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CONTAS NACIONAIS: Um breve texto introdutório

Pedro Nogueira Ramos


Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra

(versão de Dezembro de 2014)

1. Introdução

As sociedades contemporâneas hipervalorizam a informação (e ainda bem que o fazem).


Por um lado, os discursos político, mediático, e muitas vezes também o científico, multi-
plicam as declarações que sublinham a importância da informação e do conhecimento no
mundo moderno. Por outro, várias são as entidades, oficiais, privadas, investigadores
isolados, que propõem prover a sociedade com a informação que esta requer, satisfazendo
a procura que aqueles discursos antevêem. Só que compreensivelmente os pressupostos,
as características, a disponibilidade, e a própria qualidade desta informação, produzida
por entidades tão distintas, são consideravelmente díspares. Há pois a necessidade, por
vezes, de fazer a síntese da informação disponível, filtrá-la conforme a sua qualidade, e
compatibilizá-la quando as suas fontes e/ou métodos de coleção são diferentes. É essa a
primeira missão das Contas Nacionais (CN) no domínio das estatísticas económicas.

As CN são pois estatísticas de síntese, produzidas oficialmente por entidades públicas, ou


publicamente autorizadas, nos diferentes países, sendo neste sentido certificadas quanto à
sua qualidade. Em Portugal incumbe ao Instituto Nacional de Estatística (INE) produzir
as CN, sendo que uma parcela dessa tarefa, as contas nacionais financeiras, de que este
texto não trata, está delegada no Banco de Portugal. É ainda frequente as instituições
internacionais como o Fundo Monetário Internacional (FMI), a Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), o Eurostat (a Direção-Geral da
Comissão Europeia que detém o pelouro das estatísticas europeias), e o próprio Tribunal
de Contas Europeu, pronunciarem-se sobre as CN dos países membros (ou menos
frequentemente de países terceiros).
Note-se que as CN são estatísticas ditas de 2º nível ou secundárias, já que são elaboradas
a partir de outras estatísticas e informações, ditas de base, com a mais diversa
proveniência (oficial ou não), reunidas e transformadas de modo a adquirirem coerência
entre si, segundo um plano normalizado de aceitação universal. Este plano normalizado é
fornecido pelas Nações Unidas, designado de Sistema de Contas Nacionais, e é
geralmente abreviado por SNA (de System of National Accounts). A versão do SNA
atualmente em vigor é o SNA 2008. A União Europeia possui igualmente um sistema
próprio de CN, que é na realidade uma especificação do SNA, com ele compatível, mas
adequado à realidade própria (e à maior abundância de recursos investidos em produção
estatística) dos países europeus: o Sistema Europeu de Contas (SEC) 1. Em Agosto de
2014, o INE publicou pela primeira vez CN, para Portugal, segundo o SEC 2010. É
provável que, em fontes diversas, encontre ainda referências várias baseadas na anterior
série de CN, que se apoiava no SEC 1995.

É pois claro que, apesar da designação contabilidade nacional por vezes também
utilizada, as CN são estatísticas, e não registos sistemáticos e exaustivos do tipo
requerido pela contabilidade das empresas.

2. O PIB e as três óticas de lhe aceder

As CN são pois uma infra-estrutura fundamental para o conhecimento da realidade


macroeconómica (sendo nesse sentido similares à contabilidade de empresa que é a infra-
estrutura informativa essencial dessa micro-realidade). A mais importante, ou pelo menos
a mais mediática, das variáveis das CN é o Produto Interno Bruto, geralmente
conhecido pela sua abreviatura PIB. Numa primeira abordagem, podemos dizer que o
PIB é uma medida da produção de uma certa economia, ocorrida no interior do seu
território (daí o qualificativo “interno”), num certo período de tempo.

Mas medir o PIB não é tão simples quanto somar as produções dos diferentes produtos,
ou dos ramos de atividade2 que os originam. A razão é que se assim agíssemos estaríamos

1
Por vezes também abreviado por ESA, iniciais do inglês European System of Accounts.
2
Os ramos de atividade são conjuntos de unidades produtivas que produzem (como produtos principais)
produtos afins.

2
a contabilizar várias vezes algumas produções. Isto acontece porque o valor de alguns
produtos incorpora-se no valor de outros, quando aqueles primeiros produtos são usados
na produção destes últimos. Por exemplo, o valor da farinha usada na produção de pão é
parte – incorpora-se – no valor do pão (e o mesmo acontece em muitos outros casos);
quando se compra um pão paga-se de facto também a farinha; se eu somar o valor da
produção de pão com o valor de produção de farinha, estou pois de facto a contabilizar
duas vezes o valor da farinha.

Por esta razão considera-se que o contributo de uma determinada unidade produtiva (ou
de um ramo de atividade) para o valor global da produção da economia – para o PIB –
não é todo o seu valor da produção, mas somente o valor acrescentado por essas
unidades produtivas.

O valor acrescentado pode ser obtido subtraindo ao valor da produção das unidades
produtivas o valor das matérias-primas e serviços utilizados no seu processo de produção.
Este valor das matérias-primas, subsidiárias e serviços consumidos num certo processo
produtivo é designado de consumo intermédio. No nosso exemplo, o valor acrescentado
pela padaria obtém-se subtraindo ao valor do pão o valor da farinha (e de outros bens ou
serviços que são parte do seu consumo intermédio, por exemplo eletricidade).

Resumindo:
(1) VA i = PR i – CI i
em que:
VA = valor acrescentado
PR = valor da produção
CI = consumo intermédio
i = uma particular unidade produtiva

O PIB de uma economia pode pois ser obtido adicionando os valores acrescentados de
todas as unidades produtivas que laboram num território. Por regra, nesta abordagem
estatística, as unidades produtivas são primeiro agrupadas em ramos de atividade, sendo
depois o PIB obtido pela soma dos VA dos ramos de atividade. Isto é:

(2) PIB   VA i
i

3
(em que i agora tanto pode referir-se à unidade produtiva elementar, quanto ao ramo de
atividade)

Esta maneira de aceder ao PIB é designada de “ótica do produto” ou “ótica da oferta”. Os


quadros de CN construídos nesta ótica mostram também usualmente, para além do PIB,
os VA dos ramos de atividade.

Na realidade, como provavelmente já terá adivinhado por termos usado o sinal  e não =
em (2), não se obtém exatamente o PIB por este processo, mas uma outra grandeza que
lhe está muito próxima e que é o Valor Acrescentado Bruto (VAB) da economia.

