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CONCEITOS GERAIS SOBRE BARRAGENS

1. DEFINIÇÕES. TIPOS DE BARRAGENS

Define-se genericamente como barragem uma estrutura capaz de reter e armazenar água com segurança.

A existência duma Comissão Internacional de Grandes Barragens (CIGB/ICOLD) tornou popular a


definição de grande barragem dada por essa Comissão. A CIGB classifica como grande barragem:

- uma barragem com mais de 15m de altura, contada desde o ponto mais baixo da fundação até ao
coroamento;
- uma barragem com altura entre 10 a 15m desde que se verifique uma das seguintes condições:
- um desenvolvimento do coroamento superior a 500m;
- capacidade da albufeira superior a 1Mm 3;
- capacidade do descarregador de cheias superior a 2000m 3/s;
- problemas especiais de fundações ;
- projecto não convencional.

Por exclusão de partes, uma pequena barragem é aquela que não é classificada como uma grande
barragem.

Em Moçambique, são classificadas como grandes barragens os de Cahora-Bassa, Massingir, Corumana,


Chicamba, Pequenos Libombos e ainda as barragens de:

- Nacala (17m de altura, 4Mm3 de armazenamento);


- Nampula (17.5m, 4Mm3);
- Chimoio (15m);
- Macarretane (12m, 3Mm3);
- Locumué (17.5m, 1.7m3).

As barragens podem ser classificadas de acordo com a sua utilização, com o seu funcionamento
hidráulico e com os materiais que compõem a sua estrutura.

Na classificação de acordo com a sua utilização, as barragens designam-se por:

- Barragens de armazenamento criam albufeiras destinadas a fazer escoamentos.

- Barragens de derivação - destinam-se a elevar o nível da água para cotas que permitam a sua derivação
para canais de irrigação ou outros sistemas de adução. A barragem de Macarretane é um exemplo típico
destas barragens.

- Barragens de retenção - destinam a retardar a progressão de cheias ou a reter sedimentos.

Na classificação de acordo com o seu funcionamento hidráulico, as barragens dividem-se em galgáveis e


não galgáveis. As barragens galgáveis permitem descargas por cima do coroamento e tem, por isso, de ser
construídas em materiais não erodíveis pela água como betão, alvenaria, madeira. As barragens de aterro
(terra, enrocamento) são não galgáveis pois o galgamento provocaria sérias erosões podendo levar ao
colapso da barragem. Por vezes, considera-se uma barragem composta consistindo duma parte central
galgável em betão ladeada por diques laterais em terra, como é o caso da barragem dos Pequenos
Libombos.

A classificação mais habitual e mais útil em termos de projecto é a baseada nos materiais que compõem a
estrutura da barragem. De acordo com esta classificação, as barragens dividem-se em:
- Barragens de betão (incluindo barragens de alvenaria);

- Barragens de aterro (terra ou enrocamento).

As barragens de betão, por sua vez, subdividem-se em barragens gravidade, barragens arco ou abóbada e
barragens de contrafortes, conforme o seu funcionamento estrutural.

As barragens de terra também subdividem-se, habitualmente, em barragens homogéneas e barragens


zonadas.

A CIGB define do seguinte modo os vários tipos de barragens:

a) Barragem de aterro - qualquer barragem construída de materiais naturais escavados, colocados em


adição de ligantes.

A barragem pode ser homogénea quando é composta dum único material, impermeável; ou zonada
quando compreende, na secção transversal, áreas especiais de material impermeável, terra, cascalho e
enrocamento.

b) Barragem de terra - é uma barragem de aterro composta principalmente de terra compactada (mais de
50%), podendo ser homogénea ou zonada.

c) Barragem de enrocamento - é uma barragem de aterro cuja estabilidade é assegurada por grandes áreas
de enrocamento (mais de 50%). A barragem tem de conter um núcleo impermeável, habitualmente de
argila, acompanhado de filtros e drenos. A impermeabilização é, por vezes, feita no paramento de
montante o qual é de betão, betão betuminoso ou outro material impermeável.

