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As barragens podem ser classificadas de acordo com a sua utilização, com o seu funcionamento
hidráulico e com os materiais que compõem a sua estrutura.
Figura 5.2 – Exemplo de uma barragem não galgável com uma parte central
galgável (barragem dos Pequenos Libombos – Moçambique)
Figura 5.3 – Exemplo de uma barragem não galgável com uma estrutura
descarregadora separada (barragem Mohale – Lesoto)
Na classificação de acordo com os materiais (a mais habitual e mais útil em termos de projecto)
as barragens dividem-se em:
A opção por uma barragem de aterro ou por uma barragem de betão não é rigidamente definida,
resultando da solução que se revelar mais económica dentro das exigências de segurança e
qualidade técnica. Pode-se referir no entanto, em termos gerais as vantagens de cada tipo de
barragem e as exigências correspondentes.
As barragens de aterro têm uma série de méritos que têm contribuído para serem o tipo
largamente dominante:
São adequadas quer para vales apertados quer para vales muito abertos.
Adaptam-se a condições muito variadas de fundações.
Utilizam materiais naturais, minimizando a necessidade de importar e transportar grandes
quantidades de ligantes e de agregados.
Com um projecto adequado, podem incluir na mesma secção diversos tipos de materiais
naturais.
O Processo de construção é altamente mecanizado e efectivamente contínuo.
Por sua vez, os principais méritos das barragens de betão são os seguintes:
Podem ser utilizadas tanto em vales apertados como em vales abertos desde que se
disponha duma fundação em rocha sã a pequena profundidade.
Podem ser galgadas, o que lhes permite a colocação de descarregadores por cima do
coroamento (garantindo o necessário controlo da erosão a jusante).
Podem alojar descargas de fundo e outros equipamentos auxiliares em câmaras e galerias
alojadas no próprio corpo da barragem.
Este último aspecto é parcialmente compensado pelo facto dos volumes de betão numa barragem
de betão serem muito inferiores aos volumes de aterro numa barragem de terra ou de
enrocamento. É por isso que, num vale relativamente estreito e com rocha sã próxima da
superfície, uma solução de barragem de betão pode ser mais económica que uma barragem em
aterro, atendendo também ao facto de uma poder ser galgável e a outra não.
Para poderem cumprir as suas funções de regularização de escoamentos, descargas para diversos
fins e simultaneamente serem estruturas que se mantêm seguras durante a passagem de cheias, as
barragens têm de dispor, para alem do corpo da barragem propriamente dito (em aterro ou em
betão), de uma série de outros órgãos, nomeadamente:
Descarregador de cheias.
Descargas de fundo e meio-fundo.
Circuito hidráulico para turbinas.
Drenagem interna.
Impermeabilização das fundações.
Galerias e poços de inspecção.
O descarregador de cheias tem por função passar para jusante, de forma segura, os caudais de
cheia afluentes quando a albufeira está já ao nível de pleno armazenamento, evitando que a
barragem sofra danos quer devido a galgamento (no caso de barragens de aterro) quer devido a
erosões no leito do rio imediatamente a jusante e que possam minar a estrutura da barragem (no
As descargas de fundo também são muitas vezes instaladas como medida adicional de segurança
para permitir um mais rápido esvaziamento da albufeira.
Quando os caudais a descarregar pelas descargas de fundo são elevados, há que providenciar
formas de dissipar a energia do escoamento de maneira a que este não provoque erosões no leito
e margens do rio.
Quando a barragem tem uma central hidroelétrica associada, ela deve dispor do correspondente
circuito hidráulico englobando comportas de controlo da entrada de água, condutas forçadas e
depois a central propriamente dita, com as turbinas e o canal de fuga (fig. 5.9). A central pode
estar fisicamente ligada ao corpo da barragem ou estar distante dela.
