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Este artigo visa fazer uma breve introdução das ideias do historiador (francês) de
filosofia antiga Pierre Hadot, em específico da sua original leitura da filosofia antiga,
bem como utilizá-la como ferramenta teórica de compreensão do denominado Programa
Doze Passos de Narcóticos Anônimos.
Temos por base que tanto as propostas trazidas pelo historiador, quando
elucidou o que era a filosofia antiga, quanto a nova maneira de viver sugerida por
Narcóticos Anônimos são claras proposições de vida modelares e, por isso, o trabalho
incidirá sobre elementos homólogos dos respectivos modos de compreensão da
realidade humana.
Pierre Hadot indica que o termo espiritual, empregado nos vários contextos dos
atos filosóficos antigos, é capaz de indicar bem os processos que esses mesmos atos
procuram operar na pessoa, porquanto diz ele: “a palavra ‘espiritual’ permite entender
bem que esses exercícios são obra não apenas do pensamento, mas de todo o psiquismo
do indivíduo” (HADOT, 2014, p.20).
Desse modo, um outro tema que se liga necessariamente com a harmonia entre
vida e discurso se dá através da exemplaridade, ou seja, a vida, de forma clara e
evidente, deve explicitar a coerência. Não à toa, ao tomar Sócrates como mestre e
exemplo de filósofo (isto é, aquele cuja vida é modelar nos exercícios espirituais),
Hadot diz: “no diálogo socrático, a verdadeira questão que está em jogo não é aquilo
que se fala, mas aquele que fala”. (HADOT, 2014, p. 36).
Por conta da importância do Texto Básico (ou Livro Azul) de NA para a vida dos
que fazem parte do grupo, citaremos à íntegra a definição proposta pelo próprio grupo,
que afirma:
1
Comparemos, por exemplo, o que está descrito no texto básico de Alcoólicos Anônimos: “Não somos
santos. O importante é que desejamos crescer espiritualmente. Os princípios acima descritos (isto é, Os
Doze Passos) são guias para o progresso. Nossa meta é o progresso espiritual, e não a perfeição moral.”
Extraído de O texto básico para Alcoólicos Anônimos, Brasil, 2017, p. 89.
Passada esta definição validada e autorizada pela irmandade, o grupo de NA2, a
história de NA se dá, especificamente a partir de Alcoólicos Anônimos, este por sua vez
tem sua origem dentro de um movimento religioso chamado Grupo de Oxford, que se
organizava na cidade de Akron (EUA) e prescrevia comportamentos de moral elevada a
fim de transformar alcoolistas em seres humanos de verdade (A.A., 1987). O Grupo
Oxford foi iniciado pelo ministro luterano Frank Buchman (1889) entre os anos de
1916-1920 e os comportamentos propostos pelo grupo se assentavam numa ética rígida,
onde seus membros eram exortados a: “sinceridad absoluta, pureza absoluta, amor
absoluto, y falta absoluta de egoismo. Estos conceptos se empleaban como unidades de
medida del progreso individual (A.A., 1987, p. 06). Isto é, a sinceridade irrestrita, a
pureza, o amor e a total falta de egoísmo eram condições indispensáveis para
desenvolver o progresso individual.
Nos anos 30, o Grupo Oxford atraiu muitos alcoólicos e alguns conseguiam se
manter sóbrios, um desses alcoolistas fora Bill Wilson que, compartilhando sua
experiência com outro alcoolista, dr. Robert Smith, fundou em 1935 (Nova Iorque), o
Alcoólicos Anônimos (A.A., 1987).
A história de NA, derivada como vimos de AA, dá-se no início dos anos 50 na
cidade de Los Angeles (EUA). Um dos seus principais fundadores, Jimmy Kinnon
(1911-1985), frequentava reuniões de AA e viu a necessidade de partilhar o uso de
outras substâncias além do álcool mantendo a abordagem dos Doze Passos.
LIVRETO BRANCO. Narcóticos Anônimos (1990). Van Nuys, World Service Office.