A diferença entre VAB e PIB de uma economia é que por defeito – isto é se o contrário
não for dito – o VAB está avaliado a preços de base e o PIB a preços de aquisição3. A
avaliação a preços de aquisição inclui no valor do produto os impostos que incidem sobre
esse produto, isto é aqueles que são cobrados em função da quantidade ou do valor
produzido ou vendido; são exemplos destes impostos o IVA e os impostos especiais de
consumo, como o Imposto sobre Produtos Petrolíferos ou o Imposto de Tabaco 4. Por
outro lado, na avaliação a preços de aquisição são subtraídos os subsídios aos produtos de
que beneficiam as unidades produtivas, que devem cumprir a mesma regra de depen-
dência nas quantidades ou valores produzidos ou vendidos5. A avaliação a preços de base
não inclui aqueles impostos sobre os produtos, e é anterior a esta dedução dos subsídios
aos produtos6. Tem-se pois sumariando:

3
Bem entendido, embora a regra seja a exposta (avaliar o VAB a preços de base e o PIB a preços de
aquisição), não há uma razão determinante para não proceder ao contrário. Avaliar o VAB a preços de
aquisição – que nesse caso seria o mesmo que o PIB – não é usual, mas não é um erro. Do mesmo modo é
possível falar de PIB a preços de base, o que é o mesmo que o VAB.
4
Em teoria económica, estes impostos são por vezes ditos impostos indiretos. Deve ficar com a ideia
contudo que nem todos os impostos indiretos são impostos sobre os produtos, como são aqui definidos (isto
é funcionalmente ligados às quantidades ou valores produzidos ou vendidos), e que por essa razão nem
todos os impostos indiretos são aqui chamados para esta distinção entre “preços de base” e “preços de
aquisição”.
5
Aplica-se aos subsídios auferidos pelos produtores a mesma observação que na nota anterior para os
impostos, não sendo todos (e hoje em Portugal nem sequer a maioria) subsídios aos produtos, como os defi-
nimos, e não estando portanto todos envolvidos nesta discussão dos preços de avaliação do PIB e do VAB.
6
Deve ficar com a ideia, também, que a explicação apresentada neste texto para a distinção entre “preços
de aquisição” e “preços de base” é suficiente para quando pensamos em grandes agregados macroeconómi-
cos como o PIB e o VAB de uma economia. A um nível “micro” contudo, por exemplo para um particular
produto, as contas podem porém ser mais complicadas, nesta passagem entre preços de base e de aquisição,
ou no sentido inverso, sendo necessário atender, se estas existirem, às margens comerciais e de transporte.

4
(2´)  VA i = VAB (agora = e não  )
i

e (3) PIB = VAB + ISP – SP

em que : ISP = Impostos sobre os produtos


SP = Subsídios aos produtos

Regressemos então ao cálculo do PIB. Em alternativa à ótica do produto ou da oferta até


aqui suscitada, em que se observava a formação do produto adicionando os valores
acrescentados, o PIB pode de facto ser calculado por outro processo: olhando para o seu
destino, para as utilizações da produção. Esta segunda abordagem é designada “ótica da
despesa” ou “ótica da procura”.

Deve ficar entendido que o PIB é um só, embora possa ser acedido por mais que um
caminho. Isto é, o PIB toma necessariamente o mesmo valor quer seja calculado pela
“ótica do produto”, quer o seja na “ótica da despesa”. Isto é assim porque:

- Se houver produção (oferta de produto), o produto foi de algum modo


utilizado (despesa):
- Se houve utilização (decorrente da procura), o produto de algum sítio veio,
isto é teve de haver produção.

Note-se que nesta segunda abordagem da ótica da despesa, para evitar o problema da
dupla contabilização atrás mencionado, só se contam as procuras ou utilizações finais,
excluindo-se as procuras intermédias, isto é aquelas cujo propósito é o uso destes
produtos como matérias-primas na produção de outros bens ou serviços.

Na ótica da despesa o PIB resulta da adição das seguintes parcelas:

- C = Despesa de consumo final das famílias e das instituições sem fins lu-
crativos ao serviço das famílias (ISFLSF)7, também dita consumo privado.

7
A despesa de consumo final das ISFLSF é em tudo idêntica à das administrações públicas, sendo as
famílias o setor beneficiário do consumo, mas incorrendo as ISFLSF na despesa correspondente. Neste
texto agregou-se esta despesa ao consumo privado, dado que estas instituições são privadas, e porque é esse
hoje o critério seguido pelas CN do INE. É no entanto possível agrupá-la antes com o consumo público,
dado que se trata de facto de um mecanismo idêntico de consumo. Na primeira edição deste texto, escrita
em 2007, foi esse o critério que prevaleceu. Refira-se que, em qualquer caso, o peso desta despesa quer
relativamente a C, quer a G, é residual.

5
- G = Despesa de consumo final das administrações públicas, por vezes
designada de forma simplificada de consumo público.

 De facto as administrações públicas não consomem em proveito próprio; o que


está em causa nesta parcela são os bens e serviços produzidos por estas institui-
ções (por exemplo serviços de educação), ou produzidos pelo setor privado (por
exemplo, medicamentos na sua parcela comparticipada), mas colocados à
disposição das famílias e sociedade em geral a título gratuito ou a preço simbó-
lico; quer isto dizer que o PIB inclui também o valor da produção deste tipo de
bens ou serviços que usufruímos, sem por eles pagarmos; estas despesas de
consumo são ditas das administrações públicas porque são estas que incorrem
nos custos ou suportam o preço dos bens; uma parcela deste consumo tem a
natureza de consumo coletivo (por exemplo, o consumo de defesa nacional)

- I = Investimento, também designado de Formação Bruta de Capital; de-


compõe-se em três parcelas: formação bruta de capital fixo (FBCF), varia-
ção de existências e aquisições líquidas de cessões de objetos de valor.

 A FBCF é de longe a componente mais importante do investimento; a FBCF


compreende a aquisição (líquida da cessão) ou a produção própria de bens ou
serviços que não se destinam a ser consumidos no próprio período, mas antes a
ser usufruídos ao longo de vários períodos, sendo geralmente afetados ao
processo produtivo; são exemplos de FBCF – entre muitos outros – as
aquisições de edifícios e maquinaria pelas empresas; a construção de estradas ou
outros equipamentos pelas administrações públicas, e a aquisição de habitação
pelas famílias; por convenção não é considerado FBCF, mas sim consumo
privado, a aquisição de bens de consumo duráveis pelas famílias (automóveis,
computadores, eletrodomésticos, etc.), se o objetivo não for afetá-los a um
processo produtivo.

 A acumulação de produtos, que não são considerados capital fixo, pelas em-
presas ou outras instituições – mais exactamente a diferença entre as entradas e
saídas desses bens em stock – é designada de variação de existências; as
existências, e consequentemente a sua variação, podem referir-se a matérias-

6
primas e subsidiárias, produtos acabados, produtos e trabalhos em curso, ou
bens destinados a revenda sem transformação; a variação de existências é
considerada investimento dado que o período de utilização destes bens ou
serviços é diferido em relação ao momento da sua aquisição ou produção.

A consideração da variação de existências do lado da despesa é na realidade a


razão porque o PIB acedido na “ótica do produto” é exactamente igual ao
compilado na “ótica da despesa”; isto é, porque é o mesmo calcular o PIB
medindo a produção propriamente dita, ou medindo antes a sua utilização. De
facto, só assim podemos dizer que todo o produto tem um destino – se não tiver
sido possível vendê-lo o destino é a variação de existências, que podem ser
produtos acabados na própria empresa que os produziu – e simultaneamente que
toda a despesa é proveniente da produção – já que se deduz a que tem origem na
produção de períodos anteriores, porque envolve uma redução das existências.

 As aquisições líquidas de cessões de objectos de valor referem-se ao investi-


mento em pedras ou metais preciosos, joias (exceto quinquilharia), antiguida-
des, objetos de arte ou de coleção, etc.; esta componente do investimento tem
uma expressão reduzida à escala macroeconómica.

- Ex = Exportações de bens e serviços.


- Im = Importações de bens e serviços

 As importações de bens e serviços são diminuídas e não adicionadas no cálcu-


lo do PIB. De facto, as componentes anteriores da despesa – o consumo, o
investimento, e eventualmente as próprias exportações – são procura dos
agentes económicos não necessariamente dirigida à produção ocorrida em
território nacional. Ora o PIB, mesmo quando medido na ótica da despesa, é
meramente a utilização do produto produzido em território nacional. Por esta
razão à procura global dos produtos há que subtrair as importações.