Figura 5.9 – Circuito hidráulico da central hidroeléctrica de Cahora Bassa, Moçambique (planta e perfil)
Quer a fundação duma barragem seja em rocha quer em solo arenoso, o problema da
impermeabilização da fundação coloca-se frequentemente, seja por causa da permeabilidade
natural do material (areia, silte), seja porque a camada superficial da rocha está muito alterada,
seja porque a rocha apresenta fendilhação profunda.
Numa barragem de aterro é normal utilizar-se uma vala corta-águas (“cut-off trench”) que é uma
vala escavada por baixo do núcleo impermeável da barragem e preenchida com material
“impermeável”, por exemplo argila, com uma profundidade geralmente não muito grande (fig.
5.10-a). Se o estrato impermeável localizar-se a profundidades maiores, então há necessidade de
fazer uma cortina de injecção de calda de cimento ou duma mistura de argila e cimento, a partir
do núcleo impermeável da barragem ou da vala corta- águas (fig.5.10-b).
a) b)
Figura 5.10 – Impermeabilização da fundação em barragem de aterro
A percolação, embora controlada ou reduzida, existe sempre quer no corpo da barragem quer na
fundação. Por isso, todas as barragens modernas incluem dispositivos de drenagem interna cujo
objectivo principal é o alívio das pressões da água. Assim, na fundação faz-se uma série de furos
de drenagem a jusante da cortina de impermeabilização, desta forma reduzindo
significativamente as subpressões. No corpo das barragens de betão instalam-se drenos verticais,
fazendo-se a recolha da água numa galeria donde se encaminha para a saída a jusante. Nas
barragens de aterro, cria-se normalmente uma zona muito permeável do lado de jusante do
núcleo impermeável, zona essa que se liga a um tapete horizontal de drenagem que vai ter ao pé
de jusante da barragem.
Para alem do seu papel no sistema de drenagem interna, galerias e poços são projectados para
permitir uma inspecção da barragem, particularmente no caso das barragem de betão. As
galerias, poços e quais quer câmaras das comportas ou válvulas podem também ser utilizadas
para a instalação de instrumentação de observação da barragem. Nas galerias ligam-se também
piezómetros para medir a subpressão na fundação assim como os dispositivos necessários para
fazer um reforço da cortina de injecções se revelar necessário.
O desvio provisório do rio durante a construção da barragem torna-se necessário nas fases da
construção que tem de ser feitas a seco. O problema é habitualmente complexo e obriga a um
delicado compromisso entre o risco que se considera aceitável e a economia da solução de desvio
– quanto menor é o risco que se pretende correr da obra ser inundada por uma cheia durante a
construção, maior é o custo do desvio provisório.
( , ) = 1− 1− (5.1)
Assim, por exemplo, se está previsto que uma barragem leve 5 anos a ser construída e se se
pretende que o risco de inundação não exceda 10%, utilizando a fórmula 5.1, resulta que o
período de retorno a considerar para o caudal do dimensionamento seria de 48 anos.
1. Se se tratar duma barragem de betão e a época seca for suficientemente longa, pode-se
avançar com construção dos blocos durante a época seca deixando alguns a nível mais
baixo para serem galgados enquanto nos restantes se pode trabalhar a seco. Os blocos
mais baixos são elevados em outra época seca quando o resto da barragem já está
concluído.
2. Fazer um túnel de desvio para onde o rio é encaminhado e proteger a área de trabalho
com ensecadeiras a montante e a jusante. O túnel pode posteriormente ser incorporado
nos órgãos hidráulicos, por exemplo descargas de fundo (caso de Massingir) ou não o ser
(caso de Cahora-Bassa).
3. Dividir a secção transversal em duas ou três partes, canalizando o rio para uma delas e
prosseguindo o trabalho na(s) outra(s) com a protecção de ensecadeiras. Quando a obra
na parte protegida já está avançada ou concluída, faz-se passar o rio por ali deixando a
seco a parte da secção anteriormente ocupada pelo rio.
