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MODELOS DE COMUNICAÇÃO APLICADOS AOS ESTUDOS

DE PÚBLICOS DE MUSEUS

COMMUNICATION MODELS APPLIED TO MUSEUM AUDIENCE STUDIES

Adriana Mortara Almeida


Pós-doutoranda do Departamento de Geociências Aplicadas ao Ensino/Instituto de Geociências
UNICAMP

Maria Margaret Lopes


Professora Livre-docente do Departamento de Geociências Aplicadas ao Ensino/Instituto de Geociências
UNICAMP

RESUMO

O artigo apresenta modelos de comunicação e suas aplicações em museus e nas pesquisas de públicos nessas instituições. Alguns
dados de estudos internacionais e nacionais de visitantes em museus são trazidos para analisar a utilização dos modelos e as
semelhanças e diferenças dos públicos. Há um esforço para demonstrar a importância dessas pesquisas e de sua ampliação.

Palavras-chave: comunicação; museu; estudos de públicos de museus

INTRODUÇÃO Quanto aos museus, uma parcela de 41% dos


respondentes – de vários bairros e de diferentes extratos
Apresentaremos aqui algumas reflexões acerca sócio-econômicos – afirmou nunca ter visitado um
do processo comunicativo em museus e suas implicações museu em Belo Horizonte. Os principais motivos alegados
para os estudos de público. Mostraremos a importância foram desinteresse (34%), desconhecimento dos
dos modelos de comunicação tanto para a concepção museus de Belo Horizonte (33%) e falta de tempo (22%).
dos programas museológicos como para a avaliação dos Quando perguntados sobre o que os levaria a
mesmos. E tentaremos, na medida do possível, visitar um museu na cidade, 32% cobraram maior
demonstrar a importância da realização de estudos de divulgação, 23% precisariam ter mais tempo, 19% iriam
públicos em museus. a mostras de seu interesse, 17% responderam que nada
os faria ir. (SECRETARIA MUNICIPAL DE
CONHECENDO OS PÚBLICOS CULTURA, 1996, p. 68-69)
De um lado temos um público sem interesse
Nos anos de 1995 e 1996, foi realizado o “1º de visitar museus, provavelmente por considerá-los como
Diagnóstico da Área Cultural de Belo Horizonte”, que um lugar “chato”, que trata de temas distantes de sua
procurou levantar os hábitos de consumo cultural da vida cotidiana, ou que sejam feitos para outros tipos de
população da cidade, além de conhecer as opiniões e pessoas – mais “cultas” e mais escolarizadas.
sugestões de artistas, produtores e financiadores Mario Chagas, museólogo do IPHAN, coordenou
culturais. Foram entrevistados 720 moradores da cidade uma pesquisa na qual as pessoas que circulavam nas
de Belo Horizonte (MG), entre 15 a 50 anos. A ruas do Rio de Janeiro eram abordadas e perguntadas o
freqüência a espetáculos de música e dança, a leitura e que a palavra museu as fazia pensar. Velho, lugar de
muitos outros hábitos culturais foram investigados. coisas velhas, relíquias, entre outras referências ao

