Você está na página 1de 14

Notícias Brasil Internacional Economia Saúde Ciência Tecnologia Víd

ADVERTISEMENT

Nova guerra na Europa? 6 pontos para


entender conflito em Nagorno-Karabach

REUTERS

Dezenas de civis de origem armênia participaram do conflito Nagorno-Karabakh

Redação
BBC News Mundo

20 setembro 2023
Sons de artilharia e sirenes antiaéreas marcaram nesta terça-feira (19/9) o reinício da
disputa entre a Armênia e o Azerbaijão pelo controle da região de Nagorno-Karabakh.

Esta área no sul do Cáucaso — onde a Europa encontra a Ásia — é palco de confrontos há
anos. A tensão pelo controle do enclave separatista cresceu nos últimos meses — no local,
reconhecido internacionalmente como parte do Azerbaijão, vivem cerca de 120 mil
pessoas que se identificam como armênias.

Um frágil cessar-fogo foi quebrado esta terça-feira, quando o Ministério da Defesa do


Azerbaijão comunicou o início de operações “antiterroristas” na região e apelou à rendição
dos líderes separatistas armênios.

“Para que as medidas antiterroristas cessem, as formações militares armênias ilegais


devem hastear bandeira branca, entregar todas as armas e o regime ilegal deve ser
dissolvido”, afirmou o Ministério da Defesa.

“Caso contrário, as medidas antiterroristas continuarão até o fim.”

Matérias recomendadas

A Ucrânia conseguiu romper a primeira linha de defesa russa?

A disputa que ameaça estreita aliança de Ucrânia e Polônia na


guerra contra Rússia

'Papa de Hitler' ou 'salvador dos judeus'?: quem foi Pio 12 e por


que seu papel na 2ª Guerra segue polêmico

Os países vizinhos da Rússia que temem ser os próximos alvos de


Putin

O Azerbaijão afirma que lançou a operação em resposta à morte de seis pessoas, incluindo
quatro policiais, em duas explosões de minas terrestres na manhã de terça-feira.

Na principal cidade de Karabakh, Khankendi (conhecida como Stepanakert pelos


armênios), foram ouvidos tiros e sirenes de ataques aéreos.

Autoridades de defesa da região separatista disseram que militares do Azerbaijão


"violaram o cessar-fogo com ataques de artilharia e mísseis".

Outros representantes armênios falaram de uma “ofensiva militar em grande escala” e


afirmaram que houve várias mortes, incluindo mulheres e crianças, embora o Azerbaijão
negue ter civis como alvos.

ICTIMAI TV

Detonações foram relatadas em Nagorno Karabakh - o acesso da imprensa ao local é muito


limitado, o que dificulta a confirmação dos fatos

O Azerbaijão e a Armênia entraram em guerra duas vezes por causa da disputa de


Nagorno-Karabakh — primeiro no início da década de 1990, após a queda da União
Soviética, e novamente em 2020.

Há três anos, o Azerbaijão recuperou territórios dentro e ao redor de Karabakh que


estavam sob controle da Armênia desde 1994.

Desde dezembro do ano passado, o Azerbaijão bloqueou a única rota da Armênia para o
enclave, conhecida como corredor de Lachin.
O corredor é a única estrada que liga o enclave ao território da Armênia. É uma artéria
essencial para abastecimento, e os residentes de Nagorno-Karabakh relataram grave
escassez de alimentos básicos e medicamentos nos últimos meses.

O Azerbaijão acusou os armênios de usarem a estrada para circular suprimentos militares,


o que a Armênia nega.

1. Como tudo começou?


O território montanhoso de Nagorno Karabakh, uma região de cerca de 11,5 mil km2 com
população predominantemente armênia, é alvo de disputa há décadas entre o Azerbaijão,
onde está localizado, e os habitantes do enclave, que são apoiados pela vizinha Armênia.

Em 1988, perto do fim do domínio soviético, forças do Azerbaijão e separatistas armênios


começaram uma guerra violenta na qual entre 20 mil e 30 mil pessoas morreram após o
parlamento regional de Nagorno-Karabakh ter votado para se tornar parte da Armênia.

O Azerbaijão tentou então sufocar o movimento separatista, enquanto os armênios o


apoiavam.

Isso desencadeou, inicialmente, uma série de conflitos étnicos. Depois de a Armênia e o


Azerbaijão terem declarado independência de Moscou, começou uma guerra em larga
escala.
A primeira guerra terminou com um cessar-fogo mediado pela Rússia em 1994, depois de
as forças armênias assumirem o controle da região e de áreas adjacentes.