Em súmula, o PIB na ótica da despesa é calculado por:

(4) PIB = C + G + I + Ex - Im

7
Note-se que este PIB na ótica da despesa é diretamente calculado a preços de aquisição,
já que a informação estatística sobre as procuras – consumo, investimento, etc. – existe, e
muitas vezes só existe, a preços de aquisição8. Recorde-se que na ótica do produto, ao
contrário, chegava-se primeiro ao VAB (a preços de base), sendo depois necessário
passar para o PIB (a preços de aquisição).

Mas para além das óticas do produto e da despesa, considera-se ainda normalmente
existir uma terceira via para calcular o PIB (embora na maioria dos países este caminho
tenha uma importância muito menor no processo de produção estatística conducente ao
PIB): a “ótica do rendimento”.

De facto, ao longo do tempo, tem-se vindo a chamar ótica do rendimento a coisas muito
diferentes. O ponto é que o rendimento é gerado no processo produtivo, mas é depois
distribuído aos intervenientes nesse processo, sob a forma de rendimento primário, e
ainda posteriormente redistribuído, sendo nesta redistribuição já envolvidos agentes não
participantes no processo produtivo. Este último processo designa-se de redistribuição
secundária do rendimento. Se se somar o rendimento gerado no processo produtivo
obtém-se exatamente o valor do VAB, que pode depois ser convertido no PIB através da
equação (3). Com efeito:

- Sempre que o valor da produção excede o consumo intermédio, o valor


acrescentado constitui um rendimento, que é gerado assim, e de algum modo
distribuído.
- Todo o rendimento tem sempre origem, em última instância, na produção,
pelo que o rendimento gerado numa economia decorre necessariamente do seu
processo produtivo interno.

Por esta razão somar o rendimento gerado numa economia é sempre o mesmo que somar
os VABs. É isto que neste momento é feito nas CN portuguesas, publicadas pelo INE,
nos quadros que assumem a designação de ótica do rendimento. Estes quadros são
contudo pouco interessantes, já que só decompõem o PIB em três componentes:

8
Se por qualquer motivo no entanto se pretende o PIB a preços de base, ou VAB, pode-se contudo no fim –
aplicando a equação (3) – subtrair os ISP e adicionar os SP.

8
- Remunerações dos trabalhadores por conta de outrem, pagas pelas unidades
produtivas que produzem no território.
- Excedente Bruto de Exploração adicionado do Rendimento Misto que é pago
aos trabalhadores por conta própria9.
- Impostos menos Subsídios sobre a Produção e a Importação10.

Esta é uma perspetiva menos interessante do que a adotada em tempos noutros sistemas
de CN, em que a ótica do rendimento correspondia não à adição do rendimento gerado
numa economia, mas à soma dos rendimentos primários distribuídos, em benefício dos
residentes num certo país ou território. Estes rendimentos decompunham-se em remu-
nerações auferidas pelos trabalhadores por conta de outrem residentes no território, rendi-
mento misto auferido pelos trabalhadores por conta própria também residentes, juros,
rendas, dividendos, lucros retidos pelas empresas, etc. A soma de todos estes rendimentos
não conduzia ao PIB, mas mais exatamente ao Rendimento Nacional Bruto (RNB).

O RNB, apesar de já não ser apresentado assim, por via deste cálculo, continua a ser uma
variável muito importante em CN. Ele difere do PIB (ainda que em muitos países os dois
agregados macroeconómicos tenham valores muito próximos) precisamente por constituir
os rendimentos (primários) auferidos pelos residentes num território, e não os rendimen-
tos gerados internamente a esse território. Na prática passa-se do PIB para o RNB:

- adicionando os rendimentos primários recebidos do resto do mundo pelos


residentes, que são parte do RNB, mas não do PIB;
- e subtraindo os rendimentos primários pagos ao resto do mundo.

Ao invés, é possível passar do RNB para o PIB somando os segundos e diminuindo os


primeiros11.

9
A designação rendimento misto decorre de não ser possível, para estes trabalhadores, discriminar o que é
salário e o que é lucro da sua atividade.
10
Estes impostos e subsídios sobre a produção e importação são mais que os impostos sobre os produtos e
subsídios aos produtos considerados na equação (3), englobando outros impostos sobre a produção
(também considerados impostos indiretos), e outros subsídios à produção, que apesar de inerentes ao
processo produtivo, não estão ligados funcionalmente aos valores ou quantidades produzidos. Estes outros
impostos e outros subsídios à produção – que não são porventura importantes para um leitor que não queira
estudar CN a fundo – integram já o cômputo do VAB a preços de base.
11
Uma dúvida que legitimamente se pode colocar é se o RNB é uma grandeza medida (por defeito) a
“preços de aquisição” ou a “preços de base”. De facto, nos sistemas de CN atualmente em vigor
convenciona-se medir o RNB a preços de aquisição (embora medi-lo a preços de base, sendo invulgar não

9
Um outro agregado de rendimento, para além do RNB, é o Rendimento Disponível Bruto
– RDB (que também pode ser designado de Rendimento Nacional Disponível ou
Rendimento Nacional Disponível Bruto)12. Concetualmente o RDB poderia ser atingido
adicionando todos os rendimentos distribuídos numa economia, após redistribuição
secundária do rendimento. Esta redistribuição secundária tem outro fundamento não
estando diretamente associada ao processo produtivo (embora, em última instância, o
rendimento provenha deste). Exemplos de redistribuição secundária são os impostos
(sobre o rendimento) que os cidadãos pagam às administrações públicas, sem que tenha
havido em troca um contributo do Estado para a produção e geração desse rendimento;
por outro lado, alguns cidadãos auferem rendimento do setor público – por exemplo
pensões de reforma ou subsídios de desemprego – a que não esteve subjacente qualquer
envolvimento no processo produtivo.

Na prática, porém, no lugar desta adição de rendimentos redistribuídos, o RDB pode


antes ser calculado a partir do RNB, tendo em conta a tal redistribuição secundária do
rendimento, mas só a que é efetuada com o resto do mundo. Com efeito, um grande
volume de redistribuição secundária do rendimento (como os exemplos do parágrafo
anterior) envolve somente agentes residentes na economia. Em termos agregados, isto é
para o conjunto do país, esta redistribuição cancela, já que uns recebem outros pagam.
Mas há distribuição secundária do rendimento em favor ou proveniente do estrangeiro, e
essa tem de ser tida em conta no cômputo do RDB dum país. Um exemplo são as
remessas de e(i)migrantes, enviadas por cidadãos residentes num país às suas famílias
residentes no estrangeiro (independentemente da questão jurídica de qual a nacionalidade
das partes envolvidas, que não interessa às CN). Passar de RNB a RDB envolve pois:

seja um erro; veja também a explicação equivalente para o PIB e VAB na nota de rodapé 3. Esta convenção
pressupõe que os impostos sobre os produtos, líquidos de subsídios aos produtos, podem ser vistos como
rendimentos primários auferidos pelas administrações públicas, sendo pois adicionados aos outros
rendimentos primários (salários, juros, lucros, etc.).
12
O RDB não deve ser confundido com o rendimento disponível das famílias, mencionado sobretudo nos
manuais de Macroeconomia, mas que não discutimos neste texto. A diferença é que o RDB não é
estritamente rendimento das famílias, mas refere-se também a outros tipos de agentes económicos:
empresas, administrações públicas, ISFLSF, etc.

10
- subtrair a distribuição secundária do rendimento (diz-se também transferên-
cias para designar esta redistribuição) efetuada a favor de não-residentes
- adicionar as transferências provenientes do estrangeiro em benefício dos
agentes residentes.

