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DISTÚRBIOS DA AQUISIÇÃO DA com a professora e problemas de


LINGUAGEM comportamento (podem ser agressivas ou
sofrerem “bullyng” na escola).
Por isso, o diagnóstico e a intervenção precoce
nos atrasos de fala e de linguagem são tão
importantes. O que hoje pode ser um atraso na
fala, futuramente poderá resultar em uma
dificuldade escolar com consequências
emocionais e comportamentais.
O Fonoaudiólogo deve estar sempre atento às
queixas de atraso no desenvolvimento da fala
e da linguagem. Além do trabalho com os
aspectos da linguagem oral, também é
É muito comum, crianças que apresentam necessário acompanhar as habilidades de
atraso ou alteração no desenvolvimento da fala leitura, escrita e de adaptação escolar.
e da linguagem apresentarem Fique atento! Se você acha que seu filho tem
consequentemente, problemas futuros de um atraso na fala, não deixe de procurar um
aprendizagem. Fonoaudiólogo Especialista, para que no
Crianças com problemas de aprendizagem em futuro, a aprendizagem escolar, também não
decorrência de alterações de linguagem, fique comprometida!
apresentam dificuldades que comprometem o Grande parte das queixas relatadas na clínica
seu desempenho em situação em sala de aula. pediátrica, neurológica, neuropsicológica e
Alteração no desenvolvimento da fala e da fonoaudiológica infantil refere-se a alterações
linguagem pode ocasionar déficits linguístico- no processo de aprendizagem e/ou atraso na
cognitivos, o que leva à criança ao fracasso aquisição da linguagem.
escolar. Acredita-se que as dificuldades de
Crianças com distúrbios no desenvolvimento aprendizagem estejam intimamente
da fala e da linguagem podem apresentar fala relacionadas a história prévia de atraso na
ininteligível (troca de sons na fala), aquisição da linguagem. As dificuldades de
dificuldades na elaboração de frases, linguagem referem-se a alterações no processo
dificuldades na elaboração oral (dificuldade de desenvolvimento da expressão e recepção
para relatar fatos, histórias), podem apresentar verbal e/ou escrita. Por isso, a necessidade de
um vocabulário pobre, déficits de memória, identificação precoce dessas alterações no
etc. Estas dificuldades na oralidade podem curso normal do desenvolvimento evita
prejudicar o desenvolvimento das habilidades posteriores consequências educacionais e
de leitura e escrita, caracterizadas por sociais desfavoráveis.
processamento mais lento das informações, O objetivo deste estudo é instrumentalizar os
dificuldades de alfabetização (não profissionais da saúde, em especial o pediatra,
compreendem a relação letra-som), para que possam agir no diagnóstico e na
dificuldade de compreensão, dificuldade de prevenção primária dos distúrbios de
acesso ao léxico (pobre conhecimento linguagem oral e escrita. Para tornar a leitura
semântico), dificuldade em aprender o mais didática, enfocamos inicialmente o
alfabeto, lembrar-se que canções, números, processo normal de desenvolvimento da
nome das cores, dias da semana. linguagem, as causas neurobiológicas e
Crianças com fracasso escolar também podem ambientais dessas alterações, tentando
apresentar problemas emocionais (baixa auto- relacioná-las com suas implicações nas
estima, insegurança), desmotivação (muitas diversas fases do desenvolvimento. Ao final
podem até chorar, dizendo que não querem ir à
escola), prejuízo na interação com os colegas e
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de cada tópico, descreve-se uma breve linguagem. Ainda antes de nascer, elas iniciam
abordagem terapêutica. a aprendizagem dos sons da sua língua nativa
e desde os primeiros meses distinguem-na de
1. LINGUAGEM línguas estrangeiras.
No desenvolvimento da linguagem, duas fases
distintas podem ser reconhecidas: a pré-
linguística, em que são vocalizados apenas
fonemas (sem palavras) e que persiste até aos
11-12 meses; e, logo a seguir, a fase
linguística, quando a criança começa a falar
palavras isoladas com compreensão.
Posteriormente, a criança progride na escalada
de complexidade da expressão. Este processo
A linguagem é um exemplo de função cortical é contínuo e ocorre de forma ordenada e
superior, e seu desenvolvimento se sustenta, sequencial, com sobreposição considerável
por um lado, em uma estrutura anátomo entre as diferentes etapas deste
funcional geneticamente determinada e, por desenvolvimento (Tabela 1).
outro, em um estímulo verbal que depende do
ambiente.
Serve de veículo para a comunicação, ou seja,
constitui um instrumento social usado em
interações visando à comunicação. Desta
forma, deve ser considerada mais como uma
força dinâmica ou processo do que como um
produto. Pode ser definida como um sistema
convencional de símbolos arbitrários que são
combinados de modo sistemático e orientado
para armazenar e trocar informações.

1.1.Desenvolvimento da Linguagem

Muito antes de começar a falar, a criança está


habilitada a usar o olhar, a expressão facial e o
gesto para comunicar-se com os outros. Tem
também capacidade para discriminar
precocemente os sons da fala. A aprendizagem
do código linguístico se baseia no
conhecimento adquirido em relação a objetos,
ações, locais, propriedades, etc. Resulta da
interação complexa entre as capacidades
biológicas inatas e a estimulação ambiental e
evolui de acordo com a progressão do
desenvolvimento neuropsicomotor.
Apesar de não estar completamente
esclarecido o grau de eficácia com que a
linguagem é adquirida, sabe-se que as crianças
de diferentes culturas parecem seguir o mesmo
percurso global de desenvolvimento da
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O processo de aquisição da linguagem envolve múltiplos sons que ocorrem simultaneamente,
o desenvolvimento de quatro sistemas em várias frequências e com rápidas transições
interdependentes: o pragmático, que se refere entre estas. O ouvido tem de sintonizar este
ao uso comunicativo da linguagem num sinal auditivo complexo, decodificá-lo e
contexto social; o fonológico, envolvendo a transformá-lo em impulsos elétricos, os quais
percepção e a produção de sons para formar são conduzidos por células nervosas à área
palavras; o semântico, respeitando as palavras auditiva do córtex cerebral, no lobo temporal.
e seu significado; e o gramatical, O logo, então, reprocessa os impulsos,
compreendendo as regras sintáticas e transmite-os às áreas da linguagem e
morfológicas para combinar palavras em provavelmente armazena a versão do sinal
frases compreensíveis. Os sistemas fonológico acústico por um certo período de tempo2.
e gramatical conferem à linguagem a sua A área de Wernicke, situada no lobo temporal,
forma. O sistema pragmático descreve o modo reconhece o padrão de sinais auditivos e
como a linguagem deve ser adaptada a interpreta-os até obter conceitos ou
situações sociais específicas, transmitindo pensamentos, ativando um grupo distinto de
emoções e enfatizando significados. neurônios para diferentes sinais. Ao mesmo
A intenção de comunicar-se pode ser tempo, são ativados neurônios na porção
demonstrada de forma não-verbal através da inferior do lobo temporal, os quais formam
expressão facial, sinais, e também quando a uma imagem do que se ouviu, e outros no lobo
criança começa a responder, esperar pela vez, parietal, que armazenam conceitos
questionar e argumentar. Essa competência relacionados. De acordo com este modelo, a
comunicativa reflete a noção de que o rede neuronal envolvida forma uma complexa
conhecimento da adequação da linguagem a central de processamento.
determinada situação e a aprendizagem das Para verbalizar um pensamento, acontece o
regras sociais de comunicação é tão inverso. Inicialmente, é ativada uma
importante quanto o conhecimento semântico representação interna do assunto, que é
e gramatical. canalizada para a área de Broca, na porção
inferior do lobo frontal, e convertida nos
2. BASES BIOLÓGICAS DA padrões de ativação neuronal necessários à
LINGUAGEM produção da fala. Também estão envolvidas na
linguagem áreas de controle motor e as
responsáveis pela memória7.
O cérebro é um órgão dinâmico que se adapta
constantemente a novas informações. Como
resultado, as áreas envolvidas na linguagem de
um adulto podem não ser as mesmas
envolvidas na criança, e é possível que
algumas zonas do cérebro sejam usadas apenas
durante o período de desenvolvimento da
linguagem8.
Acredita-se que o hemisfério esquerdo seja
dominante para a linguagem em cerca de 90%
da população; contudo, o hemisfério direito
participa do processamento, principalmente
nos aspectos da pragmática.
O processo da linguagem é bastante complexo
e envolve uma rede de neurônios distribuída
entre diferentes regiões cerebrais. Em contato
com os sons do ambiente, a fala engloba
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A fala caracteriza-se habitualmente quanto à
3. ETIOLOGIA DOS DISTÚRBIOS articulação, ressonância, voz, fluência/ritmo e
DA LINGUAGEM ORAL E prosódia. As alterações da linguagem situam-
ESCRITA se entre os mais frequentes problemas do
desenvolvimento, atingindo 3 a 15% das
crianças, e podem ser classificadas em atraso,
dissociação e desvio (Tabela 2).

