Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Liturgia
3
4
Como participar da Santa
Missa
O sacrifício de Cristo foi suficiente para pagar por
nossas dívidas com Deus, pois como ensina São
Paulo: “Foi em virtude desta vontade de Deus que
temos sido santificados uma vez para sempre, pela
oblação do corpo de Jesus Cristo. (...) Cristo
ofereceu pelos pecados um único sacrifício... (...)
Por uma só oblação ele realizou a perfeição
definitiva daqueles que recebem a santificação.”
(Hb 10,10.12a.14) Se o próprio Deus morre, o
valor de Seu sacrifício há de ser infinito, suficiente
para saldar qualquer dívida!
5
Apóstolos, seus sucessores e os colaboradores
destes.
6
mesma e única, porém de modo incruento. No altar
da igreja: todo sacrifício precisa de um altar; a Cruz
foi o altar onde Cristo ofereceu o sacrifício de Seu
Corpo Santíssimo; na Missa não há uma Cruz física
onde Cristo deva morrer, mas um altar onde é
celebrado o sacrifício e os dons são oferecidos.
Pelas mãos do sacerdote: num sacrifício, além do
altar, é preciso uma vítima e um sacerdote, i.e., um
sacrificador; quando o altar foi a Cruz, Jesus Cristo
foi a Vítima, mas também o Sacerdote, pois
ninguém O matou, antes Ele mesmo Se entregou à
morte por nós; na Santa Missa, se o altar é o da
igreja, e a vítima é Cristo, eis que o sacrifício é o
mesmo, também há identidade quanto ao sacerdote,
o sacrificador. Validamente ordenado: Jesus
mandou que os Apóstolos realizassem o sacrifício
feito na Cruz e antecipado na última Ceia, e eles
passaram o mandato a seus sucessores e aos
colaboradores destes; os sucessores dos Apóstolos
são os Bispos, e os colaboradores os padres, unidos
a Cristo pelo sacramento da Ordem.
7
discípulo amado, São João, o Apóstolo e
Evangelista, quando estamos assistindo o Santo
Sacrifício devemos ter as mesmas atitudes de
ambos. Certamente, não estavam Nossa Senhora
nem São João batendo palmas: sua alegria pela
salvação que se operava era interna, e se misturava
com uma viva dor pelos pecados da humanidade,
cometidos de tal forma que fizeram Deus sofrer e
derramar Seu Sangue por nós. Imitando os
sentimentos e atitudes de São João e da Virgem
Maria aos pés da Cruz, estamos participando da
Missa de um modo santo e salutar.
1
São Leonardo de Porto Maurício. Tesouro Oculto
8
Unindo a terra ao céu!
A liturgia terrestre, em todos os seus atos, é um
reflexo da liturgia celeste. Os nossos louvores
sobem ao céu e unem-se aos dos santos e dos anjos,
pois, como único Corpo Místico de Cristo que
somos, como uma única Comunhão dos Santos,
como uma única Igreja santa e católica, nossas
atitudes de reverência à Trindade devem ser
apresentadas como se fossem um só cântico:
multiplicam-se as vozes, mas o hino é uníssono!
9
Por sua vez, na Liturgia das Horas entoamos
salmos e hinos que se unem àqueles eternamente
cantados pelos anjos do céu. "Na minha visão ouvi
também, ao redor do trono, dos Animais e dos
Anciãos, a voz de muitos anjos, em número de
miríades de miríades e de milhares de milhares,
bradando em alta voz: 'Digno é o Cordeiro
imolado de receber o poder, a riqueza, a
sabedoria, a força, a glória, a honra e o louvor.' E
todas as criaturas que estão no céu, na terra,
debaixo da terra e no mar, e tudo que contém, eu
as ouvi clamar: 'Àquele que assenta no trono e ao
Cordeiro, louvor, honra, glória e poder pelos
séculos dos séculos.' E os quatro Animais diziam:
'Amém!' Os Anciãos prostravam-se e adoravam."
(Ap 5,11-14) A cada hora canônica celebrada no
Ofício Divino, somam-se as vozes e todos se
congregam numa só comunidade em adoração ao
Deus Eterno. Das lições da Liturgia das Horas,
retiramos as preciosas leituras da Sagrada
Escritura, dos Padres e dos Santos, que nos dão a
esperança de participar um dia da Igreja celeste
que, em coro, tributa louvores ao Criador.
10
faz presente. E a Missa, sabemos, é a Cruz tornada
presente! O céu e a terra se unem! Os anjos
participam da Missa! O Santo Sacrifício celebrado
é a porta que nos leva ao céu: estando aberta, temos
acesso às maravilhas celestes, e miríades de anjos
rondam as igrejas e os altares quando o padre
oferece Cristo ao Pai por nossos pecados. “Era
opinião de São João Crisóstomo, opinião aprovada
e confirmada por São Gregório, no quarto de seus
Diálogos, que no momento em que o padre celebra
a Missa os céus se abrem e multidões de anjos
descem do Paraíso para assistir o Santo Sacrifício.
São Nilo Abade, discípulo do mesmo São João
Crisóstomo, afirma que via, quando este santo
doutor celebrava, uma grande multidão daqueles
espíritos celestes assistindo os ministros sagrados
em suas augustas funções.”2
11
Militante, homens da Igreja Triunfante, homens da
Igreja Padecente, todos nos unimos em cada Missa
celebrada, atualização do único sacrifício
oferecido.
12
Missa em latim – I
Certos canais da imprensa noticiaram, há alguns
anos, que o Papa autorizou o retorno das “Missas
em latim”. Como de costume, tal informação está
completamente equivocada.
13
possibilidade do uso completo do vernáculo e da
posição versus populum (sem obrigar, frise-se). É
essa mudança que Lefebvre e seus seguidores
contestam, não a língua. Claro, a Missa “antiga” é
em latim, mas a “nova” também pode ser...
14
isso, não precisa mais de autorização do Bispo,
podendo fazê-lo por sua própria vontade. O Papa
denomina essa liturgia antiga de “forma
extraordinária” do rito romano.
15
interpretação muito clássica da direção da liturgia.
Geralmente, penso que foi bom traduzir a liturgia
nas línguas locais porque a entendemos,
participamos também com nossas mentes. Mas a
presença do latim em alguns elementos ajudaria a
lhe dar uma dimensão universal, lhe dar a
oportunidade às pessoas para que vejam e digam
‘Estou na mesma Igreja’. (…) um pouco de latim
poderia ajudar a ter a experiência de
universalidade.”3
3
Entrevista concedida pelo então Cardeal Joseph Ratzinger
ao Canal Católico EWTN, disponível em
http://www.acidigital.com/bentoxvi/falando.htm
16
Missa em latim – II
“O Latim exprime de maneira palmar e sensível a
unidade e a universalidade da Igreja.”4
4
Santidade, o Papa João Paulo I. Discurso ao Clero Romano
17
fiéis, é bom que tais celebrações sejam em língua
latina; sejam igualmente recitadas em latim as
orações mais conhecidas da tradição da Igreja e,
eventualmente, entoadas algumas partes em canto
gregoriano.”5
5
Sua Santidade, o Papa Bento XVI. Exortação Apostólica
Sacramentum Caritatis, 62
6
Concílio Ecumênico Vaticano II. Constituição
Sacrosanctum Concilium, 36, § 1
7
Sua Santidade, o Papa São Pio X. Encíclica Inter Pastoralis
Officii
18
indício de unidade e um eficaz antídoto contra
todas as corruptelas da pura doutrina.”8
8
Sua Santidade, o Papa Pio XII. Encíclica Mediator Dei
9
Sua Santidade, o Papa Beato João XXIII. Encíclica Veterum
Sapientia
10
Concílio Vaticano II. Constituição Sacrosanctum
Concilium, 54
19
igreja, ao menos uma vez por semana em latim. O
idioma da Igreja Ocidental não deve ficar restrito à
forma tradicional da Missa romana: o rito
reformado, pós-Vaticano II, também deve valorizá-
lo, conforme pede o Santo Padre.
