it. ( n t. 1 2 1 , su p ra ) , p . 6 6 9 .
157
O ite m 1 6 d o s co n s id e r a n d a d iz: “P a ra evi ta r o p er açõ e s q ue p o s sa m c o mp ro me te r o
êxi to d e u ma o f er ta , d e v er ão ser l i mi tad o s o s p o d er e s d o ó r g ão d e ad mi n is tr aç ão d e u ma
so c ied ad e v i sad a e m r el ação a ce r ta s o p er açõ e s d e car ác ter e xc ep c io na l, se m i mp ed ir
ind e vid a me n te a so ci ed ad e vi sad a d e p r o s se g u i r o c ur so no r ma l d a s s u as act i vid ad e s”
( d es tac a mo s) .
158
P . F. C. S. T O L E D O ut ili za a e xp r es são “r e gr a s d e ne utr al iza ção ” p ar a r e fer ir - se à
p r ev i são co nt id a no ar t i go 1 1 d a Dir eti v a ( P o is o n p i ll: mo d i smo o u so l u çã o , i n Di re it o
S o cie tá r io – De sa f io s A tu a i s, co o r d . R. R. M. C AST R O e L . S. AR AG ÃO, São P a ulo ,
Q uar t ier L at i n, 2 0 0 9 , p . 1 7 1 ) . Ap e sa r d e co n co r d ar mo s co m a no me nc la tu r a, o p tar e mo s
p o r ut il iza r o n o men iu r is d o i n s ti t uto e m i n glê s o u e m s ua ver são p o r t u g ue sa , p ar a q ue
a r e gr a não sej a co n f u nd i d a co m aq u ela p r e vi st a no ar t i go 9 º d a Dir eti v a, q ue aq u i
d eno mi n a mo s r e gr a d a n eu tr a lid ad e ( d a ad mi n i st r ação ) .
77
O primeiro desses pontos, prescrito no artigo 5º da Diretiva,
diz respeito à oferta obrigatória 159, que veio como medida protetiva aos
acionistas minoritários das companhias européias. Com efeito, a previsão
de oferta obrigatória tem por objetivo distribuir entre todos os acionistas o
prêmio pago pelo controle da companhia. Além disso, oferece um meio
seguro de os acionistas minoritários saírem da companhia no caso de troca
de controlador.

A imposição de oferta obrigatória, assim, fortalece o mercado


de valores mobiliários, visto que protege os investidores de possíveis
manobras para explorar acionistas minoritários. Ao lado dessas vantagens,
entretanto, a oferta obrigatória torna a tomada do controle mais onerosa,
desincentivando a sua ocorrência. Por conta disso, o efeito colateral é a
negociação do controle fora do mercado, normalmente num contexto
amigável. Isso acaba por prejudicar os acionistas minoritários, que assim
ficam alijados da participação no prêmio pago pelo controle. Isso é
particularmente mais comum nos mercados com maior concentração
acionária, em que as companhias possuem controladores definidos. 160

Nesse sentido, acreditamos que melhor solução foi dada pelo


legislador brasileiro, que previu a necessidade de oferta pública obrigatória
para os casos de alienação onerosa do controle de companhia aberta: assim,
sempre que houver a alienação onerosa do controle da companhia, os
acionistas minoritários serão beneficiados.

Note-se, todavia, que a legislação brasileira não previu a oferta


obrigatória no caso de tomada de controle. Isso se deve ao fato de que o

159
O ar t i go 5 º , ite m 1 d isp õ e: 1 . Se mp r e q ue u ma p e sso a s i n g ul ar o u co le ti va , n a
seq üê n ci a d e u ma aq u i si ção e f et uad a p o r s i o u p o r p e s so a s q ue co m ela a t ua m e m
co n cer taç ão , ve n ha a d e ter va lo r e s mo b il iár io s d e u ma so c ied ad e a q ue se r e fer e o n. 1
d o ar t i go 1 º [ co mp a n hi a ab er ta] o q ue, ad ic io na d o s a u ma e v e nt ua l p ar t icip ação q ue j á
d ete n ha e à p ar t ic ip aç ã o d etid a p e la s p e s so a s q ue co m e la at u a m e m co n cer taç ão , l h e
co n f ir a m d i r et a o u i nd i r eta me n t e u ma d e ter mi nad a p e r ce n ta ge m d o s d ir ei to s d e vo to
ne s sa so c ied ad e, p er mi ti nd o - l he d i sp o r d o co nt r o lo d a me s ma, o s E st ad o s - Me mb r o s
as se g ur a m q ue e ss a p e s so a d e va la nç ar u ma o fe r ta a f i m d e p r o t e g er o s ac io ni s ta s
mi n o r i tár io s d e s sa so c ie d ad e. E s ta o f er t a d e v e s er d ir i gid a o ma i s r ap id a me nt e p o ss í ve l
a to d o s o s t it u lar es d e va lo r e s mo b il iár io s , p ar a a to ta lid ad e d a s s ua s p ar ti cip açõ e s, a
u m p r eço eq ui tat i vo d e f i nid o no n. 4 .
160
M. V E NT O RU Z Z O , Th e Th i r teen th D i rec ti ve … cit. ( nt. 6 7 , su p ra ) , p p . 3 5 -3 6 .
78
instrumento próprio para a tomada do controle, no cenário brasileiro, é a
oferta pública voluntária de aquisição de controle, prevista no artigo 257 e
seguintes da lei. Tal oferta, por si só, já garante o tratamento igualitário
entre todos os acionistas que optarem por aceitá-la, dispensando assim a
necessidade de uma oferta obrigatória.

A situação a ensejar a necessidade de oferta obrigatória é a


aquisição de porcentagem tal de ações votantes da companhia-alvo que faça
pressupor a aquisição do controle. A Diretiva não determina, previamente,
qual seria essa porcentagem, deixando tal tarefa aos Estados-Membros. 161
Se, porém, mesmo atingindo esse percentual, o controle não é adquirido, de
fato, a legislação é flexível e não impõe a realização da oferta. 162 É o caso,
por exemplo, de a oferta ser exigida a partir da aquisição de mais de 30%
das ações da companhia, mas esta possuir controlador definido com mais d e
50% das ações. Ora, ainda que um terceiro adquira mais de 30% das ações,
não conseguirá tomar o controle do atual controlador. 163

161
E ss e p er ce n t ua l v ar i a b as ta nt e d e p aí s p ar a p a í s. A t ít u lo d e e xe mp lo , o p er ce nt u al é
d e 3 0 % na I n g la ter r a e n a I tá li a, e u m ter ço , na Fr a nç a. So b r e a ad eq uaç ão d a le gi s laç ã o
in ter n a d o s E st ad o s - Me mb r o s co m a Dir et i va 2 0 0 4 /2 5 / CE , co n s ul tar o le va n ta me n t o
fe ito p o r Fr e s h f ie ld s B r uc k h a us D er i n g er ( I mp l emen tin g th e Ta keo v e r Di rec ti ve in th e
E U, 2006, d i sp o ní ve l [ o n - l in e] in
h ttp : // w w w.f r esh fi eld s.c o m/p u b lica tio n s /p d f s/2 0 0 6 /Ta keo ve r Di re ct ive.p d f [ 0 3 .0 1 .2 0 1 1 ] .
162
Ci te - se o ar t i go 1 8 7 d o Có d i go d e Va lo r e s M o b ili ár io s d e P o r t u ga l, q ue i mp õ e a
o fe r ta o b r i ga tó r i a q u a nd o ad q u ir id o u m ter ço o u me tad e d o cap ita l vo t a nte d a
co mp a n hi a, p o r é m r e s sa lv a, e m s e u p ar á gr a fo 2 º , q ue a o f er t a não ser á ne ce s sár i a ca so
ati n g id o u m t er ço d a s a çõ es , o ad q uir e nt e p r o v e não d et er o co n tr o l e, ne m f a zer p ar te
d e gr up o q ue o d e te n h a. D iz o ar ti go 1 8 7 ci t ad o : 1 - Aq u ele c uj a p ar ti cip ação e m
so c ied ad e ab e r ta ul tr ap as se, d ir e ct a me n te o u n o s t er mo s d o n.º 1 d o ar ti go 2 0 .º , u m
ter ço o u me tad e d o s d ir eito s d e vo to co r r e sp o n d en te s ao cap ita l so c ia l te m o d e ver d e
la nça r o fer ta p úb l ica d e aq u is ição so b r e a to t alid ad e d as ac çõ e s e d e o utr o s v alo r es
mo b il iár io s e mi t id o s p o r e ss a so c ied ad e q ue co n fir a m d ir e ito à s u a s ub s cr iç ão o u
aq u i siç ão .
2 - Não é e x i gí ve l o la n ça me n to d a o f er ta q ua n d o , ul tr ap as sad o o l i mi t e d e u m te r ço , a
p es so a q ue a e la e st ar ia o b r i g ad a p r o ve p er a nt e a CM VM n ão te r o d o mí nio d a
so c ied ad e vi sad a ne m e s tar co m e st a e m r el ação d e gr up o . ( .. .)
163
O e x e mp lo é d ad o p o r M. V E N T O R U Z Z O : “Acq u ir i n g 3 0 % o f v o ti n g r i g h ts, o r fo r t ha t
ma tt er a n y p ar t ic ip a tio n i n fer io r to ab so l u te maj o r it y, d o es no t e ns ur e t he ho ld er
co n tr o l o f t h e co r p o r a t io n . T hi s p o i n t i s s el f - ev id e n t wh e n so meo n e els e ho ld s t he
ab so l ute maj o r i t y o f t he vo ti n g s h ar e s. I t i s t he r ef o r e u s ua ll y p r o vid ed , al t ho u g h wi t h
d i f fer e n t ap p r o ac he s, t ha t i f a no t he r s h ar e ho l d er co ntr o l s t he co r p o r atio n, no b id i s
ma nd at ed , no t wi t hs ta nd i n g t h e cir c u ms ta n ce t h at th e ‘ ma gi c t hr e s ho ld ’ h as b e e n p as sed .
T hi s e xe mp tio n f lo ws n at ur a ll y fr o m t he u nd e r l yi n g r at io na le fo r co mp ul so r y ta keo v er s
si n ce co ntr o l ha s no t act ua ll y c h a n ged ha nd s a nd no p r e mi u m fo r co n tr o l ha s b ee n p aid ”
( Th e Th i r teen th Di rec ti v e… c it . ( nt . 6 7 , su p ra ) , p . 4 1 .
79
Um segundo ponto da Diretiva a ser considerado, e um dos
pontos mais polêmicos durante a tramitação dos projetos que culminaram
em sua formulação, diz respeito ao papel da administração da companhia-
alvo em face de oferta hostil. O princípio que norteou os trabalhos foi o da
neutralidade dos administradores com relação à oferta, de modo que a
preocupação central foi a de não retirar a decisão final sobre o sucesso da
oferta das mãos dos acionistas. 164 Com os deveres impostos pela Diretiva
aos administradores, procurou-se assegurar que a administração da
companhia-alvo agisse sempre no melhor interesse da companhia, evitando
manobras egoísticas. 165

Essa preocupação está refletida no princípio enunciado na


alínea “c” do artigo 3º da Diretiva, e mais claramente esboçada no seu
artigo 9º, o qual demanda a prévia autorização dos acionistas para que os
órgãos da administração possam tomar medidas tendentes à frustração da
oferta hostil, com exceção da procura de ofertas concorrentes. 166

Assim, vedou-se, em princípio, a utilização de medidas


defensivas pela companhia-alvo. Essa vedação está em consonância com
aquela premissa da Diretiva de que a ocorrência de ofertas públicas e
takeover é benéfica para os acionistas e o mercado em geral. Some-se a

164
E . F . OI O LI , O fe rta P ú b lica . .. c it. ( nt. 9 1 , su p r a ) , p . 8 3 .
165
V. V. CO OK E , Do e s th e E u ro p ea n … c it. ( n t. 1 2 1 , su p ra ) , p . 6 7 3 .
166
Ar t i go 9 . ° D e ver es d o ó r gão d e ad mi n is tr a ção d a so cied ad e v is ad a. ( ...)
2 . No p er ío d o r e fer id o no s e g u nd o p a r á gr a fo , o ó r gão d e ad mi n is tr a ç ão d a so ci ed ad e
vi s ad a é o b r i gad o a o b te r a au to r iz ação p r é v ia d a as se mb le ia - ger al d e a c cio ni s ta s p ar a o
ef ei to a n te s d e e mp r ee nd er q ua lq uer acç ão s u scep tí v el d e co nd u zir à fr u str a ção d a
o fe r ta, e x cep t ua nd o a p r o cu r a d e o u tr a s o fer ta s e, no me ad a me n te, a n te s d e p r o ced e r a
q ua lq uer e mi s são d e va l o r es mo b il iár io s s u s cep t ív el d e i mp ed ir d e fo r m a d u r ad o ur a q u e
o o f er e nt e a s s u ma o co n tr o lo d a so ci ed ad e v i sad a.
E st a a uto r iza ção é o b r i ga tó r i a, p elo me no s a p ar tir d o mo me n to e m q ue o ó r gão d e
ad mi ni s tr aç ão d a so c ied ad e v is ad a r eceb e as i n f o r maçõ e s r e fer id a s no p r i me ir o p er ío d o
d o n. ° 1 d o ar ti go 6 .° e enq u a nto o r es u lt ad o d a o f er t a não fo r to r na d o p úb lico o u a
o fe r ta n ão t er mi n ar . O s E s tad o s -Me mb r o s p o d e m i mp o r a a nte cip ação d o mo me n to a
p ar tir d o q ua l e st a a ut o r iza ção d e v a ser o b ti d a, p o r e xe mp lo , lo go q ue o ó r gão d e
ad mi ni s tr aç ão d a so cied ad e vi sad a to mar co n h ec i me nto d a i mi n ê nci a d a o fe r ta.
( ...)
6 . P ar a o s e f ei to s d o n. ° 2 , s e mp r e q u e a ad mi ni s tr aç ão d a so c ied ad e o b ed eça a u ma
es tr ut ur a d ua li st a, e n te n d e- s e p o r ó r g ão d e ad mi ni s tr aç ão o co ns el ho d e ad mi ni s tr aç ão e
a d ir e cção d a so c ied ad e.
80
isso a constatação de que a experiência demonstra que a utilização de
mecanismos antitakeover serve antes para a proteção (entrincheiramento)
dos administradores do que para a maximização do valor das ações detidas
pelos acionistas. 167 Mais um motivo para paralisar a atuação dos
administradores.

Realmente, no contexto de uma oferta hostil, como já se teve a


oportunidade de pontuar, surge o conflite de interesses entre os
administradores, de um lado, e os acionistas, de outro. A resposta dada pela
legislação norte-americana a esse conflito é a imposição de deveres
fiduciários aos administradores, os quais são pessoalmente responsáveis no
caso de quebra ou descumprimento de tais deveres. Com isso, visa-se
neutralizar a atuação dos administradores, impondo-lhes deveres e
responsabilidades. Na Europa, por outro lado, o conflito de interesses é
solucionado por meio da paralisação antecipada da atuação dos
administradores, por meio da regra da neutralidade.

A regra da neutralidade da administração, diante de uma oferta


pública para tomada de controle, tem inspiração no City Code, 168 e deve ser
observada independentemente de ser a oferta hostil ou amigável.

Interessante anotar, nesse passo, que o princípio da


neutralidade da administração tem diferentes conseqüências em sistemas
marcados pela concentração acionária. Em uma sociedade com propriedade
acionária concentrada, o problema de agência e o conflito de interesses
estabelecem-se não entre administradores e acionistas, mas sim entre

167
“An t i -t a keo ver a ct io ns th u s c a n b e s ee n a s d e tr i me nt al to s ha r e ho ld er s and e x a mp l e s
o f d ir e cto r s a ct i n g i n t he ir o wn b e st i n ter e s ts . T he W i n ter r ep o r t ce r t ai nl y s up p o r ted
th i s vi e w. I t no t ed : ‘ m an a ger s ar e fac ed wi t h a s i g ni f ica n t co n f lic t o f i nter e st s i f a
ta keo ve r b id is mad e. O f te n t he ir o wn p er fo r ma nc e a nd p l a n s ar e b r o u g ht i n to q u e st io n
and t he ir o wn j o b s a r e i n j eo p ar d y. T he ir i n ter e st i s i n s a vi n g t hei r j o b s a nd r ep ut at io n
in s tead o f ma x i mi s i n g the va l ue o f t h e co m p an y fo r s har e ho ld er s ’ ” ( B . C L AR KE ,
A rt ic le s 9 a n d 1 1 o f th e Ta keo v e r Di rec ti ve ( 2 0 0 4 /2 5 ) a n d th e ma rk et fo r co rp o ra t e
co n t ro l, i n Jo u rn a l o f B u sin es s La w, j u n ho d e 2 0 0 6 , p . 3 6 2 .
168
Co n fo r me ap o n ta m J . A R M O U R e D. A. S K E E L J r ., “u n le ss s har e ho ld e r s co n se n t, t he
Co d e str ic tl y p r o h ib i ts ma n a ge me n t fr o m e mp l o yi n g a n y d e fe n si v e ta c tic s t h at wo uld
ha v e t h e e f fe ct o f fr u st r ati n g a n a ct ua l o r a n ti cip a ted b id . I n co n tr a st , ma na ge me n t i n
th e U n ited S tat es h as a go o d d e al mo r e fle x ib il it y to e n ga g e i n d e fe n s i ve t act ic s ,
p r o v id ed t ha t t h e se ca n b e j us ti f ied i n acco r d an ce wi t h t hei r fid u ci a r y d u ti e s” ( Wh o
Wr i te s th e R u l e s… ci t. ( nt . 1 2 0 , su p ra ) , p . 1 7 2 9 ) .
81
acionista controlador e acionistas minoritários. Desse modo, em pouco ou
nada contribui a regra da neutralidade para a proteção dos acionistas
minoritários, visto que a decisão final sobre a oferta ficará nas mãos do
acionista controlador. A regulação que prima pela neutralidade da
administração, assim, deve ser pensada tendo em vista também essa
realidade. 169

Destaque-se, porém, que embora a administração fique


impedida de tomar qualquer medida defensiva contra a tentativa de tomada
de controle antes do aval dos acionistas, ela possui importante papel na
fase inicial da oferta: a Diretiva prevê que a administração da companhia-
alvo deva emitir parecer fundamentado sobre a repercussão da oferta, de
molde a possibilitar que os acionistas tomem sua decisão de forma mais
informada (artigo 9º, item 5 da Diretiva).

Consoante B. C LA R KE , com base no Winter Report 170, a


justificativa para essa atribuição é simples: os administradores estão em
posição mais privilegiada para aconselhar os acionistas, visto que são os
responsáveis pela atuação empresarial da companhia. 171

Tendo em vista que a regra da neutralidade da administração é


ponto polêmico, a Diretiva trouxe norma para conciliar os interesses dos
diversos Estados-Membros, pela qual a observância do disposto no artigo 9º
da Diretiva não é obrigatória, se assim optar o Estado-Membro (Artigo 12 ,
item 1). 172

169
M. V E NT O RU Z Z O , Th e Th i r teen th D i rec ti ve … cit. ( nt. 6 7 , su p ra ) , p p . 7 0 -7 1 .
170
Fo i d e no mi n ad o d e Wi n te r R ep o r t o d o c u me n to e xa r ad o e m j a ne ir o d e 2 0 0 2 p e l o
Hig h L eve l G ro u p o f Co mp a n y La w E xp e rt s, gr u p o d e est ud o s i n s ti t uíd o p ela Co mi s são
r esp o n sá v el p e la e lab o r ação d a D ir e ti v a e ur o p é ia so b r e ta k eo ve r. O gr up o fo i lid er ad o
p o r J aap W i n ter , d e o nd e fo i r et ir ad o o no me d o r ela tó r io .
171
“T h e W i nt er R ep o r t ad vi s ed t ha t t he o f fe r ee b o ar d ’s i ns i g ht i n to , a nd r esp o n sib il it y
fo r , t he str a te g y a nd d a y- t o -d a y a f f air s o f t he c o mp a n y e nab l e a nd r eq u ir e i t to ad v is e
th e s har e ho ld er s o n t he ta k eo ver b id . I t t h u s o p in ed t ha t t h e b o ar d i s b es t p l aced “to
exp r e ss it s v ie ws o n t h e co ns eq ue nc es o f t h e b i d fo r t he co mp a n y a nd i ts b u s i ne s s a nd
o n t he at tr ac ti v e ne s s o f th e ter ms o f t he b id fo r th e s har e ho ld er s ”. Co n s is te n t wi t h t h is
vi e w, Ar tic le 9 ( 5 ) o f t he Dir ec ti ve o b li g es t h e o f f er e e b o ar d to d r a w up a nd ma k e
p ub lic a d o c u me n t s et ti n g o ut i ts o p i n io n o f t he b id a nd t h e r ea so ns o n wh ic h i t i s
b ased ” ( B . C L AR K E , Ta keo ve r R eg u la tio n … c it . ( n t. 1 0 3 , su p ra ) , p . 2 5 ) .
172
Ar t i go 1 2 . ° Re g i me f ac ul ta ti vo
82
A legislação da União Européia, na forma de Diretiva, implica
que cada Estado-Membro deve confeccionar suas próprias leis sobre o
assunto, mas sempre respeitando os princípios estabelecidos naquela
diretiva, a fim de proporcionar a harmonização legislativa do bloco
europeu. 173

Tem-se, assim, que o Sistema Europeu é regido pela idéia de


neutralidade da administração no que concerte às ofertas hostis de tomada
de controle, resguardando aos acionistas da companhia-alvo a decisão final
sobre o sucesso da oferta. A Diretiva, entretanto, admite as divergências
legislativas locais, que não estão obrigadas a observar a regra da
neutralidade.

Por fim, de se mencionar, ainda, a regra da não oponibilidade


das restrições em matéria de transmissão de valores mobiliários e direito de
voto, que é denominada na doutrina especializada de breakthrough rule.

Essa regra está prevista no artigo 11 da Diretiva, e tem por


objetivo neutralizar previsões antitakeovers dispostas nos estatutos das
companhias ou mesmo em acordos entre as partes. Uma vez tornada pública
a oferta, eventuais regras restritivas à circulação das ações são tornadas
sem efeitos, até o fim da oferta. É o caso, por exemplo, da estipulação de
direito de preferência entre os integrantes de um grupo de acionistas: na
pendência de uma oferta pública de aquisição de ações, os acionistas podem
livremente vender suas ações ao ofertante, não sendo necessário antes
ofertá-las aos demais acionistas. Sob a proteção da breakthrough rule, os
acionistas que assim agirem não serão responsabilizados pela quebra do
direito de preferência.

1 . Os E s tad o s -M e mb r o s p o d e m r e ser var o d ir e it o d e n ão e xi g ir q ue a s s o cied ad e s a q ue


se r e fer e o n .° 1 d o ar t i go 1 .°, co m s ed e so cia l no s r e sp ec ti vo s ter r itó r io s, ap liq ue m o
d isp o s to no s n.° s2 e 3 d o ar t i go 9 . °e/o u no ar ti g o 1 1 .°.
A tí t ulo d e e xe mp lo , a Ale ma n h a, q u e j á p o s s u ía no r ma so b r e o a ss u n to d e sd e 2 0 0 1 ,
o p to u p o r não o b ser v ar o r eg i me p r e v i sto no ar ti go 9 º , ite n s 1 e 2 , d a Dir e ti v a. ( E . F.
OI O LI , O fe rta P ú b l ica .. . ci t. ( n t. 9 1 , su p ra ) , p . 8 9 ) .
173
V. V. CO OK E , Do e s th e E u ro p ea n … c it. ( n t. 1 2 1 , su p ra ) , p . 6 7 0 .
83
Mais uma vez, para conseguir conciliar os interesses dos
diversos Estados-Membros, esse ponto da Diretiva também não tem caráter
obrigatório, sendo que o artigo 12, item 1, 174 confere aos Estados-Membros
a liberdade de optar por adotá-lo ou rejeitá-lo.

Assim, temos que a Diretiva prevê regime opcional no que se


refere aos seus pontos mais polêmicos: breakthrough rule e neutralidade da
administração da companhia-alvo. Esse regime opcional está previsto no
artigo 12 da Diretiva, cuja redação foi determinada já no final das
discussões que culminaram no texto final do diploma normativo. Tal
dispositivo foi inserido como um mecanismo para apaziguar os acirrados
debates entre os diversos Estados-Membros no que se referia àqueles dois
pontos.

Pelo regime opcional, o Estado-Membro pode optar se aplicará


o regime previsto na Diretiva às companhias instituídas segundo as suas
leis. Porém, duas observações devem ser feitas: (i) caso o Estado-Membro
opte por não adotar alguma daquelas regras, ele deve dar a oportunidade
para que as companhias em seu território escolham se preferem seguir o
regime da Diretiva; (ii) caso escolha aplicar a Diretiva, o Estado-Membro
pode prever a chamada cláusula de reciprocidade, pela qual o regime legal
da Diretiva somente é aplicável, num takeover, se a companhia ofertante
segue aquele mesmo regime; do contrário, as regras da Diretiva ficam
suspensas, garantindo assim tratamento igualitário entre as partes
envolvidas na oferta.

2.4. Modelo Norte-Americano v. Modelo Europeu/Inglês

174
1 . Os E s tad o s -Me mb r o s p o d e m r es er var o d ir e ito d e n ão e xi g ir q ue a s so cied ad e s a
q ue s e r e fer e o n. o 1 d o ar ti go 1 . o , co m s ed e so c ial no s r e sp e ct i vo s t er r i t ó r io s , ap liq u e m
o d isp o s to no s n. o s 2 e 3 d o ar t i go 9 . o e/o u no ar ti go 1 1 .
84
Neste item, far-se-á a comparação entre os dois modelos
regulatórios acima explanados, bem como sua comparação com o sistema
inglês, dada a relevância do modelo auto-regulatório do City Code na
definição da Diretiva européia sobre takeover. Em verdade, ao se comparar
o modelo norte-americano com o inglês, pode-se dizer que a comparação é
válida também em face do modelo europeu, visto a proximidade entre o
modelo inglês e europeu.

As principais diferenças entre os dois modelos regulatórios


dizem respeito à previsão de oferta obrigatória no caso de aquisição de
ações em montante que se presume adquirido o controle e a limitações à
adoção de mecanismos de defesa por parte da administração da companhia-
alvo. Enquanto os modelos europeu e inglês prevêem a oferta obrigatória, e
proíbem a administração da companhia-alvo de utilizar medidas defensivas
contra uma oferta hostil, o modelo norte-americano vai no sentido oposto:
não há previsão de oferta obrigatória, e a administração da companhia tem
livre atuação diante de uma oferta hostil, dentro da racionalidade da
business judgment rule.

A falta de previsão de oferta obrigatória torna a legislação


federal norte-americana mais flexível, permitindo o tender offer de apenas
parte das ações. Isso acaba por não impedir a ocorrência de ofertas
alavancadas (em que o ofertante vai depender dos ativos da companhia-alvo
para fazer frente à dívida assumida com o takeover), o que pode ser
prejudicial à companhia visada. Por conta disso, o foco do takeover muda
das companhias subvalorizadas por conta de uma administração ineficiente,
para as companhias com vigorosa economia, capaz de fazer frente às
dívidas assumidas pelo ofertante na alavancagem para tomar o seu
controle. 175

Na União Européia, esse tipo de manobra acaba sendo


desencorajado ante a previsão de oferta obrigatória caso o ofertante adquira
ações em montante tal que se faça presumir adquirido o controle da
companhia. Isso acontece porque, para realizar a compra do controle, o
175
V. V. CO OK E , Do e s th e E u ro p ea n … c it. ( n t. 1 2 1 , su p ra ) , p p . 6 9 3 -6 9 5 .
85
ofertante terá que ter meios de arcar também com a oferta obrigatória,
afastando, assim, operações alavancadas.

A diferença mais gritante entre os modelos regulatórios,


todavia, refere-se às restrições à utilização de medidas defensivas contra o
takeover. Diferentemente dos Estados Unidos da América, no Reino Unido,
quando do lançamento de um takeover bid, os administradores não podem
utilizar nenhuma medida tendente a frustrar a oferta sem o consentimento
dos acionistas. As denominadas poison pills, bem como qualquer outra
defesa que tenha o efeito de impedir os acionistas de decidir sobre o mérito
da oferta, são terminantemente proibidas.

Ao restringir a utilização de técnicas defensivas pelos


administradores, a regulação inglesa acaba por tornar mais fácil o êxito d e
ofertas hostis. Conforme dados trazidos por J. A R M O U R e D. A. S K E E L J R .,
de fato, as transações do tipo M&A (“mergers and acquisitions”) possuem
maior probabilidade de serem do tipo hostil no Reino Unido e, quando
hostis, possuem maior chance de lograrem bom sucesso, do que quando
comparadas com o que ocorre nos Estados Unidos da América. 176

A Diretiva da União Européia, nesse ponto, seguiu o mesmo


traçado do City Code, como fica claro na regra da neutralidade imposta aos
administradores (artigo 9º). A opção por esse modelo faz sentido, visto que
o objetivo maior da Diretiva, ao harmonizar as regras sobre takeover, era
fomentar a prática no território europeu, dentro daquela premissa de que as
ofertas públicas e a tomada de controle agregam valores aos acionistas da
companhia-alvo. Ao retirar do caminho do ofertante o empecilho
representado pelas medidas defensivas, mais uma vez, vislumbra-se o claro
propósito de incentivar a tomada de controle e suas conseqüências
benfazejas.

176
“I n b o t h co u n tr ie s, ho s til it y i s t h e e xc ep t io n, r at her t ha n t he r u le, b u t in t he U ni ted
Ki n gd o m, 0 .8 5 % o f t a k eo v er s a n no u nced d ur i n g t h e p er io d 1 9 9 0 -2 0 0 5 wer e ho st ile ,
co mp ar ed wi t h 0 .5 7 % i n th e U n ited St at es . O f t he se ho s ti le b id s, 4 3 % we r e s uc ce ss f u l
in t he U ni ted K i n gd o m, as o p p o s ed to j u st 2 4 % in t he U ni ted S ta te s. E v id e nce o f a l i n k
b et we e n ta keo v er d e fe n se s a nd t a keo ver p r ac ti c e i s b u ttr es sed b y t he f act t ha t t he r i se
o f a nt ita k eo ver mec h a ni s ms s uc h as ‘p o i so n p il l s ’ b y U. S. f ir ms i n t h e 1 9 9 0 s co i nc id ed
wi t h a d r a ma t ic d ecl i ne i n le v el s o f ho s ti li t y i n ta k eo ver s fr o m t h e 1 9 8 0 s.” ( c f. Wh o
Wr i te s th e R u l e s… ci t. ( nt . 1 2 0 , su p ra ) , p p . 1 7 3 8 -1 7 3 9 ) .
86
Entretanto, apesar de o nível de tomada de controle hostil ser
menor nos Estados Unidos da América, quando comparado com a
Inglaterra, considerado o total de takeovers (hostis ou amigáveis)
ocorridos, nota-se que há maior ocorrência da operação nos Estados Unidos
da América. Isso sugere que as técnicas defensivas não detiveram a
ocorrência do takeover, mas apenas fizeram com que o potencial ofertant e
mudasse de técnica: ao invés da aproximação hostil, agora passa a negociar
a tomada do controle diretamente com os interessados. 177

Conseqüência direta da restrição à utilização de medidas


defensivas é a maior autonomia que os acionistas das companhias européias
gozam ao decidir sobre os fins da oferta. Com as legislações antitakeovers
dos estados norte-americanos, acabou-se por diminuir o papel dos
acionistas na decisão final sobre a oferta, tendo em vista o acréscimo de
poderes dados aos administradores para determinar o sucesso da oferta,
uma vez que são considerados pelos legisladores mais bem informados e
bastiões, por assim dizer, de outros interesses que não apenas o dos
acionistas. 178

O modelo europeu, entretanto, segue o caminho inverso,


atribuindo aos acionistas o papel fundamental na decisão sobre o êxito ou
fracasso da oferta. Isso é assegurado, sobretudo, com a regra da
neutralidade da administração, insculpida na Diretiva.

Embora possa parecer contraditório, nesse ponto há forte


semelhança entre a Diretiva e a legislação federal norte-americana
(Williams Act): ambos os diplomas primaram pela autonomia dos
acionistas, no deslinde da oferta. Com efeito, o caráter antitakeover da
legislação norte-americana deve-se antes às legislações estaduais do que ao
Williams Act. Aliás, a doutrina aponta que o caráter antitakeover das
legislações estaduais dos Estados Unidos da América é atribuído

177
J . ARM OU R e D. A. SKE E L J R., Wh o Wr ite s th e R u le s … c it. ( nt. 1 2 0 , su p ra ) , p .
1741.
178
V. V. CO OK E , Do e s th e E u ro p ea n … c it. ( n t. 1 2 1 , su p ra ) , p . 6 9 2 .
87
justamente ao fato de que a legislação federal não tutela interesses outros,
que não o dos acionistas. 179

Outro ponto de contato entre as duas legislações (européia e


norte-americana) ainda pode ser apontado: o item 14 d-9 do Williams Act
prevê que a administração da companhia-alvo emita opinião sobre se os
acionistas devem aceitar ou rejeitar a oferta, a exemplo do que determina o
artigo 9º, item 5 da Diretiva européia.

