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José R e g i n a l d o S a n t o s G o n ç a l v e s

0s MUSEUS F A RFPRFSENTAÇAO D O BRASIL


0 5 M U S E U S C O M O E S P A Ç O S M A T E R I A I S D E
R E P R E S E N T A Ç A O S O C I A L

With good reason pastmodernism has relentlessly complexa. Um longo caminho geográfico e
innructed us thac renl~y15 mc$ceyet, so zt seem histórico deve ser percorrido, desde aquelas
to me, not enough surprise hos been expresred os to ações necessárias à aquisiçâo e elaboração da
know how we nevertheless get on liring, pretending matéria-prima indispensLve1para a produção
- tbankr to the mimeticfoculty - thnt we ltve até as ações de produzir, utilizar, adquirir,
facts. notf;mon.' colecionar, dasdcar, preservar e expor os
objetos materiais que compõem uma
Michael Taussig, MirnPsir o n d alteriry a exposição.
particular history of the senses O espaço material dos'museus é
constituído, social e simbolicamente, pelo
I Ao visitarmos um museu, mal tenso entrecruzamentode diversas relações
percebemos a complexidade do sistema de entre grupos étnicos, classes sociais, nações,
relações sociais e simbólicas que tornaram categorias profissionais, público,
a sua formapo e asseguram o seu colec~onadores,artistas, agentes do mercado
funcionamento. Percorrendo o circuito das de bens cuiturais, agentes do Estado, etc As
exposições, somos levados a esquecer todo o idéias e valores que norteiam essas relações
processo de produção de cada um dos são dramatizados por mel0 de uma "teia de
objetos materiais expostos, a história de cada si@icados" (Weber, 1978; Geertz, 1973),
um deles, como chegaram ao museu, assim cuja coerência e estabilidade são
como todo o trabalho necessário à sua permanentemente ameaçadas por
aquisição, class&ca@o, preservação e questionamentos externos e internos ao
exibição naquele espaço. Os agentes e as próprio campo. Meu objetivo k descrever e
relações que tornam possíveis esses processos interpretar parcialmente essa teia, suas
ficam na penumbra, em favor do ambigiiidades e tensões e revelar o seu papel
enquadramento institucional dos objetos na construção e no funcionamento dos
numa determinada exposição. museus como espaços materiais de
Na verdade, para que esta aconteça, é representação social no Brasil.
preciso uma extensa e complexa cadeia de Os museus têm sido associados, nas
ações sociais e simbólicas. Ao siniarmos essa modernas sociedades ocidentais, aos espaços
cadeia no tempo, além de sua configuração da ntlruro, no sentido da culturn letrada, da
no espaço, ela b m - s e ainda mais extensa e alta cultura ou da cultura enidita, por oposição

