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CURSO DE CAPACITAÇÃO EM PSICANÁLISE

Disciplina:

Três Ensaios Sobre a Teoria da Sexualidade

Sigmund Freud

PROFESSORA: KARLA RIBEIRO

São Gonçalo, RJ –
Brasil Junho - 2023
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A Obra: Três Ensaios Sobre a Teoria da Sexualidade foi publicado por Freud em 1905, sendo
o texto onde o conceito de sexualidade é mais trabalhado. Ele sofre alterações até 1925. Esta
obra é considerada a segunda mais importante de Freud, depois de A Interpretação dos
Sonhos (1900), das 23 produzidas ao londo de sua carreira.

Freud, diante de todo um contexto cultural e social em sua época, desafia valores e conceitos
nesse livro. Indo contra a opinião popular e os preconceitos vigentes sobre a sexualidade.
Assim, ele estendeu a noção de sexualidade para além dos limites em que era mantida por
sua definição convencional; ele pontua em sua obra , que a sexualidade não inicia somente na
puberdade, mas na infância e que ela segue um desenvolvimento em fases sucessivas até
culminar na sexualidade adulta. Freud também estabelece uma ponte entre as formas
anormais de sexualidade e a sexualidade dita normal.

A obra em questão é dividida em três partes. Vejamos:


1ª dedicada às perversões - aberrações
sexuais; 2ª vinculada à sexualidade infantil;
3ª sobre a puberdade. Freud não trabalha específicamente a pulsão nessa obra, mas inicia
importantes refllexões no campo do instinto e pulsão. Questões relacionadas à transição do
trauma para fantasia, bem como sobre o Complexo de Édipo perpassam e embasam as
reflexões sobre os três ensaios.

Observe a cronologia da obra:

- Em 1905 já tem a importância da sexualidade infantil, a ideia de pulsões parciais,


zonas erógenas e as perversões;

- Em 1908 começa a aparecer os primeiros conceitos da ideia de fases da libido e como


essas fases vão sendo colocadas sucessivamente no desenvolvimento da sexualidade;

- Em 1908 entra a fase anal com um texto a parte dos 3 Ensaios chamado Caráter e
erotismo anal;

- Em 1910 ele introduz o Complexo de Édipo. Primeiro está alocado na puberdade e


depois vai regredindo até chegar na fase fálica. Aqui ainda não se tinha a ideia de fase fálica;

- Em 1913 descreve definitivamente o conceito de uma fase anal com o texto. A


predisposição a neurose obsessiva (não está incluído dentro dos 3 ensaios);

- Em 1915 é o começo da fase oral;

- Em 1923 ele elabora o conceito de fase fálica e genital.


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Pulsão para Freud

É o representante psíquico dos estímulos que se originam dentro do organismo e


alcançam a mente.
Componentes da pulsão

A fonte
É corporal, endógena;

Uma excitação somática que ocorre num órgão


ou parte do corpo;

Esta excitação é representada na vida mental


A pressão por uma ideia e por um afeto;

Caráter ativo da pulsão, exigência de trabalho,


fator dinâmico;
O objetivo Elemento motor que impele o organismo para
a ação específica responsável pela
eliminação da tensão;

É sempre a satisfação, definida como a


redução da tensão provocada pela pressão. A
satisfação é obtida pela descarga de energia
acumulada;

O objeto
A coisa (real/fantasmática) por meio
da qual a pulsão é capaz de atingir
seu objetivo. O que há de mais
variável numa pulsão;

Quando Freud fala em Instinto (Instinkt), ele se refere ao comportamento animal, hereditário,
característico da espécie. Já o termo Pulsão (Trieb) coloca em evidência impulsão. Segundo
Freud, uma pulsão tem a sua fonte numa excitação corporal (estado de tensão); o seu objetivo
ou meta é suprimir o estado de tensão que reina na fonte pulsional; é no objeto ou graças a
ele que a pulsão pode atingir sua meta. Processo dinâmico que consiste numa pressão ou
força (carga energética) que faz o indivíduo tender para um objetivo.

Pulsão é um dos conceitos fundamentais em Psicanálise que expressa a especificidade da


visão freudiana sobre o sujeito humano. É um conceito limite entre o psíquico e o orgânico;
Segundo Freud é um impulso traduzido em desejo. O corte epistemológico freudiano
transforma (no sentido de ultrapassar uma forma) o corpo biológico em corpo erógeno. Onde
era instinto (puramente biológico) surge a pulsão (no limite biopsíquico). O instinto é sempre
inscrito em um determinismo que antecede o indivíduo, e da espécie. A pulsão dialetiza
sujeito e ambiente, constituição e experiência subjetiva. A necessidade, no humano não existe
simplesmente. Ela tem sempre um resto, um “para além” que é da ordem do prazer (Eros).
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Esta é a diferença fundamental entre instinto e pulsão.


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Freud apresenta as pulsões com dualidade. O primeiro dualismo encontrado,segundo
ele, é o das Pulsões Sexuais e das Pulsões do Ego ou de autoconservação.Ao longo do
tempo esses conceitos foram se modificando e se classificando entre Pulsão de Vida (Eros)
e Pulsão de Morte (Thanatos).

- Pulsões de Vida se classificam como uma grande categoria de pulsões que Freud se
utiliza para contrapor, em sua última teoria, às Pulsões de Morte. Eros é a pulsão libidinal,
que motiva o indivíduo a vida. Engloba todos os impulsos e comportamentos que motivam a
nossa sobrevivência sem abrir mão do prazer e contribuindo para a sensação de bem-estar.

- Pulsões de Morte voltadas inicialmente para o interior e tendendo à autodestruição,


seriam secundariamente voltadas para o exterior, manifestando-se então sob a forma de
pulsão de agressão ou de destruição. A pulsão de morte, a qual Freud se refere, é a morte
simbólica, a morte social; uma pulsão que leva o indivíduo à loucura, ao suicídio, ou seja,
uma morte simbólica ou material perante a sociedade.

Segundo Freud, o indivíduo possui latente dentro de si a pulsão de vida e a pulsão de


morte.

A pulsão de vida faz com que o indivíduo sinta necessidade de satisfazer suas vontades, de
buscar o prazer e de satisfazer a libido, mas, para o indivíduo que vive em sociedade, sua
libido se concretiza através do instinto organizado. O instinto organizado, por sua vez, é a
consciência social implantada no indivíduo para viver coletivamente (ou seja, a ação do Ego
sobre o Id, conforme a 2ª tópica Freudiana*). O ego procura substituir o princípio de
prazer que reina sem restrições no Id pelo princípio de realidade.

Princípio do prazer — Toda a atividade psíquica tem por objetivo, proporcionar prazer e
evitar desprazer. O prazer está ligado à redução das quantidades de excitação e o
desprazer está relacionado ao aumento da excitação. O organismo tende sempre à
descarga das pulsões instintivas, regido pelo princípio do prazer.

