Você está na página 1de 26

Cartilha para Produtores Rurais

PRINCÍPIOS AGROECOLÓGICOS
PARA O MANEJO ECOLÓGICO DO SOLO E
A SAÚDE DAS ÁREAS PRODUTIVAS
Sonia Sena Alfaia - Marta Iria da Costa Ayres - Reinaldo José Alvarez Puente
José Guedes Fernandes Neto - Katell Uguen
Cartilha para Produtores Rurais

PRINCÍPIOS AGROECOLÓGICOS
PARA O MANEJO ECOLÓGICO DO SOLO E
A SAÚDE DAS ÁREAS PRODUTIVAS
Sonia Sena Alfaia - Marta Iria da Costa Ayres - Reinaldo José Alvarez Puente
José Guedes Fernandes Neto - Katell Uguen

1ª Edição

Manaus - 2018
Copyright © 2018 - Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia
PRESIDENTE DA REPÚBLICA
Michel Temer
MINISTRO DA CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO
Gilberto Kassab
DIRETOR DO INSTITUTO NACIONAL DE PESQUISAS DA AMAZÔNIA
Luiz Renato de França
EDITORA INPA
Editor: Mario Cohn-Haft. Produção editorial: Rodrigo Verçosa, Shirley Ribeiro
Cavalcante, Tito Fernandes. Bolsistas: Alan Alves, Alexsander Tenório, Brenda
Costa, Júlia Figueiredo, Mariana Franco de Sá, Sabrina Oliveira Maciel.
PROJETO GRÁFICO
Stefany de Castro Guedes

C 322 Cartilha para produtores rurais: princípios agroecológicos para o


manejo ecológico do solo e a saúde das áreas produtivas /
Sonia Sena Alfaia... [et. al.]. -- Manaus : Editora INPA, 2018.
24 p. : il. color.

ISBN: 978-85-211-0177-2

1. Agricultura familiar. 2. Manejo e conservação do solo. I.


Alfaia, Sonia Sena.

CDD 307.72

Editora do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia


Av. André Araújo, 2936 – Caixa Postal 2223
Cep : 69067-375 Manaus – AM, Brasil
Fax : 55 (92) 3642-3438 Tel: 55 (92) 3643-3223
www.inpa.gov.br e-mail: editora@inpa.gov.br
Apresentação
Esta cartilha foi elaborada como material didático de um curso
que vem sendo ministrado por uma equipe do Instituto Nacional de
Pesquisas da Amazônia para agricultores familiares do Estado do
Amazonas. Esse curso vem sendo realizado por meio de oficinas
intituladas “Capacitação em Agricultura Orgânica para Produtores
Familiares” que têm como objetivo capacitar agricultores familiares
em práticas agroecológicas de uso, manejo, conservação do solo e
agricultura orgânica, visando a produção alimentos mais saudáveis,
em agroecossitemas mais sustentáveis, de acordo com os princípios
agroecológicos. Durante as oficinas, os agricultores têm a oportuni-
dade de aprender e discutir questões teóricas e, principalmente,
realizar atividades práticas, tirando suas dúvidas e fixando o
conhecimento. Esses cursos vêm sendo realizados com apoio
financeiro do MCTIC e FINEP, por meio dos projetos Feirão do
Produtor Rural e Implantação de Unidades Demonstrativas na
Amazônia, onde no período de 2 anos, de 2016 a 2017, foram capaci-
tados mais de 1500 agricultores familiares entre assentados da
reforma agrária, ribeirinhos e povos indígenas.

Sonia Sena Alfaia


Pesquisadora do INPA
SUMÁRIO
1. PRINCÍPIOS AGROECOLÓGICOS 05
1.1. Manter e cultivar a diversidade 06
1.2. Preservar e aproveitar a água 06
1.3. Plantar e preservar as matas 06
1.4. Manejar e construir um solo vivo 06
1.5. Combater as pragas e doenças de maneira natural 06
1.6. Garantir a segurança alimentar da família 07
1.7. Autonomia: produzir adubo, sementes e mudas 07
1.8. Trocar experiências sempre enriquece 07
1.9. Se organizar com outros agricultores 07

2. PRINCÍPIOS DO MANEJO AGROECOLÓGICO DO SOLO 08


3. Entendendo as características físicas do solo 09
4. Entendendo as características químicas do solo 11
4.1. Nitrogênio (N) 12
4.2. Fósforo (P) 12
4.3. Potássio (K) 13
4.4. Cálcio (Ca) Magnésio (Mg) e Enxofre (S) 14
4.5. Micronutrientes: Zinco (Zn), Cobre (Cu), Boro (B),
Manganês (Mn), Ferro (Fe), Molibdênio (Mo) e Cloro (Cl) 15
4.6. Acidez do solo 15

