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21, nº 2, 519-523
DOI: 10.9788/TP2013.2-17
Dutton (2013) e Meisenberg e colaboradores os atendem mais que uma vez semanalmente.
(Meisenberg, 2013; Meisenberg, Rindermann, Não obstante, as pessoas que vivem em nações
Patel, & Woodley, 2012) têm, neste periódico, mais ricas tendem a deixar a religião tradicional
discutido a robusta e negativa relação entre inteli- ou não têm qualquer afiliação religiosa específi-
gência e crenças religiosas nos Estados Unidos e ca, sendo tal fuga mais substancial em nações do
na Europa, bem como, destacado o papel media- norte da Europa e em outras nações economica-
dor da educação, tipos de crenças religiosas, fer- mente mais afluentes.
tilidade e fatores de personalidade, aspectos estes A título de exemplo, no jornal diário O Es-
que, na literatura pertinente, fomentam inúmeras tado de São Paulo (Leal, 2011) relata-se que a
controvérsias e interesses teóricos. Interessante proporção de católicos, em relação às demais
também são as prováveis causas aludidas visando religiões, tem apresentado baixa recorde. A re-
a explicação da elevação de tais correlações ao portagem mostra um novo mapa das religiões
longo do desenvolvimento da civilização. no qual a proporção de católicos, em 2009, foi
Não obstante tal importância da inteligên- a menor registrada em quase 140 anos de pes-
cia e sua relação com a religião, cumpre apontar, quisas estatísticas no país. Em outras palavras,
também, o papel da religiosidade nas estimativas embora continue maioria, a população católica
individuais ou agregadas do bem-estar subjetivo. chegou a 68% do total de brasileiros, o equiva-
lente a 130 milhões de pessoas, mas, pela pri-
Paradoxo da Religião meira vez neste mesmo país, tal proporção foi
Inúmeros estudos têm demonstrado que pes- menor que 70%. Dados similares também reve-
soas religiosas registram, em média, um maior laram uma estagnação do número de evangéli-
grau de bem-estar subjetivo, bem como, menor cos pentecostais que, nos anos 90, apresentaram
número de determinadas patologias sociais, den- grande crescimento, assim como, um elevado
tre as quais os abusos domésticos, por exemplo. crescimento do número dos que se dizem sem
Levantamentos realizados entre 1972 a 2008, religião específica.
nos Estados Unidos, revelaram que a porcenta- Pergunta-se, “Por que as pessoas estão dei-
gem de pessoas indicando que são muito felizes xando a religião tradicional, em nações onde a
variou de 26%, entre aqueles que nunca atendem liberdade religiosa é alta, se essa mesma reli-
aos serviços religiosos, a 48%, entre aqueles que gião é associada a benefícios como, por exem-
1
Endereço para correspondência: Departamento de Psicologia, Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de
Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Av. Bandeirantes, 3900, Campus da USP-RP, Ribeirão Preto, SP,
Brasil, CEP 14040-901. E-mail: jadsilva@ffclrp.usp.br.
520 Da Silva, J. A., Santos, R. C.
plo, bem-estar subjetivo mais elevado?”. Acer- cios da religiosidade para o bem-estar subjetivo
ca disso, alguns teóricos supõem que o declínio são atenuados uma vez que os indivíduos não re-
na religiosidade é associado com o crescimen- ligiosos têm níveis elevados de suportes sociais
to econômico, ou seja, que a religião ajude as e respeito, os quais já lhes garantem o mesmo.
pessoas a lidarem com circunstâncias difíceis, Parece, então, que, em muitas circunstâncias
sendo mais benéfica quanto mais complexo, e sociais desafiadoras, a religiosidade agrega res-
difícil, é o contexto de vida das pessoas. Nações peito, suporte social e propósito e significado na
economicamente desenvolvidas, em média, são vida, os quais, por sua vez, são associados com
superiores em alcançarem as necessidades bá- níveis mais elevados de bem-estar subjetivo.
