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BL ISSN 0102 – 2105 – VOL. 65 – Nº1: 1-156 – JAN.-MAR.

2021 / ESPECIAL COVID-19

ARTIGOS ORIGINAIS Colangiopatia pós Covid-19: uma nova entidade clínica . . . . . . . 69


Ana Maria Graciolli, Bruna Raasch De Bortoli, Eveline Maciel Corrêa
O impacto na saúde mental de estudantes universitários submetidos
Gremelmier, Carlos Frederico Henrich, Karina Salgado, Raul Ângelo
ao ensino digital remoto durante o isolamento social decorrente da
Balbinot6, Silvana Sartori Balbinot, Rafaelle Galiotto Furlan Nesello,
pandemia de Covid-19: uma revisão sistemática . . . . . . . . . . . . . . . . . 2
Jonathan Soldera
Alice Scalzilli Becker, Catarina Vellinho Busnello, Eduarda
Luckemeyer Banolas, Georgia Oliveira Avila, Mariana Graeff Bins ARTIGO DE REVISÃO
Ely, Marilia Oberto da Silva Gobbo, Mikaela Rita Schroeder Zeni,
Retorno às atividades escolares: segurança
Natalia Dias Koff, Lucas Spanemberg e precauções necessárias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 74
A atividade física e o sono de escolares durante a Aline Petracco Petzold, Carina Marangoni, Luiza Fernandes Xavier,
pandemia da Covid-19 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12 Marina Chaves Amantéa, Marina Musse Bernardes, Sérgio Luís Amantéa
Evilyn Thalia Valandro, Samuell Jensen Fernandes Barbosa, Rafaela Gestação e Covid 19: orientações de manejo, desfechos materno
Fernandes, Ivana Loraine Lindemann, Gustavo Olszanski Acrani, fetais, tratamento e profilaxia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .82
Tiago Teixeira Simon Lina Rigodanzo Marins, Ana Selma Bertelli Picoloto
Sintomas neurológicos e psiquiátricos em gestantes infectadas Danos endoteliais causados por SARS-CoV-2 e sequelas
pelo coronavírus: uma revisão sistemática com metanálise . . . . 19 pós-Covid: revisão de literatura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .91
Fernando Anschau, Nadiessa Dorneles Almeida , Victoria Zereu Luane Pereira Gomes, Michele Paula dos Santos, Raquel Silveira
Dreifus, Eduarda Mascarenhas Mardini, Marina Rosso Martins, de Maman, Bárbara Adelmann de Lima, Fernanda Bercht Merten,
Luciane Kopittke, Maria José Santos de Oliveira Bartira Ercília Pinheiro da Costa, Miriam Viviane Baron
O impacto da pandemia da Covid-19 no número de procedimentos Perfil de segurança das drogas do Kit-Covid em gestantes:
ginecológicos e nascimentos no Brasil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29 uma revisão integrativa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 96
Edson Vieira da Cunha Filho, Ellen Arlindo, Anne Bergmann Melissa Rogick Guzzi Taurisano, Aline Antônia Souto da Rosa, Paulo
Centeno, Janete Vetorazzi, Gustavo dos Santos Raupp, Ricardo Hernandes Martins, Carolina Paz Mohamad Isa, Rafaella
Eliana Márcia Wendland Petracco, Angélica Conzati Agostini, Adriana Arent