V. V. C O O K E aponta que a relevância em se comparar os dois


modelos regulatórios está em que o caráter de cada um desses sistemas
acabaria por influenciar na ocorrência de takeovers: enquanto a União
Européia optou por um controle centralizado do assunto, os Estados Unidos
da América possuem controle descentralizado, dividido entre a esfera
federal e a esfera estadual. Justamente por conta da quantidade de diplomas
disciplinando o tema, a conseqüência do sistema norte-americano é a
redução da prática do takeover, enquanto o contrário é verificado na União
Européia, visto que uma legislação unitária tornaria mais fácil ao potencial
ofertante preencher os requisitos legais. 180

Essa conclusão, apesar de coerente, é desmentida pelo quanto


já foi dito acima: apesar de a legislação norte-americana ser mais restritiva
ao takeover, isso não diminuiu a prática em seu mercado de capitais. A
diferença deu-se apenas no perfil da oferta, que passou a ser, no mais das
vezes, do tipo amigável, ao invés de hostil.

Comparando-se os dois sistemas regulatórios, nota-se que


ambos possuem seus prós e contras. Para os novos mercados, ainda
iniciantes e pouco experientes em tema de takeover, a pergunta que ainda
fica é: qual modelo seria mais eficiente?

Olhando pelo prisma de que a ocorrência do takeover gera


valor para os acionistas da companhia-alvo, e atentando-se também ao
potencial conflito de interesses na atuação dos administradores diante de

179
Ne s se se n tid o , V. V. C OO KE , Do e s th e E u ro p e a n … c it. ( nt. 1 2 1 , su p ra ) , p . 6 9 1 .
180
Do e s th e E u ro p ea n … c i t. ( nt . 1 2 1 , su p ra ) , p . 6 9 1 .
88
uma oferta hostil, alguns doutrinadores chegam à conclusão de que, em
princípio, o sistema inglês e, pela similaridade, o europeu seria
181
preferível , pelas seguintes razões: (i) deixar nas mãos dos
administradores o destino da oferta somente seria vantajoso aos acionistas
se houvesse incentivos apropriados para que a administração agisse
segundo os interesses dos acionistas, o que, entretanto, acaba não
acontecendo, em vista do potencial conflito de interesses dos
administradores; (ii) se a decisão de barrar uma tentativa de tomada de
controle cabe aos administradores, a potencialidade de ocorrer um takeover
perde aquele efeito de incentivar a administração a sempre buscar atuar do
modo mais eficiente; (iii) incentivar a administração por meio de
compensações baseadas em ações também não é solução, visto que se o
valor das ações sobem, os administradores lucram, mas se o valor desce,
eles não sofrem qualquer punição.

Mas nem sempre a auto-regulação (proposta do sistema inglês)


é preferível. Consoante apontam J. A R MO U R e D. A. S K E E L J R ., a
efetividade da auto-regulação está estreitamente relacionada com os
incentivos dos indivíduos e entidades responsáveis pela elaboração das
regras. 182

Ademais, como já mencionado, a opção por um ou outro


modelo não diminuiu a incidência de takeover nos principais países a
adotá-los (nomeadamente, Estados Unidos da América e Inglaterra). Pelo
contrário, ambos os mercados de capitais mostram-se pujantes. Assim,
torna-se difícil apontar qual seria o melhor modelo a ser seguido (vale aqui
recordar a discussão da doutrina norte-americana sobre a adoção ou
limitação do uso de técnicas defensivas, mencionada no final do item 2.2,
181
É o ca so d e J . AR MO UR e D. A. S KE E L J R ., Wh o Wr i te s th e R u l es … c it. ( n t. 1 2 0 ,
su p ra ) , p p . 1 7 4 1 -1 7 4 3 .
182
“G i ve n t he e f f ica c y o f th e T akeo v er Co d e, i t ma y b e te mp ti n g to co n cl ud e t h at se l f -
r eg u la tio n i s a l wa ys a n o p ti ma l r e g ula to r y s tr a te g y. B ut t h is wo uld b e a mi st a ke. T h e
ef f ec ti ve n e ss o f sel f - r e g ul at io n is clo se l y tied to t h e i n ce nt i ve s o f t he i nd i v id ua ls a nd
en ti ti es t hat ar e p r o vid i n g t h e r ule s. I f t he r e g ul ato r s ' i nce n ti v e s ar e co n s is te n t wi t h
so c ial wel f ar e, se l f -r e g ul at io n ca n wo r k e x tr e me l y we ll - a nd i nd e ed , i n a n ar e a
ch ar ac ter ized b y r ap id c ha n ge, ma y p r o v e f ar s up er io r to le gi s la t iv e o r j ud i cia l
o ver s i g ht. I f t he ir i nc e nt i ve s d i ver g e, o n t he o th er h a nd , s el f -r e g ula t io n i s mu c h l es s
attr ac ti ve .” ( c f . Wh o Wr ite s th e R u le s … c it. ( nt. 1 2 0 , su p ra ) , p . 1 7 8 5 ) .
89
supra). Como lembram J. A R M O U R e D. A. S KE E L J R . 183, o importante a
ressaltar é que há duas formas de se encarar a questão regulatória, e a
opção por cada qual variará conforme as peculiaridades de cada sistema.

As peculiaridades de cada sistema, aliás, é o motivo apontado


pela doutrina para a divergência entre o modelo norte-americano e o inglês.
Atribui-se ao federalismo norte-americano e à conseqüente duplicidade de
legislação (federal e estadual) a razão pela qual o modelo daquele país
possui características mais restritivas ao takeover, permitindo a utilização
de medidas defensivas por parte dos administradores.

A forma federalista acabou por ampliar as vozes dos


administradores no contexto da regulação da tomada de controle. Ora,
juntando-se a estrutura pulverizada do capital das grandes companhias
norte-americanas, o que por si só acaba por atribuir maiores poderes aos
administradores, e a constatação de que, num takeover, os administradores
têm muito a perder (no extremo, podem perder seus cargos, no caso de o
novo controlador nomear nova administração), não é difícil imaginar que os
administradores, valendo-se de seus poderes, procurariam resguardar-se da
melhor forma que pudessem. E a saída encontrada foi justamente a opção
por estatutos legais mais restritivos ao takeover.

A partir daí, os estados norte-americanos, que possuem


competência para legislar sobre o tema (diante da estrutura federalizada),
não tardaram a responder aos anseios dos administradores, na intenção de
atrair mais e mais companhias para seu território. Instalou-se, então,
verdadeira competição regulatória entre os diversos estados, cada qual mais
desejoso de oferecer aos administradores aquilo pelo que mais ansiavam:
proteção contra takeover indesejado. 184

183
“T he U. K. s tr a te g y wi ll no t i n var iab l y b e t he b e st, a n y mo r e t ha n t h e ap p r o ac h i n t h e
U ni ted S ta te s. B u t r e fo r me r s a nd la wma k er s s ho uld k eep i n mi n d t ha t t h er e at lea st t wo
wa ys to r e g ul at e ta keo ver s, no t j us t o ne.” ( c f . Wh o Wri te s th e R u le s … ci t. ( nt. 1 2 0 ,
su p ra ) , p . 1 7 9 4 ) .
184
“I n t he U n it ed S tat es , fed er al i s m ha s a mp li f i ed t he vo i ce o f co r p o r ate ma n a ger s.
B eca u se t he y wo r r y t h at ma na ger s wi ll p ac k t h e co mp a n y's b a g s a nd mo ve el se wh er e i f
th e s ta te i s i n s u f f ici e n tl y a tte n ti v e to t he m an a ger s ' ne ed s , s tat e l a wma k er s h a ve
p o wer f u l i nce n ti v es to ke ep co r p o r a te ma na g er s h ap p y. T hi s s u g g es t s tha t ma na g er s
90
Some-se a esse quadro o fato de que, até poucos anos atrás,
justamente quando estava sendo definido o perfil regulatório, os Estados
Unidos da América não contavam com um corpo de acionistas organizados
e fortemente atuantes. Assim, diante da passividade acionária – e da
ganância dos administradores – não é difícil imaginar o cenário regulatório
resultante.

No Reino Unido, a seu turno, o principal agente a modelar a


(auto) regulação do takeover foram os acionistas institucionais. Por serem
titulares de quantidade maciça de ações nas companhias abertas inglesas,
exerceram sua influência na formação do perfil regulatório daquele país,
não sendo à toa que a regulação no Reino Unido prima pela autonomia
acionária na decisão sobre o resultado da oferta pública, assim como pelo
princípio da neutralidade da administração.

Nos Estados Unidos da América, a força dos acionistas


institucionais era sensivelmente menor, visto que tais acionistas
representavam fatia bem menos apreciável das ações no mercado. Com isso,
não foram fortes o suficiente para determinar os rumos da legislação norte-
americana em tema de takeover, que acabou sendo norteada pelos interesses
dos administradores, até por conta daquela estrutura federalizada acima
referida.

Nas duas últimas décadas, entretanto, a figura mudou


significativamente, sendo que agora os acionistas institucionais possuem
grande quantidade de ações das companhias norte-americanas (cerca de
50% das ações circulantes, conforme dados trazidos por J. A R MO U R e D. A.
S K E E L J R . 185), equiparando-se com o cenário do Reino Unido. Com isso, é
possível que, num futuro próximo, os acionistas institucionais (os “cães

wi l l o f te n ge t wh a t t he y wa nt b o t h i n De la war e and i n o t h er sta te s.” ( J . AR MO U R e D.


A. SKE E L J R., Wh o Wr i te s th e R u l e s… ci t. ( n t. 1 2 0 , su p ra ) , p . 1 7 6 6 ) .
185
Wh o Wr i te s th e R u le s… cit . ( nt . 1 2 0 , su p ra ) , p . 1 7 6 8 .
91
que não latiram da última vez” 186), agora mais fortalecidos, busquem
alterações no perfil regulatório norte-americano.

2.5. O Modelo Brasileiro

Para tratar dos mecanismos de defesa adotados pelas


sociedades brasileiras (objeto central deste estudo), é imprescindível
proceder, antes, à análise da conjuntura legal no que se refere ao tema.
Entretanto, enquadrar o perfil regulatório brasileiro, no que concerne à
tomada de controle e à admissão dos mecanismos de defesa contra oferta
hostil, não é tarefa fácil.

Inicialmente, a doutrina mostrou-se propensa a negar a


possibilidade de os administradores da companhia visada tomarem medidas
visando a impedir ou dificultar a tomada de controle, com o que o sistema
brasileiro aproximar-se-ia do princípio da neutralidade da administração,
norteadora do Sistema Europeu.

Nesse sentido, A. F. A. L O P ES assevera que a atuação da


administração, em face de uma oferta hostil, estaria vedada, tendo em vista
as obrigações legais e específicas impostas pela lei brasileira aos

186
A e xp r es s ão é d e J . A R M O U R e D. A. S KE E L J r . : “T o id e n ti f y t he s tar ti n g p o i nt s fo r a
r ic her p o li ti ca l ac co u nt, we n eed o nl y r e t ur n to o ur h i sto r ica l o ver v ie w and a s k, wh i c h
o f t he p la ye r s a nd e ve n t s t hat fi g ur ed p r o mi n e n t l y i n t he hi sto r ic al d e ve lo p me nt o f U. S.
and U. K. t a keo ver r e g u lat io n see m to b e mi s si n g fr o m t he o r t ho d o x f ed er a li s m sto r y?
T he a n s wer s, i n o ur v ie w – t he d o g s t ha t d id n 't b ar k i n t he la s t se ct io n – ar e
in s ti t ut io na l s har e ho ld e r s i n t he U ni ted K i n g d o m, a nd t h e ear l y t wen ti et h - ce nt ur y
sec u r it ie s a nd b a n ki n g l eg i sla tio n t h at d e ter mi n ed th e p at h o f U. S. co r p o r ate r e g u lat io n.
T o get her , t he y h o ld t he ke y to u nd er s ta nd i n g t he d i ver g e nt mo d es o f r eg u la tio n i n t h e
U ni ted Sta te s a nd U ni te d Ki n gd o m” . ( c f. Wh o Wr i te s th e R u l es … c it . ( n t. 1 2 0 , su p ra ) ,
p. 1791).
92
administradores e controladores, o que impediria o uso dos mecanismos de
defesa consagrados na experiência estrangeira. 187

Numa visão mais temperada, M. C A R V A LH O S A defende que


atuação da administração da companhia-alvo contra uma oferta hostil
somente seria ilegal, por caracterizar abuso de poder, quando tivesse por
objetivo apenas atacar a oferta. Entretanto, o autor sustenta que a
administração da companhia, quando diante de uma oferta hostil, deve
pronunciar-se sobre a viabilidade do negócio, tendo em vista os interesses
dos acionistas. 188 Essa obrigação deriva do dever de informar, legalmente
imposto aos membros da administração ex vi do artigo 157, §4º, da Lei das
Sociedades por Ações. 189

A questão central a pautar o tema, sempre, remete ao potencial


conflito de interesses entre os administradores e o interesse da companhia e
dos acionistas. Nesse sentido, corroborando o entendimento indicado
acima, e até mesmo se inclinando para a admissão de alguns dos
mecanismos de defesa pela legislação brasileira, C. S A LO MÃ O F I LH O
conclui que o conflito de interesses, no que concerne aos administradores,
seria substancial, ou seja, somente aferível casuisticamente. 190

Esse argumento poderia levar à aproximação do sistema


brasileiro ao norte-americano, que é pautado pela business judgment rule.

187
“No B r a si l, é i neq u í vo co q ue t ai s tip o s d e co nd ut a es tão ved ad o s, d ia n te d a s
o b r i gaçõ es le ga is ge r ai s e esp e cí f ica s q ue a l ei b r as ile ir a i mp õ e ao s ad mi n i str ad o r e s e
co n tr o l ad o r e s, i mp ed i nd o q ue o s me s mo s, d i a nte d e u ma o fer t a p úb li ca, to me m med id a s
ex cep c io na is o u ut il ize m- s e d e i n f o r maçõ e s p r i vi le g iad a s o u d o p a tr i m ô ni o so ci al p ar a
o b str u ir a o fer ta” ( A s o f er ta s p ú b l ica s... ci t. ( nt . 7 5 , su p ra ) , p . 1 8 3 ) .
188
“I t ha s b ee n s u g ge st ed th at ma n a ge me n t ha s t h e d u t y to co m me n ce li ti ga tio n o r ta ke
o th er me a s ur e s to b lo c k t he o f f er i f it b el ie ve s t he o f fer to b e d e tr i me n ta l to i t s
s har e ho ld er s. Ho we v er , d ef e ns i ve tac ti cs ai m ed so lel y at d e f ea ti n g th e o f fer ar e
u nl a wf u l a nd co ns id er ed an ab us e o f p o we r ” ( Th e B ra z il ia n E xp e r ien c e wi th R e sp ect to
Ten d e r Of fe rs , i n Jo u rn a l o f Co mp a ra ti ve Co rp o ra t e La w a n d S ecu ri ti es R eg u la tio n 3
(1981), p. 109).
189
Ar t. 1 5 7 , § 4 º Os ad mi ni s tr ad o r es d a co mp a n h ia ab er ta são o b r i gad o s a co mu ni car
i med i at a me n te à b o ls a d e va lo r e s e a d i v u l gar p el a i mp r e n sa q ualq u e r d el ib er ação d a
as se mb lé ia - ger al o u d o s ó r g ão s d e ad mi n is tr a ção d a co mp a n h ia, o u fa to r ele v a nt e
o co r r id o no s se u s ne gó cio s, q ue p o s sa i n fl u ir , d e mo d o p o nd er á vel , na d ec is ão d o s
in v e st id o r e s d o mer cad o d e v e nd er o u co mp r ar v alo r es mo b il iár io s e mit id o s p el a
co mp a n hi a.
190
O No vo Di re ito ... c it . ( nt . 9 2 , su p ra ) , p p . 1 3 4 -1 3 6 .
93
Aliás, uma possível aplicação da regra do julgamento empresarial, no
sistema brasileiro, poderia ser vislumbrada no disposto no artigo 159, §6º,
da lei 191: se reconhecido que o administrador agiu de boa-fé e no interesse
da companhia, sua responsabilidade fica afastada.

Ademais, a lei brasileira também impõe aos administradores da


companhia uma série de deveres legais, tais como o dever de diligência
(artigo 153), de lealdade (artigo 155), de informar (artigo 157), além de
responsabilizá-los pela inobservância de tais deveres.

A inspiração nos deveres fiduciários do sistema norte-


americano parece clara, até mesmo pela nomenclatura utilizada, mas se
deve ressaltar que a mera referência a deveres fiduciários não tem
aplicação no Brasil. 192 Aqui, tais deveres decorrem da lei, que os prevê
minuciosamente. São, portanto, deveres legais.

Porém, C. S A LO MÃ O F ILH O e M. S. R IC H TE R J R . 193 criticam


tanto a posição norte-americana, que confia cegamente no critério da
business judgment rule – que presume que a administração atua sempre no
melhor interesse da companhia, olvidando, assim, potenciais conflitos de
interesses (por exemplo, o interesse particular dos administradores em se
manter nos seus cargos) – quanto a posição que prega a abstenção da
administração no caso de uma tentativa de takeover, pois isso gera
presunção absoluta da existência de conflito de interesses entre
administradores e acionistas. A solução estaria, para os autores, em
diferenciar o conflito de interesses potencial e o efetivo.

Segundo a legislação brasileira, no caso em tela, não é possível


dizer que haja presunção de conflito de interesses da administração quando
no manuseio de medidas defensivas. Is so decorre da leitura harmonizada

191
Ar t. 1 5 9 , § 6 ° - O j uiz p o d er á r eco n he cer a e xc l us ão d a r e sp o n sab il id ad e d o
ad mi ni s tr ad o r , se co n v en cid o d e q u e e st e a gi u d e b o a - fé e v i sa nd o ao i nt er e s se d a
co mp a n hi a.
192
C f. L. A. S. C AMP OS, Co n s elh o d e A d m in i st ra çã o e Di re to r ia – De ve re s e
R esp o n sa b il id a d e, i n D ir ei to d a s Co mp a n h ia s, v. I , co o r d A. L AMY FI LH O e J . L.
B U LH ÕE S P E D RE I R A, Rio d e J a ne ir o , Fo r e ns e, 2 0 0 9 , p p . 1 0 8 8 -1 0 9 0 .
193
I n te re s se S o cia l... cit . ( nt . 6 4 , su p ra ) , p p . 7 1 - 7 3 .
94
entre o artigo 156 e artigo 155, II, ambos da Lei das Sociedades por Ações,
necessária para o deslinde da aparente antinomia que existe entre as duas
normas. Ora, se não é dado ao administrador intervir nas operações
societárias em que tenha interesse conflitante com a companhia (artigo
156), também não pode ele se omitir na proteção dos interesses da
companhia (artigo 155, II), o que lhe impulsiona a ter postura ativa ante
uma tentativa de takeover.

Num exercício de hermenêutica, pode-se ainda apontar para a


precisão dos termos utilizados na lei: o artigo 156 diz que é “vedado ao
administrador intervir em qualquer operação social em que tiver interesse
conflitante com o da companhia” (destacamos), e não “em que possa ter
interesse conflitante”, mostrando que a lei, de fato, preocupa-se com o
conflito de interesses efetivo, e não com o potencial.

Em face disso, é forçoso reconhecer que o tipo de conflito de


interesses previsto pela lei, no artigo 156, é do tipo ex post, ou seja,
trabalha-se com o conflito de interesses aferível no caso concreto, efetivo
(e não potencial).

. Já numa abordagem mais arrojada sobre a adoção de medidas


defensivas pelas companhias brasileiras, E. S A LO MÃ O propõe a divisão dos
países em três diferentes categorias, segundo a freqüência de utilização das
medidas defensivas: (i) países que seguem a Common Law, tais como EUA
e Canadá, em que a adoção de mecanismos de defesa é prática largamente
utilizada; (ii) um segundo grupo é composto por países em que, por conta
de características e peculiaridades locais, o uso de medidas defensivas é
raro, em vista da baixa probabilidade de ocorrência de takeover hostil,
como é o caso do Japão; (iii) por fim, há países cuja economia já está
preparada para ser palco de fenômenos como o takeover hostil e a adoção
de medidas defensivas, mas em que tais práticas ainda não ocorrem por
falta de experiência dos agentes locais. Neste último grupo, para o autor,

95
estaria inclusa a maior parte dos países da América Latina, incluindo o
Brasil. 194

Releva observar, contudo, que o texto de E. S A LO MÃ O foi


escrito em fevereiro de 1990, há quase duas décadas, portanto. Atualmente,
tendo em vista o cenário brasileiro, seria difícil continuar classificando o
país naquele terceiro grupo apresentado acima, apesar de a prática
brasileira no que concerne ao takeover hostil e à adoção de mecanismos de
defesa ainda ser recente.

Pode-se dizer que o perfil brasileiro é mais conservador no que


se refere às práticas defensivas, a exemplo do modelo inglês e europeu,
mas sem vedar de modo absoluto a sua utilização, desde que seja guiada
pelo interesse da companhia. Ao permitir o uso de técnicas defensivas, o
modelo brasileiro tangencia o sistema norte-americano. 195

Contribuindo ainda mais para esse perfil regulatório misto, nos


últimos meses, tem sido discutida a criação de organismo privado para
regular a prática das fusões e aquisições societárias, nos moldes do Panel
inglês. São os investidores nacionais articulando-se na busca pela auto-
regulação do setor e as vantagens que esse modelo pode oferecer. 196 Se

194
B ra zi lia n p o iso n p il l s: ra re b u t leg it ima te, i n I n te rn a t io n a l F in a n c ia l La w R ev ie w 3 6
(1990), p. 36.
195
No me s mo se n tid o , J . P . B . NAS CI ME NT O, A n o ta çõ e s so b re Med id a s Defen s iva s à
To ma d a d e Co n t ro le , D is ser ta ção d e Me str ad o ap r e se nt ad a à Fac u ld ad e d e D ir ei to d a
U ni ver s id ad e d e São P a ulo , S ão P a ulo , 2 0 1 0 , p . 2 5 2 : “No B r a si l, p ar e ce - no s q ue não
no s fi li ar e mo s i nte gr al me n te a ne n h u m d o s mo d elo s e xi s te nt e s, so b o en te nd i me n to d e
q ue o no s so o r d e na me nto j ur íd ico p o s s u i car acte r í st ica s p r ó p r i a s d e co mb i naç ão d a
tr ad i ção r o ma n o - ger mâ ni ca d a ci vi l la w, q u e é a na sce n te d o no s s o Dir e ito , co m
in f l uê n ci as d a tr ad içã o an g lo -s a xã d a co m mo n la w, so b r et ud o e m no s so d ir e ito
so c iet ár io e d o me r cad o d e cap ita i s”.
196
So b r e, v. N. R O C CO , P a ís d eve c r ia r en t id a d e p a ra a va lia r fu sõ e s, 0 9 .1 1 .2 0 1 0 ,
d isp o n í ve l [ o n - l in e] in h t tp : / /eco n o mi a .ig .co m.b r/ me rca d o s/ ca p ita i s /p a i s +d ev e
+c ria r+ en t id a d e +p a ra + a va lia r +fu so e s/n 1 2 3 7 8 2 2 6 3 3 1 4 8 .h tm l [ 0 3 .0 1 .2 0 1 1 ] ; N.
E I ZI RI K, V i sã o B ra si le i ra S o b re Ta k eo ve r P a n e l, p a le str a p r o fer id a no 2 ° Se mi n ár io d a
AME C em 0 9 . 1 2 .0 9 ( ap r e se n ta çã o d i sp o ní ve l [ o n - lin e] in
h ttp : // w w w.a mecb ra si l.o rg .b r/ me rca d o d e ca p i ta i s /in fo r ma t ivo s/n o ti cia s/ s emin a r io -
in te rn a c io n a l- ta k eo ve r- p a n el- 2 .h tm l [ 0 3 .0 1 .2 0 1 1 ] ; A. P U L L I N GE R, Th e U K Ta keo ve r
P a n el: a p o ss ib l e mo d e l fo r B ra zi l? , P ale s tr a p r o fe r id a no 2 ° Se mi nár io d a AME C e m
0 9 .1 2 .0 9 ( ap r ese n ta ção d i s p o n í vel [ o n - li n e] in
h ttp : // w w w.a mecb ra si l.o rg .b r/ me rca d o d e ca p i ta i s /in fo r ma t ivo s/n o ti cia s/ s emin a r io -
in te rn a c io n a l- ta k eo ve r- p a n el- 2 .h tm l [ 0 3 .0 1 .2 0 1 1 ] .
96
aquela conclusão apresentada por J. A R MO U R e D. A. S K E E L J R . 197 estiver
correta, ou seja, o que justificou a criação e o poder da auto-regulação
implantada no Reino Unido foi a forte atuação dos acionistas institucionais,
provavelmente em breve haverá notícias do já batizado Comitê de
Aquisições e Fusões, haja vista a forte atuação dos acionistas institucionais
no mercado brasileiro (a exemplo das caixas de previdência e fundos de
investimento).

É nesse cenário que as medidas defensivas adotadas pelas


companhias brasileiras, aqui denominadas de poison pills, devem ser
avaliadas.

197
V. p ar te f i na l d o ite m a nt er io r , su p ra .
97
CAPÍTULO 3
POISON PILL: DO MODELO NORTE-AMERICANO AO
BRASILEIRO

A denominada poison pill, cuja criação é atribuída a Martin


Lipton 198, surgiu como um dos mecanismos mais eficientes de detenção das
investidas hostis de tomada de controle. Na doutrina norte-americana,
algumas espécies desse mecanismo de defesa são apontadas, fazendo com
que a poison pill não seja apenas uma técnica defensiva, mas sim um
conjunto delas. 199 Não é, entretanto, o único tipo de defesa de que lançam
mão as companhias que são alvo de tomada de controle.

Com efeito, pode-se dizer que o número de instrumentos de


defesa é diretamente proporcional à criatividade dos operadores de direito,
que lidam diariamente no âmbito societário. Os mecanismos são tantos que
qualquer enumeração seria inequivocamente incompleta.

198
“T ar g et ma na g er s fo u g ht b a c k wi t h a var iet y o f d e f e ns i ve s tr a te g i es, t h e mo st
d r a mat ic o f wh i c h wa s the i mp l e me n tat io n o f the p o iso n p il ls p io n e er ed b y M ar t y
L ip to n o f W ac h te ll, L ip to n ” ( J . ARM OU R e D . A. S KE E L J R., Wh o Wr ite s th e R u le s …
cit. ( n t. 1 2 0 , su p ra ) , p . 1 7 5 5 ) ; R. C. MI CH E L E T T O, Th e P o iso n P il l … ci t. ( nt. 1 3 0 ,
su p ra ) , p . 1 1 0 , n t. 2 2 . O p r ó p r io M. L I P T O N a t r ib ui - se a p a ter n id ad e d a med id a, c f . M.
LI P T ON e P . K . ROW E , P il l s, P o ll s... ci t. ( n t. 1 4 5 , su p ra ) , p . 1 4 .
199
Ne ss e s e nt id o , J . VE L A S CO, Ju s t d o i t: a n a n t i d o te to th e p o iso n p il l, i n E mo r y La w
Jo u rn a l 5 2 ( 2 0 0 3 ) , p . 8 5 6 ( “T he t er m ‘p o iso n p ill ’ d o e s no t r e f er to a si n g le, u n i fo r m
d ev ice . Ra t her , it r e fer s to a f a mi l y o f d e v ic es t h at o p er at e i n a si mi l ar f as h io n”) .
98
Este Capítulo, porém, cuida especificamente da poison pill,
iniciando pela classificação dos mecanismos de defesa em geral e, em
seguida, passando ao estudo das chamadas pílulas de veneno – tradução da
expressão em inglês poison pills.

Contudo, desde logo se deve fazer a advertência que segue:


com a recente redescoberta do tema pela doutrina brasileira, boa parte da
doutrina e dos operadores do direito passou a referir-se às medidas
antitakeover adotadas pelas companhias brasileiras, genericamente, como
poison pills. A expressão já se popularizou, e na prática societária é
utilizada para referir-se, sobretudo, às cláusulas que asseguram a dispersão
acionária, muito freqüentes nos estatutos das companhias listadas no Novo
Mercado da BM&F-Bovespa, e que serão tratadas mais adiante. Tais
cláusulas, porém, não guardam muita semelhança com a poison pill norte-
americana (aqui referida como clássica).

Em verdade, a poison pill é apenas uma das muitas técnicas de


defesa utilizadas e conhecidas na experiência estrangeira – mormente
norte-americana. Na doutrina norte-americana, é comum a utilização da
expressão shark repellents ou shark attack repellents (repelentes de
tubarão ou repelentes de ataque de tubarão) para se referir, genericamente,
às medidas defensivas. 200

Ao final, tratar-se-á da situação brasileira e das defesas aqui


utilizadas, a que denominamos “poison pill à brasileira” ou, simplesmente,
poison pill brasileira. Abordar-se-á, ainda, a pequena mas importante
experiência que já foi vivenciada, além do atual estágio de regulação d a
matéria.

3.1. Classificação dos Mecanismos de Defesa

200
Ne s se se n tid o , R . C. C L AR K, Co rp o ra t e La w c it. ( n t. 1 3 3 , su p ra ) , p . 5 7 4 .
99
Apesar da variedade encontrada de mecanismos de defesa, o
ponto em comum entre todos esses mecanismos é o objetivo de aumentar o
custo da aquisição do controle, ou diminuir os benefícios esperados pelo
adquirente, para com isso desestimular potenciais ofertantes da empreitada
que é a tomada de controle. Dispendioso lembrar que, na experiência
estrangeira, apenas cabe falar em medidas defensivas diante de oferta
hostil, visto que na oferta amigável, negociada, não há qualquer hostilidade
a ser combatida.

As medidas defensivas podem ser classificadas segundo dois


critérios: (i) o temporal, pelo qual se dividem em defesas preventivas e
defesas remediativas (ou ex post); e (ii) o da natureza jurídica, segundo o
qual as defesas podem ser estruturais (ou legais), estatutárias e contratuais.

3.1.1. Defesas Preventivas e Remediativas

Com base em A. M. C O R D E IR O 201, as técnicas defensivas podem


ser divididas em dois grandes grupos, tendo em vista o momento em que
são postas em prática: medidas defensivas preventivas (tomadas antes da
ocorrência de oferta hostil) e medidas defensivas remediativas (realizadas
após a existência de oferta hostil, ou seja, durante seu curso). 202

As defesas preventivas são aquelas adotadas


independentemente da existência atual de oferta hostil, e em geral são
dispostas no próprio estatuto das companhias. Na literatura norte-
americana, tais defesas são conhecidas como shark repellents. Em regra,

201
Da to ma d a d e ... c it . ( nt . 3 4 , su p ra ) , p . 7 7 3 .
202
E s s a me s ma cla s si f ic aç ão t a mb é m é p r o p o s ta p o r R . C. C L A R K ( Co rp o ra t e La w c it .
( n t. 1 3 3 , su p ra ) , p p . 5 7 1 e s s.) .
100
estas medidas têm como efeito tornar a tomada do controle da sociedade
pouco interessante para o tomador.

As defesas preventivas dividem-se em:

(i) Medidas organizatórias: consistem na articulação interna da


sociedade de modo a torná-la pouco atraente ou penetrável a novas
maiorias acionárias. O exemplo mais citado é o da administração
escalonada (ou “staffização”, como prefere A. M. C O R D E IR O ), em que a
eleição dos administradores dá-se de modo escalonado, de tal modo que a
substituição da maioria dos administradores levaria várias eleições para
acontecer. Esse esquema, para ser eficaz, deve ser reforçado com a
impossibilidade de exoneração do administrador sem justa causa.

(ii) Limitações do direito de voto: tem por objetivo tornar


pouco atraente a aquisição de grande bloco de ações visando ao controle,
tendo em vista a imposição de algumas limitações, tais como elevados
quori para deliberação de determinadas matérias, ou limitação do número
de votos que cada acionista pode ter. Consistem, assim, em medidas como
previsão de quorum qualificado para alteração estatutária ou, ainda,
limitação do número de votos que cada acionista – ou grupo de acionistas –
pode se valer em assembléia.

(iii) Esquemas financeiros: tem por objetivo tornar a tomada


do controle pouco atraente financeiramente para o tomador. Exemplo dessa
modalidade é a previsão de altas indenizações aos administradores no caso
de término antecipado de sua gestão (os chamados pára-quedas dourados –
golden parachutes). Tal medida pode levar à descapitalização da sociedade
visada em caso de tomada de controle, tornando sua aquisição
desinteressante.

(iv) Controle sobre as ações: consiste na utilização de


mecanismos que garantam o controle sobre a alienação das ações, seja por
meio da submissão da venda à sociedade-alvo, seja, no extremo, por meio
da outorga, aos acionistas antigos, de direito de compra das ações
adquiridas por terceiros por baixo valor.

101
A vantagem das medidas de defesa preventivas é que elas
possuem eficácia contra qualquer adquirente, havendo takeover ou não.
Porém, justamente pelo fato de consistirem em limitações ao livre tráfico
das participações sociais, muitas vezes podem ter por conseqüência a
diminuição do valor das ações no mercado. 203

Já as defesas remediativas são aquelas postas em prática no


curso da oferta hostil, ou seja, após a materialização da ameaça
representada pela possibilidade de tomada de controle.

Algumas medidas preventivas vistas acima também poderão ser


tomadas no decurso de uma oferta, a exemplo do pagamento de
indenizações altíssimas aos administradores da sociedade visada, em caso
de cessação de seus mandatos. Além delas, também é exemplo de defes a
posta em prática no curso da oferta a venda dos principais ativos d a
companhia visada (crown jewels), esvaziando-a de suas riquezas, o que a
torna alvo pouco atraente para o tomador.