Princípio da realidade — é uma forma de adaptação do ego ao princípio do prazer - "é ao


ego que cabe resolver se a tentativa de satisfação deve ser efetuada ou afastada ou se a
reivindicação do impulso não deve ser reprimida como sendo perigosa (princípio da
realidade) (...)." No que concerne à realidade externa, que nem sempre é favorável, o
princípio da realidade impõe-se como princípio regulador. A procura desatisfação já não é
mais imediata, já não se efetua pelo caminho mais curto, mas pelos desvios, adiando seus
resultados em função da realidade exterior. Exemplo, sublimação.
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Além disso, Freud identifica quatro características da Pulsão:
1) a força constante (pressão), o motor da atividade psíquica;
2) a meta (finalidade), sua satisfação;
3) o objeto, meio pelo qual atinge a meta (o mais variado possível);
4) a fonte, sempre de origem somática.

A pressão: caráter ativo da pulsão, exigência de trabalho, fator dinâmico. Elemento motor
que impele o organismo para a ação específica responsável pela eliminação da tensão.

A meta/objetivo: é sempre a satisfação, definida como a redução da tensão provocada pela


pressão. A satisfação é obtida pela descarga de energia acumulada

A fonte: é corporal, endógena. Uma excitação somática que ocorre num órgão ou parte do
corpo. Esta excitação é representada na vida mental por uma ideia e por um afeto.

O objeto: a coisa (real/fantasmática) por meio da qual a pulsão é capaz de atingir seu
objetivo. o que há de mais variável numa pulsão.

PRIMEIRO ENSAIO - AS ABERRAÇÕES SEXUAIS (PERVERSÃO)

Neste ensaio, Freud critica os pré-conceitos populares e contesta a opinião dominante entre
os cientistas da época segundo a qual as perversões, resultam de uma degenerescência ou
são uma tara constitutiva. Considera que as perversões decorrem de um componente
adquirido da sexualidade humana, não sendo um componente inato ou constitutivo. Freud
propõe buscar a origem das perversões na infância, isto é, no desesenvolvimento
psicossexual. É inclusive muito questionado por afirmar que a perversão é a sexualidade da
criança.

Mas não a perversão como pensamos no senso comum: refere-se ao prazer que a criança
tinha no seu próprio corpo, fase autoerótica, que é perverso porque não visa a reprodução,
como o prazer na amamentação, o prazer de controlar as fezes, ou seja, o prazer nas
diversas zonas erógenas como a boca, ânus, a pele e etc.

Perverso é tudo aquilo que foge da norma – a norma seria o sexo para reprodução –
então a sexualidade infantil é perversa pois não visa a reprodução.

Aqui cabe elucidar que o conceito de sexualidade para Freud também diverge do senso
comum. Muitos autores criticaram a Freud por essa questão da sexualidade, mas ele não
planejou focar na sexualidade, mas no consultório Freud observou que as pessoas sempre
falavam e se remetiam às questões da sexualidade no sentido amplo. Como por exemplo a
escolha dos objetos de um paciente (escolha do sujeito A ou B). Freud entendia isso como
uma questão da sexualidade. Freud pensava a sexualidade como um todo. Ele nota que os
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sintomas dos seus pacientes estavam sempre ligados a sexualidade (de ordem psíquica).
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Freud fala no terceiro prefácio do livro, que o seu conceito de sexualidade tem relação com o
conceito platônico de amor, Eros, ou seja, que não tem nada a ver com questões como a
impotência, frigidez, etc. Mas fala dos relacionamentos dentro das questões psíquicas e
emocionais, dos conflitos, das faltas, dos sintomas e etc. Para Freud o normal tem a ver com
a genética e a reprodução e tudo que fica de fora dessa sexualidade é perversa. Até o olhar
de um casal um pelo outro, o beijo, o toque, fazem parte de uma preliminar que vai levar ao
ato sexual, a sexualidade dita normal.
A noção de apoio da PULSÃO

A pulsão sexual se satisfaz por "apoio" na pulsão de autoconservação;


O termo apoio designa precisamente essa relação primitiva da sexualidade com uma
função ligada à conservação da vida;
Em termos instintivos, a função de sucção tem por finalidade a obtenção do alimento
satisfazendo o estado de necessidade orgânica caracterizado pela fome.
Em termos pulsionais, a excitação dos lábios/língua pelo peito, produzindo uma
satisfação que não se reduz à saciedade alimentar;
Quando o seio é abandonado, e tanto o objetivo quanto o objeto ganham autonomia
em relação à alimentação, se constitui o protótipo da sexualidade oral para Freud: o
chupar o dedo;
Tem início, então, o autoerotismo. Os lábios da criança comportam-se como uma zona
erógena;
A necessidade de repetir a satisfação sexual desliga-se da necessidade de nutrir-se;

A fome é para a pulsão de nutrição como a libido para a pulsão sexual. Objeto (outro sexo) e
finalidade (reprodução) - objeto sexual a pessoa de quem provém a atração sexual - alvo
sexual a ação para a qual a pulsão impele. Perversões: desvios em ambos, o objeto sexual
e o alvo sexual.

As perversões são de 2 tipos:

Desvios sexuais em relação ao objeto (pessoa pela qual emana uma atração sexual):
autoerotismo, pedofilia, gerontofilia, incesto, homossexualidade, zoofilia, fetichismo,
necrofilia, travestismo, etc.

Desvios sexuais em relação à meta (objetivo sexual - ato que leva à pulsão): voyeurismo,
exibicionismo, violação, sadismo, masoquismo, dom-juanismo etc.
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AS PULSÕES PARCIAIS
Freud aborda em seguida a questão dos "desvios em relação à meta (objetivo) sexual“:
nas perversões a pulsão sexual se mantém desintegrada em vários componentes chamados
de "pulsões parciais", enquanto na sexualidade normal as pulsões parciais se reúnem e se
colocam a serviço da maturidade genital. As perversões se baseiam, então, na dominação
de uma pulsão parcial de origem infantil.Constituem fixações em metas sexuais preliminares.

A PREDISPOSIÇÃO PERVERSA POLIMORFA

A descoberta do papel precoce desempenhado pelas zonas erógenas* levou Freud a


considerar que existe na criança o que ele chama de uma "predisposição perversa
polimorfa". A expressão destaca a grande diversidade de zonas erógenas suscetíveis de
serem despertadas precocemente à excitação sexual. A existência de uma predisposição
perversa polimorfa na criança pequena permitiu a Freud explicar o fato de que toda
perversão no adulto resulta da persistência de um componente parcial da sexualidade
infantil.

PERVERSÃO E NORMALIDADE
Freud chegou a duas conclusões que chocaram particularmente o público:

⮚ A neurose é por assim dizer o negativo da perversão. Metáfora tirada da fotografia que

significa que o que é agido pelos perversos através de seus comportamentos sexuais
aberrantes, os neuróticos imaginam em suas fantasias e em seus sonhos.

⮚ Conclui que a predisposição às perversões não é um traço excepcional, mas que

pertence integralmente à constituição dita normal.

