UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

DEPARTAMENTO DE ECONOMIA E RELAÕES INTERNACIONAIS

TEORIA MICROECONÔMICA I
PROF. MARCELO S. PORTUGAL e JOÃO RICARDO R. MOREIRA
2º SEMESTRE 2017
1º PROVA

1. Considere a seguinte função de utilidade:

𝑈(𝑥1 , 𝑥2 ) = 𝑥16 𝑥24 + 1,5 ln 𝑥1 + ln 𝑥2

i. Encontre as curvas de demanda para os dois bens e classifique-os como
complementares ou substitutos; (1,5 ponto)

𝜕𝑈 6𝑥 5 𝑥 4 + 3 12𝑥16 𝑥24 + 3 3
1 2 2𝑥 2𝑥 2𝑥 3𝑥2
𝑇𝑀𝑆 = 𝜕𝑥 = 1
= 1
= 1 =
𝜕𝑈 1 6 4
4𝑥1 𝑥2 + 1 1 2𝑥1
4𝑥16 𝑥23 + 𝑥
𝜕𝑦 2 𝑥2 𝑥2

Igualando a TMS e a razão dos preços, temos:

3𝑥2 𝑝1 2𝑝1 𝑥1
= ⇒ 𝑥2 =
2𝑥1 𝑝2 3𝑝2

Substituindo 𝑥2 na restrição orçamentária, encontramos a demanda ótima do bem

1:

2𝑝1 𝑥1
𝑝1 𝑥1 + 𝑝2 ( )=𝑚
3𝑝2

3𝑝1 𝑥1 + 2𝑝1 𝑥1 = 3𝑚

3𝑚
𝑥1∗ =
5𝑝1

Substituindo 𝑥1∗ de volta em 𝑥2 , encontramos a demanda ótima do bem 2:

2𝑝1 3𝑚
𝑥2 = ( )
3𝑝2 5𝑝1

2𝑚
𝑥2∗ =
5𝑝2

ii. Encontre as curvas de Engel para ambos os bens e calcule as suas elasticidades
renda. Os bens são normais ou inferiores? (1,0 ponto)
A curva de Engel denota a demanda de um bem como função da renda, mantendo
os preços dos bens constantes. Assim, no presente contexto podemos fazer as
seguintes substituições:
 3 2
𝑘1 = 𝑒 𝑘2 =
5𝑝1 5𝑝2
Então as curvas de Engel serão:
𝑥1 = 𝑘1 𝑚
𝑥2 = 𝑘2 𝑚
As elasticidades renda da demanda serão:
𝑑𝑥 𝑚 𝑚
𝜀𝑚 = = 𝑘𝑖 = 1, 𝑝𝑎𝑟𝑎 𝑖 = 1,2
𝑑𝑚 𝑥𝑖 𝑘𝑖 𝑚

2. Suponha que João deve pagar $2 para participar de uma competição cujo prêmio é de $19
e a probabilidade de ganhar é 1/3. Se o agente possui uma função de utilidade definida por
𝑈(𝑥) = log(𝑥) e o seu nível corrente de riqueza é $10, ele vai escolher participar da
competição? Por quê? (1,5 ponto) João é avesso, neutro ou amante do risco? Justifique. (1,0
ponto)
João é avesso ao risco, pois sua função de utilidade é côncava, como segue:
1
𝑈′ =
𝑥
1
𝑈 ′′ = − 2
𝑥
Além disso, do enunciado temos que:
 Probabilidade = 1/3: Ganho esperado = 10 + 19 - 2 = 27
 Probabilidade = 2/3: Ganho esperado = 10 - 2 = 8

Fará sentido participar da competição se a utilidade esperada de Von-Neumann-

Morgentern for maior do que a utilidade de ter uma renda certa. Isto é, 𝐸(𝑈(𝑤)) >
𝑈(𝑤0 ), no qual 𝑤0 é a renda certa.