t
às eulruros populares ou à cultura de mossa. de produtos da chamada cultura erudita são
Espaços demarcados social e simbohcamente ~gualmenteincorporados, reinterpretados e
definem-se por uma relação de supremacia difundidos pelos meios de comunicação. Esse
ideológica em face de outras formas processo, é importante sublnhar, não se
culturais. Eles dramatizam, desse modo, uma desenrola num mesmo plano, em que tudo se
concepção espeuficamente ocidental e homogeneizaria num processo de g l o b d ~ z o ~ ü o
moderna de cultura. Enquanto, para as da cultura. Na verdade,
e transnocionaI~za~áo
sociedades tribais e para as sociedades esse processo de circulação da cultura está
complexas tradicionais, a cultura é pensada submetido a divisões e hierarquias, a
como algo intimamente ligado às estruturas nacionais e locais de natureza
experiências sagradas e profanas da vida social e simbólica, cuja lógica de
cotidiana e ao contexto de relações sociais funcionamento precisa ser decifrada para que
que estruturam essas experiências, nas se possam perceber os limites reais e avaliar
sociedades modernas a cultura veio a ser lucidamente os seus efeitos sociais.
oblettficada (Handler, 1985), concebida como Ao adquirir, por -nados meios, objetos
uma dimensão separada da experiência das mais diversas procedências, ao clasSicá-
cotidiana das relações socmis, como um 10s como componentes de uma determinada
espaço nobre que abriga um conjunto de coleção e ao exibi-los publicamente, os
objet~spassíveis de serem apropriados, museus modernos não somente exprusam
contemplados, preservados e representando como fabricam idéias e valores por meio dos
valores transcendentais. quais as relações entre sociedades, grupos e
As relações entre esse espaço nobre e as categorias sociais são pensadas. Seu estudo
demais formas de cultura, no entanto, vêm nos dá acesso aos mecanismos pelos quais
sendo progressivamente desestabilizadas e essas idéias e valores circulam sociaimente,
suas fronteiras demarcathrias aparentemente como são reproduzidos, reinterpretados e
enfraquecidas. Os produtos das culturas dissemúiados no espaço público das
populares e da cultura de massa são sociedades modernas. Aquilo a que Françoise
incorporados naqueles espaços; na qualidade Héritier chamou "simbólica elementar do
identicn e do diferente" (1979:217) é (Pomian, 1987; 2003; Poulot, 1993; Bann,
elaborado de modos partidares através 1994; McClellan, 1994; Beard, 1994;
daqueles procedimentos de aquisição, Bennen, 1995; Sberman e Rogoff, 1994;
classificação e exibiç80 de objetos pelos Jones, 1993). Esses estudos estão assouados,
museus. Oposições fundamentais do universo por um lado, As transformações ocorridas
social e ide6lógico moderno tais como nessas disupluas desde a Última década. Na
civilizado/primitivo, nacional/estrangeiro, antropologia, ao processo de auto-r$nnãu
erudito/popnlar, elite/povo, sobre os paradigmas antropológicos e que se
passado/presente e principalmente fazem presentes não somente nos textos dos
autenticidade/mantenhcidade são antropólogos mas também no espaço dos
representadas e disseminadas no espaço dos museus (Karp e Lavine, 1991, Karp, Lavine e
museus, o que os transforma em rico Kreamer, 1992). Na história, aos
material de estudo sobre os sistemas de questionamentos da predominânua da
relações sociais e os sistemas de idéias e história econômica e social e à configuração
valores vigentes no contexto das sociedades de uma história sonocultural ou politico-
modernas. cultural (Pomian, 2003), além da ampliação
Desde as duas últimas décadas do século das fontes utilizadas pelos historiadores,
passado, tem crescido notavelmente o daquilo que enfim é passível de ser
níunero de estudos produzidos sobre considerado material histdricu.
coleções, museus e patrimônios culturais, Por outro lado, esses estudos sobre
sobretudo nas áreas de antropologia e de coleções, museus e patrimônios dão
história. Os primeiros concentram-se em repercussão a aspirações e reivindicações
coleç6es e museus emograficos e étnicos formuladas por movimentos sociats de
(Clifford, 1997; 2003; Dias, 1991; Stoclang, natureza nacionalista, êtnica ou religiosa em
1983; Karp e Ladne, 1991; Karp, Lavine e defesa de suas respectivas concepções de
Kreamer, 1992; Thomas, 1991; Ames, identidade e memória. Um exemplo
1992; Jachis, 2002); os segundos, em ostensivo corrente desde os anos 60 é o
coleções e museus históricos e de arte processo de reivindícaç80, por parte de
sociedades nacionais e grupos étnicos, para
que rejam repatriadas coleções existentes nos
grandes museus ocidentais {Greenfield,
1987; Hass, 1996).
No Brasil, desde as duas Últunas dkcadas
do século assado, a l p estudos têm sido
realizados por antropólogos, sociólogos e
historiadores sobre coleções e museus
históricos, sobre os discn~sosoficiais do
chamado patrimôn~ohistórico e artístico
nacional e sobre concepções locais de
patrimônio cultural (Gonçalves, 1988;
1996; 2000; 2002; 2003; 2003a; Abreu,
1990; Rubmo, 1991; Santos, 1992;
Bittencourt, 1997; Fonseca, 1997; Menezes,
1992; Schwarcz, 1998;Abreu e Chagas
2003; Arantes, 1984). Fazem parte de um
processo de reflexão sobre a chamada alta
cultura ou cultura de elite em contraponto aos

II
estudos ceutrados nas chamadas culturas
ou na cultura de massa. Uma
dificuldade fundamental enfrentada por esses
estudns está precisamente na proximidade
que, como pe~~uisadoies,
mantemos com
esse objeto. Uma excessiva familiaridade
tende a nos mdunr a um procedimento de
celebraçào ou de ama*, inibindo o poder
de análise de nosso discurso. Ou, dito de
F m n d o r & 19rZ outra forma, essa excessiva familiaridade
pode levar por vezes os pesquisadores a

