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DOI: 10.34624/rtd.v36i2.10675
e-ISSN 2182-1453
Resumo | Ao património material, nomeadamente à arquitetura, tem sido atribuído um papel de relevo
como símbolo patriótico e atrativo turístico, pelo facto de transmitir um sentido de continuidade e veri-
cabilidade que é passível de ser experienciado social, simbólica e sensorialmente. As casas senhoriais,
que constituem a unidade de análise do presente estudo, são objetos pretéritos que permitem o consumo
de signicados idealizados que são anacrónicos. Estas edicações apresentam conotações óbvias com
a elite aristocrática provincial que outrora as habitou e o consumo destes recursos turísticos consagra
o estatuto social e o gosto dos hóspedes que o elegem como alojamento. Através da aplicação dos
métodos da Grounded Theory (GT), este texto propõe-se analisar o conceito de `Identidade' das Casas
cações para a prática de Turismo de Habitação (TH). O presente estudo constata que a identidade das
casas de TH, com frequência, é um obstáculo à sua completa refuncionalização, isto porque a sua funci-
onalidade original limita a formalização total do TH, o que diculta sua competitividade. Conclui-se, de
igual modo, que a casa principal apresenta mais restrições à refuncionalização do que os anexos, visto
que na primeira um aumento de funcionalidade mais depressa determina uma diminuição da genuinidade.
Abstract | Material heritage, namely architecture, has been given a prominent role as a patriotic symbol
and tourist attraction, as it conveys a sense of continuity and veriability that can be experienced soci-
ally, symbolically and sensorially. The manor houses, which constitute the unit of analysis of the present
study, are past objects that allow the consumption of idealized meanings that are anachronistic. These
buildings have obvious connotations with the provincial aristocratic elite that once inhabited them and
the consumption of these tourist resources consecrates the social status and the taste of the guests who
choose it as accommodation. Through the application of Grounded Theory (GT) methods, this paper
aims to analyze the concept of `Identity' of Manor Houses and their respective properties `Genuinity',
* CIDI-IESF Centro de Investigação, Desenvolvimento e Inovação do Instituto de Estudos Superiores de Fafe (IESF)
GOVCOPP - Research Unit on Governance, Competitiveness and Public Policies CiTUR Centre for Tourism Research,
Development and Innovation, Polytechnic of Leiria
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`Exclusivity' and `Functionality' as well as their implications for the practice of Turismo de Habitação
(i.e. Historic Housing Tourism (HHT)). The present study nds that the identity of HHT houses is
often an obstacle to their complete refunctionalisation because their original functionality restrains the
total formalisation of HHT, which hinders its competitiveness. It also concludes that the main residence
presents more restrictions to refunctionalisation than the outbuildings, since in the former an increase
pais idiossincrasias da modalidade de TH. Segue-se lidade. No campo, os ofícios são praticados de um
uma breve análise da metodologia utilizada no es- modo que estimula a imaginação dos turistas de
tudo, a GT Clássica, bem como a indicação das como a vida seria antes da Revolução Industrial.
principais incidências da recolha e análise dos da- No entanto, a constante transformação é uma ca-
dos. Na seção reservada aos resultados, é explici- racterística intrínseca às zonas rurais, sucedeu no
respetivas propriedades. Concluímos com uma dis- A míngua da vida rural e o consequente êxodo
cussão acerca do papel do antrião enquanto guar- para zonas urbanas é uma característica planetária.
