Você está na página 1de 2

A traição no reino animal

Bases Legais
Linguagens e Códigos

Objetivos
Aplicar critérios objetivos no uso de recursos estilísticos

Conteúdo relacionado

Reportagem da Veja:

A traição no reino animal

Ao contrário do que se pensava, a promiscuidade é a regra entre as fêmeas da maioria das espécies

Ricardo Amorim

Os hábitos sexuais da viúva-negra australiana são, poderíamos dizer, do tipo atração fatal. Após o coito, o macho atira-se na boca da
parceira, cujo corpo é bem maior que o seu. Ela então o devora, numa espécie de repasto nupcial. Durante décadas, o comportamento
trágico, que se vê em várias outras espécies de aranhas em todos os continentes, intrigou os cientistas. Só recentemente, à luz de uma
série de revelações sobre os rituais de reprodução no reino animal, se percebeu a razão do sacrifício do macho. Ao servir de refeição à
fêmea, ele a mantém ocupada pelo dobro do tempo do coito, evitando a aproximação de um concorrente. É um recurso extremo para
garantir a perpetuação de sua herança genética. Isso é necessário porque a fêmea da viúva-negra é volátil demais e não rejeitaria o
assédio imediato de outro macho. O comportamento está longe de ser excêntrico. Há muito se sabe que as fêmeas de certas espécies
são bastante promíscuas. A novidade que está causando frisson entre os biólogos é a constatação de que a promiscuidade é a regra no
reino animal, não a exceção. A monogamia é estatisticamente rara entre os bichos. Ocorre em apenas três de cerca de 4 000 espécies
de mamíferos. Durante muito tempo, os biólogos acreditavam que os pássaros, em sua maioria, eram monógamos. A tecnologia do
DNA revelou que várias espécies de pássaros que se acreditava serem monógamos de fato incorrem em considerável infidelidade. Em
algumas dessas espécies acontece de muitos dos filhotes serem filhos não do macho no ninho, mas de um vizinho com o qual a fêmea
copulou clandestinamente.

Essas pesquisas estão esclarecendo muito do mistério que até agora envolvia o sexo entre animais. Ficou mais fácil entender os
variados – e alguns bem bizarros – mecanismos desenvolvidos pelos machos para assegurar que os filhotes sejam realmente seus. O
coito entre moscas varejeiras dura quarenta minutos, mas o inseto permanece grudado na fêmea por outros vinte minutos para evitar
que ela se entregue a um rival. O cachorro utiliza-se do mesmíssimo expediente. Antes de depositar seus espermatozóides, os
caranguejos do tipo maria-farinha produzem uma secreção que endurece como cimento, bloqueando a passagem do esperma de outros
machos. As libélulas possuem o pênis coberto por saliências que têm como objetivo remover o sêmen deixado na fêmea pelos machos
que anteriormente copularam com ela. Genitais adaptados são a garantia de sucesso na corrida reprodutiva, e tudo isso tem a ver com
a infidelidade das fêmeas. "Gerações de biólogos partiram do princípio de que as fêmeas são sexualmente monógamas", diz o biólogo
Tim Birkhead, da Universidade de Sheffield, na Inglaterra. "Agora está claro que eles estavam errados. Na maior parte das espécies,
as fêmeas copulam rotineiramente com muitos machos."

Em um livro recém-lançado, Promiscuity (Promiscuidade), Birkhead lista uma infinidade de casos estudados recentemente. Há dados
de cair o queixo. Certas fêmeas, como a dos chimpanzés, chegam a copular até 1 000 vezes, com parceiros diferentes, até que fiquem
grávidas. Com o auxílio das novas técnicas de determinação de paternidade, descobriu-se que, em certas ninhadas de pássaros, mais
de 75% dos filhotes não são descendentes do macho que ajuda a criá-los. Entre os primatas, mostram os estudos, quanto mais
promíscuas as fêmeas, mais desenvolvidos são os órgãos sexuais dos machos. Como a fidelidade é mais freqüente entre os gorilas,
eles têm os testículos relativamente pouco desenvolvidos. Já os chimpanzés, cujas parceiras são muito volúveis, são especialmente
bem-dotados.