Como é claro a passagem de RDB a RNB faz-se por soma das primeiras e subtração das
segundas.

3. Algumas notas adicionais sobre o PIB e outros agregados conexos

Uma primeira observação adicional sobre o PIB respeita ao significado do qualificativo


“bruto” incluído na expressão “produto interno bruto”, e de resto também noutras
designações de CN, como o VAB, o RNB ou a FBCF que já conhecemos. De facto, a
avaliação “bruta” em CN tem a ver com o modo como se trata o “consumo” ou
“desgaste” dos bens de investimento. Note-se que as unidades produtivas fazem uso, na
sua atividade de produção, quer de bens de consumo intermédio quer de bens de
investimento. A diferença é que os bens de consumo intermédio são consumidos –
esgotam-se – no próprio processo produtivo no mesmo momento em que este ocorre,
enquanto os bens de investimento são utilizáveis em vários ciclos de produção durante
vários anos. Mas obviamente também acabam por se desgastar e ter de ser substituídos. É
pois razoável assumir-se que os bens de investimento, ou de capital fixo como também
são designados, também são consumidos ainda que esse consumo se reparta por vários
períodos. Este consumo é designado precisamente de consumo de capital fixo.

Note-se que o consumo de capital fixo (CCF) em cada ano não é diretamente observável
(nem por regra é fácil questionar as empresas sobre tal matéria, assegurando que as
respostas respeitem um critério objetivo). Por esta razão o CCF anual é na generalidade
dos países uma estimativa das CN obtida por modelos matemáticos13.

Como já vimos atrás, o consumo intermédio não é parte do valor acrescentado por uma
unidade produtiva ou ramo de atividade, nem em consequência do VAB e do PIB para o

13
O CCF não é obtido nem coincide com as amortizações fiscais, embora tal tenha acontecido em alguns
sistemas antigos de CN. Em Portugal este procedimento foi abandonado há mais de 30 anos, quando as CN
portuguesas adotaram o SEC.

11
conjunto da economia. A questão é então como tratar o CCF que, exceto por estender-se
a vários períodos, tem uma natureza similar; isto é, não é realmente valor criado pela
unidade produtiva, mas um valor pré-existente, incorporado nos bens de investimento,
que agora se transfere – uma parcela em cada ano – para o produto que está ser produ-
zido. Uma opção lógica seria pois tratar o CCF, respeitante ao ano em causa, do mesmo
modo que o consumo intermédio. Ou seja, no lugar de (1) ter-se-ia:

(1´) VA i = PR i – CI i – CC F i

Se procedermos deste modo diremos que se obtém o valor acrescentado líquido da


unidade ou ramo i, enquanto ao invés se aplicarmos (1) obteremos o valor acrescentado
bruto. Adicionando as diferentes unidades ou os ramos de atividade obtém-se num caso o
valor acrescentado líquido (VAL) da economia, no outro o VAB. Partindo do VAL é
possível, por (3), obter o produto interno líquido no lugar do PIB. É ainda possível falar
do rendimento nacional líquido em vez do RNB, ou da formação líquida de capital fixo
(FLCF) no lugar da FBCF14. Em todos os casos a passagem duma grandeza “líquida” a
“bruta” faz-se por adição do CCF (do ano), e da “bruta” à “líquida” por subtração dessa
estimativa.

As CN dos diferentes países fornecem hoje a maioria dos agregados macroeconómicos


(valor acrescentado, produto interno, rendimento nacional) quer em termos líquidos quer
em termos brutos. É difícil dizer porque é que a teoria económica e a discussão pública
enfocam mais a sua atenção nos agregados brutos, mas presume-se que tal decorre do
CCF ter a natureza duma estimativa, eventualmente ainda pouco fiável nalguns países.

Uma segunda nota diz respeito ao facto da imprensa, e por vezes alguns economistas
quando se dirigem ao grande público, apresentarem o PIB como uma medida da riqueza
da economia (alguns, menos erradamente, preferindo antes defini-lo como a criação de
riqueza numa economia num certo período). Deve ser assinalado que estes conceitos
simplistas (apesar do atrativo de serem facilmente entendíveis pelos não-especialistas)

14
No caso do investimento a distinção entre FBCF e FLCF é suscetível de outra interpretação. Tendo em
conta que o CCF, em cada ano, tende a igualar o investimento de reposição necessário a manter o valor do
stock de capital fixo (isto é do parque de edifícios e máquinas utilizados pelos diferentes agentes no âmbito
do processo produtivo), então a FBCF é o investimento total em capital fixo incluindo o investimento de re-
posição, enquanto a FLCF é o investimento líquido, por definição igual à variação do stock de capital fixo.

12
não são rigorosos nem corretos. De facto, riqueza em economia significa o conjunto do
património dos agentes económicos, acumulado ao longo dos anos ou mesmo dos
séculos15. Está previsto que as CN passem a fornecer – e nalguns países já o fazem – uma
estimativa da riqueza das economias. Este agregado designar-se-á Património Líquido e
incluirá, para o conjunto duma economia, o valor de todos os bens aí disponíveis não
destinados ao consumo imediato, assim como os eventuais ativos financeiros (ou
“direitos”) sobre países terceiros, subtraídos das dívidas ou outras responsabilidades para
com o estrangeiro16.

O conhecimento e confronto internacional do Património Líquido dos diferentes países


poderão vir a revelar-se um exercício interessante, produzindo algumas surpresas face ao
juízo que fazemos hoje da capacidade relativa de produção dos diferentes países, aferida
a partir do PIB. É no entanto pouco provável – quer pelo hábito de olhar para o PIB e
desconhecimento deste novo agregado, quer porque numa primeira etapa esta nova
medida será ainda inevitavelmente pouco precisa – que este debate venha a soçobrar para
a opinião pública nos próximos anos, sendo mais provável (e se calhar preferível) que
numa primeira fase se limite aos especialistas.

Assinale-se ainda, até porque mencionámos no parágrafo anterior os exercícios de


comparação internacional do PIB (e de outros agregados de CN), que sendo o PIB uma
medida da produção ocorrida num certo país, depende obviamente da dimensão do país,
não sendo estranho que seja maior nos países mais populosos, onde há mais gente para
envolver no processo produtivo. A comparação internacional pertinente refere-se pois
geralmente não ao próprio PIB, mas ao PIB per capita (PIBpc), sendo obviamente:

PIB
(5) PIBpc =
população residente

15
Note-se que mesmo a identificação do PIB com a criação de riqueza num certo período é um erro: o PIB
refere-se a toda a produção, incluindo a dos bens de consumo final que são consumidos no mesmo período
em que são produzidos, e que não persistem assim sob a forma de riqueza.
16
Note que a conta do Património Líquido é o equivalente ao balanço na contabilidade de empresa,
configurando uma lógica de “contabilidade” de stocks em oposição à de “contabilidade” de fluxos, que tem
sido a prática de CN.

13
Outra confusão frequente – na discussão menos esclarecida – é entre PIB e taxa de
crescimento do PIB. O Diagrama 1 representa a taxa de crescimento do PIB em Portugal,
no período 1996 – 2013, que oscilou entre os +4,8% em 1998, e -3,3% em 2012. Estes
crescimentos não coincidem, é claro, com os valores do PIB, expressos em milhares de
milhões de euros, como os que constam do Diagrama 2, na página 20.