Prevalência de positividade para Covid-19 entre gestantes O impacto do isolamento social na saúde mental dos idosos
atendidas em um hospital privado . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35 durante a pandemia da Covid-19 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101
Ellen Machado Arlindo, Anne Caroline Bergmann Centeno, Gustavo Roberta Vieira Pecoits, Aline Antônia Souto da Rosa, Jordana Vargas
dos Santos Raupp, Edson Vieira da Cunha Filho, Janete Vettorazzi Peruzzo, Marcela Cristina Flores, Maria Cristina Gehlen, Milena
Sbalchiero Morello, Rafaela Gageiro Luchesi Soares, Sofia Pacheco
Impacto psicossocial da vivência da pandemia do Covid-19 Estima Correia, Tiago Isamu Saiguchi Murakami, Victória Scheffer
entre os profissionais de saúde de um hospital público no Lumertz, Rodolfo Herberto Schneider
Rio Grande do Sul . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39
Impacto da pandemia Covid-19 na sexualidade:
Martina Parenza Arenhardt, Viviane Buffon
uma revisão da literatura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 109
Adesão às medidas de prevenção à Covid-19 no Eveline Franco da Silva, Nadine de Souza Ziegler, Fernanda Santos
Rio Grande do Sul . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44 Grossi, Luciana Borges Chagas, Janete Vettorazzi
Ueslei Mossoi Tribino1, Christian Pavan do Amaral2, Jéssica Estratégias terapêuticas falhas na Covid-19:
Pasquali Kasperavicius3, Raimundo Maurício dos Santos4, Amauri por que o uso de “kit Covid” ou “tratamento precoce”
Braga Simonetti5, Ivana Loraine Lindemann6, Júlio César Stobbe7, é inadequado e não se justifica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 115
Tiago Teixeira Simon8, Gustavo Olszanski Acrani9 Wagner Luis Nedel, Ana Carolina Peçanha Antônio, Edison Moraes
Parâmetros para transporte e armazenamento de amostras para Rodrigues Filho
detecção de SARS-CoV-2 por RT-PCR . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52 Enfrentando um inimigo novo com velhas armas: uso de
Amanda Marchionatti, Felipe Valle Fortes Rodrigues, Ana Paula máscaras, higienização das mãos e das superfícies, isolamento,
Klaus Damasceno, Fabio Jean Varella de Oliveira, Ismael Plentz, distanciamento social, quarentena e lockdown para controle da
Gabriele Goulart Zanirati, Jaderson Costa Da Costa, Daniel Rodrigo Covid-19. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 123
Marinowic Luíza Emília Bezerra de Medeiros, Isadora Cristina Olesiak
Cordenonsi, Dimitris Rucks Varvaki Rados, Elise Botteselle de
RELATO DE CASO Oliveira, Renata Rosa de Carvalho, Rudi Roman, Rodolfo Souza da
Ischemic Gastropathy in a Covid-19 pneumonia patient . . . . . . . .58 Silva, Marcelo Rodrigues Gonçalves, Roberto Nunes Umpierre
Jonathan Soldera, Karina Salgado
Estratégias e experiências acerca do rastreio universal em
Atenção farmacêutica na realização de testes rápidos de Covid-19 gestantes admitidas nas maternidades hospitalares . . . . . . . . . 132
em uma farmácia privada: Relato de experiência . . . . . . . . . . . . . 60 Thales Moura de Assis, Celene Longo Maria da Silva
Liciani de Mello Feliciano, Walmor Feliciano, Gabriele Moroni de
Souza, Ana Paula Poleto, Marianna de Moura Nora, Gabriéli Berton,
ARTIGO ESPECIAL
Maria Eduarda da Silva, Mariana Brandalise, Maria Renita Burg Indicações para procedimentos torácicos invasivos em pacientes
com Covid-19: estudo observacional de 92 cirurgias . . . . . . . . . 145
Gravidez Ectópica Rota e Covid-19: um relato de caso . . . . . . . . 65 Renata Baú, Airton Schneider, Paulo Roberto Kriese, Danielle
Aline Antônia Souto da Rosa, Melissa Rogick Guzzi Taurisano, Sgarabotto Ribeiro, Laura Born Vinholes, João Victor Santos
Angélica Conzati Agostini, Ana Laura L. Jaccottet, Kátia Elisabete
Pires Souto INSTRUÇÕES REDATORIAIS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 149
ARTIGO ORIGINAL

O impacto da pandemia da Covid-19 no número de


procedimentos ginecológicos e nascimentos no Brasil
The impact of the Covid-19 pandemic on the number of
gynecological procedures and births in Brazil

