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PERFIL DAS VÍTIMAS E DOS DELITOS DE ESTUPRO PRATICADOS NA

REGIÃO METROPOLITANA DE BELÉM – PARÁ – BRASIL, NO PERÍODO DE


2010 A 2019.

Leonan Braga Lopes


Universidade Federal do Pará
lopesleonan84@gmail.com

Edson Marcos Leal Soares Ramos


Universidade Federal do Pará
ramosedson@gmail.com

RESUMO
Importância do Estudo: Os casos de estupros contra mulheres são decorrentes de uma
sociedade patriarcal, cujos costumes normalizavam ou atenuavam essa prática, fazendo incidir
sobre a vítima a responsabilidade por tal ato. Nesse sentido, a pesquisa científica, como
ferramenta de luta por justiça, é essencial no processo de mudança da visão social acerca da
violência sexual, e importante instrumento de apoio à construção de políticas públicas,
garantindo apoio às vítimas e gerado sobre o Estado a demanda de punição dos agressores.
Objetivo: Traçar o perfil das vítimas e dos delitos de estupro, praticados na Região
Metropolitana de Belém/Pará/Brasil, no período de 2010 a 2019. Metodologia: A pesquisa,
quanto à abordagem do problema, possui caráter quantitativo e, quanto ao objetivo, é
descritiva e exploratória, posto que, com base em dados oficiais, caracterizar-se-á o estupro de
mulheres ocorridos no período de 2010 a 2019, utilizando-se de gráficos, tabelas e medidas de
síntese. Resultados: Verificou-se que a maioria dos casos de estupros foram praticados em
residências particulares, cuja maioria dos agressores foi o padrasto. Além disso, observou-se
que Belém é a cidade da Região Metropolitana com maior percentual de estupro, com os
casos, em sua maioria, ocorrendo no período da noite. Conclusões: Faz-se necessário maior
aprofundamento de estudo acerca dos fatores causais deste tipo de violência, como também,
reavaliar as medidas públicas de enfrentamento pelos órgãos da segurança pública.

Palavras-chave: Violência Sexual; Crime; Caracterização; Dignidade da Pessoa Humana.


2

INTRODUÇÃO

A violência sexual representa um sério problema de saúde pública, sendo um dos


principais indicadores da discriminação de gênero contra a mulher (NUNES; MORAIS,
2016). Dutra e Thibau (2020) entendem esse fato delituoso como um fenômeno multifatorial,
modelado por aspectos culturais ligados à construção dos gêneros (masculino e feminino),
categorizando historicamente as diferenças sociais, uma vez que as relações dessa natureza
não são um aspecto permanente de condição humana.
Falar aqui dos princípios constitucionais e do bem jurídico protegido...
Nesse diapasão, o estupro (falar primeiro da previsão no CPB, citando que há 2
espécies de estupro no BR) ele já é definido quando houver uma ausência de consentimento
da vítima, exemplificado quando embebedam uma pessoa e faz relações sexuais, pois a pessoa
não estava consciente para aprovar o ato (TERASOLO et al., 2015).
Segato (2003) afirma que o estupro é notado pelos agressores como “castigo ou
vingança genérica contra a mulher que não saiu do lugar”, dando a entender que função
feminina na sociedade era ficar em casa cuidando do lar. A limitação imposta à mulher
também é reforçada nas instituições judiciais, pois apesar da existência de leis, que visam
preservar a integridade feminina, na prática o mundo jurídico apresenta uma predominância
de valores masculinos que ajudam a cumprir um papel significativo de manutenção da ordem
de status entre homens e mulheres (DUTRA; THIBAU, 2020). As tomadas decisivas das
concepções discriminatórias em relação à mulher prova que ainda existe um quadro latente da
falta de harmonia entre os propósitos da lei e a moralidade patriarcal presentes na mentalidade
dos operadores da lei (DUTRA; THIBAU, 2020).
O estudo característico da pesquisa é divido em quatro itens: localização, período de
tempo, perfil da vítima e perfil do agressor. A localização agrupa o local de ocorrência e os
municípios. O período de tempo agrupa mês, ano, dia da semana e turno. Já o perfil da vítima,
caracteriza faixa etária, ocupação/profissão, nível de escolaridade e situação civil. E o perfil
do agressor agrupa a relação dele com a vítima, a faixa etária, o meio usado durante o crime e
a motivação pelo ato.