1
reeditarem em suas análises as idéias e
valores presentes nos discursos daqueles que
são seus objetos de estudo. A antropologia,
com sua tradição de estudo do outro, de
sociedades e culturas radicalmente distintas
I das nossas, e de cdtica permanente ao
~tnocentrismo,~ o d talvez
e se coiistituir num
excelente ponto de apoio para nosso
distanaamento em relação Aquele umverso.
~orrnandmde i943 Antes de tudo, é preciso colocar em
perspectiva as próprias teorias ocidentais de
cultura como algumas entre as teorias
possíveis, problematizando assim a sua Na medida em que, durante a pesquisa
univorsahdade. que realizei junto desses p~ofissionais,~
Minha sugestão é entender os museus intensifiquei meus contatos através de visitas
como espaços integrantes dos modernos a seus locais de trabalho e entrevistas, pude
"sistemas de arte e cultura" (Clifford, perceber algumas n u a n p em nossas
2003), por meio dos quais grupos e relações. Uma vez superada a fase dos
categorias sociais representam e constituem encontros mais formais, foi ficando claro
simbolicamente suas inter-relações e sua para eles que eu estava interessado não só nas
inserção na sociedade brasileira. A teorias museológicas e na história dos
estratégia assumida é a de focalzar os museus, mas na experiência cotidiana desses
processos cotidianos de construção e profissionais em seus ambientes de t r a b a l i ,
reconstrução desses sistemas do ponto de suas trajetórias na carreira, reiaçóes com seus
vista de seus agentes. Assumi como tarefa pares, com o público, com o Estado, com
inicial saber como o3 profissionais de outras fontes de financiamerito.
museus, aqueles que sâo responsáveis pela Euidentemente que a parar de então as
formação, preservação e exibição de relações se tomaram mais complexas e meus
coleções, concebem sua atividade e que entrevistados deixaram claro que estavam
relação estabelecem entre esta e os diversos determinados a me esclarecer a respeito do
grupos e categorias sociais que comp6em a que era um museu e o que era ser
sociedade brasileira e que, em princípio, museólogo, considerando que mmha posição
devem estar representados, de formas era a de um estranho naquele meio. Um
diversas, em nossos museus. estranho em termos sociais, uma vez que eu
O fato de iniciar esta reflexão assumindo não tinha vínnilos insfitucionais com museus
o ponto de vista dessa categoria - em vez de e escolas de museologia; e um estranho em
ter iniciado pelo público dos uluseus, ou termos culturais, já que, como antropólogo,
pelos colecionadores, ou ainda peks agências partilhava um outro código disciplinar.
e agentes do Estado respondveis pela Alguns temas básicos se impuseram
manutenção de gande parte dos museus desde os prnneiros contatos: os padr6es de
existentes no Brasil - deve-se a uma escolha Formação profissional, o papel social do
determmada: os profissionais de museus (em museólogo, as relações com o mercado de
geral, museólogos formados em um curso trabalho, etc. Sobretudo enquanto as
universitário, mas nem sempre) ocupam uma entrevistas se realizavam no espaço da escola
posição central no procesm de seleção, de museologia, onde inicia meus contatos.
identüicaçáo, autenticação, preservação e Quando as entrevbtas eram feitas no espaço
exibi* dos objetos que integram os acervos dos museus, o tema era o próprio museu e
dos museus. Eles fazem uma media+ sacia seu social, o sigrcado específico do
e simbólica estratkgica entre a sociedade, o trabalho dos museblogos e a trajetória de
Estado e o público. cada um deles. Evidentemente, um e outro
tema são interdependentes e a ênfase dada a campo no Brasil. Assim, talvez seja mais
cada um deles reflete os contextos prudente afirmar que esse processo de
mstitucionais em que foi conduzida a profissionalização obedece a tensões
pesquisa. específicas entre conjuntos diferenuados e
Entrevistamos uma série de opostos de idéias e valores quanto ao papel
profissionais, no Rio de Janeiro, vinculados a social dos museus e a identidade dos seus
diferentes museus, com trajetórias profissionais.
profissionais distintas, na maioria mulheres, e Vamos analisar dois temas
de gerqões diversas. Partilham todos a interdependentes que nos foram sugeridos
identidade profissional de museólogos pelos entrevistados:
expressa não só pela formaçâo e pelo título a) os padrões de formação dos
acadbico adquirido como pela sua efetiva profissionais de museus;
atuação nesse campo, sendo profissionais de b) as funções do museu e a
relativo presdgio junto de seus pares. Nessas espedcidade do trabalho dos seus
entrevistas, conduzidas, a maior parte, nos profissionais.
seus locais de trabalho, solicitamos que nos
contassem de que modo se tornaram FORMAÇÃO PROFISSIONAL E
museólogos e que descrevessem sua AS FUNÇÕES SOCIAIS DO
trajetória profissional. Formaram se todos,
MUSEU
em periodos distintos, na Escola de Museus
do Museu Histórico Nacional. Em seguida, No campo mternacional da museologia,
vieram a trabalhar inicialmente como desde os anos 60 e 70, abriu-se um extenso
estagiários e, posteriormente, c o m debate expresso nos congressos e nas
profissionais contratados no próprio Museu publicaqões Esse debate foi desencadeado
Histórico ou em outras museus públicos pelas teses identuicadas com a chamada novo
federais ou estaduais, no Rio de Janeiro ou museologio e que vieram a se contrapor
em outros estados. Muitos vieram a trabalhar concepç6es e aos modelos museográficos a.té
ou ainda trabalham como professores na enao vigentes. Embora a nova museologia já
formação de museólogos. não seja mais nenhuma novidade para os
Em linhas gerais, é possível perceber, profissronais desse campo, os debates por ela
através do depoimento dos entrevistados, que gerados, de certo modo, fazem sentir seus
ao longo dos Últimos 70 anos ocorreram efeitos até hoje e oferecem as coordenadas
mudanças significativas nas concepções de para a identiGcação das diversas posições
museu e de seu papel social e atualmente nesse campo.
conseqiientementenos padrões de formação Na verdade, a expressão novo museolagra
dos seus profissionais. Afirmar que essas é uma espécie de discurso guarda-chuva,
mudanças o&reram no sentido de uma abrigando posições hferentes mas que
progressiva pmfissionabza@o desse campo, mant$m em comum sua oposição ao que
embora não seja falso, pode induzir a uma seria o museu traámonai. Menos que um
visão iinear e teleolbgica da história desse discurso com fronteiras disciplinares bem
definidas, trata-se antes de tudo de um
movimento que veio a afetar amplamente os
padrões de formação de profissionais de
museus e colocar em questão o papel social
dessas instituiçoes em diversos países,
indundo-se o Brasil. Segundo os teóricos da
nova museologia, os museus devem assumir a
sua função eminentemente social e superar
os limites de uma concepção de cultura
restrita & produção e circulação de bens
culturais da elite, projetando-se assim como cnmpos da cultum, do ennno e da comuiuco~ão,e
instituições afmadas com uma sociedade também [pessoas escoIhidas] pelas comunzdades
democrática. 0 museu tradicional seria Iocais. Elafoz parte de uma corrente mmnaciond
&tista e voltado para si mesmo, distanciado que viso a reestrumar, animar e demmat~zmtudo
do cotidiano dos indivíduos e dos grupos que o que dzz respeito à mem0iia colenva e ri ma$o e,
compõem as modernas sociedades. mais particularmeme, oojdaeno museal
Uma obra coletiva publicada na França atualmente em pleno renor>nção(Nicolau, 1985).
em 1985, significativamenteintitulada
NouveUa muiéologies, organizada por Alain No prefbcio dessa obra, Hughes de
Nicolas e editada pela associaçáo Muséologie Varine, um dos criadores do coriceita de
Nouvelle et Experimentation Sociale - ecomuseu, faz uma ap&e de manifesto do
MNES expõe, através de entrevistas e artigos Muséologie Nouvde et Experhentation
de diversos autores sobre museus e Sonale: propõe que os profissionais de museu,
museologia, algumas idkias e propostas ou como ele os chama, les gens de rnusée,
bâsicas desse movimento. Segundo seu
organizador, . .tomem a paIaPrnfom dos circumtos oJ;cim;quc
se expresrem como profissionais e pesqur~doresde
nilssocmçõo ...Muséologie Nouvelle et rua próprio disciplina, emface dos teóncoa defora,
Experimentation So&le reúne profus1onols dos dos criticas e dosfunaondrios (1985).
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de uma fronteira rigidamente delimitada,
abrem-se para o exterior, enfraquecendo-se
e, nos termos desse discurso, fortalecendo as
relacões de comunica@o dos museus com a
sonedade como um todo.
É possível afirmar que é nos h t e s
dessas coordenadas ideológicas que se define
a identidade dos profissionais de museu a
parm dos anos 70 do século assado no
Brasil. Desde fins dessa década, uma série de
transformações ideológicas e htitunonais na
área de museus, parcialmente inspiradas pelo
dismso da nova museologia, provoca uma
redehçáo nos padrões de formação dos
profissionais? Essa red&~çZc vem opor-se
aos padr6es estabelecidos ao longo de
algumas décadas, desde os anos 30, quando
se instituiu a primeira escola de museologia
do Pais (Dumans, 1942).
A história da formaçZo dos profissionais
de museus no Brasil confunde-se, em grande
parte, com a história do Museu Histórico
Nacional, fundado por Gustavo Barroso. Os
paradigmas museográficos que, durante os
últimos 60 anos, nortearam a organização do
espaço dessa institução, os modos como
eram obtidas, organizadas e expostas suas
coleções, estão intimamente associados aos
padrões de formaçiio dos profissionais de
museu na Brasil. Gustavo Barroso, em 1911,