d) Barragem de gravidade - é uma barragem de betão ou alvenaria de pedra cuja estabilidade é assegurada
fundamentalmente pelo seu peso próprio.

e) Barragem arco ou abóbada - é uma barragem de betão apresentando em planta curvatura simples
(arco) ou dupla (abóbada) e que descarrega a maior parte da carga a que está sujeita nos encontros e não
na fundação. A curvatura é dirigida para montante.

f) Barragem de contrafortes - é uma barragem de betão em que o paramento de montante, impermeável, é


suportado do lado de jusante por uma série de apoios que são os contrafortes.

As figuras seguintes ilustram as principais variantes dos vários tipos de barragem.

A opção por uma barragem de aterro ou por uma barragem de betão não é rigidamente definida,
resultando da solução que se revelar mais económica dentro das exigências de segurança e qualidade
técnica.

Pode referir-se, no entanto, em termos gerais as vantagens de cada tipo de barragem e as exigências
correspondentes.
As barragens de aterro têm uma série de méritos que tem contribuído para serem o tipo largamente
dominante:

- são adequadas quer para vales apertados quer para vales muito apertados;
- adaptam-se a condições muito variadas de fundações ;
- utilizam materiais naturais, minimizando a necessidade de importar e transportar
grandes quantidades de cimento e inertes;
- com um projecto adequado, podem incluir na mesma secção diversos tipos de materiais naturais;
- o processo de construção é altamente mecanizado e efectivamente contínuo.

As desvantagens das barragens de aterro são poucas:

- estão sujeitas a grandes erosões e mesmo a destruição se forem galgadas, exigindo uma estrutura
separada para o descarregador de cheias;

- são vulneráveis a percolação que pode originar fenómenos de "piping" e erosão na barragem e na
fundação.

Por sua vez, os principais méritos das barragens de betão são os seguintes:

- podem ser utilizadas tanto em vales apertados como em vales abertos desde que se disponham
duma fundação em rocha sã a pequena profundidade;

- podem ser galgadas, o que lhes permite a colocação de descarregadores por cima do coroamento
(garantindo o necessário controlo da erosão a jusante);

- podem alojar descargas de fundo e outros equipamentos auxiliares em câmaras e galerias alojadas
no próprio corpo da barragem.

As principais desvantagens das barragens de betão em relação as barragens de aterro são:

- a exigência de melhores condições de fundação (rocha sã);

- a exigência de cimento e materiais naturais processados (inertes) em grande quantidade;

- a construção tradicional em betão é mão-de-obra intensiva, relativamente descontínua, exigindo


trabalhadores especializados para cofragens, betonagens, etc.

- custo unitário do m3 colocado em obra é muito mais elevado para o betão em massa do que para o
aterro compactado.

Este último aspecto é parcialmente compensado pelo facto dos volumes de betão numa barragem serem
muito inferiores aos volumes de aterro numa barragem de terra ou de enrocamento. É por isso que, num
vale relativamente estreito e com rocha sã próxima da superfície, uma solução de barragem de betão pode
ser mais económica que uma barragem em aterro, atendendo também ao facto de uma poder ser galgável
e a outra não.

2. ORGÃOS HIDRÁULICOS E OUTRAS COMPONENTES DAS BARRAGENS


Para poderem cumprir as suas funções de regularização de escoamentos, descargas para diversos fins e
simultaneamente serem estruturas que se mantém seguras durante a passagem de cheias, as barragens tem
de dispor, para alem do corpo da barragem propriamente dito (em aterro ou em betão), duma série de
outros orgãos, nomeadamente:

- descarregador de cheias;
- descargas de fundo e meio - fundo;
- circuito hidráulico para turbinas;
- drenagem interna;
- impermeabilização das fundações;
- galerias e poços de inspecção.