MATERIAL E MÉTODOS

A pesquisa é de caráter quantitativo e descritivo, realizada na Região Metropolitana de


Belém (RMB), a qual é formada pelos municípios de Belém, Ananindeua, Marituba, Santa
3

Isabel do Pará, Benevides, Santa Bárbara e Castanhal. A RMB demarca uma extensão
territorial de 3.566,203 km² e detém uma população de 2.547.756 habitantes (IBGE, 2021).
Os dados utilizados no estudo acerca dos estupros de mulheres, ocorridos na RMB no
período de 2010 a 2019, são referentes aos registros de Boletim de Ocorrência Policial
(B.O.P.) e foram extraídos do Sistema Integrado de Segurança Pública (SISP) e
disponibilizados por meio da Secretaria Adjunta de Inteligência e Análise Criminal (SIAC),
órgão esse vinculado à Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Estado do Pará
(SEGUP/PA).
Para compreensão das características dos estupros de mulheres, utilizar-se as seguintes
variáveis: (i) ano do fato: 2010, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015, 2016, 2017, 2018 e 2019; (ii)
mês do fato: janeiro, fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro,
novembro e dezembro; (iii) dia da semana do fato: domingo, segunda, terça, quarta, quinta,
sexta e sábado; (iv) turno do fato; madrugada, manhã, tarde e noite; (v) município de
ocorrência: Ananindeua, Belém, Benevides, Castanhal, Marituba, Santa Bárbara do Pará e
Santa Izabel do Pará; (vi) meio empregado: arma de fogo, arma cortante ou perfurante, objeto
contundente e outros meios; (vii) local de ocorrência: via pública, residência particular, bar e
outros (estabelecimento de ensino, casa comercial, edifício público, condomínio comercial,
habitação coletiva, logradouro público, prédio, terreno baldio, hospital, hotel, pensão, via
férrea e outros); (viii) situação civil da vítima: solteira, casada / união estável, viúva e
divorciada; (ix) faixa etária da vítima ou do agressor: 12 a 17, 18 a 24, 25 a 29, 30 a 34, 35 a
64 e >64; (x) nível de escolaridade: N.A.: não alfabetizada, EFI – ensino fundamental
incompleto, EFC – ensino fundamental completo, EMI – ensino médio incompleto, EMC –
ensino médio completo, ESI – ensino superior incompleto, ESC – ensino superior completo;
(xi) tipo de relação da vítima com o acusado: padrasto; pai; ex-companheiro; companheiro;
tio; conhecido; primo; cunhado; esposo; namorado; avô; irmão; ex-namorado; ex-cunhado;
genro; sogro; (xii) ocupação da vítima: estudante, dona de casa, domestica e outras profissões
(vendedor, atendente em geral, professora, balconista, cabeleireira, costureira, aposentada,
auxiliar em geral, camareira, comerciante, manicure, vendedora, administradora, auxiliar de
enfermagem, comerciaria, corretora, costureira, cozinheira, esteticista, estoquista, feirante,
medica, pedagoga, promotora de vendas, recepcionista, secretaria e zootecnista) e (xiii) causa
presumível: devassidão, ódio ou vingança, alcoolismo / embriaguez, entorpecentes, outras.
E, no que tange à análise dos dados, foi aplicada a técnica estatística de análise
exploratória de dados, a qual permite estabelecer a relação entre as variáveis estudadas, além
4

de demonstrar o fenômeno estudado por meio de gráficos, tabelas e medidas de síntese


(MARCONI; LAKATOS, 2003; BUSSAB; MORETIN, 2017).

