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Editora Unoesc
Coordenação
Débora Diersmann Silva Pereira - Editora Executiva
Revisão metodológica: Débora Diersmann Silva Pereira, Gilvana Toniélo, Maria Lúcia Gelain
Projeto gráfico: Simone Dal Moro
Capa: Daniely A. Terao Guedes
ISBN 978-85-8422-012-0
CDD 340.1
Reitor
Aristides Cimadon
Vice-reitor Acadêmico
Nelson Santos Machado
Vice-reitores de Campi
Campus de São Miguel do Oeste
Vitor Carlos D’ Agostini
Campus de Videira
Antonio Carlos de Souza
Campus de Xanxerê
Genesio Téo
Resumo
Abstract
This article presents the results of a bibliographical research developed under the topic
the judicialization of politics. For reaching this scope, has been made an analysis of the
main points of proceduralism, taking as reference Habermas’ work, and substantialism,
based upon Dworkin, exposing their characteristics and, at the end, tracing a summary
of the contributions that both bring to judicial review and its democratic improvement,
looking forward to provide an effective protection of the fundamental rights protected
by the Constitution. Finally, it establishes a dialogue between proceduralism and sub-
stantialism, since they are not seen as excludent, but as complementary and interdepen-
dent of each other.
Keywords: Judicial review. Judicialization of politics. Proceduralism. Substantialism.
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Pós-Doutora em Direito pela Ruprecht-Karls Universität Heidelberg, Alemanha. Doutora em Direito pela Universidade
do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, com pesquisa realizada junto à Ruprecht-Karls Universität Heidelberg, na Alemanha.
Professora do Programa de Pós-Graduação em Direito – Mestrado e Doutorado da Universidade de Santa Cruz do Sul –
UNISC, onde leciona as disciplinas de Jurisdição Constitucional e de Controle Jurisdicional de Políticas Públicas, respec-
tivamente. Coordenadora do Grupo de Pesquisa “Jurisdição Constitucional Aberta”, vinculado e financiado pelo CNPq,
desenvolvido junto ao Centro Integrado de Estudos e Pesquisas em Políticas Públicas – CIEPPP (financiado pelo FINEP),
ligado ao Programa de Pós-Graduação em Direito – Mestrado e Doutorado da Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC.
Bolsista de produtividade em pesquisa do CNPq; moniah@unisc.br
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Mestrando em Direito no Programa de Pós-Graduação em Direito – Mestrado e Doutorado da universidade de Santa
Cruz do Sul. Especialista em Direito Público pela Universidade Cândido Mendes – UCAM. Pós-graduando lato sensu (Espe-
cialização) em Gestão Pública Municipal pela Universidade Federal de Santa Maria – UFSM e em Direitos Humanos pela
Universidade Federal do Rio Grande – FURG; felipe@estudosdedireito.com.br
1 INTRODUÇÃO
substituiria o próprio texto da norma pela via indireta da interpretação. Em síntese, des-
tacam que, “sob pretexto e a despeito do texto da Constituição propiciar um tecido nor-
mativo ‘fechado’ demais, setores do direito pensam que é preciso ‘abrir’ esse sentido da
normatividade constitucional com um uso aleatório e descompromissado dos princípios
constitucionais.” (OLIVEIRA;STRECK; BARRETTO, 2010, p. 10).
Habermas, ao se referir às normas de princípio, critica que, “nos domínios da
ação não formalizada, a possibilidade de contextualização de uma aplicação de normas,
dirigida à totalidade da constituição, pode fortalecer a liberdade e a responsabilidade dos
sujeitos que agem comunicativamente” (HABERMAS, 1997a, p.306), mas, por outro lado,
ocasiona “um crescimento de poder para a justiça e uma ampliação do espaço da decisão
judicial, que ameaça desequilibrar a estrutura das normas do Estado clássico de direito,
às custas da autonomia dos cidadãos” (HABERMAS, 1997a, p. 306).
Daí é possível concluir que, para o procedimentalismo, “a Constituição se en-
contra desprovida de derivações valorativas. A Constituição, nestes termos, não possui
qualquer conteúdo ideológico, predisposição ao humano, ao social ou ao econômico. Sua
preocupação central seria apenas estabelecer procedimentos formais de composição de
interesses, quaisquer que sejam estes.” (TAVARES, 2007, p. 338-339).