𝑈(𝑤0 ) = 𝑈(10) = log 10

1 2 1 2
𝐸(𝑈(𝑤)) = log 27 + log 8 = log 33.3 + log 23.3 = log 3 + log 22 = log 12
3 3

Como 𝐸(𝑈(𝑤)) = log 12 > log 10 = 𝑈(𝑤0 ), faz sentido João participar da
competição.

3. Diga se cada um dos itens abaixo é verdadeiro ou falso e justifique detalhadamente a sua
resposta.

a. Sendo a curva de demanda negativamente inclinada e linear, a elasticidade-preço é

constante. (1,0 ponto)
FALSO. A elasticidade-preço varia com o preço ao longo de uma curva de demanda
linear. Isso é, depende do ponto onde está sendo calculada. Para constatarmos,
tomamos como dado uma demanda linear 𝑄 𝑑 = 𝑎 − 𝑏𝑝. Então, a elasticidade-preço
da demanda será dada por:
 𝑑𝑄 𝑝 𝑝 1
𝜀𝑝 = = −𝑏 =− 𝑎
𝑑𝑝 𝑄 𝑎 − 𝑏𝑝 −1
𝑏𝑝
Ou seja, a elasticidade depende dos valores do preço (p). O que é constante é apenas a
derivada e não a elasticidade.
1
b. Para a função de utilidade 𝑈(𝑥, 𝑦) = (𝑥 𝜌 + 𝑦 𝜌 )𝜌 , as taxas marginais de substituição
calculadas para as cestas (2, 3) e (4, 6) são idênticas. (1,0 ponto)
VERDADEIRO. Note que a TMS é dada por:
1
𝜕𝑈 1 (𝑥 𝜌 + 𝑦 𝜌 )𝜌−1 𝜌𝑥 𝜌−1
𝜌 𝑥 𝜌−1
𝑇𝑀𝑆 = 𝜕𝑥 = 1 = ( )
𝜕𝑈 1 𝜌 𝜌 −1 𝜌−1
𝑦
𝜕𝑦 𝜌 (𝑥 + 𝑦 ) 𝜌𝑦
𝜌

Assim, se considerarmos as cestas do enunciado, teremos:

2 𝜌−1
 (2, 3): (3)
4 𝜌−1 2 𝜌−1
 (4, 6): (6) = (3)

Ou seja, as taxas marginais de substituição são idênticas.

c. No caso de preferências do tipo Cobb-Douglas, a elasticidade-preço cruzada da

demanda por bens é nula, enquanto a elasticidade-preço da demanda por cada um
deles é unitária (em módulo). (1,0 ponto)
VERDADEIRO. Uma função de utilidade Cobb-Douglas é dada por 𝑈(𝑥, 𝑦) = 𝑥 𝛼 𝑦 𝛽 .
Note que as demandas ótimas pelos bens x e y, neste caso, são como se seguem:
𝛼𝑚 𝛽𝑚
𝑥∗ = 𝑒 𝑦∗ = , 𝑜𝑛𝑑𝑒 𝑚 é 𝑎 𝑟𝑒𝑛𝑑𝑎
(𝛼 + 𝛽)𝑝𝑥 (𝛼 + 𝛽)𝑝𝑦

Então, as elasticidades-preço das demandas serão:

𝑑𝑥 𝑝𝑥 𝛼𝑚 𝑝𝑥
𝜀𝑝 = =− 𝛼𝑚 = −1
𝑑𝑝𝑥 𝑥 (𝛼 + 𝛽)𝑝𝑥2
(𝛼 + 𝛽)𝑝𝑥

𝑑𝑦 𝑝𝑦 𝛽𝑚 𝑝𝑦
𝜀𝑝 = =− = −1
𝑑𝑝𝑦 𝑦 (𝛼 + 𝛽)𝑝𝑦2 𝛽𝑚
(𝛼 + 𝛽)𝑝𝑦

Enquanto que a elasticidade-preço cruzada será:

𝑑𝑥 𝑝𝑦 𝑝𝑦
𝜀𝑝𝑐 = =0 𝛼𝑚 =0
𝑑𝑝𝑦 𝑥
(𝛼 + 𝛽)𝑝𝑥

d. Considere um modelo de escolha intertemporal com dois períodos (t= 0, 1). Considere
um consumidor com uma função de utilidade 𝑈(𝐶0 , 𝐶1 ) e que ele receba toda a sua
renda no período 0. Assim, taxa de juros afeta a decisão de poupança desse indivíduo,
mas não tem efeito sobre sua decisão de tomar crédito. (1,0 ponto)
 VERDADEIRO. Em termos genéricos, podemos representar a equação de restrição
orçamentária intertemporal trazida a valor presente (VP) ou a valor futuro (VF) como
segue:
𝐶1 𝑀1
𝑉𝑃: 𝐶0 + = 𝑀0 +
1+𝑟 1+𝑟

𝑉𝐹: 𝐶0 (1 + 𝑟) + 𝐶1 = 𝑀0 (1 + 𝑟) + 𝑀1

onde 𝑟 é a taxa de juros, 𝐶𝑖 é o consumo no período i, 𝑀𝑖 é a renda no período i e

i=1,2.
Como a renda é recebida integralmente no período 0, 𝑀1 = 0 e a restrição
orçamentária intertemporal em termos de VP e VF podem ser escrita como segue:
𝐶1
𝑉𝑃: 𝐶0 + = 𝑀0
1+𝑟

𝑉𝐹: 𝐶0 (1 + 𝑟) + 𝐶1 = 𝑀0 (1 + 𝑟)

Então, se a poupança é uma maneira de postergar a renda para consumo futuro, vemos
que este indivíduo levará em consideração a taxa de juros para que ele possa consumir
mais no período 1 (ver VF acima). Por ouro lado, se o crédito é a forma pela qual os
agentes podem antecipar a renda de períodos futuros para ampliar seu consumo atual,
para este caso específico, o indivíduo será indiferente à taxa de juros, uma vez que ele
não dispõe de renda no período 1, de modo que sua renda no período 0 não poderá ser
expandida (ver VP acima).

e. A criação de politicas públicas que distribuem dinheiro para os pobres (como o

programa bolsa família) têm um impacto positivo sobre o bem-estar dos indivíduos.
Contudo, elas exercem um efeito negativo de redução da oferta de trabalho desses
indivíduos. (1,0 ponto)
FALSO. A primeira parte deste item está correta, mas a segunda parte não é
necessariamente verdadeira.
Caso o lazer seja considerado um bem normal, o aumento da renda proveniente do
dinheiro extra, terá o efeito de eleva a demanda de lazer e consequentemente reduzir a
oferta de trabalho. Neste caso, a afirmativa seria verdadeira.
Contudo, se o lazer for considerado um bem inferior, o aumento de renda decorrente
do benefício social, fará com que haja menor demanda por lazer e se eleve a oferta de
trabalho. Neste caso, a afirmativa é falsa.
Para ter uma ideia melhor a respeito do efeito do benefício social sobre a demanda de
lazer e oferta de trabalho considere o gráfico abaixo, que analisa a demanda de lazer
(l) e outros bens (x).
Repare que o recebimento do benefício social (b) desloca a restrição orçamentária
para a direita. Assim, o indivíduo aumenta sua utilidade, pois pode alcançar uma
curva de indiferença maior (U2), uma vez que sua renda aumentou. Entretanto, note
que não necessariamente a demanda por lazer se elevará, pois isso depende de onde
ocorrerá a tangência entre a nova restrição orçamentária e a nova curva de indiferença.
Como não se sabe ao certo qual será o real efeito do programa sobre a demanda por
lazer, também não é possível confirmar que haverá um efeito negativo de redução da
oferta de trabalho desses indivíduos.