Nos termos do acordo, o território permaneceu parte do Azerbaijão, mas desde então tem
sido em grande parte governado por uma autoproclamada república separatista, liderada
por armênios étnicos e apoiada pelo governo armênio.

Como pano de fundo está uma controversa divisão territorial de fronteiras estabelecida
durante a época da União Soviética

2. Como o território foi dividido?


O Cáucaso é uma importante região montanhosa, cujo controle foi reivindicado durante
séculos por diferentes etnias, religiões e impérios.

A Armênia e o Azerbaijão que conhecemos hoje foram integrados à antiga Soviética,


quando esta foi formada em 1920.

Nagorno-Karabakh, também conhecido como Alto Karabakh, é uma região de maioria


étnica armênia.

Em 1923, no entanto, os soviéticos entregaram seu controle às autoridades do Azerbaijão


e foi formado como região administrativa autônoma dentro da então República Soviética
do Azerbaijão.
GETTY IMAGES

Tensão entre armênios e azerbaijanos se agravou no final da década de 1980, durante a


desintegração da União Soviética.

Nogorno-Karabakh é habitada por dezenas


de milhares de armênios.

Para eles, esta região faz parte da Grande


Armênia, um conceito que reúne territórios
que historicamente foram povoados pelo
grupo étnico armênio-cristão-ortodoxo.

Ou seja, no meio de uma república


predominantemente muçulmana como o
Azerbaijão, há um território habitado por
cristãos ortodoxos.

Segundo Paulo Botta, especialista em


Oriente Médio da Universidade Católica
Argentina, esse tipo de traçado de fronteiras Brasil Partido
era uma prática comum na antiga URSS “para
João Fellet tenta entender como brasileiros
evitar qualquer tipo de homogeneidade em
chegaram ao grau atual de divisão.
todas as suas repúblicas”.
Episódios
Tratava-se de “dividir para conquistar”, disse
ele à BBC no ano passado, quando eclodiu
um novo episódio de violência que deixou dezenas de mortos.

Esta ideia é endossada por analistas como o historiador britânico Simon Sebag
Montefiore, que num artigo publicado no jornal New York Times argumentou que "Stalin
abraçou a missão imperial do povo russo e desenhou a URSS usando seu conhecimento
das disputas étnicas no Cáucaso para criar repúblicas dentro de repúblicas".

Esta rede de fronteiras influenciou vários conflitos étnico-políticos que ocorreram após a
desintegração da URSS, como as guerras chechenas da década de 1990, a guerra na
Geórgia em 2008 e as da Armênia e do Azerbaijão.

3. Os "Estados fantasma"

Nagorno-Karabakh pertence a uma categoria conhecida como “Estado Fantasma”.

São entidades que manifestaram o desejo de serem Estados independentes, que


apresentam algumas características típicas ou particulares, mas não são reconhecidas
como tal pela comunidade internacional.

A cientista política Dahlia Scheindlin, especializada em relações internacionais, explicou à


BBC que a maioria destes “Estados fantasmas” surgiram em locais onde ocorreram
conflitos etnonacionalistas, o que explicaria porque muitos se encontram no antigo bloco
comunista da Guerra Fria.
AFP

Armênios e Azerbaijanos vivem em tensão permanente

“Uma série de conflitos etno-nacionalistas ocorreu durante a dissolução da URSS e isso


aconteceu por se tratar de um império grande e em expansão, com muitos grupos étnico-
nacionais diferentes. Rebelar-se contra a liderança comunista significava abraçar suas
identidades nacionais", disse Scheindlin à BBC após o último conflito.

A URSS tinha como política tentar mudar a configuração demográfica de muitos lugares,
enviando população etnicamente russa para viver nestes locais, explicou.

“Todas estas tentativas de arquitetar a identidade nacional ao longo dos anos levaram a
rebeliões contra esta dinâmica quando a URSS caiu.”

4. O que houve em 2020?


A situação tem oscilado por anos, com confrontos episódicos interrompendo períodos de
relativa calma.

O maior confronto militar desde o início da década de 1990 aconteceu há três anos,
durante seis semanas de intensos combates.

O Azerbaijão recuperou territórios e, quando ambos os lados concordaram em assinar um


acordo de paz mediado pela Rússia, em novembro de 2020, o país já tinha recapturado
todos os territórios ao redor de Nagorno-Karabakh – e não o próprio enclave – detidos
pela Armênia desde 1994.