Diagrama 1

Taxa de Crescimento (real) do PIB, em Portugal, 1996 - 2013

5,0%
4,0%
3,0%
2,0%
1,0%
0,0%
2001
1996
1997
1998
1999
2000

2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
-1,0%
-2,0%
-3,0%
-4,0%

fonte: INE, Contas Nacionais

Em parte, a confusão entre o PIB e a sua taxa de crescimento reside no facto de algumas
pessoas (às vezes com responsabilidade...) julgarem existir uma correlação entre essas
duas medidas, no sentido que um maior PIB se traduziria num crescimento mais intenso
dessa mesma variável. Tal não só não acontece, como por regra se verifica o inverso.
Felizmente (porque tal significa rumar no sentido de mais equidade a nível mundial), na
maioria dos casos, os países com um PIBpc mais baixo têm um crescimento mais intenso
do PIB. Por exemplo a China, cujo crescimento económico tem causado a admiração do
mundo nos últimos anos, tem ainda um PIBpc (medido apropriadamente) que é menos de
metade do PIBpc português (cerca de 46% segundo as últimas estimativas do FMI refe-
rentes a 2013), e pouco mais de 1/5 do PIBpc norte-americano. É claro que se a China
prosseguir o ritmo de crescimento intenso que conseguiu nos últimos anos, acabará por

14
atingir o mesmo nível de PIBpc que Portugal, e posteriormente também que os EUA. Mas
infelizmente (para a humanidade) ainda deverá faltar muitos anos para que tal aconteça17.

Uma segunda confusão, frequente nalgumas discussões, respeita à identificação do PIBpc


com o rendimento per capita. É claro que o rendimento per capita refere-se ao RNB (ou
mesmo ao RDB), que já vimos diferir (até um certo ponto) do PIB. Bem entendido, se
queremos interpretar estas medidas como indicadores de bem-estar, a medida mais
adequada é o RNBpc (ou mesmo ao RDBpc), já que o PIB inclui produção e rendimentos
que lhe estão associados, distribuídos em favor de residentes no estrangeiro. O que se
passa, porém, é que na maioria dos países o PIB e o RNB têm valores muito semelhantes,
pelo que é indiferente proceder à análise com uma ou com outra destas duas grandezas.
Mas há exceções, devendo-se mencionar na Europa pelo menos dois casos: o
Luxemburgo e a Irlanda. De facto, em ambos estes países o PIB é consideravelmente
superior ao RNB. No Luxemburgo a razão é a existência de movimentos pendulares
significativos de indivíduos que trabalham no Luxemburgo – um grande centro financeiro
internacional e sede de várias instituições europeias – mas que residem nas cidades
vizinhas da França, Alemanha ou Bélgica – onde a habitação é muito mais barata. Essas
pessoas contribuem para o PIB luxemburguês, mas os rendimentos que lhes são
distribuídos são subtraídos no cômputo do RNB desse pequeno país. No caso da Irlanda,
o motivo da discrepância tem a ver com a importância dos investimentos estrangeiros
nesse país, que geram produção que é parte integrante do PIB irlandês, mas em que a
redistribuição do rendimento primário – sobretudo lucros – é muitas vezes em larga
medida remetida para o estrangeiro. Também em Contas Regionais, isto é quando se
pretende calcular o PIB para regiões dentro dum país, julga-se ser muito frequente a
ocorrência de situações de disparidade entre o PIB e o RNB18.

Apesar da argumentação que desenvolvemos, que aponta para uma utilização preferencial
do RNB e RDB no lugar do PIB, nas comparações internacionais com o fito de avaliar o
bem-estar relativo dos cidadãos dos diferentes países, temos de reconhecer que o PIB

17
Sobretudo porque o trajeto típico de crescimento de um país mais pobre consiste geralmente num
crescimento acelerado num período inicial, seguido depois por um abrandamento significativo, para ritmos
similares aos dos países ricos, quando o país se aproxima das nações mais ricas.
18
Sublinhamos que se trata basicamente duma presunção, já que não é normalmente possível calcular o
RNB para as regiões.

15
continua a ser também aqui a variável realmente utilizada na grande maioria dos estudos.
É difícil dizer mais uma vez porque é assim. Mas a força do hábito, o facto do diferencial
relativamente àquelas outras variáveis ser diminuto na grande maioria dos países, e ainda
a menor fiabilidade nalguns países das medidas do RNB e RDB que do PIB19, podem ser
fatores explicativos.

4. Comparações temporais e espaciais de agregados de CN

Regressemos então à questão da comparação do PIB, ou de outros agregados de CN, quer


entre diferentes momentos do tempo, quer entre diferentes países ou espaços geográficos.
A maior dificuldade na comparação temporal do PIB (ou de outro agregado) resulta
dessas variáveis estarem necessária e inevitavelmente expressas em unidades monetárias.
Isto é, embora seja possível para um particular bem – por exemplo parafusos – examinar
a progressão da sua produção em quantidades, para o conjunto da economia este enfoque
nas quantidades não é possível. Pela mais óbvia das razões: não é possível somar alhos
com bugalhos, nem parafusos com pães. Isto é, a avaliação da produção para o conjunto
duma economia obriga a que cada quantidade produzida tenha sido multiplicada pelo
respetivo preço, antes de se proceder à agregação para a economia no seu todo. Este facto
suscita então uma dificuldade: quando observamos que por exemplo o PIB numa certa
economia aumenta de valor ao longo do tempo, tal tanto pode ter resultado:

- dum aumento das quantidades produzidas;


- como dum aumento dos preços;
- (como ainda, muito provavelmente, duma combinação dos dois fatores).

Mas como é claro, quando estamos a estudar o fenómeno do crescimento de uma econo-
mia, só a parte do aumento do PIB que deriva do aumento das quantidades produzidas
nos interessa. O acréscimo do PIB tem pois de ser expurgado da parcela que reflete um
aumento dos preços a que os bens e serviços foram avaliados. Isto é, o que nos importa é
o chamado crescimento real do PIB, e não o aumento total observado nessa grandeza,

19
Deve ainda ser assinalado que o uso do PIBpc como indicador de bem-estar é criticado na literatura por
múltiplas outras razões, que escapam aos objetivos da nossa discussão. Uma crítica frequente, por exemplo,
é que o PIBpc é uma mera média, indiferente ao modo mais ou menos equitativo como se distribui o
rendimento entre diferentes estratos no interior do país.

16
normalmente designado de crescimento nominal. Passar do PIB nominal a PIB real
chama-se em linguagem técnica deflacionar o PIB, sendo que deflacionar é sinónimo de
extrair a inflação implícita nesse agregado. Deflacionar o PIB (ou outra grandeza) faz-se
por recurso a operadores designados de deflatores, que medem o crescimento dos preços
implícitos em cada variável, sendo que o deflator do PIB pode ser retirado precisamente
da equação:

PIB nominal
(6) = deflator do PIB
PIB real

Na realidade há aqui duas hipóteses distintas de proceder. O PIB nominal é naturalmente


conhecido à partida, não envolvendo a dificuldade que estamos neste momento a
examinar. Depois:

- ou se calcula diretamente o PIB real, sendo o deflator – que é também um


indicador de inflação – computado por (6);
- ou então o deflator é calculado de forma independente, sendo o PIB real
calculado por:

PIB nominal
(6´) PIB real =
deflator do PIB
que é matematicamente o mesmo que (6).