AS INVERSÕES (HOMOSSEXUALIDADE)
Há homens cujo objeto sexual não é a mulher, mas o homem, e mulheres para quem não o
homem, e sim a mulher, representa o objeto sexual. Diz-se dessas pessoas que são “de
sexo contrário”, ou melhor, “invertidas”, e chama-se o fato de inversão.

Tipos de “invertidos”:
a) absolutos (homossexuais);
b) bissexuali
dade c )
ocasionais.
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Particularmente interessantes são os casos em que a libido se altera no sentido da inversão
depois de se ter uma experiência penosa com o objeto sexual normal.
No que se refere às inversões (homossexualidade), Freud se pergunta: Quais são os fatores
que levam a escolha de objeto homossexual ou heterossexual?
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Freud resolve a questão recorrendo à bissexualidade, predisposição universal de todo ser
humano.

Freud foi o primeiro a aplicar essa noção ao nível psicológico, postulando que tendências
masculinas e tendências femininas coexistem desde a infância em todo indivíduo, de forma
que a escolha de objeto definitivo depende da predominância de uma tendência em relação
a outra. “Era sugestivo transpor essa concepção para o campo psíquico e explicar a
inversão em todas as suas variedades como a expressão de um hermafroditismo psíquico.”

É bem sabido que em todos os períodos houve, como ainda há, pessoas
que podem tomar como objetos sexuais membros de seu próprio sexo, bem
como do sexo oposto, sem que uma das inclinaçõesinterfira na outra.
Chamamos tais pessoas de bissexuais e aceitamos sua existência sem
sentir muita surpresa sobre elas. Viemos a saber, contudo, que todo ser
humano é bissexual nesse sentido e que sua libido se distribui, quer de
maneira manifesta, quer de maneira latente,por objetos de ambos os sexos.
Mas ficamos impressionados pelo ponto seguinte. Ao passo que na primeira
classe de pessoas as duastendências prosseguem juntas sem se chocarem,
na segunda classe,mais numerosa, elas se encontram num estado de
conflito irreconciliável. A heterossexualidade de um homem não se
conformará com nenhuma homossexualidade e vice-versa. Se a primeira é
a mais forte, ela obtém êxito em manter a segunda latente e em afastá-la,
pela força, da satisfação na realidade. Por outro lado, não existe maior
perigo para a função heterossexual de um homem do que o de ser
perturbada por sua homossexualidade latente. (Análise Terminável e
Interminável,1937)

CONCEPÇÃO DA INVERSÃO PELA SOCIEDADE


A degeneração (homossexualidade) ocorre:
1) Se houver uma conjugação de muitos desvios graves em relação à norma;
2) Se a capacidade de funcionamento e de sobrevivência parecer em geral gravemente
prejudicada.

Freud crítica essa percepção, pois vários fatores permitem ver que os invertidos não são
degenerados nesse sentido legítimo da palavra: Encontra-se a inversão em pessoas que
não exibem nenhum outro desvio grave da norma; do mesmo modo, encontramo-la em
pessoas cuja eficiência não está prejudicada e que inclusive se destacam por um
desenvolvimento intelectual e uma cultura ética particularmente elevados.

Inata ou Adquirida? Segundo Freud a alternativa inata/adquirida é incompleta, ou então não


abarca todas as situações presentes na inversão.
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ALVO SEXUAL DOS INVERTIDOS

De modo algum se pode chamar de uniforme a meta sexual dos invertidos Nos homens, a
relação sexual “per anum” não coincide em absoluto com a inversão; a masturbação é com
igual frequência seu alvo exclusivo, a ponto de ser um mero extravasamento da emoção –
são aqui ainda mais comuns do que no amor heterossexual. Também entre as mulheres
invertidas são múltiplos os alvos sexuais,parecendo privilegiado entre elas o contato com a
mucosa bucal.

DESVIOS COM RESPEITO AO ALVO SEXUAL - Considera-se como alvo sexual normal a
união dos genitais no ato designado como coito, que leva à descarga da tensão sexual e à
extinção temporária da pulsão sexual (uma satisfação análoga à saciação da fome).

ANlMAlS E PESSOAS SEXUALMENTE IMATURAS COMO OBJETOS SEXUAIS


Pedofilia e Zoofilia - Indivíduos talvez bastante válidos em outros aspectos - A causa não é a
loucura.

USO SEXUAL DA MUCOSA DOS LÁBIOS E DA BOCA (SEXO ORAL) - O uso da


boca como órgão sexual é considerado como perversão quando os lábios e/ou língua de
uma pessoa entram em contato com a genitália de outra, mas não quando ambas colocam
em contato a mucosa labial. Nesta exceção reside o ponto de ligação com o normal.

SUBSTITUIÇÃO IMPRÓPRIA DO OBJETO SEXUAL – FETICHISMO - Fator da


supervalorização sexual, da qual dependem esses fenômenos ligados ao abandono do alvo
sexual. - Pés - Cabelos - Roupas - Comparou-se esse substituto, não injustificadamente,
com o fetiche em que o selvagem vê seu deus incorporado. Nenhuma outra variação da
pulsão sexual nas raias do patológico merece tanto o nosso interesse quanto essa, dada a
singularidade dos fenômenos a que dá lugar. O caso só se torna patológico quando o
anseio pelo fetiche se fixa, indo além da condição mencionada, e se coloca no lugar
do alvo sexual normal, e ainda, quando o fetiche se torna o único objeto sexual. São
essas as condições gerais para que meras variações da pulsão sexual se transformem em
aberrações patológicas. Na escolha do fetiche manifesta-se a influência persistente de uma
impressão sexual recebida, na maioria das vezes, na primeira infância, o que se pode
comparar com a proverbial persistência do primeiro amor Em outros casos, o que leva à
substituição do objeto pelo fetiche é uma conexão simbólica de pensamentos que, na
maioria das vezes, não é consciente para a pessoa.
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Provavelmente a nenhum indivíduo humano do sexo masculino é poupado o
susto da castração à vista de um órgão genital feminino. Por que algumas
pessoas se tornam homossexuais em consequência dessa impressão, ao
passo que outras a desviam pela criação de um fetiche, e a grande maioria
a supera, francamente não somos capazes de explicar. É possível que,
entre todos os fatores em ação, ainda não conheçamos os decisivos para os
raros resultados patológicos. (FREUD, sobre Fetichismo, 1927)

FIXAÇÕES DE ALVOS SEXUAIS PROVISÓRIOS O TOCAR E O OLHAR - Uma certa


dose de uso do tato, ao menos para os seres humanos, é indispensável para que se atinja o
alvo sexual normal. Sabe-se também, universalmente, que fonte de prazer, por um lado, e
que afluxo de excitação renovada, por outro, são proporcionados pelas sensações de
contato com a pele do objeto sexual. Portanto, demorar-se no tocar, desde que o ato sexual
seja levado adiante, dificilmente pode contar entre as perversões. O mesmo se dá com o
ver, que em última análise deriva do tocar. A progressiva ocultação do corpo advinda com a
civilização mantém desperta a curiosidade sexual, que ambiciona completar o objeto sexual
através da revelação das partes ocultas, mas que pode ser desviada (“sublimada”) para a
arte, caso se consiga afastar o interesse dos genitais e voltá-lo para a forma do corpo como
um todo. A demora nesse alvo sexual intermediário do olhar carregado de sexo surge, em
certa medida, na maioria das pessoas normais, e de fato lhes dá a possibilidade de
orientarem uma parcela de sua libido para alvos artísticos mais elevados.

