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INTRODUÇÃO:
As leituras históricas da relação entre sociedade e natureza acompanham problemáticas
contemporâneas, e dialogam com o estudo do cotidiano e com as disputas de memória; é o caso das
cobranças ecológicas e do processo de desenvolvimento regional presentes nas narrativas da
colonização. A pesquisa problematizou maneiras como os discursos ambientais são apropriados pelos
sujeitos que participaram do processo de colonização da região de Campo Mourão, ocorrido entre
1960 e 1970, a partir de um estudo de memórias e pautado na realização de entrevistas. Os resultados
apresentam o debate teórico metodológico realizado a partir da interpretação das narrativas. Trata-se
de entrevistas, bem como de imagens reproduzidas dos arquivos fotográficos dos entrevistados. Essas
narrativas imagéticas e de história de vida foram avaliadas a partir de um olhar dialógico, preocupado
com saberes locais e com a produção de fontes históricas.
Nesse estudo de narrativas orais e imagéticas relacionadas analisamos demandas de
sustentabilidade e de políticas ambientais, mais especificamente na apropriação de discursos
ambientais no processo de colonização da região da COMCAM, problemática que nos remete a um
recorte temporal correspondente as décadas de 1960 e de1970, a partir de memórias de sujeitos que
vivenciaram tal processo. Essas narrativas imagéticas e orais (de história de vida) foram avaliadas a
partir de um olhar dialógico preocupado com os saberes locais e com a produção de fontes históricas.
Cabe evidenciar que devido à estrutura desse texto apresentaremos as narrativas a partir de questões
gerais, pautadas no diálogo historiográfico delimitado para a pesquisa, e nos seus diálogos teórico -
metodológicos, cabendo a sequência das análises a outra pesquisa, já em desenvolvimento. Uma
primeira interpretação permite-nos destacar da relação História e memória, vinculadas ao debate
historiográfico a respeito da apropriação de discursos ambientais, na construção de territórios e na
análise de conceitos como o de comunidade e de meio ambiente.
A pesquisa visou um estudo regional pautado em três abordagens interpretativas, sendo a
primeiro o de levantamento de informações históricas sobre o momento da colonização regional; a
segunda marcada pelo estudo das principais leis e discursos referentes ao momento histórico da
“colonização”- década de 1960/1970, bem como das questões ambientais atuais, e uma terceira,
pautada na produção de entrevistas e reprodução de acervos imagéticos.
A referida pesquisa dividiu-se em dois eixos de atividades. No primeiro eixo procuramos
construir uma base de leituras, pautadas nas categorias e conceitos tais como: contexto da colonização
regional a partir de políticas e de historiografia pertinente; problemáticas em torno da relação
sociedade e natureza; debates referentes às possibilidades teóricas metodológicas da História local;
discussão de conceitos presentes nas narrativas e discursos históricos, tais como comunidade,
progresso e ecologia; análise teórica e metodológica dos usos da História Oral. Num segundo eixo
procuramos nos deter a produção de narrativas orais. Essa atividade encontra-se em fase inicial, haja
visto que, não fora alcançada a análise prevista no projeto. Em relação a análise das imagens
fotográficas, esta atividade não fora iniciada e nos limitamos a seleção e digitalização do acervo.
Em relação à descrição dos resultados dessas leituras e pesquisas, vamos apresentá-la nesse
texto em três momentos. Trata-se primeiramente de retomarmos as principais leituras e problemáticas
em torno da relação sociedade e natureza, de debates epistemológicos e das possibilidades da História
Oral. Num segundo momento apresentaremos uma breve análise das entrevistas, um acervo
totalizando seis entrevistas com aproximadamente 50 minutos cada uma delas. Quanto o acervo de
imagens a ser analisado, apresentaremos o trabalho de seleção, digitalização e suas relações
epistemológicas com as narrativas orais. Num terceiro momento apontaremos os direcionamentos para
as próximas análises dos acervos narrativos produzidos, visto que já iniciamos uma nova pesquisa,
com temática, propósitos epistemológicos e metodologias, próximos da atual.