Edson Vieira da Cunha Filho1, Ellen Arlindo2, Anne Bergmann Centeno3


Janete Vetorazzi4, Gustavo dos Santos Raupp5,Eliana Márcia Wendland6

RESUMO

Introdução: A pandemia da Covid-19 tem impactado os sistemas de saúde de diversas formas e, em última instância, gera colapso na
atenção à saúde. Entre as medidas restritivas para contenção da disseminação da doença, inclui-se o cancelamento de procedimentos
cirúrgicos eletivos, e o impacto na saúde da população ainda é incerto. Nosso estudo objetiva avaliar a influência da pandemia na
redução de procedimentos cirúrgicos ginecológicos e obstétricos no Brasil. Métodos: Série temporal, descritiva, sobre o número de
procedimentos ginecológicos e obstétricos realizados entre janeiro de 2016 e fevereiro de 2021 no Brasil. Os dados foram coletados
diretamente de sites oficiais do governo brasileiro. Resultados: No ano de 2020, houve uma diminuição de 35% no número total de
procedimentos ginecológicos realizados comparado aos anos anteriores e, em momentos críticos, a redução chegou a 50%. A redução
foi mais acentuada nas regiões Nordeste e Sudeste. Quanto ao número de nascimentos, houve retração nos nascimentos no SUS e,
no setor privado especificamente na Região Sudeste. Conclusão: A redução de 50% no volume de cirurgias ginecológicas no sistema
público de saúde do Brasil é um dado de extrema relevância negativa em nosso sistema de saúde já sobrecarregado. A redução da na-
talidade foi evidente na região Sudeste do Brasil e, entre as classes sociais de mais baixa renda, ocorreu em todo o território nacional.

UNITERMOS: Coronavírus, Ginecologia, Obstetrícia

ABSTRACT

Introduction: The Covid-19 pandemic has affected health systems in many ways, with a chance of breaking it. Among the restrictive measures to stop
the disease’s dissemination there is the elective surgical procedures cancelling. This impact on the population’s health is uncertain. Our aim is to evaluate the
influence of the pandemic in the gynecologic and obstetrics procedures reduction in Brazil. Methods: Time series of gynecological and obstetrics procedures
between January 2016 and February 2021 in Brazil. The data were collected from Brazilian government official websites. Results: In the year of 2020
there was a 35% reduction in gynecologic procedures performed compared to the 4 past years and. At critical moments, the reduction was 50%. The most
affected regions were Northeast and Southeast. The number of births has decreased in the public health system and, in the private system, we saw reduction
specifically in the southeast area. Conclusion: The reduction of 50% in gynecologic surgeries in the Brazilian public health system is a relevant negative
data in our already overwhelming public health system. The reduction in birth rates was evident in the Southeastern region of Brazil and, among the lowest
income classes, occurred throughout the national territory.

KEYWORDS: Coronavirus, Gynecology, Obstetrics

1
Doutor em Medicina pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-RS). (Chefe do Serviço de Obstetrícia do Hospital Moinhos de Vento)
2
Aluna de Doutorado do PPGGO da Famed da UFRGS (Médica Ginecologista e Obstetra)
3
Aluna de Mestrado da PPGGO da Famed na UFRGS (Enfermeira Especialista em Enfermagem Obstétrica pela Unisinos)
4
Doutora em Medicina com ênfase em Gestação de Alto Risco pela Famed/UFRGS (Professora da PPGGO da Famed da UFRGS)
5
Fellow em Obstetrícia de Alto Risco do Hospital Moinhos de Vento (Médico Ginecologista e Obstetra)
6
Doutorado em Epidemiologia na UFRGS (Médica Epidemiologista do Hospital Moinhos de Vento, Professora do PPG em Pediatria e Ciências
da Saúde da UFCSPA)

Revista da AMRIGS, Porto Alegre, 65 (1): 29-34, jan.-mar. 2021 29


O IMPACTO DA PANDEMIA DA COVID-19 NO NÚMERO DE PROCEDIMENTOS GINECOLÓGICOS E NASCIMENTOS NO BRASIL Filho et al.