FIXAÇÕES DE ALVOS SEXUAIS PROVISÓRIOS - Por outro lado, o prazer de ver


[escopofilia] transforma-se em perversão:
a) Quando se restringe exclusivamente à genitália;
b) Quando se liga à superação do asco (o voyeur – espectador das funçõesexcretórias)
c) Quando suplanta o alvo sexual normal, em vez de ser preparatório a ele. Este último
é marcantemente o caso dos exibicionistas, que, se posso deduzí-lo após diversas análises,
exibem seus genitais para conseguir ver, em contrapartida, a genitália do outro.

SADISMO E MASOQUISMO - A inclinação a infligir dor ao objeto sexual, bem como sua
contrapartida, que são as mais frequentes e significativas de todas as perversões, foram
denominadas por Krafft-Ebing, em formas ativa e passiva, de “sadismo” (ativo)e
“masoquismo” (passivo).

O sadismo, suas raízes são fáceis de apontar nas pessoas normais. A sexualidade
damaioria dos varões exibe uma mescla de agressão, de inclinação a subjugar, cuja
importância biológica talvez resida na necessidade de vencer a resistência do objeto sexual
de outra maneira que não mediante o ato de cortejar. Assim, o sadismo

corresponderia a um componente agressivo autonomizado e exagerado da pulsão sexual,


movido por deslocamento para o lugar preponderante. Quando é exclusivo para a
satisfação, é frequente poder se reconhecer que o masoquismo não é outra coisa senão
uma continuação do sadismo que se volta contra a própria pessoa, que com isso assume,
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para começar, o lugar
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do objeto sexual. O sadismo e o masoquismo ocupam entre as perversões um lugar
especial, já que o contraste entre atividade e passividade que jaz em sua base pertence às
características universais da vida sexual.

CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE AS PERVERSÕES


Em nenhuma pessoa sadia falta algum acréscimo ao alvo sexual normal que se possa
chamar de perverso, e essa universalidade basta, por si só, para mostrar quão imprópria é a
utilização reprobatória da palavra perversão. Quando a perversão não se apresenta ao lado
do alvo e do objeto sexuais normais, nos casos em que a situação é propícia a promovê-la e
há circunstâncias desfavoráveis impedindo a normalidade, mas antes suplanta e substitui o
normal em todas as circunstâncias, ou seja, quando há nela as características de
exclusividade e fixação, então nos vemos autorizados, na maioria das vezes, a julgá-la como
um sintoma patológico.

DUAS CONCLUSÕES
1) A pulsão sexual tem de lutar contra certas forças anímicas que funcionam como
resistências, destacando-se entre elas com máxima clareza a vergonha e o asco.
2) A própria pulsão sexual não seja uma coisa simples, mas reúna componentes que
voltam a separar-se nas perversões. A clínica nos alertaria, portanto, para a existência de
fusões que perderiam sua expressão como tais na conduta normal uniforme.

A PULSÃO SEXUAL NOS NEURÓTICOS


Os sintomas são a atividade sexual dos doentes. O caráter histérico permite identificar um
grau de recalcamento sexual que ultrapassa a medida normal; uma intensificaçãoda
resistência à pulsão sexual (que já ficamos conhecendo como vergonha, asco e moralidade);
e uma fuga como que instintiva a qualquer ocupação do intelecto com o problema do sexo. A
enigmática contradição da histeria, registrando a presença desse par de opostos: uma
necessidade sexual desmedida e uma excessiva renúncia ao sexual. O ensejo para o
adoecimento apresenta-se à pessoa de disposição histérica quando, em consequência de
sua própria maturação progressiva ou das circunstâncias externas de sua vida, as
exigências reais do sexo tornam- se algo sério para ela. Entre a premência da pulsão e o
antagonismo da renúncia ao sexual situa- se a saída para a doença, que não soluciona o
conflito, mas procura escapar a ele pela transformação das aspirações libidinosas em
sintomas.
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PULSÕES PARCIAIS E ZONAS ERÓGENAS


Por “pulsão” podemos entender, a princípio, apenas o representante psíquico de uma fonte
endossomática de estimulação que flui continuamente, para diferenciá-la do “estímulo”, que
é produzido por excitações isoladas vindas de fora. Pulsão, portanto, é um dos conceitos da
delimitação entre o anímico e o físico. A hipótese mais simples e mais indicada sobre a
natureza da pulsão seria que, em si mesma, ela não possui qualidade alguma, devendo
apenas ser considerada como uma medida da exigênciade trabalho feita à vida anímica. O
que distingue as pulsões entre si e as dota de propriedades específicas é sua relação com
suas fontes somáticas e seus alvos. A fonte da pulsão é um processo excitatório num órgão,
e seu alvo imediato consiste nasupressão desse estímulo orgânico.

Na escopofilia e no exibicionismo o olho corresponde a uma zona erógena; no caso da dor e


da crueldade como componentes da pulsão sexual, é a pele que assume esse mesmo papel
– a pele, que em determinadas partes do corpo diferenciou-se nosórgãos sensoriais e se
transmudou em mucosa.

ESCLARECIMENTOS SOBRE A APARENTE PREPONDERÂNCIA DA SEXUALIDADE


PERVERSA NAS PSICONEUROSES
O fato é que se tem de alinhar o recalcamento sexual, enquanto fator interno, com os fatores
externos que, como a restrição da liberdade, a inacessibilidade do objeto sexual normal, os
riscos do ato sexual normal etc., permitem que surjam perversões em indivíduos que, de
outro modo, talvez permanecessem normais. A neurose sempre produz seus efeitos
máximos quando a constituição e a vivência cooperam no mesmo sentido. Uma constituição
marcante talvez possa prescindir do apoio de impressões provenientes da vida, e um grande
abalo na vida talvez provoque a neurose até mesmo numa constituição corriqueira. Aliás,
essa visão da importância etiológica do inato e do acidentalmente vivenciado é igualmente
válida em outros campos.

⮚ Homossexualidade feminina - Fixação infantil na mãe e decepção com o pai

⮚ Homossexualidade masculina - Vínculo intenso entre filho e mãe. Filho se identifica com

mãe, transforma-se nela e busca objeto capaz de substituí-lo e a quem possa amar
(1915)

Toda perversão é uma suspensão do processo de desenvolvimento.


