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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

DEPARTAMENTO DE ECONOMIA E RELAÇÕES INTERNACIONAIS


TEORIA MICROECONÔMICA I
PROF. MARCELO S. PORTUGAL
I SEMESTRE 2022
1ª PROVA

(1) Dada a função de utilidade 𝑈(𝑥1 , 𝑥2 ) = 𝛾𝑥1𝛼 + 𝛽𝑥2 onde 𝛾, 𝛼 e 𝛽 são constantes, pede-se:
a) Encontre as curvas de demanda para os bens 𝑥1 e 𝑥2 . (1,0 ponto)
Solução:
Para encontrarmos as curvas de demanda, primeiro devemos montar o lagrangeano:
𝐿 = 𝛾𝑥1𝛼 + 𝛽𝑥2 − 𝜆(𝑝1 𝑥1 + 𝑝2 𝑥2 − 𝑏)
Encontramos as condições de primeira ordem e isolamos 𝜆:
𝐿1 = 𝛼𝛾𝑥1𝛼−1 − 𝜆𝑝1 = 0
𝛼𝛾𝑥1𝛼−1
𝜆=
𝑝1
𝐿2 = 𝛽 − 𝜆𝑝2 = 0
𝛽
𝜆=
𝑝2
𝐿𝜆 = 𝑝1 𝑥1 + 𝑝2 𝑥2 − 𝑏 = 0
Igualamos λ e isolamos 𝑥1 :
𝛼𝛾𝑥1𝛼−1 𝛽
𝜆= =
𝑝1 𝑝2
1⁄
𝛽𝑝1 𝛼−1
𝑥1 = ( )
𝛼𝛾𝑝2
Substituímos 𝑥1 na restrição e isolamos 𝑥2 :
1⁄
𝛽𝑝1 𝛼−1
𝑝1 ( ) + 𝑝2 𝑥2 = 𝑏
𝛼𝛾𝑝2
1⁄
𝑏 𝛽𝑝1𝛼 𝛼−1
𝑥2 = − ( )
𝑝2 𝛼𝛾𝑝2𝛼
b) Defina o conceito de Curvas de Engel e desenhe-as para cada bem. (1,0 ponto)
Solução:
As curvas de Engel relacionam quantidade consumida e renda para um determinado indivíduo. Elas
nada mais são que um “perfil” das curvas de demanda. Para obtermos uma Curva de Engel basta
tomar a curva de demanda e fixar (ie, tornar constantes) os preços dos bens. Desta forma, a função
vai mostrar como o consumo de um bem varia em função das mudanças na renda (b) do indivíduo.
Ou seja, se a função de demanda é 𝑥𝑖 = 𝑓(𝑝𝑖 , 𝑝𝑗 , 𝑏), a Curva de Engel é simplesmente 𝑥𝑖 =
𝑓(𝑝̅𝑖 , 𝑝̅𝑗 , 𝑏) ou 𝑥𝑖 = 𝑓(𝑏)

Para o bem 𝑥1 , vê-se pela curva de demanda que a renda não afeta a quantidade consumida. Ou
seja, a Curva de Engel simplesmente uma reta horizontal, paralela ao eixo da renda.

𝑥1

Para o bem 𝑥2 , vê-se que a curva será uma reta:

𝑥2

c) Defina o conceito de elasticidade renda da demanda, defina os conceitos de bens inferiores,


normais e superiores e calcule a elasticidade-renda da demanda para ambos os bens. (1,0 ponto)
Solução:
A elasticidade renda da demanda é uma medida de como a quantidade consumida varia em termos
percentuais para cada ponto de variação percentual na renda do indivíduo. Ou seja, uma
elasticidade renda de 1,5 implica que para cada ponto percentual de variação na renda nós
observaremos 1,5 ponto percentual de variação na quantidade demandada. Nesse caso, se, por
exemplo, a renda se elevar em 10% a quantidade consumida crescerá em 15%.
Matematicamente a elasticidade renda da demanda em um certo ponto da curva de demanda pode
ser definida como:
∂𝑥 𝑏
𝜀𝑏 =
∂𝑏 𝑥
Os bens são classificados em normais, superiores ou inferiores de acordo com o valor da
elasticidade renda da demanda de forma que:
0 ≤ 𝜀𝑏 ≤ 1 implica um bem normal
𝜀𝑏 > 1 implica um bem superior
𝜀𝑏 < 0 implica um bem inferior

No caso do bem 𝑥1 , é fácil ver que a ele tem elasticidade renda da demanda igual à zero, sendo,
portanto, um bem normal. Note que, como a renda não faz parte da função de demanda desse bem,
∂𝑥
temos que = 0, o que gera 𝜀𝑏 = 0
∂𝑏

Agora, para o bem 𝑥2 , 𝑡𝑒𝑚𝑜𝑠 𝑞𝑢𝑒 :


∂𝑥2 1
=
∂𝑏 𝑝2
Note ainda que não faz sentido considerar a parcela da função de demanda em que o valor de 𝑥2 é
negativo, pois não existem quantidades negativas de bens. L

𝑏
𝜀𝑏 =
𝑝2 𝑥2

𝑏
𝜀𝑏 = =1
𝑏
𝑝2 𝑝
2

Esse resultado é intuitivo, pois a Curva de Engel é uma reta, o que requer que a elasticidade renda da
demanda seja unitária.