11
Sagrada Congregação para o Culto Divino e a Disciplina
dos Sacramentos. Instrução Redemptionis Sacramentum, 112
20
Motivos para obedecer às
normas litúrgicas
Algumas pessoas, inclusive sacerdotes, dizem que
não precisamos obedecer às normas da Igreja
quanto à liturgia. Alegam que não é importante, e
que a Igreja, ao prevê-las, está apenas dando umas
“linhas gerais”. Essas pessoas, mesmo que sejam
padres, se enganam. As normas são dadas pela
Igreja de Cristo, pelo Papa, para serem obedecidas,
e ninguém as pode alterar. O Vaticano II mesmo
tratou disso, e nos ensinou que nem mesmo o Bispo
pode mudar a norma!
(...)
21
fica privado de vida, de merecimento e de eficácia,
como corpo sem alma.”12
12
Sua Santidade, o Papa São Pio X. Terceiro Catecismo da
Doutrina Cristã, 355-356
22
conserva-se o que eles representam. O sacrifício –
no caso da Missa – e outras idéias próprias – nos
demais atos litúrgicos extra Missam – precisam ser
demonstrados aos nossos olhos, eis que, mesmo
sendo reais, não são naturalmente visíveis; assim,
revestindo-se de símbolos, captamos o que está por
trás dos sinais.
13
Catecismo da Igreja Católica, 1146
23
“A catequese está intrinsecamente ligada a toda
ação litúrgica e sacramental, pois é nos
sacramentos, e sobretudo na Eucaristia, que Cristo
Jesus age em plenitude para a transformação dos
homens.”14
14
Sua Santidade, o Papa João Paulo II. Exortação Apostólica
Catechesi Tradendae, 23
24
significa a perda da necessária conexão entre a lex
orandi e a lex credendi.”15
15
Sagrada Congregação para o Culto Divino e a Disciplina
dos Sacramentos. Instrução Inaestimabile Donum, Introdução
16
ELLIOTT, Peter. Liturgical Question Box. San Francisco:
Ignatius Press, 1998, p. 14
25
Pio XII, em sua magistral Encíclica sobre a liturgia,
mostra o engano de tal afirmação, sustentando que
o exterior deve refletir o interior, sob pena de uma
certa esquizofrenia espiritual: “A adoração
prestada pela Igreja a Deus deve ser (...) tanto
interior quanto exterior.”17
17
Sua Santidade, o Papa Pio XII. Encíclica Mediator Dei, 23
26
A dimensão sensível na
liturgia
Não se pode estudar o homem desconhecendo que
se trata de um ser profundamente integralizado por
suas diferentes facetas. O aspecto espiritual reflete-
se no intelectual, bem como no cultural, no
sentimental, e assim por diante. Uma análise que
queira ter sucesso nesse campo precisa, desse
modo, ser necessariamente uma análise integral.
27
dos anos 70, nos mostra almas que, adorando a
Deus, edificavam-se espiritualmente também pelo
entusiasmo diante da beleza. O Cardeal Ratzinger,
em sua vasta literatura sobre teologia litúrgica, não
hesita em conferir à sensibilidade e à estética do
culto um papel importante na evangelização dos
povos. É bem verdade, repetimos, que o apostolado
não é o fim da liturgia, porém dela pode decorrer
aquele, sem sombra de dúvida.
28
protestantismo. A ação de Cristo na Sexta-feira
Santa, morrendo no Calvário, não foi algo normal,
e sim revestido de profundo impacto externo: a
batalha dramaticamente espiritual no Getsêmani, a
vigília a ponto de suar sangue, terremoto e céus
escurecendo, mortos ressuscitando e andando por
Jerusalém, o véu do Templo se rasgando de alto a
baixo, o perdão de São Dimas. Mesmo a
antecipação da Cruz na última ceia não foi um
culto frio à moda protestante, mas algo que
recordou o ricamente elaborado ritual judaico da
Páscoa, e com uma multitude de sinais: o lava-pés,
as palavras que indicavam que o pão e o vinho
eram agora Seu Corpo e Seu Sangue, e o convite à
oração no horto. Definitivamente, a liturgia católica
nasceu simbólica.
29
edificado desse encontro em que precisa até mesmo
descalçar as sandálias.
30
último Evangelho) meramente acidental, então
esses acidentes devem ser removidos. O
minimalismo litúrgico, impregnado de liturgicismo,
considera o acidental um mal, e essa postura deriva
da mesma matriz gnóstica que originou o
protestantismo. Ela antagoniza o acidental ao
essencial, e até mesmo não distingue, entre os
acidentes, que alguns são mais importantes do que
outros, e que a linguagem simbólica da liturgia
existe para que o homem saiba o que está fazendo
ao cultuar a Deus e, secundariamente, seja
edificado em sua integralidade.
31
O pensamento liturgicista foi além do que diziam
as rubricas – pouco claras, é verdade, e que, no
dizer de alguns, foram imprecisas o suficiente para
que se adotassem as opções mínimas na quase
totalidade dos casos.
32
A arquitetura eclesiástica e a arte litúrgica também
sofreram com o liturgicismo e sua aversão à beleza
tradicional e às devoções – rechaço de imagens do
Sagrado Coração, por exemplo.
33
No seio do catolicismo, essa perda do simbolismo
foi sentida de tal forma que movimentos do tipo
“encontrista” procuraram em seus retiros e
reuniões, recuperar o senso de sagrado. Isso se viu,
por exemplo, nas “orações de mãos dadas”, nos
momentos de espiritualidade com luzes apagadas
(para gerar um ambiente emocional), nas canções
religiosas de conteúdo adocicado e intimista, e, nos
últimos anos, pela invasão do pentecostalismo
católico, com suas palmas na Missa, seu pop-rock,
seus êxtases.
34
espiritualidade “palpável”. Outros, em contato
com a Missa pós-conciliar bem feita – ainda que
sem desvincular-se totalmente de alguns defeitos
do liturgicismo –, ou com a Missa tridentina,
consideram-nas a melhor proteção contra a geada
minimalista que cai sobre suas cabeças.”