Deve ficar com a ideia que o primeiro procedimento é o caminho mais frequente – pelo
menos nos países com um sistema estatístico mais desenvolvido, incluindo Portugal. Isto
é, em cada ano o PIB é não só calculado aos preços do próprio ano, também ditos preços
correntes, mas simultaneamente aos preços do ano anterior. Quer isto dizer (que a regra
geral, com eventuais exceções pontuais nalguns produtos é) que cada quantidade
produzida, cada consumo intermédio, cada procura final dos diferentes produtos é
também multiplicada pelos preços médios do ano anterior, produzindo-se por este
caminho minucioso uma estimativa do PIB a preços do ano anterior. Sumariamente
representaremos por :

PIB n,n-1

o PIB do ano n avaliado a preços do ano anterior n-1.

17
Não é então difícil ver que:

PIBn, n -1
(7) ( - 1) = r = taxa de crescimento real anual do PIB
PIBn -1, n -1

A taxa de crescimento r deve ser expressa em unidades percentuais.

Repare-se que na fórmula em cima PIB n-1,n-1 é simplesmente o PIB nominal ou a preços
correntes referente ao ano n-1. De facto, nessa expressão é patente que o numerador e
denominador da fração estão avaliados aos mesmos preços – os do ano n-1 – pelo que o
valor da fração (em excesso sobre a unidade) reflete o aumento das quantidades
produzidas, permitindo assim gerar, como pretendido, um indicador do crescimento real
do PIB num particular ano n.

Por outro lado, outra conta que pode ser feita é:

PIB n, n
(8) = d = deflator anual do PIB
PIB n, n -1

Tal como em (7) também neste caso se pode subtrair 1, e exprimir d-1 em unidades per-
centuais, tornando-se então claro que o deflator do PIB tem a natureza duma taxa de cres-
cimento, no caso dos preços implícitos no PIB20; isto é o deflator do PIB é uma particular
medida da taxa de inflação21. Note-se que nesta fórmula PIB n,n é simplesmente o PIB
nominal, ou a preços correntes, do ano n (tal como PIB n-1,n-1 era o PIB nominal do ano
n-1). Atente que na expressão (8) tanto o numerador como o denominador são o PIB do
ano n, sendo a diferença os preços a que esse PIB está avaliado. Quando PIB n,n > PIB n,n-1
e consequentemente a fração contida em (8) excede 1, tal significa que os preços implí-
citos no PIB aumentaram em média na economia no ano n.

20
As CN portuguesas têm vindo a designar d-1 de taxa de variação anual do deflator.
21
Não é contudo a única medida, nem sequer a mais usual, da taxa de inflação, estando porém esta
discussão em termos pormenorizados para além do escopo deste texto. Registe porém que a taxa de
inflação é normalmente obtida a partir do chamado Índice de Preços no Consumidor (IPC), que como o
nome indica, se reporta unicamente, ao contrário do deflator do PIB, aos bens de consumo. Além disso o
IPC é obtido direta, e independentemente deste processo, por observação dos preços dos bens de consumo,
construção de médias (ponderadas), e observação da progressão ao longo do tempo dessas médias. De
facto, em Portugal, embora as CN utilizem no seu trabalho a informação de base (isto é, os preços
recolhidos) do IPC, este como tal não intervém no processo de produção estatística das CN.

18
As expressões (7) e (8) permitem pois calcular o crescimento real anual do PIB (ou de
outra variável de CN) e o respetivo deflator anual do mesmo PIB (ou implícito noutra
variável). O problema, porém, é que em muitas circunstâncias o conhecimento destes
indicadores anuais não é suficiente, sendo antes necessário trabalhar com uma pluralidade
de anos. Por exemplo, se se quiser analisar a evolução do PIB num certo intervalo de
tempo, digamos 1995 – 2013, então é necessário referenciar o PIB real dos diferentes
anos – também dito por vezes em volume – aos preços médios de um ano fixo. A série a
preços do ano anterior obviamente não resolve este problema, já que o PIB dos diferentes
anos está avaliado a preços de anos diferentes: o de 2013 a preços de 2012, o de 2012 a
preços de 2011, e assim sucessivamente.

A solução proposta nos sistemas de contas nacionais (SNA/SEC) consiste em encadear os


índices anuais. Tanto podem ser encadeados índices em volume, como os índices de
preços ou deflatores anuais. Suponha-se que se quer referenciar a série estatística aos
preços de um certo ano base, por hipótese o ano 0 à frente.

O índice encadeado em volume para o ano n (com base em 0) é então somente:

(9) 1 + Rn = (1+r1). (1+r2) … (1+rn-1). (1+rn)

e o deflator encadeado (com base no ano 0) é 22:

(10) Dn = d1 . d2 … dn-1 . dn

O PIB real, referenciado aos preços de um ano fixo23, é então calculado por um dos
seguintes dois procedimentos:

- por recurso aos índices encadeados em volume, que são sempre multiplicados
pelo PIB nominal do ano base:

22
No caso do índice de preços não se adicionou a unidade, já que no cômputo de d também não se tinha
subtraído 1.
23
Por tradição diz-se ainda hoje por vezes “a preços constantes” de um dado ano base. Embora se trate de
uma questão semântica, que reconhecemos de importância menor, a verdade é que esta designação, que era
usada em sistemas mais antigos de CN, não é agora completamente correta. O PIB real não foi em
momento algum calculado a preços de um ano fixo, portante constantes, mas sempre a preços do ano
anterior. O que foi feito foi referenciá-lo a preços de um ano base, por encadeamento de índices calculados
sempre a partir de valores a preços do ano anterior.

19
PIB 1,0 = PIB 0,0 . (1+R1)
(11) …
PIB n-1,0 = PIB 0,0 . (1+Rn-1)

PIB n,0 = PIB 0,0 . (1+Rn)

- por recurso aos índices encadeados de preços, ou deflatores encadeados, que são
usados para deflacionar o PIB nominal de cada ano:

PIB 1,0 =

(12) …
PIB n-1,0 =

PIB n,0 =

Bem entendido, embora tal não esteja demonstrado neste texto, os dois procedimentos
conduzem exatamente aos mesmos resultados. O Diagrama 2 mostra-nos o PIB real portu-

Diagrama 2

PIB real em Portugal (dados encadeados em volume), 1995 – 2013,


referenciado a preços de 2011

190000

180000

170000

160000

150000

140000

130000
2007

2010
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006

2008
2009

2011
2012
2013

unid.: milhões de euros; fonte: INE, Contas Nacionais

20
tuguês, no período 1995 – 2013, referenciado aos preços do ano de 2011. Na atual
linguagem das CN portuguesas este quadro é designado pela expressão “dados enca-
deados em volume” (que reconhecemos pouco amigável para um utilizador comum).

Examinemos agora a questão das comparações espaciais – isto é entre países ou outros
espaços geográficos – do PIB. Já foi dito atrás que esta comparação normalmente incide
sobre o PIBpc. Mas mesmo nesse caso outra questão subsiste, similar à que discutimos
nas comparações temporais: é que o PIB dos diferentes países é calculado usando preços
que, para os mesmos produtos, podem divergir de país para país. É claro que – com algu-
mas exceções como é o caso dos países do euro – os diferentes países possuem diferentes
moedas. Mas mesmo convertendo todos os preços numa mesma moeda, através da
designada taxa de câmbio corrente (isto é, do preço a que normalmente pode trocar uma
moeda por outra, num banco, casa de câmbio, ou outro local apropriado), o que se veri-
fica é que existem por vezes diferenças significativas nos preços dos mesmos produtos.
Estes diferenciais de preços podem ser observados no próprio interior da Zona Euro (e às
vezes mesmo, embora em menor escala, entre regiões do mesmo país). É claro que
diferentes valores do PIB em dois países em parte resultam destes diferenciais de preços.