1 lança pelo jornal a idéia de criar um museu


histórico muitar (Dumans, 1942). O MHN
será criado em 1922, no governo de Epitácio
Pessoa, seu cunhado, que o indica para dirigir
a recém-aiada instituição. Gustavo Barroso
dirigiu o MHN desde a fundação até o ano da
sua morte, em 1959, quando foi subsatuído
por Josué Montelo. Este, por sua vez, veio a
~umondorde 1953 ser substituído por Leo Fonseca, em 1967,
que ficou ate 1972. Datam de então as
primerras mudanças ocorridas na insatuição, museus históricos, tendem a reproduw os
depois de décadas sob a direção do fundador. padrões que vieram a ser difundidos pelo
O primeiro centro de formação Museu Histórico Nacional.
profissional no Pais foi o Curso de Museus, A formação dos conservadores de
fundado pelo próprio Gustavo Barroso em museu, dos anos 30 até fm dos anos 60,
1932 (Decretona. 21.129,de 07/03/1932), estava centrada no seu treinamento para a
e que funcionou até 1979, nas dependências identificação, autenticação e preservação de
do Museu Histórico Nacional.' Foi então objetos.O nirn'culo do Curso mcluía
transferida para a Unrrio, onde funciona hoje disciplinas como História do Brasil, História
como Escola de Museologia. Inicialmente, o da Civilização, Arqueolop, Ewografia,
Curso de Museus Formava o que entao se História da Arte, Artes Decorativas, Técnica
chamava comervadorer de museus para de Museus, culo objetivo fundamental era
desempenharem suas funções no Museu preparar os profissionaiF para as tarefas
Histórico Nacional e no Museu de Belas consideradas essenciais para o funcionamento

Artes como funcionários públicos de um museu. Segundo um dos meus


(desempenhavam o cargo de 3s oficial do entrevistados, que participou, na qualidade
Museu). Era inicialmente um curso técnico, de professor, das mudanças curriculares
mas em 1951 foi-lhe conferido mandato ocorridas em fms dos anos 60, o wxrículo se
universitário, em acordo com a Universidade compunha, até então, de um conjunto de
do Brasil, o que lhe valia a condição de curso disciplinas, sendo que a principal destas,
superior. Ao longo de décadas, a maioria dos Técnica de Museus,
profwsionais de museus atuando no Brasil era
formada por essa escola, que tem (...) era um conjwito informo1 de conhecimentos
desempenhado papel crucial na formação de que se dava n respeito de todas os coisas ligadas ao
profissionais'e na disseminação de museu, ela era um pot-powri de conceitos e de
determinado modelo museográfico para o regros técnicas mistumdas. E m um pouco o que é
resto do País. Em linhas gerais, desde os anos museu, como se organiza, como é que administra,
30, os museus brasileiros, especialmente os era uma coisa pragmática (...) .
É provável que a forma@o propriamente mZo-de-obra menos qun-frcoda, você tem
profissional ocupasse uma posição estagiários, voluntárros, também.
subordinada em relação áo função mtitunonal
(funcionáriopúblico) e ideológica Segundo ele, havia certa mt~midadeentre
(representar a história da n@o) dos futuros os alunos e o Museu, entre os alunos e os
profissionais de museu. Daí o caráter pouco objetos do acervo. Havia uma relação
sistemático e fortemente instrumental do interpessoal cotidiana entre os alunos e
currículo do Curso de Museus. O número de aqueles profissionais que dirigiam e
alunos era, até os anos 60, mmto pequeno, mantinham em funcionamento o museu. Este
entre cinco e dez, anualmente. Na grande fato permitia aos alunos um tipo de formação
maioria, mulheres. E sua origem social estava pragmática que, nos dias de hoje, têm de
nos estratos mais altos da sociedade. O buscar através de estágios em outras
mercado de trabalho era bastante restrito e o instituições, uma vez que na Escola de
destino dos alunos, ao se formarem, era Museologia não existe essa possibilidade.