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passado, foram as respostas mais freqüentes. museus e foi até utilizada para justificar sua manutenção.
(CHAGAS, 1987) Ou seja, existiria (ainda) a crença de Agora, no início do século XXI, os museus enfrentam
que os museus são depósitos de coisas velhas, o que novos desafios diante da infinidade de opções de cultura,
para muitos representa um lugar “chato” para ir visitar.1 lazer e educação existentes e do intenso
Na pesquisa realizada em Belo Horizonte, houve desenvolvimento tecnológico na criação, reprodução e
também aqueles que disseram não ir por falta de comunicação de textos e imagens.
divulgação. Como atingir estas pessoas? Quais os A concorrência dos museus pelas verbas
melhores meios? E aquelas que não iriam de qualquer públicas e privadas com outros centros de pesquisa, lazer
maneira, pois nada as levaria a visitar um museu em e divulgação, levou ao desenvolvimento de trabalhos nas
Belo Horizonte? Será que existe algum meio de levá-las áreas de marketing, nos quais os museus eram colocados
aos museus? E ainda, será que é preciso fazer que todos como geradores de renda para suas cidades e países.
visitem museus?
Posteriormente, com a valorização da atividade educativa
Pesquisas como essa, sobre consumo cultural
dos museus, trabalhos de avaliação dessas atividades
de moradores de Belo Horizonte, trazem para
passaram a ser desenhados, no intuito de saber o quanto
profissionais da área de cultura a “voz” do usuário/
foi “aprendido” pelos participantes desses programas.
espectador/visitante ou do potencial usuário.
E, finalmente, as exposições, como espaço
Acreditamos que somente com os estudos sobre os
maior de interação do público com os museus, passaram
receptores das ações culturais poderemos aperfeiçoar
as atividades oferecidas e ampliar os públicos. a ser questionadas em sua eficiência de comunicação, e
Na área de museus, nos últimos 50 anos, houve diversos estudos foram feitos para avaliá-las, enquanto
um crescimento exponencial das pesquisas de público, meios de comunicação.
voltadas para questões de marketing, de educação e de
comunicação. O PROCESSO COMUNICACIONAL EM
As avaliações das exposições são estudos sobre MUSEUS
a recepção das mídias que compõem uma exposição.
Hoje em dia, parece mais do que óbvia a importância do As pesquisas de público em museus estão
visitante no processo comunicacional dos museus, mas baseadas em modelos de comunicação, explícitos ou
essa importância, é preciso lembrar, foi também um implícitos, que norteiam as teorias e metodologias. Nas
processo historicamente construído, que guarda as primeiras décadas do século XX, o chamado modelo
especificidades das diversas situações em que ocorreu. “hipodérmico” de comunicação era o mais aceito e, nesse
Por exemplo, o caráter público dos museus sempre foi sentido, o visitante era encarado como um recipiente
uma característica intrínseca dessas instituições enquanto vazio no qual poderiam ser inseridas informações.
promotoras das ciências modernas, desde pelo menos o (HOOPER-GREENHILL, 1994, p.46; MILES, 1989,
século XVII. Já ao longo do século XIX, a abertura dos p.147)
museus e coleções ao público passou a incorporar Em seguida foram criados novos modelos
explicitamente intenções pedagógicas para afirmação informacionais que ainda eram unidirecionais, como o
de história da nação ou para a valorização de de Shannon e Weaver de 1949 (WOLF, 1995), porém
determinados aspectos da ciência, das técnicas (LOPES, traziam mais etapas do processo e inseriam a
2003). No século XX, a educação passou a ser importância do conteúdo do que estava sendo
reconhecida como uma das principais funções dos
comunicado.
A pesquisadora britânica Eilean Hooper-
Greenhill, em seu texto de 1994, adaptou este modelo
1
Mesmo que esse trabalho tenha sido feito há cerca de 16 anos, acredi-
tamos na sua atualidade. Entretanto, seria necessário conduzir novas
criado no final dos anos 1940 ao ambiente do museu,
investigações para confirmar. mostrando como cada elemento se encaixaria no modelo:

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EQUIPE COMPREENSÃO
EXPOSIÇÃO VISITANTE

Mensagem Mensagem

SINAL
SINAL CAPTADO
exposição OBJETOS mente do
TEXTOS visitante
EVENTOS

MULTIDÃO
FADIGA
SINAIS CONFUSOS

Figura1- Modelo comunicativo aplicado à exposição


Fonte: Hooper-Greenhill, 1994, p. 41

Mas esse modelo não dava conta da participação últimos trouxeram contribuição fundamental para a
do receptor no processo comunicacional, que foi sendo questão dos códigos de comunicação: as linguagens, as
vivências e culturas de cada participante do processo
cada vez mais valorizada nos estudos de comunicação
são diferentes e podem facilitar ou dificultar a
e semiótica, realizados a partir dos anos 1960. Esses comunicação.

(fonte) MENSAGEM emitida canal MENSAGEM MENSAGEM


EMISSOR como significante que recebida como DESTINATÁRIO recebida como
veicula um certo significante significado
significado

Código Código

Sub-códigos Sub-códigos

Figura2-Modelo semiótico-informacional da relação comunicativa


Fonte: Eco et al. (1965) apud Wolf (1995).