INTRODUÇÃO necológicos e dos nascimentos dos hospitais que prestam


atendimento ao SUS) (6); b) www.transparencia.registroci-
O coronavírus é um vírus de RNA isolado e descrito vil.org.br (de onde extraíram-se os dados relativos aos re-
pela primeira vez como causador de infecção em hu- gistros de recém-nascidos realizados no período estudado)
manos na década de 1960 (1,2). Em dezembro de 2019, (7); c) www.svs.aids.gov.br (onde o banco de dados foi o
houve o surgimento de um novo vírus, coronavírus 2019 painel de monitoramento de nascidos vivos) (8).
(Covid-19), com epicentro na China. A Covid-19 vem Os dados referentes aos procedimentos ginecológicos
causando um aumento significativo de internações hos- foram obtidos no site Datasus (a) utilizando-se o seguinte
pitalares com morbidade e mortalidade variáveis. Pode filtro: Procedimentos hospitalares do SUS – por local de
cursar com doença respiratória aguda (SARS-Cov-2) e internação – Brasil; AIH aprovadas por Região e Ano pro-
multissistêmica, podendo variar de casos assintomáticos cessamento; Grupo procedimento: 04 – Procedimentos
até doença grave e óbito. Os sintomas mais comuns são cirúrgicos; Subgrupo proced.: 0409 – Cirurgia do apare-
tosse, febre, mialgia, dor de garganta e cefaleia, cursan- lho geniturinário; Forma de organização: 040906 – Útero e
do, em casos graves, com pneumonia, choque séptico anexos, 040907 –Vagina, vulva e períneo.
e falência múltipla de órgãos (1,2). É um vírus respira- Os dados foram expressos em tabelas através do pro-
tório transmitido principalmente via gotículas pela fala, grama Microsoft Excel e exibidos por descrição simples de
tosse e pelos espirros, podendo ser transmitido tanto números exatos e média aritmética simples.
por pacientes sintomáticos quanto por assintomáticos
que irão desenvolver sintomas. RESULTADOS
Medidas restritivas têm sido implantadas para restringir
a circulação viral, diminuindo a disseminação da doença A média de procedimentos cirúrgicos ginecológicos
com o intuito de achatamento da curva epidêmica e evitar a realizados no SUS nos últimos 4 anos antes da pande-
sobrecarga dos sistemas de saúde do mundo. Dessa forma, mia (2016 e 2019) foi de 287.296 procedimentos por
visando-se a minimizar os riscos para o paciente, equipe ano (distribuídos nas diferentes regiões do Brasil, con-
médica e priorizar ambientes hospitalares para atendimen- forme Figura 1). No ano de 2020, foram feitas 186.651
tos de pacientes com Covid, os procedimentos cirúrgicos cirurgias ginecológicas, o que correspondeu a uma dimi-
eletivos de todas as especialidades foram cancelados, in- nuição de 35% no número total de procedimentos rea-
cluindo os dentro da área da ginecologia e obstetrícia (3). lizados por ano. No entanto, os efeitos da pandemia do
Conforme dados da literatura, estima-se que em torno novo coronavírus no Brasil tornaram-se evidentes ape-
de 28 milhões de cirurgias eletivas deixaram de ser realizadas nas a partir do mês de abril de 2020. Se considerarmos
devido à pandemia de Covid-19. Não há dados atuais exatos a produção hospitalar pelo SUS de 2019 entre os meses
sobre o impacto da pandemia nos procedimentos cirúrgicos de abril e dezembro (236.693) e compararmos com a
no Brasil. Tendo em vista que as agências de saúde reco- produção hospitalar pelo SUS de 2020, entre os mesmos
mendam a não realização de cirurgias eletivas, estima-se uma meses (121.066), vemos uma redução de quase 50% no
diminuição em torno de 30% de procedimentos (4,5). Na volume de cirurgias (Gráfico 2). Outro dado que eviden-
Austrália, estima-se que houve uma redução média de 13% cia essa intensa redução é a comparação dos meses de
nos procedimentos ginecológicos em período no qual foram janeiro e fevereiro de 2020 (em que ainda não estávamos
suspensos os procedimentos eletivos e, em momentos de sob o efeito das medidas de restrição e superlotação dos
maior restrição, essa redução passou de 40% (6).
Haja vista a importância de mapearmos os impactos da
pandemia nas diferentes áreas e a carência de dados nacio-
nais, nosso estudo objetiva avaliar o impacto desta pande-
mia na redução de procedimentos cirúrgicos ginecológicos
e obstétricos no Brasil.