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SEGUNDO ENSAIO – SEXUALIDADE INFANTIL

No segundo ensaio, Freud abala ainda mais a crença popular, segundo a qual a pulsão
sexual está ausente durante a infância e aparece apenas na puberdade, como também os
estudos científicos que ignoravam a existência de uma sexualidade na criança.

Ele atribui essa ignorância ao que chama de "amnésia infantil", isto é, ao fato de que os
adultos têm pouca ou nenhuma lembrança de seus primeiros anos de infância. Para Freud,
tanto o esquecimento da amnésia infantil quanto o esquecimento da amnésia histérica têm
como causa o recalque.

Freud defendeu ser a infância um dos períodos mais importantes para os indivíduos,por ser
no decorrer desta que as experiências vividas determinavam a existência de adultos
possivelmente neuróticos. Ele afirmava que as experiências negativas que alguém vive
nesta época da vida podem se tornar verdadeiros traumas na vida adulta.

Por conta disso, Freud estudou como a forma que as pessoas lidam com a energia sexual e
a libido durante os anos de infância poderiam causar marcas futuras na vida adulta. Para
ele, uma criança passa por três fases de descoberta, seguidas de outras duas até a sua vida
adulta, são elas:

Oral (0 até 1 ano): quando o prazer chega pela boca, por meio da sucção;
Anal (2 a 3 anos): aprende a controlar os esfíncteres, sentindo satisfação;
Fálica (3 a 5 anos): descobre que, ao tocar seus órgãos genitais, sente
prazer; Latência (5 anos até a puberdade);
Genital (puberdade e vida adulta).

AS MANISFESTAÇÕES DA SEXUALIDADE INFANTIL


A sexualidade polimorfo perversa está ligada, portanto, a várias zonas do corpo e não visa a
reprodução. Freud diz que as pulsões parciais tem uma certa cronologia, sendo
direcionadas às zonas erógenas do corpo da criança, principalmente à zona oral que está
ligada a nutrição e depois se desvincula e se torna um prazer em si mesma; depois a zona
anal, na pele, e em outras partes estimuladas na limpeza, no banho e etc. E também é bom
citar a importância da curiosidade de ver as partes genitais dos amiguinhos. Freud estará
sempre falando das pulsões parciais vinculadas às zonas erógenas. Essas pulsões com o
tempo são direcionadas às zonas genitais e até mesmo à outras zonas (puberdade), mas
apenas como preliminares e com objetivo do "normal".

Fase Oral ( 0 a 1 ano de idade) - zona bucal como zona erógena ou fonte corporal
pulsional. Geralmente, dá-se esse nome de "fase oral" à fase de organização libidinal que
vai do nascimento ao desmame.
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Nesta fase, o interesse primário está concentrado na boca e o que ela pode realizar, assim o
levar tudo à boca e o sugar adquirem a maior importância. Um pouco mais adiante, quando
já dispõe de dentes, o morder também passa a ser uma grande expressão. Os sons e os
movimentos da boca passam a ser altamente gratificantes, como cuspir, balbuciar, babar etc.
Nesta fase a criança é narcisista e os prazeres são autoeróticos. Ela se considera o centro
do mundo. Mais tarde ela descobre, à custa de muitas frustrações, que o mundo não está
sob seu controle. Ela aprende as limitações do próprio corpo e que é uma entidade
separada, onde surge o conceito de“ego original”.

São da fase oral os elementos básicos de muitos impulsos parciais que poderão se
manifestar em uma fase qualquer, inclusive na adulta, como o beber, o falar, o comerem
excesso, o agredir com palavras (correspondendo ao morder), como xingar, humilhar com
palavras, fazer gozações, ser sarcástico, ser passivamente protegido (o mesmo que ser
alimentado como uma criança), a frugalidade no comer (correspondendo a relutância em
falar).

O Objeto original do desejo: é o seio materno ou seu substituto. A primeira expressão da


libido é a ação de mamar. Com efeito, não somente esse ato de mamar satisfaz a
necessidade de nutrição, mas ainda proporciona prazer em si mesmo. Predominância de
uma zona erógena ou por um modo de relação de objeto.

A separação da mãe, no momento do nascimento, instaura uma nova relação mãe - bebê,
relação dependente e praticamente simbiótica, fusional. O principal mediador da relação, a
partir do nascimento, é a função alimentar ou nutricional. A essa função relaciona-se um
prazer que o bebê experimenta no momento de ser nutrido. E essa satisfação libidinal,
apoiada sobre a necessidade fisiológica de ser nutrido, vai separar-se desta. O bebê
descobre que a excitação pela boca e pelos lábios proporciona um prazer em si, ainda que
não seja acompanhada de nutrição (chupar os lábios, sucção do polegar, etc.).

A literatura contém muitas referências que sugerem a existência de uma pulsão de mamar,
que operaria independentemente do processo da nutrição. Por exemplo, ultrassonografias
mostram que desde o período intra-uterino o feto suga o polegar.

O objetivo pulsional - Pode-se dizer que ele é duplo: por um lado, é a estimulação
agradável da zona erógena bucal, prazer que é autoerótico. Por outro lado, é o desejo de
incorporar os objetos, desejo específico da oralidade apesar do emprego do termo"objeto",
não se confere a este o verdadeiro estatuto de objeto exterior. O objeto quase que não é
senão uma parte do sujeito (incorporado ou engolido), a criança leva à boca tudo o que lhe
interessa.

A esses fins de incorporação correspondem medos e angústias orais específicos, tais como: o
medo de ser comido que se vê reviver nos sonhos e fantasias.
19
A Fase Oral divide-se em duas subfases:
(De 0 a 6 meses): fase oral precoce: Prevalência da sucção, que tende à incorporação, à
assimilação oral das excitações oriundas do exterior, ou seja, de um "objeto" sentido como
bom e que, teoricamente, não é destruído; há satisfação autoerótica de compensação,
sobretudo nas frustrações (sucção masturbatória do polegar, pelo simples prazer de chupar)

- Indiferenciação entre corpo próprio e objeto exterior, ausência de distinção entre o


bebê que mama no seio e o seio que o nutre.

- Ausência de amor e ódio propriamente ditos, com o psiquismo estando, então, livre
de ambivalência afetiva.

A fase oral sádica (de 6 a 12 meses): é marcada pelo surgimento dos dentes, da mordida
e dos mordiscamentos dos objetos. inicialmente o seio materno, nessa época, o bebê
responde a uma frustração mordendo, ele exprime, ao morder, uma pulsão agressiva. A
incorporação tornou-se sádica, ou seja. destrutiva; o objeto incorporado, na vivência do
bebê, é atacado, mutilado, absorvido e rejeitado, no sentido da destruição do objeto. A
relação ambivalente é concomitante à segunda parte da fase oral, quando do surgimento
das pulsões sádicas.

O desmame é frequentemente um trauma que é vivido como uma punição / sobre o modo
da frustração – conseqüência da agressão. É o conflito relacional específico quese liga à
resolução da fase oral.