5. entendendo as Características Biológicas do Solo 17


6. MANEJO AGROECOLÓGICO DO SOLO 18
6.1. Cobertura do solo 18
6.2. Sucessões e Rotações de culturas 18
6.3. Consórcios entre culturas e uso de adubo verde 18
6.4. Adubação verde 19
6.5. Sistemas Agroflorestais (SAFs) 20
6.5. Manejo de plantas espontâneas 21

7. Referencias 24
1 PRINCÍPIOS AGROECOLÓGICOS
A agroecologia é uma ciência que trata das interações entre a
agricultura e os ecossistemas, mas é também uma prática que
visa a produção sustentável de alimentos saudáveis de forma
justa. Na visão agroecológica, a terra é considerada um sistema
vivo e complexo, com diversidade das plantas, animais e micror-
ganismos que apresentam interrelações ecológicas complexas
(Figura 1). Neste sistema complexo, é fundamental considerar o
conhecimento tradicional das populações que cultivam a terra
por muitas gerações, pois desenvolveram formas de manejo
adequado para cada região.

Figura 1. Em um contexto de uso de químicos o produtor tem uma visão linear, em que,
determinado inseto que ataca determinada cultura deve ser combatido com algum químico
específico. Em um contexto agroecológico a perspectiva sobre uma possível praga assume
uma visão sistêmica em que esta pode ser combatida por diversos meios, como a figura
ilustra a aranha e a galinha como possíveis predadores desse inseto. Além de desempenhar
esta função, a galinha também pode fornecer adubo para a cultura de interesse. Fonte:
Instituto Giramundo Mutuando. 2005.

Apresentamos a seguir nove princípios que podem orientar os


agricultores a continuar produzindo de maneira sustentável.

05
1.1 Manter e cultivar a diversidade
A produção diversificada diminui a dependência do agricultor em
relação a apenas uma ou duas safras e aumenta a quantidade de
seres vivos na propriedade, contribuindo para o equilíbrio ecológico
e saúde dos cultivos e do ambiente em geral.

1.2 Preservar e aproveitar a água


Cuidar da água disponível com a proteção de nascentes, rios ou
açudes através do reflorestamento das matas ciliares é essencial
para poder produzir por muito tempo. Olhos d’água e cacimba
garantem água nos períodos de seca e a água usada pode ser reapro-
veitada nas hortas e quintais.

1.3 Plantar e preservar as matas


As árvores são fundamentais para o equilíbrio ecológico na
propriedade. Elas fornecem sombra, mantém a umidade do ambien-
te, regulam o clima, dão frutos e madeira, fertilizam o solo deposi-
tando suas folhas, abrigam os animais da floresta e ajudam no
controle de insetos e microrganismos (fungos, bactérias, etc).

1.4 Manejar e construir um solo vivo


O solo precisa de proteção contra a ação direta do sol, chuvas e
ventos. A cobertura do solo promove essa proteção e ajuda a manter
sua fertilidade. Várias práticas podem ser utilizadas para revitalizar
e recuperar a sua capacidade produtiva, como cobertura morta,
adubação verde, consórcio entre culturas, rotação de cultura,
sistemas agroflorestais, adubação orgânica, dentre outros.

1.5 Combater as pragas e doenças de maneira natural


O controle biológico é estratégico para a prática de controle de
pragas e possíveis doenças, que por ser um recurso natural e ambi-
ental, equilibra o sistema, com o uso de defensivos naturais.

06
1.6 Garantir a segurança alimentar da família
A produção para o autoconsumo dos produtos agroecológicos
cultivados deve ser priorizada para a melhoria da saúde e diminui-
ção de gastos com a alimentação industrializada. O uso de ervas e
plantas medicinais também diminui os gastos com medicamentos, e
estas podem ser cultivadas, de preferência, próximo à moradia.

1.7 Autonomia: produzir adubo, sementes e mudas


Além de poder preservar e melhorar as variedades adaptadas ao
local com sementes variadas e crioulas, os gastos com a compra
desses insumos podem ser reduzidos. A produção de composto para
o adubo orgânico é fácil com o aproveitamento de restos de alimen-
tos, folhas secas, palhas, material vegetal de plantas leguminosas e
esterco de animais. Após obter um composto de boa qualidade, este
favorece a produção agrícola.