O modelo semiótico-informacional, bastante receptor. No caso da comunicação de massa, a


centrado nos códigos, também é unidirecional, porém assimetria de papéis comunicativos, na comunicação
admite o caráter negocial entre os participantes do de massa, e fatores sociais levam à compreensão
processo e valoriza a diversidade de códigos. Ele também “problemática”, ou seja, não identificável a priori
previa a possibilidade de haver ausência total de código, com as intenções comunicativas do emissor (WOLF,
disparidade de código, etc. entre emissor e 1995, p. 111)

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Posteriormente, outros modelos foram O modelo semiótico-textual propõe a
inserindo novos elementos no processo e a
comunicação em duas vias, entre emissor e receptor,
dupla direção, ou seja, o “feed-back” do receptor
passou a ser tratado como elemento fundamental levando em conta também o universo cultural em que
do processo e realimentador do mesmo. cada um está inserido:

mídias
EMISSOR DESTINATÁRIO

Conjuntos textuais Conjuntos textuais


(culturais) codificados, (culturais) recebidos,
construídos, emitidos em decodificados, construídos,
relação às práticas textuais emitidos em relação às
antecedentes práticas textuais
antecedentes

Figura 3 - Modelo semiótico-textual da relação comunicativa


Fonte: Fusari e Dupas (1997)

Nesse modelo são consideradas mídias todas compõem alguns dos códigos apresentados em uma
as formas e suportes de comunicação – televisão, exposição museológica, e caberia ao visitante decodificar
cinema, vídeo, livros, a lousa na sala de aula, textos de essa complexa rede de comunicação (ALMEIDA,
uma exposição, objetos tridimensionais de uma exposição, 1997).
obras de arte, etc. – todas sempre criadas/emitidas O modelo semiótico-textual corresponde, ao
intencionalmente. A intenção não evita os ruídos / nosso ver, ao modelo de comunicação museal proposto
resíduos que escapam do controle dos participantes. por Waldisa Rússio Guarnieri, no qual o visitante entra
A exposição museológica contém vários tipos em contato com o objeto museal no cenário da exposição,
de mídias e vários códigos. Objetos, textos, fotografias, estabelecendo assim o processo de comunicação
desenhos, cenários, iluminação, organização no espaço dialógico (RÚSSIO GUARNIERI, 1981).

Mídias da exposição

OBJETO HOMEM

Exposição Visita ao
museológica museu

Figura 4 - Modelo da relação museal


Fonte: Rússio Guarnieri (1981).

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Esse modelo confere papel significativo ao Falk e Dierking, em “The museum experience”
receptor/visitante, o que leva o pesquisador de público e propuseram investigar o que seria aprender em museu e
avaliador a dar maior espaço para as interpretações dos em quais situações seria possível afirmar que houve
visitantes diante das propostas dos curadores, aprendizagem. O “modelo de experiência interativa” em
museólogos e educadores. Cada vez mais as pesquisas museu (interactive experience model) proposto torna
apresentam as opiniões, comportamentos, falas, gestos, ainda mais visível as relações que ocorrem durante a
interrogações, sugestões, enfim, o receptor aparece visita ao museu e leva em conta também todos os
como sujeito da relação comunicativa em museu antecedentes da visita e fatos relevantes posteriores,
(STUDART; ALMEIDA; VALENTE, 2003). incluídos no chamado “contexto pessoal”. Nesse modelo,
a visita ao museu é interpretada como a intersecção de
O MODELO DA “EXPERIÊNCIA três contextos: contexto pessoal, contexto físico e
MUSEOLÓGICA” APLICADO ÀS PESQUISAS contexto sócio-cultural (FALK; DIERKING, 1992).

EXPERIÊNCIA
INTERATIVA
Contexto Contexto
Pessoal Físico

“Cada um dos contextos é construído


continuamente pelo visitante, e a
Contexto interação entre eles cria a experiência
Social do visitante.”

Figura 5 - A experiência museológica


Fonte: Falk e Dierking (1992).

Posteriormente, o modelo foi aperfeiçoado e nele envolvidos na visita, sejam aqueles dos quais o visitante
foi inserida a dimensão temporal, ou seja, passou a levar participa, sejam visitantes de outros grupos, sejam de
em conta que a aprendizagem é um processo que ocorre servidores do museu e qualquer outra pessoa com as
em diferentes tempos para cada pessoa. Essa nova quais o visitante possa ter contato no processo da visita.
versão, denominada “Modelo contextual de Assim, quando visitamos um museu desacompanhados,
aprendizagem” (contextual model of learning), parece- certamente teremos um ritmo muito diferente do que se
nos melhor que a anterior por sua dimensão diacrônica, estivermos com um colega adulto ou com uma criança.
pois as pesquisas indicam que elementos vistos em uma Se chegamos à exposição e ela está cheia de gente,
exposição podem servir de base para a construção de nosso percurso poderá ser alterado para podermos
um novo conhecimento muitos meses ou até anos depois desviar das vitrinas invisíveis diante de tantas cabeças.
da experiência da visita (FALK; DIERKING, 2000). Muitos estudos de público procuram desvendar os
Nesse modelo, o contexto sócio-cultural comportamentos das pessoas desacompanhadas,
envolve todos os contatos com indivíduos ou grupos daquelas com crianças, etc.