dião do património dos seus ascendentes e com a Ora, este fenómeno tem importantes implicações
apresentação de algumas recomendações aos pro- para a atividade turística de duas maneiras. Por
visitar/preservar o campo. Este costume consubs- novo património abarcam um leque mais vasto
tanciou o gosto por determinado tipo de paisa- do que apenas aquelas que pertencem aos lavrado-
gens (onde se incluíam as aldeias) e as imponen- res e aos trabalhadores agrícolas. Edifícios amplos,
tes casas de campo, que se achavam em elegantes umas vezes industriais, outras vezes domésticos
cenários rurais. O interesse em visitar o campo ou, ainda, institucionais, com frequência de consi-
apelo exercido pelos equipamentos e maquinaria se, também, vagos, atualmente desprovidos de
utilizada na agricultura e pelos padrões de vida a sustentação económica em comunidades rurais ou-
Se Boniface e Fowler (1993), no início da dé- Neste âmbito, a teoria empírica por nós desen-
cada de 90, referiam que grande parte da popu- volvida procurou evidenciar a requalicação a que
lação mundial vivia, ainda, no campo, a situação foram sujeitos os anexos e outras divisões da casa
atual tem vindo a inverter-se a Organização das solarenga, noutro tempo vocacionadas para a ati-
Nações Unidas projeta que, entre 2018 e 2030, a vidade agrícola e que agora servem para ampliar a
rural deverá regredir ligeiramente, este a ser o ha- Prista (2014), no estudo de caso que levou a
bitat de 45% da população do mundo em 2018 efeito sobre as Pousadas de Portugal, revela que
para constituir apenas 40% do número total de estes empreendimentos turísticos têm vindo, desde
habitantes em 2030 (Nações Unidas, s.d.). as suas origens, a providenciar uma experiência de
Na realidade, boa parte dos turistas é oriunda domesticidade rural, baseada na hospitalidade ver-
que se dirigem ao campo associam, normalmente, Deste modo, tanto no caso das Pousadas como
lugares selvagens a primitividade; paisagem a in- no caso dos TH, os turistas anseiam subtrair-se do
temporalidade; vista a pureza; e campo a imutabi- estilo de vida moderno, empreendendo uma de-
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manda por modalidades alternativas de turismo vi. Reconstrução: procurar restituir a con-
que estejam em harmonia com a envolvente e com dição do cenário e atividades físicas tão pró-
a comunidade local e que possibilitem um contacto ximo quanto possível de um estado especí-
mais estreito entre hóspedes e antriões. Parte co de uma época precedente.
deste contacto, salientando o modo como se pro- Neste contexto, o turismo pode favorecer a re-
cessam as variações no contacto entre os atores abilitação de áreas históricas e, deste modo, me-
meio privilegiado pelas autoridades políticas para nosso estudo evidenciou os méritos do TH (e, tam-
fomentarem o desenvolvimento das zonas rurais bém, as suas insuciências em conformidade com a
deprimidas (Pereiro Pérez, 2009). dedicação do antrião) no que diz respeito à acele-
No que toca à planicação do património edi- ração do ritmo de conservação das casas senhoriais
iii. Reabilitação: procurar restituir a condi- gar, quando nos referimos às cognições do mundo
ção dos cenários e atividades físicas numa físico. Neste sentido, o conceito de apego da famí-
dição dos cenários e atividades físicas atra- da cultura e da identidade de um território (Mei-
vés da remoção de elementos novos ou adi- rinhos, Aguiar & Salvado, 2017). Neste contexto,
para os tornar concordes com o cenário ori- quitetura erudita e com fundas raízes na história
região onde se inserem. modo, o turismo cria um novo signicado para
Carlos Fortuna (2013) sustenta que a atividade a continuidade da identidade local a partir da in-
turística tem a capacidade de subverter identida- venção da tradição (Zhu, 2012). Até mesmo Gre-
des. Tal sucede em virtude daquilo a que o autor enwood (1989) um férreo opositor da mercanti-
designa por `descentramento' dos sujeitos e que se lização cultural para efeitos turísticos consente
concretiza na desvalorização, interrupção ou perda que a objeticação da cultura local pelo turismo
das matrizes convencionais da identidade social, da nem sempre a destrói, podendo transformá-la e,
classe, do género, da etnia, da religião, da condi- inclusive, impulsionar a sua futura disseminação.