Fase Anal (2 ou 3 anos) - quando se instala o controle esfincteriano, quando o ato de


defecação se torna um ato sobre o qual a criança pode adquirir um domínio suficiente, que o
prazer ligado a essa defecação, assim como os conflitos específicos que se ligam a ela,
ocupam uma situação privilegiada.

Fonte pulsional corporal ou zona erógena parcial. A mucosa ano-retal, mais geralmente,
toda a mucosa da zona intestinal de excreção, investida de uma libido difusa a todo o interior
(e não apenas ligado aos orifícios).

O Objeto da pulsão anal - ocorre uma complexidade crescente do jogo pulsional. A mãe, que
permanece sendo o objeto privilegiado das pulsões da criança, tornou-se uma pessoa
inteira. A mãe é um objeto que estará sobretudo em questão, para a criança manipular,
como ela "manipula" suas matérias fecais
20

.
Outro objeto na fase anal é o conteúdo intestinal ou cilindro fecal. Ele é, de início, um
excitante direto da erogeneidade da zona corporal. O cilindro fecal é considerado pela
criança como uma parte de seu próprio corpo, que ela pode – por uma “decisão voluntária” -
conservar no interior de sí, ou expulsar, dele se separando. O cilindro fecal representa para
a criança uma moeda de troca entre ela mesma e os adultos. Freud estabelece as
equivalências entre as fezes, o presente que se oferece ou que se recusa.

Angústia específica - o temor de ser brutalmente despojado do conteúdo do corpo, de ser


esvaziado literalmente, por arrancamento.

Objetivo pulsional - Expulsar a produção intestinal, não é o único ato anal ao qual está
ligado um prazer, retardar essa defecação, isto é, reter suas matérias ao menos durante um
certo tempo, é, para a criança, de um prazer erógeno indiscutível.

Objetivo: Fase "expulsiva” - O objetivo é, aqui, desfrutar sensações agradáveis durante a


excreção. Além do prazer "natural", uma estimulação adicional é obtida como conseqüência
da importância que os pais conferem às funções anais e que conduz a criança a aumentar
seu interesse por este ato neuromuscular.

Uma outra fonte de estimulação intensa, contingente, é constituída pelas higienização


(lavagens, etc.) ministradas pela mãe.

Fase retentiva - O prazer principal se dá na retenção. Se no início, a progressão do cilindro


fecal se ligava a sensações experimentadas passivamente. Nesta fase, o prazer ligado ao
ato expulsivo/retentivo se torna o objeto de uma busca ativa. Utilizar suas matérias fecais
como presente, para demonstrar seu afeto; ou, elemento sádico:ao contrário, retê-las - o que
tem a significação de um gesto hostil (sádico) em relação aos pais. É preciso notar que a
expulsão intempestiva, coincidindo com a recusa de cumprir, no momento ou nas
circunstâncias em que o controle é desejado pelos pais,assume também um caráter
agressivo de oposição.

Características da fase anal:


O autoerotismo, que ela sempre comporta. O aspecto sádico, o qual caracteriza a totalidade
da fase anal, a ponto de se designar habitualmente essa fase pelo qualificativo
"sádico-anal". Esse aspecto sádico deriva aqui de uma dupla fonte:

- por um lado, na origem, o próprio ato de expulsão está em causa, as matérias fecais
sendo consideradas como objetos que são destruídos e pelos quais a criança não
experimenta nenhuma consideração;

- por outro lado, os fatores sociais desempenham mais tarde um papel, pois a criança
pode utilizar sua faculdade de expulsão ou reter as fezes para desafiar os pais, que
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procuram lhe ensinar a necessidade da limpeza.
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Relação de objeto - É no modelo das relações mantidas pela criança com suas matérias
fecais, e em função dos conflitos suscitados pela educação para a limpeza, que o sujeito vai
orientar sua relação de objeto. Características específicas = Ambivalência, é aqui
fisiologicamente fundada na atitude contraditória face às matérias fecais, que serve de
modelo às relações com o outro.

Assim, os objetos: mãe, pessoa no entorno, etc - poderão ser: recusados, expulsos e por
isso mesmo destruídos; introjetados, isto é, guardados como objetos de apropriação, retidos
como uma possessão preciosa e amada.

A oposição do par atividade-passividade marca profundamente as relações objetais próprias


dessa fase. É sobre o modelo desse esquema dualista ativo-passivo, derivado do
investimento anal, que a criança é sensibilizada, em sua relação com osobjetos. O essencial
da relação implica no par subjugar-ser subjugado, dominar-ser dominado.

Fase fálica - instaura uma relativa unificação das pulsões parciais sob o primado dos órgãos
e das fantasias genitais. Seja pela masturbação, seja por meio de suas investigações, a
criança irá pouco a pouco tomar consciência da realidade anatômica do pênis, e começará a
se fazer perguntas sobre a existência ou a não-existência desse atributo corporal nela ou
nos outros.

Nesse momento, o pênis não é ainda percebido como um órgão genital, mas sim como um
órgão de potência ou de completude. A criança não faz a diferença entre um homem em
relação a uma mulher, mas entre a presença ou a ausência de um só termo, o falo.

O menino: Pelo fato de se saber possuidor de um pênis que falta às meninas,


Supervaloriza esse pênis;

A menina: trata-se de uma verdadeira e profunda ferída narcísica que traz consigo um
sentimento de inferioridade no plano corporal e genital, ainda por cima complicado e
reforçado por fatores socioculturais.

Problemática da fase fálica


A angústia de castração é a expressão consagrada para designar a reação afetiva que se
segue à constatação da ausência de pênis na menina. Essa constatação traz consigo, no
menino, o medo fantasmático de perdê-lo e, na menina, o desejo de possuí-lo.

Não há necessidade, em absoluto, da intervenção dos adultos para que a criança "sofra" de
uma angústia de castração, face à qual ela deve aprender a se defender. A princípio, a
criança vai rejeitar esse mal-estar ou essa angústia, defender-se dela. Pensará que aquilo
crescerá.
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Complexo de Édipo
No menino: encontramos no menino a seguinte sequência:
- Desejo edipiano.
- Angústia de castração e ameaça fantasmática de castração pelo pai.
O Complexo de Édipo é superado, ao mesmo tempo, pela renúncia à mãe (objeto incestuoso) e
identificação com o pai.
Final abrupto do Édipo e entrada na latência.

O Édipo da menina: a mudança de objeto


A menina cumpre um passo suplementar: a transferência da mãe para o pai. Descobrindo sua
falta de pênis, a menina, depois de um período de denegação e de esperança, vê-se forçada
a aceitar bem rápido essa ausência.

Nenhuma recusa pode apagar nela a falta real, que não é vivida como a ameaça de uma
castração imaginária, mas como um fato fisiológico. Forçada, mesmo assim, a aceitar sua
falta (incompletude, inferioridade), a menina vai recriminar sua mãe e se aproximar do pai,
surge uma defesa de natureza edipiana: o desejo de ter um filho, que irá substituir o desejo
de ter um pênis. Com esse objetivo a menina escolhe o pai como objeto de amor.