ocupar uma função em algum museu Alguns dos meus entrevistados criticam
financiado pelo Estado. fortemente essa ausência de um h c u l o
O fato de o Curso de Museus funcionar, cotidiano dos alunos com a prática
até 1979, nas dependências do próprio profissional, o que Iwa a uma relação
Museu Histórico, permitia uma relação excessivamente teórica com a profissão e a
próxima entre os alunos e a prática uma limitada capacitação técnica fundada na
profissional no cotidiano de um museu. experiência.
Segundo um dos meus entrevistados, Numa relação necessária com esse
padrão de formação pro6ssiona1, o
Era uma vivência cotidiana, porque 80% dos sipficado do museu e da prática de seus
eromfununuonários do museu. Então uma prof~sionaisera pensado a partir de uma
g~andefomiJ~a,
o diretor dava aula, os teia de relações mterpessoais entre
funcionárim [sic].Então era d i r d você não estar dirigentes, técmcos de museus e membros
envolvido. (. ) O aluno era chamado, como umo de famílias de elite. O museu era ~ u i s a d o
como um espaço onde se representava a O retmto de qualquer uma das salas
história do B r a d por intermédio de arrumados na +oco de Barroso nos dó o sensação
coleções que se formavam a partir dessas de que a rupembund8ncia sm conndaoda o meio
relações dirigentes e as famílias de elite. Esse mais adequado para que as obras adquirissem
ponto já foi assinalado, respemvamente, por valor Praucameute todo o acervo a m a aposte As
duas monografias que tomam os espaço do louças ou aparelhos de cer<lmica tinhmn quarentn
Museu Histórico Nanonal como objeto de ou mais pratos, todos expostos, lado a lado. Os
descrição e análise (Santos, 1988; Abreu, objetos literalmente empilhavam-re Armas,
1990). Ao profissional de museu cabia, banderras, canhóes. louças, tudo em grande
então, um papel mediador entre essas quan~dode.Essa profusâo simbBlizava a
f m l i a s e o processo de identificação, copacidade que tmhom estes +tos de
preservaçTio e exibipo dos objetos que tesmunhar sobre a realidade Mas estas r e l i p a s
constituíam os acervos. do p m d o eram mostradas ao público obedecendo
Os objetos, valonzados pelos seus a uma lógica que Ihes pertencia. As peps de um
atributos internos e pelo fato de terem aparelho da Companhia das índias não po&am ser
pertencido a membros daquelas famílias, a separados. É como se elasjssem capazes de duer
personagens historicos e a heróis nacionais, mais do que qualquer um sobre o tema, eramfvute
autenticavam as narrativas históricas sobre o de inesgotável saber, parte da realdade a $81
Brasil. Esses objetos eram, em geral, doados descoberta por mda visitante Quem entmsse em
por essas f d a s , e as coleções formadas uma salajamau poderia pensar ter captado todo a
recebiam o nome do antepassado celebrado. sentido nela embutido Não havia uma memogem
Em um estudo sobre a coleção Miguel por p ~ n edo Museu, mas m~lhores(1988:44).
Calmon, do Museu Histórico Nacional,
Regina Abreu (1990) chama a atenFo para a Esse modelo de museu e o concomitante
relevânua dessas relações na história da padrão de formação profissional certamente
instituiçio. Essa dimensão entrará em se romperam. Romperam-se ou ao menos
dechio nos anos 70 e 80, quando serão Eragilizaram-se as reiações entre as elites e o
acionadas estruturas burocráticas, como as espaço do museu, sobretudo a partir dos
associações de amigos para mediar suas anos 70. Mudaram as relações entre os
relaç6es com a sociedade.A nação era museus e o público, Tomaram-se mais
representada de forma totalizadora e por impessoais, tecnicamente mediadas, e esse
intermkdio dessa teia de relações e desses processo refletiu-se nos modelos
objetos. No espaço do museu, a exemplo do museográficos, no modo como eram
que ocorria no nurículo do antigo Curso de concebidos e expostos os objetos. assim
Museus, os objetos ocupavam a posição como no modo de representação da
central. Estes eram dispostos de forma a identidade nacional brsileileira, conforme
evidenciar iim excesso, como assinala Myrian veremos mais adiante.
Sepúlveda dos Santos em sua anáhe a h mudanças provocadas pela nova
respeito do Museu Histórico Nacional, nos museologia repercutem no Brasil a partir dos
Últimos anos da direção de Gustavo Barroso: anos 70 sobre o ~ i c u l do
o antigo Curso de
Museus e sobre as concepções de museu e de
seu papel social. Entre as mudanças ocorridas
no campo esta asubstituipão do antigo
currfculo por um outro cujo centro
organizador era constituído pelas disciplinas
de Museologia e a Museografia.
Segundo um dos entrevistados:

Comem a estudar os conteúdos do Iiuta...


