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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

DEPARTAMENTO DE ECONOMIA E RELAÇÕES INTERNACIONAIS


TEORIA MICROECONOMICA I
PROF.: MARCELO S. PORTUGAL
I SEMESTRE DE 2020
1ª PROVA

1. Dada a função de utilidade 𝑈(𝑥, 𝑦) = (𝑥 − 𝑥0 )𝛼 (𝑦 − 𝑦0 )𝛽 tal que 𝛼 + 𝛽 = 1 e 𝑥0 , 𝑦0 são


constantes positivas. Considere (𝑥0 , 𝑦0 ) como sendo uma cesta factível.
(i) Obtenha as demandas (marshallianas) do consumidor por 𝑥 e 𝑦 (1,0 ponto);
Temos que:
𝐿 = (𝑥 − 𝑥0 )𝛼 (𝑦 − 𝑦0 )𝛽 + 𝜆(𝑏 − 𝑝𝑥 𝑥 − 𝑝𝑦 𝑦)
Logo:
𝐿𝑥 = 𝛼(𝑥 − 𝑥0 )𝛼−1 (𝑦 − 𝑦0 )𝛽 − 𝜆𝑝𝑥 = 0
𝐿𝑦 = 𝛽(𝑥 − 𝑥0 )𝛼 (𝑦 − 𝑦0 )𝛽−1 − 𝜆𝑝𝑦 = 0
Combinando as duas equações acima, obtemos:
𝛼 𝛽
=
(𝑥 𝑀 − 𝑥0 )𝑝𝑥 (𝑦 𝑀 − 𝑦0 )𝑝𝑦
Podemos reescrever a restrição orçamentária como:
𝑝𝑥 (𝑥 − 𝑥0 ) + 𝑝𝑦 (𝑦 − 𝑦0 ) = 𝑏 − 𝑝𝑥 𝑥0 − 𝑝𝑦 𝑦0
Substituindo a condição de primeira ordem na restrição orçamentária, obtemos as demandas:
𝛼 (𝑏 − 𝑝𝑥 𝑥0 − 𝑝𝑦 𝑦0 )
𝑥 𝑀 = 𝑥0 +
𝛼+𝛽 𝑝𝑥
𝛽 (𝑏 − 𝑝𝑥 𝑥0 − 𝑝𝑦 𝑦0 )
𝑦 𝑀 = 𝑦0 +
𝛼+𝛽 𝑝𝑦
(ii) Calcule as elasticidades-preço de cada bem. É possível que sejam bens de Giffen? (1,0
ponto).
Temos que:
𝜕𝑥 𝑀 𝑝𝑥 𝛼 𝑝𝑦 𝑦0 − 𝑏
𝜖𝑥,𝑝𝑥 = = <0
𝜕𝑝𝑥 𝑥 𝑀 𝛼 + 𝛽 𝑝𝑥 𝑥 𝑀
𝜕𝑦 𝑀 𝑝𝑦 𝛽 𝑝𝑥 𝑥0 − 𝑏
𝜖𝑦,𝑝𝑦 = 𝑀
= <0
𝜕𝑝𝑦 𝑦 𝛼 + 𝛽 𝑝𝑦 𝑦 𝑀
Pois a factibilidade de (𝑥0 , 𝑦0 ) implica 𝑝𝑥 𝑥0 + 𝑝𝑦 𝑦0 ≤ 𝑏, e com isso temos 𝑝𝑦 𝑦0 − 𝑏 < 0 e
𝑝𝑥 𝑥0 − 𝑏 < 0. Não é possível que estes bens sejam de Giffen, uma vez que suas
elasticidades-preço são negativas. Logo, um aumento no preço de um desses bens provoca
queda em sua demanda.
(iii) Calcule a elasticidade-renda. Como um aumento na renda do consumidor impacta as
demandas pelos bens? Como podem ser classificados esses bens? (0,5 ponto);
As elasticidades-renda são dadas por:
𝜕𝑥 𝑀 𝑏 𝛼 𝑏
𝜖𝑥,𝑏 = 𝑀
= >0
𝜕𝑏 𝑥 𝛼 + 𝛽 𝑝𝑥 𝑥 𝑀
𝜕𝑦 𝑀 𝑏 𝛽 𝑏
𝜖𝑦,𝑏 = 𝑀
= >0
𝜕𝑏 𝑦 𝛼 + 𝛽 𝑝𝑦 𝑦 𝑀
Ambos os bens são normais. Por esse motivo também poderíamos concluir que eles não
podem ser bens de Giffen, uma vez que bens de Giffen são bens inferiores.