2.3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.3.1. Estupro Criminal e Permissível na Sociedade Patriarcal

O aspecto de superioridade física masculina atribuiu ao homem um poder de


dominância. Conforme Iennaco (2017) é apontado uma presença de “normalização informal
machista” ao justificar as atitudes violentas dos homens de maneira viril, agressiva e sem
controle, que recusa ouvir um “não” da mulher como resposta. Apesar de aparentar uma forte
virilidade, o homem costuma ser identificado com virilidade frágil, pois o agressor não pratica
o ato em busca de poder e sim porque ao notar que está com a identidade masculina em risco,
se vê na necessidade de ser conquistado diariamente (SEGATO, 2003).
Num cenário de imposição social de uma masculinidade agressiva, o estupro constitui
uma busca de poder e dominação na relação entre o homem e a mulher, levando a entender
que essas causas não levam aos momentos prazerosos em não resistir aos desejos sexuais, e
sim por meio da necessidade socialmente imposta de exercer o poder, conforme exposto
(DUTRA; THIBAU, 2020).
Dutra e Thibau (2020) afirmam que na prática cotidiana de violência sexual nas
sociedades patriarcais, em contextos de guerras e ditaduras, triunfar as mulheres pelo estupro
tornou-se a maneira de medir a vitória nos combates como parte da prova de masculinidade e
de sucesso por parte dos soldados. Além disso, as filhas virgens eram negociadas pelos
próprios pais como mercadoria para aumentar o patrimônio familiar (DUTRA; THIBAU,
2020). Somente a partir dos séculos XVI e XVII que o estupro passa a ser percebido como ato
de violência, mas sem a proteção à dignidade da mulher, visto que a ameaça maior e digna de
preservação era a honra da família, que poderia se desmoronar com o “roubo da castidade e da
virtude” por parte da vítima (ROSSI, 2016).

2.3.2. Legislações sobre estupro

Antes da Lei Nº 12.015/2009, o Código Penal Lei Nº 2.848/1940, previa o crime de


estupro, no artigo 224, com o adjetivo vulnerável, por relacionar uma violência presumida o
quanto ao ato sexual com sujeitos passivos que se encaixariam aos tidos vulneráveis
(BRASIL, 1940). A evolução dos Códigos Penais traz melhorias de definição jurídica em
5

relação ao assunto, melhorando a capitulação e o enquadramento dos fatos ao tipo penal,


beneficiando uma evolução técnica por parte dos legisladores. Sancionado em 1940, o Código
Penal só entrou em vigor a partir de 1º de janeiro de 1942 (FERREIRA, 2019).
O estupro foi classificado como crime hediondo a partir da promulgação da Lei N°
8.072/1990 (BRASIL, 1990), e com relação aos crimes contra costumes a denominação
patriarcal da “mulher honesta”, foi revogada com a sanção da Lei N° 11.106/2005 (BRASIL,
2005). As reformas legislativas não foram acompanhadas de uma cultura sensível às questões
de gênero por parte de quem opera pelo direito, pois a insistência de reproduzir estereótipos e
lugares sociais nos casos de violências sexuais além de deixar de tutelar um grupo específico
de mulheres, também contribui a culpa nas vítimas pelas agressões sofridas (BARBOSA;
CATOIA; SOUZA, 2021).
O crime de estupro é previsto no Código Penal Brasileiro, no Artigo 213, onde tipifica
esse crime como qualquer ato libidinoso a ser praticado, contra a vontade da vítima (BRASIL,
1940). Não importa se o ato foi forçado contra a própria vontade da pessoa ou se a vítima
estava desacordada, é crime (CUNHA, 2019). Já o crime de estupro de vulnerável, é previsto
no Artigo 217-A do Código Penal como praticar libidinoso com menor de 14 anos ou ter
conjunção carnal (BRASIL, 1940).