1.8 Trocar experiências sempre enriquece


É importante ficar sempre em contato com outros (as) agriculto-
res (as) para trocar ideias. Junto com técnicos e pesquisadores, ou
entre agricultores de diferentes áreas, há muitos resultados para
serem observados, discutidos e divulgados. O que deu certo? O que
deu errado? O que podemos fazer? Assim podemos compartilhar as
práticas e, juntos, construir o conhecimento agroecológico, de
acordo com as condições locais e regionais.

1.9 Se organizar com outros agricultores


A formação de associações ou cooperativas oferece a possibilida-
de de compartilhar a infraestrutura, transporte e equipamentos.
Juntos e organizados, é possível comercializar os produtos por um
preço melhor, acessar novos mercados, em especial os mercados
institucionais e garantir a independência frente a atravessadores.

07
2 PRINCÍPIOS DO MANEJO AGROECOLÓGICO DO SOLO
Nesta cartilha, será dado enfoque no manejo ecológico do solo
(PRINCÍPIO 3). O solo é muito mais que um substrato, é uma estrutu-
ra complexa onde ocorrem processos dinâmicos e essenciais ao
equilíbrio e à saúde das plantas e do ambiente. O manejo agroecoló-
gico do solo tem como princípio o seu manejo para evitar a erosão,
bem como a sua nutrição por meio da adubação com materiais
orgânicos e manutenção da ciclagem de nutrientes.
Na transição agroecológica, as mudanças são feitas a partir de
pequenas ações realizadas no dia-a-dia. Com o tempo, estas ações
são fortalecidas e permitem construir a sustentabilidade do agroe-
cossistema, sempre de acordo com as possibilidades e a realidade de
cada família. Em nossa realidade, por exemplo, o uso do fogo para
limpeza das capoeiras e roçados é algo comum e resulta em uma
melhoria da fertilidade do solo, mas de curto período, apresentando
uma queda na produção após três anos de cultivos. Por meio do uso
de práticas agroecológicas, evitando o uso sistemático do fogo, é
possível manter um solo rico e vivo por um longo período e com bons
resultados na produção agrícola.
Um solo saudável depende dos nutrientes (macro e micronutri-
entes), da porosidade (ar), da acidez do solo (pH) e da umidade,
precisando de um equilíbrio adequado para a manutenção da micro
vida que servirá de alimentação para as plantas e animais. A fertili-
dade do solo depende das características física, química e biológica
do mesmo.

08
3 ENTENDENDO AS CARACTERÍSTICAS FÍSICAS DO SOLO
O solo, também chamado pelos produtores de terra, chão, é a parte
superficial da crosta terrestre, que pode ser dividido em camadas
distintas, chamados horizontes. As camadas são sobrepostas, sendo
que as mais superficiais apresentam características diferentes das
mais profundas. As plantas possuem muitas inter-relações com o solo.
Elas se desenvolvem sob o solo e precisam de água, nutrientes e
energia para se desenvolver e assim produzir biomassa nos seus
caules, folhas, raízes, frutos e sementes (Figura 2).

Figura 2. As plantas são seres vivos e precisam


de alimentos e energia para crescer e produzir.
Mediante ao processo de fotossíntese fabricam
seu próprio alimento tomando a energia do sol e
o gás carbônico da atmosfera. Adicionalmente
precisam de água, ar e nutrientes que são
fornecidos pelo solo. Observem as diferentes
camadas do solo onde as plantas se desenvolvem.

09
Um solo é formado por partículas minerais, matéria orgânica,
água e ar (Figura 3). As partículas minerais, conforme seu tamanho
são divididas em areia, silte e argila (Figura 4). Uma vez conhecida as
proporções dessas partículas do solo, por meio de análise de labora-
tório, determina-se a textura de um solo, se arenoso ou argiloso, por
exemplo.