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A etiologia das dificuldades de linguagem e condições desfavoráveis (retardo mental,
aprendizagem é diversa e pode envolver distúrbio emocional, problemas sensório-
fatores orgânicos, intelectuais/cognitivos e motores) ou, ainda, ser acentuadas por
emocionais (estrutura familiar relacional), influências externas, como, por exemplo,
ocorrendo, na maioria das vezes, uma inter- diferenças culturais, instrução insuficiente ou
relação entre todos esses fatores. Sabe-se que inapropriada. (Tabela 3).
as dificuldades de aprendizagem também
podem ocorrer em concomitância com outras

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4. LINGUAGEM E EPILEPSIA 5. LINGUAGEM E AUTISMO

A regressão da linguagem é observada na


síndrome de Landau-Kleffner e na regressão
Os efeitos da epilepsia, das crises convulsivas autística. Recentes estudos focados na
e das descargas eletroencefalográficas sobre a linguagem verbal de crianças com espectro
linguagem têm sido discutidos em diversos autista enfatizam traços anômalos da fala,
estudos. Pode-se dizer que três são os como a escolha de palavras pouco usuais,
distúrbios mais relatados em pacientes inversão pronominal, ecolalia, discurso
epilépticos: as disfasias do desenvolvimento incoerente, crianças não-responsivas a
associadas a epilepsia; as afasias críticas questionamentos, prosódia aberrante e falta de
(agudas), onde ocorre uma alteração transitória comunicação. Muitos estudos atribuem a
da função cognitiva; e a afasia epiléptica ausência de fala em alguns indivíduos ao grau
adquirida (síndrome de Landau-Kleffner). A de severidade do autismo, à tendência a
afasia epiléptica adquirida é caracterizada pela retardo mental ou a uma inabilidade de
deteriorização da linguagem na infância decodificação auditiva da linguagem. No
associada a crises ou atividade autismo, a compreensão e a pragmática estão
eletroencefalográfica epileptiforme anormal. invariavelmente afetadas, e os achados
Esse tipo de afasia muitas vezes é confundido incluem prosódia aberrante, ecolalia imediata
com síndrome autística ou deficiência e/ou tardia e perseveração (persistência
auditiva. Além da deteriorização da linguagem inapropriada no mesmo tema). Outros
e da agnosia auditiva, observam-se alterações sintomas estão também presentes, distinguindo
de comportamento, incluindo traços autistas. essas crianças daquelas com apenas atraso de
Por isso, devemos estar atentos a qualquer linguagem; esses sintomas incluem,
criança que apresente regressão de linguagem, particularmente, perturbações da comunicação
devendo esta ser avaliada cuidadosamente não-verbal, comportamentos estereotipados e
(para que seja feito um diagnóstico perseverantes, interesses restritos e/ou inusuais
diferencial) e encaminhada para o tratamento e alteração das capacidades sociais.
adequado. Concluímos, com isso, que a regressão de
linguagem na infância se caracteriza por um
distúrbio grave, com morbidades significativas
a longo prazo.

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6. INTERVENÇÃO NA CRIANÇA Todas as atividades de estimulação dentro da
COM DISTÚRBIO DA terapia fonoaudiológica infantil devem ser
LINGUAGEM realizadas de forma lúdica, através de jogos e
brincadeiras, para que a criança sinta prazer
nas técnicas propostas. Também é
recomendável envolver a família e, quando
necessário, a escola.
A estimulação através de canto, conversa,
brincadeiras e leitura propicia a aquisição de
habilidades que favorecem o desenvolvimento.
Para que comece a ocorrer um processo de
comunicação, a criança deverá se sentir
motivada. Deverá existir o que se chama de
intenção comunicativa (através da fala serão
conseguidos objetos de interesse da criança).
Este aspecto surge através do contato diário
com as pessoas e da estimulação que essa
interação propicia. Também devemos
A produção da fala e linguagem pode ser considerar a importância da amamentação
considerada adequada ou não de acordo com a materna, alimentação com textura e
idade cronológica. Para avaliá-la, é necessário consistência adequadas nas diferentes fases e a
levar em conta os aspectos cognitivos e não-existência de hábito de sucção de dedo ou
emocionais do desenvolvimento, que poderão chupeta além dos 2 anos. Todos esses fatores
indicar ou não a severidade do caso, bem contribuem para uma musculatura orofacial
como a necessidade de orientação adequada à produção da fala. A família tem
especializada à família e/ou terapia papel fundamental na estimulação da
fonaudiológica. Sabe-se que a estimulação linguagem, e cabe ao médico e/ou terapeuta
precoce da linguagem pode prevenir distúrbios envolvê-la ou permitir envolver-se pela
de aprendizagem, dislexia e problemas de família.
desenvolvimento. Pesquisas vêm
demonstrando a importância dos 3 primeiros 7. APRENDIZAGEM
anos de vida no desenvolvimento do cérebro
humano.
São princípios básicos da intervenção na
criança a avaliação do desenvolvimento da
linguagem em todos os seus níveis, a
orientação à família e escola e a terapia
propriamente dita. Esta pode ser dividida em
terapia da fala (onde serão abordados objetivos
como desvios fonéticos e fonológicos), terapia
de voz (disfonias), terapia de motricidade oral
(distúrbios de alimentação, respiração e
mobilidade de órgãos fonoarticulatórios), Do ponto de vista do construtivismo,
terapia de linguagem oral (onde o enfoque aprendizagem é construção, ação e tomada de
pode estar centrado na expressão e/ou consciência da coordenação das ações. O
recepção de linguagem) e terapia de aluno irá construir seu conhecimento através
linguagem escrita (dislexias, disortografias e de uma história individual já percorrida, tendo
disgrafias). uma estrutura, ou com base em condições
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prévias de todo o aprender, além de ser 9. BASES NEUROBIOLÓGICAS
exposto ao conteúdo necessário para seu
aprendizado.
Em relação ao aprendizado específico da
leitura e da escrita, este está vinculado a um
conjunto de fatores que adota como princípios
o domínio da linguagem e a capacidade de
simbolização, devendo haver condições
internas e externas necessárias ao seu
desenvolvimento.

8. DESENVOLVIMENTO NORMAL

O processo de aquisição da linguagem escrita,


assim como o da linguagem oral, envolve
diversas regiões cerebrais, entre elas a área
parieto-occipital. Na região occipital, o córtex
visual primário é o responsável pelo
processamento dos símbolos gráficos, e as
áreas do lobo parietal são responsáveis pelas
questões vísuo-espaciais da grafia. Essas
informações processadas são reconhecidas e
decodificadas na área de Wernicke,
responsável pela compreensão da linguagem, e
a expressão da linguagem escrita necessita da
A habilidade de leitura é verificada através da ativação do córtex motor primário e da área de
capacidade de decodificação, fluência e Broca. Para todo este processo ocorrer, é
compreensão da escrita. O processo normal de importante que as fibras de associação intra-
leitura ocorre em duas etapas. Inicialmente, é hemisféricas estejam intactas.
realizada a análise visual, através do Em uma pesquisa, observou-se ativação
processamento vísuo-perceptivo do estímulo cerebral de pessoas normais durante a leitura
gráfico. Em seguida, ocorre o processamento de pseudopalavras nas seguintes regiões:
linguístico da leitura, onde, através da via não- região frontal inferior esquerda; região
lexical, é feita a conversão grafema-fonema e, parietotemporal, envolvendo os giros angular,
pela via lexical, é feita a leitura global da supramarginal e a porção posterior de giro
palavra com acesso ao significado. A criança temporal superior; e regiões
tem que descobrir que há letras que não occipitotemporais, envolvendo porções
representam o som da fala, visto que "a leitura mesiais e inferiores do giro temporal e giro
alfabética associa um componente auditivo occipital. O mesmo estudo foi realizado em
fonêmico a um componente visual gráfico, o disléxicos, sendo constatado um aumento de
que é denominado de correspondência ativação no giro frontal inferior e pouca
grafofonêmica". É necessária a ativação em regiões posteriores.
conscientização da estrutura fonêmica da Pesquisadores relatam que, em relação aos
linguagem (decomposição das palavras) e das mecanismos neurológicos das dificuldades de
unidades auditivas que são representadas por leitura, alterações referentes à assimetria
diferentes grafemas. hemisférica geram uma organização atípica do
hemisfério direito em crianças e adolescentes
com dislexia.
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Disléxicos apresentam uma desconexão
temporo-parieto-occipital e uma desconexão
com o córtex frontal esquerdo, assim como
anormalidades do córtex têmporo-parietal e do
cerebelo em relação a outras regiões do
cérebro.