2. Suponha que exista um estudande com utilidade de Bernoulli dada por 𝑢(𝑊) = 1 − 𝑊 −1 , onde
𝑊 é o valor presente líquido de sua renda futura, e que neste momento ele considera duas opções
de carreira profissional. Uma alternativa dará 𝑊 = $40 com certeza, enquanto a outra dará
𝑊 = $100, com 20% de chance, e 𝑊 = $25, com 80% de chance.

(i) Sabendo que a relação de preferências do estudante satisfaz os axiomas da utilidade


esperada de Von Neumann-Morgenstern, qual será a carreira escolhida? Qual é o
comportamento do estudante perante ao risco? (1,5 ponto);
A loteria 𝑔1 que dará 𝑊 = $40 com certeza lhe confere u(40)=1-1/40=0.975 de utilidade.
Agora considere a loteria 𝑔2 dada por:
𝑊1 = $100 com 𝜋1 = 20% de chance
𝑊2 = $25 com 𝜋2 = 80% de chance
A utilidade esperada de Von Neumann-Morgenstern associada à segunda loteria é dada
por:
𝐸(𝑢(𝑊)) = 𝜋1 𝑢(𝑊1 ) + 𝜋2 𝑢(𝑊2 ) = 0.2 ∗ (1 − 1/100) + 0.8 ∗ (1 − 1/25) = 0.966
A opção que lhe confere maior utilidade é a primeira, portanto esta será a carreira
escolhida. O indivíduo é portanto avesso ao risco, uma vez que ele prefere uma riqueza
garantida a uma riqueza de risco com o mesmo valor esperado. De forma alternativa, note
que:
𝑢′′ (𝑊) = −2/𝑊 3 ,
implicando uma utilidade côncava em W, ou um agente avesso ao risco.
(ii) Qual é o valor que o estudante está disposto a pagar para saber exatamente se irá
conseguir 𝑊 = $25 ou 𝑊 = $100 ao optar pela segunda carreira? (1,0 ponto);
A equivalente certeza (𝐸𝐶2 ) do estudante é dada por:
𝑈𝐸(𝑔2 ) = 0.966 = 𝑢(𝐸𝐶2 ) = 1 − 1/𝐸𝐶2
Com isso, obtemos 𝐸𝐶2 = $29.41, ao resolver a equação acima. O prêmio de risco (𝑃𝑔 ) é
dado por:
𝑃𝑔 = 𝐸(𝑊) − 𝐸𝐶2 = 40 − 29.41 = $10.59
Como o indivíduo possui renda certa de 𝑊 = 40 > 25, ele poderia estar disposto a pagar
$40 − $25 = $15, se esse valor fosse menor do que o prêmio de risco, mas não é o caso.
O valor que ele está disposto a pagar pela informação é de $10.59, que é o seu prêmio de
risco.

3. De acordo com o economista Irving Fisher, em suas decisões quanto ao consumo os agentes
enfrentam uma restrição conhecida como restrição orçamentária intertemporal, que pode ser
ilustrada através de um modelo de escolha intertemporal de dois períodos. Seja a utilidade do
consumidor dada por:
𝑈(𝑐0 , 𝑐1 ) = log 𝑐0 + 𝛽 log 𝑐1 ,
onde 𝛽 é o fator de desconto intertemporal, 𝑐0 é o consumo na juventude e 𝑐1 é o consumo na
velhice. A restrição orçamentária intertemporal pode ser obtida ao considerar a existência de um
ativo cuja remuneração é vinculada à taxa de juros real 𝑟. Mais especificamente, se o indivíduo
poupa 𝑠0 = 𝑦0 − 𝑐0 na juventude, ele obtém como remuneração (1 + 𝑟)𝑠0 no segundo período,
onde 𝑦0 é a renda do agente no primeiro período.
(i) Considerando que o agente consome no segundo período toda a renda 𝑦1 obtida na
velhice, em adição à remuneração por sua poupança na juventude, construa a restrição
orçamentária intertemporal do consumidor (1,0 ponto);
Temos as relações 𝑠0 = 𝑦0 − 𝑐0 e 𝑐1 = (1 + 𝑟)𝑠0 + 𝑦1 , que combinadas resultam em:
𝑐1 = (1 + 𝑟)(𝑦0 − 𝑐0 ) + 𝑦1
A restrição orçamentária pode ser rearranjada de acordo com:
𝑐1 𝑦1
𝑐0 + = 𝑦0 +
(1 + 𝑟) (1 + 𝑟)
(ii) Obtenha o consumo na juventude e na velhice escolhidos pelo agente em função de
𝛽, 𝑦0 , 𝑦1 e 𝑟. (1,0 ponto)
Substituindo a restrição orçamentária intertemporal na função utilidade:
𝑈(𝑐0 ) = log 𝑐0 + 𝛽 log [(1 + 𝑟)(𝑦0 − 𝑐0 ) + 𝑦1 ]
Derivando em relação à variável de escolha 𝑐1 e igualando a zero, obtemos a condição de
primeira ordem:
𝑑𝑈 1 𝛽(1 + 𝑟)
= − =0
𝑑𝑐0 𝑐0 (1 + 𝑟)(𝑦0 − 𝑐0 ) + 𝑦1
Resolvendo para 𝑐0 obtemos:
1
𝑐0 = [𝑦 + 𝑦1 /(1 + 𝑟)]
1+𝛽 0
Substituindo o valor de 𝑐0 na restrição orçamentária, obtemos o consumo ótimo na
velhice:
𝛽
𝑐1 = [(1 + 𝑟)𝑦0 + 𝑦1 ]
1+𝛽