Dada a similitude entre o presente problema e o que discutimos aquando das compara-
ções temporais, não deve pois estranhar que a solução seja também ela semelhante,
baseada na equação (13) à frente, não muito diferente de (6´). De facto, o que é feito (ou
o que deve ser feito, devendo ter o cuidado de se certificar quando pesquisar estatísticas a
nível internacional se já o foi efetivamente) é que os PIBs dos diferentes países no lugar
de serem convertidos com base na taxa de câmbio corrente são-no por conversores
apropriados, designados de conversores em paridades de poder de compra. O PIB é
então dito, na gíria, estar avaliado em paridades de poder de compra (PPC):

PIB p. correntes, moeda local


(13) PIB PPC =
Conversor em PPC

Os conversores em PPC, das moedas locais dos diferentes países do mundo, para dólares/
preços médios dos EUA, ou para euros/ preços médios da Zona Euro, podem ser encon-
trados nas estatísticas ou nos sites das principais organizações internacionais (OCDE,

21
FMI, Eurostat). Estes conversores são médias ponderadas dos preços nos diferentes
países do mundo relativamente aos preços médios dos EUA ou da Zona Euro24. O recurso
à avaliação em PPC, nas comparações internacionais, tem ainda a vantagem de evitar a
instabilidade que feriria as comparações em câmbios correntes, dada a grande variabili-
dade que se verifica, em períodos de tempo diminutos, na taxa de câmbio. Por exemplo,
em 2002 o euro valia menos que o dólar, tendo essa posição se invertido significati-
vamente desde então. Esta valorização do euro, desde então até aos nossos dias, refletir-
se-ia enganadoramente, se fosse usada a taxa de câmbio corrente na comparação do PIB
dos países europeus com o dos EUA, num enorme crescimento económico aparente da
Zona Euro. Note-se, por fim, que mesmo no confronto do PIB (em valor total ou per
capita) entre países da Zona Euro, que adoptam pois a mesma moeda, deve-se fazer uso
da conversão em PPC, no lugar de proceder diretamente ao confronto em euros25.

5. A produtividade média do trabalho

Outro indicador igualmente de grande relevo no diagnóstico económico, quer quando se


procede a comparações temporais quer espaciais, que se propõe medir a eficácia das
economias, é a produtividade média do trabalho. Esta é calculada por:

PIB
(14) Produtividade média do trabalho =
Nº trabalhadores (L)
ou

PIB
(14´) Produtividade média (horária) do trabalho =
Nº horas trabalhadas ( L h )

24
Embora teoricamente o PIB PPC de um país A pudesse ser calculado diretamente com os preços dos EUA
ou da Zona Euro, produto a produto, como é normalmente feito no caso das comparações temporais, neste
caso das comparações espaciais o procedimento usado é sempre mais expedito. Ou seja o primeiro passo é
sempre o cálculo dos conversores PPC, através das médias ponderadas referidas em cima, sendo o PIB PPC
estimado a partir desses indicadores.
25
A mesma questão poderia – e nalguns casos deveria – ser suscitada nas comparações entre regiões de um
mesmo país. Contudo, embora na UE já tenha havido projetos nesse sentido, não estão geralmente
disponíveis conversores em PPC para as regiões. Recomenda-se, contudo, que na comparação de dados
regionais referentes a diferentes países – por exemplo regiões portuguesas com espanholas – se use os
respetivos conversores nacionais em PPC.

22
O uso do número de trabalhadores no indicador (14) atrás, no lugar da população total
como no PIBpc, decorre precisamente da produtividade se propor medir a eficácia do
processo produtivo, e sendo assim só os que trabalham contam. É porém preferível fazer
uso da expressão da produtividade horária (14´), dado que um número equivalente de
trabalhadores, em diferentes momentos do tempo, ou em diferentes países, pode trabalhar
um número de horas distinto. A verdadeira eficácia é pois aferida pela produção por hora,
sendo enganador constatar, desse ponto de vista, que trabalhando mais horas se produz
mais. A produtividade por trabalhador, como em (14), é ainda assim muito usada em
muitas análises, porque em muitos países não há um cômputo fiável do número de horas
trabalhadas. Hoje, porém, essa informação já existe pelo menos para os 34 países da
OCDE (que são alguns dos mais ricos do mundo), o que justifica que a discussão que se
segue faça uso sobretudo do conceito – mais rigoroso – de produtividade horária.

Note-se também que alguns autores (entre os quais nós próprios) têm argumentado que
seria mais apropriado usar o VAB, no lugar do PIB, no cálculo da produtividade. Este é
de resto o procedimento adotado no cálculo das produtividades setoriais, isto é as que se
referem a particulares ramos de atividade – a agricultura, o têxtil, a metalurgia de base,
etc. – embora não o seja realmente a maioria das vezes ao nível macroeconómico
(nomeadamente pelas principais organizações internacionais, como a OCDE, que usam o
PIB e não o VAB nesta conta). Refira-se por fim que uma comparação temporal de produ-
tividades deve ser feita a preços referenciados a um ano fixo e uma comparação espacial
referente à produtividade média para o conjunto das economias deve ser feita em PPC 26.

Um cálculo simples, que permite relacionar o PIBpc com a produtividade horária média
do trabalho é o seguinte:

PIB L PIB Lh
(15) PIBpc = x h = x =
Pop. Lh Lh Pop.
= produtividade média (horária) do trabalho x horas trabalhadas per capita

Ou seja, atingir um PIBpc elevado depende da eficácia do processo produtivo no que


respeita ao uso do fator trabalho – isto é da produtividade –, mas também do esforço de

26
Já a comparação de produtividades setoriais entre diferentes países poderá ser feita nalguns casos –
dependendo dos objetivos do estudo – em câmbios correntes.

23
trabalho, aqui medido pelo número de horas trabalhadas per capita. Dito doutro modo, os
países que têm esse benefício de um elevado PIBpc, conseguem-no ou porque trabalham
bem (produtividade) ou porque trabalham muito (horas per capita). De facto, o número
de horas trabalhadas per capita é um indicador rude do esforço de trabalho numa
economia, já que no denominador está toda população de um país, sendo que uma parte
não está, nem poderia estar, afeta ao processo produtivo: crianças, idosos, outros. Para
obviar a este problema o indicador número de horas trabalhadas per capita pode também
ser decomposto como se segue:

Lh Lh L Pop1564 Lh L Pop1564
(16) = x x = x x =
Pop. Pop. L Pop1564 L Pop15-64 Pop.
= nº médio de horas trabalhadas por trabalhador x taxa de emprego x
x fator demográfico

Nesta equação assumiu-se que a população com idades entre 15 e 64 anos (Pop15–64)
podia ser considerada a população em idade de trabalhar. Torna-se assim claro que o
indicador horas trabalhadas per capita depende de facto de três fatores:

- do efetivo esforço de trabalho de quem trabalha, expresso pelo número de horas


por ano trabalhadas em média por cada trabalhador;
- da taxa de emprego, que representa a proporção dos indivíduos entre 15 e 64 anos
que trabalha; esta taxa de emprego varia inversamente com a taxa de desemprego,
mas depende também de outros fatores como a idade média de reforma, a idade de
ingresso dos jovens, em média, no mercado do trabalho, ou da taxa de parti-
cipação das mulheres no mesmo mercado;
- da ocorrência de uma demografia mais ou menos favorável, ou seja do peso da
população em idade ativa na população total.