O descarregador de cheias tem por função passar para jusante, de forma segura, os caudais de cheias
afluentes quando a albufeira está já ao nível de armazenamento, evitando que a barragem sofra danos quer
devido a galgamento (no caso de barragens de aterro) quer devido a erosões no leito do rio
imediatamente a jusante e que possam minar a estrutura da barragem. O descarregador de cheias é
composto normalmente por uma estrutura de entrada (ou descarregador propriamente dito), um caudal
que conduz a água para jusante da barragem e uma bacia de ressalto ou outra estrutura de dissipação de
energia que permita fazer o retorno da água ao rio sem provocar grandes erosões.

O descarregador pode dispor ou não de comportas. Normalmente, os descarregadores das grandes


barragens têm comportas; os das pequenas barragens, sobretudo as situadas em locais muito isolados e
sujeitos a cheias súbitas, não utilizam comportas.

Por vezes, para além do descarregador principal, a barragem comporta um descarregador de emergência
um "dique fusível" em aterro, sobretudo aproveitando a existência de portelas, construído de maneira a
ruir quando a água atinge determinado nível, criando uma descarga adicional.

As barragens de betão tem habitualmente o descarregador de cheias sobre o coroamento, criando uma
secção galgável, enquanto que as barragens de aterro tem uma estrutura separada para o descarregador,
normalmente localizado num dos encontros.

Frequentemente, a função de regularização dos escoamentos é cumprida através de descargas da barragem


para o rio fazendo-se a jusante a captação dos caudais necessários. Para tal, a barragem deve dispor de
descargas de fundo ou de meio-fundo, compostas por condutas controladas por válvulas de regulação do
caudal.

As descargas de fundo também são muitas vezes instaladas como medida adicional de segurança para
permitir um mais rápido esvaziamento da albufeira.

As condutas e as respectivas comportas ou válvulas de controlo são facilmente incorporadas nas


barragens de betão; nas barragens de aterro, a prática normal consiste em instalar uma torre de comando,
que controla a entrada da água para a conduta ou culvert de descarga.

Quando os caudais a descarregar pelas descargas de fundo são elevados há que providenciar formas de
dissipar a energia do escoamento de maneira a que este não provoque erosões no leito e nas margens do
rio.

Quando a barragem tem uma central hidroeléctrica associada, ela deve dispor do correspondente circuito
hidráulico englobando comportas de controlo da entrada de água, condutas forçadas e depois a central
propriamente dita, com as turbinas e o caudal de fuga. A central pode estar fisicamente ligada ao corpo da
barragem ou estar distante dela.

Quer a fundação duma barragem seja em rocha quer um solo arenoso, o problema da impermeabilização
da fundação coloca-se frequentemente seja por causa da permeabilidade natural do material (areia, silte),
seja porque a camada superficial da rocha está muito alterada, seja porque a rocha apresenta fendilhação
profunda. Numa barragem de aterro é normal utilizar-se uma vala corta-águas ("cut-off trench") que é
uma vala escavada por baixo do núcleo impermeável da barragem e preenchida com material
impermeável (argila) com uma profundidade geralmente não muito grande, figura 6.

Se o estrato impermeável se localizar a profundidades maiores, então há necessidade de fazer um cortina


de injecções de calda de cimento ou duma mistura de argila e cimento, a partir do núcleo impermeável da
barragem ou da vala corta-águas, figura 6.
Nas barragens de betão, a impermeabilização da fundação rochosa faz-se através de cortinas de injecções
localizadas próximo do paramento de montante.

Em fundações permeáveis, um processo que é utilizado para reduzir a percolação através da fundação é a
utilização dum tapete argiloso apartir do pé de montante da barragem e estendendo-se para a montante. O
tapete impede a infiltração da água da albufeira próximo da barragem e assim, aumentando o caminho de
percolação, reduz o caudal percolado.

A percolação, embora controlada ou reduzida, existe sempre quer no corpo da barragem quer na
fundação. Por isso, todas as barragens modernas incluem dispositivos de drenagem interna cujo objectivo
principal é o alívio das pressões da água. Assim, na fundação faz-se uma série de furos de drenagem a
jusante da cortina de impermeabilização, desta forma reduzindo significativamente as subpressões. No
corpo das barragens de betão instalam-se drenos verticais, fazendo-se a recolha da água numa galeria
donde se encaminha para a saída a jusante.