(iii) Sob qual condição há suavização total do consumo (𝑐0 = 𝑐1 ), isto é, o consumo na
juventude é igual ao consumo na velhice? (0,5 ponto)
Note que o consumo no segundo período pode ser reescrito como:
𝛽(1 + 𝑟)
𝑐1 = [𝑦0 + 𝑦1 /(1 + 𝑟)]
1+𝛽
Com isso, igualando 𝑐0 = 𝑐1:
1 𝑦1 𝛽(1 + 𝑟) 𝑦1
[𝑦0 + ]= [𝑦0 + ]
1+𝛽 1+𝑟 1+𝛽 1+𝑟
Para que o consumo seja igual nos dois períodos, devemos ter 𝛽 = (1 + 𝑟)−1 .

4. Classifique as seguintes afirmações como verdadeiras ou falsas e justifique o seu raciocínio de


forma detalhada.
.
(i) Curvas de demanda isoelásticas são aquelas em que a elasticidade-preço é a mesma em
qualquer ponto da curva. Logo, curvas de demanda lineares são, por definição,
isoelásticas. (1,0 ponto);
Falso. A elasticidade-preço da demanda é dada por:
𝜕𝑥 𝑀 𝑝𝑥
𝜖𝑥,𝑝𝑥 =
𝜕𝑝𝑥 𝑥 𝑀
onde 𝑥 𝑀 é a demanda marshalliana por um bem 𝑥 e 𝑝𝑥 é o preço desse bem. Em uma
curva de demanda linear, 𝜕𝑥 𝑀 /𝜕𝑝𝑥 é uma constante. A elasticidade, contudo, é variável.
Quando 𝑝𝑥 = 𝑥 𝑀 , por exemplo, temos 𝜖𝑥,𝑝𝑥 = 1. Em qualquer ponto distinto desse,
teremos 𝜖𝑥,𝑝𝑥 ≠ 1.
(ii) Um consumidor cuja utilidade é dada por 𝑈(𝑥, 𝑦) = 𝑒 min(𝑥,𝑦) está disposto a abrir mão de
uma mesma quantidade de consumo de 𝑦 por uma unidade adicional de consumo de 𝑥,
independente da quantidade já consumida de 𝑥. (1,0 ponto)
Falso. Aplicando uma transformação monotônica crescente simples obtemos 𝑈(𝑥, 𝑦) =
log 𝑒 min(𝑥,𝑦) = min(𝑥, 𝑦), que representa uma preferência por bens complementares
perfeitos. Neste caso, o consumidor sempre escolherá a cesta ótima respeitando a
condição 𝑥 = 𝑦, uma vez que a proporção fixa da Leontieff é de um para um. Neste caso,
a TMgS(x,y) é sempre igua a zero, o que significa que o consumidor nunca abrirá mão de
consumir qualquer unidade de 𝑥 ou de 𝑦, para consumir uma unidade adicional de
consumo de 𝑦 ou 𝑥, respectivamente. Abrir mão do consumo de 𝑥 ou de 𝑦 equivale a
reduzir a sua utilidade, o que é inconsistente com um indivíduo racional que maximiza a
sua utilidade.

(iii) Reconsidere o problema de decisão de carreira profissional enfrentado pelo estudante na


segunda questão. A aversão relativa ao risco medida pelo indicador de Arrow-Pratt deste
estudante é a mesma caso o valor presente líquido de sua renda futura seja 𝑊 = $100 ao
invés de 𝑊 = $40. (0,5 ponto)
Verdadeiro. O coeficiente de aversão relativa ao risco (CARR) de Arrow-Pratt da
utilidade 𝑢(⋅) é dado por:
𝑊𝑢′′ (𝑊)
𝑅𝑟 (𝑊) = −
𝑢′(𝑊)
Temos que 𝑢′′ (𝑊) = −2/𝑊 3 e 𝑢′ (𝑊) = 1/𝑊 2 . Com isso:
𝑅𝑟 (𝑊) = 2
Logo, o coeficiente de aversão relativa ao risco é constante e independente do valor
presente líquido de sua renda futura.

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