As bibliografias mapeadas pontuam as temáticas destacadas na sequência do texto. Iniciamos
com a apresentação do debate em torno da relação histórica: Sociedade e Natureza. Uma de nossas
preocupações se remeteu a compreensão de política e de discursos referentes à sustentabilidade, e as
referentes implicações dessas nas memórias sobre o processo de colonização regional. Nos primeiros
passos de levantamento destacamos como, no campo das leis e de políticas publicas, propagou-se uma
busca pelo progresso e uma consequente construção de fronteiras agrícolas. Um estudo mais detalhado
dessa realidade e da materialidade de tais campanhas ficará a ser desenvolvido na pesquisa recém
iniciada, destacada acima. O foco de observação voltou-se mais as reformulações do código ambiental
e das próprias políticas de desenvolvimento regional, visto que, tais posicionamentos pautavam as
narrativas dos entrevistados. Num primeiro levantamento do mapeamento percebemos como, a partir
da década de 1990, intensificou-se o número de leis voltadas ao controle do extrativismo. Da mesma
forma, no campo das Ciências Naturais e nas Ciências Humanas desenvolveram-se novas
investigações e debates sobre a relação Sociedade e Natureza. E mesmo no campo da História notamos
uma preocupação ética a respeito.
Deve-se destacar que lidamos, no campo da História, com uma temática há pouco
delimitado. De acordo com Hogan, as décadas de 1950 e 1960 podem ser denominadas como um
período pré-ecológico e as de 1970 e 1980, uma época em que o assunto já havia emergidoi (HOGAN,
2007, p. 16). Para o autor, no referido momento a relação entre sociedade e natureza estava
fundamentada em recortes locais e apenas a partir dos anos 1980 se passa a ter noção de que se tratava
especificamente de uma visão global do próprio processo de desenvolvimento capitalista. Em relação
ao campo específico da História, podemos citar as contribuições da segunda geração dos Annales. A
ênfase esteve na revista dos Annales de 1974, cuja ressalva do então editor Emmanuel Le Roy Ladurie
destacava que não estava pendendo a modismos, pois “‘desde longo tempo’ a revista havia escolhido
‘se interessar pelos problemas de uma história ecológica” (PÁDUA, 2010, p. 82, grifo nosso).
Esse recorte temporal e temático fundamenta uma produção dialética na qual local e global
interagem quando avaliamos as problemáticas pertinentes à relação sociedade e natureza e na
definição de um posicionamento epistemológico. O entendimento do debate pode ser constatado com
os estudos do conceito de meio ambiente proposto por Enrique Leff (2005) na obra: Construindo a
história ambiental da América Latino. Para o autor a história ambiental não deveria ser vista apenas a
partir das críticas aos impactos do capitalismo, mas numa abordagem hermenêutica preocupada com
saberes locais:
[...] há um preço a pagar pelo privilégio de “viver em comunidade” — e ele é pequeno e até
invisível só enquanto a comunidade for um sonho. O preço é pago em forma de liberdade,
também chamada “autonomia”, “direito à auto-afirmação” e “à identidade” (BAUMAN,
2003, p. 10).
Procuramos entender a questão ambiental como indícios, vestígios para investigar as relações
sociedade e natureza dentro de uma história social da ocupação regional, e nesse aspecto o saber
ambiental pode despertar uma atualidade que re-significa suas tradições e suas identidades, abrindo
novos caminhos para a pesquisa histórica. E isso nos permite relembrar da história “esquecida pela
historiografia tradicional” e da memória popular sem ignorar o significado construído dessas
representações no cotidiano e no imaginário, e isso tudo não encobre o fato de haver leituras
dicotômicas, como por exemplo, leituras da história tradicional, representante da perspectiva
contrastante entre o desenvolvimento econômico e as políticas de preservação do meio ambiente; ou
ainda, da dicotomia entre um passado romantizado, o da vida da de antes, em harmonia com a
natureza, e a vida atual, marcada pela realidade do capitalismo.