35
Solenidade na Missa
O Ano da Eucaristia chegou a seu ocaso no Brasil,
e pouco em nossas igrejas foi feito de realmente
visível e significativo para a promoção do
adequado culto litúrgico. Convocado por João
Paulo II para renovar a observância às normas que
regem a celebração da Missa – as quais, em muitos
lugares, são esquecidas e contrariadas, conforme o
Pontífice mesmo denuncia na Ecclesia de
Eucharistia, especialmente nos números 10 e 52 –,
pela maioria o evento só é comentado “da boca
para fora”.
36
ante os incontáveis abusos na liturgia Brasil afora,
em franca oposição a Roma. Estas linhas são
movidas por caridade cristã!
37
Claro, todos dizem obedecer ao Santo Padre. Não
passa disso, infelizmente. Forçoso é reconhecer que
uma parte do clero desconhece ou não aplica a
recente Redemptionis Sacramentum. É ela
sumariamente ignorada, como se valor não tivesse.
Aprovada pelo Papa, a maioria não a segue. De
nada adianta falar em obediência. São precisos atos
concretos. Quando o Papa manda “x” e se faz “y”,
não se o está obedecendo. Não vale muita coisa
dizermos que o amamos e protestarmos obediência,
se não fazemos o que ele ordena. “Será abençoado
por Deus quem demonstrar seu amor à Eucaristia
pela fidelidade às normas da Igreja” (Cardeal
Sales), e não às inovações das equipes de liturgia e
dos párocos.
38
Liturgia e vida
Tomo as lições do professor de liturgia no
Seminário Interdiocesano Maria Mater Ecclesiae,
em Itapecerica da Serra, SP, Pe. Antonio Rivero,
LC, a quem tenho a honra e a alegria de conhecer,
para explanar, na coluna deste mês, sobre alguns
aspectos da liturgia vivida em cada circunstância.
39
ser santos. A liturgia é a celebração desses
sacramentos, é o espaço apropriado para a fluência
da graça em nossa alma.
40
A liturgia que é bem vivida em si mesma deve
favorecer, impulsionar a que seja bem vivida
também nos outros aspectos. O homem que vive
bem a Missa, vive bem seu trabalho, deveres de
estado, ocupações familiares, diversões etc. Em
todos esses locais e ambientes devemos, a partir da
liturgia, agir como Cristo, pensar como Cristo,
amar como Cristo, sentir como Cristo.
41
um monge, no silêncio do claustro, balbucia o hino
de Laudes. A oração a que o padre legionário se
refere, então, não é a litúrgica, e sim a pessoal,
devocional, ação privada.
42
Nossa santificação é um processo, e depende de
nossa disponibilidade. Essa entrega nossa a Deus,
para que Ele nos santifique – na liturgia e pela
liturgia –, se forja pela ação do Espírito Santo e
nossa liberdade durante a oração pessoal. Fazendo
oração, nos fazemos receptivos à ação da graça.
43
consegue com a plena participação sacramental. Da
liturgia, então, parte o homem para santificar o
mundo do trabalho e da cultura. “Liturgizados”, o
trabalho e a cultura adquirem novo significado. O
Espírito Santo deifica o homem na liturgia para que
ele humanize o mundo, e isto ele o faz pelo labor e
pela construção cultural. A cultura e o trabalho,
prossegue o Pe. Rivero, são como uma iconografia
do Espírito Santo e do homem, e se assim não
forem, serão sinais do inimigo do homem, o diabo.
44
contrário, vivendo a vida da liturgia plenamente,
faremos vida a oração, o trabalho, a cultura, a
sociedade, os pobres, o apostolado. A liturgia dará
vida a tudo isso, e será mais vida à medida em que
transportarmos o que celebramos para dentro do
que vivemos.
45
O rito extraordinário e a
“reforma da reforma”
Com o Motu Proprio Summorum Pontificum, Papa
denominou o rito romano antigo de “forma
extraordinária do rito romano”. Qual o sentido
dessa expressão?
46
Podemos difundir a forma extraordinária. Podemos
amar a forma extraordinária. Podemos querer que a
forma extraordinária esteja em todas as dioceses.
Mas, além disso, é preciso promover a forma
ordinária bem celebrada, justamente porque ela é,
ordinária, comum, usual, majoritária. Aliás, o Papa
fala de mútua influência entre as formas, e um dos
modos disso acontecer é justamente popularizando
a Missa antiga para que aqueles que celebram mal a
Missa nova possam fazer uma comparação e se
empenhar na correta celebração também dessa
nova.
47
além de contar com rubricas mais precisas e
detalhadas, ela é a procurada por católicos
insatisfeitos com a verdadeira bagunça ritual na
maioria das paróquias – sejam “populares” também
na forma ordinária.
48
Promover que a Missa, na forma ordinária mesmo,
seja celebrada conforme as rubricas – e isso não
deixa de ser uma aproximação externa entre as duas
formas – é também fazer o que pede o Papa.
49
O erro racionalista e a reforma
litúrgica
Quando se fala em algumas impropriedades da
forma moderna do rito romano, é comum levantar-
se o argumento de que não se observou o princípio
do desenvolvimento harmônico da liturgia, ou o de
que, em nome de uma suposta pureza do rito, a
partir de um erro denominado “arqueologismo”,
eliminou-se uma série de acréscimos (legítimos!)
de origem galicana ou mesmo oriundos da piedade
individual. Tudo isso está absolutamente certo, é
verdade, mas creio que um outro viés deveria ser
mais trabalhado: o de que alguns aspectos da
reforma litúrgica levada a cabo por Mons. Anibale
Bugnini, e sua implantação prática nas paróquias,
foram influenciados pelo racionalismo.
50
superficiais pedida pelo Concílio, mas obedeciam a
uma agenda que não conseguia entender o valor
dos símbolos, dos sinais. Se o homo modernus não
entende os símbolos profundos da liturgia romana
tradicional, eles devem ser retirados: eis o mote que
acompanhou boa parte dos executores da reforma.
Ora, isso é uma sandice. Então, em um país de
esmagadora maioria de analfabetos, iríamos
eliminar as letras, os sinais de pontuação, a
gramática? Se a resposta ao analfabetismo é a
alfabetização, a resposta a um século que não lê os
símbolos é ensinar-lhes o seu significado, não
propor seu banimento!
51
implementaram a reforma. O racionalismo é a
origem de muitas daquelas posturas já identificadas
com o arqueologismo litúrgico.
52
a procissão do ofertório, um mais amplo uso do
vernáculo, a ênfase no gregoriano como canto
oficial do rito romano, a restauração das preces dos
fiéis, a recolocação do Ite Missa est para depois da
bênção, a homilia ou sermão como cerimônia
integrante da liturgia e não uma interrupção da
Missa, a simplificação na gradação de festividades,
a mudança mesmo em Missas simples e rezadas,
como ensina o Mons. Peter Elliott, de um tablado
restrito no qual ficava o padre para um espaço
aberto de celebração no presbitério, etc), trouxe
enormes desvantagens ao culto católico. Esses
racionalistas e arqueologistas se aproveitaram das
diretivas do Concílio Vaticano II e da depressão de
Paulo VI, ocasionada por sua quebra de autoridade
diante de um episcopado rebelde que não aceitou
sua reafirmação da ortodoxia em matéria de moral
sexual, e da sua confiança nos oficiais do comitê
para a reforma litúrgica, para colocar o cavalo de
Tróia dentro dos muros da Igreja.