Acerca do entendimento de Habermas, é possível abstrair que, no tocante ao pro-
cesso de efetivação dos direitos sociais por meio do processo de judicialização, principal-
mente no que tange ao controle jurisdicional de políticas públicas, o papel do Poder Judi-
ciário estaria adstrito ao perímetro previamente delimitado pelas normas jurídicas, sendo
ilegítima qualquer atuação deste, quando inovar ou substituir a decisão política, eis que, ao
menos no plano teórico, transluz a vontade democrática da maioria, como destaca Appio:
na esfera social, um dever que, por ser prescrito legislativamente, cabe exatamen-
te aos juízes fazer respeitar. (CAPPELLETTI, 1993, p. 41)
Sem dúvida, é verdade, como descrição bem geral, que numa democracia o poder
está nas mãos do povo. Mas é por demais evidente que nenhuma democracia pro-
porciona a igualdade genuína de poder político. Muitos cidadãos, por um motivo ou
outro, são inteiramente destituídos de privilégios. O poder econômico dos grandes
negócios garante poder político especial a quem os gere. Grupos de interesse,
como sindicatos e organizações profissionais, elegem funcionários que também
têm poder especial. Membros de minorias organizadas têm, como indivíduos, me-
nos poder que membros individuais de outros grupos que são, enquanto grupos,
mais poderosos. Essas imperfeições no caráter igualitário da democracia são bem
conhecidas e, talvez, parcialmente irremediáveis. Devemos levá-las em conta ao
julgar quanto os cidadãos individualmente perdem de poder político sempre que
uma questão sobre direitos individuais é tirada do legislativo para o judiciário.
(DWORKIN, 2001, p. 31).
Diante disso, resta evidente que, “[...] numa democracia, as pessoas têm, pelo
menos, um forte direito moral prima facie a que os tribunais imponham os direitos que o
legislativo aprovou.”(DWORKIN, 2001, p. 14). Da mesma forma, é importante ressalvar,
como faz Appio, que “[...] invocar a voz e a obra de Ronald Dworkin como justificação
para um governo de juízes e para o populismo judicial representa, em última análise, uma
distorção de seu pensamento e de sua obra, violando princípios de democracia represen-
tativa.” (APPIO, 2013, p. 1.318).
Dworkin ressalva, é verdade, que a sua teoria da decisão judicial transfere ao juiz
maior poder que o positivismo, destacando que ela seria recomendável quando estivés-
semos certos do desejo de que os juízes, mais que os legisladores, tivessem este poder
(DWORKIN, 2002, p. 553).
Em suma, para Dworkin não se pode separar direito e moral, sendo que os prin-
cípios não nascem com a legislação, ou seja, não necessitam estar positivados. O seu
filtrar a influência que a sociedade exerce sobre o Legislativo e, a partir disso, estruturar
a proteção aos direitos fundamentais é imaginar que o princípio democrático se satis-
faz, simplesmente, com a proteção aos direitos entendidos legítimos pela maioria (GÓES,
2011, p. 340).
Por outro lado, uma atuação exclusivamente substancialista, voltada à satisfação de
direitos de forma unilateral por juízes e tribunais, em uma manifesta atuação ativista, poderia
criar uma oligarquia togada, pondo em risco os princípios democráticos do Estado Republicano
(GÓES, 2011, p. 340).
De toda a sorte, mesmo que sejam inúmeras as críticas à atuação contemporânea
do Judiciário a história tem demonstrado que não há Estado Democrático de Direito sem
uma jurisdição efetiva, atentando para os ideais de justiça constitucional, pois a esta cabe
à concretização, que se realiza mediante a interpretação de dispositivos muitas vezes
principiológicos, com elevada carga valorativa (BITENCOURT; LEAL, 2010, p. 316).