Figura 3. Composição física do um solo: 45% de Figura 4. Representação esque-


partículas minerais, 25% de água, 25% de ar e mática das frações areia, silte e
5% de matéria orgânica. argila. Areia > 0,005 mm, silte 0,02
a 0,05 mm, argila < o,oo2 mm de
diâmetro de grãos. Fonte: Mesquita
& Dias Junior (2013)

A matéria orgânica é a parte do solo composta por qualquer coisa


que um dia esteve vivo, como resto de plantas e animais. Essa parte
do solo está sempre mudando, pois, sempre que cai uma folha, uma
árvore, ou morre um animal, a matéria orgânica, contida em seus
corpos, passa a ser decomposta aumentando sua quantidade no solo.
A porosidade de um solo refere-se aos espaços ocupados pela água
e pelo ar. Os poros de um solo são classificados em "macroporos" e
"microporos". Os macroporos são responsáveis pela condução da
água, e os microporos pelo armazenamento. A matéria orgânica
melhora a agregação das partículas do solo, pois junta à areia, silte e
argila e forma os agregados os quais promovem uma melhor aeração
do solo (mais espaços porosos dentro do solo), ou seja, uma melhor
distribuição dos macro e microporos. É importante evitar práticas de
manejo que induzam a compactação do solo a qual reduz os espaços
porosos do solo, principalmente os macroporos. A compactação reduz
a infiltração da água, dificulta a penetração das raízes, ocasiona a
perda do solo, entre outros.

10
4 ENTENDENDO AS CARACTERÍSTICAS QUÍMICAS DO SOLO
São as características responsáveis pela disponibilidade de
nutrientes. As plantas precisam de dezesseis elementos que são
fornecidos pelo ar e pela água como o Carbono (C), o Oxigênio (O) e o
Hidrogênio (H) e pelo solo, os quais são divididos em dois grupos:
macronutrientes e micronutrientes (Figura 5). Os macronutrientes
tornam-se deficientes no solo antes dos demais, porque as plantas
necessitam destes nutrientes em maiores quantidades. Os micronu-
trientes são geralmente menos deficientes no solo, pois são usados
em quantidades menores.

Figura 5. Macronutrientes e micronutrientes que


as plantas necessitam para se alimentarem de
forma equilibrada. Fonte: Alfaia & Uguen, 2013.

11
4.1 Nitrogênio (N)
O nitrogênio é o N das formulas comerciais NPK. É o nutriente que
a planta absorve em maiores quantidades, indispensável para o
crescimento e produção das plantas. Portanto é o nutriente que com
maior frequência limita a produção agrícola. Se perde facilmente no
solo por lixiviação (lavagem) e perdas gasosas. A matéria orgânica
do solo é a principal fonte natural de N para as plantas.
Na Amazônia, as pesquisas têm mostrado que mais de 70% do N
aplicado ao solo como fertilizante químico, é perdido por lixiviação
ou por formas gasosas (Alfaia et. al, 2008). Felizmente, entre os
microrganismos do solos, existe uma bactéria chamada rizóbio que
tem a capacidade de se agarrar às raízes de algumas espécies de
plantas leguminosas, como o ingá de metro por exemplo, e consegue
capturar o nitrogênio (N2) que existe no ar para que possa ser utiliza-
do por elas ou por outras plantas consorciadas com elas. Portanto,
uma das alternativas para reduzir a deficiência de N nos solos é o uso
dessas plantas leguminosas fixadoras de N2, como adubos verdes. Um
outro benefício dessa prática é que o N mineralizado é liberado mais
lentamente do que os fertilizantes químicos, reduzindo assim suas
perdas por lixiviação. Na Amazônia, há uma grande diversidade de
leguminosas nativas que podem ser utilizadas para melhorar a
fertilidade do solo e principalmente aumentar a disponibilidade de N.

4.2 Fósforo (P)


O fósforo é o P das formulas comerciais NPK. É essencial para o
crescimento das plantas. O P movimenta-se muito pouco no solo.
Assim, ao contrário do N, o P é pouco perdido por lixiviação. Na
planta o P contribui para formação das sementes, desenvolvimento
das raízes, formação e maturação dos frutos.
A deficiência de P nos solos de terra firme da Amazônia é
generalizada. Devido à acidez do solo, quando se aplicam fertilizan-
tes fosfatados, a maior parte do P reage quimicamente com outros
elementos como o ferro (Fe) e alumínio (Al) e se transforma rapida-
mente em uma forma de composto químico que a planta não pode
absorver de imediato por ser insolúvel. Nessa forma ele é considera-

12
do “fixado”. Nestas condições a maior parte do fertilizante aplicado
fica indisponível para a planta. Todavia, é importante salientar o fato
de que a “fixação” de P não significa perdas irreversíveis desse
nutriente. Grande parte do P “fixado” passa à solução do solo, com o
passar dos anos, e pode ser aproveitada pelas culturas.
Em condições naturais de floresta primária de terra firme, a
maioria das plantas nativas desenvolve mecanismos que aumentam
a eficiência para aproveitamento do P. O principal mecanismo
consiste na associação das raízes com os fungos micorrízicos. As
micorrizas se desenvolvem em forma simbiótica com as raízes e se
estendem no solo permitindo à planta absorver mais facilmente os
nutrientes do solo, principalmente o P.