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No estudo realizado por Adriana M. Almeida • Jardim – 15,3%
no Museu Lasar Segall, ao serem registrados percursos • Tem trabalhos do artista – 6,5%
dos visitantes e algumas de suas conversas com • Casa modificada – 5,5%
acompanhantes, percebeu-se que o “Exercício de • Local de trabalho do artista – 2,7%
Leitura” era um dos pontos que gerava maior interação • Outros (“parece uma casa”; “Tem uma biblioteca”;
entre os visitantes, principalmente entre adultos, que “Cinema e exposição”; “Grande”; “Tem um cinema”.)
geralmente liam, e crianças, que observavam e – 6,7%
escutavam as explicações dos adultos. Neste caso, um • Não responderam – 14,9%
elemento da exposição, planejado para ser manipulado
e lido pelos visitantes, levou-os a fazer uma parada mais
O jardim era só um local de passagem, mas ficou
longa e a trocar idéias entre si (ALMEIDA, 2001). Casos
semelhantes são descritos nas observações de alguns fortemente marcado na memória desses estudantes,
elementos interativos em exposições de ciências. assim como a sensação de que o museu era um “lugar
Outro tipo de interação que ocorre em museus agradável”. Assim, foi possível perceber aspectos
é dada pela ação de educadores / monitores no espaço positivos do ambiente físico do Museu Lasar Segall
expositivo, provocando discussões, incitando a que, mesmo que não sendo prioritários na visita,
observação e orientando grupos. A ação do monitor pode interferem diretamente na apreciação do museu e nas
facilitar a interação com a exposição, mas pode também lembranças deixadas. Haverá mais chance de retorno
criar “ruídos” na comunicação, quando as linguagens ao museu quando uma pessoa o recorda como um local
não são comuns ou quando existem interferências e agradável (ALMEIDA, 2001).
emoções negativas no meio. Eventualmente, um monitor Outro aspecto do espaço físico pôde ser
pode não ter obtido a confiança do grupo que orienta e observado no percurso dos visitantes espontâneos, dentro
então a atividade ficará prejudicada pela falta de da exposição do Museu Lasar Segall. Percebeu-se que
concentração e por possíveis animosidades. Nesse algumas obras foram observadas com menor freqüência
sentido, torna-se sempre muito importante não só a por causa do local onde estavam. Elas estavam em uma
problematização do papel exercido por tais mediadores parede na qual o visitante, ao adentrar na sala, precisava
(LOPES, 1997), como também a preparação e formação virar à esquerda para apreciá-las, mas havia uma grande
contínua dos monitores, assim como a constante
obra à frente muito atraente e forte que as “atraía” para
reavaliação das estratégias utilizadas .
frente e fazia com que perdessem aquela parte da
O contexto físico engloba tanto a exposição,
exposição. Combinam-se aí a localização das obras
como o prédio do museu, seus arredores, enfim, o
ambiente no qual se dá a interação. O percurso proposto assim como seus conteúdos (ALMEIDA, 2001).
pela exposição, a disposição das vitrinas, dos painéis e Numa pesquisa realizada em diferentes
de todos os elementos da exposição definirão a exposições na França, Hana Gottesdiener observou os
experiência museal. O visitante que se sente confortável percursos dos visitantes para verificar se algumas das
no ambiente certamente ficará mais livre para poder grandes tendências apresentadas na literatura se
apreciar a exposição. Se a luz é cômoda, se há locais confirmavam: por exemplo, se as pessoas tendem sempre
para descanso, tudo isso facilitará a qualidade da visita. a ir para a direita; se o visitante tende a pegar sempre o
Na avaliação do Museu Lasar Segall, realizada caminho mais curto e, se havendo uma saída, ele será
a partir de entrevistas com estudantes que o haviam atraído para ela. Em suas observações, a autora
visitado com suas escolas no ano anterior, foi inserida percebeu que existem essas tendências, mas outros
uma pergunta sobre o prédio do Museu Lasar Segall fatores podem alterá-las, como o poder de atração de
(Como é o prédio do Museu Lasar Segall?). Nossa certas obras, a existência de várias saídas na mesma
intenção era saber se eles lembravam que o Museu Lasar sala, a quantidade e variedade de objetos apresentados.
Segall fica no local onde foi a casa e o ateliê do artista. Por exemplo, no “Salon Carré” do Louvre, dependendo
Como a pergunta era aberta, foram obtidas múltiplas da porta pela qual as pessoas adentravam, havia a
respostas (550 respostas de 448 respondentes): tendência de ir para a direita ou para a esquerda. A
• Local agradável – 28% princípio manteve-se a tendência a fazer o trajeto mais
• Casa do artista – 20,4% curto, mas de forma a poder apreciar o maior número