10. DIFICULDADES DE
APRENDIZAGEM DA
LINGUAGEM ESCRITA NA A leitura e a escrita envolvem habilidades
INFÂNCIA cognitivas complexas, além de capacidade de
reflexão sobre a linguagem no que se refere
aos aspectos fonológicos, sintáticos,
semânticos e pragmáticos.
As crianças, ao iniciar a alfabetização, já
dominam a linguagem oral, sendo capazes de
iniciar o aprendizado da escrita. Porém, sabe-
se que existem regras mais específicas e
próprias da escrita, havendo, então, maiores
dificuldades no seu aprendizado.
Dificuldades de aprendizagem referem-se a No Brasil, cerca de 40% das crianças em
alterações no processo de desenvolvimento do séries iniciais de alfabetização apresentam
aprendizado da leitura, escrita e raciocínio dificuldades escolares, e, em países mais
lógico-matemático, podendo estar associadas a desenvolvidos, a porcentagem diminui 20%
comprometimento da linguagem oral. em relação ao número total de crianças
Ao se estudar alterações no processo de também em séries iniciais. Sabe-se que se um
aprendizagem da linguagem oral, aluno com dificuldades de aprendizagem for
frequentemente verifica-se a ocorrência de bem conduzido pelos profissionais de saúde e
posteriores dificuldades de aprendizagem da educação, em conjunto com a família, poderá
leitura e escrita. Da mesma forma, ao se obter êxito nos resultados escolares.
investigar os fatores que antecedem as É importante ressaltar que existe uma
dificuldades de leitura e escrita, surgem combinação dos fenômenos biológicos e
questionamentos a respeito das dificuldades de ambientais no aprendizado da linguagem
aprendizado da linguagem. Ressalta-se que, escrita, envolvendo a integridade motora, a
entre as alterações de linguagem oral integridade sensório-perceptual e a integridade
existentes na infância, são as dificuldades socioemocional (possibilidades reais que o
fonológicas, e não as articulatórias, que podem meio oferece em termos de quantidade,
ocasionar prejuízos no aprendizado posterior qualidade e frequência de estímulos). Além
da leitura e da escrita. disso, o domínio da linguagem e a capacidade
de simbolização também são princípios
10.1. Dislexia importantes no desenvolvimento do
aprendizado da leitura e da escrita.
Sendo considerada uma alteração de
aprendizagem, a dislexia caracteriza-se por
dificuldades específicas na realização da
leitura e da escrita, havendo, de maneira geral,
dois tipos de dislexia: a dislexia de
desenvolvimento e a dislexia adquirida. A
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primeira refere-se a alterações no aprendizado
da leitura e escrita com origem institucional,
ou seja, ambiental, referente à forma de
aprendizado escolar. Nesses casos, ocorre
diminuição da capacidade de leitura associada
a disfunção cerebral, havendo uma alteração
específica na aquisição das habilidades de
leitura e consequente dificuldade no
aprendizado da leitura. Existem autores que
consideram fatores genéticos como uma das
causas de dislexia de desenvolvimento. Já na
dislexia adquirida, o aprendizado da leitura e
da escrita, que foi adquirido normalmente, é
perdido como resultado de uma lesão cerebral.
Vários são os fatores ainda em estudo que
descrevem as causas da dislexia de
desenvolvimento - entre eles, déficits
cognitivos, fatores neurológicos
(neuroanatômicos e neurofisiológicos),
prematuridade e baixo peso ao nascimento,
influências genéticas e ambientais. Sabe-se,
porém, que fatores externos (ambientais) não
podem ser separados de problemas
neurológicos, visto que aspectos tais como
instrução inadequada, distúrbios emocionais e
pobreza de estímulos na infância podem
causar diferenças no desenvolvimento
neurológico e cognitivo que precedem
dificuldades severas de leitura.
As dislexias podem ser divididas em dois
tipos: central e periférica (Tabela 4). Na
primeira, ocorre o comprometimento do
processamento linguístico dos estímulos, ou
seja, alterações no processo de conversão da
ortografia para fonologia. Na segunda, ocorre
o comprometimento do sistema de análise
vísuo-perceptiva para leitura, havendo
prejuízos na compreensão do material lido.

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Entre as dislexias centrais, ressaltam-se a 10.2. Dislexia e distúrbio da
fonológica, a de superfície e a profunda; já as atenção/hiperatividade
dislexias periféricas incluem a dislexia
atencional, a por negligência e a literal (pura).
Em relação às dislexias de desenvolvimento,
as mais comuns são a dislexia fonológica e a
de superfície, já mencionadas anteriormente, e
a dislexia semântica. Esta se caracteriza pela
preservação da leitura em voz alta, sem erros
de decodificação (fonema-grafema), porém
com pobreza na compreensão da escrita.
Várias pesquisas vêm fornecendo evidências A grande maioria das crianças com déficit de
de déficits fonológicos em dislexias de atenção/hiperatividade apresenta dificuldades
desenvolvimento. No entanto, recentes estudos escolares, podendo haver a concomitância
demonstraram a existência de múltiplos dessas alterações com dislexia do
déficits de processamento temporal nas desenvolvimento.
dislexias. De fato, disléxicos mostram Realizou-se um estudo comparando grupos de
anormalidades visuais e auditivas que podem crianças com dificuldades de leitura sem
resultar de problemas generalizados na déficit de atenção/hiperatividade, crianças
percepção e na seleção de estímulos. somente com déficit de atenção e
Crianças com dislexia apresentam alterações hiperatividade, crianças com dificuldade de
auditivas e visuais referentes à orientação leitura e déficit de atenção e hiperatividade, e
espacial. Esses achados sugerem que déficits crianças sem nenhum prejuízo. Foram
na atenção da seleção espacial podem investigados aspectos referentes ao
desorganizar o desenvolvimento de processamento auditivo do lobo temporal
representações fonológicas e ortográficas que dessas crianças. Os resultados da pesquisa não
são essenciais para o aprendizado da leitura. indicaram um déficit nas funções temporais
Em uma pesquisa realizada pelo Institute of auditivas em crianças com dificuldades de
Cognitive Neuroscience (Londres), foram leitura, mas sugeriram que a presença de
investigados 16 disléxicos adultos e 16 déficit de atenção e hiperatividade é um fator
controles através de uma bateria de testes significante na performance de crianças com
psicométricos, fonológicos, auditivos, visuais dificuldades de leitura48. Outra pesquisa
e cerebelares. Dados individuais revelaram realizada na Holanda (Department of Special
que todos os disléxicos apresentaram déficits Education, Vrije Universiteit, Amsterdã)
fonológicos, 10 mostraram déficits auditivos, mostrou que os déficit inibitórios em
quatro tinham déficits motores, e dois tinham disléxicos lexicais podem ser atribuídos a
déficits visuais. Esses achados sugerem que disfunções em estruturas cerebrais fronto-
déficits fonológicos podem aparecer na centrais envolvidas em inibições motoras,
ausência de qualquer outra alteração motora sugerindo que possa haver uma associação
ou sensorial e são suficientes para causar um entre dislexia lexical e déficit de
prejuízo significativo, como foi demonstrado atenção/hiperatividade, já que os dois grupos
em cinco dos 16 disléxicos. apresentam disfunção executiva.

10.3. Dislexia e baixo peso ao


nascimento

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relações com a incapacidade de algumas
crianças no processamento do texto. Mais
especificamente, sabe-se que existe um lócus
nos cromossomos 6 e 18 que tem mostrado
fortes e replicáveis efeitos nas habilidades de
leitura.
É importante ressaltar que o progresso no
entendimento do papel da genética na dislexia
pode ajudar a diagnosticar e tratar crianças
suscetíveis a tais dificuldades com maior
efetividade e rapidez.
Em relação às crianças que nascem com baixo
peso, existe uma associação entre a presença Outras alterações da linguagem escrita -
de doença cerebral periventricular e disgrafia e disortografia
baixa performance em testagens de leitura e
habilidades de soletração. Em um estudo
realizado nos Estados Unidos, pesquisadores
buscaram encontrar associações entre
dificuldades de leitura e seus potenciais fatores
de risco em meninos e meninas. Os resultados
indicaram que meninas com baixo peso ao
nascimento apresentam duas vezes mais
probabilidade de desenvolver alterações de
leitura. Salienta-se que existem diferenças na
utilização cortical durante a leitura em
crianças com baixo peso ao nascimento.