53
A reforma teve elementos racionalistas, mas graças
a Deus e ao Papa Paulo VI – e depois às correções
de João Paulo II –, não tantos quanto os
modernistas queriam. Todavia, se na própria
reforma litúrgica, o radicalismo dos racionalistas
foi barrado, na sua implementação em nossas
paróquias, a crise atingiu proporções apocalípticas.
54
solenes, o latim... Ocorre que o racionalismo não
estava presente somente nas novas normas, mas em
toda uma mentalidade que, ignorando as sadias
normas que procuravam manter um mínimo de
nossa tradição litúrgica romana, radicalizava a
reforma. Não contentes com as rubricas, que já não
estavam recheadas de arqueologismo e
simplificações em demasia, os revolucionários
fizeram, em cada paróquia, a sua própria reforma.
55
desenvolvimento, por um acréscimo dos elementos
positivos do Missal de Paulo VI ao Missal clássico
de São Pio V, em uma unificação da liturgia
romana, não poderá desconsiderar também a
rejeição da ideologia por trás dos pontos negativos
do novo Ordinário. E nessa ideologia, não poucos
pontos da filosofia racionalista estão presentes.
56
Visão teológica da Missa e
suas conseqüências práticas
Sobre a Missa, a lei da Igreja é clara em defini-la:
18
Código de Direito Canônico
57
preciso, sabe o homem, um meio de unir o divino
ao humano, de recuperar a amizade entre os dois!
58
e os preparando para o sacrifício definitivo
oferecido por Cristo, séculos depois. O cordeiro
sacrificado no rito mosaico simbolizava,
antecipadamente, Jesus Cristo, o Cordeiro de Deus
que tira o pecado do mundo. O ritual da primeira
ceia mosaica (cf. Ex 12,1-8.11-14) já se mostra um
grandioso símbolo da Paixão do Salvador.
Sacrifica-se um cordeiro macho e sem defeito, no
lugar dos pecados do povo de Israel; Cristo, mais
tarde, será identificado por São João Batista como
o “Cordeiro de Deus” (Jo 1,29), o Agnus Dei, e
morrerá, também sem “defeito” (ou seja, sem
pecado, puro, santo, agradável ao Pai) pelas faltas
do Novo Israel, a Igreja de Deus, santa e católica.
O sangue do cordeiro untado nas casas os
assinalaria perante o anjo da morte como os
escolhidos para a vida; o Sangue de Nosso Senhor
e Salvador, derramado na Cruz e aspergido em nós
pela fé e pelos sacramentos, nos assinala como os
eleitos para a vida eterna. A Páscoa judaica foi
dada como instituição perpétua; essa perpetuidade
foi dada por excelência quando Cristo morreu e
instituiu a Eucaristia como Nova Páscoa, sinal vivo
e presente de Sua Morte e Ressurreição, como um
holocausto permanente, conforme já previra o
profeta Daniel (cf. Dn 8,11;9,27).
59
Na Última Ceia, Jesus antecipou Seu sacrifício,
instituindo-o como perpétuo através do
oferecimento de Seu Corpo e Seu Sangue. O
mesmo Corpo morto na Cruz e o mesmo Sangue
derramado foram distribuídos aos Seus Apóstolos,
numa verdadeira antecipação do sacrifício.
60
novamente presente, ainda que de outro modo,
incruento, no altar da igreja pelas mãos do
sacerdote validamente ordenado.
61
mesmo, também há identidade quanto ao sacerdote,
o sacrificador. Validamente ordenado: Jesus
mandou que os Apóstolos realizassem o sacrifício
feito na Cruz e antecipado na última Ceia, e eles
passaram o mandato a seus sucessores e aos
colaboradores destes; os sucessores dos Apóstolos
são os Bispos, e os colaboradores os padres, unidos
a Cristo pelo sacramento da Ordem.
62
homens de hoje a reconciliação obtida de uma vez
para sempre por Cristo para humanidade de todos
os tempos. Com efeito, 'o sacrifício de Cristo e o
sacrifício da Eucaristia são um único sacrifício'. Já
o afirmava em palavras expressivas S. João
Crisóstomo: 'Nós oferecemos sempre o mesmo
Cordeiro, e não um hoje e amanhã outro, mas
sempre o mesmo. Por este motivo, o sacrifício é
sempre um só. [...] Também agora estamos a
oferecer a mesma vítima que então foi oferecida e
que jamais se exaurirá'.
19
Sua Santidade, o Papa João Paulo II. Encíclica Ecclesia de
Eucharistia, 12
63
aquele mesmo, que agora oferece pelo ministério
dos sacerdotes, se ofereceu então sobre a cruz; é
diferente apenas, o modo de fazer a oferta.'”20
20
Sua Santidade, o Papa Pio XII. Encíclica Mediator Dei, 61
21
Missal Romano; Ordinário da Missa; Preparação das
Oferendas
64
sentimentos de Cristo. Se não pode, como o padre,
ser o próprio Jesus oferecendo-Se na Cruz, deve,
então, assistir o maravilhoso espetáculo do
sacrifício de um Deus-homem que morre por
nossos pecados com a disposição de alma de quem
aspira imitar aqueles santos que estiveram aos pés
do Calvário. A Cruz torna-se presente na Missa, e
porquanto naquela estavam presentes a Santíssima
Virgem e o discípulo amado, São João, o Apóstolo
e Evangelista, quando estamos assistindo o Santo
Sacrifício devemos ter as mesmas atitudes de
ambos. Certamente, não estavam Nossa Senhora
nem São João batendo palmas: sua alegria pela
salvação que se operava era interna, e se misturava
com uma viva dor pelos pecados da humanidade,
cometidos de tal forma que fizeram Deus sofrer e
derramar Seu Sangue por nós. Imitando os
sentimentos e atitudes de São João e da Virgem
Maria aos pés da Cruz, estamos participando da
Missa de um modo santo e salutar.
65
O sacerdote, antes de celebrar a Santa Missa, deve
dizer algumas orações, como as previstas pela
liturgia da Igreja. Elas ajudam-no a melhor se
preparar para oferecer tão augusto sacrifício a
Deus, Nosso Senhor. Entre elas, contam-se aquela
na qual o celebrante pede a graça de bem celebrar e
dispõe-se a oferecer a Missa segundo o rito e a
intenção da Santa Igreja. Outras, ajudam-no a
dispor sua alma para penetrar no tremendo mistério
da Santa Missa.
22
Código de Direito Canônico
66
Subirei ao altar de Deus!
Duas grandes partes principais e duas acessórias,
igualmente indispensáveis, formam a Missa no rito
romano. As principais são a Liturgia da Palavra e a
Liturgia Eucarística. Antes da primeira e após a
segunda, estão os Ritos Iniciais e os Ritos Finais.