[um livro sobre técnica de museus usado
tradicionalmente na Escola no tempo de
Gustavo Barroso], dgo, olha esses c o n ~ ú d o snão
~
são uma coisa sd, I S S ~a q u ~CoracterIza duc1~11na
espec$cos, no área nu museologia e no área da
museograjia, diferenciação essa que não ara
conhecida por gerapes de museólogos. Não hano
esse ronhecimento de que museologia é uma área
do conhecimento que tem uma teoria própria e
que, a partir dessa teoria, hd uma prática que h a
museqrajio, que k o escrita do museu.

A partir de então, o currículo do curso


estará fundado na disciplina da Museologia
que, para muitos, é uma teoria científica,
supostamente com objeto e métodos
próprios. Seu objeto é o fato museal, que não
se hmitaria ao que ocorre no espaço
tradicional dos museus, mas pode ocorrer
em qualquer outro espaço, ampliando-se
assim os limites do que se entende por
museu. J&a Mnseogda trata das práticas
profissionais por meio das quis se
constituem osfatos museais. Para outros, a
Museologia não chega a se constituir numa
ciênc~icia,mas apenas numa disuplina cujo
produto é uma reflexãd permanente sobre as
práticas museográficas e a sociedade. Para os
que defendem a Musenlogia como uma
teoria científica, M um espaço garantido para
a Musedog~ana academia. Para os outros,
esse espaço é apenas uma dimensão, mas
--* certamente não essencial, das práticas conceituais. Isto seria uma espécie de núcleo
s museográficas, as quais se realizam no espaço da profissão, o qual tenderia a se dissolver
4 da sociedade de modos va~iados.~ porque os novos prof~sionaissão formados a
o n O c u r r í d o adotado no Curso de distância dos museus e dos acervos, mais
" ..
<
z : Museologia, na &poade minha pesquisa (ver envolvidos que estào em debates teóricos
"
-
0 i
" L Anexo I), dá grande peso a disaphas sobre a Museologia (Gonçalves, 2003a).
i
- d teóricas como a Museologia, embora outras
* disuplinas, que integravam o currículo ESTRUTURAS CONCEITUAIS
S
anterior sob a rubrica deTémica de Museus, E A MAGIA D O S O B J E T O S
0 2
Y
I ainda se fizessem presentes. Essas disciplinas,
o
- -
a
.
m
-
*
2e
no entanto, ocupam uma posição No contexto desse processo, tal qual
este se configurou a partir dos anos 70, a
r > subordinada em relação às disciplinas de
-=
a O
Museologia e Museografia, centros identidade dos profissionais de museu, como