Quando tomam posse de uma nova fêmea, os felinos, como leões e gatos, matam os filhotes que ela teve com outro macho. A tática
da poligamia feminina é usada para evitar a matança, já que os machos se confundem e não têm como saber quais filhos são seus e
quais são dos rivais. Em algumas espécies, vários machos, cada um deles com razões para se considerar pai, ajudam a fêmea a cuidar
dos filhotes. O estudo das atividades sexuais dos animais leva a conclusões interessantes, mas pouco contribui para compreender o
comportamento dos humanos. "Entre as pessoas, os fatores culturais são preponderantes na determinação do comportamento sexual",
diz Carlos Alberts, professor de zoologia e comportamento animal da Universidade Estadual Paulista. A pergunta que não quer se
calar é: por que as fêmeas são promíscuas? Um benefício é que quem acasala mais vezes tem mais chance de engravidar. Há também
questões de ordem prática. Grilos trocam sexo por comida. Ao cortejar a fêmea, o macho leva uma refeição para a pretendida. Entre
os pingüins, a mercadoria é uma pedra usada na construção do ninho que vai abrigar os herdeiros encomendados. A promiscuidade da
fêmea não traz maior número de rebentos (como ocorre com a infidelidade do macho), mas filhos melhores. Fêmeas de algumas
espécies parecem capazes de rejeitar o esperma indesejado e só se tornar prenhe daquele que lhes parece melhor. Para os mais
românticos, essas descobertas lembram o amargo gosto de uma traição.
Introdução
A promiscuidade é comum entre as fêmeas da maior parte das espécies animais. A maneira bem-humorada com que o redator de
VEJA transmite a notícia surpreende tanto quanto os fatos citados. Para obter tal efeito, o autor não recorre a nenhuma fórmula
mágica. O plano de aula a seguir tem como objetivo analisar o texto da reportagem e demonstrar que recursos simples como detalhes
descritivos, comparações e metáforas, quando empregados com critério, tornam a leitura agradável sem prejuízo da informação.

Atividades
1. Depois de apresentar o texto de VEJA aos alunos, lembre-os de que o uso do detalhe descritivo e da comparação acertada geram
uma comunicação interessante e eficaz.
a. O primeiro caso significa mostrar plasticamente uma coisa e colocá-la aos olhos do leitor como algo vivo. Peça à classe que busque
na reportagem momentos do detalhamento descritivo, como o trecho sobre a "atração fatal" do casal aracnídeo.
b. Já a comparação pode levar à compreensão de um conceito abstrato ou objeto pouco conhecido. Serve para destacar uma idéia ou
dar-lhe certa graça. Deve ser clara, espontânea, coerente e sugestiva. Liste no quadro-negro, com a ajuda da turma, as comparações
presentes no texto. Oriente a elaboração de novas comparações, em função das descobertas enumeradas por VEJA. Por exemplo:
"...embora sem usar preservativo, fazia sexo seguro como uma libélula".

2. Examine com os estudantes a clareza, a naturalidade, a coerência e a força sugestiva das comparações criadas em classe e daquelas
presentes no texto.

3. Esclareça o conceito de metáfora. Trata-se de transportar uma palavra de sua significação própria para outra. É uma transposição
por comparação instantânea, sem o elemento comparativo. A metáfora é sempre imagem ¬ rápida e intuitiva. Ela não pode obrigar o
leitor a uma ginástica mental para captar o sentido de uma frase. Dê exemplos de metáforas encontradas na reportagem.

Para evitar a anarquia da imaginação, peça aos estudantes que digam o que entendem por corvo, raposa, formiga, cigarra e demais
bichos das fábulas de Esopo, em que tais seres substituem pessoas. Verifique os valores contidos por trás dessas metáforas: a figura da
raposa vem associada à esperteza, a formiga remete ao trabalhador incansável etc. Em seguida, voltando ao exercício anterior sobre
comparações, faça a turma imaginar como alguém que não leu o texto de VEJA compreenderia afirmações como "Ela é uma
chimpanzé" ou "Rodolfo é o grilo de Marina".

4. Cheirando uma flor por muito tempo, perdemos a sensibilidade para seu perfume. Da mesma forma, os recursos de linguagem
precisam obedecer a uma certa gradação e variedade. O perigo da metáfora está na "patológica" deformação de estilo que poderíamos
chamar de metaforite. Discuta esse caso com a classe: "Ela tem uma face de mármore, olhos de safira, cabelos de ébano, boca de
marfim, dentes de pérola e colo de alabastro". Quem será ela? Mulher, vitrine de joalheira ou monstro?

A metáfora se gasta com o uso, se deprecia rapidamente e, uma vez transformada em frase feita, empobrece qualquer redação.

5. Explique aos alunos que, se não somos capazes de criar metáforas originais e sugestivas, podemos ao menos renovar as antigas.
Uma das alternativas mais fáceis para revigorar imagens desgastadas é o humor.

Você também pode gostar