Na forma tradicional do rito romano, a primeira
parte era chamada de Missa dos Catecúmenos, e a
segunda de Missa dos Fiéis.
67
Infelizmente, a reforma litúrgica de Paulo VI,
pretendendo restaurar o uso primitivo do rito
romano, acabou por retirar do Ordinário da Missa
aquele piedoso acréscimo, feito em harmônico
desenvolvimento da liturgia, que previa, iniciando a
celebração, a recitação do Salmo Judica Me, sua
antífona e as cerimônias que perfazem as chamadas
“Orações ao Pé do Altar”. Aqueles que assistem a
Missa no rito romano segundo a forma
extraordinária, i.e., conforme os livros de 1962,
ainda têm a graça de contar com tão significativas
ações cerimoniais.
68
dirigem. Não se trata de um programa de auditório,
em que o padre animará uma platéia e a convidará a
rezar e cantar. Não se trata de uma oração em
conjunto. Não se trata de uma reunião com
motivação religiosa. O que o padre fará está no
salmo: subirá ao ALTAR!
69
sacramento da Ordem. O altar ao qual o padre
subirá é de Deus.
70
Considerações sobre o rito de
1965, a reforma de 1970 e a
eventual reforma da reforma
71
reitero, a ser feita por quem de direito, e não por
sacerdotes que, na melhor boa vontade, acabam
mutilando a antiga liturgia, e, por conseguinte,
cometem o mesmo erro dos progressistas que
mutilam a nova liturgia.
72
intermediário de 1965, se aproximar do Missal
tradicional de 1962, pode ser a hora de introduzir,
neste de 1965/1970, aquilo de 1962 que, conforme
exporei no artigo abaixo, nunca deveria ter sido
eliminado, mantendo, ainda segundo meu texto, o
que foi corretamente modificado. Desse modo, em
um segundo tempo, o eventual Missal de
1965/1970 pouquíssimo se diferirá do de 1962 no
Ordinário. Assim coexistindo, e se diferenciando
mais no Próprio, não tardará a que, naturalmente,
possam se fundir de modo harmônico, com os
pontos positivos de cada rito, tendo, sem embargo,
a base do rito antigo.
73
respeitando o princípio do desenvolvimento
orgânico, quando ambos estiverem externamente
semelhantes aos olhos do não-especialista, se
verificará o que, do rito novo, “passou na prova”, e
poderá permanecer em um eventual e futuro rito
romano unificado – sob a base do antigo, com os
elementos positivos do moderno.
74
coincidiu com a falta de consciência pela maioria
dos fiéis católicos de hoje de que a Missa é um
verdadeiro sacrifício.
75
As orações recitadas ou cantadas pela
schola ou pelo povo não são mais rezadas
em particular pelo celebrante.
76
ser mantida na reforma da reforma, com o cuidado
de tornar os formulários que hoje são facultativos
no Missal de 1970/2002, preceptivos, eliminando
qualquer brecha para que uma falsa noção de
criatividade permita estragos. Se se quer rezar a
Oração Universal ou dos Fiéis, faça-se com
fórmulas pré-aprovadas pela autoridade pontifícia,
dispostas para cada dia ou tempo litúrgico.
77
O uso do véu umeral pelo subdiácono (ou, em sua
falta pela extinção de tal ordem menor, pelo acólito
instituído) confere um ar de nobreza ao rito, e sua
procissão com o cálice da credencia ao altar dá
altíssimo significado de elaboração solene à Missa.
Idem.
78
secundada pela reforma de 1970, a meu ver, de
maneira bastante feliz.
79
tratar-se de um sagrado mistério, como que para
protegê-lo. Mas o oferecimento dele, na doxologia,
é um ato, se bem que sacerdotal, mais visivelmente
vistoso, digamos assim, ainda que menos
importante do que aquele, e, portanto, poderia, sem
problemas ser audível.
80
recita-se cada dia no altar de Deus esta oração
domincal, que os fiéis escutam.” (Sermo 58)
81
Todavia, se não for restaurado esse ministério, se
poderia pensar em uma solução alternativa: um
acólito instituído fazendo suas funções de modo
obrigatório, e com véu umeral quando preciso; ou a
obrigatoriedade de dois diáconos na Missa
82
foram suprimas: Adjutorium nostrum,
Intróito, fim do Gloria, fim do Credo,
Sanctus e Libera nos.
83
ininterruptamente desde antes da Idade Média e
mantida pelo código de rubricas de 1962, retirada
em 1965 e 1970, em relação à Missa celebrada por
padres. Os textos de 1965 e de 1970 mandam que
se celebre sempre da sede na Liturgia da Palavra,
só indo ao altar na Liturgia Eucarística, e isso para
todos os celebrantes: ou seja, houve uma extensão
da regra da Missa de Bispo para a Missa de padre, e
perdeu-se a distinção.
84
todo caso, protestantização, e sim reforço do
caráter sacrifical da Liturgia Eucarística. Não seria
errado, teologicamente, celebrar um padre a
Liturgia da Palavra desde a sede. Todavia,
pergunto-me se é conveniente ou se deveria
reservar essa duplicidade de local só ao Bispo,
conforme milenar tradição romana.
85
Acredito que a reforma da reforma deva fazer
preceptiva a celebração voltada para Deus.
86
à sua esquerda (o missal está nesse lugar
desde o início do ofertório e lá permanece
até ao fim da missa).
87
Que o sacerdote se sente durante as leituras, exceto
o Evangelho, é compreensível. Estará atento,
ouvindo, já que toda duplicidade desnecessária
torna inorgânico o rito celebrado.
88
O Kyrie, o Gloria, o Credo, o Sanctus e o
Agnus Dei podem ser recitados ou
cantados na língua do país.
89
O mais importante, nas discussões sobre a reforma
litúrgica, não é o idioma, mas o rito. Já disse
algumas vezes: prefiro uma Missa tridentina em
português a uma Missa moderna em latim.
90
A liturgia e a Palavra de Deus,
segundo a Exortação
Apostólica Verbum Domini
91
“o culto público integral do místico Corpo de Jesus
Cristo, isto é, da cabeça e dos seus membros.”
92
É evidente que os experimentos espúrios já vinham
desde antes, mas com a crise da autoridade que
tomou corpo na sociedade civil desde a revolução
sorbonniana de 1968 (“é proibido proibir”), eles se
avolumaram dos anos 70 para cá. Paulo VI mesmo
confessava sentir que a “fumaça de Satanás entrou
no templo de Deus” (Discurso em 29 de junho de
1972), o que, mais tarde, seria explicado pelo
Cardeal Noé como uma apreensão diante de tantas
manipulações em relação à Missa, tantas
desobediências às rubricas, tantos desvios e
antropocentrismos, a ponto de certos críticos
católicos americanos falarem em “narcisismo
clerical”: a liturgia, de serviço do povo a Deus, de
culto público da Igreja, havia se transformado, na
prática, em espetáculo pessoal na qual cada
celebrante põe em andamento uma série de
criatividades que considera “pastoralmente
melhor”.