2.4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Na Figura 1 pode-se observar que a quantidade de estupros de mulheres ocorridos na


Região Metropolitana de Belém – Pará – Brasil, apresenta crescimento expressivo a partir do
ano 2016 ( X =¿ 2,67), sendo 2017 ( X =¿10,33), 2019 ( X =¿9,00) e 2018 ( X =¿8,42),
respectivamente, os anos com as maiores médias de ocorrências estupros no período do
estudo e janeiro de 2017 o mês com maior número (n = 15) de ocorrências.

Figura 1 – Quantidade de estupros de mulheres ocorridos na Região Metropolitana de Belém


– Pará – Brasil, no período de 2010 a 2019, por mês e ano.
6

16 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019
15
14
12
10
Quantidade

8
6
4
2
0
Jan Jul Jan Jul Jan Jul Jan Jul Jan Jul Jan Jul Jan Jul Jan Jul Jan Jul Jan Jul
Mês

Quantidade Média
Fonte: Construção dos autores a partir de informações da SIAC (2021).

A 14ª edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública (FBSP, 2020), lançada sob o
contexto da pandemia da Covid-19, mostra mais uma vez que a violência de gênero não tem
freio, se na edição de 2015 do anuário os pesquisadores mostraram que havia um estupro a
cada 11 minutos no país (FBSP, 2015), a edição de 2020 mostra que esse tipo de crime foi
registrado a cada 8 minutos em 2019. Foram lavrados 66.123 boletins de ocorrência de
estupro e estupro de vulnerável, registrados em delegacias de polícia apenas em 2019 (FBSP,
2020).
Quarta-feira foi o dia da semana identificado com maior percentual de estupro de
mulheres (18,28%), ocorridos na Região Metropolitana de Belém (Figura 2).

Figura 2 – Percentual de estupros de mulheres ocorridos na Região Metropolitana de Belém –


Pará – Brasil, no período de 2010 a 2019, por dia da semana.
7

20.00 18.02 18.28


18.00
16.00 14.72
14.00 12.18 12.69 12.69
11.42
12.00
Percentual

10.00
8.00
6.00
4.00
2.00
0.00
Domingo Segunda Terça Quarta Quinta Sexta Sábado

Dia da Semana
Fonte: Construção dos autores a partir de informações da SIAC (2021).

De acordo com os resultados do teste Qui-Quadrado, como o valor calculado do teste (


2 2
χ CAL = 13,16) é maior que o valor tabelado ( χ TAB = 12,592) ao nível de significância de 5%, foi
identificado que a probabilidade de ocorrência de estupro não é a mesma ao longo dos dias da
semana. Dados apresentados como esse busca relatar dificuldades conceituais e ambiguidade
das vítimas de serem reconhecidas como a mais afetada, e mesmo assim ser a mais
responsabilizada.
O maior percentual de estupro de mulheres (28,68%) ocorridos na Região
Metropolitana de Belém foi identificado no período da noite (Figura 3).

Figura 3 – Percentual de estupros de mulheres ocorridos na Região Metropolitana de Belém –


Pará – Brasil, no período de 2010 a 2019, por turno.
8

28.68
30.00
25.38 25.38
25.00
20.56
20.00
Percentual

15.00

10.00

5.00

0.00
Madrugada Manhã Tarde Noite

Turno

Fonte: Construção dos autores a partir de informações da SIAC (2021).

Os casos de estupro são mais acessíveis de noite em virtude de menor circulação de


pessoas. Essa situação busca discutir as dificuldades das vítimas em reconhecer se foram
violentadas, pois elas sentem o peso de serem culpadas pela violência sofrida, e nesse
contexto entra a questão do turno. O resultado do teste Qui-Quadrado indica que o valor
calculado do teste ( χ 2CAL= 5,30) é menor que o valor tabelado ( χ 2TAB = 7,815), ao nível de
significância de 5%, o que leva identificar que a probabilidade de ocorrência de estupro em
relação ao turno será a mesma. A mulher sendo vista como objeto sexual a qualquer hora para
o prazer sexual masculino, impossibilita um meio que leva o estupro ser evitado (FONSECA,
2016).
A capital do estado foi identificada como o município de ocorrência com o maior
percentual de estupro de mulheres (65,74%) na Região Metropolitana de Belém – Pará –
Brasil (Figura 4).