porcionada pela visita a lugares, como as casas Esta modalidade compreende o alojamento em
de TH, que possuem conotações com o passado. unidades habitacionais localizadas em casas de es-
Deste modo, as identidades são criadas por inter- tilo e arquitetura de época, sejam elas casas sola-
médio da acumulação de perceções relativas àquilo rengas, palacetes, mansões ou outras construções
que está relacionado com a emergência da cultura. de elevado valor histórico e cultural. Encontramos
A apropriação destas perceções será relevante para casas de TH tanto no espaço urbano quanto no ru-
a compreensão por parte do consumidor, do seu ral. O interior destas casas evidencia sosticação
lugar no tempo e no espaço. Nas sociedades que e luxo. Segundo Beni (2003), os serviços de hos-
estão alienadas das suas origens devido a um pro- pitalidade que aí são prestados distinguem-se pela
cesso de urbanização e êxodo populacional, estes sua personalização e pelo requinte do atendimento.
sentimentos de orgulho pelas raízes telúricas têm Na realidade, o TH apresenta-se como um produto
de ser gerados (McIntosh & Prentice, 1999). diferenciado do alojamento hoteleiro, uma vez que
O turismo que alguns autores têm acusado de não é massicado e é tendencialmente menos sen-
mercantilizar a cultura (Selwyn, 1996; Cole, 2007; sível ao fator preço. Constitui uma modalidade
Henriques, 2008) pode ser um veículo para in- de turismo alternativo, uma vez que o hóspede
facultando uma autoconsciência, conhecimento e usufruindo dos serviços e equipamentos que aí são
orgulho decisivos para a sua emancipação. Esta disponibilizados (Braga, 2016). Outra caracterís-
nova identidade, recriada por meio do turismo, tica que confere exclusividade a esta modalidade
pode capacitar estes grupos locais oferecendo-lhes é o facto de as famílias antriãs, proprietárias das
um capital político (e um potencial económico) casas (muitas delas descendentes dos fundadores
para pressionarem a estrutura política. Assim, o do solar), ainda nelas habitarem, propiciando ao
turismo patrimonial, ao invés de ser visto como hóspede uma perspetiva mais circunstanciada do
algo que é imposto do exterior da comunidade, ethos local. Encontramos unidades de alojamento
pode ser percecionado como uma atividade que deste tipo em Portugal, Espanha e França.
está a ser afanosamente fomentada para desenvol- Em Portugal, o TH foi concretizado como pro-
ver a cultura local e para intensicar uma distinção jeto piloto em 1978, por iniciativa da Secretaria de
que vivica os costumes tradicionais, em vez de Estado do Turismo, tendo sido implementado em
os estiolar (Halewood & Hannam, 2001). Deste quatro territórios: Ponte de Lima, Vouzela, Cas-
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telo de Vide e Vila Viçosa (Pereiro Pérez, 2009, sos, as casas de TH estão, inclusivamente, classi-
2018). A criação do TH correspondia ao intuito de cadas como imóveis de interesse municipal ou pú-
contrariar as assimetrias regionais do território na- blico (Braga, 2016; Monteiro & Carvalho, 2006).
cional e proporcionar capacidade hoteleira diferen- O TH pode ainda contemplar atividades com-
ciada em áreas onde esta era débil. Pretendia-se, plementares de animação como a caça e pesca, as
de igual modo, diversicar a oferta de alojamento atividades náuticas, a equitação, as visitas e pas-
e salvaguardar o precioso património arquitetónico seios ou as que têm lugar em equipamentos como
que se achava sujeito ao abandono e deterioração piscinas ou nos campos de ténis adstritos à casa
dinho, 2004). Esta modalidade, exceto em casos suplementar o rendimento que auferem com a mo-
excecionais, não admitia que fossem afetos mais dalidade de hospedagem organizando, em paralelo,
Decreto-Lei nº 80/2017, de 30 de junho que altera em associações de casas que têm como objetivo
o Regime Jurídico dos Empreendimentos Turísti- salvaguardar a identidade coletiva dos empreendi-
cos e pela portaria nº 937/2008 que determina os mentos de TH seus associados e que, no caso da
endimentos de TH, reticada pela Declaração de agem como centrais comum de reservas (Turihab,
Reticação nº 63-A/2008, de 17 de outubro (Tu- 2018). No que diz respeito ao enquadramento le-
rismo de Portugal, s.d.). gal das casas de TH, a sua classicação, a xação
Deste modo, atendendo à primeira normativa, da sua capacidade máxima, o licenciamento do seu
TH: `os estabelecimentos de natureza familiar ins- belecimentos está sob alçada dos municípios, ca-
talados em imóveis antigos particulares que, pelo bendo, porém, ao Turismo de Portugal, I. P. o
seu valor arquitetónico, histórico e artístico, sejam parecer vinculativo (Silva, 2009).