93
Tal documento, ademais, é de responsabilidade do
então Cardeal Ratzinger que, como acenamos,
reiteradas vezes evidenciou a centralidade do tema
da liturgia em sua monumental obra teológica.
94
celebração litúrgica, a tal ponto em que falar de
Ordem beneditina importa em mencionar o canto
litúrgico por excelência no rito romano, o canto
gregoriano. Assim, Na Missa Pro Ecclesia,
encerramento do Conclave que o elegeu, Bento
XVI ordenou que essa comemoração fosse marcada
“pela solenidade e retidão das celebrações.”
Noutras palavras: rigoroso seguimento das rubricas
do Missal; cessação de qualquer invencionice por
parte dos sacerdotes; decoro e circunspeção;
paramentos corretos; proibição de cantos estranhos
à tradição católica e de não menos estranhas palmas
e demonstrações efusivas de alegria, nada
apropriadas para quem assiste, na Missa, a
renovação do sacrifício da Cruz. “Peço isso de
modo especial aos sacerdotes.”
95
ministros extraordinários – leigos – são usados na
proclamação do Evangelho e, ordinariamente, na
distribuição da Comunhão (contrariando a
Ecclesiae de Mysterio). Exemplos de um claro
desrespeito às normas litúrgicas.
96
ápice da vida e da missão da Igreja. Aliás, o tema
da caridade é bastante presente nos documentos de
Bento XVI: “Deus Caritas Est”, “Caritas in
Veritate”, e, no caso em tela, “Sacramentum
Caritatis”. Escolhendo o tema do amor, da
caridade como central em seu Magistério, e unindo
a preocupação litúrgica com ele, o Santo Padre
parece querer mandar um recado claro: a liturgia,
ação de Cristo por nós junto do Pai, mediante a
Igreja, é manifestação da Sua caridade para com o
mundo. Se não amasse o mundo, não teria se
entregue por nós, como nos diz São João em seu
Evangelho (cf. Jo 3,16).
97
A segunda ação parte da Congregação para o
Clero. Em setembro de 2006 foi erigido o Instituto
Bom Pastor, uma sociedade de vida apostólica que
celebra a Missa exclusivamente na forma anterior
ao Concílio. Depende ao mesmo tempo da
Comissão Ecclesia Dei e da Congregação para os
Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de
Vida Apostólica.
(...)
98
Não nos espanta, portanto, que um documento que
trate não de liturgia, mas da Palavra de Deus na
Igreja, como a recente Exortação Apostólica Pós-
sinodal Verbum Domini, também seja ocasião para
o Romano Pontífice oferecer profunda catequese
sobre temas litúrgicos. Como de costume, o Papa
nos brinda com densa reflexão sobre a liturgia,
ligando-a ao assunto específico do documento.
99
reveste-se de nossa natureza humana, para
justamente cultuar ao Pai na Cruz e reviver, de
modo incruento, esse sacrifício da Missa,
perpetuando seus efeitos pelos sacramentos e, de
certa forma, no Ofício Divino. A Palavra de Deus,
i.e., o próprio Cristo, é o autor e o ator da liturgia.
A liturgia é a ação da Palavra encarnada. E, como
tal, Cristo nos fala, como Verbo que é, na liturgia
por Ele celebrada mediante seus sacerdotes.
100
pontos positivos da reforma de Paulo VI foi
justamente uma maior disposição das lições, com o
acréscimo de uma perícope nos Domingos e
solenidades (antigamente chamadas de “festas de
primeira classe”) –, a Escritura está presente, em
citações diretas, também na maioria das antífonas
(Intróito, Ofertório e Comunhão), além de se fazer
presente, quer na forma direta, quer como
inspiração, nas preces, nas coletas, nas sequências,
nos prefácios, e até em inúmeros trechos do
Ordinário da Missa (como a Consagração, o Rito
da Paz, o Pater Noster, o Gloria, o Sanctus, o
Agnus, as bênçãos solenes).
101
a Igreja nos dado a Bíblia – selecionando o que era
ou não inspirado para colocar no cânon –, sendo,
por isso, em certo sentido, “mãe da Bíblia”, natural
que os textos sagrados só ganhem seu real sentido
na própria Igreja. Santo Agostinho já dizia que só
cria no Evangelho pela autoridade da Santa Igreja,
e outros autores recolhem o adágio de que, fora da
interpretação da Igreja, a Bíblia pode ser a mãe de
todas as heresias.
102
próprio Cristo, quando, a partir do “hoje” do seu
evento, exorta a perscrutar todas as Escrituras».”
(VD, 52, grifos nossos)
103
ano na liturgia, mostrando os mistérios
fundamentais da nossa fé. Também disto depende a
correcta abordagem da Sagrada Escritura.” (VD,
52, grifos nossos)
104
João: se neste o Logos de Deus Se faz carne,
naquele a carne faz-Se «pão» dado para a vida do
mundo (cf. Jo 6, 51), aludindo assim ao dom que
Jesus fará de Si mesmo no mistério da cruz,
confirmado pela afirmação acerca do seu sangue
dado a «beber» (cf. Jo 6, 53). Assim, no mistério da
Eucaristia, mostra-se qual é o verdadeiro maná, o
verdadeiro pão do céu: é o Logos de Deus que Se
fez carne, que Se entregou a Si mesmo por nós no
Mistério Pascal.” (VD, 54)
105
justifica. A Palavra – em um tríplice aspecto (o
próprio Senhor é a Palavra, suas palavras faladas
no caminho, e sua palavra escrita nos profetas e na
lei explicando os eventos da salvação) – aponta
para a Eucaristia no partir do pão, e a Eucaristia se
torna plenamente reconhecível pela Palavra. Há
aqui um aspecto teológico profundo até mesmo
para a tarefa da apologética com os protestantes, e
penso que, em outra oportunidade, deveria ser
melhor explorado.
106
Deus e ao mistério eucarístico a Igreja tributou e
quis e estabeleceu que, sempre e em todo o lugar,
se tributasse a mesma veneração embora não o
mesmo culto. Movida pelo exemplo do seu
fundador, nunca cessou de celebrar o mistério
pascal, reunindo-se num mesmo lugar para ler,
“em todas as Escrituras, aquilo que Lhe dizia
respeito” (L c 24, 27) e actualizar, com o memorial
do Senhor e os sacramentos, a obra da salvação».”
(VD, 55)
107
estranha à Igreja, ao menos até o Concílio de
Trento, a presença do vocábulo “sacramento” no
segundo sentido, amplo, lato. Era algo
relativamente comum, por exemplo, entre os Padres
gregos, ao denominar a árvore da vida do Paraíso,
os ícones, as bênçãos, os paramentos, as velas, e até
as coroações de reis e imperadores, de sacramentos.
Com isso, não se estava, evidentemente,
aumentando a lista dos sacramentos além dos sete
dogmaticamente reconhecidos. Sabia-se
perfeitamente que uns eram os sacramentos como
canais da graça, e estes eram apenas sete, como
sempre foram e sempre serão; e outros eram
simplesmente coisas sagradas a que se aplicava a
palavra "sacramento" em um sentido amplo.