Figura 4 – Percentual de estupros de mulheres ocorridos na Região Metropolitana de Belém –


Pará – Brasil, no período de 2010 a 2019, por município de ocorrência.
9

Belém 65.74

Ananindeua 19.80

Castanhal 5.58
Município

Benevides 3.81

Marituba 2.54

Santa Isabel do Pará 1.78

Santa Barbara do Pará 0.76

0.00 10.00 20.00 30.00 40.00 50.00 60.00 70.00

Percentual
Fonte: Construção dos autores a partir de informações da SIAC (2021).

Belém ter o maior percentual entre as vítimas está ligado ao fato da capital paraense
ter uma população maior, o que possibilita maiores chances de casos registrados, além do
fácil acesso que as mulheres estupradas têm para denunciar os agressores. No ano de 2021,
foram registrados em Belém 593 casos de estupro com o percentual de 57,63%, levando em
consideração aos municípios que integram a Região Metropolitana (PARÁ, 2022).
O local onde acorreu a maioria dos estupros de mulheres da Região Metropolitana de
Belém – Pará – Brasil, foi em residência particular (77,41%) (Figura 5).

Figura 5 – Percentual de estupros de mulheres ocorridos na Região Metropolitana de Belém –


Pará – Brasil, no período de 2010 a 2019, por local de ocorrência.
Outros
9.14
Bar
2.54
Via pública
10.91

Residência
particular
77.41

Fonte: Construção dos autores a partir de informações da SIAC (2021).


10

O fato de haver constantes casos de estupros dentro das residências está justificado por
ser o lugar que impossibilita haver interferências de terceiros. Isso indica que quando o
agressor dorme ao lado, fica evidente a gravidade do problema de violência doméstica no país
ser refletido ao viés selecionado do universo que está sendo analisado (CERQUEIRA;
COELHO; FERREIRA, 2017). Dentro dos transportes coletivos, têm ocorrido práticas de
crime contra a dignidade feminina. São os crimes de importunação sexual, definido como
“praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a
própria lascívia ou a de terceiro”, de acordo com o Código Penal (BRASIL, 1940). Tal
tipificação foi inserida no Código Penal por meio da Lei N° 13.718 de 2018, a qual foi criada
após ser relatado diversos casos de assédio dentro dos transportes coletivos em São Paulo,
onde os autores do crime tinham comportamentos importunos ofensivos ao pudor, embora
essa prática não seja configurada ao estupro (FBSP, 2019). Dessa forma, houve uma iniciativa
para tentar criminalizar condutas não configuradas como estupro, porém são mais graves que
a importunação ofensiva ao pudor caracterizada de contravenção penal, como afirmam Lins
(2019) e Chakian (2019). Em 2019, foram registrados 8.068 casos de importunação sexual no
Brasil com taxa média em aproximadamente 6.600 vítimas por 100 mil habitantes (FBSP,
2019).
O meio empregado durante a ocorrência da maioria dos estupros de mulheres na
Região Metropolitana de Belém – Pará – Brasil (Figura 6) foi classificado como outros meios
n = 362), seguida por uso de arma cortante ou perfurante (n = 14). Esses outros meios são
exemplificados a partir do uso de força física por parte do agressor, a prática do estupro
coletivo, e além de dopar e embriagar a vítima.

Figura 6 – Quantidade de estupros de mulheres ocorridos na Região Metropolitana de Belém


– Pará – Brasil, no período de 2010 a 2019, por tipo de meio empregado.
11

Arma de fogo
11
Arma cortante ou
Outros meios perfurante
362 14
Objeto con-
tundente
7

Fonte: Construção dos autores a partir de informações da SIAC (2021).