MÉTODOS

Série temporal, descritiva, sobre o número de procedi-


mentos ginecológicos e obstétricos realizados entre janeiro
de 2016 e fevereiro de 2021, no Brasil.
Os dados foram extraídos de três sites que computam
informações nacionais oficiais a respeito dos procedimen-
tos executados no país: a) Sistema de Informações Hospi-
talares do SUS (SIH/SUS), disponível em www2.datasus. Gráfico 1 - Procedimentos ginecológicos realizados no SUS no Brasil,
gov.br (banco de dados dos procedimentos cirúrgicos gi- entre 2016 e 2020

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O IMPACTO DA PANDEMIA DA COVID-19 NO NÚMERO DE PROCEDIMENTOS GINECOLÓGICOS E NASCIMENTOS NO BRASIL Filho et al.
Gráfico 2 - Procedimentos ginecológicos realizados no SUS no Brasil em 2019 e 2020.

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Gráfico 2 - Procedimentos ginecológicos realizados no SUS no Brasil, Gráfico 4 - Comparação do número de procedimentos ginecológicos
em 2019 e 2020. realizados em 2020 com a média de 2016-2019, divididos por região
do Brasil

Gráfico 3 - Procedimentos cirúrgicos ginecológicos SUS em janeiro e


fevereiro de 2020 e 2021 Gráfico 5 - Número de registros de nascimentos no Brasil entre 2016
e 2020

hospitais devido à Covid-19) com a produção nos mes-


mos meses em 2021 45.449 (JAN e FEV/2020) x 27.837
(JAN e FEV/2021) (redução de 39%) (Gráfico 3).
A redução geral quanto ao número de cirurgias foi mais
acentuada nas regiões Nordeste e Sudeste (redução de 37% em
cada), e os dados por cada região encontram-se no Gráfico 4.
Quanto ao número de nascimentos, não verificamos re-
duções quando comparamos a média de nascimentos nos
últimos 4 anos antes da pandemia (2.629.154 nascimentos),
com o ano de 2020 (2.613.217 nascimentos). Este dado se
refere aos registros de nascimentos realizados por ano no
Brasil, computando os dados tanto do setor público quan-
to do privado. Os números referentes aos registros no Bra-
sil encontram-se nos gráficos 5 e 6.
Quando observamos apenas os dados de nascimentos Gráfico 6 - Registros de nascimentos entre a média de 2016/2019 e
no SUS, percebemos um declínio de 11% quando com- 2020
parados o ano de 2020 (1.004.361 nascimentos no SUS) e
a média dos 4 anos anteriores (1.119.693 nascimentos no
SUS) (gráficos 7 e 8). Já no ano de 2021, temos um declínio meses de 2021), com a média de nascimentos nestes mes-
de 4%, quando comparamos o número total de nascimen- mos dois meses somados nos últimos 5 anos (2016-2020)
tos nos meses de janeiro e fevereiro (417.068 somados os 2 (434.658 nascimentos) (Gráfico 9).

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O IMPACTO DA PANDEMIA DA COVID-19 NO NÚMERO DE PROCEDIMENTOS GINECOLÓGICOS E NASCIMENTOS NO BRASIL Filho et al.

os dois meses) com os dois primeiros meses do ano entre


os anos 2016-2019 (média de 181.857 nascimentos soma-
dos os dois meses) (Gráfico 10).

DISCUSSÃO

A pandemia da Covid-19 e as medidas necessárias para


mitigar o número de infecções e mortes têm repercutido
de forma importante no tratamento de outras doenças,
podendo causar uma situação de sindemia, refletindo-se
em um aumento de mortalidade por doenças que seriam
prevenidas se tivessem sido diagnosticadas ou, então, tra-
tadas de uma forma precoce e que foram postergadas em
Gráfico 7 - Nascimentos no SUS entre 2016-2020 virtude da Covid. Por outro lado, o número de nascimen-
tos somente apresentou uma redução em usuários do SUS,
evidente em todas as regiões do país, porém, quando anali-
sados os setores público e privado juntos, essa redução foi
observada apenas na Região Sudeste, a mais industrializada
e desenvolvida do país, podendo significar um refreamento
da natalidade devido à preocupação dos casais com o futu-
ro incerto da economia.
Diferentes países adotaram e adaptaram protocolos
próprios de distanciamento e redução de procedimentos
eletivos conforme suas realidades (momento da pandemia,
capacidade do sistema de saúde, volume de insumos, medi-
cações, testes, etc...). Mesmo na Austrália, um país onde os
números de casos e óbitos foram baixos até o momento, o
número de certos procedimentos ginecológicos se reduziu
em cerca de 20% quando comparado o primeiro semestre
de 2019 com o de 2020 (6).
Gráfico 8 - Comparação entre a média de nascimentos no SUS entre No Brasil, estima-se que até 1 milhão de cirurgias pos-
2016/2019 e 2020 sam ter sido suspensas no ano de 2020, com retração de
50-60% no volume dos procedimentos, chegando até 90%
em algumas regiões. No mundo, projeta-se que cerca de 28
milhões de cirurgias sejam canceladas ou postergadas, pre-
judicando o tratamento de mais de 2 milhões de casos de
câncer (4). Ao vermos nossos dados, estimamos uma redu-