lação está mais concentrada e onde predomina o A estratégia qualitativa de investigação que
minifúndio como sistema de propriedade fundiária. adotámos no presente estudo foi a GT Clássica.
na sua moradia e a prestar serviço de pequeno- vistas que efetuámos junto dos proprietários rele-
almoço. No TH, a hospedagem em casa de arqui- vantes para a amostra teórica (Glaser & Strauss,
tetura erudita constitui, por si só, uma experiência 1967, p. 49-60). Ao longo do nosso estudo, que
o TH como um veículo privilegiado de conservação casas solarengas. Sendo que, deste número, so-
e sustentação económica da casa. Em alguns ca- mente dez não estavam, então, classicadas como
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TH. O guião da entrevista apenas incluiu duas per- ações que resolvem de forma contínua a principal
guntas ( Pode, por favor, falar-me das suas experi- preocupação dos participantes da área substantiva
ências como proprietário(a) e antriã(o) da casa de (no caso vertente, os proprietários de casas de TH
as entrevistas não foram gravadas, mas objeto de A análise de dados na GTC é um trabalho me-
Este trabalho de investigação propôs-se deter- cem iterativamente: a codicação aberta; a aná-
minar se a identidade das casas de TH ainda per- lise comparativa constante; a amostragem teórica;
manecia autêntica, mais de quatro décadas vol- a identicação da categoria central; a codicação
vidas desde o início desta modalidade, e de que seletiva; a classicação de memorandos; a classi-
forma é que a sua refuncionalização turística se ti- cação teórica e a redação dos memorandos sob a
nha repercutido nessa identidade. forma de teoria (Glaser, 1978; Glaser, 1998; Gib-
As casas de TH são empreendimentos de pe- son & Hartman, 2014; Birks & Mills, 2011; Holton
casa com menor número de quartos dispunha de Deste modo, a codicação aberta foi realizada
dois e a que apresentava maior capacidade de alo- colocando três questões neutrais (Glaser, 1998)
jamento continha quinze aposentos. No que diz aquando da análise de dados ( Que categoria in-
respeito ao tipo de entrevistas que conduzimos, dica este incidente? Que propriedade de categoria
estas foram sobretudo presenciais (48), e em me- indica este incidente? Qual é a principal preocu-
nor número, por telefone (3) e correio eletrónico pação do participante). Os resultados empíricos
(2). que aqui se apresentam constituem somente uma
No que é atinente à proveniência geográca das fração da teoria gerada na nossa investigação dou-
tejo (1), Alto Alentejo (2), Baixo Alentejo (3), 6. A identidade da casa solarenga e a prática
Baixo Alentejo (3), Algarve (1) e Açores (2) de turismo de habitação
note-se que o total de casas contabilizadas é de
Açores e uma na região do Algarve (vd. Braga, ceito de mais alto nível que designámos de `Casa'.
baseia na geração sistemática de teoria a par- original da casa limita a formalização total do TH,
tir de uma investigação também ela sistemática. o que diculta a competição com os alojamentos
Institute, 2008; Grounded Theory Online, 2020). depressa dita uma diminuição da genuinidade.
mente como uma explicação teórica da ação ou seguintes propriedades: `Genuinidade', `Exclusi-
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vidade' e `Funcionalidade'. Nas três secções se- todo de recuperação demorou quatro
inferior.