As consequências das agressões podem ocorrer de forma imediata e ao longo prazo, de


forma física e psicológica, sendo que em algumas ocasiões os traumas físicos podem não estar
presentes pelo fato dos agressores usarem armas que impossibilitam as vítimas de opor
resistência. Os frutos dessa violência acarretam em gravidez indesejada, e dessa forma os
estudos elaborados identificou uma amostra representativa com mais de 4.000 mulheres
maiores de 18 anos, com uma taxa de gravidez de 5% por estupro (FAÚNDES et al., 2006).
Na Figura 7, pode-se ver que devassidão, isto é, ato imoral, libertino e obsceno, foi a
motivação mais observada nas ocorrências dos estupros de mulheres da Região Metropolitana
de Belém – Pará – Brasil. As outras motivações, que também é destacada na pesquisa, é
exemplificada por meio da roupa que vítima está usando, além da influência de terceiros.

Figura 7 – Percentual de estupros de mulheres ocorridos na Região Metropolitana de Belém –


Pará – Brasil, no período de 2010 a 2019, por motivação.
12

Devassidão 33.50

Ódio ou vingança 16.24


Motivação

Alcoolismo / embriaguez 4.06

Entorpecentes 0.76

Outras 45.44

0.00 10.00 20.00 30.00 40.00 50.00

Percentual
Fonte: Construção dos autores a partir de informações da SIAC (2021).

Os estupros motivados pela devassidão representam uma gravidade preocupante,


muitas vezes ao notar os comportamentos dos agressores, que vai desde o assédio iniciado
com cantadas até chegar ao contato físico de maneira não consensual. Com isso, não se
pretende transformar os homens em potenciais estupradores, e sim abrir um caminho para
desconstruir os processos de masculinidades e feminilidades que foram normalizadas pela
sociedade (CÂMARA; LIMA; CRUZ, 2019).
Mulheres adolescentes (40,87%) e adultas na faixa etária de 18 a 24 anos (24,68%) são
as vítimas mais frequentes de estupros na Região Metropolitana de Belém – Pará – Brasil
(Figura 8).

Figura 8 – Percentual de estupros de mulheres ocorridos na Região Metropolitana de Belém –


Pará – Brasil, no período de 2010 a 2019, por faixa etária (anos) da vítima.
45.00 40.87
40.00
35.00
30.00 24.68
Percentual

25.00
20.00
14.40
15.00 10.80
8.74
10.00
5.00 0.51
0.00
12 a 17 18 a 24 25 a 29 30 a 34 35 a 64 > 64

Faixa Etária (anos)


Fonte: Construção dos autores a partir de informações da SIAC (2021).
13

Ao identificar o percentual maior da faixa etária, leva em pauta a discussão da


relativização dos estupros de vulneráveis, pois causa uma preocupação com a integridade
vulnerável das vítimas. Com o Código Penal, no artigo 217-A, impedindo decisões de
adolescentes entre 12 e 14 anos em praticar atos sexuais, busca preservar o aspecto emocional
das vítimas. Dessa forma, antes da Lei N° 12.015/2009, os crimes contra menores de 14 anos
já eram abarcados na presunção de violência. Além disso, é importante ressaltar também que
o período da juventude é marcado pela padronização de modelos culturais e de estereótipos
criados sobre o corpo da mulher para serem encaixados dentro desse padrão, em que a vítima
começa a sofrer os primeiros assédios e, estando indefesa, vira alvo fácil dos criminosos. O
corpo da mulher chama atenção da figura masculina pela beleza e por provocar aos homens os
sentimentos que despertam um caráter dominador (GOMES; DINIZ, 2008).
Mulheres com ensino médio completo (28,44%) e a ensino fundamental incompleto
(24,92%) são as vítimas mais frequentes de estupros na Região Metropolitana de Belém –
Pará – Brasil (Figura 9).