3.1.2. Defesas Estruturais, Estatutárias e Contratuais

C. S A LO M Ã O F I LH O 204 propõe outra classificação das medidas


defensivas: caso sejam decorrentes da própria legislação societária, são
chamadas de técnicas estruturais; já se consistem na introdução de
cláusulas específicas nos estatutos das companhias, são denominadas de
técnicas estatutárias.

Para a doutrina 205, exemplo de medida defensiva estrutural (ou


legal) seria o artigo 254-A da Lei das Sociedades por Ações. Apesar de o

203
A. M . CO R DE I RO , Da to ma d a d e... cit . ( nt . 3 4 , su p ra ) , p . 7 7 5 .
204
O No vo Di re ito ... c it . ( nt . 9 2 , su p ra ) , p . 1 3 7 .
205
Nes s e s e nt id o , E . S AL OM ÃO, B ra zi lia n p o iso n ... ci t. ( nt. 1 9 4 , su p ra ) , p . 3 7 ; M .
C AR V AL H OS A, A s p o is o n p il l s es ta tu tá ria s n a p rá t ica b ra s ile i ra – a lg u n s a sp e cto s d e
102
objetivo desse dispositivo ser conferir aos acionistas minoritários
participação no prêmio do controle, pode-se dizer que como efeito
secundário a oferta obrigatória tem o condão de dificultar a transferência
do controle, pois a torna mais onerosa.

M. C A R V A LH O S A 206 acrescenta uma terceira classe de medidas


defensivas, denominadas de defesas contratuais. Estas podem ser
observadas a partir do artigo 118 da lei acionária, que cuida dos acordos de
acionistas. O dispositivo permite aos acionistas firmarem acordos sobre
direito de preferência para a aquisição das ações a ele vinculadas. Se os
signatários do acordo detêm preferência na aquisição de tais ações em
detrimento de terceiros, o efeito é dificultar a alienação do poder de
controle.

Tendo em vista a versatilidade da poison pill clássica, que


apresenta uma série de subespécies, é difícil a sua classificação unitária, a
priori, sendo verdade que pode ser classificada ora como defesa preventiva,
ora como defesa remediativa. 207 Também pode ser enquadrada tanto como
defesa estrutural (quando sua utilização é permitida por lei, pelos estatutos
legais antitakeover), como estatutária ou mesmo contratual. Quanto à
defesa utilizada pelas companhias brasileiras, tal se enquadra no tipo de
medida defensiva estatutária, pois não decorre de previsão legal. É,
portanto, mecanismo do tipo preventivo, previsto em sua forma final no
estatuto da companhia, e gerando efeitos apenas após a tomada de controle.

su a l eg a l id a d e, i n Di re i to S o c ietá r io – De sa f io s A tu a i s, co o r d . R. R. M . C AST R O e L.
S. AR AG ÃO , São P a u lo , Q uar tier La ti n, 2 0 0 9 , p . 2 3 .
206
Na ver d ad e, o a uto r r e fer e - se a tr ê s tip o s d e p o iso n p il l s, ut il iza nd o e st a e xp r e s são
e m se n tid o a mp lo , p ar a r ef er ir - s e às me d id as d e fe n s i va s e m ger a l. M. C AR V AL H OS A ,
A s p o iso n p i ll s... ci t. ( n t . 2 0 5 , su p ra ) , p p . 2 3 -2 4 .
207
“a no t her sp e ci es o f s ha r e ma n ip ul at io n i s t he ‘ p o iso n p i ll ’ p la n ( i t mi g ht b e ad o p t ed
b efo r e o r a ft er a ho s ti le te nd er o f fer is i m mi n e nt , so i t i s no t ne ce s sar il y a p o st -o f f er
tac tic ) ” ( R. C. C L AR K, Co rp o ra te La w ci t. ( nt . 1 3 3 , su p ra ) , p . 5 7 4 ) .
103
3.2. Poison Pill Clássica

Neste tópico, a poison pill será tratada conforme foi


originalmente desenhada na experiência norte-americana. Em seu sentido
mais restrito, a poison pill consiste numa previsão estatutária, a ser
colocada em prática pelos administradores da companhia visada quando do
surgimento de oferta não amigável.

Em interessante analogia, C. K IR C H N E R e R. W. P A IN TE R
apontam que a poison pill funciona como arma de destruição em massa: é
desenhada para não ser usada; sua mera existência já deve ser suficiente
para desencorajar a prática da tomada de controle. 208

Note-se que o principal manipulador da técnica é a


administração da companhia que é alvo do takeover. É a administração que
ministra sua utilização, assim como é ela que tem o poder de neutralizar o
veneno da pílula, nos casos em que a oferta não é hostil e, portanto, tem
seus termos amigavelmente negociados.

Essa atribuição dos administradores decorre da própria


estrutura de capital das companhias norte-americanas. Nos Estados Unidos
da América, a regra é a sociedade com capital autorizado, sendo que a
competência originária para determinar a emissão de novos títulos é da
administração da companhia. 209 Ora, como o mecanismo da poison pill de
ordinário envolve a emissão de ações, é natural que o principal
manipulador da técnica seja a administração da companhia.

A poison pill clássica surgiu nos Estados Unidos da América,


no início da década de 80, sendo um dos mecanismos de defesa mais
notáveis na prática norte-americana. Em geral, seu veneno consiste na
diluição da participação do adquirente, dificultando a obtenção do controle
208
Ta k eo ve r Def en se s… ci t. ( nt . 1 2 2 , su p ra ) , p . 4 5 3 , n t. 4 .
209
So b r e o cap it al a uto r i zad o , co mp et ê nci a d a a d mi ni str ação e d i ver gê nc ia s e n tr e o
mo d e lo no r t e -a me r i ca n o e o se g u id o p el a le i b r as ile ir a, v . J . A. T . GUE R RE I R O,
R eg i me Ju r íd ico d o Ca p ita l A u to r iza d o , S ão P a u lo , Sar a i va, 1 9 8 4 .
104
almejado e ocasionando o aumento dos custos envolvidos. Com isso, visa-
se desincentivar a tomada de controle hostil.

Trata-se de um conjunto de medidas, referidas como


“shareholder rights plan” (plano de direitos do acionista), postas em
prática quando da ocorrência de evento tal como uma oferta hostil pelo
controle da companhia, ou a aquisição de determinada porcentagem de
ações. Lançada a pílula, ela garante aos acionistas direito de comprar ou
subscrever ações adicionais da companhia visada – geralmente com um
desconto substancial sobre o valor de mercado, ou até mesmo gratuitamente
– ou vender suas ações à companhia-alvo a preços bastante atrativos. 210

M. L IP TO N e P. K. R O W E 211 indicam que a posteriormente


denominada poison pill surgiu a partir de memorando por ele redigido
(“Warrant Dividend Plan”), em 1982. A pecha de pílula de veneno,
segundo o autor, foi atribuída por um banqueiro, ao comentar o uso da
medida pela companhia Lenox Inc.

Com efeito, conforme nos dá notícia R. M IC H E LE T TO , 212 a


poison pill fez sua aparição pública em 1983, quando a companhia Lenox
Inc. colocou em prática seu plano de defesa, na época conhecido por “plano
de dividendo preferencial” (“preferred dividend plan”) ou “plano de ações
preferenciais (“preferred stock plan”), 213 contra a tentativa de tomada de
controle realizada por Brown Foreman. 214

Por essa técnica, os acionistas da companhia-alvo, com


exceção do ofertante, receberiam, quando do lançamento de uma ofert a
hostil, ações preferenciais conversíveis como forma de dividendo. Caso a
210
G. A. J AR RE L L , J . A. B RI CK L E Y e J . M. NE T T E R, Th e Ma r ket f o r Co rp o ra t e
Co n t ro l: Th e E mp i ri ca l E vid en ce S in c e 1 9 8 0 , in Jo u rn a l o f E co n o mi c P er sp e cti ve s 2 , n.
1 (1988), p. 63.
211
P il l s, P o ll s … c it. ( nt. 1 4 5 , su p ra ) , p p . 1 4 -1 5 .
212
Th e P o i so n P il l… ci t. ( nt . 1 3 0 , su p ra ) , p . 1 1 2 e n t. 3 2 .
213
R. C . C L A R K r e fe r e - s e a e s se tip o d e d e f e s a co mo “co n ve r s io n r i g h ts ve r sio n ”
( ve r s ão d ir ei to s d e co n v er s ão ) – c f . Co rp o ra te L a w c it . ( nt. 1 3 3 , su p ra ) , p . 5 7 4 .
214
P ar a u m b r e ve r e s u mo d o caso , v. P . J . L. SHI GUE M AT S U, M eca n is m o s d e p ro te çã o
e e st ra t ég ia s d e d ef esa em to ma d a s h o st is d e co n tro le, i n Di re ito S o cie t á rio – De sa fio s
A tu a i s, co o r d . R. R. M. C AST R O e L. S. AR A G ÃO, São P a u lo , Q u ar t ier L at i n, 2 0 0 9 ,
p p . 4 0 3 -4 0 4 .
105
oferta fosse exitosa, num segundo estágio da transferência do controle
(normalmente representado por uma incorporação), as ações preferenciais
seriam convertidas em ações ordinárias votantes do capital social da
sociedade incorporadora. Por conseguinte, os controladores da companhia
ofertante experimentariam significativa diluição de suas participações – é
essa conseqüência não desejada que teria o condão de afastar a tomada d e
controle hostil. 215

O problema dessa técnica, alega R. C. C LA R K 216, é que a


conversão dos títulos seria ineficaz no caso de o adquirente ser um
indivíduo (pessoa física) ou uma sociedade que não seja anônima, pois esse
tipo de adquirente não tem seu capital dividido em ações, o que impediria a
conversão. Ademais, se o adquirente for companhia aberta com propriedade
difusa, o plano não causaria o efeito desejado.

Nota-se assim que, num primeiro momento, o principal motivo


para o desenvolvimento da poison pill foi defender os acionistas daquelas
operações de aquisição de controle que se desenrolavam em duas etapas
(“two-tier takeover”). Em tais operações, o ofertante realizava a aquisição
de parcela das ações da companhia visada, suficiente para garantir-lhe o
controle 217, e em seguida expulsava os demais acionistas, normalmente por
meio da oferta de compra das demais ações da companhia, porém por valor
inferior ao pago na primeira oferta (squeeze-out), ou por meio de
incorporação da companhia-alvo, em relação de troca bastante prejudicial
aos acionistas da sociedade adquirida.

215
“U nd er t h is p l a n, t he t ar g et co r p o r at io n i ss u es co n ver tib le p r e f er r ed s to c k a s a p r o
r ata d i v id e nd to a ll ho ld er s o f i t s co m mo n s t o ck . T hi s p r e fer r ed d i v id e nd p o s se s se s
sp ec ia l r ed e mp tio n a nd co n ver s io n f ea t ur e s. ( …) Mo r eo v er , i n t he e ve n t o f a se co nd
st ep fr eez e o u t mer ger , th e co n ver sio n p r i vi le ge p er mit s al l p r e fer r ed d i vid e nd ho ld er s ,
o th er t ha n t he r aid e r , to co n ver t t ha t p r e fer r ed sto c k i n to a n eq ua l a mo u nt o f p r e f er r ed
sto c k o n t h e r a id er . ( …) T h u s, t he r ed e mp t io n a nd co n ver sio n p r iv il e ge s a llo w
s har e ho ld er s to d ec li ne te nd er i n g t hei r s har e s y et st il l r ece i ve t he t e nd er o f fer p r i ce i n
cas h , o r it s eq u i val e nt, if t he t e nd er o f fer s uc ceed s ( …) ” ( R. C . MI C HE LE T T O, Th e
P o i so n P i ll … ci t. ( nt . 1 3 0 , su p ra ) , p p . 1 1 2 -1 1 3 ) .
216
Co rp o ra te La w ci t. ( n t. 1 3 3 , su p ra ) , p . 5 7 4 .
217
Le mb r a nd o q ue a le gi s l ação no r t e -a me r ic a na nã o d eter mi n a q ua l o p er c en t ua l mí n i mo
a s er ad q u ir id o via o fer t a p úb l ica, ne m p r e vê o f er ta o b r i ga tó r i a no ca so d e aq ui s ição d e
d eter mi n ad o mo nt a nt e d e açõ e s o u d e tr a ns f er ê nc ia d o co ntr o le. So b r e , v. C ap í t ulo 2 ,
ite m 2 .2 ., su p ra .
106
Depois dessa primeira espécie de poison pill utilizada, muitas
outras surgiram. Abaixo, veremos as principais espécies mencionadas em
doutrina, que seguiram à pílula do tipo prefered dividend plan.

Uma segunda variante de poison pill é referida em doutrina


como “redemption rights” (direito de resgate). Por esse mecanismo, a
companhia-alvo emite ações preferenciais resgatáveis pela companhia em
condições bastante favoráveis aos seus titulares, no caso de ocorrer um
takeover hostil. Normalmente, o preço a ser pago pelos títulos resgatáveis é
baseado no maior valor pago pelo adquirente pelas ações da companhia
visada. O veneno dessa técnica está em que o ofertante, se concluir a
tomada de controle, adquirirá companhia cujos ativos estarão
comprometidos no pagamento do resgate daqueles títulos.

R. C LA R K aponta que o empecilho dessa técnica é o fato de


que, se levada ao extremo, pode entrar em conflito com a legislação acerca
da proteção dos credores da companhia. 218

Há ainda a modalidade flip-over, em que a companhia-alvo


atribui aos seus acionistas o direito de adquirir ações do ofertante hostil,
em instrumento similar ao bônus de subscrição brasileiro. Porém, o
exercício desse direito fica condicionado à ocorrência de algum evento,
como a tomada de controle hostil ou a aquisição de determinada
porcentagem de ações (gatilho), quando seguidas de operação de
incorporação ou fusão.

A técnica funciona em duas etapas: quando é lançada a oferta


hostil, os títulos atribuídos aos acionistas da companhia-alvo podem ser
destacados das ações e negociados separadamente, e tem o seu preço
estabelecido em valor substancialmente maior que o valor corrente das
ações da companhia-alvo. Nesse momento, porém, tais títulos ainda não
podem ser exercidos, pois o direito que outorgam é condicional. Assim,
somente será possível a aquisição de ações do ofertante quando à aquisição

218
Co rp o ra te La w ci t. ( n t. 1 3 3 , su p ra ) , p . 5 7 5 .
107
seguir-se um segundo passo, como a fusão ou a incorporação da companhia-
alvo pela adquirente.

Quando satisfeita a condição, o titular daquele direito poderá


adquirir ações da companhia adquirente, normalmente contando com grande
desconto no valor a ser pago (em regra, o desconto é de metade do preço, o
que possibilita comprar duas ações pelo preço de uma). A conseqüência,
mais uma vez, é a diluição da participação do adquirente. 219

O problema dessa técnica, conforme ressalta J. V E LA S C O , é que


ela apenas é eficaz quando à aquisição hostil segue-se uma fusão ou
incorporação. Do contrário, se o adquirente contentar-se apenas em ser o
controlador da companhia-alvo, a pílula não tem qualquer efeito. 220

É por conta disso que a pílula do tipo flip-over costuma vir


acompanhada de outra previsão, pela qual, na ocorrência de oferta hostil,
os títulos conferidos aos acionistas podem ser resgatados pela companhia-
alvo pelo seu valor nominal, o qual usualmente é bastante superior ao valor
de mercado das ações da companhia-alvo. Com isso, o mecanismo de defesa
mescla as características da pílula flip-over com o redemption rights.

Pode-se citar, também, a modalidade flip-in, pela qual a


companhia-alvo confere aos seus acionistas, com exceção do ofertante, a
possibilidade de aquisição de ações de sua emissão, mantidas em
tesouraria, por preço inferior ao negociado no mercado, ou permite a
subscrição, por valor inferior ao de mercado, de ações a serem emitidas em
aumento de capital. Com isso, objetiva-se dificultar a tomada de controle,
ou pelo aumento do numero de ações que o ofertante teria que adquirir,
encarecendo a operação, ou pela diluição de sua participação, quando a
técnica é efetivada após o encerramento da oferta.

A modalidade flip-in é a mais utilizada das pílulas, e


usualmente permite a aquisição de ações da companhia-alvo pela metade do
preço. O direito de aquisição é condicionalmente outorgado aos acionistas

219
R. C . MI C HE LE T T O, Th e P o i so n P il l… ci t . ( n t. 1 3 0 , su p ra ) , p p . 1 1 4 -1 1 6 . V.,
ta mb é m, R. C. C L AR K , Co rp o ra te La w ci t. ( nt . 1 3 3 , su p ra ) , p . 5 7 5 .
220
Ju s t d o it … c it. ( nt. 1 9 9 , su p ra ) , p . 8 6 1 .
108
da companhia-alvo, com exceção do ofertante hostil. A condição a que o
direito está submetido é o lançamento de uma oferta considerada hostil.

Verificada a condição, o direito de aquisição pode ser


destacado das ações e negociado separadamente, a exemplo do que ocorre
com a pílula do tipo flip-over. Porém, diferentemente desta, na pílula do
tipo flip-in, o direito de aquisição torna-se imediatamente exercível com o
lançamento da oferta.

Outra variante da poison pill clássica é composta pelos


chamados back-end plans. Por esse mecanismo, atribui-se aos acionistas o
direito ao recebimento de um dividendo, que seria pago em dinheiro, ações
ou outro valor mobiliário. O exercício do direito ao dividendo, porém,
estaria condicionado à aquisição de montante de ações superior a
percentual pré-definido. 221

Quando verificada a condição, os acionistas poderiam


demandar o recebimento do dividendo. Com isso, a aquisição de ações
acima de determinado percentual tornar-se-ia bastante onerosa,
desincentivando pretensos adquirentes de tomar o controle da companhia de
modo hostil.

Mesmo a pílula do tipo back-end plans possui algumas


222
variantes , mas todas elas têm por objetivo atribuir aos acionistas da
companhia-alvo, no evento de uma aquisição hostil, o recebimento do valor
tido por justo pelas suas ações. A idéia central é a de que esse valor, que
pode ser pago por meio de dinheiro ou debêntures, será sempre retirado d a
companhia-alvo e atribuído aos seus acionistas, com exceção do adquirente
hostil.

É aí que reside o veneno da pílula: o back-end plan não causa a


diluição da participação do adquirente hostil, porém sua repercussão
econômica no patrimônio da companhia-alvo diminui substancialmente o
retorno que o adquirente esperava ter com a aquisição. Esse tipo de pílula,

221
P . J . L. SHI GUE M AT S U, Meca n i smo s... ci t. ( n t. 2 1 4 , su p ra ) , p . 4 0 6 .
222
É o ca so d a “p u t p i ll ” e d a “va lu e a ssu ra n c e p i l l”, c f . J . VE L AS C O, Ju s t d o it … c it .
( n t. 1 9 9 , su p ra ) , p . 8 6 2 .
109
porém, não goza da mesma popularidade que as provisões do tipo flip-in e
flip-over. Ademais, sua eficácia e mesmo sua legalidade são questionáveis,
conforme aponta J. V E LA S C O . 223

Apesar das diversas variantes que a poison pill apresenta,


todas elas apresentam dois pontos em comum 224: (ii) são postas em prática
quando disparado o gatilho a que condicionadas, normalmente representado
pela tomada de controle ou pela aquisição de determinada porcentagem de
ações; (ii) podem ser neutralizadas a qualquer momento por ato da
administração da companhia. Com isso, resta claro que o propósito da
pílula não é apenas afastar a tomada de controle hostil (objetivo original da
medida), mas também procurar melhores condições de venda, no caso em
que a tomada de controle for inevitável.

Com efeito, ao possibilitar que a administração da companhia-


alvo torne sem efeito a poison pill, transforma-se em amigáveis as ofertas
outrora hostis. Com isso, a administração, agindo como fiduciária dos
acionistas, poderia melhor negociar os termos da oferta, sempre na busca
dos interesses dos acionistas. A poison pill serviria, desse modo, de
instrumento de barganha nas mãos dos administradores. 225

Note-se, assim, que o objetivo da poison pill não é evitar toda


e qualquer tomada de controle (takeover), mas apenas aquela do tipo hostil.
Por conta disso, não é formulada como barreira intransponível, mas sim
como um funil, capaz de proporcionar à administração da companhia-alvo
poderes para selecionar as ofertas, descartando aquelas que não atenderiam
o interesse da companhia (como, por exemplo, a aquisição por sociedade
concorrente, com o objetivo de desativar a companhia-alvo), e conseguindo

223
Ju s t d o it … c it. ( nt. 1 9 9 , su p ra ) , p p . 8 6 3 -8 6 4 .
224
Nes se se n tid o , J . P . B . N AS C I ME NT O, A n o ta çõ es so b re.. . ci t. ( nt. 1 9 5 , su p ra ) , p .
122.
225
Ne ss e se nt id o , M. LI P T ON, Ta keo ve r B id s in th e Ta rg et’ s B o a rd ro o m. i n B u s in e s s
La wye r 3 5 ( 1 9 7 9 ) , p p . 1 0 6 e ss. , e m e sp ec ia l p . 1 0 8 ( “i n ab o u t 9 5 p er c en t o f t he ca s e s
wh er e a co mp a n y ha s b ee n acq u ir ed a f ter i ni ti al l y ha vi n g r e si st ed an u n so l ic it ed
ta keo ve r b id , t h e s har e ho l d er s ha v e e nd ed up wi t h a hi g h er p r ice t ha n t he o r i g i na l
o f f er ”) . Q ue s tio na nd o o p o d er d e b ar ga n h a co n f e r id o p e lo s me ca n is mo s d e d e fe s a, v. G.
SUB R AM ANI AN, B a rg a in in g in th e S h a d o w o f T a keo ve r De fen se s, i n Ya le La w Jo u rn a l
1 1 3 ( 2 0 0 3 ) , p p . 6 2 1 -6 8 6 .
110
melhores condições junto àquelas ofertas benéficas aos interesses comuns
dos sócios.

A primeira vez que a poison pill foi submetida ao Judiciário


norte-americano foi no caso Moran v. Household International, Inc. 226, em
que ficou decidida a validade e licitude do mecanismo, desde que sua
utilização fosse guiada pelo parâmetro da business judgmente rule, e a
medida tomada fosse proporcional à ameaça.

Ademais, ficou decidido que o mecanismo não impede de modo


absoluto a tomada de controle (o que seria prejudicial aos acionistas), ante
a possibilidade de ser neutralizada pela administração.

Vale mencionar que, além das poison pills, muitas outras


técnicas defensivas são utilizadas pelas companhias norte-americanas, na
tentativa de impedir o êxito de uma oferta hostil ou, ao menos, de
transformá-la em amigável. São exemplos de outras técnicas: administração
escalonada 227, cavaleiro branco 228, pára-quedas dourados 229, defesa pac-
man 230, greenmail 231, entre outras 232.

226
Mo ra n v. Ho u seh o ld I n t ern a tio n a l, I n c. , 5 0 0 A. 2 d 1 3 4 6 ( De l. 1 9 8 5 ) .
227
T amb é m d e no mi n ad a cla ss if ied o u s ta g g e red b o a rd s, e s sa e str at é gi a co n s is te na
p r ev i são e st at u tár ia d e esc alo n a me n to d o s ma n d ato s d o s me mb r o s d a a d mi ni str ação d a
co mp a n hi a. P o r co n ta d o s ma nd a to s n ão u n i fi cad o s ( e sca lo nad o s) , o e ve n tu al ad q u ir e n te
d o co ntr o le d a co mp a n h ia f ica i mp ed id o d e s ub s tit u ir , d e fo r ma ú n ica e i med i at a, to d o s
o s me mb r o s d a ad mi n i s tr aç ão , o q ue só p o d er i a ser l e vad o a cab o ao f i nal d e a l g u n s
ano s. No B r a si l, e n tr et an to , t al me d id a go zar i a d e p o u ca o u ne n h u m a e fic ác ia, vi s t o
q ue , p el a l ei, o s ad mi n i s tr ad o r e s p o d e m ser d es ti tu íd o s a d n u tu m p ela a ss e mb lé ia - g er al .
228
E s sa té c ni ca d e d e f esa co n si s te na e x is t ên cia – e m r e gr a, i n st i gad a p elo s
ad mi ni s tr ad o r es d a co mp a n h ia - al vo – d e o f er ta co n co r r e n te, r ea li zad a p o r o u tr a
co mp a n hi a q ue é p r e f er id a p e lo s ad mi n i s tr ad o r es d a so c ied ad e vi sad a. Ger al me n te, a
o fe r ta co n co r r e n te é, e m ver d ad e, u ma o f er t a a mi gá v el – d a í p o r q ue esco l hid a p elo s
ad mi ni s tr ad o r es. O no v o o fer t a nt e é, e n tão , o ca val eir o b r a n co , e m c o nt r ap o siç ão ao
ca val eir o ne gr o ( b la ck k n ig h t) – o a uto r d a p r i m eir a o f er t a ( ho st il) .
229
Os p ár a -q ued a s d o ur ad o s ( o u g o ld en p a ra ch u te ) co n si s te m na p r e v i são d e co nc e ss ão
d e ele vad o s p a co te s r e mu n e r ató r io s ao s ad mi n is tr ad o r es d a co mp a n hi a vi sad a e m ca so
d e s u ce s so d e o fer ta ho st il o u d e ce s sa ção d o ma nd ato . D ia n te d e u ma o f er t a ho st il, a
med id a t e m p o r fi na lid ad e o n er ar a e v e nt ua l t o mad a d e co ntr o le, to r na nd o o ne gó c io
ma i s c u s to so e, p o r v ia d e co n s eq üê nc ia, me no s a tr a ti vo . N a e xp er i ê n cia e str a n geir a,
d is c ute - s e a viab il id ad e d es s e me ca ni s mo , b e m co mo s ua r ea l e f ic áci a e m e v it ar u m
ta keo v e r. I s so p o r q u e s ua p r e v i são p o d e f u nc io nar co mo d e si n ce nt i vo ao s
ad mi ni s tr ad o r es e m r e si st ir a u ma o f er ta ho st il , tend o e m vi s ta q ue o su ce sso d e s t a
p o d e- l he s tr az er v ul to so b e ne fí cio f i na n cei r o ( r e ceb i me n to d o s p ár a -q ue d as d o ur ad o s ) .
230
E s sa med id a d e f e ns i va r ep r e se nt a ver d ad ei r o c o nt r a -a taq ue p o r p ar te d a co mp a n h ia -
al vo : co ns i ste no la n ça me n to , p e la co mp a n h ia vi s ad a, d e o f er t a p úb i ca d e aq ui si ção d a s
111
Entretanto, a poison pill, em suas diversas modalidades, ainda
é a estratégia mais famosa e mais largamente utilizada, razão pela qual está
sempre no foco de acesos debates doutrinários.

3.3. Experiência Brasileira

No Brasil, a adoção do modelo clássico de poison pill, visto no


item anterior, é questionável, conforme se passa a demonstrar.

A primeira objeção que se pode levantar é o fato de, na maior


parte das vezes, o cerne do mecanismo estar relacionado principalmente à
fixação do preço de emissão das ações em aumento de capital. 233 Ora,
conforme a Lei das Sociedades por Ações, assim como o Parecer de
Orientação CVM nº 1, de 27 de Setembro de 1978, a fixação do valor da
ação emitida deve sempre seguir os parâmetros disposto no artigo 170 da
lei, 234 o que virtualmente impossibilita a aquisição das ações com desconto.

açõ e s d o o fer ta n te. O n o me P a c- Ma n D ef en s e r ef er e - se a u m p o p u lar j o go d e víd eo -


ga me d a d écad a d e 8 0 , e m q u e o p er so n a ge m i ni cia l me n te c açad o vir a o caçad o r . Ap es ar
d e at éc ni ca, a e xp r es s ão é b a st a nte i l us tr a ti v a.
231
A e xp r e ss ão é u m n e o lo gi s mo ad vi nd o d a j u nç ão d o ter mo b la ckm a il – q ue, e m
in g lê s, si g n i fi ca c ha n ta ge m – co m a e xp r e s sã o g reen – r e fer ê n ci a a o d ó lar , mo ed a
no r te -a me r i ca na . E st a t éc nic a ta mb é m é co n he cid a p o r b o n vo ya g e b o n u s o u g o o d b y e
ki ss . Co n si s te e m e v itar a to mad a d e co ntr o le p elo o fer t a nt e ho s til p o r me io d a co mp r a,
p ela co mp a n hi a -a l vo , d a s açõ e s q ue j á t e n ha m si d o ad q u ir id a s p elo o f er t an te, p o r p r eç o
si g n i fi cat i va me n t e s up e r io r ao p a go p o r el e. E m tr o ca, o o fer ta nt e co mp r o me te - se a
r etir ar a o fer ta o u a não co nt i n uar ad q u ir i nd o a çõ es d aq ue la co mp a n h ia . No t a - se a s si m
q ue a o fer ta ho st il d e aq u i siç ão d e a çõ e s vi sa nd o à to mad a d e co n tr o le, ne s se c as o ,
f u nc io na co mo fo r ma d e ch a nta g ear a ad mi n is tr aç ão d a co mp a n h ia - al vo , q ue s e v ê
o b r i gad a a p a gar al ta s so ma s p ar a e vi tar o ta k eo ve r, ad q uir i nd o d e v o lta a s p r ó p r ia s
açõ e s.
232
So b r e e s se s e o utr o s m eca ni s mo s d e d e fe sa, e s ua vi ab i lid ad e no s i st e ma b r a si leir o ,
v. J . P . B . N AS CI ME NT O, A n o ta çõ e s so b re.. . c i t. ( nt . 1 9 5 , su p ra ) .
233
E . L . S. V AZ e J . P . B . N AS CI ME NT O, P o d ere s d a a d m in i s tra çã o .. . ci t. ( n t. 6 2 ,
su p ra ) , p . 3 9 7 .
234
Ar t . 1 7 0 . Dep o is d e r eal izad o s 3 /4 ( tr ê s q ua r to s) , no mí n i mo , d o c a p ita l so c ial , a
co mp a n hi a p o d e a u me n t á- lo me d ia n te s ub scr içã o p úb lic a o u p a r t ic ul ar d e açõ e s.
112
Já a modalidade que garante aos acionistas da companhia-alvo
o resgate de suas ações ou títulos por valor acentuadamente superior ao de
mercado encontra uma série de obstáculos legais e regulamentares. É o
caso, por exemplo, do artigo 2º, alínea e, da Instrução Normativa CVM n o
10, de 14 de fevereiro de 1980 235, pelo qual é vedada a aquisição de ações
pela própria companhia quando em curso uma oferta pública de aquisição
de ações. Ora, tal previsão é suficiente para impedir a utilização dessa
forma de poison pill pelas companhias brasileiras.

Além da instrução mencionada, a própria lei acionária admite o


resgate de ações apenas em condições especiais, dispostas no artigo 44,
§1º.

Mais que isso, a Lei das Sociedades por Ações também veda o
tratamento desigual a acionistas pertencentes a uma mesma classe de ações,
consoante o artigo 109, §1º. 236 Em face desse dispositivo, não seria possível
justificar a compra de ações a valores majorados de alguns acionistas, mas
não de outros (no caso, do ofertante hostil). Nos Estados Unidos da
América, desde o caso Moran v. Household International, Inc., o Judiciário

§ 1 º O p r eço d e e mi s s ã o d ev er á ser f i xad o , se m d il u ição i nj u s ti f icad a d a p ar t ic ip ação


d o s a nt i go s acio n i st as, ai nd a q ue t e n ha m d ir eito d e p r e fer ê n cia p ar a s ub scr e v ê -l as ,
te nd o e m vi st a, a lter n a ti va o u co nj u nta me nt e: ( Red a ção d ad a p e la L ei nº 9 .4 5 7 , d e
1997)
I - a p er sp ect i va d e r e n t ab il id ad e d a co mp a n hi a; ( I n cl u íd o p e la L ei nº 9 . 4 5 7 , d e 1 9 9 7 )
I I - o va lo r d o p a tr i mô ni o líq u id o d a ação ; ( I nc l u íd o p el a L ei nº 9 .4 5 7 , d e 1 9 9 7 )
I I I - a co taç ão d e s ua s a çõ es e m B o ls a d e Va lo r es o u no me r cad o d e b a l cão o r g a ni zad o ,
ad mit id o á g io o u d es á gi o e m f u nç ão d a s co nd iç õ es d o mer c ad o . ( I n cl u í d o p ela Le i nº
9 .4 5 7 , d e 1 9 9 7 )
( ...)
§ 7 º A p r o p o sta d e a u me n to d o cap ita l d e ver á esc lar ecer q ua l o cr i t ér io ad o t ad o , no s
ter mo s d o § 1 º d este ar ti go , j u s ti f ica nd o p o r me no r izad a me n te o s a sp e c to s e co nô mi co s
q ue d et er mi n ar a m a s ua esco l ha. ( I nc l uíd o p ela L ei nº 9 .4 5 7 , d e 1 9 9 7 )
235
Ar t. 2 º A aq u is ição , d e mo d o d ir eto o u i nd ir et o , d e açõ e s d e e mi s são d a co mp a n hia ,
p ar a p er ma n ê nc ia e m te s o ur a r ia o u ca n cel a me n to , é ved ad a q ua nd o : ( .. .)
e) e st i ver e m c ur so o f er t a p úb li ca d e aq u is iç ão d e s u as açõ e s.
236
Ar t. 1 0 9 , § 1 º As a çõ e s d e cad a cl a ss e co n f er ir ã o i g uai s d ir e ito s ao s s e u s t it u lar es .
113
já firmou o entendimento de que o tratamento diferenciado entre acionistas
é admissível. 237

Já C. S A LO MÃ O F I L H O 238, definindo a poison pill à luz dos


institutos brasileiros, sustenta que a medida consiste na emissão de títulos
com vencimento condicionado à alienação de controle, que podem ser tanto
debêntures quanto bônus de subscrição, resgatáveis ou exercíveis,
respectivamente, em condições bastante favoráveis ao seu titular, no caso
do implemento daquela condição, com o claro propósito de diluir a
participação do ofertante.