(2) (ANPEC 2011, adaptado) Supondo que João deve pagar $2 para participar de uma competição
cujo prêmio é de $19 e a probabilidade de ganhar 1/3, sua função de utilidade é definida por 𝑈(𝑥) =
ln(𝑥) e seu nível de riqueza é $10:
a) Classifique João como amante, avesso ou neutro ao risco e justifique sua resposta. (1,0 ponto)
Solução:
Sendo uma função logarítmica (isto é, uma função côncava), João é avesso ao risco. Ele vai preferir
sempre ganhar o valor esperado de uma loteria a participar dessa loteria.
b) Para João, faz sentido participar da competição? Justifique sua resposta. (1,0 ponto)
Solução:
Fará sentido participar da competição se a esperança das utilidades (utilidade esperada de von
Neumann-Morgenstern) for maior que a utilidade de ter uma renda certa.
A utilidade da renda certa é log10. A utilidade esperada da loteria é dada por:
1 2 1 2
ln(10 − 2 + 19) + ln(10 − 2) = ln(27) + ln(8)
3 3 3 3
1 2
ln 33 + ln 23 = ln 3 + ln 4 = ln 12
3 3
Como ln12 > ln10, faz sentido (ie, há ganho de bem-estar) participar da competição.

(3) Felipe recebe uma herança no presente (em 𝑡0 ) no montante de $ 300 e pretende consumir esse
valor em bens ao longo do tempo esperado de sua vida de acordo com os valores da tabela abaixo:
Tempo 𝑡0 𝑡1 𝑡2 𝑡3
Consumo 𝑐0 = $80,00 𝑐1 = $110,00 𝑐2 = $165,00 𝑐3= ?

Cada período (𝑡0 , 𝑡1 , 𝑡2 e 𝑡3 ) corresponde a uma etapa relevante para este indivíduo, sendo a última,
𝑡3 , correspondente a velhice.
Suponha que Felipe não preveja entradas de renda além de sua herança em 𝑡0 no valor de $300. Ou
seja, ele apenas consome a sua herança ao longo da vida, sem auferir novos ganhos exógenos.
Considere ainda uma taxa de juros (r) que deve ser usada para valorizar o seu patrimônio é de 18% a
cada etapa.
(a) Escreva, de forma genérica, a equação que representa a restrição orçamentária intertemporal deste
indivíduo. (não substitua os valores numéricos). (1,0 ponto)
Solução:
A restrição orçamentária intertemporal do problema é dada em função da receita total recebida de
herança (𝑏0 ,) que deve ser igualada ao valor presente (ie, descontado pela taxa de juros) do
consumo ao longo da vida, ou seja:
𝑐0 𝑐1 𝑐2 𝑐3
𝑏0 = 0
+ 1
+ 2
+
(1 + 𝑟) (1 + 𝑟) (1 + 𝑟) (1 + 𝑟)3
(b) Encontre qual deverá ser o valor do consumo desfrutado na velhice de Felipe dado os dispêndios
planejados nas etapas anteriores. (1,0 ponto)
Solução:
Para encontrar o valor do consumo na velhice, basta resolver a restrição orçamentária
intertemporal para 𝑐3 . Deste modo, temos que:
𝑐1 𝑐2
𝑐3 = (1 + 𝑟)3 [𝑏0 − [𝑐0 + + ]]
1 + 𝑟 (1 + 𝑟)2
Substituindo os valores chegamos em 𝑐3 = $13,60, o consumo na velhice de Felipe.

(4) Julgue os itens abaixo classificando-os como verdadeiros ou falsos. Justifique


DETALHADAMENTE suas respostas.
(a) Bens substitutos perfeitos violam o axioma da preferência pela diversificação estrita e bens
complementares perfeitos violam o axioma da não saciedade. (1,0 ponto)
Solução:
Verdadeiro!
Bens substitutos perfeitos são bens que possuem utilidade marginal linear, i.e., para estes bens, não
vale a ideia de que, dado duas cestas distintas 𝑿 ≠ 𝐘, uma combinação convexa das suas
quantidades gera um nível de utilidade maior. Como as curvas de indiferença para esses bens são
lineares a combinação linear de quaisquer duas cestas será indiferente a essas duas cestas. O
axioma da preferência pela diversificação, portanto, é violado em sua forma estrita.

Bens complementares perfeitos são bens que violam o axioma da não saciedade - o qual pode ser
compreendido com a frase “mais é sempre preferível do que menos” porque o nível de utilidade do
indivíduo só aumenta caso as quantidades desses bens aumentarem conjuntamente, i.e, se apenas a
quantidade de um bem aumentar, o nível de utilidade deste indivíduo não se altera. Nesse caso as
curvas de indiferença têm um formato em “L”, o que viola não saciedade.

(b) A Demanda de Mercado por um bem é derivada da agregação de todas as demandas individuais
daquele bem, representando, portanto, a demanda de um indivíduo típico. Qualquer indivíduo que
possuir demanda individual diferente da demanda de mercado é um indivíduo não racional. (1,0
ponto)
Solução:
Falso!
De fato, a Demanda de Mercado por um bem qualquer é a agregação das demandas individuais (ou
de uma entidade familiar) pelo bem e pode ser interpretada como a demanda de um indivíduo típico.
Porém, não é verdade que os indivíduos precisam demandar “tipicamente” os bens para serem
considerados racionais. A racionalidade dos indivíduos está sustentada pelo respeito aos axiomas
sobre suas preferências (e.g. não-saciedade, preferências convexas, transitivas e reflexivas e
ordenadas dado informações sem custo) e são as preferências que definem a demanda individual por
um bem ou por outro. A natureza das preferências, no entanto, depende exclusivamente da natureza
dos indivíduos – e estes claramente são diferentes entre si, podendo satisfazer os axiomas de
racionalidade com demandas, da mesma forma, diferentes entre si.

(c) Elabore e responda uma pergunta de V ou F sobre o conteúdo de Teoria Microeconômica tratado
no curso. Você será avaliado pela sua escolha da pergunta e pela sua resposta.

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