Gráfico 9 - Número médio de registros de nascimentos no Brasil,


somados os meses de janeiro e fevereiro entre 2016/2020 e a soma
de janeiro e fevereiro em 2021

Quando olhamos esses dados apenas na saúde públi-


ca, a redução é expressivamente maior, correspondendo a
Gráfico 10 - Número médio de nascimentos no SUS no Brasil,
18% menos de nascimentos quando comparados os dois somados os meses de janeiro e fevereiro entre 2016/2020 e a soma
primeiros meses de 2021 (149.671 nascimentos somados de janeiro e fevereiro em 2021

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O IMPACTO DA PANDEMIA DA COVID-19 NO NÚMERO DE PROCEDIMENTOS GINECOLÓGICOS E NASCIMENTOS NO BRASIL Filho et al.

ção em 35% das cirurgias ginecológicas pelo Sistema Único comportamento, educação, economia são possíveis expli-
de Saúde, mas, em períodos de agravamento da doença, cações sociais para as três situações identificadas por nosso
esses números chegam a 50%. Tais dados assemelham-se estudo, mas as respostas finais para estas peculiaridades en-
aos encontrados na literatura mundial (6). contradas quanto ao comportamento da natalidade do ano
Em contrapartida, quando olhamos o número de nasci- de pandemia de 2020 precisarão ainda de bastante tempo
mentos no Brasil, percebemos três situações de comporta- de observação para serem esclarecidas. (gráficos 11 e 12).
mentos diferentes que merecem nossa atenção. A primeira É fundamental que se reflitam as orientações de sociedades
se refere aos nascimentos tanto no setor público quanto no internacionais de obstetrícia quanto ao esclarecimento do
privado quando analisados de uma forma conjunta. Nessa risco de gestação no período da pandemia, em decorrência,
análise, não observamos nenhuma alteração significativa principalmente, dos já sabidos fatores agravantes para essa
na taxa de nascimentos no ano de 2020, ao contrário do população (12-15).
que a grande mídia tem anunciado. De um lado, o medo Dois dados são importantes de serem apresentados
do novo, das repercussões econômicas, o medo da morte como fraquezas de nosso estudo. O primeiro cabe à in-
com as complicações da doença, fazendo com que, supos- consistência dos dados oficiais nacionais. Quando nos re-
tamente, a natalidade caísse. De outro, o instinto básico de ferimos aos nascimentos no país, o site www.svs.aids.gov.
sobrevivência da espécie, com os casais colocados na maior br possui um nítido atraso na alimentação dos dados. A
parte do tempo em casa, restritos de contato com o meio partir do mês de agosto de 2020, observamos a redução
externo e em maior exposição entre si. de cerca de 50% no número de nascimentos registrados,
A segunda situação se refere a um declínio de mais de não se podendo utilizar o respectivo site como fonte atua-
lizada de informação, para este período de tempo. Devido
10% no número de nascimentos, em todas as regiões do
a isso, usamos o portal da transparência do registro civil
Brasil, quando observados apenas os dados de nascimen-
nacional, site de livre acesso, desenvolvido para disponi-
tos no SUS. Tendo em vista que o Sistema Único de Saúde
bilizar ao cidadão informações e dados estatísticos sobre
é utilizado no Brasil predominantemente pelas classes so- nascimentos, casamentos e óbitos, apresentando uma
ciais de mais baixa renda, é possível que a explicação mais atualização sem atrasos até, pelo menos, o mês de feve-
plausível para essa situação resida na questão econômica, reiro de 2021 (o qual foi o último mês que fizemos a pes-
tanto do ponto de vista de custos para sustentar um filho quisa). O segundo ponto importante a ser mencionado
a mais, quanto no acesso à saúde, que pode ter sido afeta- é quanto à nossa apresentação dos dados referentes aos
da pela Covid-19 nos casais com menos poder aquisitivo, nascimentos do SUS. Quando sugerimos uma redução no
tendo menos recursos para tratamentos e recuperação no número de nascimentos em 2020 e em 2021, comparados
SUS, com repercussão possível na natalidade. com os anos anteriores, partimos de uma base de dados
E a terceira situação diz respeito apenas à Região Su- que parece conter as atualizações recentes. Entretanto,
deste, que foi a única do país que teve uma diminuição sig- consta no respectivo site que os dados dos últimos 6 me-
nificativa no número de nascimentos quando observados ses estão sujeitos à auditoria.
os setores público e privado conjuntamente (a Região Sul Identificamos uma certa escassez na literatura interna-
apresentou um leve declínio também). Vemos aqui exata- cional quanto aos dados oficiais de diminuição de proce-
mente o contrário do apresentado no parágrafo anterior, dimentos ginecológicos e obstétricos. Parece que nossos
considerando-se que a Região Sudeste corresponde à re- números correspondem aos de outros países, e isso pode
gião mais industrializada e desenvolvida do Brasil. Medo,