Ressalta que na prática estrangeira os títulos emitidos como


forma de poison pills, de ordinário, possuem cláusula pela qual eles podem
ser resgatados a qualquer tempo pela companhia, a seu critério. Essa
previsão é necessária para evitar os efeitos da poison pills naqueles casos
de alienação amigável de controle, permitindo à companhia esse tipo de
negociação. Entretanto, para C. S A LO MÃ O F ILH O , em face do direito
brasileiro, a validade de tal cláusula seria duvidosa, tendo em vista que o
Código Civil (artigo 122, 2ª parte) 239 veda as condições puramente
potestativas. 240

Entretanto, no que tange às debêntures, o argumento, a nosso


aviso, não procede. As debêntures, diversamente das ações, não são títulos
de capital, mas sim de passivo exigível, razão pela qual admitem resgat e
antecipado. A própria Lei das Sociedades por Ações, em seu artigo 55,
permite que a debênture seja tanto resgatada antecipadamente (caput),
quanto adquirida pela própria companhia (§2º), além de permitir que o
vencimento seja condicionado (§3º), conforme se vê abaixo 241:

237
J . ARM OU R e D. A. S KE E L J R., Wh o Wr i te s th e R u le s… ci t. ( n t. 1 2 0 , su p ra ) , p p .
1 7 5 5 -1 7 5 6 .
238
O No vo Di re ito ... c it . ( nt . 9 2 , su p ra ) , p . 1 3 8 .
239
Ar t. 1 2 2 . São l íc it as , e m ger a l, to d a s a s co n d içõ e s não co ntr ár i as à lei , à o r d e m
p úb lic a o u ao s b o ns co st u me s ; e n tr e a s co nd içõ e s d e f e sa s se i nc l ue m as q ue p r i v ar e m d e
to d o e fe ito o ne gó c io j u r íd ico , o u o s uj ei tar e m a o p ur o ar b í tr io d e u ma d as p ar te s.
240
O No vo Di re ito ... c it . ( nt . 9 2 , su p ra ) , p p . 1 3 9 .
241
E m 3 0 d e d eze mb r o d e 2 0 1 0 , a Med id a P r o v i s ó r ia 5 1 7 a lter o u a r ed a ç ão d o s § § 1 º e
2 º d o ar tigo 5 5 d a le i. P o r é m, u ma v ez q ue a med id a a i nd a não fo i c o n ver tid a e m le i,
114
Art. 55. A época do vencimento da debênture
deverá constar da escritura de emissão e do
certificado, podendo a companhia estipular
amortizações parciais de cada série, criar fundos
de amortização e reservar-se o direito de resgate
antecipado, parcial ou total, dos títulos da mesma
série.

§ 1º A amortização de debêntures da mesma série


que não tenham vencimentos anuais distintos,
assim como o resgate parcial, deverão ser feitos
mediante sorteio ou, se as debêntures estiverem
cotadas por preço inferior ao valor nominal, por
compra em bolsa.

§ 2º É facultado à companhia adquirir debêntures


de sua emissão, desde que por valor igual ou
inferior ao nominal, devendo o fato constar do
relatório da administração e das demonstrações
financeiras.

§ 3º A companhia poderá emitir debêntures cujo


vencimento somente ocorra nos casos de
inadimplemento da obrigação de pagar juros e
dissolução da companhia, ou de outras condições
previstas no título. (destacamos)

o p to u -s e p o r ma nter a r ed ação a n ter io r d o d is p o si ti vo l e gal , me s mo p o r q ue a no v a


r ed ação não i n v al id a o a r g u me n to ap r e se n tad o . Ab ai xo , a no va r ed a ção d o s d i sp o si ti vo s
me n cio n ad o s :
Ar t. 5 5 . ( ...) § 1 o A a mo r ti zaç ão d e d eb ê nt u r es d a me s ma s ér i e q ue n ão t e n ha m
ve n ci me n to s a n ua i s d i st i nto s, as s i m co mo o r e s g ate p ar ci al, d e v er ão ser fe ito s me d ia n te
so r t eio o u, se a s d eb ê n t ur e s e s ti ver e m co tad a s p o r p r eço i n fer io r ao va lo r no mi na l, p o r
co mp r a no mer cad o d e va lo r e s mo b il iár io s, o b s er va nd o a s r e gr a s e xp ed id a s p e la
Co mi s são d e Va lo r e s Mo b il iár io s. ( R ed ação d ad a p e la Med id a P r o v isó r ia nº 5 1 7 , d e
2010)
§ 2 o É f ac u ltad o à co mp a n hi a ad q uir ir d eb ê nt ur e s d e s ua e mi s s ão , d esd e q ue o b ser ve a s
r eg r a s e xp ed id a s p ela Co mi s são d e Valo r e s Mo b il iár io s, d e ve nd o o fa to co ns tar d o
r ela tó r io d a ad mi n i str a ç ão e d as d e mo n s tr açõ es f i na nc eir a s. ( Red a ção d ad a p e la Med id a
P r o vi só r ia nº 5 1 7 , d e 2 0 1 0 )
115
O autor, porém, aponta ainda mais um motivo pelo qual a
adoção desse tipo de poison pill seria questionável: trata-se da comparação
entre os efeitos da defesa utilizada – emissão de títulos cujo vencimento
acarretaria grande prejuízo à companhia, vez que necessariamente seu
resgate ou exercício dar-se-ia de modo favorável ao seu titular – e os
efeitos de eventual alienação de controle.

Ora, enquanto o prejuízo que poderia ser causado por futuro


adquirente do controle é potencial, o prejuízo causado pelo resgate ou
exercício dos títulos emitidos é certo. No embate entre estas duas esferas,
deve-se afastar o prejuízo certo (adoção da defesa), como forma de atender
ao interesse social, sob pena de responsabilidade dos administradores, na
forma do artigo 158, II. 242

Em face do exposto, como saldo final, é lícito concluir que a


poison pill, tal qual em seu modelo clássico, não pode ser validamente
utilizada no Brasil.

Nem por isso, todavia, as companhias brasileiras deixaram de


adotar técnicas defensivas. Tais técnicas, no entanto, embora sejam também
apelidadas de poison pill, não guardam semelhança com as pílulas
clássicas, vistas acima, ex ceto o fato de também serem postas em execução
quando atingido um patamar fixo, determinado em cada caso (gatilho). 243

E. S A LO M Ã O 244 entende que a necessidade de adoção de


medidas defensivas pelas companhias brasileiras, mormente na categori a
técnicas estatutárias, estaria diretamente ligada ao fato de que as técnicas
ditas estruturais, ou seja, aquelas decorrentes da legislação, não seriam
suficientes a obstar ou desencorajar as investidas do interessado em tomar
o controle de determinada sociedade.

242
C. S AL O M ÃO FI L HO, O No vo Di re ito . .. c it. ( n t. 9 2 , su p ra ) , p . 1 3 9 .
243
A o b ser v ação é d e É . G O R G A : “a ú nic a se me l ha n ça e ntr e a po i so n p i ll b r a sil eir a e a
a mer i ca na é a e x is tê nc i a d e g at il ho q ue d el i mi t a a p o r ce n ta ge m d e aq u is ição d e açõ e s
q ue d isp ar a a mb as a s t é cn ica s d e d e f e sa” ( c f . A s p o i so n p il l s a me r ica n a s e a s su p o sta s
p o iso n p il l s b r a si le ira s, 2 4 .0 8 .2 0 0 8 , d isp o n í ve l [ o n - lin e ] in
h ttp : // w w w.m ig a lh a s. co m.b r /mo s tra _ n o ti cia .a sp x? co d =6 7 3 5 8 [ 0 3 .0 1 .2 0 1 1 ] , d e st aq ue s
no o r i gi n al) .
244
E . S AL O M ÃO, B ra z il ia n p o iso n ... c it . ( nt . 1 9 4 , su p ra ) , p . 3 7 .
116
Com efeito, da análise do cenário legislativo brasileiro, poder-
se-ia imaginar que a previsão de oferta pública de aquisição de ações
obrigatória para o caso de alienação do controle de companhia aberta
poderia servir de entrave à alienação do controle indesejada. Isso, porém,
não é verdadeiro: tal oferta não serve de barreira à ocorrência de takeover
hostil, visto que o interessado em tomar o controle pode fazê-lo – e
provavelmente fará – por meio da oferta voluntária, o que afastaria a
obrigatoriedade da oferta do artigo 254-A.

Assim, além de não haver entraves legais à ocorrência de um


takeover hostil, haja vista que a previsão do artigo 254-A da Lei das
Sociedades por Ações não se aplica em tais casos (afinal, trata-se de
hipótese de aquisição originária do poder de controle), deve-se também
rejeitar a inserção de restrições à circulação de ações nos estatutos das
companhias abertas (que poderia também servir como mecanismo de
contenção ao takeover), visto que tal expediente é permitido apenas para as
companhias fechadas, por força do artigo 30 da lei 245, sendo sua utilização
ilegal nas companhias abertas.

A necessidade de adoção de técnicas defensivas por parte das


companhias brasileiras, contudo, não tem o condão de per se legitimar a
utilização de tais expedientes. É preciso averiguar se a legislação local
permitiria o uso dessas técnicas.

Entretanto, a negativa absoluta da utilização de mecanismos de


defesa também não é a escolha mais indicada. Como defende A. M.
C O R D E IR O 246, ao ser de todo proibido o recurso às técnicas antitakeover, a
melhor defesa contra a tomada hostil seria a retirada da sociedade d o
mercado de ações, com o fechamento do seu capital. Ora, essa não seria a

245
Ar t. 3 6 . O es ta t uto d a co mp a n hia f ec had a p o d e i mp o r l i mi taçõ e s à cir c u laç ão d a s
açõ e s no mi n at i va s, co n t an to q ue r e g ule mi n uc io sa me n te ta is l i mi taçõ es e n ão i mp eça a
ne go cia ção , ne m s uj ei t e o acio ni s ta ao ar b í t r io d o s ó r gão s d e ad mi n i str ação d a
co mp a n hi a o u d a maio r i a d o s ac io ni st as .
P ar ág r a fo ú ni co . A li mi tação à cir c ul ação c r iad a p o r al ter a ção e st at u tá r ia so me n te se
ap li car á à s a çõ e s c uj o s tit u lar es co m el a e xp r e s sa me n te co nco r d ar e m, med ia n te p ed id o
d e a ver b ação no l i vr o d e " Re gi s tr o d e Açõ e s No mi n at i va s" .
246
A OP A e sta tu tá r ia ... ci t . ( n t. 1 0 2 , su p ra ) , p . 1 3 5 .
117
melhor opção visto que, no extremo, o crescimento econômico ficaria
comprometido e poderia causar o definhamento do próprio mercado
acionário, por falta de matéria-prima (as ações).

É tendo essa idéia em vista que passamos à análise dos


mecanismos de defesa adotados pelas companhias brasileiras.

3.3.1. Novo Mercado e Cláusulas Estatutárias (“Poison Pills à


Brasileira”)

O Novo Mercado é um segmento especial de negociação de


valores mobiliários na BM&F-Bovespa, ao lado dos Níveis Diferenciados
de Governança Corporativa – Nível 1 e Nível 2. 247 Possui regulamento
próprio, que deve ser observado pelas companhias que aí decidam negociar
seus títulos. A idéia é a busca por maior transparência e comprometimento
com as boas práticas de governança corporativa.

Dentre os requisitos para que uma companhia entre no Novo


Mercado, podemos citar (itens 2, 3, 4 e 8 do Regulamento de Listagem do
Novo Mercado 248): (i) em regra, possuir apenas ações ordinárias 249; (ii)

247
No p r es e nt e e s t ud o , fo r a m a n al is ad a s ap e n as a s co mp a n hi as l is ta d as no No vo
Mer cad o .
248
O R e g ula me nto d e Li s t ag e m d o No vo Mer cad o p o d e ser ac e ss ad o no s ite d a B M & F -
B o ve sp a ( w w w.b mfb o vesp a .co m .b r) , no l in k h t tp : / / ww w .b m fb o vesp a .co m .b r /p t-
b r/ me rca d o s/d o wn lo a d / R eg u la men to N Me rc a d o . p d f [ 0 3 .0 1 .2 0 1 1 ] .
249
P o r via d e e xc eção , ad mi te - s e a p r e se nç a d e a çõ es p r e fer e n ci ai s d e cl as se e sp e cia l,
d eco r r e n te s d e d e se st at i zação , d e no mi n ad a s n a d o u tr i na d e g o ld en sh a r e, c f. I t e m 3 .1
( v i) d o Re g u la me n to d e L is ta g e m d o No vo M er c ad o :
3 .1 . Au to r i zaç ão p ar a Ne go c iaç ão no No vo M er cad o . O D ir eto r G er a l d a B O VE SP A
p o d er á co nc ed er a uto r iz ação p ar a ne go c ia ção n o No vo Mer cad o p ar a a Co mp a n h ia q u e
p r ee nc her a s se g ui n te s c o nd içõ e s mí n i ma s : ( . ..)
( v i) te n ha se u cap it al s o cia l d i vid id o e xcl u s i va me n te e m a çõ e s o r d i nár ia s, e xce to e m
caso s d e d e se s tat iz ação , se s e t r at ar d e açõ es p r e fer e n ci ai s d e cl a ss e e sp ec ia l q u e
te n ha m p o r f i m g ar a n ti r d ir e ito s p o l ít ico s d i f er e nc iad o s, sej a m i n tr a n s fer í ve is e d e
p r o p r ied ad e d o e nt e d e s es tat iz a nte , d e v e nd o r e f er id o s d ir ei to s ter s id o o b j eto d e a ná li se
p r év ia p el a B O VE SP A ( . ..) .
118
todos os acionistas devem ter o direito de saída conjunta nas mesmas
condições dadas aos controladores quando da venda do controle da
companhia (trata-se da previsão obrigatória de tag along); (iii) o conselho
de administração deve ter, no mínimo, cinco membros com mandato
unificado de até dois anos, e ao menos 20% dos membros devem ser
independentes; (iv) necessidade de divulgação de demonstrações
financeiras de acordo com padrões internacionais; (v) manutenção em
circulação de uma parcela mínima de ações, representando 25% do capital
social da companhia (free float).

É especialmente nas companhias que aderiram ao Novo


Mercado que se vislumbra a adoção da poison pill à brasileira (aqui
referidas como poison pill brasileira ou simplesmente poison pill, a menos
que diversamente ressaltado). A justificativa para esse posicionamento das
companhias estaria, a nosso aviso, em dois pilares do Novo Mercado: a
exigência de que as companhias possuam e emitam apenas ações ordinárias
(com a exceção das golden share) e a imposição de dispersão mínima de
ações no mercado.

Esse ambiente favorece, a um só tempo, a dispersão acionária e


o maior compartilhamento do poder de votar, visto que as companhias não
possuem acionistas privados do direito de voto.

No Brasil, optou-se por adotar mecanismo de defesa diferente


daquele utilizado pelas companhias norte-americanas. Ainda assim, por
aqui, tal mecanismo é igualmente denominado poison pill (ou pílula de
veneno). Analisando os estatutos de diversas companhias brasileiras
listadas no Novo Mercado, É. G O R G A 250 aponta a existência
fundamentalmente de dois tipos de mecanismo defensivo:

O primeiro deles, denominado “Tipo A”, determina que caso


seja adquirido determinado percentual de ações da companhia, o adquirente
deverá obrigatoriamente lançar oferta pública para adquirir as demais

250
É . G O RG A, Ch a n g in g t h e P a ra d ig m o f S to ck O wn e r sh ip f ro m Co n c en t r a ted To wa rd s
Di sp e r sed O wn e r sh ip ? E vid en c e fro m B ra z il a n d Co n seq u en ce s fo r E me r g in g Co u n t r ie s,
in No r th we st ern Jo u rn a l o f I n t e rn a tio n a l La w & B u s in e ss 2 9 ( 2 0 0 9 ) , p p . 4 8 0 e s s.
119
ações, por preço estatutariamente definido. O percentual a disparar a
necessidade de oferta pública é denominado na prática forense de “gatilho”,
e varia entre dez a trinta e cinco por cento. 251

Esse tipo aproxima-se muito da oferta obrigatória, prevista em


lei (artigo 254-A), diferindo, porém, com relação ao evento que determina
o seu lançamento: enquanto na oferta legal é a transferência onerosa do
controle, na oferta estatutária é a aquisição de determinado percentual de
ações, normalmente estatuído em percentual bastante baixo.

O segundo tipo de poison pill adotado no Brasil, referido como


“Tipo B”, consiste na imposição ao acionista que já tiver adquirido
determinado percentual de ações e desejar extrapolar esse limite do dever
de comunicar sua intenção ao Diretor de Relação com Investidores e ao
diretor da Bolsa de Valores responsável pelo pregão, para que seja
organizada a aquisição das ações em leilão aberto, realizado na Bolsa de
Valores, e do qual poderão participar também terceiros interessados. O
percentual a ensejar esse dever varia de cinco a trinta por cento.

A maior parte das companhias que adotam mecanismos de


defesa opta pelos do Tipo A, sendo que poucas companhias possuem
previsão similar ao Tipo B, e algumas adotam ambos os tipos.

Dada a preferência das companhias pela poison pill do Tipo A,


é sobre ela que nos debruçaremos na análise que segue.

Como visto, esse tipo de defesa consiste na obrigação de lançar


oferta pública imposta àquele que adquirir ações da companhia-alvo acima
de determinado percentual, denominado gatilho. Trata-se de mecanismo d e
defesa estatutário, visto que decorre de previsão clausular inserta no
próprio estatuto da companhia-alvo.

A. M. C O R D E IR O 252 denominou tal defesa de “OPA estatutária”,


e aponta que essa defesa garante proteção contra as tomadas hostis mais

251
Co n f er ir C ap í t ulo 4 , i te m 4 .3 ., e T ab ela s 1 e 2 , in f ra .
252
A OP A e sta tu tá r ia ... ci t . ( n t. 1 0 2 , su p ra ) , p p .1 4 0 -1 4 1 .
120
insidiosas, que são aquelas em que o ofertante toma o controle adquirindo
parcela minoritária do capital social (controle minoritário).

Em geral, a redação das pílulas de veneno brasileiras segue o


modelo apresentado abaixo:

“Qualquer acionista que adquirir ou se tornar


titular de ações de emissão da Companhia em
quantidade igual ou superior a (...)% [gatilho] do
total de ações de emissão da Companhia deverá,
no prazo máximo de (...) dias a contar da data de
aquisição ou do evento que resultou na titularidade
de ações em quantidade igual ou superior a (...)%
do total de ações de emissão da Companhia,
realizar ou solicitar, conforme o caso, o registro
de uma oferta pública de aquisição da totalidade
das ações de emissão da Companhia, observando-
se o disposto na regulamentação aplicável da
CVM, o Regulamento de Listagem do Novo
Mercado e as disposições deste Artigo.

O preço de aquisição na OPA de cada ação de


emissão da Companhia não poderá ser inferior ao
maior valor entre: (i) o valor econômico apurado
em laudo de avaliação; (ii) X% 253 do preço de
emissão das ações em qualquer aumento de capital
realizado mediante distribuição pública ocorrido
no período de (...) meses que anteceder a data em
que se tornar obrigatória a realização da OPA nos
termos deste artigo, devidamente atualizado pelo
índice (...) até o momento do pagamento; maior
valor pago pelo adquirente por ação da companhia,
no período de (...) meses anteriores à oferta; e (iii)

253
Se nd o X ≥ 1 0 0 %. Q ua n d o X = 1 0 0 % , é co mu m a p r e vi são d o p a g a me n t o d o va lo r d a
ação a cr e sc id o d e p r ê mi o , r ep r e se n tad o p o r p o r c en ta ge m so b r e o v alo r i nd i cad o .
121
X% da cotação unitária média das ações de
emissão da Companhia durante o período de (...)
dias anterior à realização da oferta na bolsa de
valores em que houver o maior volume de
negociações das ações de emissão da Companhia.

A alteração que limite o direito dos acionistas à


realização da oferta pública prevista neste Artigo
ou a exclusão deste Artigo obrigará o(s)
acionista(s) que tiver(em) votado a favor de tal
alteração ou exclusão na deliberação em
Assembléia Geral a realizar a oferta pública
prevista neste artigo”. 254

Nas duas primeiras partes do dispositivo, insere-se a previsão


de oferta pública, nos moldes ali indicados, a ser realizada quando uma
pessoa (física ou jurídica) ou grupo de pessoas adquira determinado
percentual de ações de emissão da companhia-alvo. Sobre a última parte do
dispositivo – cláusula acessória que tem o condão de transformar a previsão
da poison pill em espécie de cláusula pétrea do estatuto social 255 – falar-se-
á mais adiante.

No momento, a questão é analisar qual a feição que a poison


pill brasileira possui. Isso porque, do modo como é mais comumente
desenhada nos estatutos, a cláusula de poison pill é mais do que uma mera
previsão de tag along (a existência da qual, no Novo Mercado, é até uma
exigência).

254
Ad ap taç ão d o ar ti go 4 3 d o E s ta t uto So ci al d e Lo j a s R e n ner S . A., co n fo r me
at ua liz ad o a té 3 0 . 0 3 .2 0 1 0 , d i sp o ní v el [ o n - l in e] in h t tp : / /s it eemp r esa s.
b o vesp a .co m .b r /co n sb o v /A r q u ivo Co m Ca b eca lh o . a sp ? mo ti vo = &p r o to co lo =2 6 7 2 0 8 &f u n c
a o =vi su a li za r &S i te = C [ 0 3 .0 1 .2 0 1 1 ] .
255
A e xp r es são “cl á us u la p étr ea ” ve m d o D ir e it o Co ns ti t uc io nal , e m q ue ser ve p a r a
d es i g nar o n úc leo d ur o d a Co n st it u iç ão , o q u al é i mu t á vel , não ad mi t i n d o alt er aç ão p elo
P o d er Co n st it u i nte d er i vad o . Na Co n st it u ição d a Rep úb li ca Fed er at i v a d o B r as il, a s
clá u s ul as p étr ea s e nco n tr a m- s e e le n cad a s no ar ti go 6 0 , § 4 º . Ap e sar d e a clá u s u la q u e
d i fic u lt a a r et ir ad a d a p o iso n p il l d o e s ta t uto nã o ter co n te úd o co n st it uc io n al, a p r á ti c a
fo r e ns e co n v e ncio no u c ha má - l a d e cl á us u la p ét r ea, a n te o e f ei to d e i m ut ab i lid ad e q u e
ger a.
122
O tag along, ou direito de saída conjunta, nada mais é que a
transposição da oferta pública obrigatória, prevista no artigo 254-A da lei
acionária, para o campo estatutário, com algumas sensíveis alterações. No
campo estatutário, por exemplo, o tag along pode prever a obrigatoriedade
de estender a oferta de aquisição de ações para além dos acionistas com
direito a voto, abrangendo também os acionistas titulares de ações
preferenciais sem direito a voto.

Igualmente, pode prever que a oferta será correspondente a


valor maior que o fix ado na lei (atualmente, 80% do valor ofertado às ações
do controlador). No caso das companhias listadas no Novo Mercado da
BM&F-Bovespa, há a exigência de se proceder ao tag along, no caso de
alienação do controle da companhia, mas o valor da oferta deverá ser,
sempre, correspondente a 100% daquele ofertado às ações do bloco de
controle, garantindo aos acionistas minoritários, assim, tratamento
igualitário 256.

De se lembrar, ainda, que o artigo 254-A da lei tem aplicação


apenas quanto às companhias abertas. O tag along, por sua vez, pode ser
previsto também no estatuto das companhias fechadas.

Ora, em vista das condições a que submetida a eficácia das


poison pills – o chamado gatilho – esse tipo de previsão estatutária vai para
além da mera garantia de tag along. Isso porque o gatilho escolhido pelas
companhias traduz-se em percentual baixo, normalmente variando entre 10
e 35%, percentual esse que muitas vezes não é suficiente para adquirir o
controle da companhia (pressuposto do tag along).

Diante da previsão legal (artigo 254-A) e da regulamentar, o


primeiro óbice que se poderia levantar à poison pill brasileira (ou OPA
estatutária) seria que a previsão estatutária estaria a alterar a previsão

256
Re g u la me n to d o No vo Mer cad o , i te m 8 .1 - Co nt r at ação d a Al ie na ção d e Co n tr o le d a
Co mp a n h ia. A Al ie naç ão d e Co ntr o le d a Co mp a n h ia, ta n to p o r me io d e u ma ú n ic a
o p er ação , co mo p o r me io d e o p er açõ es s u ces s i va s, d e v er á ser c o nt r at ad a so b a
co nd ição , s u sp e n si va o u r e so l u ti va , d e q ue o ad q u ir e n te se o b r i g u e a e fe ti var o fer ta
p úb lic a d e aq u is iç ão d a s d e ma i s açõ es d o s o ut r o s ac io ni s ta s d a Co mp a n hi a, o b ser va nd o
as co nd içõ e s e o s p r azo s p r e vi s to s n a le g is la çã o vi g e nte e n es te Re g u l a me nto , d e fo r ma
a l he s as se g u r ar tr at a me nto i g ua li tár io àq u ele d a d o ao Acio n is ta Co n tr o l ad o r Alie n a nt e.
123
imperativa da lei, visto que exige a realização de oferta pública mesmo
quando não há a alienação do controle.

Esse óbice, entretanto, não prospera. Quando há a alienação de


controle de forma onerosa, a oferta obrigatória deriva da lei ou, ainda, do
Regulamento de Listagem do Novo Mercado. Quando não há a alienação do
controle, nem a lei, nem o Regulamento prevêem o lançamento de oferta
pública. Mas também não proíbem que essa seja instituída: trata-se, assim,
de oferta pública facultativa, regida pela autonomia privada. Não há,
portanto, derrogação de regra imperativa, mas apenas regulamentação, po r
particulares, de matéria relegada à autonomia privada. 257

Pode-se alegar, ainda, que a poison pill limitaria a circulação


das ações da companhia aberta, o que não é permitido pela lei (artigo 36, a
contrario). Mais uma vez, o argumento não convence. A circulação das
ações da companhia que tenha poison pill em seu estatuto não fica
prejudicada. Pelo contrário, a idéia é aumentar a diluição do capital social
e a liquidez das ações no mercado. 258 A pílula apenas prevê que, se atingido
determinado percentual de ações, o adquirente fica obrigado a lançar a
oferta.

Afastados tais óbices, é seguro concluir que a adoção da


poison pill, se consistente apenas na exigência de lançar oferta pública
quando atingido determinado percentual de ações, está em consonância com
o perfil legislativo brasileiro, inserta na autonomia privada.

Dado que o objetivo da poison pill é afastar a tomada de


controle hostil (seja para preservar os melhores interesses da companhia e
de seus acionistas, seja para a manutenção do atual bloco de controle),
normalmente, a cláusula apresenta conseqüências não desejadas para

257
C f. A. M. C O RD E I RO, A OP A e sta tu tá ria ... ci t. ( nt. 1 0 2 , su p ra ) , p . 1 4 1 : “A f o r tio r i
p o d e m o s p ac to s so c ia is co nt er cl á us u la a e s se p r o p ó si to . N e n h u ma r e g r a i mp er a ti v a é
af a stad a: ap e na s se ve r i fic a u ma e st at u ição p r i vad a e m ár ea q ue o Dir ei to ha v ia
ab a nd o nad o à a uto no mia p r i vad a ”. ( d e s taq ue s no o r i gi n al)
258
“Ao i nce n ti v ar – ai nd a q ue d e mo d o l i mi tad o e ind ir e cto – OP As ger a i s aci ma d o s 3 0
o u d o s 3 5 %, o s e sta t u to s so c ie tár io s q u e ad o p te m a d e fe sa aq ui a na li sad a [ OP A
es tat u tár ia] e stão , d e fa cto , a d e f e nd er o mer ca d o e a l i vr e e e f ect i va t r an s mi s s ão d a s
acçõ e s” ( A. M. C O RDE I RO , A OP A es ta tu tá ria . . . ci t. ( n t. 1 0 2 , su p ra ) , p . 1 4 4 ) .
124
eventual adquirente do controle, como, por exemplo, a aquisição das
demais ações da companhia por preço substancialmente acima do valor
pago ao controlador ou, então, do valor de mercado. Esse é
fundamentalmente o desenho da poison pill adotada no Brasil.

Sua força coercitiva decorre da previsão, no próprio estatuto


da companhia, de sanções para o caso de seu descumprimento ou não
observância. A sanção mais comum consiste na convocação de assembléia-
geral extraordinária, em que o adquirente das ações fica impedido de votar
(ante o conflito de interesses – artigo 115 da lei), para deliberar sobre a
suspensão dos seus direitos de sócio, na forma do artigo 120 da Lei das
Sociedades por Ações. 259- 260

Até esse ponto, não há qualquer elemento a indicar eventual


ilicitude na pílula brasileira: a previsão de oferta pública de ações
estatutária insere-se dentro da autonomia privada, e a sanção imposta pelo
seu desatendimento encontra previsão legal expressa.

A partir deste ponto, o tema demanda aprofundamento,


consistente na análise dos objetivos visados pela adoção da pílula.

Ao analisar o perfil das sociedades brasileiras listadas no Novo


Mercado, percebemos que cerca de metade das companhias que possuem
previsão estatutária de poison pill apresenta controle definido, ou seja,
controle detido por pessoa ou grupo de pessoas com mais de 50% do capital
votante. Nesse cenário, em que é virtualmente impossível a tomada de
controle hostil, nota-se que o papel da poison pill não é o de evitar a
tomada de controle e seus consectários.

Uma provável explicação é de que a poison pill, em tais casos,


tem o papel fundamental de manter a dispersão acionária (que é exigida,

259
Ar t. 1 2 0 . A a ss e mb l éia - ge r al p o d er á s usp e nd er o exer cí cio d o s d ir eito s d o ac io ni st a
q ue d e i xar d e c u mp r i r o b r ig ação i mp o sta p e la le i o u p elo es ta t ut o , ces s a nd o a
s u sp e n são lo go q ue c u m p r id a a o b r i ga ção .
260
Alé m d es ta, É . G O R G A , e m se u e st ud o , ap o nt a u m se g u nd o t ip o d e p e nal id ad e
ut il iz ad o p ela s co mp a n hi a s b r as il eir as : tr a ta - se d a c lá u s ula a ce s só r ia d e no mi n ad a
clá u s ul a p é tr ea , e q ue s er á a n ali s ad a a i nd a n es t e cap ít u lo . C f. Ch a n g in g th e … c it. ( n t.
2 5 0 , su p ra ) , p p . 4 8 2 -4 8 3 . V., ai nd a, Cap ít u lo 4 , in f ra .
125
aliás, no Novo Mercado – ao menos 25% das ações da companhia devem
estar em circulação – free float). 261

Pode-se imaginar, ainda, que o objetivo da inserção de poison


pill no estatuto de tais companhias teria por escopo criar terreno mais
estável para que os atuais controladores majoritários, no futuro, abrissem
mão de parcela de suas ações, sem, contudo, abrirem mão do controle (que
poderia, inclusive, passar a ser minoritário). Essa evidência já foi apontada
por L. A. B EB C H U K 262, ao analisar as razões que levam às companhias norte-
americanas a adotarem medidas defensivas em seus estatutos.

Ainda assim, causa espécie o fato de haver tantas companhias


com previsão de poison pill em seus estatutos, não obstante sejam
controladas por acionistas que possuam mais da metade do capital votante.
Qual seria a razão desse comportamento?

Em primeiro lugar, pode-se aventar que a idéia de incluir a


pílula no estatuto da companhia decorria da necessidade de conferir aos
investidores maior segurança, de modo a garantir-lhes o tag along no caso
de alienação de controle. Porém, a primeira objeção que se pode levantar
ao argumento é o fato de que a lei, no artigo 254-A, já possui essa
previsão.

Mesmo assim, poder-se-ia imaginar que a intenção foi, então,


assegurar aos acionistas minoritários o tratamento igualitário no caso de
alienação, o que o artigo 254-A mencionado não faz. Contudo, mais uma
vez, a explicação não convence: o Regulamento de Listagem do Novo
Mercado da BM&F-Bovespa já possui previsão semelhante, impondo às
companhias daquele seguimento que garantam o tratamento igualitário no
caso de alienação de controle.