10.4. Influências genéticas na Devendo ser analisada através de diferentes


dislexia tarefas (cópia, ditado e escrita espontânea), a
expressão da escrita também pode evidenciar
Sabendo-se que existem alguns indivíduos que alterações como a disgrafia, ou seja, alterações
têm predisposição genética para dificuldades no traçado das letras, e a disortografia, que se
de leitura, as dislexias vêm sendo estudadas refere a alterações ortográficas na escrita das
em função de seus aspectos genéticos. A palavras não esperadas para determinada faixa
leitura está sendo relacionada a cromossomos etária e escolaridade. A disgrafia e a
específicos (6, 1, 2 e 15), apesar de, até
recentemente, não haver evidências de genes
específicos responsáveis pela capacidade ou
incapacidade de leitura.
Achados mais recentes, pesquisados através do
Projeto Genoma Humano, evidenciaram
quatro genes de suscetibilidade à dislexia:
DYX1, DYX2, DYX3 e DYX4. São genes em
diferentes posições, suspeitando-se do caráter
heterogêneo dos transtornos de leitura.
Uma outra pesquisa, que está sendo realizada
pelo neuropsicólogo Frank Wood, da disortografia podem estar associadas ou não às
Universidade de Forest Wake, revela que dislexias.
outros cromossomos (6, 1, 2 e 15) têm
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pelos pais para os filhos, a estimulação de
11. INTERVENÇÕES jogos de rimas, que ajudam na consciência
fonológica, jogos com letras e desenhos, para
São princípios básicos do trabalho em a criança já ir se familiarizando com a escrita,
linguagem escrita com a criança: estimular a leitura de rótulos e propagandas - enfim, nunca
descoberta e utilização da "lógica" de seu se deve obrigar uma criança a ler um livro, e
pensamento na construção de palavras e textos sim fazê-la ter vontade de ler e conhecer a sua
e na representação de fonemas; oferecer história.
oportunidades para a escrita e leitura
espontâneas; explorar constantemente as 12. O QUE SÃO OS TRANSTORNOS
diversas funções da escrita (não apenas DE LINGUAGEM? CAUSAS E
produção textual mas também cartas e TIPOS
bilhetes); e explicitar as diferenças entre
língua falada e língua escrita. É importante
que a criança tenha adequada consciência de
que a fala e a escrita são formas diferentes de
expressão da linguagem.
Conforme visto anteriormente, alterações nos
processos perceptivos da leitura ou nos
processos psicolinguísticos (lexicais, visuais,
fonológicos, sintáticos ou semânticos) podem
acarretar dificuldades de leitura, estando a
elaboração do programa de reabilitação Partindo-se do pressuposto de que a principal
diretamente relacionada com a avaliação dos ferramenta para o ser humano interagir com o
processos deficitários na criança. Em pacientes mundo e formar vínculos é a linguagem,
com dislexia de superfície, geralmente se conclui-se que dificuldades nos campos social
utiliza uma estratégia lexical, e em disléxicos e intelectual podem emergir caso exista algum
fonológicos, a intervenção mais apropriada é a problema no processo de desenvolvimento da
estimulação da conversão grafema-fonema linguagem do indivíduo. Tais dificuldades são
(não-lexical). Salienta-se a importância da identificadas por baixo rendimento acadêmico,
estimulação da consciência fonológica em pré- isolamento social ou retardo no
leitores, visto que muitos estudos demonstram desenvolvimento cognitivo, que por sua vez,
sua eficiência no aprendizado da leitura. acabam sendo responsáveis por prejuízos no
A principal indicação atual para o tratamento desenvolvimento psicológico da criança,
de crianças com dificuldades de linguagem podendo gerar transtornos de conduta ou
escrita é a intervenção direta nas habilidades emocionais significativos. Dessa forma, vários
de leitura, associada a atividades relacionadas casos de Transtornos de Linguagem são
ao processamento fonológico da linguagem. assistidos tanto pelo fonoaudiólogo quanto
Práticas anteriores buscavam estimular pelo psicólogo e/ou outros profissionais.
habilidades consideradas pré-requisitos para o
aprendizado da leitura, como percepção vísuo- 12.1. O que são os Transtornos de
espacial, habilidades psicomotoras, etc. Linguagem?
Todas as atividades de estimulação da
linguagem escrita devem ser realizadas de Entende-se por Transtornos de Linguagem os
forma lúdica, através de jogos e brincadeiras, quadros que apresentam desvios nos padrões
para que a criança sinta prazer em ler e normais de aquisição da linguagem desde suas
escrever. Em casa, o estímulo deve ser etapas iniciais. Entretanto, crianças normais
iniciado com a leitura de histórias infantis variam amplamente na idade na qual elas
iniciam a aquisição da linguagem falada e no
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ritmo no qual as habilidades de linguagem se Os transtornos que interferem na comunicação
tornam firmemente estabelecidas. do indivíduo, podem estar relacionados à fala,
Existem diferentes tipos de Transtornos de à linguagem, à audição ou à voz.
Linguagem, embora seja frequente a presença
de comorbidades, tanto entre si, como entre 12.4. Dislalia
transtornos psicológicos. Sendo assim, muitas
crianças que apresentam atrasos na aquisição Normalmente até os 6 anos de idade, a maioria
da linguagem, possuem dificuldades de leitura dos sons da fala já está adquirida. A dislalia ou
e escrita, e também problemas nos transtorno específico de articulação da fala
relacionamentos interpessoais, que levam corre quando a aquisição dos sons da fala pala
respectivamente, a um rendimento escolar criança está atrasada ou desviada, levando a:
deficiente e a possíveis transtornos da esfera má articulação e consequente dificuldade para
emocional e de comportamento. que os outros a entendam; omissões,
Embora a criança que apresenta algum quadro distorções ou substituições dos sons da fala;
de Transtorno de Linguagem seja capaz de se inconsistência na coocorrência de sons (isto é,
comunicar melhor em situações que lhe sejam a criança pode produzir fonemas corretamente
familiares, o comprometimento da linguagem em algumas posições nas palavras, mas não
existe em qualquer situação. em outras).
A gravidade do distúrbio articulatório varia de
12.2. Quais são as causas? pouco ou nenhum efeito sobre a
inteligibilidade da fala até uma fala
As etiologias das alterações da linguagem e da completamente ininteligível, embora mesmo
fala podem envolver aspectos genéticos, nestes casos, as pessoas da família
degenerativos, lesionais, ambientais e/ou compreendam o que a criança quer expressar.
emocionais. Alguns autores classificam os Existem vários fatores etiológicos, além dos
transtornos com base em dois tipos de fatores aspectos que favorecem indiretamente a
que podem alterar e incidir desfavoravelmente existência e manutenção da alteração, como 3:
na evolução da comunicação e da linguagem: permanência de esquemas de articulação
fatores orgânicos, sejam eles genéticos, infantis; déficit na discriminação auditiva;
neurológicos ou anatômicos e fatores déficit na orientação do ato motor da língua.
emocionais. Entretanto, outros autores Alterações na respiração, inadequação da
consideram que a diferenciação entre os mastigação e deglutição, hábitos orais
transtornos de etiologia orgânica e psicológica inadequados (uso prolongado da chupeta e
pode resultar mais útil no adulto, embora mamadeira, onicofagia e sucção de dedo),
ambos os tipos de fatores devam ser podem causar prejuízos anatômicos e
considerados de forma integrada. Na criança funcionais no sistema orofacial da criança,
essa diferenciação está ultrapassada, já que o alterando os movimentos adequados e
efeito de qualquer fator orgânico ou necessários para a produção correta dos
psicológico tem repercussões sobre o conjunto fonemas.
de processos de ordem psicológica que Diversas classificações são encontradas para o
constituem a aquisição e o desenvolvimento da distúrbio articulatório, entretanto, a
linguagem. classificação abaixo é bastante esclarecedora:
Dislalias fonológicas: os mecanismos de
12.3. Tipos de Transtornos de conceitualização dos sons e as relações entre
Linguagem significantes e significados estão afetados, os
sons não se organizam em sistemas e não
existe uma forma apropriada de usá-los em um
contexto;
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Dislalias fonéticas: determinadas por Não se reconhece uma etiologia única para a
processos fisiológicos, de realização gagueira, e as formas terapêuticas e
articulatória com traços característicos de abordagens de tratamento são variadas,
incoordenação motora e/ou insensibilidade visando em alguns casos uma melhor
orgânica. adaptação social e emocional, passando pelo
Existem alterações articulatórias nos casos de enfrentamento de situações de exposição
disartrias, entretanto estas são ocasionadas por verbal, pela diminuição da ansiedade e o
danos cerebrais. aumento da auto-estima.

12.5. Disfemia 12.6. Afasia

A disfemia é conhecida pela dificuldade em


manter a fluência da expressão verbal, é um
transtorno de fluência da palavra, que se
caracteriza por uma expressão verbal
interrompida em seu ritmo, de maneira mais
ou menos brusca. O tipo mais comum de
disfemia é a gagueira, também chamada de
tartamudez.
A tartamudez se caracteriza pela interrupção
da fluência verbal, por meio de repetições ou
prolongamento dos sons, sílabas ou palavras. As afasias compreendem os transtornos de
Frequentemente, ela vem acompanhada de linguagem causados por uma lesão cerebral,
movimentos corporais, como balançar os ocorrida após a aquisição total da linguagem
braços e as mãos, piscar os olhos ou tremor ou durante seu processo. Existe diferentes tipo
labial, na tentativa de superar o bloqueio da de afasias, porém elas são definidas de acordo
fala. Observa-se que a frequência e a com o local lesionado.
intensidade da gagueira estão associadas ao Independente do local da lesão, a afasia é vista
estado emocional do indivíduo. como um transtorno de linguagem no qual
Muitas crianças apresentam uma disfluência, existe uma perda parcial ou total da
também chamada gagueira fisiológica, entre os capacidade de expressão dos pensamentos por
dois e cinco anos de idade, o que é sinais e da compreensão dos mesmos. Assim,
considerado normal, visto que o entende-se que a afasia é a incapacidade de
desenvolvimento e a aquisição da linguagem compreender a palavra falada, de leitura e
se dão de forma intensa nesse período. A escrita, embora essas últimas se apresentem
criança apresenta uma fala vacilante, em graus variáveis.
repetições de vocábulos, semelhantes ao
gaguejar, mas assim como a disfluência 12.7. Disfonias
aparece, com o desenvolvimento da criança
ela cessa. Recomenda-se não chamar a atenção
da criança a respeito desse comportamento,
nem a corrigir ou completar frases e palavras
por ela. Nessa fase pais e professores
necessitam paciência e a espera para que a
criança possa voltar a falar com ritmo normal.
A procura por um tratamento só deve ser feita
se a disfluência permanecer após essa fase.