O importante neste aspecto é que tanto o procedimentalismo de Habermas quanto
o substancialismo de Dworkin reconhecem a abertura e a indeterminação do conteúdo da
Constituição (LEAL, 2012, p. 95). Assim, é possível vislumbrar a possibilidade de “[...] uma
postura procedimentalista preocupada com a tutela substantiva de direitos, a especial ma-
neira de prover-se uma saída para a legitimidade das decisões judiciais.” (GÓES, 2011, p.
340).
A vinculação entre as correntes é reforçada pelo fato de que o próprio exercício de
procedimentos e competências conduz necessariamente a uma leitura moral e valorativa,
principalmente porque os conceitos à operacionalização destes elementos só existirão se
forem lidos partindo-se de algum lugar. Por consequência, em dado contexto, por exem-
plo, a ideia de participação política e de representação, tal qual a própria noção de de-
mocracia, somente será compreendida ou operada caso restem claros os seus pressupostos
(LEAL, 2012, p. 202).
Com efeito, esses elementos encontram-se em um campo de modo tipicamente
substantivo, o que demonstra a indissociabilidade entre o procedimentalismo e o substan-
cialismo (LEAL, 2012, p. 202). Dito em outras palavras, o “processo democrático é pro-
cesso com participação efetiva das partes, mas com vistas a fazer prevalecer toda a carga
substantiva inerente aos direitos fundamentais.” (GÓES, 2011, p. 336).
Assim, não há como imaginar uma participação democrática, sem ter como pre-
missa básica, como ponto de partida não exclusivamente a liberdade e manifestação indi-
vidual pura e simples, idealizadas por Habermas, mas, principalmente, a garantia dos di-
reitos que são fundamentais, os quais representam o cerne das garantias do próprio Estado
Constitucional e Democrático de Direito, idealizado por Dworkin (GÓES, 2011, p. 336).
Diante disso, instrumentos que não contenham fins ou certa face teleológica se
demonstram vazios, uma vez que, como a própria essência do termo “instrumento” reve-
la, se constituem em uma ferramenta à realização de algo. Destarte, da mesma forma,
não podem, os procedimentos democráticos e a participação cidadã, serem tidos como um
fim em si mesmo, necessitando, pois, sob pena de esvaziarem o seu sentido, uma fusão
com determinados conteúdos materiais e valorativos (LEAL, 2012, p. 202).
5 CONCLUSÃO
cialização da política idealizado por Dworkin, pois se correria o risco de instituir-se uma
oligarquia togada, sob os auspícios “do poder da caneta” e o sonho da efetivação de di-
reitos a qualquer custo.
Assim sendo, resta claro que não se trata de tudo ou nada, de substancialismo ou
procedimentalismo, mas de se aplicar, no sistema brasileiro, as contribuições de ambas as
correntes, de modo que se tenha um diálogo conciliador entre estas duas lógicas, eis que
não são excludentes, mas interdependentes, pois não se pode dispensar os procedimentos
democráticos, bem como, no exercício da função jurisdicional, não se pode abdicar de
uma tutela substancial à concretização de direitos.
Como já se expos, tanto Habermas quanto Dworkin acreditam que o ideal de-
mocrático parte de uma sociedade integrada por atores em igual liberdade e igualdade.
Ocorre que, enquanto o primeiro acredita que, para a consecução democrática, bastaria
à fixação e o respeito às condições procedimentais, o segundo sustenta que não há de-
mocracia sem uma leitura substantiva da Constituição, traduzida no tratamento de igual
consideração e respeito à pessoa humana, sem o qual não há a possibilidade de efetivação
democrática dos direitos.
Por derradeiro, é necessário reafirmar a necessidade dos procedimentos demo-
cráticos, principalmente com a abertura de arenas propícias à participação popular e o
efetivo exercício da cidadania, mas também é imperioso que se tenha, principalmente
quando houver dano aos direitos das minorias e omissão dos demais Poderes na efetivação
dos direitos fundamentais, que o Judiciário exerça seu papel de Guardião da Constituição,
o qual passa, necessariamente pela tutela substancial destes direitos, e que, de forma
alguma, coloca em risco os ideais democráticos e a harmonia entre os Poderes.
REFERÊNCIAS
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APPIO, Eduardo. Ronald Dworkin e o ativismo judicial. Jornal Carta Forense. abr. 2013.
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