261
Ne s se se n tid o , P . J . L. SHI GU E M AT S U, Me ca n is mo s... ci t. ( nt . 2 1 4 , su p ra ) , p . 3 9 9 .
262
“[ U ] nd er t he e xp la na tio n b a sed o n e n co ur a gi n g d e co n cen t ra t io n o f o wn e r sh ip ,
an ti ta keo v er p r o vi s io ns ser v e t he i nt er e st s o f s h ar e ho ld er s wh e n f ir ms g o p ub l ic. I n t he
ab se n ce o f s uc h ar r a n ge me n t s, fo u nd er s wo u ld b e d i sco ur a ged fr o m s ub seq u e nt l y
r ed u ci n g t he ir ho ld i n g s a nd r e li nq u i s hi n g t he lo c k o n co n tr o l t ha t co me s wi t h
co n ce nt r at ed o wn er s h ip ” ( Wh y fi rm s a d o p t a n ti ta keo v e r a r ra n g e men ts, in Un i ve rs it y o f
P en n s ylva n ia La w R e vi e w 1 4 2 ( 2 0 0 3 ) , p . 7 1 5 ) .
126
Aliás, recentemente, a BM&F-Bovespa propôs a alteração no
Regulamento de Listagem do Novo Mercado para que a oferta pública fosse
obrigatória sempre que houvesse o atingimento, por acionista ou grupo de
acionistas, de participação relevante (entendida a participação a partir de
30% das ações), e não apenas quando transferido o controle. Tal proposta,
porém, foi rejeitada por 60 das companhias listadas no Novo Mercado, não
tendo sido aprovada. 263

O interessante é notar a escolha do percentual da proposta –


que é, aliás, o mesmo utilizado para a oferta obrigatória prevista no City
Code inglês. Com a previsão de lançamento de oferta pública para a
aquisição de 30% das ações, introduzir-se-ia, no âmbito regulamentar,
previsão semelhante à das cláusulas estatutárias denominadas poison pill:
já se disse que a diferença entre o tag along e a poison pill à brasileira
seria que o primeiro é condicionado à venda do controle da companhia,
enquanto a última entra em ação com a aquisição de simples parcela do
capital votante, não exigindo a tomada do controle.

Ora, ao determinar a oferta a partir da aquisição de 30% das


ações da companhia (considerada participação relevante), a previsão
regulamentar não mais condicionaria a oferta à aquisição do controle, a
exemplo do que faz a poison pill. A diferença seria apenas que muitas
companhias, em seus estatutos, elegem como gatilho a disparar a oferta
percentual ainda menor que 30% (o gatilho varia de 10% a 35%).

Entretanto, a negativa, pelas companhias, da alteração do


Regulamento de Listagem quer indica que a intenção da poison pill não é
apenas garantir o tratamento igualitário, pois se assim fosse, não haveria
motivo razoável para rejeitar a proposta.

Há fortes evidências de que a inclusão do mecanismo de defesa


no estatuto das companhias listadas no Novo Mercado seria a necessidade
de assegurar porcentagem mínima de ações circulantes (free float de 25%).

263
Co n fo r me o i te m 1 4 .2 . d o R e g ula me nto d e Li s t ag e m, es te so me nt e p o d e ser al ter ad o
se a mo d i f ic ação f o r ap r o vad a p e la ma io r ia s i mp le s d a s co mp a n hi a s l is tad a s no No vo
Mer cad o , d e sd e q u e não haj a a o p o siç ão e xp r es sa d e ma is d e u m ter ço d as co mp a n h ia s
p ar ti cip a nte s, al é m d e a alt er aç ão ser ap r o vad a p ela C VM.
127
Tanto, que as poison pill, no Novo Mercado, passaram a ser chamadas de
cláusula estatutária de proteção à dispersão acionária.

A explicação só faz sentido, porém, se o objetivo for o d e


fomentar a pulverização das ações no mercado, para além daquele mínimo
exigido no Regulamento de Listagem. Isso porque, pela lei e pelo
Regulamento, são consideradas em circulação todas as ações do capital da
companhia aberta, excetuadas as de propriedade do acionista controlador,
por pessoas a ele vinculadas, de diretores, de conselheiros de
administração, as em tesouraria e as preferenciais de classe especial que
tenham por fim garantir direitos políticos diferenciados, que sejam
intransferíveis e de propriedade exclusiva do ente desestatizante (artigo 4º-
A, §2º da Lei das Sociedades por Ações c.c. item 2.1 do Regulamento de
Listagem).

Ou seja, basta que a soma das ações excluídas da noção de


ações em circulação seja inferior a 75% para que o mínimo de free float
exigido seja cumprido. Com isso, ainda que terceiro adquira as ações
restantes, representativas de 25% do capital social, mas não se torne nem
controlador, nem administrador, aquele mínimo continua garantido.

É nesse ponto, talvez, que reside o problema. Supondo uma


sociedade controlada majoritariamente com 51% do capital social, e em que
a somatória total de ações não consideradas em circulação seja de 70%.
Nesse cenário, um adquirente de participação relevante de ações, digamos
25%, apesar de não conseguir tomar o controle, dificilmente não pleiteari a
um posto na administração da companhia, com isso retirando também suas
ações de circulação. Se isso ocorrer, a somatória total de ações fora de
circulação certamente seria igual ou superior a 76% (os 51% do
controlador, somados aos 25% do novo adquirente-administrador, mais as
ações detidas pelos demais administradores).

Nessa configuração, o argumento de assegurar a dispersão


acionária mínima começa a fazer sentido.

A poison pill, desse modo, serviria de desestímulo ao potencial


comprador, visto que para adquirir, digamos, 25% das ações da companhia,
128
ver-se-ia obrigado a lançar oferta para adquirir todo o restante, por preço
sobremaneiramente elevado, o que encareceria demais o negócio.

Mas seria esse o único interesse atendido pelas poison pills


brasileiras? Acredita-se que não. Se é verdade que tanto os
administradores, quanto os acionistas, sobretudo o controlador, devem agir
com o fito de atender o interesse da companhia, e este, como já se
mencionou, segundo a teoria contratualista, poderia ser equiparado ao
interesse comum dos acionistas, é tranqüilo afirmar que a previsão da
poison pill deve atender aos interesses dos acionistas. Mas quais
acionistas?

No caso de alienação de controle ou de aquisição de ações


acima do gatilho previsto na cláusula de poison pill, não se duvida que o
interesse de todos os acionistas – minoritários e eventuais controladores –
seria atendido, visto que todos receberiam preço equivalente por suas
ações. Porém, no caso em que não ocorre nenhum desses eventos – nem
aquisição acima do percentual que serve como gatilho, nem alienação de
controle – sobretudo por conta da suposta proteção que a poison pill
proporciona (ou seja, afastar eventuais adquirentes hostis), o interesse de
quem é protegido?

Esse parece ser o ponto polêmico de tais cláusulas. Afastar


eventuais ofertantes hostis parece beneficiar, em primeiro plano 264, apenas
aos administradores, no caso de controle gerencial (realidade ainda
pequena nas companhias brasileiras) e aos controladores, sobretudo se
minoritários, no caso de haver controle acionário (majoritário ou
minoritário).

Em regra, a mudança de controle da companhia, sobretudo se


tiver ocorrido de modo hostil, não é interessante para os administradores,

264
Di z -s e e m p r i meir o p l a no p o r q u e não s e ne g a q ue a p r o teç ão co n tr a o fe r ta nt es ho st is
p o d e b e ne f ici ar o utr o s n úc leo s d e i nt er e ss e s: se a i nt e nção d o o f er ta nt e ho s ti l fo r
d es ma n te lar a co mp a n hi a, p ar a ve nd e r se u s a ti vo s ma is va lio so s, o u e nt ão p ô r fi m a
u ma co n co r r e n te, é i ne g áv el q ue o s i n ter es s es d o s acio n i st as mi n o r i tár i o s, a ss i m co mo
d o s tr ab al h ad o r e s e at é me s mo d o mer c ad o e m ger a l r e st ar á a ti n gid o , se nd o p o r ta n to
in ter es s a nte r ep e lir e ss e tip o d e i n v es tid a, o q u e p o d e ser alc a nçad o co m a p r e v is ão d e
p o iso n p il l.
129
visto que um novo controlador pode significar nova administração. Ou seja,
os atuais administradores vêem na tomada de controle uma verdadeira
ameaça aos seus postos de trabalho. Ainda mais diante da legislação
brasileira, que permite a sua destituição ad nutum.

Aos controladores minoritários, afastar ofertantes hostis


também é interessante, pois isso lhes assegura certa estabilidade no
controle da companhia. Mais que isso: é justamente no caso de controle
minoritário que se torna possível a tomada de controle, e quando ess a
ocorre ao arrepio do controlador minoritário, tem-se a chamada aquisição
originária do controle da companhia, a qual não dá ensejo nem à oferta
obrigatória do artigo 254-A da Lei das Sociedades por Ações, nem ao tag
along obrigatório previsto no Regulamento de Listagem do Novo Mercado.
Ou seja, o controle seria adquirido, e nem o controlador minoritário
anterior, nem os demais acionistas, receberiam prêmio algum pelo controle
perdido.

A poison pill pode ainda ser benéfica aos controladores


majoritários, no caso de eles pretenderem abrir mão de parte de suas ações
ao mercado, para aumentar a dispersão acionária, instituindo controle
minoritário na companhia.

O mecanismo legal conferido pelo legislador para incentivar a


dispersão acionária, sem desatender o interesse dos controladores, foi a
possibilidade de emissão de ações preferenciais. Com efeito, ao permitir
que até metade do capital social 265 fosse representado por ações
preferenciais sem direito a voto, a lei possibilitou que o controle
majoritário da companhia fosse detido com pouco mais de um quarto do
capital social. Todavia, como a emissão desse tipo de ação não é permitida
no Novo Mercado, outra solução encontrada para incentivar aquela
dispersão seria, justamente, a poison pill.

265
L e mb r e - se q u e, o r i g i na r ia me n te, o n ú me r o to ta l d e açõ es p r e fer e nc iai s se m d ir e ito a
vo t o ad mi tid o er a d e d o i s ter ço s d o cap i ta l so c ia l ( r ed aç ão o r i g i nal d o ar ti go 1 5 , § 2 º ) , o
q ue p er mi tir ia a d et e nç ão d e co n tr o l e maj o r it ár io co m p o uco ma i s d e u m se xto d o
cap i tal so ci al.
130
Essa última explicação, de que a poison pill atenderia ao
interesse do controlador, parece ser a mais convincente, sobretudo tendo
em vista o cenário brasileiro: o corpo acionário brasileiro sempre s e
apresentou bastante concentrado, sendo essa ainda a regra na esmagadora
maioria das companhias brasileiras (e até mesmo no Novo Mercado – até
julho de 2010, 65 das 106 companhias listadas apresentavam controlador
definido) 266, o que demonstra o forte apego dos acionistas ao controle das
companhias de que fazem parte.

Reforça essa evidência o fato de que no estatuto de algumas


companhias, cujo controle é definido (ou seja, majoritário), a poison pill
somente tem aplicação a partir do momento em que o controle da
companhia passa a ser “difuso” 267, conforme a definição constante do
Regulamento de Listagem do Novo Mercado, isto é, o poder de controle
detido por acionista ou grupo de acionistas com menos de 50% do capital
votante.

Para M. C A R V A LH O S A 268, contudo, o uso da poison pill como


forma de manutenção do atual controle da companhia seria um
desvirtuamento do instituto, que, nascido para proteger a companhia de
ofertas hostis inesperadas e prejudiciais, dessa forma acaba por atender
interesses outros (nomeadamente, dos acionistas controladores).

Com efeito, se é verdade que o uso das medidas defensivas


como forma de entrincheirar os administradores é condenado na experiência
estrangeira, a transposição desse raciocínio para o cenário brasileiro, em
que o problema de agência estabelece-se primordialmente entre acionista
controlador e não controlador, equivaleria a dizer que é igualmente
condenável a utilização da poison pill como forma de “entrincheirar” o
controlador.

266
C f. Re lató r io d i v ul g ad o p e la B M & F - B o ve sp a , d i sp o n í vel [ o n - lin e] in
h ttp : // w w w.b mfb o v esp a . co m.b r/ emp re sa s/d o wn l o a d /C la u su la s- d e- P ro te ca o - C ia s- No vo -
Me rca d o . xl s [ 0 3 .0 1 .2 0 1 1 ] .
267
É o caso , p o r e x e mp l o , d as se g ui n te s co mp a n hi a s: H elb o r E mp r ee n d i me nto s S. A.,
I np a r S . A. e T P I – T r iu n fo P ar ti cip a çõ e s e I n ve s ti me n to s S. A.
268
M. C AR V AL H OS A, A s p o iso n p il l s... ci t. ( n t. 2 0 5 , su p ra ) , p . 2 1 .
131
Entretanto, a transposição de qualquer conclusão estrangeira
ao cenário brasileiro deve ser feita com cuidado, ante as peculiaridades
locais. Na busca de um mercado acionário disperso, o que contribuiria para
sua maior liquidez, não seria fácil convencer os acionistas brasileiros a
abrir mão daquele objeto de desejo, o controle. A doutrina aponta que o
controlador pode deixar de abrir o capital da companhia, ainda que tal
medida lhe seja benéfica, se isso custar-lhe o poder de comando. 269

Assim é que mecanismos como a emissão de ações


preferenciais sem direito de voto, ou como a recente poison pill, atuam no
sentido de facilitar o processo de dispersão acionária, na medida em que
permitem a manutenção do poder de controle com parcela reduzida do
capital social.

Desse modo, a previsão de poison pill não parece, ao menos em


princípio, ilegal ou passível de rechaça. É verdade que a sua previsão
mostra um excesso de zelo das companhias brasileiras, que ainda não estão
inseridas num contexto de mercado pelo controle acionário, como acontece
em economias como a norte-americana e a inglesa.

Em tais economias, a quantidade de ofertas hostis fez com que


os acionistas e as companhias se mobilizassem na busca de proteção. Nos
Estados Unidos da América, a resposta veio com o disclosure e, em nível
estadual, com a admissibilidade da utilização de mecanismos de defesa, que
a criatividade forense não tardou a desenvolver. Já no Reino Unido, a
resposta foi a previsão da oferta obrigatória imposta àquele que adquira
30% ou mais do capital votante da companhia.

269
Ne ss e se nt id o , E . S . MU NH O Z, De sa f io s d o d ir ei to so ci etá rio b ra si lei ro n a
d is cip lin a d a co mp a n h i a a b erta : a va l ia çã o d o s s i ste ma s d i lu íd o e c o n cen t ra d o , i n
Di re ito S o ci etá rio – De sa f io s A tu a i s, co o r d . R . R . M . C AST R O e L. S . AR AG ÃO, S ão
P au lo , Q u ar t ier L at i n, 2 0 0 9 , p . 1 3 6 ; L. A. B E B C HU K, A R en t- P ro t ect io n Th eo r y o f
Co rp o ra te O wn e r sh ip a n d Co n tro l, i n Ha r va rd La w S ch o o l – Jo h n M. Ol in Cen te r fo r
La w, E co n o mi c s, a n d B u sin es s Di scu s sio n P a p er n. 2 6 0 , 1 9 9 9 , p . 3 0 , d isp o n í ve l [ o n -
lin e] in h ttp : / /w w w. la w.h a rva rd .ed u /p ro g ra m s/o lin _ cen t e r/p a p er s/p d f/2 6 0 .p d f
[ 0 3 .0 1 .2 0 1 1 ] .
132
Para C. K. Z A N IN I 270, entretanto, o uso da poison pill como
forma de manutenção do controle atual da companhia, mais do que um
desvirtuamento, seria antijurídico.

Para o autor, a pílula teria por conseqüência conferir


tratamento desigual entre acionistas da mesma classe, em afronta ao
disposto no artigo 109, §1º, da lei. 271 Essa desigualdade decorreria do fato
de que a presença da pílula impediria que qualquer outro acionista que não
o controlador possuísse participação acionária acima do limite previsto
como gatilho. Com isso, ficaria impedida também a formação de minorias
expressivas, entendidas como aquelas capazes de utilizar dos mecanismos
legais a elas conferidos.

Apesar da respeitável opinião do autor, capaz de apontar com


crueza os aspectos menos benéficos da poison pill, com ele não
concordamos integralmente. Embora seja verdade que a presença da pílula
dificulta a aquisição, por um único acionista ou grupo de acionistas, de
percentual acima do valor estipulado como gatilho, ela não impede a
formação de grupos relevantes de acionistas, os quais podem ser
alinhavados até mesmo por meio de acordo. Conforme já assinalado por J.
A. T. G U ER R E IR O :

“há minorias e minorias, dispersas e pouco coesas


umas, organizadas e arregimentadas outras, sendo
que, no último caso, os instrumentos de
aglutinação que a lei propõe (e aqui sempre me
refiro à Lei 6.404) vão desde a criação de classes
de ações ordinárias, com prerrogativas próprias
(...) até a institucionalização de acordos de
acionistas, destinados a regular a compra e venda

270
A p o iso n p i ll b ra s il ei ra : d esv ir tu a men to , a n ti ju rid ic id a d e e in efi ci ên cia , in Te ma s d e
Di re ito S o ci etá rio e E m p re sa ria l Co n t emp o râ n e o , co o r d . M. V. AD AM E K, São P a ulo ,
Mal h eir o s, 2 0 1 1 , p p . 2 5 6 -2 5 7 , e m e sp eci al p p . 2 6 4 -2 7 0 .
271
Ar t. 1 0 9 , § 1 º As a çõ e s d e cad a cl a ss e co n f er ir ã o i g uai s d ir e ito s ao s s e u s t it u lar es .
133
de ações, a preferência para adquiri-las e o direito
de voto”. 272

Com relação aos acionistas reunidos por meio de acordo,


porém, vale ressaltar que os estatutos das companhias que adotam a poison
pill normalmente trazem definição própria de “Acionista Adquirente”, para
fins de enquadramento na pílula, que inclui não só o acionista
isoladamente, mas também aqueles agrupados por meio de acordo de votos,
especificamente. 273 Assim, se da reunião dos acionistas signatários do
acordo de votos resultar participação igual ou superior ao montant e
definido como gatilho, tais acionistas também precisarão lançar oferta
pública, nos termos da pílula.

Apesar de causar estranheza pela sua rigidez, essa regra tem


por finalidade evitar burlas à própria poison pill. Com efeito, se assim não
fosse, seria simples escapar das obrigações impostas pela pílula: bastaria
que o interessado em adquirir ações em montante superior ao do gatilho
recorresse ao uso de “testas de ferro”, todos arregimentados por meio de
acordo de voto, mas cada qual isoladamente sendo titular de quantidade de
ações inferior ao gatilho da pílula.

Ora, se o objetivo da poison pill é evitar a tomada de controle


indesejada, sem negociação e sem divisão do prêmio pelo controle entre
todos os acionistas 274, admitir a situação acima descrita seria tornar a pílula
sem efeito.

272
Di re ito d a s M in o ria s n a S o cied a d e A n ô n ima , i n R evi s ta d e D ir ei to Me rca n ti l 6 3
(1986), p. 107.
273
Red ação co mu m no s e s tat u to s d a s co mp a n hi as q ue ad o t a m a p o i so n p i l l é a s e g ui n te:
“Ac io ni st a Ad q u ir e n te” si g n i fi ca q ua lq uer p e s so a ( i n cl u i nd o , e xe mp li f ica ti v a me nt e,
q ua lq uer p e s so a na t ur a l o u j ur íd ic a, f u nd o d e in v e st i me n to , co nd o mí n io , car tei r a d e
tít u lo s, u ni ver s al id ad e d e d ir ei to s, o u o u tr a f o r ma d e o r g a niz ação , r es id e nt e, co m
d o micí lio o u co m sed e no B r a si l o u no e xte r io r ) , o u gr up o d e p e s so a s vi n c ulad a s p o r
aco r d o d e vo to co m o Acio n is ta Ad q uir e nte e/o u q ue a t ue r ep r e se n ta nd o o me s mo
in ter es s e d o Acio n i sta Ad q u ir e n te, q ue ve n h a a s ub scr e v er e/o u a d q u ir ir a çõ e s d a
Co mp a n h ia. ( Red ação r e tir ad a d o E st at u to d e M. Dia s B r an co S. A. I nd ú s tr ia e Co mér cio
d e Ali me n to s)
274
N u nca é d e ma i s r e co r d ar a o b ser va ção j á me n c io n ad a d e A. M. C O R D E I R O , d e q u e a
to mad a d e co n tr o l e p o r me io d a aq u is ição d e p a r cel a mi no r i tár ia d o cap ita l so cia l é u m a
d as fo r ma s ma i s i n sid io sa s d e ta keo v e r ( c f . A OP A es ta tu tá ria . .. c it . ( nt . 1 0 2 , su p ra ) ,
p p .1 4 0 -1 4 1 ) .
134
Essa a razão de estender-se a obrigação de realizar oferta
pública também aos acionistas que, aglutinados em acordo de voto,
conjuntamente, venham a adquirir ou deter percentual igual ou superior ao
do gatilho.

Isso, contudo, não invalida o argumento aqui apresentado (de


que, ainda com a pílula, é possível a formação de minorias expressivas).
Isso porque a idéia do agrupamento é arregimentar acionistas em número
suficiente para o exercício de direitos conferidos pela lei – tais como
solicitar o procedimento de voto múltiplo ou requisitar informações à
administração – e não formar um bloco para votar concertadamente.

Note-se, porém, que a lei não exige forma escrita para o acordo
de acionistas, de modo que mesmo o acordo verbal de votos configuraria
acordo de voto. O que se defende aqui, entretanto, não é a aglutinação de
acionistas para votarem em conjunto, mas tão-somente para poderem se
valer dos expedientes legais a eles atribuídos.

O agrupamento de acionistas para pleitear o procedimento d e


voto múltiplo, por exemplo, não pode ser entendido como acordo de votos.
Em primeiro lugar, porque voto aí não há, mas apenas a solicitação de um
procedimento previsto na lei. Em segundo lugar, entender que mero
agrupamento de acionistas, por si só, já desencadearia a oferta pública da
pílula, mais que draconiano, seria sim ilícito, visto que nesse caso o
estatuto estaria criando obstáculos ao exercício de direitos legalment e
previstos.

É regra basilar de hermenêutica jurídica aquela segundo a qual


o intérprete deve sempre buscar o sentido que confira ao texto utilidade,
preferindo a interpretação de que resulte sentido lícito à outra, cujo sentido
pode ser considerado ilícito.

Mais: toda regra que traz em si uma restrição de direitos deve


ser interpretada estritamente. 275 Ora, as disposições estatutárias dizem

275
C. M AXI MI LI AN O, H er men êu ti ca e A p l ica çã o d o D ir ei to , 1 9 ª ed ., R io d e J a n eir o ,
Fo r e n se, 2 0 1 0 , p p . 1 3 4 - 1 3 5 e p p . 1 8 3 e s s.
135
claramente que configura “Acionista Adquirente” o agrupamento selado por
meio de acordo de votos. Qualquer outro tipo de agrupamento, portanto,
está fora da definição.

Assim como no caso de controle majoritário não é possível a


alienação do poder de controle sem o devido rateio do prêmio entre todos
os acionistas, a pílula visa a trazer a mesma regra de tratamento no caso de
alienação de participações expressivas, sobretudo num contexto de controle
minoritário (ou difuso, como prefere a nomenclatura do Novo Mercado).

Vale ressaltar ainda que o menor gatilho utilizado pelas poison


pills brasileiras está no patamar de 10%. Ou seja, é a aquisição de ações em
patamar igual ou acima desse percentual que enseja a realização de oferta
pública.

A Lei das Sociedades por Ações prevê uma série de


prerrogativas e direitos aos acionistas detentores de determinado percentual
de ações, tais como convocar assembléia-geral, eleger membro do conselho
fiscal, solicitar informações aos administradores etc. Com menos de 10%
das ações votantes, é possível gozar de várias dessas prerrogativas, mas
não de todas, como é o caso, por exemplo, do previsto no artigo 141, §4º, I,
pelo qual é dado aos acionistas detentores de mais de 15% do capital
votante eleger membro e suplente do conselho de administração, ou do
previsto no caput do artigo 141, pelo qual acionistas representantes de 10%
do capital social votante podem solicitar o procedimento de voto
276- 277
múltiplo.

276
§ 4 o T er ão d ir e ito d e ele ge r e d e st it u ir u m m e mb r o e se u s up l e nte d o co n se l ho d e
ad mi ni s tr aç ão , e m vo ta ção e m s ep ar ad o n a a s se mb léi a - ger a l, e x cl u í d o o acio ni st a
co n tr o l ad o r , a ma io r i a d o s ti t ul ar e s, r e sp ec t iv a me n te : ( Red ação d a d a p el a L ei nº
1 0 .3 0 3 , d e 2 0 0 1 )
I - d e açõ es d e e mi s são d e co mp a n hi a ab er ta co m d ir ei to a vo to , q ue r e p r es e nte m, p elo
me no s, 1 5 % ( q u i nze p o r ce nto ) d o to t al d a s a çõ es co m d ir e ito a vo to ; e ( I nc l uíd o p el a
L ei nº 1 0 .3 0 3 , d e 2 0 0 1 )
277
Ar t. 1 4 1 . Na ele ição d o s co n se l hei r o s , é fa c ul ta d o ao s a cio n is ta s q ue r e p r es e nte m, no
mí n i mo , 0 ,1 ( u m d éc i mo ) d o cap ita l so c ia l co m d ir ei to a vo to , e stej a o u não p r e vi s to no
es tat u to , r eq uer er a ad o ção d o p r o c es so d e v o to mú l tip lo , a tr ib u i nd o - se a cad a aç ão
ta nto s vo to s q u a nto s s ej a m o s me mb r o s d o c o n se l ho , e r eco n he cid o ao ac io ni st a o
d ir ei to d e c u mu l ar o s vo to s n u m só ca nd id a to o u d is tr ib u í - lo s e ntr e vár io s.
136
A escolha de gatilho em percentual baixo, entretanto, não
invalida o argumento apresentado. Podemos apresentar duas objeções à
idéia de que a poison pill brasileira impede a formação de minorias
relevantes.

A primeira delas é fática: a maior parte das companhias


brasileiras que adotam a pílula opta por gatilho superior a 10%, sendo a
média 20%, de modo que a formação de minorias expressivas não fica
prejudicada. Aliás, de se ressaltar que apenas três companhias, das 112
listadas atualmente no Novo Mercado da BM&F-Bovespa, estipulam gatilho
nesse patamar. 278

A segunda objeção é jurídica: deve-se notar que os direitos


conferidos pelo artigo 141 (caput e §4º, I) são outorgados não a um
acionista isolado, mas ao conjunto de acionistas que, juntos, detenham o
percentual do capital social votante exigido. Logo, continua valendo o
argumento apresentado acima de que as possíveis limitações impostas pela
poison pill podem ser contornadas por meio do agrupamento dos acionistas
minoritários.

Já É. G O R G A aponta que a adoção de poison pill em


companhias com controlador definido (majoritário) parece ser fruto da má
orientação dos controladores sobre os efeitos da pílula. 279

Acreditamos que o objetivo seja, em verdade, estabilizar o


controle no caso de ocorrer a saída do controle majoritário para minoritário
e, como apontado linhas acima, não vemos isso como prejudicial. De fato,
numa companhia com controle majoritário, não é necessário o recurso às
defesas contra oferta hostil de tomada de controle, haja vista que a
tentativa de takeover seria barrada pela simples negativa do controlador em
aceitar a oferta.

Essa constatação parece ser o fundamento da afirmação de É.


G O R G A . Isso e o fato de que a presença da poison pill, em tais casos,

278
C f. T ab ela 1 , no Cap ít u lo 4 .
279
Ch a n g in g th e… ci t. ( n t. 2 5 0 , su p ra ) , p p .4 8 1 -4 8 2 .
137
poderia interferir com interesses particulares do próprio controlador, que
teria dificuldade em negociar o controle, quando isso fosse de seu
interesse.

Com efeito, ao tornar a tomada de controle mais onerosa, ainda


que o ofertante amigavelmente negociasse a aquisição do poder de comando
da companhia com o seu controlador majoritário, não conseguiria escapar
da oferta prevista na poison pill. Ao menos, em princípio.

Se for da vontade do controlador a alienação, ele poderia


convocar assembléia-geral extraordinária para reformar o estatuto da
companhia, retirando a pílula. Estaria, entretanto, impedido de votar, haja
vista a existência de conflito de interesses. A alteração estatutária somente
seria levada a cabo pelo voto dos demais acionistas, todos orientados pelo
interesse social, conforme a lei.

Em princípio, a alienação do controle, nesses moldes, não


prejudicaria os demais acionistas, minoritários, visto que, quer pela lei
(artigo 254-A), quer pelo Regulamento de Listagem do Novo Mercado, eles
participariam do prêmio do controle, sendo que no último caso (Novo
Mercado) participariam em igualdade de condições com o controlador. De
todo modo, a decisão final sobre a remoção da pílula estaria nas mãos dos
acionistas minoritários.

Já no caso de controle minoritário, a pílula pode sim servir de


estabilização do poder de controle. Isso, porém, é um efeito secundário. O
efeito principal da pílula é proteger os acionistas de tomada de controle
indesejada, ou mesmo evitar que o controle seja adquirido sem que tenha
havido pagamento de qualquer contrapartida aos demais acionistas.

Nesse cenário, do mesmo modo, a pílula não impede o


takeover. Se a tomada do controle for do interesse dos acionistas
representantes da maior parte do capital social, igualmente poderão
convocar assembléia para a retirada da poison pill do estatuto. Ressalte-se,
aliás, que a retirada da pílula pode acontecer até mesmo ao arrepio da
vontade de eventual controlador minoritário, visto que este não possui a

138
maior parte do capital social, não conseguindo, sozinho, barrar a remoção
da pílula.

Por outro lado, se a tomada do controle não for do interesse d a


maioria, ainda que seja do interesse do controlador minoritário, a pílula
não será removida, de modo que o ofertante será levado ou a desistir da
empreitada, ou a arcar com os custos decorrentes da poison pill. Dos dois
modos, garante-se o atendimento do interesse da companhia, este sempre
entendido segundo a ótica contratualista.

O que não se pode admitir é que a poison pill leve ao


engessamento da atividade empresarial, impedindo a ocorrência de
negócios muitas vezes interessantes e até mesmo necessários às
companhias. Nesse ponto, concordamos com M. C A R V A LH O S A . 280

Isso, todavia, é o que tem acontecido, mas não por conta da


pílula em si, mas sim por causa da cláusula acessória normalmente a ela
aposta, e que costuma ser equivocadamente referida como cláusula pétrea.

Exemplificativamente, em dezembro de 2008, a Positivo


Informática S.A. recebeu proposta de aquisição de ações formulada po r
Lenovo (fabricante de microcomputadores chinesa), oferecendo R$18,00
por ação, 281 quando estas estavam sendo negociadas na BM&F-Bovespa por
R$5,00. Porém, a Positivo Informática possuía em seu estatuto a poison
pill, prevendo que aquele que adquirisse mais de 10% de suas ações deveria
lançar oferta aos demais acionistas, pelo valor correspondente à cotação
máxima atingida nos últimos 24 meses, o que equivaleria, na época, à
R$47,15. A Lenovo não estava disposta a arcar com tamanha despesa, e
esperava que os controladores da companhia-alvo eliminassem a poison pill
de seu estatuto. O problema, contudo, é que o estatuto da Positivo
Informática S.A. possuía a previsão de que a remoção da poison pill

280
M. C AR V AL H OS A, A s p o iso n p il l s... ci t. ( n t. 2 0 5 , su p ra ) , p . 2 1 .
281
C f. Fato Rel e va n te d i v ul g ad o p o r P o s iti vo I n f o r mát ica S. A. e m 1 7 d e d eze mb r o d e
2 0 0 8 , d i sp o ní ve l [ o n - lin e] i n w w w.c vm .g o v.b r.
139
somente seria possível se realizada a oferta nela prevista. O negócio, então,
não foi concluído. 282

Situação similar foi vivenciada por Klabin Segall. Seu


estatuto, além de prever a pílula de veneno estipulando gatilho de 15%,
possuía previsão que tornava a pílula espécie de cláusula pétrea: por tal
dispositivo, no caso de votação para remover a poison pill, os acionistas
que votassem a favor da exclusão ficariam obrigados a lançar oferta pública
para adquirir 100% das ações da companhia, pelo preço nela definido.

Klabin Segall tentou vender 15% de suas ações à gestora de


recursos Polo Capital. Esta, porém, já possuía ações da Klabin, de modo
que se adquirisse os 15% ofertados, dispararia o gatilho da poison pill
prevista no estatuto. A solução encontrada foi a Polo Capital desfazer-se de
seus papéis, antes de proceder à nova aquisição. 283

Vê-se, assim, que a situação fica ainda mais grave nos casos,
comuns entre as companhias brasileiras, em que a poison pill é consignada
como verdadeira cláusula pétrea no estatuto social, de modo que não podem
ser demovidas, ainda que os acionistas, em sua maioria, assim queiram. A
cláusula pétrea funciona como um desestímulo à retirada da poison pill,
diante da previsão que contém: prevê que, havendo a alteração ou a
exclusão da pílula, o acionista que tiver votado favoravelmente fica
obrigado a lançar a oferta de aquisição de ações prevista na cláusula de
poison pill aos demais acionistas.