lece uma ponte entre a tradição e a contempora- alojamento massivo. Neste sentido, o estilo clás-
neidade. Reconverter sem fazer a casa perder a sico de refuncionalização é mais conservador da
constitui um dos princípios orientadores do an- trião pode optar por um recheio que esteja menos
trião destas unidades de alojamento. De facto, de acordo com a identidade da casa, mas que seja
pode-se recuperar a casa tendo em conta a sua mais funcional. Por outras palavras, ao formalizar,
Em casas em que o recheio tenha sido objeto de nanceira adquirindo recheio pouco el à identi-
partilhas ou degradação, o proprietário, ao refun- dade da casa. Pode, também, comprar recheio
cionalizar, procurará manter-se el à genuinidade, para criar uma outra identidade mais consonante
comprando recheio em antiquários ou, eventual- com um estilo moderno de refuncionalização. Não
mente, mandando fazer recheio que pareça vincu- obstante, numa casa que tenha sofrido uma que-
lado a uma época remota. Por vezes, contudo, a bra de transmissão, o antrião por aquisição pode
recuperação da casa e o recheio renovado podem tentar recuperar a casa sendo el à sua identi-
idade dourada que é do agrado dos seus preponen- Assim, esta identidade pode ser genuína ou
gesso, não há muitos artistas que fa- podem conduzir a uma degradação da identidade
pessoal das Belas Artes, espanhóis que Na realidade, importância parece estar, cada
orientaram pessoas da região para fa- vez mais, a ser conferida à formalização da pro-
recuperar. Levámos cerca de três anos mento legal primitivo da estrutura política, que
entre em contradição com ela. Neste contexto, tituir recheio com vinculação familiar à casa por
o antrião poderá optar por ser el à identidade recheio não genuíno, uma vez que os clientes in-
e, como tal, não aumentar tanto a capacidade de sensíveis tomam o TH pelo alojamento massivo e,
hospedagem como seria desejável para elevar a em alguns casos, subtraem recheio como souvenir.
sustentabilidade nanceira do TH. O estilo híbrido e o estilo moderno de refun-
único. Existem, por exemplo, inúmeras fotograas identidade da casa no que toca ao interior dos
de familiares, de antepassados, que dão um certo anexos. Assim, existem casas em que o recheio é
carácter de casa vivida e de casa com passado que mais autêntico que noutras. É possível que a se-
o alojamento massivo não possui. Os objetos não gregação progressiva dos hóspedes, característica
são padronizados, como no alojamento massivo, do estilo híbrido, acarrete consigo a inautentici-
e não são revestidos de utilidade imediata, mas dade dos espaços. Na realidade, a necessidade de
poder ser vista como um microcosmo da envol- então, o grau de delidade à identidade original
país). Assim, o hóspede, ao contrário do que se A genuinidade é vendável numa sociedade cada
sucede num alojamento massivo, tem acesso às vez mais homogénea de produtos de belo aspeto,
raízes, à tradição, ao bucólico em vias de desapa- mas de sabor estereotipado. Daí decorre que,
recer. Ganhará em genuinidade o que perderá em estando boa parte das casas localizada junto ao
Uma estratégia de exibição de genuinidade é como algo de genuíno. Enm, a genuinidade está,
decorar a casa como se fosse só para a família lá também, relacionada com o apego que a família
viver, mas abri-la aos hóspedes de uma maneira antriã tem à casa. Uma formalização excessiva
quase voyeur, como quem entra na casa dos ou- pode pôr em causa este apego, ao comprometer
tros e vê como eles vivem. Há uma vinculação a genuinidade da casa para refuncionalizar mais
que depende da localização da casa na envolvente, para que a mesma tenha uma melhor visibilidade
da reputação da mesma, mas, também, da habi- no mercado. Cada casa tem uma identidade única,
lidade do antrião em fazer uma simbiose entre diferentemente dos alojamentos massivos.