Os Quadros nºs 1 e 2 à frente mostram-nos para um conjunto de países da OCDE, para


2013 27, como se procede às decomposições (15) e (16). Em ambos os quadros os valores
tomaram a forma de um número índice, em que aos Estados Unidos foi atribuído o valor

27
De facto, nalguns países o indicador demográfico refere-se a 2012, tendo os restantes fatores sido
ajustados de forma coerente.

24
Quadro nº 1

PIBpc (em paridades de poder de compra), e sua decomposição em Produtividade


do trabalho (horária), e Nº Horas trabalhadas per capita, em 2013,
em alguns países da OCDE – (Estados Unidos = 100)

Produti- Horas Produti- Horas


PIBpc vidade trabalh. PIBpc vidade trabalh.
País (horária) per cap. País (horária) per cap.
Bélgica 79,0 98,4 80,3 Luxemburgo 171,2 141,9 120,7
Chile 41,6 40,4 102,9 México 31,8 28,8 110,6
Dinamarca 82,7 94,3 87,6 Holanda 87,1 95,0 91,7
França 70,9 93,1 76,1 Polónia 44,7 43,9 101,8
Alemanha 81,4 93,1 87,4 Portugal 52,5 52,6 99,8
Grécia 48,3 53,7 89,9 Espanha 62,5 76,6 81,5
Itália 66,1 75,7 87,4 Turquia 35,1 47,2 74,2
Japão 68,1 61,9 110,0 Reino Unido 72,2 74,2 97,4
Coreia do Sul 62,4 48,3 129,3 Estados Unidos 100 100 100
fonte: OCDE

Quadro nº 2
Decomposição do Nº Horas/ano trabalhadas per capita em Horas por empregado,
Taxa de emprego na população em idade ativa (15-64 anos), e Peso
da pop. 15-64 anos na população total, em 2013, em alguns países da OCDE –
(Estados Unidos = 100)

Horas Horas
Emprego/ Pop 15- Emprego/ Pop 15-
por por
Pop. 64/Pop Pop. 64/Pop
empre- empre
15-64 Total 15-64 Total
País gado País -gado
Bélgica 90,7 89,9 98,5 Luxemburgo 78,6 148,0 103,7
Chile 116,0 85,9 103,3 México 122,7 92,2 97,8
Dinamarca 82,6 108,8 97,5 Holanda 81,8 112,6 99,5
França 85,7 92,3 96,3 Polónia 117,1 82,0 106,0
Alemanha 78,4 112,3 99,3 Portugal 108,4 92,4 99,7
Grécia 118,5 77,2 98,3 Espanha 97,8 82,9 100,6
Itália 100,7 88,6 97,9 Turquia 105,4 69,2 101,7
Japão 99,8 118,1 93,3 Reino Unido 96,0 103,1 98,4
Coreia do Sul 119,6 98,3 109,9 Estados Unidos 100 100 100
fonte: OCDE

25
100. A diferença relativamente a 100 mede assim o desvio de cada país, nesse indicador,
relativamente aos EUA. 103 significa 3% acima do valor dos EUA e 97 3% abaixo. O
facto dos valores originais estarem transformados em números índice não impede que as
equações (15) e (16) sejam verdadeiras, também nessa forma, como pode confirmar com
uma simples máquina de calcular.

Com base nos Quadros nºs 1 e 2 pode pois concluir-se que:

- Com exceção do Luxemburgo, todos os outros países contemplados têm PIBpc


nitidamente inferiores ao dos EUA.

- Se olharmos para os países do centro da Europa (Bélgica, Dinamarca, França,


Alemanha, Holanda) é contudo claro que o menor PIBpc não deriva significa-
tivamente duma produtividade do trabalho mais reduzida, isto é duma menor
eficácia produtiva, mas sobretudo dum menor esforço de trabalho, traduzido em
indicadores de horas trabalhadas per capita muito inferiores ao observado nos
EUA.

- A razão porque na Europa o número de horas trabalhadas per capita é inferior


aos EUA resulta sobretudo dos que trabalham trabalharem menos horas, embora
nalguns países também a taxa de emprego se distancie em baixa da dos EUA
(Quadro nº 2). A Europa manifesta assim uma maior preferência (legítima) pelo
lazer, em detrimento de um PIB mais elevado.

- Este padrão que detetámos na Europa não é porém extensível a Portugal.


Portugal tem um PIBpc muito inferior quer ao dos EUA, quer ao dos países do
centro da Europa, ainda que em 2013 fosse já maior que o da Grécia, mais
atingida que foi pela recente crise económica internacional. Mas ao contrário de
outros países europeus o PIBpc baixo, em Portugal, deve-se fundamentalmente à
produtividade horária do trabalho muito baixa, mesmo inferior à da Grécia.

- Não é contudo verdade que os portugueses trabalhem pouco (quem diria!). Com
efeito, o número de horas de trabalho per capita situa-se somente 0,2% abaixo
do dos EUA. Por outro lado, este valor inferior aos dos EUA resultou funda-
mentalmente duma quebra da taxa de emprego nos últimos anos, que espelhou o

26
aumento do desemprego em Portugal. O número de horas trabalhadas anual-
mente por trabalhador em Portugal é superior em 8,4% ao observado nos EUA28.

- Por curiosidade, se atentar ao Quadro nº 2, o país, entre os que aí são relevados,


em que se trabalha menos horas/ano por trabalhador é a Alemanha.

- Ao contrário do que acontece nos países europeus, nos países asiáticos, incluídos
nos quadros (Japão e Coreia do Sul), os valores relativamente reduzidos dos
PIBpc resultam de facto de uma produtividade muito reduzida. Esta é uma
constatação notável porque esses países são associados na “mitologia” contem-
porânea a potências tecnológicas. Na realidade a Coreia do Sul tem mesmo uma
produtividade do trabalho horária inferior à de Portugal. O que se observa, ao
contrário, é que estes países atingem apesar de tudo níveis relativamente confor-
táveis de PIBpc, devido ao seu assinalável esforço de trabalho. A Coreia do Sul
beneficia ainda de uma demografia significativamente mais favorável, que a de
qualquer outro país considerado nos quadros.

- Caso curioso é o do Chile, que geralmente é visto como um paradigma a adotar


pelos setores mais conservadores da elite mundial. A verdade, porém, é que o
Chile tem um PIBpc e regista uma produtividade do trabalho bem mais baixos
que a maioria dos outros países da OCDE, incluindo Portugal, e no caso da
produtividade um valor mesmo inferior ao da Turquia.

- Uma última palavra para o Luxemburgo. Este país tem um PIBpc 71,2% acima
dos EUA, o que em parte se deve à produtividade horária do trabalho, que é
41,9% mais que nos EUA. Contudo, o enorme empolamento do PIBpc do Lu-
xemburgo reflete em grande medida o número de horas trabalhadas per capita,
em consequência de uma taxa de emprego anormalmente elevada. Este valor da
taxa de emprego decorre, como já se explicou trás de migrações pendulares
transfronteiriças, ou seja do facto de parte dos empregos que contribuem para o
PIB luxemburguês serem preenchidos por não-residentes no grão-ducado. Na

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O que dissemos para Portugal pode ser dito também para a Grécia. Não é verdade que os gregos
trabalhem pouco! As horas trabalhadas per capita pelos gregos são inferiores em 2013 ao registo de
Portugal, porque a taxa de emprego ainda se afundou mais em reflexo do crescimento astronómico do
desemprego.

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realidade, embora, isso não seja observado no Quadro nº 2, o emprego no
Luxemburgo excede mesmo, em valor absoluto, o número de residentes com
idades entre 15 e 64 anos.

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