4.3 Potássio (K)


O Potássio é o K das formulas comerciais NPK. É o segundo
macronutriente em teor contido nas plantas. O teor de K nas plantas
só é inferior, em geral, ao de N. É o nutriente mais importante para a
formação dos ramos e produção de frutos.
Quando se aplicam fertilizantes potássicos, o K se perde com
facilidade devido à sua solubilidade em água, sendo que os solos
tropicais têm baixa capacidade para retê-lo. As perdas de K por
lixiviação são menores que as de N. Na Amazônia os solos têm baixos
teores de K, devido ao requerimento relativamente alto que muitas
plantas nativas da região têm por este elemento, o K é um dos nutri-
entes que mais limita a produção de frutos dessas espécies. Estudos
na região de Manaus mostraram que o K é o nutriente mais exporta-
do pelos produtos agroflorestais, devido à sua maior concentração
nas cascas e pecíolos de infrutescência (Wandelli et al., 2002). Em
plantios agroflorestais na região de Rondônia, o uso da casca de
frutos de cupuaçu triturada como adubo orgânico elevou os teores
de K no solo aumentando em 70% a produção de frutos do cupuaçu-
zeiro (Alfaia et al., 2008). Outros adubos ricos em K, mas de disponi-
bilidade restrita, são as cinzas, que, além do K, apresentam teores
consideráveis de P, Ca e Mg.

13
4.4 Cálcio (Ca) Magnésio (Mg) e Enxofre (S)
O cálcio (Ca), o magnésio (Mg) e o enxofre (S), são geralmente
chamados de macronutrientes secundários. Isso não significa que
eles têm um papel secundário no crescimento das plantas. Eles são
tão importantes quanto o N, P e K, apesar das plantas, de modo geral,
não os exigirem em grandes quantidades. O Ca é removido do solo
por lixiviação, erosão e colheita. A maneira mais importante de
adição de Ca ao solo é a calagem. Devido a uma quantidade elevada
de Ca das culturas estar contida nas partes vegetativas, qualquer
prática de manejo que inclua o retorno dos restos culturais ao solo
resulta na reincorporação de quantidade apreciáveis do Ca removi-
do (Figura 6).
Os solos geralmente contêm menos Mg do que Ca, porque o Mg é
mais solúvel e sujeito à maior lixiviação. Embora a maioria dos solos
contenha Mg o suficiente para suportar o crescimento das plantas,
podem ocorrer deficiências, principalmente nos solos arenosos e
ácidos das regiões úmidas. A fonte mais comum do Mg é o calcário
dolomítico. Também uma parte do Mg extraída do solo pelas cultu-
ras pode retornar a ele com os resíduos vegetais.

Figura 6. Quantidades elevadas


de Ca e Mg contidas nas partes
vegetativas das plantas, podem
ser reincorporadas ao solo com o
retorno dos restos culturais como
cobertura morta, além de
proteger o solo contra a erosão,
mantém a temperatura e umidade
em níveis adequados. Foto: Sonia
Alfaia
14
No solo, a maior parte do enxofre (S) encontra-se na forma orgâ-
nica, permanecendo combinado com o carbono (C) e o nitrogênio
(N). Quantidades consideráveis de S são retidas na matéria orgânica
do solo, que representa uma importante fonte de S na maioria dos
solos.

4.5 Micronutrientes: Zinco (Zn), Cobre (Cu), Boro (B), Manganês (Mn),
Ferro (Fe), Molibdênio (Mo) e Cloro (Cl)
Os micronutrientes são tão importantes para a nutrição das
plantas quanto os macronutrientes. Estes ocorrem no solo e na
planta em quantidades muito pequenas. As deficiências de micronu-
trientes em plantas podem ter efeitos drásticos sobre a produtivida-
de das culturas, embora sua ocorrência seja bem mais rara do que a
deficiência de macronutrientes.