As questões estão permeadas pelo lugar social ocupado pelos entrevistados, no momento
quando narram parte de suas histórias. Essa categoria de análise nos remete a Roger Chartier e o seu
significado para as representações:
ACERVOS IMAGETICOS:
A historiadora Essus contribui ao debate voltado as analises imagéticas ao destacar a relações
histórico semiótica presente em uma fotografia “A partir desta perspectiva a fotografia é interpretada
como fruto do trabalho humano de produção sígnica, pautado sobre códigos convencionalizados
socialmente. [...]” (ESSUS, 1994, p. 4). Ainda cabe ressaltar os devidos cuidados a serem tomados na
análise dos critérios de guarda das imagens pelos entrevistados (pois, diferentemente de fotografias de
arquivos públicos, a finalidade da utilização da fotografia corresponde a questões subjetivas e
familiares) e da sua produção.
Foram digitalizadas 25 imagens. Elas foram selecionadas dentre as outras fotografias
apresentadas pelos entrevistados que se dispuseram a cedê-las a pesquisa. Procuramos estabelecer uma
relação com as narrativas orais, priorizando imagens que nos permitisse construir analogias com a
relação sociedade natureza, especificamente no destaque da transformação espacial. Em linhas gerais,
apresentavam o processo de mecanização de terras e de urbanização local, bem como as contribuições
e ou inserção dos entrevistados na história local, por eles narradas. Algumas imagens ainda foram
selecionadas por apresentarem conquistas pessoais em diferentes espações sociais, por exemplo, na
educação, e economia local. No caso de alguns dos entrevistados essas fotografias nos foram
apresentadas a partir das suas reivindicações nos discursos memorialistas. Todas as imagens tiveram a
devida autorização. Tivemos o cuidado de produzirmos uma cópia digitalizada para facilitar a
sequencia das análises. O acervo digitalizado encontra-se disponível em anexo no relatório final da
pesquisa aqui apresentada.
REFERÊNCIAS:
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Zahar Editor, 2003.
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CARDOSO, C.; VAINFAS, R. Domínios da história: ensaios teoria e metodologia. Rio de Janeiro,
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CHATIER, Roger. O mundo como representação. Estudos avançados, v5, n11, 1991
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ESSUS, Ana Maria Mauad de S. Andrade. Através da imagem: possibilidades teórico-metodológicas
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possibilidades teórico-metodológicas para o uso da fotografia como recurso didático, uma experiência
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http://www.historia.uff.br/primeirosescritos/sites/www.historia.uff.br.primeirosescritos/files/pe01-
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______. Através da Imagem: fotografia e história- interfaces, Tempo, 12/1996, Volume 1, n 2, p.73-
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HALL, Stuart. Identidade Cultural na Pós-modernidade. (2002). 7. ed. Rio de Janeiro: DP & A.
KOSSOY, Boris. Realidades e ficções na trama fotográfica. São Paulo: Ateliê Editorial, 2009
LEFF, Enrique. Construindo a historia Ambiental na América latina. Esboços, v 12, n 13, 2005.
POUTIGNAT, Philippe; STREIFF-FENART, Jocelyne. Teorias da etnicidade. São Paulo: Editora
da UNESP, 2000. Observação: No mesmo livro consta o texto "Grupos Étnicos e suas Fronteiras", de
Fredrik Barth.
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Pp. 219-242. V. 9, n 19, set. 1989 / fev. 1990. Acesso 03/05/2011.
i
O autor destaca o caso das catástrofes de Donora, Pensilvânia (de outubro de 1948), da névoa matadora em
Londres (1952), a doença dos gatos dançantes em Minamata (1955), etc., destacando as repercussões das
cobranças dos moradores das cidades e regiões afetadas pelas respostas da ciência.
ii
Entendido como vulnerabilidade, para o autor a categoria esquecimento volta a questão dos abusos e reconhece
a necessidade de uma memória justa e ou contida. Suas 3 formas são: esquecimento por apagamento de
vestígios (conceituado elo neurologista, pela psicanálise e pelo historiador); por esquecimento reversível (
depende do reconhecimento); esquecimento de manifesto (estratégico). Delineado os três momentos da
consciência Ricoeur apresenta a relação desses com a produção historiográfica.