-
z

r
ç
-
o
r,
'd.i estruturadores do que veio a ser o novo
curríeiilo. Nesse sentido, a formação do
projsnonm, passou a ocupar uma posifão
hierarquicamente superior no que diz
j profissional de museu a partir dos anos 70 respeito b funções instituaanais e
9
* passou a se d e f i mais fortemente a partir ideológicas que desempenhavam em relação i
< 2rn
+
-
I/
-- da categoria Museologio. Isto significou uma sociedade, o que vai repercutir sobre o modo
>
intensi6caçào do processo de como é representada a identidade nacional e
e
prof~sionalização. outras identidades socioculturais, Até os anos
Vale assmalar que os efeitos desse 60, eles operavam fundamentalmente como
processo não se realizam, no entanto, de responsáveis pela representação da nação
maneira direta e automátita, mas mediados pensada em sua totalidade. Dos anos 70 em
pelo código cultural que norteia a prática dos diante, essa representação cede twreno a
268 museus Deste modo, enquanto para muitos uma visão fragmentária, na qual se acentuam
museblogos a profissionalização e todos os as identidades particulares de grupos e
seus efeitos &o vistos positivamente, para categorias sociais. A extensa proliferação de
outros esse processo trouxe uma perda de museus na última d&cadapode ser pensada
qualidade na formação dos profissionais, e tomo um sintoma desse processo de
que repercute em suas práticas. Para estes, há f r a g m e n e o nas formas de representação
uma relativa dissolução da identidade do das identidades sociais e culturais. Essa
museólogo na medida em que se deslocou a mudança ocorre concomitantemente a
Mase dos obletos materiais para estruturas mudanças no padrb de formação dos
conceituais ou textos. Desse mesmo ponto museblogos, na prbpria concepção de museu
de vista, a espedcidade dos profissionais de e nas relações dos profissionais com o
museu está precisamente numa relação mercado.
sensível c o h os objetos, relação mediada pela A profissionalizaçáodos museblogos
visao e pelo tato -o que os diferencia do corresponde uma disciphaçào do discurso
historiador e do uentista social, que museológico e um afastamento de uma
trabalham fundamentalmente com estruturas determinada concepção de museu a que
chamei "museu narrativa'', em contraposição relação ao modelo do museu-narrativa, passa-
ao -museu-informação" (Gonçalves, 2003a). se de uma forte ênfase dada aos objetos (tanto
No primeiro caso, o profissional de museu em termos de formação profissional quanto
está imerso numa teia de relações pessoais em termos de modelo museográíico) para
por intermédio das quais circulam os objetos uma ênfase &sesiruturas conceituois, em textos,
materiais que vêm a ser apropriados e dominantes no -museu-informação"
classificados pelos museus. Há um público (Gonçalves, 2003). Os textos ganham um
restrito e os museus constituem-se papel central, enquanto os objetos tendem a
parcialmente de espaços de celebração dos assumir a função de suportes materiais das
valores das elites sociais que representam a mensagens veiculadas. No primeiro modelo,
nação de modo totalizador. No segundo caso, os objetos mantinham a sua capacidade
o profissional é deffido pela sua autonomia, evocativa, na medida em que existiam como
pelo saber específico de que é detentor, mediadores simbólicos entre as familias de
assumindo a função de atender não a um elite e o espaço do museu, no qual se
público restrito (fadias de elite), mas a um representava a nação por meio de valores
público amplo, impessoal, um público no transcendentes dramatizados por herbis
sentido moderno do termo. nacionais. No segundo modelo, os objetos
Nesse processo de afastamento em passam a desempenhar função subordinada,
já que a missáo principal do museu passa a não dão conta do nacional e que representar
ser pensada como a de representar, da o Brasil tornou-se uma tarefa bem mais
maneira mais objetiva possível, isto é, por complexa. A concepção e a reaiizaqão de um
meio de estruturas mceituais, o cotidiano projeto de módulo num museu, hoje em dia,
dos diversos grupos e categorias sociais que supõem a participyia efetiva de profissionais
compõem a sociedade bradara. diversos, na qual historiadores e
Os museólogos entrevistados assinalaram antropólogos, no caso dos muwus histktricos
que o mercado de trabaiho, embora pequeno, e museus de cultura popular, têm papel
vem-se ampliando em função da criaFo de central. Há, portanto, uma forte consciência
novos museus desde a ú i m a dêcada e devido de que o Brasil a ser representado é menos
à própria rede6nição da atividade do uma totalidade já concluída, composta por
museólogo a partir do discurso da d o r e s transcendentes e heróis nacionais, do
museologia. Assim, o profusional de museu que um processo conhrigencial de construção
atualmente não se vê limitado &perspectiva com base em fragmentos de sociedade e de
de se tomar um funcionário público em cultura, representaçóer do cotidiano de
algum museu do Estado: pode ser contratado diversos grupos e categorias sociais situados
por empresas privadas ou por grupos e no espaço e no rempo histórico.
categorias sociais empenhadas em firmar Mas, além dessa variação diacrônica e
publicamente sua memória e identidade. Na siucrônica nos conteíldos da reprrsentaçáo da
medida em que esses temas se tomam mais e na@o nos museus brasile~ros,é preciso
mais relevantes no espaço público dos enfatizar que a variação também 6
grandes centros metropolitanos (Gonçalves, perceptível nas modalidades mesmas de
2003a), é um processo ainda em expansão. entendimento da linguagem museográfica.
Fato merecedor de destaque é que esse Não é absolutamente irrelevante assinalar
processo tem trazido efeitos sobre a maneira que o que está no coração mesmo desses
como os prof~sionaisde museu vêm processos de representação no espap dos
pensando suas atividades no que se refere ao museus ê o fato de ali se desenrolar uma
modo de representapo da identidade linguagem espe&ta, articulada por meio de
nacional brasileira e dos vários grupos e espaços, imagens e objetos matetia~s,e que
categorias souais que a compóem. O ponto- não traduz de modo transparente uma
chave de minha argumentaçáo é que, à lmguagem de conceitos.
profissionalização d a vez maior dos Em outra palavras: se fosse possível
museólogos, vem correspondendo um modo dizer por intermédio apenas de palams (por
de representaqão do Brasil cada vez mais escrito ou oralmente) o que digo por meio
dependente de perspectivas singulares de de disposiçiies espaciais, imagens e objetos
grupos e categorias sociais, sem o materiais, como se faz nas exposições nos
pressuposto, de que estejam representando o museus, por que gastar tantos recursos com
Brasil como um todo. Um de nossos estas? Estamos diante de problemas
entrevistados afirma ter clara consciência de específicos susritados pela natureza da
que atualmente os profissionais de museus representaçáo museogr&ca. Não basta dizer
que os museus reprwentam identidades ANEXO I .-
4

nacionais, identidades étnicas, religiosas, etc. L


m

É preciso responder por que essas 1 R a d m peúodo: a) Metodobgia da Pesquisa Aplicada z 2


representações feitas por meio de objetos
a Museologia; b) Intraduqãa ao Estudo das Ciênoaii; d) -
/j !e
0

htroduqão &TeoriaMuseológica, e) História da "


<
materiais continuam a exercer sua magia e a Cidizqão I; I)Sentido e Foma da Produ@o Arb'stia; $
D Y
L
despertar fascínio nas pessoas. A pergunta g) Imoduçãa à Adminishaçâo. "
- 0.