4.6 Acidez do solo


A presença de dois elementos presentes no solo, que não são
nutrientes, determinam o grau de acidez de um solo. São os íons de
alumínio (Al3+) e hidrogênio (H+) que aumentam a acidez do solo,
enquanto Ca2+, Mg2+ e K+, diminuem. A acidez é um dos fatores mais
limitantes para o uso dos solos na Amazônia, a maior parte dos solos da
região é ácida, tem baixos teores de Ca, Mg e K e altos teores de Al e H.
A consequência principal da acidez do solo é a toxidez que o
alumínio causa às plantas. O alumínio compromete o desenvolvi-
mento das raízes, diminuindo a capacidade das plantas para absor-
ver água e nutrientes do solo; inibe o desenvolvimento de microrga-
nismos responsáveis pela decomposição da matéria orgânica e pela
liberação de nitrogênio, fósforo e enxofre; a fixação de nitrogênio
pelas plantas leguminosas também é severamente afetada; adicio-
nalmente o alumínio bloqueia a absorção e translocação de nutrien-
tes essenciais como o fósforo, o cálcio, o magnésio e alguns micronu-
trientes, causando problemas nutricionais nas plantas.
Para avaliar a acidez do solo é necessário conhecer o pH e a
quantidade de alumínio. O termo pH define a acidez ou alcalinidade

15
relativa de uma solução. A escala de pH cobre uma amplitude de 0 a
14. Um valor de pH igual a 7 é neutro. Valores abaixo de 7 são consi-
derados ácidos e acima de 7 são básicos. A maioria dos solos produti-
vos varia entre valores de pH 4 e 9.
Existem várias estratégias para corrigir os problemas de acidez
do solo, tais como:
1) seleção de espécies vegetais tolerantes à acidez do solo.
Algumas espécies, principalmente nativas da Amazônia são toleran-
tes a níveis altos de Al;
2) Aplicação de calcário que contém Ca e em alguns casos, tam-
bém o Mg. O calcário aumenta pH e neutraliza o Al, diminuindo a
acidez do solo, além de fornecer Ca e Mg para a nutrição vegetal;
3) As cinzas também têm um efeito parecido ao do calcário. Estas
contêm Ca e Mg provenientes das plantas e ao entrar em contato com
o solo aumentam o pH e diminuem o teor Al.

16
5 ENTENDENDO AS CARACTERÍSTICAS BIOLÓGICAS DO SOLO
Além de decomporem a matéria orgânica e permitirem a recicla-
gem de nutrientes nos solos pobres, os microrganismos invisíveis a
olho nu (fungos, bactérias e algas) e também aqueles visíveis a olho
nu (minhocas, cupins, formigas, etc) realizam uma série de ativida-
des essenciais para o desenvolvimento das plantas (Figura 7). Em
virtude da baixa disponibilidade de nutrientes, os solos dependem
da atividade biológica para reciclar os nutrientes, por exemplo,
disponibilizando o P e fixando o N da atmosfera. Para isto são
necessárias entradas constantes de material orgânico no solo. Além
de alimentos para os microrganismos a matéria orgânica pode
complexar o alumínio e contribuir para a estruturação dos solos,
melhorando a infiltração e retenção de água.

Figura 7. O solo é o meio com o maior número de espécies do


planeta, portanto, é importante manter a saúde do solo.
Fonte:
http://www.adalgisamocellin.com.br/seres-vivos-no-solo/

17
6 MANEJO AGROECOLÓGICO DO SOLO
Um dos principais fatores limitantes para a sustentabilidade da
agricultura na Amazônia é a baixa fertilidade natural do solo e a
dificuldade de manejá-lo para se obter produtividades satisfatórias.
Para aumentar a produtividade nesses solos pobres, é necessário
repor os nutrientes, sendo, o manejo da matéria orgânica de funda-
mental importância. Devem-se realizar práticas que conservem e
aumentem o teor da matéria orgânica.
Dentre as várias técnicas de manejo para manter a vida e a quali-
dade do solo pode-se destacar:

6.1 Cobertura do solo


Essa prática tem como objetivo manter a umidade e temperatura do
solo em níveis ótimos, evitando a erosão pelo vento, pela chuva e resse-
camento pelo sol. Um solo coberto e mais úmido favorece a existência de
microrganismos, de minhocas, formigas, etc, que são importantes para a
respiração do solo e os seus dejetos fornecem nutrientes para as plantas.
Cobertura do solo com plantas vivas ou secas impedem o desenvolvi-
mento de plantas espontâneas. O uso de cobertura é muito importante,
pois, além de auxiliar no controle de "ervas daninhas", protege o solo do
impacto da chuva e diminui a necessidade de rega, já que conserva a
umidade do solo. Além disso, reciclam os nutrientes, constituindo-se
numa boa fonte de adubo orgânico.