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Embora não estejam incluídas nos transtornos No conceito de retardo mental é encontrada
de linguagem, as disfonias implicam as grande variedade de ideias que se estendem
alterações na qualidade da voz ou em sua desde a desenvolvida por Kraepelin e citada
emissão, consequente de distúrbios orgânicos por Weitbrecht (1970), na qual “os débeis
ou funcionais das cordas vocais ou ainda por mentais são pessoas em cujo cérebro não
uma respiração incorreta. A disfonia pode se ocorrem muitas coisas”, até a noção proposta,
apresentar através da rouquidão, soprosidade em 1958, pela Associação Americana de
ou aspereza da voz. Deficiência Mental, que considera que “o
As circunstâncias afetivas, emocionais, os retardamento mental refere-se ao
fatores culturais e estéticos, a idade, o sexo, as funcionamento intelectual era abaixo da
exigências e autovalorização da própria voz média, que se origina durante o período de
são fatores que influem diretamente na desenvolvimento e está associado a prejuízo
avaliação da patologia da vocal. no comportamento adaptativo” (Robinson,
As disfonias podem ser causadas por 1975; OMS, 1985).
alterações orgânicas, desarmonia ou O funcionamento intelectual abaixo da média
incoordenação dos músculos respiratórios, será considerado a partir de um QI padrão de
laríngeos e das cavidades de ressonância, 70/75, avaliado com base em provas
principalmente geradas pelo mau uso ou abuso padronizadas, levando-se em consideração a
vocal. O otorrinolaringologista deve ser o diversidade cultural e linguística, bem como
médico que fará exames clínicos para outros fatores de comportamento definidos
diagnóstico juntamente com o fonoaudiólogo pelo ambiente em que se encontra o indivíduo.
que atuará na reabilitação vocal. Observamos no Retardo Mental, além das
perturbações orgânicas, dificuldades na
13. DIFERENTES PATOLOGIAS E realização de atividades socialmente
INCLUSÃO SOCIAL esperadas, bem como as consequentes
alterações no relacionamento com o mundo.
O processo de habilitação define as
necessidades básicas para os serviços
necessários à implantação do atendimento que
determinará, de certa forma, o prognóstico da
população envolvida. Esses serviços podem
ser esquematizados da seguinte maneira, de
acordo com diversos autores (Comissão
Conjunta em Aspectos Internacionais da
Deficiência Mental, 1981; Krynski, 1985;
OMS, 1985):
A aquisição e o desenvolvimento da A Atenção Primária, através de medidas pré-
linguagem dependem da integridade e do natais, perinatais e pós-natais;
funcionamento normal e adequado de todo o A Atenção Secundária, quando além de
sistema funcional neurológico. exames e tratamentos, também são utilizados
A capacidade que determina a possibilidade de serviços de estimulação;
falar e entender uma língua depende da E a Atenção Terciária, que engloba todos os
passagem de potenciais neuronais por procedimentos multidisciplinares, assim como,
inúmeros circuitos do sistema educação especial, programas
centroencefálico. profissionalizantes e programas residenciais.

13.1. Retardo Mental 13.2. Distúrbios de Linguagem em


Crianças Pequenas
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A análise do chamado desenvolvimento 5. Há que se ter condições favoráveis
normal se faz necessária porque pode nos para a interação: uma situação ou
fornecer elementos para uma melhor contexto.
compreensão dos distúrbios da linguagem e, 6. A criança também necessita ter
consequentemente, possibilitar a elaboração de capacidades cognitivas favoráveis para
um plano terapêutico mais eficaz. atuar sobre o mundo e compreendê-lo.
Falamos em crianças pequenas e em
intervenção precoce. Sabemos que, realmente,
quanto mais cedo os problemas puderem ser
detectados e tratados, maiores serão as
possibilidades de superação dos mesmos.
Porém, infelizmente, temos visto crianças que
só procuram um atendimento fonoaudiológico
quando já estão com 3 ou 4 anos de idade.
Ora, também sabemos que o período esperado
para a aquisição de linguagem vai de 1 a 2
anos de idade. É difícil compreender como,
tendo tais crianças ultrapassadas os 2 anos sem
adquirirem linguagem, chegando aos 3 ou até
mesmo aos 4 anos sem terem desenvolvido as
habilidades linguísticas esperadas, não tenham
sido encaminhadas para um exame ou Temos, assim esboçados, seis importantes
tratamento fonoaudiológico. fatores que, combinados, asseguram ou criam
Muitas crianças, por volta do primeiro condições favoráveis para o desenvolvimento
aniversário, começam a ensaiar suas primeiras de capacidades comunicativas. Como
palavras. Porém, antes de chegarem a esta podemos notar, a comunicação tem, em sua
forma verbal de linguagem, desenvolveram origem, uma função nitidamente social. A
uma série de habilidades comunicativas mais criança, interagindo com as pessoas e com as
gerais num plano pré-linguístico. Para que coisas, organiza experiências, constrói
esse desenvolvimento comunicativo anterior conhecimentos, sente desejos, ou seja, elabora
ao uso das palavras ocorresse e fosse os conteúdos de sua atividade mental e isto
garantindo o aparecimento de formas graças à sua atividade cognitiva. São estes
linguísticas mais evoluídas, algumas conteúdos que irá comunicar, por alguma
condições se fizeram necessárias. razão: porque deseja um objeto que não está
Vamos apontar seis destes fatores ao seu alcance e quer expressar este desejo
determinantes do desenvolvimento da para que possa ter acesso ao objeto; porque
comunicação infantil: quer chamar a atenção para algo que está
1. A criança necessita ter uma razão ou vendo acontecer e quer partilhar com o adulto
motivo para se comunicar: uma ou, ainda, porque quer chamar atenção sobre si
intenção. mesma. Para que tudo isto seja possível, isto é,
2. Há necessidade de se ter algo para a fim de que suas intenções, experiências ou
comunicar: um conteúdo. desejos sejam expressos, a criança necessita
3. É também necessário um meio de lançar mão de alguma forma de comunicação
comunicação: uma forma. que pode ser um meio verbal, ou não-verbal,
4. Há necessidade de se ter pessoas com dependendo de suas possibilidades.
quem se comunicar: um parceiro. A pessoa ou parceiro com quem a criança quer
se comunicar pode ser alguém que está
próximo a ela. Mas não basta simplesmente a
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criança ter uma razão para se comunicar e num mesmo grupo, as crianças divergem entre
tomar a iniciativa. O adulto deve estar si quanto ao grau de dificuldades e extensão
receptivo, atento, tem que estar sensível aos das mesmas. Esta classificação leva em conta
esforços comunicativos que a criança está a existência de dificuldades específicas quanto
fazendo, tem que ser capaz de atribuir à aquisição da linguagem ou dificuldades
significação aos mesmos e isto faz parte das globais de desenvolvimento e se aplica a
condições favoráveis para a interação. crianças que não adquiriram linguagem na
Antes de ser capaz de empregar recursos idade esperada.
linguísticos para a comunicação, a criança
desenvolve meios não-verbais e isto acontece 13.4.1. Grupo I – Retardo de linguagem
gradativamente graças às experiências fazendo parte de atraso global
interativas que vai tendo com os outros. Desde do desenvolvimento
seu nascimento, ela tem oportunidades de Subgrupo A – Crianças apresentando ausência
tomar parte de eventos que possuem um de condutas simbólicas, com comportamentos
caráter comunicativo, que implicam em organizados a nível sensoriomotor.
relações com as pessoas que estão ao seu lado. Subgrupo B – Crianças com atraso global do
Como consequência de tais vivências desenvolvimento e que já apresentam algum
interativas e comunicativas, a criança vai grau de simbolismo em suas condutas que,
adquirindo formas de manifestar seus apesar de presentes, estão defasadas em
conteúdos mentais, assim como também vai relação ao esperado para a idade.
desenvolvendo estratégias para compreender
os desejos e as intenções dos outros. 13.4.2. Grupo II – Retardo simples de
linguagem
13.3. Distúrbios de Linguagem A prática clínica tem demonstrado ser comum
encontrarmos crianças apresentando
A denominação “distúrbios de linguagem” diz dificuldades ou impedimentos mais
respeito a comprometimentos no curso acentuados no que diz respeito à aquisição da
evolutivo da aquisição da linguagem. Os linguagem. O problema configura-se como
distúrbios que mais comumente afetam o mais específico, sendo que outros aspectos do
desenvolvimento da criança pequena são os desenvolvimento estão menos comprometidos,
chamados “retardos de aquisição da ou seja, estão evoluindo dentro dos limites do
linguagem”. Crianças apresentando condições que é considerado normalidade. Este tipo de
evolutivas favoráveis tendem a adquirir problema é encontrado, por exemplo, em
linguagem no decorrer do segundo ano de crianças com deficiência auditiva que, devido
vida, entre 1 e 2 anos de idade. Algumas a um impedimento físico, têm um
crianças já começam a ensaiar as primeiras comprometimento quanto ao domínio da
palavras por volta do primeiro aniversário. linguagem. Porém, tal tipo de problema não
Outras começam mais tarde. está restrito ao deficiente auditivo. Crianças
sem distúrbios da audição podem também
13.4. Classificando os retardos de apresentar tal tipo de defasagem.
linguagem
13.5. Planejando um Trabalho de
A classificação dos retardos de aquisição da Intervenção Fonoaudiológica
linguagem pode ser feita tomando-se como
referência as dificuldades encontradas e sua
abrangência. Podemos dividir os retardos em
dois grandes grupos, sempre considerando
que, embora possam estar sendo classificadas
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capacidades, em sermos capazes de
acompanhar detalhes de seu desenvolvimento.
Apontamos três áreas que atuam como
determinantes do desenvolvimento da
linguagem: cognição, capacidades
comunicativas pré-verbais e habilidades para
interação social.