108
para a Lumen Gentium, referindo-se à Igreja é um
sinal, algo sagrado, e a Igreja é o “algo sagrado”
por excelência, dado que dela ou por ela recebemos
o necessário para nos salvarmos, inclusive os sete
sacramentos em sentido estrito.
109
indica a modalidade histórico-salvífica com que o
Verbo de Deus entra no tempo e no espaço,
tornando-Se interlocutor do homem, chamado a
acolher na fé o seu dom.” (VD, 56)
110
“Assim é possível compreender a
sacramentalidade da Palavra através da analogia
com a presença real de Cristo sob as espécies do
pão e do vinho consagrados. Aproximando-nos do
altar e participando no banquete eucarístico,
comungamos realmente o corpo e o sangue de
Cristo. A proclamação da Palavra de Deus na
celebração comporta reconhecer que é o próprio
Cristo que Se faz presente e Se dirige a nós para
ser acolhido. Referindo-se à atitude que se deve
adoptar tanto em relação à Eucaristia como à
Palavra de Deus, São Jerónimo afirma: «Lemos as
Sagradas Escrituras. Eu penso que o Evangelho é
o Corpo de Cristo; penso que as santas Escrituras
são o seu ensinamento. E quando Ele fala em
“comer a minha carne e beber o meu sangue” (Jo
6, 53), embora estas palavras se possam entender
do Mistério [eucarístico], todavia também a
palavra da Escritura, o ensinamento de Deus, é
verdadeiramente o corpo de Cristo e o seu sangue.
Quando vamos receber o Mistério [eucarístico], se
cair uma migalha sentimo-nos perdidos. E, quando
estamos a escutar a Palavra de Deus e nos é
derramada nos ouvidos a Palavra de Deus que é
carne de Cristo e seu sangue, se nos distrairmos
com outra coisa, não incorremos em grande
perigo?». Realmente presente nas espécies do pão
e do vinho, Cristo está presente, de modo análogo,
também na Palavra proclamada na liturgia. Por
isso, aprofundar o sentido da sacramentalidade da
Palavra de Deus pode favorecer uma maior
111
compreensão unitária do mistério da revelação em
«acções e palavras intimamente relacionadas»,
sendo de proveito à vida espiritual dos fiéis e à
acção pastoral da Igreja.” (VD, 56, grifo nosso)
112
“Importa, antes de tudo, diferenciarmos os
modos pelos quais Deus Se faz presente nas
coisas, nos lugares e nos seres.
113
6) Presença de Cristo na Santíssima
Eucaristia pela realidade e pela substância,
não como se nas outras Ele não estivesse
real ou substancialmente presente, mas por
antonomásia, de modo excelso.
114
erro do panteísmo, que confunde o Criador
com os seres criados.
115
ellos una profunda amistad deificante. Toda la
obra misericordiosa del Padre celestial, es
decir, toda la obra de Jesucristo, se consuma en
la comunicación del Espíritu Santo a los
creyentes.” (RIVERA, Pe. José; IRABURU,
Pe. José María. Síntesis de la Espiritualidad
Católica, Fundación Gratis Date)
116
sendo Ele nosso Deus dentro de nós.” (Santo
Inácio de Antioquia, Ad Eph., 15,3) A
inabitação é formalmente uma união física e
amistosa entre Deus e o homem, fundada na
caridade e realizada pela graça, mediante a
qual Deus Se dá à alma e nela Se torna
presente pessoal e substancialmente, sem
alteração da substância própria do homem,
porém, fazendo-a participar da vida divina.
“Deus mora secretamente no seio da alma”
(São João da Cruz, Chama, 4, 14) Essa
santificação ou divinização não é uma
mudança da substância humana em divina,
mas elevação da primeira à última. A
grande reformadora do Carmelo sempre se
referia às “(...) três Pessoas que trago na alma
(...).” (Santa Teresa d'Ávila, Consc., 42)
117
referimos à onipresença, estamos falando de
um atributo da divindade. Ainda que esta se
una indissoluvelmente à humanidade de
Cristo em Sua Encarnação, aquela é
preexistente. Antes mesmo de tornar-se
carne, o Verbo, por ser Deus, já estava em
tudo e em todos (sem alterar-lhes, contudo,
a substância, nem fazer-lhes participar de
Sua natureza divina); na Eucaristia, porém,
eis que é Cristo, Verbo feito carne, não só a
divindade como a humanidade do Salvador
estão presentes.
Deus não está presente na pedra ou na
árvore de modo a fazê-las participar de Sua
divindade. Cada ser conserva sua substância
própria. A pedra é pedra, não Deus. Sua
semelhança com o Criador se dá pela
participação da perfeição divina enquanto
tem, como Deus, o ser (no caso, o ser
pedra). Assim também, o homem não é
Deus por estar Este presente naquele; sua
natureza humana, substância humana, resta
inalterada. É o homem semelhante a Deus
apenas na medida em que participa das
faculdades da inteligência e da vontade, as
quais são perfeições divinas. No homem,
Deus está presente, pela ubiqüidade, sendo a
ele semelhante, vez que é inteligente e
possui vontade (Deus, que é puro espírito,
também é inteligente e possui vontade).
118
No homem em estado de graça (e nos anjos
do céu), Deus faz-Se presente de modo
ainda mais excelso: pela participação na
natureza divina. Ainda nesta, o homem
continua homem (e o anjo, anjo), mas, pela
graça, recebe algo da divindade, algo da
substância divina, sem alterar a sua própria,
contudo.
119
Deus! Não está Cristo nela como na pedra
(que continua pedra) ou no homem (que
continua homem, mesmo elevado pela graça
à natureza divina), mas há verdadeira
mudança de substância (transubstanciação):
as substâncias do pão e do vinho, após a
consagração e por ela, mudam-se em Corpo,
Sangue, Alma e Divindade de Nosso
Senhor, Deus, Rei e Salvador, Jesus Cristo.
A pedra tem a presença de Deus, porém
resta com a substância de pedra. O homem
tem a presença de Deus, porém resta com a
substância de homem. A Eucaristia tem a
substância de Deus, pois nela Cristo não só
está presente: a Eucaristia É Deus! Sob a
aparência de pão, encontra-se o Criador do
Universo! Daí que a adoremos, o que não se
faz com uma pedra, ainda que Deus nela
esteja presente pela ubiqüidade, nem com
um homem, ainda que seja feito à Sua
imagem e semelhança e, no caso do homem
justificado, participe da natureza divina.
120
especialmente, na Eucaristia. “Esta presença
chama-se ‘real’ não por exclusão, como se as
outras não fossem ‘reais’, mas por
antonomásia”, diz Paulo VI, “porque é
substancial e porque por ela Cristo, Deus e
homem, se torna presente completo”.