E
expressa na epígrafe deste artigo deve ser
2 Segundo período: a) Museologia I; b) M u s e ~ a O a c; )
Antropologia I; d) Histeria da Ci&a@o li; e) História
- d
Y

objeto de reflexão. do Bmil I; 9 Sentido e Fonna da Pmduqáo Artística U. 4 :


u
Uma sugestio, uma vez que não há 3 íerniro periòdo: a) Antropologia U; b) Preservaqão de 0
z,
n E
espaço para desenvolvermos adequadamente
Bens Culmais 1; c) História da Civiuza@o UI; d)
IHistbria do Basil 11; e) %tido e Forma da ProdqXo ,-
" <4
O
esta discussão nos Limites destas páginas, (: que Artística Ul; f) ~dehtibcica@ode Motivos eTécaicas
Arb'sticas; g)Amaria e Insmimentos de Suplicia.
Q

a
-
=
- E
=
os objetos materiais, ao contrário do que ::
4 'grtoperIodo: a) Anhopologia UI; b) Prerem@o de o O
pensamos usualmente, não se restringem i -
CulmaisU; c) Pradqão Artistica no Brasil I; d) = *D
Q
o*- de suportes de significados. N a e = z
sentido, os espaças dos museus, assim como
História do Brasil RI; e) Modernismo: Forma e'
Processo; Heráldica e Oiganizqão Nobiliárquica: g)
-
-
r
Y

2
i

os objetos materiais que abrigam, & são


Acervos Religiaiaa. a :
5 Qdmperiodo: a) Museaiagia U; lr)Museografia E;c) o >
apenas instrumentos de representaçFio ou de P r o d ~ ~ ã o ~ d s tno
i c Brasil
a U; d) Evolu$ão do i
4 'r
invençFio da M@Oou de quaisquer outras Vesmbio; e) N-ismátioa 1; 9 Hiatória do Brad N ; g) n 4
categorias. Estas representayões são, na
Antropologia N; h) Vmguarda: Forma e Processa. -
>
6 Saco p m i ~ d ajMuseologia
~: 111; b) MuseogreJk 1U; c) w
verdade, vindas como fatos, não como Pm-ção Arfística n o Brad; d) Arqueologia I; e)
ficções, E os objetos materiais, especialmente Condecoações e Bandeiras; 9 N&&tiea 11; g)
Vidras, Cristais, Cwâmicas, Faiangas e Porce-, h)
os objetos de museu, desempenham h + o
Owívesaria e Brmes.
estratégica neste processo. Os objetos 7 Sbbq~eriodo:a) Mumlogia Ni b) Museogda 1V;
contemplados nas exposições históricas ou c) Arquwlagia n; d) Crítica da Produpo Artística; e)
Mobiliário.
emográficas são percebidos como metonhias 271
8 O ;itim piodo indui. a) estágio obrigatório, b)
de realidades distantes no espaço ou no monoF& e mais as disciplinas de c) Tapetes e
tempo, estabelecendocom elas uma relaçáo TapeçariaF e d) FilosoCa Critica da Cufhna.
de contmindade sensível. E nesse sentido
desemp&afn papel ativo, ao impr%drem
realidade, materialidade e visibilidade a
categorias abstratamente formuladas,
mediando o visível e o iniisível (Pomian,
1987). Uma pista para o entendimento da
natureza específica da linguagem ABREU, Regma. O d t o dasaudade no templo dos
imorais Tese de mestrado apresentada ao PPGAS do
rnuseográb, da sua d i m d o visual e mesmo
Moseu N a d d da UFRJ, 1990. (Mimeografado)
t á d , esteja talvez na advertência institucional e CHAGAS, M&XQ(ora). Memdrie e
òirigida, por escrito, ao olhar de todo visitante potrimâmo- wisaios contanpo&eos Rio de Janeiro
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WEBER, Ma*. Emomy and mciety: an outUne o5 têm uma histMa de empreendimentos mshtuoows e
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WITTICH, Claus (ed.).pítulot] Univmsitg of disnnniva. por exemplo,tais empreendunetitas
Caluornia Press,1978.2 v. expressam-se par meio de alpnas p o s i ~ hdentro do
campo Aipuas defendem a wrtência de uma teom
dofoto musp~l,assummdo a s m a nstureza aendjh da
museologia. Outrasenfahram urna eoncep$há da
profissão a par0r da museograüa, que seria
baa-ente a prálicados museus.

1 Com boas razões, o Pós-modemiamo tem-nos


mostrado incansavelmenteque a realidade 6 um
&cio, ainda que, assim me parece, não muita
surpresa tenha sido expressa em rei+ a sabermos
como, apesar disso, n6s contmuamos a viver
acreditando g i a p s à faculdade da mimese - que
vivemos fams e não fic+es.
2 Este artigo é resultado do projeto Museus m o
Sistemas Culturais: uma Perspectiva Antropológica,
financiado pelo CNPq na década de 1990, e que deu
continuidade aos estudas que já vinha r&do, desde
a década de 1980, sobre os discursas do patrimônio
cultural no Brasil (Gonçalves, 1988; 1996; 2000; 2002;
2003; 2003s).
3 As entrevistas foram feitas em 1994 e i n c l h
profissionais do Rio de Janeiro l p d o s ao Museu
Histórico Nacional e à Escola de Museologia da Unirio,
aos quais sou bastante grato pela atençáo e gentileza
com que me receberam. Destaco en*e eles o professar
Mário Chsgas, então diretor da Escola de Museologia
da Unirio, que partilhou comigo o seu r e f i d o
conhedmento sobre a história dos museus brasileiros.

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