14. DEFICIÊNCIA AUDITIVA

A pergunta que sempre nos fazemos diz


respeito a como tratar crianças com retardos
de aquisição da linguagem. Porém, como é
possível constatar, não podemos falar de uma
maneira única ou de um procedimento padrão
para trabalhar do ponto de vista
fonoaudiológico. Na realidade, falamos em
retardos de aquisição da linguagem, o que “O que é surdez na realidade”?
implica em configurações diversificadas, com Será um número na escala de decibels que
problemas variando em termos de descreve a severidade da perda auditiva? Será
profundidade e graus de extensão. Isto uma doença como caxumba, sarampo ou
significa que devemos adequar o trabalho meningite? Será um estribo anquilosado? Será
fonoterápico ao perfil de desenvolvimento de um tecido no sistema auditivo que seria
cada criança. considerado anormal se visto sob o
Atuarmos com uma criança que apresenta um microscópio? Será uma enfermidade a ser
atraso global de desenvolvimento e ausência conquistada pelo cientista engenhoso? Será a
de condutas simbólicas pode requerer um tipo pressão de uma criança cujos pais desejam
de trabalho e estimulação distinto da criança persistente e ardentemente que o cientista seja
que esteja apresentando um retardo simples de bem sucedido e logo? Será uma forma especial
linguagem. Uma atividade que pode ser de comunicação? Será algo encontrado
bastante útil e eficiente para uma criança pode ocasionalmente no homem ou mulher, cujos
ser completamente ineficaz ou inútil para a dedos voam e cujos sons emitidos são
outra. Foi por esta razão que este artigo arrítmicos e estridentes? Será uma causa à
começou abordando questões ligadas ao qual professores diligentes, talentosos e
desenvolvimento normal da comunicação e pacientes vêm se dedicando há gerações? Será
suas relações com o desenvolvimento de o sofrimento causado pelo isolamento de uma
capacidades cognitivas e sociais. Precisamos, parte do mundo real? Será a alegria da
antes de mais nada, compreender o tipo de conquista que prejudica o deficiente físico?
retardo que a criança apresenta, quais aspectos Será a mente brilhante e as mãos
de seu desenvolvimento estão mais potencialmente hábeis das quais a economia
prejudicados, quais aspectos estão melhor não faz uso por falta de tê-las cultivado? Será
preservados, assim como em que nível a cristalização de atitudes de um grupo distinto
evolutivo se encontram. cuja surdez, modos de comunicação e outros
Um dos preceitos básicos da intervenção atributos (tais como educação prévia) que eles
terapêutica diz respeito a entrar em sintonia têm em comum e que os leva a se unirem para
com a criança para poder desenvolver nela alcançar auto-realização social e econômica?
habilidades interativas e isto implica em “É claro, surdez é tudo isso e mais,
sermos sensíveis aos seus interesses e
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dependendo de quem faz a pergunta e por 14.5. Deficiência auditiva funcional
que.” (H. DAVIS & R. SILVERMAN) Neste tipo de disfunção auditiva (também
denominada de pseudo-hipoacusia, quando
14.1. Fonoaudiologia Prática simulada), o paciente não apresenta lesões
Classificação orgânicas no aparelho auditivo, quer periférico
As perdas de audição podem ser classificadas ou central. A dificuldade de entender a
segundo a sua localização topográfica audição pode ser de fundo emocional ou
(condutivas, sensorioneurais, mistas, centrais e psíquico, podendo sobrepor-se a alguma lesão
funcionais) ou conforme sua expressão clínica auditiva prévia, apresentando pioras bruscas
(hipoacusia, disacusia, surdez e anacusia). do quadro clínico.