Declínio do Complexo de Édipo


O menino renuncia aos desejos sensuais dirigidos para a mãe e aos anseios hostis em
relação ao pai, e isso sob o choque da ameaça de castração.

Na menina, a renúncia ao complexo de Édipo é mais gradual e menos completa. Essa


renúncia provém do medo de perder o amor da mãe, medo que não constitui uma força tão
potente e tão dinâmica quanto a da angústia de castração, mas que desempenha seu papel
igualmente. Com a resolução do Complexo de Édipo, as escolhas objetais são substituídas
por identificações (o que implica o desejo de se assemelhar a alguém, por exemplo, no
menino que imita as características do pai).

O mecanismo de formação do superego


A criança pequena não possui inibições internas, obedece a seus impulso. O papel interditor
é primeiramente representado pela autoridade parental. A renúncia às satisfações pulsionais
será consequência da angústia inspirada por essa autoridade externa, renunciando à
satisfação pulsional para não perder seu amor.
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Por meio do mecanismo de identificação essa interdição externa será internalizada. A


relação como os pais, o temor de perder seu amor, a ameaça de punição, transformam-se
no superego, pelo processo de identificação.

Período de latência - A dissolução ou o abandono do complexo de Édipo são


acompanhados de uma liberação energética considerável. Essa energia liberada será
geralmente investida na aquisição de um aparelhamento intelectual. Entre 5 e 6 anos até a
puberdade.

Sucedendo ao Édipo e a suas agitações, a fase seguinte do desenvolvimento é


classicamente considerada como uma fase de repouso e de consolidação das posições
adquiridas. Os instintos sexuais turbulentos adormecem, o comportamento tende a ser
dominado por sublimações parciais e formações reativas -, enfim, a criança aí se volta, de
preferência, para outros domínios que não os sexuais-, escola,companheiros de
brincadeiras, livros e outros objetos do mundo real, ainda que a energia desses novos
interesses seja sempre derivada dos interesses sexuais.

TERCEIRO ENSAIO – PUBERDADE

Com o advento da puberdade, ocorrem mudanças destinadas a conferir à sexualidade


infantil sua forma definitiva e normal. A pulsão sexual até aqui era predominantemente
autoerótica; agora, ela encontra um objeto sexual. Agora, surge uma nova finalidade sexual,
e todos os impulsos componentes se combinam para atingí-la, enquanto as zonas erógenas
passam a se subordinar ao primado da zona genital.

Desenvolvimento psicossexual - caracterizado por uma revivescência pulsional maciça.


Reativação e superativação tanto das pulsões agressivas como da líbido, tanto narcisistas
como objetais. A tarefa psicológica essencial é a adaptação da personalidade às novas
condições produzidas pelas transformações físicas. Pode-se considerar todos os fenômenos
psíquicos que caracterizam a puberdade como tentativas de restabelecimento do equilíbrio
perturbado.

A vivência da sexualidade na puberdade vai depender da sexualidade anterior. O caminho


dessa sexualidade, em relação às pulsões parciais e ao contexto vivido pelo indivíduo pode
ter modificações, como se fixar em uma delas e se tornar perverso; ouse tornar neurótico
quando a pulsão é recalcada e retorna no sintoma, e esse indivíduo neurótico vive sua
sexualidade no sintoma; ou o indivíduo poderá viver uma sexualidade normal, onde as
pulsões parciais se transformam em uma única pulsão para o sexo considerado normal para
a reprodução.
25

Relação de objeto, escolha objetal


Devido ao amor infantil pelos pais, nada mais natural do que a escolha recair sobre eles, no
momento de sair da fase de latência e encontrar um objeto sexual. Assim, a libido se dirige
novamente para os objetos de amor da infância, ou seja, os objetos de amor parentais, e a
primeira tarefa do Ego será integrar, fazer desaparecer a necessidade objetiva de viver essa
escolha parental.

O dilema se coloca novamente entre a relação materna objetiva pré-genital e dual, porum
lado, e, por outro, a relação objetal e genital com os homens e mulheres que vão substituir
esses pais. Como regra geral e de maneira característica, o jovem indivíduo vai isolar-se e
se comportar como um estranho em relação à sua família; é a revolta pubertária contra os
pais, a autoridade ou seus substitutos simbólicos.

Ao mesmo tempo em que estas fantasias claramente incestuosas são


superadas e repudiadas, completa-se uma das conquistas mais
significativas, mas também mais dolorosas, do período puberal: a
emancipação da autoridade dos pais, único processo que permite o
surgimento da oposição entre e velha e a nova geração, tão fundamental
para o progresso da civilização." (FREUD, 1905)

Na puberdade, a libido que estava ligada aos pais se deslocará para uma outra pessoa,outro
objeto. Mas o não desligamento, ou seja, a fixação no pai ou na mãe pode levar a pessoa a
desenvolver uma neurose, uma fixação na imagem dos pais e não conseguir ter um
relacionamento com uma outra pessoa. Por exemplo: o homem pode desejar ter uma mulher
para uma relação obscena e outra para uma relação mais pura, e não consegue se
desvencilhar dessas duas imagens pois não conseguiu se desvencilhar da imagem em que
se fixou no Complexo de Édipo. Também pode se encontrar presente o deslocamento onde
o indivíduo busca inconscientemente no objeto sexual coisas semelhantes dos seus pais,
como cor de cabelo, tom de voz, tipo de corpo, mesma profissão, etc.

Existem três desfechos diferentes para o desenvolvimento sexual:

a) Perversão - Freud diz: quando todas as disposições se mantém em sua proporção


relativa, considerada anormal, e são reforçadas com o amadurecimento, o desfecho só pode
ser uma vida sexual perversa. Quando a zona genital é fraca, essa conjugação exigida na
puberdade está fadada a fracassar, e o mais forte dentre os demais componentes da
sexualidade impõe sua prática como uma perversão. Aqui um ponto da pulsão parcial é
muito forte e acaba se desenvolvendo de uma forma anormal.

Neurose: produz-se um desfecho diferente quando, no curso do desenvolvimento,alguns


componentes que tinham força excessiva na disposição passam pelo processo de
recalcamento, sobre o qual devemos insistir em que não é equivalente a uma supressão.
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(não
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exclui, nem elimina totalmente, mas coloca a energia, a libido inconsciente e ela retorna no
sintoma) Nesse caso, as excitações continuam a ser produzidas como antes, mas são
impedidas por um obstáculo psíquico de atingir seu alvo e empurradas para muitos outros
caminhos, até que consigam se expressar como sintomas.

b) Sublimação: o terceiro desfecho da disposição constitucional anormal é possibilitado


pelo processo de "sublimação", no qual as excitações hiperintensas provenientes das
diversas fontes da sexualidade encontram escoamento e emprego em outros campos, de
modo que, de uma disposição em si perigosa, resulta um aumento nada insignificante de
eficiência psíquica. Na sublimação a libido pode ser direcionada para outros fins que não é a
sexualidade.