Figura 9 – Percentual de estupros de mulheres ocorridos na Região Metropolitana de Belém –


Pará – Brasil, no período de 2010 a 2019, por escolaridade da vítima.
30.00 28.44
24.92
25.00

20.00 18.21
Percentual

15.00 13.10
10.22
10.00

4.15
5.00
0.96
0.00
N.A. E.F.I. E.F.C. E.M.I. E.M.C. E.S.I. E.S.C.

Escolaridade
Fonte: Construção dos autores a partir de informações da SIAC (2021).
Legenda: N.A: não alfabetizada, EFI – ensino fundamental incompleto, EFC – ensino
fundamental completo, EMI – ensino médio incompleto, EMC – ensino médio completo, ESI
– ensino superior incompleto, ESC – ensino superior completo.

A faixa etária das vítimas já relaciona também no aspecto do nível de escolaridade


com o fato delas frequentaram pelo menos o ensino fundamental e médio serem ampla
14

maioria. Segundo Cerqueira e Coelho (2014), ao apontar que 70% das vítimas de estupro
eram crianças e adolescentes, configurando no estupro de vulnerável, abre um sinal de alerta,
pois as consequências psicológicas que atingem as vítimas são devastadoras, comprometendo
no processo de formação da autoestima.
Mulheres solteiras são as vítimas mais frequentes (81,54%) de estupros na Região
Metropolitana de Belém – Pará – Brasil (Figura 10).

Figura 10 – Percentual de estupros de mulheres ocorridos na Região Metropolitana de Belém


– Pará – Brasil, no período de 2010 a 2019, por situação civil da vítima.
Casada / União es-
tável
16.62

Divorciada
0.92
Viúva
0.92

Solteira
81.54

Fonte: Construção dos autores a partir de informações da SIAC (2021).

Independente do comprometimento, a sociedade precisa compreender que a mulher é


quem comanda seu próprio corpo, tendo direito de liberdade e vida sexual. Negar os direitos
da mulher representa fortalecer uma questão de gênero que favorece o pensamento machista e
patriarcal (TERASOLO et al., 2015).
Em relação à profissão/ocupação, o percentual de mulheres vítimas de estupro na
Região Metropolitana de Belém, no período de 2010 a 2019, revelou que 44,84% das vítimas
foram identificadas como solteiras (Figura 11).

Figura 11 – Percentual de estupros de mulheres ocorridos na Região Metropolitana de Belém


– Pará – Brasil, no período de 2010 a 2019, por profissão/ocupação da vítima.
15

Outras
profissões
32.74
Doméstica
11,03

Dona de casa
11.39

Estudante
44.84

Fonte: Construção dos autores a partir de informações da SIAC (2021).

O padrasto (22,63%), o pai (14,13%), o ex-companheiro (13,43%), o companheiro


(12,37%) e o tio (10,95%) são os acusados da maioria dos estupros (73,51%) na região
metropolitana de Belém – Pará – Brasil (Figura 12). Corroborando com os achados deste
trabalho uma pesquisa realizada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP, 2017)
indica que no Brasil 503 mulheres são vítimas de agressão a cada hora, o que equivale a 4,4
milhões no ano, cinco espancamentos a cada 2 minutos, um estupro a cada 11 minutos e uma
mulher é assassinada a cada 2 horas. Além disso, 61,00% dos casos foram perpetrados por
familiares ou pessoas de confiança (FBSP, 2017). Neste mesmo contexto, Nascimento e
Santana (2019, p. 41), afirmam que “nos casos de estupros é comum os autores estarem
inseridos no seio familiar, são pessoas de confiança e têm livre acesso à vítima”.

Figura 12 – Percentual de estupros de mulheres ocorridos na Região Metropolitana de Belém


– Pará – Brasil, no período de 2010 a 2019, por tipo de relação com o acusado.
16

Padrasto 22.63
14.13
Ex-companheiro 13.43
12.37
Tio 10.95
Relação com o Acusado

7.77
Primo 4.59
3.89
Esposo 2.83
2.12
Avô 1.77
1.41
Ex-namorado 1.06
0.35
Genro 0.35
0.35
0.00 5.00 10.00 15.00 20.00 25.00

Percentual
Fonte: Construção dos autores a partir de informações da SIAC (2021).