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de obras, assim, “é a direção que permite se aproximar onde vai com amigos ou familiares para se divertir. Isso
rapidamente do máximo de obras que será preferido” pode ser confirmado pelo fato de que apenas 12% dos
(GOTTESDIENER, 1987, p.59). respondentes tinham ido sozinhos, enquanto 45% foram
A autora também destaca a diferença de uma acompanhados de familiares e 23% de amigos
pesquisa sua, feita na França, de uma pesquisa de Melton, (ALMEIDA, 1995).
realizada nos Estados Unidos. Nas suas observações Apesar de muitas pesquisas indicarem que os
em museus de arte, registrou maior atenção das pessoas museus de arte são mais visitados por pessoas
diante de pinturas que estavam em salas mobiliadas. desacompanhadas do que outros tipos de museus, por
Melton, por sua vez, teria evidenciado que as pinturas permitirem experiências de contemplação e fruição
que fazem parte de ambientes de época reconstituídos individual (“razões reverenciais”), outras indicam o
detêm menor atenção dos visitantes. Certamente outros espaço do museu de arte como um local de interação
fatores deveriam estar interferindo nesses percursos social e de lazer de família (“razões sociais e
estudados, além do fato de tratar-se de sociedades com recreativas”).
tradições culturais muito diversas (GOTTESDIENER, As pesquisas de público do Museu do Louvre
1987, p.56). mostraram o museu como um espaço eminentemente
Entra, então, o terceiro círculo da intersecção social. Dos respondentes (com idade acima de 15 anos)
da experiência interativa: o contexto pessoal. Cada em 1999, 94% visitavam acompanhados, sendo 33% em
pessoa vai crescer num ambiente cultural que comporá pares, 32% em grupos de 3, 4 ou 5 pessoas e 27% de
parte de sua personalidade. O contexto pessoal engloba seis ou mais. Quase metade (49%) visitaram com
todas as motivações, conhecimentos e crenças do familiares e 30% com amigos. A divergência para outros
visitante, sua seleção e escolha de percurso e atitudes museus de arte pode se dar pelo fato de o Louvre ser
durante a visita e os eventos e experiências de reforço uma importante atração turística e um lugar para
posteriores fora do museu. A experiência de vida de “mostrar para alguém”, sejam crianças e jovens (motivo
cada um e o ambiente cultural em que está embebido, de visita de 12,5% dos visitantes de 1998) ou parentes e
certamente fazem diferença. Esses elementos do amigos (motivo de 16% dos visitantes de 1998). O
contexto pessoal só fazem sentido aqui quando Louvre é um espaço de socialização e aparece aqui,
relacionados à experiência interativa no museu. como variável significativa, a importância do museu
Inúmeros são os estudos que relacionam enquanto atração turística (OBSERVATOIRE
expectativas e motivações à experiência museal. Se uma PERMANENT DE PUBLICS, 1999 e 2000).
pessoa vai a um museu para fazer um trabalho escolar Os interesses, as crenças e conhecimentos
fará um tipo de visita; se estiver visitando como parte prévios também fazem parte do contexto pessoal. Muitos
de uma viagem de férias, a experiência será outra. estudos têm se concentrado nesses fatores,
Segundo Falk e Dierking (1992) seriam três especialmente aqueles que são realizados durante o
tipos de motivações para visitar um museu: planejamento da exposição. Um exemplo foi o estudo
1 - razões sociais e recreativas, ou seja, para se divertir, desenvolvido pela equipe do Musée de la Civilisation
estar junto em local agradável; du Québec, para conhecer as opiniões, curiosidades e
2 - razões educacionais; conhecimento do público-alvo sobre drogas, tema da
3 - razões “reverenciais” (reverential reasons), como exposição que estava sendo planejada. Os adolescentes
a busca de objetos únicos, monumentos sacralizados. entrevistados sugeriram que a exposição deveria ser para
Na avaliação da exposição do Museu do todos as faixas etárias e não somente dirigida a eles.
Instituto Butantan realizada por Adriana M. Almeida Solicitaram a apresentação de informações objetivas
foram entrevistados 125 visitantes à saída do Museu. sobre o tema, mas sem tom moralista. Um aspecto que
Perguntados sobre o motivo da visita, 58% responderam fez a equipe mudar uma parte da proposta inicial foi que
que foram à passeio e/ou turismo, 14% foram os entrevistados não gostariam de ver o tema tratado
acompanhar outras pessoas e 5% estavam na região e com humor, por ser uma questão séria demais para eles.
resolveram entrar. Ou seja, o museu biológico é um Todos esses resultados foram levados em conta, mas
espaço de lazer social para a maioria dos respondentes, utilizados criticamente na construção da exposição para