O argumento central dessa obra freudiana é que existe a sexualidade infantil e essa
sexualidade pode ter pontos de fixação e se tornar uma sexualidade perversa, também pode
se desenvolver em sintoma posterior a partir de um recalcamento e o indivíduo se torna um
sujeito neurótico; e numa terceira possibilidade pode se tornar numa sexualidade normal.
Um dos pontos principais da teoria da sexualidade é sabermos que a neurose é o
negativo da perversão. É o motivo pelo qual Freud estuda a perversão na infância. Antes
ele data na puberdade as neuroses, mas depois ele regride no tempo em relação a isso.
Freud diz que a neurose é o que nega a perversão, é como uma substituição dessa
perversão.

A perversão negativa - No caso da neurose. (A neurose é o que nega a perversão, mas


também acaba vivendo a mesma através do recalcamento e dos sintomas, que surgem
através de uma formação de compromisso).

A perversão positiva – Aqui não há negação, é o caso dos perversos (sadismo,


masoquismo, fetichismo, etc.) Enfim, os Três Ensaios tem uma cronologia, começando em
1905 e terminando em 1925. Freud abre o caminho para a investigação da sexualidade
infantil e para entender os sintomas dos neuróticos.

Três Ensaios da Teoria da Sexualidade, como o próprio título diz, não é um texto fechado e
conclusivo, é um ensaio, um esboço de muitas coisas que Freud vai trabalhar depois. Freud
sempre reformulava seus conceitos e modificava através das experiências que ele tinha na
clínica com seus pacientes.
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Referências

FREUD, S. Interpretação dos Sonhos. Imago. In: Obras Completas, Imago.FREUD,


S. Pulsões e Destinos da Pulsão. 1915.

FREUD, S. Três ensaios para sobre a Teoria da Sexualidade. Ed Imago. 2002.


** Apostila montada com base em materiais disponibilizados por Léa Madureira e Luciana
Lemos Antunes de Souza.

GLOSSÁRIO:

Bissexualidade — Noção primeiramente descrita por Wilhelm Fliess e depois assumida e desenvolvida por
Freud, que inclui aspectos genéticos, embriológicos, anatômicos e psíquicos, segundo os quais todos os
indivíduos, sejam homens ou mulheres, mantém vestígios do sexo oposto, embora, no curso de sua evolução, se
orientem para uma predominância monossexual. Dessas predisposições e das decorrentes identificações que o
indivíduo assume no seu desenvolvimento, define- se a sua heterossexualidade ou homossexualidade,
permanecendo, contudo, sempre presentes aspectos secundários relacionados à sua predisposição bissexual
inata.

Complexo de Castração — Ocorre em resposta aos afetos contidos na situação psíquica do complexo de édipo.
Os meninos temem, na fantasia, a castração como realização de uma ameaça paterna, pela rivalidade e
hostilidade que eles próprios sentem em relação ao pai e pela culpa secundária aos desejos sexuais que sentem
pela mãe. Daí decorre uma intensa "angústia de castração" que introduz o menino nomundo das leis e das
proibições, abrindo assim o caminho para o seudesenvolvimento socializado. Na menina, a ausência do pênis é
sentida como um dano sofrido, uma falta importante que ela procura negar, compensar ou reparar.

Complexo de Édipo — Édipo, segundo a mitologia grega narrada por Sófocles (Édipo Rei), estava amaldiçoado e
deveria vir a matar seu próprio pai e casar com sua própria mãe. Ao descrever a relação da criança (entre os três
e os cinco anos) com seus pais,na fase fálica do desenvolvimento sexual infantil, Freud percebeu a presença de
desejos amorosos e hostis, contraditórios, porém complementares, dirigidos pela criança a seus genitores.
Genericamente, predomina o amor pelo genitor do sexo oposto e a raiva e rivalidade pelo genitor do mesmo
sexo. A inviabilidade de concretizar esses desejos libidinosos incestuosos e agressivos permite a repressão dos
mesmos, que assim se tornam inconscientes acompanhando, contudo, a pessoa por toda a vida. O conceito
evoluiu e ganhou uma expressão importante e complexa dentro da psicanálise, sendo a forma acima descrita a
mais simplificada possível.

Instinto — Na presente tradução das "Obras Completas" de Freud, o uso do termo instinto equivale a impulso
instintivo ou pulsão (do alemão trieb); algumas vezes, na edição original alemã, aparece a palavra instinkt, no
sentido clássico, correspondente a um comportamento herdado, próprio de uma espécie animal, que pouco varia
de um indivíduo para outro. Esse fato pode acarretar um risco de confusão entre a teoria freudiana das pulsões e
as concepções psicológicas do instinto animal, distorcendo e anulando a originalidade da concepção freudiana,
particularmente a tese do caráter indeterminado da pulsão e a variabilidade de seus alvos (objetos), o que explica
o caráter inacabado e indeterminado do ser humano.
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Neurose — (palavra grega, relativa a "nervo") — Afecção psicogênica na qual os sintomas são a expressão
simbólica de um conflito psíquico que tem suas raízes na história infantil do indivíduo e constituem compromissos
entre o desejo e a defesa. Há diferentes tipos de neuroses, entre as quais a neurose obsessiva, a histeria e a
neurose fóbica.

Objeto — Em Psicanálise, é o alvo, o objetivo para o qual se dirige um impulso ou pulsão, seja sexual ou
agressivo, com a finalidade de obter uma satisfação. O objeto pode ser uma pessoa, parte de uma pessoa
(objeto parcial), um objeto real mesmo ou um objeto fantasiado. A capacidade de esclarecer relações objetais e
particularmente amor objetal com outra pessoa evidencia um importante desenvolvimento da personalidade de
um indivíduo.

Pulsão (impulso) — Processo dinâmico que implica uma pressão ou força (carga energética, fator de movimento)
que faz tender o organismo para um alvo ou objeto. Esse impulso ou pulsão tem sua origem numa excitação
corporal, sua meta é resolver a tensão presente na fonte pulsional e para isso dirige-se a um objeto, graças ao
qual obtém a satisfação. O conceito de pulsão, segundo Freud, é "um conceito limite entre o psíquico e o
somático".

Sexualidade — No significado que Freud lhe confere, relativo ao seu efeito no desenvolvimento psíquico e
responsabilidade no aparecimento da neurose, constitui um dos objetos centrais da investigação da psicanálise.
Em psicanálise, a sexualidade é inseparável do descobrimento do inconsciente e dos processos que dependem
dele. Não designa apenas as atividades e o prazer que dependem do aparelho genital, mastoda uma série de
excitações e de atividades presentes desde a infância que proporcionam prazer e que se encontram presentes
em todas as formas de amor. Nas fases de desenvolvimento infantil, a sexualidade está presente e domina
determinadas zonas corporais (a boca, o ânus, o pênis ou a vagina), dizendo-se neste caso sexualidade oral,
anal, fálica ou genital. Fantasias sexuais estão presentes na criança desde a tenra infância.
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