Tal mecanismo, apesar de não vedar absolutamente a retirada


da poison pill, torna esse recurso proibitivo, ante o elevado ônus que impõ e
aos acionistas: a realização da oferta pública. A previsão somente seria
neutralizada no caso de votação unânime pela exclusão da pílula, pois
assim todos os acionistas seriam ofertantes, não restando ações para

282
No t íc ia d e E . T AV ARE S, Um a n tíd o to p a ra a s p ílu la s d e v en en o , i n R e vi sta E xa m e ,
1 0 .1 1 .2 0 0 9 , d i sp o ní ve l [ o n - lin e] i n h ttp : // ex a me.a b ri l.co m.b r/ seu - d i n h ei ro /n o tic ia s/
a n tid o to - p i lu la s- v en en o - 5 1 1 0 7 4 [ 0 3 .0 1 .2 0 1 1 ] .
283
Re tir ad o d a no tí ci a d e G. F OG AÇ A, Um ve n en o p a ra o s n eg ó c io s ? , i n R ev is t a
E xa me , 0 1 .1 0 .2 0 0 9 , d isp o n í ve l [ o n - l in e] i n h ttp : / /a p p .e xa me .a b r il .co m.b r/ r evi s ta -
exa me /ed ico e s /0 9 5 3 / fin a n ca s /n o t icia s /ven en o - n e g o cio s- 5 0 1 9 6 8 ? p a g e =1 [ 0 3 .0 1 .2 0 1 1 ] .
140
aderirem à oferta. Is so equivale a dizer que, por via indireta, estabelece-se
quorum qualificado, acima do legal, para a alteração estatutária. Em
verdade, mais do que quorum qualificado, demanda-se a unanimidade, em
clara violação à Lei das Sociedades por Ações.

A lei acionária admite a elevação do quorum legal apenas para


as companhias fechadas. É o que se depreende do artigo 129, caput e §1º 284,
reforçado pelo disposto no artigo 136 da lei 285.

Em face disso, é forçoso reconhecer a ilicitude da cláusula que


torna a poison pill praticamente imutável, seja pelo seu teor prejudicial a
companhia, que se vê muitas vezes privada de realizar negócios benéficos
ao seu interesse, seja pela violação direta de dispositivos da Lei das
Sociedades por Ações.

Esse potencial prejudicial da poison pill foi especialmente


notado com a crise de 2008, quando o mercado experimentou acentuada
diminuição de liquidez, além do aumento do custo do capital. Com isso, a
saída para as companhias necessitadas de capital seria a busca por novos
investidores. Porém, a presença de poison pill nos estatutos de muitas das
companhias listadas fechou as portas para essa alternativa, visto que os
potenciais investidores sentiram-se desmotivados a investir em tais
companhias, ante as restrições impostas pela pílula. 286

Ora, nem mesmo nos Estados Unidos da América, em que os


mecanismos de defesa contra a tomada de controle são largamente

284
Ar t . 1 2 9 . As d el ib er a çõ es d a as se mb lé ia - g er al , r es sa l vad a s a s e x ceçõ es p r e vi s ta s e m
lei, ser ão to mad a s p o r ma io r i a ab so l ut a d e v o to s, não se co mp uta n d o o s vo to s e m
b r an co .
§ 1 º O est at u to d a co mp a n h ia fe c had a p o d e au me n t ar o q uo r u m e x i gid o p ar a cer ta s
d elib er açõ es , d e sd e q u e esp e ci f iq ue as ma tér i a s. ( ...)
285
Ar t. 1 3 6 . É nec e ss ár i a a ap r o vaç ão d e ac io ni s ta s q ue r ep r es e nte m me tad e , no
mí n i mo , d a s açõ e s co m d ir ei to a vo to , se ma io r q u o ru m não fo r e x i gid o p elo e s ta t uto d a
co mp a n hi a c uj a s a çõ e s não e stej a m ad mi t id a s à n e go ci ação e m b o ls a o u no mer c ad o d e
b alcão , p ar a d e lib er ação so b r e : ( .. .) .
286
So b r e, v. J . L. S. F RE I RE e A. C. S. F RE I RE , L iv re s d a s p o i so n p il l s, i n R e vi sta
Ca p i ta l A b e r to 64, ano 6 (2008), d isp o n í vel [ o n - lin e] in
h ttp : // w w w.ca p ita la b e rt o .co m.b r/ le r_ a rt ig o .p h p ? p a g =2 &i = 2 2 9 8 &s ec =5 6 [ 0 3 .0 1 .2 0 1 1 ] .
141
admitidos e utilizados, admite-se que a técnica defensiva impeça
287
absolutamente a ocorrência do takeover.

Foi nesse momento que muitas das companhias abertas


brasileiras começaram a rever a inclusão de poison pill em seus estatutos,
optando por retirá-las ou, ao menos, por flexibilizar o seu uso.

Em face de todo o exposto, defendemos que a utilização da


poison pill à brasileira não está, em princípio, vedada pela legislação
nacional. A pílula não engessa o andamento social, pois não impede em
caráter absoluto a tomada de controle, apenas a torna mais dificultosa.
Como defendido por A. M. C O R D E IR O , a OPA estatutária não veda a tomada
de controle, mas sim impede a mais valia representada pela aquisição da
companhia por parcela de seu valor, 288 como ocorreria caso fosse possível
adquirir o controle da sociedade com menos da metade do capital social
votante (controle minoritário), sem precisar estender a oferta aos demais
acionistas.

Não obstante o entendimento acima esposado, sustentamos que


a previsão estatutária do que se convencionou denominar cláusula pétrea é
ilegal. Isso porque, além de retirar dos acionistas, reunidos em assembléia-
geral (considerado órgão soberano da companhia) 289, a decisão sobre a
mantença da pílula de veneno no estatuto da companhia, violando
dispositivos da Lei das Sociedades por Ações, impede a realização de
negócios benéficos e em sintonia com o interesse da companhia. Essa é
também a conclusão de M. C A R V A LH O S A . 290

287
Co n fo r me fi co u d ecid i d o na d ec is ão d a ap el a ção , j ul g ad a p el a S up r e ma Co r te d e
Del a wa r e e m 1 9 8 5 , no caso Mo ra n v. Ho u s eh o ld I n t ern a tio n a l, I n c. ( 5 0 0 A.2 d 1 3 4 6 –
Del . 1 9 8 5 ) .
288
A OP A e sta tu tá r ia ... ci t . ( n t. 1 0 2 , su p ra ) , p . 1 4 1 .
289
F. K. CO MP AR AT O, O p o d er d e Co n t ro l e... ci t. ( n t. 2 , su p ra ) , p . 1 7 .
290
“As p o i so n p il ls são cl áu s u la s e st at u tár ia s d e r ela ti v a o u co mp let a i le ga lid ad e. Sã o
ile g ai s a p ar tir d o mo me nto e m q u e ad q u ir e m f e i çõ es d e clá u s u la s ‘p é tr e as ’, q ua nd o , n a
ver d ad e, tr at a - se d e no r ma s j ur íd ica s d e c ar á ter p ar as so c ia l. N es se se n ti d o , as c lá u s ul as
d e p o iso n p i ll s, q ua nd o tê m o car á ter d e p er p et uid ad e, a p ar tir d e se u asp e cto p u ni ti vo
d a o b r i g ato r ied ad e d e r eal iza ção d e o fer ta p úb l ica p o r p ar te d o ac io ni s ta q ue vo t ar no
se n tid o d e a lt er á - la o u ex cl u í -l a d o es tat u to so cia l, d e mo n str a m cl ar a me n te a i nte n çã o
ile g ít i ma e a nt ij ur íd i ca d e p er p et uar a ad mi n i str ação d a co mp a n h ia, ai n d a q ue e sta sej a
142
Corroborando com essa conclusão, há o Parecer de Orientação
o
da CVM n 36, de 23 de junho de 2009, do qual se falará em seguida, além
da recentemente aprovada alteração no Regulamento de Listagem do Nov o
Mercado, que veda esse tipo de previsão (v. item 3.3.2, infra).

A ilegalidade da cláusula pétrea contribui ainda mais para o


caráter não absoluto da poison pill brasileira. Ao ser permitida a retirada
da poison pill pelos acionistas da companhia-alvo, garante-se a
possibilidade de celebração de negócios amigáveis e benéficos à
companhia.

É verdade que a forma mais eficiente de se obter o mesmo


resultado seria a própria cláusula de poison pill prever o seu afastamento
episódico, quando assim fosse decidido quer pelos acionistas, reunidos em
assembléia, quer pelos administradores, em deliberação do conselho de
administração.

Aliás, a intervenção dos administradores parece boa solução


para o eficaz desempenho da pílula.

Não é à toa que o conselho de administração é órgão


obrigatório na companhia aberta: sua existência, além de ser indício de que
o legislador procurou prestigiar o órgão nas companhias abertas, decorre da
necessidade de haver representantes dos acionistas congregados em órgão
colegiado para tomar decisões de forma mais célere e informada. De fato,
essa preocupação estava presente na elaboração do projeto de lei qu e
culminou na atual Lei das Sociedades por Ações, como se lê em su a
Exposição de Motivos. 291

Ora, se toda decisão negocial da companhia dependesse da


convocação de assembléia-geral para deliberação, ainda mais em
companhias abertas, cujo pressuposto é a existência de grande corpo

ele ita p o r u m co ntr o lad o r mi no r it ár io ” ( c f. A s p o iso n p i ll s.. . cit . ( n t. 2 0 5 , su p ra ) , p .


29).
291
A o b r i gato r ied ad e d o c o n se l ho d e ad mi n i str açã o n as co mp a n h ia s ab er t as j u st i fic a - se
“p o r q u e o Co n se l ho d e Ad mi n is tr a ção é ma i s r e p r es e nta ti vo d a As s e mb l éia Ger al, p o i s
ne le te m a ss e nto a ss e g u r ad o r ep r e s e nta n te s d a mi n o r i a” ( E xp o s ição d e Mo ti vo s n o 1 9 6 ,
d e 2 4 d e J u n ho d e 1 9 7 6 , d o Mi n i stér io d a F aze n d a) .
143
acionário, disperso e espalhado por várias localidades, o andamento social
restaria comprometido.

Assim como a democracia indireta determina a eleição de


representantes do povo para a gestão da coisa comum, a sociedade anônima
é composta por órgão representativo dos acionistas, que diretamente elegem
seus representantes no conselho de administração. 292

O conselho de administração surge da necessidade de um corpo


intermediário de poder nas médias e grandes empresas. Medeia a
assembléia-geral, composta apenas por acionistas, e a diretoria, órgão
executivo.

Conforme aumentou a complexidade das medidas tomadas pela


sociedade, houve maior transferência de poderes da assembléia-geral para o
conselho, relativizando aquela idéia de que a assembléia-geral é o órgão
soberano da sociedade (apesar de essa idéia ainda estar fortemente presente
na lei acionária). O caráter colegiado do conselho de administração, aliás,
tem como função a proteção dos acionistas, que perderam parte do poder
que possuíam na assembléia para o conselho.

Assim é que a própria lei transfere ou permite a transferência


de competências originariamente atribuídas à assembléia-geral para o
conselho de administração, naquelas companhias em que o órgão existe. É o
caso emblemático da eleição dos diretores (artigo 142, II) e da
possibilidade de emissão de ações ou bônus de subscrição (artigo 142, VII),
nas companhias com capital autorizado (em que a existência do conselho de
administração também é obrigatória). 293

292
F. K. CO MP AR AT O, O p o d er d e Co n t ro l e... ci t. ( n t. 2 , su p ra ) , p p . 1 6 e s s.
293
Ci te m- s e ai nd a o s r e cé m- a l ter ad o s § § 1 º e 2 º do ar ti go 5 9 d a L ei d as So c ied ad e s p o r
Açõ e s: Ar t. 5 9 . A d el ib er ação so b r e e mi s s ão d e d eb ên t ur e s é d a co mp et ên cia p r i va ti va
d a a ss e mb l éia - g er a l, q u e d e ver á fi x ar , o b ser v a d o o q u e a r e sp ei to d is p u ser o e sta t uto :
( ...)
§ 1 º Na co mp a n h ia ab er ta, o co n se l ho d e a d mi ni str ação p o d er á d e lib er ar so b r e a
e mi s são d e d eb ê n t ur e s não co n v er sí ve i s e m aç õ es, i nd ep e nd e nte me nt e d e d isp o si ção
es tat u tár ia, e a a s se m b léi a g er a l p o d e d ele gar ao co n se l ho d e a d mi ni str ação a
d elib er aç ão so b r e a s co nd i çõ e s d e q ue tr at a m o s i nc i so s VI a VI I I d o ca p ut e so b r e a
o p o r t u nid ad e d a e mi s sã o . ( Red a ção d ad a p e la Med id a P r o v i só r i a nº 5 1 7 , d e 3 0 d e
d eze mb r o d e 2 0 1 0 )
144
Nesse passo, cumpre ressaltar que a competência para afastar a
oferta pública prevista estatutariamente na forma de poison pill não é
originária do conselho de administração. À administração da companhia
competem, em princípio, apenas os atos de gestão ordinária, representada
pela fórmula “orientação geral dos negócios da companhia” (artigo 142, I).

Assim, a competência para afastar ou suprimir obrigação


estatutariamente prevista compete originariamente aos acionistas, reunidos
em assembléia-geral.

Essa atribuição encontra fundamento legal na competência para


a reforma estatutária, conferida aos acionistas. Ora, se é permitido aos
acionistas reformar o estatuto, suprimindo ou criando cláusulas das quais
decorram obrigações, com muito mais razão é dado aos mesmos acionistas a
possibilidade de simplesmente afastar a obrigação estatutariamente
294
imposta. É mera aplicação da regra de hermenêutica segundo a qual quem
pode o mais, pode o menos (in eo quod plus est semper inest et minus). 295

A competência para a reforma do estatuto é privativa da


assembléia-geral (artigo 122, I). Não comporta, pois, delegação, nem pode
ser afastada pela vontade das partes (norma de ordem pública).

Já o afastamento episódico de obrigações apenas


estatutariamente previstas não implica a reforma estatutária, nem desatende
a nenhum preceito de ordem pública. Isso porque a obrigação assim
prevista é fruto da vontade dos acionistas consignada no estatuto social.

Se, em princípio, a competência para afastar esse tipo de


obrigação é dos acionistas (responsáveis pela inserção da obrigação no
estatuto), nada impede que os próprios acionistas deleguem-na a outro
órgão, como é o caso do conselho de administração.

§ 2 o O es ta t uto d a co m p an h ia ab er t a p o d er á a uto r iz ar o co n se l ho d e ad mi ni s tr aç ão a
d elib er ar so b r e a e mi s s ão d e d eb ê nt u r e s co n ver sí v ei s e m a çõ e s, e sp ec i f ica nd o o l i mi te
d o au me nto d e cap it al d eco r r e n te d a co n ver sã o d as d eb ê nt ur es , e m v alo r d o c ap i tal
so c ial o u e m n ú me r o d e açõ e s, e a s e sp éc ie s e cl as se s d a s açõ es q ue p o d er ão s er
e mit id a s. ( R ed aç ão d ad a p ela Med id a P r o vi só r ia nº 5 1 7 , d e 3 0 d e d e ze mb r o d e 2 0 1 0 )
294
No te - se q u e e sta mo s aq ui no ca mp o a f eto à a ut o no mi a p r i v ad a, e m q u e as r e gr as são
d isp o s iti v a s.
295
So b r e, v. C. M AXI MI L I AN O, He rmen êu t ica .. . cit. ( nt. 2 7 5 , su p ra ) , p p . 2 0 0 -2 0 1 .
145
Veja-se que, mesmo admitindo essa delegação, não se retira
dos acionistas a palavra final sobre o sucesso da oferta de aquisição de
ações a eles apresentadas. Afinal, são os acionistas os destinatários dela,
pois são eles os titulares das ações visadas. Ademais, a eles sempre
continuará a pertencer a competência – privativa – para a reforma do
estatuto.

Entretanto, apenas pequena parcela das companhias brasileiras


com poison pill prevê a intervenção do conselho de administração no
processo da oferta pública. E mesmo assim, a atribuição que conferem ao
conselho não é a de neutralizar a pílula, mas sim de avaliar a oferta
realizada pelo adquirente por imposição da pílula. É o caso do Estatuto
Social da BM&F-Bovespa e da CETIP S.A., por exemplo.

Como única exceção, o estatuto da Brasil Insurance


Participações e Administração S.A. prevê expressamente, em seu artigo 38,
§13, a possibilidade de o conselho de administração dispensar o adquirente
de realizar a oferta pública. Interessante notar que a companhia citada
abriu seu capital recentemente, no fim de outubro de 2010. Talvez esse seja
um indicativo da mudança do perfil das defesas adotadas pelas companhias
brasileiras.

Outra parcela reduzida das companhias listadas no Novo


Mercado prevê expressamente a possibilidade de os acionistas deliberarem
a exclusão da pílula, como é o caso de BR Properties S.A. e de Bematech
S.A., sendo que alguns estatutos prevêem quorum qualificado para a
alteração da cláusula, como é o caso, por exemplo, da Cia. Hering (dois
terços). 296

Quanto à última modalidade de cláusula, apesar de não impedir


a alteração estatutária, entendemos que igualmente viola a lei, pois impõ e
quorum qualificado para a alteração estatutária, superior ao legal (que é de
maioria absoluta, cf. artigo 129 da lei), o que não é permitido pela Lei das

296
No to t al, 1 2 co mp a n h ia s p o ss u e m e s se t ip o d e d isp o s iti v o . So b r e o s d ad o s ap o n tad o s,
r e met e - se à s T ab e la s 1 e 2 , no Cap í t ulo 4 , in f ra .
146
Sociedades Anônimas. É, portanto, ilegal, a exemplo do que foi dito quanto
à previsão de cláusula pétrea (supra).

3.3.2. Parecer de Orientação da CVM n o 36/2009

A febre das poison pills deu-se entre 2004 e 2007, anos em que
o Brasil teve grande atividade na Bolsa de Valores, impulsionada pelas
IPOs. Com a crise que assolou as maiores economias do mundo – e seus
reflexos no mercado nacional – entre 2008 e 2009, as companhias adeptas
das poison pills começaram a questionar a oportunidade de sua adoção,
visto que, como estavam postas (verdadeiras cláusulas pétreas), impediam a
entrada de bons investidores no capital da companhia, engessando os
negócios num momento crucial como o de crise.

Em meio à tempestade, em boa hora, foi lançado o Parecer d e


Orientação n o 36, de 23 de junho de 2009 (doravante, apenas Parecer
36/2009), o que permitiu àquelas companhias reverem sua estratégia. Com
efeito, algumas companhias realizaram alterações estatutárias, umas
retirando a previsão de poison pills de seus estatutos, 297 e outras, a exemplo
da Natura, apenas amenizando os seus efeitos (retirada do prêmio e
aumento da percentagem de gatilho). 298

O estopim para que a CVM tomasse posicionamento com


relação ao tema surgiu justamente da controversa cláusula pétrea

297
Fo i o q ue f ez a G VT , cuj o s ac io ni st a s vo tar a m p e la r et ir ad a d a p í l u la. So b r e, C.
B I AN CO NI , A cio n i sta s d a GV T a p ro va m r eti r a d a d e 'p o i so n p ill ' d o es ta tu to , i n O
E st a d o de S. P a u lo , 0 3 .1 1 . 2 0 0 9 , d i sp o ní v el [ o n - lin e] in
h ttp : // w w w.e s ta d a o .co m. b r/n o ti cia s/ tecn o lo g ia ,a cio n i s ta s- d a - g vt- a p ro va m- r et ira d a - d e-
p o iso n - p il l- d o - e s ta tu to , 4 6 0 4 2 9 ,0 .h tm %2 0 %2 2 p o iso n %2 0 p ill [ 0 3 .0 1 .2 0 1 1 ] .
298
So b r e, M . G AME Z , O r a , P ílu la s! , i n R evi s ta Din h e i ro 6 1 4 , 1 5 .0 7 .2 0 0 9 , d isp o n í ve l
[ o n - lin e ] in h ttp : // w w w. is to e d in h ei ro . co m.b r /n o t icia s/1 7 1 0 _ OR A +P I LU LA S
[ 0 3 .0 1 .2 0 1 1 ] .
147
mencionada no tópico anterior, sendo ela o objeto central do Parecer
36/2009.

Após a realização de Audiência Pública (n o 03/2009), realizada


entre os dias 18 de abril e 18 de maio de 2009, a CVM estabeleceu, no
referido documento, que “não aplicará penalidades, em processos
administrativos sancionadores, aos acionistas que, nos termos da legislação
em vigor, votarem pela supressão ou alteração da cláusula de proteção à
dispersão acionária, ainda que não realizem a oferta pública prevista na
disposição acessória”, 299 visto que tal disposição acessória, no
entendimento da autarquia, não seria compatível com diversos princípios e
normas da legislação societária vigente.

Abaixo, analisar-se-ão os argumentos que foram levados em


conta pela CVM para chegar à conclusão consignada no Parecer 36/2009 300.

Em primeiro lugar, o Colegiado da CVM entendeu que a


cláusula pétrea violaria o disposto no artigo 121 da Lei das Sociedades por
Ações 301, visto que impõe pesado ônus aos acionistas que decidirem votar
pela exclusão da cláusula.

O ponto desse argumento está no fato de que o ônus decorrente


da alteração da cláusula de poison pill acaba por cercear o próprio direito
de voto do acionista, o qual, receoso de ter que arcar com aquele ônus,
acaba votando contrariamente à remoção da pílula, nitidamente agindo
segundo seu interesse (ou temor) particular, e não conforme o interesse d a
companhia, como manda o artigo 115 da lei 302. Ora, se a assembléia-geral
tem poderes para decidir sobre todos os negócios da companhia, o
cerceamento da vontade do acionista acaba por afetar a própria soberania
da assembléia.

299
T exto d o p r ó p r io P a r ec er d e Or ie n ta ção d a CV M n o 3 6 , d e 2 3 d e j u n ho d e 2 0 0 9 .
300
Os ar g u me n to s aq ui c o lac io nad o s fo r a m r e tir ad o s d o P r o ce sso RJ 2 0 0 9 /3 3 6 2 , q u e
p o d e s er co n s ul tad o e m w w w.c vm.g o v.b r.
301
Ar t. 1 2 1 . A a s se mb léi a - ger al, co n vo c ad a e i n st a lad a d e ac o r d o co m a l ei e o e st at u to ,
te m p o d er es p ar a d e cid i r to d o s o s ne gó cio s r e la ti vo s ao o b j eto d a co mp an h ia e to mar as
r eso l uçõ e s q u e j u l gar co n ve n ie n te s à s ua d e fe sa e d e se n vo l v i me n to .
302
Ar t. 1 1 5 . O ac io ni s ta d ev e e xe r cer o d ir ei to a v o to no i n ter es se d a co m p an h ia ( ...) .
148
J. P. B. N A S C IM E N TO 303 critica o argumento, visto entender que
a cláusula pétrea atinge, na verdade, o direito de voto do acionista, e não a
assembléia-geral. Concordamos com o ponto levantado, porém não vemos
conflito entre os dois posicionamentos, mas antes uma complementaridade.
A assembléia-geral é o palco próprio para a expressão do direito de voto
dos acionistas. Qualquer medida que afete o último trará inexoravelmente
conseqüências para a assembléia-geral.

Vale lembrar que a assembléia-geral é órgão colegiado da


companhia, composto pelos seus acionistas. Segundo a teoria organicista,
sua vontade não é a vontade dos sócios, mas sim resulta da congregação das
vontades individualmente expressas por eles por meio do voto, sempre
tendo em vista o interesse da companhia. Visto assim, o voto é o
instrumento próprio pelo qual é formada a vontade soberana da assembléia-
geral. 304

O segundo ponto levantado pelo Colegiado da CVM é o de que


a cláusula pétrea também estaria em rota de colisão com o artigo 122, I, da
lei acionária. 305 Isso porque o fato de a cláusula pétrea tornar a poison pill
praticamente imutável suprime a competência privativa legalmente
atribuída à assembléia-geral de reformar o estatuto da companhia, sempre
que o interesse social assim demandar.

Assim, continua a CVM, o efeito da cláusula pétrea é


demandar a unanimidade para a retirada ou alteração da cláusula de poison
pill. Conforme já defendemos no item anterior, essa conseqüência da
cláusula pétrea conflita com o artigo 129, §1º, da Lei das Sociedades
Anônimas, o qual, interpretado a contrario, veda à companhia aberta a
majoração dos quori legais.

303
A n o ta çõ es so b re ... c it . ( n t. 1 9 5 , su p ra ) , p . 1 4 4 .
304
So b r e o ato co le g ia l v. P . R. C . S OU Z A, A to Co l et ivo , A to Co leg ia l, A to Co mp l exo ,
I n st itu içã o , i n Di re ito S o cie tá r io Co n te mp o râ n eo , v. I , co o r d . E . V. A. N. F R AN Ç A,
São P a u lo , Q uar t ier La ti n, 2 0 0 9 , p p . 2 7 -4 0 .
305
Ar t. 1 2 2 . Co mp e te p r i v ati v a me n te à a ss e mb l éi a - ge r al :
I - r e fo r ma r o e s tat u to s o cia l; ( ...)
149
Por fim, o Colegiado da CVM aponta que, no extremo, a
cláusula pétrea pode levar à violação do artigo 115 da lei. Este dispositivo
determina que o acionista deve exercer o direito de voto no interesse da
companhia. Como já indicado, o acionista, diante da ameaça de ter que
realizar uma oferta pública bastante onerosa, acaba por votar segundo seus
interesses pessoais (interesse em não ter que realizar a oferta), e não
consoante o interesse social.

Do nosso ponto de vista, os argumentos alinhavados pela CVM


são bastante consistentes, e não poderiam levar à outra conclusão que não a
tomada pela autarquia. Vale destacar que a CVM é tribunal administrativo,
e não judicial, de modo que não possui competência para deliberar sobre a
nulidade das cláusulas pétreas. Seu posicionamento, entretanto, deixa clara
sua convicção na ilicitude de tais previsões.

O Parecer 36/2009, porém, tem sido alvo de críticas 306, não


pelo seu conteúdo em si, mas pela pequena extensão que avançou no tema
das medidas defensivas adotadas pelas companhias brasileiras.

Como deixa entrever o relatório dos debates encetados durante


a audiência pública, a expectativa era de que a CVM deveria ter se
pronunciado também sobre as poison pills brasileiras, o que não ocorreu.

De todo modo, é inegável o alívio que o Parecer 36/2009


trouxe para a comunidade dos acionistas e para o mercado de capitais, em
geral. Após a divulgação do posicionamento da CVM sobre o tema, os
acionistas podem deliberar com mais conforto sobre a alteração ou
supressão das pílulas de veneno.

A BM&F-Bovespa, seguindo o movimento avalizado pelo


Parecer 36/2009, e em resposta aos anseios do mercado, propôs alteração
em seu Regulamento de Listagem, na qual se veda a inclusão das chamadas
cláusulas pétreas nos estatutos das companhias listadas no Novo Mercado,
como um dos pré-requisitos para a autorização de negociação no Novo
Mercado (atual item 3 do Regulamento).

306
C f. P . B . N AS C I ME NT O, A n o ta çõ e s so b re.. . c i t. ( nt . 1 9 5 , su p ra ) , p . 1 4 2 .
150
Tal alteração já foi aprovada pelas companhias listadas no
seguimento. Para se adequar à realidade atual das companhias, a proposta
de alteração incluiu o acréscimo do item 15.5 ao regulamento, prevendo a
possibilidade de manutenção das cláusulas pétreas, mas também admitindo
a possibilidade de alteração estatutária quando visar à exclusão das
referidas cláusulas.

A expectativa era de que as modificações no Regulamento de


Listagem aprovadas entrassem em vigor até o final de 2010, após aprovadas
pelo conselho de administração da BM&F-Bovespa e pela CVM. 307

3.3.3. Casos de Oferta Hostil no Cenário Brasileiro

O tema relativo à oferta hostil e à tomada de controle ganhou


grande notoriedade na comunidade jurídica brasileira a partir da tentativa
da companhia Sadia S.A. de adquirir o controle de sua então concorrente,
Perdigão Agroindustrial S.A. Não obstante, essa não foi a primeira vez que
uma companhia brasileira tentou tomar o controle de outra sociedade,
apesar de serem raros os casos de oferta hostil no cenário nacional.

Conforme nos dá notícia M. C A R V A LH O S A 308, o primeiro caso


de oferta hostil de aquisição de controle, no Brasil, ocorreu em outubro d e
1971, em Porto Alegre (RS), quando Macrosul S.A. tentou tomar o controle
de Sulbanco (Banco Industrial e Comercial do Sul S.A.). A tentativa
ocorreu num momento em que havia grande incentivo governamental à
formação de conglomerados financeiros, o que contava, inclusive, com o
suporte financeiro do Banco Central. A investida, porém, não logrou êxito,

307
Co n fo r me no tí cia v ei cu lad a no s ite d a B M & F -B o ve sp a, d i sp o ní ve l [ o n - l in e] i n
h ttp : // w w w.b mfb o v esp a . co m.b r/ emp re sa s/p a g es / 1 0 0 9 0 9 No t A .a sp [ 0 3 .0 1 . 2 0 1 1 ] .
308
M. C AR V AL H OS A, Th e B ra z il ia n ... ci t. ( n t. 1 8 8 , su p ra ) , p p . 1 0 3 -1 0 4 .
151
mas a controvérsia sobre a legalidade da oferta foi o ponto de partida para
as discussões sobre a regulação da matéria no Direito Brasileiro.

M. C A R V A LH O S A , à época consultor jurídico da então Bolsa de


Valores de São Paulo (atual BM&F-Bovespa), opinou pela ilegalidade d a
operação, conforme noticia F. K. C O MP A R A TO . Este, entretanto, entendeu
pela licitude da oferta, apoiado no postulado da legalidade, pelo qual
ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de
lei. 309

No geral, todavia, o ponto central das discussões girava em


torno do fato de que, normalmente, dada a falta de previsão legal, o prêmio
oferecido pelo adquirente do controle era percebido tão-somente pelos
acionistas controladores, restando alijados da operação – e de suas
vantagens – os acionistas minoritários. A discussão culminou com a
publicação de nova Lei das Sociedades por Ações, a Lei n o 6.404, de 15 de
dezembro de 1976, vigente até hoje.

Em seu âmbito, o novel diploma trouxe a previsão da oferta


pública de aquisição de ações obrigatória, em seu artigo 254 original, pelo
qual toda vez em que houvesse a alienação onerosa do controle de
companhia aberta, o adquirente seria obrigado a realizar oferta pública de
aquisição das ações dos demais acionistas (minoritários), pelo preço pago
pelas ações do acionista controlador. 310

Um segundo caso relatado na doutrina, esse já sob a égide da


atual Lei das Sociedades por Ações, diz respeito à tentativa da Companhia
Força e Luz Cataguazes-Leopoldina de adquirir o controle da Companhia
Mineira de Eletricidade, intento que foi impedido pela intervenção da
CEMIG (Centrais Elétricas de Minas Gerais S.A.). 311

309
F. K. CO MP AR AT O, N o va s fo rma s ju r íd i ca s. .. cit. ( nt. 8 , su p ra ) , p . 1 3 8 .
310
De ve - s e r e s sa lta r q ue a o fe r ta p úb l ica o b r i ga tó r i a s er i a d ir i gid a ap e na s a o s a cio n is ta s
mi n o r i tár io s d e te n to r e s d e açõ es co m d ir e ito a vo to , e x cl u íd a s, p o r ta nto , as a çõ e s
p r e fer e n cia i s não vo ta n t es.
311
So b r e o c a so , v. L. L . C ANT I DI AN O, A A q u i si çã o d o Co n tro le A c io n á rio d a Cia .
Min ei ra d e E le t ric id a d e – Um Ca so P o l êm ic o , in D i rei to S o ci etá ri o e Mer ca d o d e
Ca p i ta i s, Rio d e J a ne ir o , R e no var , 1 9 9 6 , p p . 6 3 -7 3 , b e m co mo a De lib er ação d a C V M
n o 2 /7 8 , d e 1 0 d e no ve m b r o d e 1 9 7 8 , d e o nd e fo r a m r e tir ad o s o s d ad o s tr azid o s ab ai xo .
152
Em 11 de outubro de 1978, a Companhia Força e Luz
Cataguazes-Leopoldina (ofertante) lançou oferta pública de aquisição de
controle da Companhia Mineira de Eletricidade (companhia-alvo), nos
moldes da lei, oferecendo Cr$1,67 por ação. No decurso da oferta, a
CEMIG, companhia de economia mista, lançou oferta concorrente para a
aquisição do controle da companhia-alvo, porém sem respeitar os requisitos
legais exigidos. Ofertou o preço de Cr$1,78 por ação.

Note-se que não haveria qualquer impedimento que a CEMIG


negociasse a aquisição do controle da companhia-alvo fora do mercado de
ações. O problema não foi a intenção de adquirir o controle, mas sim o
veículo utilizado para tanto. Ao desrespeitar as regras legais, sua oferta era
inválida, mas devido a demora da CVM em repudiá-la, sua permanência
acabou por frustrar a oferta válida da Cataguazes-Leopoldina, visto que os
acionistas da Companhia Mineira de Eletricidade a ela não aderiram, ante a
perspectiva de receber maior valor por suas ações com a oferta da CEM IG.

Cataguazes-Leopoldina, então, melhorou sua oferta, conforme


lhe permite a lei, dispondo-se a pagar Cr$1,80 por ação, em novembro
daquele ano. A CEMIG, a seu turno, realizou nova oferta, desta vez
observando os requisitos legais, pela qual se comprometia a pagar Cr$1,92
por ação em fevereiro do ano seguinte.

O ponto, entretanto, é que o maior lapso temporal que a


CEMIG quis utilizar para fazer o pagamento das ações (ao invés de pagar
em novembro, como ofertou sua concorrente, propôs-se a pagar apenas em
fevereiro), causava uma verdadeira depreciação daquele valor. Com efeito,
conforme relatado por L. L. C A N TID IA N O , o presidente da Cataguazes-
Leopoldina veio a público esclarecer que, em novembro, a oferta de sua
companhia era mais vantajosa que a apresentada pela CEM IG, visto que em
fevereiro do ano seguinte, o valor de Cr$1,80 então ofertado representaria
Cr$1,94, sendo superior, portanto, à oferta da CEM IG. Por conta disso, a
Cataguazes-Leopoldina melhorou novamente sua oferta, igualando o prazo
de pagamento ao de sua concorrente (fevereiro) e oferecendo Cr$1,94 por
ação.