Gráfico 12 - Comparação entre a média de nascimentos no Brasil nos


Gráfico 11 - Comparação entre a média de nascimentos no Brasil no setores público e privado, por Região, entre os anos de 2016-2019 e
SUS, por Região, entre os anos de 2016-2019 e o ano de 2020 o ano de 2020

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O IMPACTO DA PANDEMIA DA COVID-19 NO NÚMERO DE PROCEDIMENTOS GINECOLÓGICOS E NASCIMENTOS NO BRASIL Filho et al.

nos ajudar a copiar o modelo de retomada já adotado por 7. DATASUS [Internet]. [cited 2021 Apr 27]. Available from: http://
alguns países. Uma nova perspectiva que se pode lançar www2.datasus.gov.br/DATASUS/index.php
8. Portal da Transparência - Registro Civil [Internet]. [cited 2021 Apr
mão para o restabelecimento de consultas ginecológicas e 27]. Available from: https://transparencia.registrocivil.org.br/espe-
obstétricas e, consequentemente, os procedimentos cirúr- cial-Covid
gicos é o uso da telemedicina. (16-18). Contudo, mais es- 9. Departamento de Análise de Saúde e Vigilância de Doenças Não
Transmissíveis (DASNT) - SVS/MS [Internet]. [cited 2021 Apr 27].
tudos são necessários para avaliação adequada dessa nova Available from: http://svs.aids.gov.br/dantps/
ferramenta. 10. Sairally BZF, Clark TJ. Prioritisation of outpatient appointments
Destacamos a importância de nosso estudo para dimen- and elective surgery in gynaecology. Best Pract Res Clin Obstet Gy-
naecol [Internet]. 2021 Mar [cited 2021 Apr 27]; Available from:
sionar o impacto da pandemia nos procedimentos gineco- https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/33883091/
lógicos e nos nascimentos no Brasil de forma global. Em 11. Thomas V, Maillard C, Barnard A, Snyman L, Chrysostomou A,
um país onde a saúde pública agoniza, onde os serviços Shimange-Matsose L, et al. International Society for Gynecologic
Endoscopy (ISGE) guidelines and recommendations on gynecolo-
que prestam assistência ao SUS apresentam filas que ultra- gical endoscopy during the evolutionary phases of the SARS-CoV-2
passam os dois anos de espera para determinadas cirurgias, pandemic [Internet]. Vol. 253, European Journal of Obstetrics and
mesmo elas sendo, muitas vezes, de baixa complexidade, Gynecology and Reproductive Biology. Elsevier Ireland Ltd; 2020
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