Nas barragens de aterro, cria-se normalmente uma zona muito permeável do lado de jusante do núcleo
impermeável, zona essa que se liga a um tapete horizontal de drenagem que vai ter ao pé de jusante da
barragem.

Para além do seu papel no sistema de drenagem interna, galerias e poços são projectados para permitir
uma inspecção da barragem, particularmente no caso de barragens de betão. As galerias, poços e
quaisquer câmaras das comportas ou válvulas podem também ser utilizadas para a instalação de
instrumentação de observação da barragem. Nas galerias ligam-se também piezómetros para medir a
subpressão na fundação assim como os dispositivos necessários para fazer um reforço da cortina de
injecções se se revelar necessário.

3. DESVIO PROVISÓRIO DO RIO DURANTE A CONSTRUÇÃO

O desvio provisório do rio durante a construção da barragem torna-se necessário para uma construção que
tem de ser feita a seco. O problema é complexo e obriga a um delicado compromisso entre o risco que se
considera aceitável e a economia da solução de desvio, quanto menor é o risco que se pretende correr da
obra ser inundada por uma cheia durante a construção maior é o custo do desvio provisório.
O caudal de dimensionamento do desvio provisório é função do risco que se considera aceitável e do
tempo estimado da construção, a partir da relação entre risco, duração da construção e período de retorno.

1
R(N,T)= 1-(1- T )N
Assim, por exemplo, se está previsto que uma barragem leve 5 anos a construir e se se pretende que o
risco de inundação não exceda 10%, o período de retorno a considerar para o caudal de dimensionamento
seria de 48 anos.

Podem considerar-se três soluções básicas para o desvio provisório:

1 - Se se tratar duma barragem de betão e a época seca for suficientemente longa, pode-se avançar com a
construção dos blocos durante a época seca deixando alguns deles a nível mais baixo para serem galgados
enquanto nos restantes se pode trabalhar a seco. Os blocos mais baixos são elevados em outra época seca
quando o resto da barragem já esta concluída;

2- Fazer um túnel de desvio para onde o rio é encaminhado e proteger a área de trabalho com
ensecadeiras a montante e a jusante. O túnel pode posteriormente ser incorporado nos orgãos hidráulicos/
descargas de fundo (caso de Massingir) ou não o ser (Cahora-Bassa);

3- Dividir a secção transversal em duas ou três partes, canalizando o rio para uma delas e prosseguindo o
trabalho na(s) outra(s) com a protecção de ensecadeiras. Quando a obra na parte protegida já esta
avançada ou concluída, faz-se passar rio por ali, deixando a seco a parte da secção anteriormente ocupada
pelo rio. A barragem dos Pequenos Libombos foi construída desta maneira:

- protegeu-se com ensecadeiras as partes ligadas aos dois encontros, deixando uma zona central
livre para a passagem do rio;
- avançou-se com os aterros das margens esquerda e direita e com o descarregador de cheias na
parte protegida da margem esquerda;
- quando o descarregador ganhou altura sufeciente, o rio passou a escoar-se através de alguns
orifícios deixados no descarregador o que permitiu o avanço do trabalho na zona do desvio.

A figura 7 ilustra com pormenor o desvio e o progresso da construção da barragem sul- africana de
Hendrik Verwoerd (extraído do livro "The Engeneering of Large Dams" de H. H. Thomas).