153
Logo após, a CEM IG aumentou sua oferta para Cr$ 2,02 por
ação, superando o valor ofertado pela concorrente. Quando a Cataguazes-
Leopoldina pretendia aumentar sua proposta, foi barrada pela CVM, sob o
entendimento de que, pela lei, é dado aos ofertantes melhorar sua proposta
apenas uma vez. Com isso, a Cataguazes-Leopoldina foi excluída da
aquisição do controle da Companhia Mineira de Eletricidade.

Essa posição da CVM mereceu críticas 312, sobretudo porque


acabou por prejudicar não só o ofertante inicial, como também os
acionistas da companhia-alvo. De fato, se não tivesse interferido e a
competição continuasse até que um dos ofertantes desistisse, certamente o
preço a ser recebido pelos acionistas da companhia-alvo seria maior.

Assinale-se que se o caso tivesse ocorrido recentemente, o seu


desfecho provavelmente seria diferente. A posição atual, inclusive
o
consignada no artigo 13, §3º, da Instrução Normativa da CVM n 361, de 5
de março de 2002 313, é de que, em havendo ofertas concorrentes, os
ofertantes podem melhorar suas ofertas tantas vezes quanto julgarem
conveniente.

Com tão poucas tentativas de tomada de controle no mercado


acionário brasileiro, não é de se estranhar o adormecimento do tema n a
doutrina pátria, bem como a demora que se observou até que as primeiras
companhias começassem a dispor de medidas defensivas em seus
estatutos. 314

Recentemente, o mercado brasileiro presenciou outro caso de


oferta hostil: trata-se da tentativa frustrada da Sadia S.A. em tomar de
controle de sua então concorrente, Perdigão Agroindustrial S.A. O

312
So b r e, v. L. L. C ANT I DI ANO, A A q u is içã o d o ... ci t. ( n t. 3 1 1 , su p ra ) , p p . 6 6 -6 9 .
313
Ar t. 1 3 , § 3 o U ma v ez la nçad a u ma OP A co nc o r r e nte, se r á l íc ito t a nt o ao o f er ta n t e
in ic ia l q u a nto ao o fer t a nt e co nco r r e nte a u me n t a r e m o p r eço d e s ua s o f e r ta s ta n ta s v eze s
q ua n ta s j ul g ar e m co n v e ni e nt e, d esd e q u e d e ta l au me nto d ê e m no tí cia p úb l ica, co m o
me s mo d e staq u e d a o f er t a.
314
Na d éc ad a d e 8 0 , h á r ef er ê n cia , ai nd a, à o c o r r ê nci a d e o utr a o fer t a ho s ti l, e s sa
f i nal iz ad a co m ê xi to , q u e r es u lto u na co mp r a d a Ci me n to Ar at u p el a Vo to r a nt i m, c f. C.
CO R R E A e T . L E T HB R I DGE , P o r q u e o n eg ó c io d o a n o n ã o sa iu , i n R evi s ta E xa m e,
2 8 .0 7 .2 0 0 6 , d i sp o ní ve l [ o n - lin e] i n h ttp : // ex a me.a b ri l.co m.b r/ re vi st a - exa m e/ed ico es /
0 8 7 3 /n eg o c io s /n o t ic ia s / p o r- q u e- o - n eg o c io - d o - a n o - n a o - sa iu - m0 0 8 4 3 8 2 [ 0 3 .0 1 .2 0 1 1 ] .
154
interessante desse caso, além de toda a atenção e repercussão que causou, é
o fato de que a tentativa de takeover lidou com um elemento a mais: a
previsão de poison pill contida no estatuto da companhia-alvo.

Em 2006, a Sadia lançou oferta pública de aquisição de


controle dirigida aos acionistas da Perdigão (companhia-alvo), oferecendo
o valor de R$27,88 por ação. Os administradores da Perdigão, todavia,
entenderam que o valor ofertado estava significativamente abaixo do valor
de mercado da companhia, não correspondendo, assim, às expectativas de
seus acionistas.

Os principais acionistas da companhia visada, então,


articularam-se para resistir à tomada de controle e, juntos detentores de
mais da metade do capital social, rejeitaram a proposta apresentada pela
Sadia, conforme a Perdigão noticiou à CVM em Fato Relevante publicado
no dia 18 de julho de 2006.

A Sadia, em conseqüência, reformulou sua proposta inicial,


passando a ofertar o valor de R$29,00 por ação. Em princípio, esse valor
estaria abaixo do mínimo legalmente exigido para aumentar a proposta, que
é de 5% (conforme artigo 261, §1º da lei acionária). 315 A proposta
novamente foi rejeitada por acionistas representantes de mais da metade do
capital social, o que fez com que a oferta da Sadia perdesse sua eficácia,
tendo a administração da ofertante optado por revogá-la definitivamente.

Nota-se, assim, que o insucesso da investida da Sadia deveu-se


antes à articulação dos acionistas, que não entenderam interessante a
proposta formulada, do que à cláusula de poison pill prevista no estatuto da
Perdigão, até porque, desde o início, a Sadia já havia se comprometido a
atender às exigências impostas pela poison pill, abaixo apontadas.

315
Nes se se n tid o , J . P . B . N AS C I ME NT O, A n o ta çõ es so b re.. . ci t. ( nt. 1 9 5 , su p ra ) , p .
3 5 . Co ntr a, s u s te nt a nd o a não ap li cab i lid ad e d o ar ti go 2 6 1 , § 1 º , no p r e s en te ca so , v. L .
L. C ANT I DI ANO, A n á l i se d o ca so S a d ia . .. c it. ( nt . 2 3 , su p ra ) , p p . 2 3 9 -2 4 1 .
155
O Estatuto Social da Perdigão 316 possuía cláusulas que previam
a necessidade de apresentação de oferta pública aos seus acionistas nas
hipóteses de (i) alienação de seu controle acionário (“tag along”), caso em
que os acionistas não controladores teriam direito a receber o mesmo valor
pago pelas ações do bloco de controle, em conformidade com o
Regulamento de Listagem do Novo Mercado; (ii) cessão onerosa de direitos
de subscrição de ações ou outros títulos conversíveis em ações que possam
resultar na alienação do controle da companhia, ou em caso de alienação
indireta do controle; (iii) acionista vir a adquirir ou se tornar titular de
ações da companhia em montante igual ou superior a 20%; (iv) ficar
deliberado o cancelamento do seu registro de companhia aberta, caso em
que a oferta deverá ser realizada pelo acionista controlador ou pela própri a
companhia; (v) ficar deliberada a saída da companhia do Novo Mercado da
Bovespa.

Como a oferta da Sadia enquadrava-se em várias destas


hipóteses a ensejar a realização de oferta pública, a companhia interessada
fez constar no Edital de sua oferta as condições necessárias para o
atendimento de todas as exigências previstas no estatuto social da
Perdigão. De fato, em sua proposta, a Sadia pretendia adquirir 50% do
capital social da Perdigão mais uma ação (= maioria absoluta), além de
realizar reorganização societária entre si e a companhia-alvo, pelo que a
Perdigão seria retirada do Novo Mercado.

A conclusão a ser tirada desse caso é a de que a poison pill não


cumpriu o seu papel, pois sua previsão não foi suficiente para afastar
ofertas de aquisição de controle. Não fosse a resistência dos acionistas,
devidamente informados pela administração, e provavelmente a oferta teria
logrado êxito. Aliás, essa conclusão nada tem de absurda, visto que alguns
anos depois, mais precisamente em 18 de maio de 2009, os acionistas das
duas companhias assinaram acordo de fusão, criando uma nova sociedade,
denominada BRF – Brasil Foods S.A.

316
Dad o s r e tir ad o s d e L. L . C ANT I DI ANO, A n á li s e d o ca so S a d ia ... c it. ( nt . 2 3 , su p ra ) ,
p p . 2 2 1 -2 4 5 .
156
Em 2009, mais uma tentativa de tomada de controle veio à
baila, trazendo igualmente questões controversas. Dessa vez, o caso
envolve três companhias: Telefônica (por meio da TELESP –
Telecomunicações de São Paulo S.A.), Vivendi e GVT (Holding) S.A., a
última sendo o alvo da aquisição. 317

A GVT é companhia brasileira com atuação na área de


telecomunicações. Estava listada no Novo Mercado, e possuía poison pill
em seu estatuto. Interessante notar que a companhia era controlada,
minoritariamente, por três acionistas (Swarth Investments L.L.C., Swarth
Investments Holdings L.L.C. e Global Village Telecom (Holland) B.V.) 318
que, agrupados, detinham cerca de 30% das ações votantes, estando as
demais ações dispersas no mercado.

A Vivendi, grupo francês com atuação na área de telefonia,


visando abrir operação no mercado brasileiro, manifestou interesse em
adquirir o controle da GVT, por R$42,00 a ação. Em 8 de setembro de
2009, Vivendi e os acionistas controladores da GVT firmaram contrato
possibilitando à Vivendi lançar oferta pública de aquisição amigável, para
a aquisição de até 100% das ações da companhia. Porém, antes mesmo de
formalizar a proposta de oferta, a Telefônica – grupo espanhol já atuante
no mercado de telecomunicação brasileiro, e com interesse na companhia
visada – adiantou-se e, por intermédio da TELESP, comunicou o mercado,
por meio de Fato Relevante, que lançaria oferta pública de aquisição de
ações da GVT, por R$48,00 a ação, posteriormente elevando sua própria
proposta para R$50,50, consoante admitido pelo artigo 261, §1º, da lei. 319

Essa reação da Telefônica animou o mercado, que vislumbrava


uma disputa pelo controle da GVT, sobretudo porque ambas as companhias
317
Os d ad o s aq u i tr azid o s t ê m p o r b as e a s i n fo r maçõ e s d isp o n í ve is at é d eze mb r o d e
2 0 1 0 , d ata d a úl ti ma d eci são p ub l ic ad a p el a CV M so b r e o ca so ( R eg. nº 7 2 9 5 /1 0 ,
p ub lic ad a e m 9 d e d eze mb r o d e 2 0 1 0 ) .
318
C f. Fato Re le v a nte d iv u l gad o p ela GVT à CV M e m 1 3 d e no ve m b r o d e 2 0 0 9 ,
d isp o n í ve l [ o n - l in e] i n w w w.c vm.g o v.b r.
319
Dad o s r e tir ad o s d o E d ita l d e O fer ta P úb l ic a d e Aq ui s ição d e Açõ e s Or d i n ár ia s d a
GVT ( Ho ld i n g) S. A., p ub lic ad o e m 2 6 d e m ar ço d e 2 0 1 0 , d i sp o ní ve l [ o n - l in e] i n
h ttp : // w w w.c vm.g o v.b r/d a d o s/ La u d E d it Op a /R J- 2 0 0 9 - 1 1 5 7 0 /2 0 1 0 0 3 2 9 _ E DI T A L_ DE
_ OF E R TA _ P % C3 %9 A B L I CA .p d f [ 1 1 .1 2 .2 0 1 0 ] .
157
já haviam mostrado interesse em melhorar suas ofertas. Todavia, ao
contrário de lançar oferta pública concorrente, a Vivendi optou por
negociar privadamente a aquisição do controle da GVT com os então
controladores.

Assim, pouco depois que a Anatel (Agência Nacional de


Telecomunicações) aprovou a alienação do controle da GVT (impondo
algumas restrições caso a compradora fosse a Telefônica), a Vivendi ganha
a disputa pela aquisição da brasileira GVT, pagando R$56,00 reais por
ação. O negócio foi finalizado em 13 de novembro de 2009, conforme Fato
Relevante divulgado no mesmo dia informando a aquisição.

Na negociação, Vivendi adquiriu 39,7% do capital votante e


opções de compra de ação representando 19,6% do capital votante. No
total, após ex ercidas as opções, Vivendi passaria a ter 57,5% do capital
votante da companhia. Por conta disso, no Fato Relevante divulgado por
GVT, em 13 de novembro de 2009, Vivendi se comprometeu a lançar oferta
pública pelo valor de 100% do valor ofertado pelas ações do controle, em
observância ao artigo 254-A da Lei das Sociedades por Ações.

Advirta-se que a necessidade de realizar a oferta obrigatória


decorre do fato de que a Vivendi, ao contrário da Telefônica, negociou
previamente a compra da GVT junto aos seus acionistas, realizando a
aquisição onerosa do controle já existente (aquisição derivada).

Dada as circunstâncias em que o negócio entre Vivendi e GVT


se deu, foi instaurado processo administrativo sancionador no âmbito da
CVM. 320- 321

320
P r o ces so Ad mi n i str at i v o Sa nc io nad o r RJ 2 0 1 0 /2 4 1 9 , in s ta ur ad o p ela S u p er i nt e nd ê nc ia
d e R el açõ e s co m E m p r es as – S E P p ar a a p ur a r r e sp o n sab i lid ad e s p o r e ve nt u ai s
ir r e g ul ar id ad e s o co r r id a s no co nt e xto d a aq ui s iç ão d o c o ntr o le d a GVT ( Ho ld i n g) S. A.,
no q u al fo i ac eit a a celeb r aç ão d e te r mo d e co mp r o mi s so , c f . Re g. nº 7 2 9 5 /1 0 ,
d iv u l gad a e m 9 d e d e ze mb r o d e 2 0 1 0 .
321
A. AL E RI GI J R., Te le fó n ica p ed e à CV M in f o rma çõ e s d e a p u ra çã o d a co mp ra d a
GV T , in O E s ta d o de S. P a u lo , 2 1 .1 2 .2 0 0 9 , d i sp o ní ve l [ o n - lin e] in
h ttp : // w w w.e s ta d a o .co m. b r/n o ti cia s/ tecn o lo g ia ,t ele fo n ica - p ed e- a - cv m- in fo r ma co e s- d e-
a p u ra ca o - d a - co mp ra - d a - g vt,4 8 5 4 5 7 ,0 .h tm [ 0 3 .0 1 .2 0 1 1 ] . V. , t a mb é m, C a so GV T exp ô s
d ive r sa s b re ch a s n a s n o rma s a tu a i s, i n V a lo r E co n ô m ico , 2 4 .0 3 .2 0 1 0 , d isp o n í vel [ o n -
lin e] i n h t tp : / / w w w.v a lo ro n lin e.co m.b r/ imp re s so / in ve st im en to s /1 1 9 /1 1 3 4 9 8 /ca so - g v t-
exp o s - d iv er sa s- b rech a s- n a s- n o rma s- a tu a i s [ 0 3 .0 1 .2 0 1 1 ] .
158
Apesar da peculiaridade do caso, é interessante notar que, mais
uma vez, a poison pill não impediu a tomada do controle, mas dessa vez por
razões diversas das apresentadas no caso da Sadia e Perdigão. Tanto a
Telefônica, quanto a Vivendi propuseram como pré-requisito para suas
ofertas a retirada do estatuto da GVT da cláusula de poison pill. O fato de
os controladores, ainda que minoritários, estarem desejosos de abrir mão do
controle, tendo inclusive negociado-o privadamente com a Vivendi,
facilitou o cumprimento desse requisito, e a pílula de veneno foi retirada
do estatuto da companhia, em 3 de novembro de 2009. 322

Estas, em síntese, as experiências que o mercado brasileiro já


vivenciou sobre ofertas hostis. Entretanto, em nenhum momento a questão
da validade da cláusula de poison pill foi posta à prova. Com exceção da
análise feita pela CVM quando da elaboração do Parecer 36/2009, que se
cingiu às denominadas cláusulas pétreas, a oferta pública estatutária, nos
moldes como presente nos estatutos das companhias brasileiras, ainda não
foi objeto do crivo regulatório, nem do judicial.

O mais próximo que se chegou desse ponto, conforme aponta J.


P. B. N A S C IM E N TO 323, foi o caso da aquisição do controle da Arcelor S.A.
pela indiana Mittal Steel Compan y N. V. 324 Essa aquisição não ocorreu no
mercado brasileiro, mas aqui irradiou efeitos, visto que a companhia-alvo
(Arcelor) possuía participação acionária em algumas sociedades brasileiras.

Uma dessas companhias, a Arcelor Brasil S.A., possuía em seu


estatuto a obrigação de lançar oferta pública no caso de aquisição de seu
controle, ainda que indiretamente. Até aí, essa previsão poderia representar
simples direito de saída conjunta (tag along), prática comum e aceita no
mercado brasileiro.
322
Co n f o r me no t ici ad o p o r C . B I AN C ONI , A c io n is ta s d a GV T... c it. ( nt . 2 9 7 , su p ra ) .
So b r e, v . E d ita l d e O fer ta P úb l ica d e Aq u i si ção d e Açõ es Or d i nár ia s d a GVT ( Ho ld i n g )
S. A., p ub l icad o em 26 de mar ço de 2010, d i sp o ní v el [ o n - lin e] in
h ttp : // w w w.c vm.g o v.b r/d a d o s/ La u d E d it Op a /R J- 2 0 0 9 - 1 1 5 7 0 /2 0 1 0 0 3 2 9 _ E DI T A L_ DE
_ OF E R TA _ P % C3 %9 A B L I CA .p d f [ 1 1 .1 2 .2 0 1 0 ] .
323
J . P . B . N AS CI ME NT O, A n o ta çõ es so b re ... c it . ( n t. 1 9 5 , su p ra ) , p p . 1 3 8 -1 3 9 .
324
O s d ad o s me n c io nad o s r ela ti vo s ao c aso r e f let e m a ú lt i ma d eci s ão d a C VM até a d ata
d o fe c ha me n to d e s ta d i s ser t ação ( j a n eir o d e 2 0 1 1 ) . So b r e , v. P r o ce s so Ad mi n is tr a ti vo
CV M RJ 2 0 0 7 /1 9 9 6 , d i s p o n í vel [ o n - l in e] i n w w w.c vm.g o v.b r.
159
Porém, dois pontos do caso chamaram a atenção. O primeiro
deles foi o reconhecimento da não incidência da oferta pública obrigatória
prevista no artigo 254-A da lei acionária brasileira, visto não ter havido a
alienação onerosa do controle, já que este foi adquirido, no exterior, por
meio de oferta pública de aquisição de ações. 325 A aquisição foi, portanto,
originária. Tanto, que a CVM não determinou a oferta pública obrigatória
no caso da Acesita S.A., outra companhia aberta brasileira controlad a
indiretamente pela Arcelor S.A. 326

No caso da Arcelor Brasil, exigiu-se a realização de oferta


pública não por conta da lei, mas sim da previsão estatutária acim a
mencionada. E aqui se encontra o segundo ponto de destaque do caso: o
fato de o controle acionário da companhia-alvo, então controladora da
Arcelor Brasil, ter sido tomado com a aquisição de menos da metade do
capital social.

Apesar do esforço argumentativo de que a alienação de menos


que a maioria absoluta das ações votantes não caracterizaria alienação de

325
Ne ss e s e nt id o , va le a t r an s cr iç ão d e p ar te d o v o to d o P r es id e n te M ar c elo F er na nd es
T r ind ad e : “A q ui si çã o o rig i ná r ia de co nt ro le e o f ert a pú bl ica p o r a q ui si çã o in d iret a .
Ma s a I n str u ção 3 6 1 /0 2 não p r e vi u a o co r r ê nc ia d e u m ca so co mo o d is c ut id o ne st e
p r o ce sso , q ua l sej a, o d e q u e a r e al iza ção d a o f e r ta p o d e d e co r r er não d e u ma a li en a çã o
d e co ntr o le ma s d a s u a a q u is içã o p o r me io d e u ma o fer ta p úb li ca ho st il . E s sa hip ó te se ,
d e o fer ta d eco r r e n te d e aq u i siç ão , e não d e ali e na ção d o co nt r o le , não es tá p r e vi st a na
lei b r a s il eir a , co mo fo i lo n ga me n te e xp o s to no vo to d o D ir e to r R e lato r W lad i mir
Ca s telo B r a n co , q u a nd o d a d ecis ão so b r e a o b r i gaç ão d e r eal iz ação d a o fer ta d e q ue
aq u i s e tr a ta. A aq u i siç ão o r i gi ná r ia d o co n tr o l e até e n tão d i sp er so e n tr e mi l har e s d e
acio n is ta s não faz i ncid ir a r e gr a d o ar t. 2 5 4 - A. T al o fe r ta só o co r r e , co mo no ca s o
co n cr e to , p o r q u e o est at u to d a co mp a n hi a co nt r o lad a e xp r e s sa me n te a s si m o
es tab e lec e.” ( P r o c e sso Ad mi n is tr a ti vo C VM RJ 2 0 0 7 /1 9 9 6 , Re g. nº 5 4 4 3 /2 0 0 7 , vo to d e
Mar ce lo Fer n a nd ez T r i n d ad e, p r o fe r id o e m 2 1 d e mar ço d e 2 0 0 7 )
326
C f. vo to d e W lad i mir Ca s telo B r a n co Ca s tr o , p r o f er id o e m 2 5 d e se te mb r o d e 2 0 0 6 ,
no P r o c e sso Ad mi n i s tr a t ivo CV M RJ 2 0 0 6 /6 2 0 9 , R e g. nº 5 2 5 6 /2 0 0 6 : “E m 1 º .0 8 .2 0 0 6 , a
SE P e a S RE co mu n i ca r a m se u e n te nd i me n to d e q ue a M it ta l St ee l, ‘a d q u ir en te d o
p o d er d e co n t ro l e in d i re to d a A r celo r B ra s il , t e m o d eve r leg a l d e cu mp ri r a o b rig a çã o
es ta tu ta r ia m en te p r evi s ta d e rea li za çã o d e O P A p a ra o s a cio n is ta s min o ri tá rio s d a
Co mp a n h ia ’. E s sa o p i ni ão e st a va b a se ad a e m p ar e cer d a P r o c u r ad o r ia Fed er a l
E sp e cia li zad a – P F E ( M E MO /P FE - C VM /Nº 1 0 0 4 /0 6 , d e 3 1 .0 8 .2 0 0 6 ) q u e en te nd ia q ue a
OP A d eco r r er ia d o ar t. 1 0 d o es ta t uto so c ial d a Ar ce lo r B r a s il ( e não d o ar t. 2 5 4 - A d a
L ei 6 .4 0 4 /7 6 ) . T r at a nd o - se d e co mp r o mi s so d eco r r e n te d e cl á u s ula es ta t utár ia, a
P r o cur ad o r ia e nt e nd e q u e a O fer t a não é e x i gí v e l no ca so d e Ace si ta S. A., c uj o e s tat u to
não co nt é m ta l d i sp o si ção ”. V., ai nd a, V. H. M. F R AN CO, Co n s id e ra çõ e s so b re a s
o fe rta s p ú b l ica s p a ra a q u is içã o d e a çõ e s ( OP A s ) – e s ta d o a tu a l d a q u es tã o , i n R ev i st a
d e D ir ei to Me rca n t il 1 4 4 ( 2 0 0 6 ) , p . 2 7 .
160
controle a priori (posicionamento já adotado pela CVM 327), a autarquia
reconheceu a transferência do controle, e determinou a realização da oferta
pública, em respeito às disposições estatutárias. 328

Nos votos proferidos, reconheceu-se expressamente que a lei


brasileira não contempla a hipótese de oferta obrigatória no caso de
aquisição originária de controle, nem direta, nem indiretamente. 329

Esse posicionamento da CVM deixa entrever sua predisposição


em respeitar a oferta pública prevista estatutariamente. Porém, repita-se,
não há ainda posicionamento expresso da CVM sobre o assunto, sendo
temerário afirmar rigorosamente qual o entendimento por ela perfilhado.

De todo modo, seguindo a linha de A. M. C O R D E IR O , tem-se


que a oferta estatutária não se inclui na categoria de oferta pública
obrigatória, no sentido legal do termo. Sua observância obrigatória decorre
não da lei, mas da autonomia privada das partes. É, portanto, oferta
facultativa. Por conta disso, no âmbito regulatório estatal, a oferta deve ser
tratada como qualquer outra oferta facultativa. 330

Quanto às sanções impostas no estatuto pela inobservância de


suas regras, elas não possuem relevância mobiliária, para aquele autor.

327
Vo to d o Re la to r P ed r o Oli v a Mar ci lio d e So u s a p r o fer id o e m 1 1 d e ab r i l d e 2 0 0 6 , no
Re g. Co l. 4 7 8 8 /2 0 0 5 : “e m u ma co mp a n hia c o m a mp la d i sp er s ão o u q ue t e n ha u m
acio n is ta, ti t ul ar d e ma i s d e 5 0 % d a s a çõ e s, q ue sej a o mi s so na s vo taçõ es e o r ie n taçõ e s
d a co mp a n hia , e v e nt u al acio n is ta q ue co n si ga p r ep o nd er ar s e mp r e, não e st á s uj ei to ao s
d ev er e s e r esp o n sab il id ad es d o aci o ni st a co n t r o lad o r , u ma vez q ue p r ep o nd er a p o r
q ue s tõ e s fá ti ca s d a s as s e mb lé ia s não p r ee n c he n d o o r eq ui s ito d a a lí ne a " a" d o ar t. 1 1 6 ,
e mb o r a p r ee nc ha o d a a lí ne a " b " . E s se acio n i st a s er i a co n sid er ad o , p ar a d et er mi n ação
d e s ua r esp o n s ab il id ad e, co mo u m ac io ni st a no r ma l ( s uj ei to , p o r t a nto , a o r eg i me d o a r t.
1 1 5 ) ”.
328
So b r e o c aso , v. P r o c e s so Ad mi n i s tr a ti vo C V M RJ 2 0 0 7 /1 9 9 6 , R e g. nº 5 4 4 3 /2 0 0 7 ,
d isp o n í ve l [ o n - l in e] i n w w w.c vm.g o v.b r, e V. H. M. F R AN C O, Co n si d era çõ e s so b r e.. .
cit. ( nt. 3 2 6 , su p ra ) , p p . 2 6 -2 7 .
329
Co n fo r me vo to d e Mar c elo Fer na nd ez T r i nd ad e, cit ad o na n t. 3 2 5 , su p ra .
330
“Do p o n to d e v i sta d a Ad mi n i str ação mo b i li ár ia, a OP A e st at u tár ia é u ma OP A
fa c ul ta ti va , is to é : u ma OP A q u e n ão é i mp o st a p o r lei. As s i m, a CM VM ir á tr a tar o
o fe r ta n te co mo u m i n ter es sad o n u ma OP A ger a l não o b r i ga tó r i a. O f ac to d e el e a gir n o s
ter mo s d u m co n tr a to -p r o me s sa , d u m ma nd ato , d u m co ntr a to a f a vo r d e ter c eir o o u d o s
es tat u to s d u ma so ci ed ad e é, s al vo p r ece ito e xp r es so e m co n tr ár io , re s i nte r a l io s a ct a .
T al o co r r ên ci a não p r o vo c a a ap li caç ão d e q ua i sq uer r e gr a s le g ai s d ifer e nt es d a s
co n vo cad a s p o r u ma OP A f ac u lta ti v a; tão -p o uco af as ta a l g u ma o u al g u m as d e la s” ( c f. A
OP A e s ta tu tá ria .. . ci t. ( nt . 1 0 2 , su p ra ) , p p . 1 4 1 - 1 4 2 – d es taq u es no o r i g i na l) .
161
Assim, são questões interna corporis, tal como a inibição do direito de
voto. Em sendo lícitas, nada impede a previsão de sanções para o
descumprimento da oferta, como é o caso da suspensão dos direitos de
sócio, nos casos previstos no artigo 120 da Lei das Sociedades por Ações.
Quaisquer outras questões devem ser tratadas no âmbito judicial. 331

331
“A i no b ser v â nci a d a s r e gr a s es ta t ut ár ia s q u e i mp o n h a m OP As ger ai s não te m
r ele v â nci a mo b il iár i a. A s sa nçõ es q ue d aí ad ve n ha m s ão d o fo r o i n ter io r d a so ci ed ad e :
in ib i çõ e s d e vo to o u clá u s ul as p e na is . A le i p er mi te u ma s e o u tr a s, n ad a v ed a nd o a s u a
as so c iaç ão à i no b ser v â n cia d e d e ter mi nad o p r o ces so aq u i si ti vo . Q uai s q uer d ú v id a s o u
lit í gio s s ub s eq üe nt es d ev er ão s er d ir i mi d o s p er a nt e o s tr ib u n ai s c o mu n s” ( A. M.
CO R DE I R O, A OP A e sta tu tá ria . .. c it. ( nt. 1 0 2 , s u p ra ) , p . 1 4 2 ) .
162
CAPÍTULO 4
A POISON PILL À BRASILEIRA EM NÚMEROS

Neste capítulo final, apresentar-se-ão os dados relativos à


utilização da poison pill à brasileira pelas companhias listadas no Novo
Mercado da BM&F-Bovespa.

Tais dados, relativos à posição acionária da companhia, à


presença da pílula, de cláusula pétrea, bem como à possibilidade de
remoção da pílula ou afastamento da oferta pública por ela determinada
foram colhidos no segundo semestre de 2010, e retirados das seguintes
fontes: estatutos sociais das companhias, página virtual da BM&F-Bovespa,
bem como de pesquisa já formulada pela própria BM&F-Bovespa 332 sobre o
perfil de controle das companhias e a adoção da poison pill.

O estudo levantado pela BM&F-Bovespa, que leva em


consideração apenas as companhias listadas no Novo Mercado em 6 de
julho de 2010, serviu de base à nossa pesquisa, sendo que os dados
presentes na Tabela 1 relativos à posição acionária (primeira coluna) foram
integralmente dele retirados e mantidos. Os demais dados, alguns baseados
no relatório divulgado pela BM&F-Bovespa, foram atualizados, e outros
332
Re la tó r io d i v u l ga d o p ela B M & F -B o ve sp a , d i sp o n í vel [ o n - lin e ] in
h ttp : // w w w.b mfb o v esp a . co m.b r/ emp re sa s/d o wn l o a d /C la u su la s- d e- P ro te ca o - C ia s- No vo -
Me rca d o . xl s [ 0 3 .0 1 .2 0 1 1 ] .
163
dados foram introduzidos (como o percentual do gatilho, penalidades
previstas e a possibilidade de remoção da pílula ou afastamento da oferta).

Na Tabela 2, trouxemos os dados relativos àquelas companhias


que migraram para o Novo Mercado no segundo semestre do ano de 2010,
após, portanto, a realização do estudo formulado pela BM&F-Bovespa.

Vale mencionar, ainda, que estudo semelhante foi realizado por


É. G O R G A 333, no período entre 2006 e 2007, e cujos resultados já foram
publicados. É desse estudo que se retirou a nomenclatura atribuída às
penalidades comumente utilizadas em conjunto com a pílula, as quais já
foram tratadas no Capítulo 3, item 3.3.1., supra.

Assim, a penalidade do Tipo 1 refere-se àquela em que o não


cumprimento da oferta pública prevista na pílula enseja a realização de
assembléia-geral, na qual os acionistas, com base no artigo 120 da Lei das
Sociedades por Ações, deliberam sobre a suspensão dos direitos de sócio do
acionista-adquirente responsável pela formulação da oferta. Nessa
assembléia, o acionista-adquirente não poderá votar, em observância ao
artigo 115 da lei acionária.

Já a penalidade do Tipo 2 refere-se à denominada cláusula


pétrea, que consiste em disposição acessória à poison pill pela qual se
dificulta a sua remoção. Por essa penalidade, os acionistas que votarem
favoravelmente à alteração ou exclusão da poison pill ficam obrigados a
lançar oferta pública para a aquisição das demais ações da companhia, nos
moldes definidos na própria pílula.

Foram analisadas 113 companhias, das quais, atualmente, 112


estão listadas no Novo Mercado. No relatório original da BM&F-Bovespa,
que apresenta 106 companhias, consta a sociedade Açúcar Guarani S.A.,
cujo registro de companhia aberta foi cancelado em 13 de agosto de 2010,
mas seus dados foram mantidos, riscados, para manter a referência ao
relatório mencionado.

333
É . G O RG A, Ch a n g in g t h e… c it . ( nt . 2 5 0 , su p ra ) , p p . 4 3 9 -5 5 4 .
164
4.1. Controle Definido e Poison Pill

Das 112 companhias listadas no seguimento, ao menos 66 estão


submetidas a controle definido 334, do tipo majoritário, ou seja, aquele
exercido por acionista ou grupo de acionistas que, em conjunto, possuem
mais da metade do capital social votante. Trata-se, como se vê, da maior
parte das companhias listadas no Novo Mercado, representando quase 60%
do setor.

Dentre essas 66 companhias, 29 possuem previsão estatutária


de poison pill, número expressivo, diante da inviabilidade prática que o
controle majoritário representa ao takeover hostil. O estatuto de algumas
dessas sociedades, entretanto, prevê que a pílula apenas se torna aplicável
no caso de haver controle difuso. É o caso, por exemplo, de Helbor
Empreendimentos S.A., Inpar S.A. e TPI – Triunfo Participações e
Investimentos S.A.

O Regulamento de Listagem do Novo Mercado traz a definição


de controle difuso 335, que é seguida pelos estatutos das companhias aí
listadas. Trata-se daquele controle detido com menos da metade do capital
social votante ou por grupo de acionistas não organizados em acordo de
voto, que não esteja submetido a controle comum, nem represente interesse
comum.