Em condições ideais, o local para a construção de uma barragem devia preencher os seguintes
critérios:
a) Situar-se numa secção estreita do vale. A razão é obviamente o tornar possível uma
barragem de custo mais baixo. Há, no entanto, que tornar atenção ao facto de que vales
muito estreitos podem dificultar a colocação de órgãos hidráulicos e complicar o
problema da dissipação de energia.
b) Estar a jusante de um vale aberto para que a albufeira criada pela barragem tenha uma
capacidade de armazenamento.
c) Ter boas condições de fundação (rocha sã a pequena profundidade, inexistência de falhas
importantes, solos compactos e pouco permeáveis).
d) A geologia do vale a montante, onde se vai localizar a albufeira, mostrar não haver
problemas de rochas cársicas, solos permeáveis ou possibilidade de deslizamentos nas
encostas.
e) Possibilitar a extracção dos materiais de construção necessários (solos e agregados).
f) Ter acessos fáceis.
Como é evidente, estas condições raramente são preenchidas na totalidade pelo que é necessário
procurar uma solução de compromisso.
A selecção do local para a construção de uma barragem não deve ser feita sem se considerarem 2
ou 3 locais alternativos, pesando cuidadosamente as vantagens e inconvenientes de cada um
deles (fig. 5.11).
A escolha de um local deve atender também a outros factores dependentes das finalidades da
barragem e das especificidades da região, como por exemplo:
Possibilidade de aproveitamento duma queda para a produção de energia eléctrica.
Áreas de interesse económico, social ou cultural e infraestruturas que possam ser
inundadas pela albufeira (aldeias que têm de ser deslocadas, estradas e caminhos-de-ferro
que ficam submersos, etc.).
Assim, a escolha do referido local para a barragem implica investigações preliminares que, de
acordo com a importância da barragem, podem levar anos a realizar e custar muito dinheiro. É,
por isso, importante desenvolver os estudos preliminares em estágios de aprofundamento
sucessivo de forma a eliminar rapidamente as piores alternativas de locais e concentrar as
investigações em 1 ou 2 locais mais promissores. Caso contrário, os estudos preliminares,
nomeadamente os de topografia e de geologia, podem vir a assumir uma percentagem
exageradamente alta do custo da obra.
Uma primeira análise de possíveis locais para a barragem pode ser feita sobre fotografias aéreas
utilizando um esteoroscópio.
Para a delimitação da albufeira e determinação das curvas de áreas inundadas e dos volumes
armazenados, é preciso dispor de cartas à escala 1:25.000 ou 1:50.000 com curvas de nível
espaçadas de 1 ou 2 metros. Se se tratar de uma pequena barragem, com uma altura de poucos
metros, será preciso uma carta a uma escala maior e com curvas de nível com intervalos
menores. Eventualmente, tratando-se de uma pequena albufeira, poderá fazer-se o seu
levantamento topográfico.
Para o local da barragem propriamente dito, são necessárias cartas a uma escala bastante grande
(1:5.000 ou 1:2.500 ou mesmo 1:1.000) com curvas de nível espaçadas de 0,5 a 1 metros, para se
poderem estimar quantidades de materiais a empregar, volumes de escavação e de aterro e a
localização das diversas componentes da barragem. Normalmente será necessário fazer um
levantamento topográfico específico para produzir as cartas necessárias.
Vale a pena referir que o custo elevado da exploração geológica normalmente limita o estudo aos
mínimos considerados seguros. Por isso, durante a construção da barragem, é importante
aproveitar a fase de escavação das fundações para complementar os conhecimentos existentes
sobre a geologia do local e, se necessário, fazer as adaptações adequadas no projecto.