14.2. Deficiência auditiva 14.6. Hipoacusia


condutiva A hipoacusia expressa uma diminuição na
As ondas sonoras não alcançando a orelha sensitividade da audição.
interna de forma adequada, quer por
problemas na orelha externa (meato acústico) 14.7. Disacusia
ou na orelha média (membrana do tímpano, A disacusia expressa um defeito na audição.
cadeia ossicular, janelas redonda ou oval, ou Defeito este que não pode ser expresso em
mesmo a tuba auditiva) determinam uma decibels.
redução da acuidade auditiva, constituindo-se
em deficiências do tipo condutiva. 14.8. Surdez
A palavra surdez tem sido empregada para
14.3. Deficiência auditiva designar qualquer tipo de perda de audição,
sensorioneural parcial ou total. Recentemente, a surdez
Neste tipo de deficiência auditiva, o aparelho adquiriu novo significado. Surdo é um termo
de transmissão do som encontra-se normal, muito forte e depreciativo da condição do
mas há uma alteração na qualidade do som. O indivíduo, daí a tendência atual em utilizar
termo sensorioneural é hoje empregado para “deficiência auditiva” em seu lugar.
substituir “surdez de percepção”. Engloba Concordamos com DAVIS, quando procura
desde lesões sensoriais (orelha interna ou dar à palavra surdez uma definição mais
órgão de Corti) a neurais (lesões desde o nervo precisa.
coclear até os núcleos auditivos no tronco).
Nas deficiências auditivas do tipo 14.9. Reabilitação Aural: a Clínica
sensorioneural há Fonoaudiológica e o Deficiente
É relativamente rara, mal conceituada e Auditivo
definida. Certos pacientes, embora Para melhor compreender a reabilitação aural
supostamente apresentando audição normal, na perspectiva da terapia fonoaudiológica, é
não conseguem entender o que lhes é dito. interessante lembrar de sua origem na
Quanto mais complexa a mensagem sonora, Educação Especial. No passado, na tentativa
maior dificuldade haverá. de organizar procedimentos pedagógicos que
resultassem no aprendizado acadêmico,
14.4. Deficiência auditiva mista religioso ou de outra natureza, alguns
Esta perda auditiva apresenta-se com educadores fizeram propostas que tinham
características diversas das anteriores, pois, como finalidade ultrapassar em alguma
dependendo do predomínio do fator de medida a barreira da ausência ou precariedade
condução ou da gravidade da lesão sensorial, da linguagem oral imposta pela surdez.
apresentará características diferentes. Surgem então os chamados métodos orais,
bem como os gestuais. Convém lembrar que
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essas propostas datam de uma época em que traduz os pressupostos teóricos adotados por
ainda não se contava com a tecnologia para cada profissional na sua prática. Pode até
diagnóstico, nem tampouco com recursos de mesmo se referir a propostas que se limitam a
amplificação do som. discutir procedimentos que visam treinar o
A reabilitação da criança surda esteve sujeito naquilo que está privado pela
tradicionalmente sob a responsabilidade da patologia.
educação especial. Seus objetivos incluem,
além do desenvolvimento acadêmico dos
alunos com deficiência de audição, o
desenvolvimento da linguagem, quer seja oral
ou gestual.
Os avanços do conhecimento na área da
audiologia vão sendo incorporados ao trabalho
terapêutico e vêm corroborar com a
possibilidade de desenvolvimento de
linguagem oral para crianças com perdas de
audição moderadas, em grande parte severas e
mesmo profundas, desde que tenham acesso a
um trabalho terapêutico apropriado a suas
necessidades e possam fazer uso adequado de
aparelho de amplificação sonora. 15. PROCESSO TERAPÊUTICO
Quanto às crianças com pouco aproveitamento
do resíduo auditivo, também é possível 15.1. Diagnóstico
desenvolver um trabalho terapêutico com Em se tratando de crianças muito pequenas, é
enfoque na linguagem oral, principalmente a preciso ter em mente que os limiares
partir do recurso do implante coclear. audiométricos podem não ficar totalmente
Entretanto, deve-se estar constantemente definidos a partir dos primeiros exames
atento às eventuais necessidades de realizados. É de extrema importância que elas
encaminhamento para opções que privilegiem sejam submetidas a avaliações
o uso de sinais. eletrofisiológicas, além dos outros exames que
O critério audiométrico não pode ser usado compõem a bateria de testes audiológicos. A
como indicador do uso da audição residual, observação das mudanças de comportamento
tampouco do desenvolvimento de linguagem. da criança frente ao estímulo sonoro, com e
Não é possível reduzir a criança às sem amplificação, auxilia na identificação dos
características de seu quadro audiológico. A resíduos auditivos presentes. Algumas
época em que a perda de audição foi crianças, cujos resultados da avaliação
adquirida, sua identificação pela família, audiológica inicial apontavam para perdas
características pessoais, familiares e sócio- auditivas profundas, podem surpreender em
culturais são fatores que interagem com o relação ao aproveitamento do resíduo auditivo;
quadro audiológico. quer este funcione apenas como um
Reabilitação Aural é o termo comumente importante vínculo com o ambiente,
utilizado na literatura sobre deficiência de quebrando barreiras para a aproximação da
audição e sugere procedimentos específicos família com a criança; quer possa contribuir
para que os efeitos provocados pela para a detecção de aspectos acústicos da fala,
deficiência de audição sejam minimizados. que vão se constituindo numa fonte de
Esta terminologia não define por si só o informação importante para o
enquadramento, cabendo aí propostas, tanto desenvolvimento da linguagem oral.
pedagógicas quanto clínicas. Também não
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Portanto essa combinação – amplificação e trouxeram grandes esperanças para a
terapia – pode auxiliar no esclarecimento do transformação do surdo num “ouvinte”. Todos
diagnóstico audiológico de uma criança muito se baseavam na necessidade de oralizar o
pequena, ao mesmo tempo em que a relação surdo, não permitindo a utilização de Sinais.
da família com a criança e com a surdez vai se
mostrando ao terapeuta. 15.5. Oralismo puro ou estimulação
auditiva
15.2. Uso da amplificação
Embora o tema seleção de aparelhos não seja Foi desenvolvida na CLARK SCHOOL FOR
assunto deste capítulo, gostaríamos de fazer THE DEAF no final do século XIX. Para seus
algumas considerações a respeito de sua adeptos, a criança surda deve ser exposta à
adaptação, uma vez que acreditamos que tal língua falada e aos sons, sempre usar aparelho
processo esteja extremamente relacionado à de amplificação sonora, se possível, e sofrer
atitude da família frente à criança e frente à treinamento auditivo. O trabalho começa com
surdez. Quanto à escolha do aparelho de o treinamento de atenção para a leitura
amplificação sonora, esta deve se basear em orofacial e inclui elementos sonoros isolados,
todos os dados provenientes dos exames combinações de sons, palavras e finalmente a
realizados, da história e de observações dos fala, devendo ter continuidade em casa,
comportamentos apresentados diante das através do envolvimento de toda a família.
experiências com amplificação.
15.6. Método
15.3. História e Educação: o Surdo, multissensorial/unidade silábica
a Oralidade e o Uso de Sinais
É realizado de forma semelhante ao anterior,
acrescentando-se a leitura e a escrita das
formas ortográficas da língua. São utilizadas
outras pistas além da audição como: visão e
tato. Este é o sistema mais amplamente usado
numa abordagem oral. Método de linguagem
por associação de elementos ou método da
“língua natural”. Foi desenvolvido por
MILDRED GROHT (LEXINGTON
A educação do surdo só pode ser
SCHOOL FOR THE DEAF IN NEW YORK)
compreendida a partir de uma perspectiva
e baseia-se no pressuposto de que a criança
mais ampla que abranja a sua história e que
deve aprender a falar através da atividade.
mostre quais as fundamentações teóricas,
Desta forma tudo que é feito deve ser cercado
filosóficas, políticas e ideológicas que a
de linguagem, o professor fala sem parar e as
embasaram desde o seu início.
crianças são encorajadas a fazer perguntas
através da fala. É realizado igualmente
15.4. Oralismo
treinamento de leitura orofacial e de fala.
No decorrer do século XX, o oralismo adotou
15.7. Método unissensorial ou
novas técnicas. O desenvolvimento da
abordagem aural
tecnologia eletroacústica (com aparelhos de
amplificação sonora individual e coletivo, para
Também conhecido como abordagem
um melhor aproveitamento dos restos
acupédica, refere-se a um programa de
auditivos), das investigações na reabilitação da
reabilitação para a criança surda. Este envolve
afasia e dos trabalhos na clínica foniátrica
a família e enfatiza o treinamento auditivo sem
(SÁNCHEZ, 1990), foram de grande ajuda e
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nenhum ensino formal de leitura orofacial ordem dos vocábulos do português oral, ou
(POLLACK, 1970). Esta abordagem depende seja, sujeito-verbo-complemento.
de diagnóstico, orientação familiar, indicação Exemplos – PEGAR CIGARRO COLOCAR
e adaptação de amplificação sonora individual (boca) ACENDER FUMAR
o mais cedo possível, assim como exposição Um aspecto que chamou a atenção e que de
total à estimulação de linguagem normal. certa forma interfere na sintaxe, diz respeito ao
uso simultâneo das duas mãos, sendo que cada
15.8. Comunicação total uma para produzir um sinal, o que parece dar
uma ideia de continuidade e concomitância.
Na década de 60, a insatisfação com os ...A repetição de sinais também foi observada,
resultados do trabalho de reabilitação dos dando a ideia, não de repetição, mas de
surdos numa linha oralista era muito grande manutenção de um estado de coisas. Exemplos
nos EUA. Novos conhecimentos teóricos e a – FUMAR FUMAR FUMAR (interpretado
realização de pesquisas levaram a questionar o como continuar fumando ou fumar sem parar)
trabalho feito até aquele momento, pois este ou COMER COMER COMER (interpretado
não levava ao desenvolvimento esperado de como comer sem parar).” Verifica-se que esta
fala, leitura orofacial, desenvolvimento de forma diferente de organização da Língua de
linguagem e habilidades de leitura. Sinais, implica na não-possibilidade de
acompanhamento dos Sinais pela fala, como é
15.9. Língua de sinais e bilinguismo feito nos sistemas bimodais. Os estudos
realizados sobre a Língua de Sinais elevaram-
A pesquisa de STOKOE sobre Língua de na ao status de uma língua que foi reconhecida
Sinais foi seguida por muitas outras que em diversos países.
analisaram a sua gramática, morfologia e Ainda que no Brasil isto ainda não tenha
sintaxe. Como já assinalamos anteriormente, a acontecido, aparecem os primeiros
Língua de Sinais é estruturada de forma movimentos neste sentido. Estes estudos, além
diferente da língua oral, por ser transmitida de uma modificação da postura frente aos
por um canal visual. PEREIRA (1993) escreve direitos das minorias, que aconteceu
que, segundo KLIMA e BELLUGI, as Línguas principalmente nos EUA, mas também em
de Sinais: “...apresentam características outros países da Europa, tiveram e continuam
diferentes das línguas orais, resultantes da tendo até hoje grande influência nos caminhos
diferença de canal de transmissão- da educação dos surdos. Os surdos, enquanto
gestual/visual em oposição ao canal oral/aural minoria, passaram a exigir o reconhecimento
das línguas orais. A principal diferença é que, da Língua de Sinais como válida e passível de
nas línguas orais, os vocábulos são utilização em sua educação, a reivindicar o
organizados sequencialmente – como uma direito de ter reconhecida sua cultura, que é
sequência linear de elementos sonoros – diferente da dos ouvintes, e a transmissão
enquanto que nas línguas de sinais os desta cultura às crianças surdas.
elementos são organizados como uma
combinação de componentes que ocorrem 15.10. Papel do Fonoaudiólogo
simultaneamente.” Podemos citar alguns
exemplos da forma que a Língua de Sinais é Com relação ao trabalho fonoaudiológico com
organizada na LIBRAS (Língua Brasileira de indivíduos surdos com a utilização de Sinais
Sinais). PEREIRA (op. cit., 1993), num estudo ou Língua de Sinais, existem formas diferentes
sobre a sintaxe desta língua, declara que: “...é de atuação, referenciadas pela formação e
possível afirmar ...que a ordem dos sinais compreensão que estes profissionais têm do
segue, na maior parte das vezes, a mesma surdo e do seu papel. Vamos tentar fazer uma
divisão, no que compete ao fonoaudiólogo na
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abordagem Bimodal e no Bilinguismo, ainda É a afasia de compreensão mais grave,
que existam sobreposições entre elas. definida por um conjunto de características
Em suma, os caminhos da educação dos bastante específicas. A compreensão oral
surdos, os obstáculos que lhes foram impostos encontra-se gravemente comprometida. A
na manutenção da sua comunidade, da sua expressão é marcada por discurso fluente e
língua e da sua cultura. Desde o início desta abundante, fala logorréica e jargonafásica e
história os princípios filosóficos, políticos, pela grande presença de neologismos. A fala
sociais, ideológicos e os interesses pessoais apresenta curva melódica/entonação normais e
regeram os rumos desta educação e o destino o sujeito fala sem considerar o interlocutor. A
dos surdos. Estamos atualmente em outro associação com anosognosia é bastante
momento, com os mesmos princípios atuando, frequente. A compreensão gráfica pode estar
ainda que de forma diferente. Enquanto tão comprometida quanto à compreensão oral
profissionais que trabalham com surdos, temos ou pode estar um pouco melhor. Há
que estar conscientes da presença destes possibilidade de redução na expressão gráfica,
determinantes e escolher uma forma de sendo que o ditado está sempre muito alterado
atuação que esteja de acordo com o que e pior do que a cópia.
acreditamos. As nossas crenças são
determinadas por princípios sociais que estão 16.2. Afasia global
acima de nós, mas somos livres para escolher
aqueles que nos fazem sentido e através deles É a afasia mais grave, caracterizada por
delimitarmos nossa conduta enquanto comprometimento severo da emissão e da
profissionais. compreensão oral e gráfica. Geralmente, o
paciente apresenta mutismo na emissão oral ou
16. AFASIA DE BROCA ela está restrita a estereotipias e automatismos.
Há supressão da emissão gráfica. Existe uma
É a afasia de expressão mais comumente variedade de formas clínicas; quando a
encontrada. Caracteriza-se por ser do tipo não- compreensão melhora muito, mas não chega a
fluente, sendo que a expressão oral pode estar ficar tão boa quanto à esperada para uma
comprometida em diversos graus. Na fase afasia de Broca, temos a afasia motora mista.
aguda, o paciente pode apresentar supressão No entanto, muitos dos casos evoluem para
de fala e de escrita ou estereotipia. As uma afasia de Broca.
estereotipias são frequentes e podem se
manter; podemos ainda encontrar parafasias 16.3. Prognóstico
fonéticas e/ou fonêmicas, redução e
agramatismo. A anomia pode estar presente, A maioria dos pacientes afásicos mostra uma
mas aparece geralmente no discurso. A melhora espontânea nos meses subsequentes à
compreensão está preservada ou levemente lesão. O período de recuperação espontânea
comprometida, podendo o paciente apresentar aparece de forma variada na literatura, mas a
dificuldades em compreender frases maioria dos autores reconhece este período
complexas, textos e elementos gramaticais. A entre os 3 e os 6 primeiros meses. Uma das
escrita também pode evoluir da fase aguda questões que sempre esteve presente quando
com redução, agramatismo e paragrafias. A se tratou da reabilitação da afasia é o quanto
compreensão da escrita pode estar mais esta recuperação pode ser influenciada de
alterada do que a compreensão oral. modo positivo pela terapia fonoaudiológica.
BASSO (1993) realizou uma revisão da
16.1. Afasia de Wernicke literatura sobre os fatores de prognóstico
relativos à recuperação, os efeitos do
tratamento e os padrões de recuperação em
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grupos de pacientes e em pacientes aprendizagem certamente irão contribuir para
considerados individualmente. Em seu estudo, uma melhoria na abordagem terapêutica
considerou apenas as variáveis experimentais, desses pacientes. A sistemática da
uma vez que existem muitos fatores que investigação em busca do diagnóstico preciso
interferem no prognóstico do paciente, mas pode direcionar o profissional de saúde na
que não são quantificáveis, como ocorre com a escolha do melhor tratamento indicado para
motivação, por exemplo, que é um fator cada caso.
importantíssimo quando se fala em
reabilitação, mas que não pode ser
considerado cientificamente. Assim, a autora
dividiu essas variáveis em dois grupos, a
saber: fatores individuais como a idade, o sexo
e a preferência manual; e fatores neurológicos
como a etiologia, localização e tamanho da
lesão, a severidade e o tipo da afasia. O “efeito
da terapia” foi considerado separadamente. A
autora concluiu que os fatores individuais têm
um pequeno papel na recuperação das afasias,
sendo mais relevantes à gravidade inicial do
problema, que está relacionada à extensão e à
localização da lesão, e a reabilitação. A terapia
não modifica o perfil da recuperação
espontânea, mas a torna possível em um
número de pacientes que não apresentaria
nenhuma melhora e ainda acelera a
recuperação espontânea dos pacientes em
acompanhamento.