A previsão estatutária de que a pílula apenas passa a valer


quando o controle for do tipo difuso vai ao encontro daquela observação

334
Diz - se “ao me no s” v is t o q ue não fo i p o s s í vel o b ter d ad o s d e d ua s co mp a n h ia s, q ue
ab r ir a m o cap i ta l r e c en te me n te e, p o r t a nto , ai nd a não e ntr e gar a m r el ató r io d e
I n fo r ma çõ e s An u ai s à C VM. São e la s: B r as il I n s ur a n ce P ar t ic ip açõ es e Ad mi n is tr a ção
S. A ( r e g i str o co nc ed i d o e m 2 8 .1 0 .2 0 1 0 ) e Rai a S. A. ( r e gi s tr o co nc ed id o e m
1 6 .1 2 .2 0 1 0 ) .
335
O i te m 2 .1 . d o R e g ula me n to d e fi ne : Co n tr o le Di f u so si g n i fi ca o P o d e r d e Co ntr o l e
ex er c id o p o r ac io ni s ta d ete n to r d e me n o s d e 5 0 % ( c i nq üe nt a p o r c e nto ) d o cap it al
so c ial , as si m co mo p o r gr up o d e ac io ni st a s q ue não sej a s i g nat ár io d e a co r d o d e vo to s e
q ue não e s tej a so b co n tr o le co mu m e n e m a t ue r ep r e se nt a nd o u m i nte r e s se co mu m.
165
formulada no Capítulo 3 (item 3.3.1., supra) de que a pílula assim utilizada
serve de incentivo ao aumento da dispersão acionária, possibilitando ao
hoje controlador majoritário passar a deter o controle da companhia com
menos da metade do capital social votante.

Entre as demais companhias, que não possuem controle


definido (46 companhias), 29 possuem poison pill.

4.2. Poison Pill e Penalidades

A força coercitiva da poison pill é atribuída pelas penalidades


estatutariamente estabelecidas para o caso de seu descumprimento.

Nos estatutos das companhias brasileiras que adotam a pílula,


há dois tipos de penalidade comumente utilizados: a previsão de suspensão
de direitos de sócio do acionista que não cumprir o previsto na cláusula de
poison pill (penalidade do Tipo 1) e a disposição acessória denominada
cláusula pétrea, cujo objetivo é dificultar a alteração ou remoção da pílula
(penalidade do Tipo 2).

No total, entre companhias com controle definido e não


definido, 58 possuem poison pill em seus estatutos, o que representa pouco
mais da metade das companhias listadas no Novo Mercado. Todas as 58
companhias apresentam a penalidade do Tipo 1.

Já a penalidade do Tipo 2 (cláusula pétrea) é adotada por 25


companhias, mesmo após a divulgação do Parecer de Orientação da CVM n o
36, de 23 de junho de 2009. Dessas, 13 companhias possuem controle
definido.

As companhias com penalidade do Tipo 2 representam menos


da metade daquelas que possuem poison pill, mas ainda assim estão em
número considerável. Interessante anotar, porém, que dentre os estatutos
166
das sete companhias recém-ingressadas no Novo Mercado (Tabela 2),
nenhum possui a cláusula pétrea, sendo que 4 das sete companhias adotam a
pílula.

4.3. Gatilho

Outro ponto relevante a ser mencionado é o percentual


escolhido como gatilho pelas diversas companhias que adotam a pílula. O
gatilho consiste no percentual máximo que pode ser adquirido ou titulado
pelos acionistas sem a necessidade de realizar a oferta pública prevista na
pílula. A detenção de ações em número igual ou superior ao definido como
gatilho enseja a realização da oferta.

Nas companhias analisadas, o gatilho varia de 10 a 35%, sendo


a média 20%. Destaque-se que apenas 3 companhias 336 adotam o gatilho de
10%, considerado bastante baixo.

4.4. Remoção da Pílula ou Dispensa da Oferta Pública

As companhias que apresentam a penalidade do Tipo 2, por


razão de incompatibilidade, não possuem dispositivo expresso que permita
a exclusão da pílula ou o afastamento da oferta.

Das 33 companhias com poison pill sem a previsão de cláusula


pétrea, 12 possuem a previsão expressa de que os acionistas, reunidos em

336
São e la s: M. D ia s B r an co S . A. I nd ú s tr ia e Co mé r c io d e Ali m en to s, P o s it i vo
I n fo r má t ica S. A. e S ão Mar t i n ho S. A. ( T ab el a 1 ) .
167
assembléia-geral, podem deliberar a exclusão ou dispensa da oferta pública,
se isso for do interesse da companhia.

Claro está que naquelas companhias que não possuem nem a


previsão de cláusula pétrea, nem disposição expressa permitindo a remoção
da pílula ou a dispensa da oferta, tal manobra está permitida, tendo em
vista que a assembléia-geral tem competência para reformar o estatuto
social, consoante o artigo 122, I, da Lei das Sociedades por Ações.

Mesmo nas companhias em cujo estatuto está presente a


cláusula pétrea, após a divulgação do Parecer de Orientação da CVM n o 36,
de 23 de junho de 2009, reforçada pela reforma do Regulamento de
Listagem do Novo Mercado 337, é possível a remoção da poison pill.

Entretanto, a questão mais polêmica, a nosso ver, refere-se à


previsão de quorum qualificado para a remoção da pílula, como é o caso da
Cia. Hering, cujo estatuto determina que a remoção da pílula depende do
voto concorde de dois terços do capital votante.

Entendemos que esse tipo de previsão é ilegal, diante da


previsão do artigo 129 da Lei das Sociedades por Ações, cuja interpretação
resulta na impossibilidade de os estatutos das companhias abertas
majorarem os quori legalmente previstos.

4.5. Tabelas

Abaixo, colacionamos as duas tabelas formuladas com os dados


acima apresentados.

337
So b r e, v. Cap ít u lo 3 , it e m 3 .3 .2 ., su p ra .
168
Tabela 1

Claúsula de
Existência de Acionista Previsão expressa
Proteção da Existência de
Companhias listadas no Novo Mercado Controlador titular de que os acionistas
Dispersão Gatilho "cláusula Penalidades
da BM&FBOVESPA em 06/07/2010 mais de 50% do capital podem afastar a
Acionária na pétrea"
votante338 pílula
forma de OPA (*)
Posição
Razão Social Sim / Não Sim / Não % Sim / Não Tipo 1 e/ou 2 Sim / Não
acionária em:
AMERICAN BANKNOTE S.A.* Não 30/12/09 Sim 20% Sim Tipo 1 e 2 N/A
ALIANSCE SHOPPING CENTERS S.A. Sim 12/11/09 Sim 30% Não Tipo 1 Sim (art. 37, §11)
AMIL PARTICIPACOES S.A. Sim 31/05/09 Não - N/A - -
B2W - COMPANHIA GLOBAL DO
Sim 13/05/09 Sim 20% Não Tipo 1 Não
VAREJO
BEMATECH S.A. Não 30/09/09 Sim 25% Não Tipo 1 Sim (art. 10, §10)
BHG S.A. - BRAZIL HOSPITALITY
Sim 30/04/09 Sim 35% Sim Tipo 1 e 2 N/A
GROUP
BMFBOVESPA S.A. BOLSA VALORES
Não 30/11/09 Sim 15% Não Tipo 1 Não
MERC FUT
BRASIL BROKERS PARTICIPACOES
Não 16/06/09 Sim 20% Não Tipo 1 Não
S.A.
BR MALLS PARTICIPACOES S.A. Não 29/07/09 Não - N/A - -
BR PROPERTIES S.A. Não 06/10/09 Sim 20% Não Tipo 1 Sim (art. 26, §4o)
BCO BRASIL S.A. Sim 31/03/09 Não - N/A - -
BRASILAGRO - CIA BRAS DE PROP
Não 21/10/09 Sim 20% Sim Tipo 1 e 2 N/A
AGRICOLAS

338
A p r i meir a co l u na, r el ati v a à e xi st ê nci a d e ac io n i st a co n tr o lad o r co m mai s d e 5 0 % d o cap ita l vo ta n te, b e m co mo a s no t a s e r e fer ê n ci a
ne la i n ser id a s, e nco nt r a m- s e na v er s ão o r i gi n al d o Re lató r io fo r mu l ad o p el a B M & F -B o ve sp a, d i s p o n í vel [ o n - l in e] i n
h ttp : // w w w.b mfb o v esp a . co m.b r/ emp re sa s/d o wn l o a d /C la u su la s- d e- Pro te ca o - C ia s- No vo - Me rca d o .xl s [ 0 3 .0 1 .2 0 1 1 ] .
169
Claúsula de
Existência de Acionista Previsão expressa
Proteção da Existência de
Companhias listadas no Novo Mercado Controlador titular de que os acionistas
Dispersão Gatilho "cláusula Penalidades
da BM&FBOVESPA em 06/07/2010 mais de 50% do capital podem afastar a
Acionária na pétrea"
votante pílula
forma de OPA (*)
Posição
Razão Social Sim / Não Sim / Não % Sim / Não Tipo 1 e/ou 2 Sim / Não
acionária em:
BRF - BRASIL FOODS S.A. Não 30/04/09 Sim 20% Sim Tipo 1 e 2 N/A
BROOKFIELD INCORPORAÇÕES S.A. Sim 10/11/09 Não - N/A - -
CAMARGO CORREA DESENV.
Sim 31/03/09 Não - N/A - -
IMOBILIARIO S.A.
CIA CONCESSOES RODOVIARIAS Sim 23/11/09 Não - N/A - -
CETIP S.A. - BALCÃO ORGANIZADO
Não 05/10/09 Sim 15% Não Tipo 1 Não
DE ATIVOS E DERIV.
CIA HERING Não 15/12/09 Sim 20% Não Tipo 1 Sim (art. 38, §11)
CIELO S.A. Sim 06/07/09 Não - N/A - -
CIA SANEAMENTO DE MINAS
Sim 18/06/09 Não - N/A - -
GERAIS-COPASA MG
COSAN S.A. INDUSTRIA E
Sim 29/03/10 Não - N/A - -
COMERCIO
CPFL ENERGIA S.A. Sim 23/04/09 Não - N/A - -
CR2 EMPREENDIMENTOS
Não 13/11/09 Não - N/A - -
IMOBILIARIOS S.A.
CREMER S.A. Não 04/05/09 Não - N/A - -
CSU CARDSYSTEM S.A. Sim 03/09/09 Não - N/A - -
CYRELA COMMERCIAL PROPERT
Não 08/10/09 Sim 15% Sim Tipo 1 e 2 Não
S.A. EMPR PART
CYRELA BRAZIL REALTY
Não 07/12/09 Não - N/A - -
S.A.EMPREEND E PART
DIAGNOSTICOS DA AMERICA S.A. Não 15/12/09 Sim 15% Sim Tipo 1 e 2 N/A
DIRECIONAL ENGENHARIA S.A. Sim 04/12/09 Não - N/A - -
DROGASIL S.A. Não 13/04/09 Não - N/A - -

170
Claúsula de
Existência de Acionista Previsão expressa
Proteção da Existência de
Companhias listadas no Novo Mercado Controlador titular de que os acionistas
Dispersão Gatilho "cláusula Penalidades
da BM&FBOVESPA em 06/07/2010 mais de 50% do capital podem afastar a
Acionária na pétrea"
votante pílula
forma de OPA (*)
Posição
Razão Social Sim / Não Sim / Não % Sim / Não Tipo 1 e/ou 2 Sim / Não
acionária em:
DURATEX S.A. Não 18/12/09 Não - N/A - -
BRASIL ECODIESEL IND COM BIO.
Não 27/08/09 Sim 30% Sim Tipo 1 e 2 N/A
OL. VEG. S.A.
ECORODOVIAS INFRAESTRUTURA E
Sim 30/06/04 Não - N/A - -
LOGÍSTICA S.A.
EMBRAER-EMPRESA BRAS DE
Não 29/04/09 Sim 35% Não Tipo 1 Não
AERONAUTICA S.A.
EDP - ENERGIAS DO BRASIL S.A. Sim 30/06/09 Não - N/A - -
EQUATORIAL ENERGIA S.A. Sim 20/03/09 Não - N/A - -
ESTACIO PARTICIPACOES S.A. Sim 21/12/09 Sim 20% N/A Tipo 1 Sim (art. 37, §4o)
ETERNIT S.A. Não 15/01/10 Não - N/A - -
EVEN CONSTRUTORA E
Não 30/06/10 Não - N/A - -
INCORPORADORA S.A.
EZ TEC EMPREEND. E
Sim 04/09/09 Sim 15% Sim Tipo 1 e 2 N/A
PARTICIPACOES S.A.
FERTILIZANTES HERINGER S.A. Sim 31/12/09 Sim 20% Sim Tipo 1 e 2 N/A
FIBRIA CELULOSE S.A. Não 30/05/09 Sim 25% Não Tipo 1 Não
FLEURY S.A. Sim 04/01/10 Não - N/A - -
GAFISA S.A. Não 22/02/10 Não - N/A - -
GENERAL SHOPPING BRASIL S.A. Sim 20/04/09 Sim 15% Sim Tipo 1 e 2 N/A
GRENDENE S.A. Sim 21/09/09 Não - N/A - -
ACUCAR GUARANI S.A.** Sim 31/07/09 Não - N/A - -
HELBOR EMPREENDIMENTOS S.A. Sim 30/06/09 Sim 20% Sim Tipo 1 e 2 N/A
HYPERMARCAS S.A. Sim 30/12/09 Não - N/A - -

171
Claúsula de
Existência de Acionista Previsão expressa
Proteção da Existência de
Companhias listadas no Novo Mercado Controlador titular de que os acionistas
Dispersão Gatilho "cláusula Penalidades
da BM&FBOVESPA em 06/07/2010 mais de 50% do capital podem afastar a
Acionária na pétrea"
votante pílula
forma de OPA (*)
Posição
Razão Social Sim / Não Sim / Não % Sim / Não Tipo 1 e/ou 2 Sim / Não
acionária em:
IDEIASNET S.A. Não 06/10/08 Não - N/A - -
IGUATEMI EMPRESA DE SHOPPING
Sim 19/11/09 Não - N/A - -
CENTERS S.A
INDUSTRIAS ROMI S.A. Não 07/04/09 Sim 15% Sim Tipo1 e 2 N/A
INPAR S.A. Sim 30/11/09 Sim 20% Sim Tipo 1 e 2 N/A
IOCHPE MAXION S.A. Sim 23/03/09 Sim 15% Sim Tipo 1 e 2 N/A
JBS S.A. Sim 31/12/09 Sim 20% Não Tipo 1 Não
JHSF PARTICIPACOES S.A. Sim 22/10/09 Sim 15% Não Tipo 1 Não
JÚLIO SIMÕES LOGÍSTICA S.A. Sim ¹ 19/04/10 Sim 15% Não Tipo 1 Não
RESTOQUE COMÉRCIO E
Não 30/04/09 Não - N/A - -
CONFECÇÕES DE ROUPAS S.A.***
LIGHT S.A. Sim 14/08/09 Não - N/A - -
LLX LOGISTICA S.A. Sim 30/10/09 Não - N/A - -
LOCALIZA RENT A CAR S.A. Não 08/04/08 Não - N/A - -
LOG-IN LOGISTICA INTERMODAL
Não 30/04/09 Sim 35% Sim Tipo 1 e 2 N/A
S.A.
MARISA LOJAS S.A. Sim 28/06/10 Sim 15% Não Tipo 1 Não
LOJAS RENNER S.A. Não 15/04/09 Sim 20% Sim Tipo 1 e 2 N/A
LPS BRASIL - CONSULTORIA DE
Não 23/09/09 Sim 20% Sim Tipo 1 e 2 N/A
IMOVEIS S.A.
LUPATECH S.A. Não 30/04/09 Sim 20% Não Tipo 1 Não
M.DIAS BRANCO S.A. IND COM DE
Sim 14/12/09 Sim 10% Não Tipo 1 Não
ALIMENTOS
MAGNESITA REFRATARIOS S.A. Sim 30/10/09 Não - N/A - -

172
Claúsula de
Existência de Acionista Previsão expressa
Proteção da Existência de
Companhias listadas no Novo Mercado Controlador titular de que os acionistas
Dispersão Gatilho "cláusula Penalidades
da BM&FBOVESPA em 06/07/2010 mais de 50% do capital podem afastar a
Acionária na pétrea"
votante pílula
forma de OPA (*)
Posição
Razão Social Sim / Não Sim / Não % Sim / Não Tipo 1 e/ou 2 Sim / Não
acionária em:
MARFRIG ALIMENTOS S/A Não 03/12/09 Não - N/A - -
METALFRIO SOLUTIONS S.A. Não 30/11/09 Não - N/A - -
MILLS ESTRUTURAS E SERVIÇOS DE
Sim ² 14/04/10 Sim 20% Não Tipo 1 Sim (art. 34, §4o)
ENGENHARIA S.A.
MINERVA S.A. Sim 30/04/09 Sim 20% Não Tipo 1 Sim (art. 47, §8o)
MMX MINERACAO E METALICOS
Sim 01/09/09 Não - N/A - -
S.A.
MPX ENERGIA S.A. Sim 31/12/09 Não - N/A - -
MRV ENGENHARIA E
Não 21/12/09 Não - N/A - -
PARTICIPACOES S.A.
MULTIPLUS S.A. Sim ³ 03/02/10 Não - N/A - -
NATURA COSMETICOS S.A. Sim 05/08/09 Sim 25% Não tipo 1 Sim (art. 33, par. 4)
ODONTOPREV S.A. Sim 23/12/09 Sim 15% Sim tipo 1 e 2 N/A
OGX PETROLEO E GAS
Sim 23/09/09 Não - N/A - -
PARTICIPACOES S.A.
OBRASCON HUARTE LAIN BRASIL
Sim 16/04/09 Sim 20% Não tipo 1 Não
S.A.
OSX BRASIL S.A. Sim 03/09/07 Não - N/A - -
PDG REALTY S.A. EMPREEND E
Não 30/11/09 Não - N/A - -
PARTICIPACOES
PORTO SEGURO S.A. Sim 30/11/09 Não - N/A - -
PORTOBELLO S.A. Não 24/04/09 Sim 30% Não tipo 1 Não
POSITIVO INFORMATICA S.A. Sim 28/04/09 Sim 10% Sim Tipo 1 e 2 N/A
PROFARMA DISTRIB PROD
Sim 01/10/09 Sim 20% Sim tipo 1 e 2 N/A
FARMACEUTICOS S.A.

173
Claúsula de
Existência de Acionista Previsão expressa
Proteção da Existência de
Companhias listadas no Novo Mercado Controlador titular de que os acionistas
Dispersão Gatilho "cláusula Penalidades
da BM&FBOVESPA em 06/07/2010 mais de 50% do capital podem afastar a
Acionária na pétrea"
votante pílula
forma de OPA (*)
Posição
Razão Social Sim / Não Sim / Não % Sim / Não Tipo 1 e/ou 2 Sim / Não
acionária em:
CIA PROVIDENCIA INDUSTRIA E
Sim 30/04/09 Não - N/A - -
COMERCIO
REDECARD S.A. Sim 01/04/09 Sim 26% Não tipo 1 Não
RENAR MACAS S.A. Sim 12/08/09 Não - N/A - -
RODOBENS NEGOCIOS
Não 05/11/09 Sim 15% Sim tipo 1 e 2 N/A
IMOBILIARIOS S.A.
ROSSI RESIDENCIAL S.A. Não 14/10/09 Sim 15% Não tipo 1 Sim (art. 43, §9o)
CIA SANEAMENTO BASICO EST SAO
Sim 29/04/09 Não - N/A - -
PAULO
SAO CARLOS EMPREEND E
Não 30/04/09 Sim 25% Não tipo 1 Não
PARTICIPACOES S.A.
SAO MARTINHO S.A. Sim 30/07/09 Sim 10% Não tipo 1 Não
SLC AGRICOLA S.A. Sim 06/04/09 Sim 20% Não tipo 1 Sim (art. 50, §8o)
SPRINGS GLOBAL PARTICIPACOES
Sim 30/04/09 Sim 20% Não tipo 1 Não
S.A.
TARPON INVESTIMENTOS S.A. Sim 19/03/10 Não - N/A - -
TECNISA S.A. Sim 03/12/09 Sim 20% Sim Tipo 1 e 2 N/A
TEGMA GESTAO LOGISTICA S.A. Sim 30/04/09 Não - N/A - -
TEMPO PARTICIPACOES S.A. Não 30/04/09 Sim 20% Não tipo 1 Não
TIVIT TERC. DE PROC., SERV. E TEC.
Sim 04/09/09 Não - N/A - -
S.A.
TOTVS S.A. Não 30/06/09 Sim 20% Sim tipo 1 e 2 N/A
TRACTEBEL ENERGIA S.A. Sim 06/05/09 Não - N/A - -
TRISUL S.A. Sim 27/05/09 Sim 15% Sim tipo 1 e 2 N/A

174
Claúsula de
Existência de Acionista Previsão expressa
Proteção da Existência de
Companhias listadas no Novo Mercado Controlador titular de que os acionistas
Dispersão Gatilho "cláusula Penalidades
da BM&FBOVESPA em 06/07/2010 mais de 50% do capital podem afastar a
Acionária na pétrea"
votante pílula
forma de OPA (*)
Posição
Razão Social Sim / Não Sim / Não % Sim / Não Tipo 1 e/ou 2 Sim / Não
acionária em:
TPI - TRIUNFO PARTICIP. E INVEST.
Sim 20/04/09 Sim 20% Sim tipo 1 e 2 N/A
S.A.
WEG S.A. Sim 06/04/09 Não - N/A - -
(*) Oferta pública de aquisição de ações.
FONTE: Informações Anuais - IAN, Prospectos de Distribuição Pública e Estatutos Sociais.

N/A - Não aplicável.

¹ Após a conclusão da Oferta Pública Inicial de ações (IPO), sem considerar o exercício da Opção de Ações
Suplementares.

² Após a conclusão da Oferta Pública Inicial de ações (IPO), sem considerar o exercício da Opção de Lote Suplementar
e a aquisição de Ações no Âmbito da Oferta Prioritária.

³ Após a conclusão da Oferta Pública Inicial de ações (IPO), considerando-se o exercício total da Opção do Lote
Suplementar.

* A AbNote agora é Valid Soluções e Serviços de Segurança em Meios de Pagamento e Identificação S.A.

** A Açúcar Guarani S.A. teve seu registro de companhia aberta cancelada em 13.08.2010.

*** A Restoque agora é Le Lis Blanc Deux Comércio e Confecções de Roupas S.A.

175
Tabela 2

Claúsula de Previsão expressa


Existência de Acionista Existência de
Companhias listadas no Novo Mercado da Proteção da que os acionistas
Controlador titular de mais "cláusula Gatilho Penalidades
BM&FBOVESPA após 06/07/2010 Dispersão Acionária podem afastar a
de 50% do capital votante1 pétrea"
na forma de OPA (*) pílula

Posição
Razão Social Sim / Não Sim / Não Sim / Não % Tipo 1 ou 2 Sim / Não
acionária em:
ANHANGUERA EDUCACIONAL
Sim Não
PARTICIPACOES S.A Não 7/12/2010 15% tipo 1 Não
BRASIL INSURANCE PARTICIPAÇÕES E
N/D - Sim Não
ADMINISTRAÇÃO S.A 20% tipo 1 Não
HRT PARTICIPAÇÕES EM PETRÓLEO
Não 28/12/2010 Sim Não
S.A. 20% tipo 1 Sim (art. 47, §4o)
PORTX OPERAÇÕES PORTUÁRIAS S.A. Não 19/11/2010 Não N/A - - -
RAIA S.A. N/D - Sim Não 20% tipo 1 Sim (art. 31, §4o)
REDENTOR ENERGIA S.A Sim 22/12/2010 Não N/A - -
TEREOS INTERNACIONAL S.A. Sim 4/10/2010 Não N/A - - -
(*) Oferta pública de aquisição de ações.
FONTE: Site da BM&F-Bovespa, Site da CVM e Estatutos Sociais

N/D: não disponível


1
Informação disponível no site da BM&F-Bovespa, em que consta que acionistas detentores de mais de 5% das ações
ordinárias, ainda que reunidos, não possuem mais de 50% do capital votante.

176
CONCLUSÃO

Ao longo deste trabalho, buscou-se trazer e examinar os


principais elementos envolvidos na tomada de controle de companhia
aberta, tais como seus instrumentos (em especial a oferta pública de
aquisição de ações), seus diferentes modos de regulação e, sobretudo, a
existência de técnicas de defesa normalmente utilizadas para obstar a
tomada de controle indesejada.

Após esse longo percurso, chegou-se ao tema central da


dissertação, que consiste justamente na análise da técnica defensiva mais
largamente utilizada pelas companhias brasileiras, referida no mercado
como cláusula de proteção à dispersão acionária, e pela doutrina já
apelidada de poison pill.

A intenção precípua do trabalho, além de trazer elementos


importantes para os debates acerca do tomada de controle, foi confrontar a
validade do mecanismo de defesa aqui adotado com a legislação e
regulação em vigor.

As denominadas poison pills brasileiras, e as disposições


acessórias normalmente a elas justapostas, têm sido alvo de acesos debates,
não só acadêmicos, como também no âmbito dos profissionais atuantes no
mercado e até mesmo no campo regulatório, como se pode ver nas
177
discussões que precederam a publicação do Parecer de Orientação da CVM
n o 36, de 23 de junho de 2009.

A doutrina nacional apenas recentemente começou a se


preocupar de forma mais acentuada com o tema, sendo a produção nacional
ainda pequena, embora de grande importância. Daí a necessidade de se
socorrer da experiência estrangeira no que toca ao assunto.

O motivo da falta de doutrina nacional especializada deve-se à


própria estrutura do mercado de capitais brasileiro, que apenas na última
década começou a caminhar na direção da dispersão acionária. Até o
momento, o perfil das companhias abertas brasileiras ainda é o
concentrado, caracterizado pela presença de acionista controlador definido,
detentor de mais da metade do capital social. Mas avanços em direção a um
mercado acionário mais disperso já podem ser sentidos.

Assim, trouxemos os dois principais modelos regulatórios no


que se refere à tomada de controle, nem tanto para enquadrar o perfil
brasileiro em um deles – missão que seria bastante difícil, como se pontuou
– mas sim na intenção de mostrar as possíveis alternativas no trato do
assunto, a que, acredita-se, os legisladores e reguladores devem ficar
atentos.

O influxo tanto do modelo norte-americano, quanto do modelo


europeu é forte na legislação brasileira. Citem-se, a título de exemplo, os
deveres “fiduciários” 339 impostos aos administradores, a exemplo do que
ocorre nos Estados Unidos da América. Há ainda a oferta pública
obrigatória, prevista pela legislação brasileira, assim como na européia. A
oferta obrigatória é, aliás, um dos principais pontos de divergência entre o
modelo norte-americano e o europeu.

Mas há pequena diferença entre a oferta obrigatóri a


determinada pela Diretiva Européia sobre Takeovers e a prevista na lei
brasileira – e é aqui que se encontra o ponto fértil para o surgimento da
poison pill brasileira: enquanto na Europa a oferta deve ser lançada sempre

339
E m ver d ad e, não s ão fi d uc iár io s , ma s s i m l e gai s, p o is d eco r r e m d a le i.
178
que ocorra a aquisição de percentual pré-definido de ações no mercado, no
Brasil, a oferta é válida apenas para os casos de alienação onerosa do
controle da companhia aberta.

Com isso, nos casos de aquisição originária de controle, não se


impõe a realização de oferta pública prevista no artigo 254-A da lei. O
dispositivo, como já se pontuou, é insuficiente como medida defensiva. É
justamente nessa lacuna que se visualizou a necessidade da adoção de
mecanismos de defesas pelas companhias brasileiras (cf. Capítulo 3, item
3.3., supra).

Assim é que vem à tona a poison pill à brasileira, a qual prevê


a necessidade de lançar oferta pública também naqueles casos de aquisição
de ações acima de determinado percentual.

Após confrontar os argumentos tanto favoráveis, quanto


contrários à pílula brasileira, concluiu-se pela sua licitude, entendendo seu
fundamento na autonomia privada, a exemplo de A. M. C O R D E IR O (cf.
Capítulo 3, item 3.3.1., supra). A oferta pública assim prevista não é
obrigatória, à luz da lei. Sua obrigatoriedade decorre dos dispositivo s
estatutários que a regulamenta, frutos da autonomia privada dos acionistas,
consignada no estatuto social.

Frisou-se que essa licitude, contudo, não se estende a outras


disposições comumente traçadas junto às poison pill, como é o caso das
cláusulas pétreas e da previsão de quorum de deliberação qualificado para a
remoção ou alteração da pílula.

Com isso, defende-se a licitude da pílula, desde que seja


possível a sua remoção ou afastamento episódico, para permitir à
companhia a realização de negócios do seu interesse.

Diante dessas conclusões, e dos dados levantados junto às


companhias listadas no Novo Mercado, trazidos para ilustrar a análise
realizada, espera-se contribuir e incentivar o estudo das medidas defensivas
contra a tomada de controle da companhia aberta, não só da poison pill à

179
brasileira, como também de outras técnicas que porventura possam ser aqui
validamente utilizadas.

180
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196
RESUMO

O presente trabalho cuida das técnicas comumente referidas


como cláusula de proteção à dispersão acionária, empregadas pelas
companhias brasileiras. Tais técnicas foram apelidadas pela comunidade
jurídica nacional de poison pills (pílulas de veneno). A expressão já é
utilizada na experiência norte-americana para se referir a um conjunto de
medidas defensivas contra a tomada de controle hostil, com as quais a
poison pill à brasileira guarda pouca semelhança.

O tema insere-se no contexto mais amplo da tomada de


controle da companhia aberta (takeover) e as técnicas de defesa usualmente
empregadas para impedi-la ou dificultá-la, quando indesejada. Tais técnicas
são principalmente empregadas por companhias com capital disperso no
mercado mobiliário e cujo poder de controle é exercido com a detenção de
parcela reduzida do capital social.

A busca pela maior dispersão acionária, bem como a presença


apenas de ações votantes, fez com que a pílula brasileira se tornasse
especialmente comum nas companhias listadas no Novo Mercado da
BM&F-Bovespa S.A. – Bolsa de Valores, Mercadorias e Futuros. A análise
proposta circunscreve-se a tais companhias e à defesa por elas adotada.

Dessa forma, parte-se da análise da disciplina jurídica das


ofertas públicas voluntárias (artigo 257 da Lei das Sociedades por Ações),
principal instrumento para a tomada de controle da companhia aberta,
passa-se pelos dois principais sistemas de regulação da tomada de controle,
com destaque para os modelos norte-americanos e inglês/europeu, para
enfim chegar à apreciação da medida defensiva denominada poison pill –
tanto como originalmente concebida, na prática forense norte-americana,
quanto em sua versão brasileira.

197
É tema recente na literatura jurídica brasileira, ainda pouco
explorado, mas bastante conhecido, estudado e vivenciado pela doutrina e
experiência estrangeira, com apoio na qual o presente trabalho foi
desenvolvido.

Palavras-chave: companhia aberta; tomada de controle; tomada de controle


hostil; takeover; poder de controle; oferta pública de aquisição; medidas
defensivas; poison pill; pílula de veneno; cláusula de proteção à dispersão
acionária.

198
RIASSUNTO

Il presente lavoro si occupa delle tecniche comunemente citate


come clausola di protezione alla dispersione azionaria, usate dalle società
brasiliane. Dette tecniche sono state soprannominate dalla comunità giuridica
nazionale di poison pills (pillole di veleno). L’espressione già è utilizzata
nell’esperienza nordamericana per riferirsi a un insieme di misure difensive
contro la scalata ostile, con la quale la poison pill alla brasiliana si somiglia
molto poco.

Il tema si inserisce nel contesto più ampio della scalata della


società cotata (takeover) e le tecniche di difesa usualmente impiegate per
impedirla o tornarla più difficile, quando non desiderata. Tali tecniche sono
principalmente usate da società con capitale disperso sul mercato mobiliare e il
cui potere di controllo è praticato con il controllo di porzione ridotta del
capitale sociale.

La ricerca per una maggiore dispersione azionaria, così come la


presenza solamente di azioni votanti, ha fatto con che la pillola brasiliana si
tornassi specialmente comune nelle società elencate nel Nuovo Mercato della
‘BM&F-Bovespa S.A.’ – Borsa Valori, Borsa Merce e Mercato a termine.
L’analisi proposta è circoscritta a dette società e alla difesa da loro adottate.

In questo modo, si parte dall’analisi della disciplina giuridica


delle offerte pubbliche volontarie (articolo 257 della Legge di Società per
Azioni), principale strumento per la scalata del controllo di società cotata,
passiamo per i due principali sistemi di regolazione della scalata, con distacco
ai modelli nordamericani e inglese/europeo, per infine arrivare alla valutazione
della misura difensiva denominata poison pill – tanto come originalmente
concepita, nella pratica forense nordamericana, quanto nella sua versione
brasiliana.

199
È tema recente nella letteratura giuridica brasiliana, ancora poco
investigata, ma abbastanza conosciuta, studiata e vissuta dalla dottrina ed
esperienza straniera, con base nella quale il presente lavoro è stato sviluppato.

P AROLE CHIAVE : società cotata; scalata della società cotata; scalata ostile;
takeover; potere di controllo; offerta pubblica di acquisto; misure difensive;
poison pill; pillola di veleno; clausola di protezione alla dispersione azionaria.

200

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