4. A AVALIAÇÃO DO LOCAL DA BARRAGEM

Em condições ideais, o local duma barragem devia preencher os seguintes critérios:

a - situar-se numa secção estreita do vale. A razão é obviamente o tornar possível uma barragem de custo
mais baixo. Há, no entanto, que tomar atenção ao facto de que vales muito estreitos (como o da barragem
de Cahora-Bassa) podem dificultar a colocação de orgãos hidráulicos e complicar o problema da
dissipação de energia (cf. ABECASSIS 1979).

b - estar a jusante dum vale aberto para que a albufeira criada pela barragem tenha uma grande capacidade
de armazenamento.

c - ter boas condições de fundação (rocha sã a pequena profundidade, inexistência de falhas importantes,
solos compactos e pouco permeáveis).

d - a geologia do vale a montante, onde se vai localizar a albufeira, mostrar não haver problemas de
rochas cársicas, solos permeáveis ou possibilidade de deslizamento de encostas.

e - possibilitar a extracção dos materiais de construção necessários (solos, agregados).


f - ter acessos fáceis.
Como é evidente, estas condições raramente são preenchidas na totalidade pelo que é necessário procurar
uma solução de compromisso.

A selecção do local da barragem não deve ser feita sem se considerarem 2 a 3 locais alternativos, pesando
cuidadosamente as vantagens e inconvenientes de cada um deles, figura 8.

A escolha dum local deve atender também a outros factores dependentes das facilidades da barragem e
das especifidades da região, como por exemplo:

- possibilidade de aproveitamento duma queda para a produção de energia;

- áreas de interesse económico, social ou cultural e infra-estruturas que possam ser inundadas pela
albufeira (aldeias que tem de ser deslocadas, estradas e caminhos-de -ferro que ficam submersos,
etc).

A escolha do local da barragem implica assim investigações preliminares que, de acordo com a
importância da barragem, podem levar anos a realizar e custar muito dinheiro. E, por isso, importante
desenvolver os estudos preliminares em estágios de aprofundamento sucessivo de forma a eliminar
rapidamente as piores alternativas de locais e concentrar as investigações em 1 ou 2 locais mais
promissores. Caso contrário, os estudos preliminares, nomeadamente os de topografia e geologia, podem
vir a assumir uma percentagem exageradamente alta do custo da obra.

Uma primeira análise de possíveis locais para a barragem pode ser feita sobre fotografias aéreas
utilizando um asteoroscópio. Em Moçambique dispoem-se de fotografia aérea a escala 1:40000 cobrindo
todo o território.

Para a delimitação da albufeira e determinação das curvas de áreas inundadas e dos volumes
armazenados, é preciso dispor de cartas a escala 1:25000 ou 1:50000 com curvas de nível espaçadas de 1
ou 2 m. Se se tratar duma pequena barragem, com uma altura de poucos metros, será preciso uma carta a
uma escala maior e com curva de nível com intervalos menores. Eventualmente, tratando-se duma
pequena albufeira, poderá fazer-se o seu levantamento topográfico.

Para o local da barragem propriamente dito, são necessárias cartas a uma escala bastante grande (1:5000
ou 1:2500 ou mesmo 1:1000) com curvas de nível espaçadas de 0.5 a 1 metros, para se poderem estimar
quantidades de materiais a empregar, volumes de escavação e aterro e a localização de diversas
componentes da barragem. Normalmente será necessário fazer um levantamento topográfico específico
para produzir as cartas necessárias.

Do ponto de vista da geologia, é importante compilar a informação já existente sobre a região tendo em
vista formular as primeiras ideias com respeito a:
- segurança da barragem nas suas fundações;
- impermeabilidade da albufeira;
- disponibilidades dos materiais de construção.

A informação regional permitirá conhecer a existência ou não de formações calcáreas (perigosas, porque
solúveis na água), sistemas de falhas, etc., conhecimento que pode ser apoiado em análises químicas da
água.
Posteriormente, é necessário ir obtendo um conhecimento da geologia do local da barragem cada vez
mais trabalho. Em princípio, é aconselhável ter bom conhecimento da fundação até uma profindidade
igual a altura da barragem.