sicas previamente pretendidas, como educação,
segurança e longevidade, por exemplo. Felicidade e Religião
Neste mesmo contexto, tais nações têm tam- Sendo salientes as conexões entre religião
bém melhor infraestrutura que outras protetoras e saúde mental, é a religião, como suposta por
contra desastres naturais e doenças epidêmicas. Freud, corrosiva para a felicidade, isto pelo fato
Assim, em nações economicamente desenvolvi- da mesma criar uma neurose obsessiva que en-
das, supostamente, as pessoas são mais hábeis em talha culpa, sexualidade reprimida e emoções
alcançar os mais elevados indicadores de bem- suprimidas, associando-a a satisfação e prazer.
estar subjetivo sem a ajuda da religião organiza- Evidências acumuladas revelam que algumas
da. Contrastando, quando as pessoas se deparam formas de experiências religiosas se correlacio-
mais frequentemente com a fome, doenças, cri- nam com preconceitos e culpa, mas, em geral, a
mes e educação não qualitativa, as quais são rela- religiosidade ativa é mais associada com vários
tivamente mais descontroladas, e prevalentes, em critérios de saúde mental. Pessoas ativamente re-
sociedades pobres, a religião pode, talvez, fazer ligiosas são bem menos prováveis de tornarem-
uma contribuição maior para o bem-estar. Nestas se delinquentes, viciados em drogas e álcool,
nações, religiosidade, usualmente, é associada divorciarem-se e cometerem suicídio do que as
com maior suporte social, respeito, propósito ou não religiosas.
significado na vida. Ademais, dados revelam que pessoas ativa-
Considerando especificamente a relação en- mente religiosas tendem a ser fisicamente mais
tre religiosidade e bem-estar subjetivo das dife- saudáveis e viverem mais longamente, também.
rentes nações (escores agregados), religião cor- Por sua vez, outras pesquisas têm revelado es-
relaciona-se em -0,48 com avaliações da vida, a treita correlação entre fé e capacidade de enfren-
qual varia de 3,0 no Togo, onde 88% disseram tamento de crises que ocorram ao longo de suas
que religião é importante em sua vida diária, vidas. Por exemplo, comparadas com viúvas
a 7,9 na Dinamarca, onde 19% afirmaram que religiosamente inativas, aquelas recentemente
religião é importante. No nível individual, após enviuvadas que, usualmente, participam de cul-
controlar circunstâncias negativas, as pessoas re- tos religiosos, registram uma maior satisfação e
ligiosas tendem a ter indicadores de bem-estar alegria em suas vidas. Também, entre as mães
subjetivos mais elevados, mas os efeitos benéfi- de crianças com dificuldades evolutivas e cogni-
cos são maiores em nações mais difíceis. tivas, aquelas com profunda fé religiosa têm se
Assim considerando, a associação de reli- mostrado menos vulneráveis à depressão. Pesso-
giosidade com bem-estar subjetivo pode depen- as de fé também tendem a reter, ou a recuperar,
der de duas condições, a saber: se uma socieda- uma maior felicidade após passarem por divór-
de enfrenta condições de vida mais difíceis ou cio, desemprego, doença grave ou sofrimento
se é altamente religiosa. Em sociedades menos intenso. Para as pessoas, os dois melhores pre-
religiosas, com circunstâncias relativamente fa- ditores da satisfação com a vida, na maturidade,
voráveis, o bem-estar subjetivo médio elevado é têm sido saúde e religiosidade.
atingido pela maioria das pessoas, independente Em um levantamento realizado em várias
da religiosidade. Nestas sociedades, os benefí- nações, pessoas religiosamente ativas também
Carta aos editores: Bem-Estar Subjetivo, Educação, Inteligência e Religião 521
ções com QI de 64 a 108) e +0,54 (populações Lynn, R., Harvey, J., & Nyborg, H. (2009). Average
com QI de 87 a 108). Neste grupo, em particular, intelligence predicts atheism rates across 137
20% da população, não acreditam em Deus (ver nations. Intelligence, 37, 11-15.
também, Kanazawa, 2009, 2010; Lynn & Va- Lynn, R., & Vanhanen, T. (2012). Intelligence: A
nhanen, 2012). unifying construct for the Social Science. Lon-
Logo, na descrença religiosa, a maior parte don: Ulster Institute for Social Research.
da variação está entre as nações com QI mais alto. Meisenberg, G. (2013). A reply to Dutton´s (2013)
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