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que esta respondesse aos objetivos inicialmente propostos DAIGNAULT, Lucie. L’usage des études préalables
(DAIGNAULT, 1998). pour la conception d’exposition. Une étude de cas:
Em síntese, os diferentes aspectos da l’exposition DROGUES. In: DUFESNE-TASSÉ, C.
experiência museal podem ser estudados do ponto de (ed.) Évaluation et education muséale: nouvelles
vista do visitante/receptor, trazendo informações que tendances / Evaluation and Museum Education: new
possibilitam o aperfeiçoamento dos programas dos
trends / Evaluación y Educación museística: nuevas
museus voltados ao público, à ampliação do público e à
tendencies, CECA/ICOM/Canadá, 1998: p. 111-120.
maior freqüência de visitas aos museus.

ABSTRACT FALK, John; DIERKING, Lynn. Learning from


museums: visitor experiences and the making of
This article presents some communication models and meaning. Boston, Maryland: Altamira Press. 2000.
their application in the museum process and in the
audience research in these institutions. Some data of ______. The museum experience. Washington, DC:
national and international surveys in museums are used Whalesback Books. 1992.
to analyze the application of the models and the
similarities and differences of their visitors. There is an FUSARI, Maria Felisminda; DUPAS, Heloisa P.
effort to demonstrate the importance of such research Modelo semiótico textual da relação comunicativa.
and their expansion. Esquema desenvolvido em disciplina de pós-graduação
“Dimensões comunicacionais da cultura escolar em
Key-words: communication; museum; museum audience
sociedades de multimídias” na Faculdade de Educação
studies.
da USP. 1997.
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Agradecimentos: À FAPESP, pelo apoio financeiro às
OBSERVATOIRE PERMANENT DES PUBLICS. Le pesquisas de pós-doutoramento de Adriana Mortara
Almeida. Ao CNPq, pelo apoio às pesquisas de Maria
public du Musée du Louvre em 1999. Synthèse.
Margaret Lopes.
Relatório. (mimeo). 2000.

OBSERVATOIRE PERMANENT DES PUBLICS.


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Adriana Mortara Almeida é Pós-doutoranda do
RÚSSIO GUANIERI, Waldisa. Qu’est-ce que c’est la Departamento de Geociências Aplicadas ao Ensino/
Muséologie?. In ICOM Muwop – Museologiacal Instituto de Geociências na UNICAMP.
Working Papers, n. 2, 1981: p. 58-59.
Av. Pedroso de Morais, 144 Ap. 702
SECRETARIA MUNICIPAL DE CULTURA E VOX CEP: 05420-000 - São Paulo - SP
MERCADO. Primeiro diagnósticos da área cultural e-mail: amortara@ige.unicamp.br
adrianamortara@aol.com
de Belo Horizonte. Belo Horizonte: Secretaria
Municipal de Cultura. 1996.
Maria Margaret Lopes é Professora Livre-docente
STUDART, Denise; ALMEIDA, Adriana Mortara; do Departamento de Geociências Aplicadas ao Ensino/
VALENTE, M. Esther Alvarez. Pesquisa de público Instituto de Geociências na UNICAMP.
em museus: desenvolvimento e perspectivas. In:
GOUVÊA, G.; MARANDINO, M.; LEAL, M. C.
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caráter educativo dos museus de ciência. Rio de Janeiro: Artigo recebido em: 28/05/2003
FAPERJ/ Ed. ACCESS. 2003. p. 129-157. Aceito para publicação em: 03/09/2003

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