que cative hóspedes sensíveis e insensíveis ao TH casa é parte importante da proposta de hospeda-
De outro modo, o facto de as casas onde se hóspedes internacionais pernoitarem na casa é co-
com que a massicação deste tipo de turismo seja Assim, a exclusividade da casa é uma estrutura
algo a evitar. Caso contrário, a casa pode tornar- condicional. Pode favorecer a elevação da susten-
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tabilidade nanceira do TH ou pode constrangê-la. Por conseguinte, a identidade da casa pode au-
De facto, as estruturas políticas estabelecerão um mentar a sua reputação. Cada casa é diferente, é
enquadramento legal discriminatório positivo para exclusiva, ao arrepio do que acontece com o aloja-
os casos em que a identidade da casa justique mento massivo. O TH pode contemplar variações
ao espaço envolvente à casa. A razão da proteção A arquitetura, o recheio e a história da casa po-
da casa prende-se com a sua utilidade pública, que dem, também, ter implicações na diferenciação da
lhe é conferida pela sua exclusividade. proposta de hospedagem, bem como a atrativi-
Sucede, também, que boa parte das casas dis- dade e o apetrechamento da envolvente.
põe de um chamariz, ou seja, algo de diferente na A casa é um microcosmo cultural, pelo que
sua identidade que cria uma proposta de hospeda- o hóspede sensível tem preocupações desta natu-
gem diferenciada. Ademais, a proposta de hospe- reza. Neste sentido, a exclusividade é algo que
dagem será tanto mais diferenciada quanto maior contribui para que a casa antiga possua um valor
for a dimensão do espaço exterior, ainda que o TH maior do que outras casas mais modernas, que se
não tenha, como propósito imediato, a fruição de dedicam a distintas modalidades de exploração da
experiências no espaço exterior da casa, como su- hospedagem. A casa está ligada a uma história de
cede noutras modalidades. Não obstante, existem família, sendo que o clã pode ser o do antrião,
casas com maior ou menor terreno adjacente. se ele for de linhagem, ou não, se ele o for por
nacional. Contudo, com frequência, a sua iden- se a nanciamento da estrutura política. Não obs-
tidade atrai, eminentemente, hóspedes sensíveis a tante, esta privilegia a atribuição de nanciamento
esta unidade de património erudito. Para atrair a casas com maior utilidade pública, logo, maior
hóspedes insensíveis à TH, uma solução pode ser, exclusividade. O facto de as casas e a envolvente
por exemplo, a criação de obras de arquitetura mo- serem diferentes de região para região concorre,
aumenta a visibilidade da casa, atraindo hóspedes Por conseguinte, a casa é exclusiva: é única
Este novo edifício que construímos é identidade que o alojamento massivo não possui.
uma obra-prima de arquitetura. Um Existe um conjunto de vivências que ali estão en-
quinhãozinho dos hóspedes são arqui- cerradas e que poderão fazer parte da proposta de
tetos. O edifício é uma obra-prima do hospedagem. Cada casa é única, sendo que todas
edifício está muito bem estruturado. Portanto, a identidade da casa valoriza a hos-
Tem lá tudo, uma salinha [. . . ] Está pedagem e é suscetível de concorrer para a sus-
Quando foi produzido, foi tido como exclusividade comporta amiúde um ex-libris, que é
uma coisa muito boa [. . . ] O facto de a principal atração da casa. Pode ser um ex-libris
o projeto ter sido concebido por bons a nível da arquitetura, de jardim, etc. O ex-libris é
arquitetos fez com que tenha sido ci- parte fundamental da proposta de hospedagem de
tado em revistas estrangeiras, guias de cada casa e pode motivar visitas especiais à casa,
contacto com um modo de vida diferente, con- suas limitações, é, outrossim, um contratempo à
casa com recheio antigo. Os hóspedes sensíveis, casas requer sensibilidade e contenção por parte do
sem dúvida, vêm em busca da experiência de vi- hóspede. Os constrangimentos relativos à identi-
vência numa casa antiga. dade da casa reetem-se no TH, ao poderem con-
Em síntese, a casa transmite a tradição fami- correr para que a casa feche a sua capacidade de
liar, regional e nacional ao hóspede. Uma estadia hospedagem no período de baixa auência.