16.4. Terapia

A preocupação em se criar métodos de


reabilitação para o paciente cérebro-lesado
ocupou lugar preponderante a partir da década
de 40. Uma revisão das metodologias usadas
na terapia das afasias permite observar
diferentes pressupostos teóricos que explicam
o problema e se propõe a “solucioná-lo”.

17. CONCLUSÃO

Sabe-se que as causas de alterações de


linguagem e de dificuldades de aprendizagem
podem ser variadas, apesar de existirem
muitos estudos indicando fatores neurológicos
para tais problemas. Avanços na compreensão
da neurobiologia dos processos de
desenvolvimento da linguagem e
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AVALIAÇÃO DE DISTÚRBIOS DE
AQUISIÇÃO DE LINGUAGEM 4. Acredita-se que o hemisfério esquerdo
seja dominante para a linguagem em
1. É um exemplo de função cortical cerca de ____________da população;
superior, e seu desenvolvimento se contudo, o hemisfério direito participa
sustenta, por um lado, em uma do processamento, principalmente nos
estrutura anátomo funcional aspectos da pragmática:
geneticamente determinada e, por a) 95%
outro, em um estímulo verbal que b) 70%
depende do ambiente: c) 90%
a) Escrita d) 80%
b) Audição
c) Tato 5. Existe um diferença significativa entre
d) Linguagem evolução da linguagem e das outras
áreas do desenvolvimento:
2. No desenvolvimento da linguagem, a) Atraso
duas fases distintas podem ser b) Desvio
reconhecidas: a c) Dissociação
_________________________, em d) Deficiência
que são vocalizados apenas fonemas
(sem palavras) e que persiste até aos 6. Fatores de risco sociais e emocionais:
11-12 meses; e, logo a seguir, a fase a) Causa ambiental
________________________quando a b) Autismo
criança começa a falar palavras c) Déficit cognitivo
isoladas com compreensão. d) Déficit auditivo
a) Pré-linguística e lingüística
b) Pré operatório e operatório 7. Pesquisas vêm demonstrando a
c) Oral e oral dominante importância dos __________ primeiros
d) Oral e lingüística anos de vida no desenvolvimento do
cérebro humano.
3. A área de _____________________, a) 2
situada no lobo temporal, reconhece o b) 3
padrão de sinais auditivos e interpreta- c) 5
os até obter conceitos ou pensamentos, d) 6
ativando um grupo distinto de
neurônios para diferentes sinais. Ao 8. O processo de aquisição da linguagem
mesmo tempo, são ativados neurônios escrita, assim como o da linguagem
na porção inferior do lobo temporal, os oral, envolve diversas regiões
quais formam uma imagem do que se cerebrais, entre elas a área parieto-
ouviu, e outros no lobo parietal, que occipital. Na região_______________,
armazenam conceitos relacionados. De o córtex visual primário é o
acordo com este modelo, a rede responsável pelo processamento dos
neuronal envolvida forma uma símbolos gráficos, e as áreas do lobo
complexa central de processamento. parietal são responsáveis pelas
a) Broca questões vísuo-espaciais da grafia.
b) Wernicke a) Lobo temporal
c) Lobo temporal b) Occipital
d) Hemisfério esquerdo c) Wernicke
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d) Broca

9. É conhecida pela dificuldade em


manter a fluência da expressão verbal,
é um transtorno de fluência da palavra,
que se caracterizapor uma expressão
verbal interrompida em seu ritmo, de
maneira mais ou menos brusca. O tipo
mais comum é a gagueira, também
chamada de tartamudez:
a) Dislexia
b) Disfonias
c) Disfemia
d) Afasias

10. Caracteriza-se por ser do tipo não-


fluente, sendo que a expressão oral
pode estar comprometida em diversos
graus. Na fase aguda, o paciente pode
apresentar supressão de fala e de
escrita ou estereotipia. As estereotipias
são frequentes e podem se manter;
podemos ainda encontrar parafasias
fonéticas e/ou fonêmicas, redução e
agramatismo:
a) Afasia de Wernicke
b) Afasia de Broca
c) Afasia global
d) Afasia da linguagem

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