Embora as mulheres sejam expostas ao perigo da violência sexual, já é evidente que as


fases delas como jovens e adolescentes, convivem com esses riscos dentro das próprias
residências, tendo os pais e os padrastos como os principais autores do crime (BOYER; FINE,
1992). Dessa forma, é comum que as primeiras relações sexuais das vítimas tenham ocorrido
na base da força e da coerção.
Homens adultos na faixa etária de 35 a 64 anos (51,77%) são os acusados mais
frequentes de estupros na Região Metropolitana de Belém – Pará – Brasil (Figura 13).

Figura 13 – Percentual de estupros de mulheres ocorridos na Região Metropolitana de Belém


– Pará – Brasil, no período de 2010 a 2019, por faixa etária (anos) do acusado.
60.00
51.77
50.00

40.00
Percentual

30.00

20.00 15.29
12.94 12.94
10.00 4.71
2.35
0.00
12 a 17 18 a 24 25 a 29 30 a 34 35 a 64 > 64
Faixa Etária (anos)
17

Fonte: Construção dos autores a partir de informações da SIAC (2021).

Uma pesquisa feita em agosto de 2016 pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública,
informou que 91% (FBSP, 2016) dos entrevistados concordaram com a afirmação “Temos
que ensinar meninos a não estuprar”. Essa informação tem a necessidade de ser abordada pela
influência que as crianças recebem dos adultos, principalmente em função do ambiente
escolar e familiar que esteja vivendo como o espaço acessível às disputas ideológicas num
sistema patriarcal e cercado pelo machismo. Por isso, a importância de educar desde cedo os
meninos para o desenvolvimento social e alterando a cultura do machismo para futuras
gerações.

2.5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Portanto, o objetivo desse artigo é identificar as características encontradas na prática


de estupro para buscar soluções e tratar esses casos com mais seriedade, buscando ter empatia
com a vítima. Com as informações encontradas na pesquisa, é importante ressaltar que as
mulheres vítimas de estupro foram são caracterizadas ao pertencerem na faixa etária de 12 a
17 anos (40,87%), tendo o nível de escolaridade identificado com o ensino médio completo
(28,44%), estado civil de solteira (81,54%) e com localidade em Belém (65,74%) nas
residências particulares (77,41%).
É fundamental que haja uma mobilização da sociedade e do poder público com o
intuito de conscientizar a população, para entender o impacto causado nas mulheres que
foram estupradas, por meio de campanhas promovidas pelas ruas da cidade e nos meios de
comunicação. Dessa forma, com os resultados obtidos, essa pesquisa colabora com a
promoção de futuras pesquisas acerca do tema abordado, por meio de informações
atualizadas, além de expandir as pesquisas pelas cidades do interior. Diante dos fatos, essas
informações ajudam também as instituições políticas a desenvolver projetos que visam
combater o estupro perante a realidade que está vivendo.
Tratado como crime hediondo pela Lei N° 8.072/1990, o estupro representa um ato de
desrespeito contra a integridade física e emocional da mulher, além de ser tratado como
problema de saúde pública e violação contra os direitos humanos. Nada justifica o estupro,
sendo assim importante aplicar a punição ao estuprador para reduzir os casos de violência
sexual, o que fortalece o comprometimento da sociedade nesse sentido, pois tratar esse crime
de forma pacífica ajuda contribuir na impunidade.
18

2.6. REFERÊNCIAS

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Reflexão sobre o crime de estupro no Brasil. Revista Estudos Feministas, v. 29, n. 3, p. 1-
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e determina outras providências. Brasília, 1990.

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de 7 de setembro de 1940 – Código Penal e dá outras providências. Brasília, 2005.

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