Nos termos do acordo, as forças armênias tiveram que se retirar destas áreas e desde
então ficaram confinadas a uma parte menor da região.

Desde o fim de 2020, cerca de 3 mil soldados russos monitoram a frágil trégua, mas a
atenção de Moscou foi desviada após a invasão russa na Ucrânia.

EPA

Ataques 2020 voltaram a deixar milhares de vítimas.

5. O papel da Rússia e Turquia

Potências regionais estão fortemente envolvidas no conflito.

A Turquia, país membro da Otan, a aliança militar ocidental, foi a primeira nação a
reconhecer a independência do Azerbaijão em 1991 e continua a ser um forte aliado do
país.
Na opinião de muitos, os drones Bayraktar de fabricação turca tiveram papel crucial nos
combates de 2020, permitindo ao Azerbaijão ganhar territórios.

A Armênia, por sua vez, tem tradicionalmente mantido boas relações com a Rússia. Há
uma base militar russa na Armênia e os dois países são membros da aliança militar da
Organização do Tratado de Segurança Coletiva (CSTO), formada por seis antigos Estados
soviéticos.

GETTY IMAGES

A população de Stepanakert tem sofrido com a falta de acesso a alimentos e suprimentos


devido ao bloqueio do Azerbaijão.

Mas as relações entre a Armênia e a Rússia azedaram desde que Nikol Pashinyan, que
liderou enormes protestos contra o governo em 2018, se tornou primeiro-ministro da
Armênia .

Ele disse recentemente que a dependência russa da Armênia como fonte única de
segurança era um “erro estratégico”.

A Armênia anunciou neste mês que estava organizando exercícios conjuntos com forças
dos EUA. Eles foram criticados por Moscou como “medidas hostis”.

O presidente Vladimir Putin negou que a Armênia tenha quebrado sua aliança com a
Rússia, mas declarou que Ierevan, a capital da Armênia, tinha "essencialmente
reconhecido" a soberania do Azerbaijão sobre Nagorno-Karabakh.
“Se a própria Armênia reconheceu que Karabakh faz parte do Azerbaijão, o que
deveríamos fazer?”, disse Putin durante um fórum econômico em Vladivostok.

6. O que acontece agora?


O acesso à área para observadores independentes é extremamente difícil e a extensão das
atuais operações militares e sua duração não são claras.

O que está claro é a acentuada inimizade que continua a existir entre os dois países.

O presidente do Azerbaijão, Ilham Aliyev, ameaçou repetidamente no passado retomar


todo o território de Nagorno-Karabakh pela força, se necessário.

Em 2019, Pashinyan disse a uma multidão de armênios reunidos na principal cidade de


Karabakh que "Artsakh é Armênia, ponto final".

Artsakh é o nome armênio de Nagorno-Karabakh.

REUTERS

Centenas de pessoas protestaram em Ierevan, capital da Armênia, contra a ofensiva do


Azerbaijão

Muitas nações olham para esta área do Cáucaso com preocupação de que outra guerra
possa surgir no antigo território soviético, além da guerra na Ucrânia.

A Europa quer manter a paz no Azerbaijão, de onde importa 8 bilhões de metros cúbicos
de gás por ano, depois de sofrer com a perda de fornecimento de gás da Rússia devido ao
conflito com a Ucrânia.

Mas o barril de pólvora que este conflito representa é uma ameaça constante a esse e a
outros objetivos geopolíticos das potências que o rodeiam.

O Ministério das Relações Exteriores da Rússia disse na terça-feira que foi avisado sobre a
ofensiva do Azerbaijão com poucos minutos de antecedência e que instou ambos os países
a respeitarem um cessar-fogo assinado após a guerra em 2020.

O representante especial regional da União Europeia, Toivo Klaar, disse que há


“necessidade urgente de um cessar-fogo imediato”.

Tópicos relacionados

Militares Vladimir Putin Política Ásia Leste Europeu Europa

Principais notícias

Queda do dólar aniquila renda dos catadores de recicláveis: 'preciso recolher 8


toneladas de papel para ganhar um salário mínimo'
Há 1 hora

Reduflação: por que produtos menores com preços iguais vieram para ficar
Há 1 hora
Teto que esquenta na favela e ar-condicionado no bairro rico: a desigualdade sob
calor extremo
Há 37 minutos

Leia mais

A 'poeira cósmica' alojada nos telhados das catedrais


24 setembro 2023

Você também pode gostar