A exploração geológica deve ser feita por diversas vias:


- reconhecimento superficial - a abertura de trincheiras com maior profundidade possível permite detectar
falhas, planos de sedimentação, tipo de rochas, grau de alteração; é possível como complemento de
sondagens e extracção de carotes em rochas e solos;

- exploração geofísica (métodos sísmicos e eléctricos) - constitui um processo rápido e barato para
determinar uma larga área um importante conjunto de propriedades como descontinuidades na fundação,
profundidade de aluvião, espessura da rocha alterada, etc. Deve ser usada em conjunto com outras formas
de reconhecimento superficial e sub - superficial;

- sondagens (com recuperação de material) e galerias escavadas em rocha. São normalmente de custo
elevado pelo que a sua definição deve ser feita por um geológo de fundações com muita experiência.

Vale a pena referir que o custo elevado da exploração geológica normalmente limita o estudo aos
mínimos considerados seguros. Por isso, durante a construção da barragem, é importante aproveitar a fase
de escavação das fundações para complementar os conhecimentos existentes sobre a geologia do local e,
se necessário fazer as adaptações adequadas no projecto.

Em conexão com estudos geológico, há que considerar também a actividade sísmica, quer se trate de
sismicidade natural quer de sismicidade induzida pela albufeira. A sismicidade natural deve ser
investigada com base em registos de sismógrafos (quando existam) bem como apartir de informações da
imprensa e da população. A existência de falhas, sobretudo se existir alguma falha activa, é de grande
importância.

Quanto a sismicidade induzida embora não haja evidência conclusiva, parece ser possível que, em
determinadas circuntâncias, o enchimento de grandes albufeiras e posteriores grandes variações dos
volumes armazenados origina sismos (devido aos ajustamentos que ocorrem na crusta terrestre). Os mais
importantes casos registados foram os das barragens de Koyna, na India, que sofreu grandes estragos com
um sismo de magnitude 6.4 (escala de Mercalli) quando não se tinha memória de qualquer sismo
anteriormente a barragem; Hoover, nos Estados Unidos, que passou a sofrer frequentes sismos o maior
dos quais, de magnitude 5; e Kariba, no Zimbabwe, que já sofreu um sismo de magnitude 5.8. Note-se
que se trata de albufeiras de muito grandes capacidades de armazenamento:2800; 42000 e de 170000
milhoes de metros cúbicos respectivamente.

5. SELECÇÃO DO TIPO DE BARRAGEM


O melhor tipo de barragem para um dado local é definido em função de condicionantes técnicas e do
custo. Em certas situações, as condicionantes técnicas impoem um detrminado tipo de barragem, noutras
porem, diversos tipos são tecnicamente possíveis e a decisão é tomada em função dos custos das soluções
alternativas.

Quatro aspectos são de fundamental importância para a seleção do tipo de barragem:

a) o gradiente hidráulico- a figura 9 ilustra as diferenças que se podem verificar no gradiente hidráulica
para os diversos tipos de barragem.
Nas barragens de aterro verifica-se percolação não apenas através da fundação mas também através do
próprio corpo da barragem o que não se verifica nas barragens de betão que podem ser consideradas
impermeáveis. No caso de barragens de terra homogéneas o gradiente hidráulico pode ser bastante baixo,
por exemplo, de 0.2 ou 0.3; as barragens de gravidade podem ter um gradiente de cerca de 1; as barragens
de aterro zonadas podem ter valores da ordem de 2 ao passo que as barragens de contrafortes, abóbada e
enrocamento com impermeabilização a montante podem ter valores entre 5 e 20. O gradiente hidráulico
constitui assim uma condicionante para as fundações visto que fundações menos resistentes e mais
permeáveis dificilmente suportarão as pressoes internas associadas a gradientes hidráulicos elevados.

b) as tensões na fundação- os diversos tipos de barragem transmitem tensões a fundação que diferem
bastante. NOVAK (1990) refere as seguintes ordens de grandeza para barragens com cerca de 100m
de altura:

Tipo de barragem Pressão (MPa)


Aterro 0.2
Gravidade 3.0 - 4.0
Contrafortes 5.5 - 7.5
Abóbada 7.5 - 10

O material da fundação condiciona, portanto, fortemente o tipo de barragem visto que as barragens de
betão exigem fundações rochosas (as únicas que suportam pressoes superiores a 1MPa=10kgf/cm2).