6.2 Sucessões e Rotações de culturas


A alternância entre as culturas evita o desgaste do solo com
monoculturas e contribuindo para a conservação dos nutrientes,
pois utiliza plantas com diferentes processos de crescimento, tipos
de raízes e com funções e necessidades diversas. Assim como contri-
bui para o controle de pragas e doenças.

6.3 Consórcios entre culturas


Plantas companheiras de famílias diferentes favorecem a produ-
ção pela riqueza de interações. Elas podem ser arranjadas de formas

18
diversas, tornando o manejo até mais fácil. Os consórcios mais
comuns são os de leguminosas com gramíneas.

6.4 Adubação verde


Os adubos verdes são plantas que agem como verdadeiros fertili-
zantes, e condicionadores, adicionando ao solo matéria orgânica de
alta qualidade nutricional. São plantas, em sua maioria, da família
das leguminosas, tais como: mucuna preta, leucena, guandu, feijão-
deporco, ingá, gliricídia, puerária, desmodium, palheteira, entre
outras. Estas plantas têm a capacidade de aumentar a quantidade de
nitrogênio (N) no solo, além de outros nutrientes. Essas plantas
devem ser deixadas sobre a superfície ou incorporadas ao solo. A
adubação verde além de fornecer os nutrientes, pode servir como
proteção do solo contra a erosão.
Como escolher um bom adubo verde?
A planta precisa ter crescimento rápido; produzir muitas semen-
tes, folhas e galhos; goste de solo pobre; faça bastante sombra na
terra e tenha raízes profundas. As espécies citadas abaixo, como,
feijão-de-porco (Figura 8), feijão guandu (Figura 9), ingá, gliricídia
(Figura 10), dentre outros podem ter um bom desempenho para
adicionar nitrogênio no solo.

Figura 8. Feijão-de-porco, uma importante leguminosa rasteira


para ser usada com adubação verde e que também pode ser usada
para alimentar os porcos. Foto: Profa. Anastácia Fontanetti.

19
Figura 9. Feijão Guandu, também uma importante legu- Figura 10. Espécies de árvores de legu-
minosa arbustiva para adubação verde e que pode ser minosa apropriadas para o uso como
consumida pela população humana. Foto: Profa. adubação verde. No alto do lado esquerdo
Anastácia Fontanetti. a Leucena e do lado direito a Gliricídia.
Embaixo, do lado esquerdo, a Palheteira e
do lado direito o Ingá Cipó, que é a mais
comum na região de Manaus. Foto: Luiz
Augusto G. Sousa.

6.5 Sistemas Agroflorestais (SAFs)


Os Sistemas Agroflorestais (SAFs) seguem os conceitos e princí-
pios ecológicos no desenvolvimento de sistemas produtivos com
mais sustentabilidade, produzindo e conservando, ao mesmo
tempo, o solo, a água e a biodiversidade. As agroflorestas podem
melhorar a produtividade, a rentabilidade e a qualidade de vida dos
agricultores.
A biodiversidade é condição indispensável para a saúde dos
sistemas naturais. Sendo também um princípio norteador para os
SAFs, que tem sua sustentação e estabilidade baseadas na diversida-
de da produção. Esta diversidade de espécies é um caminho para se
obter produções estáveis a curto, médio e longo prazo. Quanto maior
a biodiversidade do sistema mais ele terá resistência a pragas,
doenças e outros riscos causados pelas variações climáticas e
econômicas.
A diversidade de espécies vem juntamente com uma grande
variedade de funções das plantas, que podem ser cultivadas nos
SAFs de forma harmônica. A proposta para a agrofloresta é aberta e
permite que agricultores e agricultoras construam seu Sistema

20
Agroflorestal, de acordo com suas necessidades e com o que a
natureza lhe permite (Figura 11).

Figura 11. Sistema Agroflorestal com 10 anos do Projeto


RECA em Rondônia, composto de pupunha, cupuaçu e
castanha. Foto: Sonia Alfaia

6.6 Manejo de plantas espontâneas


As plantas que surgem espontaneamente são muitas vezes
chamadas de “plantas daninhas”, “mato” ou mesmo “pragas”. O uso
desses nomes para as chamadas plantas espontâneas, muitas vezes não
são apropriados para a agricultura orgânica, pois leva em conta apenas
os efeitos negativos que elas causam sobre a produção agrícola,
ignorando seus efeitos positivos (Pereira e Melo, 2008)
No manejo agroecológico, as plantas diferentes da cultura são
chamadas de “espontâneas” porque surgem sem serem plantadas, mas
isso não significa que sejam prejudiciais à cultura. Mesmo podendo
causar perdas as culturas pela competição por água, luz e nutrientes, ao
invés de eliminar as plantas espontâneas – até mesmo aplicando herbi-
cidas – deve-se conviver com elas. Cada uma dessas plantas tem seu
papel de proteger a superfície do solo, estocar nutrientes e hospedar
insetos polinizadores, benefícios ao cultivo.
Há plantas mais problemáticas nos ciclos de diferentes culturas,
sendo preciso avaliar o dano econômico para planejar as estratégias de
manejo. Se for necessária a eliminação seletiva, ou o controle dessas
plantas podem ser usadas as seguintes técnicas de manejo:

21
• Cobertura do solo com plantas vivas ou secas impedem o desen-
volvimento de plantas espontâneas.
• Não revolver o solo para manter as sementes das plantas espon-
tâneas na superfície do solo, sem condições adequadas à sua
germinação.
• Controle mecânico através de capinas, manuais ou mecânicas, ou
melhor, ainda, através de roçadas a partir do momento em que as
plantas espontâneas atingem o ponto de dano econômico.

Figura 12. Nesta imagem podemos observar a aplicação de algumas técnicas descritas acima como a
cobertura do solo, consórcio entre culturas e sistemas agroflorestais. Nas linhas acima temos o
consórcio agroflorestal entre banana, café, abacate, eucalipto, entre outras arbóreas e nas entrelinhas
o plantio de hortaliças como rúcula, alface, tomate, brócolis, dentre outras culturas. Fonte: José Guedes.

As técnicas de manejo agroecológico do solo valorizam sempre o


princípio da vida, tendo como referência alguns princípios práticos:
• Não fazer queimadas;
• Não usar agrotóxicos nem adubos sintéticos;
• Manter o solo permanentemente coberto;
• Conhecer e obedecer à sucessão natural da plantas;

22
• Buscar sempre aumentar a biodiversidade da área cultivada;
• Manejar espécies agrícolas, frutíferas e florestais;
• Conservar flora (plantas) e fauna (animais) nativas;
• Cultivar a mesma área até que ela se torne sustentável;
• Produzir as próprias mudas ajuda a diminuir os custos de
produção. Elas podem ser preparadas a partir das sementes ou
vegetativamente, com partes das plantas.
• Utilizar sempre que possível os recursos locais, inclusive para a
alimentação da família.

23
7 REFERêNCIAS
ALFAIA, S. S.; UGUEN, K. 2013. Fertilidade e Manejo de Solos. In:
MOREIRA, F.M.S.; CARES, J.E.; ZANETTI, R.; STUMER, S.L. (Org.). O
Ecossistema Solo - Componente, relações ecológicas e efeitos na
produção vegetal. Lavras: Editora UFLA, p. 75-90.
ALFAIA, S.S.; UGUEN, K.; RODRIGUES, M.R.L. 2008. Manejo da
Fertilidade dos Solos na Amazônia. In: MOREIRA, F.M.S; SIQUEIRA,
J.O; BRUSSAARD, L. (Org.). Biodiversidade do solo em ecossiste-
mas brasileiros. Lavras: Editora da UFLA, p. 117-141.
MESQUITA, M.G.B.F; DIAS JUNIOR, M.S. 2013. Física do Solo. In:
MOREIRA, F.M.S.; CARES, J.E.; ZANETTI, R.; STUMER, S.L. (Org.). O
Ecossistema Solo - Componente, relações ecológicas e efeitos na
produção vegetal. Lavras: Editora UFLA, p. 65-74.
MUTUANDO, INSTITUTO GIRAMUNDO. 2005. Botucatu, SP: Editora
Criaçã o Ltda. 92p. Disponıv́el em
http://www.fca.unesp.br/Home/Extensao/GrupoTimbo/Cartilha
Agroecologica.pdf
PEREIRA, W., MELO, W.F. 2008. Manejo de plantas espontâneas no
sistema de produção orgânica de hortaliças. Circular Técnica 62,
Embrapa, Brasília-DF. 8p.
WANDELLI E.V.; FERREIRA, F.; SOUZA, G.F.; SOUZA, S.G.A. &
FERNANDES, E.K.M 2002. Exportação de nutrientes de sistemas
agroflorestais através de colheitas- O valor dos resíduos dos
frutos amazônicos. In: Congresso Brasileiro de Sistemas Agroflo-
restais, 6, Ilhéus, Bahia, Resumos, CD-ROM.

24
ISBN 978-85-211-0177-2

9 788521 101772

Você também pode gostar