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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS


ESCOLA DE COMUNICAÇÃO - ECO/UFRJ
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃO E CULTURA

“FIQUE EM CASA” versus POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA:


narrativas em um contexto sociocultural quando o isolamento social não é uma opção

EXERCÍCIO NÚMERO 1:
delimitação do objeto empírico de investigação

Exercício número 1 apresentado à disciplina de


Metodologia de Pesquisa em Comunicação do
Programa de Pós-Graduação em Comunicação e
Cultura da Escola de Comunicação da
Universidade Federal do Rio de Janeiro, como
requisito parcial para aprovação na mesma.

Rio de Janeiro
2023
INTRODUÇÃO
Há quase dois anos em isolamento social, longe de aglomerações e isento de abraços
calorosos, vem à tona uma preocupação genuína com aqueles que não têm onde morar: a
população em situação de rua. Essa diligência se torna ainda mais autêntica, pois, no Brasil,
desenvolver políticas públicas para pessoas que se encontram nessa situação sempre foi
bastante desafiador. Além do mais, oficialmente, o país não realiza a contagem das pessoas
em situação de rua. Por outro lado, o cenário mundial criado a partir da descoberta do novo
coronavírus, bem como as demais mudanças provocadas pela Covid-19, fez com que
respostas mais rápidas fossem exigidas, justamente para que houvesse a estabilização da
situação a nível mundial — principalmente às populações com altas chances de
contaminação.
Complementando essa ideia, do ponto de vista normativo, disposto no decreto
7.053/09, o qual institui a Política Nacional para a População em Situação de Rua (PNPSR),
as características que compõem essa população são: a) heterogeneidade; b) pobreza extrema;
c) fragilidade ou a inexistência dos vínculos familiares; d) inexistência de moradia regular; e
e) utilização de locais públicos para respectiva moradia e sustento. De todas as características
apresentadas, sem dúvida, a mais significativa é a heterogeneidade. Afinal, “todas as
pesquisas revelam que não há um único perfil da população de rua, há perfis; não é um bloco
homogêneo de pessoas, são populações” (Escorel, 2003). Assim, como principal elemento
que desponta nessa caracterização, podemos conceber a ideia de que se trata de um segmento
populacional composto por homens, mulheres, crianças, idosos, negros, brancos etc.
Por conta disso, merece um olhar mais cuidadoso a condição das pessoas em situação
de rua; afinal, elas são mais suscetíveis, naturalmente, à infecção e, graças às insalubres
condições higiênico-sanitárias, correm maior risco (Aguiar, Meireles, Rebelo & Barros,
2020). Cabe aqui, por conseguinte, considerar a grande vulnerabilidade social, com
reconhecidas dificuldades de acesso à saúde que a população em situação de rua encontra
(Hino, Santos & Rosa, 2018). Segundo Baggett et al. (2013), as pessoas em situação de rua
com idade igual ou abaixo de 65 anos têm uma mortalidade de qualquer causa 5 a 10 vezes
maior do que a população em geral. No entanto, essa disparidade pode ser aumentada com a
infecção de Covid-19 (Tsai & Wilson, 2020).
Diante desse quadro emergencial, a atenção às pessoas em situação de rua consegue
congregar todas as demandas e dramas inerentes a essa população — a qual, não raro, é
subestimada e naturalizada nas grandes cidades. Logo, a necessidade de isolamento social e
respectivo atendimento às condições de higiene para aqueles que não possuem moradia (ou
os que nem residências coletivas provisórias dispõem) e a severa e repentina limitação dos
precários meios de sobrevivência, como pequenos serviços (os chamados bicos) e doações,
são fatores que servem apenas para aprofundar o conhecimento sobre o abismo social que
esse grupo vivencia diariamente.
Além do mais, como destacou De Paula et al. (2020), sabe-se que essa população, ao
longo do tempo, vai adotando certos habitus, ainda que estes não sejam percebidos
conscientemente; afinal, o “habitus é uma noção que auxilia a pensar as características de
uma identidade social, de uma experiência biográfica e um sistema de orientação” (Setton,
2002).
Por conta disso, a questão norteadora que baliza essa pesquisa é: como a população
em situação de rua enxerga e interpreta o seu cotidiano diante do isolamento social
promovido pela Covid-19? Assim, na presente pesquisa, o autor pretende estudar mais
profundamente a interpretação e a consequente estruturação que as pessoas em situação de
rua fazem do seu cotidiano. Esse objetivo será alcançado com a utilização da pesquisa
etnográfica. Afinal, como bem observa Janice Caiafa (2019), “na etnografia a produção de
dados deriva sobretudo do enfrentamento e aproveitamento do imprevisível no trabalho de
campo”. Dessa forma, é esperado que se possa compreender, por meio da construção e
análise de diferentes narrativas, as dificuldades reais das pessoas que não podem se isolar em
casa, já que essa não é uma opção.

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