c) a deformabilidade da fundação- duma maneira geral, as barragens de betão e sobretudo as barragens


de abóbada e de contrafortes adaptam-se mal a deformações excessivas ou diferenças da fundação ao
passo que uma barragem de aterro bem projectada é bastante flexível e permite ajustamentos a
deformação da fundação.

d) o volume da escavação na fundação- se para se atingir o "bedrock" para fundar uma barragem de
betão é necessário um grande volume de escavação que tem depois de ser enchido com betão, então
trata-se duma alternativa pouco económica.

A figura 10 apresenta algumas situações em que a topografia e a geologia apontam preferencialmente


para determinados tipos de barragem.

Haverá outros factores a considerar na selecção do tipo de barragem como, por exemplo:

- possibilidade de desvio do rio;


- rapidez da construção;
- possibilidade de inundação durante a construção;
- carência de pessoal especializado (por ex: equipas para cofragens especiais ou para betoes de alta
resistência);
- questoes ambientais.

6. FORÇAS ACTUANTES NA BARRAGEM


A integridade e a segurança duma barragem tem de ser mantidas em todas as situações que
provavelmente possam ocorrer ao longo da sua vida desde o início da sua construção. É preciso assegurar
a estabilidade da barragem e da fundação e a sua impermeabilidade.

Apesar da aparente simplicidade das suas formas, as barragens tem um comportamento estrutural muito
complexo, visto tratarem-se de estruturas assimétricas, tridimensionais, com materiais heterogéneos e
com interação com a fundação. Por outro lado, as solicitações efecticas nas barragens estão próximas das
solicitações de projecto o que não acontece com muitas outras estruturas.
Nem todas as forças actuam nos vários tipos de barragem da mesma forma, por isso neste capítulo apenas
se fará uma caracterização geral das solicitações.

É vantajoso dividir as forças actuantes em três grupos: primárias, secundárias e excepcionais. A figura 11
ilustra as várias forças actuantes, exemplificando-se com uma barragem de gravidade.

a) Forças primárias são as de maior importância para todas as barragens, independentemente do tipo,
incluindo:

P1- resultante da pressão hidrostática. Note-se que poderá haver uma componente vertical caso o
paramento de montante não seja vertical assim como uma pressão do lado de jusante corresponde ao nível
da água que aí se verifica;
P2- peso próprio;
P3- subpressão resultante da percolação na fundação. O diagrama será triangular se não houver uma
linha de drenos. Nas barragens de aterro, a percolação através do corpo da barragem origina pressoes nos
poros.

b) Forças (ou solicitações) secundárias são de menor importância ou consideram-se apenas para certos
tipos de barragens:

P5- pressão sobre o paramento de montante resultante do sedimento submerso;


P6- força resultante de ondas (pouco importante);
Tensoes térmicas resultantes de variações lineares e diferenciais de temperatura (apenas em barragens
de betão).

c) Forças excepcionais são as que tem uma probabilidade de ocorrência muito baixa:
P4, P7- a ocorrência de sismos traduz-se por movimentos da fundação (acelerações) que são
transmitidas ao corpo da barragem e ao volume de água armazenada, podendo gerar importantes tensões.
O seu tratamento rigoroso cai no domínio da Dinámica das Estruturas e é demasiado complexo para ser
aqui tratado, limitando-nos a uma análise simplificada através da introdução de forças estáticas
"equivalentes" P4 e P7.

Importa ter desde já em conta que nas barragens de betão as forças atrás referidas se podem considerar
como forças externas, para uma análise simplificada, enquanto que nas barragens de aterro elas tem de ser
consideradas como forças internas distribuídas.

7. ALGUNS ELEMENTOS HISTÓRICOS E ESTATÍSTICOS


A construção de barragens data da Antiguidade Oriental e liga-se a quase todas as grandes civilizações
orientais (Egipto, Mesopotâmia, India, China) e a civilização romana.