Em conexão com o estudo geológico, há que considerar também a actividade sísmica, quer se
trate de sismicidade natural quer de sismicidade induzida pelo albufeira. A sismicidade natural
deve ser investigada com base em registo de sismógrafos (quando existem) bem como a partir de
informações da imprensa e da população. A existência de falhas, sobretudo se existir alguma
falha activa, é de grande importância. Quanto à sismicidade induzida, embora não haja evidência
conclusiva, parece ser possível que, em determinadas circunstâncias, o enchimento de grandes
albufeiras e posteriores grandes variações de volumes armazenados origina sismos (devido aos
ajustamentos que ocorrem na crusta terrestre). Os casos mais importantes registados foram os
das barragens de koyna, na India, que sofreu grandes estragos com um sismo de magnitude 6.4
(escala de Mercalli) quando não se tinha memória de qualquer sismo anteriormente à barragem;
Hoover, nos Estados Unidos da América, que passou a sofrer frequentes sismos, o maior dos
quais de magnitude 5; e Kariba, na fronteira entre Zâmbia e Zimbabwe, que já sofreu um sismo
de magnitude 5,8. Note-se que se trata de albufeiras de muito grandes capacidades de
armazenamento: 2.800; 42.000 e 170.000 M m3 (milhões de metros cúbicos) respetivamente.
O melhor tipo de barragem para um dado local é definido em função de condicionantes técnicas
e do custo. Em certas situações, as condicionantes técnicas impõem um determinado tipo de
barragem; noutras, diversos tipos são tecnicamente possíveis e a decisão é tomada em função dos
custos das soluções alternativas.
a) O gradiente hidráulico – a fig. 5.12 ilustra as diferenças que se podem verificar no gradiente
hidráulico para os diversos tipos de barragem.
Nas barragens de aterro verifica-se percolação não apenas através da fundação mas também
através do próprio corpo da barragem o que não se verifica nas barragens de betão que podem ser
consideradas impermeáveis. No caso de barragens de terra homogéneas o gradiente hidráulico
pode ser bastante baixo, por exemplo de 0,2 ou 0,3; as barragens gravidade podem ter um
gradiente de cerca de 1; as barragens de aterro zonadas podem ter valores da ordem de 2 ao
passo que as barragens de contrafortes, abóbada e enrocamento com impermeabilização a
montante podem ter valores 5 e 20. O gradiente hidráulico constitui assim uma condicionante
para as fundações visto que, fundações menos resistentes e mais permeáveis dificilmente
suportarão as pressões internas associadas a gradientes hidráulicos elevados.
Aterro 0.2
Gravidade 3- 4
Abóbada 7.5 – 10
Haverá outros factores a considerar na selecção do tipo de barragem como, por exemplo:
Possibilidade de desvio do rio.
Rapidez da construção.
Possibilidade de inundação durante a construção.
Carência de pessoal especializado, por exemplo, equipas para cofragens especiais ou para
betões de alta resistência).
Questões ambientais.
A integridade e a segurança duma barragem têm de ser mantidas em todas situações que
provavelmente possam ocorrer ao longo da sua vida desde o início da sua construção. É preciso
assegurar a estabilidade da barragem e da fundação e a sua impermeabilidade.
Apesar da aparente simplicidade das suas formas, as barragens têm um comportamento estrutural
muito complexo, visto tratarem-se de estruturas assimétricas, com materiais heterogéneos e com
interacção com a fundação. Por outro lado, as acções efectivas nas barragens estão
frequentemente próximas das acções de projecto o que não acontece com muitas outras
estruturas.
Nem todas as forças actuam nos vários tipos de barragem da mesma forma, por isso neste
capítulo apenas se fará uma caracterização geral das acções.
b) Acções secundárias são de menor importância ou consideram-se apenas para certos tipos de
barragens; incluem:
P5 – Pressão sobre o paramento de montante resultante do sedimento submerso.
P6 – Força resultante de ondas (pouco importante)
Tensões térmicas resultantes de variações lineares e diferenciais de temperatura (apenas em
barragens de betão).
c) Acções excepcionais são as que têm uma probabilidade de ocorrência muito baixa; podem
ser P4 e P7. A ocorrência de sismo traduz-se por movimentos da fundação (acelerações) que
são transmitidas ao corpo da barragem e ao volume de água armazenada, podendo gerar
importantes tensões.
Importa ter desde já em conta que nas barragens de betão as acções acima referidas podem-se
considerar como acções externas, para uma análise simplificada, enquanto nas barragens de
aterro elas têm de ser consideradas como forças internas distribuídas.
Fontes bibliográficas