(Encíclica Mysterium Fidei, de 3 de
setembro de 1965, nº 39) A Eucaristia não é
apenas presença de Cristo: ela é o próprio
Cristo! Ainda que estivesse em todos os
lugares, uma vez que, sendo Deus, era
onipresente, Cristo, em Sua vida terrena,
após a Encarnação, estava, de modo
especial, presente em locais específicos: em
Cafarnaum, Nazaré, Jerusalém, na
manjedoura, nas bodas de Caná, em um
barco no mar da Galiléia... A presença de
Jesus em um local específico e determinado
não elimina Sua ubiqüidade, imensidão,
onipresença. O mesmo em relação ao
Santíssimo Sacramento: é Deus conosco, e
Sua presença nele, específica, não invalida a
ubiqüidade. De qualquer maneira, é uma
presença excelente, real por antonomásia!
121
real, que se dá de maneira espiritual. A
substância do lugar não muda.”
122
tema da presente Exortação. O despertar para a
liturgia, requerido por Bento XVI, passa por um
contato mais estreito com a Palavra de Deus, que,
como vimos, permeia não só a celebração litúrgica,
como é a base da teologia que a sustenta.
123
desabrochar numa vida de adesão coerente a
Cristo e aos seus ensinamentos.” (Mensagem em
22 de fevereiro de 2006)
124
no seu contexto e a identificarem o centro do
anúncio revelado à luz da fé. A formação litúrgica
deve comunicar aos leitores uma certa facilidade
em perceber o sentido e a estrutura da liturgia da
Palavra e os motivos da relação entre a liturgia da
Palavra e a liturgia eucarística. A preparação
técnica deve tornar os leitores cada vez mais
idóneos na arte de lerem em público tanto com a
simples voz natural, como com a ajuda dos
instrumentos modernos de amplificação sonora».”
(VD, 58)
125
conservada pelos que observam a forma antiga,
extraordinária, do rito romano, e pelos inúmeros
ritos orientais. Assim, historicamente, esse
ministério do leitor era tão importante a ponto de o
chamarmos “ordem menor”, em analogia ao
sacramento da Ordem.
126
fato, além de musicar as perícopes bíblicas ou,
quando não o faça, se inspirar profundamente nas
mesmas, o canto gregoriano, por sua métrica e
técnica, subordina a melodia à palavra cantada. O
centro, no canto gregoriano, é o que se canta, e não
tanto como se canta.
127
“Várias intervenções dos Padres sinodais
insistiram sobre o valor do silêncio para a
recepção da Palavra de Deus na vida dos fiéis. De
facto, a palavra pode ser pronunciada e ouvida
apenas no silêncio, exterior e interior. O nosso
tempo não favorece o recolhimento e, às vezes,
fica-se com a impressão de ter medo de se separar,
por um só momento, dos instrumentos de
comunicação de massa. Por isso, hoje é necessário
educar o Povo de Deus para o valor do silêncio.
Redescobrir a centralidade da Palavra de Deus na
vida da Igreja significa também redescobrir o
sentido do recolhimento e da tranquilidade
interior. A grande tradição patrística ensina-nos
que os mistérios de Cristo estão ligados ao silêncio
e só nele é que a Palavra pode encontrar morada
em nós, como aconteceu em Maria, mulher
indivisivelmente da Palavra e do silêncio. As
nossas liturgias devem facilitar esta escuta
autêntica: Verbo crescente, verba deficiunt.
128
litúrgico não é feita somente quando se a proclama
ou quando se a escuta, mas também quando se a
digere e contempla. De nada adianta ouvir a
Palavra, sem meditá-la, e só se medita quando se
está em silêncio. O silenciar, por alguns instantes,
na Missa, não é ocasião de tédio ou vazio, mas de
sublime contemplação da Palavra de Deus
liturgicamente anunciada.
129
dando uma pincelada em pontos que julgamos mais
relevantes –, após explanarmos, dizíamos, sobre o
nexo entre a Sagrada Escritura e o culto público da
Igreja, não nos restaria senão recomendarmos a
leitura direta do texto do documento, como forma
de aproximação com o riquíssimo pensamento
litúrgico do Papa Bento XVI. Pensamento, aliás,
iniciado já antes, no seu tempo de padre, teólogo,
Bispo e Cardeal da Santa Igreja Romana.
130
As ações cerimoniais: fazer de
qualquer jeito?
Na liturgia, é preciso executar determinadas ações,
fazer certos gestos, portar-se de uma maneira
adequadamente disposta. Chamamos a tais
procedimentos ações cerimoniais, pois se executa,
por eles, uma dada cerimônia. Em alguns
momentos, deve-se sentar, em outros ajoelharem-se
ou ficar de pé. É necessário, igualmente, juntar as
mãos ou elevá-las, falar em voz alta ou baixa,
segurar objetos, ler, fazer o sinal-da-cruz etc.
131
ações, conforme nos mandam as rubricas de cada
livro litúrgico. As ações cerimoniais
uniformemente adotadas passam-nos a mensagem
da universalidade da Igreja, da solidez do rito e da
seriedade do culto católico. Por sua fiel
observância, denotamos que o centro da liturgia é
Jesus Cristo, não o homem. A Missa, a Liturgia das
Horas, a celebração dos sacramentos, as procissões,
enfim, cada ato de culto público instituído pela
autoridade da Igreja, conquanto tenha por
beneficiário o homem, têm por destinatário a Deus.
Trata-se de atividades teocêntricas, nunca
antropocêntricas. E, como é o Senhor quem está no
centro e no fim da liturgia, importa a Ele agradar
pela adoração “em espírito e verdade” (Jo 4,23), e
não satisfazer nossas paixões ou gostos
particulares. Nesse terreno, é a Igreja Católica,
depositária da verdade e representante da vontade
de Deus, quem deve regular, nunca nossas
opiniões, muitas delas recheadas de subjetivismo e
relativismo, tão em voga nos tempos hodiernos.
132
se poderia cantar nenhuma parte do Ordinário. E
uma Missa solene, i.e., com diácono e subdiácono –
função hoje assumida pelo acólito –, não poderia
ser rezada, apenas cantada. O incenso, enfim, só
poderia ser usado em Missas cantadas e solenes. E
assim por diante.
133
limitar-se por princípio a realizar exclusivamente o
que é estritamente obrigatório, nem tampouco
colocar sempre em prática todas as possibilidades
não preceituadas, com independência das
circunstâncias: sem distinguir, por exemplo, se se
trata de uma Missa dominical em um grande
oratório ou em uma igreja, ou de uma Missa ferial
em um pequeno oratório a que assistem poucas
pessoas etc. “23
23
http://www.opuslibros.org/libros/Exliturgia/xpliturg
ia2.htm
134
referência para certos gestos. Está clara, assim, a
continuidade litúrgica.
135
diante de algo banal. Naturais devemos ser como
quem está diante de um Pai amoroso, mas sem
esquecer que se trata de uma celebração
profundamente sobrenatural, na qual é o próprio
Cristo quem celebra mediante Seus ministros
sagrados. A liturgia não é algo do dia-a-dia,
comum, porém um sair da normalidade, do
ordinário: é criar o céu na terra, é sair da
habitualidade e colocar-se diante do trono do
Altíssimo e do Cordeiro, é refletir a adoração
celebrada na corte celestial, é fazer presente o
descrito no Apocalipse, é unir a Igreja Militante e a
Padecente à Triunfante.
136
ÍNDICE
137