A mais antiga barragem de que há vestígios é a barragem de Sadd-Kafara, no Egipto. Foi construida no
braço do rio Nilo, com uma altura de 14m, em terra com encontros na rocha e protecção dos paramentos
com alvenaria. Data possivelmente de cerca de 2800 a.c. A barragem rompeu possivelmente devido ao
galgamento.

Outras barragens foram construidas na antiguidade no Médio Oriente, merecendo destaque a barragem de
Marib (terra), no Iemen, com uma altura de 20m, e a barragem de Kesis Golu (alvenaria) na Turquia com
uma altura de 10m. As barragens datam de cerca de 750 a.c.

Também os romanos construiram muitas barragens no Médio Oriente e na bacia mediterrânica. Foram os
primeiros a construir barragens arco como a barragem de Baume, em França, com 12m de altura, no séc.
II d.c.
No primeiro milénio aumentou grandemente o número de barragens construidas em várias partes
do mundo bem como a sua altura. Avanços significativos foram introduzidos no séc. XVI em
Espanha, como por exemplo, a barragem de Tibi (gravidade) com 42m de altura.

A grande expansão, no entanto, corresponde ao séc. XX correspondendo quer ao


desenvolvimento criado pela Revolução Industrial quer aos avanços no domínio da teoria (Teoria
da Elasticidade, Mecânica dos Solos) quer ao progresso da tecnologia (materiais como o betão,
equipamento de movimento de terra, etc.).

A CIGB mantem um registo de grandes barragens que vai sendo actualizado regularmente com
informação fornecida pelos comités nacionais. Apresentam-se alguns elementos de seguida.

Quadro 1- Estatistica de grandes barragens(CIGB 1984)


Grupo Tipo Codigo (CIGB) Numero %
Aterrro Terra TE 28845 82.9
Enrocamento ER
Betao(incluindo Gravidade PG 3953 11.3
alvenaria) Abobada VA, MV 337 4.8
Contrafortes CB 1663 1.0
Total (até ao fim 34798
de 1982)

Pode referir-se que a China tinha 18595 grandes barragens e os Estados Unidos 5338. Havia em
1950, 5196 barragens o que significa que, durante 30 anos, foram construidas em média mais de
900 grandes barragens por ano.

O quadro seguinte, obtido de MERMEL 1988, indica as maiores barragens do mundo em termos
de altura, volume de aterro e capacidade da albufeira.
Quadro 2- As maiores barragens do Mundo
Barragem Pais Tipo Ano Altura (m) Volume Capacidade
(106m3) (109m3)
Rogun URSS TE/ER 1989 335
Nurek URSS TE 1980 300
Grand Dixene Suica PG 1962 285
Inguri
Vaiont URSS VA 1980 272
Italia VA 1961 262
Chapeton Argentina TE/PG 1996 35 296
Pati Argentina TE/PG 1990 36 238
Tarbela Paquistao TE/ER 1976 143 106
Fort Peck EUA TE 1937 76 96
Lower Usuma
Nigeria TE 1990 49 93

Owen Falls
Kariba Uganda PG 1954 31 2700
Bratsk Zimbabwe VA 1959 128 181
Aswan URSS TE/PG 1964 125 169
Akosombo Egipto TE/ER 1970 111 169
Ghana TE/ER 1965 134 148

Bibliografia para aprofundamento da matéria

THOMAS- The Engineering of Large Dams- cáps. 3, 5, 7.


NOVAK- Hydraulic Strutures- cáp. 1.
USBR- Design of Small Dams- cáps. 1, 4, 5, 11.
ABECASSIS, F.- Importância dos factores hidráulicos para a economia das barragens - Recursos
Hídricos, vol.1, n- 2, Maio 1980.
MERMEL, T- Major dams of the world 1988- Water Power & Dams Constr., vol 40, n- 6, June
1988.
SERAFIM, j. l.- Elements for a thorough Statistical analysis of dam failures- Revista da Univ.
Coimbra, vol. 29, 1981.

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