O filme Afterimage, do diretor polonês Andrzej Wajda, retrata um artista e
professor que se encontra em um regime ditatorial, ao se expressar contra o regime ele é “exilado”, impedido de trabalhar, dar aulas, fazer parte da união de artistas, de comprar materiais de pintura e comida, toda arte moderna, incluindo suas obras, é removida, destruída e censurada por não expressar os ideais totalitários. Em alguns momentos o protagonista da obra, Wladyslaw Strzeminski, defende a liberdade de criar fora do realismo, Strzeminski considera a arte moderna superior ao mesmo, além de acreditar que há uma fronteira entre a arte e a política. Entretanto, apesar da arte de Strzeminski não expressar ideais políticos, não é possível separá-la deles pois ela está expressa nesse contexto, no seminário Relações do Conhecimento em Dois Artistas Cientistas: (II) Cildo Meireles, a socióloga Maria Arminda do Nascimento Arruda cita que a arte não é uma mera expressão da vida social e não é instituída por ela, porém ela institui, ela atua no mundo, toda arte é política de alguma forma. Sendo assim, a luta pela defesa da arte do protagonista já a torna política, mesmo que a arte em si não se encaixe no realismo e não tenha intenção de comunicar ideais. A arte não tem obrigação de atender a nenhuma forma ou pensamento, ela nem mesmo precisa ser bonita, mas ela sempre comunica algo, como disse Marcel Duchamp no texto o ato criador “[…a arte pode ser ruim, boa ou indiferente, mas, seja qual for o adjetivo empregado, devemos chamá-la de arte, é arte ruim, ainda assim, é arte, da mesma forma que a emoção ruim é ainda emoção. ” Ademais, o julgamento da “qualidade” da arte e seu significado são também resultados da interpretação do público, o denominado ato criador é uma junção das expressões do artista, intencionais ou não, e do entendimento do público. Voltando ao filme de Wajda, é importante ressaltar que a retaliação sofrida pelo protagonista era sobretudo uma forma de torná-lo invisível, de apagar sua arte da história, apesar de impedido se se alimentar, o principal foco da punição era atacar seu intelecto, pouco importava para o regime que o artista estivesse morto, mas era necessário que ele fosse esquecido, que seus posicionamentos não influenciassem seus alunos ou a sociedade soviética, por isso há um esforço tão grande em preservar seus trabalhos por parte de seus amigos e alunos. Durante o filme é notável que a preocupação está voltada majoritariamente para essas obras e não para o artista, claro que em vários momentos Strzeminski recebe ajuda, mas ao decorrer da trama é perceptível que o foco fica cada vez mais em seu trabalho, um antigo amigo se oferece para esconder suas telas, mas não para lhe conseguir um emprego, obviamente temendo punições, mas já sabendo que mais nada seria capaz de salvá-lo. No fim, o destino de Wladyslaw Strzeminski é como a de sua ex esposa, que morreu em um leito de hospital sem que ao menos os telespectadores pudessem a conhecer ou ver seu rosto, apenas seu trabalho é apresentado através de esculturas guardadas por sua filha, além dessa filha, a arte é a única coisa que restará de ambos. Fazendo um paralelo com o documentário A Caverna dos Sonhos Esquecidos do diretor Werner Herzog, a arte é uma maneira de materializar o ato de contar uma história, é também uma linguagem e uma forma de comunicação, as pinturas presentes nas paredes da Caverna de Chauvet, objeto de estudo do documentário, dizem bastante sobre o passado, visitá-las é como visitar um museu. O local era utilizado pelos seres humanos pré-históricos para pinturas e cerimônias, mas eles não viviam na caverna, ou seja, já existia uma noção de museificação antes mesmo da invenção dos museus, a caverna se tratava apenas de um local de visita, de registro de imagens, principalmente de animais, pois eles faziam parte da vivência desses seres humanos. Portanto, é possível afirmar que há uma contínua existência dos museus através do tempo, apesar das transformações do mundo e da sociedade, pois a vontade de contar histórias ou preservar parte delas é intrínseca ao homem. Além disso, a arte segue em conformidade a esse fato, pois suas mudanças e adaptações acompanham o curso da história e projetam um futuro.