na casa permite ter um mais cabal acesso a modos Neste contexto, os espaços interiores da casa-
e costumes regionais e nacionais da envolvente. A mãe terão menos funcionalidade do que os anexos,
casa tem um valor artístico e um valor familiar que uma vez estes últimos foram construídos quase
é uma mais-valia da proposta de hospedagem que de raiz para o TH. Também casas que sofreram
se pretende vender. Por outro lado, a reputação uma recuperação de altíssima intensidade podem
diciona a experiência turística? Que limitações cria Efetivamente, a identidade especíca da casa é
ela à fruição do espaço e que virtualidades apre- lesiva da sua sustentabilidade nanceira, uma vez
senta para suscitar as preferências dos hóspedes? que conduz a encargos mais elevados de recupera-
Ao optar por um estilo clássico ( vd. Braga, ção e hospedagem. A identidade da casa acarreta
2016), o antrião estará a escolher um paradigma uma maior dedicação do antrião ao TH e con-
de refuncionalização que está condicionado pela tribui, igualmente, para que a casa não possa ele-
identidade primitiva da casa e por um enquadra- var a sua sustentabilidade nanceira com grupos
mento legal mais restrito da estrutura política. Por de hóspedes que não teriam sensibilidade para as
outro lado, quanto mais ampla for a refuncionali- contingências de funcionalidade da casa ou da sua
zação da casa, maior nanciamento a estrutura reduzida capacidade de hospedagem de raiz (e.g.
política dispensará ao TH. os hóspedes de negócios).
Não obstante, a identidade da casa é um im-
rias e menos quartos do que aqueles que, agora, O antrião de TH tem a função primacial de
são precisos para a sustentabilidade nanceira da salvaguardar o ativo patrimonial representado pela
casa. Na verdade, o antrião tem de respeitar casa solarenga para a posteridade. Por outras pa-
a identidade da casa para que a reconversão não lavras, cabe-lhe certicar-se de que a utilização
traia o seu espírito original e histórico. do ativo patrimonial familiar pela geração presente
De igual modo, a identidade é, ao mesmo não inviabiliza a capacidade das gerações vindou-
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ras de se servirem e fruírem dele. Em consonância que tal pode ter implicações indesejáveis quando
são suscetíveis de constranger o potencial recre- antrião continuador. Logo, o TH não deverá for-
ativo do património. Assim sendo, valoriza-se o malizar em excesso, de modo a não se converter
ativo patrimonial como legado para gerações futu- numa modalidade am de um alojamento massivo.
visitantes. Na realidade, se não desfrutarem da ex- Beni, M. C. (2003). Análise estrutural do turismo. (9ª ed.).
periência, serão menos propensos a reincidirem na
São Paulo: Editora Senac São Paulo.
visita ou recomendarem a atração a outros. Jul- Birks, M., & Mills, J. (2011). Grounded Theory: A practi-
gamos que a tendência da formalização do TH, a cal guide. Thousand Oaks: Sage Publications Inc.
urgência de diferenciar a hospedagem, bem como
Boniface, P., & Fowler, P. (1993). Heritage and Tourism
a adesão ao estilo moderno de refuncionalização in the global village. London: Routledge.
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tabilidade nanceira da casa para encurtar o ciclo
bilitación del patrimonio sociocultural y de la economía
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investigação corrobora a de Garrod e Fyall (2000),
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quando sustentam que as atrações patrimoniais
larenga: uma Grounded Theory. (Tese de Dou-
devem ser nanceiramente saudáveis para cumpri-
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obras de recuperação mais intensiva deverão ser em 13 de outubro de 2019, em https://repositorio-
aberto.up.pt/handle/10216/83349>.
garantidas, em alguma parte, por nanciamento
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vem fornecer um serviço de cada vez maior qua- (2017). Turismo de Habitação: Património, Identi-
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lidade aos seus visitantes se pretendem concorrer
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efetivamente com um mercado turístico cada vez https://doi.org/10.34624/rtd.v2i27/28.20855
mais saturado de competidores. A nossa teoriza-
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ção oferece um importante subsídio para que os
Teoria Fundamentada do Turismo de Habitação. (Atas
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